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ARQUITETURA DOS ÍNDIOS DA AMAZÔNIA

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ARQUITETURA DOS ÍNDIOS

DA AMAZÔNIA

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São Paulo - 2013

ARQUITETURA DOS ÍNDIOS

DA AMAZÔNIA

Johan van Lengen

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Ilustrações

Johan van LengenPrólogo

Kaká WeráDesenho Gráfico

RebeccaWhanCoordenação Editorial

Jorge Henrique BastosEdição

B4 Editores

2013

Todos os direitos desta edição reservados àB4 Editores (selo da Book Partners)Rua Vítor Ângelo Fortunato, 43906612-800 - São Paulo - SPTelefone: (11) 4772-0100www.bookpartners.com.br

© B4 Editores e Johan van LengenSegundo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990)

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTESINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

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“…aqui, estas águas tranquilas seguem lentamente, encontrando seu próprio nível. Suavemente, irão levantar uma folha, penetrar nos poros do húmus, escorrer para uma minúscula toca de insetos, isolar uma pequena colônia de vida jovem, sepultar um agrupamento de fungos sob a sua su-perfície cintilante ou inundar um formigueiro, em todos os lugares massa-crando e afogando criaturas que não tem pernas ou asas para levá-las a um lugar seguro. E tudo isso acontece no que é apenas uma poça d’água. Lá no curso principal, o rio está com um humor predatório. As margens são atacadas e pedaços são arrancados fora; eles desaparecem nas profundezas, dissolvem e são varridos na forma de uma lama amarelo-acinzentada. Partes inteiras da floresta podem ser levadas, com animais, cabanas e pes-soas ainda sobre elas. Quando essas massas de terra caem no rio, agitam a água que engolfa outros pequenos bancos mais a frente. Árvores pendem e caem, com suas grandes copas afundando como se fossem brinquedos espalha-dos no curso insensato do rio. Raízes gigantes emergem do fluxo amarelado corpos de animais flutuam rio abaixo. Ilhas inteiras são levadas, girando muitas vezes. Algumas se desintegram, outras mantêm-se como ilhas, com sua vegetação ainda crescendo sobre elas, até que o rio as ataque novamente alguns anos mais tarde…”Emil Schulthess

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AGRADECIMENTOS

A partir do momento em que um membro da tribo Cinta-Larga me mostrou em um desenho como eles constroem suas casas, fiquei impressionado com o sentido de arquitetura e construção que es-tas pessoas tinham.Utilizando poucas ferramentas conhecidas, er-guiam grandes casas para abrigar famílias.Durante minha pesquisa sobre essa arquitetura, contei com a enorme ajuda da equipe do Museu do Índio, no Rio de Janeiro, e o Museu Goeldi em Belém. Também aprendi muito com o departa-mento de Antropologia da UNICAMP, em São Paulo. Sem contar com o entusiasmo de sempre viajar com a Força Aérea Brasileira (FAB) para alcançar as regiões extremas da Amazônia.Contudo, todos esses esforços não resultariam em um livro se não fosse pela ajuda generosa da Rebecca Whan, que fez a edição gráfica e o layout das páginas, Peter van Lengen e Verónica Flores van Lengen pelo seu apoio incondicional. Minha gratidão a todas essas pessoas.

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ARquITETuRA DOS ÍNDIOS DA AMAzôNIA

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Xilogravura do livro de Hans Staden, descrevendo os anos em que passou como prisioneiro com os Tu-pinambá. Suas anotações foram as primeiras informações sobre as tri-bos do “recém-descoberto” Brasil.

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RESuMO

PRÓLOGO

INTRODuÇÃO

I A ALDEIA

II A MALOCA

III A ESTRuTuRA

IV OS MATERIAIS

V CONCLUSÕES

i. Glossário de termos

ii. Referências

Í N D I C E

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13

27

41

55

77

105

116

118

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WITOTO

TIRIyÓ

yANOMAMI

uAuPÉS

yAMADI CINTA-LARGAS

kAMAIuRÁ

kAIAPÓ

NAMbIkWARA

kAINGANG

bORORÓ

TuPINAMbÁ

Muitos tipos de aldeias podem ser encontrados entre as tribos, apesar de algumas terem desaparecido ou mudado devido ao contato com colonos invasores..

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Este livro não procura ser uma dissertação sobre arquitetura indígena, mas sim uma pesquisa por um novo modelo ambiental através de uma investi-gação do que foi feito antes e por quê.

O objetivo desta investigação, para aqueles que pretendem planejar ou construir na Amazônia, é tomar nota do que já foi feito por muitos anos e ser inspirado por este conhecimento.

“Aquele que acredita que as pessoas são, em geral, más e egoístas, deveria ir longe, conhecer outras culturas, para descobrir que será tratado melhor do que merece…”Karl von der Steinen, explorador

“...Entrar em uma paisagem que o homem não foi capaz de dominar, al-terar, distorcer em função de seus propósitos é uma lição de humildade e certamente uma experiência saudável.”Marston Bates, Where Winter Never Comes

R E S u M O

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…A corrente de água, em constante mudança…

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P R Ó L O G O

No início dos anos noventa fui visitar o povo Krahô, à convite de um cacique amigo, de nome Pehon, e quando cheguei lá me deparei com ruínas do que fora uma grande edificação de alvenaria construída para ser uma escola. Contrastando com esta cena, estava ao largo da minha visão a aldeia em que habitava meu amigo, disposta em di-versas casas formando um imenso círculo no entorno da vegetação quente no espaço plano do cerrado, todas elas de palha e de formato semi-arredondadas, serenas no azul da tarde. Eram simples. Per-feitamente humildes e harmônicas naquele contexto.

Perguntei o que havia ocorrido com aquela estrutura em ruína. Então o cacique me disse que duas coisas colaboraram para aquela situa-ção: primeiro, a posição em que iniciaram a construção, cuja forma quadrada e o ângulo em que fora construída agredia os caminhos dos ventos, segundo ele, e por isso de tempos em tempos sopravam ar-rancando o aparentemente forte telhado de amianto; e segundo, que talvez devido ao grande número de pessoas que eram necessárias para concluir a obra, a longa distância entre a cidade e a aldeia, que dificultava a vinda dos tradicionais materiais e operários para construção em alvenaria, e outras questões políticas que não vem ao caso, a obra fora tocada com longos intervalos de semi-abandono, até que desistiram. Isto sem contar o fato que eu soube depois que

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uma exagerada soma em dinheiro público foi gasto para a execução do projeto. E enquanto isso, as casas de palhas dos Krahô, com seus telhados de folhas de buriti do serrado continuavam firmes, sua ar-rendada forma talvez acolhedora para os ventos e compatíveis à necessidade do vilarejo. É assim que, milenarmente, os Krahô con-tinuam construindo seus lares com fibras das palmeiras do buritizal, estruturando-as com troncos e cipós locais.

Tempos depois, me deparei com outra situação insólita; que ocor-reu no Espírito Santo. O governo local edificou para os guaranis daquela região umas “casinhas” seguindo o modelo de construção da classe média brasileira; e quando os engenheiros, tempos após a entrega das chaves para as famílias, foram visitá-los, verificaram que os guaranis tinham improvisado uns “arremedos” nas casas. Primei-ro quebraram um pedaço do piso no centro da sala, para ter espaço para fazer o “fogo de chão” que estavam acostumados, pois fazia parte de sua tradição. Depois, inutilizaram um banheiro interno e construíram do lado de fora, com madeira e sem privada, outro to-alete; pois de acordo com seus costumes não poderiam ter este tipo de coisa dentro da habitação onde fica a família e onde todos dor-mem. Nunca havia passado pela cabeça dos idealizadores do projeto, que possivelmente aqueles povos tinham outro jeito de morar.

Desde a chegada dos europeus, no século XVI, que é assim; existe uma mentalidade soberba de superioridade cultural em determina-dos grupos de pessoas, que simplesmente ignoram que outras cul-turas também possuem as suas tecnologias, as suas arquiteturas, as suas cosmovisões, as suas ciências; e que estas por sua vez não nasceram de um dia para o outro. No Brasil, por exemplo, existem culturas que possuem mais de 12.000 anos de presença, ciência, cos-tumes e desenvolvimento inspirados por diferentes modos de per-cepção e relacionamento com o espaço, os recursos, e o ambiente.

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Eu achava que os europeus de modo geral nunca iriam perceber isso, e achava que dificilmente iriam respeitar uma cultura autóc-tone. E como se não bastasse, influenciaram neste quesito grande parte da sociedade brasileira atual, que possui uma diversidade de origens em sua genética, inclusive indígena, mas que conforma-se em ignorar a sabedoria de suas raízes.

Foi então que conheci o Johan, em meados dos anos 90. E através dele conheci o TIBÁ, um centro de desenvolvimento e de acol-himento de tecnologias intuitivas, seu projeto e missão de longo tempo. Fiquei impressionado como um sujeito tipicamente europeu; encontrou os Brasis desta parte da América, e abriu seu olhar, seu coração, seu tato, ou seja, todos os seus sentidos, formando uma compreensão profunda naquilo que eu chamo de eco-arquitetura an-cestral do Brasil. Além disso, estruturou seu conhecimento de modo a criar uma pedagogia, a partir do que foi aprendido empírica e in-tuitivamente pelos povos ancestrais, para compartilhá-la de modo claro, técnico e eficiente ás gerações mais jovens. Johan faz mais do que respeitar as sabedorias das construções dos povos desta terra; neste livro as difunde enquanto tecnologias da floresta, verdadeira-mente sustentáveis.

Tenho certeza de que este trabalho será de grande valia nestes tem-pos em que a sociedade de modo geral precisa de novos parâmet-ros e paradigmas de desenvolvimento e de qualidade de vida. A ex-periência que Johan traz é de muitas décadas de dedicação, estudo, pesquisa, prática. Poderia inclusive servir de inspiração de políticas públicas para construções sustentáveis. Este trabalho é precioso e sagrado. Que seu conteúdo possa inspirar muitos e muitos desta nova geração, para construirmos um mundo melhor de se morar e de se viver.

Kaká Werá