apostila de metalurgia versao white martins

91
CURSO DE CURSO DE METALURGIA DA SOLDAGEM METALURGIA DA SOLDAGEM Elaborada pelo Engenheiro M.Sc. Jeferson F. M. Costa Pertence a Paulo Ricardo da Silva Maranhão Promotor de vendas Corte & Solda Primeira Edição(Draft) Ano 2004 3

Upload: mario-fisga

Post on 18-Feb-2015

43 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

CURSO DECURSO DEMETALURGIA DA SOLDAGEMMETALURGIA DA SOLDAGEM

Elaborada peloEngenheiro M.Sc. Jeferson F. M. Costa

Pertence a Paulo Ricardo da Silva MaranhãoPromotor de vendas Corte & Solda

Primeira Edição(Draft)Ano 2004

3

Page 2: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Objetivo do curso

Fornecer conceitos básicos sobre metalurgia da soldagem dos aços carbono, baixa liga e inoxidáveis, além do alumínio e suas ligas, de modo a permitir que os participantes possam identificar os principais problemas metalúrgicos associados à soldagem desses materiais.

ConteúdoFundamentos da Metalurgia Física• Sistemas cristalinos• Difusão• Diagramas de equilíbrio• Diagrama Fe-C / Fe-Fe3C• Curvas de resfriamento (TTT e CCT)• Tratamentos térmicos

Metalurgia da Soldagem• Aspectos térmicos da soldagem• Zona fundida• Zona termicamente afetada• Controle do ciclo térmico na soldagem• Trinca a frio• Trincas a quente• Fissuração lamelar• Porosidade • Tensões e deformações na soldagem• Soldabilidade dos aços carbono e baixa liga• Soldabilidade dos aços inoxidáveis• Soldabilidade do alumínio e suas ligas

4

Page 3: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

METALURGIA DA SOLDAGEMMETALURGIA DA SOLDAGEM

11IntroduçãoIntrodução

O estudo da soldagem envolve vários fenômenos metalúrgicos – fusão, solidificação, difusão, precipitação, transformações no estado sólido, entre outros- que provocam modificações nas propriedades do material e podem produzir descontinuidades estruturais, além de modificar significativamente o estado de tensões reinante.. Através de alguns princípios metalúrgicos, é possível controlar essas alterações produzidas pela soldagem e evitar a falha prematura do material.

O estudo da metalurgia da soldagem é um campo específico, no qual se adapta os conceitos da metalurgia convencional ao universo da junta soldada. A metalurgia física é uma importante ferramenta no estudo da metalurgia da soldagem, e por essa razão, inicialmente será feita uma rápida revisão dos principais conceitos da metalurgia física pertinentes, para que em seguida eles possam ser aplicados no estudo da metalurgia da soldagem.

22Metalurgia FísicaMetalurgia Física

A metalurgia é a arte e a ciência da produção dos metais e ligas metálicas com a forma e as propriedades convenientes à sua utilização prática. Portanto, a metalurgia abrange desde a obtenção dos metais a partir de seus respectivos minérios, até o desenvolvimento de novas ligas com características especiais para a indústria aeroespacial. A metalurgia é dividida em ramos que estudam aspectos diferentes da natureza dos metais. A metalurgia física se ocupa do estudo das estruturas dos metais e suas ligas, com a finalidade de conceber e produzir as estruturas que conferem as melhores propriedades.

2.1 - Os Metais

Os metais são elementos químicos eletropositivos, em geral sólidos, brilhantes, bons condutores de calor e eletricidade. Devido a sua alta afinidade pelo oxigênio e enxofre, os metais são encontrados na natureza, na maior parte das ocorrências, em sua forma oxidada (óxidos e sulfetos). A transformação do minério (mineral rico no metal de interesse) em metal reduzido é uma operação que demanda grande quantidade de energia e um controle estrito das variáveis do processo.

Os metais são os materiais industriais mais empregados atualmente, principalmente pelo conjunto de suas propriedades, das quais pode-se destacar as suas propriedades mecânicas (ductilidade, tenacidade, resistência mecânica, etc.), bem como sua soldabilidade. Outro aspecto importante, é sua disponibilidade na natureza. Os metais podem ser empregados puros ou na forma de ligas metálicas. O aço (liga Fe-C) é o material metálico mais amplamente utilizado para fins industriais. Existem diversos tipos de aços que são produzidos pela indústria siderúrgica, a partir do minério de ferro (mineral rico em Fe2O3 (Hematita) e/ou Fe3O4 (Magnetita)). O processo de fabricação do aço é

5

Page 4: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

uma operação termoquímica realizada em duas etapas: a primeira no alto-forno para produzir o gusa (liga Fe-C com elevado teor de carbono) e a segunda para promover a redução do gusa ao aço nos conversores (figura 1).

Figura 1 – Fluxograma esquemático para a produção do aço

2.2 - Estrutura Cristalina dos Metais

Os metais se solidificam formando cristais, ou seja, um arranjamento regular e repetitivo de átomos nas 3 dimensões espaciais. Esse arranjo ordenado de átomos é chamado de reticulado cristalino, e é responsável por muitas das propriedades dos metais. As estruturas cristalinas mais comuns entre os metais são: • Cúbica de Corpo Centrado (CCC);• Cúbica de Face Centrada (CFC);• Hexagonal Compacta (HC).

A figura 2 apresenta a configuração das células unitárias (menor porção representativa do reticulado cristalino) desses três tipos de sistema cristalino.

Figura 2 – (A) Célula unitária do sistema Cúbico de Corpo Centrado, (B) Oito células CCC formando um reticulado cristalino (C), Célula unitária do sistema Cúbico de Face Centrada e (D) Célula unitária do sistema hexagonal compacto.

Pode-se observar na figura 2(B) um arranjamento de oito células unitária cúbicas de corpo centrado formando um pequeno reticulado cristalino. Nesse reticulado é fácil verificar que o átomo a assinalado na figura, participa das oito células unitárias. Portanto, quando se faz a contagem do número de átomos por célula unitária, o átomo a, assim como todos os outro sete átomos que se posicionam no vértice da célula unitária, são contados como 1/8. Dessa forma, numa célula unitária CCC existem 2 átomos (um que ocupa o centro da célula e oito átomos dos vértices que participam

6

Alto-forno

CoqueMinério de FerroFundentes

Conversor

Aço

Carga (matéria-prima)

Page 5: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

com 1/8 cada um = 1 + (8 * 1/8) = 2). Fazendo o mesmo raciocínio, chega-se a conclusão que na célula unitária do sistema cúbico de face centrada (CFC), o número de átomos por célula unitária é de 4 átomos (oito átomos dos vértices que participam com 1/8 cada um e seis átomos do centro de cada face que participam com 1/2 cada um = (1/8 * 8) + (1/2 * 6) = 4). Para a célula unitária do sistema hexagonal compacto, o número de átomos por célula unitária é igual a 6 (são doze átomos nos vértices que pertencem a seis células, dois átomos no centro das faces hexagonais que pertencem a duas células e três átomos no centro que só pertencem a célula unitária em questão = (1/6 *12) + (1/2 * 2) + (1 * 3) = 6).

A representação esquemática apresentada na figura 2 mostra a posição relativa dos átomos na célula unitária de forma mais fácil de visualizar. Entretanto, o modelo das esferas rígidas é mais precisamente representado por esferas sólidas, como bolas de bilhar, que se atraem formando os reticulados cristalinos. A figura 3 apresenta as células unitárias dos sistemas CCC e CFC, segundo o modelo das esferas rígidas. O sistema CFC possui planos compactos (plano no qual cada esfera tangencia todas as seis esferas vizinhas, criando uma condição de máxima compactação). O plano compacto que existe no sistema CFC torna-se mais evidente quando o átomo do vértice é retirado (figura 3B). A existência dos planos compactos explica a maior capacidade de deformação plástica e tenacidade dos metais que se cristalizam segundo este sistema, pois os mecanismos de deformação ocorrem preferencialmente e com menor demanda de energia nesses planos compactos. A tabela 1 apresenta a relação dos principais metais e suas respectivas estruturas cristalinas.

Tabela 1 – Tipo de estrutura cristalina para os principais metaisEstruturacristalina

Metais

CFCalumínio (Al), cobre (Cu), ouro (Au), chumbo (Pb), níquel (Ni), prata (Ag),

cobalto (Co)*, ferro (Fe)**

CCCcromo (Cr), ferro (Fe)**, molibdênio (Mo), nióbio (Nb), titânio(Ti)***,

tungstênio (W), vanádio (V), zircônio (Zr)***

HCcobalto (Co), magnésio (Mg), estanho (Sn), titânio(Ti)***, zinco (Zn), zircônio

(Zr)***

*O cobalto possui estrutura CFC a altas temperaturas, mas se transforma na estrutura HC a baixas temperaturas.**O ferro possui estrutura CCC próximo a temperatura de fusão e a temperatura ambiente, mas a temperaturas intermediárias sua estrutura é CFC.***O titânio e o zircônio possuem estrutura CCC a temperaturas elevadas e estrutura HC a temperaturas baixas.

7

Page 6: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 3 – Modelo das esferas rígidas para (A) Célula unitária do sistema CFC (B) Mesmo modelo sem a esfera do vértice superior, evidenciando o plano compacto (C) Célula unitária do sistema

CCC.

2.3 - Estrutura Policristalina

Os materiais industriais são formados por vários cristais ou grãos, como normalmente são designados os cristais. Cada grão possui a mesma estrutura cristalina que é típica do metal, mas a orientação do reticulado varia de um grão para outro. Na figura 4, tem-se uma chapa metálica, na qual se representa esquematicamente a granulação da sua seção transversal. No detalhe dessa mesma figura, pode-se observar que a orientação cristalográfica varia de um grão para o outro. Entre um grão e seu vizinho imediato existe uma região na qual o arranjamento da estrutura cristalina é perturbada devido a diferença de orientação que existe entre os grãos. Essa região que se delineia claramente é chamada de contorno de grão. Os contornos de grão formaram uma rede contínua por todo o metal. As propriedades mecânicas do metal dependem do tamanho de grão, da orientação dos grãos individualmente e da composição química do metal.

Os contornos de grão são regiões de alta energia devido a entropia provocada pela quebra da organização cristalográfica, sendo portanto, sítios preferenciais para ocorrência de reações de precipitação, transformação de fase e outros fenômenos metalúrgicos que serão estudados posteriormente.

Figura 4 – Estrutura policristalina de um material industrial, evidenciando o contorno de grão no detalhe.

8

Page 7: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Os contornos de grão são descontinuidades estruturais, no sentido que representam uma interrupção na regularidade do reticulado cristalino. Existem outras descontinuidades, que como os contornos de grão, são importantes na determinação das propriedades do material. As lacunas são descontinuidades estruturais que consistem na ausência de um átomo numa das posições do reticulado cristalino. As lacunas existem em quantidade apreciável no reticulado, sendo que sua quantidade depende essencialmente da temperatura. Quanto mais elevada é a temperatura, maior a quantidade de lacunas em equilíbrio no reticulado cristalino. As lacunas possuem um papel de destaque no mecanismo de difusão. A figura 5 apresenta um reticulado cristalino com a presença de lacunas.

No reticulado cristalino existem átomos dissolvidos, quer seja de impurezas que aparecem como conseqüência do processo de produção dos metais ou de fabricação de produtos metálicos, quer seja de elemento de liga que são introduzidos intencionalmente para desenvolver uma propriedade específica que o metal puro não apresenta. (formação de ligas metálicas). Os átomos dissolvidos são descontinuidades no reticulado cristalino que provocam distorção na rede. Essa distorção na rede cristalina é responsável pelo aumento da resistência mecânica e dureza das ligas metálicas em relação ao metal puro.. Esses elementos químicos dissolvidos na matriz são solutos de uma solução sólida, na qual o solvente é o metal-matriz. O soluto se dissolve no reticulado cristalino do metal puro de duas formas:

• Elemento substitucional – forma uma solução sólida substitucional e ocorre quando os átomos de soluto substituem os átomos do metal nas posições do reticulado cristalino. Em geral, a solução sólida substitucional ocorre quando o diâmetro atômico do soluto é próximo a do solvente. A figura 5(A) ilustra a representação esquemática desse tipo de solução sólida. Exemplo desse tipo de solução sólida é o sistema Cu-Ni e Au-Ag.

• Elemento intersticial – forma solução sólida intersticial e ocorre quando os átomos de soluto são pequenos em relação ao metal da matriz e se posicionam nos espaços vazios entre os átomos do reticulado cristalino da matriz metálica. A figura 5(B) ilustra esquematicamente esse tipo de solução sólida. Exemplo desse tipo de solução sólida é a solubilização de pequenos teores de C, N, B, O e H2 intersticialmente no Fe e outros metais. É importante observar que, em geral, as ligas possuem tanto os elementos intersticiais como os substitucionais dissolvidos, simultaneamente.

Figura 5 - Descontinuidades estruturais: lacunas, átomos intersticiais e átomos substitucionais.

Outra importante descontinuidade estrutural é a discordância. Esta consiste na existência de um plano de átomos que é subitamente interrompido (semiplano). As discordâncias são importantes

9

Átomo intersticial

Átomo de solvente

Átomo substitucional

Lacuna

Page 8: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

para explicar o mecanismo de deformação plástica, ou seja, as deformações permanentes que acontecem nos materiais metálicos. A figura 6 apresenta o arranjo atômico num plano normal a uma discordância em aresta.

Figura 6 - Representação esquemática de um arranjo cristalino com discordância em cunha.

2.4 - Difusão

A difusão é um processo termicamente ativado (é acelerado pelo aumento da temperatura) no qual os átomos se movimentam no reticulado cristalino. Esse fenômeno é particularmente importante nas soluções sólidas intersticiais e substitucionais, pois permite a movimentação dos átomos de soluto na matriz metálica, permitindo sua efetiva redistribuição. A difusão é mais rápida nos contornos de grão do que no interior dos cristais. A velocidade de difusão na superfície livre é ainda maior que nos contornos de grão. Esse fato é devido a existência de estruturas mais abertas nos contornos de grão e nas superfícies livre, havendo portanto, maior facilidade para a movimentação dos átomos. A difusão de átomos intersticiais é mais fácil que a dos átomos substitucionais, pois a movimentação dos primeiros ocorre de entre espaços intersticiais, que não dependem de lacunas.

A força motriz para o processo difusional é a variação de composição química. Quando a concentração de soluto varia gradualmente na matriz, estabelece-se a condição para que haja a difusão, no sentido de distribuir homogeneamente o soluto pela matriz metálica. Quanto maior for a temperatura, maior será a vibração dos átomos (energia cinética), maior será a quantidade de lacunas (que facilitam o mecanismo de migração de átomos), maior será o espaçamento entre os átomos do reticulado cristalino, e portanto, mais efetivos serão os mecanismos de difusão.

A difusão é um dos fenômenos metalúrgicos mais importantes, pois é através deste processo que os átomos se movimentam na estrutura para se redistribuírem e reagirem, transformando-se em fases com propriedades, dimensões e morfologia completamente diferentes. O controle do processo difusional é feito através do controle da temperatura e do tempo a que o material é submetido a um determinado intervalo de temperatura. A inibição do processo difusional para evitar transformações indesejadas, pode ser feito da mesma forma, ou seja, não permitindo que o material permaneça por um tempo suficientemente grande na temperatura na qual as reações acontecem (controle da velocidade de resfriamento, por exemplo).

2.5 – Solidificação

No estado líquido, os átomos que compõe o metal não apresentam ordenação como a do reticulado cristalino, o arranjamento é amorfo como o da água e do vidro. Quando a temperatura do metal

10

Page 9: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

líquido se aproxima da temperatura de solidificação, partículas sólidas designadas de núcleo, começam a se formar em sítios preferências, conforme é mostrado na figura 7A. Nessas partículas sólidas, os átomos se organizam conforme a estrutura cristalina típica do metal. Nos metais puros, a transformação de fase líquido/sólido ocorre a temperatura constante, enquanto que nas ligas metálicas, a transformação de fase ocorre normalmente, numa faixa de temperatura denominada intervalo de solidificação.

Os metais se solidificam formando uma estrutura que cresce preferencialmente segundo direções cristalográficas específicas. Essa estrutura com crescimento orientado recebe a designação de dendrita devido a sua semelhança com ramos de árvores (dendron, em grego). A solidificação na prática ocorre através de um processo de nucleação (heterogênea) e crescimento de cristais devido ao gradiente térmico.

A figura 7(B) mostra a continuação do processo de solidificação com o crescimento dos núcleos que se transformam em grãos. A solidificação termina quando todo o metal líquido se transforma em metal sólido (figura 7(C)). A estrutura obtida diretamente do processo de solidificação, como a das peças fundidas, é grosseira e conhecida como estrutura bruta de fusão.

O refinamento dessa estrutura bruta de fusão é conseguido com o tratamento termo-mecânico, imposto ao produto semi-acabado fundido (lingote, por exemplo), com o objetivo de conferir forma, dimensões e propriedades mecânicas apropriadas . A figura 8 mostra esquematicamente a modificação estrutural provocada pelo processamento termo-mecânico em um lingote fundido.

Figura 7 – Etapas do processo de solidificação: (A) Formação dos primeiros cristais (B) Formação dos grãos colunares (C) Final da solidificação.

11

Page 10: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Etapas sucessivas do processo de laminação

Lingote(estrutura bruta de fusão)

Figura 8 – Modificação da estrutura dendrítica provocada pela laminação

Entretanto, as peças que são empregadas na condição como fundida podem apresentar a formação de 3 regiões com características bem distintas: zona coquilhada, zona de crescimento colunar e zona de crescimento equiaxial. A figura 9 apresenta o aspecto da estrutura bruta de fusão de uma peça fundida.

Figura 9 - Seção transversal de uma peça fundida identificando as três zonas de solidificação.

12

Page 11: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Durante a solidificação dos metais, tanto na soldagem como na fundição, alguns aspectos são particularmente importantes. O primeiro aspecto é que a solubilidade de gases e impurezas na massa líquida é maior que no sólido. Desta forma, durante a solidificação ocorre a segregação destes produtos do sólido na direção do líquido. Os principais efeitos causados pela segregação dessas impurezas são a formação de poros, trincas e o comprometimento das propriedades mecânicas.

A contração da massa metálica durante a solidificação é outro efeito significativo, pois no caso da fundição, ela produz variação dimensional entre o molde e a peça fundida. Devido ao resfriamento diferencial, tensões internas significativas são geradas. Esses fatos junto com a segregação de impurezas explicam a recomendação de não introduzir cantos vivos em peças fundidas. A figura 10 mostra que nos cantos vivos há uma grande tendência ao alinhamento das impurezas na bissetriz do ângulo reto, o que aliado às tensões residuais elevadas, promovem uma grande tendência à fissuração.

Figura 10 –Tendência à fissuração no canto vivo de peças fundidas

2.6 - Ligas Polifásicas

As propriedades do metal ou liga metálica dependem da sua composição química, tamanho e morfologia dos grãos e dos constituintes que se formam como resultado do processamento termo-mecânico. Esse conjunto de atributos composto pela morfologia e tamanho de grão, assim como os constituintes presentes, formam a microestrutura do material, que é responsável pelas suas propriedades físicas e mecânicas. Portanto, a microestrutura é determinada pela composição química do material e pelo seu histórico termo-mecânico.

Os átomos adicionados ao reticulado cristalino do metal matriz, normalmente não se dissolvem em qualquer proporção nessa estrutura. Em geral, existem limites de solubilidade para cada espécie atômica, que normalmente variam com a temperatura. Portanto, a adição de teores de elementos de adição acima desses percentuais irá promover a formação de uma segunda fase, rica em soluto. A microestrutura da liga passará então, a ser composta por grupos atômicos mesclados, ou seja , que possuem estruturas cristalinas diferentes. Esse tipo de liga é conhecido como liga polifilásica , sendo que cada tipo de estrutura cristalina diferente é denominada como uma fase diferente. Se a liga for lixada e polida adequadamente, e posteriormente atacada com um reagente químico apropriado, essas diferentes fases poderão ser visualizadas ao microscópio com ampliações de 50X a 2000X. A técnica de estudar a microestrutura dos metais através de amostras adequadamente preparadas é conhecida como metalografia. Esse estudo é muito importante, pois permite

13

Page 12: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

estabelecer a relação entre as propriedades dos metais e suas ligas com a sua microestrutura. A figura 11 apresenta dois exemplos de ligas polifásicas.

Figura 11 – Microestrutura de ligas polifásicas: (A) aço carbono e (B) Liga Alumínio-Silício

A maioria dos metais e ligas comerciais consiste de um elemento básico (solvente) e a adição de pequenas quantidades de outros elementos (solutos). Os solutos podem ser adicionados intencionalmente para desenvolver alguma propriedade específica ou ser resíduo do processo de fabricação (impurezas). As ligas metálicas podem ser monofásicas ou polifásicas, sendo que cada fase possui uma fase cristalina característica, e conseqüentemente, suas propriedades.

Os efeitos térmicos e mecânicos da soldagem, podem alterar a microestrutura, porém as modificações ficam confinadas a uma região do metal de base próximo à solda. As mudanças metalúrgicas que podem ocorrer nessa região, conhecida com Zona Termicamente Afetada (ZTA), produzem um efeito pronunciado sobre o desempenho da estrutura soldada. Vários dos fenômenos que afetam as propriedades mecânicas de uma liga, tanto a baixas temperaturas como nas temperaturas elevadas, ocorrem no contorno de grão, onde o arranjamento de átomos é irregular. Devido à presença de muitas lacunas e de irregularidades no reticulado cristalino, a distância entre átomos é maior que o normal, permitindo que os átomos se movimentem com maior facilidade. O processo difusional ocorre mais rapidamente nos contornos de grãos que no interior, e por essa razão, as transformações de fases, a segregação e todos os demais fenômenos que acontecem assistidos pela difusão ocorrem preferencialmente nos contornos de grãos.A segregação de soluto e impurezas para os contornos de grãos pode levar a formação de fases que afetam negativamente as propriedades do material, pela redução da ductilidade, aumento da susceptibilidade à fissuração durante a soldagem ou tratamento térmico, ou redução da resistência à corrosão. A própria variação no tamanho de grão da zona termicamente afetada produzida pelo aporte de calor da soldagem, é por si só, um efeito indesejado, pois o tamanho de grão impacta diretamente nas propriedades do material. Em baixas temperaturas, quanto menor o tamanho de

14

Page 13: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

grão, maior a resistência mecânica e a resistência ao impacto. Em temperaturas elevadas, o material de granulação grosseira apresenta melhor resistência mecânica que o de granulação fina.

2.7 - Transformação de Fases

A alotropia é o fenômeno que ocorre em alguns metais, que permite que eles modifiquem suas estruturas cristalinas quando aquecidos acima de uma determinada temperatura, denominada como “temperatura crítica”. No caso do ferro, sua transformação alotrópica é apresentada na figura 12. Outros metais como urânio, hafnium, titânio, zircônio e cobalto também apresentam transformações alotrópicas. A transformação alotrópica é uma transformação de fase, de modo que nos metais puros ela acontece a temperatura constante, como pode ser observado na figura 12(B) para o caso do ferro. A adição de elementos de liga, a variação na taxa de resfriamento e a presença de tensões influenciam a temperatura na qual a transformação de fase ocorre.

As ligas metálicas, formadas pela associação de dois ou mais metais (componentes da liga),usualmente, fundem e solidificam numa faixa de temperatura (com exceção das ligas eutéticas, que fundem e solidificam a uma temperatura constante). As transformações de fase no estado sólido, normalmente, também ocorrem numa faixa de temperatura.

Figura 12 – Alotropia do Ferro (A). Curva de resfriamento mostrando a transformação de fase (alotrópica) do ferro puro.

2.8 - Diagrama de Equilíbrio de Fases

As transformações metalúrgicas como a solidificação e as mudanças de fases são mais bem ilustradas através do diagrama de equilíbrio de fases. Esse gráfico apresenta as fases em equilíbrio para cada temperatura e composição de liga. O termo “equilíbrio” significa que, para uma determinada condição de temperatura e pressão, permite-se a evolução do sistema para uma posição estável. A análise do diagrama de equilíbrio de um dado sistema permite a determinação das fases presentes e a percentagem de cada uma delas para várias composições de liga a uma dada temperatura. Os diagramas de fase também fornecem informações acerca do ponto de fusão, solubilidade, e mudanças de fases que tendem a ocorrer com a variação da composição e/ou temperatura. Os diagramas de fases também são importantes ferramentas na análise metalográfica de soldas, uma vez que fornecem informações sobre a microestrutura que seria obtida em condições de equilíbrio. Entretanto, devido as altas velocidades de resfriamento que são próprias do processo

15

Page 14: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

de soldagem, a microestrutura da solda, em geral, difere daquela que seria obtida sob condições de equilíbrio.

Como a maioria dos diagramas de equilíbrio disponíveis é baseado em sistemas binários (dois componentes), eles fornecem apenas uma descrição aproximada das ligas comercias; que possuem mais que dois componentes e alcançam condições de equilíbrio apenas a altas temperaturas. Os diagramas de equilíbrio podem ser construídos para sistemas contendo mais que dois metais, mas estes diagramas são complexos e de difícil interpretação. Apesar destas limitações, os diagramas de equilíbrio de fase são a melhor técnica para estudar a maioria dos sistemas de liga.

Na figura 13 é apresentado o diagrama de equilíbrio de fase do sistema Cu-Ni, que é bastante simples. Neste sistema binário, observa-se que os dois elementos apresentam completa solubilidade um no outro em todas as proporções, em todas as temperaturas, tanto no estado líquido quanto no estado sólido. Como pode ser observado nessa figura, os diagramas de equilíbrio de fases são convencionalmente desenvolvidos com teor de soluto no eixo horizontal e a temperatura no eixo vertical. Na extremidade esquerda do diagrama está representada a liga 100% Ni, enquanto que na extremidade direita está a liga 100% Cu.

Figura 13 – Diagrama de equilíbrio de fases para o sistema Cu-Ni.

No diagrama de equilíbrio de fase da figura 13, a linha A delimita a temperatura acima da qual todas as ligas estão completamente no estado líquido. Essa linha é denominada “liquidus”, acima desta temperatura , a única fase presente é metal líquido. A curva B delimita as temperaturas abaixo da qual todas as ligas encontram-se completamente no estado sólido. Essa temperatura é designada “solidus”. Todas as ligas no estado sólido desse diagrama são solução sólida homogêneas (monofásica), pois o cobre e o níquel são completamente solúveis um no outro, em todas as proporções.A liga 30% Cu – 70% Ni tem grande importância comercial e permanece sólida até 1330°C, a partir desta temperatura a liga começa a fundir, tornando-se completamente líquida a 1365ºC. Nas regiões entre as curvas A e B, as fases sólidas e líquidas coexistem. Diferente dos metais puros, a maioria das ligas funde e solidifica numa faixa de temperatura . Neste sistema , apenas o cobre puro e o níquel puro fundem e solidificam a temperatura constante.

16

Page 15: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

A regra da alavanca pode ser aplicada ao diagrama de equilíbrio de fases com objetivo de obter informações importantes sobre o processo de solidificação. Quando essa regra é utilizada em diferentes níveis de temperatura na faixa de solidificação, pode-se demonstrar que a composição química da fase sólida no intervalo de solidificação modifica conforme a temperatura cai. Portanto, quando as primeiras dendritas (cristais com forma de pequenas árvores) se formam pelo resfriamento lento da liga fundida (condições de equilíbrio), sua composição muda e elas são mais ricas no metal com maior ponto de fusão do que o sólido formado a menor temperatura. Os materiais podem apresentar uma estrutura heterogênea se não forem submetidos a um tratamento térmico para homogeneização de sua composição química.

A figura 14 apresenta um exemplo de aplicação da regra da alavanca para um sistema composto pelos componentes hipotéticos “A” e “B”. Quando a liga líquida composta por 60% do metal A e 40% do metal B é resfriada até o ponto indicado pela letra T na linha tracejada vertical, a regra da alavanca é implementada traçando-se uma linha horizontal passando pelo ponto T, desde a linha “Liquidus” até a linha “Solidus”. No ponto onde a linha horizontal intercepta as linhas “Liquidus” e “Solidus”, traça-se linhas verticais para se determinar a composição do líquido e do sólido formados, respectivamente. Assim, a quantidade de sólido e de líquido remanescente à temperatura T pode ser calculada pela proporção do segmento XY. A porcentagem de fase sólida é indicada pelo segmento XT, enquanto que a porcentagem de líquido é determinada pelo segmento TY.

Figura 14 – Diagrama de equilíbrio para o sistema A-B ilustrando a aplicação da regra da alavanca.

Percentual de líquido = TY XY

Percentual de sólido = XT XY

A composição do sólido formado na temperatura T é obtida diretamente pela coordenada do ponto Y (aproximadamente 68%B e 32%A). Enquanto que a composição do líquido é indicada pela coordenada do ponto X (aproximadamente 82%A a 18%B).

O sistema prata-cobre possui um diagrama de equilíbrio de fases mais complexo. Esse diagrama é apresentado na figura 15 e é bastante utilizado no desenvolvimento de ligas para serem aplicadas em brasagem. A fase sólida existe como fase única (monofásica) em duas regiões do diagrama e como duas fases em outra região (bifásica). A fase rica em prata é designada como alfa (α ), enquanto que a fase rica em cobre é denominada beta (β ). As duas fases são CFC, porém suas

17

Page 16: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

composições químicas e parâmetro de rede (tamanho de célula unitária) são diferentes. Na região entre as linhas “Solidus” e “Liquidus”, a fase líquida está em equilíbrio com a fase α ou β . Finalmente, a região designada por α + β contém grãos de Alfa e de Beta.

Figura 15 – Diagrama de equilíbrio de fases para o sistema Ag-Cu

Na figura 15, a linha que separa as regiões na qual existe a fase β e a fase α + β , representa o limite de solubilidade da prata no cobre. A solubilidade aumenta com o aumento da temperatura. Essa característica, que é comum a vários sistemas de liga, torna possível para algumas ligas o endurecimento por precipitação (os fundamentos dessa técnica serão discutidos posteriormente).

Esse diagrama de equilíbrio de fases, que apresenta uma reação eutética, pode ocorrer quando os dois componentes de uma liga binária possuem solubilidade parcial. O eutético é uma mistura física de duas ou mais fases. O número de fases é igual ao número de componentes da liga. Ligas com a composição eutética solidificam a uma temperatura constante, como as substâncias puras. Entretanto, o eutético é constituído por duas fases que se alternam, formando um constituinte lamelar.

18

Page 17: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

2.9 - Comportamento Mecânico dos Materiais Metálicos

Os materiais metálicos respondem de forma distinta aos diferentes tipos de carregamento mecânico. Portanto, é importante identificar e quantificar o tipo de carregamento a que o material está submetido quando em serviço, para que se possa selecionar e dimensionar o material corretamente. Os tipos de carregamento mecânico elementar são apresentados na figura 16. Em geral, em condições de serviço, os carregamentos encontrados são associações de dois ou mais tipos de carregamento elementar.

Figura 16 – Tipos de carregamento elementar.

Outro aspecto importante com relação ao carregamento mecânico que influencia no comportamento do material é a taxa de carregamento, ou seja, a velocidade segundo a qual os esforços mecânicos são aplicados. Essencialmente pode-se diferenciar o carregamento estático do carregamento dinâmico. O carregamento estático é aquele no qual o esforço mecânico é aplicado progressivamente, com baixa velocidade, até atingir o valor da carga máxima. No caso do carregamento dinâmico, o esforço é aplicado de forma abrupta, atingindo rapidamente seu valor máximo. A taxa de carregamento pode modificar substancialmente a resposta do material à solicitação mecânica. Quando o carregamento é feito lentamente, o material tem tempo para acomodar as deformações produzidas pelo esforço mecânico. Entretanto, quando a velocidade de carregamento aumenta, alguns mecanismos de deformação são inibidos e o material pode experimentar uma mudança de comportamento. Efeito semelhante é produzido pelo abaixamento da temperatura que também pode restringir a capacidade de deformação plástica dos materiais.

Os metais apresentam capacidade de deformação elástica, ou seja, enquanto a solicitação mecânica é mantida aplicada sobre o material, este apresenta um valor de deformação que é proporcional a força aplicada. Quando o esforço mecânico é retirado, a deformação desaparece. Essa capacidade de se deformar elasticamente é observada até um determinado valor de carga, a partir do qual, mesmo quando o carregamento é retirado o material continua a apresentar um valor residual de deformação (deformação plástica).

O gráfico da figura 17 apresenta uma curva associando os valores de força de tração (eixo vertical) com os valores de variação de comprimento no eixo horizontal (∆ L). O comprimento inicial do corpo de prova é L0 e quando se aplica um esforço trativo igual a F1, observa-se que o comprimento do corpo de prova aumenta para L1. Assim sendo, o alongamento relacionado a força F1 foi ∆ L1= L1-L0. Aumentando-se progressivamente a força e medindo o valor do alongamento respectivo, chega-se a curva traçada na figura 17. Nessa curva observa-se uma parte inicial da curva que é linear, ou seja, a força é proporcional ao alongamento. Esse comportamento linear corresponde à região de comportamento elástico, na qual o alongamento desaparece com a retirada

19

Page 18: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

da força. A partir de um determinado ponto do gráfico, o material passa a apresentar deformação plástica (permanente) e a relação F x ∆ L deixa de ser linear.

Figura 17 – Diagrama Força x Alongamento para materiais metálicos.

O gráfico apresentado na figura 17 assume uma importância ainda maior, quando ao invés da força no eixo vertical se introduz o conceito de tensão, que é representada pela letra grega sigma (σ ). A tensão é genericamente definida como a resistência interna de um corpo a uma força externa aplicada sobre ele, por unidade de área (tensão= σ = Força / Área). No caso do gráfico levantado com valores de força, toda vez que há variação na seção transversal do corpo de prova, o valor da força para provocar o mesmo efeito se modifica. Quando o gráfico é levantado com os valores de tensão, observa-se que se obtém o mesmo efeito independente da seção transversal do corpo de prova. No eixo horizontal é comum se plotar os valores de deformação, representada pela letra grega épsilon (ε ), que é dada pela relação ε = ∆ L/L0. Um aspecto importante é que como no ensaio de tração, assume-se que a seção transversal do corpo de prova é constante durante o teste, os gráficos F x ∆ L e σ x ε , possuem a mesma forma.

A teoria de Hooke explica a relação linear entre a tensão e a deformação (σ = E ε ) e introduz uma constante E denominada “Módulo de Elasticidade” ou de “Young”. As unidades de tensão mais utilizadas são: o Pascal (Pa) que é a unidade do Sistema Internacional (SI); a libra por polegada quadrada (psi) que é a unidade do sistema inglês e o kgf/mm2 que é uma unidade prática. A relação de correspondência entre essas unidades é a seguinte: 1MPa = 106 Pa = 145psi.

A figura 18 (A) apresenta um gráfico σ x ε típico para materiais metálicos submetidos ao ensaio de tração. Na região linear, o material possui comportamento elástico e a partir do ponto que a curva começa a não se comportar mais linearmente, o material apresenta comportamento elasto-plástico (as deformações apresentam componentes elástica e plástica). Na figura 18(B) são plotados dois diagramas σ x ε , um que representa o comportamento a tração de um material dúctil e outro que se comporta de forma frágil. O material dúctil é aquele que possui uma significativa capacidade de se deformar plasticamente, portanto, no seu gráfico observa-se uma região elasto-plástica significativa. O material frágil é aquele que praticamente não apresenta nenhuma ou baixa capacidade de se deformar plasticamente. Portanto, no gráfico do material frágil, a região elasto-plástica é nula ou muito pequena, pois o material atinge valores de ruptura antes de haver deformação plástica significativa.

20

Page 19: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

O escoamento é a transição entre os regimes elástico e elasto-plástico. É o nível de tensão a partir do qual observa-se valores significativos de deformação plástica. Em alguns materiais o escoamento aparece na forma de um patamar no diagrama tensão x deformação. Nos materiais nos quais não há escoamento nítido (patamar de escoamento) é estabelecido um valor convencional de deformação plástica para caracterizar o escoamento. A tensão de escoamento ou limite de escoamento é a propriedade utilizada nos cálculos e dimensionamentos mecânicos por ser de mais fácil determinação que o limite elástico. A figura 19 ilustra os dois tipos de escoamento observados nos diagramas tensão x deformação de materiais metálicos.

Se durante um teste de tração, após o material ter ultrapassado o limite de escoamento, ao invés de continuar a aumentar o nível de carregamento, se efetuar o descarregamento, se verificará um comportamento como o mostrado na figura 20. Ao atingir o ponto A, se o carregamento for sendo retirado gradualmente, o descarregamento será efetuado pelo segmento AB, de modo que quando a tensão for zero, corresponderá no gráfico ao ponto B. Isso significa que a parcela da deformação total (segmento OC) que corresponde a deformação plástica (que permanece) é o segmento OB, enquanto que o segmento BC corresponde a parcela da deformação elástica, pois ela é recuperada quando o esforço é retirado.

Patamar de Escoamento Limite de escoamento convencional

Figura 19 – Limite de escoamento para materiais metálicos

21

Comportamento dúctil x frágilRegião de

comportamento elástico

Região de comportamento elasto-plástico

Page 20: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 20 – Ciclo de carregamento e descarregamento num ponto do gráfico de tração

No ciclo de carregamento e descarregamento pode-se observar um efeito importante da deformação plástica que é o encruamento. O encruamento é o aumento da dureza e do limite de escoamento por deformação plástica. Na figura 21 está ilustrado um ciclo de carregamento e descarregamento a partir de um ponto na região elasto-plástica do material. No carregamento ao se atingir o ponto A, já houve deformação plástica e se for efetuado o descarregamento, esse acontecerá seguindo a linha tracejada (paralela ao trecho linear do gráfico). No ponto B do gráfico o material está completamente descarregado. Se o material for novamente submetido ao ciclo de carregamento, este se dará agora , seguindo o segmento BA, de modo que o material só entrará em novo escoamento quando atingir o ponto A.

Figura 21 – Ciclo de carregamento e descarregamento no ensaio de tração, evidenciando o efeito de encruamento.

22

A

A

B CO

ε (%)

σ

ε plast

ε elast.

ε elast. - componente elástica da deformação totalε plast- componente plástica da deformação total

σ

ε (%)

B

Page 21: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

No ensaio de tração, normalmente são determinadas as seguintes propriedades do material:

Limite de Resistência Mecânica = σ R = Fmax./A0

Limite de Escoamento = σ e = Fesc./A0 Alongamento percentual = A(%) = Lf - L0 / L0

Estricção percentual = Z(%) = A0 - Af / A0

O ensaio de tração é um dos principais testes para determinação das propriedades mecânicas dos materiais metálicos. Entretanto, quando há a necessidade de se avaliar o efeito da temperatura ou de altas taxas de carregamento sobre as propriedades do material, o ensaio de tração é muito limitado. A tenacidade foi conceituada inicialmente como a capacidade do material de absorver energia até a sua ruptura. No diagrama tensão x deformação, a área sob a curva é uma avaliação da quantidade de energia absorvida até a fratura em condições de carregamento estático. Mas essa condição não é a mais restritiva, sob carregamento dinâmico e a baixas temperaturas a severidade é muito maior. O ensaio de impacto que utiliza um pêndulo para romper corpos de prova, como os mostrados na figura 22, permite avaliar o comportamento do material sob carregamentos dinâmicos e a baixas temperaturas. Neste ensaio observa-se que com o abaixamento da temperatura, alguns materiais apresentam o fenômeno conhecido como transição dúctil – frágil, ou seja, a partir de uma determinada temperatura o material deixa de se comportar de forma dúctil para apresentar comportamento frágil. Na figura 22 observa-se um exemplo da curva de transição de um aço carbono. Atualmente, o conceito de tenacidade evoluiu e está relacionado com a capacidade do material para resistir a propagação de uma trinca.

Aspecto Macroscópico de Fratura

Figura 22 (a) - Aspecto macrográfico da fratura dos corpos de prova de impacto.

23

A0=seção transversal inicial do corpo de provaFmax = Força máxima no testeFesc = Força no escoamentoLo = Comprimento inicial (base de medida)

Page 22: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Curva de Transição Dúctil / Frágil

Figura 22 (b) - Curva de transição dúctil / frágil.

2.10 - Efeitos de deformação e dos Tratamentos Térmicos sobre as Propriedades dos Metais

A deformação plástica e os tratamentos térmicos produzem efeitos diversos sobre as propriedades mecânicas e resistência à corrosão do material. A deformação plástica e os tratamentos térmicos podem ser realizados juntos ou separadamente, dependendo do efeito desejado sobre as propriedades do material.

Quando os metais são deformados plasticamente (laminação ou forjamento, por exemplo) a temperatura ambiente, algumas modificações microestruturais acontecem. Cada grão deve modificar sua forma para que a deformação total ocorra. Conforme a deformação continua, os grãos se tornam mais duros, tornando mais difícil as deformações posteriores. Este fenômeno é conhecido como Encruamento.

O trabalho a frio envolve a deformação plástica do metal com o intuito de produzir mudança na forma (conformação mecânica) e melhorar as propriedades mecânicas à baixa temperatura. O efeito do trabalho a frio sobre a resistência mecânica e ductilidade de um metal está ilustrado na figura 23(A). Quando um metal é deformado abaixo da temperatura crítica, sua dureza e resistência mecânica aumentam gradualmente, ao passo que a ductilidade diminui. As propriedades originais do metal podem ser totalmente ou parcialmente recuperadas por tratamento térmico (recozimento) conforme mostrado na figura 23(B).

24

Page 23: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 23 – (A) Efeito do trabalho a frio sobre a resistência mecânica e ductilidade do aço. (B) Efeito do tratamento térmico sobre as propriedades do aço submetido ao trabalho a frio.

As microestruturas de aços com média deformação, altamente deformado e submetido ao alívio de tensões são mostradas nas figuras 24 (A), (B) e (C), respectivamente. Vários fenômenos ocorrem se o mesmo metal é trabalhado moderadamente (figura 24(A)) ou severamente (figura 24(B)) e então, aquecido a temperaturas progressivamente maiores. A temperaturas de até aproximadamente 200ºC, a tensão residual decresce levemente, mas praticamente nenhuma modificação microestrutural é observada. Entre 200oC e 230oC, a tensão residual decresce para um patamar relativamente baixo, enquanto que a microestrutura permanece inalterada. A resistência mecânica do metal é relativamente alta e a ductilidade ainda permanece baixa. A redução do nível de tensão e melhoria no valor de ductilidade são atribuídos ao fenômeno metalúrgico denominado de recuperação (redução na tensão do reticulado cristalino sem modificações microestruturais).

Quando o metal trabalhado a frio é aquecido a temperaturas acima de 230ºC, modificações na microestrutura e nas propriedades mecânicas já podem ser observadas, dependendo do material. No lugar dos grãos deformados mostrados na figura 24(A) e 24(B), um grupo de novos grãos se formam e crescem como mostrado na figura 24(C).

Os novos grãos consomem os grãos antigos, e eventualmente, todos os sinais de trabalho a frio anterior podem desaparecer. A nova microestrutura se assemelha a que existia antes do trabalho a frio, que proporciona maior ductilidade e menor dureza ao material que na condição de trabalhado a frio. Esse processo, conhecido como recristalização, é uma etapa do recozimento.

25

Page 24: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 24 – Microestrutura de um material - (A) submetido a trabalho mecânico leve, (B) submetido a trabalho mecânico intenso e (C) submetido a trabalho mecânico seguido de recristalização.

2.11 - Transformação de Fase no Ferro e no Aço

Os aços são as ligas comerciais de maior aplicação. As propriedades do ferro e dos aços são governadas pelo teor de soluto, geralmente carbono, e pelas transformações de fase a que eles são submetidos durante o processamento. O entendimento dessas transformações é essencial para a soldagem com sucesso desses materiais.

Como foi visto anteriormente, o ferro apresenta uma transformação alotrópica na qual ele se solidifica segundo uma estrutura CCC (Fe - δ ). Com o resfriamento, a estrutura cristalina se transforma em CFC (Fe - γ ), para finalmente retornar ao sistema CCC (Fe - α ).

O aço é uma liga de ferro que contém menos que 2% de carbono. A presença do carbono altera as temperaturas nas quais a solidificação e as transformações de fase acontecem. A adição de outros elementos de liga também modificam as temperaturas de transformação. Variações no teor de carbono produzem um efeito profundo tanto nas temperaturas de transformação quanto na proporção e distribuição de várias fases, conforme mostra o diagrama Fe – Fe3C apresentado na figura 25.

O diagrama apresentado na figura 25 não é um diagrama de equilíbrio verdadeiro, pois a cementita não é uma fase de equilíbrio. A grafita é mais estável que a cementita e sob condições adequadas, a cementita se decompõe, formando grafita. Em aços comuns essa decomposição quase nunca é observada, porque a nucleação da cementita no ferro supersaturado de carbono ocorre muito mais facilmente que a nucleação da grafita. Assim, quando o carbono se precipita de soluções sólidas de ferro alfa (cúbico de corpo centrado) ou de ferro gama (cúbico de face centrada), o precipitado resultante é quase sempre a cementita ou algum outro carboneto, e não a grafita. Uma vez formada, a cementita é muito estável e pode ser encarada para aplicações práticas, como uma fase de equilíbrio. Por essas razões, pode-se utilizar o diagrama da figura 25 para prever as mudanças de fase que as ligas Fe-C sofrem em ciclos de variação de temperatura

26

Page 25: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 25 – Diagrama de equilíbrio de fases Fe-Fe3C

A solução sólida de carbono em ferro delta denomina-se ferrita delta. A solução sólida de carbono em ferro gama denomina-se austenita e a solução sólida de carbono em ferro alfa é denominada ferrita alfa, ou simplesmente, ferrita. A cementita é o composto intermetálico Fe3C, que é um carboneto de alta dureza. A cementita possui 6,67% C.

A transformação ferrita delta em austenita ocorre a 1390º C no ferro puro. Entretanto, para aços, a temperatura de transformação aumenta conforme aumenta o teor de carbono, até o máximo de 1492º C. Aços com teor de carbono acima de 0,5%, solidificam diretamente com a estrutura austenítica, a temperaturas abaixo de 1492ºC. Para esses aços, portanto, não existe a ferrita delta.

A transformação de austenita em ferrita e carboneto de ferro (Fe3C) ocorre durante o resfriamento e é uma das mais importantes para os aços. O controle dessa transformação é a base para maioria dos tratamentos térmicos usados para endurecer os aços. Essa transformação ocorre no ferro puro a 910º C. Nos aços, com o aumento do teor de carbono, a transformação passa a ocorrer na faixa de

27

Page 26: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

temperaturas entre os limites A3 e A1, conforme mostra a figura 25. O limite superior dessa faixa de temperatura (A3) varia entre 910º C e 723º C. Por exemplo, a temperatura designada pela linha A3

para um aço com 0,10% C é 870º C, enquanto que para um aço com 0,5% C é de 775º C. Assim, a presença de carbono promove a estabilidade de austenita, em detrimento da ferrita delta e alfa, tanto em temperaturas elevadas quanto nas temperaturas baixas. A menor temperatura da faixa (A1) permanece a 723º C para todos os aços carbono independe do teor de carbono.

A austenita pode dissolver até 2% de carbono em solução sólida, enquanto a ferrita só pode dissolver 0,025%. Na temperatura A1 do diagrama de equilíbrio de fases, a austenita se transforma em ferrita e no composto intermetálico Fe3C, que é o carboneto de ferro denominado cementita. A ferrita e a cementita quando dispostas lado a lado na forma de camadas, formam uma estrutura lamelar denominada perlita. O aspecto micrográfico da perlita é mostrado na figura 26.

A maioria dos elementos de liga adicionados ao aço altera as temperaturas de transformação indicadas pelo diagrama Fe-Fe3C. A microestrutura dos aços carbono a temperatura ambiente é composta por um ou mais dos seguintes constituintes, quando solidificados segundo as condições de equilíbrio: Ferrita – Perlita – Cementita.

Os aços carbono são classificados em relação à sua posição no diagrama de equilíbrio de fases. O aço com 0,8% C é conhecido como eutetóide e sua microestrutura é composta por 100% de perlita. Os aços com teor de carbono menor que 0,8% são conhecidos como hipoeutetóides e sua microestrutura é composta por ferrita (pro-eutetóide, ou seja, que se forma antes da reação eutetóide) e perlita. Os aços com teor de carbono acima de 0,8% e abaixo de 2,0% são designados como aços hipereutetóides. A microestrutura desses aços é composta por cementita (pro-eutetóide) e perlita.

Figura 26 – Aspecto típico do constituinte lamelar denominado perlita. Ampliação de 750X.

Quando os aços carbono são resfriados lentamente, a partir da faixa de temperatura na qual a estrutura encontra-se totalmente austenítica, quantidades relativas dos três constituintes irão aparecer, dependendo da composição química. Entretanto, a decomposição da austenita é

28

Page 27: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

fortemente afetada quando se aumenta a velocidade de resfriamento. O aumento da velocidade de resfriamento retarda o início da decomposição da austenita, mas quando a transformação começa, ela ocorre mais rapidamente, e grandes volumes de perlita são formados.

Conforme a velocidade de resfriamento é incrementada, as lamelas de perlita tornam-se mais finas. Com o aumento ainda maior da velocidade de resfriamento, a temperatura de transformação abaixa, e os carbonetos começam a se formar com a forma de penas na matriz ferrítica, ao invés da estrutura lamelar da perlita. Esse arranjo de carbonetos finos com forma de pena e agulhas na matriz ferrítica é conhecido como bainita. Essa microestrutura possui maior resistência mecânica e dureza e menor ductilidade que a perlita fina. Aumentando-se ainda mais a velocidade de resfriamento, observa-se a formação da martensita.

A martensita é o produto de transformação da austenita que atinge os maiores valores de dureza. Quando a velocidade de resfriamento é suficientemente rápida para formar 100% da martensita, verifica-se que maiores incrementos na velocidade de resfriamento não aumentam a dureza. A figura 27 apresenta o aspecto típico da estrutura martensítica. A decomposição da austenita é um ponto importante na soldagem dos aços porque o metal de solda e parte da zona afetada pelo calor (ZAT) sofrem essa transformação.

Figura 27 – Aspecto micrográfico da martensita. Ampliação 500X.

Nos tratamentos térmicos dos aços utilizam-se diferentes meios de resfriamento para promover velocidade de resfriamento distinto e produzir diferentes produtos de transformação de austenita.

29

Page 28: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

2.12 - Diagrama de Transformação Isotérmica

Apesar do diagrama de equilíbrio de fases do sistema Fe-Fe3C ser muito útil, ele não fornece nenhuma informação acerca de transformação da austenita em outros produtos que não os de equilíbrio. O diagrama de equilíbrio não permite a correlação entre os produtos de transformação, a temperatura de transformação e a velocidade de resfriamento.

Um diagrama que permite esse tipo de avaliação é o diagrama de transformação isotérmica ou diagrama TTT (Temperatura-Tempo-Transformação). Esse diagrama registra graficamente o tempo necessário para iniciar e terminar a transformação da austenita em perlita, bainita ou martensita. O diagrama permite também identificar a temperatura na qual essas transformações acontecem. Na figura 28 é apresentado o diagrama TTT para o aço carbono com 0,8% C.

Figura 28 – Diagrama TTT do aço carbono eutetóide.

Para levantar o diagrama TTT mostrado na figura 28, amostras de aço carbono com 0,8% C foram austenitizados a 845º C, e em seguida, foram resfriadas em banhos de sais fundidos a várias temperaturas abaixo de 700º C. Cada corpo-de-prova foi mantido a uma determinada temperatura

30

Page 29: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

por um determinado tempo, sendo depois removido da temperatura de tratamento e resfriado até a temperatura ambiente. A amostra foi polida, atacada e examinada ao microscópio para determinação do percentual de austenita transformada naquelas condições. Assim, obtém-se no diagrama, o tempo para início e término da transformação da austenita naquela temperatura, conforme mostra a figura 29.

Figura 29 – Método de construção do diagrama TTT.

Na figura 28 pode-se observar que a austenita começa a se transformar após 480 segundos (8 minutos) a 700º C. A reação se completa após 7200 segundos (2 horas). A temperatura de 540º C, que é o nariz da curva, a reação começa após 1 segundo e se completa rapidamente em aproximadamente 7 segundos.

Em temperaturas abaixo do nariz, os produtos de transformação mudam de perlita para bainita e martensita, com suas estruturas com características tipo pena e acicular. Conforme o teor de carbono e de elementos de liga aumentam, a curva TTT se desloca para a direita. De modo que o aço se transforma em martensita com menores taxas de resfriamento. Esses aços possuem maior temperabilidade.

Outros fatores que deslocam a curva TTT para a direita, são o tamanho de grão e a homogeneidade da austenita. Quanto maior o tamanho de grão, menor é a quantidade de contorno de grão, que são sítios naturais para a transformação da austenita. Assim sendo, os aços com maior tamanho de grão possuem a curva à direita em relação ao mesmo aço com tamanho de grão menor, pois a disponibilidade de sítios para a austenita se decompor em perlita é menor que no aço de granulação fina. A heterogeneidade da austenita, representada por inclusões, precipitados e segregações,

31

Page 30: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

funciona como sítios para sua transformação (da mesma forma que o contorno de grão). Portanto quanto maior for a homogeneidade da austenita, mais à direita estará a curva TTT do aço.

Em resumo, a soldabilidade do aço pode ser avaliada pela posição do nariz da curva TTT, quanto mais à esquerda ele estiver mais fácil será a operação de soldagem. Por essa razão, os teores de carbono e de elementos de liga devem ser considerados quando da soldagem desses materiais, para minimizar a formação de martensita e o conseqüente risco de fissuração.

2.13 - Diagramas de Transformação em Resfriamento Contínuo

Na maioria dos tratamentos térmicos e na soldagem, a austenita se transforma durante o processo de resfriamento. O diagrama de transformação em resfriamento contínuo (CCT – Continuous Cooling Transformation) é usado para se obter informações sobre a transformação da austenita em resfriamento contínuo. A informação fornecida pelo diagrama CCT é usada para qualificação de procedimentos de soldagem e para seleção de materiais.

A principal diferença entre o diagrama TTT e o diagrama CCT, é que nesse último o início da transformação no resfriamento contínuo ocorre após um tempo maior e a uma temperatura menor do que seria previsto usando a curva TTT. Em outras palavras, as curvas do diagrama CCT são deslocadas para baixo e à direita em relação ao diagrama TTT. Para fins de comparação, as curvas CCT e TTT para o aço AISI 8630 são mostradas na figura 30.

Figura 30 – Comparação entre as curvas dos diagramas TTT e CCT para o aço AISI 8620.

32

Page 31: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

2.14 - Transformações de Aços Austenitizados Durante a Soldagem

Apesar das diferenças apresentadas no tópico anterior entre os diagramas TTT e CCT, os diagramas isotérmicos permitem estimar as microestruturas que serão produzidas na zona termicamente afetada dos aços durante a soldagem. Portanto, eles servem como base para a análise das modificações que podem ocorrer, considerando as características metalúrgicas do aço. Entretanto, os diagramas TTT apresentam limitações quando aplicados em juntas soldadas, uma vez que o ciclo térmico na soldagem é significativamente diferente do resultante de um tratamento térmico.

No caso do tratamento térmico, o aço é mantido à temperatura especificada por um tempo suficiente para dissolver os carbonetos e desenvolver uma fase austenítica homogênea e com um tamanho de grãos relativamente uniforme. No ciclo térmico de soldagem, a temperatura de austenitização (temperatura máxima) varia desde uma temperatura próxima ao ponto de fusão até a temperatura crítica, e a duração do ciclo é muito pequena em relação ao tempo de encharcamento dos tratamentos térmicos. As elevadas temperaturas que são atingidas próximo à zona de ligação, permitem que a difusão ocorra muito rapidamente nessa região, e que os átomos de soluto (especialmente o carbono) se dispersem uniformemente na austenita. A alta temperatura também favorece o crescimento de grão da austenita.

Por outro lado, em temperaturas mais baixas, próxima à temperatura crítica, os carbonetos podem não se dissolver completamente na austenita. Além disso, os átomos de soluto que se dissolveram, devido as temperaturas relativamente baixas, podem não se difundir para pontos muito afastados da posição original do carboneto. Assim, nesses pontos em que a máxima temperatura é próxima da temperatura crítica, a austenita contém áreas de alto teor de elementos de liga e áreas com baixo teor de elementos de liga. O tamanho de grão da austenita nessa região é pequeno. Na região intermediária, entre a temperatura próxima ao ponto de fusão e o ponto no qual a temperatura atingiu o valor da temperatura crítica, a homogeneidade e o tamanho de grão de austenita situam-se entre esses dois extremos.

Durante o resfriamento, a temperatura de decomposição e os tipos de produtos de transformação da austenita vão depender da composição química local e do tamanho de grão da austenita, além da velocidade de resfriamento. A homogeneidade da austenita, o tamanho de grão e a composição química influenciam a posição das curvas TTT e CCT, como já visto anteriormente. Dois diagramas de transformação do mesmo material (aço Ni-Cr-Mo) são mostrados na figura 31. Um diagrama apresenta a transformação isotérmica da austenita após um tempo de encharcamento de 30 minutos a 840º C. O outro diagrama apresenta a transformação da austenita durante o ciclo térmico de soldagem para uma temperatura de pico de 1310º C. Observa-se diferenças marcantes entre as duas curvas de transformação, devido aos diferentes ciclos térmicos.

33

Page 32: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 31 – Comparativo entre os diagramas de uma barra tratada termicamente e da simulação do ciclo térmico de soldagem.

Na microestrutura da zona termicamente afetada, o início de transformação da austenita em perlita e bainita foi atrasada em um fator de 6X e a temperatura de início de formação de martensita (Ms) foi abaixada em 50º C. Se a temperatura de pico do ciclo térmico de soldagem fosse reduzida abaixo de 1315º C, a austenita seria menos homogênea e teria tamanho de grão menor, o que proporcionaria um comportamento diferente durante o resfriamento. Portanto, torna-se óbvio que a condição de austenitização possui um efeito significativo sobre as características de transformação.

2.15 - Fatores que Afetam a Transformação da Austenita.

A composição química, o tamanho de grão e o grau de homogeneidade da austenita são fatores importantes na determinação das transformações que poderão ocorrer no aço. Todas as transformações normais no estado sólido que acontecem acima da temperatura em que a martensita se forma, ocorrem por um processo de nucleação e crescimento. As novas fases se formam em certos sítios preferenciais (normalmente nos contornos de grão) e crescem em volume até que a transformação se complete. A transformação martensítica é a exceção, pois é uma transformação atérmica, que não envolve o processo difusional.

A composição do aço é o fator mais importante na determinação do comportamento durante a transformação. O carbono, o níquel, o manganês abaixo de 1%, o silício abaixo de 1,5% e o cobre deslocam a curva de transformação para a direita, mas não modificam sua forma. Portanto, o diagrama TTT de um aço carbono, como é mostrado na figura 32, é similar ao de um aço ao níquel, exceto que a decomposição de austenita para o aço ao níquel inicia e termina depois. Isso pode ser visto na figura 33. O cromo, o molibdênio, o vanádio e outros fornecedores de carbonetos, também

34

Page 33: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

deslocam a curva para a direita, mas modificam a forma da curva. Esse fenômeno pode ser observado na figura 34.

Apenas alguns elementos deslocam a curva de transformação para a esquerda. Exemplos incluem o cobalto e o telúrio, mas esses não são comumente adicionados aos aços carbono e baixa liga.

Figura 32 – Diagrama TTT para o aço com 0,35%C 0,37%Mn.

35

Page 34: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 33 – Diagrama TTT para um aço 0,37%C e 0,68%Mn.

Figura 34 – Diagrama TTT de um aço alto carbono e 2%Cr.A perlita nucleia no contorno de grão de austenita. Portanto, austenita de grão fino proporciona maior número de sites (sítios) para nucleação do que a austenita de grão grosseiro. Como resultado, há a formação de uma maior quantidade de núcleos, e assim, a austenita se transforma mais

36

Page 35: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

rapidamente. Por outro lado, a bainita parece não ser muito afetada pelo tamanho de grão da austenita.

Os metais com granulação fina, normalmente apresentam melhores propriedades mecânicas, o que os tornam adequados para trabalhos à temperatura ambiente e a temperaturas mais baixas. Por outro lado, os aços de granulação grosseira geralmente se desempenham melhor a temperaturas elevadas. A granulação fina é desejável para melhorar a tenacidade e a ductilidade. Aços forjados e fundidos são freqüentemente normalizados para produzir o refinamento de sua estrutura. O tamanho de grão austenítico do aço depende da temperatura de austenitização e do tempo que o material foi submetido a essa temperatura. O refinamento de grão ocorre quando o aço que irá se transformar é aquecido a uma temperatura ligeiramente acima de A3 , e em seguida, é resfriado até a temperatura ambiente.

Como foi anteriormente observado, o comportamento durante a transformação é relacionado com a composição química local da austenita. Se a austenita não é homogênea, as áreas enriquecidas em elementos de liga se transformam em aços de alta liga, e portanto, possuem maior temperabilidade que as áreas empobrecidas.

Carbonetos não dissolvidos afetam a transformação da austenita de dois modos: primeiramente porque eles não contribuem com elementos de liga para a austenita e porque eles funcionam como sítio de nucleação para a decomposição da austenita.

A temperatura de início de formação da martensita (Ms) e de término de transformação (Mf) são geralmente abaixadas pela adição de elementos de liga ao aço. Em alguns casos, a temperatura Mf pode estar abaixo da temperatura ambiente. Nesses casos, alguma austenita pode ficar retida no aço quando este é resfriado até a temperatura ambiente. As temperaturas Ms e Mf também são influenciadas pela homogeneidade da austenita, porém o tamanho de grão parece não exercer efeito significativo.

2.16 – Temperabilidade

O conceito de temperabilidade permite avaliar quantitativamente a transformação da austenita em diferentes aços. A temperabilidade é a propriedade que determina a profundidade e distribuição de dureza induzida por têmpera, sendo uma característica importante para soldagem porque permite determinar a extensão da região endurecida. A Temperabilidade não pode ser confundida com dureza, a qual é função do teor de carbono, como é ilustrado na figura 35.

Por outro lado, a temperabilidade é uma medida da quantidade de martensita que se forma na microestrutura pelo resfriamento. Certos aços que possuem alta temperabilidade formam martensita mesmo quando resfriados ao ar. Outros com baixa temperabilidade exigem altas taxas (velocidade) de resfriamento para transformar a austenita em martensita.

37

Page 36: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 35 – Efeito do teor de carbono no valor máximo da dureza da martensita.

2.17 - Revenimento da Martensita

Devido ao fato da martensita ser muito frágil, normalmente, as peças submetidas ao tratamento de têmpera não são utilizadas diretamente nessa condição. Geralmente logo após a têmpera, as peças são submetidas ao tratamento de revenimento, com o objetivo de reduzir a dureza e as tensões residuais, além de aumentar a tenacidade. A resistência mecânica também é ligeiramente reduzida.

O revenimento consiste em re-aquecer o aço até uma temperatura apropriada (sempre abaixo de A1) e mantê-lo nesta temperatura por um intervalo de tempo curto. Este tratamento térmico permite que o carbono precipite como finas partículas de carboneto. A microestrutura resultante do revenimento é a martensita revenida. Qualquer relação entre dureza e tenacidade pode ser obtida desde que seja feita uma adequada seleção da temperatura e tempo de revenimento. Altas temperaturas de revenimento resultam em um aço macio e tenaz. O efeito de temperatura de revenimento sobre as propriedades do aço AISI 4140 (Cr-Mo) é mostrado a figura 36.

A têmpera e o revenimento são freqüentemente utilizados para melhorar as propriedades dos aços usados na fabricação de ferramentas, vasos de pressão e em aplicações estruturais. Aços baixa liga temperados e revenidos exibem alto limite de escoamento e alta resistência mecânica. Além disso, a

38

Page 37: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

tenacidade à fratura desses aços é mais elevada que a do mesmo aço laminado à quente, recozido ou normalizado.

Figura 36 – Efeito da temperatura de revenimento sobre a resistência mecânica e ductilidade do aço AISI 4140.

2.18 - Endurecimento por Precipitação

O endurecimento por precipitação ocorre quando há a precipitação de um constituinte duro a partir de uma solução sólida super saturada. Esse fenômeno, também é conhecido como envelhecimento, é um outro método usado para aumentar a resistência mecânica e a dureza em alguns aços e em ligas metálicas não ferrosos.

O princípio do endurecimento por precipitação está ilustrado na figura 37(A), quando uma liga bifásica de composição X é aquecida até a temperatura T1, na qual a fase β se dissolve na fase α. Quando a liga é resfriada rapidamente até a temperatura ambiente, a fase α não tem tempo suficiente para se transformar em fase β. O resultado é uma liga monofásica, homogênea e relativamente macia. Quando a liga é re-aquecida a uma temperatura entre T2 e T4 por um tempo adequado, a fase β formam finos precipitados na matriz α . Os precipitados β livremente dispersos aumentam significativamente a resistência da liga, como é mostrado na figura 37(B). As propriedades mecânicas da liga dependem do tratamento anterior ao envelhecimento, da

39

Page 38: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

temperatura de envelhecimento e do tempo. É importante destacar que o excesso de temperatura ou tempo não irão melhorar as propriedades mecânicas ou a resistência à corrosão.

(A)

(B)

Figura 37 – (A) Diagrama de equilíbrio de um sistema susceptível ao endurecimento por precipitação. (B) Efeito da temperatura e tempo de envelhecimento sobre a dureza de uma liga

endurecida por precipitação.

40

Page 39: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

33Metalurgia da SoldagemMetalurgia da Soldagem

A soldagem é um processo metalúrgico complexo, que envolve fusão e solidificação, fenômenos superficiais, reações metal-gás e metal-escória. Essas reações ocorrem mais rapidamente durante a soldagem do que durante as operações de conformação, fundição ou tratamentos térmicos. As características do material base, determinadas por seu histórico termo-mecânico e eventuais condições de serviço, devem ser consideradas na determinação do procedimento de soldagem, pois irão influenciar consideravelmente os fenômenos metalúrgicos inerentes à soldagem. O entendimento dos fundamentos da metalurgia da soldagem é um requisito necessário para que se possa avaliar quais os possíveis efeitos da soldagem sobre as propriedades da junta soldada e identificar as variáveis que permitem controlá-los, de modo a se obter os resultados desejados.

3.1 - A Junta Soldada

A junta soldada é constituída pelo metal de solda (região da junta que é fundida), pela zona termicamente afetada e pelo metal de base não afetado pelo calor da soldagem. Os fenômenos metalúrgicos que ocorrem em cada uma dessas regiões estão relacionados com a composição química do metal de base e do metal de adição, com o processo de soldagem e com o procedimento de soldagem utilizado para soldar.

O metal de solda se solidifica rapidamente e possui, tipicamente, uma microestrutura dendrítica de granulação fina. O metal de solda é uma mistura de parte do metal de base que é fundido durante a soldagem e do metal de adição que é introduzido, quando necessário. Algumas soldas são compostas apenas por metal de base fundido (caldeamento), sendo que nesse caso o processo é conhecido como soldagem autógena. Exemplos de processos autógenos são: soldagem por resistência elétrica, soldagem laser, TIG (GTAW) e feixe de elétrons sem adição de material. Entretanto, na maioria das operações de soldagem, o metal de adição é empregado, com o objetivo de permitir o controle da composição química do metal de solda e permitir o preenchimento do chanfro. Em geral, o metal de solda tem sua composição química balanceada pelo metal de adição, de modo que sua composição química final e suas propriedades físicas e mecânicas se aproximam bastante das do metal de base. A diluição é o parâmetro que quantifica a participação do metal de base na composição do metal de solda. A figura 38 ilustra o conceito de diluição, que é calculada através da seguinte expressão:

Sendo:A =área da região preenchida pelo metal de adiçãoB= área referente ao metal de base que foi fundido

Figura 38 – Diluição na junta soldada.O valor da diluição varia de acordo com o processo e o procedimento de soldagem. Pode-se atingir valores de diluição de 100%, quando a área A da figura 38 é igual a zero, ou seja, soldagem autógena (sem metal de adição). No processo de brasagem não há fusão do metal de base (área B da

41

Page 40: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

figura 38 é igual a zero), e nesse caso, a diluição é zero. Os processos de soldagem possuem faixas de valores típicos de diluição, sendo que o valor da diluição em cada solda é influenciado também pelos parâmetros e técnica de soldagem.

Em algumas circunstâncias específicas, a composição do metal de solda é especificada de modo a diferir significativamente da composição química do metal de base (soldagem de revestimento, soldagem de materiais dissimilares e amanteigamento, por exemplo). Nesses casos, o controle da diluição assume uma importância ainda maior, pois a composição química e as propriedades do metal de solda apresentarão uma grande variação conforme houver variação na diluição. A compatibilidade metalúrgica entre o metal de solda e o metal de base, nesses casos, deve ser cuidadosamente avaliada para que não ocorra a formação de um metal de solda com propriedades inadequadas à aplicação.

Durante a solidificação do metal de solda, os primeiros grãos a se solidificarem, iniciam seu crescimento a partir dos grãos parcialmente fundidos na zona de ligação, mantendo a mesma orientação cristalográfica desses grãos do metal de base. Esse fenômeno, que é típico da solidificação do metal de solda chama-se crescimento epitaxial (figura 39). Dependendo das taxas de segregação e solidificação, a solda pode solidificar segundo o modo de crescimento celular ou dendrítico. Ambos os modos de crescimento causam segregação de elementos de liga. Conseqüentemente, o metal de solda é quase sempre menos homogêneo que o metal de base. A figura 40 ilustra os modos de crescimento dendrítico e celular, e indica também os padrões de segregação encontrados em cada um desses modos.

Figura 39 – Crescimento epitaxial.

42

Page 41: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 40 – Esquema da distribuição de soluto nos modos de crescimento celular e dendrítico.

A zona termicamente afetada (ZTA) encontra-se adjacente ao metal de solda, e é a porção do metal de base que não foi completamente fundida, mas que teve sua microestrutura e propriedades mecânicas alteradas pelo calor da soldagem. A largura da zona termicamente afetada é função do aporte de calor (Heat Input). O aporte de calor varia para os diferentes processo de soldagem, assim como também é influenciado pelo procedimento de soldagem adotado. O aporte de calor ou energia de soldagem pode calculado pela expressão a seguir:

v

PfE =

P= V x I (soldagem ao arco elétrico)

O terceiro componente da junta soldada é o metal de base. O metal de solda e a zona termicamente afetada devem ser compatíveis com o metal de base e com as condições de serviço para que a solda seja bem sucedida. Quando o metal de base é composto por ligas simples que alcançam suas propriedades através da adição de elementos de liga apenas, a soldagem pode produzir metal de

43

E =energia de soldagem (joule/mm)f = eficiência de transmissão de calor (%)P= potência (watt)V = tensão (volt)I= corrente (ampère)v= velocidade de soldagem (mm/s)

Page 42: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

solda e zona termicamente afetada compatíveis, em termos de propriedades. Entretanto, quando o metal de base desenvolve suas propriedades através de complexos tratamentos termo-mecânicos, pode ser difícil produzir uma junta soldada totalmente compatível.

3.2 - Metal de Solda

A microestrutura do metal de solda é marcadamente diferente do metal de base, mesmo quando suas composições são similares, conforme pode ser observado na figura 41. A diferença em termos microestruturais não é relacionada com a composição química, mas é devida às diferenças no histórico termo-mecânico do metal de base e metal de solda.

A estrutura do metal de base é o resultado da operação de laminação à quente e múltiplas recristalizações do metal trabalhado à quente. O metal de solda, por outro lado, não é deformado mecanicamente durante a soldagem, apresentando estrutura bruta de fusão. Essa estrutura e as respectivas propriedades mecânicas resultantes, são produzidas pela seqüência de eventos que ocorrem enquanto o metal de solda se solidifica. Esses eventos incluem as reações do metal de solda com os gases presentes na atmosfera em torno da poça de fusão e com as fases não metálicas líquidas (escória), assim como aquelas que ocorrem no estado sólido.

Figura 41 – Macroestrutura de uma junta soldada de um aço baixa liga.

3.2.1 – Solidificação

Os grãos parcialmente fundidos da zona termicamente afetada na interface sólido-líquido, funcionam como substrato ideal para a solidificação do metal de solda. O metal cresce adotando a mesma orientação cristalina do substrato (fenômeno denominado epitaxia) e mais rapidamente em certas direções cristalográficas, de modo que os grãos orientados favoravelmente em relação à

44

Page 43: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

direção de extração de calor (perpendicular às isotermas) irão crescer substancialmente, enquanto que grãos orientados em direções desfavoráveis serão bloqueados pelos anteriores, que crescem mais rápidos (figura 42). Por essa razão, o metal de solda sempre apresenta macroestrutura colunar, evidenciando o mecanismo de crescimento competitivo de grãos e estrutura grosseira, que deriva da granulação da zona termicamente afetada que é grosseira devido ao aquecimento que é submetida.

Figura 42- Crescimento competitivo de grão e epitaxia.

A solidificação do metal de solda na maioria das ligas comerciais envolve a micro segregação de elementos de liga e impurezas. Nesse processo formam-se as dendritas, que são estruturas que refletem a forma complexa da interface líquido-sólido durante a solidificação, como mostra a figura 40. Conforme as primeiras dendritas se solidificam, os solutos que se dissolvem em maior quantidade no liquido que no sólido, são rejeitados pela fase sólida e se difundem no líquido remanescente, reduzindo seu ponto de solidificação. Como os elementos de liga segregados se concentram próximo à interface sólido-líquido, o crescimento do cristal nessa direção é limitado. Os grãos então crescem lateralmente, produzindo os braços característicos da dendrita como observado na condição bruta de fusão. Muitas dendritas podem crescer simultaneamente no liquido, a partir de um único grão durante a solidificação. Cada uma dessas dendritas possui a mesma orientação cristalográfica e todas elas fazem parte do mesmo grão.

No final da solidificação, forma-se uma rede de líquido rico em soluto entre as dendritas, , como mostra a figura 40. A estrutura do metal de solda parece grosseira com pequena ampliação porque apenas a estrutura do grão é visível. Com maiores ampliações, a estrutura dendrítica fina torna-se evidente, como pode ser verificado na figura 43. O espaçamento entre os braços das dendritas é uma medida de segregação de elementos de liga. Esse espaçamento é determinado pela velocidade de solidificação. Quanto mais rápida a solidificação, menor é o espaçamento entre as dendritas. A tendência geral é no sentido do tamanho de grão do metal de solda aumentar com o aporte de calor, porém não existe nenhuma relação estabelecida. O tamanho de grão pode também ser influenciado por agente nucleadores, vibrações ou outros variáveis do processo. Por outro lado, o espaçamento do braço das dendritas é uma função exclusivamente da velocidade de solidificação que é controlada pelo aporte de calor.

45

Page 44: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 43 – Microestrutura do metal de solda e da zona termicamente afetada.

Como a direção de crescimento dos grãos colunares do metal de solda é definida pela forma das isotermas (curvas definidas pelos pontos de mesma temperatura), a velocidade de deslocamento da fonte de calor modifica a orientação da estrutura da zona fundida. A figura 44 ilustra esquematicamente, o efeito da velocidade de soldagem sobre a estrutura do metal de solda. Nessa figura observa-se que nas soldas com maior velocidade de soldagem, há a tendência a concentração de produtos de segregação ao longo do eixo central do cordão. Esse efeito pode provocar trincas a quente por uma grande extensão da solda. Em cordões executados com baixa velocidade de soldagem, a tendência é que a segregação de solutos e impurezas ocorra na direção da poça de fusão, o que exige cuidados na finalização do cordão para evitar a formação de trincas de cratera.

Figura 44 – Efeito da velocidade de soldagem sobre a estrutura da zona fundida.

46

Page 45: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

3.2.2 - Reações Gás-Metal

As reações gás-metal dependem da presença de um ou mais gases reativos (H2, O2 ou N2) na atmosfera de proteção da poça de fusão. Existem várias fontes potenciais que podem introduzir esses elementos na atmosfera protetora. A principal fonte de hidrogênio (H2) é o próprio ar atmosférico, que deve ser evitado através de uma proteção gasosa que o desloca ou de vácuo. Na soldagem com eletrodos revestidos (SMAW) e ao arco submerso (SAW), o hidrogênio pode estar presente na forma de umidade no revestimento do eletrodo revestido ou no fluxo do processo arco submerso. O hidrogênio pode aparecer também, dissolvido em solução sólida nos metais não ferrosos, em óxidos na superfície do metal, ou ainda em lubrificantes orgânicos empregados na fabricação do arame ou na conformação mecânica do metal de base.

O oxigênio ou o CO2 são adicionados intencionalmente em pequenos percentuais ao argônio no gás de proteção do processo MAG (GMAW) para soldagem dos aços, visando melhorar a estabilidade do arco elétrico. Nesse caso, como os teores desses gases são limitados, as reações são controladas, de modo que os efeitos benéficos sejam consideravelmente maiores que os eventuais problemas causados por essas adições. O oxigênio também pode ser absorvido do ar atmosférico ou ser oriundo da decomposição do vapor d’água ou óxidos. O nitrogênio, assim como o hidrogênio, tem como principal fonte o ar atmosférico.

Na soldagem dos aços, reações metal-gás ocorrem em várias etapas. Na primeira etapa, devido as elevadas temperaturas produzidas pelo processo de soldagem, há a quebra das moléculas diatômicas. Os átomos dissociados de gás se dissolvem no metal líquido, sendo que as velocidades de reação são extremamente elevadas nas elevadas temperaturas que o material atinge durante a soldagem (1650° ou superior). Uma vez dissolvidos no aço, oxigênio e nitrogênio geralmente reagem com os elementos desoxidantes intencionalmente introduzidos (Mn, Si e Al). Esses óxidos irão formar a escória que sobrenada para a superfície do cordão ou irão precipitar no metal de solda como pequenas inclusões. Teores de 250 a 600 partes por milhão (ppm) de oxigênio são comuns em aços soldados ao arco elétrico com eletrodos consumíveis. Òxidos e Nitretos aparecem como pequenas partículas isoladas, que apesar de reduzir a ductilidade e a tenacidade do metal de solda dos aços, não comprometem as propriedades mecânicas para a maioria das aplicações comerciais.

Na soldagem com eletrodos consumíveis, a quantidade de óxidos no metal de solda de aços é significativamente maior que o teor de nitrogênio. Isto ocorre porque o oxigênio é adicionado intencionalmente na atmosfera do arco elétrico, enquanto que o nitrogênio não é. Se o metal de solda não contiver quantidades suficientes de desoxidantes, o oxigênio dissolvido irá reagir com o carbono em solução para produzir monóxido de carbono (CO) ou dióxido de carbono (CO2) durante a solidificação. As moléculas de gás serão segregadas durante a solidificação (a solubilidade no estado sólido é menor que a no estado líquido) e produzirão porosidade e menor teor de elementos de liga no metal de solda (parte dos elementos de liga é oxidada).

O hidrogênio está sempre presente na atmosfera do arco elétrico, mesmo que em pequenas quantidades. Os átomos de hidrogênio são mais solúveis no aço líquido que no aço sólido. O excesso de hidrogênio que é rejeitado durante a solidificação poderá causar porosidade, senão conseguir escapar para a atmosfera. Um outro problema que pode ser provocado pelo hidrogênio dissolvido no aço sólido é a trinca a frio ou trinca atrasada (esse problema será melhor descrito no item: “Reações no estado sólido”).

Na soldagem dos metais não ferrosos, reação gás-metal de maior importância envolve a dissolução, reação e evolução do hidrogênio ou vapor d’água. Portanto, todos os esforços devem ser empreendidos para que esses gases sejam excluídos da poça de fusão. Na soldagem do alumínio ou

47

Page 46: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

magnésio e suas ligas, o hidrogênio é freqüentemente introduzido na poça de fusão pelos óxidos hidratados ou através da superfície do metal de adição ou da superfície do metal de base, ou ambos. O gás é segregado da massa metálica durante a solidificação produzindo porosidade. Por essa razão, os consumíveis (metal de adição) para soldagem de alumínio e magnésio devem ser armazenados limpos, em recipientes selados e desumidificados. A limpeza mecânica ou aquecimento a vácuo em temperaturas de 150°C é recomendada para o metal de base ou metais de adição que tiverem sido expostos a umidade. Como a diferença de solubilidade do hidrogênio entre a fase líquida e a fase sólida no magnésio é menor que no alumínio, a tendência à formação de porosidade induzida pelo hidrogênio é menor no magnésio.

No caso do cobre e suas ligas, o hidrogênio reage com o oxigênio presente na poça de fusão durante a solidificação, produzindo vapor d’água e conseqüentemente, porosidade. O metal de adição para as ligas de cobre, possui desoxidantes para evitar essa reação. A porosidade causada por vapor d’água não se forma nas ligas de zinco, alumínio e berílio, porque esses elementos formam óxidos estáveis. Entretanto, nas ligas cobre-níquel e ligas de níquel, a porosidade induzida pela presença de vapor d’água pode se formar no metal de solda. Portanto, os metais de adição para essas ligas devem conter desoxidantes fortes.

As ligas de titânio são fragilizadas pela reação com alguns gases, incluindo, nitrogênio, hidrogênio e oxigênio. Conseqüentemente, esses elementos devem ser excluídos da atmosfera do arco elétrico. A soldagem do titânio e suas ligas devem ser realizadas sob uma atmosfera inerte especialmente projetada para essa finalidade ou sob vácuo. A zona termicamente afetada do titânio e suas ligas também é bastante fragilizada pela reação com nitrogênio e oxigênio. A soldagem do titânio e suas ligas deve ser realizada de modo que toda superfície que atinja temperaturas acima de 260° C esteja protegida por uma atmosfera de gás inerte. A aparência da superfície da junta soldada é um indicador eficiente da efetividade da proteção. Uma coloração bronze clara indica uma pequena quantidade de contaminantes; azul cintilante indica mais contaminantes, e uma camada branca de escamas de óxidos indica contaminação excessiva.

O hidrogênio é o maior causador de porosidade nas soldas de titânio. A fonte de hidrogênio, como em outros metais ferrosos e não ferrosos, pode ser a superfície do metal de adição. Adicionalmente, o hidrogênio solubilizado no metal de adição e no metal de base, pode contribuir significativamente para o total de hidrogênio na poça de fusão.

3.2.3 - Reações Metal-Líquido

Freqüentemente durante a soldagem são produzidas fases líquidas não metálicas que interagem com a poça de fusão. Essas fases líquidas são denominadas genericamente de escória e são produzidas pela fusão de fluxos intencionalmente adicionados.

A escória produzida pelos processos eletrodo revestido, arco submerso e eletroescória são projetados para absorver produtos de reação de desoxidação e outros contaminantes produzidos no arco elétrico e na poça de fusão. A quantidade e o tipo de produtos não metálicos da reação de desoxidação gerados durante a soldagem ao arco elétrico dos aços estão diretamente relacionados com o tipo de proteção e desoxidantes utilizados. Esses produtos (principalmente silicatos de alumínio, manganês e ferro) geralmente sobrenadam na superfície da poça de fusão e se incorporam na escória. Entretanto alguma quantidade pode ficar retida no metal de solda como inclusões não-metálicas. A limpeza do metal de solda é influenciada pela quantidade de produtos da reação de desoxidação formada e pela capacidade deste produto ser removido para a escória. Naturalmente

48

Page 47: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

que quanto mais ativa (oxidante) for a atmosfera do arco elétrico, maior será a quantidade de desoxidantes requerida, e maior será a quantidade de produtos de reação (escória).

Outro efeito importante que resulta da interação entre as fases sólida e líquida é a descontinuidade de soldagem conhecida como trinca a quente. Esse fenômeno aparece durante a solidificação do metal de solda, quando o líquido interdendrítico (a última região a solidificar), possui baixo ponto de fusão (muito inferior ao do metal que se solidifica inicialmente). Nessas condições, as tensões de contração produzida durante a solidificação do metal de solda se concentram em pequenas regiões no estado líquido, produzindo micro-trinca entre as dendritas. O termo trinca a quente é usado porque essas trincas ocorrem a temperaturas próximas a temperatura de solidificação do metal ou liga. Elas são produzidas por qualquer variação na composição química produzida por segregação no metal de solda que promove a formação de compostos de baixo ponto de fusão na região interdendrítica.

A formação de compostos de baixo ponto de fusão na região interdendrítica está associada à presença de impurezas como enxofre, chumbo, fósforo e outros elementos que formam eutéticos de baixo ponto de fusão. Em algumas ligas ferrosas como nos aços inoxidáveis, tem-se verificado que na presença de silicatos produz trincas. O controle da fissuração a quente nas ligas ferrosas é usualmente conseguida com a limitação das quantidades e tipos de sulfatos que se formam e da quantidade e tipo dos elementos de liga que podem provocar a fissuração. No caso dos aços carbono e baixa liga, uma relação entre o percentual de manganês e de silício de 30 vezes ou mais é utilizado para evitar trincas a quente no metal de solda. Em aços inoxidáveis austeníticos, utiliza-se uma estrutura duplex (austenítica com ferrita delta) no metal de solda para evitar a fissuração a quente. Por essa razão, o metal de adição para aço inoxidável austenítico é formulado de tal forma a produzir metal de solda com 2% a 8% de ferrita delta a temperatura ambiente. Em teores maiores que 8%, a ferrita delta deteriora as propriedades do metal de solda.

3.2.4 - Reações no Estado Sólido

Com relação ao comportamento do metal de solda, existem várias reações que ocorrem no estado sólido que podem modificar as suas propriedades. Em particular, existem interações durante a soldagem que promovem a fissuração a frio ou trinca retardada (recebe essa denominação porque a fissuração pode acontecer até 24 horas depois de completada a operação de soldagem). Esse fenômeno é típico na soldagem de aços que é suscetível à transformação martensita e que apresentam quantidades significativas de hidrogênio dissolvido. A trinca a frio pode ocorrer no metal de solda ou na zona termicamente afetada.

A trinca a frio ocorre quando a solda já resfriou até a temperatura ambiente e só ocorre quando existe a presença de três elementos: microestrutura frágil (martensita), hidrogênio dissolvido e tensões residuais. Para evitar esse fenômeno, deve-se tomar algumas precauções. A primeira medida é avaliar o risco de formação de microestrutura frágil através do cálculo do carbono equivalente, conforme a fórmula abaixo:

OBS: Essa expressão para o cálculo do carbono equivalente é recomendada pelo International Institute of Welding (IIW), sendo que existem muitas outras distintas na leitura especializada.

49

Page 48: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Se o valor do carbono equivalente é superior a 0,40 há a necessidade de cuidados especiais para evitar a fissuração pelo hidrogênio. Nesse caso, é recomendável especificar um pré-aquecimento para o metal de base de modo que a velocidade de resfriamento não seja muito alta, e assim, evite a formação da martensita. Outro efeito causado pelo pré-aquecimento é o de proporcionar um maior escape do hidrogênio dissolvido, pois a permanência em maiores temperaturas por um tempo maior, favorece o processo difusional do hidrogênio, que tende a escapar para a atmosfera.

Outro cuidado importante para evitar a fissuração a frio é utilizar processos de soldagem nos quais o teor de hidrogênio seja mínimo. Reduzindo o teor de hidrogênio dissolvido no metal de solda, haverá menor risco de fissuração.

O hidrogênio possui relativa solubilidade na austenita e é praticamente insolúvel na ferrita (figura 45). Com o resfriamento rápido, a austenita se transforma em um agregado ferrita/carboneto e/ou martensita, sendo que o hidrogênio é mantido em solução sólida. No caso de aços carbono essa transformação acontece a temperaturas relativamente elevadas (próximo de 700° C) mesmo com resfriamento rápido. Conseqüentemente, os átomos de hidrogênio ainda possuem mobilidade suficiente para difundir no sentido da atmosfera. Adicionalmente, os produtos de transformação de austenita a temperatura elevada (ferrita e carboneto) que se formam no metal de solda e na zona termicamente afetada, são relativamente dúcteis e resistentes a fissuração. O resfriamento rápido de um aço temperável provoca a transformação de austenita a temperaturas baixas, nos quais os átomos de hidrogênio possuem baixa mobilidade e a microestrutura é martensítica (sensível a fissuração). Essa combinação de hidrogênio dissolvido e microestrutura frágil é muito susceptível a fissuração a frio.

Figura 45 – Variação da solubilidade do hidrogênio no aço em função da temperatura.

A associação do hidrogênio com a trinca a frio levou ao desenvolvimento dos eletrodos revestidos de baixo hidrogênio. O revestimento desses eletrodos de baixo hidrogênio deve ser mantido afastado da umidade, pois a umidade (água) é uma potente fonte de hidrogênio. Para prevenir a contaminação pela umidade, os eletrodos são fornecidos em embalagens hermeticamente fechadas e devem ser submetidos a um procedimento de secagem e armazenamento controlado antes de seu

50

Page 49: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

uso. Em geral, as condições de armazenamento são especificadas pelos fabricantes dos eletrodos e envolve o controle da umidade e manutenção a temperatura no feixe de 100° C a 250° C. Durante o transporte do eletrodo da estufa de armazenamento e todo o período prévio à utilização, os eletrodos devem ser armazenados em recipientes térmicos (cochichos) para evitar a sua contaminação.

Outra reação no estado sólido que pode afetar as propriedades mecânicas da junta soldada em ligas ferrosas e não ferrosas, é a precipitação da segunda fase durante o resfriamento. A precipitação da segunda fase é particularmente deletéria quando ocorre no contorno de grão, devido ao fato do contorno de grão ser contínuo na estrutura no metal. A concentração de segunda fase no contorno de grão pode reduzir significativamente a ductilidade e a tenacidade de junta de soldada.

3.2.5 - Mecanismos de Endurecimento do Metal de Solda

Existem poucos métodos para aumentar a resistência do metal de solda quando comparado com os métodos existentes para o metal de base. No metal de solda , normalmente, não é possível realizar o endurecimento por trabalho a frio (encruamento). Entretanto, existem quatro mecanismos que podem ser utilizados para aumentar a resistência do metal de solda: controle da granulação durante a solidificação, endurecimento por solução sólida, endurecimento por transformação de fase e endurecimento por precipitação. Os dois primeiros mecanismos podem ser empregados em qualquer tipo de metal e liga, enquanto que os dois últimos mecanismos só podem ser aplicados em liga que sejam susceptíveis a esse tipo de tratamento.

CONTROLE DE GRANULAÇÃO NA SOLIDIFICAÇÃO

Como foi mencionada anteriormente, a alta velocidade de resfriamento a que o metal de solda é submetido, cria um padrão de segregação em cada grão. A microestrutura resultante consiste de dendritas finas numa rede rica em soluto, como mostra figura 40. Esse tipo de microestrutura restringe a deformação plástica durante o ensaio de tração, e como resultado, o metal de solda apresenta uma relação entre limite de escoamento e limite de resistência mecânica maior que o metal de base. O controle dessa estrutura de solidificação está associado as variáveis de soldagem, ou seja, o procedimento de soldagem adotado.

ENDURECIMENTO POR SOLUÇÃO SÓLIDA

O metal de solda pode ser endurecido pela adição de elementos de liga. Tanto os elementos de ligas substitucionais como os elementos intersticiais causam distorção no reticulado cristalino e interagem com as discordâncias, aumentando a resistência à sua movimentação, e conseqüentemente, exigindo maiores níveis de tensão para promover a deformação plástica. Esse processo está ilustrado na figura 5.

51

Page 50: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

ENDURECIMENTO POR TRANSFORMAÇÃO DE FASE

Esse efeito é obtido em metais de solda ferrosos, mesmo quando a austenita não se transforma em martensita. A alta velocidade de resfriamento, alcançada no ciclo térmico de soldagem diminui a temperatura de transformação da austenita. O agregado ferrita carboneto formado a baixas temperaturas é fino e mais resistentes que aqueles formados a temperaturas de transformação elevada.

ENDURECIMENTO POR PRECIPITAÇÃO

O metal de solda de liga susceptíveis ao tratamento de endurecimento por precipitação pode ser endurecido pelo processo de envelhecimento. Na maioria das aplicações comerciais , as juntas soldadas susceptíveis ao endurecimento por precipitação são envelhecidas após a soldagem sem o tratamento de solubilização. Nas soldas multipasses, algumas regiões do metal de solda são envelhecidas ou superenvelhecidas pelo próprio calor produzido pelo passe posterior.

A zona termicamente afetada também apresenta regiões nas quais podem ocorrer super-envelhecimento. Apesar da presença de regiões super-envelhecidas, o tratamento de envelhecimento aumenta a resistência do metal de solda e de zona termicamente afetada. Entretanto, o nível de endurecimento obtido no metal de solda não alcança o mesmo patamar do obtido no metal de base, devido à presença de regiões super-envelhecidas. Algumas ligas endurecíveis por precipitação sofrem envelhecimento natural, ou seja, a temperatura ambiente.

3.3 – Zona Termicamente Afetada

Na teoria, a zona termicamente afetada inclui todas as regiões aquecidas acima da temperatura ambiente. Do ponto de vista prático ,entretanto, ela consiste apenas daquelas regiões que foram efetivamente influenciadas pelo calor do processo de soldagem. Portanto, para aços carbono laminados, a zona termicamente afetada não inclui regiões do metal de base que forem aquecidas a temperaturas inferiores a 700ºC, uma vez que o calor produzido pela soldagem possui pouca influência sobre estas. Por outro lado, para um aço temperado e revenido a 315ºC, qualquer região aquecida acima de 315ºC durante a soldagem seria considerada como parte da zona termicamente afetada. Outro exemplo seria uma liga de alumínio envelhecida artificialmente a 120ºC, qualquer região de junta soldada aquecida acima dessa temperatura seria parte da zona termicamente afetada.

A zona termicamente afetada é freqüentemente definida por variações na dureza ou modificações na microestrutura de junta soldada.Essas modificações na microestrutura produzidas pelo calor de soldagem podem ser observadas diretamente pelo ataque químico da seção transversal da solda após lixamento (macrografia) ou pelo levantamento do seu perfil de dureza . Deve-se notar, entretanto, que em muitos casos essas são formas arbitrárias de dimensionar a zona termicamente afetada, apesar de poder ser de valor prático para avaliação de uma junta soldada

Na figura 46, se observa a seção transversal de uma solda multipasses em um aço carbono manganês. Pode-se identificar cada passe de solda e verificar que cada um deles possui uma região periférica que é visivelmente afetada pelo calor de sua deposição. Essa sobreposição das zonas termicamente afetadas que se observa junto à linha de fusão, se estende por toda a espessura da chapa. Na soldagem multipasses, é comum que o calor do passe posterior beneficie o passe anterior, pelo refinamento de parte da estrutura bruta de fusão. Entretanto, esse metal de solda beneficiado pelo passe posterior não é considerado zona termicamente afetada

52

Page 51: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 46 – Macrografia de uma solda multipasses de um aço carbono manganês (40mm de espessura).

A resistência mecânica e a tenacidade na zona termicamente afetada de uma junta soldada depende do tipo de metal de base, do processo de soldagem e do procedimento de soldagem. Os metais de base que são mais afetados pelo calor de soldagem são aqueles que sofreram tratamentos térmicos para aumentar ou reduzir a sua resistência mecânica, visto que, o ciclo térmico de soldagem envolve altas temperaturas. As temperaturas na ZAT da solda variam desde a temperatura ambiente até próximo à temperatura “Liquidus”. Os fenômenos metalúrgicos que ocorrem lentamente a temperaturas baixas, tende a ocorrer muito rapidamente a temperaturas elevadas.

Para entender os vários efeitos do calor da soldagem, sobre a ZAT, é melhor considerar esses efeitos em termos de 4 tipos diferentes de ligas que podem ser soldadas:

1º Ligas endurecidas por solução sólida;2º Ligas endurecidas por trabalho a frio (encruamento);3º Ligas endurecidas por precipitação;4º Ligas endurecidas por transformação de fases (martensita).

Naturalmente, que algumas ligas podem ser endurecidas por mais de um dos mecanismos apresentados acima. Entretanto, por simplicidade, os efeitos sobre cada um desses tipos de processamento são apresentados separadamente.

LIGAS ENDURECIDAS POR SOLUÇÃO SÓLIDA

Essas ligas são as que apresentam menores problemas com relação à zona termicamente afetada. Se não acontecer nenhuma transformação no estado sólido, o efeito do ciclo térmico é pequeno e as propriedades de zona termicamente afetada praticamente não sofrem modificações significativas.

O crescimento de grão ocorre próximo a zona de ligação como resultado das altas temperaturas atingidas nesse ponto. Esse efeito não afeta muito intensamente as propriedades mecânicas, se a região de grãos grosseiros se restringir a alguns poucos grãos. Normalmente, as ligas usadas na condição endurecidas por solução sólida, são ligas de alumínio, cobre e aços de baixo carbono laminados a quente. Aços inoxidáveis ferríticos e austeníticos também pertencem a esta categoria de ligas.

LIGAS ENDURECIDAS POR TRABALHO A FRIO

Essas ligas se recristalizam quando aquecidas acima da temperatura equivalente a metade de sua temperatura de fusão expressa em graus Kelvin. O calor da soldagem recristaliza a ZTA de materiais trabalhados a frio e reduz sua dureza consideravelmente. A seção transversal da junta soldada mostrado na figura 47, ilustra o efeito do ciclo térmico de soldagem sobre a microestrutura

53

Page 52: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

de um material trabalhado a frio. O metal de base não afetado pelo calor indicado pela letra A na figura 47(A), possui uma estrutura típica de grãos alongados que resulta de intensa deformação plástica. Na região indicada como B, aparece uma região de granulação fina equiaxial, na qual a temperatura da ZTA ultrapassou a de recristalização e o crescimento de grão só ocorreu na região de temperaturas elevadas, próximo a zona de fusão. A zona termicamente afetada recristalizada é mais macia e menos resistente que o metal de base encruado, sendo que as propriedades mecânicas não podem ser recuperadas por tratamento térmico.Se o material de base encruado sofrer transformação alotrópica quando aquecido, os efeitos de soldagem são um pouco mais complexos. O aço, o titânio e outras ligas que apresentam transformação alotrópica, podem ter duas zonas de recristalização, conforme é ilustrado na figura 47(B). A primeira zona de grãos finos resulta na recristalização da fase α encruada. A segunda zona de granulação fina resulta da transformação alotrópica para a fase de alta temperatura.

Figura 47 – Recristalização na zona termicamente afetada de aço trabalhado a frio.(A) para materiais que não sofrem mudança de fase. (B) para materiais que sofrem transformação alotrópica.

LIGAS ENDURECIDAS POR PRECIPITAÇÃO

Essas ligas respondem ao calor da soldagem da mesma forma em que as ligas encruadas, ou seja, na zona termicamente afetada ocorre um tratamento de recozimento. Existe entretanto, um aspecto complicado porque o ciclo térmico de soldagem produz diferentes efeitos em diferentes regiões. A seqüência do tratamento térmico para endurecimento por precipitação consiste no tratamento de solubilização, têmpera para manter o soluto em solução sólida super-saturada e envelhecimento para promover a precipitação fina das partículas da segunda fase. O calor de soldagem resolubiliza a região próxima a zona de ligação e produz uma região monofásica macia e com alguns grãos grosseiros. Essa região pode recuperar a dureza através de um tratamento de envelhecimento após a soldagem.

54

Page 53: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Aquelas regiões da zona termicamente afetada que foram aquecidas a temperaturas abaixo de temperatura de solubilização foram superenvelhecidas pelo calor de soldagem .Um tratamento térmico de envelhecimento após a soldagem não irá recuperar suas propriedades. A parcela da zona termicamente afetada que não foi submetida a temperatura acima da temperatura original de envelhecimento, não terão suas propriedades mecânicas significativamente afetadas. A zona afetada termicamente de uma liga endurecida por precipitação é ilustrada na figura 48É muito difícil soldar ligas endurecidas por precipitação de alta resistência sem que haja perda de resistência, porém, três técnicas são usadas para minimizar essas perdas. Um método envolve o tratamento de re-solubilização, têmpera e envelhecimento. Apesar de ser o método mais efetivo, pode se tornar muito caro e mesmo inviável em alguns casos.

O segundo método consiste em soldar o metal de base e após a soldagem promover um tratamento de envelhecimento da junta soldada. Esse tratamento aumenta a resistência mecânica da região que foi re-solubilizada da zona termicamente afetada, porém não provoca nenhuma melhoria na região super envelhecida.

O outro método usado para minimizar os efeitos da soldagem sobre a ZTA, é soldar o metal de base na condição solubilizada e após a soldagem efetuar o envelhecimento de toda a peça soldada. A zona superenvelhecida é neste caso o ponto fraco da junta, mas o resultado final é melhor do que o método anterior.

Como o ciclo térmico da soldagem reduz a resistência mecânica do metal de base tratado termicamente, processos de soldagem que utilizam alto aporte de calor não são recomendados para essas ligas. Aportes de calor menores reduzem a extensão da zona termicamente afetada e a região do metal de base com baixas propriedades mecânicas.

Figura 48 – Superenvelhecimento na zona termicamente afetada de uma liga endurecida por precipitação.

55

Page 54: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

LIGAS ENDURECIDAS POR TRANSFORMAÇÃO DE FASES

Nesse grupo de ligas, o interesse se concentra nos aços com teor de carbono e elementos de liga suficientes para produzir a transformação martensítica. Esses aços são soldados já na condição temperado e revenido ou possuem temperabilidade para produzir martensita quando submetido ao ciclo térmico de soldagem. Em ambos casos, a zona termicamente afetada é influenciada pelo ciclo térmico de soldagem aproximadamente da mesma maneira. A zona termicamente afetada desses aços junto com o diagrama de equilíbrio de fases para o sistema Fe-Fe3C é mostrado na figura 49.

Figura 49 – Correlação entre o ciclo térmico de soldagem e o diagrama de equilíbrio de fases

A região de grãos grosseiros se localiza próximo à interface da solda na região 1. Nesta região o crescimento de grão da austenita é rápido e ocorre quando ela é exposta a temperatura próxima ao ponto de fusão. O aumento no tamanho de grão aumenta a temperabilidade, de modo que assim, pode haver a transformação para martensita durante o resfriamento.

56

Page 55: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

A região 2 é austenitizada, porém, a temperatura é muito baixa para promover o crescimento de grão. A temperabilidade da região 2 não é aumentada pelo crescimento de grão, mas nessa zona pode haver formação martensítica se a velocidade de esfriamento for suficientemente alta ou o teor de elementos de liga for suficiente para deslocar o diagrama CCT suficientemente.

Na região 3, alguns grãos se transformam em austenita e outros não, mas os grãos de austenita são muito finos.

Na região 4, não há nenhuma transformação em austenita no aquecimento, mas os grãos de ferrita podem ser amaciados pelo calor de soldagem.

A largura da zona termicamente afetada e a largura de cada uma das regiões descritas anteriormente, são controladas pelo aporte de calor. Aportes de calor elevados resultam em taxas de resfriamento menores portanto, o aporte de calor determina quais serão os produtos de transformação de austenita na zona termicamente afetada. A martensita com alto teor de carbono é muito dura e frágil e pode criar problemas na ZTA. A dureza da zona termicamente afetada é função do teor de carbono do metal de base. Com o aumento do teor de carbono, a tenacidade da ZTA diminui e a sua dureza e sua susceptibilidade à fissuração aumentam. A martensita sozinha geralmente não causa fissuração, mas associada ao hidrogênio dissolvido e as tensões residuais podem provocar trincas a frio. As mesmas precauções indicadas para prevenir fissurações a frio de metal de solda se aplica a zona termicamente afetada.

A dureza da zona termicamente afetada é, geralmente, uma boa indicação da quantidade de martensita presente e o potencial para fissuração. Apesar da fissuração raramente ocorrer quando a dureza brinell é menor que 250HB, é comum acontecer quando a dureza atinge valores de 450HB e nenhuma precaução é tomada.

A figura 50 apresenta a microestrutura e a microdureza de três cordões de solda depositados com diferentes condições de pré e pós-aquecimento em um aço carbono com 0,25%C. A dureza Knoop da zona termicamente afetada da solda produzida sem preaquecimento foi de 435HK. A segunda solda foi depositada na chapa pré-aquecida e a dureza da zona termicamente afetada foi de 361HK. A terceira chapa foi revenida a 595ºC depois da soldagem e a dureza da zona afetada termicamente foi 196HK. Pode–se observar que as durezas da segunda e da terceira chapa foram bem menores que de primeira. Este fato sugere que em tratamento térmico pós-soldagem pode ser necessário para reduzir a dureza do metal de solda e da zona termicamente afetada em aços temperáveis.

Precauções especiais podem ser necessárias quando se for soldar aços temperáveis que foram intencionalmente tratados termicamente para produzir uma microestrutura de martensita revenida. E geralmente indicado, o uso de baixo aporte de calor para o controlar a extensão da zona termicamente afetada e uma elevada temperatura de preaquecimento para controlar a taxa de resfriamento da solda. As recomendações do fabricante do aço devem ser consideradas na preparação do procedimento de soldagem de aços baixa liga e alta resistência (ARBL).

57

Page 56: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 50 – Dureza e microestrutura de três soldas com diferentes condições de pré e pós-aquecimento.

3.4 - Metal de base

Além do metal de solda e da zona termicamente afetada, o terceiro componente da junta soldada é o metal de base. O metal de base é selecionado pelo projetista, levando em consideração a aplicação especifica e as propriedades requeridas, como limite de escoamento ou de resistência mecânica, tenacidade a fratura, resistência à corrosão e etc. Muitas ligas empregadas comercialmente são de boa soldabilidade, sendo que outras entretanto, possuem soldabilidade limitada e exigem cuidados especiais

O termo soldabilidade se refere à capacidade do material ser soldado sob condições de fabricação impostas, para se constituir numa estrutura adequada conforme projetada, e se desempenhar satisfatoriamente no serviço em questão. De acordo com essa definição, a soldabilidade de alguns materiais pode ser ruim sob determinadas condições e satisfatória sob outras condições. Um exemplo é o aço ASTM A514 que é tratado termicamente para obter 689MPa de limite de escoamento. Todos os graus desse material têm soldabilidade satisfatória, desde que seja suficientemente pré-aquecido, utilize-se procedimentos de soldagem que produzam baixo teor de hidrogênio e que as limitações no que se refere ao aposte de calor não sejam ultrapassadas.

A soldabilidade é afetada pela espessura e geometria da junta, limpeza da superfície e propriedades mecânicas do metal. Entretanto, o fator mais importante que influência na soldabilidade é a composição química do metal de base. Para cada tipo de material existem limites para o procedimento de soldagem, de modo a permitir a obtenção de soldas isentas de descontinuidades e com propriedades mecânicas satisfatórias. Se esses limites são largos, o metal é tido como de boa soldabilidade. Se esses limites são estreitos, o metal é tido como de soldabilidade difícil. Se precauções extraordinárias são necessárias, o material é tido como não soldável. Em alguns casos e

58

Page 57: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

em certas aplicações, entretanto, materiais não soldáveis são soldados rotineiramente com cuidados especiais e procedimentos específicos de inspeção, além de critérios de aceitação próprios.

3.4.1 - Soldabilidade de ligas comerciaisOs procedimentos de soldagem implementados para ligas comerciais devem refletir qualquer aspecto metalúrgico particular do material. Por exemplo, a presença de estrutura grosseira no metal de base (ASTM Nº5 ou mais grosseira) pode restringir o uso de processos com alta densidade de energia, como feixes de elétrons e MIG com alto aporte de calor (transferência em spray). Aspectos metalúrgicos podem exercer grande influência no procedimento para soldar materiais dissimilares e ligas endurecíveis por precipitação. Qualquer junta soldada pode sofrer mudanças metalúrgicas quando submetida a trabalho a frio e tratamentos térmicos. Para serviços a altas temperaturas, tanto as condições metalúrgicas como os aspectos de projeto são importantes para se obter uma longa vida útil para o equipamento fabricado.

As considerações metalúrgicas envolvidas na avaliação da soldabilidade de ligas são particularmente complexas quanto ligas dissimilares devem ser unidas. A composição do metal de solda é controlada não apenas pelo metal de adição, mas pela diluição entre os dois metais de base distintos. Muitas combinações de metais dissimilares são possíveis e o grau de diluição varia de acordo com o processo de soldagem, a técnica de soldagem e o projeto de junta. Todos esses fatores influenciam na seleção de um método de união e do material de soldagem para produzir uma junta soldada com todas as propriedades requeridas pela aplicação.

Em muitos casos existe mais do que um consumível que satisfaz os requisitos de compatibilidade metalúrgica entre os metais de base e o próprio metal de adição. Nesse caso, a seleção do consumível é baseada na resistência mecânica requerida, no meio em que o material vai trabalhar, ou no aspecto econômico (custo do produto). Juntamente com a diluição do metal de solda, outros fatores como diferença de expansão térmica e ponto de fusão, geralmente influenciam na seleção do metal de adição para juntas dissimilares, especialmente se a junta for submetida a altas temperaturas de serviço.

A expansão térmica desigual dos membros da junta introduz tensões que podem provocar redução na sua resistência à fadiga. Se um dos metais de base é de menor resistência, o metal de adição deve ser selecionado com a expansão térmica próxima a desse membro da junta. A tensão resultante da expansão desigual ficará então, concentrada no membro de maior resistência da junta soldada.

Uma junta entre um aço inoxidável austenítico e um aço carbono, ilustra a importância da expansão térmica. A expansão térmica do aço carbono é menor que a do aço inoxidável austenítico. Do ponto de vista da diluição, tanto o eletrodo de aço inoxidável como um eletrodo de níquel-cromo-ferro(Ni-Cr-Fe) seriam adequados. O eletrodo de aço inoxidável, possui expansão térmica próximo ao do metal de base de aço inoxidável, enquanto que a do eletrodo de Ni-Cr-Fe se aproxima do aço carbono. Se a junta for soldada com o eletrodo de aço inoxidável, ambos, o metal de solda e o metal de base de aço inoxidável, irão se expandir mais que o aço de carbono, posicionando a linha da expansão diferencial ao longo do componente mais fraco (aço carbono). Se a junta é soldada com o eletrodo Ni-Cr-Fe, a tensão resultante da expansão desigual é confinada ao longo do componente da junta mais resistente.

Durante a soldagem, as diferenças entre os pontos de fusão dos dois metais de base ou entre o metal de solda e o metal de base, pode resultar na ruptura do material que possui menor ponto de fusão. A solidificação e a contração do material com maior ponto de fusão, introduz tensões no material com

59

Page 58: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

menor ponto de fusão, que está numa condição de baixa resistência, pois ainda não está completamente solidificado. O problema pode ser eliminado na maioria das vezes, pela aplicação de uma camada de metal de solda sobre o metal de base com menor ponto de fusão, antes da junta ser soldada. O nível de tensão gerada durante a aplicação dessa camada de metal de solda sobre o metal de base é muito menor que o produzido na soldagem da junta. Durante a soldagem da junta com a camada do metal de solda previamente depositada, ocorre uma redução significativa entre a diferença de pontos de fusão.

3.4.2 - Soldabilidade de aços

Os aços são ligas Ferro-Carbono, com o teor de carbono inferior a 2,0%, e que contém elementos residuais (fósforo, enxofre, manganês e silício) resultantes do processo de fabricação. Suas propriedades físicas e mecânicas são determinadas pela composição química e pelo histórico termo-mecânico a que a liga foi submetida.

Existem várias formas de classificar a grande diversidade de tipos de aço, quer seja considerado a sua composição química, sua aplicação, sua microestrutura, suas propriedades, etc. Uma das classificações mais generalizadas é a que considera a composição química dos aços. De uma forma bem abrangente, pode-se separá-los em 3 grandes grupos, conforme os teores de elementos da liga:

Aços baixa liga O teor total de elementos de liga é menor que 5%.Aços média liga O teor total de elementos de liga se situa entre 5% e 10%.Aços alta liga O teor total de elementos de liga é maior que 10%.

A classificação dos aços pelo sistema AISI (American Iron and Steel Institute ) e SAE (Society of Automotive Engineers ) é muito utilizados para aços carbono e baixa liga. Sua aceitação foi tão grande que ela serviu de base para o sistema UNS (Unified Numbering System) elaborado pela ASTM (American Society for Testing Materials) e SAE.

Nesse sistema, os aços são designados por um número composto por duas seqüências de dígitos:YYXX ou YYXXX, sendo que os dois primeiros dígitos representam os elementos de ligas presentes (conforme tabela 2) e os dois ou três últimos, representam o teor de carbono do aço multiplicado por 100. Assim a designação AISI-SAE 1020, representa em aço carbono comum (YY=10) com teor médio de carbono de 0,2% (XX=20). Na designação UNS, esse aço seria G10200.

Uma outra classificação bastante difundida para aços carbono é aquela que leva em consideração a sua aplicação. As propriedades indicadas para cada tipo de aços são apenas valores médios orientativos:

AÇOS DE BAIXO CARBONO

São materiais fáceis de serem trabalhados a frio e de serem soldados. O teor de carbono desses aços é menor a 0,18%, seu limite de resistência situa-se entre 32 e 38 Kgf/mm2 e o limite de escoamento entre 15 e 22 Kgf/mm2.

AÇOS DE MÉDIO CARBONO

São materiais de boa soldabilidade, mas não tão fáceis de serem trabalhados a frio como os de baixo carbono. O teor de carbono se situa entre 0,18% e 0,28% e o teor de manganês é, em geral, menor

60

Page 59: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

que 1%. O limite de resistência mecânica se situa entre 42 e 49 Kgf/mm2 e o limite de escoamento entre 23 e 27 Kgf/mm2.

Sistemas SAE, AISI e UNS de classificação dos aços.

DesignaçãoTipos de Aço

AISI-SAE UNS10XX G10XXX Aços carbono comuns11XX G11XXX Aços de usinagem fácil, com alto S12XX G12XXX Aços de usinagem fácil, com alto P e S15XX G15XXX Aços Mn com manganês acima de 1,00%13XX G13XXX Aços Mn com 1,75% de Mn médio40XX G40XXX Aços MO com 0,25% de Mo médio41XX G41XXX Aços Cr-Mo com 0,40 a 1,10% de Cr e 0,08 a 0,35% de Mo

43XX G43XXXAços Ni-Cr-Mo com com 1,65 a 2,00% de Ni, 0,40 a 0,90% de Cre 0,20 a 0,30% de Mo

46XX G46XXX Aços Ni-Mo com 0,70 a 2,00% de Ni e 0,15 a 0,30% de Mo47XX G47XXX Aços Ni-Cr-Mo com 1,05% de Ni, 0,45% de Cr e 0,20% de Mo48XX G48XXX Aços Ni-Cr-Mo com 3,25 a 3,75% 0,20 a 0,30% de Mo51XX G51XXX Aços Cr com 0,70 a 1,10% de Cr

E51100 G51986 Aços cromo (forno elétrico) com 1,00% de CrE52100 G52986 Aços cromo (forno elétrico) com 1,45% de Cr61XX G61XXX Aços Cr-V com o,60 ou 0,95 de Cr e 0,10 ou0,15% de V min.86XX G86XXX Aços Ni-Cr-Mo com 0,55% de Ni, 0,50% de Cr e 0,20% de Mo87XX G87XXX Aços Ni-Cr-Mo com 0,55% de Ni, 0,50% de Cr e 0,25% de Mo

88XX G88XXXAços Ni-Cr-Mo com 0,55% de Ni, 0,50% de Cr e 0,30 a 0,40% de Mo

9260 G92XXX Aços Si com 1,80% a 2,20% de Si50BXX G50XXX Aços Cr com 0,20 a 0,60% de Cr e 0,0005 a 0,003% de boro51B60 G51601 Aços Cr com 0,80% de Cr e 0,0005 a 0,003% de boro

81B45 G81451Aços Ni-Cr-Mo com 0,30% de Ni, 0,45% de Cr, 0,12% de Mo e 0,0005 a 0,003% de boro

94BXX G94XXXAços Ni-Cr-Mo com 0,45% de Ni, 0,40% de Cr, 0,12% de Mo e 0,0005 a 0,003% de boro

Tabela 2.

AÇOS PARA BAIXA TEMPERATURA

São aços indicados para serviços a baixas temperaturas. O teor de carbono é, em geral, menor 0,23% e o teor de manganês é mais elevado que dos aços de médio carbono, em torno de 1,10%. Os limites de resistência mecânica e de escoamento são similares ao dos aços de médio carbono. Esses aços normalmente apresentam granulação fina para melhorar sua tenacidade.

61

Page 60: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

AÇO DE QUALIDADE ESTRUTURAL

São aços utilizados na construção mecânica e na fabricação de estruturas metálicas. Os limites de resistência mecânica e de escoamento são relativamente elevados, sendo que alguns graus apresentam soldabilidade não muito fácil.

AÇOS CARBONO DE ALTA RESISTÊNCIA

São aços de baixo carbono e teor de manganês mais elevado que os aços de baixo carbono para desenvolver valores elevados de resistência mecânica (até 65 Kgf/mm2). Como o teor de carbono é baixo, a soldabilidade desses aços é boa, mas as propriedades na zona termicamente afetada tendem a se deteriorar.

3.5 - Ciclo térmico e repartição térmica

Considere um ponto da junta soldada, definido pela sua distância ao centro da solda e pela sua posição em relação a espessura. O calor da operação de soldagem provoca, neste ponto, variações de temperatura como indica a figura 6.9.

Figura 6.9 – Ciclo Térmico no ponto A

A variação de temperatura em função do tempo, θ = f(t) num determinado ponto da junta soldada é o ciclo térmico no ponto considerado. A curva permite a determinação de:

62

Page 61: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

θ m – temperatura máxima atingidatp – tempo de permanência acima de uma certa temperatura, por exemplo: θ c

Vθ - velocidade de resfriamento à temperatura θtr – tempo de resfriamento entre as temperaturas θ 1 e θ 2

Analisando todos os pontos, é possível se obter as temperaturas máximas atingidas em função da distância ao centro da solda θ m = f(x) (figura 6.10). Esta função é a repartição térmica para a reta considerada (no centro da solda). Estabelecido o regime de soldagem, a repartição térmica mantém a sua forma ao longo do cordão de solda.

Figura 6.10- Repartição térmica

Com as duas funções, torna-se viável o estudo das transformações metalúrgicas no estado sólido ocorrente numa junta soldada. O ciclo térmico possibilita a interpretação ou previsão das transformações, enquanto que a repartição térmica permite determinar a extensão das zonas onde se passam tais fenômenos.

As curvas temperatura-tempo levantadas em diversos pontos ao longo de uma perpendicular à solda tem a forma da figura 6.11. À medida que o ponto considerado se afasta da soda, as temperaturas máximas são decrescentes e atingidas com um certo atraso. O tempo de permanência acima de uma certa temperatura decresce no mesmo sentido.

63

Page 62: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 6.11 - Ciclos térmicos em diversas distâncias da soldaTeoricamente as velocidades de resfriamento decrescem à medida que a distância x aumenta. Entretanto do ponto de vista prático e para a faixa de temperatura onde ocorrem os fenômenos de têmpera, pode-se considerar a velocidade de resfriamento - ou o tempo de resfriamento - como constante em toda extensão da zona afetada termicamente.

3.5.1 - Fatores do ciclo térmico

A temperatura máxima e a velocidade de resfriamento, calculadas pelas fórmulas abaixo, são os parâmetros principais do ciclo térmico.

Para peças espessas (t>40mm)

Para peças finas.

Onde:

θ m – temperatura máxima atingida α - coeficiente de troca térmica superficial

64

Page 63: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Vθ - velocidade de resfriamento λ - condutibilidade térmicaC – capacidade térmica volumétrica x – distância ao centro da soldae – base dos logarítmos neperianos θ - temperatura na qual se calcula a velocidadeE – energia de soldagem de resfriamentot – espessura θ o – temperatura inicial da peça

Da análise dessas fórmulas, pode-se concluir que:

• A temperatura máxima atingida e a velocidade de resfriamento dependem das propriedades físicas do material que está sendo soldado;

• A temperatura máxima atingida varia diretamente com a energia de soldagem, isto é, quanto maior energia de soldagem maior será a temperatura máxima atingida. É importante observar que o aumento da temperatura inicial da peça equivale, simplificadamente, a um aumento da energia de soldagem;

• A temperatura máxima atingida varia inversamente com a distância ao centro da solda, isto é, quanto mais afastado da solda estiver o ponto considerado, menor será a temperatura máxima atingida;

• A velocidade de resfriamento varia inversamente com a temperatura inicial da peça que está sendo soldada, isto é, quanto maior a temperatura inicial da peça, menor a velocidade de resfriamento. A influência da temperatura inicial é mais significativa em peças de pequena espessura;

• A velocidade de resfriamento varia diretamente com a espessura da peça que está sendo soldada, isto é, quanto maior a espessura maior a velocidade de resfriamento. Entretanto, a variação tem um limite. A partir de uma determinada velocidade de resfriamento, por mais que se aumente a espessura, a velocidade de resfriamento não se altera. A velocidade de resfriamento limite varia com a energia de soldagem (ver figura 6.12).

65

Page 64: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 6.12 – Influência da energia de soldagem e da espessura no tempo de resfriamento

• A velocidade de resfriamento varia inversamente com a energia de soldagem, isto é, quanto menor a energia de soldagem maior a velocidade de resfriamento. A influência da energia de soldagem na velocidade de resfriamento é maior em espessuras finas.

• A velocidade de resfriamento varia com a forma geométrica das peças. A figura 6.13 mostra os coeficientes de correção para a energia de soldagem e a espessura da peça a serem empregados no cálculo da velocidade de resfriamento, em função da geometria das juntas.

Figura 6.13 – Coeficiente de correção para a energia de soldagem e espessura da peça em função das geometrias das juntas.

O processo de soldagem define a energia de soldagem e, portanto, influencia tanto a temperatura máxima como a velocidade de resfriamento.

66

Page 65: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Deve-se observar que quanto maior é a temperatura máxima atingida, maior é a extensão da zona afetada termicamente e que quanto menor é a velocidade de resfriamento, menor é a possibilidade de têmpera.

3.6 - Zona fundida - transformações associadas à fusão

Chama-se de fusão para um determinado metal, a sua passagem do estado sólido para o estado líquido. Essa transformação se dá com aumento de calor ou energia térmica. Durante a fusão, o metal passa por um processo de aquecimento.

Durante a breve permanência no estado líquido, a solda sofre alterações em sua composição química que podem ser atribuídas às seguintes causas:

3.6.1 - Volatilização

A perda de metal fundido é considerável, quando a pressão de vapor do metal é elevada na temperatura de soldagem. Se a temperatura de soldagem é próxima do ponto de fusão, as perdas são desprezíveis, como é o caso da soldagem a gás ou soldagem TIG de metais considerados voláteis como o chumbo e o magnésio Na soldagem com eletrodo revestido ou MIG, onde a temperatura é elevada, as perdas por volatilização podem ser apreciáveis. Estas perdas, além de acarretarem problemas de higiene, alteram a composição química da solda. Um bom exemplo é a volatilização do titânio, que impede o seu como elemento estabilizante de soldas de aço inoxidável austenítico. O manganês, o ferro, o cromo e o alumínio, se comportam semelhantemente, porém, em menor intensidade. Além da temperatura, a volatilização depende também do tempo de permanência em alta temperatura. Assim, a transferência rápida de metal por pulverização (MIG) é menos favorável a perda do que a transferência por gotas da soldagem com eletrodo revestido.

3.6.2 - Reações químicas

As reações químicas no metal líquido são prejudiciais quando provocam o desprendimento de gases. A reação entre o óxido de ferro e o carbono do aço (FeO + C ↔ Fe + CO) tem grande influência na qualidade das soldas. O óxido de ferro pode se formar em virtude do contato do metal líquido com a atmosfera (por exemplo: na raiz de soldas não protegidas) ou do contato com gases ativos (por exemplo: processo MAG).

Os aços efervescentes têm a tendência de reiniciar a reação mostrada acima por ocasião da soldagem, a menos que atuem agentes desoxidantes. Os agentes desoxidantes, possuindo alta afinidade com o oxigênio, têm a função de reagir com o oxigênio, preferencialmente ao carbono, com o produto da reação sendo escorificado. Tem essa função os elementos de adição (manganês, silício, alumínio, etc...) presentes no revestimento ou na alma dos eletrodos na soldagem a arco. Na ausência de elementos desoxidantes e com a solidificação rápida da solda o monóxido de carbono formado pela reação entre o óxido de ferro e o carbono fica retido provocando a porosidade.

Os valores elevados dos limites de escoamento e resistência da zona fundida na soldagem com eletrodo revestido, MIG e arco submerso, são conseqüência da adição de elementos.

67

Page 66: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Merecem destaque as reações entre escória e metal líquido que possibilitam a adição de elementos de ligas a partir de ferro-ligas presentes nos revestimentos e fluxos. É o caso dos eletrodos revestidos de aço carbono e aços-liga, que são todos produzidos com alma do carbono efervescente.

3.6.3 - Absorção de gases

O metal líquido da solda pode dissolver gases, notadamente o hidrogênio, resultante da decomposição do vapor d'água no arco elétrico.

O vapor d'água provém da umidade absorvida pelos fluxos e eletrodos, da água de cristalização de alguns componentes e dos produtos da combustão de substâncias orgânicas constitutivas dos revestimentos.

A variação de solubilidade, como indica a figura 6.14, e a rapidez da solidificação, na soldagem a arco, provocam a super saturação da solda em hidrogênio. Nessa condição, pode ocorrer a fissuração a frio (ou sob cordão) como será visto no item 13.1.

Após o resfriamento, o hidrogênio tende a se liberar espontaneamente. Isto se dá lentamente à temperatura ambiente e bem mais rápido à temperatura elevada.

Figura 6.14- Curvas de Sieverts. Variação da solubilidade de hidrogênio com a temperatura.

68

Page 67: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

.

3.7.8 - Crescimento competitivo de grãos

A partir da orientação, pré-determinada pelo metal de base, os grãos obedecem a um crescimento competitivo. Os grãos que dispõem da orientação principal perpendicular às isotermas (curvas traçadas por pontos à mesma temperatura) crescem com maior facilidade que os demais (figura 6.17).

Figura 6.17- Crescimento competitivo dos grãos

Assim, a zona fundida, além da granulação grosseira tem uma estrutura orientada conforme a curvatura das isotermas e a velocidade da fonte de calor ou, com maior precisão, da relação entre a velocidade de soldagem e a velocidade de solidificação (figura 6.18).

Figura 6.18 - Orientação da estrutura da zona fundida em função da velocidade de soldagem

A granulação grosseira e a orientação da estrutura exercem uma influência marcante sobre as propriedades mecânicas da zona fundida. Torna-se mais fácil a propagação da fratura frágil (transgranular), que se constata pela diminuição da tenacidade. A segregação da zona fundida pode ocupar uma posição desfavorável em relação às tensões de contração da solda. Também, descontinuidades do metal de base - por exemplo, a dupla laminação - podem se propagar pelo metal fundido em direção à superfície da peça. É óbvio que essas considerações se referem à soldagem em um só passe. A regeneração estrutural, conseguida com a soldagem em vários passes, atenua estes inconvenientes.

69

Page 68: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

3.7.9 - Segregação

O diagrama do equilíbrio mostra que à medida que a solidificação progride, o líquido se enriquece em impurezas ou elementos de liga (ver figura 6.19).

Figura 6.19 - Segregação da zona fundida: A - Segregação; B – Propagação de uma segregação (ou defeito) pré-existente.

A segregação de fases de ponto de fusão (ou resistência) mais baixo que a solda é, geralmente, a causa da fissuração a quente, como será visto adiante.

A zona fundida, com grãos envolvidos por um filme líquido, não tem resistência mecânica suficiente para suportar as tensões de contração da solda. É caso, por exemplo, das soldas de aço carbono com teor de enxofre elevado e do aço inoxidável tipo AISI-347, onde a fase pré-fusível é constituída de Nb, C e N.

Observe que a estrutura de uma solda de deposição lenta (figura 6.18), para uma mesma geometria de junta, é mais favorável à segregação e à fissuração a quente. Porém, em uma solda de deposição rápida (figura 6.18), a segregação e a fissuração a quente podem ocorrer no eixo do cordão, atingindo um grande comprimento.

70

Page 69: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

3.7.10 - Separação de substâncias insolúveis

O metal fundido pode conter substâncias dissolvidas que se separam durante a solidificação. É o caso, por exemplo, do hidrogênio ou mesmo do monóxido de carbono produzido pela reação do carbono com óxido de ferro. Esses gases podem ser eliminados ou produzir inclusões de aspecto particular, dependendo da relação entre a velocidade de solidificação e taxa de separação líquido-gás (figura 6.20).S – SólidoL – Líquido

Velocidade de soldagem lenta

Velocidade de soldagem média

Velocidade de soldagem alta

Figura 6.20 - Mecanismo de formação da porosidade.

A porosidade vermicular evidencia a orientação de solidificação da solda. Ela ocorre, por exemplo na soldagem dos aços efervescentes (não desoxidados) ou quando da utilização dos eletrodos de baixo hidrogênio por soldadores não qualificados.

Quando a substância insolúvel é um sólido ou líquido, a composição química varia periodicamente resultando na formação de camadas destas segregações na zona fundida.

71

Page 70: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

3.8 - Pré-aquecimento

O pré-aquecimento consiste no aquecimento da junta numa etapa anterior à soldagem. Tem como principal efeito reduzir a velocidade de resfriamento da junta soldada, permitindo desta forma:

• Evitar a têmpera, isto é, a formação de martensita;• Aumentar a velocidade de difusão do hidrogênio na junta soldada.

O pré-aquecimento faz com que a junta soldada atinja temperaturas ligeiramente mais elevadas e que permaneça nestas temperaturas por mais tempo. Isto permite que o hidrogênio dissolvido, em sua maior parte na austenita, tenha possibilidade de se difundir. Intensiona-se com o pré-aquecimento evitar a formação de martensita, assim como reduzir a possibilidade à fissuração pelo hidrogênio.

O pré-aquecimento influencia também as tensões de contração da junta soldada. As tensões de contração normalmente diminuem com o pré-aquecimento. Entretanto, se a junta possui um alto grau de restrição, as tensões de contração podem ser aumentadas, por pré-aquecimento localizado, aumentando a possibilidade da fissuração.

O pré-aquecimento tem como desvantagem aumentar a extensão da zona afetada termicamente. Em alguns materiais, caso não se controle convenientemente a temperatura, o pré-aquecimento pode ter um efeito bastante prejudicial. Um exemplo é a soldagem de aços com 16% de cromo, nos quais um pré-aquecimento excessivo pode propiciar a formação de fases de baixa tenacidade. Em materiais de alta temperabilidade como, por exemplo, os aços-liga, é bastante usual a utilização de pré-aquecimento.

3.9 - Pós-aquecimento

O pós-aquecimento consiste na manutenção da junta soldada a uma temperatura acima da temperatura ambiente por um determinado tempo, por exemplo, 2 horas a 250º C, com o objetivo principal de aumentar a difusão do hidrogênio na solda. O pós-aquecimento deve ser executado tão logo a soldagem termine, de forma a não permitir o resfriamento da junta soldada. A eficiência do pós-aquecimento depende deste fato, pois o resfriamento da junta soldada permitiria a formação de fissuração pelo hidrogênio.É conveniente salientar que o pós-aquecimento, por ser executado em temperatura relativamente baixa, não deve ser considerado como um tratamento térmico de alívio de tensões, pois, para tanto, seria necessário um tempo de permanência nesta temperatura extremamente longo.

72

Page 71: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

3.10 – Fissuração pelo hidrogênio ou fissuração a frio

A fissuração pelo hidrogênio é conseqüência da ação simultânea de quatro fatores: o hidrogênio dissolvido no metal fundido, as tensões associadas à soldagem, a uma microestrutura frágil e à baixa temperatura (abaixo de 150º C). Nenhum desses fatores, isoladamente, provoca a fissuração a frio.

O mecanismo da fissuração pode ser estabelecido em função dos seguintes pontos:

• Compostos que contem hidrogênio, como por exemplo, o vapor d’água se decompõe na atmosfera do arco liberando hidrogênio atômico ou iônico (H+). As principais fontes de hidrogênio são:

- Revestimento orgânico dos eletrodos;- Umidade absorvida ou adsorvida pelo revestimento dos eletrodos, particularmente os de baixo hidrogênio;- Compostos hidratados existentes na peça, como por exemplo, a ferrugem;- Umidade do fluxo, na soldagem a arco submerso;- Umidade do ar.

• A solda, no estado líquido, dissolve quantidades apreciáveis de hidrogênio. A solubilidade decresce com a temperatura e de forma descontínua na solidificação e nas modificações alotrópicas, conforme mostra a figura 6.14. Conseqüentemente, na fase final do resfriamento, a solda poderá estar super saturada em hidrogênio.

• A figura 6.21, chave para a explicação do fenômeno, indica que durante o resfriamento a ZF já finalizou a transformação γ → α , enquanto a ZAT permanece por um determinado período de tempo ∆ T na fase γ (por causa de sua maior temperabilidade). Conforme observado na figura 6.14, a solubilidade do hidrogênio na fase α é inferior à da fase γ , e ele se torna concomitantemente bem mais difusível na primeira fase. O hidrogênio (H+) tende então a atravessar a zona de ligação, através da “janela” que se abre, correspondente ao segmento AB. Até o ponto B, a ZAT encontra-se ainda totalmente austenítica (γ ), podendo então dissolver grande quantidade de H+. Como, porém o seu coeficiente de difusão na γ é baixo, o H+ irá se concentrar na região da ZAT logo subjacente ao cordão. Quando esta região carregada em H+ se transformar em martensita (M), ocorrerá fragilização e fissuração.

73

Page 72: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 6.21- Mecanismo da migração de hidrogênio para a zona afetada termicamente.

• A microestrutura de baixa tenacidade como, por exemplo, a martensita, quando saturada em hidrogênio é consideravelmente frágil. A solda, em virtude de sua composição química e das condições térmicas da soldagem, pode gerar tais microestruturas. Nessas condições e na fase final do resfriamento apresentará regiões frágeis à baixa temperatura saturadas em hidrogênio submetidas a um sistema de tensões residuais, cuja intensidade é próxima do limite de escoamento do metal de solda.

A ação simultânea desses quatro fatores é responsável pelo aparecimento de trincas que se manifestam segundo os tipos apresentados na figura 6.22. A têmpera poderá ser inevitável como no caso dos aços-liga ou por descuido, como por exemplo, em peças pré-aquecidas incorretamente.

1 – Trinca sob cordão (underbead crack)2 – Trincas na raiz ( root cracks)

3 – Trincas na margem ( toe cracks)4 – Trincas transversais ( transverse cracks)

Figura 6.22- Tipos de trincas provocadas pelo hidrogênio

• Os entalhes, como por exemplo, mordedura, falta de penetração e inclusões, promovem, através da concentração de tensões, deformações plásticas locais que põem em movimento as discordâncias

74

Page 73: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

(imperfeições da estrutura cristalina). O hidrogênio, conduzido pelas discordâncias aumenta sua concentração local, favorecendo a fissuração junto aos entalhes. As trincas dos tipos 2 e 3 da figura 6.22, resultam desse fato.

• A maior parte do hidrogênio em super saturação se difunde e abandona a solda, após um tempo que, como em todo mecanismo de difusão, depende da temperatura. Os dados da tabela a seguir ilustram a difusão do hidrogênio à temperatura ambiente. A 250º C o hidrogênio difusível é eliminado em poucas horas.

EVOLUÇÃO DO HIDROGÊNIO DAS SOLDAS

Concentração de hidrogênio em ml/100g

Processo Solda LíquidaLiberado nas

primeiras 24horas

Liberado nos 20 dias

subseqüentesResidual

Eletrodo revestido E 6010

28 10 3 15

Eletrodo revestido E 6012

15 6 2 7

Eletrodo revestido E 6015

8 2 1 5

TIG (argônio) 4 1 0 3

Por intermédio destes dados, vê-se que o risco de fissuração é temporário, existindo enquanto o hidrogênio estiver se desprendendo da solda. É evidente a vantagem do pós-aquecimento de soldas sensíveis à fissuração a frio, pois, nessas condições - por exemplo, a 250º C durante 2 horas - o hidrogênio é eliminado enquanto a temperatura da solda é bem superior à temperatura de transição.

• É útil destacar que o exame radiográfico não permite detectar certos tipos de trincas, especialmente as sob cordão, sendo necessário o exame ultra-sônico para detectá-las. Além disso, as trincas podem aparecer ou se propagar várias horas após a conclusão da soldagem, tornando recomendável a aplicação dos exames não-destrutivos com uma defasagem de 48 horas. Esta recomendação se aplica, é claro, às soldas sem pós-aquecimento.

• As medidas preventivas da fissuração pelo hidrogênio são agrupadas em tomo de seus quatro fatores, a saber:

- Teor em hidrogênio: A atmosfera do arco deve ter o menor teor possível em hidrogênio. Os eletrodos de baixo hidrogênio foram desenvolvidos com este propósito. Entretanto, tais revestimentos são altamente higroscópicos. Em conseqüência, a secagem e o manuseio desses eletrodos são de importância fundamental na prevenção do problema. As exigências nesse sentido são tanto mais necessárias quanto maior e a umidade relativa no ambiente e mais críticos são os outros três fatores. A secagem do fluxo, na soldagem a arco submerso, embora menos necessária face à maior energia de soldagem, é uma medida a ser considerada no caso dos fluxos básicos.

- Microestrutura frágil: Quando pode ser evitada ou diminuída é um dos recursos preventivos. O preaquecimento, o aumento da energia de soldagem, a escolha do metal de

75

Page 74: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

adição de menor resistência possível, contribuem para a redução do risco de fissuração. A alta severidade térmica das soldas provisórias - fixação de dispositivos de montagem - é, freqüentemente, a origem de trincas.

- Tensões: A soldagem com o menor grau de restrição possível é uma medida útil. O tensionamento das juntas soldadas contribui para a fissuração, especialmente se for levado em conta que a deformação plástica - através da movimentação das discordâncias - eleva a concentração de hidrogênio na extremidade dos entalhes. Assim, deve-se considerar a ação de esforço como exemplo: peso próprio, contração de outras soldas, testes de pressão, dispositivos para correção de deformações, etc.

- Temperatura: Manter a solda a urna temperatura suficiente que permita a difusão do hidrogênio, é uma medida que pode ser empregada. Isto pode ser feito por meio de preaquecimento, do controle da temperatura interpasse e de pós-aquecimento.

3.11 – Fissuração lamelar

Ocorre na forma de degraus paralelos à direção de laminação do metal de base e a linha de fusão, normalmente, em junta de ângulo. Localiza-se no metal de base e é paralela e próxima a zona afetada termicamente (Figura 6.23). Não resulta de um processo essencialmente metalúrgico; ocorre por um efeito termomecânico. Sua ocorrência está associada à presença simultânea de inclusões não metálicas alinhadas na direção de laminação no metal de base e tensões trativas de soldagem perpendiculares ao eixo dessas inclusões.

Figura 6.23 - Tipo de trinca ocasionada por Fissuração Lamelar

Para se prevenir deste defeito, devem ser avaliadas a qualidade do metal de base, a geometria da junta e a seqüência de soldagem. As impurezas no metal de base são formadas basicamente de sulfetos de manganês. Elementos como o enxofre deve ser evitado e elementos desoxidantes como o Mn e Si, além de aumentar a tensão de escoamento e a resistência à tração nos aços, diminui a possibilidade de ocorrência de trincas ou fissuração lamelar. De outro modo, deve ser realizada numa seqüência que admita, tanto quanto possível, uma distribuição uniforme de calor.

Uma maneira de se evitar que ocorra fissuração lamelar, na soldagem de cordão multipasse de metal, onde se suspeita ou é comprovada a presença de inclusões não metálicas, é empregando-se a técnica de amanteigamento, ver a figura 6.24. No amanteigamento deposita-se sobre as partes à soldar uma camada de material mais dúctil do que está se soldando. Esta medida faz com que as tensões de origem térmica geradas na soldagem sejam absorvidas por essa camada de metal depositado, evitando assim, que haja deformação no metal de base capaz de ocasionar a decoesão das inclusões alinhadas.

76

Page 75: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 6.24 - Amanteigamento para se evitar Fissuração Lamelar

3.12 – Fissuração a quente

A fissuração a quente resulta da segregação de fases de ponto de fusão mais baixo que o metal da zona fundida ou da zona afetada termicamente. O mecanismo da fissuração a quente é, hoje em dia, controvertido. O mecanismo descrito a seguir é um dos possíveis e o classicamente indicado como o formador da fissuração a quente.

Como já foi comentada, a fissuração a quente resulta da segregação de fases de ponto de fusão mais baixo que o metal da zona fundida ou da zona afetada termicamente. Os grãos envolvidos por um filme líquido não dispõem de resistência mecânica e ductilidade suficiente para suportar os esforços devidos a contração da solda. As trincas são do tipo intergranular e se manifestam macroscopicamente, como indica a figura 6.25.

1 – Trinca longitudinal na zona afetada termicamente

2 – Trinca longitudinal na zona fundida

3 – Trinca de cratera

Figura 6.25 - Tipos de trincas a quente.

As medidas preventivas estão relacionadas aos dois fatores principais de fissuração, isto é, a existência de uma pequena quantidade de fase pré-fusível e os esforços de contração.

3.12.1 – Fase pré-fusível

O fósforo e o enxofre, em teores superiores a 0,04%, são os principais causadores da fissuração a quente dos aços carbono e de baixa liga. O fósforo, associado ao ferro, manganês, níquel e cromo, forma eutéticos de baixo ponto de fusão. O baixo ponto de fusão do sulfeto de ferro (FeS) é o responsável pela ação nefasta do enxofre.

77

Page 76: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

No caso do fósforo a solução consiste em limitar o seu teor. Atualmente, a maioria das soldas tem teores de fósforo situados entre 0,02 e 0,03%, atingindo, em alguns aços de alta resistência, valores inferiores a 0,01%. Além da limitação do seu teor, a influência do enxofre pode ser anulada pela adição de manganês. O sulfeto de manganês solidifica-se em forma de inclusões evitando a formação do filme líquido que conduz à fissuração a quente. A quantidade de manganês deve ser 1,75 vezes maior que a de enxofre. A soldagem de chapas com carepa ou óxidos pode resultar na oxidação de parte do manganês não permitindo a fixação de todo o enxofre. Nessas condições, a solda pode apresentar fissuras a quente.

O silício também aumenta a susceptibilidade à fissuração. Os teores limites dependem do tipo e aço; alguns aços são afetados com teores da ordem de 0,75%, outros toleram até 1,5%. Em soldas de alta resistência, o teor de silício é limitado em 0,35% pela sus ação prejudicial sobre tenacidade como, por exemplo, nos eletrodos da série E 100.

A fissuração a quente assume uma importância fundamental na soldagem do níquel e suas ligas. A contaminação da solda com compostos sulfetados - como lubrificantes, produtos de corrosão, lápis indicador de temperatura - resulta na formação de sulfeto de níquel que se segrega no contorno dos grãos e nos espaços interdendríticos. Decorrem desse fato as exigências de limpeza na soldagem das ligas de níquel.

Estruturas totalmente austeníticas predispõem os aços inoxidáveis à fissuração quente. É o caso dos aços 25%Cr-20%Ni e 18%Cr-38%Ni. Constata-se também que pequenas quantidades de ferrita tornam o aço imune à fissuração. O teor adequado de ferrita depende do grau de restrição da solda e da quantidade e natureza dos elementos de liga ou impurezas presentes. Para os aços 18%Cr-10%Ni e 25%Cr-12%Ni o teor recomendável situa-se entre 3% a 8%.

Esse teor é obtido pela seleção do metal de adição, com o auxílio do diagrama de Schaeffler, como será visto adiante. Admite-se que a ação benéfica da ferrita está relacionada à sua posição nos contornos de grão e a maior solubilidade quanto aos elementos causadores da fase pré-fusível: fósforo, enxofre, nióbio, silício, oxigênio, entre os de pior reputação.

Os aços inoxidáveis austeníticos estabilizados com nióbio são também sensíveis à fissuração a quente.

3.12.2 – Esforços de contração

A fissuração a quente é, em resumo, a incapacidade do metal de solda de se deformar sob a ação dos esforços inerentes à soldagem. Algumas medidas preventivas podem ser tomadas, para reduzir os esforços atuantes sobre a zona fundida na fase inicial do resfriamento. A diminuição da energia de soldagem, usando-se eletrodos de pequeno diâmetro é um exemplo. A soldagem com o mínimo de restrição à contração ou a transferência dos esforços da zona fundida para dispositivos de montagem são providências úteis.

O final da solda - a cratera - é uma região suscetível à fissuração devido aos elevados esforços de contração resultante da solidificação rápida (figura 6.25). A extinção gradativa do arco elétrico por meio de dispositivo especial (crater filler) é a melhor solução. O esmerilhamento da cratera é outra solução.

78

Page 77: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Mesmo que as medidas preventivas sejam adotadas, é aconselhável a inspeção com líquido penetrante de cada camada das soldas sensíveis à fissuração a quente.

3.13 – Tensões residuais e deformações em soldagem

A soldagem, devido ao aquecimento localizado, provoca tensões residuais e deformações que devem ser levadas em conta no projeto e fabricação das peças.

3.13.1 – Analogia da barra aquecida

Considere um dispositivo constituído de três barras engastadas a suportes fixos, inicialmente à temperatura ambiente (figura 6.26). Admita, agora, que a barra B seja aquecida independentemente das outras duas.

• A dilatação térmica restringida provoca tensões de compressão na barra B e de tração -para que o equilíbrio seja mantido - nas barras A e C.

• À medida que a temperatura se eleva, as tensões nas barras aumentam, atingindo o limite de escoamento na barra B (ponto 1). A partir desse ponto a dilatação térmica é absorvida com a deformação plástica da barra B.

• As curvas indicam a variação do limite de escoamento com a temperatura. Continuando o aquecimento, a tensão na barra B evolui ao longo de 1, 2, onde a plastificação impede o estabelecimento de tensões superiores ao limite de escoamento. O ponto 2 corresponde à temperatura máxima atingida (θ 2).

• Durante o resfriamento, a barra B se contrai tendendo para um comprimento livre menor do que L, em virtude da deformação plástica a que foi submetida. A tensão diminui, muda de sinal e atinge o limite de escoamento – à tração – no ponto 3.

• A partir do ponto 3 a contração térmica é absorvida por deformação plástica, não permitindo que a tensão na barra ultrapasse o limite de escoamento. Ao longo de 3, 4, o valor da tensão acompanha a variação do limite de escoamento com a temperatura.

• Concluindo o resfriamento, as 3 barras ficam submetidas a um sistema de tensões residuais. Na barra B a tensão é de tração e da ordem de grandeza do limite de escoamento do material.

Esse raciocínio é evidentemente simplificado. Não foi considerada a variação do módulo de elasticidade e do coeficiente de dilatação térmica, com a temperatura. A fluência do material (“creep”) foi também desprezada.

79

Page 78: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 6.26- Variação da tensão na barra B

3.13.2 – Repartição térmica e plastificação

Uma peça soldada se assemelha ao sistema de 3 barras. A repartição térmica mostra que a zona aquecida acima de θ 1 sofre deformações plásticas, analogamente à barra B, determinando o aparecimento de tensões residuais (figura 6.27). O nível de tensões depende do grau de restrição da estrutura, na direção considerada. Na maioria dos casos, a restrição é total na direção longitudinal do cordão de solda. Verificações experimentais confirmam que nessa direção as tensões são muito próximas do limite de escoamento.

Não dispondo de rigidez suficiente, as peças se deformam tendendo a aliviar as tensões residuais. As deformações são proporcionais à extensão da zona plastificada.

As tensões e deformações resultantes da soldagem aparecem em condições muito mais complexas que no modelo da barra aquecida. O movimento da fonte de calor, a variação do grau de restrição à medida que a solda é depositada e a soldagem em vários passes, são os principais fatores eliminados pela simplificação. Entretanto, apesar de sua relativa simplicidade, a analogia permite conclusões úteis, tais como:

80

Page 79: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 6.27- Distribuição de tensões residuais de uma solda

• O pré-aquecimento em temperaturas inferiores a θ 1 - aproximadamente 150º C, para os aços carbono - praticamente não reduz o nível de tensões residuais. O pré-aquecimento total da peça em temperaturas nas quais o limite de escoamento se anula, previne o aparecimento das tensões residuais. Entretanto, nesta condição, a peça pode se deformar sob ação de seu peso. O pré-aquecimento local - qualquer que seja a temperatura - não reduz o nível de tensões, embora apresente várias outras ações benéficas.• Repartições térmicas mais estreitas – soldagem com baixa energia (“low heat input”) – reduzem a zona plastificada, diminuindo as deformações. A soldagem a gás, por exemplo, provoca maiores deformações que a soldagem a arco. Pela mesma razão, o pré-aquecimento tende a aumentar as deformações.

81

Page 80: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

• A contração de solidificação não tenciona a peça soldada. A falta de continuidade do meio sólido não possibilita a ação de forças. Em vista disso, ao se avaliar as deformações, deve-se reportar às dimensões da zona plastificada e não da zona fundida da solda.

• As deformações podem ser evitadas, com a utilização de dispositivos de montagem, entretanto, deve-se considerar que, quanto maior o grau de restrição, mais elevadas são as tensões residuais de soldagem.

• Se as tensões atuam em duas ou três direções, dependendo da forma e dimensões da peça, as possibilidades de plastificação diminuem e as tensões residuais podem atingir valores superiores ao limite de escoamento, determinado pelo ensaio convencional – uniaxial – de tração.

3.14 – Tratamentos térmicos

Para se obter o controle metalúrgico de uma junta soldada e, por conseqüência, o controle das propriedades mecânicas, é necessário que se conheça os ciclos térmicos a que a junta soldada é submetida. Os tratamentos térmicos têm o objetivo de alterar ou conferir características determinadas à junta soldada.

3.14.1 – Tratamento térmico de alívio de tensões

O tratamento térmico de alívio de tensões consiste, de modo simplificado, em aquecer uniformemente a peça, de maneira que o limite de escoamento do material fique reduzido a valores inferiores às tensões residuais. Nesta condição, as tensões residuais provocam deformações plásticas locais diminuindo de intensidade.

O tratamento térmico de alívio de tensões é executado através do aquecimento da peça à temperatura apropriada e pela manutenção nesta temperatura por um determinado tempo, seguida de um resfriamento uniforme de modo a impedir a introdução de novas tensões. Para impedir mudanças na microestrutura ou dimensões da peça, a temperatura é mantida abaixo da temperatura crítica.

Para os aços carbono, somente os tratamentos realizados em temperaturas superiores a 500ºC são realmente eficazes. Para cada tipo de aço temperaturas específicas de tratamento são recomendadas.

O tratamento térmico de alívio de tensões pode reduzir a tenacidade do metal de base. Isto se torna bastante relevante em ocasiões em que se faz necessário a execução do tratamento por mais uma vez.

3.14.2 – Normalização

A normalização consiste no aquecimento da peça a uma temperatura acima da zona crítica (temperatura A3 ou temperatura Acm), seguida de resfriamento ao ar. É necessário que toda a estrutura se austenitize antes do resfriamento.

82

Page 81: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

O objetivo da normalização é a obtenção de uma microestrutura mais fina e uniforme. Os constituintes que se obtém da normalização do aço carbono são ferrita e perlita fina (aços hipoeutetóides) ou cementita e perlita fina (aços hipereutetóides). Dependendo do tipo de aço pode-se eventualmente, obter bainita (ver figura 6.28)

Figura 6.28- Normalização de um aço hipoeutetóide.

3.14.3 – Recozimento

O recozimento consiste no aquecimento da peça acima da zona crítica (A3) durante o tempo necessário para que toda a microestrutura se austenitize, seguido de um resfriamento muito lento, mediante o controle da velocidade de resfriamento do forno. A microestrutura obtida nos aços carbono é a perlita grossa e ferrita (ver figura 6.29)

Figura 6.29- Recozimento

3.14.4 – Têmpera e revenimento

A têmpera consiste no aquecimento da peça acima da zona crítica seguido de um resfriamento rápido. O objetivo da têmpera é a obtenção da estrutura martensítica resultando, por este motivo, no aumento da dureza e na redução da tenacidade da peça.

O revenimento é o tratamento térmico que normalmente acompanha a têmpera, pois atenua os inconvenientes produzidos por esta. O revenimento consiste em aquecer o material a temperaturas

83

Page 82: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

bastante inferiores à temperatura crítica, permitindo uma certa acomodação do sistema cristalino e, como conseqüência, a diminuição da dureza e o aumento da tenacidade da peça. A estrutura resultante chama-se de martensita revenida (ver figura 6.30).

Figura 6.30 - Tempera e revenimento

3.15 – Soldagem de aços carbono

A grande maioria de aços carbono empregados como elementos soldados tem percentagem de carbono inferior a 0,29%. Esses aços podem ser soldados pelos processos usuais de soldagem. Geralmente aços carbono contendo teores de C ≤ 0,19% e de Mn ≤ 1,60% podem ser soldados satisfatoriamente sem preaquecimento ou pós-aquecimento em espessuras inferiores a 25 mm. Entretanto, em aços carbono com teores de C > 0,20% e de Mn > 1,00%, deve-se especificar procedimentos de soldagem que resultem em baixos teores do hidrogênio dissolvido na solda.

Quando a espessura da peça a ser soldada é maior que 25 mm, podem ser necessárias precauções adicionais na soldagem como, por exemplo, pré-aquecimento, controle da temperatura interpasse e tratamento térmico de alívio de tensões. Tais precauções visam evitar a fissuração que pode ocorrer na zona fundida ou na zona afetada termicamente e a redução das propriedades mecânicas da junta soldada.

Quando, além de grandes espessuras, o material possui teores elevados de C e Mn as precauções com a soldagem devem ser mais rigorosas. Deve-se incluir nos procedimentos de soldagem cuidados que resultem em baixos teores de hidrogênio. Nesses casos, é desejável a utilização de processos com alta energia de soldagem e/ou pré-aquecimento.

É sempre necessária a limpeza da junta na etapa anterior a soldagem. O projeto da junta é especialmente importante na soldagem de grandes espessuras, já que afetam de modo relevante a qualidade, as deformações e o custo da soldagem.

84

Page 83: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

3.16 – Particularidades inerentes aos aços de baixa e média liga

Recebem a denominação geral de aços-liga todos os aços que possuam qualquer quantidade de outros elementos além dos que entram na composição do aço-carbono (Fe, C, Mn, Si, P e S). Esses elementos adicionais são denominados de “elementos de liga”. Exemplos de elementos de liga são: Cr, Ni, Mo, V, Nb, etc.

3.16.1 – Aços de baixa e média liga

Estão apresentados a seguir os aços de baixa e média liga mais utilizados nas construções soldadas.

Aços-liga Molibdênio e Cromo-Molibdênio

Os aços-liga molibdênio e cromo-molibdênio são aços contendo até 1% de Mo e até 9% de Cr como elementos de liga. São todos materiais magnéticos de estrutura ferrítica. Os aços-liga mais utilizados são os seguintes:

Elementos de liga % Nominal½ Mo1 ¼ Cr, ½ Mo2 ¼ Cr, 1 Mo5 Cr, ½ Mo7 Cr, ½ Mo9 Cr, 1 Mo

Do ponto de vista dos casos de emprego, pode-se subdividir esses materiais em dois grupos:

• Aços contendo até 2 ½ % de Cr• Aços contendo mais de 2 ½ % de Cr.

Aços contendo até 2 ½ % de Cr

Esses aços foram desenvolvidos especificamente para serviços em altas temperaturas, onde os esforços mecânicos forem elevados e a corrosividade do meio moderada.A principal aplicação desses aços-liga é para tubulações de vapor, cuja temperatura esteja acima do limite de temperatura admitida para o aço carbono.

85

Page 84: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Aços contendo mais de 2 ½ % de Cr

Esses aços são específicos para serviços em temperaturas elevadas com esforços mecânicos moderados e alta corrosividade do meio.

O principal caso de emprego desses materiais são as tubulações, tubos de permutadores de calor, e equipamentos de pequeno e médio porte em serviços com hidrocarbonetos em temperaturas acima de 250ºC.

Aços Níquel

Os aços níquel mais usuais são os seguintes:

Elementos de liga% Nominal

2 ½ %3 ½ %9%

Os aços contendo níquel como elemento de liga são os materiais específicos para serviços em baixas temperaturas. Quanto maior a percentagem de níquel, mais baixo também pode ser a temperatura de utilização do aço.

Aços-liga de alta resistência

Existe uma grande variedade de aços-liga desenvolvidos especialmente para apresentarem altos valores do limite de resistência, que pode atingir até 100 kgf/mm2. Os elementos de liga são variáveis, podendo conter Mn, Cr, Mo, V entre outros, em uma quantidade total de até 5%. Esses aços são submetidos a tratamento térmicos de têmpera e revenimento.

3.16.2 – Soldagem dos aços Cr-Mo

Os aços-liga Cr-Mo são soldáveis pelos processos usuais de soldagem. A característica dos aços Cr-Mo de serem temperáveis ao ar requer que os procedimentos de soldagem sejam desenvolvidos com a precaução de evitar a fissuração pelo hidrogênio. No desenvolvimento destes procedimentos, devem ser considerados o controle do preaquecimento, o pós-aquecimento, a composição do metal de adição e os tratamentos térmicos após a soldagem.

Recomenda-se que o metal de adição tenha a mesma composição química nominal que o metal de base, exceto no teor de carbono que deve ser menor no metal de adição.

Quando aços Cr-Mo de diferentes composições têm que ser soldados pode-se utilizar a composição que contenha mais elementos de liga ou metal de adição, cuja composição seja igual ou superior à média dos teores de cromo dos metais de base. Por exemplo; na soldagem do um aço com 1 ¼ %Cr

86

Page 85: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

– ½ %Mo com um aço contendo ½ %Cr – ½ % Mo, pode-se utilizar o metal de adição com 1 ¼ %Cr – ½ %Mo. Nesses casos, costuma-se freqüentemente utilizar metais de adição de aço inoxidável austenítico, principalmente em casos de reparo em que a solda não pode sofrer tratamento térmico após soldagem. O metal de adição de aço inoxidável austenítico tem uma excelente ductilidade e absorve as tensões de contração, além de reduzir a possibilidade de fissuração pelo hidrogênio, pois retém o hidrogênio, que tem alta solubilidade na austenita. Entretanto, no caso das condições de trabalho cíclico ou em temperaturas que permitam a difusão do hidrogênio para o metal de base, não se recomenda a utilização de metal de adição de aço inoxidável austenítico, pois as diferenças entre os coeficientes de expansão térmica e as composições químicas entre o aço inoxidável austenítico e os aços-liga Cr-Mo são muito elevadas.

3.17 – Particularidades inerentes aos aços de alta liga

Os aços de alta liga que serão estudados são os aços inoxidáveis. Os aços inoxidáveis não se oxidam à atmosfera ambiente normal. Esta propriedade é conseguida pelo fato de contarem no mínimo 12% de cromo.

3.17.1 – Classificação dos aços inoxidáveis

Os aços inoxidáveis são classificados em três grupos, de acordo com a estrutura cristalina predominante na liga à temperatura ambiente:

• Aços inoxidáveis austeníticos;• Aços inoxidáveis ferríticos;• Aços inoxidáveis martensíticos.

AÇOS INOXIDÁVEIS AUSTENÍTICOS

Os aços inoxidáveis austeníticos contêm 16 a 26% de Cr, 6% a 22% de Ni, além de eventualmente outros elementos de liga; esse grupo de aços abrange cerca de 20 tipos diferentes, entre os quais, os mais importantes estão mostrados abaixo:

DESIGNAÇÃO AISI COMPOSIÇÃO NOMINAL (%)

304C ≤ 0,08; Mn ≤ 2,0; Si ≤ 1,0;18,0 ≤ Cr ≤ 20,0; 8,0 ≤ Ni ≤ 10,5

309C ≤ 0,20; Mn ≤ 2,0; Si ≤ 1,0;22,0 ≤ Cr ≤ 24,0; 12,0 ≤ Ni ≤ 15,0

310C ≤ 0,08; Mn ≤ 2,0; Si ≤ 1,0;24,0 ≤ Cr ≤ 26,0; 19,0 ≤ Ni ≤ 22,0

316C ≤ 0,08; Mn ≤ 2,0; Si ≤ 1,0;16,0 ≤ Cr ≤ 20,0; 10,0 ≤ Ni ≤ 14,0; 2,0 ≤ Mo ≤ 3,0

321C ≤ 0,08; Mn ≤ 2,0; Si ≤ 1,0;17,0 ≤ Cr ≤ 19,0; 9,0 ≤ Ni ≤ 12,0; Ti ≤ 0,7

347 C ≤ 0,08; Mn ≤ 2,0; Si ≤ 1,0;

87

Page 86: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

17,0 ≤ Cr ≤ 19,0; 9,0 ≤ Ni ≤ 13,0; Cb + Ta ≤ 1,1

Deve-se observar que, devido à sua estrutura cristalina os aços inoxidáveis austeníticos não são magnéticos. Outra característica importante é que os aços inoxidáveis austeníticos têm grande ductilidade e elevado coeficiente de dilatação térmica, se comparado com os aços de estrutura ferrítica.

AÇOS INOXIDÁVEIS FERRÍTICOS MARTENSÍTICOS

Esses aços inoxidáveis têm, dependendo do tipo, de 12 a 30% de Cr; a maioria não contém Ni, porém alguns deles contêm pequenas porcentagens desse metal. São todos ligas magnéticas. Abaixo estão mostrados os principais tipos de aços deste grupo.

DESIGNAÇÃO AISI COMPOSIÇÃO NOMINAL (%)

405C ≤ 0,08; Mn ≤ 1,0; Si ≤ 1,0;11,5 ≤ Cr ≤ 14,5; Ni ≤ 0,6; 0,1 ≤ Al ≤ 0,3

410C ≤ 0,15; Mn ≤ 1,0; Si ≤ 1,0;11,5 ≤ Cr ≤ 13,5; Ni ≤ 0,75

410SC ≤ 0,08; Mn ≤ 1,0; Si ≤ 1,0;11,5 ≤ Cr ≤ 13,5; Ni ≤ 0,6

430C < 0,12; Mn < 1,0; Si < 1,0;16,0 ≤ Cr ≤ 18,0; Ni < 0,75

446C < 0,20; Mn < 1,5; Si < 1,0;23,0 ≤ Cr ≤ 30,0

Os aços inoxidáveis ferríticos e martensíticos apresentam, em relação aos austeníticos, bem menor resistência à corrosão em geral.

3.17.1 – Diagrama de Schaffler

Em soldagem é importante a avaliação da estrutura e o conseqüente conhecimento das propriedades de um depósito de solda de aços inoxidáveis. Esse conhecimento influi na escolha do processo adequado para a execução da soldagem, bem como na previsão e prevenção dos problemas que podem ocorrer, determinando também, em conseqüência, os tratamentos térmicos necessários, anteriores ou posteriores à soldagem.

O diagrama de Schaeffler é o principal instrumento para a avaliação do depósito de solda. Ele permite prever com antecedência a microestrutura de uma solda de liga Cr - Ni. Permite também escolher os eletrodos apropriados para cada soldagem, mesmo heterogênea, de aço liga, aço carbono, aço inoxidável ferrítico, austenítico, etc. Chega-se a comparar a importância do diagrama de Schaeffler para os aços inoxidáveis à importância do diagrama Fe – Fe3C para os aços-carbono.

Para a utilização do diagrama do Schaeffler é necessário calcular os seguintes parâmetros:

88

Page 87: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Cromo Equivalente

É definido igualmente como a soma ponderada dos elementos alfágenos e expressa sua influência de vários elementos químicos relativamente ao Cromo. Schaeffler o definiu como:

Creq = % Cr + % Mo + 1,5 x % Si + 0,5 x % Nb

Níquel Equivalente

É definido igualmente como a soma do teor de níquel e dos elementos gamágenos, multiplicados pelo fator que expressa sua influência relativamente ao níquel. Assim, Schaeffler definiu o teor de níquel equivalente como:

Nieq = % Ni + 30 x % C + 0,5 x % Mn

A parte mais importante do diagrama é a região austeno-ferrítica, onde se encontram várias curvas que expressam o teor de ferrita na estrutura. Essas linhas são de grande utilidade, ver diagrama na figura 6.31.

Figura 6.31 - Diagrama de Schaeffler

89

Page 88: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Região 1

Abrange a região dos aços inoxidáveis ferríticos ao cromo, com baixo teor de carbono. Nesta região, o problema é o crescimento irreversível dos grãos, quando permanecem por muito tempo a temperaturas maiores que 11500C.

Região 2

Esta região abrange as estruturas martensíticas e parte das estruturas mistas martensítica-austenítica e martensítica-ferrítica. Nesta região, o problema é a fissuração pelo hidrogênio.

Região 3

Esta região engloba todas as composições de ligas que tem possibilidade de dar, após longo tempo de permanência em temperaturas na faixa de 500 – 900ºC, aparecimento a uma fase chamada fase sigma, basicamente Fe – Cr, que tem como principal característica uma grande fragilidade à temperatura ambiente. A fase sigma, sendo formada basicamente por ferro e cromo, tem mais facilidade de se formar a partir da ferrita. Entretanto, ligas austeníticas também podem gerar fase-sigma.Região 4

Essa região engloba basicamente as composições austeníticas. O problema que pode ocorrer nas soldagens de ligas cuja composição esteja neste campo, é fissuração a quente.

Região Central

Ao centro do diagrama existe uma região que não pertence a nenhum dos quatro campos. As composições químicas que pertencem a essa região indicam que a liga está praticamente livre dos quatro problemas citados. O objetivo então é tentar fazer com que a composição química da zona fundida caia dentro dessa região, embora esse procedimento não resolva a situação para a zona afetada termicamente, cuja composição química é do metal de base. Os parâmetros a controlar para a consecução desse objetivo são basicamente a escolha do metal de adição (eletrodo, fluxo, etc.) e o controle da diluição (participação do metal de base), possível pela seleção apropriada dos parâmetros do processo de soldagem utilizado.

Ainda que esse objetivo não seja atingido, o diagrama de Schaeffler fornece a indicação do problema principal a encontrar na soldagem, possibilitando-nos a prevenção (ou correção) necessária.

Exemplo de aplicação do Diagrama de Schaeffler

Verificar a composição da solda executada em uma tubulação de aço-liga ASTM A 335 Gr P5 no processo manual com eletrodo revestido austenítico AWS E 309-16.

90

Page 89: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Composição química do aço A 335 Gr P5

% C ≤ 0,15 % Si ≤ 0,500,30 ≤ % Mn ≤ 0,60 4% ≤ % Cr ≤ 6%P ≤ 0,030 0,45 ≤ % Mo ≤ 0,65S ≤ 0,030

Composição do eletrodo E 309-16

% C ≤ 0,15 % Mn ≤ 2,522 ≤ % Cr ≤ 25 % Si ≤ 0,912 ≤ % Ni ≤ 14 % P ≤ 0,04

% S ≤ 0,03

Cálculo dos teores de Cr e Ni equivalentes Metal de Base

Creq máx. = 6 + 0,65 + 1,5 x 0,5 = 7,4%Creq mín. = 4 + 0,45 + 1,5 x 0,5 = 5,2%Nieq máx. = 0 + 30 x 0,15 + 0,5 x 0,6 = 4,8%Nieq mín. = 0 + 30 x 0,15 + 0,5 x 0,3 = 4,65%

Metal de Adição

Creq máx. = 25 + 1,5 x 0,90 = 26,35Creq mín. = 22 + 1,5 x 0,90 = 23,35Nieq máx. = 14 + 30 x 0,15 + 0,5 x 2,5 = 19,75Nieq mín. = 12 + 30 x 0,15 + 0,5 x 2,5 = 17,75

91

Page 90: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

Figura 6.32- Diagrama de Schaeffler

Pelo diagrama vê-se que há uma linha reta que liga os centros de gravidade dos retângulos correspondentes às composições químicas do metal de base e do metal de adição.

A composição química da zona fundida não será a do metal de adição, devido à diluição (participação do metal de base). Mas estará em algum ponto dessa linha reta, entre o metal de base e o eletrodo, dependendo do grau de diluição, que por sua vez depende dos parâmetros de soldagem, do processo e do passe de solda executado. Espera-se a diluição máxima para o passe de raiz, justamente onde há a maior probabilidade de defeitos.

Com uma diluição de até cerca de 45% vemos no diagrama que a estrutura da zona fundida será totalmente austenítica. Como a diluição normal obtida em uma soldagem a arco com eletrodo revestido é da ordem de 10 a 30%, portanto menor que 45%, não deve ser considerado o problema de têmpera e fissuração pelo hidrogênio, embora deva ocorrer têmpera em uma faixa da zona afetada termicamente. O problema que pode ocorrer é a fissuração a quente (região 4 do diagrama).No passe de raiz, a estrutura já será totalmente austenítica, qualquer que seja a diluição, por exemplo, 30%.

Para o 2º passe o metal de base já não será o da tubulação, mas uma mistura entre ele e o metal da zona fundida do 1º passe, prevalecendo este em proporção.

3.17.2 – Número de ferrita

Em aços inoxidáveis CR – Ni austeníticos, soldas totalmente austeníticas, sem fase ferrítica, são propensas à fissuração a quente. Soldas contendo de 4 a 10% de ferrita são resistentes à fissuração.

Para se determinar a percentagem de ferrita em uma solda foi introduzido o conceito de Número de Ferrita (NF). O estabelecimento deste conceito veio a facilitar a determinação da percentagem de

92

Page 91: Apostila de Metalurgia Versao White Martins

ferrita uma vez que o número de ferrita de uma solda é medido por leituras magnéticas, com aparelhos calibrados em corpos de prova padrão.

O número de ferrita é essencialmente equivalente à percentagem de ferrita sendo que, quando NF < 6, a percentagem de ferrita é igual ao número de ferrita, e quando NF > 6, passa a existir uma pequena discrepância entre o número e a percentagem de ferrita.

Para se prever a percentagem de ferrita na composição de uma solda utiliza-se o Diagrama de Schaeffler, que permite a escolha do metal de adição mais adequado.

93