aos societát rios - vida económica | economia, imposto ...vj_ed164... · do código das...

67
março/2012 Vida Judiciária Nº 164 - março 2012 - 7,50€ EM FOCO Revisão ao Regulamento das Custas Processuais já se encontra em vigor DESTAQUE Nova Lei da Arbitragem Voluntária MARCAS IMITAÇÃO DE MARCA (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13/03/2012) ATOS SOCIETÁRIOS Obrigações decorrentes do Código das Sociedades Comerciais

Upload: nguyenliem

Post on 28-Nov-2018

222 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

mar

ço/2

012

Vida

Judi

ciár

ia

Nº 164 - março 2012 - 7,50€

em foco

Revisão ao Regulamento das Custas Processuais já se encontra em vigor

destaque

Nova Lei da arbitragem Voluntária

maRcas

IMITAÇÃO DE MARCA (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13/03/2012)

atos societáRios obrigações decorrentes do código das sociedades comerciais

editorial VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 1

a nova lei da arbitragem voluntáriaPor: Sandra Miranda da Silva

A nova Lei da Arbitragem Voluntária aplica-se aos processos arbitrais que se iniciem após 14.3.2012, assim como aos processos arbitrais iniciados em data anterior, desde que ambas as partes nisso acordem.De acordo com o novo regime, qualquer litígio respeitante a interesses de natureza patrimonial pode ser cometido pelas partes à decisão de árbitros, desde que por lei especial não esteja submetido exclusivamente aos tribunais do Estado ou a arbitragem necessária, mediante convenção de arbitragem.Mesmo que os litígios não envolvam interesses de natureza patrimonial, é igualmente válida a convenção de arbitragem desde que as partes possam vir a celebrar transação sobre o direito controvertido.Acelerar a resolução de litígios entre empresas, contribuir para reduzir as pendências que entopem os tribunais do Estado e dotar Portugal de condições para atrair arbitragens internacionais são propósitos anunciados com a criação do novo quadro legal. Especialistas na matéria entendem que, ao nível da internacionalização que se persegue para a arbitragem nacional, esta lei poderá ter um papel importante. Nomeadamente ao nível da captação de arbitragens de conflitos que envolvam empresas de países onde se fala oficialmente a língua portuguesaSerá necessário, no entanto, criar condições para que o novo quadro legal seja devidamente aproveitado.Na opinião do árbitro e professor universitário Dário Moura Vicente, “para que a arbitragem se afirme como um meio alternativo ou complementar da justiça estadual, é muito importante a existência de centros de arbitragem sólidos, bem organizados e prestigiados”.O uso da arbitragem depende, agora, da reforma extensiva dos regulamentos de arbitragem dos centros de arbitragem institucional. Por outro lado, a reforma das tabelas de custas e honorários, no sentido da sua redução significativa, é igualmente um passo importante no sentido da generalização da arbitragem.

ProprietárioVida Económica - Editorial, S.A.

Rua Gonçalo Cristóvão, 14 - 2º

4000-263 Porto

NIF 507 258 487

diretorJoão Carlos Peixoto de Sousa

Coordenadora de ediçãoSandra Silva

Paginação e capaFlávia Leitão

direção ComercialPorto:

Teresa Claro

Madalena Campos

assinaturasMaria José Teixeira

E-mail: [email protected]

redação, administração Vida Económica - Editorial, S.A.

Rua Gonçalo Cristóvão, 14 r/c

4000-263 Porto

Telef. 223 399 400

Fax. 222 058 098

E-Mail: [email protected]

delegação de lisboaAv. Fontes Pereira de Melo,

nº 6 - 4º piso

1069-106 Lisboa

Telef. 217 805 410

Fax. 217 805 415

impressãoUniarte Gráfica / PortoPublicação inscrita no Instituto

da Comunicação Social nº 120738

Empresa Jornalística nº 208709

Periodicidade: mensal

Nº 164 março 2012REVISTA MENSAL

SuMárioVIDA JUDICIÁRIA - março 20122

4 Destaque

Nova Lei da Arbitragem Voluntária

18 Em Foco Revisão ao Regulamento das Custas Processuais já se encontra em vigor

20 Atualidades Informações jurídicas

25 Registos & Notariado Cedência ocasional de trabalhador

26 Análise Atos societários – obrigações decorrentes do Código das Sociedades Comerciais

27 Marcas & Patentes Imitação de marca

32 Jurisprudência

Resumos de Jurisprudência Jurisprudência do STJ e das Relações Sumários do STJ

63 Legislação Principal legislação publicada 1ª e 2ª séries do Diário da República

Uma obra inovadora que o vai ajudar a compreender e a interpretar uma cláusula que levanta problemas ao nível da sua aplicação.

Autora:Patrícia Meneses Leirião

Páginas: 228

P.V.P.: € 15

Autora:Autora:Patrícia Meneses Leirião

A CLÁUSULA GERAL ANTIABUSO E O SEU PROCEDIMENTO DE APLICAÇÃO

Regul

amen

to e

m li

vrar

ia.vidaeconomica.pt

Exclusivo paracompras online

Compre já em http://livraria.vidaeconomica.pt e ganhe Pontos com Vida.

[email protected] 223 399 400

- R. Gonçalo Cristóvão, 14, r/c • 4000-263 PORTO

Melhor Opção

Especialmente recomendada para juristas, advogados, consultores, financeiros e gestores

deStaqueVIDA JUDICIÁRIA - março 20124

Nova lei da arbitragem Voluntária No dia 14 de Março de 2012 entrou em vigor a nova Lei da Arbitragem Voluntá-ria (Lei 63/2011, de 14.12), data a partir da qual se considera revogada a lei da arbitragem actualmente em vigor (Lei nº 31/86, de 29.8), com excepção do disposto no nº 1 do artigo 1º (conven-ção de arbitragem), que se mantém em vigor para a arbitragem de litígios emergentes de ou relativos a contratos de trabalho. A nova Lei aplica-se aos processos ar-bitrais que se iniciem após 14.3.2012. Todavia, este novo regime é também aplicável aos processos arbitrais inicia-dos em data anterior, desde que ambas as partes nisso acordem ou se uma delas formular proposta nesse sentido e a outra a tal não se opuser no prazo de 15 dias a contar da respectiva recepção.O diploma que aprova o novo regime de arbitragem introduz, em conformidade, alterações aos arts. 812º-D, 815º, 1094º e 1527º do Código de Processo Civil e revoga o nº 2 do art. 181º e o artº 186º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, assim como o art. 1097º do Código de Processo Civil.De acordo com o novo regime, qualquer litígio respeitante a interesses de na-tureza patrimonial pode ser cometido pelas partes à decisão de árbitros, desde que por lei especial não esteja subme-tido exclusivamente aos tribunais do Estado ou a arbitragem necessária, mediante convenção de arbitragem.Mesmo que os litígios não envolvam interesses de natureza patrimonial é igualmente válida a convenção de ar-bitragem desde que as partes possam vir a celebrar transacção sobre o direito controvertido.Podem ser sujeitos a arbitragem litígios actuais ou litígios eventuais emergentes de determinada relação jurídica contra-tual ou extracontratual (cláusula com-promissória). Por outro lado, as partes também podem acordar em submeter a arbitragem, para além das questões

de natureza contenciosa em sentido estrito, quaisquer outras que requeiram a intervenção de um decisor imparcial, designadamente as relacionadas com a necessidade de precisar, completar e adaptar contratos de prestações dura-douras a novas circunstânciasAcelerar a resolução de litígios entre empresas, contribuir para reduzir as pendências que entopem os tribunais do Estado e dotar Portugal de condições para atrair arbitragens internacionais são propósitos anunciados, com a cria-ção deste novo quadro legal.Das alterações ora introduzidas desta-camos as seguintes: - Cabe ao tribunal arbitral decidir se a

convenção de arbitragem – acordo pelo qual as partes decidem que determinada matéria pode ser sub-metida a árbitros – é ou não válida. Os tribunais do Estado abstêm-se assim de julgar a matéria em questão, a não ser que se verifique que a convenção de arbitragem é manifestamente invalida.

- A nova lei atribui também ao tribunal arbitral competência para proferir providências cautelares. Tal permitirá evitar que no decorrer de uma acção que se prolongue no tempo a parte demandada dissipe os seus bens.

- Ao contrário do que sucedia até aqui, passam a ser possíveis arbitragens com pluralidade de partes, com vários demandantes e vários demandados.

- Relativamente à duração do processo arbitral, a nova lei alarga-o para um período de 12 meses, contra os seis meses anteriormente previstos.

- Deixa de haver possibilidade de recurso da decisão arbitral para os tribunais do Estado. Em situações excepcionais, como a existência de vícios muito graves da sentença arbi-tral, a lei permite interpor uma acção de anulação, que terá de ser intentada num Tribunal da Relação.

- O reconhecimento de sentenças arbi-

trais oriundas do estrangeiro cabia, até aqui, aos Tribunais de primeira instância. Esse reconhecimento passa agora para a alçada dos Tribunais da Relação, de segunda instância.

Transcrevemos nesta edição a nova Lei da Arbitragem Voluntária

lei da arbitragem Voluntária

CaPÍtulo ida convenção de arbitragem

artigo 1ºConvenção de arbitragem

1 - Desde que por lei especial não esteja submetido exclusivamente aos tribunais do Estado ou a arbitragem necessária, qualquer litígio respeitante a interesses de natureza patrimonial pode ser cometido pelas partes, mediante convenção de arbitragem, à decisão de árbitros.2 - É também válida uma convenção de arbitragem relativa a litígios que não envolvam interesses de natureza patrimonial, desde que as partes pos-sam celebrar transacção sobre o direito controvertido.3 - A convenção de arbitragem pode ter por objecto um litígio actual, ainda que afecto a um tribunal do Estado (com-promisso arbitral), ou litígios eventuais emergentes de determinada relação jurídica contratual ou extracontratual (cláusula compromissória).4 - As partes podem acordar em sub-meter a arbitragem, para além das questões de natureza contenciosa em sentido estrito, quaisquer outras que requeiram a intervenção de um decisor imparcial, designadamente as relacionadas com a necessidade de precisar, completar e adaptar contra-tos de prestações duradouras a novas circunstâncias.5 - O Estado e outras pessoas colecti-vas de direito público podem celebrar

deStaque VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 5

convenções de arbitragem, na medida em que para tanto estejam autorizados por lei ou se tais convenções tiverem por objecto litígios de direito privado.

artigo 2ºrequisitos da convenção de arbitragem; sua revogação

1 - A convenção de arbitragem deve adoptar forma escrita.2 - A exigência de forma escrita tem-se por satisfeita quando a convenção conste de documento escrito assinado pelas partes, troca de cartas, telegra-mas, telefaxes ou outros meios de telecomunicação de que fique prova escrita, incluindo meios electrónicos de comunicação.3 - Considera-se que a exigência de forma escrita da convenção de arbitra-gem está satisfeita quando esta conste de suporte electrónico, magnético, óptico, ou de outro tipo, que ofereça as mesmas garantias de fidedignidade, inteligibilidade e conservação.4 - Sem prejuízo do regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, vale como convenção de arbitragem a remissão feita num contrato para documento que contenha uma cláusula compro-missória, desde que tal contrato revista a forma escrita e a remissão seja feita de modo a fazer dessa cláusula parte integrante do mesmo.5 - Considera-se também cumprido o requisito da forma escrita da conven-ção de arbitragem quando exista troca de uma petição e uma contestação em processo arbitral, em que a existência de tal convenção seja alegada por uma parte e não seja negada pela outra.6 - O compromisso arbitral deve deter-minar o objecto do litígio; a cláusula compromissória deve especificar a re-lação jurídica a que os litígios respeitem.

artigo 3ºNulidade da convenção de

arbitragemÉ nula a convenção de arbitragem ce-lebrada em violação do disposto nos artigos 1º e 2º.

artigo 4ºModificação, revogação e caducidade da convenção

1 - A convenção de arbitragem pode ser modificada pelas partes até à aceitação do primeiro árbitro ou, com o acordo de todos os árbitros, até à prolação da sentença arbitral.2 - A convenção de arbitragem pode ser revogada pelas partes, até à prolação da sentença arbitral.3 - O acordo das partes previsto nos números anteriores deve revestir a for-ma escrita, observando-se o disposto no artigo 2º.4 - Salvo convenção em contrário, a morte ou extinção das partes não faz caducar a convenção de arbitragem nem extingue a instância arbitral.

artigo 5ºefeito negativo da convenção

de arbitragem1 - O tribunal estadual no qual seja proposta acção relativa a uma questão abrangida por uma convenção de ar-bitragem deve, a requerimento do réu deduzido até ao momento em que este apresentar o seu primeiro articulado sobre o fundo da causa, absolvê-lo da instância, a menos que verifique que, manifestamente, a convenção de arbi-tragem é nula, é ou se tornou ineficaz ou é inexequível.2 - No caso previsto no número anterior, o processo arbitral pode ser iniciado ou prosseguir, e pode ser nele proferida uma sentença, enquanto a questão estiver pendente no tribunal estadual.3 - O processo arbitral cessa e a sen-tença nele proferida deixa de produzir efeitos, logo que um tribunal estadual considere, mediante decisão transitada em julgado, que o tribunal arbitral é incompetente para julgar o litígio que lhe foi submetido, quer tal decisão seja proferida na acção referida no nº 1 do presente artigo, quer seja proferida ao abrigo do disposto no nº 9 do artigo 18º, e nas subalíneas i) e iii) da alínea a) do nº 3 do artigo 46º.4 - As questões da nulidade, ineficácia e inexequibilidade de uma convenção de

arbitragem não podem ser discutidas autonomamente em acção de simples apreciação proposta em tribunal esta-dual nem em procedimento cautelar instaurado perante o mesmo tribunal, que tenha como finalidade impedir a constituição ou o funcionamento de um tribunal arbitral.

artigo 6ºremissão para regulamentos

de arbitragemTodas as referências feitas na presente lei ao estipulado na convenção de ar-bitragem ou ao acordo entre as partes abrangem não apenas o que as partes aí regulem directamente, mas também o disposto em regulamentos de arbi-tragem para os quais as partes hajam remetido.

artigo 7ºConvenção de arbitragem e providências cautelares decretadas por tribunal

estadualNão é incompatível com uma conven-ção de arbitragem o requerimento de providências cautelares apresentado a um tribunal estadual, antes ou durante o processo arbitral, nem o decreta-mento de tais providências por aquele tribunal.

CaPÍtulo iidos árbitros e do tribunal

arbitral

artigo 8ºNúmero de árbitros

1 - O tribunal arbitral pode ser constitu-ído por um único árbitro ou por vários, em número ímpar.2 - Se as partes não tiverem acordado no número de membros do tribunal ar-bitral, é este composto por três árbitros.

artigo 9ºrequisitos dos árbitros

1 - Os árbitros devem ser pessoas singu-lares e plenamente capazes.2 - Ninguém pode ser preterido, na sua designação como árbitro, em razão da

deStaqueVIDA JUDICIÁRIA - março 20126

nacionalidade, sem prejuízo do dispos-to no nº 6 do artigo 10º e da liberdade de escolha das partes.3 - Os árbitros devem ser independentes e imparciais.4 - Os árbitros não podem ser respon-sabilizados por danos decorrentes das decisões por eles proferidas, salvo nos casos em que os magistrados judiciais o possam ser.5 - A responsabilidade dos árbitros pre-vista no número anterior só tem lugar perante as partes.

artigo 10ºdesignação dos árbitros

1 - As partes podem, na convenção de arbitragem ou em escrito posterior por elas assinado, designar o árbitro ou os árbitros que constituem o tribunal arbi-tral ou fixar o modo pelo qual estes são escolhidos, nomeadamente, cometen-do a designação de todos ou de alguns dos árbitros a um terceiro.2 - Caso o tribunal arbitral deva ser constituído por um único árbitro e não haja acordo entre as partes quanto a essa designação, tal árbitro é escolhido, a pedido de qualquer das partes, pelo tribunal estadual.3 - No caso de o tribunal arbitral ser composto por três ou mais árbitros, cada parte deve designar igual número de árbitros e os árbitros assim desig-nados devem escolher outro árbitro, que actua como presidente do tribunal arbitral.4 - Salvo estipulação em contrário, se, no prazo de 30 dias a contar da recepção do pedido que a outra parte lhe faça nesse sentido, uma parte não designar o árbitro ou árbitros que lhe cabe escolher ou se os árbitros designados pelas par-tes não acordarem na escolha do árbitro presidente no prazo de 30 dias a contar da designação do último deles, a desig-nação do árbitro ou árbitros em falta é feita, a pedido de qualquer das partes, pelo tribunal estadual competente.5 - Salvo estipulação em contrário, aplica-se o disposto no número ante-rior se as partes tiverem cometido a designação de todos ou de alguns dos

árbitros a um terceiro e este não a tiver efectuado no prazo de 30 dias a contar da solicitação que lhe tenha sido dirigi-da nesse sentido.6 - Quando nomear um árbitro, o tribu-nal estadual competente tem em conta as qualificações exigidas pelo acordo das partes para o árbitro ou os árbitros a designar e tudo o que for relevante para garantir a nomeação de um árbitro independente e imparcial; tratando-se de arbitragem internacional, ao nomear um árbitro único ou um terceiro árbitro, o tribunal tem também em considera-ção a possível conveniência da nome-ação de um árbitro de nacionalidade diferente da das partes.7 - Não cabe recurso das decisões profe-ridas pelo tribunal estadual competente ao abrigo dos números anteriores do presente artigo.

artigo 11ºPluralidade de demandantes

ou de demandados1 - Em caso de pluralidade de deman-dantes ou de demandados, e devendo o tribunal arbitral ser composto por três árbitros, os primeiros designam con-juntamente um árbitro e os segundos designam conjuntamente outro.2 - Se os demandantes ou os deman-dados não chegarem a acordo sobre o árbitro que lhes cabe designar, cabe ao tribunal estadual competente, a pedido de qualquer das partes, fazer a designa-ção do árbitro em falta.3 - No caso previsto no número anterior, pode o tribunal estadual, se se demons-trar que as partes que não conseguiram nomear conjuntamente um árbitro têm interesses conflituantes relativamente ao fundo da causa, nomear a totalidade dos árbitros e designar de entre eles quem é o presidente, ficando nesse caso sem efeito a designação do árbitro que uma das partes tiver entretanto efectuado.4 - O disposto no presente artigo entende-se sem prejuízo do que haja sido estipulado na convenção de arbi-tragem para o caso de arbitragem com pluralidade de partes.

artigo 12ºaceitação do encargo

1 - Ninguém pode ser obrigado a ac-tuar como árbitro; mas se o encargo tiver sido aceite, só é legítima a escusa fundada em causa superveniente que impossibilite o designado de exercer tal função ou na não conclusão do acordo a que se refere o nº 1 do artigo 17º.2 - A menos que as partes tenham acordado de outro modo, cada árbitro designado deve, no prazo de 15 dias a contar da comunicação da sua designa-ção, declarar por escrito a aceitação do encargo a quem o designou; se em tal prazo não declarar a sua aceitação nem por outra forma revelar a intenção de agir como árbitro, entende-se que não aceita a designação.3 - O árbitro que, tendo aceitado o en-cargo, se escusar injustificadamente ao exercício da sua função responde pelos danos a que der causa.

artigo 13ºFundamentos de recusa

1 - Quem for convidado para exercer funções de árbitro deve revelar todas as circunstâncias que possam suscitar fundadas dúvidas sobre a sua impar-cialidade e independência.2 - O árbitro deve, durante todo o pro-cesso arbitral, revelar, sem demora, às partes e aos demais árbitros as circuns-tâncias referidas no número anterior que sejam supervenientes ou de que só tenha tomado conhecimento depois de aceitar o encargo.3 - Um árbitro só pode ser recusado se existirem circunstâncias que possam suscitar fundadas dúvidas sobre a sua imparcialidade ou independência ou se não possuir as qualificações que as partes convencionaram. Uma parte só pode recusar um árbitro que haja designado ou em cuja designação haja participado com fundamento numa causa de que só tenha tido conheci-mento após essa designação.

artigo 14ºProcesso de recusa

1 - Sem prejuízo do disposto no nº 3

deStaque VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 7

do presente artigo, as partes podem livremente acordar sobre o processo de recusa de árbitro.2 - Na falta de acordo, a parte que pre-tenda recusar um árbitro deve expor por escrito os motivos da recusa ao tribunal arbitral, no prazo de 15 dias a contar da data em que teve conhecimento da constituição daquele ou da data em que teve conhecimento das circunstâncias referidas no artigo 13º Se o árbitro re-cusado não renunciar à função que lhe foi confiada e a parte que o designou insistir em mantê-lo, o tribunal arbitral, com participação do árbitro visado, decide sobre a recusa.3 - Se a destituição do árbitro recusado não puder ser obtida segundo o proces-so convencionado pelas partes ou nos termos do disposto no nº 2 do presente artigo, a parte que recusa o árbitro pode, no prazo de 15 dias após lhe ter sido comunicada a decisão que rejeita a recusa, pedir ao tribunal estadual com-petente que tome uma decisão sobre a recusa, sendo aquela insusceptível de recurso. Na pendência desse pedido, o tribunal arbitral, incluindo o árbitro recusado, pode prosseguir o processo arbitral e proferir sentença.

artigo 15ºincapacitação ou inacção de

um árbitro1 - Cessam as funções do árbitro que fique incapacitado, de direito ou de facto, para exercê-las, se o mesmo a elas renunciar ou as partes de comum acordo lhes puserem termo com esse fundamento.2 - Se um árbitro, por qualquer outra razão, não se desincumbir, em tempo razoável, das funções que lhe foram cometidas, as partes podem, de comum acordo, fazê-las cessar, sem prejuízo da eventual responsabilidade do árbitro em causa.3 - No caso de as partes não chegarem a acordo quanto ao afastamento do árbitro afectado por uma das situações referidas nos números anteriores do presente artigo, qualquer das partes pode requerer ao tribunal estadual

competente que, com fundamento na situação em causa, o destitua, sendo esta decisão insusceptível de recurso.4 - Se, nos termos dos números an-teriores do presente artigo ou do nº 2 do artigo 14º, um árbitro renunciar à sua função ou as partes aceitarem que cesse a função de um árbitro que alegadamente se encontre numa das situações aí previstas, tal não implica o reconhecimento da procedência dos motivos de destituição mencionados nas disposições acima referidas.

artigo 16ºNomeação de um árbitro

substituto1 - Em todos os casos em que, por qual-quer razão, cessem as funções de um árbitro, é nomeado um árbitro substitu-to, de acordo com as regras aplicadas à designação do árbitro substituído, sem prejuízo de as partes poderem acordar em que a substituição do árbitro se faça de outro modo ou prescindirem da sua substituição.2 - O tribunal arbitral decide, tendo em conta o estado do processo, se algum acto processual deve ser repetido face à nova composição do tribunal.

artigo 17ºHonorários e despesas dos

árbitros1 - Se as partes não tiverem regulado tal matéria na convenção de arbitragem, os honorários dos árbitros, o modo de reembolso das suas despesas e a forma de pagamento pelas partes de preparos por conta desses honorários e despesas devem ser objecto de acordo escrito entre as partes e os árbitros, concluído antes da aceitação do último dos árbi-tros a ser designado.2 - Caso a matéria não haja sido re-gulada na convenção de arbitragem, nem sobre ela haja sido concluído um acordo entre as partes e os árbitros, cabe aos árbitros, tendo em conta a complexidade das questões decididas, o valor da causa e o tempo despendido ou a despender com o processo arbitral até à conclusão deste, fixar o montante

dos seus honorários e despesas, bem como determinar o pagamento pelas partes de preparos por conta daque-les, mediante uma ou várias decisões separadas das que se pronunciem sobre questões processuais ou sobre o fundo da causa.3 - No caso previsto no número anterior do presente artigo, qualquer das partes pode requerer ao tribunal estadual competente a redução dos montantes dos honorários ou das despesas e res-pectivos preparos fixados pelos árbitros, podendo esse tribunal, depois de ouvir sobre a matéria os membros do tribunal arbitral, fixar os montantes que conside-re adequados.4 - No caso de falta de pagamento de preparos para honorários e despesas que hajam sido previamente acorda-dos ou fixados pelo tribunal arbitral ou estadual, os árbitros podem suspender ou dar por concluído o processo arbitral, após ter decorrido um prazo adicional razoável que concedam para o efeito à parte ou partes faltosas, sem prejuízo do disposto no número seguinte do presente artigo.5 - Se, dentro do prazo fixado de acordo com o número anterior, alguma das partes não tiver pago o seu preparo, os árbitros, antes de decidirem suspender ou pôr termo ao processo arbitral, co-municam-no às demais partes para que estas possam, se o desejarem, suprir a falta de pagamento daquele preparo no prazo que lhes for fixado para o efeito.

CaPÍtulo iiida competência do tribunal

arbitral

artigo 18ºCompetência do tribunal

arbitral para se pronunciar sobre a sua competência

1 - O tribunal arbitral pode decidir sobre a sua própria competência, mesmo que para esse fim seja necessário apreciar a existência, a validade ou a eficácia da convenção de arbitragem ou do contrato em que ela se insira, ou a apli-cabilidade da referida convenção.

deStaqueVIDA JUDICIÁRIA - março 20128

2 - Para os efeitos do disposto no núme-ro anterior, uma cláusula compromis-sória que faça parte de um contrato é considerada como um acordo indepen-dente das demais cláusulas do mesmo.3 - A decisão do tribunal arbitral que considere nulo o contrato não implica, só por si, a nulidade da cláusula com-promissória.4 - A incompetência do tribunal arbi-tral para conhecer da totalidade ou de parte do litígio que lhe foi submetido só pode ser arguida até à apresentação da defesa quanto ao fundo da causa, ou juntamente com esta.5 - O facto de uma parte ter designado um árbitro ou ter participado na sua designação não a priva do direito de arguir a incompetência do tribunal arbitral para conhecer do litígio que lhe haja sido submetido.6 - A arguição de que, no decurso do processo arbitral, o tribunal arbitral excedeu ou pode exceder a sua compe-tência deve ser deduzida imediatamen-te após se suscitar a questão que ale-gadamente exceda essa competência.7 - O tribunal arbitral pode, nos casos previstos nos nos 4 e 6 do presente artigo, admitir as excepções que, com os fundamentos neles referidos, sejam arguidas após os limites temporais aí estabelecidos, se considerar justificado o não cumprimento destes.8 - O tribunal arbitral pode decidir sobre a sua competência quer mediante uma decisão interlocutória quer na sentença sobre o fundo da causa.9 - A decisão interlocutória pela qual o tribunal arbitral declare que tem compe-tência pode, no prazo de 30 dias após a sua notificação às partes, ser impugnada por qualquer destas perante o tribunal estadual competente, ao abrigo das suba-líneas i) e iii) da alínea a) do nº 3 do artigo 46º, e da alínea f) do nº 1 do artigo 59º.10 - Enquanto a impugnação referida no número anterior do presente artigo estiver pendente no tribunal estadual competente, o tribunal arbitral pode prosseguir o processo arbitral e proferir sentença sobre o fundo da causa, sem prejuízo do disposto no nº 3 do artigo 5º

artigo 19ºextensão da intervenção dos

tribunais estaduaisNas matérias reguladas pela presente lei, os tribunais estaduais só podem intervir nos casos em que esta o prevê.

CaPÍtulo iV

das providências cautelares e ordens preliminares

SeCÇÃo iProvidências cautelares

artigo 20ºProvidências cautelares decretadas pelo tribunal

arbitral1 - Salvo estipulação em contrário, o tribunal arbitral pode, a pedido de uma parte e ouvida a parte contrária, decretar as providências cautelares que considere necessárias em relação ao objecto do litígio.2 - Para os efeitos da presente lei, uma providência cautelar é uma medida de carácter temporário, decretada por sentença ou decisão com outra forma, pela qual, em qualquer altura antes de proferir a sentença que venha a dirimir o litígio, o tribunal arbitral ordena a uma parte que:a) Mantenha ou restaure a situação

anteriormente existente enquanto o litígio não for dirimido;

b) Pratique actos que previnam ou se abstenha de praticar actos que pro-vavelmente causem dano ou prejuízo relativamente ao processo arbitral;

c) Assegure a preservação de bens sobre os quais uma sentença subsequente possa ser executada;

d) Preserve meios de prova que possam ser relevantes e importantes para a resolução do litígio.

artigo 21ºrequisitos para o

decretamento de providências cautelares

1 - Uma providência cautelar requerida ao abrigo das alíneas a), b) e c) do nº 2

do artigo 20º é decretada pelo tribunal arbitral, desde que:a) Haja probabilidade séria da existência

do direito invocado pelo requerente e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão; e

b) O prejuízo resultante para o requeri-do do decretamento da providência não exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pre-tende evitar.

2 - O juízo do tribunal arbitral relativo à probabilidade referida na alínea a) do nº 1 do presente artigo não afecta a liberdade de decisão do tribunal ar-bitral quando, posteriormente, tiver de se pronunciar sobre qualquer matéria.3 - Relativamente ao pedido de uma providência cautelar feito ao abrigo da alínea d) do nº 2 do artigo 20º, os requisitos estabelecidos nas alíneas a) e b) do nº 1 do presente artigo aplicam-se apenas na medida que o tribunal arbi-tral considerar adequada.

SeCÇÃo iiordens preliminares

artigo 22ºrequerimento de ordens preliminares; requisitos

1 - Salvo havendo acordo em sentido diferente, qualquer das partes pode pe-dir que seja decretada uma providência cautelar e, simultaneamente, requerer que seja dirigida à outra parte uma ordem preliminar, sem prévia audiência dela, para que não seja frustrada a finali-dade da providência cautelar solicitada.2 - O tribunal arbitral pode emitir a ordem preliminar requerida, desde que considere que a prévia revelação do pedido de providência cautelar à parte contra a qual ela se dirige cria o risco de a finalidade daquela providência ser frustrada.3 - Os requisitos estabelecidos no artigo 21º são aplicáveis a qualquer ordem preliminar, considerando-se que o dano a equacionar ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 21º é, neste caso, o que pode resultar de a ordem preliminar ser ou não emitida.

deStaque VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 9

artigo 23ºregime específico das ordens

preliminares1 - Imediatamente depois de o tribunal arbitral se ter pronunciado sobre um re-querimento de ordem preliminar, deve informar todas as partes sobre o pedido de providência cautelar, o requerimento de ordem preliminar, a ordem prelimi-nar, se esta tiver sido emitida, e todas as outras comunicações, incluindo comu-nicações orais, havidas entre qualquer parte e o tribunal arbitral a tal respeito.2 - Simultaneamente, o tribunal arbitral deve dar oportunidade à parte contra a qual a ordem preliminar haja sido decretada para apresentar a sua posição sobre aquela, no mais curto prazo que for praticável e que o tribunal fixa.3 - O tribunal arbitral deve decidir prontamente sobre qualquer objecção deduzida contra a ordem preliminar.4 - A ordem preliminar caduca 20 dias após a data em que tenha sido emitida pelo tribunal arbitral. O tribunal pode, contudo, após a parte contra a qual se dirija a ordem preliminar ter sido dela notificada e ter tido oportunidade para sobre ela apresentar a sua posição, decretar uma providência cautelar, adoptando ou modificando o conteúdo da ordem preliminar.5 - A ordem preliminar é obrigatória para as partes, mas não é passível de execução coerciva por um tribunal estadual.

SeCÇÃo iiiregras comuns às providências

cautelares e às ordens preliminares

artigo 24ºModificação, suspensão e revogação; prestação de

caução1 - O tribunal arbitral pode modificar, suspender ou revogar uma providên-cia cautelar ou uma ordem preliminar que haja sido decretada ou emitida, a pedido de qualquer das partes ou, em circunstâncias excepcionais e após ouvi-las, por iniciativa do próprio tribunal.2 - O tribunal arbitral pode exigir à parte que

solicita o decretamento de uma providência cautelar a prestação de caução adequada.3 - O tribunal arbitral deve exigir à parte que requeira a emissão de uma ordem preliminar a prestação de cau-ção adequada, a menos que considere inadequado ou desnecessário fazê-lo.

artigo 25ºdever de revelação

1 - As partes devem revelar prontamen-te qualquer alteração significativa das circunstâncias com fundamento nas quais a providência cautelar foi solici-tada ou decretada.2 - A parte que requeira uma ordem preliminar deve revelar ao tribunal arbi-tral todas as circunstâncias que possam ser relevantes para a decisão sobre a sua emissão ou manutenção e tal de-ver continua em vigor até que a parte contra a qual haja sido dirigida tenha tido oportunidade de apresentar a sua posição, após o que se aplica o disposto no nº 1 do presente artigo.

artigo 26ºresponsabilidade do

requerenteA parte que solicite o decretamento de uma providência cautelar ou requeira a emissão de uma ordem preliminar é responsável por quaisquer custos ou prejuízos causados à outra parte por tal providência ou ordem, caso o tribunal ar-bitral venha mais tarde a decidir que, nas circunstâncias anteriormente existentes, a providência ou a ordem preliminar não deveria ter sido decretada ou ordenada. O tribunal arbitral pode, neste último caso, condenar a parte requerente no pagamento da correspondente indemni-zação em qualquer estado do processo.

SeCÇÃo iVreconhecimento ou execução

coerciva de providências cautelares

artigo 27ºreconhecimento ou execução

coerciva1 - Uma providência cautelar decretada

por um tribunal arbitral é obrigatória para as partes e, a menos que o tribunal arbitral tenha decidido de outro modo, pode ser coercivamente executada mediante pedido dirigido ao tribunal estadual competente, independente-mente de a arbitragem em que aquela foi decretada ter lugar no estrangeiro, sem prejuízo do disposto no artigo 28º.2 - A parte que peça ou já tenha obtido o reconhecimento ou a execução coer-civa de uma providência cautelar deve informar prontamente o tribunal esta-dual da eventual revogação, suspensão ou modificação dessa providência pelo tribunal arbitral que a haja decretado.3 - O tribunal estadual ao qual for pe-dido o reconhecimento ou a execução coerciva da providência pode, se o con-siderar conveniente, ordenar à parte re-querente que preste caução adequada, se o tribunal arbitral não tiver já tomado uma decisão sobre essa matéria ou se tal decisão for necessária para proteger os interesses de terceiros.4 - A sentença do tribunal arbitral que decidir sobre uma ordem preliminar ou providência cautelar e a sentença do tribunal estadual que decidir sobre o reconhecimento ou execução coerciva de uma providência cautelar de um tribunal arbitral não são susceptíveis de recurso.

artigo 28ºFundamentos de recusa

do reconhecimento ou da execução coerciva

1 - O reconhecimento ou a execução coerciva de uma providência cautelar só podem ser recusados por um tribunal estadual:a) A pedido da parte contra a qual a

providência seja invocada, se este tribunal considerar que:i) Tal recusa é justificada com funda-

mento nos motivos previstos nas subalíneas i), ii), iii) ou iv) da alínea a) do nº 1 do artigo 56º; ou

ii) A decisão do tribunal arbitral respeitante à prestação de caução relacionada com a providência cau-telar decretada não foi cumprida; ou

deStaqueVIDA JUDICIÁRIA - março 201210

iii) A providência cautelar foi revoga-da ou suspensa pelo tribunal arbi-tral ou, se para isso for competente, por um tribunal estadual do país estrangeiro em que arbitragem tem lugar ou ao abrigo de cuja lei a pro-vidência tiver sido decretada; ou

b) Se o tribunal estadual considerar que:i) A providência cautelar é incom-

patível com os poderes conferidos ao tribunal estadual pela lei que o rege, salvo se este decidir refor-mular a providência cautelar na medida necessária para a adaptar à sua própria competência e regi-me processual, em ordem a fazer executar coercivamente a provi-dência cautelar, sem alterar a sua essência; ou

ii) Alguns dos fundamentos de re-cusa de reconhecimento previstos nas subalíneas i) ou ii) da alínea b) do nº 1 do artigo 56º se verificam relativamente ao reconhecimento ou à execução coerciva da provi-dência cautelar.

2 - Qualquer decisão tomada pelo tribunal estadual ao abrigo do nº 1 do presente artigo tem eficácia restrita ao pedido de reconhecimento ou de execução coerciva de providência cau-telar decretada pelo tribunal arbitral. O tribunal estadual ao qual seja pedido o reconhecimento ou a execução de providência cautelar, ao pronunciar-se sobre esse pedido, não deve fazer uma revisão do mérito da providência cautelar.

artigo 29ºProvidências cautelares

decretadas por um tribunal estadual

1 - Os tribunais estaduais têm poder para decretar providências cautelares na dependência de processos arbitrais, independentemente do lugar em que estes decorram, nos mesmos termos em que o podem fazer relativamente aos processos que corram perante os tribunais estaduais.2 - Os tribunais estaduais devem exercer esse poder de acordo com o regime

processual que lhes é aplicável, tendo em consideração, se for o caso, as ca-racterísticas específicas da arbitragem internacional.

CaPÍtulo Vda condução do processo

arbitral

artigo 30ºPrincípios e regras do processo

arbitral1 - O processo arbitral deve sempre respeitar os seguintes princípios fun-damentais:a) O demandado é citado para se de-

fender;b) As partes são tratadas com igualdade

e deve ser-lhes dada uma oportunida-de razoável de fazerem valer os seus direitos, por escrito ou oralmente, antes de ser proferida a sentença final;

c) Em todas as fases do processo é garantida a observância do princípio do contraditório, salvas as excepções previstas na presente lei.

2 - As partes podem, até à aceitação do primeiro árbitro, acordar sobre as regras do processo a observar na arbi-tragem, com respeito pelos princípios fundamentais consignados no número anterior do presente artigo e pelas demais normas imperativas constantes desta lei.3 - Não existindo tal acordo das partes e na falta de disposições aplicáveis na presente lei, o tribunal arbitral pode conduzir a arbitragem do modo que considerar apropriado, definindo as regras processuais que entender ade-quadas, devendo, se for esse o caso, ex-plicitar que considera subsidiariamente aplicável o disposto na lei que rege o processo perante o tribunal estadual competente.4 - Os poderes conferidos ao tribunal arbitral compreendem o de determinar a admissibilidade, pertinência e valor de qualquer prova produzida ou a produzir.5 - Os árbitros, as partes e, se for o caso, as entidades que promovam, com ca-rácter institucionalizado, a realização de arbitragens voluntárias, têm o dever

de guardar sigilo sobre todas as infor-mações que obtenham e documentos de que tomem conhecimento através do processo arbitral, sem prejuízo do direito de as partes tornarem públicos os actos processuais necessários à defesa dos seus direitos e do dever de comunicação ou revelação de actos do processo às autoridades competentes, que seja imposto por lei.6 - O disposto no número anterior não impede a publicação de sentenças e outras decisões do tribunal arbitral, ex-purgadas de elementos de identificação das partes, salvo se qualquer destas a isso se opuser.

artigo 31ºlugar da arbitragem

1 - As partes podem livremente fixar o lugar da arbitragem. Na falta de acordo das partes, este lugar é fixado pelo tribunal arbitral, tendo em conta as circunstâncias do caso, incluindo a conveniência das partes.2 - Não obstante o disposto no nº 1 do presente artigo, o tribunal arbitral pode, salvo convenção das partes em contrário, reunir em qualquer local que julgue apropriado para se realizar uma ou mais audiências, permitir a realização de qualquer diligência probatória ou tomar quaisquer deliberações.

artigo 32ºlíngua do processo

1 - As partes podem, por acordo, esco-lher livremente a língua ou línguas a uti-lizar no processo arbitral. Na falta desse acordo, o tribunal arbitral determina a língua ou línguas a utilizar no processo.2 - O tribunal arbitral pode ordenar que qualquer documento seja acompa-nhado de uma tradução na língua ou línguas convencionadas pelas partes ou escolhidas pelo tribunal arbitral.

artigo 33ºinício do processo; petição e

contestação1 - Salvo convenção das partes em contrário, o processo arbitral relativo a determinado litígio tem início na data

deStaque VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 11

em que o pedido de submissão desse litígio a arbitragem é recebido pelo demandado.2 - Nos prazos convencionados pelas partes ou fixados pelo tribunal arbitral, o demandante apresenta a sua petição, em que enuncia o seu pedido e os factos em que este se baseia, e o demandado apresenta a sua contestação, em que explana a sua defesa relativamente àqueles, salvo se tiver sido outra a con-venção das partes quanto aos elemen-tos a figurar naquelas peças escritas. As partes podem fazer acompanhar as referidas peças escritas de quaisquer documentos que julguem pertinentes e mencionar nelas documentos ou outros meios de prova que venham a apresentar.3 - Salvo convenção das partes em contrário, qualquer delas pode, no decurso do processo arbitral, modificar ou completar a sua petição ou a sua contestação, a menos que o tribunal arbitral entenda não dever admitir tal alteração em razão do atraso com que é formulada, sem que para este haja justificação bastante.4 - O demandado pode deduzir re-convenção, desde que o seu objecto seja abrangido pela convenção de arbitragem.

artigo 34ºaudiências e processo escrito

1 - Salvo convenção das partes em contrário, o tribunal decide se serão realizadas audiências para a produção de prova ou se o processo é apenas conduzido com base em documentos e outros elementos de prova. O tribu-nal deve, porém, realizar uma ou mais audiências para a produção de prova sempre que uma das partes o requeira, a menos que as partes hajam previa-mente prescindido delas.2 - As partes devem ser notificadas, com antecedência suficiente, de quaisquer audiências e de outras reuniões convo-cadas pelo tribunal arbitral para fins de produção de prova.3 - Todas as peças escritas, documentos ou informações que uma das partes

forneça ao tribunal arbitral devem ser comunicadas à outra parte. Deve igualmente ser comunicado às partes qualquer relatório pericial ou elemento de prova documental que possa servir de base à decisão do tribunal.

artigo 35ºomissões e faltas de qualquer

das partes1 - Se o demandante não apresentar a sua petição em conformidade com o nº 2 do artigo 33º, o tribunal arbitral põe termo ao processo arbitral.2 - Se o demandado não apresentar a sua contestação, em conformidade com o nº 2 do artigo 33º, o tribunal arbitral prossegue o processo arbitral, sem considerar esta omissão, em si mesma, como uma aceitação das alegações do demandante.3 - Se uma das partes deixar de compa-recer a uma audiência ou de produzir prova documental no prazo fixado, o tribunal arbitral pode prosseguir o processo e proferir sentença com base na prova apresentada.4 - O tribunal arbitral pode, porém, caso considere a omissão justificada, permitir a uma parte a prática do acto omitido.5 - O disposto nos números anteriores deste artigo entende-se sem prejuízo do que as partes possam ter acorda-do sobre as consequências das suas omissões.

artigo 36ºintervenção de terceiros

1 - Só podem ser admitidos a intervir num processo arbitral em curso ter-ceiros vinculados pela convenção de arbitragem em que aquele se baseia, quer o estejam desde a respectiva conclusão, quer tenham aderido a ela subsequentemente. Esta adesão carece do consentimento de todas as partes na convenção de arbitragem e pode ser feita só para os efeitos da arbitragem em causa.2 - Encontrando-se o tribunal arbitral constituído, só pode ser admitida ou provocada a intervenção de terceiro que declare aceitar a composição actual

do tribunal; em caso de intervenção espontânea, presume-se essa aceitação.3 - A admissão da intervenção depende sempre de decisão do tribunal arbitral, após ouvir as partes iniciais na arbitra-gem e o terceiro em causa. O tribunal arbitral só deve admitir a intervenção se esta não perturbar indevidamente o normal andamento do processo arbitral e se houver razões de relevo que a justi-fiquem, considerando-se como tais, em particular, aquelas situações em que, não havendo manifesta inviabilidade do pedido:a) O terceiro tenha em relação ao objec-

to da causa um interesse igual ao do demandante ou do demandado, que inicialmente permitisse o litisconsór-cio voluntário ou impusesse o litis-consórcio necessário entre uma das partes na arbitragem e o terceiro; ou

b) O terceiro queira formular, contra o demandado, um pedido com o mes-mo objecto que o do demandante, mas incompatível com o deste; ou

c) O demandado, contra quem seja invocado crédito que possa, prima facie, ser caracterizado como solidá-rio, pretenda que os demais possíveis credores solidários fiquem vinculados pela decisão final proferida na arbi-tragem; ou

d) O demandado pretenda que sejam chamados terceiros, contra os quais o demandado possa ter direito de regresso em consequência da proce-dência, total ou parcial, de pedido do demandante.

4 - O que ficou estabelecido nos nú-meros anteriores para demandante e demandado vale, com as necessárias adaptações, respectivamente para de-mandado e demandante, se estiver em causa reconvenção.5 - Admitida a intervenção, aplica-se, com as necessárias adaptações, o dis-posto no artigo 33º6 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a intervenção de terceiros an-teriormente à constituição do tribunal arbitral só pode ter lugar em arbitra-gem institucionalizada e desde que o regulamento de arbitragem aplicável

deStaqueVIDA JUDICIÁRIA - março 201212

assegure a observância do princípio da igualdade de participação de todas as partes, incluindo os membros de partes plurais, na escolha dos árbitros.7 - A convenção de arbitragem pode regular a intervenção de terceiros em arbitragens em curso de modo dife-rente do estabelecido nos números anteriores, quer directamente, com observância do princípio da igualdade de participação de todas as partes na escolha dos árbitros, quer mediante remissão para um regulamento de ar-bitragem institucionalizada que admita essa intervenção.

artigo 37ºPerito nomeado pelo tribunal

arbitral1 - Salvo convenção das partes em contrário, o tribunal arbitral, por sua iniciativa ou a pedido das partes, pode nomear um ou mais peritos para ela-borarem um relatório, escrito ou oral, sobre pontos específicos a determinar pelo tribunal arbitral.2 - No caso previsto no número anterior, o tribunal arbitral pode pedir a qual-quer das partes que forneça ao perito qualquer informação relevante ou que apresente ou faculte acesso a quais-quer documentos ou outros objectos relevantes para serem inspeccionados.3 - Salvo convenção das partes em contrário, se uma destas o solicitar ou se o tribunal arbitral o julgar necessário, o perito, após a apresentação do seu relatório, participa numa audiência em que o tribunal arbitral e as partes têm a oportunidade de o interrogar.4 - O preceituado no artigo 13º e nos nos 2 e 3 do artigo 14º, aplica-se, com as necessárias adaptações, aos peritos designados pelo tribunal arbitral.

artigo 38ºSolicitação aos tribunais

estaduais na obtenção de provas

1 - Quando a prova a produzir dependa da vontade de uma das partes ou de terceiros e estes recusem a sua colabo-ração, uma parte, com a prévia autori-

zação do tribunal arbitral, pode solicitar ao tribunal estadual competente que a prova seja produzida perante ele, sendo os seus resultados remetidos ao tribunal arbitral.2 - O disposto no número anterior é aplicável às solicitações de produção de prova que sejam dirigidas a um tri-bunal estadual português, no âmbito de arbitragens localizadas no estrangeiro.

CaPÍtulo Vida sentença arbitral e

encerramento do processo

artigo 39ºdireito aplicável, recurso à

equidade; irrecorribilidade da decisão

1 - Os árbitros julgam segundo o direi-to constituído, a menos que as partes determinem, por acordo, que julguem segundo a equidade.2 - Se o acordo das partes quanto ao julgamento segundo a equidade for posterior à aceitação do primeiro árbi-tro, a sua eficácia depende de aceitação por parte do tribunal arbitral.3 - No caso de as partes lhe terem confiado essa missão, o tribunal pode decidir o litígio por apelo à composição das partes na base do equilíbrio dos interesses em jogo.4 - A sentença que se pronuncie sobre o fundo da causa ou que, sem conhecer deste, ponha termo ao processo arbitral, só é susceptível de recurso para o tribu-nal estadual competente no caso de as partes terem expressamente previsto tal possibilidade na convenção de ar-bitragem e desde que a causa não haja sido decidida segundo a equidade ou mediante composição amigável.

artigo 40ºdecisão tomada por vários

árbitros1 - Num processo arbitral com mais de um árbitro, qualquer decisão do tribu-nal arbitral é tomada pela maioria dos seus membros. Se não puder formar-se maioria, a sentença é proferida pelo presidente do tribunal.

2 - Se um árbitro se recusar a tomar parte na votação da decisão, os outros árbitros podem proferir sentença sem ele, a menos que as partes tenham convencionado de modo diferente. As partes são subsequentemente infor-madas da recusa de participação desse árbitro na votação.3 - As questões respeitantes à ordena-ção, à tramitação ou ao impulso proces-sual poderão ser decididas apenas pelo árbitro presidente, se as partes ou os outros membros do tribunal arbitral lhe tiverem dado autorização para o efeito.

artigo 41ºtransacção

1 - Se, no decurso do processo arbitral, as partes terminarem o litígio median-te transacção, o tribunal arbitral deve pôr fim ao processo e, se as partes lho solicitarem, dá a tal transacção a for-ma de sentença proferida nos termos acordados pelas partes, a menos que o conteúdo de tal transacção infrinja algum princípio de ordem pública.2 - Uma sentença proferida nos termos acordados pelas partes deve ser elabo-rada em conformidade com o disposto no artigo 42º e mencionar o facto de ter a natureza de sentença, tendo os mesmos efeitos que qualquer outra sen-tença proferida sobre o fundo da causa.

artigo 42ºForma, conteúdo e eficácia da

sentença1 - A sentença deve ser reduzida a escrito e assinada pelo árbitro ou árbitros. Em processo arbitral com mais de um árbitro, são suficientes as assinaturas da maioria dos membros do tribunal arbitral ou só a do presidente, caso por este deva ser proferida a sentença, desde que seja mencionada na sentença a razão da omissão das restantes assinaturas.2 - Salvo convenção das partes em con-trário, os árbitros podem decidir o fundo da causa através de uma única sentença ou de tantas sentenças parciais quantas entendam necessárias.3 - A sentença deve ser fundamentada, salvo se as partes tiverem dispensado

deStaque VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 13

tal exigência ou se trate de sentença proferida com base em acordo das partes, nos termos do artigo 41º.4 - A sentença deve mencionar a data em que foi proferida, bem como o lugar da arbitragem, determinado em conformidade com o nº 1 do artigo 31º, considerando-se, para todos os efeitos, que a sentença foi proferida nesse lugar.5 - A menos que as partes hajam convencionado de outro modo, da sentença deve constar a repartição pelas partes dos encargos directamente resultantes do processo arbitral. Os árbi-tros podem ainda decidir na sentença, se o entenderem justo e adequado, que uma ou algumas das partes compense a outra ou outras pela totalidade ou parte dos custos e despesas razoáveis que demonstrem ter suportado por causa da sua intervenção na arbitragem.6 - Proferida a sentença, a mesma é imediatamente notificada através do envio a cada uma das partes de um exemplar assinado pelo árbitro ou ár-bitros, nos termos do disposto nº 1 do presente artigo, produzindo efeitos na data dessa notificação, sem prejuízo do disposto no nº 7.7 - A sentença arbitral de que não caiba recurso e que já não seja susceptível de alteração no termos do artigo 45º tem o mesmo carácter obrigatório entre as partes que a sentença de um tribunal estadual transitada em julgado e a mesma força executiva que a sentença de um tribunal estadual.

artigo 43ºPrazo para proferir sentença

1 - Salvo se as partes, até à aceitação do primeiro árbitro, tiverem acordado prazo diferente, os árbitros devem notificar às partes a sentença final proferida sobre o litígio que por elas lhes foi submetido dentro do prazo de 12 meses a contar da data de aceitação do último árbitro.2 - Os prazos definidos de acordo com o nº 1 podem ser livremente prorrogados por acordo das partes ou, em alternativa, por decisão do tribunal arbitral, por uma ou mais vezes, por sucessivos períodos de 12 meses, devendo tais prorrogações

ser devidamente fundamentadas. Fica, porém, ressalvada a possibilidade de as partes, de comum acordo, se oporem à prorrogação.3 - A falta de notificação da sentença final dentro do prazo máximo determinado de acordo com os números anteriores do presente artigo, põe automaticamente termo ao processo arbitral, fazendo também extinguir a competência dos árbitros para julgarem o litígio que lhes fora submetido, sem prejuízo de a con-venção de arbitragem manter a sua eficá-cia, nomeadamente para efeito de com base nela ser constituído novo tribunal arbitral e ter início nova arbitragem.4 - Os árbitros que injustificadamente obstarem a que a decisão seja proferida dentro do prazo fixado respondem pelos danos causados.

artigo 44ºencerramento do processo

1 - O processo arbitral termina quando for proferida a sentença final ou quando for ordenado o encerramento do proces-so pelo tribunal arbitral, nos termos do nº 2 do presente artigo.2 - O tribunal arbitral ordena o encer-ramento do processo arbitral quando:a) O demandante desista do seu pedido,

a menos que o demandado a tal se oponha e o tribunal arbitral reconheça que este tem um interesse legítimo em que o litígio seja definitivamente resolvido;

b) As partes concordem em encerrar o processo;

c) O tribunal arbitral verifique que a prossecução do processo se tornou, por qualquer outra razão, inútil ou impossível.

3 - As funções do tribunal arbitral cessam com o encerramento do processo arbi-tral, sem prejuízo do disposto no artigo 45º e no nº 8 do artigo 46º4 - Salvo se as partes tiverem acordado de modo diferente, o presidente do tri-bunal arbitral deve conservar o original do processo arbitral durante um prazo mínimo de dois anos e o original da sen-tença arbitral durante um prazo mínimo de cinco anos.

artigo 45ºrectificação e esclarecimento

da sentença; sentença adicional1 - A menos que as partes tenham convencionado outro prazo para este efeito, nos 30 dias seguintes à recepção da notificação da sentença arbitral, qualquer das partes pode, notificando disso a outra, requerer ao tribunal ar-bitral, que rectifique, no texto daquela, qualquer erro de cálculo, erro material ou tipográfico ou qualquer erro de natureza idêntica.2 - No prazo referido no número anterior, qualquer das partes pode, notificando disso a outra, requerer ao tribunal arbitral que esclareça alguma obscuridade ou ambiguidade da sentença ou dos seus fundamentos.3 - Se o tribunal arbitral considerar o re-querimento justificado, faz a rectificação ou o esclarecimento nos 30 dias seguin-tes à recepção daquele. O esclarecimen-to faz parte integrante da sentença.4 - O tribunal arbitral pode também, por sua iniciativa, nos 30 dias seguintes à data da notificação da sentença, rectifi-car qualquer erro do tipo referido no nº 1 do presente artigo.5 - Salvo convenção das partes em contrário, qualquer das partes pode, notificando disso a outra, requerer ao tribunal arbitral, nos 30 dias seguintes à data em que recebeu a notificação da sentença, que profira uma sentença adicional sobre partes do pedido ou dos pedidos apresentados no decurso do processo arbitral, que não hajam sido decididas na sentença. Se julgar justificado tal requerimento, o tribunal profere a sentença adicional nos 60 dias seguintes à sua apresentação.6 - O tribunal arbitral pode prolongar, se necessário, o prazo de que dispõe para rectificar, esclarecer ou completar a sentença, nos termos dos nos 1, 2 ou 5 do presente artigo, sem prejuízo da observância do prazo máximo fixado de acordo com o artigo 43º.7 - O disposto no artigo 42º aplica-se à rectificação e ao esclarecimento da sentença bem como à sentença adicional.

deStaqueVIDA JUDICIÁRIA - março 201214

CaPÍtulo Viida impugnação da sentença

arbitral

artigo 46ºPedido de anulação

1 - Salvo se as partes tiverem acordado em sentido diferente, ao abrigo do nº 4 do artigo 39º, a impugnação de uma sentença arbitral perante um tribunal es-tadual só pode revestir a forma de pedido de anulação, nos termos do disposto no presente artigo.2 - O pedido de anulação da sentença arbitral, que deve ser acompanhado de uma cópia certificada da mesma e, se estiver redigida em língua estrangeira, de uma tradução para português, é apre-sentado no tribunal estadual competente, observando-se as seguintes regras, sem prejuízo do disposto nos demais números do presente artigo:a) A prova é oferecida com o requeri-

mento;b) É citada a parte requerida para se opor

ao pedido e oferecer prova;c) É admitido um articulado de resposta

do requerente às eventuais excepções;d) É em seguida produzida a prova a que

houver lugar;e) Segue-se a tramitação do recurso de

apelação, com as necessárias adap-tações;

f) A acção de anulação entra, para efeitos de distribuição, na 5ª espécie.

3 - A sentença arbitral só pode ser anulada pelo tribunal estadual competente se:a) A parte que faz o pedido demonstrar

que:i) Uma das partes da convenção de ar-

bitragem estava afectada por uma in-capacidade; ou que essa convenção não é válida nos termos da lei a que as partes a sujeitaram ou, na falta de qualquer indicação a este respeito, nos termos da presente lei; ou

ii) Houve no processo violação de alguns dos princípios fundamentais referidos no nº 1 do artigo 30º com influência decisiva na resolução do litígio; ou

iii) A sentença se pronunciou sobre um litígio não abrangido pela convenção

de arbitragem ou contém decisões que ultrapassam o âmbito desta; ou

iv) A composição do tribunal arbitral ou o processo arbitral não foram con-formes com a convenção das partes, a menos que esta convenção contra-rie uma disposição da presente lei que as partes não possam derrogar ou, na falta de uma tal convenção, que não foram conformes com a presente lei e, em qualquer dos ca-sos, que essa desconformidade teve influência decisiva na resolução do litígio; ou

v) O tribunal arbitral condenou em quantidade superior ou em objec-to diverso do pedido, conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento ou deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar; ou

vi) A sentença foi proferida com viola-ção dos requisitos estabelecidos nos nos 1 e 3 do artigo 42º; ou

vii) A sentença foi notificada às partes depois de decorrido o prazo máximo para o efeito fixado de acordo com ao artigo 43º ; ou

b) O tribunal verificar que:i) O objecto do litígio não é susceptível

de ser decidido por arbitragem nos termos do direito português;

ii) O conteúdo da sentença ofende os princípios da ordem pública interna-cional do Estado português.

4 - Se uma parte, sabendo que não foi respeitada uma das disposições da pre-sente lei que as partes podem derrogar ou uma qualquer condição enunciada na convenção de arbitragem, prosseguir apesar disso a arbitragem sem deduzir oposição de imediato ou, se houver prazo para este efeito, nesse prazo, considera-se que renunciou ao direito de impugnar, com tal fundamento, a sentença arbitral.5 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, o direito de requerer a anulação da sentença arbitral é irrenunciável.6 - O pedido de anulação só pode ser apresentado no prazo de 60 dias a contar da data em que a parte que pretenda essa anulação recebeu a notificação da senten-ça ou, se tiver sido feito um requerimento

no termos do artigo 45º, a partir da data em que o tribunal arbitral tomou uma decisão sobre esse requerimento.7 - Se a parte da sentença relativamente à qual se verifique existir qualquer dos fundamentos de anulação referidos no nº 3 do presente artigo puder ser disso-ciada do resto da mesma, é unicamente anulada a parte da sentença atingida por esse fundamento de anulação.8 - Quando lhe for pedido que anule uma sentença arbitral, o tribunal estadual com-petente pode, se o considerar adequado e a pedido de uma das partes, suspender o processo de anulação durante o período de tempo que determinar, em ordem a dar ao tribunal arbitral a possibilidade de retomar o processo arbitral ou de tomar qualquer outra medida que o tribunal arbitral julgue susceptível de eliminar os fundamentos da anulação.9 - O tribunal estadual que anule a senten-ça arbitral não pode conhecer do mérito da questão ou questões por aquela deci-didas, devendo tais questões, se alguma das partes o pretender, ser submetidas a outro tribunal arbitral para serem por este decididas.10 - Salvo se as partes tiverem acordado de modo diferente, com a anulação da sentença a convenção de arbitragem volta a produzir efeitos relativamente ao objecto do litígio.

CaPÍtulo Viiida execução da sentença

arbitral

artigo 47ºexecução da sentença arbitral

1 - A parte que pedir a execução da sen-tença ao tribunal estadual competente deve fornecer o original daquela ou uma cópia certificada conforme e, se a mesma não estiver redigida em língua portugue-sa, uma tradução certificada nesta língua.2 - No caso de o tribunal arbitral ter pro-ferido sentença de condenação genérica, a sua liquidação faz-se nos termos do nº 4 do artigo 805º do Código de Processo Civil, podendo no entanto ser requerida a liquidação ao tribunal arbitral nos ter-mos do nº 5 do artigo 45º, caso em que

deStaque VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 15

o tribunal arbitral, ouvida a outra parte, e produzida prova, profere decisão comple-mentar, julgando equitativamente dentro dos limites que tiver por provados.3 - A sentença arbitral pode servir de base à execução ainda que haja sido im-pugnada mediante pedido de anulação apresentado de acordo com o artigo 46º, mas o impugnante pode requerer que tal impugnação tenha efeito suspensivo da execução desde que se ofereça para prestar caução, ficando a atribuição desse efeito condicionada à efectiva prestação de caução no prazo fixado pelo tribunal. Aplica-se neste caso o disposto no nº 3 do artigo 818º do Código de Processo Civil.4 - Para efeito do disposto no número anterior, aplica-se com as necessárias adaptações o disposto nos artigos 692º-A e 693º-A do Código de Processo Civil.

artigo 48ºFundamentos de oposição à

execução1 - À execução de sentença arbitral pode o executado opor-se com qualquer dos fundamentos de anulação da sentença previstos no nº 3 do artigo 46º, desde que, na data em que a oposição for deduzida, um pedido de anulação da sentença arbitral apresentado com esse mesmo fundamento não tenha já sido rejeitado por sentença transitada em julgado.2 - Não pode ser invocado pelo executado na oposição à execução de sentença arbi-tral nenhum dos fundamentos previstos na alínea a) do nº 3 do artigo 46º, se já tiver decorrido o prazo fixado no nº 6 do mesmo artigo para a apresentação do pedido de anulação da sentença, sem que nenhuma das partes haja pedido tal anulação.3 - Não obstante ter decorrido o prazo previsto no nº 6 do artigo 46º, o juiz pode conhecer oficiosamente, nos termos do disposto do artigo 820º do Código de Processo Civil, da causa de anulação prevista na alínea b) do nº 3 do artigo 46º da presente lei, devendo, se verificar que a sentença exequenda é inválida por essa causa, rejeitar a execução com tal fundamento.

4 - O disposto no nº 2 do presente artigo não prejudica a possibilidade de serem deduzidos, na oposição à execução de sentença arbitral, quaisquer dos demais fundamentos previstos para esse efeito na lei de processo aplicável, nos termos e prazos aí previstos.

CaPÍtulo iXda arbitragem internacional

artigo 49ºConceito e regime da

arbitragem internacional1 - Entende-se por arbitragem interna-cional a que põe em jogo interesses do comércio internacional.2 - Salvo o disposto no presente capítulo, são aplicáveis à arbitragem internacional, com as devidas adaptações, as disposi-ções da presente lei relativas à arbitragem interna.

artigo 50ºinoponibilidade de excepções baseadas no direito interno de

uma parteQuando a arbitragem seja internacional e uma das partes na convenção de arbi-tragem seja um Estado, uma organização controlada por um Estado ou uma socie-dade por este dominada, essa parte não pode invocar o seu direito interno para contestar a arbitrabilidade do litígio ou a sua capacidade para ser parte na arbitra-gem, nem para de qualquer outro modo se subtrair às suas obrigações decorrentes daquela convenção.

artigo 51ºValidade substancial da

convenção de arbitragem1 - Tratando-se de arbitragem interna-cional, entende-se que a convenção de arbitragem é válida quanto à substância e que o litígio a que ele respeita é suscep-tível de ser submetido a arbitragem se se cumprirem os requisitos estabelecidos a tal respeito ou pelo direito escolhido pelas partes para reger a convenção de arbitragem ou pelo direito aplicável ao fundo da causa ou pelo direito portu-guês.

2 - O tribunal estadual ao qual haja sido pedida a anulação de uma sentença proferida em arbitragem internacional localizada em Portugal, com o fundamen-to previsto na alínea b) do nº 3 do artigo 46º, da presente lei, deve ter em conside-ração o disposto no número anterior do presente artigo.

artigo 52ºregras de direito aplicáveis ao

fundo da causa1 - As partes podem designar as regras de direito a aplicar pelos árbitros, se os não tiverem autorizado a julgar segundo a equidade. Qualquer designação da lei ou do sistema jurídico de determinado Estado é considerada, salvo estipulação expressa em contrário, como designando directamente o direito material deste Estado e não as suas normas de conflitos de leis.2 - Na falta de designação pelas partes, o tribunal arbitral aplica o direito do Estado com o qual o objecto do litígio apresente uma conexão mais estreita.3 - Em ambos os casos referidos nos nú-meros anteriores, o tribunal arbitral deve tomar em consideração as estipulações contratuais das partes e os usos comer-ciais relevantes.

artigo 53ºirrecorribilidade da sentença

Tratando-se de arbitragem internacional, a sentença do tribunal arbitral é irre-corrível, a menos que as partes tenham expressamente acordado a possibilidade de recurso para outro tribunal arbitral e regulado os seus termos.

artigo 54ºordem pública internacional

A sentença proferida em Portugal, numa arbitragem internacional em que haja sido aplicado direito não português ao fundo da causa pode ser anulada com os fundamentos previstos no artigo 46º e ainda, caso deva ser executada ou pro-duzir outros efeitos em território nacional, se tal conduzir a um resultado manifesta-mente incompatível com os princípios da ordem pública internacional.

deStaqueVIDA JUDICIÁRIA - março 201216

CaPÍtulo Xdo reconhecimento e execução

de sentenças arbitrais estrangeiras

artigo 55ºNecessidade do reconhecimentoSem prejuízo do que é imperativamente preceituado pela Convenção de Nova Iorque de 1958, sobre o reconhecimento e a execução de sentenças arbitrais es-trangeiras, bem como por outros tratados ou convenções que vinculem o Estado português, as sentenças proferidas em arbitragens localizadas no estrangeiro só têm eficácia em Portugal, seja qual for a nacionalidade das partes, se forem reconhecidas pelo tribunal estadual português competente, nos termos do disposto no presente capítulo desta lei.

artigo 56ºFundamentos de recusa do reconhecimento e execução

1 - O reconhecimento e a execução de uma sentença arbitral proferida numa arbitragem localizada no estrangeiro só podem ser recusados:a) A pedido da parte contra a qual a

sentença for invocada, se essa parte fornecer ao tribunal competente ao qual é pedido o reconhecimento ou a execução a prova de que:i) Uma das partes da convenção de

arbitragem estava afectada por uma incapacidade, ou essa convenção não é válida nos termos da lei a que as partes a sujeitaram ou, na falta de indicação a este respeito, nos termos da lei do país em que a sentença foi proferida; ou

ii) A parte contra a qual a sentença é invocada não foi devidamente informada da designação de um árbitro ou do processo arbitral, ou que, por outro motivo, não lhe foi dada oportunidade de fazer valer os seus direitos; ou

iii) A sentença se pronuncia sobre um litígio não abrangido pela convenção de arbitragem ou contém decisões que ultrapassam os termos desta; contudo, se as disposições da senten-

ça relativas a questões submetidas à arbitragem puderem ser dissociadas das que não tinham sido submetidas à arbitragem, podem reconhecer-se e executar-se unicamente as primei-ras; ou

iv) A constituição do tribunal ou o pro-cesso arbitral não foram conformes à convenção das partes ou, na falta de tal convenção, à lei do país onde a arbitragem teve lugar; ou

v) A sentença ainda não se tornou obri-gatória para as partes ou foi anulada ou suspensa por um tribunal do país no qual, ou ao abrigo da lei do qual, a sentença foi proferida; ou

b) Se o tribunal verificar que:i) O objecto do litígio não é sus-

ceptível de ser decidido mediante arbitragem, de acordo com o direito português; ou

ii) O reconhecimento ou a execução da sentença conduz a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública internacional do Estado português.

2 - Se um pedido de anulação ou de sus-pensão de uma sentença tiver sido apre-sentado num tribunal do país referido na subalínea v) da alínea a) do nº 1 do presen-te artigo, o tribunal estadual português ao qual foi pedido o seu reconhecimento e execução pode, se o julgar apropriado, suspender a instância, podendo ainda, a requerimento da parte que pediu esse reconhecimento e execução, ordenar à outra parte que preste caução adequada.

artigo 57ºtrâmites do processo de

reconhecimento1 - A parte que pretenda o reconheci-mento de sentença arbitral estrangeira, nomeadamente para que esta venha a ser executada em Portugal, deve forne-cer o original da sentença devidamente autenticado ou uma cópia devidamente certificada da mesma, bem como o original da convenção de arbitragem ou uma cópia devidamente autenticada da mesma. Se a sentença ou a convenção não estiverem redigidas em português, a parte requerente fornece uma tradução

devidamente certificada nesta língua.2 - Apresentada a petição de reconheci-mento, acompanhada dos documentos referidos no número anterior, é a parte contrária citada para, dentro de 15 dias, deduzir a sua oposição.3 - Findos os articulados e realizadas as diligências que o relator tenha por indispensáveis, é facultado o exame do processo, para alegações, às partes e ao Ministério Público, pelo prazo de 15 dias.4 - O julgamento faz-se segundo as regras próprias da apelação.

artigo 58ºSentenças estrangeiras sobre

litígios de direito administrativoNo reconhecimento da sentença arbitral proferida em arbitragem localizada no es-trangeiro e relativa a litígio que, segundo o direito português, esteja compreendi-do na esfera de jurisdição dos tribunais administrativos, deve observar-se, com as necessárias adaptações ao regime processual específico destes tribunais, o disposto nos artigos 56º, 57º e no nº 2 do artigo 59º da presente lei.

CaPÍtulo Xidos tribunais estaduais

competentes

artigo 59ºdos tribunais estaduais

competentes1 - Relativamente a litígios compreendi-dos na esfera de jurisdição dos tribunais judiciais, o Tribunal da Relação em cujo distrito se situe o lugar da arbitragem ou, no caso da decisão referida na alínea h) do nº 1 do presente artigo, o domicílio da pessoa contra quem se pretenda fa-zer valer a sentença, é competente para decidir sobre:a) A nomeação de árbitros que não

tenham sido nomeados pelas partes ou por terceiros a que aquelas hajam cometido esse encargo, de acordo com o previsto nos nos 3, 4 e 5 do artigo 10º e no nº 1 do artigo 11º;

b) A recusa que haja sido deduzida, ao abrigo do nº 2 do artigo 14º, contra um árbitro que a não tenha aceitado, no

deStaque VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 17

caso de considerar justificada a recusa;c) A destituição de um árbitro, requerida

ao abrigo do nº 1 do artigo 15º;d) A redução do montante dos honorários

ou despesas fixadas pelos árbitros, ao abrigo do nº 3 do artigo 17º;

e) O recurso da sentença arbitral, quando este tenha sido convencionado ao abrigo do nº 4 do artigo 39º;

f) A impugnação da decisão interlocutória proferida pelo tribunal arbitral sobre a sua própria competência, de acordo com o nº 9 do artigo 18º;

g) A impugnação da sentença final pro-ferida pelo tribunal arbitral, de acordo com o artigo 46º;

h) O reconhecimento de sentença arbitral proferida em arbitragem localizada no estrangeiro.

2 - Relativamente a litígios que, segundo o direito português, estejam compreen-didos na esfera da jurisdição dos tribunais administrativos, a competência para decidir sobre matérias referidas nalguma das alíneas do nº 1 do presente artigo, pertence ao Tribunal Central Administra-tivo em cuja circunscrição se situe o local da arbitragem ou, no caso da decisão referida na alínea h) do nº 1, o domicílio da pessoa contra quem se pretende fazer valer a sentença.3 - A nomeação de árbitros referida na alínea a) do nº 1 do presente artigo cabe, consoante a natureza do litígio, ao presidente do Tribunal da Relação ou ao presidente do tribunal central administra-tivo que for territorialmente competente.4 - Para quaisquer questões ou matérias não abrangidas pelos nos 1, 2 e 3 do pre-sente artigo e relativamente às quais a presente lei confira competência a um tribunal estadual, são competentes o tribunal judicial de 1ª instância ou o tribu-nal administrativo de círculo em cuja cir-cunscrição se situe o local da arbitragem, consoante se trate, respectivamente, de litígios compreendidos na esfera de ju-risdição dos tribunais judiciais ou na dos tribunais administrativos.5 - Relativamente a litígios compreendi-dos na esfera da jurisdição dos tribunais judiciais, é competente para prestar assistência a arbitragens localizadas no

estrangeiro, ao abrigo do artigo 29º e do nº 2 do artigo 38º da presente lei, o tribunal judicial de 1ª instância em cuja circunscrição deva ser decretada a pro-vidência cautelar, segundo as regras de competência territorial contidas no artigo 83º do Código de Processo Civil, ou em que deva ter lugar a produção de prova solicitada ao abrigo do nº 2 do artigo 38º da presente lei.6 - Tratando-se de litígios compreendidos na esfera da jurisdição dos tribunais ad-ministrativos, a assistência a arbitragens localizadas no estrangeiro é prestada pelo tribunal administrativo de círculo territorialmente competente de acordo com o disposto no nº 5 do presente artigo, aplicado com as adaptações necessárias ao regime dos tribunais administrativos.7 - Nos processos conducentes às deci-sões referidas no nº 1 do presente artigo, o tribunal competente deve observar o disposto nos artigos 46º, 56º, 57º, 58º e 60º da presente lei.8 - Salvo quando na presente lei se pre-ceitue que a decisão do tribunal estadual competente é insusceptível de recurso, das decisões proferidas pelos tribunais referidos nos números anteriores deste ar-tigo, de acordo com o que neles se dispõe, cabe recurso para o tribunal ou tribunais hierarquicamente superiores, sempre que tal recurso seja admissível segundo as normas aplicáveis à recorribilidade das decisões em causa.9 - A execução da sentença arbitral proferida em Portugal corre no tribunal estadual de 1ª instância competente, nos termos da lei de processo aplicável.10 - Para a acção tendente a efectivar a responsabilidade civil de um árbitro, são competentes os tribunais judiciais de 1ª instância em cuja circunscrição se situe o domicílio do réu ou do lugar da arbitra-gem, à escolha do autor.11 - Se num processo arbitral o litígio for reconhecido por um tribunal judicial ou administrativo, ou pelo respectivo presi-dente, como da respectiva competência material, para efeitos de aplicação do pre-sente artigo, tal decisão não é, nessa parte, recorrível e deve ser acatada pelos demais tribunais que vierem a ser chamados a

exercer no mesmo processo qualquer das competências aqui previstas.

artigo 60ºProcesso aplicável

1 - Nos casos em que se pretenda que o tribunal estadual competente profira uma decisão ao abrigo de qualquer das alíneas a) a d) do nº 1 do artigo 59º, deve o interessado indicar no seu requerimento os factos que justificam o seu pedido, nele incluindo a informação que considere relevante para o efeito.2 - Recebido o requerimento previsto no número anterior, são notificadas as demais partes na arbitragem e, se for caso disso, o tribunal arbitral para, no prazo de 10 dias, dizerem o que se lhes ofereça sobre o conteúdo do mesmo.3 - Antes de proferir decisão, o tribunal pode, se entender necessário, colher ou solicitar as informações convenientes para a prolação da sua decisão.4 - Os processos previstos nos números anteriores do presente artigo revestem sempre carácter urgente, precedendo os respectivos actos qualquer outro serviço judicial não urgente.

CaPÍtulo Xiidisposições finais

artigo 61ºÂmbito de aplicação no espaço

A presente lei é aplicável a todas as arbi-tragens que tenham lugar em território português, bem como ao reconhecimen-to e à execução em Portugal de sentenças proferidas em arbitragens localizadas no estrangeiro.

artigo 62ºCentros de arbitragem

institucionalizada1 - A criação em Portugal de centros de arbitragem institucionalizada está sujeita a autorização do Ministro da Justiça, nos termos do disposto em legislação especial.2 - Considera-se feita para o presente arti-go a remissão constante do Decreto-Lei nº 425/86, de 27 de Dezembro, para o artigo 38º da Lei nº 31/86, de 29 de Agosto.Aceder ao sítio da I.N.C.M.

eM FoCoVIDA JUDICIÁRIA - março 201218

No passado dia 29 de Março entraram em vigor as recentes alterações introduzidas ao Regulamento das Custas Processuais (RCP), pela Lei n.º 7/2012, de 13.2.

A finalidade desta revisão passa pela imposição de custas e sanções adicio-nais aos devedores não cooperantes nos processos executivos; pela introdução de uma estrutura de custas judiciais ex-traordinárias para litígios prolongados desencadeados pelas partes litigantes sem justificação manifesta; pela padro-nização das custas judiciais; e pela intro-dução de custas judiciais especiais para determinadas categorias de processos e procedimentos com o objetivo de au-mentar as receitas e desincentivar a liti-gância de má-fé.Recordamos, todavia, que o objectivo primordial de tais alterações é a uni-formização das custas, sendo aplicável o mesmo regime de custas a todos os processos pendentes, independente-mente do momento em que os mesmos se iniciaram. De acordo com o regime de aplicação no tempo das normas que sofreram al-terações, a nova versão do diploma é aplicada a todos os processos iniciados após 29.3.2012, sendo que aos penden-tes nessa data (29.3.2012) são aplicáveis as seguintes regras:1 - As alterações só se aplicam aos atos praticados a partir de 29.3.2012, consi-derando-se válidos e eficazes todos os pagamentos e demais atos regularmente efectuados ao abrigo da legislação apli-cável no momento da prática do ato, ainda que a aplicação do Regulamento

das Custas Processuais, na nova versão, determine solução diferente; 2 - Todos os montantes cuja constituição da obrigação de pagamento ocorra após 29.3.2012, nomeadamente os relativos a taxas de justiça, a encargos, a multas ou a outras penalidades, são calculados nos termos previstos na nova versão do Regulamento das Custas Processuais.3 - Nos processos em que as partes se encontravam isentas de custas, ou em que não havia lugar ao pagamento de custas em virtude das características do processo, e a isenção aplicada não en-contre correspondência na nova versão do Regulamento das Custas Processuais, mantém-se em vigor, no respectivo pro-cesso, a isenção de custas.4 - Nos processos em que, de acordo com a nova versão do Regulamento das Cus-tas Processuais, as partes ou o processo passam a estar isentos de custas, a isen-ção aplica-se, não havendo no entanto lugar à restituição do que já tiver sido pago a título de custas.5 - O valor da causa, para efeitos de cus-tas, é sempre fixado de acordo com as regras que vigoravam na data da entra-da do processo.6 - Nos processos em que há lugar ao pa-gamento da segunda prestação da taxa de justiça e o mesmo ainda não se tenha tornado exigível, o montante da presta-ção é fixado nos termos da nova versão do Regulamento das Custas Processuais, ainda que tal determine um montante diverso do da primeira prestação.7 - Nos processos em que o pagamento da taxa de justiça devida por cada uma das partes foi regularmente efetuado num único momento não há lugar ao pa-gamento da segunda prestação da taxa

de justiça ora previsto na nova redação do Regulamento das Custas Processuais.8 - Nos processos em que, em virtude da legislação aplicável, houve lugar à dis-pensa do pagamento prévio da taxa de justiça, essa dispensa mantém-se, sendo o pagamento dos montantes que a parte teria de ter pago caso não estivesse dis-pensada devidos apenas a final, ainda que a nova redação dada ao Regulamen-to das Custas Processuais determinasse solução diferente.9 - Nos processos em que a nova redação do Regulamento das Custas Processuais passa a prever a dispensa do pagamen-to prévio da taxa de justiça, não há lu-gar à sua dispensa, exceto se ainda não tiver sido paga a segunda prestação da taxa de justiça, caso em que a dispensa de pagamento prévio se aplica apenas a esta prestação.10 - Para efeitos de aplicação do Regula-

revisão ao regulamento das Custas Processuais já se encontra em vigor

eM FoCo VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 19

mento das Custas Processuais, na nova redação, aos processos iniciados antes de 20 de Abril de 2009, a taxa de justiça inicial é equiparada à primeira prestação da taxa de justiça e a taxa de justiça sub-sequente é equiparada à segunda pres-tação da taxa de justiça.11 - São aplicáveis a todos os processos pendentes as normas do Regulamento das Custas Processuais, na nova versão, respeitantes às custas de parte, incluindo as relativas aos honorários dos manda-tários, salvo se a respetiva nota discrimi-nativa e justificativa tiver sido remetida à parte responsável em data anterior a 29.3.2012.12 - Todos os pagamentos decorrentes do regime de custas processuais devem ser efetuados pelos meios previstos na nova versão do Regulamento das Cus-tas Processuais.Relembramos, ainda, que o pagamen-to da taxa de justiça volta a ser feito em duas prestações, sendo a primeira paga até ao momento da prática do ato pro-cessual a ela sujeito, e a segunda presta-ção no prazo de 10 dias a contar da noti-ficação da audiência final.Em matéria de pagamento das custas em prestações, prevê-se agora que sempre que o valor a pagar seja igual ou superior a 3 UC (€306 - 1 UC equivale de € 102), o responsável pode requerer, fundamen-tadamente, o pagamento das custas em prestações, agravadas de 5 %, de acordo com as seguintes regras:- O pagamento é feito em até seis presta-

ções mensais sucessivas, não inferiores a 0,5 UC, se o valor total não ultrapas-sar a quantia de 12 UC, quando se tra-te de pessoa singular, ou a quantia de 20 UC, tratando-se de pessoa coletiva;

- O pagamento é feito em até 12 presta-ções mensais sucessivas, não inferiores a 1 UC, quando sejam ultrapassados os valores acima referidos.

A nova versão do RCP prevê condições de dispensa do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça devida.De acordo com o art.º 14.º-A, não há lu-gar ao pagamento da segunda pres-tação da taxa de justiça, nos seguintes casos:- Ações de processo civil simplificado;

- Ações que não comportem citação do réu, oposição ou audiência de julga-mento;

- Ações que terminem antes de oferecida a oposição ou em que, devido à sua fal-ta, seja proferida sentença, ainda que precedida de alegações;

- Ações que terminem antes da designa-ção da data da audiência final;

- Ações administrativas especiais em que não haja lugar a audiência pública;

- Ações administrativas especiais em massa suspensas, salvo se o autor re-querer a continuação do seu próprio processo;

- Processos de jurisdição de menores;- Processos de jurisdição voluntária, em

matéria de direito da família;- Processos emergentes de acidente de

trabalho ou de doença profissional terminados na fase contenciosa por decisão condenatória imediata ao exa-me médico;

- Processos tributários, no que respeita à taxa paga pelo impugnante, em caso de desistência no prazo legal após a revogação parcial do ato tributário impugnado.

Em matéria de incentivos à extinção de processos, prevê-se que nos processos que tenham dado entrada no tribunal até 13.02.2012, ou que resultem da apre-sentação à distribuição de providências de injunção requeridas até à mesma data, e venham a terminar por extinção da instância em razão de desistência do pedido, desistência da instância, confis-são do pedido ou transacção apresen-tadas até 29.03.2013, há dispensa do pagamento das taxas de justiça e dos encargos devidos pela parte ou par-tes que praticaram o ato que conduziu à extinção da instância, não havendo lugar à restituição do que já tiver sido pago a título de custas nem sequer, sal-vo motivo justificado, à elaboração da respectiva conta. Todavia, esta dispen-sa de pagamento não abrange o direito ao pagamento da remuneração devida às entidades que intervenham nos pro-cessos ou que coadjuvem em quaisquer diligências e aos agentes de execução a título de despesas e honorários, cujo pa-gamento se mantém a ser devido.

Na sequência da aprovação desta re-visão, em matéria de custas processu-ais, foi entretanto publicada a Port. n.º 82/2012, de 29.3, também em vigor desde o passado dia 29 de Março, que introduz alterações à regulamentação do RCP, a respeito do modo de elabo-ração, contabilização, liquidação, pa-gamento, processamento e destino das custas processuais, multas e outras penalidadesA maioria das alterações agora intro-duzidas decorre de duas situações: o fato de a conta deixar de ser feita de modo contínuo durante todo o proces-so, sendo efectuada apenas no final do processo, e o fato de ter sido revogado o mecanismo de conversão da taxa de justiça em pagamento de encargos pre-visto no artigo 22.º do Regime das Cus-tas Processuais.

Passa a prever-se o meio de pagamen-to da taxa de justiça nas injunções eu-ropeias .De referir que constituem receita do conselho geral da Ordem dos Advo-gados cinco em cada mil das quantias cobradas a título de taxa de justiça em processos cíveis. Estas verbas apenas podem ser utilizadas para, no âmbito das respetivas competências, acorrer às despesas necessárias à regulamen-tação e organização da formação inicial e contínua de advogados e advogados estagiários, bem como à promoção do aperfeiçoamento profissional daqueles.Dois em cada mil das quantias cobradas a título de taxa de justiça em processos cíveis são receita do conselho geral da Câmara dos Solicitadores.

atualidadeSVIDA JUDICIÁRIA - março 201220

As propostas de alteração ao Códi-go Penal e ao Código de Proces-so Penal já estão na posse da Mi-

nistra da Justiça, sendo posteriormente levadas à aprovação do governo.A Ministra pretende colocar a justiça ao serviço do combate à fraude e à evasão fiscais. Prevê-se, por isso, que as falsas declarações prestadas aos serviços de finanças, às conservatórias, aos notários e aos agentes da polícia, passem a ser considerados crimes, e não como ac-tualmente apenas contra-ordenações.Assim, quem mentir perante as referi-das entidades, sobre o estado civil, a actividade profissional, a paternidade, filiação, a residência, quer para usufruir de benefícios fiscais, quer para dificultar notificações do tribunal ou das finanças, incorrerá na prática de um ilícito crimi-

nal, punível com pena de multa ou pena de prisão até dois anos.Das alterações previstas salientamos as que dizem respeito às prescrições. O prazo de prescrição passará a ficar sus-penso logo que haja uma decisão con-denatória na primeira instância. O Juiz de instrução vai deixar de estar obrigado a aplicar a medida de coação promovida pelo Ministério Público (M.º P.º) , podendo aplicar aquela que en-tender adequada, independentemente daquela que o M.º P.º tiver promovido.As declarações prestadas no inquérito e na instrução vão passar a valer para efei-tos de prova, em sede de julgamento.As agressões a agentes de autoridades vêm as penas agravadas e a extradição de cidadãos estrangeiros condenados em Portugal será agora facilitada.

Códigos Penal e Processo Penal – Propostas de alteração

SECTOR DAS PESCAS, AGRíCOLA E FLORESTAL

Moratória nas operações

de créditoDe acordo com o diploma aprovado

no Conselho de Ministros de 1.3.2012, foi criada uma moratória no reembolso

das operações de crédito contratadas ao abrigo das linhas de crédito de

apoio às empresas do sector das pescas e empresas dos sectores agrícola,

pecuário, agroindustrial, florestal e ainda ao sector da pecuária intensiva.

Desta forma permite-se o alargamento do prazo de reembolso dos

empréstimos concedidos no âmbito das linhas de crédito referidas,

possibilitando às empresas a obtenção de uma folga financeira e a melhoria das

suas condições de liquidez.

O regime que estabelece as re-gras de utilização das câmaras de vídeo pelas forças e servi-

ços de segurança em locais públicos de utilização comum foi alvo de recen-tes alterações.Estas alterações vêm reforçar a video-vigilância em espaços públicos e elimi-nar o parecer vinculativo da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD). De acordo com a nova lei, a autoriza-ção da instalação de câmaras fixas está apenas sujeita a autorização do mem-bro do Governo que tutela a força ou

serviço de segurança requerente, isto é, do ministro da Administração Inter-na. O parecer prévio da CNPD man-tém-se, mas esta apenas se pronun-cia sobre a conformidade do pedido, tendo sido retirada a disposição que determinava que no caso de parecer negativo da CNPD, a autorização não pode ser concedida.Foi aditado um novo artigo em maté-ria de sistemas de proteção florestal e deteção de incêndios florestais (Artigo 15º). De acordo com esta disposição, a instalação de sistemas de vigilância eletrónica em florestas visa “a deteção, em tempo real ou através de registo, de incêndios florestais e a aplicação das correspondentes normas sancionató-rias; o accionamento de mecanismos de protecção civil e socorro no mesmo âmbito; a utilização dos registos vídeo para efeitos de prova em processo pe-nal ou contra-ordenacionalEstas alterações entram em vigor no dia 24 de março do corrente ano.

locais públicos – utilização de câmaras de vídeo

atualidadeS VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 21

PRODUTOS VíNICOS

ações de promoçãoFoi recentemente aprovada em Conselho de Ministros, a revisão do regime das taxas incidentes sobre os vinhos e produtos vínicos, com vista à sua clarifi cação.Por forma a difundir a qualidade dos vinhos nacionais e promover a sua imagem, foi igulamente aprovada a reformulação do regime de apoio a ações de promoção e informação sobre aqueles produtos.

No Conselho de Ministros de 1 de março último foi aprovado o di-ploma que procede à instalação

do Tribunal da Propriedade Intelectual e do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão.Recordamos que a criação destes novos tribunais ocorreu em junho de 2011.Ao tribunal da propriedade intelectual compete conhecer, entre outras, das ques-tões relativas a:- Ações em que a causa de pedir verse sobre direito de autor e direitos conexos;- Ações em que a causa de pedir verse so-bre propriedade industrial, em qualquer das modalidades previstas na lei;- Ações de nulidade e de anulação previs-tas no Código da Propriedade Industrial;- Recursos de decisões do Instituto Na-cional da Propriedade Industrial que con-cedam ou recusem qualquer direito de propriedade industrial ou sejam relativas a transmissões, licenças, declarações de caducidade ou a quaisquer outros actos que afectem, modifi quem ou extingam direitos de propriedade industrial;- Recurso e revisão das decisões ou de quaisquer outras medidas legalmente sus-ceptíveis de impugnação tomadas pelo Instituto Nacional da Propriedade Indus-trial, em processo de contra-ordenação;- Ações de declaração em que a causa de pedir verse sobre nomes de domínio na Internet;A competência do Tribunal nestas ma-

térias abrange respectivos incidentes e apensos, bem como a execução das de-cisões.Já ao tribunal da concorrência regulação e supervisão compete conhecer das ques-tões relativas a recurso, revisão e execução das decisões, despachos e demais medi-das em processo de contra-ordenação legalmente susceptíveis de impugnação:- Da Autoridade da Concorrência (AdC);- Da Autoridade Nacional de Comunica-ções (ICP-ANACOM);- Do Banco de Portugal (BP);- Da Comissão do Mercado de Valores Mo-biliários (CMVM);- Da Entidade Reguladora para a Comuni-cação Social (ERC);- Do Instituto de Seguros de Portugal (ISP);- Das demais entidades administrativas independentes com funções de regula-ção e supervisão.Compete, ainda, a este tribunal conhecer das questões relativas a recurso, revisão e execução:-Das decisões da AdC proferidas em pro-cedimentos administrativos a que se refe-re o regime jurídico da concorrência, bem como da decisão ministerial;- Das demais decisões da AdC que admi-tam recurso, nos termos previstos no re-gime jurídico da concorrência.Estas competência abrangem os respec-tivos incidentes e apensos.

aprovada a instalação dos tribunais da propriedade intelectual e da concorrência

No passado dia 1 do corrente mês de março foi aprovado o regime que vem regular e disciplinar a

oferta de alojamento turístico na Região dos Açores. O diploma ora aprovado vai ao encontro das especifi cidades regio-nais, destacando-se como principais pre-ocupações as características dos empre-endimentos de turismo no espaço rural e

empreendimentos de turismo de natu-reza, bem como o nível de intervenção da administração regional nos procedi-mentos relativos às operações urbanís-ticas dos empreendimentos de turismo e a respetiva tutela para determinar a classifi cação ofi cial dos empreendimen-tos turísticos e gerir o sistema de gestão das capacidades máximas da oferta de

alojamento turístico nos Açores. De refe-rir que os requisitos específi cos da insta-lação, classifi cação e funcionamento de cada tipo de empreendimento turístico serão defi nidos por portaria do membro do Governo Regional responsável pela área do turismo. O regime ora aprovado entrará em vigor no dia seguinte à pu-blicação da regulamentação a aprovar.

aprovado o regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos nos açores

atualidadeSVIDA JUDICIÁRIA - março 201222

Ficam abrangidos pelo novo regi-me de atribuição de subsídio de desemprego os trabalhadores

independentes que, no mesmo ano civil, obtenham da mesma empresa, quer seja pessoa coletiva ou pessoa singular com atividade empresarial, independentemente da sua nature-za e das finalidades que prossigam, 80% ou mais do valor total anual dos rendimentos obtidos na atividade in-dependente.Para efeitos de concessão do subsídio, é obrigatório o pagamento das contri-buições à Segurança Social pelas em-presas (entidades contratantes) de 5% do valor total dos serviços prestados às mesmas pelo trabalhador, em pelo menos dois anos civis, sendo um de-les o ano imediatamente anterior ao da cessação do contrato de prestação de serviços.São contemplados os beneficiários en-quadrados no regime dos trabalhado-res independentes que sejam econo-micamente dependentes de uma única entidade contratante.Consideram-se economicamente de-pendentes os trabalhadores indepen-dentes que obtenham de uma única entidade contratante 80% ou mais do valor total dos seus rendimentos anu-ais resultantes da atividade indepen-dente que determinem a constituição de obrigação contributiva por aquela entidade (taxa de 5%).A proteção social concretiza-se através da atribuição do subsídio por cessação de atividade e do subsídio parcial por cessação de atividade:- subsídio por cessação de atividade - destina-se a compensar a perda de ren-dimentos dos trabalhadores indepen-dentes em consequência da cessação involuntária da atividade independen-te resultante da cessação de contrato de prestação de serviços com entidade contratante;- subsídio parcial por cessação de ativi-dade - é atribuído nas situações em que

o trabalhador independente, após ces-sar o contrato de prestação de serviços com a entidade contratante, mantenha uma atividade profissional correspon-dente aos restantes 20% ou menos do valor total anual dos seus rendimentos de trabalho.O reconhecimento do direito ao sub-sídio por cessação de atividade ao tra-balhador independente depende da verificação das seguintes condições:- cessação involuntária do contrato de prestação de serviços celebrado com a entidade contratante;- cumprimento do prazo de garantia: 720 dias de exercício de atividade in-dependente, economicamente depen-dente, com o correspondente paga-mento efetivo de contribuições (à taxa de 5%), num período de 48 meses ime-diatamente anterior à data da cessação involuntária do contrato de prestação de serviços;- cumprimento da obrigação contri-butiva das entidades contratantes do trabalhador independente, nessa qua-lidade, em pelo menos dois anos civis, sendo um deles o ano imediatamente anterior ao da cessação do contrato de prestação de serviços;- o trabalhador independente ser con-siderado economicamente dependen-te à data da cessação do contrato de prestação de serviços;- inscrição no centro de emprego da área de residência, para efeitos de emprego.O requerimento para atribuição do subsídio de desemprego deve ser apre-sentado no prazo de 90 dias consecu-tivos a contar da data do desemprego por cessação do contrato de prestação de serviços e precedido de inscrição para emprego no centro de emprego.O requerimento, de modelo próprio (a publicar brevemente na 2ª série do DR), é apresentado no centro de emprego da área da residência do beneficiário ou online no site da Segurança Social (www.seg-social.pt)

trabalhadores independentes Proteção no desemprego em vigor a 1 de julho

MADEIRA

alterações ao iVa e aos impostos

especiais de Consumo

De acordo com o Programa de Ajustamento Económico e Financeiro

acordado entre o Governo da República Portuguesa e a Região Autónoma da

Madeira, foi aprovada no Conselho de Ministros de 7 de março a proposta de lei que introduz alterações ao Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e aos

Impostos Especiais de Consumo em vigor naquela Região Autónoma.

Assim, a partir de 1 de abril de 2012, as taxas de IVA em vigor na Madeira

passam as seguintes:•Taxa reduzida: passa de 4% para 5%

•Taxa Intermédia: passa de 9% para 12%•Taxa Normal: passa de 16% para 22%

Por outro lado, a partir da mesma data, os serviços de Restauração e Bebidas

passam a estar sujeitos à taxa de 22%, e os serviços de Alojamento à taxa de 5%. Relativamente à Região Autónoma dos

Açores, não existe alteração de taxas, mantendo-se as atuais, que são:

•Taxa reduzida: 4%•Taxa Intermédia: 9%

•Taxa Normal: 16%

atualidadeS VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 23

Fundo de Socorro SocialCom a vista a unificar e a actualizar a legislação existente em matéria de socorro social, no Conselho de Ministros do passado dia 15 de março, foi aprovado o novo regime do Fundo de Socorro Social.O diploma ora aprovado clarifica as finalidades deste Fundo, identifica as suas receitas, bem como as situações passíveis de apoio e respetivo enquadramento procedimental, numa ótica de consolidação legislativa, transparência, certeza e segurança jurídicas.As finalidades do Fundo de Socorro Social são as seguintes: prestar auxílio em situações de alerta, contingência ou calamidade conforme tipificadas na Lei de Bases da Proteção Civil; prestar apoio às instituições particulares de solidariedade social, ou outras de fins idênticos e de reconhecido interesse público; apoiar pessoas e famílias que se encontrem em situação de emergência social e responder à despesa decorrente do diferimento da desocupação de imóvel arrendado para habitação.

Com vista a apoiar os consumi-dores e a reduzir os atuais níveis de endividamento das famílias,

o executivo apresentou recentemente um conjunto de medidas legislativas, a implementar até ao próximo Verão. Estas medidas passam pela aprovação de um novo regime jurídico que disci-plinará a gestão do risco e da ocorrên-cia de incumprimento de contratos de crédito celebrados com os consumido-res, de modo a viabilizar a recuperação extrajudicial dos créditos.Está previsto que os bancos sejam obri-gados a encetar um processo de nego-ciações com os clientes incumpridores, durante um período de 90 dias, antes de exigirem a dívida em tribunal ou de resolverem os contratos de crédito.Perante uma situação de risco de so-breendividamento e incumprimento do consumidor, todas as instituições de crédito serão obrigadas a contac-tar e a acompanhar o cliente, com fins preventivos.Uma das medidas passa pela elabora-ção do “Plano de Acção para o Risco de Incumprimento”, alertando o con-sumidor para a sua situação de risco e apresentando propostas adequadas à sua situação financeira, características pessoais e necessidades.

Uma outra medida pretende “flexi-bilizar” as negociações entre as insti-tuições de crédito e os consumidores que se encontrem já em situação de incumprimento contratual de reem-bolso de créditos.O início deste procedimento dá-se com o registo do incumprimento, a que to-das as instituições de crédito passarão a estar obrigadas, no trigésimo primei-ro dia após a sua ocorrência ou assim que o cliente o solicite.Durante este processo de negociação, o consumidor, sempre que o deseje, será aconselhado e acompanhado pe-las entidades qualificadas e credencia-das públicas ou privadas que partici-pam numa rede nacional de apoio aos consumidores endividados.Nas situações em que não seja possível chegar a acordo com o banco, o con-sumidor poderá solicitar um procedi-mento adicional de mediação condu-zido pelo “Mediador de Crédito”.Está ainda prevista a criação de uma rede nacional de informação e apoio ao consumidor endividado, na qual parti-cipam os Centros de Informação Autár-quicos ao Consumidor, bem como to-das as associações de defesa dos con-sumidores e centros de arbitragem de conflitos de consumo.

Medidas contra o endividamento das famíliasinstituições bancárias obrigadas a negociar com devedores

De acordo com o secretário de Estado do Emprego, deverão ser abolidos ainda este ano os

feriados civis de 5 de outubro e 1 de dezembro.Segundo o mesmo responsável, a abo-lição destes dois feriados “vai, com cer-teza, depender da altura em que a pro-posta de lei entrar em vigor, mas espe-ramos que entre em junho ou julho, o que implicará a eliminação destes dois feriados já este ano”. O Governo preten-

de eliminar quatro feriados do calendá-rio: dois civis e dois religiosos. A decisão quanto aos feriados religiosos, que será emitida pela Igreja, poderá ser mais de-morada. Ainda não é certo que tal abo-lição seja aplicada em 2012.Recentemente, o presidente da delega-ção da Santa Sé na comissão paritária que negoceia a questão dos feriados com o Estado português admitiu que “não está garantido que seja o 15 de agosto”, não tendo excluído a hipótese

de ser o 1 de novembro, dia de todos os santos. No que diz respeito ao segundo feriado católico que será eliminado, não parece haver dúvidas: “em relação ao Corpo de Deus, não há dificuldade, porque já em muitos países se celebra no domingo, não é preciso fazer nenhuma alteração especial.” Refira-se que o feriado do Cor-po de Deus é móvel e ocorre sempre 60 dias após a Páscoa, sendo no corrente ano a 7 de junho.

Governo pretende eliminar feriados ainda este ano

atualidadeSVIDA JUDICIÁRIA - março 201224

Entram em vigor no dia 1 de abril as novas alterações ao regime de pro-teção no desemprego dos traba-

lhadores por conta de outrem, benefici-ários do regime geral de segurança social.Foi ainda publicado um novo regime de proteção no desemprego para os traba-lhadores independentes que prestam ser-viços maioritariamente a uma entidade contratante. Relativamente aos trabalha-dores por conta de outrem, destacam-se as seguintes novidades:- majoração temporária (até 31 de de-zembro de 2012) de 10% do montante do subsídio de desemprego nas situações em que ambos os membros do casal se-jam titulares de subsídio de desempre-go e tenham filhos a cargo, abrangendo esta medida igualmente as famílias mo-noparentais;- redução de 450 para 360 dias do prazo de garantia para a obtenção de subsídio de desemprego;- quanto ao valor do subsídio de desem-prego foi introduzida uma redução de 10% a aplicar após 6 meses de concessão, como forma de incentivar a procura ativa de emprego por parte dos beneficiários;

- o limite máximo do montante mensal do subsídio de desemprego foi reduzi-do, mantendo-se os valores mínimos de modo a salvaguardar os beneficiários com menores salários;- os períodos de concessão do subsídio de desemprego são reduzidos, passan-do o prazo máximo de atribuição para

540 dias (18 meses), ficando salvaguar-dados, contudo, os direitos em formação dos beneficiários, mantendo-se o direito aos acréscimos em função da idade do beneficiário e do número de meses com

registo de remunerações no período ime-diatamente anterior à data do desempre-go. No entanto, para trabalhadores com carreira contributiva mais longa é garan-tida a possibilidade de ultrapassar esse limite, especialmente acima dos 50 anos;- com o objetivo de dinamizar e inserir no mercado de trabalho os trabalhadores

desempregados, criou-se a possibilida-de do pagamento parcial do montante único das prestações de desemprego em acumulação com a continuação do paga-mento das prestações de desemprego.

Subsídio de desemprego com novas regras a partir de abril

No passado dia 10 de Fevereiro foi aprovado DL n.º 31-A/2012, que confere poderes ao Banco

de Portugal para intervir em instituições sujeitas à sua supervisão em situações de desequilíbrio financeiro, procede à cria-ção de um Fundo de Resolução e cria m procedimento pré-judicial de liquidação para as instituições sujeitas à supervisão do Banco de Portugal.Têm vindo a constatar-se insuficiências dos mecanismos jurídicos e poderes de intervenção dos supervisores em institui-ções de crédito cuja situação financeira dá sinais de deterioração.Na verdade, os mecanismos existentes não permitem a adoção de medidas conducentes à recuperação financeira da

instituição em causa, por forma a evitar o risco de contágio a outras instituições.Torna-se necessário em situação de gra-ve desequilíbrio financeiro, recuperar a instituição de crédito ou preparar a sua liquidação ordenada, de modo a salva-guardar o interesse essencial da estabi-lidade financeira.No âmbito do Programa de Assistência Financeira a Portugal entre o Estado Por-tuguês, a União Europeia, o Fundo Mo-netário Internacional e o Banco Central Europeu, aprovaram-se medidas de pro-moção da estabilidade do sector finan-ceiro e a maior proteção dos depositan-tes. Nesta matéria, Portugal assumiu o compromisso de reforçar os regimes de intervenção em situações de potencial

ou efetivo desequilíbrio financeiro de instituições de crédito. O diploma ora aprovado vem concretizar esses propó-sitos, substituindo o regime de sanea-mento actualmente previsto em sede de Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF) por uma nova disciplina legal, caracterizada pela existência de três fases de interven-ção distintas – intervenção corretiva, ad-ministração provisória e resolução.A aplicação do diploma ora aprovado não afeta as providências de saneamen-to adotadas pelo Banco de Portugal ao abrigo do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, que ainda se encontrem em fase de execução a 15 de Fevereiro de 2012.

Procedimento pré-judicial de liquidação das instituições sujeitas à supervisão do Banco de Portugal

reGiStoS e Notariado VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 25

A cedência ocasional consiste na disponibilização temporária de trabalhador, pelo empregador, para prestar trabalho a outra entidade, a cujo poder de direção aquele fi ca sujeito, mantendo-se o vínculo contratual inicial.A minuta que seguir publicamos traduz um exemplo de contrato de cedência ocasional de trabalhador.

CedêNCia oCaSioNal de traBalHador

MiNuta de CoNtrato de CedêNCia oCaSioNal de traBalHador

Entre,Empresa ______________________________________, com sede na Av. ______, nº__, __, em ___, capital social no montante de ____ Euros,

pessoa coletiva nº______, matriculada na C.R.C. de _____, sob o nº ______, neste acto representada pelo(s) seu (s) administrador (es) ________, como Primeira Outorgante,

E Empresa ______________________, com sede na Av. ______, nº__, __, em ___, capital social no montante de ____ Euros, pessoa colectiva

nº______, matriculada na C.R.C. de _____, sob o nº ______, neste ato representada pelo(s) seu (s) administrador (es) ________, como Segunda Outorgante,

E___________________________(nome completo do trabalhador), _____________________(estado civil), residente ______________________

(morada), titular do B.I. nº ______________, de __________________(Data), emitido pelos S.I.C. de _____, e do cartão de contribuinte nº______, como Terceiro Outorgante,

é livremente e de boa fé fi rmado e reduzido a escrito o presente contrato de cedência ocasional de trabalhador, que se regerá segundo as cláusulas seguintes:

Cláusula primeira: A Primeira e Segunda Outorgantes detem, cada uma delas, no capital social da outra, participações recíprocas, existindo entre ambas um protocolo de colaboração que inclui a cedência de pessoal, segundo o qual a Primeira cederá trabalhadores seus à Segunda, nos termos dos artigos 288º e seguintes do Código do Trabalho.

Cláusula segunda: No âmbito do referido protocolo, a Primeira Outorgante cede à Segunda, temporariamente, o seu trabalhador ___________________(nome), de ora em diante designado como Terceiro Outorgante, e como tal acima identifi cado, que nesta data exerce na Primeira Outorgante a actividade/funções correspondentes à categoria de ___________, mediante contrato sem termo, para executar a actividade de _____.

Cláusula terceira: A cedência ajustada entre a Primeira e a Segunda Outorgantes, é feita pelo período de um ano, com início em __________, e termo em ______, sendo renovável por iguais períodos até ao limite de 5 anos.

Cláusula quarta: Um - O Terceiro Outorgante auferirá, durante o período da cedência, a remuneração mensal de ______________________ Euros (indicar por

extenso) ilíquida, acrescida de um subsídio de almoço no valor de ______euros (indicar por extenso), por cada dia útil de trabalho, e ainda os subsídios de férias e Natal, sendo todos eles pagos pela Primeira Outorgante.

Dois – A Segunda Outorgante reembolsará a Primeira de todos os encargos suportados com o trabalhador durante o período da cedência.Três – Ressalvam-se quaisquer despesas com deslocações, estadias, ou outras semelhantes, realizadas ao serviço da Segunda Outorgante, as

quais serão directamente reembolsadas por esta ao Terceiro Outorgante. Cláusula quinta: Durante o período da cedência o Terceiro Outorgante manterá todos os seus direitos e obrigações para com a Primeira

Outorgante, a qual continuará também a exercer sobre ele o poder disciplinar, e não será incluído no efetivo do pessoal da entidade cessioná-ria – Segunda Outorgante – para determinação das obrigações relativas ao número de trabalhadores empregados, excepto no que respeita à organização dos serviços de saúde, higiene e segurança no trabalho.

Cláusula sexta: Durante o período da cedência, o Terceiro Outorgante fi ca sujeito ao regime de trabalho aplicável à Segunda Outorgante no que respeita aov modo , lugar, duração do trabalho e suspensão da prestação de trabalho, segurança, higiene e saúde no trabalho e acesso aos seus equipamentos sociais, devendo a Segunda Outorgante informá-lo sobre os riscos para a sua segurança e saúde inerentes ao posto de trabalho a que é afecto.

Cláusula sétima: O presente contrato de cedência cessará automaticamente e sem necessidade de aviso prévio pelo decurso do respectivo prazo, acordo das partes ou perda, por qualquer causa, do vínculo laboral entre a Primeira e a Terceira Outorgantes.

Cláusula oitava: O Terceiro Outorgante aceita a cedência, nos termos convencionados.Cláusula nona: Quanto aos aspectos omissos, em virtude de a mesma não se encontrar regulada na legislação coletiva aplicável, aplicar-se-á

o regime decorrente dos artigos 288º e seguintes do Código do Trabalho.Cláusula décima: Em caso de litígio emergente do presente contrato, fi ca desde já designado pelas partes como competente o foro da Comarca

de _____, com expressa renúncia a qualquer outro.Cláusula décima primeira: Este contrato é feito em três vias, destinando-se uma a cada um dos Outorgantes.

(Data de celebração)Primeira Outorgante ______________(assinatura) Segunda Outorgante______________ (assinatura)Terceiro Outorgante______________(assinatura)

aNáliSeVIDA JUDICIÁRIA - março 201226

Os órgãos societários, anualmente, têm o dever de prestarem contas do exercício, efetuarem o respetivo relatório e proce-derem ao depósito das contas anuais. Aproveitamos para relembrar alguns desses atos societários, com indicação do prazo para a prática dos mesmos.

1. relatório de gestão e documentos de prestação de contasO relatório de gestão, as contas do exer-cício e demais documentos de prestação de contas devem ser apresentados, sal-vo casos particulares previstos na lei, no prazo de três meses a contar da data de encerramento de cada exercício anual, ou no prazo de cinco meses a contar da mesma data quando se trate de socieda-des que devam apresentar contas con-solidadas ou que apliquem o método de equivalência patrimonial.Os liquidatários devem prestar, nos três primeiros meses de cada ano civil, contas da liquidação, as quais devem ser acom-panhadas por um relatório pormenoriza-do do estado da mesma.A assembleia geral dos acionistas deve reunir nos três meses a contar da data do encerramento do exercício ou no prazo de cinco meses a contar da mesma data quando se tratar de sociedades que de-vam apresentar contas consolidadas ou apliquem o método da equivalência pa-trimonial para:– Deliberar sobre o relatório de gestão

e as contas do exercício, quando a assembleia seja o órgão competen-te para isso;

–Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados;

–Proceder à apreciação geral da admi-nistração e fiscalização da sociedade e, se disso for o caso e embora esses assuntos não constem da ordem do dia, proceder à destituição, dentro da sua competência, ou manifestar a sua desconfiança quanto aos administra-dores ou diretores;

– Proceder às eleições que sejam da sua competência;

Até 30 dias antes da data da assembleia geral convocada para apreciar os docu-mentos de prestação de contas, o con-selho de administração deve apresentar ao conselho fiscal o relatório de gestão e as contas de exercício.Até 30 dias da data da assembleia ge-ral convocada para apreciação geral da administração e fiscalização, a direção deve apresentar ao revisor oficial de contas o relatório de gestão e as contas de exercício.Os gerentes, administradores ou direto-res de uma sociedade obrigada por lei à consolidação de contas devem elaborar e submeter aos órgãos competentes o relatório consolidado de gestão, as con-tas consolidadas do exercício e os de-mais documentos de prestação de con-tas consolidadas.Os documentos de prestação de contas atrás referidos devem ser apresentados e apreciados pelos órgãos competentes no prazo de cinco meses a contar da data de encerramento do exercício.Os gerentes, administradores ou direto-res de cada sociedade a incluir na con-solidação que seja empresa filial ou as-sociada devem, em tempo útil, enviar à sociedade consolidante o seu relatório e contas e respetiva certificação legal ou declaração de impossibilidade de certi-ficação, a submeter à respetiva assem-bleia geral, bem como prestar as demais informações necessárias à consolidação de contas.

2. documentos de prestação de contas da sociedade - registoO pedido de registo de prestação de con-tas de sociedades e de estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada deve ser efetuado até ao 15.º dia do 7.º mês posterior à data do termo do exer-cício económico.O registo da prestação de contas consiste no depósito, por transmissão eletrónica

de dados da informação constante dos seguintes documentos: a) Ata de aprovação das contas do exer-

cício e da aplicação dos resultados;b) Balanço, demonstração de resultados

e anexo ao balanço e demonstração de resultados;

c) Certificação legal das contas;d) Parecer do órgão de fiscalização, quan-

do exista.O registo da prestação de contas conso-lidadas consiste no depósito, por trans-missão eletrónica de dados da informa-ção constante dos seguintes documentos: a) Ata da deliberação de aprovação das

contas consolidadas do exercício, de onde conste o montante dos resulta-dos consolidados;

b) Balanço consolidado, demonstração consolidada dos resultados e anexo;

c) Certificação legal das contas conso-lidadas;

d) Parecer do órgão de fiscalização, quan-do exista.

3. Publicidade de atos sociaisRegra geral, os atos relativos à socieda-de estão sujeitos publicação e registo. Assim, está sujeita a registo, sendo obri-gatória a sua publicação, nomeadamen-te a prestação de contas das sociedades anónimas, por quotas e em comandita por ações, bem como das sociedades em nome coletivo e em comandita sim-ples quando houver lugar a depósito, e de contas consolidadas de sociedades obrigadas a prestá-las.As publicações obrigatórias devem ser feitas, a expensas da sociedade, em sítio na Internet de acesso público, no qual a informação objeto de publicidade possa ser acedida, designadamente por ordem cronológica.Os atos societários cuja publicação seja obrigatória não são oponíveis a tercei-ros enquanto essa publicação não se en-contrar efetuada, exceto se a sociedade provar que o ato está registado e que o terceiro tem conhecimento dele.

atos societários – Obrigações decorrentes do Código das Sociedades Comerciais

MarCaS VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 27

iMitaÇÃo de MarCa(Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13/03/2012)

SuMário:1) Existe o risco de confusão quando um consumidor médio toma uma marca por outra e, consequentemente, um produto por outro ou então associá-la a uma já existente.2) Este risco não se verifica quanto às marcas Porca de Murça e Quinta do Vale da Porca, atento o número de palavras que as compõem .

acordam no tribunal da relação de lisboa: A Apelante A (…. S.A), também de-nominada Real …. interpôs recurso do despacho do Senhor Diretor do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, que concedeu o registo da marca nacional nº ... “QUINTA DO VALE DA PORCA”, requerido pelo apelado B, pedindo que se revogue o despacho recorrido e se ordene a recusa do registo daquela.Fundamenta a sua pretensão, em síntese, no fato de ser titular do registo prioritá-rio de marcas nacionais e comunitárias, verificando-se, relativamente às mesmas, todos os requisitos de imitação. Acres-centa que as marcas de que é titular têm elevadíssima notoriedade e que a coexistência no mercado das marcas da titularidade da recorrente e concedida potencia a possibilidade da prática de atos de concorrência desleal.Respondeu o recorrido, dizendo, em sín-tese, que não se verificam os invocados requisitos de imitação e a possibilidade da prática de atos de concorrência des-leal, até porque a palavra “porca” já faz parte de outras marcas registadas tais como “Caves da Porca”, “Vinho da Porca” e “Adega da Porca”.Conclui pela improcedência do recurso.Foi proferida sentença julgando impro-cedente o recurso.A apelante, inconformada, recorre agora para este Tribunal, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:A) A marca registanda “QUINTA DO VALE DA PORCA” constitui imitação das marcas “PORCA DE MURÇA” da Recorrente, as

quais gozam de prioridade relativamen-te àquela, destinando-se todos os sinais em confronto a assinalar vinhos.B) Embora não haja uma semelhança total entre estas marcas, constata-se que o elemento dominante e mais caraterís-tico da marca da Recorrente (“PORCA”) é reproduzido na íntegra pela marca do Recorrido, constituindo também o elemento nuclear desta última.C) Isto porque, estando em causa marcas nominativas complexas, o elemento individualizante – o que melhor capta a atenção do consumidor médio e de que este conserva memória – é a palavra mais sonante, que é o núcleo ou coração das mesmas.D) Neste caso, a palavra “PORCA” cons-titui o núcleo essencial, quer da marca registada, quer da marca registanda,E) O que torna evidente o risco de confusão do público e inevitável a as-sociação dos dois sinais, por parte dos consumidores.F) Esta conclusão sai ainda mais refor-çada devido à elevada notoriedade de que gozam as marcas prioritárias da Recorrente, visto que – como declarou o Tribunal de Justiça das Comunidades Eu-ropeias, no seu acórdão SABEL.PUMA,de 11.11.97 – o risco de confusão é tanto mais elevado quanto o caráter distintivo da marca anterior se reconhece como importante.G) Uma marca que goza de uma noto-riedade de 88,8% junto do universo dos consumidores de vinho portugueses, e que é conhecida de 62,5% do público em geral (incluindo consumidores e não consumidores de vinho), tem, inquestio-

navelmente, uma elevada notoriedade.H) Em Portugal, qualquer vinho cuja marca inclua a palavra “Porca” será imediatamente associado pelos consu-midores à Apelante, em prejuízo desta, desses consumidores e da lealdade das transacções comerciais.I) Ao contrário do que refere a sentença recorrida, a palavra “PORCA” só seria uma palavra “descritiva e genérica” em relação a porcos… ou a produtos pecuários. Em relação a vinhos, esta palavra é total-mente arbitrária, revestindo um caráter distintivo muito intenso, com grande facilidade de reconhecimento imediato por parte do consumidor.J) Por isso, seria fácil, para o titular da marca (atual ou futuro), tirar partido indevido do esforço realizado pela Ape-lante, durante 80 anos, na promoção e divulgação dos seus produtos.K) Pelo que a concessão do registo daria lugar a riscos acrescidos de concorrên-cia desleal, resultante da confusão no espírito dos consumidores quanto à proveniência empresarial dos produtos, o que representa motivo suplementar de recusa do registo, ao abrigo da alínea e) do nº 1 do art. 239º do CPI.EM SíNTESE (art. 690º/2 do CPC):- O douto despacho recorrido recorrida não fez, pois, adequada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 239º/1/a) e e), 245º/1 e 317º, alíneas a), c) e e),todos do CPI de 2003.- As citadas normas foram assim erra-damente interpretadas e aplicadas pelo Tribunal a quo, que deveria tê-las inter-pretado e aplicado do modo indicado nas precedentes conclusões.

MarCaSVIDA JUDICIÁRIA - março 201228

Em contra-alegações o apelado pug-nando pela manutenção do julgado conclui que :1. A douta sentença recorrida fez boa aplicação da lei;2. As marcas “Quinta do Vale da Porca” e “Porca de Murça” são gráfica e fonetica-mente distintas uma da outra;3. Pelo que o público consumidor não as toma uma pela outra;4. A coincidência da palavra “PORCA” não funda a imitação, já que coexistem pacificamente, com a marca “PORCA DE MURÇA” as marcas nacionais nº ... “CAVES DA PORCA”, ... “VINHO DA PORCA” e ... “ADEGA DA PORCA”;5. Sendo que a diversidade de fontes produtivas inerente à coexistência determina que o público consumidor esteja habituado a ver a palavra “POR-CA” associada a vinhos de mais de uma proveniência;6. Para além do que a marca obstativa “PORCA DE MURÇA” não tem um ele-mento prevalente valendo pelo seu todo e sendo pelo seu todo conhecida;7. Pelo que a douta sentença recorrida fez boa aplicação artigos 25º,nº 1, alínea d), 239º, alínea m) e 245º do CPI;IIO objeto do presente recurso resume-se a saber se a denominação da marca “Quinta do Vale da Porca” é susceptível de ser confundida com a denominação marca da apelante ”Porca de Murça”.IIIA primeira instância considerou provada a seguinte matéria :1 - Por despacho datado de 16.07.2008, o Sr. Diretor do Serviço de Marcas do Insti-tuto Nacional de Propriedade Industrial concedeu o registo da marca nacional nº ... “QUINTA DO VALE DA PORCA”, pedida em 16.12.2003, por B .2 - A referida marca destina-se a assinalar produtos da classe 33ª “Vinhos, incluindo o vinho do Porto”3 - A referida marca é constituída pelo nome “QUINTA DO VALE DA PORCA” em letras de imprensa maiúsculas.--4 - A recorrente é titular da marca nacio-nal nº ... “PORCA DE MURÇA”, concedida

em 14 de Junho de 1929.5 - A referida marca destina-se a assinalar, na classe 33ª “Vinhos”.6 - A mencionada marca é constituída pelo nome “PORCA DE MURÇA”.7 - A recorrente é titular da marca comu-nitária nº ... registada em 13 de outubro de 2001.8 - A mencionada marca destina-se assinalar, na classe 33ª “Vinhos, vinhos do Porto, vinhos de mesa, aguardentes e licores”.9 - A mencionada marca é constituída pelas palavras “PORCA DE MURÇA” em letras de imprensa maiúsculas.10 - A recorrente é titular da marca na-cional nº ... registada em 13 de outubro de 1931.11 - A mencionada marca destina-se as-sinalar, na classe 33ª “Bebidas alcoólicas com excepção de cervejas”.12 - A referida marca é constituída pela figura de um retângulo com aposição dentro do mesmo, entre outras de um animal e das palavras “PORCA DE MURÇA”,“VINHO BRANCO DE MESA”, nos termos constantes do documento nº 3, junto com o requerimento de re-curso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.13 - A recorrente é titular da marca co-munitária nº ... registada em 10.08.2005.14 - A mencionada marca destina-se a assinalar, na classe 33ª “Vinhos prove-nientes da região do Douro”.15 - A referida marca é constituída pela fi-gura de um retângulo com aposição den-tro do mesmo de uma “moldura” e dentro desta, designadamente de elementos figurativos e das palavras “PORCA DE MURÇA” e “Douro”, nos termos cons-tantes do documento nº 4 junto com o requerimento de recurso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.-16 - Foi elaborado pelo IPOM – Instituto de Pesquisa de Opinião e Mercado em dezembro de 2005 e janeiro de 2006, um Estudo de Notoriedade sobre o Vinho “Porca de Murça”, nos termos constantes do documento junto como nº 7 com o requerimento de recurso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

17 - As vendas do vinho assinalado com a marca “Porca de Murça” foram de 966.257 litros, o que representa 6,7% do total das vendas de VQPRD no ano de 2005.-18 - 966.257 litros de vinho correspon-dem a cerca de 1.288.342 garrafas de 7519 - Aos vinhos comercializados sob o si-nal “PORCA DE MURÇA” foram atribuídos diversos prémios, diplomas e distinções, concedidos por entidades oficiais e privadas, dentro de fora do país.-20 - Foram concedidos os registos das marcas nacionais nº ... “CAVES DA POR-CA”, ... “VINHO DA PORCA” e ... “ADEGA DA PORCA”, destinadas a assinalar vinhos.IVAntes do mais há que averiguar qual a lei aplicável ao caos concreto, tendo em conta as sucessivas alterações a que o Código da Propriedade Industrial (CPI) foi sujeito.O atual CPI foi aprovado pelo DL nº 36/ 2003, de 05/03, que revogou o anterior aprovado, pelo DL nº16/95 de 24/01.Este DL nº 36/2003 foi alterado pelos seguintes diplomas: DL nº318/2007 de 26/09 ; DL nº360/2007 de 02/11 ; Lei nº16/2008 de 01/04 ; DL nº 143/2008 de 25/07; Lei nº52/2008 de 28/08 e; Lei nº46/2011de 24/06.O DL nº 36/2003, consagra no seu art. 10º que o CPI se aplica aos pedidos de registo de marca efetuados antes da sua entrada em vigor que ainda não tivessem sido objeto de despacho.O despacho do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) foi proferido em 16/07/2008, sendo que o pedido de registo efetuado em 16/12/2003.- facto nº 1.Ora, tendo em atenção o princípio geral da não retroatividade da lei, consagrado no art. 12º, nº1 do Código Civil (C Civ), o regime legal aplicável é o constante do DL nº36/2003 na sua versão original sendo a data de pedido de registo a relevante.[1]

O presente recurso respeita à concessão de uma marca.A marca é um sinal distintivo de produtos ou serviços, visando individualizá-los, não só para assegurar clientela como

1.Ac STJ de 13/01/2000, proc nº00A1504(Lemos Triunfante) in www.dgsi.pt

MarCaS VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 29

para proteger o consumidor do risco de confusão ou associação com as marcas concorrentes.Preceitua o nº 1 do art. 222º do CPI que a marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais suscetíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respetiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.A primeira exigência legal é a de que a marca seja composta por um sinal sus-ceptível de representação gráfica.Logo a seguir, aponta a lei, como requi-sito da marca, a capacidade distintiva: a marca deve ser apta, por si mesma, a individualizar uma espécie de produtos ou serviços – ela serve para distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.Por outro lado, como decorre do precei-tuado pelos artigos 258º e 4º, nº 4, do CPI, “o registo da marca confere ao seu titular o direito de impedir terceiros, sem o seu consentimento, de usar, no exercício de atividades económicas, qualquer sinal igual, ou semelhante, em produtos ou serviços idênticos ou afins daqueles para os quais a marca foi registada, e que, em consequência da semelhança entre os sinais e da afinidade dos produtos ou serviços, possa causar um risco de confusão, ou associação, no espírito do consumidor “e constitui“…fundamento de recusa ou de anulação de denomi-nações sociais ou firmas com eles con-fundíveis, se os pedidos de autorização ou de alteração forem posteriores aos pedidos de registo”.Nos termos do art. 239º, alª m), do CPI é recusado o registo de marcas que con-tenham, em todos ou alguns dos seus elementos, “Reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca ante-riormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins

que possa induzir em erro o consumidor ou que compreenda o risco de associa-ção com a marca registada”.Uma marca registada considera-se imita-da por outra quando, cumulativamente, tiver prioridade, sejam ambas destinadas a assinalar produtos idênticos ou afins e tenham ambas tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro o confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto. - art.245º do CPC.Há risco de erro ou confusão sempre que a semelhança possa dar origem a que um sinal seja tomado por outro, ou a que o público considere que há identidade de origem ou proveniência dos produtos ou serviços a que os sinais se destinam[2]

Como diz Coutinho de Abreu [3] “(…) o risco de confusão deve ser entendido em sentido lato, de modo a abarcar tanto o risco de confusão em sentido estrito ou próprio como risco de asso-ciação. Verifica-se o primeiro quando os consumidores podem ser induzidos a tomar uma marca por outra e, conse-quentemente, um produto por outro (os consumidores crêem erroneamente tratar-se da mesma marca e produto). Verifica-se o segundo quando os consu-midores, distinguindo embora os sinais, ligam um ao outro e, em consequência, um produto ao outro (crêem erronea-mente tratar-se de marcas e produtos imputáveis a sujeitos com relação de coligação ou licença, ou tratar-se de marcas comunicando análogas quali-dades dos produtos).Acerca do critério para determinar a confundibilidade entre as marcas o Ac. STJ de 13/07/2010 (Fonseca Ramos) [4] tirou o seguinte sumário que, aqui, se transcreve:“I-A imitação ou confundibilidade entre as marcas pressupõem, um “confronto”

de modo a que se possa concluir, ou não, sobre se os produtos que as mar-cas assinalam são idênticos ou afins, ou despertam, pela semelhança dos seus elementos, a possibilidade de associação a outros produtos ou marcas já existen-tes no mercado .II- Esse confronto não demanda, da parte do consumidor, especiais qualidades de perspicácia, subtileza ou atenção, já que, no frenético universo do consumo, o padrão é o consumidor médio, razoa-velmente informado, mas não particular-mente atento às especificidades próprias das marcas.III. Daí que, no juízo a fazer acerca da imitação, se deva ter em conta uma im-pressão de conjunto e não de pormenor das marcas ou produtos, sendo relevan-tes os elementos que essencialmente, as distinguem por serem os dominantes.IV. É assim o critério do consumidor médio, o relevante, para diante dos ele-mentos gráficos, fonéticos ou figurativos (sobretudo nas marcas mistas) de certo produto de uma marca, poder ou não, ter a perceção de que pode confundir essa com aquela outra, ou associá-la a uma já existente, não sendo de exigir que, se tivesse a possibilitar de as con-frontar, logo as suas dúvidas pudessem ser dissipadas”.Também Carlos Olavo [5] adverte que a apreciação do caráter distintivo da marca deve ter em conta “por um lado … os produtos e serviços a que se destina“ e por outro, em relação a “perceção que dela tem o público relevante nor-malmente informado e razoavelmente advertido”.Analisando o caso concreto, diz-se o seguinte.A apelante é titular das marcas nacio-nais nº ... de 14/07/1929 e, nº166575 de 13/10/1931 “Porca de Murça” .E é titular das marcas comunitárias nº ... de 13/10/2001 e, nº... de 10/08/2005 “Porca de Murça”.As marcas nacional nº ... e comunitária

[2] Carlos Olavo, “Violação do Direito à Marca”, ROA, ano 127, Jan./Jun. 1995, 56, e “Propriedade Industrial”, Coimbra,1997, 53.[3] Boletim da Faculdade de Direito, Vol. LXXIII, 1997 pag. 145, em estudo sobre as Marcas, cit no AC STJ de 15/12/2011, proc nº 478/09.7TBCBR.C1.S1

in www.dgsi.pt [4] Proc nº 806/03.TBMRG.C1.S1 in www.dgsi.pt/stj[5] Propriedade Industrial, 2005, pag. 82

MarCaSVIDA JUDICIÁRIA - março 201230

nº...,destinam-se a assinalar, respetiva-mente produtos da classe 33(vinho, incluindo o do Porto) e, produtos da classe 33 (vinhos, vinhos do Porto, vinhos de mesa, aguardentes e licores).Ambas são constituídas pelas palavras “Porca de Murça”.A marca nacional nº 166575 assinala produtos da classe 33 (bebidas alcoólicas com excepção de cervejas) A marca comunitária nº...assinala produ-tos da classe 33 (vinhos provenientes da região do Douro).Ambas são constituídas pela figura de um retângulo, com aposição dentro do mesmo de um animal e das palavras “Porca de Murça e Vinho Branco de Mesa“ no caso da marca nacional e “Porca de Murça Douro“ no caso da comunitária.A marca nº... de 16/07/2008 e constituída pelo nome “Quinta do Vale da Porca “ em letras de imprensa maiúsculas.Argumente a recorrente que a utilização da palavra “Porca” é o elemento individu-alizante das marcas, o que mais capta a atenção do público uma vez que a sua utilização para designar vinhos é “total-mente arbitrária”.Mas a ser assim as marcas nacionais nº ...

“CAVES DA PORCA”, ... “VINHO DA PORCA” e ... “ADEGA DA PORCA”, destinadas a assinalar vinhos, todas posteriores às da apelante (os números assim o confir-mam) suscitariam confusão e o registo foi concedido.Ora qualquer das marcas da apelante é constituída por 3 palavras.A marca do apelado é constituída por 5.Enquanto que nas marcas da apelante as palavras que sobressaem são “porca” e “Murça”, já na marca do apelado as palavras são “vale“ e “porca”.Por outro lado também as marcas da apelante no que respeita a bebidas alco-ólica e vinhos do Douro são assinaladas, ainda, pela figura do animal dentro de um retângulo.Assim quando se pensa em Porca de Murça, tem-se presente a denominação geográfica(concelho de Murça) enquan-to que com a Quinta do Vale da Porca, a ideia que permanece é que o Vale da Porca será a proveniência geográfica, ou seja, a Quinta situa-se num lugar com aquele nome .No confronto das designações na tota-lidade entende-se que um consumidor médio, quando colocado na presença

de bebidas alcoólicas com a designa-ção Porca de Murça e Quinta do Vale da Porca, não confundirá uma com a outra.Não se vê assim que se verifique o risco de confusão em qualquer dos seus sentidos.As conclusões da recorrente improce-dem pois.Em síntese1) Existe o risco de confusão quando um consumidor médio toma uma marca por outra e, consequentemente, um produto por outro ou então associá-la a uma já existente.2) Este risco não se verifica quanto às marcas Porca de Murça e Quinta do Vale da Porca, atento o número de palavras que as compõem .

VConsiderando o que se acaba de expor, julga-se improcedente a apelação con-firmando-se a douta sentença recorrida.Custas pela apelante.

Lisboa, 13 de Março de 2012 Teresa Henriques Isabel Brás Fonseca António Santos

CoMeNtário:

No âmbito do presente recurso coloca-se a seguinte questão:- saber se a denominação da marca “Quinta do Vale da Porca” é suscep-tível de ser confundida com a deno-minação marca da apelante ”Porca de Murça”.Tendo em conta o princípio geral da não retroatividade da lei, consagrado no art. 12º, nº1 do Código Civil, o regi-me legal aplicável ao caso em apreço é o constante do DL nº36/2003 na sua versão original sendo a data de pedido de registo a relevante.A marca é um sinal distintivo de pro-dutos ou serviços, visando individua-lizá-los, não só para assegurar cliente-la, como para proteger o consumidor do risco de confusão ou associação com as marcas concorrentes.

De acordo com o art. 222º do CPI a marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais suscetíveis de representação gráfica, nomeada-mente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respetiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.A primeira exigência legal é a de que a marca seja composta por um sinal susceptível de representação gráfica.Outro requisito da marca é a capa-cidade distintiva: a marca deve ser apta, por si mesma, a individualizar uma espécie de produtos ou serviços – ela serve para distinguir os produ-tos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.Por outro lado, como decorre do pre-

ceituado pelos artigos 258º e 4º, nº 4, do CPI “o registo da marca confere ao seu titular o direito de impedir terceiros, sem o seu consentimento, de usar, no exercício de atividades económicas, qualquer sinal igual, ou semelhante, em produtos ou serviços idênticos ou afins daqueles para os quais a marca foi registada, e que, em consequência da semelhança entre os sinais e da afinidade dos produtos ou serviços, possa causar um risco de confusão, ou associação, no espírito do consumidor ”e constitui “…fun-damento de recusa ou de anulação de denominações sociais ou firmas com eles confundíveis, se os pedidos de autorização ou de alteração forem posteriores aos pedidos de registo”.Nos termos do art. 239º, alª m), do CPI, é recusado o registo de marcas que contenham, em todos ou alguns

MarCaS VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 31

dos seus elementos,” Reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins que possa induzir em erro o consumidor ou que com-preenda o risco de associação com a marca registada“.Uma marca registada considera-se imitada por outra quando, cumula-tivamente, tiver prioridade, sejam ambas destinadas a assinalar pro-dutos idênticos ou afins e tenham ambas tal semelhança gráfica, figu-rativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro o confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca ante-riormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto – art. 245º do CPC.Há risco de erro ou confusão sempre que a semelhança possa dar origem a que um sinal seja tomado por outro, ou a que o público considere que há identidade de origem ou proveniên-cia dos produtos ou serviços a que os sinais se destinam.A apelante é titular das marcas nacio-nais “Porca de Murça” .E é titular das marcas comunitárias “Porca de Murça”.As marcas nacional nº ... e comuni-tária nº..., destinam-se a assinalar, respetivamente, produtos da classe

33 (vinho, incluindo o do Porto) e, produtos da classe 33 (vinhos, vinhos do Porto, vinhos de mesa, aguarden-tes e licores).Ambas são constituídas pelas pala-vras “Porca de Murça”.A marca nacional nº 166575 assinala produtos da classe 33 (bebidas al-coólicas com excepção de cervejas) A marca comunitária nº...assinala produtos da classe 33 (vinhos prove-nientes da região do Douro).Ambas são constituídas pela figura de um retângulo, com aposição dentro do mesmo de um animal e das palavras “Porca de Murça e Vinho Branco de Mesa“ no caso da marca nacional e “Porca de Murça Douro “ no caso da comunitária.A marca nº... de 16/07/2008 e cons-tituída pelo nome “Quinta do Vale da Porca“ em letras de imprensa maiúsculas.Argumente a recorrente que a utiliza-ção da palavra “Porca” é o elemento individualizante das marcas, o que mais capta a atenção do público uma vez que a sua utilização para designar vinhos é “totalmente arbitrária”.Mas a ser assim as marcas nacionais nº ... “CAVES DA PORCA”, ... “VINHO DA PORCA” e ... “ADEGA DA PORCA”, destinadas a assinalar vinhos, todas posteriores às da apelante (os núme-ros assim o confirmam) suscitariam confusão e o registo foi concedido.

Ora qualquer das marcas da apelante é constituído por 3 palavras.A marca do apelado é constituída por 5.Enquanto que nas marcas da apelan-te as palavras que sobressaem são “porca” e “ Murça”, já na marca do ape-lado as palavras são “vale“ e “porca”.Por outro lado também as marcas da apelante no que respeita a bebidas alcoólica e vinhos do Douro são assi-naladas, ainda, pela figura do animal dentro de um retângulo.Assim quando se pensa em Porca de Murça, tem-se presente a denomina-ção geográfica (concelho de Murça), enquanto com a Quinta do Vale da Porca, a ideia que permanece é que o Vale da Porca será a proveniência geográfica, ou seja, a Quinta situa-se num lugar com aquele nome .No confronto das designações na totalidade entende-se que um con-sumidor médio, quando colocado na presença de bebidas alcoólicas com a designação Porca de Murça e Quinta do Vale da Porca não confundirá uma com a outra .Não se vê assim que se verifique o risco de confusão em qualquer dos seus sentidos.Face ao exposto, o Tribunal da Re-lação de Lisboa decidiu em julgar improcedente o recurso de apelação, mantendo na íntegra a sentença recorrida.

CONHEÇA A LIVRARIA ONLINEDA VIDA ECONÓMICA

Visite-nos em: livraria.vidaeconomica.ptPublicações especializadas • Edições técnicas • Formação

juriSPrudêNCia - ResumosVIDA JUDICIÁRIA - março 201232

A decisão do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 29 de março de 2012, foi sumariada do se-guinte modo: “I - O tribunal deve proceder à fixação de alimentos a favor do menor, ainda que desconheça a concreta situação de vida de um dos progenitores obrigado a alimentos.II - O interesse do menor sobreleva a indeterminação ou não conhecimento dos meios de subsistência do obrigado a alimentos, cabendo a este o ónus da prova da impossibilidade total ou par-cial da prestação de alimentos..”Neste recurso interposto junto do Tri-bunal do Supremo Tribunal de Justiça discute-se a seguinte matéria:- Fixação de alimentos a menor no caso de desconhecimento do paradeiro e si-tuação económica e social do obrigado.Para uma corrente jurisprudencial, a fixação da pensão de alimentos não é obrigatória nas decisões que regulam o exercício das responsabilidades pa-rentais, sempre que o obrigado não ti-ver quaisquer meios para cumprir esse dever de prestar alimentos. E, nestas cir-cunstâncias, o Tribunal deverá abster-se de fixar qualquer pensão de alimentos, por forma a dar cumprimento ao crité-rio da proporcionalidade plasmado no artigo 2004º, nº 1, do Código Civil.Para outra corrente jurisprudencial, o Tribunal deve sempre proceder à fixa-ção de alimentos a favor do menor, ain-da que desconheça a concreta situação da vida do obrigado a alimentos, visto que o interesse do menor sobreleva a questão da indeterminação ou do não conhecimento dos meios de subsistên-cia do obrigado a alimentos, cabendo

a este o ónus de prova da impossibili-dade total ou parcial de prestação de alimentos.Sublinhada a importância da proteção dos menores, sobretudo dos mais des-favorecidos, como é o caso quando um dos progenitores os vota ao abandono, importa desencadear os mecanismos de substituição que o legislador em boa hora previu. Deste modo surge a intervenção do Fundo cuja obrigação tem o caráter de prestação social. A sua responsabilida-de apenas se constitui com a decisão que aprecia os pressupostos para sua intervenção e o condena no pagamen-to de certa prestação. O Fundo, quando assegura o pagamento de prestações alimentícias, fá-lo no cumprimento de uma obrigação própria e não alheia. O montante dos alimentos imposto ao Fundo é fixado no incidente de incum-primento e só então se torna líquido e exigível, como direito social do ali-mentando.A obrigação do Fundo não existe en-quanto não for apurado o incumpri-mento do originário devedor e demais pressupostos legais, de tal modo que tal obrigação só é criada com a decisão do respetivo incidente. Nos termos do artigo 1º da Lei 75/98, de 19/11, quando a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos a menor residente em território nacional não satisfizer as quantias em dívida pelas formas previstas no artigo 189º do De-creto-Lei 314/78, de 27/10, e o alimen-tado não tenha rendimento líquido su-perior ao salário mínimo nacional nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, o

Estado assegura as prestações previstas naquela lei até ao início do efetivo cum-primento da obrigação. Esta prestação social, a cargo do Estado, encontra fundamento no direito das crianças à proteção, consagrado cons-titucionalmente (artigo 69º) que, como se explicita no preâmbulo do Decreto-Lei 164/99, de 13/5, não pode deixar de comportar a faculdade de requerer à sociedade e ao próprio Estado as pres-tações que proporcionem as condições essenciais ao seu desenvolvimento e a uma vida digna. Resultando da interpretação conjuga-da dos arts. 1º da Lei 75/98 , 2º e 4º, nº 5, do DL 164/99, conjugados com o nº 2 do art. 3º da citada Lei, que a obriga-ção a cargo do FGADM só se constitui com a decisão do tribunal, estando em causa a subsistência do menor, obvia-mente que, verificados os pressupostos da obrigação de prestar alimentos por parte do ausente progenitor, tal como impõe o preceituado pelo artº 2009, nº 1, al. c), do Código Civil, importa que se ultrapassem os formalismos processuais ou mesmos alguns princípios secun-dários que impedem a fixação desses alimentos. O STJ, no caso em apreço, subscre-veu a posição defendida neste tribu-nal no Acórdão proferido no processo 4.231/09.0TBGMR.G1.S1, de 12-7-11, segundo o qual “a natureza constitu-cional da obrigação de prestação de alimentos encontra expressão ordiná-ria, ao nível da tutela penal da violação da obrigação do credor de alimentos menor, com consagração no artigo 250º do Código Penal, e na específica compressão, em sede executiva, do próprio direito à sobrevivência condig-na do progenitor vinculado ao dever de prestar alimentos, desanexado, atento o referencial básico das necessidades fundamentais dos filhos menores, do

reSPoNSaBilidadeS PareNtaiS- Direito a alimentos

referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.03.2012Fonte: site do STJ – www.dgsi.pt

Resumos - juriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 33

valor do salário mínimo nacional, como reduto inexpugnável do devedor, mas que, inversamente, não releva como pressuposto negativo da intervenção do Fundo de Garantia de Alimentos De-vidos a Menores, ou seja, o requisito da “inexistência de rendimentos líquidos do alimentando superiores ao salário mínimo nacional”. Efetivamente, uma

das concretizações mais marcantes des-te direito fundamental dos filhos meno-res à prestação alimentar, por parte dos seus progenitores, encontra-se na ins-tituição pelo Estado de uma prestação social substitutiva, com vista ao reforço da proteção social dos menores caren-ciados, expressa no regime do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a

Menores, constante da Lei nº 75/98, de 19 de novembro, regulamentada pelo DL nº 164/99, de 13 de maio. Face ao exposto, o STJ julgou proceden-te o recurso do Ministério Público em representação da menor fixando em 100,00 € (cem euros) a prestação men-sal a título de alimentos devidos pelo pai, revogando-se o acórdão recorrido.

CoNtrato de traBalHo- Justa causa de despedimento

A decisão do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 29 de março de 2012, foi sumariada do se-guinte modo: “I - No âmbito do CT/2003, do elenco gradativo das sanções disciplinares aí previstas, o despedimento sem qual-quer indemnização ou compensação surge como a “ultima ratio”, reservada às situações de crise irreparável da relação jurídica de trabalho.Estes são os casos de justa causa de despedimento, com os contornos deli-mitados pela noção/cláusula geral esta-belecida no art. 396º, nº 1, preenchida por um comportamento culposo do trabalhador, violador de deveres estru-turantes da relação, que, pela sua gravi-dade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência do vínculo juslaboral, impossibilidade perspetivada enquanto inexigibilidade da sua manutenção.II - Na apreciação da inexigibilidade da manutenção do vínculo laboral, para além das circunstâncias que se mos-trem particularmente relevantes no caso, ponderam-se, com objetividade e razoabilidade, os fatores a que alude o nº 2 do art. 396º, aferindo-se a final a gravidade do comportamento em função do grau de culpa e da ilicitude, como é regra do direito sancionatório,

nela incluído necessariamente o prin-cípio da proporcionalidade, convoca-do aquando da opção pela adequada sanção disciplinar – art. 367º.III - O despedimento-sanção é a solu-ção postulada sempre que, na análise diferencial concreta dos interesses em presença, se conclua – num juízo de probabilidade/prognose sobre a viabi-lidade do vínculo, basicamente dirigido ao suporte psicológico e fiduciário que a interação relacional pressupõe – que a permanência do contrato constitui ob-jetivamente uma insuportável e injusta imposição ao empregador, ferindo, des-mesurada e violentamente, a sensibili-dade e liberdade psicológica de uma pessoa normal colocada na posição do real empregador.IV - No âmbito da relação laboral, tra-balhador e empregador têm de sedi-mentar a sua conduta no postulado ínsito no princípio geral da boa-fé e da mútua e leal colaboração na exe-cução do contrato, expressamente plasmado no art. 119º, em cujos ter-mos as partes, no cumprimento das respetivas obrigações, assim como no exercício dos correspondentes direitos, devem proceder de boa fé, devendo colaborar, na execução do contrato, no sentido da obtenção da maior produtividade e bem assim da

promoção humana, profissional e so-cial do trabalhador.V - A ideia de mútua colaboração – não obstante a coexistência latente de uma conflitualidade ôntica nas relações de trabalho – elaborada embora em con-texto histórico coevo do sistema corpo-rativo (vide art. 18º da LCT), continua a ser o suporte matricial dos deveres de zelo e diligência na realização do traba-lho, que impendem sobre o trabalhador, e que concretamente integram a panó-plia elencada no art. 121º [cfr. alíneas c) e g) do seu nº 1].VI - O contrato de trabalho, sendo “intui-tu personae”, pressupõe uma particular relação de confiança e de colaboração estreita, estando nele subjacente o credo nas qualidades de honestidade, lealdade e confidencialidade, funda-mentais para a consecução da finali-dade contratual, sendo que essa con-fiança nas qualidades da outra parte – embora de maior ou menor grau/intensidade consoante a correspetiva exigência fiduciária das funções confia-das – constitui sempre a “raiz indefetível e o pressuposto essencial e constante da relação”, pela óbvia razão de que a permanente proximidade e interação entre os dois protagonistas da relação implica consideráveis riscos de lesão recíproca: o trabalhador vê-se inserido numa organização dominada pelo em-pregador, ficando, por isso, exposto à potencial violação dos seus direitos; o empregador insere na sua organização

referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.03.2012Fonte: site do STJ – www.dgsi.pt

juriSPrudêNCia - ResumosVIDA JUDICIÁRIA - março 201234

produtiva alguém que pode causar-lhe prejuízos significativos.VII - É de afirmar a justa causa do despe-dimento quando está demonstrado que a trabalhadora – única pessoa, ao servi-ço da R., a exercer funções de controle de qualidade da atividade dos clientes desta – após realizar as respetivas visitas inspetivas aos mesmos, não elaborou, em tempo oportuno, os corresponden-tes relatórios, imprescindíveis à aprecia-ção a efetuar pelas entidades estatais competentes para o efeito; nessa situ-ação, no âmbito de uma reunião com a gerente da R., solicitou autorização para frequentar uma acção de formação e, perante o indeferimento dessa autoriza-ção, fundamentada na não elaboração dos referidos relatórios, saiu da referida reunião a cantarolar, entrando em situ-ação de baixa médica no dia seguin-te – baixa essa que se prolongou por mais de dois meses – e, ainda, face às solicitações da R. para disponibilizar os elementos necessários à elaboração dos respetivos relatórios por outro técnico, manteve uma conduta de indiferença.VIII - Este circunstancialismo afronta os deveres previstos nas alíneas a), c), d) e g) do nº 1 do art. 121º do CT/2003 e preenche a previsão constante do art. 396º, nºs 1 e 3, alíneas a), d) e m), do mesmo diploma legal, configurando inequivocamente um comportamento culposo e grave da A. que, em si e nas suas consequências, atingiu fatalmente o suporte psicológico da relação, não sendo justo nem suportável, no balanço dos interesses em presença, impor à R. empregadora a manutenção do vínculo juslaboral.”Neste recurso interposto junto do Tri-bunal do Supremo Tribunal de Justiça discute-se a seguinte matéria:- Aferir da (i)licitude do despedimento cominado enquanto fundado ou não em justa causa.No Acórdão recorrido considerou-se que – ante a situação objetiva de absoluta quebra de confiança na trabalhadora/A., única Técnica Supe-rior de Higiene e Segurança de que a R. dispunha para o exercício das funções que lhe estavam cometidas – se tornou

inexigível à empregadora a permanên-cia do contrato.A recorrente insurge-se tão-somente quanto à solução alcançada, a de que, afinal, não se verifica qualquer ilicitude de comportamentos e, por isso, ne-nhum dos fundamentos da ajuizada justa causa de despedimento. Sob a epígrafe ‘Segurança no empre-go’, a C.R.P. consagrou no seu art. 53º a garantia aos trabalhadores de que são proibidos os despedimentos sem justa causa, proibição que ora o art. 338º do revisto Código do Trabalho/2009 igual-mente proclama. Dispõe-se no 396º/1 do CT/2003 – em termos praticamente coincidentes com a noção antes constante do art. 9º/1 da LCCT e atualmente mantida no art. 351º/1 do CT/2009 – que constitui justa causa de despedimento o com-portamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequên-cias, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho. A relação juslaboral é tendencialmente duradoura ou de execução duradoura. A posição jurídica do empregador con-fere-lhe, enquanto titular da empresa um conjunto de poderes, incluído o disciplinar, que se manifesta na possibi-lidade de aplicação de sanções internas aos trabalhadores, seus subordinados, cuja conduta se revele desconforme com as ordens, instruções e regras de funcionamento da estrutura produtiva. Do elenco das previstas sanções disci-plinares (art. 366º/CT/2003), o despedi-mento sem qualquer indemnização ou compensação surge como a ‘ultima ra-tio’, reservada às situações de crise irre-parável da relação jurídica de trabalho. Estes são os casos de justa causa de despedimento, com os contornos de-limitados pela referida noção/cláusula geral, preenchida por um comporta-mento culposo do trabalhador, violador de deveres estruturantes da relação, que, pela sua gravidade e consequên-cias, torne imediata e praticamente impossível a subsistência do vínculo juslaboral, impossibilidade perspeti-vada enquanto inexigibilidade da sua

manutenção, como é entendimento doutrinal e jurisprudencial unânime, pacífico e reiterado. Na respetiva apreciação, para além das circunstâncias que se mostrem particularmente relevantes no caso, ponderam-se, com objetividade e ra-zoabilidade, os fatores a que alude o nº 2 do art. 396º, aferindo-se a final a gra-vidade do comportamento em função do grau de culpa e da ilicitude, como é regra do direito sancionatório, nela in-cluído necessariamente o princípio da proporcionalidade, convocado aquan-do da opção pela adequada sanção dis-ciplinar – art. 367º. O despedimento-sanção é a solução postulada sempre que, na análise dife-rencial concreta dos interesses em pre-sença, se conclua que a permanência do contrato constitui objetivamente uma insuportável e injusta imposição ao empregador, ferindo, desmesura-da e violentamente, a sensibilidade e liberdade psicológica de uma pessoa normal colocada na posição do real empregador.A conduta da A. assumiu claramente contornos de uma abordagem perversa do postulado ínsito no princípio geral da boa-fé e da mútua e leal colaboração na execução do contrato, expressamen-te plasmado no art. 119º (igualmente mantido no art. 126º do CT/2009), em cujos termos as partes, no cumprimen-to das respetivas obrigações, assim como no exercício dos corresponden-tes direitos, devem proceder de boa fé, devendo colaborar, na execução do contrato, no sentido da obtenção da maior produtividade e bem assim da promoção humana, profissional e social do trabalhador. No vínculo juslaboral a confiança nas faladas qualidades da outra parte cons-titui sempre a ‘raiz indefetível e o pressu-posto essencial e constante da relação’, pela óbvia razão de que a permanente proximidade e interação entre os dois protagonistas da relação implica consi-deráveis riscos de lesão recíproca.Ora, no caso em apreço, a A., tendo efetuado várias vistorias a empresas clientes da R. nos dias 21 a 23 e 26 de

Resumos - juriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 35

Fevereiro e nos dias 6 e 13 de Março, ambos de 2007, não se empenhou na elaboração subsequente dos corres-pondentes relatórios, que deveriam ser encaminhados ‘logo de seguida’, (tão rapidamente quanto possível) para as empresas vistoriadas. Sabendo que as empresas destinatárias devem apresentar no ISHST, impreteri-velmente até 30 de Abril de cada ano, os relatórios respetivos, cuja elaboração era também da responsabilidade da A., esta, não obstante, tinha acumulados (e ainda por elaborar, ao tempo) cerca de cem (100) desses relatórios. E apesar dessa relevante limitação a A., no dia 14 de Março de 2007, solicitou, ainda assim, autorização à gerente da R., na reunião havida nesse dia, para frequentar uma ação de formação so-bre ‘Ruído’. Essa pretensão foi indeferida em virtude de ainda não terem sido efetuados os relatórios das recentes vistorias, como sobredito, e também porque se estava em período de realização de relatórios anuais da atividade dos serviços de Se-gurança, Higiene e Saúde no Trabalho,

que as empresas têm que apresentar, como se disse, impreterivelmente até ao dia 30 de Abril, relatórios cuja elabora-ção era igualmente da sua responsabi-lidade, encontrando-se então cerca de cem (100) por elaborar.Perante isto – …e certamente por não ter aceitado bem o indeferimento da pretendida autorização para a frequên-cia da dita ação de formação/workshop – a A. saiu a cantarolar da referida reu-nião, havida com a gerente da R., E… entrou de baixa médica no dia se-guinte. … Baixa que, inicialmente por dez dias, foi prorrogada por mais 30 dias e depois de novo prolongada até 23.5.2007, in-clusive. A A., que era a única Técnica de que a R. dispunha e sabia que trabalho tinha que fazer, apresentou-se ao serviço a 24 de Maio de 2007. Face a este súbito e inesperado cenário, a R., em 28 desse mês de Março, embo-ra durante a baixa da sua trabalhadora, enviou à A. uma carta, a que a A. não respondeu. No cumprimento zeloso e diligente

das suas funções era-lhe exigível, nas descritas circunstâncias, outra con-duta, não sendo preciso ir mais longe para significar que, num quadro de normalidade, aferível pelo padrão ou critério geral do bom pai de família, deveria ter cumprido adequadamen-te os seus deveres funcionais, elabo-rando em tempo próprio os relató-rios sequentes às vistorias realizadas, aceitando, com urbanidade e sem retaliação, a negação de autorização para frequência do referido workshop, colaborando, com normal disponibili-dade, na realização alternativa dos re-latórios que a sua ausência, sem mais, inviabilizou. À luz do que acima se deixou dito aquando da análise da dimensão nor-mativa da noção constante do art. 396º/1, o cominado despedimento mostra-se proporcionado à gravidade do comportamento assumido pela A. É lícita, por isso, a sanção escolhida e aplicada pela R. Em conformidade com o exposto STJ negou a Revista e confirmar o Acórdão impugnado.

AUTOR: Joaquim Fernando Ricardo (Consultor de Empresas)

Páginas: 1440 PVP (Papel): € 45 PVP (eBook): € 30

Todos os Códigos Fiscais e extensa legislação complementar

DIREITO TRIBUTÁRIO

Versão Papel + eBookPACK ESPECIAL

14ª Edição - 2012

AP

VePAC

juriSPrudêNCia do STJ e das RelaçõesVIDA JUDICIÁRIA - março 201236

aSSuNto: Enriquecimento sem causa

referências: Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.3.2012

Fonte: site do TRL – www.dgsi.pt

Sumário: Findo um contrato que continha o consentimento da autora para a utilização comercial das gravações da sua voz – bem de personalidade patrimonial – que tinha feito para a ré, esta não pode continuar a fazer o aproveitamento económico dessas gravações, sob pena de enriquecimento injustificado no valor igual do da retribuição habitual.

acordam no tribunal da relação de lisboa

“A” intentou em 16/04/2009 a pre-sente ação contra a “B” Portugal – Co-municações Pessoais, SA, pedindo que esta seja condenada a retirar do “voice mail” da rede “BBB” quaisquer gravações e locuções contendo registos de voz da autora, bem como a não utilizar, repro-duzir ou divulgar as gravações e locuções contendo os registos de voz da autora sem prévio consentimento escrito desta, seja qual for o suporte, meio ou fim em causa; e ainda a pagar-lhe uma compen-sação em dinheiro, contabilizada à data da propositura da ação em 29.074,45€, a que devem acrescer as quantias pro-porcionais vincendas à razão anual de 8.113,80€, até que efetivamente sejam retiradas do “voice mail” da rede “BBB” quaisquer gravações ou locuções conten-do registos de voz da autora, e respetivos juros legais; por fim, a condenação da ré a pagar uma sanção pecuniária compulsó-

ria, a ser fixada pelo tribunal, em termos significativos, por cada dia de atraso no cumprimento da sentença condenatória que vier a ser proferida, quando aos dois primeiros pedidos.

Alega para o efeito que no exercício da sua profissão de atriz celebrou com a ré, em 25/09/2000, um contrato de prestação de serviços nos termos do qual se comprometeu a prestar serviços de locução e gravação em ações de informação sobre os produtos/serviços “BB”/”B”; o contrato tinha a duração de um ano e foi estipulada uma retribuição anual de 800.000$, acrescida de oferta de chamadas telefónicas; o contrato foi renovado por iguais períodos de 1 ano, por quatro vezes consecutivas, até 2005, tendo cessado a relação contratual, por mútuo acordo, em 05/09/2005; sucede que a ré, após a data da cessação do contrato, continuou a utilizar e a divulgar publicamente as locuções e gravações de voz efetuadas pela autora, mas sem lhe pagar qualquer contrapartida; a au-tora, em 22/08/2007, enviou uma carta registada com aviso de receção, em que considerava abusiva essa utilização e pretendia que a ré, num prazo máximo de 30 dias, retirasse os registos da sua voz do “voice mail” da rede “BBB”; a ré recusou, invocando que as cláusulas 3ª e 4ª do contrato legitimavam-na a utilizar e a reutilizar as locuções e gravações feitas nesse âmbito; a autora entende que, de acordo com os usos da profissão, todas as locuções têm um prazo de validade de um ano a partir da data da 1ª exibição ou 15 dias após a gravação e que, uma vez terminado tal prazo de validade, há lugar ao pagamento integral das peças (renovação dos direitos), sendo obrigatória a autorização antecipada do locutor em causa; entende, por isso, que a ré tem feito, com fins comerciais, uma

utilização abusiva da sua voz, por não ter o seu consentimento para o efeito, tendo enriquecido à sua custa, uma vez que não lhe paga qualquer contrapartida monetária.

A ré, citada a 20/04/2009, contestou alegando, em síntese, que efetivamente foi celebrado com a autora o referido con-trato que foi renovado por forma expressa por 3 vezes e que o mesmo não foi de novo renovado porque a autora rejeitou a proposta de aumento da remuneração; pagou à autora todos os serviços contra-tados; as renovações do contrato foram realizadas para permitir novas locuções e gravações e não para garantir a vigência de um consentimento; nos termos do contrato resulta claramente que o resulta-do das prestações da autora é da exclusiva titularidade da ré, pelo que a utilização das gravações efetuadas é absolutamente legítima, não havendo lugar a qualquer enriquecimento ilícito, nem ao pagamen-to de qualquer indemnização; no que respeita à declaração junta pela autora relativa aos pagamentos dos serviços de locução, refere que o mesmo não é parte integrante do contrato, além de ser uma declaração unilateral subscrita por várias pessoas, em que a autora não é uma delas, não podendo sequer ser considerado um indício de existência de usos ou da existência de uma profissão de locução, sendo certo que a autora afirma que a sua profissão é atriz; entende assim que a ação deve ser julgada improcedente.

Depois do julgamento, foi proferida sentença, julgando a ação improcedente e absolvendo a ré do pedido.

A autora recorre desta sentença – para que seja revogada e substituída por outra que condene a ré no pedido – terminan-do as suas alegações com as seguintes conclusões (que são sintetizadas neste acórdão):

direitoS de PerSoNalidade- Direito à voz – direitos de autor

juriSPrudêNCia do STJ e das Relações VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 37

i) O contrato dos autos não respeita a uma prestação de serviços qualquer, porque envolve a limitação voluntária de direito de personalidade, designadamente a autorização para uso da voz, que integra o núcleo do direito geral de personalidade, previsto no art. 70 do CC, constituindo manifestação do direito à palavra, consti-tucionalmente consagrado no art. 26/1 da Constituição da República (= CRP);

ii) tal limitação pode ser revogada a todo o momento (art. 81/2 do CC), pelo que é errado e inconstitucional o juízo da sentença recorrida de que as gravações efetuadas no âmbito do contrato são “propriedade” da ré, “conforme resulta do contrato”.

iii) Todos os contratos dos autos têm a duração de apenas um ano e por isso a limitação ao direito de personalidade não podia ultrapassar este prazo de duração:

iv) os contratos e os factos provados nada dizem sobre o prazo de validade da utilização da voz;

v) a renovação de direitos – 100% por cada ano de utilização - é uma componen-te da retribuição que não foi prevista nem afastada no contrato;

vi) os contratos não estipulam, nem se provou, qualquer cláusula ou acordo pré-vio que afastasse ou derrogasse os “usos da profissão” (facto 18 do probatório), segundo os quais a validade da utilização da voz é de 1 ano, e, findo esse prazo, há lugar ao pagamento integral das peças em causa, de 100% por cada ano, sendo obrigatória a autorização antecipada do locutor em causa; daí que os contratos tenham sido renovados anualmente;

vii) Estando comprovado que a ré continuou a utilizar e a reutilizar as locu-ções e gravações efetuadas pela autora além da vigência do contrato, apesar de ter conhecimento da expressa oposição da autora, é evidente que a ré agiu ilici-tamente, pelo que impende sobre a ré o dever de indemnizar a autora.

viii) A controvérsia da lide nada tem a ver com direitos autorais, desde logo porque a autora não se arroga “autora”, não invoca “criação inteletual” nem está em causa qualquer “obra”, na aceção dos arts 1 e seguintes do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, pelo

que a sentença não tem razão em relevar o facto de que “quando a autora assinou o contrato com a ré acordou que a pro-priedade do direito de autor das obras criadas ao abrigo desse contrato ficasse propriedade da ré”.

ix) A indemnização não decorre das regras da responsabilidade civil extra-contratual, mas do enriquecimento sem causa por intervenção (art. 473 do CC): verifica-se locupletamento indevido ob-tido pela ré, à custa do aproveitamento comercial das vantagens económicas decorrentes da utilização e exposição pública da voz da autora, no “voice mail” da rede “BBB”, sem qualquer contrapartida ou título legítimo, a partir de 05/09/2005 (data da cessação do contrato por mú-tuo acordo) ou pelo menos desde de 22/08/207 (data da oposição da autora), o que se traduz numa ingerência ilícita e injustificada nos direitos de personalida-de da autora.

x) A ré deve ser condenada a pagar à autora o valor correspondente à utilização e reutilização da voz da autora de que ilegitimamente beneficiou. Para efeitos do cálculo do enriquecimento e corres-petiva indemnização, deverá ter-se em conta a matéria provada sobre os usos da profissão, de acordo com o art. 1158/2 do CC, bem como o valor da soma da retribuição anual acordada, em dinheiro e em espécie, perfazendo 8113,80€/ano.

A ré contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso, dizendo, em síntese, o seguinte:

a) não existe qualquer ofensa a um direito de personalidade da autora, já que o que esta pretende é o reconhecimento de um direito com natureza patrimonial (regular e perpétuo);

b) a autora consentiu a fixação da voz pelo que não há violação do seu direito de personalidade;

c) aliás, ninguém sabe que é a voz da autora nas gravações em causa;

d) o contrato celebrado pela autora não limita a sua capacidade de utilizar a sua voz, pelo que não é aplicável a possi-bilidade de revogação do art. 81/2 do CC;

e) se estivesse em questão um filme publicitário onde a autora tivesse consen-tido na utilização da sua voz e imagem, a

autora poderia interromper a sua utiliza-ção pela ré?;

f ) o contrato encerra um con-sentimento vinculante, irrevogável unilateralmente (cita neste sentido Capelo de Sousa, “O direito geral de personalidade”, Coimbra, 1995, págs. 244, 410 e 220, nota 446), sob pena de incumprimento contratual (com direito de indemnização);

g) as gravações de voz, que se distin-guem da voz da autora, são propriedade da ré;

h) a voz da autora não é objeto do contrato, o que é objeto é a gravação da voz;

i) as gravações da voz não são obras, mas a proteção que a autora pretende é superior à que as obras teriam, pois que pretende uma remuneração adicional à remuneração prevista no contrato;

j) não é aplicável o regime dos “publi-city rights” porque os serviços prestados pela autora em momento algum tiveram como pressuposto a sua (hipotética) celebridade;

k) as sucessivas renovações do con-trato foram realizadas para permitir novas locuções e gravações;

l) nada no contrato indicia que a utili-zação pela ré está limitada pela vigência do contrato; a clª 4ª indicia que a utilização não está sujeita a qualquer prazo;

m) a referência aos usos não é rele-vante para o caso concreto porque existe contrato;

n) não existe enriquecimento sem causa porque existe uma causa que é o contrato e porque o serviço prestado pela autora já foi remunerado.

Questões que importa resolver: se, de-pois de findo o contrato celebrado entre ambas, a ré podia ter continuado a utilizar para os seus fins lucrativos as gravações de voz feitas no decurso do mesmo; e se se concluir que não o podia fazer, fica por saber quais as consequências desse aproveitamento.

Factos provados:1. A autora é atriz de teatro, cinema

e televisão.2. No exercício da sua profissão, a

autora tem participado em diversos tra-

juriSPrudêNCia do STJ e das RelaçõesVIDA JUDICIÁRIA - março 201238

balhos de interpretação, representando, recitando e fazendo locuções de textos.

3. A ré é uma operadora de telefonia móvel, incluindo as redes de telemóvel “B” e “BBB”.

4. No dia 25/09/2000, por contrato escrito, a autora e a ré celebraram reci-procamente, pelo prazo de um ano, um contrato de prestação de serviços, pelo qual aquela se comprometia a prestar serviços de locução e gravação em ações de informação sobre os produtos/serviços “BB”/”B”.

5. Na cláusula 8º desse contrato foi estipulado que “o presente contrato tem a duração de um ano”.

6. Em execução do contrato, a autora fez diversas locuções e gravações que integram o acervo de voz difundido no “voice mail” da rede “BBB”.

7. Tais locuções e gravações consis-tiam na fixação em suporte áudio da leitura de algarismos e de diversas frases padronizadas, tais como frases para te-lemóvel, atendimento telefónico, “spots” para telefone e gravações de “voice mail” em geral.

8. Em contrapartida dos serviços previstos no contrato, foi estipulada uma retribuição anual em dinheiro no valor de 800.000$, pagável em três prestações, acrescida da oferta de chamadas ilimita-das para a rede “B” e de 100 minutos por mês para outras redes.

9. A componente da retribuição em oferta de chamadas tem, atualmente, o valor mensal de 51,15€, a que correspon-de uma retribuição anual em espécie, no valor de 613,80€.

10. O mesmo contrato foi renovado por iguais períodos de 1 ano, de Outubro de 2001 a Setembro de 2002, mediante o pagamento da remuneração anual de 1.500.000$; de Outubro de 2002 a Setembro de 2003, mediante o paga-mento da remuneração anual de 7.500€; de Outubro de 2003 a Setembro de 2004, mediante o pagamento da remuneração anual de 7.500€; de Outubro de 2004 a Se-tembro de 2005, mediante o pagamento da remuneração anual de 7.500€.

11. As renovações do contrato foram realizadas para permitir novas locuções e gravações.

12. No início de Setembro de 2005, foi comunicado pela ré à autora que deixara de existir interesse na renovação do con-trato e neste contexto as partes decidiram reciprocamente cessar o contrato.

13. A relação contratual entre as par-tes extinguiu-se por mútuo acordo em 05/09/2005, data do último recibo verde passado pela autora, o qual foi enviado à ré por carta registada com aviso de receção.

14. Para além da cessação do contrato, a ré continuou a utilizar e a divulgar as locuções e gravações de voz efetuadas pela autora, constantes do acervo de voz do “voice mail” da rede “BBB”, o que fez e continua a fazer no âmbito da sua ativi-dade comercial, com fins lucrativos, não pagando à autora qualquer contrapartida por essa utilização e divulgação.

15. Inconformada com esta situação, a autora enviou à ré carta registada, com aviso de receção de 22/08/2007 em que lhe comunicou que considerava aquela utilização abusiva e para no prazo máxi-mo de 30 dias retirar os registos da sua voz do “voice mail” da rede “BBB”.

16. Por carta de 29/11/2007, a ré recu-sou o pedido da autora, com o fundamen-to que “procedemos à análise cuidada de ambos os contratos de prestação de serviços acima referidos, tendo concluído que os mesmos, nomeadamente nas suas cláusulas terceira e quarta, legitimam a “B” a utilizar as locuções e gravações efetua-das nesse âmbito”.

17. Apesar de ter conhecimento da expressa oposição da autora, a ré, até à presente data, continua a utilizar e a reuti-lizar as locuções e as gravações efetuadas por aquela.

18. De acordo com os usos da pro-fissões, as locuções em que não exista uma negociação/contrato prévios têm o prazo de validade de um ano a partir da data da primeira exibição ou 15 dias após a gravação e, findo esse prazo, há lugar ao pagamento integral das peças em causa, de 100% por cada ano, de acordo com a tabela de locuções, sendo obrigatória a autorização antecipada do locutor em causa.

Ao abrigo dos arts. 659/3 e 713/2, ambos do CPC, transcrevem-se ainda

algumas das cláusulas do contrato em causa nos autos (a 1ª por ter interesse para a decisão das questões postas, as duas últimas por lhe serem referidas nos factos e nas alegações):

Clª 2ª (Exclusividade temporária e parcial)

A autora desde já se obriga a não pres-tar, a entidades direta [ou indiretamente] concorrentes da ré (telecomunicações e afins/móveis), e pelo período de duração do presente contrato (um ano), serviços de locução e gravação em ações de publi-cidade ou informação sobre [de] produ-tos/serviços [concorrentes] que envolvam a audição da sua voz e/ou visualização da sua imagem pelo público em geral.”

Clª 3ª (Locuções e gravações)1. A forma e respetivo conteúdo a dar

às ações em que intervenha a autora ao abrigo do presente contrato serão da ex-clusiva escolha e responsabilidade da ré.

2. A autora manter-se-á à disposição da ré, nos locais e datas por esta indica-dos, mediante planeamento prévio para efetuar as locuções / gravações que lhe forem solicitadas no âmbito do presente contrato.

3. A autora desde já se obriga a pres-tar, por um preço fixo mencionado na clª 5ª infra, até 10 horas de gravação por mês.

4. As horas de gravação mensais que, por qualquer motivo não sejam utilizadas, poderão sê-lo no(s) mês(es) seguinte(s), a critério da ré, nunca excedendo o termo do presente contrato.

Clª. 4ª (Direitos de Autor)A titularidade do direito de autor

relativo às obras eventualmente criadas ao abrigo do presente contrato pertence exclusivamente à ré.

A construção da sentença é a se-guinte:

“Dúvidas não existem, quer na doutri-na, quer na jurisprudência, que o direito à voz integra o núcleo do direito geral da personalidade que tem acolhimento no art. 70 do CC e art. 26/1 da CRP. Tal como é referido no ac. do TRP de 12/11/2008, com o nº convencional JTRP00041859, in www.dgsi.pt ‘(…) Os direitos de perso-nalidade são direitos absolutos, prevale-cendo, por serem de espécie dominante, sobre os demais direitos, em caso de

juriSPrudêNCia do STJ e das Relações VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 39

conflito, nomeadamente sobre o direito de propriedade e o direito ao exercício de uma atividade comercial. Aqueles direitos (de personalidade) pela sua própria natu-reza, sobrelevam os direitos de conteúdo económico, social e cultural (P. Lima – A. Varela, CC Anot, 4ª ed, pág. 104, Jorge Mi-randa, Manual de Direito Constitucional, IV, págs. 145-146, J. Gomes Canotilho, RLJ, 125, 538, acs. do STJ, BMJ, 406/623, 435/816, 450/403, CJ, Ano II, II/54, Ano III, I/55, Ano VI, II/76 e III/77)(…)’.

Por outro lado, à responsabilidade por ofensas à personalidade é aplicável, em termos gerais, o disposto nos arts 483 e seguintes do CC (nesse sentido, vide ac. do TRL de 01/06/2006, [10554/2005-6] in www.dgsi.pt e ac do TRP de 15/10/2007, com o nº convencional JTRP00040694, in www.dgsi.pt).

[…] a conduta da ré ao utilizar as gravações já efetuadas não consti-tuem qualquer conduta ilícita, pois está a utilizar as gravações efetuadas no âmbito do contrato e que são sua propriedade, conforme resulta desse mesmo contrato.

Por outro lado, ao celebrar este con-trato, a própria autora comprometeu-se a prestar um serviço em que utilizou a sua voz, dispondo assim desse seu direito.

Estamos no âmbito contratual em que há coincidência entre a prestação a que a autora se obrigou e um seu direito de personalidade, neste caso, a utilização da sua voz. E como contrapartida dessa prestação, a autora foi remunerada.

Também quando a autora assinou o contrato com a ré e acordou que a pro-priedade do direito de autor das obras que criadas ao abrigo desse mesmo con-trato ficasse propriedade da ré, aceitou que o respetivo direito de personalidade fosse limitado, mediante uma contrapar-tida em dinheiro.

Questão diferente seria a utilização da voz da autora em gravações que tivessem sido efetuadas fora do âmbito deste con-trato, pois aí não haveria qualquer dúvida que [a ré] não poderia utilizar as mesmas sem que a tal utilização correspondesse uma remuneração e desde que obtives-se o consentimento da autora. Aí sim, serviria de referência a tabela de preços

elaborada para este setor da comunica-ção e nos termos aí descritos.

i - do objeto do contrato – da voz…Sugere a ré que a questão se reduz ao

facto de a autora querer mais dinheiro, querer receber uma remuneração per-pétua… ou “ad eternum”.

Poderia dizer-se que, pelo contrário, a questão se reduz ao facto de a ré querer utilizar perpetuamente a voz da autora sem pagar mais nada…

A fundamentação da ré, seguida pela sentença, resume-se, no essencial, à afirmação de que, pagando por elas, ficou proprietária das gravações efetu-adas pela autora durante a duração do contrato. Tal como se se tratasse de uma das modalidades dos contratos de pres-tação de serviço, a empreitada: aquilo que foi produzido pela autora passou a ser da ré, que poderia fazer do bem o que quisesse (arts. 1207 e 1212, ambos do Código Civil).

A autora chama a atenção para a par-ticularidade do objeto do contrato: a sua voz, um bem da sua personalidade. Não é uma coisa que possa ser transmitida.

ii- … não só a vozDe resto, em relação a algumas das

objeções postas pela ré, diga-se que não era só a voz da autora que estava em causa nos contratos.

Note-se o teor da cláusula 2ª dos contratos: dela resulta que não está só em causa a voz da autora, porque, para além disso, a autora se obrigou a não prestar, a entidades direta [ou indireta-mente] concorrentes da ré e pelo período de duração do presente contrato (um ano), serviços de locução e gravação em ações de publicidade ou informação sobre produtos/serviços concorrentes que envolvessem a audição da sua voz e/ou visualização da sua imagem pelo público em geral.

Perante isto não pode deixar de se entender que a voz da autora não foi contratada só como voz e como uma qualquer voz, mas por ser uma voz que seria reconhecível como a voz de uma concreta pessoa, pessoa de cuja imagem a ré também pretendia ter o exclusivo.

Dito de outro modo: no caso bem se pode admitir a ideia da “imagem sonora” de que fala Maria Dolores Palacios Gon-zález, “La cesión de derechos de imagem”, AC (2004), págs. 469-482 (471), citada por David de Oliveira Festas (Do conteúdo pa-trimonial do direito à imagem. Contributo para um estudo do seu aproveitamento consentido e inter vivos, Coimbra Edito-ra, 2009, pág. 50, nota 129, embora em discordância com a ideia da autora, que também será da jurisprudência do Tribu-nal Constitucional Espanhol, de ampliar o conceito de imagem de modo a abranger todos os atributos que permitam a iden-tificação da pessoa).

Como diz Francisco de P. Blasco Gascó, Catedrático de Derecho Civil Uni-versitat de València: “De hecho, alguna sentencia y el propio art. 7-6 LO 1/1982, enumera, junto con la imagen […], la voz y el nombre. Esto es así porque, al final, lo que se protege es la individualidad de cada una de las personas y dicha individualidad normalmente se corres-ponde con la imagen, pero también con la voz (como sucedía con el famoso y fallecido ator y cantante italo-americano, conocido precisamente como “the voi-ce”) Algunas cuestiones del derecho a la propia imagen (pág. 27, consultado em http://www.derechocivil.net/esp/ALGUNAS%20CUESTIONES%20DEL%20DERECHO%20A%20LA%20PROPIA%20IMAGEN.pdf, a 27/02/2012).

O que, diga-se, permitiria a aplicação do art. 79/1 do CC (referido abaixo) de for-ma direta e já não apenas por analogia.

iii - da pretensão da autoraNão está em causa, nestes autos, a

utilização que a ré fez, durante o período do contrato, das gravações efetuadas pela autora durante esse período. A au-tora não põe em causa a licitude dessa utilização, nem quer mais dinheiro por essa utilização, nem diz que se verificou qualquer violação dos seus direitos du-rante esse período. O que está em causa é saber se a ré, depois de findo o contrato, pode continuar a utilizar – aproveitando-se para os seus fins lucrativos (facto 14) - as gravações da voz da autora, efetuadas durante o período do contrato.

juriSPrudêNCia do STJ e das RelaçõesVIDA JUDICIÁRIA - março 201240

iV- da propriedade das gravaçõesA ré, para concluir por essa possibili-

dade, defende que com o contrato adqui-riu a propriedade dessas gravações e por isso pode fazer delas o que bem entender. E o mesmo defende a sentença recorrida.

Com esta argumentação, por um lado, confunde-se o direito de propriedade das coisas que incorporaram a voz da autora – os registos dessas, voz eventualmente em CD –, com o direito ao aproveitamento económico da voz da autora.

Se é verdade que a ré é proprietária daqueles suportes e pode fazer deles o que quer, já não é assim quanto ao aproveitamento económico do que neles foi fixado: a voz da gravação. Se alguém compra um CD com uma grava-ção sonora, pode-o ouvir quando quiser, ou pode-o deitar fora. Mas ninguém se lembraria de dizer que esse alguém pode (licitamente) reproduzir esse CD e vender os CD que obtiver com essa reprodução.

Como lembra Paulo Mota Pinto, “A limitação voluntária do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada”, em “Estudos em Homenagem a Cunha Rodri-gues”, Coimbra Editora, vol. II, 2001, pág. 555, nota 60: “[…] não se deve confundir o direito (de personalidade) à imagem com os direitos incidentes sobre a sua corporização num determinado suporte (filme, negativo fotográfico, impressão ou suporte informático) […]”. No mesmo sentido, veja-se David de Oliveira Festas, obra citada, nota 1258, pág. 359. Parafra-seando esta nota, dir-se-ia que uma coisa é a voz, outra é a gravação da voz e ainda outra o suporte dessa gravação; objeto do direito à voz é a voz e a gravação da voz e não o suporte em si; o negócio que incida sobre o suporte não é um negócio sobre a voz nem sobre a gravação da voz.

Tal como “se um desportista cele-bra um contrato com uma sociedade nos termos do qual esta é autorizada a utilizar um seu retrato em cromos que serão colocados em cadernetas alusivas a determinados eventos desportivos (v. g. campeonatos), não se exige o consen-timento do atleta para todo e qualquer ato de disposição sobre os cromos em que venha retratado” (David de Oliveira Festas, obra citada, nota 994, pág. 276).

A verdade, no entanto, é que os factos provados não permitem, seja de que modo for, concluir que a ré tenha adquirido a propriedade das gravações da voz da autora.

Designadamente que o tenha feito por força da cláusula 4ª do contrato.

V - da cláusula 4ª do contratoDiz a ré que “a ‘construção’ da autora

baralha direitos de personalidade, direitos de autor / conexos e “publicity rights” para sustentar um pedido que não tem qualquer sustentação legal.” A verdade é que é a ré que, ao invocar a cláusula 4ª dos contratos, traz à liça a questão dos direitos de autor e da propriedade das gravações sem qualquer razão.

A cláusula 4ª do contrato não tem nada a ver com as questões que os autos colocam, pois que apenas se reporta à eventualidade de virem a ser criadas, ao abrigo dos contratos, “obras” (no sentido de obras de direito de autor) e, para essa eventualidade, consigna-se que a titula-ridade do direito de autor relativo a essas obras pertencerá exclusivamente à ré.

Como não está em causa a criação de qualquer “obra”, ou a titularidade de qualquer “obra”, a questão não se coloca.

Mas a invocação desta cláusula serviu à ré para estabelecer a confusão com a questão da propriedade das gravações, levando a que a própria sentença se sirva do teor desta cláusula para falar, tal como a ré, na propriedade das gravações.

Sem qualquer razão como se vê.Aliás, esta cláusula pode ser invocada

em sentido contrário: a eventualidade da criação de obra, também revela a especia-lidade do objeto deste contrato de presta-ção de serviços. Dado o particular objeto deste contrato – a “imagem sonora” da autora –, era possível que da atividade da autora pudesse resultar uma “obra”…

Vi - do contrato não podia ter resultado a transmissão da propriedade da voz ou das gravações da voz:

Dada a especial natureza do objeto do contrato, “do consentimento para o aproveitamento económico da voz de-corre [apenas] uma situação creditícia,

independentemente de a autorização concedida ser exclusiva […]” (David de Oliveira Festas, obra citada, pág. 364, ou conclusão 49, na pág. 431).

A voz é um atributo ou bem de per-sonalidade, como o disse a sentença e a ré o reconhece. Bem de personalidade que, desde logo, não é uma coisa (Da-vid de Oliveira Festas, obra citada, pág. 66: “A literatura portuguesa viria, salvo raras exceções, a excluir os bens de per-sonalidade do universo das coisas”; ver ainda págs. seguintes e especialmente pág. 72).

Sendo um bem de personalidade e por isso também objeto de um direito fundamental (art. 26/1 da CRP) não pode ser transmitido, nem renunciado. Apenas pode ser limitado no seu exercício (art. 81/1 do CC) (neste sentido, Paulo Mota Pinto, A limitação…, págs. 527 e segs, espec. pág. 527 e 554/555: “não existindo uma verdadeira transmissão do direito, ou de faculdades jurídicas que o integram, para o beneficiário da autorização – pois o consentimento não tem eficácia real translativa desse direito, o qual é, aliás, como começamos por referir, intrans-missível”).

Como diz David de Oliveira Festas, obra citada, págs. 69, 71, 290 a 298, 352 a 364 e 411 (: “devem considerar-se nulos os atos de renúncia ou de transmissão do direito à imagem por contrariedade à dignidade humana e aos princípios da ordem pública [art. 26 da CRP e 81/1]).

Aliás, é esta intransmissibilidade do direito que levou a que o STJ, no famoso caso dos cromos “da” Panini considerasse que esta não tinha qualquer direito à imagem dos jogadores, ou melhor, na lógica da argumentação do STJ, ao retrato deles (págs. 343 a 350, da obra de David Oliveira Festas; o acórdão é de 08/11/2001 e está publicado na CJ.STJ.2001.III, págs. 113 a 115 e na base de dados do ITIJ sob o nº. 01B2853; o ac. do TRL de 18/12/2007 (7379/2007-2) discute, com um voto de vencido não publicado, a questão da aplicação da fundamentação deste acór-dão, mas no caso deste último acórdão [da relação de Lisboa] os autores eram os próprios jogadores/titulares do direito à imagem).

juriSPrudêNCia do STJ e das Relações VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 41

Vii - do conteúdo patrimonial do direito à voz

Para além de um bem de personali-dade, a voz, tal como a imagem, é objeto de um direito de personalidade que tem conteúdo patrimonial {David de Oliveira Festas, obra citada, págs. 55, 60/61, nota 167, págs. 71, 74, 75, nota 215, págs 85 a 139 e 416 a 421); embora este autor se esteja a referir ao direito à imagem, logo adverte (nota 10, pág. 20) que as refle-xões expostas relativamente ao direito à imagem podem ser, em determinados aspetos, transpostas para outros direitos de personalidade (nome e voz) e antes tinha reconhecido a natureza semelhante destes bens de personalidade (vejam-se também as págs. 116, 203 e 204). Este mesmo autor, mais à frente, pág. 62, refere que não é possível separar o apro-veitamento económico da imagem dos valores pessoais associados à imagem, e em nota, 170, completa: trata-se de um aspeto central e que tem sido defendido por diversos autores relativamente ao direito à imagem, mas também a outros direitos de personalidade patrimoniais [sendo que estes são sempre exemplifica-dos apenas com a imagem, voz e nome, que são os direitos de personalidade que dizem respeito à identificação da pessoa na comunidade, tendo um conteúdo pa-trimonial elevado: págs. 77 e 116]}.

Reconhecendo o conteúdo patrimo-nial de alguns direitos de personalidade, veja-se:

Paulo Mota Pinto, “A limitação…”, págs. 551 e segs; e também Interesse contratual negativo e interesse contratual positivo, Coimbra Editora, Dez2008, págs. 1594 a 1603, especialmente pág. 1595, nota 4584: “Cumpre notar, aliás, que se verifica um crescente reconhecimento de uma dimensão patrimonial em muitos destes direitos de personalidade […] em correspondência com uma prática social corrente. E não cabe, a nosso ver, argu-mentar contra esta ‘comercialização’ com a natureza pessoal dos interesses protegi-dos pelos direitos de personalidade, pois tal não exclui uma concomitante vertente patrimonial. Antes pelo contrário […]”.).

Menezes Leitão, “O enriquecimento sem causa no direito civil”, “Cadernos de

Ciência e Técnica Fiscal”, Lisboa, 1996, págs. 748/749: “não pode deixar de se considerar que se verificou uma evolução das conceções da sociedade no sentido da função económica dos direitos de personalidade e do valor representado pela sua comercialização [...] Não parece […] que se justifique negar a aplicação do enriquecimento sem causa nestes do-mínios, uma vez que esta pode aparecer como o único meio adequado de reagir contra a intervenção nesses direitos de personalidade, que se reconduza a um seu aproveitamento económico por par-te do seu interventor”. Júlio Gomes, “O conceito de enriquecimento, o enriqueci-mento forçado e os vários paradigmas do enriquecimento sem causa”, Porto, 1998, pág. 220: “Na sociedade moderna, parece evidente que certos direitos de persona-lidade, por exemplo, o direito à imagem, têm conteúdo económico”.

Para além destes autores, David de Oliveira Festas refere ainda (obra citada, págs. 125 a 127, notas 410 a 412 e págs. 416 a 421): Morais de Carvalho, Mer-chandising de marcas, págs. 57 e segs e 66 segs; Cláudia Trabuco, Dos contratos relativos ao direito à imagem, págs. 458: “aspetos patrimoniais e não patrimoniais que o compõem”; Menezes Cordeiro, Tra-tado de Direito Civil português, I, tomo III, págs. 97/98 [também 106], de quem terá sido tirada a expressão “direito de per-sonalidade patrimonial”; e Carlos Olavo, Propriedade industrial, vol. I, pág. 235: a relevância patrimonial não é […] incom-patível com os direitos de personalidade”.

Viii - do exclusividade do conteúdo patrimonial

Conteúdo patrimonial que pertence em exclusivo ao seu titular. É o que decor-re do art. 79/1 do CC (David de Oliveira Festas, obra citada, págs. 54, 61, 115, 124 a 137 e 289 a 291), norma que, embora se refira apenas a um dos direitos de personalidade patrimoniais (imagem), é aplicável, por analogia, a todos eles (ou seja, também à voz e nome). Assim, David de Oliveira Festas, obra citada, nota 223 da pág. 78, admite expressamente a apli-cação analógica do art. 79 (ver também págs. 85 e 128).

O artigo 79 só fala do direito à imagem porque, à data da sua elaboração, os pro-blemas do tipo que estão em causa nestes autos só se colocavam quanto ao direito à imagem e não porque entre a voz e a imagem exista uma diferença substancial que justificasse que a solução normativa em causa não se aplicasse àquela. David de Oliveira Festas (obra citada, pág. 204) lembra que, mesmo nos EUA, o âmbito de protecção do right of publicity – referido pela ré – apenas será estendido à voz por um acórdão de 1988.

Veja-se também Rabindranath V. A. Capelo de Sousa, “O direito geral de perso-nalidade”, Coimbra Editora, 1995, nota 562 da pág. 247, que diz: “A voz é não apenas um dos atributos extrínsecos de qualquer pessoa, que a identifica e individualiza, mas também um elemento intrínseco da personalidade, uma qualidade físico-espiritual, dotada de criatividade e de originalidade”. E logo a seguir acrescenta, num evidente paralelo com o que consta do art. 79/1 do CC: “Assim, ninguém pode, sem motivo justificado, fixar, difundir ou dispor da voz de outrem, cantada ou fala-da” (ver também nota 818, págs. 324/325).

No mesmo sentido, veja-se Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Por-tuguês, I, tomo III, 2007, 2ª edição, pág. 236: “a palavra humana também pode ser gravada e reproduzida. Ela tem cara-terísticas que permitem reportá-la a uma determinada pessoa e, apenas, a ela […] A utilização da gravação pode […] afrontar direitos patrimoniais legítimos. […] Ne-nhuma dificuldade existe em extrapolar, com base no art. 70 ou, se necessário, do art. 79, por analogia, um direito à palavra”

E ainda Maria do Rosário Palma Rama-lho, “O direito à imagem do desportista, notas breves”, publicado nos “Estudos em homenagem no centenário do nas-cimento do Prof. Doutor Paulo Cunha”, Almedina, 2012, pág. 792, nota 3, cita esta passagem da obra de Menezes Cordeiro, numa clara aceitação da ideia [da aplica-ção, pelo menos por analogia, das regras do art. 79].

No Código Civil de Macau, que tem sido objeto de tratamento frequente pela doutrina portuguesa (veja-se por exemplo Paulo Mota Pinto, “Os Direitos de

juriSPrudêNCia do STJ e das RelaçõesVIDA JUDICIÁRIA - março 201242

Personalidade no Código Civil de Macau”, BFDUC 2000, págs. 205 a 250, especial-mente págs. 246 a 248), o art. 80/5 diz que o disposto relativamente ao direito à imagem “é aplicável, com as necessárias adaptações, à captação, reprodução e divulgação da palavra de uma pessoa” (citado através da nota 223 da obra de Pedro de Oliveira Festas).

Por sua vez, o art. 7/2e) do Código da Publicidade, aprovado pelo Dec.-Lei 330/90, de 23/10 (já com 13 alterações, de que o sítio da PGD de Lisboa dá conta), proíbe, nomeadamente, a publicidade que “utilize, sem autorização da própria, a imagem ou as palavras de alguma pessoa”.

iX - da situação creditícia resultante do contrato

Assim, dada a natureza de bem de personalidade intransmissível, com um conteúdo patrimonial pertença exclusiva do seu titular, do contrato em causa não pode ter resultado a transmissão do direi-to à voz, mas apenas um consentimento para o aproveitamento económico, pela ré, do direito à voz da autora.

Esse consentimento, através do con-trato, traduz-se na limitação do exercício do direito à voz, limitação prevista no art. 81/1 do CC. Ou seja, “a limitação ao exercício do direito à imagem [no caso, à voz] e o seu aproveitamento económico são efetuados através de um instrumento jusprivatista vocacionado para a nego-ciação relativa a bens intransmissíveis e irrenunciáveis: o consentimento” (David de Oliveira Festas, obra citada, pág. 411).

Dito de outra perspetiva, tendo em vis-ta o que é dito na 1ª parte da conclusão d) das contra-alegações da ré, “qualquer dis-posição relativa ao retrato [no caso: à voz] de uma pessoa surge, efetivamente, como uma limitação ao direito à imagem [no caso: à voz]. O art. 81 será, assim, aplicável” (Menezes Cordeiro, obra citada, pág. 238]

X - Necessidade de o consentimento ter um âmbito estritamente delimitado

Por isso, num contrato que o tenha por objeto, a concessão de poderes (atra-vés do consentimento vinculante, que a ré refere através de Capelo de Sousa, mas

que virá de Orlando de Carvalho, “Teoria Geral de Direito Civil, Sumários desen-volvidos”, Coimbra 1981, pág. 183, Paulo Mota Pinto, “A limitação…”, págs. 537/539, nota 52, e págs. 551/553, ou em Interesse contratual negativo e interesse contra-tual positivo, Coimbra Editora, Dez2008, págs. 1594 a 1603, em que já discute a crítica desta classificação na obra de David de Oliveira Festas, págs. 323 a 325 e nota 1312, págs. 374/375, e nota 1346, págs. 385/386) para o aproveitamento económico da voz tem de ser delimitada rigorosamente, designadamente através de limites temporais e do fim para que a concessão foi feita

Como diz David de Oliveira Festas, obra citada, págs. 289 a 298 e 318 a 328, especialmente págs. 326/327: “Como princípio geral, pode dar-se por assente que o objeto do consentimento, consi-derado nas suas diferentes perspetivas, deve ser determinado ou ser, pelo menos, determinável (art. 280/1). Parece-nos inadmissível um consentimento ilimitado, equivalente, em termos práticos, a uma renúncia ao direito à imagem.”.

Como exemplos, veja-se o que este autor escreve mais à frente (nota 1092, pág. 307): “qualquer negócio jurídico que tenha por objeto o aproveitamento económico da imagem de um recém-nascido que contenha uma obrigação que o vincule depois da maioridade (e mesmo durante um largo período de tempo), deve ter-se por nulo por ofensa à ordem pública ou aos bons costumes (arts. 81/1 e 280/2). Pense-se nomeada-mente num negócio jurídico nos termos do qual os pais acordem que a imagem do seu filho de um ano estará pelo período de 16 anos associada à comercialização de uma determinada marca de equipamento desportivo”. Um contrato em que essa determinação temporal não constasse, ou não pudesse ser feita, seria nulo (arts. 81/1 e 280/1, ambos do CC). Assim, Paulo Mota Pinto, “A limitação…”, pág. 546, julga que “o acordo ou o consentimento deve ter um âmbito estritamente delimitado, isto é, referido apenas a certos factos, delimitáveis material, temporalmente e espacialmente”).

Ou, dito de outro modo, um contrato

que se traduzisse no direito de a ré utilizar economicamente a voz da autora, perpe-tuamente, seria o equivalente à renúncia, parcial, da autora, ao mesmo direito, e por isso nulo (David de Oliveira Festas, obra citada, págs. 320/321 e 326; este autor ad-mite um negócio sem termo, desde que esteja salvaguardada a possibilidade de denúncia a todo o tempo, para qualquer uma das partes [nos termos gerais que valem para qualquer negócio jurídico de duração indeterminada] nota 1146, pág. 326 – note-se que não é o caso dos autos, em que o contrato tinha termo e de qualquer modo foi entretanto revogado por mútuo acordo).

Xi - a determinação resulta ainda da finalidade da utilização.

David de Oliveira Festas (obra citada, pág. 327, nota 1151), referindo-se à fina-lidade da utilização, diz: “trata-se de um aspeto particularmente importante. O consentimento está associado a um de-terminado fim, e a utilização económica do retrato para um fim diverso daquele que (expressa ou tacitamente) resulta do consentimento do titular configura um ato ilícito e inadmissível. Neste contexto são diversos os autores germânicos que defendem, com bons resultados, uma aplicação analógica da teoria oriunda do direito de autor da ‘Zweckübertragung’, no sentido de que o titular do direito só dispõe da sua imagem na medida em que tal seja exigido pela finalidade do contrato que lhe subjaz ou no qual se enquadra”.

No caso paralelo das fotografias, tem-se entendido, corretamente, que o consentimento prestado para um dado fim não pode ser utilizado para outros fins. Se A consente em posar numa sessão fotográfica para a ilustração da capa de um álbum, esse consentimento não pode ser utilizado para a divulgação da imagem do A em cartazes com outros fins. É o caso tratado no ac. do TRL de 28/09/2004 (1086/2003-7 da base de dados do ITIJ), citado por David de Oliveira Festas, obra citada, nota 1152 da pág. 328.

O mesmo vale para o consentimento contido num contrato. Vale para os fins desse contrato e não para nenhuns outros e enquanto o mesmo vigorar.

juriSPrudêNCia do STJ e das Relações VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 43

Xii - aquilo que a ré não pode ter adquirido pelo contrato

Serviu isto tudo para estabelecer o seguinte: o consentimento constante do contrato em causa nos autos nunca poderia ser um consentimento para a utilização perpétua ou “ad eternum” de que fala a ré.

Assim, conclui-se que, por um lado, a ré não pode ter adquirido a propriedade da gravação da voz da autora, e, por ou-tro, também não poderia ter adquirido um direito creditício ao aproveitamento económico da gravação da voz da autora para todo o sempre. Aliás, estas duas argumentações da ré – tenho a proprie-dade da gravação e tenho autorização para a utilizar perpetuamente – , que não são apresentadas como subsidiárias, são contraditórias: quem tem a propriedade de uma coisa não precisa de autorização para a usar. Um proprietário não diz que pode utilizar as suas coisas porque tem consentimento de alguém…

Xiii - o “right of publicity” e o direito à imagem ou à voz

É aqui relevante a diferença entre o “right of publicity” – invocado pela ré – e o direito à imagem ou voz. Enquanto no direito americano, o “right of publicity” pode ser transmitido e por isso se adquire um “property right”, no direito de matriz continental o direito à imagem ou à voz não pode ser transmitido e por isso não se adquire qualquer direito de propriedade sobre a imagem ou voz. Assim, se nos EUA se pode dizer que o adquirente do retrato da Broke Shields pode aproveitá-lo como e quando quiser (como se decidiu no caso Shields v. Gross), em Portugal a retratada poderia revogar o consentimento pres-tado, para além de que a concessão de poderes sobre o retrato teria de ter sido delimitada e só vigoraria no período de duração do contrato (veja-se sobre isto, as págs 217 a 234 da obra citada de David de Oliveira Festas, de onde foi retirada a ideia da construção, sem que com isto se queira dizer que este autor concorde com esta construção).

XiV - da cessação do contratoE, por tudo isto, os poderes que a ré re-

cebeu da autora através do contrato, que se traduzem numa situação creditícia, não podem ter subsistido à cessação do con-trato (factos 12 e 13). Um consentimento vinculante prestado num contrato que subsistisse depois deste ter sido revogado por mútuo acordo corresponderia afinal à transmissão do direito ao aproveitamento da voz, o que já se viu não ser possível. E que, aliás, por ser perpétuo ou “ad eter-num”, como é caraterizado pela ré, seria nulo ainda por indeterminação temporal.

XV - do que a ré obteve com o contrato

De qualquer modo, os factos prova-dos apontam no sentido de que o apro-veitamento económico das gravações da autora apenas poderia ocorrer durante o período de validade do contrato.

O contrato dos autos deve ser inter-pretado nos termos das regras gerais de qualquer outro contrato (arts. 236 a 238 do CC; David de Oliveira Festas, obra citada, págs. 325/326: “a extensão do con-sentimento para o aproveitamento eco-nómico da imagem (designadamente os poderes dele resultantes) deve ser aferida interpretando-se, nos termos gerais (arts. 236 e segs), a declaração de consentimen-to” e pág. 296: “o consentimento para o aproveitamento da imagem (arts. 79 e 81) surge, em regra, como um verdadeiro e próprio negócio jurídico”). No mesmo sentido, Paulo Mota Pinto, A limitação…, pág. 537: “julgamos que a autorização para a limitação voluntária do direito à reserva, emitida no confronto de outrem, deve ser considerada um negócio jurídico, seja quando integrada num verdadeiro “contrato de autorização” […], seja como negócio jurídico unilateral (previsto justa-mente no art. 81)” (ver também pág. 539).

Ora, estamos perante um contrato, oneroso, que concedeu à ré poderes para se aproveitar economicamente de um direito cujo exclusivo de aproveitamento está destinado ao seu titular e que não pode ser transmitido para outrem.

Por isso, se nesse contrato se diz que o presente contrato tem a duração de um ano, não há qualquer razão para entender que esse prazo vale só para a obrigação de uma das partes, em vez de se entender

que vale para todo o contrato, como o diz expressamente, ou seja, para todas as obrigações.

É esse o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, tiraria das declarações nego-ciais emitidas (art. 236/1 do CC).

E se houvesse alguma dúvida, era esse o sentido que conduziria ao maior equilí-brio das prestações (art. 237 do CC), pois que de outro modo a ré teria adquirido, para todo o sempre, um direito de apro-veitamento económico de que só tinha pago o aproveitamento inicial.

XVi - do ónus da provaPara além disso, o ónus da prova dos

factos constitutivos do direito de a ré continuar a aproveitar economicamente a voz da autora cabia à ré (art. 342/1 do CC).

Como diz Paulo Mota Pinto, “A Limita-ção…”, pág. 539, nota 28: “[…] O ónus da prova da existência de um consentimento ou acordo, quer este seja concebido como causa de justificação ou como limitação voluntária do direito, compete ao respetivo beneficiário e não ao titular do direito […]”.

Assim, não era à autora que cabia provar os factos tendentes a demonstrar que o consentimento só vigorava – aliás, natural e logicamente, como já se disse – durante o período de vigência do con-trato, mas era à ré que cabia demonstrar o contrário, isto é, que a titular do exclu-sivo lhe tinha concedido os poderes para sempre, “ad eternum”, perpetuamente e que apesar de o contrato ter sido re-vogado por mútuo acordo, tais poderes subsistiam….

Ou seja, teria que ser a ré a alegar e a provar que do contrato resultava o di-reito de, findo o mesmo, a ré continuar a aproveitar economicamente as gravações feitas pela autora.

O que a ré não fez, como aliás resulta do teor das suas próprias contra-alega-ções: dizer-se que nada indicia que a utilização estivesse limitada pela vigência do contrato, é o mesmo que reconhecer que não se provou que a utilização não estava limitada pelo contrato, pois que, caso contrário, se diria que estava prova-do e não se falaria em indícios.

juriSPrudêNCia do STJ e das RelaçõesVIDA JUDICIÁRIA - março 201244

Não o tendo feito, teria que invocar um outro título para poder continuar a aproveitar a voz da autora – o outro tinha cessado – o que a ré não fez.

XVii - em suma, poder-se-ia desde já concluir que a ré não provou ter poderes para, findo o contrato que lhos dava, continuar a aproveitar economicamente as gravações da voz da autora.

No entanto, vejam-se ainda outras objecções da ré:

Dos publicity rightsÉ também a ré, e não a autora, a trazer

à liça a questão dos “publicity rights”. O “right of publicity” é um modo de

ver as questões do direito ao aproveita-mento económico dos bens de persona-lidade no Direito dos Estados Unidos da América: “[…] configura um “tort” autó-nomo destinado a proteger uma pessoa do aproveitamento económico não con-sentido de ‘indícios” da sua ‘identidade’ (personalidade)” (David de Oliveira Festas, obra citada, pág. 150). Note-se que estes “indícios de identidade” englobam todas as formas de identificação da pessoa, no-meadamente coisas, e não apenas bens de personalidade de matriz continental, como a imagem, nome ou voz – nota 547 da pág. 166)

Ou seja, o “right of publicity” não é uma figura do Direito dos EUA que se possa dizer, como o faz a ré, que só existe no nosso país no regime do contrato de trabalho do praticante desportivo (art. 10 da Lei 28/98, de 26/07)…, mas sim um modelo (aliás considerado insatisfatório) de tutela dos valores patrimoniais dos di-reitos de personalidade (David de Oliveira Festas, obra citada, pág. 427, conclusões 23 e 24), que tem um modelo alternativo no direito de matriz continental, baseado nos direitos à imagem, voz e nome, com lugar próprios nos arts. 79 a 81 do CC.

Seja como for…Diz a ré que não é aplicável o regime

dos “publicity rights” porque os serviços prestados pela autora em momento algum tiveram como pressuposto a sua (hipotética) celebridade.

Diga-se desde logo que a transcrição da cláusula 2ª dos contratos e o que já

se disse acima quanto a ela (parte II) de algum modo logo sugere que não é as-sim (isto é, quanto à alegada inexistência deste pressuposto).

De qualquer modo, está muito longo de ser verdade que os “publicity rights” tenham como pressuposto a celebridade do seu titular. David de Oliveira Festas, obra citada, págs. 86, nota 256, 89, nota 263, demonstra que é o contrário o que se entende nos EUA quanto a tal questão: o aproveitamento económico de direitos de personalidade não se limita a pessoas com notoriedade pública – ou figuras públicas ou celebridades – ou a um de-terminado grupo de pessoas ou classe social; e especialmente nas págs. 190 a 195, que termina referindo que o § 46, comment b, do Restatement (Third) of Unfair Competition, considera que tanto as figuras públicas como as pessoas sem notoriedade pública podem intentar uma ação com base em lesão do seu right of publicity).

Por outro lado, relativamente ao direi-to civil português, não há ninguém – ou não se conhece ninguém – que defenda que o conteúdo patrimonial dos direitos de personalidade dependa da celebrida-de do seu titular (vejam-se, por exemplo, os dois autores citados na nota 256 da pág. 86).

XViii - da recognoscibilidade Diz a ré que ninguém sabe que é a

voz da autora nas gravações em causa. Trata-se, desde logo, de um facto que não consta dos factos provados…

De qualquer modo e parafraseando David de Oliveira Festas, obra citada, pág. 242, poderia dizer-se que a recognoscibi-lidade é um dos componentes da fixação da voz enquanto objeto da proteção patrimonial. E esse elemento tem sido exigido para que seja concedida proteção do direito à imagem (ou da voz, no caso) (também no “right of publicity” – págs. 197/198). Mas essa recognosciblidade tem apenas a ver com a suscetibilidade de identificação da pessoa através da imagem (no caso, da voz) por pessoas que conheçam o titular, nomeadamente por familiares (págs. 246 a 250: “O possível reconhecimento pelas pessoas do círculo

íntimo é quanto basta para que a perso-nalidade da pessoa e a sua identidade estejam em causa).

Para além disso, e quanto ainda a esta objeção, vale ainda o que se disse acima na parte II.

XiX - da (ir)revogablidade do consentimento

A posição de Capelo de Sousa quanto à irrevogabilidade do consentimento não tem, no caso, interesse, pois que acaba por não estar em causa a revogação unilateral de qualquer consentimento. A posição assumida neste acórdão é que o consentimento deixou de existir com a re-vogação, por mútuo acordo, do contrato.

XX - outras objeções da réA pergunta formulada pela ré em

e) esquece duas coisas: primeiro, que o alcance do consentimento depende do seu conteúdo e, segundo, que no caso dos autos não se trata de interromper um contrato em vigor ou um consentimento que se tenha provado vigorar para além do contrato.

O que consta em f) esquece, de novo, que não se trata de a autora estar a revo-gar um consentimento prestado, mas sim de a ré estar a fazer um aproveitamento económico da voz da autora, depois de findo o contrato, sem provar ter consen-timento para o efeito.

O que consta do facto 11 (“as su-cessivas renovações do contrato foram realizadas para permitir novas locuções e gravações”), referido pela ré em k), não pode implicar o contrário das soluções encontradas, desde logo porque nele não se diz que tenha sido esse o único fim (note-se que a ré alegava ainda: “e não para garantir a vigência de um con-sentimento”, sendo que esta parte não foi dada como provada, nem se acrescentou “apenas” ou “só” ao dado como provado, sem que a ré tenha interposto recurso da decisão de facto), nem, por outro lado, se sabe se as gravações utilizadas dizem res-peito a gravações dos anteriores contratos e não do último (e tendo sido do último, a questão já não se punha porque este contrato já não foi renovado).

De resto, mesmo que se tivesse

juriSPrudêNCia do STJ e das Relações VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 45

provado tudo o que a ré alegava, o fac-to não passaria de uma interpretação subjetiva dos fins das partes, que não se poderia sobrepor à correta aplicação da lei aos restantes factos provados. Com as duas afirmações feitas (no art. 40 da contestação), a ré tentava resumir a po-sição das partes nos autos e pretendia que se optasse por uma delas. Ou seja, aquelas duas afirmações representavam uma conclusão que se pretendia obter logo na decisão da matéria de facto. Ora, como matéria conclusiva, a mesma teria de se ter por não escrita [“o questionário não pode incluir um quesito que a priori contenha a resolução da questão con-creta do direito que é objeto da ação, limitando-lhe ou traçando-lhe o destino. Formulado ele, a respetiva resposta não pode deixar de ser tida por não escrita – art. 646/3 do CPC, aplicado por analogia.” (ac. RL, de 28/05/1987, CJ, 1987, III, pág. 99, citado por Abílio Neto em CPC Anotado, Ediforum, 16ª ed, pág. 819]. Acrescenta o acórdão: “[…A]través da resposta direta ao quesito em causa estava achada a solução definitiva do problema que opõe autor e réu […] Porque é um juízo que há-de fluir de um somatório de factos, constituindo, assim, matéria conclusiva, não pode ser levado ao questionário […]”.

XXi - do enriquecimento sem causaTendo-se concluído que a ré não

demonstrou que tivesse, depois de findo o contrato, o direito de aproveitar econo-micamente as gravações efetuadas pela autora durante a vigência do contrato, ficam por decidir quais as consequências de tal aproveitamento.

Se estivesse em causa a ofensa ilícita, culposa e danosa dos direitos de perso-nalidade da autora, e principalmente dos valores pessoais de tais direitos, tal daria lugar à responsabilidade aquiliana (arts. 483 do CC).

Mas no caso não é isso que está em causa.

O que se discute é antes, como se dis-se, as consequências do aproveitamento económico pela ré, depois de findo o contrato, das gravações efetuadas pela autora durante a vigência do contrato.

Já se viu que, por força do art. 79/1 do

CC, o direito ao aproveitamento económi-co das gravações da voz da autora é um direito exclusivo do seu titular.

Pode-se ver nisto a destinação do conteúdo patrimonial desse direito à autora (David de Oliveira Festas, obra citada, pág. 117 e notas 374 a 376 e págs. 118-119; Menezes Leitão, obra citada, págs. 741 e segs, especialmente págs. 743 e 749: “protecção da personalidade contra intervenções não autorizadas no direito à imagem, que redundam em lucro para o interventor”, incluindo a expressão oral; Paulo Mota Pinto, “O direito à reserva”, BFDUC 1993, pág. 582: “restará ao titular do direito, nestes casos, a via da pretensão restitutória fundada no enriquecimento sem causa, nos termos do art. 473 do CC, já que o locupletamento não deixará nestes casos de ser “à custa de outrem”; Menezes Cordeiro, obra citada, pág. 235: “Tais lucros deveriam reverter para o próprio retratado: seja para evitar o enri-quecimento alheio, seja porque o Direito positivo em jogo reconhece tal faculdade lucrativa ao “dono” originário da imagem”; Leite Campos, A subsidiariedade da Obri-gação de restituir o enriquecimento, págs. 470-471, nota 2, reconhecendo a existên-cia de um conteúdo de destinação”, citado através de David de Oliveira Festas, nota 412 da pág. 126).

A apropriação desse conteúdo por outrem traduz-se num enriquecimento sem causa por parte desse outrem à custa do titular do direito.

Assim, a autora tem o direito à resti-tuição desse enriquecimento por parte da ré, ao abrigo da cláusula geral do nº. 1 do art. 473/1 do CC.

XXii - qual a medida dessa indemnização/restituição?

David de Oliveira Festas lembra que na jurisprudência francesa é atribuída uma indemnização em função da remu-neração habitual para aquelas situações (obra citada, nota, 350 da pág. 110).

Menezes Leitão, obra citada, pág. 744, diz que no caso Paul Dahlke o tribunal alemão considerou que o enriquecimento seria determinado pela remuneração habitual da utilização da imagem no caso e mais à frente (750/751) diz que

“face ao art. 479/1 do CC a não restituição não pode abranger mais do que o valor que representa o aproveitamento do direito da personalidade, não havendo lugar à restituição de todos os ganhos obtidos pelo interventor.” A boa ou má fé do interventor é valorada depois para outras questões que no caso não têm importância.

Em termos mais genéricos, Júlio Gomes, obra citada, pág. 227, diz que “quem, como nós, entenda que o ob-jeto da obrigação de restituir consiste antes no enriquecimento real (sendo o enriquecimento patrimonial apenas um limite que se destina a proteger o enriquecido de boa fé) hesitará em trilhar esta via [a de eliminar todo o enrique-cimento patrimonial que se regista na esfera do enriquecido e, portanto, tam-bém todo o lucro causalmente resultante de uma sua ingerência na esfera jurídica alheia]. O objeto da obrigação de restituir fundado no enriquecimento sem causa é, para nós, sempre o valor da coisa, do bem, do serviço, da competência alheia, indevidamente recebido ou apropriado e não as consequências, os reflexos do que se obteve no património do enri-quecido.”

No casos destes autos, ficou provado que (facto 18), de acordo com os usos da profissões, as locuções em que não exista uma negociação/contrato prévios têm o prazo de validade de um ano a partir da data da primeira exibição ou 15 dias após a gravação e findo esse prazo há lugar ao pagamento integral das peças em causa, de 100% por cada ano, de acordo com a tabela de locuções, sendo obrigatória a autorização antecipada do locutor em causa.

Tudo isto conduz à restituição nos termos pedidos pela autora – a remune-ração habitual. Note-se que a autora não pediu – corretamente – qualquer lucro que a ré tivesse obtido com as gravações da sua voz.

Aquilo que a autora vinha recebendo em cada ano era (factos 8 a 9) a retribuição de 7500€, acrescida da oferta de chama-das ilimitadas para a rede “B” e de 100 minutos por mês para outras redes, com o valor anual de 613,80€.

juriSPrudêNCia do STJ e das RelaçõesVIDA JUDICIÁRIA - março 201246

O contrato – e com ele os poderes concedidos à ré - cessou em 05/09/2005 (facto 13)

XXiii - da sanção pecuniária compulsória

Por força do art. 829-A do CPC, “1. Nas obrigações de prestação de facto infungí-vel, positivo ou negativo, […], o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cum-primento ou por cada infração, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso. 2. A sanção pecuniária compulsória prevista no número anterior será fixada segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar. 3. O montante da sanção pecuniária compulsória destina-se, em partes iguais, ao credor e ao Estado.

O valor anual da “licença” da autora era de 8113,80€, o que corresponde ao valor diário de 22,23€, a que a autora continuará a ter direito enquanto a ré se

continuar a aproveitar das gravações da sua voz. Assim, julga-se suficiente que, para além disso, a ré seja condenada a pagar, por cada dia em que se mantiver tal aproveitamento ou a possibilidade dele, metade desse valor, destinado em partes iguais à autora e ao Estado.

Isto sem prejuízo dos juros de 5% previstos automaticamente no nº. 4 do art. 829-A.XXiV - juros

Como a obrigação de restituição decorre de um aproveitamento ilícito do direito da autora, mas a obrigação da ré só se liquida com este acórdão, a mora só existe a partir da citação da ré para a ação (arts. 804 e 805/3 do CC). Desde tal data são devidos juros de mora legais (arts. 806 e 559 do CC), de 4% ao ano até eventual alteração legal (Portaria 291/2003, de 8/4).(…)

Pelo exposto, julga-se procedente o recurso e condena-se a ré a:

a) a retirar do “voice mail” da rede “BBB” quaisquer gravações e locuções

contendo registos de voz da autora, bem como a não utilizar, reproduzir ou divulgar as gravações e locuções contendo os registos de voz da autora, seja qual for o suporte, meio ou fim em causa; b) a pagar-lhe 8113,80€ por cada ano a

contar de 05/09/2005 e o proporcional por ano incompleto, até que seja feita a retirada referida em a), acrescidos dos juros anuais de 4% vencidos a partir de 21/04/2009 e vincendos a partir deste acórdão;

c) e a pagar-lhe uma sanção pecuniária compulsória, de 11€ por dia, por cada dia de atraso no cumprimento da condenação referida em a), destinados em partes iguais à autora e ao Estado.

Custas pela ré quer na ação quer no recurso.

Lisboa, 21 de Março de 2012. Os Desembargadores,Pedro MartinsSérgio Silva AlmeidaLúcia Sousa

ANOTAÇÃO

questão decidenda:O Tribunal da Relação de Lisboa,

no dia 21 de Março de 2012, procurou dar solução definitiva às seguintes questões:

- saber se depois de findo o contra-to celebrado entre as partes, a ré podia ter continuado a utilizar para os seus fins lucrativos as gravações de voz da autora feitas no decurso do mesmo; e se se concluir que não o podia fazer, saber quais as consequências desse aproveitamento.

Solução jurídica:No caso em apreço não está em

causa a utilização que a ré fez, durante o período do contrato, das gravações efetuadas pela autora durante esse período. A autora não põe em causa a licitude dessa utilização, nem quer mais dinheiro por essa utilização, nem diz que se verificou qualquer violação dos seus direitos durante esse período.

O que está em causa é saber se a ré, depois de findo o contrato, pode con-tinuar a utilizar – aproveitando-se para os seus fins lucrativos – as gravações da voz da autora, efetuadas durante o período do contrato.

Assim, dada a natureza de bem de personalidade intransmissível, com um conteúdo patrimonial pertença exclusiva do seu titular, do contrato em causa não pode ter resultado a transmissão do direito à voz, mas apenas um consentimento para o aproveitamento económico, pela ré, do direito à voz da autora.

Esse consentimento, através do contrato, traduz-se na limitação do exercício do direito à voz, limitação prevista no art. 81/1 do C. Civil.

Ou seja, a limitação ao exercício do direito à imagem, no caso, à voz, e o seu aproveitamento económico são efetuados através de um instrumento jusprivatista vocacionado para a nego-ciação relativa a bens intransmissíveis e irrenunciáveis: o consentimento.

Por isso, num contrato que o tenha por objeto a concessão de poderes, ou em interesse contratual negativo e interesse contratual positivo, para o aproveitamento económico da voz tem de ser delimitada rigorosamente, designadamente através de limites temporais e do fim para que a con-cessão foi feita

Ou, um contrato que se traduzisse no direito de a ré utilizar economi-camente a voz da autora, perpetua-mente, seria o equivalente à renúncia, parcial, da autora, ao mesmo direito, e por isso nulo.

O consentimento constante do contrato em causa nos autos, nunca poderia ser um consentimento para a utilização perpétua ou “ad eternum” de que fala a ré.

Assim, conclui-se que, por um lado, a ré não pode ter adquirido a propriedade da gravação da voz da autora, e, por outro, também não poderia ter adquirido um direito cre-ditício ao aproveitamento económico

juriSPrudêNCia do STJ e das Relações VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 47

da gravação da voz da autora para todo o sempre.

E, por tudo isto, os poderes que a ré recebeu da autora através do con-trato, que se traduzem numa situação creditícia, não podem ter subsistido à cessação do contrato. Um consen-timento vinculante prestado num contrato que subsistisse depois deste ter sido revogado por mútuo acordo, corresponderia afinal à transmissão do direito ao aproveitamento da voz, o que se viu não ser possível. E que, aliás, por ser perpétuo ou “ad eter-num”, como é caraterizado pela ré, seria nulo ainda por indeterminação temporal.

De qualquer modo, os factos pro-vados apontam no sentido de que o aproveitamento económico das gravações da autora apenas poderia ocorrer durante o período de validade do contrato.

Estamos, pois, perante um con-trato, oneroso, que concedeu à ré poderes para se aproveitar economi-camente de um direito cujo exclusivo de aproveitamento está destinado ao seu titular e que não pode ser transmi-tido para outrem.

Por isso, se nesse contrato se diz

que o presente contrato tem a du-ração de um ano, não há qualquer razão para entender que esse prazo vale só para a obrigação de uma das partes, em vez de se entender que vale para todo o contrato, como o diz expressamente, ou seja, para todas as obrigações.

É esse o sentido que um decla-ratário normal, colocado na posição do real declaratário, tiraria das decla-rações negociais emitidas (art. 236/1 do CCivil).

Ou seja, teria que ser a ré a alegar e a provar que do contrato resultava o direito de, findo o mesmo, a ré con-tinuar a aproveitar economicamente as gravações feitas pela autora.

O que a ré não fez.Não o tendo feito, teria que invocar

um outro título para poder continuar a aproveitar a voz da autora – o outro tinha cessado – o que a ré não fez.

Tendo-se concluído que a ré não demonstrou que tivesse, depois de findo o contrato, o direito de aprovei-tar economicamente as gravações efe-tuadas pela autora durante a vigência do contrato, fica por decidir quais as consequências de tal aproveitamento.

Se estivesse em causa a ofensa

ilícita, culposa e danosa dos direitos de personalidade da autora, e princi-palmente dos valores pessoais de tais direitos, tal daria lugar à responsabi-lidade aquiliana (arts. 483 do CCivil).

A apropriação desse conteúdo por outrem traduz-se num enriquecimen-to sem causa por parte desse outrem à custa do titular do direito.

Assim, a autora tem o direito à restituição desse enriquecimento por parte da ré, ao abrigo da cláusula geral do nº. 1 do art. 473/1 do CCivil.

Pelo exposto, entendeu a Relação de Lisboa em julgar o recurso proce-dente.decisão do acórdão:

A decisão tomada pelos Juízes Desembargadores acabou por ser sumariada, no Acórdão, do seguinte modo:

“Findo um contrato que continha o consentimento da autora para a utilização comercial das gravações da sua voz – bem de personalidade patrimonial – que tinha feito para a ré, esta não pode continuar a fazer o aproveitamento económico dessas gravações, sob pena de enriqueci-mento injustificado no valor igual do da retribuição habitual”.

O QUE DIZ A LEI

Código Civil

artigo 81.ºlimitação voluntária dos direitos

de personalidade 1- Toda a limitação voluntária ao

exercício dos direitos de personalida-de é nula, se for contrária aos princí-pios da ordem pública.

2- A limitação voluntária quando legal, é sempre revogável, ainda que com obrigação de indemnizar os prejuízos causados às legítimas expe-tativas da outra parte.

artigo 236.ºSentido normal da declaração

1- A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratá-rio, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.

2- Sempre que o declaratário co-nheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a decla-ração emitida.

artigo 473.ºPrincípio geral

1- Aquele que, sem causa justifi-cativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou.

2- A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de

modo especial por objeto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.

artigo 483.º

Princípio geral 1- Aquele que, com dolo ou mera

culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.

2- Só existe obrigação de indemni-zar independentemente de culpa nos casos especificados na lei.

juriSPrudêNCia do STJ e das RelaçõesVIDA JUDICIÁRIA - março 201248

oBriGaÇÃo de aliMeNtoS- Prestações a cargo do Fundo de Garantia dos Alimentos a Menores

aSSuNto: Pagamento das prestações a cargo do Fundo

referências: Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 28.3.2012Fonte: site do TRP – www.dgsi.pt

Sumário: A prestação a cargo do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores é devida apenas a partir do mês seguinte ao da notificação da decisão que a fixou.

acordam no tribunal da relação do Porto

O Ministério Público requereu a regu-lação das responsabilidades parentais do menor B…, filho de C… e D….

Na conferência de pais (art. 175º da OTM), realizada em 04-11-2010, foi fixado, ao abrigo do disposto no artigo 157º da OTM, um regime provisório. Na parte que aos presentes autos interessa, foi decidido: que o menor “residirá com a irmã E…, a cuja guarda fica confiado, que fica incumbida de zelar e acautelar pelo respetivo bem estar, a ela cabendo o exercício das responsabilidades paren-tais relativas aos atos da vida corrente do jovem.”; que o Pai e a Mãe pagarão ao jovem, a título de alimentos, a quantia de € 100,00 (cem Euros) mensais cada um, actualizável anualmente em 2,5%, a entregar à irmã E…, até ao dia 8 (oito) de cada mês.

Em 27-12-2010 E… informou nos autos que os pais do menor não contri-buíam com qualquer prestação para o sustento do B….

Notificados para se pronunciarem sobre o alegado incumprimento, os progenitores nada disseram.

Após informação da GNR sobre as condições sócio económicas daqueles,

em 30-09-2011 foi proferido despacho (fls. 63/71, cuja parte decisória se re-produz:

“Pelo exposto, julgo procedente o presente incidente de incumprimento e declaro verificado o incumprimento pe-los requeridos C… e D… das prestações de alimentos supra referidas.

Em consequência, ao abrigo do pre-ceituado nos artigos 157º e 189.º, n.º 1, alínea c) da OTM e 3º, nº 2 da Lei nº 75/98, de 19 de novembro, determino a título provisório que:a) A Segurança Social proceda ao des-

conto no subsídio de desemprego do requerido C… da quantia de € 1.100,00 (mil e cem euros), relativa a prestações vencidas, em 18 (dezoito) prestações mensais e sucessivas de € 61,11 (sessenta e um euros e onze cêntimos) cada, assim como das prestações de alimentos vincendas no valor de € 100,00 (cem euros) mensais, devendo entregar as referidas quan-tias diretamente à irmã do jovem B…, E…, mediante depósito em conta bancária ou transferência em conta bancária a indicar por esta, até ao dia 8 de cada mês, devendo a referida prestação ser atualizada anualmente à taxa de 2,5%;

b) O Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores assegure o pa-gamento da prestação mensal de alimentos atribuída ao jovem, em substituição da requerida D…, no montante de € 100,00 (cem euros) mensais, assim como das prestações vencidas no valor de € 1.100,00 (mil e cem euros), até ao início do efetivo cumprimento por parte da mesma, devendo entregar as referidas quan-tias diretamente à irmã do jovem B…, E…, mediante depósito em conta bancária ou transferência em conta bancária a indicar por esta, até ao dia 8 de cada mês, devendo a referida

prestação ser atualizada anualmente à taxa de 2,5%.”O Ministério Público e o Instituto de

Gestão Financeira da Segurança Social interpuseram recurso.

O Ministério Público finalizava as alegações com as seguintes conclusões:

1. Recorre-se da sentença proferida na parte em que a mesma condenou o Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores a assegurar o pagamento da prestação mensal de alimentos devida ao menor B… em substituição da sua progenitora D…, no montante das pres-tações vencidas (no valor de €1.100,00) até ao início do efetivo cumprimento por parte daquela (alínea b) da decisão proferida).

2. Na parte em que a decisão re-corrida condena o Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores no pagamento das prestações alimentares vincendas em substituição da progenito-ra devedora, a mesma não merece qual-quer censura e deverá, assim, manter-se.

3. A decisão recorrida, contudo, quando condena o Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores no paga-mento das prestações vencidas (no valor de €1.100,00), entra frontalmente em oposição com o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 12/2009, publicado no Diário da Republica nº 150, 1.ª Serie, de 05.08.2009.

4. Ora, a decisão recorrida violou frontalmente a jurisprudência uniforme, na esteira do entendimento firmando no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 54/2011, de 23 de fevereiro.

5. Todavia, mantém-se ainda plena-mente em vigor a jurisprudência fixada no Acórdão Uniformizador de Jurispru-dência nº 12/2009, pelo que a decisão proferida deverá ser revogada na parte em que condenou o Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores no pagamento das prestações vencidas em

juriSPrudêNCia do STJ e das Relações VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 49

substituição da requerida D…, no valor de €1.100,00,

O I.G.F.S.S, IP, rematava as alegações com as seguintes conclusões:

lº A douta sentença recorrida inter-pretou e aplicou de forma errónea, ao caso sub judice, o art.º 1º da Lei 75/98 de 19/11 e o art° 4º nºs 4 e 5 do Dec-Lei n° 164/99 de 13 de maio;

2° Com efeito, o entendimento do douto Tribunal a quo, de que no mon-tante a suportar pelo FGADM devem ser abrangidas as prestações já vencidas e não pagas pelo progenitor (judicialmen-te obrigado a prestar alimentos) não tem, salvo o devido respeito, suporte legal;

3º O Dec-Lei n° 164/99 de 13 de maio é taxativo quanto ao início da responsa-bilidade do Fundo pelo pagamento das prestações

4° No n° 5 do art° 4 do citado diplo-ma, é explicitamente estipulado que “o centro regional de segurança social inicia o pagamento das prestações, por conta do Fundo, no mês seguinte ao da notificação da decisão do Tribunal, nada sendo dito quanto às prestações em dívida pelo obrigado a prestar alimentos;

5° Existe uma delimitação temporal expressa que estabelece o momento a partir do qual o Fundo deve prestar alimentos ao menor necessitado

6° Não foi intenção do legislador dos supramencionados diplomais legais, impor ao Estado, o pagamento do dé-bito acumulado pelo obrigado a prestar alimentos;

7° Tendo presente o preceituado no art° 9º do Código Civil, ressalta ter sido intenção do legislador, expressamente consagrada, ficar a cargo do Estado, ape-nas o pagamento de uma nova prestação de alimentos a fixar pelo Tribunal dentro de determinados parâmetros — art° 3° n°3 e art° 4° n° 1 do Dec-Lei 164/99 de 13/5 e art° 2° da Lei 75/98 de 19/11;

8° A prestação que recai sobre o Es-tado é, pois, uma prestação autónoma, que não visa substituir definitivamente a obrigação de alimentos do devedor, mas, antes, proporcionar aos menores a satisfação de uma necessidade atual de alimentos, que pode ser diversa da que determinou a primitiva prestação;

9º FGADM não garante o pagamento da prestação de alimentos não satisfeita pela pessoa judicialmente obrigada a prestá-los, antes assegurando, face à verificação cumulativa de vários requi-sitos, o pagamento de uma prestação “a forfait” de um montante por regra equivalente - ou menor - ao que fora judicialmente fixado.

10º Só ao devedor originário é pos-sível exigir o pagamento das prestações já fixadas, como decorre do disposto no art° 2006 do CC, constatação que é reforçada pelo disposto no art° 7 do Dec-Lei 164/99 ao estabelecer que a obrigação principal se mantém, mesmo que reembolso haja a favor do Fundo.

11º Não há qualquer semelhança entre a razão de ser da prestação de ali-mentos fixada ao abrigo das disposições do Código Civil e a fixada no âmbito do Fundo. A primeira consubstancia a forma de concretização de um dos deveres em que se desdobra o exercício do poder pa-ternal; a última visa assegurar, no desen-volvimento da política social do Estado, a proteção do menor, proporcionando-lhe as necessárias condições de subsistência;

11º Enquanto o art° 2006° do Código Civil está intimamente ligado ao vínculo familiar - art° 2009° do CC — e daí que quando a ação é proposta, já os alimen-tos seriam devidos, por um princípio de Direito Natural, o Dec-lei 164/99 “cria” uma obrigação nova, imposta a uma entidade que antes da sentença., não tinha qualquer obrigação de os prestar.

12° A obrigação de prestação de alimentos pelo FGADM (autónoma da prestação alimentícia decorrente do poder paternal) não decorre automati-camente da Lei, sendo necessária uma decisão judicial que a imponha, ou seja, até essa decisão não existe qualquer obrigação.

13º Se é diferente a natureza das duas prestações, diferente é também o momento a partir do qual se começam a vencer:

14º A prestação de alimentos, visto haver norma substantiva que o prevê, começa a vencer-se a partir da proposi-tura da ação que fixou o quantitativo a satisfazer pelos progenitores do menor,

15º já a prestação a satisfazer pelo FGADM, tendo em conta o regime ge-ral aplicável à generalidade das ações, começa a vencer-se após o trânsito em julgado da decisão judicial que fixa o seu montante.

16° Muito bem decidiu o douto Acór-dão do Tribunal da Relação de Coimbra — agravo n° 1386/01 de 26- 06-01 - no sentido de o Estado não responder pelo débito acumulado do obrigado a alimen-tos, tratando-se de prestações de diversa natureza. No mesmo sentido, entre outros, os Acórdãos citados no ponto 63 das presentes alegações.

17º Não colhe o argumento de que o menor não pode ficar à mercê das contingências do processo e seu arrasta-mento pelos Tribunais, porquanto, como é do conhecimento geral, no entretanto, e enquanto o processo se encontra pendente do Tribunal, a verdade é que alguém tem de alimentar o menor, sob pena de este não sobreviver.

18° O pagamento das prestações relativas ao período anterior não visaria propriamente satisfazer as necessidades presentes de alimentos a menor, consti-tuindo, antes, um crédito de quem, na ausência do requerido, custeou unilate-ralmente (ao longo do anos) a satisfação dessas necessidades.

19° O Estado substituiu-se ao de-vedor, não para pagar as prestações em dívida por este, mas p assegurar os alimentos de que o menor necessita para que este não volte a ter frio, não volte a ter fome (e não, para evitar que ele tives-se frio ou fome, pois tal é impossível. Já passou. É tarde de mais).

20° Daí a necessidade de produção de prova sobre os elementos constantes da lei n° 75/98 de 19 de novembro e do Dec-Lei n° 164/99 de 13 de maio, que o Tribunal deve considerar na fixação da prestação a efetuar pelo estado, pres-tação essa que não é necessariamente equivalente à que estava em dívida pelo progenitor.

21° A intervenção do FGADM está dependente de pressupostos cumula-tivos acima elencados tendo a natureza de prestação social, não podendo recor-rer- se à analogia com o art° 2006° do

juriSPrudêNCia do STJ e das RelaçõesVIDA JUDICIÁRIA - março 201250

CC, por não se tratar de caso omisso, o que legitima arredar o disposto no art° 10º do CC.

22° Se tivesse havido o propósito de estabelecer uma qualquer responsabili-dade do Estado por prestações vencidas e não pagas pelo obrigado, o legislador não teria deixado de a prever e até de cominar a modalidade e prazo de paga-mento, tal como, aliás, o fez no citado art° 4° n° 5 do DL n° 164/99.

23° O FGADM somente deverá ser responsabilizado pelo pagamento das prestações fixadas e devidas a partir da prolação da sentença judicial, e não pelo pagamento do débito acumulado dos obrigados.

24° O que se entende facilmente se atentarmos na finalidade da criação do regime instituído pelos supra citados diplomas legais, que é o de assegurar (garantir) os alimentos devidos a me-nores e não o de substituir a obrigação alimentícia que recai sobre o obrigado a alimentos.

25° A obrigação do FGADM só nasce com a decisão judicial que verifica os pressupostos da sua intervenção, ordena o pagamento e determina o seu montan-te, diferentemente da obrigação dos pais “em prover o sustento” dos filhos, que decorre do próprio vínculo da filiação

26° O FGADM não tem intervenção na lide incidental de incumprimento, não lhe sendo assegurado qualquer contraditório, não podendo ser conde-nado no pagamento de prestações antes vencidas, sob pena de grosseira violação dos princípios firmados nos art°s 3º e 3°A do CPC, 2° e 20° da CRP — vide Acórdão do Tribunal Constitucional n°s 249/97, 259/2000 e 209/2004.

27° Por fim, e de acordo com o re-cente Acórdão de Uniformização de Ju-risprudência do STJ, sempre se dirá que “A obrigação de prestação de alimentos a menor, assegurada pelo FGADM, em substituição do devedor, nos termos pre-vistos nos artigos 1º da Lei n° 75/98, de 19 de novembro, e 2° e 4° n° 5 do Dec-Lei n° 164/99 de 13 de maio, só nasce com s decisão que julgue o incidente de in-cumprimento do devedor originário e a respetiva exigibilidade só ocorre no mês

seguinte ao da notificação da decisão do tribunal, não abrangendo quaisquer prestações anteriores - Acórdão do STJ n° 12/2009 de 5 de agosto.

28° De salientar que a douta sen-tença recorrida refere, que de acordo com a jurisprudência fixada no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 12/2009 de 07/07/2009, o FGADM deve proceder ao pagamento das prestações de alimentos apenas desde o mês sub-sequente à data em que foi proferida a decisão de incumprimento, não abran-gendo quaisquer prestações anteriores.

29° Mas, de seguida invoca o Acór-dão n° 54/2011 de 23 de fevereiro do Tribunal Constitucional.

30° Ora, “a recusa da aplicação da doutrina uniformizada deverá surgir ape-nas em casos excecionais, em que surjam circunstâncias supervenientes e capazes de imporem uma nova interpretação, justificando a sua revisibilidade” — Ac. Trib. Rel. Guimarães de 06/03/2008.

31º Por último, dir-se-á que o Acór-dão n° 400/2011 proferido em Plenário pelo Tribunal Constitucional (vide in http://www.tribunal constitucional.pt/tc//tc/acordaos/20110400. html), pôs termo à questão controversa da constitu-cionalidade da norma constante do art.ºart.º 4° n° 5 do Dec-Lei n° 164/99 de 13 de maio, ao decidir não julgar inconsti-tucional a referida norma, pelo que inútil será qualquer discussão sobre a matéria.

Termos em que deve ser considerado procedente o presente recurso de ape-lação e, consequentemente, revogada a douta sentença recorrida, devendo ser substituída por outra decisão, na qual o FGADM do IGFSS seja obrigado a efetuar o pagamento das prestação apenas a partir do mês seguinte ao da notificação da decisão do Tribunal, pois, só assim se fará INTEIRA JUSTIÇAos factos

Na decisão recorrida foram conside-rados provados os seguintes factos:

1) O jovem B… nasceu a 16 de novembro de 1994, em …, Marco de Canaveses;

2) É filho dos requeridos C… e D…, nascidos em 06.06.1966 e 09.11.1964, respetivamente, e casados entre si;

3) Devido aos conflitos existentes entre os seus progenitores, o jovem passou a viver na companhia da sua irmã E… e do seu marido F…, em finais do ano de 2007;

4) Por decisão provisória deste Tribu-nal, datada de 04.11.2010, foi atribuída a guarda e cuidados do jovem B… à sua irmã E…;

5) Foi fixado um regime de visitas livre;

6) Pela mesma decisão foi fixada uma pensão de alimentos de € 100,00 (cem euros) mensais a ser paga ao jovem por cada um dos progenitores, actualizável anualmente em 2,5%, a entregar à irmã E…, até ao dia 8 (oito) de cada mês;

7) Até à presente data, os requeridos não efetuaram o pagamento da pensão de alimentos a que estavam obrigados;

8) Em 26.06.2010 o vencimento líquido de F…, cônjuge de E…, era de € 626,00 (seiscentos e vinte e seis euros);

9) A E… auferia € 395,00 (trezentos e noventa e cinco euros), a título de subsídio de desemprego;

10) O agregado familiar de E… tinha encargos mensais no valor de € 623,74 (seiscentos e vinte e três euros e setenta e quatro cêntimos);

11) Os requeridos C… e D… não têm quaisquer bens imóveis;

12) O requerido possui um ciclomo-tor, marca “…”, matrícula ..-DS..;

13) A requerida é doméstica, não possuindo quaisquer rendimentos, e o requerido está desempregado, auferindo um subsídio de desemprego no valor diário de € 13,97 (treze euros e noventa e sete cêntimos), cerca de € 415,00 (qua-trocentos e quinze euros) por mês;

14) Os requeridos vivem em casa arrendada da qual pagam € 100,00 (cem) euros a título de renda.

Com interesse para a decisão, encon-tra-se ainda provado (Relatório Social, fls. 50/51):

15) O menor B… frequenta a Escola

o direitoQuestão a decidir: Desde quando

são devidas as prestações a pagar pelo FGADM.

A mãe do menor não pagou à filha

juriSPrudêNCia do STJ e das Relações VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 51

as importâncias a que se encontrava obrigado, a título de alimentos. Devido à situação de carência, não foi possível obter o cumprimento coercivo da obri-gação, com recurso aos meios previstos no artigo 189º da OTM. E a execução também não se mostra viável, atenta essa situação de carência.

Para o caso importa atender no teor do artigo 1º da Lei nº 75/98, de 19/11: “Quando a pessoa judicialmente obriga-da a prestar alimentos a menor residente em território nacional não satisfizer as quantias em dívida pelas formas pre-vistas no artigo 189º do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de outubro, e o alimentado não tenha rendimento líquido superior ao salário mínimo nacional nem bene-ficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontra, o Estado assegura as prestações previstas na presente lei até ao início do efetivo cumprimento da obrigação.”

O menor não tem qualquer rendi-mento e a capitação de rendimentos do agregado onde o menor se insere é inferior ao salário mínimo nacional. Estão assim reunidos os requisitos para que o FGADM assegure o pagamento das prestações de alimentos a cargo da mãe do menor (arts. 1º da Lei nº 75/98, de 19-11 e 2º, nº 1 e 2, e 3º, nº 1 e 2, do DL nº 164/99, de 13-5).

Mas, coloca-se a questão de saber a partir de quando são devidas as presta-ções alimentares a cargo daquele Fundo.

O nº 5 do artigo 4º do DL 164/99 esta-belece: “O centro regional de segurança social inicia o pagamento das prestações, por conta do Fundo, no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal.”

Esta norma não responde à suscitada questão, uma vez que apenas indica quando se iniciam os pagamentos; quan-do a dúvida é saber que pagamentos, ou seja, desde quando são devidas as prestações.

A dúvida foi solucionada através do acórdão do STJ, de 7-7-2009, que uni-formizou a jurisprudência nos seguintes termos:

“A obrigação de prestação de alimen-tos a menor, assegurada pelo FGADM, em substituição do devedor, nos termos

previstos nos artigos 1.º, da Lei n.º 75/98, de 19 de novembro, e 2.º e 4.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de maio, só nasce com a decisão que julgue o incidente de incumprimento do devedor originário e a respetiva exigibilidade só ocorre no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal, não abrangendo quaisquer prestações anteriores”. (Diário da República, 1.ª série, de 5 de agosto de 2009).

Na decisão recorrida foi recusada a aplicação daquela jurisprudência, com fundamento em inconstitucionalidade, invocando-se para tanto o acórdão do Tribunal Constitucional, nº 54/2011, de 23 de fevereiro, no qual se decidiu “Julgar inconstitucional, por violação do dispos-to nos artigos 69.º, n.º 1, e 63.º, n.º 1 e 3, da Constituição, a norma constante do artigo 4.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de maio, na interpretação de que a obrigação do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores assegurar as pensões de alimentos a menor judi-cialmente fixadas, em substituição do devedor, só se constitui com a decisão do tribunal que determine o montante da prestação a pagar por este Fundo, não sendo exigível o pagamento de presta-ções respeitantes a períodos anteriores a essa decisão.”

Aquele juízo de inconstitucionali-dade mereceu críticas do Prof. Remé-dio Marques, que considerou que é temerário ver neste regime um labéu de inconstitucionalidade material por violação do preceituado nos artigos 13º, 63º, nº 1 e 3, e 69º, nº 1, todos da Consti-tuição (Cadernos de Direito Privado, nº 34, pp. 26/36).

Posteriormente, no acórdão nº 400/2011, de 22-9-201, em plenário, decidiu o Tribunal Constitucional, não julgar inconstitucional a norma constan-te do artigo 4.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de maio, na interpretação de que a obrigação de o Fundo de Ga-rantia de Alimentos Devidos a Menores assegurar as prestações a menor judicial-mente fixadas, em substituição do de-vedor de alimentos, só se constitui com a decisão do tribunal que determine o montante da prestação a pagar por este

Fundo, não sendo exigível o pagamento de prestações respeitantes a períodos anteriores a essa decisão.

Sintetizam-se os argumentos utiliza-dos neste acórdão, transcrevendo alguns excertos do mesmo:

“Em primeiro lugar, deve notar-se que a retroação da condenação, impon-do ao Fundo o pagamento das presta-ções correspondentes ao período de-corrido entre a formulação do pedido e a decisão final, não seria meio idóneo para satisfazer, por si mesma, as necessidades de manutenção do menor no momento a que tais prestações se referem (nemo alitur in praeteritum).”

“As necessidades vitais do menor tiveram de ser satisfeitas com outros re-cursos, normalmente mediante esforço acrescido do progenitor (ou da pessoa) que o tem à sua guarda, porventura com privações na satisfação das necessidades próprias. Mas, a cobertura, mediante as prestações do Fundo, do tempo en-tretanto passado só pode servir como mecanismo jurídico de compensação, não como meio efetivo de acorrer àque-las necessidades próprias do menor no período a que respeitam cuja insatisfa-ção pode tornar-se incompatível com a dignidade da pessoa humana.

Se o menor, em consequência do incumprimento do dever de alimentos por parte do progenitor, sofreu privações dessa natureza já não será a retroação das prestações a cargo do Fundo que pode remediá-las.”

“(…) afigura-se que a possibilidade de fixação provisória de uma prestação pública é um meio adequado – um dos meios adequados, não competindo ao Tribunal ir mais além – para ocorrer em tempo real a necessidades imperiosas, àquelas necessidades cuja não satisfação pelo incumprimento do progenitor do dever de alimentos pode pôr em risco ou, pelo menos, comprometer o seu desenvolvimento integral. Mais do que uma medida que cubra a posteriori todo o tempo de carência, a adoção de medi-das provisórias, contemporâneas da ne-cessidade de sustento permitirá ocorrer num curto espaço de tempo a situações de especial urgência, proporcionando-

juriSPrudêNCia do STJ e das RelaçõesVIDA JUDICIÁRIA - março 201252

lhes remédio ou alívio à medida que elas surgem.”

“É certo que uma medida dessa natureza não cobre todo o tempo do incumprimento por parte do progeni-tor, nem se aplica a todas as situações de incumprimento do obrigado a alimen-tos. Aliás, mesmo com a retroação das prestações ao momento da formulação do pedido de condenação do Fundo também haveria um período que, em regra, ficaria a descoberto, por não haver coincidência entre o vencimento da prestação não satisfeita e a dedução do incidente de condenação do Fundo. Mas não é possível conferir à incum-bência constitucional de proteção da infância por parte do Estado uma tal extensão de cobertura temporal, cuja exigência parece pressupor uma lógica de intervenção substitutiva das respon-sabilidades parentais que se não retira por interpretação do artigo 69.º, n.º 1 e 68.º, nº 1 da Constituição. A Constituição não investe o Estado na posição jurídica de garante das concretas obrigações alimentares dos progenitores.”

“O Estado não intervém como prestador por causa do incumprimento da obrigação alimentar judicialmente fixada, mas por causa da situação de carência para que esse incumprimento contribui. Daí a “condição de recursos” de que a prestação social em causa está dependente.”

“Em segundo lugar, a circunstância de a fixação provisória da prestação pública poder ser precedida de dili-

gências de prova não é de molde a comprometer-lhe intoleravelmente a aptidão para, em termos de razoável praticabilidade e normal atuação dos diversos protagonistas, permitir respos-ta pública temporalmente adequada às situações carecidas de providências urgentes. As diligências de prova devem ser reduzidas ao mínimo compatível com um juízo prima facie acerca dos pressupostos da decretação provisória da prestação, devendo o n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 75/98 ser aplicado com a flexibilidade inerente ao facto de prover a uma situação de urgência qualificada num processo que já tem natureza ur-gente (princípio da adequação formal).”

“Aliás, uma das entidades legitima-das para pedir a atribuição da prestação pública a favor do menor é o Ministério Público, magistratura sobre a qual im-pende o dever funcional de impulsionar a decisão provisória quando tal se justi-fique, por essa via cumprindo também o Estado (por instrumentos legislativos e organizacionais) os deveres de proteção que lhe incumbem. O eventual não uso ou a aplicação prática deficiente dos meios processuais existentes não jus-tifica o recurso sucedâneo ao juízo de inconstitucionalidade da norma agora em causa.”

“Tanto basta para julgar improce-dente a crítica de que o diferimento da prestação (definitiva) a cargo do Fundo para o momento em que é proferida a decisão judicial, não sendo devidas prestações correspondentes ao período

decorrido entre o momento da formu-lação do pedido e essa decisão, priva o menor de proteção temporalmente adequada por parte do Estado, violando o disposto no n.º 1 do artigo 69.º e nos n.ºs 1 e 3 do artigo 63.º da Constituição.”

*Estes argumentos apresentam-se

com solidez que se afigura bastante para afastar o juízo de inconstitucio-nalidade sobre a interpretação fixada pelo acórdão uniformizador. No caso dos autos, a obrigação do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Me-nores apenas é devida a partir do mês seguinte ao da notificação da decisão que a fixou.

DecisãoPelos fundamentos expostos, na

procedência da apelação revoga-se a decisão recorrida, na parte em que ordenou o pagamento pelo FGADM das “prestações vencidas” e decide-se que a prestação mensal de €100 a cargo daquele Fundo é devida a partir do mês seguinte ao da notificação da decisão, não abrangendo qualquer prestação anterior.

Não são devidas custas

Porto, 28.3.2012

Os Desembargadores,José Bernardino de Carvalho Eduardo Manuel B. Martins Rodrigues

PiresMárcia Portela

ANOTAÇÃO

Questão decidenda:O Tribunal da Relação do Porto, no

dia 28 de março de 2012, procurou dar solução definitiva à seguinte questão:

- saber desde quando são devidas as prestações a pagar pelo FGADM.

Solução jurídica:No caso dos autos, a mãe do

menor não pagou as importâncias a que se encontrava obrigada, a título

de alimentos. Não foi possível obter o cumprimento coercivo da obrigação, com recurso aos meios previstos no artigo 189º da OTM., sendo que não se mostrou a execução viável, atenta essa situação de carência.

Dispõe o artigo 1º da Lei nº 75/98, de 19/11 que: “Quando a pessoa judi-cialmente obrigada a prestar alimen-tos a menor residente em território nacional não satisfizer as quantias em dívida pelas formas previstas no artigo 189º do Decreto-Lei nº 314/78, de 27

de outubro, e o alimentado não tenha rendimento líquido superior ao salário mínimo nacional nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontra, o Estado assegura as prestações previstas na presente lei até ao início do efetivo cumprimento da obrigação.”

Ora, no caso concreto, o menor não tem qualquer rendimento e a ca-pitação de rendimentos do agregado onde o menor se insere é inferior ao salário mínimo nacional. Estavam, por

juriSPrudêNCia do STJ e das Relações VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 53

isso, reunidos os requisitos para que o FGADM deva assegurar o pagamento das prestações de alimentos a cargo da mãe do menor (arts. 1º da Lei nº 75/98, de 19.11 e 2º, nº 1 e 2, e 3º, nº 1 e 2, do DL nº 164/99, de 13.5).

Todavia, a questão é saber a partir de quando são devidas as prestações alimentares a cargo daquele Fundo.

O nº 5 do artigo 4º do DL 164/99 determina que: “O centro regional de segurança social inicia o pagamento das prestações, por conta do Fundo, no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal.”

Esta norma apenas indica quando se iniciam os pagamentos, sendo que a dúvida no caso em apreço é saber que pagamentos, ou seja, desde quan-do são devidas as prestações.

O Tribunal da Relação do Porto, neste caso, acolheu os fundamentos do Tribunal Constitucional, de acordo com os quais a obrigação de o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores assegurar as prestações a menor judicialmente fixadas, em substituição do devedor de alimen-tos, só se constitui com a decisão do tribunal que determine o montante da prestação a pagar por este Fundo, não sendo exigível o pagamento de prestações respeitantes a períodos anteriores a essa decisão.

Aproveitamos para transcrever alguns excertos desse acórdão, tam-bém acolhidos pela Relação do Porto:

“Em primeiro lugar, deve notar-se que a retroação da condenação, impondo ao Fundo o pagamento das prestações correspondentes ao período decorrido entre a formulação do pedido e a decisão final, não seria meio idóneo para satisfazer, por si mesma, as necessidades de manuten-ção do menor no momento a que tais prestações se referem (nemo alitur in praeteritum).”

“As necessidades vitais do menor tiveram de ser satisfeitas com outros recursos, normalmente mediante esforço acrescido do progenitor (ou

da pessoa) que o tem à sua guarda, porventura com privações na satisfa-ção das necessidades próprias. Mas, a cobertura, mediante as prestações do Fundo, do tempo entretanto passado só pode servir como mecanismo jurí-dico de compensação, não como meio efetivo de acorrer àquelas necessida-des próprias do menor no período a que respeitam cuja insatisfação pode tornar-se incompatível com a dignida-de da pessoa humana.

Se o menor, em consequência do incumprimento do dever de alimen-tos por parte do progenitor, sofreu privações dessa natureza já não será a retroação das prestações a cargo do Fundo que pode remediá-las.”

“(…) afigura-se que a possibilidade de fixação provisória de uma presta-ção pública é um meio adequado – um dos meios adequados, não compe-tindo ao Tribunal ir mais além – para ocorrer em tempo real a necessidades imperiosas, àquelas necessidades cuja não satisfação pelo incumprimento do progenitor do dever de alimentos pode pôr em risco ou, pelo menos, comprometer o seu desenvolvimento integral. Mais do que uma medida que cubra a posteriori todo o tempo de carência, a adoção de medidas provi-sórias, contemporâneas da necessida-de de sustento permitirá ocorrer num curto espaço de tempo a situações de especial urgência, proporcionando-lhes remédio ou alívio à medida que elas surgem.”

“É certo que uma medida dessa natureza não cobre todo o tempo do incumprimento por parte do progenitor, nem se aplica a todas as situações de incumprimento do obrigado a alimentos. Aliás, mesmo com a retroação das prestações ao momento da formulação do pedido de condenação do Fundo também haveria um período que, em regra, ficaria a descoberto, por não haver coincidência entre o vencimento da prestação não satisfeita e a dedução do incidente de condenação do Fun-

do. Mas não é possível conferir à in-cumbência constitucional de proteção da infância por parte do Estado uma tal extensão de cobertura temporal, cuja exigência parece pressupor uma lógica de intervenção substitutiva das responsabilidades parentais que se não retira por interpretação do artigo 69.º, n.º 1 e 68.º, nº 1 da Constituição. A Constituição não investe o Estado na posição jurídica de garante das concretas obrigações alimentares dos progenitores.”

“O Estado não intervém como prestador por causa do incumpri-mento da obrigação alimentar judi-cialmente fixada, mas por causa da situação de carência para que esse incumprimento contribui. Daí a “con-dição de recursos” de que a prestação social em causa está dependente.”

“Em segundo lugar, a circunstância de a fixação provisória da prestação pública poder ser precedida de dili-gências de prova não é de molde a comprometer-lhe intoleravelmente a aptidão para, em termos de razoável praticabilidade e normal atuação dos diversos protagonistas, permitir resposta pública temporalmente adequada às situações carecidas de providências urgentes. As diligências de prova devem ser reduzidas ao mínimo compatível com um juízo prima facie acerca dos pressupostos da decretação provisória da prestação, devendo o n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 75/98 ser aplicado com a flexibilidade inerente ao facto de prover a uma situação de urgência qualificada num processo que já tem natureza urgente (princípio da adequação formal).”

“Aliás, uma das entidades legi-timadas para pedir a atribuição da prestação pública a favor do menor é o Ministério Público, magistratura so-bre a qual impende o dever funcional de impulsionar a decisão provisória quando tal se justifique, por essa via cumprindo também o Estado (por instrumentos legislativos e organi-zacionais) os deveres de proteção

juriSPrudêNCia do STJ e das RelaçõesVIDA JUDICIÁRIA - março 201254

O QUE DIZ A LEI

lei n.º 75/98, de 19 de novembro – Garantia dos alimentos devidos

a Menores

artigo 1.ºGarantia de alimentos devidos a

menores Quando a pessoa judicialmente

obrigada a prestar alimentos a menor residente em território nacional não satis-fizer as quantias em dívida pelas formas previstas no artigo 189.º do Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de outubro, e o ali-mentado não tenha rendimento líquido superior ao salário mínimo nacional nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, o Estado assegura as prestações previstas na presente lei até ao início do efetivo cumprimento da obrigação.

artigo 2.ºFixação e montante das prestações

1 - As prestações atribuídas nos termos da presente lei são fixadas pelo tribunal e não podem exceder, mensalmente, por cada devedor, o montante de 4 UC.

2 - Para a determinação do montan-te referido no número anterior, o tribu-nal atenderá à capacidade económica do agregado familiar, ao montante da prestação de alimentos fixada e às necessidades específicas do menor.

artigo 3.ºdisposições processuais

1 - Compete ao Ministério Público ou àqueles a quem a prestação de ali-mentos deveria ser entregue requerer nos respetivos autos de incumprimen-to que o tribunal fixe o montante que o Estado, em substituição do devedor, deve prestar.

2 - Se for considerada justificada e urgente a pretensão do requerente, o juiz, após diligências de prova, proferirá decisão provisória.

3 - Seguidamente, o juiz mandará proceder às restantes diligências que entenda indispensáveis e a inquérito sobre as necessidades do menor, posto o que decidirá.

4 - O montante fixado pelo tribunal perdura enquanto se verificarem as circunstâncias subjacentes à sua con-cessão e até que cesse a obrigação a que o devedor está obrigado.

5 - Da decisão cabe recurso de agravo com efeito devolutivo para o tribunal da relação.

6 - Compete a quem receber a prestação a renovação anual da prova de que se mantêm os pressupostos subjacentes à sua atribuição, sem o que a mesma cessa.

dl n.º 164/99, de 13 de maio

regula a Garantia de alimentos devidos a Menores

artigo 4.ºatribuição das prestações de

alimentos 1 - A decisão de fixação das presta-

ções a pagar pelo Fundo é precedida da realização das diligências de prova que o tribunal considere indispensáveis e de inquérito sobre as necessidades do menor, oficiosamente ou a requeri-mento do Ministério Público.

2 - Para os efeitos do disposto no número anterior, o tribunal pode solicitar a colaboração dos centros re-gionais de segurança social e informa-ções de outros serviços e de entidades públicas ou privadas que conheçam as necessidades e a situação sócio-económica do alimentado e da sua família.

3 - A decisão a que se refere o n.º 1 é notificada ao Ministério Público, ao representante legal do menor ou à pessoa a cuja guarda se encontre e respetivos advogados e ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.

4 - O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social deve de imediato, após a notificação, comunicar a decisão do tribunal competente ao centro re-gional de segurança social da área de residência do alimentado.

5 - O centro regional de segurança social inicia o pagamento das pres-tações, por conta do Fundo, no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal.

que lhe incumbem. O eventual não uso ou a aplicação prática deficiente dos meios processuais existentes não justifica o recurso sucedâneo ao juízo de inconstitucionalidade da norma agora em causa.”

“Tanto basta para julgar improce-dente a crítica de que o diferimento da prestação (definitiva) a cargo do Fundo para o momento em que é proferida a decisão judicial, não sendo devidas prestações correspondentes ao período decorrido entre o momen-

to da formulação do pedido e essa decisão, priva o menor de proteção temporalmente adequada por parte do Estado, violando o disposto no n.º 1 do artigo 69.º e nos n.ºs 1 e 3 do artigo 63.º da Constituição.”

Por todos estes fundamentos, a Relação do Porto entendeu julgar procedente o recurso em questão, decidindo que a prestação mensal a cargo daquele Fundo é devida a partir do mês seguinte ao da notificação da decisão, não abrangendo qualquer

prestação anterior.

decisão do acórdão:A decisão tomada pelos Juízes

Desembargadores acabou por ser sumariada, no Acórdão, do seguinte modo:

“A prestação a cargo do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores é devida apenas a partir do mês seguinte ao da notificação da decisão que a fixou”.

Sumários - juriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 55

arreNdaMeNtoReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12/01/2012Revista nº 649/09.6TVLSB.S1 - 2.ª SecçãoAssunto: Arrendamento - Demolição de obras

I - As obras realizadas no locado que, sem autorização do senhorio, altera-ram a divisão interna das suas divisões e por isso fundamentaram a resolu-ção do contrato de arrendamento configuram-se como deteriorações incompatíveis com uma utilização prudente do mesmo e cuja elimina-ção compete ao locatário, como típica obrigação de indemnização na forma de reconstituição natural.II - Os danos constituídos por essas alterações não se confundem com os danos causados pela reposição do locado no estado em que o locatário o recebeu, mas sobre este impende a obrigação de indemnizar uns e outros.III - Formulando-se um pedido de «relativamente ao valor dos danos causados para reposição do locado no estado em que o mesmo se encon-trava, caso venha a ser necessário, se condenassem os Réus, solidariamente, no pagamento do valor que os autores venham a despender, a liquidar em execução de sentença», tratando-se de um dano futuro, o mesmo deve improceder se não foram alegados e concretizados os danos que previsivel-mente serão causados pelos trabalhos de reposição do locado.V - A condenação na reposição do locado no estado anterior aquele em que se encontrava, aquando da cele-bração do contrato ou no pagamento, no regime de solidariedade, do valor que os apelantes venham a ter que despender para tal efeito, relegando-

se para execução de sentença tal valor, configuraria perante aquele pedido nos termos em que foi formulado, condenação em objeto diverso do pedido, determinativa da nulidade da sentença nessa parte.

CiVilReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10/01/2012,Revista nº 817/07. 5TBSCR.L1.S1 - 6.ª SecçãoAssunto: Ação de reivindicação

I - Tem-se entendido que prevalece, no nosso direito, a concepção subjetiva da posse. Nesta concepção a posse é integrada por dois elementos (art. 1251º do CC): a) o corpus, que consiste no domínio de facto sobre a coisa; b) o animus, que é a intenção de exer-cer sobre a coisa, como seu titular, o direito real correspondente àquele domínio de facto.II - Traduzindo-se o animus possidendi num elemento de natureza psicoló-gica, a respetiva prova reveste-se de grande dificuldade. Por isso, para fa-cilitar a prova do animus, a lei estabe-leceu no citado art. 1252º, nº 2, do CC, uma importante presunção de posse a favor de quem tem o poder de facto.III - A posse distingue-se da mera detenção; os meros detentores ou possuidores precários não podem ad-quirir por usucapião – art. 1253º do CC.IV - “In casu”, como a posse (com cor-pus e animus) para efeito da aquisição do solo, por usucapião, por parte dos réus/recorrentes, só se iniciou em 14-04-1993, e o respetivo prazo em curso de interrompeu em 16-05-2007, com a citação para a presente ação (arts. 1292º e 323º, nº 1, do CC), quando apenas tinham decorrido 14 anos e 2 dias, é manifesto que os réus não

podem ter adquirido o solo por usu-capião – cf. art. 1296º do CC.

CoMerCialReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24/01/2012Revista nº 117/07.0TYVNG.P1.S1 - 6.ª SecçãoAssunto: Deliberação social

I - O direito que todo o sócio tem a ser designado para os órgãos de adminis-tração e de fiscalização da sociedade, nos termos da lei e do contrato, previs-to no art. 21º, nº 1, al. d), do CSC, não é um “bem social” suscetível de repar-tição pelos sócios, do mesmo modo que o não é o direito de quinhoar nos lucros, o direito de informação e o di-reito a participar nas deliberações dos sócios (previstos nas restantes alíneas do mesmo preceito).II - Em todos estes casos, trata-se de direitos em abstrato dos sócios, que só se transformam em direitos em concreto quando se verifiquem os pressupostos do seu “nascimento”. Assim, o direito do sócio exigir fazer parte dos órgãos sociais há-de resultar das regras estatutárias e legais que regulam o seu exercício, não sendo direta e imediatamente atribuído pela norma do CSC supra referida.III - Não existe justificação para, em concreto, chamando à colação os princípios da paridade e da propor-cionalidade, bloquear o normal fun-cionamento do princípio da maioria e conseguir, contra a vontade que esta expressou, a designação de pessoa diversa da indigitada pelos sócios maioritários como representante da 1.ª ré na assembleia geral da 2.ª ré em que se delibere a eleição dos órgãos sociais.IV - O facto de os sócios terem direito a

SuPreMo triBuNal de juStiÇa

juriSPrudêNCia - SumáriosVIDA JUDICIÁRIA - março 201256

um tratamento paritário não significa que o tribunal possa sobrepor-se às respetivas deliberações, transforman-do as minorias em maiorias.V - O direito à remuneração não pode ser encarado como algo que tenha de ser usufruído, rotativa e rateadamen-te, pelos sócios (quer os maioritários, quer os minoritários), como se estivés-semos em presença de um dividendo do exercício da atividade, ou de um “bem social” de natureza semelhante.

CoNtratoSReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12/01/2012Revista nº 1472/06.5TVLSB.L1.S1 - 2.ª SecçãoAssunto: Contrato de locação financeira

I - Com a responsabilização do reque-rente da providência cautelar conside-rada injustificada (art. 390º, nº 1, do CPC) visa-se penalizar civilmente o mesmo por, havendo que ter em conta a maior suscetibilidade de virem a ser decretadas medidas cautelares, quer baseadas em circunstancialismo fác-tico inverídico, quer baseadas numa versão unilateralizada dos factos e meios de prova apresentados, ter tido uma atuação censurável. Podendo chegar-se à conclusão que a medida cautelar decretada se fundou em fac-tos inverídicos ou deturpados ou em meios de prova falseados.II - Tornando-se necessário, para que o lesado seja garantido dos prejuízos, que estejam alegados e provados factos geradores da responsabilida-de civil: (i) injustificação (ou caduci-dade) da providência; (ii) imputação ao requerente; (iii) atuação dolosa do requerente ou fora das regras da pru-dência normal; (iv) danos determina-dos pela providência requerida; e (v) nexo de causalidade entre a conduta do requerente e tais danos.III - Não bastando, para a responsa-bilização do requerente o facto de a mesma vir a ser julgada injustificada, sendo, ainda, necessário a prova da sua culpa, que caberá ao lesado.IV - A locação financeira, muitas vezes designada de leasing, é um contrato

de financiamento, conjugando os con-tratos de locação e de compra e venda, embora constitua um tipo contratual autónomo deste.V - Não tendo ficado demonstrada a impossibilidade da prestação ou a perda do interesse do credor no respetivo cumprimento, tendo-se o devedor constituído em mora, por-que não cumpriu no tempo devido, transformou-se a mesma em incum-primento definitivo, após ter sido efe-tuada, sem sucesso, interpelação ao devedor, “in casu”, em conformidade com o clausulado no contrato. Sendo ao devedor que incumbe provar o cumprimento, o qual, em princípio, não se presume.VI - Feita a interpelação do devedor, sem cumprimento por banda do mes-mo, pode o contrato ser resolvido pela contraparte.

FaMÍliaReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31/01/2012Revista nº 6014/09.8TBVLSB.L1.S1 - 7.ª SecçãoAssunto: Alimentos – união de facto

I - As pensões de sobrevivência sur-gem na sua atual configuração com o DL nº 322/90, de 18-10.II - Pretende-se, como vem referido no preâmbulo do mencionado De-creto- -Lei, compensar, mediante a concessão de prestações continuadas, o desequilíbrio provocado pela morte de um dos membros do casal.III - Este desiderato legal tem ínsita a ideia de que o casamento, e também uma comunhão de facto consistente, denotam uma comunhão de vida em que cada um dos seus membros contribuía com parte substancial dos seus proventos para a comunidade familiar. Essa situação criou expetati-vas e serviu de base a encargos que o casal assumiu.IV - A Lei nº 23/2010, de 30-08, veio, entre outras alterações à Lei 7/2001, de 11-05, dispensar a prova da neces-sidade de alimentos para ter direito a uma pensão como membro sobrevivo de uma união de facto e impossibili-

dade da sua prestação por parte dos familiares do requerente e por parte da herança do falecido.V - As alterações em causa aplicam-se às uniões dissolvidas antes da entrada em vigor da nova lei já que aquelas configuram verdadeiros “estados de facto” que se prolongam no tempo independentemente da sua origem, sendo que esta solução se impõe até por força do “princípio da igualdade” consagrado no art. 13º da CRP.VI - A atribuição da pensão de so-brevivência, de harmonia com o art. 11º da Lei supra referida, que alterou a Lei 7/2001, de 11-05, tem efeito a partir da LOE posterior à sua entrada em vigor.

PeNalReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11/01/2012Proc. nº 1928/11.8JAPRT-A.S1 - 3.ª SecçãoAssunto: Juiz natural - Prisão ilegal

I - A providência de “habeas corpus” constitui um incidente que se destina a assegurar o direito à liberdade cons-titucionalmente garantido – arts. 27º, nº 1, e 31º, nº 1, da CRP –, sendo que visa pôr termo às situações de prisão ilegal, efetuada ou determinada por entidade incompetente, motivada por facto pelo qual a lei a não permite ou mantida para além dos prazos fixados na lei ou por decisão judicial – art. 222º, nºs 1 e 2, als. a) a c), do CPP.II - No caso vem alegado que a medida de coação de prisão preventiva em consequência do qual o peticionan-te se encontra preso foi determinada com violação das regras de compe-tência (em razão do território), viola-ção que constitui nulidade insanável nos termos da al. e) do art. 119º do CPP, por violação do princípio do Juiz natural.III - Sendo taxativos os fundamentos de “habeas corpus” previstos na lei, esta providência não pode ser utiliza-da para sindicação de outros motivos ou fundamentos suscetíveis de pôr em causa a regularidade e a legalidade da prisão, designadamente a sindicação

Sumários - juriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 57

de eventuais anomias processuais situadas a montante ou a jusante da prisão ou a verificação da legalidade da prisão reportada a momentos ante-riores, sindicação que só é admissível através do meio normal de impugna-ção das decisões judiciais, ou seja o recurso ordinário.IV - A lei ao aludir no art. 222º, nº 2, al. a), do CPP, à ilegalidade da prisão efetuada ou ordenada por entidade incompetente, apenas contempla si-tuações em que a prisão é decretada por outra autoridade que não um juiz, apelidada a prisão de non judice, não abrangendo situações em que a prisão é determinada por juiz incompetente, tanto mais que, de acordo com o nº 3 do art. 33º daquele diploma, as medi-das de coação ordenadas por tribunal declarado incompetente conservam eficácia mesmo após a declaração de incompetênciaV - Como se refere no Ac. do STJ de 10-10-2010, Proc. nº 3777/07, a «incom-petência» a que se refere a al. a) do nº 2 do art. 222º do CPP é essencialmente a falta de jurisdição, ou seja, a situação em que a entidade que decidiu a pri-são é alguém que não detém poder jurisdicional para intervir e decidir no caso concreto. A intervenção de juiz diferente do competente segundo as regras da repartição funcional de competências não envolve nenhuma diminuição de garantias para o argui-do e, por isso, não é fundamento de “habeas corpus”.VI - Carece, igualmente, de fundamen-to, no âmbito da presente providência, o pedido efetuado pelo requerente de reapreciação das medidas de coação que lhe foram aplicadas pelo tribunal a seu ver incompetente.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11/01/2012Proc. nº 522/11.8GCBNV-A.S1- 3.ª SecçãoAssunto:“habeas corpus”

I - A providência de “habeas corpus” é uma providência urgente e expedita, com uma celeridade incompatível com a prévia exaustão dos recursos ordinários e com a sua própria tramita-

ção, destinada a responder a situações de gravidade extrema, visando reagir, de modo imediato, contra a privação arbitrária da liberdade ou contra a manutenção de uma prisão manifes-tamente ilegal, ilegalidade essa que se deve configurar como uma violação direta, imediata, patente e grosseira dos seus pressupostos e das condi-ções da sua aplicação.II - Resulta do art. 219º, nº 2, do CPP, que mesmo em caso de recurso de decisão que aplicar, mantiver ou substituir medidas de coação legal-mente previstas, inexiste relação de dependência ou de caso julgado entre esse recurso e a providência de “habeas corpus”, independente dos respetivos fundamentos. Com efeito, a excepcionalidade da providência não se refere à sua subsidiariedade em relação aos meios de impugnação ordinários das decisões judiciais, mas antes e apenas à circunstância de se tratar de providência vocacionada a responder a situações de gravidade estrema, com uma celeridade in-compatível com a prévia exaustação dos recursos ordinários e com a sua própria tramitação.III - O peticionante solicita a sua ime-diata restituição à liberdade alegan-do a ilegalidade da sua detenção e subsequente prisão por excesso de prazo de apresentação ao juiz, consi-derando que a mesma foi decretada sem que previamente tivesse sido constituído arguido, e sem que tivesse sido previamente ouvido, não tendo a respetiva defensora legitimidade para, em nome do arguido, prescindir do que quer que fosse, uma vez que nem sequer conheceu o arguido ou falou com ele.IV - Conforme se extrai do art. 194º, nº 2, do CPP, a aplicação de medida de coação não implica necessária ou obrigatoriamente a audição prévia do arguido, ressalvando-se no nº 3 os ca-sos de «impossibilidade devidamente fundamentada, e que pode ter lugar no ato de primeiro interrogatório ju-dicial, aplicando-se sempre à audição o disto do nº 4 do art. 141º».

V - Embora o nº 1 do art. 192º do CPP refira que a aplicação de medidas de coação e de garantia patrimonial de-pende de prévia constituição como arguido após referir que «desde o mo-mento em que uma pessoa adquirir a qualidade de arguido é-lhe assegu-rado o exercício de direitos e de de-veres processuais», acrescenta: «sem prejuízo da aplicação de medidas de coação e de garantia patrimonial e de efetivação de diligências probatórias, nos termos da lei». Por outro lado, e relativamente à representação do arguido por defensor, há que ter em conta que o art. 63º, nº 1, do CPP, que o defensor exerce os direitos que a lei reconhece ao arguido, salvo os que ela reservar pessoalmente a este.VI - Dos elementos constantes dos autos, resulta que a prisão do arguido foi decretada por despacho datado de 16-09-2011 e, na sequência de inter-rogatório judicial, foi reexaminada em 10-11-2011, e revista pelo despacho de 03-01-2012. Além disso, aquando do despacho de 16-09-2011, em que se decidiu pela aplicação de medida de coação, sem a sua audição prévia face às razões de saúde atestadas no processo, e sem prejuízo de o mesmo vir a ser ouvido logo que o seu estado o permitisse, o arguido estava repre-sentado pela sua defensora.VII - Não se verificou situação de abuso de poder ou de erro grosseiro e rapi-damente verificável no decretamento da prisão preventiva. Não consta que o arguido impugnasse, em recurso, o despacho que lhe aplicou a prisão preventiva.VIII - Uma vez que o arguido se encon-tra em prisão preventiva à ordem dos autos desde 16-09-2011, determina-da por decisão judicial, por indícios da prática de crime de homicídio qualificado, o seu prazo máximo de duração de duração só terminará em 16-03-2012, se até lá não for deduzida acusação.IX - Desta forma, não ocorre qualquer fundamento previsto no art. 222º, nº 2, do CPP para o decretamento da providência de “habeas corpus”.

juriSPrudêNCia - SumáriosVIDA JUDICIÁRIA - março 201258

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11/01/2012Proc. nº 1111/11.7YFLSB - 3.ª SecçãoAssunto: Extradição

I - Nos termos do art. 58º, nº 1, da Lei 144/99, de 31-08, estipula-se que o MP e o extraditado podem recorrer da decisão final no prazo de dez dias, cabendo o julgamento do recurso à secção criminal do STJ (art. 49º, nº 3). Por sua vez, no art. 47º, nº 1, do citado diploma, a intervenção do Es-tado requerente da extradição é a de mero «participante» e «tem em vista possibilitar (…) o contato direto com o processo (…), bem como a fornecer ao tribunal os elementos que entenda solicitar».II - Assim, a posição do Estado reque-rente à luz do preceito em causa é a de cooperar e não dificultar o an-damento dos autos, restringindo a sua esfera interventiva à de trazer ao tribunal os elementos de que careça dentro desse espírito de colaboração. Tem, pois, uma posição de subalter-nidade em requerido e ao Estado requerido.III - A norma do art. 58º da Lei 144/99, de 31-08, rege, apenas, para o recurso da decisão final ordenando a extradi-ção é omissa quanto à admissibilidade dos recursos interpostos após essa fase processual, mas se a lei é bem expressa em vedar a legitimidade do Estado requerente da decisão que ordena a extradição, por maioria de razão, enquanto elemento lógico in-terpretativo da lei (art. 9º do CC), que essa proibição se imponha quanto a decisões da Relação proferidas após aquela fase.IV - O processo de extradição compor-ta uma fase administrativa e uma fase judicial, nos termos dos arts. 47º e 49º ss., respetivamente, iniciando-se a últi-ma mediante a apresentação do pedi-do de elementos documentais que o acompanharam ao MP junto do Tribu-nal da Relação competente. A questão da violação pelo Estado requerente do princípio da especialidade é um inci-dente da entrega, regulada no art. 60º da Lei 144/99, de 31-08, e em conexão

com a extradição decretada, ainda dentro da fase judicial, tanto assim que a sua resolução é desencadeada ante a entidade judiciária.V - Não pode fundamentar a atri-buição de legitimidade ao Estado requerente para recorrer a afetação de direitos nos termos do art. 401º, nº 1, do CPP. Efetivamente, o Estado requerente não é detentor de quais-quer direitos fundamentais ou parce-la de liberdade individual afetados, decorrentes de tratado internacional, desrespeitados por Portugal, deman-dando, por isso mesmo, a utilização de correspondentes instrumentos para realização, em forma célere e ajustada, pela via do recurso.VI - A interpretação que veda o recur-so ao Estado requerente não atropela qualquer direito constitucional, desig-nadamente por ofensa aos arts. 2º, 7º, nº 1, 20º, nº 4, e 32º, da CRP.VII - A cooperação internacional regu-lada em matéria penal releva do prin-cípio da reciprocidade, princípio que extravasa transversalmente todo o processo, impregnado de um sentido de moral geral e ética próprios, com o alcance de permitir-se a aplicação dosefeitos jurídicos em determinadas relações de direito sempre que esses mesmos efeitos são aceites por Esta-dos estrangeiros.VIII - O princípio da especialidade é um dos princípios estruturantes de todo o processo de cooperação inter-nacional e que não se limita, apenas, à extradição, nos termos da abran-gência alargarda a outras formas de cooperação definidas no art. 1 da Lei 144/99, de 31-08. Esse princípio faz parte daquele conjunto de axiomas impostos pela simples coexistência relevante da comunidade internacio-nal no sentido de que a entrega por extradição de u, delinquente obriga o Estado requerente a conter o seu procedimento, a sua perseguição pe-nal, nos precisos limites da acusação específica pelo crime predefinido e não por qualquer outro.IX - A especialidade desempenha uma função de garantia sucessiva, ou seja,

garantia da extradição efetuada, des-tinada a assegurar o cumprimento das obrigações que os Estados, com o pe-dido de extradição, de modo implícito mas inequívoco, se comprometem a observar (o Estado para o qual uma pessoa tenha sido extraditada não pode ser julgada, salvo consentimen-to do Estado requerido, senão pelo cri-me pelo qual tenha sido extraditado).X - A violação da clausula da especia-lidade por parte do Estado que viu a sua pretensão satisfeita integrará um ilícito, como tal censurável ao nível das relações entre os Estados.XI - No caso concreto, a extradição foi requerida não com base em con-vénio bilateral entre os Estados, mas pelo facto de existir uma convenção internacional – a Convenção Interna-cional para a Repressão de Atentados Terroristas à Bomba – e se mostrarem reunidos os pressupostos enunciados no art. 6º da Lei 144/99, de 31-08. O pedido de extradição foi instruído, ainda, com base numa declaração de garantia formal de que a pessoa reclamada não será julgada por fac-tos diversos dos que fundamentam o pedido e lhe sejam anteriores ou contemporâneos.XII - Assim, se o Estado requerente, após investigação dirigida contra o extraditado, alargou o âmbito da acusação, imputando-lhe novos fac-tos anteriores aos que integram o ato de extradição, ocorreu uma violação do princípio da especialidade. Com efeito, o alcance do princípio da es-pecialidade de forma alguma se pode conformar à luz da sua formulação, extensão e conformação jurídicas com o julgamento por crimes distin-tos daqueles por que foi autorizada a extradição.XIII - A nossa lei de cooperação in-ternacional não prevê a hipótese de infração à regra da especialidade, assumida pelo Estado requerente em compromisso internacional casuisti-camente ajustado. Contudo, o Estado Português, como estado soberano, não pode ficar imune ao incumpri-mento evidente e frontal de uma sua

Sumários - juriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 59

decisão, emanada da sua mais Alta Instância.XIV - Nestes termos, encontrando-se a extradição concedida sujeita a condição resolutiva, que o Estado requerente incumpriu, declara-se a sua resolução.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18/01/2012Proc. nº 4/10.5PATNV.C1.S1 - 3.ª SecçãoAssunto: Dupla conforme

I - O art. 400º, nº, al. f ), do CPP, na sua versão atual, introduzida pela Lei 48/07, de 29-08, veio vedar o recurso para o STJ das decisões condenató-rias da Relação, que confirmando o decidido em l.ª instância, apliquem pena não superior a 8 anos de prisão. A dupla conforme mostra-se válido instrumento de realização de celeri-dade processual sobretudo na zona de pequena e média criminalidade além de exprimir a crença de que a coincidência do decidido pelo acerto decisório ostentado não justifica mais do que um grau de jurisdição, ou seja um terceiro e um segundo de recurso, sendo suficiente um.II - O TC, em constância jurispruden-cial, tem vindo a afirmar que o recurso em triplo grau para o STJ, deve ser reservado aos casos de maior me-recimento penal (cf. o Ac. do TC nº 640/2004), não sendo irrazoável, des-proporcionado ou arbitrário restringir o recurso a um único grau; o acesso à Relação constitui já garantia consti-tucional de defesa (cf. Acs. do TC nºs 32/2006, 20/2007, 424/2009, 49/2003, 255/2005, 487/2006 e 682/2006).III - A dupla conforme é tanto a total como a parcial, in mellius, ou seja nos casos em que o tribunal de recurso reduz a pena, dizendo o STJ, quase una voce, que não deixa de haver confir-mação nos casos em que, in mellius, a Relação reduz a pena: até ao ponto em que a condenação posterior eli-mina o excesso resulta a confirmação da anterior.IV - O TC, por decisão sumária sua, nº 600/2011, no Proc. 800/2011, declarou e fez questão de sublinhar, expressa-

mente, ser jurisprudência uniforme sua que não é inconstitucional a in-terpretação da norma do art. 400º, nº 1, al. f ), do CPP, no sentido de não admitir recurso para o STJ da decisão da Relação, que aplicando pena de prisão não superior a 8 anos, reduz a pena aplicada em 1.ª instância, preci-samente porque o direito de defesa do arguido se mostra salvaguardado.

ProCeSSo CiVilReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12/01/2012Revista nº 4674/04.5TBSTS.S1 - 2.ª SecçãoAssunto: Renovação da prova

I - Constando do acórdão recorrido que o conhecimento de uma deter-minada questão fica prejudicado pelo entendimento nele vertido, não existe omissão de pronúncia; o que há é o entendimento de que tal questão não pode ser conhecida, entendimento esse cuja bondade não pode dar ori-gem a uma nulidade, mas antes ao conhecimento do seu mérito.II - Não sendo a Relação um segundo tribunal de 1.ª instância, mas sim um primeiro tribunal de 2.ª instância – e não sendo caso, por isso, de se realizar um novo julgamento integral – a rea-preciação da matéria de facto que aí é feita incidirá fundamentalmente sobre a apreciação dos meios de prova que o tribunal de 1.ª instância utilizou para fundamentar as respostas, servindo-se, não só dos elementos fornecidos pelas partes, mas também de todos os elementos em que aquele tribunal se tenha fundado – cf. art. 712º, nº 2, do CPC.III - Não obstante as respostas aos con-cretos pontos impugnados não terem assentado no depoimento da teste-munha cuja depoimento não ficou gravado, acaso a Relação entendesse que o mesmo era absolutamente in-dispensável para o apuramento da verdade (e perante a impossibilidade de o apreciar em gravação) poderia determinar a renovação do mesmo na própria Relação, conforme o permite o art. 712º, nº 3, do CPC.

ProPriedade HoriZoNtalReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12/01/2012Revista nº 149/2002.L2.S1 - 7.ª SecçãoAssunto: Partes comuns

I - O art. 483º do CC vem estabelecer uma cláusula geral de responsabili-dade civil subjetiva, fazendo depen-der a constituição da obrigação de indemnização da existência de uma conduta do agente (facto voluntário), a qual represente a violação de um dever imposto pela ordem jurídica (ilicitude), sendo o agente censurável (culpa), a qual tenha provocado danos (dano), que sejam consequência dessa conduta (nexo de causalidade entre o facto e o dano).II - O juízo de censura ao agente – apreciação da culpa – pode ser estabe-lecido por duas formas: um primeiro critério aponta para a apreciação da culpa em concreto, exigindo ao agen-te a diligência que ele põe habitual-mente nos seus próprios negócios ou de que é capaz; um segundo critério aponta para a apreciação da culpa em abstrato, exigindo a lei ao agente a diligência padrão dos membros da sociedade, a qual é naturalmente a diligência do homem médio, do bonus pater famílias.III - O critério adotado no CC, no art. 799º, nº 2, onde se prevê que «a culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, segundo as circunstâncias do caso», aponta para o critério tradi-cional da apreciação em abstrato se-gundo a diligência do homem médio, que continua a ser definido através da fórmula tradicional do bom pai de família, significando a referência a «circunstâncias de cada caso» que o próprio padrão a ter em conta varia em função do condicionalismo da hipótese e, designadamente, do tipo de atividade em causa.IV - Este juízo de censura pode resultar de infração de uma norma destinada a proteger interesses alheios produ-zindo um dano, incluindo-se aqui a

juriSPrudêNCia - SumáriosVIDA JUDICIÁRIA - março 201260

violação das normas que visam pre-venir, não a produção de um dano em concreto, mas sim o simples perigo do dano em abstrato.V - A relevância jurídica da omissão está ligada ao «dever genérico de prevenção de perigo», querendo-se com isto significar que o criador ou o mantenedor da situação especial de perigo tem o dever jurídico de o remover, sob pena de responder pelos danos provenientes da omissão.VI - Tendo resultado provado que de-vido ao facto de as escadas do prédio onde vivia em fração arrendada a autora caiu no último lance de esca-das – entre a fração da porteira e a porta do prédio –, e que esse mesmo prédio está constituído em proprie-dade horizontal, encontrando-se as mesmas inscritas a favor do réu e dos intervenientes, são os mesmos responsáveis (enquanto compro-prietários dessa parte comum), pela omissão de reparação da instalação geral de água, posto que não só não acautelaram a rutura da canalização, como não procederam à sua repara-ção imediata.VII - Significa isto que os condóminos poderiam ter evitado a queda da au-tora caso tivessem agido com o dever geral de cuidado, observando as mais básicas regras de segurança, que se limitariam a uma reparação imediata da rutura ou, pelo menos, a alertar a EPAL para fechar a água, sem omitir a necessária limpeza das escadas.VIII - Tanto os condóminos cujas fra-ções dão acesso às aludidas escadas, quanto os condóminos cujas frações dão acesso imediato à rua são com-proprietários não só das escadas como das instalações gerais da água, pelo que todos eles são coresponsáveis pela queda da autora, sendo a sua obrigação de indemnizar solidária.IX - Inexiste culpa da autora ao, vendo as escadas inundadas, ainda assim resolver atravessá-las, posto que não só era inexigível que a lesada ficasse retida em casa até que a água fosse cortada pela EPAL (o que só aconte-ceu 10 dias depois), como ainda não

resultou provado que as escadas es-tivessem intransitáveis e que, por via disso, ninguém pudesse sair de casa.

reSPoNSaBilidade CiVilReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12/01/2012Revista nº 81/06.3TCGMR.G1.S1 - 7.ª SecçãoAssunto: Acidente de trabalho – danos não patrimoniais

I - Dano é, na esteira do Prof. Antunes Varela, o prejuízo “in natura” que o le-sado sofreu nos interesses materiais, espirituais ou morais que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar.II - A ressarcibilidade dos danos não patrimoniais através de uma presta-ção pecuniária pode contribuir para atenuar, minorar ou de alguma forma compensar os danos sofridos pelo lesado servindo de compensação pecuniária para a satisfação das mais variadas necessidades desde as mais elementares às da mais elevada espi-ritualidade, tendo a lei reservado tal ressarcibilidade para aqueles danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.III - Tendo resultado provado que (i) à data do acidente o Autor tinha 39 anos, (ii) o acidente ocorreu em fevereiro de 2004 e apenas teve alta em novembro de 2006, (iii) teve um prolongado período de doença e so-freu vários internamentos, (iv) sofreu fratura exposta na perna direita e após 6 meses da intervenção a que foi sub-metido teve atraso na consolidação das fraturas do fémur e da tíbia, razão pela qual teve um atraso na consoli-dação das fraturas do fémur e da tíbia e teve de se proceder a manutenção da perda da substância cutânea na perna direita o que motivou que ti-vesse sido submetido a dinamização da vareta VFN, a enxerto livre da pele da perna e a osteotomia do peróneo direito, (v) foi novamente operado e durante 90 dias necessitou do auxílio de terceira pessoa para executar as tarefas da vida diária, (vi) ficou afetado com uma IPP de 15%, (vii) sofreu dores

intensas, quer no momento do aciden-te, quer no decurso dos tratamentos a que foi sujeito fixáveis em grau 5 (numa escala de 1 a 7), (viii) apresen-ta dano estético, designadamente cicatrizes extensas na perna direita, (ix) era uma pessoa saudável e alegre e agora encontra-se afetado física e psiquicamente, afigura-se adequado o montante indemnizatório encontrado pelas instâncias de € 25 000.

traBalHoReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5/1/2012Recurso nº 4820/04.9TTLSB.L1.S1 - 4.ª SecçãoAssunto: Isenção de horário de trabalho

I - Não se extraindo do acervo fatual provado a alegada degradação das condições de trabalho do autor, a injustificada contestação do mesmo por parte da respetiva Diretora e a sua crescente inatividade profissio-nal, mas antes que ocorreram três situações de dissensão entre o autor e aquela Diretora, que não extravasa-ram o âmbito do legalmente admis-sível no quadro de relações laborais hierarquicamente estruturadas, não ocorre a invocada violação de deveres por parte do empregador.II - A matéria de facto coligida não demonstra, nem sequer indicia, que a avaliação de desempenho do autor, em 2003, se tenha ficado a dever à manipulação/alteração de critérios utilizados para o efeito, pelo que ca-rece de suporte fáctico a alegação de que o Banco réu não o avaliou com a objetividade e rigor devidos.III - Embora de natureza retributiva, a remuneração especial por isenção do horário de trabalho não se encontra submetida ao princípio da irredutibi-lidade da retribuição, pelo que só será devida enquanto perdurar a situação em que assenta o seu fundamento, podendo o empregador suprimila quando cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição.IV - Não se provando o nexo de causa-lidade entre o facto de o autor sofrer de síndrome depressivo e qualquer

Sumários - juriSPrudêNCia VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 61

atuação ilícita do Banco réu, não existe obrigação, por parte deste, de indemnizar o autor pelo danos não patrimoniais invocados.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5/1/2012Recurso nº 3301/05.8TTLSB.L1.S1-4.ª SecçãoAssunto: Extinção de posto de trabalho

I - O artigo 38º, nº 1, da LCT, contempla um prazo especial de prescrição de créditos e uma regra específica quanto à sua contagem, sendo que, no mais, é aplicável o regime geral prescrição previsto no Código Civil, designa-damente no que à sua suspensão e interrupção respeita.II - Do disposto no artigo 389º, nº 1, al. a), do Código de Processo Civil, decorre que o prazo de propositura da ação – de que a eficácia da providên-cia depende e apenas no que a esta respeita/importa – conta-se, expres-samente, não a partir do seu trânsito em julgado ou do trânsito da decisão emergente de eventual recurso que dela tenha sido interposto, mas sim a partir da data em que lhe tiver sido notificada a decisão.III - A falta de autonomia do procedi-mento cautelar impõe que o reque-rente seja lesto em intentar a ação de reconhecimento ou de exercício do direito provisoriamente assegurado por aquele meio de tutela; de todo o modo, a demora no exercício dos direitos subjetivos não produzem, necessariamente, efeitos no próprio direito subjetivo.IV - O despacho que proclame a ca-ducidade do procedimento cautelar é meramente declarativo, o que signi-fica que os efeitos da sua prolação se reportam ao momento da verificação dos pressupostos da caducidade.V - Todavia, atento o disposto no ar-tigo 327º, nº 1, do Código Civil, esse despacho só releva para reinício da contagem do prazo de prescrição de créditos – que entretanto haja sido interrompido com a citação promo-vida no procedimento cautelar – caso tenha colocado termo ao processo e tenha transitado em julgado.

VI - Já assim não sucederá quando esse despacho não haja sido oportuna-mente proferido e quando, no proce-dimento cautelar, haja sido proferida decisão que, essa sim, tenha colocado termo ao processo e tenha transitado em julgado, sendo, pois, a partir desta data que se reinicia a contagem do prazo de prescrição dos créditos.VII - Não se mostram extintos, por efeito da prescrição, os créditos recla-mados pelo autor em ação intentada em 29 de Julho de 2005, se a decisão que colocou termo ao procedimento cautelar apenas foi proferida em 23 de Fevereiro de 2005 e transitou em jul-gado, sendo, assim, irrelevante, para o dito efeito, que a caducidade do pro-cedimento cautelar haja produzido efeitos em 15 de Setembro de 2003, se o despacho que a declarou apenas foi proferido em 7 de Abril de 2006.VIII - O despedimento com fundamen-to na extinção de posto de trabalho apresenta, quanto às suas causas, uma fisionomia híbrida: colhe, do despe-dimento com fundamento em justa causa subjetiva, o critério de aferição da legitimidade do motivo da rutu-ra, exigindo que seja praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho; pressupõe, em comum com o despedimento coletivo, quan-to à natureza dos seus fundamentos, causas objetivas de ordem estrutural, tecnológica ou conjuntural relativas à empresa ou motivos económicos, tecnológicos ou estruturais, relativos à empresa.IX - Quando o artigo 32º, nº 1, al. a), da LCCT, comina com o vício da nulidade a cessação do contrato de trabalho com fundamento na extinção do posto de trabalho nos casos em que faltem as comunicações previstas no artigo 28º, não está a referir-se, única e exclusivamente, às situações em que essa fase seja, em absoluto, suprimi-da ou inexistente: está, sem dúvida, a referir-se também àquelas situações em que essa fase, embora formalmen-te existente, não cumpra o desiderato a que está vocacionada.X - É nulo o procedimento conducente

à extinção do posto de trabalho quan-do a comunicação efetuada ao traba-lhador adote, na sua fundamentação, expressões vagas e conclusivas, des-providas de enquadramento fáctico, e quando da mesma não seja possível extrair um nexo causal mínimo entre os fundamentos invocados e a extin-ção do posto de trabalho.XI - Os pressupostos da responsabi-lidade civil por facto ilícito cifram-se, conforme emerge do disposto no artigo 483º, nº 1, do Código Civil, na violação de um direito ou interesse alheios, na ilicitude ou antijuridici-dade dessa violação, no vínculo de imputação ao agente do facto lesante desses direitos ou interesses, no dano sofrido e no nexo de causalidade entre o facto lesante e o dano.XII - No que respeita aos danos não patrimoniais, são ressarcíveis, por im-perativo legal – artigo 496º, nº 1, do Código Civil – apenas aqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.XIII - Não é de conferir o direito a in-demnização por danos não patrimo-niais quando apenas se prova que, em consequência do despedimento promovido pela entidade emprega-dora, o trabalhador foi acometido de angústia, insónias e receios, mas se não apura que essas emoções tenham atingido uma gravidade, profundidade, danosidade ou acen-tuação tais que tenham causado na sua personalidade moral um prejuízo assinalável e, por isso, digno de res-sarcimento.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5/1/2012Recurso nº 485/07.4TTLMG.P1.S1 - 4.ª SecçãoAssunto: Descaraterização de acidente de trabalho

I - A descaraterização do acidente de trabalho prevista na alínea b) do nº 1 do art. 7º da LAT exige a adopção, pelo sinistrado, de um comportamento temerário em alto e relevante grau, que não se consubstancie em ato ou omissão resultante da habitualidade ao perigo do trabalho executado, da

juriSPrudêNCia - SumáriosVIDA JUDICIÁRIA - março 201262

confiança na experiência profissional ou nos usos e costumes da profissão, considerando-se temerário o com-portamento perigoso, arriscado, au-dacioso, arrojado, intrépido, que não tem fundamento exigindo, ainda, a exclusividade desse comportamento para a ocorrência do evento.II - É de considerar descaraterizado o acidente quando está demonstrado que o mesmo ocorreu, exclusiva-mente, por o sinistrado ousar seguir, por sua livre opção – contrariando o aviso dos circunstantes – por um terreno onde não existia qualquer caminho que ligasse o prédio do R. à via pública, o que fez percepcionando claramente o risco que corria, por se tratar de um terreno acidentado, com declive acentuado tendo acoplado ao trator que conduzia um bombo com 400 litros de água, o que determinaria – como determinou – que o trator “em-pinasse”, situação que tentou, aliás, contornar, impondo a um dos seus tra-balhadores que se colocasse na frente do trator a fazer peso e aos demais que se equilibrassem nos lados, porquanto o sinistrado – teimosa, ousada, desne-cessária e inutilmente – seguiu por um “caminho” que não existia, avançando num contexto morfológico de patente risco, desafiando as limitações da má-quina e as leis da Física.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5/1/2012Recurso nº 486/07.2TTSTS.P1.S1 - 4.ª SecçãoAssunto: Acidente de trabalho - Violação de regras de segurança

I - No âmbito da LAT a responsabili-dade agravada tipificada no art. 18º, nº 1 está dependente da alegação e prova, de um comportamento culposo da entidade empregadora ou seu re-presentante, ou a violação das regras de segurança e o nexo de causalidade entre a violação e o acidente.II - O estabelecimento do nexo de causalidade, juridicamente relevante para o efeito da imputação de respon-sabilidade, pressupõe que o facto ilí-cito (ação ou omissão) praticado pelo agente tenha atuado como condição

da verificação de certo dano, apre-sentando-se este como consequência normal, típica ou provável daquele.III - Não se retirando da matéria de facto apurada nos autos que o aci-dente tenha resultado da falta de ob-servação das regras de segurança no trabalho, não se mostram preenchidos os pressupostos da responsabilidade agravada da empregadora.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5/1/2012Recurso nº 164/07.2TTCBR.C1.S1 - 4.ª SecçãoAssunto: Justa causa de despedimento

I - O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não é suscetível de ser objeto de recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, a menos quedecorra da violação expressa de lei, que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.II - Exige-se para a justa causa de des-pedimento que exista um violação culposa, pelo trabalhador, dos seus deveres contratuais, que essa violação seja grave em si mesma e nas suas consequências e que, por via dessa gravidade, seja imediata e pratica-mente impossível manter o contrato, sendo de apreciar esta impossibili-dade no campo da inexigibilidade, a determinar perante os interesses em presença, por forma a que a subsis-tência do contrato represente uma insuportável e injusta imposição ao empregador.III - Verificar-se-á a impossibilidade prática da subsistência da relação la-boral quando se esteja perante uma situação de quebra de confiança entre trabalhador e empregador, que seja suscetível de criar no espírito deste a dúvida sobre idoneidade futura da conduta daquele, estando, portanto, o conceito de justa causa ligado à ideia de inviabilidade do vínculo contratual, correspondendo a uma crise extrema e irreversível do contrato.IV - Apurando-se que o trabalhador, ao ser questionado acerca do atraso no abastecimento de combustível de um

cliente da entidade empregadora, res-pondeu, ao seu superior hierárquico, que se quisesse saber poderia ter liga-do para a cliente, sendo certo que lhe competia, no âmbito das suas funções, prestar as informações que fossem suscetíveis de complicar a atempada execução do serviço, conclui-se pela violação do dever de colaboração e obediência.V - Apurando-se, igualmente, que o trabalhador recusou, indevidamente, a realização de um abastecimento a uma cliente da ré, sabendo que esse serviço apenas demoraria duas horas, que, se esse abastecimento não fos-se realizado, a fábrica dessa cliente poderia parar e que a entidade em-pregadora poderia perder a cliente e ter que a indemnizar pelos prejuízos causados, conclui-se pela violação do apontado dever, mostrando-se adequada a sanção do despedimento com justa causa.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5/1/2012Recurso nº 715/09.4T4AVR.C1.S1 - 4.ª SecçãoAssunto: Novo contrato de trabalho

I - Tendo as partes acordado, por escri-to, que a partir de 1 de Maio de 2005 e até 31 de Julho de 2007 se quiseram vincular através dum novo contrato de trabalho, agora celebrado a termo, e cuja validade não foi questionada pelo autor, temos de concluir que o contrato de trabalho que vigorava desde Dezembro de 1997 cessou efe-tivamente com a celebração deste contrato a termo, pois a subsistência deste novo contrato era absoluta-mente incompatível com a vigência do contrato anterior, gerando assim a sua caducidade.II - Assim, e considerando que o con-trato cessou em data anterior a 1 de Maio de 2005, e tendo a ação sido ajuizada já em 2009, há muito que se esgotara o prazo de prescrição dos créditos emergentes do primeiro contrato de trabalho, e que é de um ano contado da cessação do contrato, conforme prescreve o artigo 381º, do Código do Trabalho de 2003.

leGiSlaÇÃo - Síntese VIDA JUDICIÁRIA - março 2012 63

Agentes de execução - estágioDeclaração de retificação n.º 449/2012, de 28.3 (II série)- Retifica o Regulamento de Estágio de Agentes de Execução, publicado com o n.º 275/2011 no Diário da República, 2.ª série, n.º 86, de 4 de maio de 2011

Comércio à distância de serviços financeirosLei n.º 14/2012, de 26.3- Procede à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 95/2006, de 29 de maio, no que respeita à resolu-ção dos contratos relativos a serviços financeiros prestados a consumidores celebrados através de meios de comunicação à distância e transpõe parcialmente para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2002/65/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de setembro, relativa à co-mercialização à distância de serviços financeiros prestados a consumidores

Custas processuaisPort. n.º 82/2012, de 29.3- Quarta alteração à Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, que regula o modo de elaboração, contabilização, liquidação, pagamento, pro-cessamento e destino das custas processuais, multas e outras penalidades

Estruturas residenciais para idososPort. n.º 67/2012, de 21.3- Define as condições de organização, funciona-mento e instalação das estruturas residenciais para pessoas idosas

ImpostosLei nº 14-A/2012, de 30.3 – (Supl.) - Aprova alterações ao Código do IVA, ao Código dos Impostos Especiais de Consumo e procede à décima alteração ao Decreto-Lei nº347/85, de 23 de agosto, no âmbito do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro da Região Autónoma da Madeira.

Iniciativa “Projeto limpar Portugal”Port. n.º 63/2012, de 20.3- Estabelece um regime excecional aplicável à iniciativa «Projeto limpar Portugal»

Máquinas de diversãoDLR n.º 12/2012/A, de 27.3- Quarta alteração ao Decreto Legislativo Regio-nal n.º 28/2000/A, de 10 de agosto, que estabe-lece o regime de licenciamento, de exploração e registo de máquinas de diversão

Preço da habitação por m2Port. n.º 64/2012, de 20.3- Fixa, para vigorar em 2012, o preço da habita-ção por metro quadrado de área útil e o preço de venda dos terrenos destinados a programas de habitação de custos controlados

REGIÕES AUTÓNOMAS

Açores - Sistema científico – Incentivos financeirosDLR n.º 10/2012/A, de 26.3- Estabelece o regime jurídico do Sistema Cien-tífico e Tecnológico dos Açores (SCTA) e cria o respetivo sistema de atribuição de incentivos financeiros

Açores - Apoio ao microcrédito bancárioDLR n.º 11/2012/A, de 26.3- Define as regras para execução do Regime de Apoio ao Microcrédito Bancário nos Açores.

Madeira - Subsídio de mobilidade socialRALRA Açores n.º 19/2012/M, de 26.3- Procede à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 66/2008, de 9 de abril, alterado pelas Leis n.os 50/2008, de 27 de agosto, e 21/2011, de 20 de maio, que regula a atribuição de um subsídio de mobilidade social aos cidadãos beneficiários, no âmbito dos serviços aéreos e entre o continente e a Região Autónoma da Madeira.

Madeira - Orçamento 2012 MadeiraDecreto Legislativo Regional n.º 5/2012/M, de 30.3 - Aprova o Orçamento da Região Autónoma da Madeira para 2012

Sistema financeiro - garantiasPort. n.º 80/2012, de 27.3- Segunda alteração à Portaria n.º 1219-A/2008, de 23 de outubro, que regulamenta a concessão extraordinária de garantias pessoais pelo Estado, no âmbito do sistema financeiro

TRABALHO E SEGURANÇA SOCIAL Vencimento dos gestoresRCM n.º 36/2012, de 26.3- Aprova a classificação das empresas públicas e das entidades públicas integradas no Serviço Nacional de Saúde para efeitos da determinação do vencimento dos respetivos gestores.

Igualdade no trabalhoDL n.º 76/2012, de 26.3- Aprova a orgânica da Comissão para a Igualda-de no Trabalho e no Emprego

Qualificações profissionaisPortaria n.º 88/2012, de 30.3 - Especifica as profissões regulamentadas abran-gidas no setor da defesa nacional e designa a res-petiva autoridade competente para proceder ao reconhecimento das qualificações profissionais

Portaria n.º 89/2012, de 30.3 - Determina as profissões regulamentadas na área da justiça e as autoridades nacionais competentes para o reconhecimento das qua-

lificações profissionais para o exercício dessas profissões por cidadãos de Estado-membro da União Europeia ou de Estado signatário do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu

Portaria n.º 90/2012, de 30.3 - Especifica as profissões regulamentadas abran-gidas nas áreas da agricultura, das florestas, do mar, do ambiente e do ordenamento do territó-rio e designa as autoridades nacionais que, para cada profissão, são competentes para proceder ao reconhecimento das qualificações profissio-nais, nos termos da Lei n.º 9/2009, de 4 de março

Portaria nº 91-A/2012, de 30.3 (Supl.) - Especifica as profissões regulamentadas no âmbito do ensino superior e designa as au-toridades competentes para procederem ao reconhecimento das respetivas qualificações profissionais, nos termos da Lei nº 9/2009, de 4 de março.

Ensino recorrentePortaria n.º 91/2012, de 30.3 - Segunda alteração à Portaria n.º 550-E/2004, de 21 de maio, que cria diversos cursos do en-sino recorrente de nível secundário, aprova os respetivos planos de estudos e aprova o regime de organização administrativa e pedagógica e de avaliação aplicável aos cursos científico-humanísticos, aos cursos tecnológicos e aos cursos artísticos especializados, nos domínios das partes visuais e dos audiovisuais, de ensino recorrente de nível secundário

Tráfico de estupefacientesLei n.º 13/2012, de 26.3- Altera pela décima nona vez o Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, que aprova o regi-me jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, acrescentando a mefedrona e o tapentadol às tabelas que lhe são anexas

Tribunal da Propriedade e Tribunal da ConcorrênciaDL n.º 67/2012, de 20.3- Procede à instituição do tribunal da proprie-dade intelectual e do tribunal da concorrência, regulação e supervisão, tribunais com com-petência territorial de âmbito nacional para o tratamento das questões relativas à proprie-dade intelectual e à concorrência, regulação e supervisão

TribunaisPort. n.º 83/2012, de 29.3- Quinta alteração aos quadros das secretarias judiciais e dos serviços do Ministério Público, constantes do mapa anexo à Portaria n.º 721-A/2000, de 5 de setembro

Port. n.º 84/2012, de 29.3- Declara instalados o 1.º Juízo do Tribunal da

PriNCiPal leGiSlaÇÃo PuBliCada1ª e 2ª Séries do Diário da República de 17 A 31 de Março de 2012

leGiSlaÇÃo - SínteseVIDA JUDICIÁRIA - março 201264

eXtiNÇÃo do PoSto de traBalHo

Sumário: “i - No âmbito do CT/2003, a extinção do posto de trabalho determina o despedimento justificado por motivos económicos, que tanto podem ser de mercado, como estruturais ou tecnológicos, relativos à empresa, nos termos previstos para o despedimento colectivo.E será a alternativa a seguir quando se não verifique o regime definido para aplicação deste, sendo ilícito nas situações previstas nos arts. 429.º e 432.º, nomeadamente se forem declarados improcedentes os motivos justificativos invocados para o despedimento e se não tiverem sido respeitados os requisitos do n.º 1 do art. 403.º.ii - A sindicabilidade jurisdicional da actuação do empregador está limitada, porquanto, na apreciação da verificação ou não do motivo justificativo invocado para a extinção do posto de trabalho, as decisões técnico-económicas ou gestionárias a montante da extinção do posto de trabalho estão cobertas pela liber-dade de iniciativa dos órgãos dirigentes da empresa, colocando-se, por isso, a verificação judicial ao nível do nexo sequencial entre a op-ção de extinção do (daquele) posto de trabalho e a decisão de pôr termo àquele contrato. iii - A impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho tem de decorrer da demonstração de factualidade que revele que, extinto o posto de trabalho em apreço, inexistia outro compatível com a categoria do trabalhador, competindo a prova dessa circunstância ao empregador.iV - É de considerar ilícito o despedimento quando está demonstrado que a R., após a cessação do contrato da A. – para além de não ter, sequer, tentado recolocá-la a exercer quaisquer outras funções compatíveis com a sua categoria profissional – contratou outra pessoa para desenvolver parte das funções que até então aquela desenvolvia e atribuiu algumas outras dessas funções a pessoas que já trabalhavam para a R., mas com menor antiguidade que a A. iV - O escopo da sanção pecuniária compul-sória é o de forçar o devedor a cumprir, a vencer a provável resistência da sua oposição ou indiferença.Consistindo num meio coercivo, intimidatório, não visa primacialmente, por isso, o objectivo de indemnizar os danos sofridos pelo credor com a mora, sabido que, neste contexto, mais

que o montante da retribuição do trabalhador, releva, na ponderação dos postulados equilí-brio e sentido da proporção, o valor maior da urgente recuperação do posto de trabalho, com todos os reflexos inerentes.Assim, no caso, revela-se adequada a fixação dessa sanção em € 500,00 diários.V - Tendo as partes acordado, expressamente, um horário de trabalho fixo, impendia sobre a R. a obrigação de obter o acordo prévio da A. para proceder à alteração do seu horário de trabalho, pelo que, não tendo a R. logrado demonstrá-lo, é de concluir que o trabalho prestado pela A. aos fins-de-semana e feria-dos, no âmbito das escalas de permanência extraordinárias designadas pela R., tem de ser considerado, para efeitos de remuneração, como trabalho suplementar, prestado em dia de descanso semanal, obrigatório e comple-mentar, e em dia feriado.Vi - Até ao CT/2003, em caso de violação do princípio de para trabalho igual, salário igual, cabia ao trabalhador o ónus da alegação e prova da igualdade do trabalho (em natureza, quantidade e qualidade); Porém, o art. 23.º, n.º 3, do referido Código veio, no caso de existência de algum factor discriminatório, inverter o mencionado ónus da prova, atribuindo ao empregador o encargo de provar que a diferença salarial não assenta em algum desses factores, ou seja, que essa diferença é justificada.Vii - Não tendo a R. logrado demonstrar, relativamente aos anos de 2003 a 2006, que procedeu à avaliação do desempenho da A., e que o não pagamento dos prémios respectivos se ficou a dever a desempenho profissional insuficiente por parte desta, justificativo desse não pagamento, tem a A. direito ao pagamen-to dos reclamados prémios.”.(Proc. nº. 554/07.0TTMTS.P1.S1, de 15/3/2012).

direito ao BoM NoMe

Sumário:”i - Impondo-se ao director da publicação o de-ver especial de conhecer e decidir, antecipada-mente, sobre a determinação do seu conteúdo, em ordem a impedir a divulgação de escritos ou imagens susceptíveis de constituir um facto ilícito gerador de responsabilidade civil, a imputação ao mesmo do conteúdo que resulta da própria titularidade e exercício da função e dos inerentes deveres de conhecimento integra uma presunção legal.

ii - Trata-se de uma presunção legal que dis-pensa o lesado do ónus da prova do facto a que a presunção conduz, isto é, a demonstra-ção da culpa do agente, admitindo-se, porém, que o onerado a ilida, mediante prova em contrário, dada a sua natureza de presunção tantum iuris.iii - Tendo o lesado invocado os factos consti-tutivos do ilícito, isto é, no caso concreto, a pu-blicação do «escrito» e a qualidade de director do agente, o qual, por seu turno, não alegou e provou que ignorava, de forma não culposa, o teor do escrito causador da lesão ou que este foi publicado sem o seu conhecimento ou com a sua oposição, não ilidiu, consequentemente, a base da presunção, tornando-se, assim, civilmente, responsável pelos danos causados.iV - Em matéria de responsabilidade civil, no âmbito da comunicação social, está consa-grado um regime de solidariedade passiva dos titulares das empresas jornalísticas com o autor da publicação, mas não de litiscon-sórcio necessário, relativamente ao director da publicação.V - A gravidade do dano não patrimonial depende, por um lado, da intensidade das afirmações feitas e da divulgação que lhes foi dada, e, por outro, da personalidade e funções do visado, assumindo particular acuidade no caso de alguém que foi futebolista de eleição e exercia, na ocasião, funções de responsabi-lidade na Federação Portuguesa de Futebol.Vi - De acordo com a doutrina da causalidade adequada, na sua vertente negativa, um facto é causal de um dano quando é um de entre várias condições sem as quais aquele se não teria produzido, exigindo-se entre o facto e o dano indemnizável um nexo mais apertado do que a simples sucessão cronológica, de modo que nem todos os danos sobrevindos ao facto ilícito estão incluídos na responsabilidade do agente.Vii - Muito embora os réus, na contestação, não tenham invocado a insolvência de terceiro como circunstância obstativa do cumprimento do contrato que o lesado celebrou com o mesmo, mas apenas com a junção de docu-mentos que efectuaram antes da audiência de discussão e julgamento, não se tratando de defesa por excepção, mas antes de factos que compõem a negação motivada, era ao autor que competia a prova dos mesmos, como factos constitutivos do seu alegado direito à indemnização, e não aos réus. “(Proc. n.º 3976/06.0TBCSC.L1.S1, de 15/3/2012).

disponíveis em www.dgsi.ptaCórdÃoS do Stj

Propriedade Intelectual e o 1.º Juízo do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão

ACÓRDÃOS - Tribunal Constitucional

Regulamento de Estágio da Ordem dos AdvogadosAcórdão do Tribunal Constitucional n.º 89/2012, de 9.3- Declara a inconstitucionalidade, com força

obrigatória geral, das normas constantes do artigo 24.º, n.os 3 e 4; do artigo 36.º, n.º 2, 2.ª parte; do artigo 42.º, n.º 5, 2.ª parte, todos do Regulamento Nacional de Estágio da Ordem dos Advogados (Regulamento n.º 52-A/2005, de 1 de agosto), na redação que lhes foi conferida pela Deliberação n.º 3333-A/2009, de 16 de dezembro, do Conselho Geral da Ordem dos Advogados

RECTIFICAÇÕESCustas processuaisDecl. de Retif. n.º 16/2012, de 26.3- Declaração de retificação à Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro, que procede à sexta alteração ao Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, publicada no Diário da República, 1.ª série, n.º 31, de 13 de fevereiro de 2012

BD JURÍDICAbase de dados on-line

Constituição

Contabilidade

Direito Administrativo

Direito Civil

Direito do Ambiente e Ordenamento do Território

Direito do Consumo

Direito Fiscal

Direito Laboral

Direito Penal

Direito Rodoviário

Incentivos e Apoios a Empresas

Organização

Político-Administrativa

Segurança, Higiene e Saúde do Trabalho

Segurança Social

Sociedades e Direito Comercial

Turismo

Áreas Temáticas Destinatários

Advogados

Solicitadores

Notários

Revisores Oficiais de Contas

Técnicos Oficiais de Contas

Empresas (Departamentos Jurídicos)

Responsáveis de Recursos Humanos

Directores Financeiros

Organismos Públicos

Gabinetes de Contabilidade

Autarquias

Associações Empresariais

Associações Comerciais

Sindicatos

Na BD Jurídica encontra legislação, doutrina fiscal e da Segurança Social, jurisprudência, textos de análise e minutas, tudo sistematizado por áreas jurídicas. Também disponível a edição da 1.ª série DR (desde 2003) e os diplomas mais importantes da 2.ª série.

Cobertura integraldas áreas jurídicas mais relevantes

Atualizada e tratada diariamente por uma equipa de juristas experientes

PREÇOSMensal: 30€ | Anual: 350€ | Bienal: 630€

Assine já em http://livraria.vidaeconomica.pt [email protected] 223 399 400

PREÇOS

Assine já em http://livraria.vidaeconomica.ptAssine já em http://livraria.vidaeconomica.pt [email protected]

Assine já em http://livraria.vidaeconomica.ptAssine já em http://livraria.vidaeconomica.pt [email protected]

PREÇOS

Assine já em http://livraria.vidaeconomica.pt [email protected]

PREÇOS

Assine já em http://livraria.vidaeconomica.pt [email protected]

Agricultura tem nova linha de crédito de 50 milhões de euros

Pág. 8

FISCALIDADE

Orçamento retifi cativo altera regras de IRS e IRC

Pág. 29

MERCADOS

Ouro ganha importância nas carteiras de investimento

Pág. 42

Nº 1440 / 13 de abril 2012 / Semanal / Portugal Continental J 2,20

www.vidaeconomica.pt

DIRETORJoão Peixoto de Sousa

C

M

Y

CM

MY

CY

CMY

K

JOSÉ AZEVEDO RODRIGUES, BASTONÁRIO DA OROC, CONSIDERA

“Continuamos a conviver com inúmeros POC setoriais”

Págs. 4 e 5

9 720972 000037

0 1 4 4 0ISBN 972-0-97200-003-7

PUB

www.netopo l is .p t ● 217 828 100

Atendimento de excelência

Multicanal (Voz, Email, Chat)

Reduz Custos

Implementeuma solução de ContactCenter em menos de 5 dias

Desde110€mês

PUB

PUB

• Suplemento Frotas• Suplemento Portos• Especial Aeroportos

NESTA EDIÇÃO

FINANCIAMENTO A 100% E SPREADS A PARTIR DE 1,5% SÃO AS CONDIÇÕES OFERECIDAS

Bancos têm milhares de imóveis para venderPág. 41

CEM NORTEDE11562011GRC

4,00 euros (IVA incl.)

ABRIL • 1ª QUINZENA ANO 80º • 2012 • Nº 7

(Continua na pág. 275)

Subsídio de desemprego tem novas regras

Entraram em vigor no dia 1 de Abril as novas regras relativas à proteção no desemprego dos trabalhadores por conta de outrem, constantes do Decreto-Lei nº 220/2006, de 3.11 (Bol. do Contribuinte, 2006, pág. 487).

Principais alteraçõesDas novidades introduzidas pelo Decreto-Lei nº

64/2012, de 15.3, destacam-se as seguintes:• majoração temporária (até 31 de dezembro de

2012) de 10% do montante do subsídio de desemprego quando no mesmo agregado familiar ambos os côn-juges ou pessoas que vivam em união de facto sejam titulares do subsídio de desemprego e tenham fi lhos ou equiparados a cargo, ou quando no agregado mo-noparental o parente único seja titular do subsídio de desemprego e não aufi ra pensão de alimentos decretada ou homologada pelo tribunal(*).

Refi ra-se que os benefi ciários das prestações de de-semprego já começaram a ser notifi cados pelo Instituto do Emprego e Formação Profi ssional da majoração de 10% sobre tais montantes.

De acordo com o Governo, a eventual manutenção da majoração para além da data referida resultará da avaliação que o Ministério da Solidariedade e da Se-gurança Social realizar nessa altura;

• redução de 450 para 360 dias do prazo de garantia para a obtenção de subsídio de desemprego;

NESTE NÚMERO:

• Orçamento retifi cativo – proposta de lei• IRS – declaração modelo 3 - deduções

e benefícios aplicáveis ao exercício de 2011• IMI – regras de pagamento – taxas

LegislaçãoLei n.º 14-A/2012, de 30.3 (IVA e Impostos Especiais de Consumo - alterações aos Códigos - alteração ao Dec.-Lei n.º 347/85, de 23.8) .................... 259Dec. Leg. Reg. n.º 5/2012/M, de 30.3 (Orçamento da Madeira para 2012 - adaptação do sistema fi scal nacional) ..................................... 260Port. n.º 77/2012, de 26.3 (Contribuição sobre o setor bancário - Alteração à Port.nº 121/2011, de 3.3) 263Proposta de Lei n.º 51/XII (Orçamento Retifi cativo - IRS, IRC, EBF, LGT, CPPT e Código Contributivo - alterações - Lei nº 64-B/2011, que aprova o Orçamento do Estado para 2012 - legislação complementar – alterações) ............................. 265DL n.º 65/2012, de 15.2 (Trabalhadores Independentes - proteção social na eventualidade de desemprego) 272Resoluções administrativas e Informações vinculativasIMI: regime de avaliação geral de prédios urbanos

para efeitos fi scais - Alteração do nº 6 da Circ. nº 25/201 ............................................... 255IVA: destruição de resíduos das indústrias alimentares;

regras especiais de tributação - desperdícios, resíduos e sucatas recicláveis - Anexo E ao Código do IVA (cavilha de latão); subsídios e comparticipações para a realização de feiras, congressos e outros eventos ............................ 255 a 257 Obrigações fi scais do mês e informações diversas . 242 a 246IRS - benefícios e deduções fi scais aplicáveis a 2011 249Sistemas de incentivos e apoios ................................ 254Trabalho e Segurança SocialLegislação, Informações Diversas ....................... 272 a 277Sumários do Diário da República .............................. 280

SUMÁRIO

feve

reir

o/20

12Vi

da Ju

dici

ária

Nº 163 - fevereiro 2012 - 7,50€

em foco

Ordem dos Advogados de Angola quebra protocolo com advogados portugueses

mARcAS

Confundibilidade entre marcas

eNTReVISTA Paula Meira Lourenço

eficácia

não é inconstitucional

ARReNDAmeNTo URBANoProposta de alteração

MARÇO E ABRIL 2012 | N.º 14 | 2ª SÉRIE

EDITORIAL

• Crescimento,CompetitividadeeEmprego

ENTREVISTA

• LeopoldoAssunçãoAlves,ProfessorUniversitário,ROC,TOCemembrodaCNC

• RuiAlmeida,AdministradordoGrupoMoneris

ARTIGOS

• Aplicaçãoderesultados

• Património????

• Macroenquadramentodasdiferençasdeexpectativasemauditoria:sociedade,economia,governodassociedadeseregulamentação

• PauloCastro?????

OUTROSDESTAQUES

• FalecimentodoPresidentedaCNC,Prof.Dr.DomingosJosédaSilvaCravo

• CasoPráticon.º16–Dívidasareceber

CONTABILIDADE& EMPRESAS

7 278820 120304

ISBN 727-882-012-030-4

Nos negócios, como na alta competição,é necessário estar bem preparado.

Compre já em http://livraria.vidaeconomica.pt

Paula Meira Lourenço

omissão para a e

não é inconstitucional

eNTReVISTA Paula Meira Lourenço

comissão para a das execuções não é inconstitucional

Regul

amen

to e

m li

vrar

ia.vi

daeconomica.pt

Exclusivo paracompras online

Vida Económica - R. Gonçalo Cristóvão, 14, r/c • 4000-263 PORTO | Tel. 223 399 400 | Fax 222 058 098 | E-mail: [email protected]