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TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE SÃO PAULO Registro: 2012.0000411162 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 9172657- 48.2007.8.26.0000, da Comarca de Ribeirão Preto, em que são apelantes ROBERTO JOSE JAUREGUI e HOSPITAL SAO FRANCISCO S E LTDA, são apelados HOSPITAL SAO FRANCISCO S E LTDA e ROBERTO JOSE JAUREGUI. ACORDAM, em 10ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso do réu e deram parcial provimento ao recurso do autor para majorar a verba honorária. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores JOÃO CARLOS SALETTI (Presidente sem voto), COELHO MENDES E ROBERTO MAIA. São Paulo, 14 de agosto de 2012. CARLOS ALBERTO GARBI – RELATOR – [assinado digitalmente]

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  • TRIBUNAL DE JUSTIAPODER JUDICIRIO DO ESTADO DE SO PAULO

    Registro: 2012.0000411162

    ACRDO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelao n 9172657-

    48.2007.8.26.0000, da Comarca de Ribeiro Preto, em que so apelantes

    ROBERTO JOSE JAUREGUI e HOSPITAL SAO FRANCISCO S E LTDA, so

    apelados HOSPITAL SAO FRANCISCO S E LTDA e ROBERTO JOSE

    JAUREGUI.

    ACORDAM, em 10 Cmara de Direito Privado do Tribunal de

    Justia de So Paulo, proferir a seguinte deciso: "Negaram provimento ao

    recurso do ru e deram parcial provimento ao recurso do autor para majorar a

    verba honorria. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra

    este acrdo.

    O julgamento teve a participao dos Exmos. Desembargadores

    JOO CARLOS SALETTI (Presidente sem voto), COELHO MENDES E

    ROBERTO MAIA.

    So Paulo, 14 de agosto de 2012.

    CARLOS ALBERTO GARBI RELATOR

    [assinado digitalmente]

  • TRIBUNAL DE JUSTIAPODER JUDICIRIO DO ESTADO DE SO PAULO

    Apelao n 9172657-48.2007.8.26.0000 - (Voto n 9.724) LPRD Pgina 2 de 8

    VOTO N 9.724

    Apelao com Reviso n 9172657-48.2007.8.26.0000.Comarca: Ribeiro Preto (9 Vara Cvel).Apelantes: Roberto Jos Jauregui (assistncia judiciria) e outro.Apelados: Hospital So Francisco e outro.

    PRESTAO DE SERVIOS HOSPITALARES. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DEVER DE RESGUARDO INCOLUMIDADE DO PACIENTE.

    1. O autor, de acordo com seu peso e estatura, no poderia ter sido acomodado no quarto por uma nica enfermeira. Deveria ter sido disponibilizada equipe de enfermagem apta ao deslocamento do autor. Tudo a fim de garantir sua incolumidade. Entretanto, sob o fundamento de que a sala de recuperao deveria ser desocupada naquele exato momento, somente uma enfermeira realizou a acomodao do autor em quarto, fato, que, como visto, causou-lhe sangramento na inciso, dores, e internao prolongada por cinco dias.

    2. O hospital responde objetivamente pelos defeitos dos servios prestados (art. 14, do CDC). Alm disso, o ru desenvolve atividade econmica lucrativa. Com maior razo, portanto, deve indenizar os danos decorrentes da deficincia dos servios, notadamente quando h afronta incolumidade do paciente, como se notou no caso em exame. Indenizao por danos morais corretamente fixada.

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    Apelao n 9172657-48.2007.8.26.0000 - (Voto n 9.724) LPRD Pgina 3 de 8

    Recurso do ru no provido e recurso do autor parcialmente provido para majorar a verba honorria.

    1. Recorreram as partes da sentena, proferida pela Doutora Flvia

    de Almeida Montigelli Zanferdini, que julgou procedente o pedido de

    indenizao por danos morais decorrentes de deficincia dos servios

    hospitalares prestados pelo ru. A sentena condenou o ru a pagar reparao

    por danos morais no valor de R$ 5.000,00 e honorrios advocatcios

    correspondentes a 10% do valor da condenao.

    O ru, no recurso, afirmou que a reparao no poderia ter sido

    concedida, pois no houve prova do dano sofrido. Tampouco houve prova da

    deficincia dos servios prestados. Afirmou que o sangramento sofrido pelo

    autor, aps a cirurgia para correo de hrnia inguinal, decorreu de culpa

    exclusiva dele, que teria se disposto de modo errado na cama. Caso seja

    mantida a condenao, pediu a reduo do valor da indenizao.

    O autor tambm interps recurso. Pediu a majorao da verba

    honorria quantia correspondente a 20% do valor da condenao.

    Os recursos foram respondidos pelas partes.

    o relatrio.

    2. O autor submeteu-se a cirurgia para correo de hrnia inguinal

    no dia 16 de dezembro de 2003. Aps a cirurgia, foi levado ao quarto por

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    Apelao n 9172657-48.2007.8.26.0000 - (Voto n 9.724) LPRD Pgina 4 de 8

    enfermeira, que, sozinha, no pde corretamente acomod-lo na cama. O fato

    ocasionou a abertura da inciso cirrgica pelos esforos feitos pelo autor, que

    foi submetido a novo procedimento para adequada limpeza e correo dos

    pontos cirrgicos.

    O ru Hospital So Francisco , que prestou os servios mdicos e

    hospitalares, responde objetivamente pelos danos causados ao autor, nos

    termos do art. 14 do Cdigo de Defesa do Consumidor.

    Alm disso, o ru desenvolve atividade econmica lucrativa. Com

    maior razo, portanto, deve indenizar os danos decorrentes da deficincia dos

    servios, notadamente quando h afronta incolumidade do paciente, como se

    notou no caso em exame. o que esclarece Paulo de Tarso Vieira Sanseverino:

    Na responsabilidade atribuda ao fornecedor imputa-se a reparao dos

    danos causados por esse produto ou servio presumidamente defeituoso, por

    estar o agente desenvolvendo uma atividade econmica em seu benefcio,

    devendo arcar tambm com suas consequncias (ubi onus, ibi emolumentum).

    Basta observar que, dentro dessa faixa de risco, foi atribudo ao fornecedor o

    encargo de indenizar danos causados por produtos ou servios defeituosos,

    bastando que no consiga provar a inocorrncia do defeito. Outro ponto

    importante, na imputao pelo risco, a absoluta irrelevncia do elemento

    culpa no suporte ftico do fato gerador da obrigao de indenizar. Isso

    significa dizer que esse elemento pode estar presente no fato da vida em

    considerao, mas desprezado pelo direito na composio do suporte ftico

    necessrio incidncia da norma que atribui ao fornecedor a obrigao de

    indenizar. A prpria presena do elemento ilicitude discutvel, pois, com

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    Apelao n 9172657-48.2007.8.26.0000 - (Voto n 9.724) LPRD Pgina 5 de 8

    frequncia, o fornecedor responsabilizado sem que ocorra qualquer defeito,

    tendo agido licitamente na colocao do produto ou do servio no mercado. [...]

    Enfim, como a colocao do produto ou do servio no mercado feita em

    benefcio do fornecedor, imputa-se a este a responsabilidade pelos

    ressarcimento dos danos causados aos consumidores, ainda que no esteja

    clara o suficiente a ocorrncia de um defeito (Responsabilidade Civil no

    Cdigo do Consumidor e a Defesa do Fornecedor, Ed. Saraiva, 3 ed., 2010, p.

    194/195).

    Nesse sentido, explica Nehemias Domingos de Melo que Nessa

    perspectiva, entre o hospital e o paciente se estabelece uma perfeita relao de

    consumo. Pelo contrato de prestao de servios mdico-hospitalar temos de

    um lado o consumidor (paciente) e de outro lado o fornecedor (hospital), de tal

    sorte que na eventualidade de falhas na prestao destes servios devem ser

    aplicadas, primacialmente, as normas contidas no Cdigo de Defesa do

    Consumidor (Lei n 8.078/90) ... (Responsabilidade Civil por erro Mdico, Ed.

    Atlas, 1 ed., pg. 114). Diante disso, o ru responde de forma objetiva pelo

    defeito no servio prestado, conforme dispe o art. 14 da Lei n 8.078/90: O

    fornecedor de servios responde, independentemente da existncia de culpa, pela

    reparao dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos

    prestao dos servios, bem como por informaes insuficientes ou

    inadequadas sobre sua fruio e riscos.

    No h dvida de que o autor, de acordo com o seu peso (105 quilos)

    e estatura, no poderia ter sido acomodado no quarto por uma nica

    enfermeira. Deveria ter sido disponibilizada equipe de enfermagem apta ao

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    Apelao n 9172657-48.2007.8.26.0000 - (Voto n 9.724) LPRD Pgina 6 de 8

    deslocamento do autor. Tudo a fim de garantir sua incolumidade, dever que

    assume o estabelecimento de sade ao receber o paciente para tratamento.

    nesse sentido a doutrina de Rui Stoco, apoiado em Jos de Aguiar

    Dias e Teresa Ancona Lopez de Magalhes: H danos materiais ou morais

    suportados por pacientes e seu prximos, causados no em razo da atuao

    dos mdicos ou das casas de sade diretamente junto s vtimas, no

    tratamento especfico do mal que as acomete ou do procedimento mdico

    contratado, mas decorrentes da culpa in vigilando ou in eligendo dos

    prepostos, enquanto os pacientes, clientes ou internos esto hospedados ou

    internados no hospital e, portanto, acobertados por clusula de incolumidade.

    Constituem exemplos mais expressivos as quedas sofridas pelos pacientes por

    falta de cuidados por parte dos enfermeiros e serviais; os suicdios ou

    tentativas de suicdio cometidos pelos internos com distrbios mentais; a fuga

    de pacientes de hospital, que vm a sofrer acidentes j fora das dependncias do

    nosocmio, ou causem mal a terceiros. (Responsabilidade Civil dos Hospitais,

    Sanatrios, Clnicas, Casas de Sade e Similares em face do Cdigo de Defesa

    do Consumidor in Doutrinas Essenciais Responsabilidade Civil, vol. V, p.

    824, coordenao de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery.

    Tambm publicado na RT 712/1995).

    Vale lembrar que a internao do paciente implica na assuno, pelo

    hospital, da obrigao de oferecer o melhor tratamento mdico e tambm dos

    deveres de guarda e de proteo da pessoa hospitalizada. Do contrato de

    internamento, afirma lvaro Henrique Teixeira de Almeida, decorre, tambm,

    uma obrigao de vigilncia e segurana do paciente que, em ltima anlise,

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    Apelao n 9172657-48.2007.8.26.0000 - (Voto n 9.724) LPRD Pgina 7 de 8

    vem a ser mais uma das facetas do dever de incolumidade. Uma vez internado,

    compete ao hospital zelar pela segurana do paciente, oferecendo servios que o

    coloquem a salvo de sinistros que afetem sua sade ou integridade corporal,

    mesmo que o fato ensejador do dano seja completamente estranho aos servios

    mdicos e paramdicos (O Contrato Hospitalar, in Responsabilidade Civil e o

    Fato Social no Sculo XXI, coord. De Nagib Slaibi Filho, ed. Forense, p. 42).

    Entretanto, sob o fundamento de que a sala de recuperao deveria

    ser desocupada naquele exato momento, somente uma enfermeira realizou a

    acomodao do autor em quarto, fato, que, como visto, causou-lhe sangramento

    na inciso, dores, e internao prolongada por cinco dias.

    Assim, a sentena, corretamente, reconheceu a responsabilidade do

    ru pela reparao dos danos morais causados. A indenizao (R$ 5.000,00) foi

    fixada com moderao, em atendimento s circunstncias do caso apontadas. A

    reduo do valor da reparao ao valor correspondente a um salrio mnimo,

    como pretendia o ru, significaria a concesso de indenizao insuficiente

    reparao do dano, o que no poderia ser admitido.

    Em relao aos honorrios advocatcios, o recurso do autor comporta

    parcial provimento. que a sentena estabeleceu honorrios advocatcios de

    10% sobre o valor da condenao. Entretanto, o pedido foi contestado e a

    resistncia do ru foi deduzida em recurso, que exigiu trabalho maior do

    advogado do autor. Assim, razovel a fixao dos honorrios em 15% sobre o

    valor da condenao.

    3. Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso do ru e DOU

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    Apelao n 9172657-48.2007.8.26.0000 - (Voto n 9.724) LPRD Pgina 8 de 8

    PROVIMENTO PARCIAL ao recurso do autor para fixar os honorrios

    advocatcios na quantia correspondente a 15% do valor da condenao.

    CARLOS ALBERTO GARBI relator

    [assinado digitalmente]

    2012-08-17T15:54:55+0000Not specified