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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL (UFRGS)
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL (PROPUR)
GRUPO DE PESQUISA LABORATÓRIO DE ESTUDOS URBANOS (LEURB)
CURSO DE EXTENSÃO EM PLANEJAMENTO URBANO
ENCONTRO 5: O DIREITO À CIDADE
PALESTRANTES VANÊSCA BUZELATO PRESTES | ANNELISE MONTEIRO STEIGLEDER
O DIREITO À CIDADE NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E
NO ESTATUTO DA CIDADE
VANÊSCA BUZELATO PRESTES
Doutora Universitá del Salento, mestre PUC/RS, especialista
Unirriter/ESDM, procuradora municipal Porto Alegre
O Estado Democrático de Direito. O significado dos direitos fundamentais. O
princípio da dignidade da pessoa humana. A concepção constitucional do
Direito à Cidade como um direito síntese de direitos e deveres externados pelos
comandos constitucionais relativos ao meio ambiente (art. 225), à política
urbana (art. 182), à gestão democrática e ao direito à moradia (art. 6º). O
Estatuto da Cidade e os princípios do direito à cidade.
O conceito de cidades foi se modificando ao longo dos tempos.
As modificações ocorridas nas cidades ao longo da história acompanham o sistema político e econômico vivenciado no respectivo período
As Cidades na História A Cidade Antiga: Fustel de Coulanges • Associação de tribos, respeitado o culto de cada qual/
cidades espécie de confederação
• Associação religiosa e política das famílias e tribos; urbe o lugar de reunião, do domicílio, o santuário desta sociedade
• Religião originou Estado e Estado mantinha religião
• Cidadãos eram submetidos às cidades; não existia direitos frente às cidades e seus deuses
• No período medieval as cidades tiveram uma força política intensa, e eram econômica, política, social e culturalmente independentes.
Entre os séculos XV e XVIII introdução capitalismo mercantilista
Início período o centro era o rei; cidades que mais se desenvolveram abrigavam uma corte real, fonte de poder econômico. Em contraste com o regime medieval, o poder e a população não mais se achavam dispersos e descentralizados.
A construção de cidades era um meio de consolidar o poder político em um único centro nacional, sob o olhar do rei
Era das cidades absolutas
Cidade Pós-medieval
Mudança economia de mercadorias para economia monetária aumentou recursos Estado
Início enormes transformações urbanas Terra escapou à detenção feudal e passa a ter
enorme valor econômico; terra mercadoria Idade Média e liberdade era buscada em relação às
restrições feudais, para as atividades corporativas da municipalidade, a ordem religiosa. Nas novas cidades, liberdade significativa não subordinação às restrições municipais: liberdade para o instrumento privado, lucro e acumulação, sem qualquer referência a bem-estar (MUMFORD)
Lewis Munford, A Cidade na História
A terra feudal era concedida por um prazo de 99 ou 999 anos; pelo menos três gerações. Esse sistema favorecia a continuidade e reduzia o movimento ascensional dos preços. Quando a terra se tornou um produto e não um bem permanente, fugiu a qualquer espécie de controle comunal
A cidade foi tratada não como uma instituição pública, mas como uma aventura comercial privada, visando aumentar a rotatividade e fazer subir o valor dos terrenos.
As funções urbanas deixaram de ser significativas na cidade comercial
• Este período pós-medieval é também denominado período liberal. Caracterizou-se pela perda da força das cidades, pois com a queda do feudalismo, um dos efeitos foi a ausência de controle.
• A terra passa a ser considerada um bem econômico e ocorre a extensão sem limites ou regras urbanísticas da ocupação humana
Modernidade
• Retomada do controle perdido no período liberal, embelezamento das cidades que haviam se “enfeiado”, usando, para tanto, medidas urbanísticas cientificamente estudadas, em grande parte inaplicáveis dado ao alto custo e a grande quantidade de pessoas que já residiam nas áreas urbanas
Modernidade
Com a funcionalização e a tentativa de delimitação do que era urbano foi acentuado o conceito de que cidade corresponde a urbano (moderno/desenvolvimento) e campo rural (arcaico/tradicional)
Carta de Atenas, escrita por Le Coubusier e resultado de encontro de urbanistas e arquitetos em 1933 na Grécia identifica funções urbanas: a) habitar; b) trabalhar; c) circular e d) lazer
Cidade Industrial
Maior contribuição: saneamento e saúde pública
Bom urbanismo: dar de novo à cidade ar puro, água fresca, espaços abertos com verde e sol passou a ser objetivo do urbanismo
“a degradação do estivador, do porteiro, do carregador e do marinheiro não só infestou o próprio cais, mas se propagou para outras regiões da cidade, aumentando a incidência de pestes e de sífilis”. (Munford)
Cidade (urbano) X campo (rural)
• Surge com o liberalismo (tradição X desenvolvimento)
• É reforçado na modernidade com a funcionalização
• Urbanistas europeus do final do sec. XIX apontavam o equívoco, alertando que o planejamento deveria retomar a integralidade do território
Cidade na Contemporaneidade
• Cidade como espaço de cidadania
• Expressão do direito à diferença
• Função socioambiental
• Funções sociais da cidade (art. 182 CF)
• Dimensão de todo o território. A cidade não se contrapõe ao campo
• Era da quebra da fragmentação
Cidade na Constituição de 1988 e no Estatuto da Cidade (Lei 10.257/01)
• Cidade engloba todo o território
• Plano Diretor é para todo o território (art. 40, § 2º do estatuto da Cidade)
• Plano Diretor estabelece a função social da propriedade
• Estatuto da Cidade não é lei que rege apenas o ambiente construído; possibilita fazer a simbiose campo e cidade
Como legislar para todo o território
Planos Diretores
a) passagem zona rural para zona urbana
b) proteção dos recursos naturais necessários ao desenvolvimento da cidade como um todo, independente da zona em que situados
c) relações em geral entre o meio urbano e o meio rural
d) questões espaciais do meio rural, naquilo que não esteja diretamente vinculado à política agrária
(Carlos Ari Sundfeld)
Cidade/Estado Socioambiental
• Estado constitucional ecológico: idéias de justiça intergeracional e de direitos das futuras gerações (Canotilho
• Eu/nós contra o Estado; nós em favor do Planeta (Herman Benjamin)
• Supera a dicotomia público/privado
• Expressão socio ambiental: convergência agendas social e ambiental
• Socioambiental é a afirmação de uma Constituição do Estado social, que reconhece direitos fundamentais e fornece meios jurisdicionais para sua garantia.
• Direito à cidade abordagem é socioambiental, representando fusão fundamental (agenda verde e agenda marrom)
Cidades no Estado Socioambiental
• Tem compromisso com a praxis constitucional, tendo a dignidade da pessoa humana como fio condutor
• Sustentabilidade urbano-ambiental é meta
• Propriedade só é legítima se respeitar função socioambiental prevista Plano Diretor
• É democrática
• É um espaço de cidadania e de expressão do direito às diferenças
Conceito jurídico de cidade (dimensão constitucional direito à cidade)
• Art. 182 CF
• Art. 225 CF
• Art. 6º. – direito à moradia
• Gestão democrática / expressão do espaço de cidadania
O conceito de meio ambiente nas cidades necessariamente deve contemplar o espaço
construído, suas interações e seus problemas.
É necessária a interação entre o Direito Urbanístico e o Direito Ambiental para aplicação da legislação às
cidades
• O meio ambiente nas cidades contempla tanto o ambiente natural (ar, água, solo, fauna e flora) quanto o ambiente artificial ou humano, denominado construído.
• O conceito de meio ambiente nas cidades necessariamente deve contemplar o espaço construído, suas interações e seus problemas.
• Necessidade de repensar o conceito de função social da propriedade
Conceito de Meio Ambiente nas Cidades
• Ambiente construído ou artificial
• Patrimônio histórico
• Patrimônio cultural
• Aspectos econômicos, sociais e infra-estrutura urbana necessária à vida nas cidades
• Reflexos dos efeitos das mudanças climáticas
Legislação Urbanística
• Não teve por objeto as avaliações do ambiente natural e, em geral, avalia o ambiente construído a partir do empreendimento ou da atividade em si
• Não trabalha com o conceito de esgotamento dos recursos naturais
Limitações
• Análise urbanística ocorre a partir do conceito de propriedade (matrícula do imóvel)
• O planejamento nas cidades (onde existe) ainda é físico-territorial
A Legislação Ambiental no Brasil
• Legislação portuguesa: equilíbrio ecológico/ proteção da Coroa (Ordenações Alfonsinas proibia o corte deliberado de árvores frutíferas; Ordenações Manuelinas, vedava a caça de perdizes, lebres e coelhos com instrumentos que causassem dor aos animais; Ordenações Filipinas protegiam as águas, punindo quem jogasse material que as sujasse ou matasse os peixes.
Após a Independência: 1830, Código Penal, arts. 178 e 257 puniam corte ilegal de madeiras;
1916: Código Civil, direito de vizinhança ao regular o direito de construir
1923: Decreto 16.300, Regulamento de Saúde Pública
1934: Decreto 23.793, Código Florestal, substituído pela Lei 4.771/65; Decreto 24.114, Regulamento de Defesa Sanitária Vegetal; Decreto 24.643, Código de Águas.
1937: Decreto-Lei 25, que organiza a proteção ao patrimônio histórico e artístico nacional e ainda está em vigor;
1938: Decreto-Lei 794,Código de Pesca, depois substituído pelo Decreto 221/67;
1940: Decreto-Lei 1985 (Código de Minas), depois substituído pelo Decreto-Lei 227/67; Decreto-Lei 2848, Código Penal;
Anos 60, textos legais com ênfase ao amparo e a qualidade ambiental
• Lei 4504/64, Estatuto da Terra
• Lei 4771/65, Código Florestal
• Lei 5.197/67, Proteção à Fauna
• Decreto-Lei 221/67, Código de Pesca
• Decreto-Lei 227/67, Código de Mineração
• Decreto-Lei 248/67, Política Nacional de Saneamento Básico
• Decreto-Lei 303/67, criação do Conselho Nacional da Poluição Ambiental
• Decreto-Lei 1413/75, controle da poluição ambiental industrial
• Lei 6453/77, responsabilidade civil e criminal por danos nucleares
• Lei 6766/79, parcelamento do solo urbano
Anos 80 Legislações reflexo da Declaração de Estocolmo de 1972
Lei 6938/81, cria o Sistema Nacional do Meio Ambiente e vigora até hoje
Lei 7347/85, disciplinou a ação civil pública para defesa meio ambiente
CONSTITUIÇÃO DE 1988, art. 225, Constituições Estaduais e Leis Orgânicas Municipais
Lei 9605/98, sanções penais e administrativas aplicáveis as condutas lesivas ao meio ambiente
Conferência da Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - A Cúpula da Terra - Agenda 21 - Rio de Janeiro/1992
Capítulo 7 : Promoção do Desenvolvimento Sustentável dos Assentamentos Humanos
Na virada do século metade da população mundial, mais de três bilhões de pessoas estarão vivendo e trabalhando em áreas urbanas.
O objetivo geral dos assentamentos humanos é melhorar a qualidade social, econômica e ambiental dos assentamentos humanos e as condições de vida e de trabalho de todas as pessoas.
As áreas de programas incluídas neste capítulo são:
• Oferecer a todos habitação adequada;
• Aperfeiçoar a manejo dos assentamentos humanos;
• Promover o planejamento e o manejo sustentáveis do uso da terra;
• Promover a existência integrada de infra-estrutura ambiental: água, saneamento, drenagem e manejo de resíduos sólidos;
Promover sistemas sustentáveis de energia e transporte nos assentamentos humanos;
Promover o planejamento e o manejo dos assentamentos humanos localizadas em áreas sujeitas a desastres;
Promover atividades sustentáveis na indústria da construção;
Promover o desenvolvimento dos recursos humanos e a capacitação institucional e técnica para o avanço dos assentamentos humanos.
2ª Conferência das Nações Unidas para os Assentamento Humanos - Agenda Habitat, Istambul, 1996
Os problemas mais sérios: recursos financeiros inadequados, falta de oportunidades de empregos, aumento do contingente dos desabrigados, expansão de assentamentos de invasores, aumento da pobreza e da crescente desigualdade entre ricos e pobres, aumento da insegurança e criminalidade, estoques de imóveis, serviços e infra-estrutura inadequados ou em deterioração, falta de equipamentos de saúde e educação, uso impróprio do solo; insegurança da posse, aumento do congestionamento do trânsito e da poluição, falta de áreas verdes, fornecimento inadequado de água e esgoto, desenvolvimento urbano desordenado e aumento da vulnerabilidade a desastres,
LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
• O Estatuto da Cidade traz diretrizes e instrumentos capazes de construir esta agenda urbano-ambiental, exigindo dos administradores públicos que passem a ser gestores capazes de construir a cidade sustentável
• Meio ambiente integrando União, Estados e Municípios
Sustentabilidade Urbano-ambiental
• Conceito jurídico em aberto
• Necessidade do Poder Público dirigir o processo e não ficar refém deste
• Risco de confundir flexibilização com desregulação
• Necessidade de romper com a fragmentação do processo decisório
Função Social da Propriedade
Roma: Instituição Religiosa; caráter religioso; propriedade individual ou privada
Normas predominam mundo ocidental: Revolução Francesa (1789); Constituição Americana (1791); Código Napoleônico Francês (1804)
Augusto Comte (1892) – o proprietário tem o dever de formar e administrar capitais em cada geração para preparar os trabalhos da geração seguinte
Rudolfh Von Ihering (1877) – adversário aberto do caráter absoluto da propriedade
Função Social da Propriedade
Otto Gierke – defende propriedade privada, ataca sistema socialista; propunha propriedade baseada na harmonia social e por um sentido social da propriedade da terra, inspirado no direito alemão histórico
Leon Duguit – início século XX – conceito de propriedade função-social
Maurice Hariou (1910) – propriedade-função
Encíclica Rerum Novarum (1891) – propriedade carrega consigo função social
Constituição Weimar (1919) – propriedade obriga
Constituições Democráticas
Constituição de 1988
Art. 5º XXII e XXIII (direito fundamental)
Art. 170 – ordem econômica
ARt. 182 e 183 – funcionalização propriedade urbana e rural
Previsão de disciplinas de acordo com a potencialidade econômica da propriedade, considerando a destinação (ex: disciplina pequena propriedade, usucapião 50 hc rural e 250 m urbano)
Vários estatutos para diversas situações proprietárias
“A proteção ambiental, a utilização racional das reservas naturais, as relações de trabalho derivadas da situação proprietária, o bem-estar desses mesmos trabalhadores, são interesses tutelados constitucionalmente e que passaram a integrar o conteúdo funcional da situação proprietária” Gustavo Tepedino
Consequências Jurídicas
• Funcionalização
• Atribuir função
• Reconhecimento funções socioambientais da propriedade
• Relevância do não fazer
• Destaque para função ambiental – ex: reserva legal (obrigação de )
Ordem Urbanística e a Cidade Sustentável
Ordem Urbanística como Direito Difuso
Art. 1º, VI Lei 7.347/85 (lei da ação civil pública VI à ordem urbanística. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)
Direito Difuso: Transindividual e de titularidade indefinida
◦ Representam a quebra da fragmentação do exame das questões controversas no
âmbito dos direitos ◦ Representam temas que estão além dos indivíduos e da relação entre estes
Cidade/Estado Socioambiental
• Estado constitucional ecológico: idéias de justiça intergeracional e de direitos das futuras gerações (Canotilho
• Eu/nós contra o Estado; nós em favor do Planeta (Herman Benjamin)
• Supera a dicotomia público/privado
• Expressão socio ambiental: convergência agendas social e ambiental
• Socioambiental é a afirmação de uma Constituição do Estado social, que reconhece direitos fundamentais e fornece meios jurisdicionais para sua garantia.
• Direito à cidade abordagem é socioambiental, representando fusão fundamental (agenda verde e agenda marrom)
Políticas Públicas Municipais – núcleo de direitos difusos Políticas Públicas organizadas em sistemas nacionais com atuação direta no âmbito local
ECA (Lei 8.069/90)
Consumidor (Lei 8.078/90)
LOAS (Lei 8.742/93),
Trânsito (Lei 9.503/97)
SUS 8.080/90
EC 14 (Educação)
Estatuto da Cidade (Política Urbana )/ Regularização Fundiária
Estatuto do Idoso
Acessibilidade
Licenciamento Ambiental
Mobilidade urbana
Mudanças Climáticas
MUDANÇA DE PARADIGMAS
• Políticas Públicas Permanentes
• Dever do Estado com a obrigação de criar estruturas para o atendimento
• Dever de Estado e não prerrogativa de Governo
Cidades Sustentáveis: temos um conceito jurídico?
Art. 2º, inc. I, (Estatuto da Cidade) – Lei Federal 10.257/01
“Garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações”
Cidades Sustentáveis
• Reconhecimento de um feixe de direitos que se inter relacionam e não se sobrepõem
• A densificação da ideia intergeracional
• O reconhecimento jurídico da pluralidade democrática e dos mais amplos âmbitos de direitos, pois na cidade é o “locus” onde os direitos se concretizam