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Economy & Finance


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Page 1: Artigo exploratório   cadeias de blocos e contratos inteligentes

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Inovação na tecnologia financeira:

As cadeias de blocos e os contratos inteligentes

1. Génese e evolução

Durante o ano de 2015 os principais operadores financeiros internacionais (bancos, seguradoras, gestoras de fundos e bolsas de valores) demonstraram um interesse crescente na experimentação da tecnologia blockchain ao constituir consórcios internacionais, incubadoras e ao promover e patrocionar conferências e hackatons.

Para os analistas financeiros, técnicos, directores e membros de conselhos de administração de empresas financeiras é cada vez mais importante entender as implicações da blockchain no desenvolvimento operacional e estratégico das suas unidades de negócio, dentro de uma tendência mais ampla de desintermediação dos serviços financeiros (fintech) e da criação de uma verdadeira economia de valor na internet (web 3.0).

A blockchain, ou cadeia de blocos, adopta protocolos de cibersegurança derivados da moeda criptográfica do bitcoin. Existem actualmente muitas definições sobre o que é a blockchain pelo que este artigo pretende introduzir apenas as principais linhas conceptuais associadas a esta tecnologia. Em termos sintéticos a blockchain é uma base de dados descentralizada e sincronizada entre diversos computadores em rede, em tempo real, e cujos dados registados são teoricamente imutáveis, não podendo assim ser alterada a versão da história que a blockchain pretende avalisar. Como unidade de negócio pode ser considerada como uma tecnologia de suporte a actividades de notário (escrow).

Actualmente cerca de dez mil programadores encontram-se envolvidos em startups e projectos relacionados com a blockchain e com as linguagens de programação específicas para criação de contratos inteligentes (smart contracts). A linguagem Solidity representa um novo paradigma na computação descentralizada. Em termos muitos básicos a Solidity é a junção de uma linguagem de alto nível, similar a Javascript, com um token que serve como meio de pagamento, aos membros da rede de computadores peer-to-peer, e proporcional ao tamanho das instruções (objectos, scripts reunidos em smart contracts) que são gravadas e depois são executadas automaticamente, sem possibilidade de intervenção humana. As instruções dos contratos inteligentes são assim considerados como auto-reguladas (self-enforceable) no momento em que são inseridas na blockchain, o que levanta questões legais e operacionais.

Na nossa opinião o projecto que apresenta um potencial de maior disrupção é a Ethereum, uma rede descentralizada aberta a qualquer utilizador online, fruto de uma comunidade de programadores de classe mundial . A Ethereum tem como objectivo principal a integração de diferentes contratos inteligentes, que comunicam entre si, numa só blockchain o que, segundo algumas perspectivas, poderia originar o aparecimento de organizacões autónomas descentralizadas que vivem no ciberespaço mas também no mundo da internet das coisas, dos sensores conectados à internet (internet of things).

Na óptica de retorno do investimento empresarial, os custos de computação, sobretudo, e armazenagem nas redes blockchain são, actualmente, muito superiores aos das bases de dados tradicionais. As aplicações que mais poderão beneficiar numa fase inicial são aquelas cuja nível de segurança informática é crítico, como é o caso das operações financeiras.

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Em termos muitos gerais a blockchain tem sido visto como um paradigma de integração e automatização das operações financeiras quer sobre activos digitais on-the-blockchain ou off-the-blockchain, mediante oráculos inteligentes, que são os agentes que mediante um protocolo de consenso, validam e inserem as informações do mundo real, incluindo bases de dados externas, na cadeia de blocos, aparentemente como a versão mais válida da realidade que pretende representar.

2. Aspectos conceptuais

A cadeia de blocos apresenta-se como uma solução tecnicamente segura (segue os mais altos padrões criptográficos), economicamente viável (de código aberto), alternativa às bases de dados multimaster (tipo SQL). As linguagens de programação de contratos inteligentes vêm criar um novo modelo democrático (permissionless) , cripto-económico (pay-per-contract), com a certeza da automatização de instruções (self-enforceable).

O primeiro aspecto a considerar é o modelo de consenso (consensus) inerente à sincronização de blocos idênticos na rede distribuida peer-to-peer. Podendo ser híbrido, o consenso é atingido através da imposição ou de uma recompensa potencial ou de um prejuízo potencial aos membros da rede, para validarem blocos uniformes de informação na blockchain, através ou de uma prova de trabalho (proof-of-work) ou através de uma prova de depósito (proof-of-stake). O Bitcoin, por exemplo utiliza, a proof-of-work baseada no dispêndio computacional para resolver um puzzle matemático, sendo que o computador ou consórcios de computadores (nodes) que consegue resolver esse problema recebe uma determinada recompensa, na moeda criptográfica dessa blockchain. Os protocolos proof-of-stake, ao contrário da proof-of-work, no bitcoin, já conheceram diversas falhas (ou seja um ataque com sucesso, de uma só entidade que consegue dominar 51% do poder de consenso). A prova de depósito exige que o membro da rede já tenha tokens e que os coloque numa espécie de contrato temporário. Um dos protocolos que se espera ter mais sucesso no futuro é o CASPER, que virtualiza funções de recompensa/prejuízo muito similares ao bitcoin, mas com a vantagem de um menor dispêndio energético (electricidade), e que deverá ser implementado na rede Ethereum ainda este ano.

Dois tipos de concepções antagónicas poderão ser feitas quanto ao grau de permissão dentro de uma cadeia de blocos. É muito comum ser citado o argumento de que redes blockchain privadas (permissioned ledgers) não favorecem a inovação aberta e uma maior disrupção nos serviços financeiros. Segundo alguns experts as redes públicas são as que trazem um maior valor acrescentado, devido a serem resistente à censura de dados (censorship-resistant) A identidade online é um elemento essencial que valida, legalmente, as transações e contratos efectuados na internet. Para os intermediários financeiros determinar a identidade dos utilizadores de serviços (financeiros) , é basilar para assegurar o compliance das instituições perante supervisores que asseguram o cumprimento dos dispositivos de regulação do sistema financeiro (especialmente na obediência às normas de KYC, Know Your Costumer, e AML, Anti Money Laundering). Por vezes a democratização do acesso a serviços financeiros, que se traduz numa maior inclusão financeira, e a identidade (na internet) são dificeis de conciliar, positivamente, na mesma equação. Surgem também outras questões de debate como a gestão da privacidade dos utilizadores e dos dados biométricos dos utilizadores de serviços online.

A tokenização nos serviços financeiros, tem um carácter efémero: representa uma forma de salvaguardar a identidade e os dados, em cada nova transação. Os tokens, são uma forma comum de proteger os dados de um cartão de crédito, numa operação online, mas aqui são considerados numa perspectiva mais abrangente. O Token na blockchain, assume, tradicionalmente, a figura de uma moeda criptográfica. Mas, como referido, a blockchain permite o dinheiro programável, portanto esta moeda pode representar simplesmente uma unidade (voucher, bilhete, etc.) que é válida por determinado

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tempo, condições ou contexto determinados por código dentro de programas de software (i.e. organização autónoma descentralizada). Dentro da comunidade crypto existem dois extremos que vão desde a posição agnóstica, ou seja, não é necessária a utilização de um token como meio de pagamento, pelo menos numa rede onde todos os participantes se conhecem e confiam entre si outras modalidade de acerto de custos e fees (settlement) . Para estes a blockchain não é vista como um mecanismo monetário de pagamentos, mas puramente, de registo técnico, para sincronização de balancetes, posições (de contrapartes) e inventários entre instituições aderentes. Note-se que não havendo um Token na rede blockchain, então a norma de Consenso, não pode ser realizada através do modelo cripto-económico de consenso distribuido mas através de modelos computacionais anteriores ao bitcoin (em concreto o Practical Byzantine Fault Tolerance). O token é o crédito que serve de recompensa on-the-blockchain pela manutenção da integridade dos dados na rede.

A tokenização e a prova de trabalho, nas suas variantes, são elementos de cibersegurança nos quais se baseiam as cadeias de blocos, nomeadamente as permissionless blockchains. As blockchains, é argumentado, não constituem uma inovação mas um conjunto ou combinação de vários protocolos que tem vindo a ser desenvolvidos no domínio da criptografia, bem como a nível de hardware especializado para mineração de blocos. Na perspectiva maximalista, do bitcoin, os ASICs são placas de circuitos integrados especificamente criados para resolver problemas computacionais associados à validação de novos blocos de dados, similar a um processo contínuo de assinatura digitais (time stamping). Quando gerada uma função de dispersão criptográfica (hash SHA-256) com um valor inferior ao do objectivo é então criado (resolvido) um novo bloco e distribuida uma recompensa. Uma hash é um tipo de função unidirecional praticamente impossível de inverter e que tem propriedades interessantes no domínio da csegurança informática (As propriedades poderão ser consultadas em detalhe no wikipedia: https://en.wikipedia.org/wiki/Cryptographic_hash )

A Cadeia de blocos tem sido vista por alguns autores e empreendedores como uma infraestrutura plausível para implementação de sistemas de governança. As regras de governança são determinadas no programa de software e ditam como as operações e transacções se irão realizar na rede. Dentro do bitcoin, por exemplo, não existe um sistema de governança no software que permita fazer face ao problema do limite de informação por bloco. Nas blockchains “turing complete”, ou seja naquelas em que é possível programa e executar código de forma mais eficiente, como todo o sistema é modular e baseado em objectos com instruções autónomas que normalmente contém uma variável valor (value) e um estado (state), podemos argumentar que um sistema inicial, que é derminado por um pequeno cojunto de normas, pode desenvolver-se para um sistema complexo de contratos inteligentes que interagem e comunicam entre si e o meio envolvente, para além da sua função central de processamento de instruções internas. Podemos desenhar sistemas autónomos DAOs (Decentralized Autonomous Organizations) compostos por conjuntos de contratos inteligentes coordenados que deixam de ter intervenção humana directa para gerirem e determinarem acções futuras. Isto requer por um lado, um elevado nível de abstracção, que se traduz em contratos cada vez mais sintéticos e interligados, por outro uma certeza da validade jurídica e técnica ( do código do programa) que numa fase intermédia, poderá ser assegurada por uma rede humana de Oráculos Inteligentes descentralizados na blockchain (Smart Oracles).

Os oráculos são uma componente que também merece revisão quando começamos a desenvolver protótipos dentro da lógica da cadeia de blocos. Os oráculos constituem a fonte de validação de informação externa, por via da sua sintese e publicação na blockchain (por exemplo em hashes). A IBM com suporte das ferramentas da Ethereum criou um protótipo (IBM Adept) que testa as cadeias de blocos como solução para a internet das coisas. Os principais factores críticos que tornam a Blockchain interessante como plataforma para a IoT , principalmente nos sectores dos seguros, imobiliário, leasing

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e economia da partilha, são a autenticação, a monitorização remota, a interoperabilidade, a monetização, e a melhoria do serviço ao cliente. Os oráculos são considerados inteligentes quando associados a instruções executadas on-the-blockchain, ou seja o seu código é executado pelos vários peers da rede sendo também automaticamente comparado os resultados das observações através de um modelo de consenso ou de previsão (prediction markets).

A Internet das Coisas, sendo um conceito abstracto é, provavelmente, fácil de associar com as aplicações de smartphone (GPS, giroscópio, acelerómetro, microfone, barómetro touchscreen, câmaras, etc.). A segurança da internet das coisas é um factor crítico à medida que as nossas aplicações migram dados e computação para a nuvem (cloud) que no fundo não são mais do que servidores dedicados que remotamente armazenam e disponibilizam os dados às aplicações dos nossos dispositivos. A nível industrial a Internet das Coisas representa um pontencial gigante e por vezes confunde-se com a noção da 4.ª revolução industrial. Existe hoje um protótipo funcional para a Internet-of-things na Blockchain que permite, de uma forma mais segura, a gestão de fechaduras electrónicas e controlo de dispositivos mediante instruções de contratos inteligentes. Esta solução (Slock.it) incorpora microprocessadores (arduino, raspberry, edison) que correm um sistema operativo dedicado para correr os programas na cadeia de blocos, alterando por completo o paradigma da computação segura e desintermediando, possivelmente, a Airbnb ou a Uber, através de plataformas de partilha peer-to-peer totalmente descentralizadas. A VISA em parceria com a Docusign criaram um protótipo funcional de propriedade inteligente (smart property) para uma viatura automóvel. Podemos imaginar e identificar outras aplicações e startups que permitem, com o nivel de segurança da blockchain, a monitorização e transacções de propriedade física não apenas na prestação de serviços ao consumidor final mas ao longo de uma cadeia de produção e expedição de mercadorias. Para os intermediários financeiros que trabalham no comércio internacional (trade finance) e para o sector segurador a blockchain na IoT permitirá uma maior integração de sistemas e uma maior automatização de operações associadas à gestão de riscos.

Até ao momento, apenas nos referimos aos contratos inteligentes como pedaços de código informático que vivem numa blockchain. Para o utilizador final é importante transmitir as garantias de segurança, confidencialidade e privacidade mas também a usability. A forma mais comum de apresentar as soluções ao utilizador é através de Dapps (decentralized applications). As aplicações descentralizadas pretendem resolver talvez os mesmos problemas do utilizador comum, seja ele um consumidor ou empresa, mas com uma perspectiva diferente. Em termos gráficos as Dapps podem ser distríbuidas através de Dapp Markets e usadas num Browser ou Sistema Operativo dedicado. As Dapps, principalmente na área financeira, poderão oferecer ao utilizar serviços totalmente desintermediados, como por exemplo na área do financiamento colaborativo, facilitadas pelo desenvolvimento de comunidades em torno de Organizações Autónomas Descentralizadas (DAOs) . As Dapps comunicam entre si, fundamentalmente, valor. No capítulo seguinte serão apresentadas algumas soluções que, vistas de uma perspectiva integradas, oferecem um retorno diferente ao utilizador (através de modelos de revenue sharing automatizados na blockchain).

A privacidade na blockchain está intimamente relacionada com os níveis de permissão definidos (ou não) pela equipa que programou o código original da rede. Como se disse existem dois extremos ao nível da permissão, que para alguns, poderá traduzir-se também no facto da rede blockchain ser pública ou privada. Porém, convém distinguir entre níveis de permissão de escrita e níveis de permissão de leitura no acesso a dados, fundamentalmente quando são criados protótipos que tem de como objectivo adicional fazer cumprir as normas das entidades de regulação e de supervisão. Uma rede pode ser pública e ter permissões, bem como pode ser privada e não ter nenhuma permissão para além do acesso a registo de novos utilizadores. Assim, aparenta-nos ser o modelo permissionless o mais generalista,

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porque é possível teoricamente (agora ainda não tecnicamente, nomeadamente contratos ) ocultar ou preservar identidades e informações na blockchain através de provas de conhecimento zero (zero knowledge proofs). Os privacy preserving smart contracts estão a ser desenvolvidos pelos projecto Hawk e Enigma em universidades americanos por experts em criptografia. Estes contratos tem aplicações que, exigindo um maior poder computacional e de armazenamento, permitem a execução de contratos na rede pública preservando parte ou a totalidade das informações e identidades ou limitando a sua visibilidade a utilizadores autorizados. Se considerarmos rede pública como internet, esta solução tem maior valor acrescentado no contexto da desintermediação de serviços bancários e financeiros.

Abordámos as DAOs, organizações autónomas descentralizadas, nos anteriores parágrafos. Segundo o autor William Mougayar, a DAO permite criar uma singularidade entre os modelos de produção/consumo peer-to-peer, as organizações descentralizadas (como as cooperativas), a modularização de serviços (unbundling) e os modelos criptográficos de consenso que recriam o factor confiança entre agentes. Mougayar define um roteiro para o desenvolvimento de DAOs: ( 1) participação voluntária, (2) colaboração para a criação de valor acrescentado, (3) cooperação na partilha de valor, (3) distribuição, através da multiplicação, (4) desdobramento e replicação de iniciativas, (4) Escala com descentralização, (5) Autonomia aplicando inteligência artificial sustentável. Mougayar desenvolve uma matriz de enquadramento lógico para as DAOs onde identifca os factores críticos ao nível da tecnologia, ganhos, governança, valor, stake, e escopo. A matriz pode ser consultada no seguinte artigo: http://www.coindesk.com/succeed-as-decentralized-autonomous-organization/

3. Aplicações e Casos de Estudo

Dentro das aplicações e casos de estudo convém mencionar os diferentes tipos de entidades que tem apresentado publicamente manifestações de interesse e implementado iniciativas com a blockchain.

Grandes empresas de informática: A Microsoft disponibilizou soluções na plataforma Azure, A IBM associou-se à Fundação Linux para doação de Código no Github

Bolsas de Valores: em meados de 2015 o NASDAQ associou-se a várias startups para testar protótipos. A bolsa da Austrália tem mantido negociações com uma startup que recebeu 50M USD.

Grandes Bancos Internacionais: criaram um consórcio R3 CEV que actualmente reune mais de 40 bancos de renome. Testaram diversos contratos inteligentes na Ethereum, contribuindo para a valorização da sua cripto-moeda em mais de 3000%. Apoiam startups em incubadoras.

Grandes Consultoras Internacionais: publicam regularmente estudos e artigos na internet e organizam hackatons patrocinando e estando presentes em conferências temáticas.

Gestores de Fundos de Investimento: no final do ano alguns fundos e gestores de fundos de renome associaram-se com manifestações de interesse e publicações online.

Seguradoras: o ano de 2016 tem vindo a despertar maior interesse e novos protótipos. Prevê-se um grande interesse associado a soluções de monitorização pela IoT.

Empreendedorismo / Startups: estima-se que cerca de 10.000 programadores se encontram envolvidos em projectos com esta tecnologia.

Nos últimos dois anos, novas startups em todo o mundo encontram a desenvolver provas de conceitos e protótipos com as cadeias de blocos e com os contratos inteligentes adoptando diferentes estratégias de implementação e segmentos de mercado. Um contrato simples de financiamento colaborativo (crowdfunding) pode ser escrito em menos de 100 linhas de código.

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A maioria dos projectos que identificamos tem interesse na perspectiva de serem soluções integradas e interoperáveis, com base em critérios de qualidade das provas de conceito (white papers), perfil dos fundadores, dinamismo empresarial e distribuição de código livre. Muitos pretendem concorrer com os players estabelecidos num determinado sector de actividade, ou com um modelo inovador de acesso a bens e serviços, redução de custos ou partilha de rendimentos entre utilizadores.

Ethereum: Fundação na Suiça, criou o conceito de computador mundial descentralizado. É uma rede blockchain permissionless totalmente programável. Desenvolvem linguagens de programação de alto nível para contratos inteligentes. Teoricamente todas as aplicações imagináveis e poderão ter sinergias ao trabalharem numa blockchain. Actualmente a capacidade de computação é muito limitada, mas a velocidade de processamento de transacções é de menos de 15 segundos.

Eris Industries: Sede na Inglaterra. Dedicam-se à produção de livrarias de contratos inteligentes para o ramo empresarial e finanças. Recentemente acordaram uma parceria com uma consultora «Big4». Destacam-se pela utilização da Marmota como mascote/logotipo como alegoria a possibilidade de se criarem milhões de cadeias de blocos.

Factom: Sede nos EUA. Pretendem criar um grande notário para registos imobiliários, tendo desenvolvido acordos com Estados norte-americanos e países centro-americanos, bem como parcerias com investidores asiáticos

Storj: A Storj é um sistema de armazenagem na cloud, descentralizado, compartilhando o espaço disponível de cada utilizador, similar ao Bittorrent, mas com um token que permite desenvolver um modelo de recompensa.

La'Zooz: É uma prova de conceito para a blockchain e actualmente está disponível uma aplicação android para registo de utilizadores. Visa descentralizar o modelo da Uber, no domínio da mobilidade. Os tokens são gerados automaticamente na rede, em função das viagens partilhadas, mediante leitura de GPS.

Synereo: Pretendem descentralizar as redes sociais, partilhando receitas em função do grau de participação dos utilizadores

Orisi/Oraclize.it: Oferecem soluções para implementação de oráculos inteligentes nas cadeias de blocos

Bitshares: É uma rede blockchain programável dedicada a contratos inteligentes para manipulação de activos digitais

Ripple: O objectivo da Ripple, sediada em São Francisco, Califórnia, é criar uma rede paralela à Swift, a cooperativa que gere as mensagens interbancárias a nível mundial, que deverá funcionar como player mundial no domínio dos pagamentos internacionais no segmento bancário e corporate.

Stellar: A Stellar foi criada pelo mesmo fundador da Ripple, que entrou em dissidência com esta. Dedicam-se ao mercado das microfinanças, como o mesmo objectivo de criar uma Swift para as MFIs( Microfinance Institutions). Conseguiram implementar uma rede na Nigéria, segundo o site e notícias.

Twister: Projecto de microblogging, já com vários anos de actividade. Utiliza uma base de dados partilhada com propriedades da blockchain para emular o Twitter.

Open Bazaar: O Open Bazaar é o player mais activo e com melhor qualidade demonstrada, em provas de conceito, na comunidade que utiliza bitcoins na área de mercados online descentralizados. O seu objectivo é suplantar as falhas do polémico mercado Silk Road. Não arquiva nem executa contratos inteligentes na blockchain do bitcoin.

GetGems: É um serviço de mensagens ao estilo do MSN messenger, que oferece recompensas em

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bitcoin por cada visualização de banners de publicidade na sua aplicação. Não temos conhecimento se as mensagens são encriptadas numa base de dados comum ou blockchain. Oferece uma carteira

NameCoin: É um protótipo funcional desenvolvido em código livre. Pretende descentralizar a forma como são registados os sites na internet. Foi o primeiro fork do bitcoin, ou seja, a primeira aplicação desenvolvida a partir do código do bitcoin.

Filament: É uma empresa que, operando há algum tempo na área da IoT, está a desenvolver uma solução descentralizada para a Internet das Coisas.

Slock.it. A Slock.it é uma empresa co-fundada por um dos fundadores da Ethereum. Demonstrou publicamente o primeiro protótipo funcional (smart lock) na conferência Ethereum DevCon1. A Slock.it fez uma parceria com a RWE, importante empresa de energia alemã, para desenvolver uma solução de carregamento de baterias elétricas dos automóveis.O expectro de aplicações Slock.it é muito vasto e com alto potencial

Ribbit.me: É a primeira empresa que está a desenvolver uma solução profissional completa para a emissão de vouchers através da blockchain.

Hawk /Enigma: São projectos desenvolvidos a nível académico com vista a implementar contratos com parâmetros de privacidade e acesso dentro de cadeias de blocos públicas.

Solarcoin: Foi um dos primeiros projectos a associar a tecnologia blockchain com a produção de energias renováveis.

TransActive Grid: Pretendem criar uma rede de distribuição eléctrica verifica e monitorizada por contratos inteligentes. Este projecto é desenvolvido na plataforma Ethereum, através de uma joint venture com a Consensys. A Consensys é uma empresa fundada por um dos co-fundadores do projecto Ethereum

Augur: É o projecto que, na plataforma Ethereum, visa criar um mercado descentralizado para previsões (prediction market) de todos os tipos: económicas, políticas, etc.

D-cent: Projecto da Fundação NESTA no Reino Unido que mereceu financiamento de fundos europeus. Desenvolveu aplicações descentralizadas respeitando a privacidade dos cidadãos e promovendo a sua participação e empoderamento.

Sidechains: É uma tecnologia que pretende estender as funcionalidades do protocolo bitcoin de forma a permitir uma maior interoperabilidade entre esta rede e outras redes. É um projecto desenvolvido pela Blockstream. A Ripple também apresentou uma prova de conceito (Interleger) para responder ao mesmo problema.

Uport: É um cartão de identidade, descentralizado, baseado na tecnologia blockchain, implementado pela Consensys. Estabeleceu recentemente uma parceria com a Canonical / Ubuntu para criarem em conjunto uma solução de identidade para o Ubuntu Phone e tablets.

VEX Venture Equity Exchange: Este projecto pretende disponibilizar, na blockchain da Ethereum, um pacote completo de soluções de gestão e finanças para empreendedores, para capitais de risco e business angels, de forma a automatizar todas as operações relacionadas com investimentos em empresas startups.

Provenance: É um negócio social, em fase de prova de conceito, que tem como objectivo criar um passaporte digital com os dados relevantes dos produtos que passam pela cadeia de produção até chegar ao consumidor final. Poderá ter bastante impacto na economia circular.

Cargochain: Consiste num protótipo base para a guia de transporte, vocacionado para a área do Trade Finance / comércio internacional. Este projecto foi vencedor de um hackaton da Deloitte

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4. Perspectivas futuras

Dentro das tendências que identificamos no nosso acompanhamento das startups fintech, gerou-se uma agregação de conhecimentos, informações, desinformações e contra informações. Destacamos as que nos parecem ser mais credíveis e aquelas em que poderá haver desenvolvimentos com impacto:

A tecnologia da blockchain, nasceu de um conjunto de evoluções cripto-económicas e parece ser um meio viável de desintermediação e democratização e afecta a maior parte dos sectores de activide e toca também as questões de governança da sociedade.

A blockchain atraiu assim um grande número de talentos de programação, empreendedores, capital de risco e chegou à comunicação social mainstream. A blockchain não pareceu atrair a comunidade do terceiro sector, organizações cooperativas e associativas, para projecto de interesse comum .

Existe sim, uma comunidade dinâmica de incubadoreas, eventos, empreendedores e programadores. Estas comunidades não parecem se preocupar muito com o interesse das grandes empresas da cloud e dos bancos nos seus vários projectos, porém algumas delas demonstram preocupaçoes éticas e solucionar problemas sociais e ambientais.

As grandes empresas, da cloud e da banca, demonstram interesse na tecnologia: os bancos começaram a desenvolver consórcios para estudar aplicações, porque tem um interesse em aumentar o nível de segurança e confiança entre parceiros, prestando melhores serviços aos seus clientes e libertando funcionários através de maior automatização, com menores custos e maiores margens.

Existe uma clara possibilidade de absorção das potenciais mais valias, pelo sector financeiro tradicional, de uma tecnologia que tem as características de um bem público, ou pelo menos uma atitude pro-activa no sentido de assegurar a manutenção das margens e quotas de mercados, impedindo a entrada de novos competidores da área fintech, a desintermediação pura o

As grandes empresas de informática e da internet não demonstraram publicamente um interesse tão elevado em testar e prototipar, estarão eventualmente mais preocupadas no sentido de manterem as suas quotas de serviços no sector financeiro e corporate, pelo que se limitam a publicar literatura na internet, cada vez menor inovadora.

A nível técnico, a principal crítica relaciona-se com a computação na blockchain. Os contratos inteligentes na blockchain da ethereum são executados em todos os computadores, obedecem também a uma linguagem turing completa: é impossivel saber se um programa, composto por um conjunto de instruções, ficará eternamente em execução (por exemplo causado por um bug). A Ethereum criou um token associado à execução de cada linha de código que previne esta execução infinita, assim sendo a rede permissionless poderá originar problemas relacionados com contratos incompletos.

Inovação na tecnologia financeira:

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Durante o ano de 2015 os principais operadores financeiros internacionais (bancos, seguradoras, gestoras de fundos e bolsas de valores) demonstraram um interesse crescente na experimentação da tecnologia blockchain ao constituir consórcios internacionais, incubadoras e ao promover e patrocionar conferências e hackatons.

Para os analistas financeiros, técnicos, directores e membros de conselhos de administração de empresas financeiras é cada vez mais importante entender as implicações da blockchain no desenvolvimento operacional e estratégico das suas unidades de negócio, dentro de uma tendência mais ampla de desintermediação dos serviços financeiros (fintech) e da criação de uma verdadeira economia de valor na internet (web 3.0).

A blockchain, ou cadeia de blocos, adopta protocolos de cibersegurança derivados da moeda criptográfica do bitcoin, criada em 2009. Existem actualmente muitas definições sobre o que é a blockchain pelo que este artigo pretende introduzir apenas as principais linhas conceptuais associadas a esta tecnologia. Em termos sintéticos a blockchain é uma base de dados descentralizada e sincronizada entre diversos computadores em rede, em tempo real, e cujos dados registados são teoricamente imutáveis, não podendo assim ser alterada a versão da história que a blockchain pretende avalisar. Como unidade de negócio pode ser considerada como uma tecnologia de suporte a actividades de notário (escrow).

Actualmente cerca de dez mil programadores encontram-se envolvidos em startups e projectos relacionados com a blockchain e com as linguagens de programação específicas para criação de contratos inteligentes (smart contracts). A linguagem Solidity representa um novo paradigma na computação descentralizada. Em termos muitos básicos a Solidity é a junção de uma linguagem de alto nível, similar a Javascript, com um token que serve como meio de pagamento, aos membros da rede de computadores peer-to-peer, e proporcional ao tamanho das instruções (objectos, scripts reunidos em smart contracts) que são gravadas e executadas automaticamente, sem possibilidade de intervenção humana. As instruções dos contratos inteligentes são assim considerados como auto-regulados (self-enforceable) no momento em que são inseridas na blockchain, o que levanta questões legais e operacionais.

Na nossa opinião o projecto que apresenta um potencial de maior disrupção é a Ethereum, uma rede descentralizada aberta a qualquer utilizador online, fruto de uma comunidade de programadores de classe mundial . A Etherem tem como objectivo principal a integração de diferentes contratos inteligentes, que comunicam entre si, numa só blockchain o que, segundo algumas perspectivas, poderia originar o aparecimento de organizacões autónomas descentralizadas que vivem no ciberespaço mas também no mundo da internet das coisas, dos sensores conectados à internet (internet of things).

Na óptica de retorno do investimento empresarial, os custos de computação, sobretudo, e armazenagem nas redes blockchain são, actualmente, muito superiores aos das bases de dados tradicionais. As aplicações que mais poderão beneficiar numa fase inicial são aquelas cuja nível de segurança informática é crítico, como é o caso das operações financeiras.

Em termos muitos gerais a blockchain tem sido visto como um paradigma de integração e automatização das operações financeiras quer sobre activos digitais on-the-blockchain ou off-the-blockchain, mediante oráculos inteligentes, que são os agentes que mediante um protocolo de consenso, validam e inserem as informações do mundo real, incluindo bases de dados externas, na cadeia de blocos, aparentemente como a versão mais válidade da verdade ou exactidão.

2. Aspectos conceptuais

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A cadeia de blocos apresenta-se como uma solução economicamente segura (segue os mais altos padrões criptográficos), viável (de código aberto), alternativa às bases de dados multimaster (tipo SQL). As linguagens de programação de contratos inteligentes vêm criar um novo modelo democrático (permissionless) , cripto-económico (pay-per-contract), com a certeza da automatização (self-enforceable).

O primeiro aspecto a considerar é o modelo de consenso (consensus) inerente à sincronização de blocos idênticos na rede distribuida peer-to-peer. Podendo ser híbrido, o consenso é atingido através da imposição ou de uma recompensa potencial ou de um prejuízo potencial aos membros da rede, para validarem blocos uniformes de informação na blockchain, através ou de uma prova de trabalho (proof-of-work) ou através de uma prova de depósito (proof-of-stake). O Bitcoin, por exemplo utiliza, a proof-of-work baseada no dispêndio computacional para resolver um puzzle matemático, sendo que o computador ou consórcios de computadores (nodes) que consegue resolver esse problema recebe uma determinada recompensa, na moeda criptográfica dessa blockchain. Os protocolos proof-of-stake, ao contrário da proof-of-work, no bitcoin, já conheceram diversas falhas (ou seja um ataque com sucesso, de uma só entidade que consegue dominar 51% do poder de consenso). A prova de depósito exige que o membro da rede já tenha tokens e que os coloque numa espécie de contrato temporário. Um dos protocolos que se espera ter mais sucesso no futuro é o CASPER, que virtualiza funções de recompensa/prejuízo muito similares ao bitcoin, mas com a vantagem de um menor dispêndio energético (electricidade), e que deverá ser implementado na rede Ethereum ainda este ano.

Dois tipos de concepções antagónicas poderão ser feitas quanto ao grau de permissão dentro de uma cadeia de blocos. É muito comum ser citado o argumento de que redes blockchain privadas (permissioned ledgers) não favorecem a inovação aberta e uma maior disrupção nos serviços financeiros. Segundo alguns experts as redes públicas são as que trazem um maior valor acrescentado, devido a serem resistente à censura de dados (censorship-resistant) A identidade online é um elemento essencial que valida, legalmente, as transações e contratos efectuados na internet. Para os intermediários financeiros determinar a identidade dos utilizadores de serviços (financeiros) , é basilar para assegurar o compliance das instituições perante supervisores que asseguram o cumprimento dos dispositivos de regulação do sistema financeiro (especialmente na obediência às normas de KYC, Know Your Costumer, e AML, Anti Money Laundering). Por vezes a democratização do acesso a serviços financeiros, que se traduz numa maior inclusão financeira, e a identidade (na internet) são dificeis de conciliar, positivamente, na mesma equação. Surgem também outras questões de debate como a gestão da privacidade dos utilizadores e dos dados biométricos dos utilizadores de serviços online.

A tokenização nos serviços financeiros, tem um carácter efémero: representa uma forma de salvaguardar a identidade e os dados, em cada nova transação. Os tokens, são uma forma comum de proteger os dados de um cartão de crédito, numa operação online, mas aqui são considerados numa perspectiva mais abrangente. O Token na blockchain, assume, tradicionalmente, a figura de uma moeda criptográfica. Mas, como referido, a blockchain permite o dinheiro programável, portanto esta moeda pode representar simplesmente uma unidade (voucher, bilhete, etc.) que é válida por determinado tempo, condições ou contexto determinados por código dentro de programas de software (i.e. organização autónoma descentralizada). Dentro da comunidade crypto existem dois extremos que vão desde a posição agnóstica, ou seja, não é necessária a utilização de um token como meio de pagamento, pelo menos numa rede onde todos os participantes se conhecem e confiam entre si outras modalidade de acerto de custos e fees (settlement) . Para estes a blockchain não é vista como um mecanismo monetário de pagamentos, mas puramente, de registo técnico, para sincronização de balancetes, posições (de contrapartes) e inventários entre instituições aderentes. Note-se que não havendo um Token na rede blockchain, então a norma de Consenso, não pode ser realizada através do modelo

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cripto-económico de consenso distribuido mas através de modelos computacionais anteriores ao bitcoin (em concreto o Practical Byzantine Fault Tolerance). O token é o crédito que serve de recompensa on-the-blockchain pela manutenção da integridade dos dados na rede.

A tokenização e a prova de trabalho, nas suas variantes, são elementos de cibersegurança nos quais se baseiam as cadeias de blocos, nomeadamente as permissionless blockchains. As blockchains, é argumentado, não constituem uma inovação mas um conjunto ou combinação de vários protocolos que tem vindo a ser desenvolvidos no domínio da criptografia, bem como a nível de hardware especializado para mineração de blocos. Na perspectiva maximalista, do bitcoin, os ASICs são placas de circuitos integrados especificamente criados para resolver problemas computacionais associados à validação de novos blocos de dados, similar a um processo contínuo de assinatura digitais (time stamping). Quando gerada uma função de dispersão criptográfica (hash SHA-256) com um valor inferior ao do objectivo é então criado (resolvido) um novo bloco e distribuida uma recompensa. Uma hash é um tipo de função unidirecional praticamente impossível de inverter e que tem propriedades interessantes no domínio da csegurança informática (As propriedades poderão ser consultadas em detalhe no wikipedia: https://en.wikipedia.org/wiki/Cryptographic_hash )

A Cadeia de blocos tem sido vista por alguns autores e empreendedores como uma infraestrutura plausível para implementação de sistemas de governança. As regras de governança são determinadas no programa de software e ditam como as operações e transacções se irão realizar na rede. Dentro do bitcoin, por exemplo, não existe um sistema de governança no software que permita fazer face ao problema do limite de informação por bloco. Nas blockchains “turing complete”, ou seja naquelas em que é possível programa e executar código de forma mais eficiente, como todo o sistema é modular e baseado em objectos com instruções autónomas que normalmente contém uma variável valor (value) e um estado (state), podemos argumentar que um sistema inicial, que é derminado por um pequeno cojunto de normas, pode desenvolver-se para um sistema complexo de contratos inteligentes que interagem e comunicam entre si e o meio envolvente, para além da sua função central de processamento de instruções internas. Podemos desenhar sistemas autónomos DAOs (Decentralized Autonomous Organizations) compostos por conjuntos de contratos inteligentes coordenados que deixam de ter intervenção humana directa para gerirem e determinarem acções futuras. Isto requer por um lado, um elevado nível de abstracção, que se traduz em contratos cada vez mais sintéticos e interligados, por outro uma certeza da validade jurídica e técnica ( do código do programa) que numa fase intermédia, poderá ser assegurada por uma rede humana de Oráculos Inteligentes descentralizados na blockchain (Smart Oracles).

Os oráculos são uma componente que também merece revisão quando começamos a desenvolver protótipos dentro da lógica da cadeia de blocos. Os oráculos constituem a fonte de validação de informação externa, por via da sua sintese e publicação na blockchain (por exemplo em hashes). A IBM com suporte das ferramentas da Ethereum criou um protótipo (IBM Adept) que testa as cadeias de blocos como solução para a internet das coisas. Os principais factores críticos que tornam a Blockchain interessante como plataforma para a IoT , principalmente nos sectores dos seguros, imobiliário, leasing e economia da partilha, são a autenticação, a monitorização remota, a interoperabilidade, a monetização, e a melhoria do serviço ao cliente. Os oráculos são considerados inteligentes quando associados a instruções executadas on-the-blockchain, ou seja o seu código é executado pelos vários peers da rede sendo também automaticamente comparado os resultados das observações através de um modelo de consenso ou de previsão (prediction markets).

A Internet das Coisas, sendo um conceito abstracto é, provavelmente, fácil de associar com as aplicações de smartphone (GPS, giroscópio, acelerómetro, microfone, barómetro touchscreen, câmaras, etc.). A segurança da internet das coisas é um factor crítico à medida que as nossas aplicações migram

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dados e computação para a nuvem (cloud) que no fundo não são mais do que servidores dedicados que remotamente armazenam e disponibilizam os dados às aplicações dos nossos dispositivos. A nível industrial a Internet das Coisas representa um pontencial gigante e por vezes confunde-se com a noção da 4.ª revolução industrial. Existe hoje um protótipo funcional para a Internet-of-things na Blockchain que permite, de uma forma mais segura, a gestão de fechaduras electrónicas e controlo de dispositivos mediante instruções de contratos inteligentes. Esta solução (Slock.it) incorpora microprocessadores (arduino, raspberry, edison) que correm um sistema operativo dedicado para correr os programas na cadeia de blocos, alterando por completo o paradigma da computação segura e desintermediando, possivelmente, a Airbnb ou a Uber, através de plataformas de partilha peer-to-peer totalmente descentralizadas. A VISA em parceria com a Docusign criaram um protótipo funcional de propriedade inteligente (smart property) para uma viatura automóvel. Podemos imaginar e identificar outras aplicações e startups que permitem, com o nivel de segurança da blockchain, a monitorização e transacções de propriedade física não apenas na prestação de serviços ao consumidor final mas ao longo de uma cadeia de produção e expedição de mercadorias. Para os intermediários financeiros que trabalham no comércio internacional (trade finance) e para o sector segurador a blockchain na IoT permitirá uma maior integração de sistemas e uma maior automatização de operações associadas à gestão de riscos.

Até ao momento, apenas nos referimos aos contratos inteligentes como pedaços de código informático que vivem numa blockchain. Para o utilizador final é importante transmitir as garantias de segurança, confidencialidade e privacidade mas também a usability. A forma mais comum de apresentar as soluções ao utilizador é através de Dapps (decentralized applications). As aplicações descentralizadas pretendem resolver talvez os mesmos problemas do utilizador comum, seja ele um consumidor ou empresa, mas com uma perspectiva diferente. Em termos gráficos as Dapps podem ser distríbuidas através de Dapp Markets e usadas num Browser ou Sistema Operativo dedicado. As Dapps, principalmente na área financeira, poderão oferecer ao utilizar serviços totalmente desintermediados, como por exemplo na área do financiamento colaborativo, facilitadas pelo desenvolvimento de comunidades em torno de Organizações Autónomas Descentralizadas (DAOs) . As Dapps comunicam entre si, fundamentalmente, valor. No capítulo seguinte serão apresentadas algumas soluções que, vistas de uma perspectiva integradas, oferecem um retorno diferente ao utilizador (através de modelos de revenue sharing automatizados na blockchain).

A privacidade na blockchain está intimamente relacionada com os níveis de permissão definidos (ou não) pela equipa que programou o código original da rede. Como se disse existem dois extremos ao nível da permissão, que para alguns, poderá traduzir-se também no facto da rede blockchain ser pública ou privada. Porém, convém distinguir entre níveis de permissão de escrita e níveis de permissão de leitura no acesso a dados, fundamentalmente quando são criados protótipos que tem de como objectivo adicional fazer cumprir as normas das entidades de regulação e de supervisão. Uma rede pode ser pública e ter permissões, bem como pode ser privada e não ter nenhuma permissão para além do acesso a registo de novos utilizadores. Assim, aparenta-nos ser o modelo permissionless o mais generalista, porque é possível teoricamente (agora ainda não tecnicamente, nomeadamente contratos ) ocultar ou preservar identidades e informações na blockchain através de provas de conhecimento zero (zero knowledge proofs). Os privacy preserving smart contracts estão a ser desenvolvidos pelos projecto Hawk e Enigma em universidades americanos por experts em criptografia. Estes contratos tem aplicações que, exigindo um maior poder computacional e de armazenamento, permitem a execução de contratos na rede pública preservando parte ou a totalidade das informações e identidades ou limitando a sua visibilidade a utilizadores autorizados. Se considerarmos rede pública como internet, esta solução tem maior valor acrescentado no contexto da desintermediação de serviços bancários e financeiros.

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Abordámos as DAOs, organizações autónomas descentralizadas, nos anteriores parágrafos. Segundo o autor William Mougayar, a DAO permite criar uma singularidade entre os modelos de produção/consumo peer-to-peer, as organizações descentralizadas (como as cooperativas), a modularização de serviços (unbundling) e os modelos criptográficos de consenso que recriam o factor confiança entre agentes. Mougayar define um roteiro para o desenvolvimento de DAOs: ( 1) participação voluntária, (2) colaboração para a criação de valor acrescentado, (3) cooperação na partilha de valor, (3) distribuição, através da multiplicação, (4) desdobramento e replicação de iniciativas, (4) Escala com descentralização, (5) Autonomia aplicando inteligência artificial sustentável. Mougayar desenvolve uma matriz de enquadramento lógico para as DAOs onde identifca os factores críticos ao nível da tecnologia, ganhos, governança, valor, stake, e escopo. A matriz pode ser consultada no seguinte artigo: http://www.coindesk.com/succeed-as-decentralized-autonomous-organization/

3. Aplicações e Casos de Estudo

Dentro das aplicações e casos de estudo convém mencionar os diferentes tipos de entidades que tem apresentado publicamente manifestações de interesse e implementado iniciativas com a blockchain.

Grandes empresas de informática: A Microsoft disponibilizou soluções na plataforma Azure, A IBM associou-se à Fundação Linux para doação de Código no Github

Bolsas de Valores: em meados de 2015 o NASDAQ associou-se a várias startups para testar protótipos. A bolsa da Austrália tem mantido negociações com uma startup que recebeu 50M USD.

Grandes Bancos Internacionais: criaram um consórcio R3 CEV que actualmente reune mais de 40 bancos de renome. Testaram diversos contratos inteligentes na Ethereum, contribuindo para a valorização da sua cripto-moeda em mais de 3000%. Apoiam startups em incubadoras.

Grandes Consultoras Internacionais: publicam regularmente estudos e artigos na internet e organizam hackatons patrocinando e estando presentes em conferências temáticas.

Gestores de Fundos de Investimento: no final do ano alguns fundos e gestores de fundos de renome associaram-se com manifestações de interesse e publicações online.

Seguradoras: o ano de 2016 tem vindo a despertar maior interesse e novos protótipos. Prevê-se um grande interesse associado a soluções de monitorização pela IoT.

Empreendedorismo / Startups: estima-se que cerca de 10.000 programadores se encontram envolvidos em projectos com esta tecnologia.

Nos últimos dois anos, novas startups em todo o mundo encontram a desenvolver provas de conceitos e protótipos com as cadeias de blocos e com os contratos inteligentes adoptando diferentes estratégias de implementação e segmentos de mercado. Um contrato simples de financiamento colaborativo (crowdfunding) pode ser escrito em menos de 100 linhas de código.

A maioria dos projectos que identificamos tem interesse na perspectiva de serem soluções integradas e interoperáveis, com base em critérios de qualidade das provas de conceito (white papers), perfil dos fundadores, dinamismo empresarial e distribuição de código livre. Muitos pretendem concorrer com os players estabelecidos num determinado sector de actividade, ou com um modelo inovador de acesso a bens e serviços, redução de custos ou partilha de rendimentos entre utilizadores.

Ethereum: Fundação na Suiça, criou o conceito de computador mundial descentralizado. É uma rede blockchain permissionless totalmente programável. Desenvolvem linguagens de programação de alto nível para contratos inteligentes. Teoricamente todas as aplicações imagináveis e poderão ter sinergias

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ao trabalharem numa blockchain. Actualmente a capacidade de computação é muito limitada, mas a velocidade de processamento de transacções é de menos de 15 segundos.

Eris Industries: Sede na Inglaterra. Dedicam-se à produção de livrarias de contratos inteligentes para o ramo empresarial e finanças. Recentemente acordaram uma parceria com uma consultora «Big4». Destacam-se pela utilização da Marmota como mascote/logotipo como alegoria a possibilidade de se criarem milhões de cadeias de blocos.

Factom: Sede nos EUA. Pretendem criar um grande notário para registos imobiliários, tendo desenvolvido acordos com Estados norte-americanos e países centro-americanos, bem como parcerias com investidores asiáticos

Storj: A Storj é um sistema de armazenagem na cloud, descentralizado, compartilhando o espaço disponível de cada utilizador, similar ao Bittorrent, mas com um token que permite desenvolver um modelo de recompensa.

La'Zooz: É uma prova de conceito para a blockchain e actualmente está disponível uma aplicação android para registo de utilizadores. Visa descentralizar o modelo da Uber, no domínio da mobilidade. Os tokens são gerados automaticamente na rede, em função das viagens partilhadas, mediante leitura de GPS.

Synereo: Pretendem descentralizar as redes sociais, partilhando receitas em função do grau de participação dos utilizadores

Orisi/Oraclize.it: Oferecem soluções para implementação de oráculos inteligentes nas cadeias de blocos

Bitshares: É uma rede blockchain programável dedicada a contratos inteligentes para manipulação de activos digitais

Ripple: O objectivo da Ripple, sediada em São Francisco, Califórnia, é criar uma rede paralela à Swift, a cooperativa que gere as mensagens interbancárias a nível mundial, que deverá funcionar como player mundial no domínio dos pagamentos internacionais no segmento bancário e corporate.

Stellar: A Stellar foi criada pelo mesmo fundador da Ripple, que entrou em dissidência com esta. Dedicam-se ao mercado das microfinanças, como o mesmo objectivo de criar uma Swift para as MFIs( Microfinance Institutions). Conseguiram implementar uma rede na Nigéria, segundo o site e notícias.

Twister: Projecto de microblogging, já com vários anos de actividade. Utiliza uma base de dados partilhada com propriedades da blockchain para emular o Twitter.

Open Bazaar: O Open Bazaar é o player mais activo e com melhor qualidade demonstrada, em provas de conceito, na comunidade que utiliza bitcoins na área de mercados online descentralizados. O seu objectivo é suplantar as falhas do polémico mercado Silk Road. Não arquiva nem executa contratos inteligentes na blockchain do bitcoin.

GetGems: É um serviço de mensagens ao estilo do MSN messenger, que oferece recompensas em bitcoin por cada visualização de banners de publicidade na sua aplicação. Não temos conhecimento se as mensagens são encriptadas numa base de dados comum ou blockchain. Oferece uma carteira

NameCoin: É um protótipo funcional desenvolvido em código livre. Pretende descentralizar a forma como são registados os sites na internet. Foi o primeiro fork do bitcoin, ou seja, a primeira aplicação desenvolvida a partir do código do bitcoin.

Filament: É uma empresa que, operando há algum tempo na área da IoT, está a desenvolver uma solução descentralizada para a Internet das Coisas.

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Slock.it. A Slock.it é uma empresa co-fundada por um dos fundadores da Ethereum. Demonstrou publicamente o primeiro protótipo funcional (smart lock) na conferência Ethereum DevCon1. A Slock.it fez uma parceria com a RWE, importante empresa de energia alemã, para desenvolver uma solução de carregamento de baterias elétricas dos automóveis.O expectro de aplicações Slock.it é muito vasto e com alto potencial

Ribbit.me: É a primeira empresa que está a desenvolver uma solução profissional completa para a emissão de vouchers através da blockchain.

Hawk /Enigma: São projectos desenvolvidos a nível académico com vista a implementar contratos com parâmetros de privacidade e acesso dentro de cadeias de blocos públicas.

Solarcoin: Foi um dos primeiros projectos a associar a tecnologia blockchain com a produção de energias renováveis.

TransActive Grid: Pretendem criar uma rede de distribuição eléctrica verifica e monitorizada por contratos inteligentes. Este projecto é desenvolvido na plataforma Ethereum, através de uma joint venture com a Consensys. A Consensys é uma empresa fundada por um dos co-fundadores do projecto Ethereum

Augur: É o projecto que, na plataforma Ethereum, visa criar um mercado descentralizado para previsões (prediction market) de todos os tipos: económicas, políticas, etc.

D-cent: Projecto da Fundação NESTA no Reino Unido que mereceu financiamento de fundos europeus. Desenvolveu aplicações descentralizadas respeitando a privacidade dos cidadãos e promovendo a sua participação e empoderamento.

Sidechains: É uma tecnologia que pretende estender as funcionalidades do protocolo bitcoin de forma a permitir uma maior interoperabilidade entre esta rede e outras redes. É um projecto desenvolvido pela Blockstream. A Ripple também apresentou uma prova de conceito (Interleger) para responder ao mesmo problema.

Uport: É um cartão de identidade, descentralizado, baseado na tecnologia blockchain, implementado pela Consensys. Estabeleceu recentemente uma parceria com a Canonical / Ubuntu para criarem em conjunto uma solução de identidade para o Ubuntu Phone e tablets.

VEX Venture Equity Exchange: Este projecto pretende disponibilizar, na blockchain da Ethereum, um pacote completo de soluções de gestão e finanças para empreendedores, para capitais de risco e business angels, de forma a automatizar todas as operações relacionadas com investimentos em empresas startups.

Provenance: É um negócio social, em fase de prova de conceito, que tem como objectivo criar um passaporte digital com os dados relevantes dos produtos que passam pela cadeia de produção até chegar ao consumidor final. Poderá ter bastante impacto na economia circular.

Cargochain: Consiste num protótipo base para a guia de transporte, vocacionado para a área do Trade Finance / comércio internacional. Este projecto foi vencedor de um hackaton da Deloitte

 

4. Perspectivas futuras

Dentro das tendências que identificamos no nosso acompanhamento das startups fintech, gerou-se uma agregação de conhecimentos, informações, desinformações e contra informações. Destacamos as que nos parecem ser mais credíveis e aquelas em que poderá haver desenvolvimentos com impacto:

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A tecnologia da blockchain, nasceu de um conjunto de evoluções cripto-económicas e parece ser um meio viável de desintermediação e democratização e afecta a maior parte dos sectores de activide e toca também as questões de governança da sociedade.

A blockchain atraiu assim um grande número de talentos de programação, empreendedores, capital de risco e chegou à comunicação social mainstream. A blockchain não pareceu atrair a comunidade do terceiro sector, organizações cooperativas e associativas, para projecto de interesse comum .

Existe sim, uma comunidade dinâmica de incubadoreas, eventos, empreendedores e programadores. Estas comunidades não parecem se preocupar muito com o interesse das grandes empresas da cloud e dos bancos nos seus vários projectos, porém algumas delas demonstram preocupaçoes éticas e solucionar problemas sociais e ambientais.

As grandes empresas, da cloud e da banca, demonstram interesse na tecnologia: os bancos começaram a desenvolver consórcios para estudar aplicações, porque tem um interesse em aumentar o nível de segurança e confiança entre parceiros, prestando melhores serviços aos seus clientes e libertando funcionários através de maior automatização, com menores custos e maiores margens.

Existe uma clara possibilidade de absorção das potenciais mais valias, pelo sector financeiro tradicional, de uma tecnologia que tem as características de um bem público, ou pelo menos uma atitude pro-activa no sentido de assegurar a manutenção das margens e quotas de mercados, impedindo a entrada de novos competidores da área fintech, a desintermediação pura o

As grandes empresas de informática e da internet não demonstraram publicamente um interesse tão elevado em testar e prototipar, estarão eventualmente mais preocupadas no sentido de manterem as suas quotas de serviços no sector financeiro e corporate, pelo que se limitam a publicar literatura na internet, cada vez menor inovadora.

A nível técnico, a principal crítica relaciona-se com a computação na blockchain. Os contratos inteligentes na blockchain da ethereum são executados em todos os computadores, obedecem também a uma linguagem turing completa: é impossivel saber se um programa, composto por um conjunto de instruções, ficará eternamente em execução (por exemplo causado por um bug). A Ethereum criou um token associado à execução de cada linha de código que previne esta execução infinita, assim sendo a rede permissionless poderá originar problemas relacionados com contratos incompletos.

Bibliografia: Em organização / desenvolvimento. Aceder em: https://drive.google.com/folderview?id=0B4M5pihu3FN3M3BNN2RoUkk0Uzg&usp=gmail&tid=0B4M5pihu3FN3TmEtN29aS29wZzA