artigo coloquio de moda

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O QUE ELES QUEREM: Estudo sobre o processo de decisão de compra de vestuário do público masculino Bruna Rosa Machado Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM-Sul Pós-Graduação em Ciências do Consumo Aplicadas Resumo O presente artigo investiga acerca do processo de decisão de compra de vestuário de homens jovens adultos. Contextualiza-se o papel do homem na sociedade contemporânea e a sua relação com a moda. Investiga-se ainda as etapas do processo de decisão de compra e então entrevistas em profundidade são usadas para desenvolver hipóteses acerca de novos comportamentos de consumo masculino. Palavras-chave: Moda masculina. Consumo. Processo de decisão de compra Abstract The following article investigates consumer decison process made by male young adults when purchasing clothes. It was contextualized the role of men in contemporary society and their relation with fashion. The steps in the consumer decison process were investigated and in depth interviews were made to develop hispoteses about new consumer behaviour of men. Keywords: Menswear. Consumption. Consumer decison process. Pós-Graduanda do curso de Ciências do Consumo Aplicadas da ESPM-Sul e Sócia- Proprietária da em presa SAMO. Orientadora: Prof. Ma. Janie Kiszewski Pacheco. E-mail: [email protected]

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Page 1: Artigo Coloquio de Moda

O QUE ELES QUEREM: Estudo sobre o processo de decisão de compra de

vestuário do público masculino

Bruna Rosa Machado

Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM-Sul

Pós-Graduação em Ciências do Consumo Aplicadas

Resumo

O presente artigo investiga acerca do processo de decisão de compra de vestuário de homens jovens adultos. Contextualiza-se o papel do homem na sociedade contemporânea e a sua relação com a moda. Investiga-se ainda as etapas do processo de decisão de compra e então entrevistas em profundidade são usadas para desenvolver hipóteses acerca de novos comportamentos de consumo masculino.

Palavras-chave: Moda masculina. Consumo. Processo de decisão de compra

Abstract

The following article investigates consumer decison process made by male young adults when purchasing clothes. It was contextualized the role of men in contemporary society and their relation with fashion. The steps in the consumer decison process were investigated and in depth interviews were made to develop hispoteses about new consumer behaviour of men.

Keywords: Menswear. Consumption. Consumer decison process.

1. Introdução

Pós-Graduanda do curso de Ciências do Consumo Aplicadas da ESPM-Sul e Sócia-Proprietária da em presa SAMO. Orientadora: Prof. Ma. Janie Kiszewski Pacheco.

E-mail: [email protected]

Page 2: Artigo Coloquio de Moda

Conforme Paulo Stephan (2014) o crescimento mercado global de moda masculina

corresponde a um ritmo médio de 14%, quase o dobro do crescimento do mercado

feminino. Esta estatística revela uma oportunidade de mercado que muitas empresas já

observaram e estão destinando alguns investimentos para esse segmento. Um dos principais

segmentos é o de higiene e beleza, em 2006 o Jornal do Comércio em reportagem já

destacava as empresas que haviam começado incluir produtos para o público masculino no

seu portfólio, como por exemplo a Philips, que lançava o Bodygroom, um aparelho para

raspar e aparar os pelos masculinos. Outras marcas também lançavam linhas exclusivas para

eles, como a OX Cosméticos, que incluiu 18 novos produtos na linha OX Men e a BIC, que

lançou nova linha com preparo para barbear e pós- barba para complementar o mix de

produtos que já contemplava as lâminas de barbear no mercado.

Em termos de varejo de moda, o jornal New York Times em 2012 destacou o

crescente número de novas lojas exclusivamente masculinas de grandes marcas como

Hermes, Bottega Veneta, Lanvin e Ralph Lauren, bem como maior espaço para este

segmento durante a semana de moda de Nova York. No Brasil, de acordo com reportagem

da revista Veja (2014) a marca Colcci teve 40% de seu faturamento em 2013 no segmento

masculino, um aumento de 21% em relação a 2011 e a marca masculina João Pimenta

dobrou o seu faturamento de 2012 para 2013. O artigo ainda cita o aumento considerável do

número de marcas nacionais masculinas que desfilaram na 37ª edição do São Paulo Fashion

Week. Entretanto não basta apenas aumentar a oferta de produtos para realmente

aproveitar a oportunidade do crescente mercado masculino, se torna imprescindível

entender o que esse consumidor busca. O homem atual não é o mesmo de dez anos atrás,

portanto não se justifica tratá-lo da mesma forma. É deste interesse que nasce este trabalho,

com o intuito de entender melhor o processo de decisão de compra de vestuário do homem.

A relevância do artigo se dá pela a grande importância que reside em entender o

comportamento do consumidor para as empresas, esse tipo de investigação possibilita o

desenvolvimento de estratégias mais eficientes para atingir os consumidores, sendo

indicado como foco primário dentro do planejamento de marketing de empresas de sucesso

(BLACKWELL; MINIARD; ENGEL,2005).

O objetivo geral deste trabalho se estabelece em entender o processo de decisão de

compra de vestuário de homens jovens adultos. Os objetivos específicos foram delimitados

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Page 3: Artigo Coloquio de Moda

como investigar sobre as mudanças ocorridas no papel social do homem e sobre a sua

relação com a moda, sendo também importante identificar todas as etapas do processo de

decisão de compra.

Observa-se ainda que existam poucos estudos a respeito do processo de decisão de

compra masculino. Toma-se como exemplo o banco de dados da biblioteca da ESPM Sul,

consultado durante o 1º semestre de 2014, existem mais de 100 títulos sobre

comportamento de consumo, sobre consumo feminino aproximadamente cinco, sobre

consumo de baixa renda no mínimo dois, entretanto não foi encontrada nenhuma

bibliografia direcionada especificamente para o consumo masculino. Não se toma este fato

como prova única dos poucos estudos nessa área, porém é considera-se como um indicativo.

A partir de pesquisas mais aprofundadas constatou-se que os estudos sobre consumo de

vestuário masculino além de poucos são bem recentes, observa-se um crescente nos últimos

anos com pesquisas encomendadas por empresas e que são utilizadas nesse trabalho, como

a pesquisa ELES realizada pela Vox para o grupo Abril (2014).

Destaca-se a crescente demanda por produtos que atendam as necessidades desse

novo homem e que, de certa forma, o mercado já está apresentando alguns movimentos de

resposta a este consumidor quando lança produtos exclusivamente masculinos e também

quando aumenta o mix de produtos já existentes. Todavia, como dito anteriormente, é

necessário maior investigação acerca dos novos anseios deste consumidor para que o

mercado possa entregar produtos e serviços mais alinhados a esses homens. Esta

abordagem tem como objetivo contextualizar de forma sucinta as mudanças ocorridas na

compreensão do papel do homem contemporâneo em nossa sociedade para então

averiguar qual o impacto disso nos seus novos hábitos de compra.

2. Referencial Teórico

Debates acerca das mudanças na compreensão da identidade masculina no ultimo

século vêm gradativamente ganhando espaço em estudos e pesquisas. Observa-se

transformações no entendimento do papel social do homem, do conceito de masculinidade

e das suas relações interpessoais, entretanto a questão pouco abordada é como essas

mudanças afetam o comportamento de consumo deste “Novo Homem”?

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Page 4: Artigo Coloquio de Moda

Pierre Bourdieu (1999) destaca que a maneira como a sociedade estava organizada

durante a Idade Moderna, quando se tinha claros papéis sociais, já não corresponde ao

momento atual. Declarações como “Seja homem!” deixaram de fazer tanto sentido, porque

se pergunta o que de fato é ser Homem? A pesquisa ELES realizada pela Vox e editora Abril

(2014) frisa que “Sem um modelo de referências para ser seguido, - ser homem - é algo que

está sendo reinventado e ressignificado”.

O estudo deste Homem neste trabalho aborda o seu novo papel social e as

motivações para tanto, como contexto histórico, a fronteira dos gêneros e da sexualidade, o

envolvimento e interesse do homem com a moda. Esta abordagem tem como objetivo

contextualizar de forma sucinta as mudanças ocorridas na compreensão do papel do homem

contemporâneo em nossa sociedade para então averiguar qual o impacto disso nos seus

novos hábitos de compra.

2.1 O Papel Social do Homem

A Idade Moderna se caracterizou pela definição clara dos papéis sociais. É

estabelecido, nesse período, a organização das relações sociais baseadas em hierarquias, e

no caso, a mulher submetida à autoridade do homem. Dentro das divisões de gênero,

Bourdieu (1999) explica que o que dizia respeito às atribuições masculinas estava

automaticamente excluído das atribuições femininas, evidenciando um pensamento

excludente e dicotômico.

A divisão entre os gêneros englobava o comportamento e as divisões de tarefas

desempenhadas. A mulher caberia ser obediente submetida ao papel de propriedade. Sua

responsabilidade era a família e a casa, garantindo que todos estivessem bem cuidados. Sua

postura também deveria ser adequada, o olhar cabisbaixo demonstra sua obediência e

necessidade de proteção. Por outro lado, o homem era o provedor da casa e deveria agir

como tal, sua postura viril e agressiva demonstra a coragem frente aos desafios.

Manifestações de afeto e cuidados pessoais são exclusividades femininas. A tarefa de

produzir riqueza e deter conhecimento também cabia as homens, bem como proteger a

família e sua honra.

A concentração de pessoas nas cidades, resultado do processo de industrialização,

propiciou a maior troca de ideias, angústias e experiências. Foi dessa forma que novos

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Page 5: Artigo Coloquio de Moda

grupos se articularam para a defesa de seus interesses. Surgiram movimentos que

contestavam o status quo da sociedade. Dentre eles se destaca o movimento feminista

como afirma o escritor João Trevisan.

Historicamente, as feministas foram as primeiras a fazer deslanchar, de modo organizado, um processo de profunda revisão cultural já em meados do século XIX. Ao mesmo tempo que reivindicavam seus direitos civis, as então chamas “sufragetes” enfrentaram o establishment falocêntrico e provocaram modificações substanciais no conceito de masculinidade.(TREVISAN, 1997, p.59)

A inserção da mulher no mercado de trabalho, o direito ao voto, a popularização de

métodos anticoncepcionais, a lei do divórcio, todos estes itens foram direitos e

reinvindicações feitos pelas mulheres, elas exigiram mudanças. Modelos de divisão de

gêneros antes rígidos passam a se fragmentar gerando novas possibilidades para homens e

mulheres. Stephan (2014) observa que as mudanças masculinas se mostram como reflexo

das femininas, sendo assim os homens mudaram mais lentamente e ainda, com maior

resistência. Algumas das consequências destas mudanças foi a maior responsabilidade nas

tarefas da casa, na criação dos filhos, a menor cobrança do sucesso profissional, a

valorização da sua afetividade e vaidade.

Outro ponto a ser observado neste quadro de mudanças é a ruptura do conceito de

masculinidade. Nolasco (1997), em seu artigo - Um “homem de verdade” - discorre sobre o

legado que está impresso nesta definição. O “homem de verdade” é um padrão de

masculinidade semelhante ao homem moderno, que se aproxima da imagem de

conquistador, viril, que busca ter sucesso, poder e prestígio social e se afasta dos temas mais

afetivos e introspectivos, o autor chama atenção ainda para a forma como os meninos

aprendem a construir os seus vínculos afetivos. “Um menino aprende, em seu processo de

socialização, que deve silenciar seus sentimentos e frustrações, bem como evitar situações

de vergonha e medo.” A criação desta identidade resulta em um ideal de masculinidade

problemático já que não corresponde as novas demandas apresentadas para o homem,

como maior participação e presença familiar.

Além das mudanças ocasionadas no comportamento masculino pelas conquistas

feministas, como citado anteriormente, essas que contribuem para o questionamento do

conceito de masculinidade, deve-se ainda considerar a visibilidade do homossexualismo

como parte importante desse processo. Trevisan discorre sobre o tema.

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Page 6: Artigo Coloquio de Moda

A revelação homossexual cumpre uma importante tarefa no cenário da crise: acirra as contradições no sentido de tirar a máscara do masculino imposto, apontando para um masculino temperado por nuances nas quais cabem o frágil e o sensível, aí incluída aquela tão execrada passividade que também compõe o macho – simplesmente porque faz parte do humano e não apenas do gênero feminino. O que pode parecer um paradoxo, do ponto de vista patriarcal, é uma aquisição importante, sem a qual não se chegará ao coração do masculino – justamente porque ele é feito de paradoxos, ao contrário do que deixa parecer o protótipo de macho consagrado (TREVISAN, 1997, p.87)

A organização da sociedade patriarcal também relegou os homossexuais a

marginalidade. Somente na década de 1970, o espirito libertário da contra cultura permitiu

que este movimento tivesse maior força no Brasil encabeçado pelo grupo SOMOS, o

primeiro a lutar pela liberação homossexual no país. Desde então o questionamento da

sociedade patriarcal feito pela comunidade gay tem se difundido cada vez mais, pelas artes,

literatura, cinema, teatro e na televisão. (TREVISAN, 1997).

O que se percebe é que o contexto homossexual é capaz de mesclar os componentes

dos dois gêneros, tornando menos rígida a noção de masculinidade. A influência

homossexual também se manifesta na estética, considerando o maior cuidado com a

aparência, com o corpo e a maior ousadia na escolha do vestuário.

O que era verdade a respeito da organização das pessoas em centros urbanos

durante o período de industrialização continua sendo verdade hoje. A maior concentração

de pessoas resulta na maior articulação de diferentes grupos e quanto mais em contato com

o diferente, mais aceitável esse se torna. Sendo assim, é principalmente neste cenário que

códigos estéticos primeiramente adotados por gays se transformam e popularizam sendo

adotados por heterossexuais também. Como exemplo cita-se o uso de brincos, de cores mais

vibrantes e de modelagens mais ajustadas que foram primeiramente escolhas estéticas gays

e hoje já fazem parte do vestuário masculino em geral.

Em resumo, as mudanças ocorridas no papel social do homem tem origem na

revolução feminista e o questionamento do conceito de masculinidade é reforçado pela

maior visibilidade do grupo homossexual. Como resultado dessas mudanças não existe uma

definição específica sobre como é o Novo Homem, o que se conclui é que a fragmentação de

modelos hierárquicos possibilita maior liberdade para que eles decidam com o que mais de

identificam e como querem ser vistos pelos outros.

2.2 A Moda e o Homem

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Page 7: Artigo Coloquio de Moda

As roupas do homem no inicio do século passado até hoje pouco se transformaram, são repetições de materiais, volumes, comprimentos e as peças são sempre camisas e camisetas, calças, jaquetas e paletós. O homem contemporâneo parece esperar inovação da imagem de moda, mas não no design de moda.” (QUEIROZ, 1997, p. 36)

Mário Queiroz relata o ainda conservadorismo em relação ao consumo masculino de

moda. As variações já existentes no vestuário masculino se mantêm constantes, o guarda

roupa é composto de maneira geral pelos mesmos elementos bem como as cores que, na

sua grande maioria, permanecem sóbrias. Entretanto, existiram momentos nos quais o

homem deu maior importância para a sua representação estética, um dos maiores exemplos

dessa atitude é a ascensão da figura do dândi.

No inicio do século XIX, na Inglaterra, o dandismo surge como o esforço de distinção

da aristocracia em relação à burguesia, tendo George Brummel como seu grande

representante. O dandismo inglês não apresentava suntuosidade na maneira de vestir, mas

sim elegância. Roupas mais ajustadas, com caimento impecável e bons tecidos estavam no

cerne do dandismo. De acordo com James Laver (1989, p.158) “George Brummel se

orgulhava de suas roupas não terem uma única ruga e de seus calções se ajustarem às

pernas como a própria pele” todo esse cuidado demandava tempo e dedicação ao ato de

vestir. Posteriormente o estilo dândi inglês é transformado pelos franceses através de

Charles Baudelaire e Oscar Wilde que trouxeram maior excentricidade a figura do dândi

através de camisas de seda, gravatas extravagantes e sapatos rigorosamente engraxados. O

que é extremamente relevante quanto a estes três ícones de estilo Brummel, Baudelaire e

Oscar Wilde, é a dedicação ao vestir, a relevância que a moda masculina tem neste período

e, como constatado, a vaidade também.

Por outro lado, se o dandismo surge para diferenciar a aristocracia da sociedade

burguesa, o que a história confirma é que a burguesia prevalece. De encontro com o

dandismo, Hopkins (2013) relata que a Revolução Francesa teve um efeito que perpetua até

hoje na moda masculina, o afastamento da ostentação, do uso de cores extravagantes. É

nesse momento que a paleta de pretos, marrons e azuis se torna predominante no guarda

roupa masculino, justamente pela busca de austeridade na maneira de vestir. A Revolução

Industrial encoraja os homens a se preocupar com questões mais “relevantes” do que o

vestuário e é neste momento que a combinação de paletó, colete e calças se popularizou e o

terno se tornou o uniforme masculino.

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Page 8: Artigo Coloquio de Moda

Como dito por Laver (1989) é cerca de 1950 que a revolução jovem inicia, até então

as roupas para adolescentes eram as mesmas de seus pais, mas os jovens queriam a sua

própria moda, a resposta foi a popularização do sportswear, o vestuário que era comumente

utilizado na prática de esportes, mas que se tornou a representação de um estilo mais casual

para homens e mulheres. Hopkins (2013) argumenta que a roupa esportiva justamente

atraiu os jovens por romper com o estilo restritivo que até então era vigente na moda. Hoje

em dia o sportswear se tornou o streetwear, a sua ampla aceitação o fez um estilo de grande

representação no mercado de moda masculina, com marcas como Nike, Adidas, Onitsuka.

Mesmo com relativo conservadorismo quanto às inovações dentro do guarda roupa

masculino, como já comentado, Stephan (2014) aponta um crescimento no número de

homens que dizem se preocupar em estar na moda. Em 2001 este número correspondia a

27% e em 2013 já somavam mais de 61% além disso, o mercado de moda masculina

representa 30% da produção do setor e está liderando o crescimento na cadeia produtiva

têxtil. O autor ainda afirma.

O critério na escolha das roupas, por exemplo, antes considerado um capricho feminino, começou a integrar as preocupações dos homens. Acompanhar a moda, outro “passatempo feminino” também passou a frequentar a agenda de rapazes de todas as idades. (STEPHAN, 2014, p.52)

O crescimento no interesse e na vaidade do homem contemporâneo pode ser

entendido como um espaço para desenvolvimento de novas proposições para o Design de

moda masculina.

2.3 O Processo de Decisão de Compra

Quando estudado o comportamento do consumidor é necessário o entendimento de

como se dá o processo de decisão de compra do mesmo. Para delimitar e explorar estas

etapas utilizou-se Hawkins, Mothersbaugh e Best (2007), Blackwell, Miniard, e Engel (2005)

como referência. Esses autores determinam que o processo de decisão de compra é

constituído pelas seguintes etapas: Reconhecimento da necessidade, busca de informações,

avaliação de alternativas, compra e pós compra. Hawkins, Mothersbaugh e Best (2007)

estabelece que a etapa de pós-compra compreende o momento de consumo, avaliação pós

consumo e descarte, diferente de Blackwell, Miniard, e Engel (2005) que especificam essas

etapas separadamente. Com o propósito de objetivar o estudo será utilizada a definição de

Hawkins, Mothersbaugh e Best (2007). 8

Page 9: Artigo Coloquio de Moda

Importante destacar que as etapas podem ser mais ou menos complexas de acordo

com o grau de envolvimento da compra, que significa o quão importante ou interessante é a

compra para o consumidor. Podendo haver uma variação de acordo com interesses

pessoais, disponibilidade de tempo, valores, cultura, tipos de produto.

O grau de envolvimento resulta em três diferentes tipos de tomada de decisão que

impacta em outras etapas do processo. A tomada de decisão Nominal, Limitada e Estendida

(BLACKWELL; MINIARD; ENGEL, 2005).

Como tomada de decisão Nominal entende-se aquelas que representam baixo

envolvimento do consumidor, são exemplificadas por compras habituais, compras para uso

diário. Este tipo de consumo pode ter passado por um processo extenso de tomada de

decisão e depois se configurou como um hábito e é constituído apenas pela repetição. A

escolha de uma determinada marca de cuecas ou meias serve como exemplo, em certo

momento o consumidor leva em consideração alguns fatores para escolher o produto, mas

uma vez feita esta escolha, o comportamento é de repetição desta compra de maneira

automatizada. A tomada de decisão Estendida é justamente o contrário da Nominal, envolve

uma extensa busca de informações e representa um envolvimento muito grande do

consumidor. Neste caso o comprometimento financeiro a longo prazo é um indicador deste

tipo de tomada de decisão, como a compra de uma casa ou um carro. É entendida ainda

como tomada de decisão Estendida aquelas que possuem grande representação emocional,

essas, no entanto, muito mais subjetivas, citando como exemplo do vestuário, o traje para o

casamento que tende a ser uma decisão de grande envolvimento emocional. A tomada de

decisão Limitada se encontra no meio das anteriores. Define-se ainda por um envolvimento

moderado do consumidor, busca-se informações externas e internas, mas as decisões são

mais simplificadas frente aos atributos dos produtos. Portanto esta tomada de decisão pode

ser exemplificada por uma decisão situacional: O consumidor precisa de uma camiseta, ele

considera as lojas próximas e efetua a sua escolha (BLACKWELL; MINIARD; ENGEL, 2005).

Como dito anteriormente o envolvimento do consumidor irá afetar as etapas de

decisão de compra, portanto estas podem ser mais complexas ou simplificadas. Examina-se

a seguir o processo de decisão de compra.

2.3.1 Reconhecimento do Problema

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Page 10: Artigo Coloquio de Moda

Conforme Blackwell, Miniard e Engel (2005) o reconhecimento do problema é

descrito como a dissonância entre o estado real e o desejado. Cita-se como exemplo a

participação de um consumidor x em uma reunião importante, na qual ele gostaria de estar

bem vestido, porém não encontra uma peça no armário que faça jus a situação, então o

problema se caracteriza por “não ter uma roupa adequada para a reunião”. Dessa forma, se

observa o estado real como “não ter uma roupa adequada” e o desejado como “estar bem

vestido”.

O problema pode ainda ser caracterizado por algo rotineiro, como a falta de roupas

de baixo, uma mancha na camisa inesperada, etc ou ainda por sentimentos que são

solucionados por um comportamento de consumo ou iniciadores do mesmo. Importante

salientar que nem sempre os problemas são reconhecidos de forma consciente, muitos deles

podem estar no nível inconsciente. Por exemplo, é possível sentir-se ansioso ou inquieto e ir

às compras, no caso o motivador não é a falta de roupas adequadas, mas sim o tédio, um

sentimento que poderia ser sanado por outras atividades.

O reconhecimento do problema é o motivador da ação, sem ele não há necessidade

de decisão. A ação que o consumidor vai ter está diretamente ligada a intensidade do

incômodo ou da insatisfação gerada entre a situação real e a desejada.

2.3.2 Busca de Informações

A segunda etapa da decisão de compra é a busca de informações. Após o problema

ter sido identificado surge o questionamento sobre quais as características que o produto

deve ter, este questionamento, conforme Hawkins, Mothersbaugh e Best (2007), é chamado

de critérios de avaliação e é a razão para a busca interna, aquela que faz uso das nossas

experiências anteriores, das marcas ou produtos que já são conhecidos e familiares ao

consumidor para solução do problema e também para a busca externa que se caracteriza

pela busca de informação através de recomendações de amigos e familiares, em revistas,

grupos de consumidores, websites, comparadores online, vendedores, testes de produto,

etc.

A busca externa sofreu grandes alterações com a popularização da internet.

Informações comparativas e avaliações são facilmente encontradas online e os produtos

também ficaram muito mais fáceis de serem testados, pois seu acesso foi facilitado. Em 2013

10

Page 11: Artigo Coloquio de Moda

Stephan (2014) relata que a internet foi considerada a primeira fonte de informações

buscada pelos homens, com o percentual de 51% em relação a outras mídias, destacando o

papel fundamental da internet dentro da busca de informações.

É importante salientar também que as informações que são retidas na memória que

pautam o comportamento de consumo principalmente na tomada de decisão Nominal e

Limitada foram inicialmente construídas através de um processo de consulta de fontes

externas. Martin (2009) observa que para a entrada de novas marcas na mente do

consumidor é necessário quebrar com a avaliação que o consumidor já fez e leva-lo a uma

nova busca de informações para que ele então esteja aberto a testar novos produtos e

revisar a sua tomada de decisão.

De acordo com Blackwell, Miniard e Engel (2009) a busca por informações pode ser

feita de maneira ativa, quando o consumidor de fato busca as informações e de forma

passiva, quando ele apenas se coloca mais receptivo e atento as informações ao seu redor.

Essa busca de informações resulta na construção do conjunto percebido, que é composto

por três subcategorias, o conjunto evocado é o grupo de marcas que o indivíduo considera

como possível resposta para o seu problema, o conjunto inepto, são as marcas que o

indivíduo teve alguma avaliação negativa a respeito e não considera apto da sua escolha, e

finalmente o conjunto inerte, que são marcas que a existência é reconhecida, porém o

consumidor se mantém indiferente a elas.

2.3.3 Avaliação de Alternativas

A avaliação do conjunto evocado é feita a partir dos critérios de avaliação

estabelecidos pelo consumidor. Conforme Hawkins, Mothersbaugh e Best (2007) é

importante salientar que esse processo de avaliação é regido pela racionalidade limitada do

consumidor, isso quer dizer que existe limitação quanto ao processamento de informações,

o que resulta em uma avaliação não estritamente racional, constatação que vem ao

encontro do fato de 95% do comportamento humano ser controlado pelo inconsciente

(MARTIN 2009). Os critérios de avaliação podem ser extremamente simples e rápidos ou

ainda longos e complexos, proporcionais aos tipos de decisão de compras descritos

anteriormente, Nominal, Limitada e Estendida.

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Page 12: Artigo Coloquio de Moda

Os autores destacam três diferentes tipos de escolhas, a afetiva, de atributos e de

atitudes. Na escolha afetiva o que está em primeiro plano são sentimentos subjetivos. A

escolha de um terno a partir de sentimentos de poder ou elegância é um bom exemplo

dessa categoria, que desconsidera os atributos do produto, como tecido, corte, qualidade,

proveniência, que exatamente se configura na escolha por atributos, na qual o consumidor

define conscientemente os atributos que para ele são determinantes no processo de

decisão. No caso da escolha por atitudes levam-se em consideração breves impressões sobre

o produto, como a indicação de um amigo.

Na escolha por atributos, o consumidor normalmente estabelece regras de decisão.

Solomon (2008) classifica estas regras como Compensatórias ou Não Compensatórias. As

primeiras dizem respeito às regras que permitem que um atributo muito bom compense por

um atributo muito ruim no produto, já as segundas são regras que não permitem um

produto compensar o baixo desempenho em um atributo. Os produtos são escolhidos por

meio de regras como de decisão conjuntiva, lexicográfica e de eliminação dos aspectos.

2.3.4 Compra

De acordo com Hawkins, Mothersbaugh e Best (2007) a decisão de compra pode

seguir as seguintes três sequências “(1) marca (ou item) primeiro, loja depois; (2) loja

primeiro, marca depois; ou (3) marca e loja simultaneamente”. Observa-se que as

estratégias de marketing dos varejistas e das marcas irão corresponder a estas sequências.

Lojas multimarcas comumente apresentam a sequência número dois e por isso dedicam-se

ao bom atendimento e diferenciação no ponto de venda. Lojas de marcas próprias

normalmente apresentam sequência numero um, preocupam-se na construção da imagem e

do ponto de venda como a extensão da marca. Compras por impulso são um bom exemplo

da sequência numero três.

Segundo Blackwell, Miniard e Engel (2009) é nesta etapa que ocorre o processo de

união entre os consumidores e o mercado e a este encontro é denominado varejo. O

momento da compra ainda é palco de muitas decisões dos consumidores, como a avaliação

do tipo de varejista, loja de departamento ou especializada, loja online ou física e posterior a

escolha da loja em sí leva em consideração diversos critérios de avaliação, como a

localização, o atendimento, a atmosfera da loja entre outros citados na figura a seguir.

12

Page 13: Artigo Coloquio de Moda

Tendo em vista a quantidade de fatores que influenciam o consumidor na etapa de

compra e a variedade lojas competindo por clientes, Solomon (2008) ressalta a importância

da imagem da loja, sendo essa algo como a “personalidade” da loja e parte essencial do

posicionamento das marcas. Os critérios de avaliação evidenciados por Blackwell, Miniard e

Engel (2009) são os responsáveis pela formação da imagem da loja e sua avaliação é variável

de acordo com o tipo de compra e nível de exigência do consumidor.

2.3.5 Pós-Compra

Nesta etapa após a compra do produto ou serviço Hawkins, Mothersbaugh e Best

(2007) discorrem sobre a existência da possibilidade de dissonância pós compra, que se

caracteriza por ser um certo desconforto ou dúvida do cliente em relação à compra. A

dissonância é variável de acordo com o tipo de compra e também com a personalidade do

individuo que adquiriu o produto.

A pós compra abrange ainda o uso ou não uso do produto ou serviço. Existindo o uso,

pode-se ainda mapear quando, onde, como, quanto e ainda, uma característica crucial e

bem mais subjetiva nesse momento é o sentimento do consumidor em relação ao uso da sua

compra. Conforme Blackwell, Miniard e Engel (2009) esse sentimento ocorre em diferentes

graus e maneiras. Tratando especificamente da moda, existem muitos sentimentos

13

Figura 1. Processo de Decisão de Compra

(Fonte: BLACKWELL, MINIARD, ENGEL, 2005 p. 137)

Page 14: Artigo Coloquio de Moda

associados a compra de vestuário, o sentimento de poder, conforto, beleza, principalmente

porque a questão da autoestima é muito relevante para o consumo desse tipo de produto.

Após o uso, temos a avaliação do consumidor e como consequência a satisfação ou

insatisfação do consumidor.

Obviamente um determinante critico de satisfação é a percepção dos consumidores sobre a performance do produto durante o consumo. Performances fracas e experiências desfavoráveis de consumo geralmente garantem que o consumidor ficará insatisfeito com o produto, a não ser que haja circunstâncias atenuantes. Em geral, quanto mais favorável for a performance de um produto maior será a satisfação de quem consome. (BLACKWELL, MINIARD E ENGEL, 2009, p. 185)

Entretanto nem sempre a boa performance garante a satisfação, existem outros

fatores que afetam o consumidor, como a expectativa, que dependendo se for positiva ou

negativa pode alterar a percepção do consumidor.

O descarte também faz parte do processo de decisão de compra, no caso do

vestuário, existe uma peculiaridade nesta etapa, se caracteriza pelo descarte através da

doação. Uma roupa que não serve mais, está velha ou ainda que não é mais apreciada pelo

usuário pode ser doada para algum familiar ou pessoa próxima estendendo o ciclo de vida

desta peça.

3. Metodologia

O presente artigo possui vertente qualitativa de acordo com a extensão e objetivo da

pesquisa. Conforme define Malhotra (2006, p.154) “A pesquisa qualitativa proporciona

melhor visão e compreensão do contexto do problema.” exatamente o que se busca

nessa investigação, entender o processo de decisão de compra de vestuário de forma a

captar as motivações e percepções do público masculino. McDaniel e Gates (2003,

p.120) adicionam ainda a essa definição “Pesquisa qualitativa é termo usado com certa

liberdade. Ele significa que os resultados da pesquisa não estão sujeitos à uma análise de

quantificação ou quantitativa”, o fato da pesquisa se definir como qualitativa e de

caráter exploratório resulta em conclusões não generalizadas, porém que levantam

hipóteses acerca do tema e possibilitam a continuidade do estudo através de métodos

conclusivos.

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Page 15: Artigo Coloquio de Moda

Delimita-se o público investigado como homens jovens adultos, de 25 a 35 anos

classe A e B em virtude do ciclo de vida, tendo em vista que nesta faixa etária e classe social

as preocupações são mais individuais. São homens que ainda não constituíram família ou

estão começando, diminuindo assim os compromissos financeiros com membros da família

dependentes e possibilitando o gasto maior com itens de uso pessoal, como o vestuário.

Estabelece-se também o foco de estudo em homens que atuem na área criativa, ou seja,

fotógrafos, designers, publicitários, etc. Homens mais criativos e inovadores tendem a dar

mais atenção a sua aparência e justamente por isso a relação que eles estabelecem com a

moda já se torna mais interessante para este artigo.

Após ter sido definida a unidade de estudo foi desenvolvido o roteiro para a realização

de entrevistas em profundidade, essas definidas por Malhotra (2006) como um método de

obtenção de dados não estruturado através de entrevista realizada individualmente com um

respondente. O roteiro das entrevistas foi elaborado visando verificar alguns dados

levantados na etapa anterior, como crescente vaidade e maior interesse no consumo de

vestuário pelos homens, juntamente com as etapas do processo de decisão de compra. O

recrutamento dos entrevistos foi feito por meio de indicação e também pela base de

contatos da autora do trabalho.

As entrevistas foram transcritas na integra, verificadas as respostas obtidas e organizadas

por blocos de quadros comparativos. As análises deste estudo exploratório são feitas a partir

das respostas obtidas e também pelas observações pessoais feitas pela autora do trabalho

durante as entrevistas em profundidade.

Foi objetivado abranger todas as etapas, porém entende-se que existem inúmeras

variáveis que poderiam ter sido investigadas, além das já contidas no trabalho, entretanto

pelo tempo de estudo e abrangência do trabalho solicitada pela instituição de ensino foi

necessário focar a abordagem analisando as percepções de um grupo de homens propensos

a serem mais inovadores e possíveis indicativos de comportamentos de consumo

emergentes.

4. Análise

As análises foram feitas pelos blocos de perguntas, que seguem o processo de

decisão de compra descrito anteriormente, selecionando e resumindo as principais

15

Page 16: Artigo Coloquio de Moda

respostas, porém o que está descrito nos quadros não representa as descrições exatas das

palavras dos entrevistados, foram utilizadas nomes fictícios em relação aos entrevistados,

podendo as entrevistas na íntegra serem consultadas em anexo ao artigo.

QUADRO COMPARATIVO 1: Amostra e Contextualização

NOME CLASSESOCIAL

IDADE CONTEXTUALIZAÇÃOMARCAS

CONTEXTUALIZAÇÃOCOMPRADOR

Mr.Blue

B1 31 anos

Calvin Klein, Spirito Santo, Ralph Lauren

Ele com namorada

Mr. Blonde

B2 26 anos

Vans, Independent, Volcom Ele com namorada

Mr. White

A2 31 anos

Ted Baker, Burberry,Louis Vuitton

Ele sozinho

Mr. Orange

B1 31 anos

Tom Brownie, Richards, Hermanos Estebecorena

Ele sozinho

Mr. Brown

A2 33 anos

Ellus, Zara, Levi’s Ele com namorada

Fonte: Elaborado pela autora

No primeiro quadro comparativo observa-se a quantidade de marcas citadas quando

questionada a identificação do entrevistado com marcas de moda, evidenciado a diversidade

de estilos, pois todas elas variam entre sí. Quando questionados sobre quem comprava a

maior parte de suas roupas todos os entrevistados afirmaram que eles mesmos eram

responsáveis por essa escolha, mesmo aqueles que vão com a namorada afirmam aceitar a

opinião delas, porém não serem determinantes para efetivação da compra como

exemplificado pelo comentário de Mr. Blonde “Com ela, quando a gente vai, normalmente a

gente vai junto. Ela sempre me dá umas dicas, tem vezes que eu não escuto”.

QUADRO COMPARATIVO 2: Reconhecimento do problema

NOMERECONHECIMENTO

DO PROBLEMAFREQUÊNCIA

RECONHECIMENTO DO PROBLEMANECESSIDADE

Mr.Blue 1x por mês

TrabalhoCompras planejadas

Oportunidade de roupas com descontoMr.

Blonde1x por mês Identificação

Oportunidade de roupas com descontoMr.

White4x por ano Compras planejadas

Mr. Mais de 1x por mês Trabalha em loja e sempre é impactado

16

Page 17: Artigo Coloquio de Moda

OrangeMr.

Brown4x por ano Mudança de estação evidencia necessidades

Fonte: Elaborado pela autora.

A frequência de compra relacionada com as motivações para compra evidencia a

maior abertura dos entrevistados a compras de ocasião, como no caso da tomada de decisão

limitada conforme definida por Blackwell; Miniard; Engel (2005) como a compra que tem

envolvimento moderado do consumidor e de caráter situacional, passar em alguma loja por

acaso e gostar de um produto ou ainda uma promoção que chama a atenção.

O reconhecimento do problema no vestuário, novamente explicado por Blackwell;

Miniard; Engel (2005), como a dissonância entre o estado real e o desejado mostrou-se na

sua maioria ser o estado das roupas, no caso estarem velhas. Este foi ponto comum entre os

entrevistados, porém o que foi destacado no quadro foram justamente as respostas que vão

além do senso comum. A constatação do fato de as roupas estarem gastas, ou da falta de

algum item pode ser resultado da troca de estação e também da necessidade de estar bem

alinhado no trabalho. Mr. White e Mr. Blue demonstram prestar mais atenção na

composição de seus guarda-roupas fazendo compras planejadas, não no sentido de sair

objetivamente para adquirir uma roupa específica, mas de identificar o item que precisam,

manter isso em mente e se colocar em uma postura mais atenta para encontrá-lo,

evidenciando uma busca de informações passiva, descrita por Blackwell; Miniard; Engel

(2005) como uma forma do consumidor se colocar mais receptivo para as informações ao

seu redor. A apresentação no trabalho foi citada por Mr. Blue como um motivador

importante para o consumo de vestuário e também para a escolha do seu conjunto evocado,

aquele conjunto que o consumidor entende como possível solução do seu problema, como

será mostrado a seguir.

QUADRO COMPARATIVO 3: Busca de informações

NOME

BUSCA DE INFORMAÇÕESCRITERIOS DE AVALIAÇÃO

BUSCA DE INFORMAÇÕESEXTERNA

BUSCA DE INFORMAÇÕES

INSPIRAÇÃO

Mr.Blue

Marca (reconhecida)Caimento

Preço

Não procuraLoja Pandórga

Blog Canal MasculinoGuia VIP de estilo

Mr. Blonde

EstiloCaimento

Indicação de amigosRedes sociais

Pessoas de referência

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Page 18: Artigo Coloquio de Moda

Mr.White

CorteAcabamento

Estilo

ViajandoRevistas

Pessoas de referênciaRevistasInternet

Mr. Orange

Marca (propósito)Estilo

QualidadeConforto

Indicação de fornecedores/clientes

RevistasWGSN (birô de tendências)

RevistasTV

Facebook

Mr. Brown

EstiloConfortávelCaimento

Indicação de amigosLoja Pandórga

TVRevistas

Fonte: Elaborado pela autora.

Os critérios de avalição descritos no quadro não estão por ordem de hierarquia. Esses

referem-se ao conjunto de características que o produto deve ter, como definido por

Hawkins, Mothersbaugh e Best (2007). Muito comentado entre os entrevistados foi a

preocupação com o caimento da roupa e por isso todos eles experimentam as roupas antes

de comprar. Interessante observar os dois tipos de valorização de marca que surgiram nas

entrevistas, em um dado momento a marca é vista como identificação de status entre os

seus pares tornando a avaliação de alternativas por atributos, mas por outro lado a marca

também foi citada pelos valores que ela carrega, o seu histórico, como os produtos são

feitos, da onde ela veio, etc. Esta última seria uma avaliação de alternativas mais emotiva

pois se conecta com uma questão ética. Estilo foi um atributo comentado pelos

entrevistados, que para eles estava impresso em sentir-se bonito, demonstrando a crescente

vaidade masculina.

A busca de informações externa, não foi comentada como grande preocupação dos

entrevistados, a indicação de amigos foi citada como forma de conhecer novas marcas e

também a loja Pandórga por ser uma loja coletiva que trabalha primordialmente com novos

designers. Para inspiração pessoal a observação de pessoas de referência não diz respeito a

pessoas famosas ou celebridades, mas sim as pessoas que estão ao redor desses homens

que para eles estão bem vestidas e podem ser vistas nas ruas ou ainda na internet.

QUADRO COMPARATIVO 4: Compra – localização, e-commerce, mix de produtos e preço.

NOME

COMPRALOCALIZAÇÃO(1 nada importante5 muito importante)

COMPRAPRÓS E CONTRAS

E-COMMERCE

COMPRAMIX DE

PRODUTOS

COMPRAPREÇO

(1 muito caro5 muito barato)

Mr.Blue

3, shopping tem mais lojas

Prós: preçoContras: Tamanho

Encontra o que precisa

3, tem comprado em liquidação ou

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Page 19: Artigo Coloquio de Moda

e má qualidade em viagem

Mr. Blonde

2 não se importa com a

localização

Prós: TempoContras: Má

qualidade

Não encontra produtos

específicos

4, pediu para amigo comprar roupas no

exterior

Mr. White

4, tem que ser no caminho e

ter estacionamento

Não compra porque não pode

experimentar

Tem dificuldade em encontrar o

que precisa

3, existem opções mais em conta

Mr. Orange

1, a loja tem que ser

relevante

Prós: preçoContras: Tamanho

Não encontra produtos

específicos

5, governo com alta taxa tributária e sem incentivos

Mr. Brown

4, não gosta de se locomover

Prós: Preço e comodidade

Contras: Tamanho

Encontra o que precisa

4, no Brasil é muito caro

Fonte: Elaborado pela autora.

O bloco compra foi separado em três diferentes quadros comparativos, o primeiro diz

respeito a localização da loja que os entrevistados mais frequentam, prós e contras da

compra online, o mix de produtos apresentados nas lojas e a percepção de preço. O segundo

quadro compreende a propaganda e a organização do ponto de venda e o terceiro o

atendimento, os serviços e atmosfera da loja.

Observa-se que ainda predomina o pensamento de objetividade e comodidade

quando os entrevistados falam a respeito da localização da loja, Mr. Brown justifica a sua

nota com a seguinte frase “Não gosto de me locomover muito para fazer compras. O ideal

seria se tivesse um shopping do lado de casa. Essa função de pegar o carro e ir até o

shopping, sair de uma loja, ir para a outra eu acho meio encheção de saco... homem

normalmente não curte”. Na mesma linha de pensamento durante a entrevista Mr. Blonde

conta de uma situação na qual sua noiva o leva no que ele define como “peregrinação” nas

lojas, contando que ficaram mais de duas horas circulando no shopping e o quanto isso foi

irritante para ele. Destaca-se ainda para o shopping como primeira opção de consumo entre

os entrevistados porque reúne maior numero de lojas em local só.

A compra online já faz parte da maioria das opções de consumo dos entrevistados,

entretanto o maior problema ainda é acertar o tamanho, visto que não existe padronização

das tabelas de medidas na maioria dos países e a questão da qualidade do produto enviado.

O preço ainda é visto como o maior beneficio.

Na entrevista os participantes foram questionados se sentiam-se incomodados em

comprar em lojas que ofereciam também roupas femininas e nenhum entrevistado viu isso

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Page 20: Artigo Coloquio de Moda

como um problema. Mr. Blonde, Mr. White e Mr. Orange relataram a dificuldade em

encontrar certos produtos mais diferenciados nas lojas que frequentam.

Os entrevistados tiveram como percepção de preço entre intermediário e muito caro.

Como todos os entrevistados já haviam viajado para o exterior eles fizeram comparativos

com roupas compradas fora do Brasil que seriam mais baratas, isso demonstra que a

concorrência do vestuário brasileiro não se limita a marcas nacionais ou presentes no país,

os entrevistados relataram esperar por viagens para fazer compras.

QUADRO COMPARATIVO 5: Compra – Propaganda e organização

NOMECOMPRA

PROPAGANDA

COMPRAORGANIZAÇÃO

(variedade de produtos x espaço de circulação)

COMPRAORGANIZAÇÃO

(categoria produto, estilo ou cor)

Mr.Blue

Não se interessa, mas se sente representado

É preciso ter um equilíbrio

Produto

Mr. Blonde

Não se sente representado,

demonstram padrões não reais

Variedade de produtos

Produto e tamanho

Mr. White

Sente-se representado Variedade de produtos

Produto

Mr. Orange

Não se sente representado, são muito

caretasEspaço de circulação Produto

Mr. Brown

Não o afeta Espaço de circulação Estilo

Fonte: Elaborado pela autora.

Quando questionados sobre propagandas masculinas os entrevistados tiverem

dificuldade de lembrar de anúncios que os impactaram, muitas das respostas demonstraram

pouco interesse por essa área. Quando perguntado a respeito da organização da loja Mr.

Blonde trouxe um pouco de vista interessante “Bah acho que se tem muita coisa na loja,

muito abarrotada já me parece meio chinelagem, mas por outro lado quando não tem nada

já me passa uma imagem de muito caro” ele relaciona a quantidade de produto com o

preço. Pela dificuldade de encontrar produtos que os agradem Mr. Blonde e Mr. White

preferem maior variedade de produtos na loja, já Mr. Orange e Mr. Brown optaram por mais

espaço porque se sentem mais confortáveis para escolher o que querem. A organização pela

20

Page 21: Artigo Coloquio de Moda

disposição de categorias de produtos foi escolhida por facilitar na hora da compra,

novamente indicando a objetividade masculina.

QUADRO COMPARATIVO 6: Compra- atendimento, serviços e atmosfera da loja

NOMECOMPRA

ATENDIMENTO(homem ou mulher)

COMPRAATENDIMENTO

BOM/RUIM

COMPRASERVIÇOS

COMPRAATMOSFERA DA

LOJA

Mr.Blue

Prefere atendente

homem, que saiba dar dicas

Vendedor conhece o produto/intimidade

excessivaAjustes Não gosta de clima

de festa

Mr. Blonde

Indiferente Prestativo/invasivo Bar, galeria Gosta de música no provador

Mr. White

Homem, se sente mais à vontade

Vendedor conhece o produto/não está

disponívelConhecimento Clima alto astral

Mr. Orange

Mulher, tem mais sensibilidade Liberdade/invasivo

Café, cabeleireiro, loja de vinil

Clima bacana

Mr. Brown Indiferente

Vendedor conhece o produto/puxa-saco Café, ajustes

Bem organizada, iluminada, com

música legalFonte: Elaborado pela autora.

Os entrevistados se mostraram incomodados quando se fala em atendimento.

Destaca-se a necessidade do vendedor ser bem informado quanto ao produto, para poder

explicar a matéria-prima e ajudar com informações sobre caimento e combinações, em um

caráter mais informativo. Percebe-se que a intimidade excessiva e atitudes invasivas são

extremamente negativas para os entrevistados. Mr Blonde chega a citar que o melhor

atendimento seria por um Ipad, em um modelo self service, portanto se mostra

imprescindível respeitar o espaço do consumidor e quando requisitado o vendedor se

mostrar prestativo.

Os serviços citados em algumas vezes fazem relação com uma atividade social, como

a ida a um bar ou café, mostrando que os entrevistados não inteiramente encaram a

atividade de consumo como mais uma obrigação a ser cumprida e quando adicionada as

respostas sobre a atmosfera da loja percebe-se a busca por um momento mais prazeroso,

menos estressante, para que eles possam tirar o melhor proveito da situação de compra.

21

Page 22: Artigo Coloquio de Moda

QUADRO COMPRATIVO 7: Pós Compra

NOMEPÓS COMPRADISSONÂNCIA DESCARTE

Mr.Blue

Raramente, levava pelo preço e depois não usava.

Doação

Mr. Blonde

Raramente, leva de tamanho diferente porque gostou e não usa

Doação

Mr. White

Pouco, levava pelo preço e depois não usava.

Doação

Mr. Orange

Raramente, comprou por impulso e depois não gostou.

Doação

Mr. Brown

Pouco, tamanho errado Doação

Fonte: Elaborado pela autora.

A dissonância pós compra, definida por Hawkins, Mothersbaugh e Best (2007) como

desconforto ou dúvida da compra do produto, foi relatada pelos os entrevistados como

pequena, ela é principalmente motivada por liquidações e compras por impulso. Na etapa

descarte foi unanimidade a doação das peças que estão fora de uso, os entrevistados

demonstraram ainda preocupação em relação ao destino dessas peças direcionando elas

para pessoas que necessitam de ajuda. Como comentado anteriormente este tipo de

comportamento aumenta o ciclo de vida do vestuário.

5. Considerações finais

Conclui-se que de fato existe um comportamento diferente em relação ao processo de

decisão de compra de vestuário dos homens decorrente das mudanças no papel social do

homem. Essas motivadas pelas mudanças feministas em meados do século XIX e também

pela visibilidade do homossexualismo que possibilitaram ao homem questionar o conceito

de masculinidade e o formato de suas relações familiares, profissionais e de auto-

conhecimento.

Como objetivo geral deste trabalho se dá em entender o processo de decisão de compra

de vestuário destacam-se as seguintes conclusões a respeito das etapas do processo:

Percebe-se que na definição do problema o principal motivador dos homens entrevistados

são as roupas que velhas. A frequência de compra e o questionamento quanto as razões da

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Page 23: Artigo Coloquio de Moda

últimas compras indicam tomadas de decisão Limitada, que são situacionais. A busca por

informações ocorre de maneira passiva, os entrevistados se colocavam mais receptivos para

informações relacionadas a vestuário e demonstram se inspirar para se vestir principalmente

em pessoas ao seu redor que consideram bem vestidas. Os principais critérios de avaliação

que apareceram nas entrevistas foram o caimento das roupas e o estilo, a parte estética da

roupa. Na avaliação de alternativas destacam-se as avaliações emotivas e de atributos.

Na etapa compra percebe-se a objetividade masculina na escolha da loja e na compra da

roupa. A principal vantagem encontrada pelos entrevistados em comprar online ao invés da

loja física foi o preço, mas que na maioria das vezes não compensa a insegurança de não

saber a qualidade e tamanho do produto que chegará nas suas casas. A oferta do mix de

produtos foi percebida como um ponto a ser melhorado por lojas e marcas e a percepção de

preço ficou entre intermediário e caro, destacando a razão pela qual alguns consumidores

optam por fazer compras fora do país.

Para o público masculino entrevistado o atendimento ainda é problemático, por vezes

invasivo ou ainda desinformado. Os homens pesquisados querem estar à vontade dentro das

lojas e isso significa não serem incomodados quando circulando pela loja e por outro lado

atendidos de maneira mais técnica quando solicitados, com mais informação de moda, das

peças e sobre como usar.

O pós compra caracteriza-se por pequena dissonância, os entrevistados se mostraram

assertivos quanto às suas compras e também preocupados com o descarte dos seus

produtos. A doação é a principal forma de descarte e sempre visando pessoas que façam

bom uso das peças, por necessidade ou por gosto pessoal.

Ao longo do levantamento bibliográfico, das observações mercadológicas e das

entrevistas em profundidade percebe-se como o mercado de moda masculina é atraente por

apresentar crescimento em demanda e também a possibilidade de investigações mais

profundas sobre o processo de compra masculino sendo este artigo apenas um breve

apanhado de um vasto campo a ser estudado.

6. BIBLIOGRAFIA

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