aprender é formular hipóteses, ensinar é organizar provocações

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Vovô e seus netos merecem ver a uva

Nem método fônico, Nem construtivismo

Introdução

Exclusivamente método fônico, NÃO

Incompletudes do Construtivismo em Didática

A interação social nas aprendizagens

Fase discursiva e fase dialética das aprendizagens

Interação social pelas atividades culturais

Alfabetizando um milhão de colombianos

Profissionalizando professores

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Faz o MEC muito bem em rever os sistemas de alfa

betização utilizados nas escolas brasileiras. O que está

em uso, hoje, alfabetiza menos de 50% dos brasileiros, a

cada ano letivo. Impõe-se, entretanto, fazer uma revisão sé-

ria e abalizada cientificamente. Em primeiro lugar, é neces-

sário localizar qual é o alunado que não se alfabetiza, pois

há os que logram este objetivo. Quem, minimamente, está

envolvido com educação, não sabe que, em escolas particula-

res ou em escolas públicas freqüentadas por alunos oriundos

de classes médias com alguma trajetória intelectual, o índice

de alfabetização é praticamente 100%? Para ter-se, portan-

to, média nacional de menos de 50% de alfabetização é

porque em muitas escolas este índice beira os 30%. E onde

ocorre isto? Nas escolas públicas freqüentadas por crianças

de famílias de classes populares. Mais especificamente, de

famílias cujos pais estão dentre os 50 milhões de analfabe-

tos adultos deste nosso querido, mas triste país, quando se

pensa em aprendizagens escolares.

Para que alguém se alfabetize é preciso que ele se formu-

le problemas sobre o que é a escrita. Que ele se pergunte

sobre o que é ler e escrever. Ora, se no seu ambiente de vida

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não há livros, não há jornais, não há revistas, não há cartasque chegam e que saem, mas sobretudo não há leitores eescritores, isto é pessoas lendo e escrevendo quotidianamente,ele tem muito menos ocasião do que as crianças em cujascasas, o ler e o escrever são atos de rotina, de ser provocadoa se formular tais problemas.

O que ocorre quando uma criança, desde pequenina, con-vive com pessoas que lêem e escrevem, e com materiaisescritos? Ela percorre uma bela trajetória de hipóteses parase responder à instigante pergunta: o que vem a ser um con-junto de risquinhos que enchem os jornais, os anúncios, atela da TV, as revistas, os livros, as listas de palavras, mas,principalmente, o que vem a ser uma seqüência de traçosque dizem ser o seu nome?

Nesta trilha, ela conjectura explicações inteligentes, masbizarras e incompletas. A primeira delas é que escrita é omesmo que desenho. Escrever seria desenhar e ler seria in-terpretar desenhos com traços figurativos do que aquela es-crita se refere. A segunda, é que se escreve com sinais gráfi-cos já sem relação figurativa com o que está sendo represen-tado, mas sem nenhuma vinculação com a pronúncia da pa-

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lavra que se quer escrever. A terceira, é que o que se escrevetem a ver com a pronúncia, porém no seguinte sentido –cada sílaba oral da palavra é escrita com uma só letra. Assim,casa seria escrita com apenas duas letras, bicicleta comquatro. Somente num quarto momento é que o caminhanteque está aprendendo a respeito da magia das letras se dáconta de que não basta uma letra para cada vez que se abre aboca ao pronunciar uma palavra, quando se quer escrevê-la.Somente então é que ele descobre que cada som pronuncia-do tem uma letra correspondendo na escrita. Para passarpor estas hipótese não é preciso estar na escola. Basta quese esteja perto de muitos escritos e de pessoas que realizematos de ler e de escrever. Ora, este é o caso somente de crian-ças cujas famílias possibilitem este ambiente alfabetizador.Para estas crianças, ao ingressarem numa classe de alfabeti-zação o método fônico pode ser útil. Elas já estabeleceramuma vinculação fina entre a pronúncia dos sons e sua repre-sentação escrita. Para as que ainda transitam suposições maisprimitivas o método fônico não lhes fará nenhum sentido. Eestas são a imensa maioria dos alfabetizandos brasileiros,especialmente nas escolas públicas.

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Não se trata de defender este ou aquele método. Impõe-se, isto sim, ir ao encontro do processo de aprendizagem detodos e de cada aluno para que eles aprendam. Privilegiar ométodo fônico em escolas públicas para alunos que aindanão atingiram a compreensão do que a pronúncia tem a vercom a escrita é uma flagrante inadequação pedagógica porrazões bem óbvias.

A afirmação tupiniquim de que países desenvolvidos ado-tam um certo método não é argumento suficiente para queele seja bom em qualquer circunstância e nem mesmo paratoda a população dos ditos países desenvolvidos. A não apren-dizagem da leitura e da escrita por uma parte da população éfenômeno, infelizmente, de âmbito internacional. Em todosos países, há alunos que não logram se alfabetizar. São aque-les que não foram respeitados em seu processo de aprendi-zagem. Urge que superemos lucidamente questões de méto-do e que oportunizemos a entrada no mundo letrado a todofilhote de um homem e de uma mulher que está convivendoconosco neste milênio em sociedades para as quais uma desuas marcas definidoras é o uso desta construção estupendaque é a escrita.

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Nem Método Fônico,

nem Construtivismo

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Introdução

O Ministério da Educação anuncia que vai rever o

processo de alfabetização, discutindo a volta do “vovô

viu a uva”. Rever o que está sendo feito em matéria de alfa-

betização é muito oportuno face à ineficácia da escola brasi-

leira em ensinar a ler e a escrever. Ela produziu nos últimos

anos 50 milhões de analfabetos acima de 15 anos e a cada

ano, consegue menos de 50% de aprendizagem da leitura e

da escrita em classes iniciais do ensino fundamental. Esta

incompetência certamente contribuiu para gerar ainda mais

analfabetos adultos a cada ano que passa.

Rever o que vem sendo feito será ou não oportuno se for

para dar um passo em frente e não para retroceder, confron-

tando método fônico com construtivismo. Nem um nem ou-

tro trazem solução a este desafio. E pior ainda é o que grassa

no país, isto é, a mistura de modelos teóricos embasando as

práticas alfabetizadoras nas escolas.

Atrás de toda prática há um conjunto articulado de idéi-

as, quer dizer, uma teoria. Se esta for consistente a prática

apresentará bons resultados.Se ela não o for , os resultados

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serão pífios. Esta é uma das razões pelas quais somos tãoexímios e competentes na produção de analfabetos, come-tendo o crime de fechar as portas da cidadania a tantos com-patriotas.

Uma vez que está sendo colocada a questão da alfabeti-zação em torno ou do método fônico ou do construtivismo,impõe-se analisar um e outro, do ponto de vista científico,mesmo que a mistura de modelos seja ainda mais correnteque ambos e produza também efeitos muito deletérios.

Exclusivamente método fônico, NÃO

O método fônico parte do principio que os alfabetizandosque chegam à escola já estão todos alfabéticos, dentro daterminologia de Emilia Ferreiro. Isto é, eles já compreende-ram a vinculação entre escrita e som das letras. Porém, parachegar lá é necessário ter tido tantas experiências com escri-tos e com pessoas que lêem e escrevem que os tenham aju-dado a superar idéias tais como a de que desenho e escritasão o mesmo, de que se escreve com sinais gráficos, mas semarticulação com a pronúncia e que tenham superado que a

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relação entre pronúncia e escrita é de cada sílaba oral comuma letra.Cerca de 90% dos alunos de escolas públicas, vin-dos de famílias que tem entre seus membros, representantesdos 50 milhões de analfabetos adultos, chegam à escola an-tes de estabelecerem correlação entre som e letra. Por estarazão, exclusivamente método fônico para eles é inútil, umavez que lhes é inacessível lógica e psicologicamente associa-ção alfabética entre pronúncia e escrita.

Incompletudes do Construtivismo em Didática

Outrossim a aplicação didática do construtivismo a partirde Emilia Ferreiro no Programa de formação deAlfabetizadores do Mec (Ministério da Educação) no gover-no FHC - Profa - foi e é insuficiente e incapaz de ensinar atais alunos. Emilia Ferreiro, por sua estrita filiação a JeanPiaget, para quem o ser humano se desenvolve construindoconhecimentos diretamente através de seu contato com oreal, não incorpora nem a dimensão social nem a antropoló-gica que consideraram Vigotsky, Henri Wallon, Sara Painou Gérard Vergnaud. A base cultural que alimenta a com-

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preensão do mundo pelas pessoas humanas e a base socialque a dinamiza não são contempladas na perspectivaconstrutivista. Esta base cultural é definidora de qualquerdidática. para alunos que vem de situações de vida compouco ou pouquíssimo contato com a escrita.

Para os construtivistas a didática da alfabetização écentrada no trato com textos escritos, o que bastaria paraencaminhar os alunos para o domínio da leitura e da escri-ta. Para alunos de escolas públicas somente atividades emtorno de textos são insuficientes para levá-los à alfabetiza-ção, embora o texto seja central nesta trajetória. A organi-zação sistemática de provocações que incluem estudo depalavras e de letras, ao lado da abordagem de textos éparte integrante de uma didática para alfabetizar, sobretu-do o alunado vindo de camadas populares.

A interação social nas aprendizagens

Porem, mais do que isto: a perspectiva grupal das apren-dizagens que não tem lugar de destaque na visãoconstrutivista é essencialíssima. Esta perspectiva grupal in-

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clui desde a oportunização intencional de trocas entre os

alunos, entre os professores e os alunos, entre a classe esco-

lar e as riquezas culturais do seu meio e entre professores.

As trocas entre alunos implicam rigorosamente uma

nova estética na sala de aula, onde as filas são substituídas

por pequenos grupos na maior parte do tempo escolar .Es-

tes pequenos grupos denominados no pós-construtivismo

como grupos áulicos devem ser cuidadosamente

constituídos.Duas modalidades de constituição são úteis: a

primeira, de conformação heterogênea quanto aos esque-

mas de pensamento dos alunos relativamente à alfabetiza-

ção, fruto da explicitação de escolhas de colegas para estu-

dar mais proximamente, tanto na votação para determina-

ção de líderes como no convite para integrar o pequeno

grupo em aula; a segunda, em alguns momentos, a cada

semana, de conformação homogênea quanto aos esquemas

operatórios de pensamento dos alunos a respeito da escri-

ta. A exigência de consideração explicita e estratégica de fo-

mento à interlocução entre os alunos é uma decorrência de

dois tipos de intercambio que presidem as aprendizagens.

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Um deles, um intercambio vertical entre dois protagonis-tas da cena do aprender que se distinguem por sua compe-tência no pensar o objeto de aprendizagem, perfeitamenteidentificada na troca entre professor e aluno.Um outrointercambio que pode ser considerado como horizontal acon-tece entre parceiros,em igualdade de condições quanto àscompetências cognitivas, face ao objeto de aprendizagem,num dado momento .São as trocas entre colegas, os quaissão pares quanto ao patamar de competências.. Estes doistipos de intercâmbio presidem, por sua vez, dois momentosdistintos do aprender, a saber, as fases discursivas e as fa-

ses dialéticas dos processos inteligentes.A explicitação deambas tem a ver com a segunda natureza de troca didáticaque são as que ocorrem entre professor e aluno.Estas trocaspodem ser nitidamente enriquecedoras com o que no Geempa– Grupo de Estudos sobre Educação, Metodologia de Pesqui-sa e Ação – tomam a forma de uma aula-entrevista.A aulaentrevista são alguns ,momentos, ao longo do período leti-vo, em que o professor realiza um encontro particular comcada um dos seus alunos para detectar seus esquemas opera-tórios depensamento, relativamente ao campo conceitual que

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é o objetivo pedagógico perseguido no contrato escolar doperíodo em curso..Esquemas operatórios de pensamento éuma das noções-chave do pós-construtivismo, nascida comPiaget mas amplamente aprofundada por Gérard Vergnaud.Ele abriga de certo modo, as idéias de zona proximal de

desenvolvimento de Vigotsky a fecunda idéia de rede deHenri Wallon, a noção de níveis de Emilia Ferreiro e a fun-

ção da ignorância de Sara Pain, na trilha de sua basilarafirmação de que “todo o conhecimento é conhecimento doOutro”.Ao abrigar tais idéias não só se amplia de muito oconstrutivismo como a comunidade científica foi forçada areformulá-lo, a dar-lhe novas bases e a brindar-lhe um novoarcabouço estrutural, o qual leva o nome de pós-

construtivismo.”Outro”, por exemplo leva às idéias psicana-líticas de inconsciente e de desejo.Na consideração do “Ou-tro” se é levado à substituição dos instintos por aprendiza-gens, da natureza pelo cultural. Leva também à eliminaçãoda idéia de desenvolvimento quando se explica como cresceum ser humano. Leva-nos ao conceito de sujeito de cultura,ao mesmo tempo determinado e determinante do curso dahistória de suas próprias aprendizagens.E isto conduz a uma

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mudança radical no rumo das atividades docentes. O profes-sor deixa de ser um explicador para ser um organizador deprovocações.Aprender passa a ser formulação de problemaspara além de ser sua resolução e para muitíssimo além deser memorização de informações ou de elaborações prontas.

A aprendizagem é com efeito, uma construção seqüencialcomplexa que se assenta em esquemas operatórios de pensa-mento os quais funcionam por sistemas fechados, como asescadas a seguir:

Alfabético

Silábico

Pré-silábico 1

Pré-silábico 2

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...que caracterizam núcleos comuns de conhecimentos

e cujo tamanho do passo para ascender, em cada uma delas,exige uma competência apropriada. O professor passa a serum organizador das provocações para que cada um de seusalunos suba degraus de uma mesma escada e para que aofinal de um período letivo ele tenha condições intelectuaispara galgar os degraus da escada seguinte. Esta ascensão épessoal e intransferível , porém o conceito de pessoal embu-te intrinsecamente a dimensão social, uma vez que não so-mos seres singulares- somos seres plurais.Somos genetica-mente sociais. Para tal não só o professor precisa identificaras competências de cada aluno, como necessita formalizar aintimidade do seu compromisso com cada um deles, o que seconcretiza nas aulas-entrevistas. Elas produzem também ou-tros efeitos secundários interessantíssimos. Dentre deles apossibilidade de o número adequado, para bem ensinar, numaturma de alunos, pode ser bem maior do que o convencio-nalmente considerado. O trabalho em grupos áulicos tam-bém corrobora com este efeito, por conta das aprendizagensfavorecidas pelas trocas entre iguais isto é, entre colegas,sem a necessidade de intervenção direta do professor.

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Fase discursiva e fase dialética das aprendizagens

As fases discursivas e dialéticas da aprendizagem acon-

tecem , respectivamente quando um aluno permanece no

mesmo degrau ou quando passa de um para outro. A pas-

sagem de um degrau para outro é um momento mais delica-

do na caminhada aprendente, porque vivido como uma ex-

periência de conflito. O aluno tem que ser dar conta da

incompletude das idéias que até então, julgava válidas. É’

o que Sara Pain denomina de ignorâncias. Nestes momen-

tos as trocas entre pares são mais úteis e eficazes do que

uma intervenção do professor. Por isso é tão importante

que o professor identifique na aula-entrevista onde se en-

contra cada um de seus alunos no processo de aprendiza-

gem. Trata-se, com efeito de uma forma muito mais refina-

da de ser professor , porque muito mais científica do que a

convencional. Por isso mesmo, muito mais exigente do pon-

to de vista do preparo dos docentes.

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Interação social pelas atividades culturais

A incorporação da dimensão dramática ou cultural na prá-tica docente é mais uma variante da interlocução para asaprendizagens ou seja da interação social em sala de aula.Estaincorporação tem pelo menos três vetores, a saber:

1. A oportunização da participação em atividadesculturais socialmente desejáveis

2. A contextualização das dramáticas vividas pela classe.

3. A estética das merendas pedagógicas e do ambienteda sala de aula.

1. A oportunização da participação em atividades culturaissocialmente desejáveis representa uma inserção na vida maisampla do grupo humano onde está inscrita a escola. Se ir aescola significa uma deserção da vida coletiva que pulsa nasvizinhanças, a través da midia e das produções artísticas,esta escola empobrece ao invés de ampliar e abrir horizon-tes. Uma professora que isole seus alunos enquanto grupoaprendente, dos eventos significativos em sua comunidadeestá estereotipando e artificializando a construção deconhecimento.O sentido da lógica é a sua dramática, porque

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esta empresta emoção à objetividade do pensamento . Umalógica sem emoção é oca e por isso, triste.O que está ocor-rendo no mundo das artes, incluindo a música, a literatura, oteatro, a dança, os esportes, o cinema, os patrimôniosarquitetônicos e as artes plásticas e porque não a moda e aculinária precisam embasar o que se aprende na escola.Nestalinha , pode-se afirmar tranqüilamente que sem cultura nãose faz educação. Para além das aulas na sala, aulas literal-mente culturais precisam intercalar-se naquelas.

2) É um pré-requisito cultural embeber as provocações didá-ticas em contextos semânticos escolhidos a partir do queestá sendo vivido como significante pela turma. Isto implicavividos internos e externos ao grupo .Entende-se por vivi-dos internos o que emana da própria dinâmica didática. Porexemplo a ausência de um aluno à escola, o impacto do co-nhecimento dos lugares na escada dos níveis psicogenéticosapós uma aula-entrevista com todos os alunos, a escolha delíderes e a constituição de grupos áulicos, a realização de umpasseio, uma comemoração na escola, etc.. .Por vividos exter-nos ao grupo de aula entenda-se o nascimento do irmão deum aluno, a morte de um familiar deles ou mesmo de um

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animalzinho de estimação, um acontecimento político, umavitória ou derrota desportiva,....

Dentro desta perspectiva, textos,palavras ou letras traba-lhadas em aula serão tanto mais ensinantes quanto maiscontextualizadas semanticamente nestes universosdramáticos.Empresta-se magnificamente vincular um textoliterário, prosa ou poesia, com estes dramas existências quevivem os alunos.Toda arte explica a vida com a força daemoção que arrasta consigo.

3) A estética das merendas pedagógicas, do ambiente e dosmovimentos em sala de aula.

Comer juntos é um dos atos mais culturais no mundo,tanto que todas as religiões tem no centro de seus cultosuma refeição. Não aproveitar a merenda na escola como ati-vidade pedagógica é o maior desperdício ensinante.

O que significa este aproveitamento? A merenda peda-gógica tem também dois vetores – o que servir e comoservir.Pode se servir o já conhecido ou o novo.Pode-se repe-tir rotineiramente sempre as mesmas coisas ou ter a preocu-pação de alternar variando regularmente o que é servido.Pode-se servir pequena ou grande quantidade.

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O “como” servir é ainda mais rico pedagogicamente.

Todos estes aspectos socializantes e culturalizantes não são

essenciais ao construtivismo, como conseqüência de sua pers-

pectiva epistemológica. Entretanto, eles são fundantes de uma

didática que consegue ensinar a ler e escrever ao tipo de

aluno que a escola pública recebe em qualquer país do mun-

do e muito particularmente no Brasil. Esclareça-se bem o

que queremos dizer com este tipo de aluno das escolas pú-

blicas. Não se trata, absolutamente, de alunos com menor

condição de aprender do que alunos de classes medias ou

altas.Trata-se isto sim, de alunos com diferença no conjunto

de experiências relativamente a coisas escritas e a atos de

leitura e de escrita, porque vem de ambientes ainda com

muitos analfabetos adultos.Eles chegam portanto, na escola

com esquemas operatórios de pensamento para aquém da

visão alfabética e precisam de uma didática que leve isto em

conta,isto é, que considere sua bagagem social e cultural como

parte do modo de ensinar-lhes.

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Alfabetizando um milhão de colombianos

Felizmente, há uma resposta validada, uma forma de

proposta didática para servir a esta população, a qual é reco-

nhecida inclusive pelo Ministério da Educação de Colômbia,

que firmou convênio com o Geempa para formar

alfabetizadores que ensinem a ler e a escrever a um milhão

de colombianos.

Profissionalizando professores

Neste momento o foco central de pesquisa do Geempa éa formação de professores dentro desta nova formulação pós-construtivista. A sua eficácia para alfabetizar analfabetos estáfortemente comprovada no mais amplo universo situacional-crianças ou adultos, em redes públicas ou em iniciativasprivadas, em mais de treze estados brasileiros,nas cidades enos campo, em grandes e pequenas cidades.

A formação de professores é o que se impõe agora comurgência máxima, pois o grau de desprofessionalização des-ta categoria de trabalhadores é muito elevado. Salários bai-xos, ausência de um sistema nacional de ensino no país,

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predomínio da idéia de que ser professor é exercer um oficioou cumprir uma missão para o qual se nasce ou nãovocacionado e não professar um conjunto de conhecimentosinerentes às responsabilidades de garantir um produto soci-al da maior importância qual seja a construção de conheci-mentos indispensáveis para um cidadão do terceiro milênio.

É abominável o convívio com 50 milhões de analfabetosadultos, assim condenados a partir da generalizada freqüên-cia durante em média três anos à escola.

Urge revisar posição entre quem se diz ou se dizia deesquerda, extremamente reacionária de que “as classes po-pulares tem um saber próprio equivalente ao científico e que,portanto, não lhes faz falta aprender a ler e a escrever seeles conhecerem seus direitos de cidadão”. Ela condena mi-lhões à marginalização de uma fonte estupenda de poderque é a competência de se comunicar via letra escrita.Quemexerce uma atividade de pesquisa na produção de conheci-mento experimenta na pele o valor da escrita para forjar umpensamento construtor de soluções demandadas pelas con-tingências da vida do mundo. Quem não usufrui desta habi-lidade é dependente de quem dela desfruta, tendo que serconduzido pela mão de outros.

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Por outro lado, aprender, exige canalização de agressividade,pois só quem tem raiva da sua ignorância investe na sua supe-ração e só pode fazê-lo com a força desta energia que é aagressividade.Portanto, um ensino eficiente é um direcionadorde agressividade que impede a sua utilização para finalidadesanti-sociais, na esfera da violência .Uma boa escola é um vali-oso antídoto à violência.

Entretanto as sociedades tendem a se reproduzir, manten-do os privilégios de quem já os tem. Apostar e investir emensino não se coaduna com esta manutenção de privilégios.Já em 1919 Gramsci acusava tanto esquerda como direita denão terem propostas para a educação. Educação pra valer sópode ser assumida pelos que não pautam suas vidas pelas van-tagens dos lucros econômicos ou por ânsias de poder social epolítico.Vale o fato de que ainda existem estes e são muitos,mormente dentre o professorado. Cabe-nos inteligentementeorganizar saída para quadro tão desolador, na certeza de queé isso que vale a pena fazer como escolha que honre nossodesejo de ser gente é não mero vulto que nem sombra deixacomo rastro.

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