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1 Apocalipse, capítulo 2 1 O Cristo glorificado, Senhor da igreja e dos reis da terra e detentor da chave da morte e do inferno, visto por João no capítulo 1, dá o tom de todo o livro de Apocalipse. Tendo como base a autoridade de Jesus, o capítulo 2 tem início com a ordem para que sejam entregues a sete igrejas da Ásia Menor (Éfeso, Esmirna, Pérgamo, Tiatira, Sardes, Filadélfia e Laodiceia) mensagens que expressam o contentamento e/ou descontentamento do Cordeiro com o estado espiritual dessas comunidades. Essas igrejas não eram as únicas na região, mas, por algum motivo, Deus as escolheu para que fossem as destinatárias das cartas que serviriam de ensino, admoestação e consolo para elas e para todas as comunidades cristãs desde então. Ao lado daqueles que entendem assim, há quem afirme que as cartas, embora citem comunidades que realmente existiram, são, na verdade, representação de períodos históricos por que tem passado a igreja ao longo dos anos. Essa é a teoria dispensacionalista, que divide as cartas da seguinte maneira: Éfeso: igreja primitiva; Esmirna: perseguição sofrida na era patrística; Pérgamo: tempo de Constantino; Tiatira: era medieval; Sardes: período da Reforma protestante; Filadélfia: séculos 18 e 19 (missões estrangeiras); Laodiceia: época moderna. Aumento da apostasia e volta de Cristo. A maioria dos estudiosos, no entanto, fecha com a teoria da existência real dessas comunidades e da atualidade das cartas para todos os cristãos. 1 Este estudo não é autoral. Consiste, em sua quase totalidade, na compilação de ideias dos autores citados nas referências, ao final do capítulo.

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Apocalipse, capítulo 21

O Cristo glorificado, Senhor da igreja e dos reis da terra e detentor da

chave da morte e do inferno, visto por João no capítulo 1, dá o tom de todo o

livro de Apocalipse.

Tendo como base a autoridade de Jesus, o capítulo 2 tem início com a

ordem para que sejam entregues a sete igrejas da Ásia Menor (Éfeso, Esmirna,

Pérgamo, Tiatira, Sardes, Filadélfia e Laodiceia) mensagens que expressam o

contentamento e/ou descontentamento do Cordeiro com o estado espiritual

dessas comunidades. Essas igrejas não eram as únicas na região, mas, por

algum motivo, Deus as escolheu para que fossem as destinatárias das cartas

que serviriam de ensino, admoestação e consolo para elas e para todas as

comunidades cristãs desde então.

Ao lado daqueles que entendem assim, há quem afirme que as cartas,

embora citem comunidades que realmente existiram, são, na verdade,

representação de períodos históricos por que tem passado a igreja ao longo

dos anos. Essa é a teoria dispensacionalista, que divide as cartas da seguinte

maneira:

• Éfeso: igreja primitiva;

• Esmirna: perseguição sofrida na era patrística;

• Pérgamo: tempo de Constantino;

• Tiatira: era medieval;

• Sardes: período da Reforma protestante;

• Filadélfia: séculos 18 e 19 (missões estrangeiras);

• Laodiceia: época moderna. Aumento da apostasia e volta de Cristo.

A maioria dos estudiosos, no entanto, fecha com a teoria da existência

real dessas comunidades e da atualidade das cartas para todos os cristãos.

1 Este estudo não é autoral. Consiste, em sua quase totalidade, na compilação de ideias dos autores citados nas referências, ao final do capítulo.

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Essa série de mensagens toma os capítulos 2 e 3 do livro de Apocalipse,

cabendo ao capítulo 2 o registro das quatro primeiras cartas: a Éfeso, Esmirna,

Pérgamo e Tiatira. Vamos a elas, então.

• Carta à igreja de Éfeso

A cidade de Éfeso era a quarta maior do império romano, perdendo

apenas para Roma, Alexandria e Antioquia da Síria. Contava com

aproximadamente 250 mil habitantes e era um centro comercial e de negócios,

por ser uma cidade portuária.

Ruínas da antiga Éfeso

A cidade era guardiã do templo da deusa Diana (para os gregos, deusa

Ártemis), monumento considerado uma das sete maravilhas do mundo antigo.

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O templo de Diana era quatro vezes maior que o Partenon de Atenas, possuía

127 pilares de 18m de altura e contava com o serviço de milhares de

sacerdotes e sacerdotisas, muitas delas prostitutas. A estátua original era uma

rocha bruta, pouco esculpida, escura, com muitos seios, que os romanos

consideravam ser um meteorito caído do céu.

Imagem ilustrativa do que teria sido o templo da deusa Diana Atos 19.23-41 relata o episódio em que o apóstolo Paulo se viu

envolvido em tumulto provocado por seguidores da deusa Diana, onde se pode

ver a grandeza do culto e do comércio criado em torno dele.

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O que restou do templo à deusa Diana

Além da adoração a Diana, o culto ao imperador era bastante

desenvolvido em Éfeso, o que provavelmente era fonte de conflito entre os

moradores da cidade e os cristãos, com possível perseguição àqueles que não

participavam das atividades relativas, direta ou diretamente, ao culto pagão.

Inicialmente, o culto ao imperador era dedicado apenas aos soberanos mortos,

mas alguns imperadores passaram a aceitar adoração em vida, o que acirrou a

perseguição aos cristãos, por se negarem a participar dessas celebrações.

Alguns estudiosos consideram a possibilidade de Priscila e Áquila terem

fundado a igreja em Éfeso, pois Atos 18.18-25 e 19.1-7 relatam a visita de

Paulo e do casal à igreja lá estabelecida. A narrativa traz também a chegada

de Apolo, que, após falar na sinagoga sobre o batismo de João, é instruído

mais precisamente sobre Jesus por Priscila e Áquila.

A cidade de Éfeso não existe mais. Nem a igreja. Até 500 d.C., a cidade

ainda era importante na região, mas problemas naturais fizeram com que fosse

abandonada e seu tesouro arqueológico levado para Constantinopla. No século

XIV, os turcos removeram os últimos habitantes da região. A 3 km da antiga

Éfeso, surgiu a cidade de Selçuk, mas o parque arqueológico de Éfeso

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continua aberto à visitação pública e ainda guarda os traços da grandiosidade

da cidade antiga.

Região em que se localizou a antiga Éfeso

Verso 1: Ao anjo da igreja em Éfeso escreve: Isto diz aquele que tem na sua

destra as sete estrelas, que anda no meio dos sete candeeiros de ouro:

O primeiro versículo do capítulo traz a ordem a João para que escreva a

carta à igreja em Éfeso e repete, com ligeira diferença, a descrição de Cristo

contida no capítulo 1: “aquele que tem na sua destra as sete estrelas, que anda

no meio dos sete candeeiros de ouro”. A maior parte das cartas às igrejas

reproduzirá um atributo do Cristo glorificado, presente na visão que João teve

no primeiro capítulo, e que guardará relação com a realidade da igreja.

O próprio Cristo, no final do capítulo 1, já havia revelado o significado

das sete estrelas (os anjos das sete igrejas) e dos sete candeeiros (as sete

igrejas), sendo, neste verso, acrescido o fato de que Cristo “anda no meio dos

sete candeeiros”, diferentemente do verso 13 do primeiro capítulo, em que o

escritor diz apenas ter visto o Cristo glorificado no meio dos candeeiros. Esse

movimento de Jesus demonstra sua augusta presença no meio das igrejas,

observando todas as coisas, zelando pelos seus filhos e exercendo sua

autoridade divina.

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Cada igreja é uma entidade espiritual na mão do Cristo, por isso as sete

estrelas (os líderes das igrejas – vide discussão no capítulo 1) estão sob seu

controle, em sua mão. O verbo utilizado no capítulo 1 equivale a “segurar”, mas

aqui tem sentido mais contundente, equivalendo a “agarrar”, em clara indicação

de autoridade, zelo, preocupação e vigilância.

Verso 2: Conheço as tuas obras, e o teu trabalho, e a tua perseverança; sei

que não podes suportar os maus, e que puseste à prova os que se dizem

apóstolos e não o são, e os achaste mentirosos;

Ao revelar conhecimento das obras da igreja em Éfeso, Cristo não se

refere apenas ao conhecimento intelectual, mas a um conhecimento absoluto

de toda a caminhada espiritual da comunidade.

Jesus conhece o trabalho realizado pelos crentes daquela igreja e o

termo original aqui traduzido como “trabalho” é o mesmo que Paulo usa em

diversas cartas, indicando serviço pesado, verdadeiro labor. É o caso de 1 Ts

2.9; 2 Ts 3.8 e 1 Co 15.58, que falam sobre o trabalho físico árduo de Paulo na

construção de tendas, bem como seu esforço na pregação do evangelho.

Apocalipse 14.13 faz uso do mesmo termo e revela que esse trabalho não

ficará sem recompensa.

O Mestre conhece também a perseverança dos cristãos de Éfeso — o

exercício da paciência em meio à dificuldade —, resposta esperada por Deus

ao longo de todo o livro. A perseverança é um tema que perpassa todo o

Apocalipse (1.9; 2.2,3,19; 3.10; 13.10; 14.12) e seu resultado é a vitória.

Fidelidade e perseverança são virtudes que se completam e que devem existir

na vida daquele que crê independentemente das circunstâncias, como se verá

ao longo da narrativa joanina.

A igreja em Éfeso é elogiada porque não suporta pessoas más, moral e

espiritualmente, pondo-as à prova, para que, não havendo verdade nelas, suas

más obras venham à luz. O zelo da igreja em preservar o ensino correto das

Escrituras aparece na intensidade da expressão “não podes suportar os maus”,

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o que a levou a reprovar aqueles que se diziam apóstolos sem ser,

desmascarando-os e rejeitando-os.

O versículo faz referência a falsos mestres, fato bastante comum na vida

da igreja do primeiro século e muito combatido pelos apóstolos. Não se sabe

quem eram precisamente, mas é possível que se tratasse de missionários,

evangelistas ou mestres itinerantes que percorriam as igrejas ou iam de casa

em casa ensinando doutrinas pouco ortodoxas. Talvez tenham sido judaizantes

vindos de Jerusalém, que combatiam o evangelho de Jesus, ou, ainda, os

nicolaítas, grupo fortemente combatido em algumas das sete igrejas da Ásia

Menor. Em qualquer das hipóteses, eram pessoas que não ensinavam o

verdadeiro evangelho e estavam causando prejuízo à igreja em Éfeso.

A atitude de rejeição aos falsos mestres é elogiada por Jesus, pois

demonstra zelo pelas coisas de Deus e o desejo de preservar a pureza do

evangelho, o único capaz de conduzir os homens à salvação. Permitir o ensino

corrompido em qualquer tempo, mas especialmente no berço da igreja, seria

comprometer toda a história da igreja no mundo.

Os crentes de Éfeso não aceitaram qualquer ensinamento, antes

testaram aqueles que ensinavam e rejeitaram a todos que não ensinavam a

verdade de Deus, ainda que ostentassem títulos. Não se deixaram seduzir pela

aparência humana, nem pelo status dos mestres, sendo corajosos o suficiente

para declará-los mentirosos e não permitir que continuassem sua obra

desconstrutora. Inácio, bispo de Antioquia, deixou registrado que Éfeso foi a

igreja que não tolerou falsos mestres, reconhecendo o zelo dessa comunidade.

Verso 3: e tens perseverança e por amor do meu nome sofreste, e não

desfaleceste.

No verso 3, Cristo continua elogiando os crentes efésios, mencionando

novamente sua perseverança e afirmando que sofreram motivados pelo amor

ao seu nome e não esmoreceram nem desistiram. Os cristãos de Éfeso

puseram-se ao lado de Cristo, posicionaram-se segundo sua fé, ficaram firmes

em sua ortodoxia e por essa razão sofreram. E sofreram por amor, sabendo

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que maior amor demonstrara Cristo por eles em seu sacrifício na cruz e, por

isso, zelaram pelo nome venturoso do Filho de Deus, padecendo em

consequência de sua fidelidade.

Não se trata tão somente de sofrer por uma causa, mas de sofrer

movido pelo amor, o mais poderoso dos sentimentos, capaz de fazer o ser

humano abrir mão de sua própria segurança, da segurança de seu grupo, para

contemplar bem maior: o próprio Deus. É essa motivação e essa ação que

Jesus enaltece nos crentes de Éfeso.

Verso 4: Tenho, porém, contra ti que deixaste o teu primeiro amor.

Os elogios à igreja em Éfeso dão lugar a uma queixa muito significativa.

Deus tem contra os cristãos efésios que eles deixaram o primeiro amor. No

verso anterior, eles são elogiados pelo amor demonstrado ao nome de Jesus,

logo não é esse tipo de amor que falta no coração dos seus filhos. Enquanto o

amor ao nome de Jesus remete ao zelo pela fé, o primeiro amor remete ao

entusiasmo, à empolgação, ao fogo dos primeiros anos, semelhantemente ao

fogo da paixão dos primeiros tempos dos enamorados. Há ortodoxia no

coração dos efésios, mas falta intimidade com Deus, amor e desejo de um

relacionamento pessoal.

Mt 24.12 fala sobre o esfriamento que se verificará nos últimos dias, o

que pode ocorrer mesmo não se abrindo mão da verdade. Ortodoxia fria, zelo

sem amor, à semelhança dos judeus, que eram zelosos, mas não tinham

entendimento, não satisfaz o coração de Jesus, que pede, acima de tudo, o

nosso coração. Os efésios estavam amando mais a verdade que o Deus da

verdade. Da mesma forma que é possível ser irrepreensível sem nem ser

cristão, é possível desenvolver a ortodoxia enquanto o amor encolhe. O

cristianismo é antes, e mais que tudo, relacionamento de amor entre filho e pai

em resposta ao amor primeiramente recebido. Sem amor, tudo mais perde

expressão e brilho. O próprio cristão começa a se ressentir da vida cristã

quando o entusiasmo diminui, daí a importância de manter acessa a chama.

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Uma igreja que para de amar deixa de ser igreja, até porque a diminuição do

amor a Deus trará, invariavelmente, a diminuição do amor ao próximo.

Verso 5: Lembra-te, pois, donde caíste, e arrepende-te, e pratica as primeiras

obras; e se não, brevemente virei a ti, e removerei do seu lugar o teu

candeeiro, se não te arrependeres.

A solução para a falha da igreja em Éfeso vem no verso 5, sob a forma

de tríplice imperativo: “lembra-te”, “arrepende-te” e “pratica”. Arrependimento e

mudança é o que deve ocorrer no coração dos cristãos.

Lembra-te: os efésios precisarão refletir sobre sua história e descobrir

onde caíram, onde começaram a mudar, que valores negociaram, o que lhes

enfraqueceu o amor, em última instância, em que momento mudaram o rumo

da vida cristã. Identificar as raízes do erro ajuda a voltar atrás.

Arrepende-te: o arrependimento é o reconhecimento de que a

reprovação divina tem razão de ser. É identificar o erro e se entristecer com

ele. A palavra de Deus diz que a tristeza segundo Deus produz vida, pois leva

à mudança. Não se trata de remorso, mas de humildemente concordar com

Deus que algo não está certo.

Pratica as primeiras obras: significa voltar atrás e readquirir o padrão

divino de sentir e agir. O arrependimento leva, obrigatoriamente, à obediência,

a buscar aquilo que Deus ordenou. No caso dos efésios, significa cultivar o

relacionamento genuíno com Deus, que leva à ortodoxia, ao zelo pela pureza

do evangelho, mas que não se resume a isso nem tem esse procedimento

como motivação, mas como resultado.

O não atendimento à ordem divina traz juízo e a medida anunciada é a

perda do testemunho, a perda da posição como igreja. Inácio, em seus

escritos, testifica que a igreja em Éfeso mudou, o que, estando correto o seu

registro, afastou o juízo anunciado. Deus repreende não para punir,

primeiramente, mas para estimular à mudança, com o fim de que o julgamento

não seja necessário.

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Verso 6: Tens, porém, isto, que aborreces as obras dos nicolaítas, as quais eu

também aborreço.

O momento que seria o encerramento da carta, como acontece nas

cartas seguintes, volta a ser o registro de um elogio. Os efésios aborrecem a

obra dos nicolaítas, as quais Deus também aborrece. Ao anúncio do juízo

segue-se novo incentivo, ressaltando que cristãos efésios e Deus estão em

harmonia ao rejeitar a doutrina dos nicolaítas. Novamente o zelo dos efésios é

engrandecido.

Embora não se tenha muitas informações sobre quem exatamente eram

os nicolaítas e qual seu ensinamento, sabe-se, também pelos comentários em

outras cartas, que se está falando de imoralidade e idolatria, o que se estudará

mais detidamente nos próximos capítulos. A relação que as demais cartas

estabelecem entre Balaão e Jezabel, personagens do Antigo Testamento que

estiveram envolvidos com idolatria e imoralidade esclarecerão melhor esse

ponto. Alguns estudiosos também levantam a possibilidade de os nicolaítas

terem ligação com o culto ao imperador. O fato é que, novamente, os efésios

estão rejeitando o que Deus também rejeita, e isso lhes é imputado como

justiça.

Verso 7: Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas. Ao que

vencer, dar-lhe-ei a comer da árvore da vida, que está no paraíso de Deus.

O fecho da carta é uma advertência profética para que todos deem

ouvidos ao que Jesus determinou que João registrasse em carta. Aquilo que é

dito deve ser levado a sério, pois quem as profere tem autoridade para ordená-

las. Trata-se de advertência para se abrir a mente e o coração para as

verdades do Alto, que regulam o mundo físico e o mundo invisível. Aquilo que o

Espírito diz é para esclarecimento e orientação de todos os seres humanos, é

verdade e, como tal, deve ser recebida. O Espírito é o meio da revelação, a

qual visa levar os homens ao arrependimento e à obediência.

O vencedor — aquele que perseverar na verdade — receberá a

recompensa, no caso, comerá da árvore da vida, no paraíso de Deus, nunca

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mais morrerá e habitará com Deus. É o resgate do Éden, onde tudo começou,

de onde o homem poderia nunca ter saído. O que Adão e Eva não

experimentaram, comer do fruto da árvore da vida, nós experimentaremos,

pois, consumada a obra de Cristo e debaixo dos seus efeitos, poderemos viver

para sempre. A mensagem final da carta aos efésios é um estímulo e também

um desafio para que todos sejam vencedores e desfrutem da glória do reino de

Deus.

Nossa vitória é participar da vitória já alcançada por Jesus Cristo e

nossa vida deve declarar a vitória de Jesus sobre o pecado e a morte e a

confiança no triunfo final sobre o mal. Devemos viver apenas para Deus, acima

de qualquer coisa ou circunstância terrena, como demonstração de fidelidade e

perseverança.

• Carta à igreja de Esmirna

A cidade de Esmirna, tal qual Éfeso, era uma cidade portuária,

localizada no mar Egeu. A 50 km de Éfeso, Esmirna disputava com ela e com

Pérgamo a posição de maior cidade da Ásia. Em 95 a.C, foi erigido um templo

à deusa Roma e, em 26 d.C., um templo ao imperador Tibério, fato que

confirma a existência do culto ao imperador na região. Esmirna era

extremamente fiel ao Império Romano. Aquedutos conduziam água em

abundância à cidade, que possuía vida cultural intensa. Única das sete cidades

que existe até hoje, a antiga Esmirna chama-se hoje Izmir e é considerada a

maior cidade da Turquia asiática.

Ruínas da antiga Esmirna

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Cidade de Izmir, antiga Esmirna

Verso 8: Ao anjo da igreja em Esmirna escreve: Isto diz o primeiro e o último,

que foi morto e reviveu:

A carta à igreja em Esmirna apresenta a mesma estrutura da carta à

igreja em Éfeso e traz mais um atributo de Cristo.

Importante obsevar que os títulos atribuídos a Jesus e escolhidos para

cada carta guardam relação com a realidade vivida pela comunidade. Os

atributos de Jesus retirados do capítulo 1 são: “o primeiro e o último, que foi

morto e reviveu”, os quais falam de sua eternidade e soberania. Ele é o início e

o fim de todas as coisas e, embora tenha morrido, está vivo e tem o controle de

todas as coisas. Cristo é o Senhor da história e, mesmo que os cristãos em

Esmirna sejam perseguidos e mortos, são vencedores, pois ele venceu a

morte.

Verso 9: Conheço a tua tribulação e a tua pobreza (mas tu és rico), e a

blasfêmia dos que dizem ser judeus, e não o são, porém são sinagoga de

Satanás.

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Novamente Jesus diz que conhece sua igreja e dá início à sua avaliação

destacando seus pontos fortes.

O texto deixa claro que a igreja passa por tribulações e que, embora

Esmirna seja uma cidade próspera, há pobreza no meio do povo de Deus.

Esmirna participa dos sofrimentos de Cristo (Fp 3.10), não somente dos

benefícios de sua obra salvífica. Na igreja primitiva, sofrer por amor a Cristo era

considerado um privilégio, e a comunidade de Esmirna assim entendia. Sua

pobreza material, no entanto, não ofuscava sua riqueza espiritual, por isso

Jesus declara que ela é rica.

Policarpo, bispo em Esmirna no século II, registra a existência de muitos

judeus na cidade, e a menção a eles, na carta, revela a natureza da

perseguição por que passa a igreja, que sofre com a blasfêmia daqueles que

deveriam a ela se unir na promessa do advento do messias. Não tendo crido

em Jesus, os judeus perseguem os cristãos, e a igreja sofre com calúnias e

oposição.

Desde antes de Jesus, os judeus gozavam da tolerância do Império

Romano em relação à religião. Eles tinham liberdade de culto e podiam

livremente adorar a Deus em suas sinagogas e no templo. Pouco tempo depois

do surgimento do Cristianismo, no entanto, os judeus fizeram questão de deixar

claro que os seguidores de Jesus não faziam parte de seu grupo e o resultado

foi que, em diversas ocasiões, também o Império Romano perseguia a igreja. A

diáspora mencionada em Atos dos Apóstolos é prova disso. A igreja se

dispersou por várias regiões e, com ela, o evangelho foi disseminado. O

resultado foi positivo, mas a causa, não.

Quando perseguidos, os seguidores de Cristo sofriam todo tipo de

oposição, chegando a perder seus empregos e a ter suas propriedades

queimadas ou destruídas. As classes mais pobres, sem o apoio do Estado

romano, ficavam alijadas da vida social, que, muitas vezes, centrava-se em

atividades ligadas ao culto religioso pagão ou ao culto ao imperador.

Apesar de tudo isso, como dito, Jesus declara que os crentes da igreja

em Esmirna são ricos, pois ele os tem abençoado com riquezas jamais

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sonhadas, como a certeza da salvação, a promessa da vida eterna e a

comunhão pessoal com Deus, seu Filho e o Espírito Santo. Quanto aos judeus,

todavia, Jesus declara que, de fato, não o são, sendo antes sinagoga de

Satanás. Se fossem judeus de coração, teriam crido em Cristo, não

perseguiriam sua igreja e, muito menos, blasfemariam do seu nome. A

sinagoga, símbolo da fé judaica, torna-se sinagoga de Satanás, pois esses

judeus deixaram, há muito, de seguir a Deus.

Verso 10: Não temas o que hás de padecer. Eis que o Diabo está para lançar

alguns de vós na prisão, para que sejais provados; e tereis uma tribulação de

dez dias. Sê fiel até a morte, e dar-te-ei a coroa da vida.

Este verso traz profecia e encorajamento. O sofrimento da igreja em

Esmirna não só não acabou, como vai se acirrar. O Diabo, o adversário da

igreja, trabalha contra ela e lançará alguns na prisão, mas eles são chamados

a ser fiéis até a morte, para que possam receber a recompensa das mãos de

Deus.

Ao longo de todo o Novo Testamento, em todas as situações de

perseguição, o povo é chamado a não temer, a perseverar e manter-se fiel,

pois o sofrimento terreno é passageiro, mas a recompensa de Deus é eterna. O

sofrimento da igreja em Esmirna é iminente e inevitável. Eles serão provados,

haverá dor, mas Deus permanecerá presente, ajudando-os. Não há promessa

de vida fácil nas Escrituras, mas de conforto e bênção na tribulação. O Império

Romano não prendia para punir. Prendia como medida de coação, para

julgamento ou para execução. Os cristãos corriam risco real de morte.

A menção a um período de dez dias de tribulação suscita várias

conjecturas. Há quem defenda que a expressão seja um semitismo, uma forma

de expressar período aproximado, um arredondamento. Alguns estudiosos

acham que seja uma referência ao teste de dez dias de Daniel; outros, que se

trata de dez períodos em que os cristãos ficarão nas mãos de dez imperadores.

A posição predominante, no entanto, é que a expressão diga respeito a um

período de tempo limitado de perseguição, embora bastante intenso.

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Seja como for, Deus avisa antecipadamente a igreja em Esmirna, para

que os cristãos saibam que ele mantém todas as coisas sob seu controle e não

permitirá que o período se estenda para além do suportável.

Àquele que não julgar sua vida mais importante que o reino de Deus e

perseverar até a morte, se preciso for, sua recompensa será a coroa da vida,

símbolo de honra e autoridade, a qual será recebida das mãos do próprio Deus

como reconhecimento da fidelidade.

Verso 11: Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas. O que

vencer, de modo algum sofrerá o dado da segunda morte.

Cristo está tão satisfeito com a igreja em Esmirna, que nada tem contra

ela. Há elogio, estímulo, promessa, mas nenhuma repreensão. Apenas

Esmirna e Filadélfia tiveram esse privilégio, mesmo sendo as comunidades

mais insignificantes das sete igrejas do ponto de vista de riqueza material e

influência política. Os valores do reino de Deus são outros, por isso é

necessário repensar os conceitos modernos de igreja bem-sucedida.

O encerramento da carta é o mesmo das demais cartas e traz a

exortação para que se ouça o que o Espírito diz às igrejas, o que deve resultar

em obediência.

Ao vencedor é dada a promessa de vida eterna. Aqueles que não creem

morrem fisicamente e também espiritualmente, sendo alvo da condenação

eterna, o que, na Bíblia, é chamado de segunda morte; os que creem, no

entanto, podem até experimentar a morte física, caso Jesus não volte antes,

mas a eternidade lhes está garantida.

Os crentes de Esmirna sofreriam e poderiam até morrer como resultado

da perseguição, mas a vida eterna jamais lhes poderia ser tirada. Assim

também será com todos os cristãos ao redor do mundo, em todos os tempos:

aqueles que perseverarem, que se mantiverem fiéis, serão pessoalmente

galardoados por Deus.

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• Carta à igreja em Pérgamo

A cidade de Pérgamo era um centro industrial importante e se destacava

pela fabricação do pergaminho de couro de carneiro. O templo para adoração a

Zeus, considerado o salvador, uma das principais divindades gregas,

destacava-se na cidade.

Os romanos dominaram a cidade a partir de 133 a.C. e Pérgamo passou

a ser a capital da província da Ásia, além de centro do culto ao imperador.

Atualmente, próxima ao local onde antes existia Pérgamo, está a cidade de

Bérgama, mas as ruínas permanecem, testemunhando a riqueza e a

importância da cidade antiga.

Ruínas da antiga Pérgamo

Bérgama, próxima de onde existiu a antiga Pérgamo

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Verso 12: Ao anjo da igreja em Pérgamo escreve: Isto diz aquele que tem a

espada aguda de dois gumes:

Esta é a descrição mais simples de Cristo nas sete cartas, apenas um

elemento: a espada de dois gumes, símbolo da justiça romana e, por seu corte

em ambos os lados, representação de precisão. Esse atributo fala da

autoridade divina para o juízo e de como Jesus fará justiça sobre todos os

poderes da terra.

Verso 13: Sei onde habitas, que é onde está o trono de Satanás; mas reténs o

meu nome e não negaste a minha fé, mesmo nos dias de Antipas, minha fiel

testemunha, o qual foi morto entre vós, onde Satanás habita.

Jesus conhece a realidade de Pérgamo, sabe o mundo pagão em que

eles vivem, a ponto de dizer que lá Satanás erigiu seu trono. O culto aos

deuses gregos, em especial a Zeus, e o culto ao imperador faziam de Pérgamo

um lugar especialmente idólatra. Satanás habita o local onde a igreja está e

Cristo sabe disso.

O culto ao imperador era a essência da religião de Pérgamo e provocou

perseguição aos cristãos durante os reinados de Domiciano e Trajano.

Pérgamo era o centro desse culto na província da Ásia.

Apesar de todo esse contexto adverso, Jesus conhece o coração dos

crentes em Pérgamo e sabe que eles retiveram o seu nome, não negaram a fé,

mantiveram-se fiéis, mesmo testemunhando o martírio de Antipas, fiel

testemunha de Cristo. Embora não se tenha detalhes de quem foi Antipas e o

que exatamente o levou à morte, o contexto deixa claro tratar-se de um mártir

cristão, que morreu por testemunhar fielmente sua fé.

O verbo usado para “conservas o meu nome” dá a ideia de “agarrar

energicamente”, numa clara alusão à firmeza dos cristãos dessa igreja. O

nome de Cristo representa quem é Cristo, sua identidade, sua missão, sua

natureza. É a isso que se apegam os cristãos. Não negar a fé significa viver à

altura da pessoa de Cristo, resistindo à sedução do mundo pagão. Da mesma

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forma que Cristo segura firmemente as sete estrelas em sua mão, os crentes

em Pérgamo se apegam a ele com firme vontade.

Verso 14: entretanto, algumas coisas tenho contra ti; porque tens aí os que

seguem a doutrina de Balaão, o qual ensinava Balaque a lançar tropeços

diante dos filhos de Israel, introduzindo-os a comerem das coisas sacrificadas a

ídolos e a se prostituírem.

Diferentemente da igreja em Éfeso, que rejeitou veementemente os

nicolaítas, a igreja em Pérgamo estava tolerando os falsos mestres, que, à

semelhança de Balaque e Balaão, no Antigo Testamento (Nm 22-24; 25.1-3;

31.16), estavam levando o povo à apostasia. A tolerância ao falso ensino é

algo a que Deus resiste fortemente, pois da manutenção da pureza do

evangelho depende a fé e a salvação dos que o ouvem. Da igreja, portanto,

Deus espera que não tolere falsos mestres.

Há passagens em Apocalipse em que a imoralidade é metáfora para a

idolatria; em outras, o sentido é real. Pode ser uma coisa e outra, mas, neste

versículo, os termos sugerem o sentido literal das palavras.

Verso 15: Assim tens também alguns que de igual modo seguem a doutrina

dos nicolaítas.

Os nicolaítas estavam conduzindo o povo de Deus em Pérgamo à

idolatria e à imoralidade. Como já dito, não se sabe exatamente quem foram

eles e qual a sua doutrina, mas tudo leva a crer que são eles o grupo

comparado aos que detêm a doutrina de Balaão e de Jezabel nas cartas

seguintes. Ainda que se considere que sejam eles outro grupo que não esse, é

certo que o ensinamento não é bíblico, mas mesmo assim está sendo tolerado

pela igreja em Pérgamo, razão por que Cristo os está repreendendo.

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Verso 16: Arrepende-te, pois; ou se não, virei a ti em breve, e contra eles

batalharei com a espada da minha boca.

O fato de Pérgamo não estar enfrentando os falsos mestres está

colocando a igreja em risco, não só porque o verdadeiro evangelho está sendo

pregado lado a lado das heresias, como também porque o juízo de Deus se

avizinha, caso eles não deem ouvidos ao alerta divino. Eles têm de reconhecer

o erro e mudar, e isso tem de se dar logo, pois Cristo virá em breve pelejar

contra os falsos mestres, o que, naturalmente, afetará a igreja toda. Quando

Deus tem de intervir, os resultados são sempre mais drásticos, pois ele fará o

que a igreja deveria ter feito.

Essa batalha travada pelo Cordeiro com a espada da sua boca é uma

metáfora apocalíptica e mostra Deus indo à guerra em favor de seu povo e

contra os seus inimigos. Essa é uma realidade recorrente no livro de

Apocalipse.

Verso 17: Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas. Ao que

vencer darei do maná escondido, e lhe darei uma pedra branca, e na pedra um

novo nome escrito, o qual ninguém conhece senão aquele que o recebe.

Como em todas as cartas, a advertência profética de ouvir e atender ao

que Cristo diz vem acompanhada da promessa ao vencedor. No caso da igreja

em Pérgamo, ao vencedor será dado o maná escondido e uma pedra branca

com um novo nome escrito, o qual só conhecerá quem o receber.

O maná, a comida que Deus enviava ao povo de Israel no deserto, pode

representar o alimento celeste em oposição à comida sacrificada a ídolos que

os cristãos de Pérgamo deveriam evitar. Pode também significar a eucaristia, o

alimento espiritual que Deus tem reservado aos seus filhos, ou, ainda, ser

representação do próprio Cristo, o alimento de Deus para nós. Por último, há

os que defendem tratar-se da comida que será experimentada no reino

messiânico. Seja qual for o significado do maná, será grande recompensa para

aquele que perseverar até o fim.

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Não se sabe ao certo o significado da pedra branca, mas o texto sugere

uma identidade nova dada ao cristão por Jesus, uma espécie de segredo entre

eles, pois o nome escrito na pedra, que será o novo nome do cristão, só será

conhecido pelos dois. Deus e o crente fiel unidos por um segredo de amor e

reconhecimento.

A carta à igreja em Pérgamo adverte o cristão de hoje para que jamais

aceite um ensinamento não bíblico, independentemente da pressão secular

para se moldar aos valores do mundo (1 Pe 4.3-4). Quanto mais o Cristianismo

fica popular, mais riscos correm os cristãos de não se manterem fiéis, daí a

necessidade de se agarrarem energicamente ao nome de Cristo, rejeitando os

falsos mestres e mantendo-se firmes na fé.

• Carta à igreja em Tiatira

Tiatira foi fundada no século III a.C. e ficava a 64 km de Pérgamo. Não

era uma cidade de destaque no Império Romano, sendo, antes, um pequeno

centro industrial de confecção de tecidos. Roma assumiu o controle da cidade

em 190 a.C., vindo depois disso sua prosperidade, nos séculos II e III d.C.

Seus tecelões, tintureiros, alfaiates, curtidores e demais profissionais da

área têxtil eram organizados em associações de classe, o que tornou a cidade

conhecida. Lídia, mencionada em Atos dos Apóstolos, era uma das

comerciantes de Tiatira (At 16.12-15).

As associações tinham padroeiros (deuses pagãos) e as festas

religiosas eram o centro da vida social da cidade. Vida social e religiosa se

misturavam e os cristãos provavelmente sofriam pressão por não frequentarem

esses eventos. A recusa podia, por vezes, significar perda de simpatia e até de

negócios.

Apolo, o deus sol, filho de Zeus, era a principal entidade adorada pelo

povo de Pérgamo, sociedade composta por diversas nacionalidades.

Atualmente, no mesmo lugar, existe uma cidade de proporções

semelhantes, chamada Akhisar.

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Ruínas da antiga Tiatira

Cidade de Akhisar

Verso 18: Ao anjo da igreja em Tiatira escreve: Isto diz o Filho de Deus, que

tem os olhos como chama de fogo, e os pés semelhantes a latão reluzente:

Bastante comum nos evangelhos, a expressão “Filho de Deus” aparece

só esta vez no livro de Apocalipse. Os olhos de chama, como sabido,

simbolizam onisciência, o olhar que a tudo perscruta e ao qual nada escapa.

Os pés de latão reluzente falam da firmeza do reino do Cordeiro, de sua

estabilidade e força, diferentemente dos pés de barro da estátua da visão de

Daniel.

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Verso 19: Conheço as tuas obras, e o teu amor, e a tua fé, e o teu serviço, e a

tua perseverança, e sei que as tuas últimas obras são mais numerosas que as

primeiras.

Interessante notar que as igrejas com mais problemas são também as

que mais apresentam boas obras (Éfeso e Tiatira). Além do amor, fé, serviço e

perseverança são virtudes dignas de menção e elogio em Tiatira. A igreja é

operosa a tal ponto, que suas obras atuais são mais numerosas que as dos

primeiros dias da fé. O amor, que é a base de toda a força da igreja, não só

não diminuiu, como aumentou; a igreja de Tiatira progrediu, tornou-se melhor,

teve seu caráter cristão aperfeiçoado.

Não se apagou nem se afrouxou o primeiro amor. A confiança em Deus

permanece e a fidelidade ao evangelho, a despeito da oposição dos pagãos,

continua presente na vida diária da comunidade. O serviço, única referência a

essa virtude em todo o livro de Apocalipse, garante a vida ativa de cuidado e

ajuda e o resultado é um ministério caridoso de uns para com os outros.

Grande é o elogio recebido por essa igreja.

Verso 20: Mas tenho contra ti que toleras a mulher Jezabel, que se diz

profetisa; ela ensina e seduz os meus servos a se prostituírem e a comerem

das coisas sacrificadas a ídolos;

Semelhantemente a Pérgamo, Tiatira não tem tido zelo na preservação

do evangelho, pois Jesus os repreende pela tolerância com alguém que, com

falsos ensinamentos, seduz o povo de Deus a prostituir-se e a comer coisas

sacrificadas a ídolos. Essa pessoa é comparada a Jezabel, personagem do

Antigo Testamento conhecida por sua maldade. Jezabel era a esposa fenícia

de Acabe e levou Israel, o reino do Norte, à idolatria (adoração a Baal) e à

feitiçaria.

Na igreja de Tiatira, há uma mulher que se diz profetisa, não o sendo

todavia. Não se sabe a verdadeira identidade dessa mulher, pois Jezabel é um

codinome, sendo a referência simbólica. O fato é que ela está levando os

cristãos a distanciar-se de Deus por meio da prostituição e da idolatria.

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Novamente a imoralidade pode ser figura da impureza espiritual ou alusão à

promiscuidade.

Em Pérgamo, havia ameaça de morte; em Tiatira, há represália

econômica. A participação nas associações de classe (guildas) era condição

para o sucesso, pois quase não havia autônomos. Como mencionado, a vida

religiosa se misturava à vida social e se requeria dos associados a participação

nas festas. Isso expunha os cristãos às coisas sacrificadas aos ídolos. É

possível que a sedução de Jezabel refira-se à relativização dessas práticas,

alegando-se que a participação nos eventos nada tinham a ver com religião,

pois se tratava de questão civil. Essa é a única menção, no livro, à sedução

dos cristãos, pois, nas demais passagens, os incrédulos é que são seduzidos

pela besta e pelo falso profeta.

Jesus alertou, quando estava com os discípulos, que viriam falsos

messias e falsos profetas, os quais enganariam a muitos na igreja, daí a

necessidade de se cortar o mal pela raiz, impedindo-se que esses mensageiros

de Satanás se infiltrem na igreja e corrompam os cristãos.

Verso 21: e dei-lhe tempo para que se arrependesse; e ela não quer

arrepender-se da sua prostituição.

Esta afirmação permite que se entenda que a falsa profetisa foi alertada

de alguma forma, pois lhe foi dado tempo para o arrependimento, todavia ela

não reconheceu o seu erro e não abriu mão de suas más obras.

Verso 22: Eis que a lanço num leito de dores, e numa grande tribulação os que

cometem adultério com ela, se não se arrependerem das obras dela;

Não havendo arrependimento, o resultado será o juízo de Deus sob

forma de enfermidade e dores, e seus seguidores sofrerão muitas aflições. O

texto deixa claro que não há mais condicionais: o castigo é certo e virá

diretamente de Deus. Adoecer o pecador é juízo comum no Antigo Testamento.

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Verso 23: e ferirei de morte a seus filhos, e todas as igrejas saberão que eu

sou aquele que esquadrinha os rins e os corações; e darei a cada um de vós

segundo as suas obras.

A promessa de juízo prossegue e agrava-se, pois os filhos da profetisa

serão feridos de morte. Talvez não seja possível saber se se trata de filhos

biológicos ou se a referência é aos seguidores da falsa profetisa. Alguns

estudiosos defendem que sejam filhos biológicos, pois aos que praticam as

mesmas obras que ela (verso 22) parece ainda haver alguma chance de

arrependimento, pois o texto diz “se não se arrependerem”.

Verso 24: Digo-vos, porém, a vós os demais que estão em Tiatira, a todos

quantos não têm esta doutrina, e não conhecem as chamadas profundezas de

Satanás, que outra carga vos não porei;

Àqueles que não se prostituíram com a falsa profetisa, que não

aceitaram a sua doutrina nem se envolveram com práticas diametralmente

opostas ao reino de Deus, escandalosamente antibíblicas, pois são chamadas

de “profundezas de Satanás”, Deus não lhes pesará a mão, poupando-os de

qualquer juízo.

Verso 25: mas o que tendes, retende-o até que eu venha.

Não, porém, sem o alerta para que retenham a fidelidade até que ele

venha. Em meio a tanta depravação espiritual, o risco de o cristão se afastar de

Deus é real, por isso é preciso estar atento e perseverar na sã doutrina.

Verso 26: Ao que vencer, e ao que guardar as minhas obras até o fim, eu lhe

darei autoridade sobre as nações,

Pela segunda vez, Cristo fala da perseverança até o fim, o que permite

inferir a possibilidade de o cristão vacilar em sua caminhada. Àquele, porém,

que se mantiver firme e de pé será dada autoridade sobre as nações. O texto

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de Apocalipse não dá muitas indicações sobre o reinado do povo de Deus

sobre a terra, mas a promessa de que os fiéis reinarão com Cristo é algo

recorrente em toda a Escritura, em especial, no livro de Apocalipse.

Verso 27: e com vara de ferro as regerá, quebrando-as do modo como são

quebrados os vasos do oleiro, assim como eu recebi autoridade de meu Pai;

É possível que a referência a esse reinado em que os cristãos

governarão com vara de ferro diga respeito ao milênio, mas para isso teríamos

que admitir que o milênio é um evento real, com duração de mil anos, em que o

povo de Deus governará na terra, enquanto o Diabo estará preso, teoria que

não é unânime entre os estudiosos. Veremos mais sobre isso nos capítulos

seguintes.

Verso 28: também lhe darei a estrela da manhã.

Jesus é, nas Escrituras, chamado de “a estrela da manhã”, por esse

motivo, não se sabe ao certo o que significa essa expressão como recompensa

ao vencedor. É possível que se refira à estreita comunhão que o vencedor terá

com o Cordeiro, ou, ainda, a inauguração de um novo dia, de uma nova era na

vida do cristão, com o advento do reino visível de Deus.

Verso 29: Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas.

Aqui a advertência profética aparece por último, antes da recompensa

prometida pelo Cordeiro, mas com a mesma intenção de que a palavra

proferida seja considerada.

REFERÊNCIAS

DUCK, Daymond R. Guia fácil para entender Apocalipse. Rio de Janeiro:

Thomas Nelson, 2014.

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MIRANDA, Neemias Carvalho. Apocalipse – comentário versículo por

versículo. Curitiba/PR: A. D. Santos Editora, 2013.

OSBORNE, Grant R. Apocalipse. São Paulo: Vida Nova, 2014.

http://www.abiblia.org/ver.php?id=3596&id_autor=66&id_utente=&caso=pergunt

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