aplicaÇÃo de modelo multicritÉrio difuso para a … · hoje, 75% do espaço público é ......

12
APLICAÇÃO DE MODELO MULTICRITÉRIO DIFUSO PARA A PONDERAÇÃO DAS CARACTERÍSTICAS DO AMBIENTE CONSTRUÍDO QUE INFLUENCIAM NA CAMINHABILIDADE RESUMO Este trabalho visa três objetivos (i) determinar a importância das características do ambiente construído que estimulam a realização de viagens utilitárias a pé na cidade de Porto Alegre; (ii) comparar os resultados obtidos com os de um estudo anterior; (iii) categorizar os bairros pesquisados, analisando o efeito de mudanças das características do ambiente construído na caminhabilidade. A determinação da importância foi baseada e no Processo Analítico Hierárquico Difuso (FAHP) e validado com o Método de Kendall. Os dois atributos mais importantes foram: Segurança pública (53.73%) e Segurança do tráfego (14.08%), resultados semelhantes aos encontrados no trabalho anterior. A técnica FAHP forneceu especial fortaleza, considerando no cálculo a incerteza das avaliações realizadas pelos tomadores de decisão. Os efeitos marginais calculados e cenários simulados mostraram que intervenções na segurança pública têm um impacto significativo na caminhabilidade. ABSTRACT This paper pursue three objectives (i) determine the importance of the built environment’s characteristics that encourage walking trips in the city of Porto Alegre; (ii) compare the results with a previous study; (iii) categorize the researched neighbourhoods, analyzing the effect of changes in the built environments on walkability. The determination of the the importances was based in the Fuzzy Analytic Hierarchy Process (FAHP) and validated with the Kendall Method. The two most important characteristics were: Public Security (53.73%) and Traffic Safety (14,08%), similar results found in the previous study. The FAHP method gave special strenght, considering the decision makers’ uncertainty. The marginal effects and scenarios simulated showed that interventions in public security have great impact on walkability. 1. INTRODUÇÃO Deslocamentos a pé são essenciais para o desenvolvimento sustentável dos espaços urbanos. Melhoram a qualidade de vida, reduzem os custos de transporte, os impactos ambientais e oferecem maior equidade de acesso às atividades urbanas (Zhu e Chen, 2016). Ruas, calçadas, parques, praças, e características do ambiente urbano têm um papel importante no estímulo de este modo de transporte, tornando alguns lugares mais convidativos e caminháveis do que outros. Estudos mostram que o ambiente construído pode estimular ou desestimular a realização de deslocamentos a pé (e.g. Ewing e Cervero, 2010; Larranaga et al. 2014b; Singh, 2016). O conceito de caminhabilidade (walkability, em inglês) tem sido utilizado em vários estudos para descrever a qualidade dos espaços para caminhada, onde estes espaços tornam-se atraentes para a realização das viagens a pé (Litman, 2003). O estímulo dos deslocamentos a pé tem se tornado prioridade da política pública em muitos países, sendo diretriz de planejamento urbano em grandes cidades do mundo. Cidades europeias, tais como Copenhague, Amsterdã, Helsinque, Zurique, Hamburgo, assim como São Francisco, Portland, Nova York nos Estados Unidos, são exemplos de onde as viagens a pé estão incorporadas ao planejamento do transporte urbano. Copenhague, por exemplo famosa pelo uso da bicicleta como meio de transporte, implementou suas primeiras zonas exclusivas para pedestres na década do 60. Atualmente, estas áreas estão espalhadas pela cidade e os diferentes modais convivem no espaço urbano. Zurique iniciou em 1996 o chamado Compromisso Histórico, documento estabelecendo políticas que permitiram alcançar a mobilidade eficiente, integrada e multimodal, onde as pessoas conseguem chegar a praticamente qualquer lugar sem precisar de carro (Pacheco, 2015). Analisando cidades americanas, um exemplo é a cidade de Nova York. Especificamente, as intervenções ocorridas na Times Square, símbolo da cidade. Em 2009, parte da Times Square foi fechada

Upload: lamanh

Post on 16-Dec-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

APLICAÇÃO DE MODELO MULTICRITÉRIO DIFUSO PARA A PONDERAÇÃO

DAS CARACTERÍSTICAS DO AMBIENTE CONSTRUÍDO QUE INFLUENCIAM

NA CAMINHABILIDADE

RESUMO

Este trabalho visa três objetivos (i) determinar a importância das características do ambiente construído que

estimulam a realização de viagens utilitárias a pé na cidade de Porto Alegre; (ii) comparar os resultados obtidos

com os de um estudo anterior; (iii) categorizar os bairros pesquisados, analisando o efeito de mudanças das

características do ambiente construído na caminhabilidade. A determinação da importância foi baseada e no

Processo Analítico Hierárquico Difuso (FAHP) e validado com o Método de Kendall. Os dois atributos mais

importantes foram: Segurança pública (53.73%) e Segurança do tráfego (14.08%), resultados semelhantes aos

encontrados no trabalho anterior. A técnica FAHP forneceu especial fortaleza, considerando no cálculo a

incerteza das avaliações realizadas pelos tomadores de decisão. Os efeitos marginais calculados e cenários

simulados mostraram que intervenções na segurança pública têm um impacto significativo na caminhabilidade.

ABSTRACT

This paper pursue three objectives (i) determine the importance of the built environment’s characteristics that

encourage walking trips in the city of Porto Alegre; (ii) compare the results with a previous study; (iii) categorize

the researched neighbourhoods, analyzing the effect of changes in the built environments on walkability. The

determination of the the importances was based in the Fuzzy Analytic Hierarchy Process (FAHP) and validated

with the Kendall Method. The two most important characteristics were: Public Security (53.73%) and Traffic

Safety (14,08%), similar results found in the previous study. The FAHP method gave special strenght,

considering the decision makers’ uncertainty. The marginal effects and scenarios simulated showed that

interventions in public security have great impact on walkability.

1. INTRODUÇÃO

Deslocamentos a pé são essenciais para o desenvolvimento sustentável dos espaços urbanos.

Melhoram a qualidade de vida, reduzem os custos de transporte, os impactos ambientais e

oferecem maior equidade de acesso às atividades urbanas (Zhu e Chen, 2016). Ruas, calçadas,

parques, praças, e características do ambiente urbano têm um papel importante no estímulo de

este modo de transporte, tornando alguns lugares mais convidativos e caminháveis do que

outros. Estudos mostram que o ambiente construído pode estimular ou desestimular a

realização de deslocamentos a pé (e.g. Ewing e Cervero, 2010; Larranaga et al. 2014b; Singh,

2016). O conceito de caminhabilidade (walkability, em inglês) tem sido utilizado em vários

estudos para descrever a qualidade dos espaços para caminhada, onde estes espaços tornam-se

atraentes para a realização das viagens a pé (Litman, 2003).

O estímulo dos deslocamentos a pé tem se tornado prioridade da política pública em muitos

países, sendo diretriz de planejamento urbano em grandes cidades do mundo. Cidades

europeias, tais como Copenhague, Amsterdã, Helsinque, Zurique, Hamburgo, assim como

São Francisco, Portland, Nova York nos Estados Unidos, são exemplos de onde as viagens a

pé estão incorporadas ao planejamento do transporte urbano. Copenhague, por exemplo

famosa pelo uso da bicicleta como meio de transporte, implementou suas primeiras zonas

exclusivas para pedestres na década do 60. Atualmente, estas áreas estão espalhadas pela

cidade e os diferentes modais convivem no espaço urbano. Zurique iniciou em 1996 o

chamado Compromisso Histórico, documento estabelecendo políticas que permitiram

alcançar a mobilidade eficiente, integrada e multimodal, onde as pessoas conseguem chegar a

praticamente qualquer lugar sem precisar de carro (Pacheco, 2015). Analisando cidades

americanas, um exemplo é a cidade de Nova York. Especificamente, as intervenções

ocorridas na Times Square, símbolo da cidade. Em 2009, parte da Times Square foi fechada

para os automóveis. Dois objetivos foram perseguidos com essa ação: diminuir a poluição

atmosférica e aumentar a qualidade de vida dos indivíduos nas ruas. Estas mudanças tiveram

efeitos positivos sobre a economia e a valorização de imóveis na região. Hoje, 75% do espaço

público é destinado para pedestres (Sadik e Solomonow, 2016).

Nos últimos anos, diversos índices foram desenvolvidos para determinar a caminhabilidade de

bairros ou cidades (e.g. Walkscore.com, 2010; Stockton et al., 2016). Estes se diferenciam no

método, tipo de dados e variáveis consideradas. Um índice de caminhabilidade está composto

por diversos indicadores das características do bairro. A importância relativa de cada

característica pode diferir e, ainda, variar entre indivíduos e cidades.

Este trabalho visa três objetivos. Primeiro, determinar a importância das características do

ambiente construído que estimulam a realização de viagens utilitárias a pé na cidade de Porto

Alegre. A determinação da importância relativa das características foi baseada e no Processo

Analítico Hierárquico Difuso (FAHP - Fuzzy Analytic Hierarchy Process) e validado usando

o Método de Ponderação Simples (Kendall, 1970). O FAHP é uma adaptação do Processo

Analítico Hierárquico (AHP - Analytic Hierarchy Process) (Saaty, 1980) que busca levar em

consideração a incerteza das avaliações realizadas pelos tomadores de decisão. Em segundo

lugar, comparar os resultados obtidos com os apresentados em estudo anterior (Larranaga et

al., 2014a), no qual foi empregado o AHP utilizando matrizes incompletas de comparações

pareadas para a determinação das importâncias. Terceiro, categorizar os bairros pesquisados

com base em sua caminhabilidade, analisando o efeito de mudanças das características do

ambiente construído na caminhabilidade. Assim, determinar se elas são relevantes para a

elaboração de políticas.

Ambos os métodos aplicados no estudo são métodos de análise multicritério de apoio à

decisão, ferramentas muito utilizadas em diversas áreas do conhecimento, inclusive em

transportes e planejamento urbano (Herva e Roca, 2013; Nosal e Solecka, 2014; Mateo-

Babiano, 2016; Li et al., 2016). O FAHP utiliza matrizes completas, obtidas através de

comparações pareadas entre os aspectos (no caso, as características de bairro apresentadas

num questionário a residentes de diferentes bairros da cidade). Estas comparações são

realizadas mediante etiquetas linguísticas vinculadas a uma escala difusa pré-definida. A

importância relativa de cada uma permitiu identificar as características mais relevantes e

determinar o impacto de possíveis intervenções no ambiente urbano. O restante do trabalho

está organizado da seguinte forma. A seção 2 descreve o método utilizado; a seção 3

apresenta a coleta de dados; seções 4 e 5 apresentam e discutem os resultados obtidos e a 6

conclusões e sugestões.

2. MÉTODO

A abordagem proposta baseia-se na utilização do FAHP e o Método de Ponderação Simples.

Estas técnicas são descritas a seguir, além da avaliação da caminhabilidade resultante.

2.1. Processo Analítico Hierárquico Difuso

O estudo dos fatores que influenciam nas condições de caminhabilidade dos bairros está

imerso num ambiente de grande incerteza, não só pela própria natureza incerta da tomada de

decisões realizada na engenharia de transportes, mas também pela subjetividade e caráter

pessoal das avaliações realizadas pelos cidadãos sobre o assunto. De fato, as probabilidades

de ocorrência dos critérios e a informação disponível sobre eles podem ser confusas,

ambíguas ou imprecisas (Awasthi et al., 2010; Herva e Roca, 2013; Arce et al., 2015).

Portanto, nestes casos, é razoável pensar que a avaliação destes fatores melhoraria

significativamente se for construído um modelo linguístico difuso (fuzzy, em inglês), mais

adequado que uma avaliação multicritério tradicional para modelizar estes fenômenos

imprecisos (Awasthi et al., 2010; Arce et al., 2015). Assim, o FAHP, variante fuzzy do

processo analítico hierárquico (AHP), foi escolhido como método de ponderação multicritério

para este estudo, já queé um dos mais potentes atualmente e oferece grandes vantagens em

relação a outros métodos de decisão multicritério discretos. Além disso, permite um adequado

tratamento fuzzy das opiniões dos cidadãos utilizadas para avaliar as importâncias relativas

dos fatores considerados (Brugha, 2004; Herva e Roca, 2013; Ruiz-Padillo et al., 2016).

O AHP é um método de decisão multicritério da família de técnicas de atribuição indireta

(Nosal e Solecka, 2014). Basicamente, alcança a ponderação e escolha a partir de uma matriz

quadrada de comparações por pares entre critérios, na qual cada elemento da matriz

representa quantas vezes é mais importante o critério localizado na linha em relação ao

critério da coluna. Nas avaliações, o método utiliza uma escala pré-definida chamada escala

fundamental de Saaty, que assume valores entre 1/9, 1/8, ..., 1/2, 1, 2, ..., 8 e 9. A partir dessa

matriz, é calculado o autovetor associado ao autovalor dominante da mesma (λmax), e este

vetor constitui o conjunto de pesos do problema de decisão (Saaty, 1980; Lau et al., 2003).

No entanto, o AHP, na sua concepção original, não reflete a forma em que o pensamento

humano toma as decisões ou realiza suas avaliações subjetivas, já que os indivíduos utilizam

um modelo de avaliação incerto e impreciso. Assim, às vezes, os tomadores de decisão se

mostram hesitantes ou incapazes de atribuir valores numéricos exatos às avaliações de

comparação por pares. Portanto, é especialmente interessante empregar expressões

linguísticas mais próximas à linguagem natural nas avaliações das importâncias relativas e

vinculadas à escala fundamental de Saaty, e modelá-las mediante números fuzzy que formarão

as matrizes de comparações dos critérios (Kahraman et al., 2003; Lau et al., 2003).

Os números difusos ou fuzzy são um caso particular de conjuntos fuzzy. Permitem a

pertinência de um elemento a um determinado conjunto de forma gradativa, lembrando que a

noção clássica de conjunto reflete a ideia de agrupar coleções de objetos que cumprem uma

ou várias propriedades que caracterizam dito conjunto. Uma propriedade pode ser considerada

como uma função que a cada elemento u do domínio U atribui um valor no conjunto {0, 1},

de forma que se o elemento pertencer a um determinado conjunto A, ou seja, cumprir a

propriedade, é atribuído o valor 1 ou, no caso contrário, o valor 0. Portanto, os conjuntos

clássicos introduzem uma noção de dicotomia que, em essência, é uma classificação binária: a

pertinência de um objeto a uma categoria determinada é aceita ou rejeitada. Por sua parte, nos

conjuntos fuzzy existem as possibilidades de verdades parciais entre o “completamente

verdadeiro” e o “completamente falso”, admitindo pertinências parciais avaliadas no intervalo

(0, 1), em lugar de unicamente no conjunto {0, 1}. Para isso, é utilizada a denominada função

de pertinência ao conjunto fuzzy à (Zadeh, 1994).

Os números fuzzy são, portanto, a definição de conjuntos fuzzy na reta real, com uma série de

características de convexidade, continuidade, normalização e domínio compacto que

permitem que sejam representados pelos extremos do intervalo real sobre o que se situa o grau

de pertinência (entre 0 e 1), chamado de suporte do número fuzzy. Na presente pesquisa foram

empregados números fuzzy triangulares, que são aqueles definidos segundo a função de

pertinência definida na equação 1 (Kahraman et al., 2003; Lau et al., 2003):

𝜇Ã(𝑥) = {

𝑥−𝑎

𝑏−𝑎, se 𝑎 ≤ 𝑥 ≤ 𝑏

𝑐−𝑥

𝑐−𝑏, se 𝑏 ≤ 𝑥 ≤ 𝑐

0, em outro caso

(1)

onde a, b e c são números reais.

Assim, nestes casos o número fuzzy à expressa-se com o tripleto (a, b, c) e representa o

conceito de quantidade difusa “x é aproximadamente igual ao valor de b”, sendo b o número

que corresponde com a mediana ou valor central do intervalo suporte (a, c) (vide Figura 1).

Figura 1: Representação do número fuzzy à = (a, b, c). Fonte: elaborada pelos autores.

A Tabela 1 apresenta a escala de etiquetas linguísticas utilizada nesta pesquisa e sua

correspondência com as escalas direta e recíproca fuzzy para o FAHP (à semelhança da escala

fundamental de Saaty). Os procedimentos de cálculo do método devem seguir os princípios da

teoria dos números fuzzy e os resultados obtidos serão igualmente números fuzzy. Portanto, o

FAHP requer também a aplicação de técnicas para obter resultados tradicionais (ou “crisp”,

em oposição a fuzzy) para o vetor de pesos, processo que é chamado de “defuzzificação”. A

técnica empregada no FAHP original é a denominada do centróide fuzzy o do centro de

gravidade do número fuzzy triangular: para o número fuzzy da Figura 1, o valor crisp

associado ao mesmo é obtido como (a+b+c)/3 (Lau et al., 2003; Ruiz-Padillo et al., 2016).

Tabela 1: Escala de correspondência entre números fuzzy triangulares e as etiquetas

linguísticas utilizadas na pesquisa. Fonte: adaptado de Lau et al. (2003). Intensidade

importância Termo linguístico

Escala triangular

difusa

Escala triangular

difusa recíproca

Exatamente igual (1, 1, 1) (1, 1, 1)

1 Igualmente importante (1/3, 1, 3) (1/3, 1, 3)

2 Um pouco mais importante (1, 3, 5) (1/5, 1/3, 1)

3 Mais importante (3, 5, 7) (1/7, 1/5, 1/3)

4 Muito mais importante (5, 7, 9) (1/9, 1/7, 1/5)

5 Extremamente mais importante (7, 9, 9) (1/9, 1/9, 1/7)

Do mesmo modo que o AHP tradicional, o FAHP assume certas incorreções na estimativa das

comparações por pares dos critérios e o cálculo do vetor de pesos. Portanto, é necessário

analisar a consistência do processo através da chamada razão de consistência (RC), que mede

a exatidão da estimativa do autovetor como o vetor de pesos dos critérios. A RC é obtida

mediante a comparação do índice de consistência (IC) do autovetor com o índice de

consistência aleatório ou randômico médio (IR) apropriado ao tamanho da matriz de

comparações e cujo valor é derivado de uma amostra de 500 matrizes recíprocas inversas

geradas aleatoriamente utilizando a escala fundamental de Saaty (Saaty, 1980) (Eq. 2):

𝑅𝐶 =𝐼𝐶

𝐼𝑅 (2)

a b c0

1

x

O IC da matriz de comparações é calculado segundo a equação 3:

𝐼𝐶 =𝜆𝑚𝑎𝑥−𝑛

𝑛−1 (3)

onde λmax é o autovalor dominante da matriz de comparações e n é o tamanho da matriz.

Se a RC não for menor de 10% (para n≥5), 8% (para n=4) ou 5% (para n=3), é recomendável

reestudar o problema e revisar as avaliações de comparação. Portanto, para avaliar a

consistência do vetor de pesos obtido, é necessário calcular o autovalor dominante, que como

resultado da matriz fuzzy é igualmente fuzzy, de modo que também precisa ser

“defuzzificado”. A técnica utilizada pelo FAHP para este autovalor dominante é a escolha da

mediana do número fuzzy (no caso do número fuzzy (a, b, c) seria o valor de b) (Ruiz-Padillo

et al., 2016).

A partir das comparações pareadas foram construídas matrizes fuzzy para cada nível da

hierarquia e para cada respondente. Estas matrizes individuais foram agregadas para alcançar

as matrizes médias representativas da população amostrada, empregando a média geométrica

dos elementos individuais fuzzy das matrizes, que é a recomendada por Saaty na agregação de

avaliações procedentes de vários tomadores de decisão (Saaty, 1990; Ruiz-Padillo et al.,

2016). Finalmente, os resultados obtidos devem ser apresentados de forma adimensional.

Dentre as diferentes técnicas de normalização, a presente pesquisa utilizou o procedimento

linear.

2.2. Método de ponderação simples

Com o intuito de validar os pesos obtidos do FAHP, foi usada outra técnica de ponderação de

diferente suporte metodológico e lógica de cálculo. Neste caso, a técnica de ponderação

simples ou de Kendall (Kendall, 1970), pertencente à família de métodos de atribuição direta.

Esta técnica permite estimar os pesos dos critérios empregando as ordenações qualitativas dos

mesmos segundo sua importância (ranking), mas sem tratamento difuso. No caso de vários

tomadores de decisão, como é o caso dos respondentes do questionário aplicado, foi calculada

a posição média no ranking de cada aspecto em relação aos colocados no mesmo grupo da

hierarquia mediante a média aritmética das ordenações ascendentes de cada indivíduo.

2.3. Avaliação da caminhabilidade

As importâncias determinadas foram utilizadas na categorização dos bairros com base na

caminhabilidade. Os bairros pesquisados foram ordenados a partir da soma ponderada das

valorações dos diferentes critérios, segundo uma escala pré-estabelecida, e dos pesos obtidos

da técnica FAHP. Este valor médio ponderado permitiu estabelecer um ranking de

caminhabilidade para estes bairros da cidade. Adicionalmente, este valor foi comparado com

a valoração global do bairro de residência realizada pelos indivíduos (solicitada no

questionário aplicado). Finalmente, foi analisado o efeito marginal de mudanças das

características do ambiente construído na caminhabilidade e simulados diferentes cenários

com possíveis politicas de transporte para estimular a caminhabilidade da cidade.

3. COLETA DE DADOS E DESENHO DO QUESTIONÁRIO

3.1 Amostra Entrevistas através da internet foram realizadas entre Abril e Maio de 2016, com 178

indivíduos de 18 bairros de Porto Alegre (Figura 2). O tamanho amostral foi determinado

através de um processo de amostragem aleatória estratificada, sendo a amostra proporcional

ao tamanho de cada estrato. O nível de confiança adotado foi 95%, 20% o coeficiente de

variação e 5% o erro admissível médio.

A amostra foi selecionada através de um método de amostragem em dois estágios: setores

censitários e indivíduos. Em um primeiro estágio, todos os setores censitários foram

estratificados através de três variáveis: índice de motorização, densidade de comércios e

serviços e inclinação média do terreno. Estudo anterior realizado em Porto Alegre (Larranaga

et al., 2014b) mostra que a realização de deslocamentos a pé é influenciada por estas

características. Analisando os histogramas das variáveis de estratificação, para todos os

setores da cidade, foram determinados os seguintes pontos de corte: (i) Índice de motorização

(IM- nºautom./dom): alto ( ≥0,6) e baixo (<0,6); (ii) Declividade média: alta( ≥7 %), baixa

(<7%) e (iii) Densidade de comércios e serviços (DC-nºestablec./km2): alto(≥3000), médio

(500≥DC>3000) e baixo (<500). Foram determinados 11 estratos (1 estrato foi

desconsiderado pois nenhum setor verificou as características estabelecidas). Os setores

censitários foram selecionados de forma balanceada entre os estratos. Em um segundo

estágio, em cada setor censitário amostrado foram selecionados 16 indivíduos através de

amostragem aleatória. O recrutamento dos entrevistados foi realizado a partir de uma lista de

contatos da Universidade e de contatos obtidos em pesquisas anteriores nos bairros

selecionados. A distribuição dos respondentes por idade e gênero foi levada em consideração

durante a seleção da amostra, visando garantir as distribuições observadas no Censo 2010.

Figura 2: Distribuição dos bairros amostrados

A pesquisa foi realizada via internet utilizando a ferramenta de pesquisa on-line Qualtrics

assim como questionários virtuais através do software Microsoft Office Excel. Este método de

pesquisa foi escolhido devido às vantagens decorrentes do mesmo: baixo custo, entrevistado

não é influenciado pela presença do entrevistador.

3.2. Atributos de pesquisa

As características urbanas foram selecionados baseados em um conjunto de estudos anteriores

realizados pelos autores para a mesma área de estudo. Todos os atributos utilizados neste

trabalho foram significativos em pelo menos dois estudos, qualitativos e/ou quantitativos, já

publicados em congressos e periódicos. Um total de 8 atributos foram considerados:

- (i) Qualidade do pavimento - se refere à qualidade do projeto, construção e manutenção da

calçada (tipo de pavimento, materiais, regularidade e nivelamento da superfície, etc.);

- (ii) Largura efetiva da calçada - largura disponível para os pedestres caminharem;

conjunção das características de largura física da calçada e a presença de obstáculos nela (tais

como mobiliário urbano, postes, etc.) que restringem esta largura livre para a caminhada;

- (iii) Declividade - inclinação da via, particularmente na calçada;

- (iv) Segurança pública - refere-se à presença de policiamento e a incidência de roubos e

assaltos no entorno do bairro durante o dia;

- (v) Segurança de tráfego - sensação de segurança do pedestre ao se deslocar no bairro,

devido à presença de alto fluxo de veículos, existência de faixas de segurança, etc.;

- (vi) Atratividade visual - inclui os aspectos visuais e estéticos do ambiente, tais como

qualidade das edificações e do mobiliário urbano e limpeza da calçada entre outros;

- (vii) Comércios e serviços próximos – presença e quantidade de comércios e serviços;

- (viii) Existência de caminhos alternativos –conectividade viária entre origem e destino,

possibilitando chegar ao mesmo lugar por trajetos diferentes.

3.3. Questionário de pesquisa

Os atributos selecionados foram dispostos numa estrutura hierárquica de critérios e

subcritérios para facilitar a aplicação do FAHP. A estrutura adotada seguiu os axiomas de

aplicabilidade do processo: homogeneidade dos elementos de cada nível de hierarquia e

dependência em relação ao nível superior, e completude da hierarquia estabelecida, além da

exigência conhecida da reciprocidade das avaliações. Para isso, foram contemplados três

critérios, denominados “Condições da calçada”, “Segurança” e “Características do

caminho”, e como subcritérios os diferentes atributos pesquisados (Figura 3).

Figura 3: Sistema de hierarquia para ponderação dos atributos de pesquisa.

O questionário foi estruturado em cinco seções: 1) Introdução - apresentação do estudo; 2)

Dados dos indivíduos e suas famílias (ex. idade, gênero); 3) Apresentação sequencial dos

diferentes grupos de critérios e subcritérios - o respondente devia ordenar os critérios e

subcritérios de maior a menor importância em relação ao objetivo do problema de decisão; 4)

Comparações pareadas dos atributos utilizando a escala linguística definida (Tabela 1); e 5)

avaliação das características do bairro de residência - avaliação de cada atributo e avaliação

geral da caminhabilidade do bairro (escala de 1 a 5). Os atributos Atratividade visual e

Existência de caminhos alternativos foram apresentados através de texto e imagens para

facilitar a compreensão. Um exemplo dos questionários é apresentado na Figura 4.

Figura 4: Exemplo dos questionários virtuais utilizados na pesquisa.

4. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

O método FAHP explicado anteriormente foi aplicado às matrizes médias resultantes da

amostra pesquisada em relação às comparações por pares de critérios e subcritérios, de modo

que foram calculados os vetores de pesos e autovalores principais. Todos estes valores foram

“defuzzificados” seguidamente segundo os procedimentos descritos e permitiram alcançar os

pesos absolutos e razões de consistência de cada grupo, apresentados na Tabela 2.

No caso do grupo de subcritérios da segurança, devido a que o FAHP não é aplicável a

conjuntos de apenas 2 elementos, simplesmente foi “defuzzificado” o único valor

representativo da matriz 2×2, o qual permite calcular a importância relativa entre os dois

subcritérios (pesos). Portanto, não existe valor da RC para eles. Nos outros casos, todos

apresentam valores da RC muito inferiores aos limiares definidos por Saaty para estimar os

resultados consistentes, e mais ainda no primeiro nível da hierarquia (critérios), o que fornece

a máxima robustez aos resultados.

Tabela 2: Pesos absolutos e razões de consistência calculados com o FAHP. Critérios Pesos Aspectos Pesos

Condições da

calçada 16.52%

Qualidade do pavimento 41.45%

Largura efetiva da calçada 30.16%

Declividade 28.40%

RC = 0.13%

Segurança 67.80% Segurança pública 79.24%

Segurança de tráfego 20.76%

Características do

caminho 15.67%

Atratividade visual 34.90%

Comércios e serviços próximos 42.35%

Existência de caminhos alternativos 22.76%

RC = 0.06%

RC = 0.03%

Ainda, foram calculados também os pesos dos critérios e de cada grupo de subcritérios

mediante o método de Kendall sobre as posições médias. Assim, com os dois conjuntos de

valores dos pesos de cada grupo de critérios, foram obtidas as ponderações dos aspectos

considerados como resultado da agregação dos valores segundo a hierarquia estabelecida

(Figura 2), simplesmente multiplicando os pesos obtidos para cada subcritério pelo peso do

critério do qual dependem. Portanto, os pesos finais dos aspectos são os apresentados em

ordem crescente na Tabela 3, tanto para o FAHP quanto para o método de Kendall.

Tabela 3: Pesos finais obtidos para os aspectos de caminhabilidade Aspecto Peso Final FAHP Peso Final Kendall Peso Larranaga et al. (2014a)**

Segurança pública 53.73% 33.19% 42.30%

Segurança de tráfego 14.08% 18.13% 14.60%

Qualidade do pavimento 6.85% 9.62% 8.20%*

Comércios e serviços próximos 6.64% 8.56% 7.00%

Atratividade visual 5.47% 9.47% 5.30%

Largura efetiva da calçada 4.98% 7.42% -

Declividade 4.69% 7.00% 4.80%

Existência de caminhos alternativos 3.57% 6.60% 4.60%

Presença de obstáculos 8.60% * O atributo medido foi Qualidade do pavimento e largura das calçadas ** O estudo de Larranaga et al. (2014a) incluía

outros 2 atributos -Densidade populacional e Disponibilidade de Transporte Coletivo, estes apresentaram pesos muito baixos

e não foram considerados no presente estudo.

A comparação de ambos os conjuntos de pesos mostra que a ordenação relativa segundo

importância praticamente coincide, somente os atributos Atratividade visual e Comércios e

serviços próximos aparecem invertidos entre os dois rankings, embora com pesos finais muito

parecidos. Porém, os valores finais dos pesos segundo o método de Kendall apresentam uma

dispersão menor e destaca a principal diferença no aspecto mais importante, Segurança

pública, cuja diminuição de peso faz que as ponderações dos restantes aspectos cresçam. Isto

é devido, fundamentalmente, a que o método de Kendall não leva em conta o grau de

importância relativa entre os elementos nem a incerteza das avaliações, e os respondentes

atribuíram uma relevância muito destacada na escala linguística fuzzy ao critério “Segurança”

em geral e ao aspecto da Segurança pública em particular.

O atributo mais importante é Segurança pública. Este resultado não surpreende, pois a

violência urbana, relacionada especialmente com roubos, assaltos e outras agressões, é um dos

problemas sociais gerais mais importantes do país. Na cidade de Porto Alegre, este problema

tem sofrido uma significativa intensificação nos últimos anos.

O segundo atributo em importância é Segurança de tráfego, motivado também pela

importância absoluta do critério “Segurança”, embora fique a uma distância considerável do

aspecto da Segurança pública. A seguir, aparecem o resto dos atributos com pesos localizados

entre um 3 e um 7% no caso do FAHP e entre um 6,50 e um 9,50% nas ponderações simples.

Porém, é possível identificar como os mais relevantes de este grupo são Qualidade do

pavimento, Comércios e serviços próximos, Atratividade visual. É interessante observar que

os respondentes oferecem maior importância relativa às características concretas da superfície

de caminhada do que à existência de obstáculos ou estreitamentos nas calçadas. As

características menos importantes consideradas pelos indivíduos pesquisados correspondem a

Declividade e Existência de caminhos alternativos. Os resultados apresentados determinaram

um conjunto de pesos representativos das importâncias relativas das características do

ambiente construído no estimulo da caminhada.

Comparando os resultados obtidos com o trabalho de Larranaga et al. (2014a) na mesma área

de estudo é possível identificar semelhanças nos mesmos. No estudo anterior, Segurança

pública também foi identificado como o atributo mais relevante. Entretanto, o valor da

importância incrementou, de 42,3% ao atual do 53,73%. Este incremento pode ser devido a

fortalezas do FAHP em relação ao tratamento da incerteza das respostas dos indivíduos, à

cuidados seleção da amostra realizado neste estudo e provavelmente ao efeito temporal. A

sensação de insegurança cresceu nos últimos anos, tanto em Porto Alegre como em outras

cidades brasileiras. Hoje em dia, é preocupação significativa dos residentes. Em relação aos

outros atributos, Segurança de Tráfego apresentou um peso similar, 14,6%. Qualidade do

pavimento, Comércios e serviços próximos, Atratividade visual também apareciam com esta

ordem e pesos similares no estudo anterior. No entanto, no estudo anterior, as características

das calçadas foram representadas através dos seguintes atributos: Presença de obstáculos nas

calçadas e Qualidade do pavimento e largura das calçadas. Agrupação anterior é diferente à

utilizada atualmente, na qual a presença de obstáculos e largura da calçada foram combinadas

em um único atributo, Largura efetiva da calçada. Os resultados obtidos para Declividade e

Existência de caminhos alternativos também coincidem.

5. CARACTERIZAÇÃO DOS BAIRROS E AVALIAÇÃO DE MUDANÇAS NA

CAMINHABILIDADE

A Tabela 4 apresenta a categorização dos bairros com base na caminhabilidade. A “Avaliação

ponderada - FAHP” se refere ao valor computado para a caminhabilidade a partir dos valores

de importância resultantes da técnica FAHP e da avaliação dos respondentes de cada atributo

do seu bairro de residência (respostas ao questionário, descritos em 3.3). A “Avaliação geral”

se refere à média da valoração da caminhabilidade do bairro de residência pelos respondentes

(perguntado no questionário). A escala utilizada varia entre 1 e 5 (maior caminhabilidade).

Tabela 4: Categorização dos bairros pesquisados em base na caminhabilidade Bairro Avaliação ponderada - FAHP Avaliação Geral

Bom Fim / Independência 3.41 4.33

Moinhos de Vento 3.35 4.13

Rio Branco 3.25 3.40

Cidade Baixa 3.12 3.76

Santana / Petrópolis 3.05 3.34

Vila Assunção 2.93 3.38

Restinga / Floresta 2.69 3.21

Centro 2.58 3.23

Santo Antonio / Partenon 2.55 2.15

Humaitá / Rubém Berta 2.44 3.12

Nonoai / Vila nova 2.18 2.50

Ambas valorações e ordenações são semelhantes, confirmando os valores de importâncias

calculados. Os bairros mais caminháveis são Bom Fim/Independência e Moinhos de Vento.

Eles não apresentam diferencia significativa no valor de caminhabilidade (teste t-Student para

duas médias). Devido ao alto valor de importância calculado para Segurança Pública, os

bairros com os melhores (piores) valorações da caminhabilidade coincidem com aqueles onde

os residentes sentem maior (menor) segurança.

A Tabela 5 apresenta a análise do efeito marginal de mudanças das três características mais

importantes na caminhabilidade e a simulação de diferentes cenários. O efeito marginal foi

calculado como o efeito no valor da caminhabilidade a partir de um incremento de 1 categoria

na escala de avaliação de cada respondente, para o aspecto analisado. Os cenários

considerados refletem possíveis políticas de transporte para estimular a caminhada.

Tabela 5: Efeitos marginais na caminhabilidade e cenários simulados

Bairro

Efeito marginal

Segurança

Pública

Efeito marginal

Segurança

Tráfego

Efeito marginal

Qualidade do

Pavimento

Cenário 1 Cenário 2

Bom Fim / Independência 13.6% 4.0% 1.6% 3.41 3.41

Moinhos de Vento 13.8% 3.5% 1.6% 3.35 3.35

Rio Branco 14.2% 8.6% 1.9% 3.25 3.25

Cidade Baixa 14.7% 4.1% 2.1% 3.12 3.12

Santana / Petrópolis 15.0% 4.1% 2.0% 3.05 3.05

Vila Assunção 15.5% 3.8% 1.6% 2.93 2.93

Restinga/ Floresta 16.6% 5.0% 2.3% 2.69 2.69

Centro 17.2% 4.8% 2.6% 2.58 3.26

Santo Antônio / Partenon 17.4% 5.2% 2.6% 2.55 2.55

Humaitá / Rubém Berta 18.0% 4.9% 2.7% 2.44 2.44

Nonoai / Vila Nova 19.8% 5.4% 3.0% 3.09 2.18

Os Cenários 1 e 2 representam melhorias na Segurança Pública dos bairros Nonoai / Vila

Nova (pior caminhabilidade) e Centro (área central da cidade) para uma equivalente ao do

bairro de melhor caminhabilidade. Os valores recalculados, indicados em vermelho na Tabela

5, tornariam no Cenário 1 a Nonoai / Vila Nova em quarto lugar e no Cenário 2 ao Centro no

terceiro lugar. Este resultado, assim como o do efeito marginal para Segurança Pública,

mostra que intervenções na segurança dos bairros tem um impacto significativo na sua

caminhabilidade. O Centro apresenta o maior percentual de deslocamento a pé da cidade,

favorecer a caminhabilidade de esta área é fundamental para a sustentabilidade urbana.

6. CONCLUSÕES

A técnica FAHP permitiu determinar a importância relativa e hierarquizar as principais

características do ambiente construído para estimular a caminhabilidade da cidade. Estas

ponderações foram similares às computadas com o Método de Kendall, técnica de ponderação

de diferente suporte metodológico e lógica de cálculo. Os dois atributos mais importantes

identificados por residentes de Porto Alegre foram: Segurança pública, impacto de 53.73% e

Segurança do tráfego, impacto de 14.08%. Seguindo em importância: Qualidade do

pavimento (6.85%), Comércios e serviços próximos (6.64%), Atratividade visual (5.47%),

Largura efetiva da calçada (4.98%), Declividade (4.69%), Existência de caminhos

alternativos (3.57%). Dentre os principais atributos, Segurança pública foi o mais importante

para os respondentes, com um valor sensivelmente superior aos obtidos para os demais. Este

resultado para Segurança pública não surpreendeu, já que a violência urbana tornou-se um

problema social grave em todo o país.

Comparando os resultados obtidos com o trabalho de Larranaga et al. (2014a) na mesma área

de estudo, é possível identificar semelhanças nos mesmos. No estudo anterior, Segurança

pública também foi identificado como o atributo mais relevante. Entretanto, o valor da

importância incrementou, de 42.3% ao atual do 53.73%. Este incremento pode ser devido a

fortalezas do FAHP em relação ao tratamento da incerteza das respostas dos indivíduos, à

cuidados seleção da amostra realizado no presente estudo e provavelmente ao efeito temporal.

A técnica FAHP forneceu aos valores deduzidos uma especial fortaleza graças ao tratamento

difuso dos dados e aos resultados satisfatórios das consistências obtidas.

O grau de importância dos diferentes fatores percebidos pelos residentes de Porto Alegre está

agora mais consolidado, devido à validação obtida mediante a presente pesquisa e

comparação com os diferentes métodos de ponderação utilizados. A caracterização dos

bairros pesquisados baseados na caminhabilidade permitiu identificar os bairros que, de

acordo a percepção dos residentes, apresentaram melhor e pior caminhabilidade. Os bairros

mais caminháveis, dentre os pesquisados, foram Bom Fim/Independência e Moinhos de

Vento. Os menos caminháveis foram Nonoai/Vila Nova. O cálculo de efeitos marginais e

cenários simulados mostraram que intervenções na segurança dos bairros tem um impacto

significativo na sua caminhabilidade.

Políticas urbanas e de transporte que busquem estimular os deslocamentos a pé devem prestar

especial atenção neste aspecto. Teorias estudadas e medidas aplicadas em outras cidades, tais

como Uso controlado de barreiras, Prevenção do Crime através do Desenho Urbano - CPTED,

Iluminação e Gestão da vegetação, que levam a um ambiente fisicamente saudável para todos,

deveriam ser consideradas. Estudos que busquem analisar especificamente o impacto da

segurança sobre as viagens a pé e identificar os fatores ambientais que influenciam na

sensação de segurança são necessários. Adicionalmente, estudos que busquem determinar a

importância dos fatores de forma indireta, através de preferência declarada ou outra técnica de

elicitação que reduza o viés de política que pode existir nas respostas dos entrevistados,

contribuirão na formulação de um índice de caminhabilidade para a cidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Arce, M.E.; Á. Saavedra, J.L. Míguez e E. Granada (2015) The use of grey-based methods in multi-criteria

decision analysis for the evaluation of sustainable energy systems: A review. Renewable and Sustainable

Energy Reviews, v. 47, p. 924-932.

Awasthi, A.; S.S. Chauhan e S.K. Goyal (2010) A fuzzy multicriteria approach for evaluating environmental

performance of suppliers. Int. J. Production Economics, v. 126, p.370–378.

Burden, D. (2001) Building communities with transportation. Transportation Research Record, v. 1773, p. 5-20.

Brugha, C. M. (2004) Structure of multi-criteria decision making. European Journal of the Operational

Research Society, v. 55, n. 11, p. 1156-1168

Ewing, R. e R. Cervero (2010) Travel and the Built Environment -- A Meta-Analysis. Journal of the American

Planning Association, v. 76, p. 265 – 294.

Fleming, C.M. e M. Bowden (2009) Web-based surveys as an alternative to traditional mail methods. Journal of

Environmental Management, v. 90, p. 284-292.

Herva, M. e E. Roca (2013) Review of combined approaches and multi-criteria analysis for corporate

environmental evaluation. Journal of Cleaner Production, v.39, p. 355-371.

Kahraman, C.; U. Cebeci e Z. Ulukan (2003) Multi-criteria supplier selection using fuzzy AHP. Logistics

Information Management, v. 16(6), p. 382-394.

Kendall, M. (1970) Rank correlation methods, 4th edition. Charles Griffin, London.

Larranaga, A. M. L.; H. B. Cybis e O. Strambi (2014a) Determinação da importância relativa dos atributos do

bairro que estimulam as viagens a pé. Anais do XXVIII Congresso de Pesquisa e Ensino em Transportes,

ANPET, Curitiba.

Larranaga, A. M. L.; L. I. Rizzi; J. Arellana; O. Strambi e H. Cybis (2014b) The Influence of built environment

and travel attitudes on walking: a case study of Porto Alegre, Brazil. International Journal of Sustainable

Transportation, v. 10, n. 4, p. 332-342.

Lau, H. C. W.; C. W. Y. Wong; P. K. H. Lau; K. F. Pun; K. S. Chin e B. Jiang (2003) A fuzzy multi-criteria

decision support procedure for enhancing information delivery in extended enterprise networks. Engineering

Applications of Artificial Intelligence, v. 16, p. 1-9.

Li, X.; Y. Liu; Y. Wang e Z. Gao (2016) Evaluating transit operator efficiency: An enhanced DEA model with

constrained fuzzy-AHP cones. Journal of Traffic and Transportation Engineering (English Edition), v. 3, p.

215-225.

Litman, T. (2003) London congestion pricing: implications for other cities. Victoria Transport Policy Institute,

Victoria.

Mateo-Babiano, I. (2016) Pedestrian's needs matter: Examining Manila's walking environment. Transport

Policy, v. 45, p. 107-115.

Nosal, K. e K. Solecka (2014) Application of AHP method for multi-criteria evaluation of variants of the

integration of urban public transport. Transportation Research Procedia, v. 3, p. 269-278.

Pacheco, P. (2015) Five Cities Show the Future of Walkability, The city fix. Disponível em

http://thecityfix.com/blog/five-cities-show-future-walkability-active-transport-priscila-pacheco/. Acesso: 6/2016.

Ruiz-Padillo, A.; A. J. Torija; A. Ramos-Ridao e D. P. Ruiz (2016) Application of the fuzzy analytic hierarchy

process in multi-criteria decision in noise action plans: Prioritizing road stretches. Environmental Modelling

& Software, v. 81, p. 45-55.

Saaty, T. L. (1980) The Analytic Hierarchy Process. McGraw-Hill, New York.

Sadik-Khan, J. e S. Solomonow (2016) Streetfight: Handbook for an Urban Revolution. Viking, Nova York.

Singh, R. (2016) Factors affecting walkability of neighborhoods. Procedia – Social and Behavioral Sciences, v.

216, p. 643-654.

Stockton, J. C.; O. Duke-Williams, E. Stamatakis, J. S. Mindell, E. J. Brunner e N. J. Shelton (2016)

Development of a novel walkability index for London, United Kingdom: crosssectional application to the

Whitehall II Study. BMC Public Health, v. 16, p. 416.

Walkscore (2010) Find a Walkable Place to Live. Disponível em: http://www.walkscore.com. Acesso: 6/2016.

Zadeh, L. A. (1994) Soft computing and fuzzy logic. IEEE Software, v. 11, n. 6, p. 48-56.

Zhu e Chen (2016) The built environment affects non-motorized travel behaviors differently for lower- and

higher-income people, Transportation Research Board 95th Annual Meeting, Washington DC.