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ÁREA TEMÁTICA: ST10 Sociologia do Consumo AS DIFERENÇAS DE GÉNERO NO CONSUMO DE AUTOMÓVEIS PREMIUM EM PORTUGAL: UMA PERSPECTIVA SOCIOLÓGICA IDENTIFICAÇÃO DO(S) AUTOR(ES): RODRIGUES, Paulo Mestrando em Comunicação Empresarial, ISCSP UTL [email protected] Licenciatura Marketing, Publicidade e Relações Pública, ISLA, Lisboa CORREIA, Ana Mestrando em Comunicação Empresarial ISCSP UTL [email protected]

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ÁREA TEMÁTICA: ST10 Sociologia do Consumo

AS DIFERENÇAS DE GÉNERO NO CONSUMO DE AUTOMÓVEIS PREMIUM EM PORTUGAL: UMA

PERSPECTIVA SOCIOLÓGICA

IDENTIFICAÇÃO DO(S) AUTOR(ES):

RODRIGUES, Paulo

Mestrando em Comunicação Empresarial, ISCSP – UTL [email protected]

Licenciatura – Marketing, Publicidade e Relações Pública, ISLA, Lisboa

CORREIA, Ana

Mestrando em Comunicação Empresarial

ISCSP – UTL

[email protected]

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Palavras-chave: sociologia; consumo; género; automóvel; Portugal.

Keywords: sociology; consumption; gender; automobile; Portugal.

PAP1261

Resumo

O automóvel privado desempenha um papel de relevo nas sociedades contemporâneas e

tem sido um indicador clássico de status na sociologia do consumo e no marketing.

Este trabalho tem por objeto o consumo de automóveis do segmento premium em dois

períodos, 2003 e 2009, em Portugal. A escolha deste segmento prende-se com a forte

carga simbólica, identitária e um estatuto que ultrapassa largamente o conceito de meio

de transporte.

Pretendemos identificar os fatores sociológicos que enformam as decisões de consumo

de automóveis premium em Portugal, verificar se há critérios de escolha distintivos entre

o género masculino e feminino e observar se estes registaram uma evolução significativa

no intervalo de 6 anos. Com o intuito de caracterizar a realidade sociológica da

população em estudo, bem como as vendas e a posse de automóveis, recorremos à

análise quantitativa de várias fontes, entre outras o principal estudo realizado em

Portugal sobre o consumo automóvel. Foram ainda aprofundadas as motivações de

compra através da aplicação de um inquérito a homens e mulheres, proprietários de

automóveis das marcas selecionadas. Os resultados deste estudo revelam uma menor

proporção de mulheres proprietárias de automóveis de marcas premium, tendo-se

registado, inclusive, uma variação negativa nesta proporção entre 2003 e 2009.

Verificou-se um comportamento mais racional das mulheres, traduzido na maior

valorização dos atributos ligados ao aspeto prático dos automóveis.

Abstract

Cars play a major role in contemporary societies, structured around mobility and it has

been a classic indicator of status used in sociology of consumption and marketing.

This study was design to evaluate the use of premium segment cars in two periods, 2003

and 2009, in Portugal. The selection of this segment is linked to a strong symbolism,

identity and status that go well beyond the transportation concept. The goal is to identify

the sociological factors that shape the decisions of consumption of premium cars in

Portugal, check selection criteria distinguishing between males and females and see if

they have evolved substantially in the range of 6 years. In order to feature the

sociological reality of the study population, as well as sales and car ownership, we turn

to the quantitative analysis of various sources, including the main study in Portugal

about cars consumption. We further explored the motivations for purchase, using a

survey applied to women and men, car owners of select brands.

The findings of this study points out the lower female representation in premium brand

cars ownership, and a negative change in this ratio between 2003 and 2009. The inquiry

to owners and drivers suggested a more rational behavior in women, reflected in the

higher valorization of cars´ practical attributes.

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Introdução

O automóvel em abstracto é hoje entendido como um bem corrente, trivial e, portanto não distintivo da

identidade dos indivíduos (Dant & Martin, 2001: 149). Porém, também é verdade que os automóveis não são

todos iguais, verificando-se da parte dos construtores um constante esforço de actualização e diferenciação,

do qual resulta a apresentação frequente de novos modelos, mais sedutores que os anteriores.

De uma gama de dois ou três modelos, a maioria das marcas evoluiu para uma estratégia de diversificação,

da qual resulta hoje uma oferta extraordinariamente alargada em termos de modelos, versões, motorizações e

níveis de equipamento.

No principal estudo realizado em Portugal sobre o consumo automóvel, o Barómetro Auto (Data E) chamou-

nos à atenção não só a assimetria entre o consumo de cada género, mas também na preferência pelas

diferentes marcas premium, o que nos leva a indagar sobre as motivações e mecanismos sociais que presidem

à aquisição por parte dos homens e das mulheres.

Será esse o objecto de estudo no presente trabalho: o consumo de automóveis premium pelas mulheres, entre

2003 e 2009. Pretendemos identificar os factores sociológicos que enformam as decisões de consumo de

automóveis premium em Portugal, verificar se há factores diferenciadores nos géneros e verificar se estes

registaram uma evolução significativa no intervalo de 6 anos.

Para este efeito, recorreremos à análise quantitativa recorrendo às bases de dados Pordata e do INE. No que

concerne às vendas e posse de automóveis premium no período 2003-2009, efectuamos também uma análise

dos dados do mercado coligidos pela ACAP e dos que foram apurados pela empresa de estudos de mercado

Data E no seu estudo Barómetro Auto, contemplando as edições do segundo semestre de 2003 e do ano de

2009. Finalmente, aprofundaremos os aspectos motivacionais num inquérito a proprietários e condutores de

automóveis das marcas seleccionadas. A fim de balizarmos o propósito da análise, considerámos para apenas

as marcas com maior volume de vendas no segmento premium do mercado português: Audi, BMW,

Mercedes-Benz e Volvo, com vendas anuais entre as 4 mil e as 7 mil unidades. Com uma dimensão bastante

mais reduzida poderíamos ainda considerar a Lexus, Jaguar e SAAB. No entanto, como o seu volume de

vendas é muito reduzido, não constam do estudo Barómetro Auto, razão que justifica a sua ausência nesta

análise. Focaremos a nossa investigação essencialmente nas particularidades relativas ao género feminino.

Premiumi, que significa em inglês superior em qualidade, em preço ou valor, é o adjectivo utilizado pelo

sector automóvel para qualificar um conjunto reduzido de marcas que oferecem automóveis exclusivos, com

uma forte imagem assente em valores como o design, tecnologia, qualidade, segurança e sofisticação, e com

preços superiores aos que são praticados pelas marcas comuns em produtos semelhantes. A designação é

comummente utilizada por oposição às marcas generalistas, com uma oferta mais diversificada em termos de

segmentos e preços, e às marcas de luxo, com um posicionamento superior baseado em critérios de

personalização, exclusividade e preço que os tornam inacessíveis à maioria dos consumidores. Nas marcas

premium integram-se marcas com propostas entre os cerca de 20 mil e os 200 mil euros, enquanto nas

marcas de luxo a maioria dos produtos apresenta preços superiores a 200 mil euros, podendo ir ultrapassar

mesmo o milhão de euros.

Começaremos por enquadrar conceptualmente o consumo do bem automóvel nas correntes sociológicas mais

relevantes, no capítulo 5, Para melhor compreendermos o fenómeno da compra e utilização de automóveis

premium pelo género feminino, analisaremos a evolução do papel da mulher na sociedade portuguesa,

procurando algumas explicações para as variações encontradas nos consumos dos géneros e também nos

diferentes períodos considerados na evolução de alguns indicadores-chave, como a escolaridade, o

rendimento, as profissões e cargos exercidos, entre outros.

Em suma, partindo de dados sobre a posse de automóveis das diferentes marcas em 2003 e 2009,

procuraremos explorar a evolução do fenómeno do consumo do bem automóvel na sociedade portuguesa no

mesmo período, identificar os critérios de consumo próprios de cada género e a isolar aqueles que

determinam as diferentes preferências pelas marcas, com especial enfoque no género feminino.

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1. Revisão da Literatura

A generalização da utilização do automóvel nas sociedades modernas conduziu ao desenvolvimento de áreas

como a produção do automóvel em si e de todos os seus componentes, a sua comercialização, construção de

infra-estruturas, urbanismo, segurança, ambiente e justiça, só para citar as mais óbvias.

Por outro lado, também as relações sociais entre indivíduos e organizações sofreram mudanças de relevo por

via da generalização do uso do automóvel, o qual está na origem do aparecimento de um elevado número de

factos sociais de grande impacto na sociedade, quer na sua abrangência, quer na sua frequência. A

importância sociológica e económica do automóvel manifesta-se de forma crescente, desde o início do século

XX e, em particular, da década de 60, até aos nossos dias.

Conduzir automóveis é muito mais do que transportar o corpo humano de um ponto para outro (Urry

1999:29), ou seja, a perspectiva puramente racional da utilidade do automóvel enquanto suporte da

mobilidade dos indivíduos é insuficiente para explicar o fenómeno.

O prazer de ter um automóvel não está só na sua condução, mas principalmente no poder de sedução que

confere ao seu proprietário (Vaaranen, 1999), identificando-se aqui uma óptica de apropriação simbólica do

automóvel, enquanto bem com uma função de valorização social.

Ter um automóvel é certamente um prazer que pode ser ampliado pela observação dos outros indivíduos

(Dant e Martin, 2001). Este pensamento deixa transparecer as ideias estruturalistas sobre o consumo como

forma de cumprir expectativas sociais.

Nos anos 60, a posse de um automóvel no Reino Unido já era habitual, não conferindo de per si estatuto

social. Contudo o tipo de carro continuava a ser um factor distintivo socialmente (Shove, 1998: 3-4).

Tendo estas reflexões por base, e considerando o cenário apresentado actualmente pelo mercado, que propõe

simultaneamente um acesso facilitado ao crédito (quando comparado com o que se verificava há duas ou três

décadas) e uma grande pressão das marcas, com constantes campanhas publicitárias e ofertas “sedutoras”, é

natural que o indivíduo deixe aflorar as suas “necessidades” de aquisição. Estará a reagir a estímulos do

mercado, de acordo com elementos subjectivos, que poderão ser individuais, mas serão sobretudo sociais.

Um aspecto incontornável a ter em conta nesta análise é o facto do automóvel frequentemente fazer parte das

condições de remuneração de quadros superiores das empresas em Portugal, o que constitui um factor

afirmação, de pertença a um grupo, uma fonte de motivação e de afirmação estatutária. Contudo, a aquisição

do automóvel pela empresa esbate a importância da afirmação da individualidade e do estilo de vida, dado

que a intervenção do indivíduo na escolha do automóvel é limitada por critérios de natureza financeira e da

política de Recursos Humanos vigente. Também ao nível das marcas de automóveis podem existir limitações

decorrentes de um leque de modelos por vezes reduzido.

Normalmente, a escolha e utilização de um automóvel, particularmente no segmento premium, surge

claramente como um processo semiológico, onde os signos produzem, reproduzem e exacerbam, por meio de

imagens, texto, música e sensações a real necessidade de compra. Ao adquirir um bem, o indivíduo passa a

assumir uma nova posição nessa cadeia: a de consumidor no meio social. Tal movimento

(indivíduo/consumidor) acontece em função de alguns factores que são estudados por várias correntes da

sociologia. Neste trabalho, abordaremos alguns que balizarão doravante a nossa análise.

No final do século XIX, a Teoria da Classe Ociosa apresentava a sociedade como um campo de disputas

individuais pela posse de bens, no qual a reputação social assenta na riqueza ostentada pelas pessoas

(Veblen, 1965:91). Nos grandes centros urbanos, por natureza mais impessoais, a aquisição de bens caros e

supérfluos é a forma ideal das classes superiores demonstrarem o seu poder económico. Podemos identificar

na sociedade portuguesa contemporânea manifestações desse tipo de fenómeno de afirmação estatutária

através do automóvel: em locais de acesso condicionado, os proprietários de automóveis de luxo esperam um

tratamento preferencial imediato dos responsáveis pelo controlo dos acessos, como se a posse de um

automóvel de luxo automaticamente conferisse ao seu proprietário um estatuto superior ao dos restantes

cidadãos e, sobretudo, sem as limitações que se lhes aplicam.

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Os consumidores usam os bens para construir um universo inteligível e para criar e manter relacionamentos

sociais (Douglas e Isherwood, 1996). Para estes autores, o consumo está directamente ligado à necessidade

de o indivíduo criar um sentido no mundo.

A fim de endossar a afirmação acerca da “sedução”, utilizaremos os conceitos da corrente pós-modernista de

Bocock (1993). Para o autor, o consumo no sistema capitalista ocidental está ligado aos desejos através dos

signos (símbolos/sinais) culturais utilizados nas vendas - não eliminando o factor económico do processo. O

consumo, estará relacionado com significados simbólicos dos produtos. Tendo cada uma das marcas

premium uma fortíssima identidade, suportada num intenso universo imagético e iconográfico, é pois natural

que os indivíduos façam a sua escolha de acordo com este princípio, adquirindo veículos que estão mais

próximos da sua identidade e que lhes permitem exprimir a sua personalidade.

O consumo está para além do cumprimento de uma simples necessidade concreta do consumidor, há um

posicionamento social na relação entre o consumidor e o objecto, associa-se a compra de um bem como o

automóvel a factores como estatuto social, poder, prestígio e diferenciação (Corrigan, 1997).

Na competição entre classes os bens de consumo são “armas” para afirmar as suas posições na estrutura

social, pelo que há uma permanente tensão entre bens “distintos” e a sua popularização (Bourdieu, 1984).

Entendemos que os automóveis são disso um bom exemplo, muito particularmente os das marcas premium.

A ascensão cultural e económica da mulher em Portugal nos últimos anos terá assim ditado também uma

ascensão social que manifestou a sua influência na escolha dos automóveis premium, levando-a a optar por

aqueles que melhor cumprem essa afirmação social, o que parece enquadrar-se no conceito de violência

simbólica que mostra "todo o poder que infunde significações e as impõe como legítimas, dissimulando as

relações de força que fundamentam a sua força” (Bourdieu, 1972: 18). A preferência das classes superiores

por automóveis das marcas premium, leva as restantes classes a procurar seguir esse modelo, associando

estes carros a um estatuto de sucesso pessoal.

Esta violência “suave e disfarçada” pode assumir igualmente a forma de dominação masculina, que se exerce

com a cumplicidade do género dominado, as mulheres, e tem implicações muito relevantes nas suas opções

de consumo, dado que condiciona não só as ideias dos indivíduos – de ambos os géneros – mas a sua forma

de compreender, apreciar e agir. Os dados constantes no quadro 2 relativo à posse de automóveis em

Portugal demonstra que as mulheres estão em larga maioria nos segmentos mais baixos, com uma quota de

65% nos veículos económicos, mais pequenos e baratos, e a sua presença vai decrescendo consoante subimos

na escala. No segmento dos automóveis superiores e de luxo, as mulheres já representam menos de 30%.

Existem especificidades de comportamento do consumidor masculino, com relevância no domínio do

automóvel: os homens tendem a procurar produtos que confiram estatuto social, sendo menos impulsivos e

compulsivos relativamente às compras, ao passo que as mulheres terão maior tendência para aprofundar

relações (Mitchell e Walsh, 2004). Este facto, pode igualmente suportar as diferentes preferências entre

géneros, no que diz respeito ao tipo e marca de automóveis.

O interior dos automóveis pode ser também um espaço para a socialização. Namorados, casais, amigos,

familiares e crianças podem conviver enquanto a viatura se desloca (O'Connell 1998: 94; Shove 1998: 2-3).

Tratando-se de um espaço exíguo, o interior de um automóvel funciona como um laboratório que potencia e

acelera a socialização. Assim, serão as características do espaço interior um factor distintivo dos géneros?

A análise do padrão de consumo por género revela uma evolução das concepções (Catalá, 2007: 139-156).

Tradicionalmente as classes mais abastadas consideravam que “os homens produzem, as mulheres

consomem” (Catalá, 2007: 142). O mundo feminino seria, nessa perspectiva, um espaço de emoções,

sentimentos, desejos, caprichos, impulsos e prazeres, enquanto o dos homens seria o da produção, da

racionalidade, da utilidade, do prático, da responsabilidade e eficiência. As grandes transformações ocorridas

na sociedade, como a entrada massiva das mulheres no mercado de trabalho, a divisão sexual do trabalho

remunerado e doméstico, não esbateram completamente as diferenças de género - “o consumo é uma das

áreas que longe de ser igualitária, estabelece e reproduz a desigualdade de género” (Catalá, 2007: 154). Os

dados sobre o consumo de automóveis premium pelos dois géneros que parecem confirmar esta conclusão.

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As mulheres atribuem uma maior valorização aos aspectos práticos dos automóveis, tais como os

equipamentos de segurança, o espaço interior e os compartimentos de arrumação, o que poderá estar

associado às responsabilidades socialmente atribuídas à mulher na gestão do lar e na educação dos filhos

(Mohammadian, 2004). Outra conclusão relevante deste estudo é o facto de as mulheres terem mostrado

maior sensibilidade ao preço do automóvel do que os homens, cujos interesses se centram mais na potência e

desempenho do veículo. O menor poder de compra feminino e um acesso mais limitado ao crédito são

apontados pelo autor como razões para justificar essa constatação.

Nas últimas décadas do século XX, o acesso dos dois géneros ao automóvel tem-se aproximado mais. Na

base desta tendência estarão principalmente as reivindicações e conquistas femininas em favor da igualdade,

mais que quaisquer mudanças tecnológicas ou na produção (Walsh, 2004). Outros factores sociológicos são

referidos por Walsh para fundamentar a maior procura de automóveis pelas mulheres, nomeadamente a

crescente participação das mulheres no mundo do trabalho e da política, “invadindo o tradicional espaço

público masculino”, o correspondente incremento de rendimentos, a elevação do nível de formação cultural e

profissional. Além disso, verifica-se o acréscimo de famílias monoparentais encabeçadas por mulheres e o

desenvolvimento das áreas residenciais suburbanas sem transportes públicos colectivos eficientes. Todos

estes factores explicam uma maior utilização do automóvel pelo género feminino.

Na actualidade a maior diferenciação no consumo do automóvel estará nos rendimentos e na idade que,

conjugados com factores como a raça e a estrutura familiar explicam melhor as diferenças encontradas do

que o género (Walsh, 2004).

O carro proporciona hoje às mulheres oportunidades para um estilo de vida mais flexível e, ao assumirem o

volante mais vezes, as mulheres contribuíram para mudar a face de uma sociedade dominada pela

motorização: “a diferença de género na obtenção de cartas de condução, acesso aos automóveis e distâncias

percorridas diminuiu consideravelmente, ficando as mulheres e os homens com idênticas oportunidades de

tornar os seus automóveis num segundo espaço privado” (Walsh, 2004).

2. Metodologia de análise

Utilizaremos métodos quantitativos, quer na análise demográfica, quer de consumo de automóveis, por

razões que se prendem com o âmbito, exequibilidade e urgência desta investigação, assumidamente de

carácter primário. Pretendemos apenas responder às questões-chave deste projecto e levantar propostas para

futuros trabalhos. Sequencialmente seguiremos esta ordem:

Análise dos dados quantitativos sobre a população portuguesa através de consulta de dados

compilados na base de dados Pordata (com origem no Instituto Nacional de Estatística, no Ministério

da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e no Ministério do Trabalho e da Segurança Social)

Análise das vendas de automóveis das marcas seleccionadas, recorrendo a fontes como a Associação

de Comércio Automóvel de Portugal (ACAP), às empresas representantes das marcas objecto do

estudo (SIVA, Mercedes Benz Portugal, BMW Portugal, Volvo Car Portugal) e aos dados apurados

pela empresa Data E nos estudos quantitativos Barómetro Auto, do 2º semestre de 2003 e do ano de

2009.

Análise dos dados provenientes do inquérito realizado sobre a compra e utilização de

automóveis de marcas premium por indivíduos do género feminino em Portugal. Para a realização

deste estudo foi elaborado um questionário online, em

https://spreadsheets1.google.com/viewform?formkey=dGgzQzMzaVdNU09TdDZfQjFoV3VPaHc6

MA dirigido a uma base de contactos pessoais, maioritariamente composta por indivíduos do sexo

feminino utilizadores de veículos das quatro marcas seleccionadas. O inquérito foi muito

condicionado pela urgência, dado que o estudo se realizou entre os dias 16 e 22 de Dezembro de

2010, o que muito limitou a dimensão e a representatividade da amostra. Foram obtidas 18 respostas,

das quais, 14 de mulheres e 4 de homens.

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3. Análise de Dados e Resultados

Para uma maior eficácia na interpretação dos resultados, faremos uma análise dividida em diversas vertentes,

de forma a proporcionar um retrato mais abrangente e completo.

3.1. A evolução da mulher na sociedade portuguesa

Para compreender as actuais escolhas femininas no segmento dos automóveis premium, é importante

compreender o percurso ascendente que a mulher tem feito na sociedade portuguesa nas últimas décadas e,

em particular nos anos mais recentes. Os números mostram-nos que a sociedade portuguesa tem, em geral,

evoluído no sentido da redução das desigualdades entre sexos.

Essa evolução é notória, desde logo, na educação, onde as mulheres superam os homens na frequência de

todos os níveis do ensino superior.

Gráfico 1 - Alunos matriculados no Ensino Superior em Portugal (2003/ 2009) por sexo e nível de formação

Fonte: Pordata (dados GPEARI/MCTES – DIMAS/RAIDE)

Devido à pesada herança histórica e social as mulheres continuam a representar maioria da população que

não possui qualquer grau formal de ensino. As conquistas obtidas foram muito significativas. Mantiveram a

supremacia enquanto professoras e alargaram a sua formação. Actualmente são maioritárias no número de

inscritos e diplomados do ensino superior, superando o número de homens que obtêm doutoramentos (Rosa e

Chitas, 2010: 35). Face a este cenário estará associada uma idêntica progressão no mercado de trabalho?

Gráfico 2 - População portuguesa activa em 2003 e 2009, por sexo

Fonte: Pordata (dados INE – Inquérito ao emprego)

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Na verdade, verificamos uma evolução positiva na representatividade das mulheres na população activa

(empregada e desempregada), onde já são 47,2%, 1,2 p.p. acima da taxa que se verificava em 2003 e num

movimento consistente de crescimento ao longo das últimas décadas.

Gráfico 3 - Ganhos médios mensais dos trabalhadores por conta de outrém em 2003 e 2008, por sexo e nível

de qualificação profissional. Fonte: Pordata (dados GEP/MTSS – Quadros de Pessoal)

Mas, como indica o gráfico 3, o aumento da representatividade feminina no mercado de trabalho por

comparação com o sexo masculino ainda não se traduz em igualdade nos proveitos do trabalho. Mantém-se

uma vantagem para o sexo masculino, embora esteja a diminuir ao longo dos anos. Em 2008 (últimos dados

disponíveis), os homens ainda ganhavam em média mais 28% que as mulheres, embora essa diferença tenha

vindo a diminuir (era de 31% em 2003). Por níveis de qualificação, a superioridade do ganho médio do sexo

masculino comparativamente ao feminino atinge os valores máximos no topo da hierarquia, isto é, no nível

dos quadros superiores. Aí o ganho dos homens é 44% superior ao das mulheres em 2008. E, ao contrário da

tendência geral de convergência, no período entre 2003 e 2008 verifica-se um aumento das disparidades nas

remunerações dos quadros superiores (de 41% em 2003 para 44% em 2008) e dos quadros médios (de 19

para 25%), com vantagem para os homens.

3.2. A evolução da posse de automóveis entre 2003 e 2009 em Portugal

No que se refere aos automóveis, a taxa de posse de veículos pelas mulheres em Portugal não está muito

distante das taxas de participação no mercado de trabalho (quadro 1): 47% dos veículos em 2003 e 46% em

2009. Já se nos limitarmos ao segmento Premium, verificamos que, tal como acontece ao nível dos quadros

superiores, mais uma vez, a proporção é mais desfavorável às mulheres, embora caminhe também no sentido

da convergência: da quota de 35% em 2003 para os 41% em 2009.

Universo/Ano

Total Homens Mulheres

2003 2009 2003 2009 2003 2009

Parque

Automóvel 3 707 000 4 232 000 1 972 000 2 305 000 1 735 000 1 927 000

Parque Seg.

Premium 266 000 402 000 173 000 238 000 93 000 165 000

Quadro 1 - Posse de Automóveis em Portugal, em 2003 e 2009, por sexo

Fonte: Data E (Barómetro Auto 2º sem. 2003 e 2009, c/arrendondamento nos milhares)

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Esta variação está certamente relacionada com a menor representatividade das mulheres nas funções de topo

às quais os automóveis do segmento premium estão associados, como complemento salarial, mas também

com a constatação de Catalá sobre o consumo como factor de “estabelecimento e reprodução da

desigualdade de género” (2007: 154), dado que as mulheres possuem sobretudo veículos dos segmentos

baixos e médio (quadro 2), onde as marcas premium têm uma oferta menos expressivas.

Quadro 2 - Posse de Automóveis em Portugal, em 2003 e 2009, por sexo e segmento automóvel

Fonte: Data E (Barómetro Auto 2º sem. 2003 e 2009, c/arrendondamento nos milhares)

Uma análise sumária dos dados do mercado quando estruturado por segmentos automóveis no seu todo

aponta para duas conclusões muito claras (quadro 2):

Apesar de ligeiramente minoritária no conjunto do mercado, a mulher está em maioria nos

segmentos inferiores e o seu peso relativo vai diminuindo à medida de caminhamos para o topo do

mercado, onde se encontram os automóveis mais sofisticados, potentes e caros;

Entre 2003 e 2009 a presença da mulher evoluiu negativamente quer no conjunto do mercado, quer

em cada um dos segmentos, o que associado à crise económica que já então se fazia sentir e afectou

significativamente as vendas de automóveis, leva a concluir que as necessidades de mobilidade

individual feminina são as primeiras a ser sacrificadas quando é necessário reduzir os gastos

familiares.

Total Mercado 2003 2009

Segmentos

Automóveis Total Masculino Feminino Total Masculino Feminino

A - Seg. Económico

125 000 44 000 81 000 214 000 76 000 138 000

100% 35,2% 64,8% 100% 35,5% 64,5%

B - Seg. Inferior

1 742 000 834 000 908 000 1 753 000 853 000 900 000

100% 47,9% 52,1% 100% 48,7% 51,3%

C - Médio Inferior

1 196 000 683 000 513 000 1 467 000 859 000 608 000

100% 57,1% 42,9% 100% 58,6% 41,4%

D - Médio Superior

566 000 357 000 209 000 779 000 503 000 276 000

100% 63,1% 36,9% 100% 64,6% 35,4%

E/F - Superior/Luxo

79 000 55 000 24 000 21 000 15 000 6 000

100% 69,6% 30,4% 100% 71,4% 28,6%

Mercado total

3 708 000 1 973 000 1 735 000 4 232 000 2 305 000 1 927 000

100% 53,2% 46,8% 100% 54,5% 45,5%

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Na relação com o automóvel, a mulher é, assim, relegada para uma posição secundária, à qual estão

associados os veículos de menor dimensão e mais baratos. Além das razões sociológicas identificadas em

estudos realizados noutros países, que confirmam esta tendência e a relacionam com as responsabilidades da

mulher na família no que se refere aos filhos, à gestão da casa e ao tipo de percursos efectuados pela maioria

das mulheres, de curta distância e em ambiente urbano (Mohammadian, 2004; Mitchell & Walsh, 2004), há

que pensar igualmente nos aspectos culturais ligados ao domínio masculino que ainda caracterizam a

sociedade portuguesa. Não são de excluir também diferenças de género ao nível das motivações e

mecanismos de compra, com a mulher a fazer uma avaliação mais racional das suas opções de compra.

3.3. A evolução das marcas automóveis premium no mercado português entre 2003 e 2009

No ano de 2009, a BMW foi a marca premium mais vendida no mercado nacional, com uma quota de

mercado de 4,7%. A Audi e a Mercedes situam-se em posições muito próximas, ambas com quotas de 4,3%.

A Volvo tem uma posição significativamente inferior em termos de representatividade, sendo também a

marca com uma oferta mais reduzida em variedade.

Ano/ Marcas

2003 2009

Volume

Quota

Mercado Volume

Quota

Mercado

Audi 6 387 3,3% 6 922 4,3%

BMW 4 554 2,4% 7 558 4,7%

Mercedes 7 809 4,0% 6 894 4,3%

Volvo 2 205 1,2% 1 955 1,2%

Mercado Premium 20 955 10,9% 23 329 14,5%

Mercado total 192 308 100,0% 160 997 100,0%

Quadro 3 - Vendas no mercado de veículos ligeiros de passageiros em Portugal, em 2003 e 2009, volumes e

quotas de mercado. Fonte: ACAP

Comparando 2009 com o ano de 2003, verificamos que as vendas totais de veículos automóveis ligeiros de

passageiros de veículos registaram uma redução de 19,4% mas que o segmento premium apresenta um

crescimento de 10,2%, fenómeno explicado principalmente por dois factores:

A crise económica, que determinou a redução das vendas de automóveis em geral, afectando em

menor escala os estratos populacionais com maior poder de compra (é um fenómeno recorrente no

mercado automóvel, sempre que há contracção do mercado);

A alteração substancial das gamas de produtos das marcas premium, no sentido do alargamento da

oferta e do downsizing, traduzido simultaneamente na introdução de maior número de modelos nos

segmentos mais baixos e no lançamento de motorizações mais pequenas e eficientes que, por

motivos fiscais, têm um preço mais reduzido.

Para ficarmos com uma ideia mais precisa da relevância das quatro marcas em análise no segmento premium

introduzimos o quadro seguinte:

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2003 2009

Unidades Quota

Mercado Unidades

Quota

Mercado

Audi 6 387 30,5% 6.922 29,7%

BMW 4 554 21,7% 7.558 32,4%

Mercedes 7 809 37,3% 6.894 29,6%

Volvo 2 205 10,5% 1.955 8,4%

Mercado

Premiu

m

20 955 100,0% 23.329 100,0%

Quadro 4 – Vendas no mercado de veículos ligeiros do segmento premium

Fonte: ACAP

Como se pode verificar, este segmento de mercado é completamente dominado por três marcas, que em

conjunto detêm mais de 90% de quota de mercado. A Volvo tem uma presença bastante mais reduzida.

Face a esta realidade, será interessante verificar se existe uma diferença significativa nas vendas por género?

Será possível identificar quais as características mais valorizadas pelas mulheres relativamente a cada uma

das marcas? Relativamente às vendas por género, será interessante comparar o posicionamento de marketing

de cada uma das marcas em análise com a distribuição da percentagem de mulheres em cada marca (ver

quadros 5 e 7).

No que às características valorizadas pelas mulheres diz respeito, os resultados do inquérito fornecem

algumas pistas, que serão detalhadas mais adiante.

Marca

Posicionamento Gama Intervalo de preços

Audi Design/Estilo

Desportiva

22 modelos/versões

incl. berlinas, carrinhas, coupés, cabriolets, SUV, e

versões super desportivas

De 19.230€ (A1) a

201.065€

(Q7V12)

BMW Tecnologia

Performance

28 modelos/versões

incl. berlinas, carrinhas, coupés, cabriolets, SUV,

versões super desportivas e híbridos

De 30.300€ (116) a

198.950 (760)

Mercedes

Benz

Clássica

Prestígio

22 modelos/versões

incl. berlinas, carrinhas, coupés, cabriolets, SUV, e

versões super desportivas

De 23.392€ (Classe A)

a 149.288€

(Classe S)

Volvo Segurança

Ambiente

11 modelos/versões

incl. berlinas, carrinhas, coupés, cabriolets, SUV

De 24.404€ (C30) a

91.116 € (S80

V8)

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Quadro 5 - Posicionamento, gama de veículos e intervalo de preços nas marcas automóveis premium no

mercado português em 2009. Fonte: Comunicação das Marcas

Total Masculino Feminino

2003 2009 2003 2009 2003 2009

Audi

% vertical

% horizontal

57 000

1,5%

100,0%

121 000

2,9%

100,0%

31 000

1,5%

53,8%

85 000

3,7%

70,1%

26 000

1,5%

46,2%

36 000

1,9%

29,9%

BMW

% vertical

% horizontal

83 000

2,2%

100,0%

63 000

1,5%

100,0%

58 000

2,9%

69,8%

29 000

1,2%

45,5%

25 000

1,4%

30,2%

35 000

1,8%

54,5%

Mercedes

% vertical

% horizontal

90 000

2,4%

100,0%

170 000

4,0%

100,0%

60 000

3,0%

66,8%

103 000

4,5%

60,4%

30 000

1,7%

33,2%

67 000

3,5%

39,6%

Volvo

% vertical

% horizontal

36 000

1,0%

100,0%

48 000

1,1%

100,0%

24 000

1,2%

66,9%

21 000

0,9%

43,4%

12 000

0,7%

33,1%

27 000

1,4%

56,6%

Base 3 707 000 4 232 000 1 972 000 2 305 000 1 735 000 1 927 000

Perfil 100,0% 100,0% 53,2% 54,5% 46,8% 45,5%

Quadro 6 - Marca automóvel possuída por sexo, em 2003 e 2009, em Portugal. Fonte: Data E (Barómetro

Auto 2º sem. 2003 e 2009, c/arrendondamento nos milhares)

2009

Marca/seg.

premium

Peso do

sexo feminino

Market

Index

Variação

vs.

2003

Audi 29,9% 66 -35,3%

BMW 54,5% 120 80,5%

Mercedes 39,9% 88 20,2%

Volvo 56,6% 124 71,0%

Quota total das

mulheres

no

segmento

premium

45,5% 100 -2,7%

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Quadro 7 - Diferencial da posse de automóveis das marcas premium pelas mulheres Fonte: Adaptação a

partir de Data E (Barómetro Auto 2º sem. 2003 e 2009)

O quadro 7 dá-nos uma fotografia do peso das mulheres em cada uma das marcas. Tendo por base a quota

total de mulheres que detêm automóveis premium em 2009 (45.5%), podemos considerar este valor como

uma referência, ou seja o indicador de mercado – Market Index (MI de valor 100). Comparando este

indicador com cada uma das marcas, obteremos o MI relativo para cada marca. Desta forma, poderemos

concluir que:

A maioria de automóveis Volvo (56,6%) é detida por mulheres. Esta percentagem, é muito superior

à média do mercado. É importante sublinhar a colagem do posicionamento de marketing desta marca

(Segurança e Ambiente) ao género feminino.

A BMW é a segunda marca preferida pelas mulheres, com um peso próximo da Volvo. É também de

salientar o apreço das mulheres pelo apelo à Tecnologia e à Performance, atributos do

posicionamento desta marca.

3.4. Análise sucinta dos resultados do Inquérito

De forma genérica os resultados mostram que todos os atributos são maioritariamente valorizados como

importantes. Tal facto deve-se certamente ao perfil dos inquiridos, utilizadores de viaturas de grande

qualidade, que dada a sua função e posição hierárquica são por excelência muito exigentes. É também

interessante verificar que os resultados do inquérito parecem estar alinhados com os dados reais do mercado

em termos de vendas das marcas analisadas e respectivo posicionamento.

As características mais valorizadas pelas mulheres inquiridas nos seus automóveis, independentemente da

marca foram, a fiabilidade e a segurança, seguidas de perto pelo conforto e a economia no consumo de

combustível. Do lado dos aspectos menos valorizados por este público encontramos o aspecto desportivo, o

prestígio da marca, a velocidade e potência, os dispositivos de lazer como GPS e os custos de manutenção.

No entanto, quando questionadas sobre os aspectos que mais apreciam nos seus automóveis, uma larga

maioria das inquiridas destaca, para além da segurança e do conforto, também a potência e o design,

elementos menos racionais e mais ligados ao simbolismo do automóvel no meio social.

A análise dos aspectos mais valorizados em cada revela os seguintes resultados:

Volvo e BMW

São as marcas com maior expressão nas mulheres, com larga vantagem para a Volvo. O inquérito

revelou que a totalidade dos utilizadores destacou a segurança como aspecto positivo da Volvo, o

que está de acordo com o posicionamento. Na BMW, o inquérito não revelou evidentes factores

distintivos da marca.

Mercedes e Audi

Ambas as marcas estão abaixo da média do mercado em termos da taxa de posse por mulheres.

Contudo os inquiridos revelaram apreciar na Mercedes o conforto, a robustez e a qualidade de

construção. Relativamente à Audi, apreciaram a performance e o design. Em ambos os casos

verifica-se uma colagem ao posicionamento destas marcas, bem como ao perfil dos seus clientes

identificado no estudo de mercado da Data E.

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Conclusões

Como resultado da pesquisa bibliográfica efectuada, confirmámos que o Homem enquanto

indivíduo/consumidor e enquanto membro de um grupo social é fruto do somatório e da conjugação das

diversas forças extrínsecas e intrínsecas ligadas à necessidade de consumir bens e/ou serviços.

Na sequência da análise dos dados empíricos, podemos então considerar que a perspectiva estruturalista

defendida nomeadamente por Bourdieu e Baudrillard é a que melhor explica o fenómeno da escolha e

aquisição de automóveis de marcas premium, na medida em que o padrão, a referência da marca premium se

restringe apenas a três marcas que detêm mais de 90% do mercado e que é a estrutura social do trabalho que

determina a situação.

Na verdade, não encontrámos diferenças significativas entre os géneros: os profissionais com estatutos mais

elevados, homens ou mulheres, optam por veículos das marcas premium por razões de distinção social, com

origem num contexto profissional. A menor representatividade das mulheres na posse de veículos dos

segmentos superiores pode ser associada à posição também minoritária das mulheres no topo da hierarquia

profissional.

Nos critérios de escolha confirmam-se as conclusões de estudos efectuados anteriormente noutras geografias,

sobre a maior racionalidade das mulheres, traduzida na valorização dos aspectos relacionados com a

fiabilidade, segurança e economia em detrimento das variáveis hedonísticas e estatutárias, próprias do género

masculino (Mohammadian, 2004; Mitchell & Walsh, 2004).

Esta última ideia poderá, de alguma forma, ser explicada pelo facto das variáveis estatutárias serem um dado

adquirido à partida – todas as marcas em estudo o são igualmente e não é o indivíduo que o determina, mas

sim a empresa quando define o tipo de veículo a atribuir.

Mas se os critérios de escolha femininos são mais racionais e distintos dos masculinos, então a preferência

das mulheres por veículos premium neste contexto terá de ser explicada por um efeito de mimetismo, ou seja,

pela reprodução dos comportamentos masculinos. Sendo este comportamento a forma de assegurar a

continuidade neste grupo social e a progressão no seu seio, representa, no fundo uma manifestação da

violência simbólica teorizada por Bourdieu, no sentido da legitimação e perpetuação da dominação

masculina através da imposição dos padrões de consumo.

Do nosso ponto de vista, reconhecemos as limitações da vertente qualitativa da nossa análise, não só pela

escassez da amostra como pela ausência de maior detalhe sobre os consumos ao nível dos modelos e

motorizações, bem como níveis de equipamento, que permitiram aferir melhor a natureza dos critérios de

escolha. Será uma hipótese a explorar em futuros trabalhos.

Fontes e contactos

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Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, consultado em 28.12.2010 no site

http://www.ciberduvidas.com/pergunta.php?id=725, DATA E, Barómetro Auto, edição do 2º semestre de

2003 e edição de 2009

premium. (n.d.). Cambridge Advanced Learner's Dictionary consultado em 30 de Novembro de 2010 no site:

http://dictionary.cambridge.org/dictionary/british/premium_4

SIVA – Sociedade Importadora de Veículos Automóveis SA

www.audi.pt (SIVA), consultado em 6.11.2010

www.bmw.pt (BMW Portugal Lda.), consultado em 6.11.2010

www.ine.pt (INE), consultado em 20 e 23.11.2010

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www.mercedes-benz.pt (Mercedes Benz Portugal SA), consultado em 6.11.2010

www.nead.unama.br/site/bibdigital/pdf/artigos_revistas/211.pdf

www.pordata.pt (PORDATA), consultado em 20.11.2010

www.volvocar.com/pt (Volvo Car Portugal SA.), consultado em 6.11.2010

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