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As Perícias na Polícia Judiciária Artur Pereira Polícia Judiciária Directoria do Porto 1. Introdução A investigação criminal tem como objectivo último a descoberta da verdade material de factos ocorridos, i.e. a reconstituição histórica da materialidade de eventos do passado. Contudo, não basta investigar! Não basta apenas descobrir a verdade! É preciso provar, i.e. demonstrar a total e rigorosa identidade entre o evento ocorrido no passado e a respectiva reconstituição feita no presente. Essa demonstração deve ter lugar, de acordo com regras e princípios pré-definidos que a caracterizam, limitam e disciplinam A produção de prova tem evoluído ao longo dos tempos, acompanhando as mutações tecnológicas e científicas, com especial relevo a partir do séc. XIX . Na verdade, a administração da prova no processo penal sofreu, de acordo com as épocas, numerosas variações. O processo penal antigo assentava no dogma do dever de verdade, que também impendia sobre o arguido. A confissão configurava-se, assim com a “proba probantissima” ou rainha das provas, pelo que a tortura se configurava como meio idóneo de assegurar o cumprimento daquele dever. A legitimidade de recurso à tortura está expressa de forma paradigmática no artigo 58º da Constitutio Criminalis Carolina de 1532. 1 , 2 A tradição processual fundava-se ainda na subjectividade de juízos formulados quer por polícias quer por testemunhas, aos quais não eram estranhos pré-juizos de índole moral e social sobre as vítimas e queixosos. Ora, foi sendo reconhecido que o testemunho não era uma prova absolutamente certa, não que as testemunhas careçam todas de sinceridade, mas porque é muito raro que tenham visto perfeitamente o que interessa ver e sobretudo que disso se recordem exactamente. Em particular, é muito difícil obter de uma testemunha uma descrição precisa e é mais difícil ainda de lhe fazer indicar exactamente uma hora e sobretudo uma data se os factos não são recentes. 3 Concluímos então que devemos preferir à prova testemunhal, o indício e entre estes aqueles que são fornecidos pela aplicação de métodos científicos. Assim se criou o nome técnica policial ou criminalística, um modo de administração da prova no processo penal que consiste na análise sistemática de indícios deixados na cena do crime. A prova material ou científica, fundada em dados objectivos obtidos através de métodos científicos, ganhou maior relevo em detrimento da prova pessoal ou subjectiva. Poderíamos dizer que a religião da confissão deixou o lugar à religião da prova científica. Alguns dizem mesmo que ela é hoje a rainha das provas. Convém, no entanto, ponderar quer a prova testemunhal continua, necessariamente a ter um papel importante na realização da justiça, nalguns casos até, determinante. Toda a actividade de investigação criminal está balizada, como não podia deixar de ser, num estado de direito, num quadro normativo que lhe fixa as regras e limites condicionantes, que é o direito processual penal e outra legislação avulsa complementar. 1 Há quem nos dias de hoje classifique as intercepções telefónicas como a tortura do sec.21 2 Há também quem acuse que a Polícia só investiga com base na confissão. Ora por vezes a confissão só atrapalha. Veja-se, desde logo, a confissão da autoria de um homicídio, em 1986, em Narborough-Inglaterra, que está na origem da primeira aplicação do DNA no sistema de justiça, o qual afastou as suspeitas sobre o suposto autor confesso. Ou ainda o caso da jovem inglesa Caroline Dickinson, violada e assassinada na Bretanha Francesa, em 1996, que levou a polícia a deter um sem abrigo, autor confesso, o qual foi ilibado através do DNA, concluindo-se que o autor havia sido Fernando Montes entretanto fugido para os USA, e detido numa cadeia de Miami, identificado devido à perspicácia de um funcionário das alfandegas de Detroit, após a reabertura do caso 3 Já Edmond Locard afirmava : L’administration de la preuve dans le procès penal a subi, suivant les époques, de curieuses variations. Alors que l’ancien droit exigeait du juge l’ établissement de preuves légales dont la principale était l’ áveu, proba probantissima ou la reine des preuves, ayant comme conséquence, la question, c’est-à-dire, la torture, la preuve testemoniale joue dans le procès pénale moderne un rôle de premier plan. Or, il est démontré, par une série de recherches contemporaines, que le témoignage n’ est jamais une preuve absolument certe. 1

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  • As Percias na Polcia Judiciria

    Artur Pereira Polcia Judiciria

    Directoria do Porto

    1. Introduo

    A investigao criminal tem como objectivo ltimo a descoberta da verdade material de factos ocorridos, i.e. a

    reconstituio histrica da materialidade de eventos do passado.

    Contudo, no basta investigar! No basta apenas descobrir a verdade!

    preciso provar, i.e. demonstrar a total e rigorosa identidade entre o evento ocorrido no passado e a

    respectiva reconstituio feita no presente.

    Essa demonstrao deve ter lugar, de acordo com regras e princpios pr-definidos que a caracterizam,

    limitam e disciplinam

    A produo de prova tem evoludo ao longo dos tempos, acompanhando as mutaes tecnolgicas e

    cientficas, com especial relevo a partir do sc. XIX .

    Na verdade, a administrao da prova no processo penal sofreu, de acordo com as pocas, numerosas

    variaes. O processo penal antigo assentava no dogma do dever de verdade, que tambm impendia sobre o arguido.

    A confisso configurava-se, assim com a proba probantissima ou rainha das provas, pelo que a tortura se configurava

    como meio idneo de assegurar o cumprimento daquele dever. A legitimidade de recurso tortura est expressa de

    forma paradigmtica no artigo 58 da Constitutio Criminalis Carolina de 1532.1,2

    A tradio processual fundava-se ainda na subjectividade de juzos formulados quer por polcias quer por

    testemunhas, aos quais no eram estranhos pr-juizos de ndole moral e social sobre as vtimas e queixosos. Ora, foi

    sendo reconhecido que o testemunho no era uma prova absolutamente certa, no que as testemunhas caream todas

    de sinceridade, mas porque muito raro que tenham visto perfeitamente o que interessa ver e sobretudo que disso se

    recordem exactamente. Em particular, muito difcil obter de uma testemunha uma descrio precisa e mais difcil

    ainda de lhe fazer indicar exactamente uma hora e sobretudo uma data se os factos no so recentes.3

    Conclumos ento que devemos preferir prova testemunhal, o indcio e entre estes aqueles que so

    fornecidos pela aplicao de mtodos cientficos. Assim se criou o nome tcnica policial ou criminalstica, um modo de

    administrao da prova no processo penal que consiste na anlise sistemtica de indcios deixados na cena do crime.

    A prova material ou cientfica, fundada em dados objectivos obtidos atravs de mtodos cientficos, ganhou

    maior relevo em detrimento da prova pessoal ou subjectiva. Poderamos dizer que a religio da confisso deixou o

    lugar religio da prova cientfica. Alguns dizem mesmo que ela hoje a rainha das provas.

    Convm, no entanto, ponderar quer a prova testemunhal continua, necessariamente a ter um papel

    importante na realizao da justia, nalguns casos at, determinante.

    Toda a actividade de investigao criminal est balizada, como no podia deixar de ser, num estado de

    direito, num quadro normativo que lhe fixa as regras e limites condicionantes, que o direito processual penal e outra

    legislao avulsa complementar.

    1 H quem nos dias de hoje classifique as intercepes telefnicas como a tortura do sec.21 2 H tambm quem acuse que a Polcia s investiga com base na confisso. Ora por vezes a confisso s atrapalha. Veja-se, desde

    logo, a confisso da autoria de um homicdio, em 1986, em Narborough-Inglaterra, que est na origem da primeira aplicao do DNA no sistema de justia, o qual afastou as suspeitas sobre o suposto autor confesso.

    Ou ainda o caso da jovem inglesa Caroline Dickinson, violada e assassinada na Bretanha Francesa, em 1996, que levou a polcia a deter um sem abrigo, autor confesso, o qual foi ilibado atravs do DNA, concluindo-se que o autor havia sido Fernando Montes entretanto fugido para os USA, e detido numa cadeia de Miami, identificado devido perspiccia de um funcionrio das alfandegas de Detroit, aps a reabertura do caso

    3 J Edmond Locard afirmava : Ladministration de la preuve dans le procs penal a subi, suivant les poques, de curieuses variations. Alors que lancien droit exigeait du juge l tablissement de preuves lgales dont la principale tait l veu, proba probantissima ou la reine des preuves, ayant comme consquence, la question, cest--dire, la torture, la preuve testemoniale joue dans le procs pnale moderne un rle de premier plan. Or, il est dmontr, par une srie de recherches contemporaines, que le tmoignage n est jamais une preuve absolument certe.

    1

  • Enquadramento Legal

    O regime jurdico das percias (meio de prova) e dos exames (meio de obteno da prova) encontra-se

    estabelecido no Cdigo de Processo Penal (CPP) e na Lei n 45/2004, de 19 de Agosto, referente s percias mdico-

    legais e forenses e na Lei n 5/2008, referente criao da base de dados de perfis de ADN.

    Os artigos 151 a 163 do CPP estabelecem o regime da prova pericial, assinalando-se o artigo 151

    (Quando tem lugar), o 152 (Quem a realiza), o 154 (Despacho que ordena a percia), o 156 (Procedimento), o 159

    (Percias mdico-legais e forenses) e o 160-A (Realizao de percias).

    A Lei n 45/2004 estabelece o regime jurdico das percias mdico-legais e forenses, introduzindo algumas

    excepes aplicao do CPP.

    O regime jurdico da constituio de uma base de dados de perfis de ADN, j aprovado pelo governo,

    aportar, porventura, alguma especialidade s percias relacionadas com a biologia forense.

    Refira-se ainda que, por fora do disposto no artigo 270 do CPP, o Ministrio Pblico pode delegar em

    autoridades de polcia criminal a faculdade de ordenar percias.

    No que Polcia Judiciria diz respeito, estabelece a sua Lei Orgnica um regime mais alargado do que o

    previsto no CPP.

    Os artigos 171 a 174 do CPP, por sua vez, enquadram o regime dos exames.

    Os meios de prova caracterizam-se pela sua aptido para serem, por si mesmos, fontes do convencimento

    do juiz, ao passo que os meios de obteno de prova so instrumentos de que se servem as autoridades judicirias

    para investigar e recolher meios de prova.

    A finalidade do exame fixar documentalmente ou permitir a observao directa pelo tribunal de factos

    relevantes em matria probatria

    H lugar prova pericial nos casos em que a percepo ou a apreciao dos factos exigem especiais

    conhecimentos tcnicos, cientficos ou artsticos.

    A percia assim uma interpretao dos factos feita por pessoas dotadas de especiais conhecimentos

    tcnicos, cientficos ou artsticos; nesta perspectiva, a partir da anlise de vestgios os peritos chegam a determinadas

    concluses periciais, as quais so submetidas s autoridades judicirias para a sua apreciao.

    2. Conceitos: Criminalstica, Polcia Cientfica, Polcia Tcnica

    Toda a investigao criminal baseia-se no facto de que um criminoso deixa no local do crime alguns

    vestgios, adquirindo, por outro lado, quer na sua roupa ou em objectos que utilize, outros vestgios porventura

    imperceptveis, mas de qualquer forma caractersticos da sua presena ou da sua actuao. Esta constatao foi

    primeiro definida por Edmond Locard, ficando conhecida como o Princpio de Locard.

    claro que o progresso tcnico e cientfico transformaram as sociedades, dando azo ao surgimento de

    novas formas de criminalidade, pelo que o Princpio de Locard no abarca, naturalmente, nos dias de hoje, toda a

    actividade delituosa, designadamente a perpetrada com elevada componente tecnolgica.

    De todas as formas, a abordagem do local do crime representa para o investigador um enorme desafio, no

    que concerne clarividncia, ateno, rigor e competncias exigidas.

    A recolha da prova material ou evidncia fsica e a correspondente interpretao, so tarefas que podero

    contribuir de forma decisiva, positiva ou negativamente, para o desfecho de uma investigao. Por isso, um vasto leque

    de tarefas so apresentadas ao investigador, seja na seleco da evidncia, na sua recolha e preservao, nas

    potencialidades informativas que dela se podem extrair. Importa tambm realar a importncia da correcta

    interpretao da informao que mais tarde lhe ser facultada, via relatrio pericial.

    O conjunto dos princpios cientficos e mtodos tcnicos aplicados na investigao criminal, para provar a

    existncia de crime, integra o conceito amplo de Criminalstica. Hans Gross, nos finais do sc. XIX, utilizou o termo

    2

  • pela primeira vez, definindo-a como o estudo global do crime. Por conseguinte, teria como objectivo a pesquisa e o

    estudo material do crime, tendo em vista conseguir a prova.4

    No possvel encontrar uma definio unnime de Criminalstica, existindo diversa concepo nos pases

    anglo-saxnicos, onde o termo quase desconhecido, sendo substitudo pela designao Forensic Sciences. Este

    conceito bastante mais amplo e, aparentemente, mais lgico, porque tem em considerao o conjunto de processos

    tcnicos e cientficos empregues na sequncia do surgimento de um facto com interesse judicirio, que visam a

    pesquisa, bem como a conjugao e explorao cientfica dos indcios, de modo a compreender os mecanismos

    destinados a identificar as partes intervenientes.

    Entre ns, e de acordo com a tradio francesa, embora sem uniformidade de conceitos, considerava-se a

    Polcia Tcnica e Cientfica como fazendo parte da Criminalstica, da qual se excluam a Medicina e a Psiquiatria, muito

    embora ainda se confundam muitas vezes os conceitos de Criminalstica e Polcia Cientfica.

    A Criminalstica assume hoje um espectro mais amplo de princpios metodolgicos de explicao e

    interpretao da evidncia fsica, apoiados na valorizao estatstica dos resultados.

    A Polcia Tcnica ter como finalidade constatar, recolher e conservar os indcios e vestgios deixados pelo

    autor de uma infraco penal.5

    A Polcia Cientfica desenvolver-se- cronologicamente aps estes procedimentos, mas em interaco com

    os mesmos, definindo-se como a actividade laboratorial de explorao dos vestgios materiais, com a finalidade de se

    obter uma prova objectiva em tribunal.

    Com efeito, ao longo do sc 19, a polcia tcnica adquire vrios progressos, sendo a identificao dos

    reincidentes a maior preocupao das polcias. Os ingleses, graas a Howard Vincent so os primeiros a realizar um

    registo de presos. Em Frana, as dificuldades em estabelecer a identidade judiciria dos reincidentes faz-se sentir com

    a abolio em 1832, da marca com ferro em brasa dos condenados. Afim de resolver este problema, Alphonse Bertillon

    pe em execuo um mtodo que considerava verdadeiramente cientfico que era a antropometria criminal.

    Apesar da evoluo da polcia tcnica, no sc. 19 a polcia cientfica no desempenha qualquer papel no

    sistema judicirio.

    Porm, com o desenvolvimento tcnico, um movimento tende a introduzir os mtodos laboratoriais no

    inqurito criminal.

    No 6 Congresso de antropologia criminal, realizado em Turim, em 1906, os representantes da polcia

    cientfica reclamam pela primeira vez uma organizao cientfica da polcia. Consideram que o mtodo de identificao

    dos criminosos insuficiente. Nesta ocasio, o relator do congresso declarou inmeros servios de polcia aguardam

    da aplicao do mtodo cientfico uma nova direco, um outro impulso 6

    Entre ns o grande impulso de introduo da polcia cientfica, na investigao criminal dado por Azevedo

    Neves, quando aps tomar posse do cargo de director da morgue de Lisboa, em 1911, cria um departamento a que d

    o nome de Polcia Cientfica. Tinha como funes a identificao de cadveres, com recolha de impresses digitais,

    fotografia e at de desenhos anotados. Simultaneamente desenvolve estudos de antropologia criminal, a partir dos

    estudos de Lombroso, Bertillon e Vervaeck.7

    No desenvolvimento do seu raciocnio, Azevedo Neves reinvindica para a tutela mdica de actos policiais,

    medicalizando todo o processo crime, baseando-se na crena da cientificidade da prova construda atravs da

    demonstrao laboratorial, no domnio da microbiologia, da qumica, da toxicologia, a dactiloscopia, fotografia, balstica

    e antropometria criminal.8

    4 Hans Gross est na origem da criao por todo o mundo de laboratrios de polcia cientfica 5 Considera-se que a primeira actividade de polcia tcnica ocorreu na Esccia, em 1786, com o caso Richardson, quando a recolha

    de uma pegada permitiu a identificao do autor de um homicdio. 6 Jean Susini, Un sicle de police scientifique, Rev.Sc.Crim, avr-juin, 1996, 7 Em 1908, Rudolfo Xavier da Silva, mdico assistente, na morgue de Lisboa, identifica, pela primeira vez, um cadver atravs das

    impresses digitais. 8 F.Moita Flores: Azevedo Neves : um dos arquitectos da Polcia Cientfica

    3

  • 3. Exames

    A actividade da Criminalstica comea no local do crime. Nem todas as cenas de crime exigem a recolha de

    evidncias fsicas, pelo que a exiguidade de recursos impe restries na composio das equipas que tomam conta

    das ocorrncias. Os crimes contra as pessoas, violentos ou causadores de alarme social, tm preenchido, de um

    modo geral, as preocupaes policiais, no sentido de acautelar eficazmente a abordagem da cena do crime. O seu

    exame representa muitas vezes um papel fundamental e decisivo no sucesso de uma investigao.

    A cena de um crime grave , sem dvida, o mais importante incidente que um polcia chamado a

    responder. Dependendo da sua natureza, a resposta questo O que aconteceu? s pode ser determinada depois de efectuada uma inspeco cuidadosa e inteligente ao local, coadjuvada com a subsequente interpretao

    profissional.

    A conduta criminosa, bem como o seu resultado, estabelecem uma relao de causa-efeito recproca com o

    local e/ou a vtima, pois como j foi referido, segundo a definio de Edmond Locard, todo o criminoso deposita ou

    leva consigo indcios ou vestgios.

    A cena do crime a forma de comunicao entre o criminoso e o investigador.

    A capacidade do investigador compreender a linguagem do crime ir determinar como o investiga

    eficientemente.

    Deste modo, a aco a desenvolver no local do crime, contm uma tripla virtualidade:

    - Traduz normalmente o primeiro contacto da investigao com o facto criminoso em si mesmo;

    - Permite a obteno, atravs de conhecimentos tpicos e sistemticos, de valiosos dados e

    indicaes tendentes reconstituio dos factos (prova material e pessoal), que iro condicionar e dirigir a

    investigao subsequente;

    - Permite a possibilidade de vir a conhecer-se quem fez o qu? A inspeco judiciria reveste-se, por conseguinte, cada vez mais de fundamental importncia para a

    actividade policial, atenta a sofisticao de mtodos usados na criminalidade violenta, organizada e transnacional.

    Deste modo, apresenta-se de elevada exigncia tcnica que se manifesta a trs nveis:

    - No carcter urgente da interveno, pois os investigadores possuem pouco tempo para trabalhar

    num local de crime no seu estado original, dado que o tempo um factor de destruio;

    - No elevado grau de perfeio da aco a desenvolver, devidamente planeada, com a adopo

    dos procedimentos mais correctos e dos meios mais eficazes, utilizados at exausto, i.e. sem excluso do

    ponto de vista metodolgico de quaisquer hipteses;

    - Na adopo de metodologias e regras adequadas, que garantam a inviolabilidade da informao

    obtida, i.e. estabeleam a correcta pesquisa, registo seleco, acondicionamento e preservao de vestgios,

    evitando a sua contaminao.

    A preservao do local do crime, de molde a evitar contaminaes, a correcta abordagem do mesmo com

    uso de mtodos apropriados, muitas vezes num trabalho de concorrncia, atenta a especialidade de potenciais

    intervenientes, requer preparao adequada, s devidamente conseguida com a constituio de unidades especficas,

    especializadas e devidamente apetrechadas.

    A Polcia Judiciria criou j uma equipa de local de crime, a qual por ainda ser nica percorre o pas,

    naturalmente, apenas nos casos em que se esteja em presena de crimes mais graves. No entanto, idnticas equipas

    tero de se estabelecer, uma vez que no apenas a exigncia tcnica e rigor na preservao da prova que o

    impem, mas tambm os requisitos de cooperao internacional.

    Este assunto tem vindo a ganhar acuidade e interesse no seio da comunidade policial e laboratorial, de tal

    forma que o ENFSI9, em colaborao com a Europol e o apoio da Comisso Europeia, atravs do programa AGIS,

    instituiu um grupo de trabalho (Enfsi Scene of Crime Working Group) que tem como fundamento considerar o local do

    crime como parte da contribuio geral das cincias forenses na investigao criminal e na administrao da justia;

    reconhecer que a definio de local de crime deve ser alargada, de modo a compreender a localizao, colheita e

    interpretao de vestgios, quer de suspeitos quer de vtimas, quer ainda de lugares e localizaes, tendo presente os

    concorrentes interesses no seu exame da Polcia, dos tcnicos forenses e de outros operadores judicirios.

    9 European network of forensic science institutes - www.enfsi.org

    4

  • A partilha de informao e uma efectiva cooperao pressupem valores e normas de interpretao comuns,

    procedimentos e bases de dados compatveis, competncias universalmente aceites e integridade de processos. Em

    suma, padres internacionais.

    No apenas importante a recolha de cada tipo de evidncia fsica.

    Relevantes so tambm outros aspectos, tais como a abordagem estratgica da cena do crime, a sua

    preservao, o registo e interpretao, no contexto geral do crime.

    A misso do grupo de trabalho estabelecer a definio de tcnicas e boas prticas na investigao da cena

    do crime, que inclui:

    - Desenvolvimento de standards e competncias internacionais e uniformizao de procedimentos;

    - Website, com informao sobre mtodos e tcnicas de recolha de vestgios no local do crime;

    - Manual europeu do investigador.

    Tudo com o fim ltimo de que os vestgios recolhidos no local de crime de um estado membro possam ser

    considerados vlidos em qualquer outro ordenamento jurdico da Unio Europeia.

    Parece consensual que todos os procedimentos de preservao, controlo e arquivo relativos ao local do

    crime, devem estar perfeitamente estipulados em documento prprio, posto disposio de todo o pessoal policial e

    forense, que esteja legitimamente autorizado a trabalhar no mesmo.

    Como consequncia, perspectiva-se que as diversas polcias dos estados membros, com responsabilidades

    de investigao criminal, constituiro equipas especializadas de local de crime que devero obedecer a controlos de

    qualidade e de acreditao.

    Tendo em considerao o explanado, no devem ser s os laboratrios forenses a empregar procedimentos

    rigorosos no manejo das amostras de DNA, cumprindo normas estritas de controlo de qualidade, acreditados de acordo

    com a ISO/IEC 17025.

    Tambm as equipas de local de crime, tero que seguir procedimentos normalizados, que devero ser, de

    acordo com as discusses ainda em curso, conformes quer com aquela norma quer com a ISO/IEC 1702010, a qual

    estabelece os critrios gerais para o trabalho dos organismos que se dedicam inspeco. Segundo esta norma

    devero ser devidamente acauteladas questes como a qualificao do pessoal interveniente, o seu equipamento, os

    mtodos de trabalho, a integridade da prova (deteriorao e contaminao), a estratgia da inspeco ao local, a

    recolha, o registo da prova e at a elaborao do relatrio final.

    A equipa do local do crime ser pois multidisciplinar, agregando valncias da Polcia Tcnica e da Polcia

    Cientfica.

    Com efeito, dever estar habilitada a proceder, fundamentalmente, recolha de qualquer evidncia fsica, a

    qual inclui todo e qualquer objecto que possa estabelecer que um crime foi cometido ou possa fornecer uma ligao

    entre o crime e a vtima ou entre a vtima e o criminoso.

    Nela se incluem quer vestgios lofoscpicos, biolgicos, da rea da entomologia forense, e quaisquer outros

    fisico-qumicos apropriados para alm da elaborao de fotografia e de desenho.

    Importa precisar que, no campo da lofoscopia, revestem-se de importncia os vestgios das falanges dos

    dedos (dactiloscpia), das palmas das mos (quiroscopia) e das plantas dos ps (pelmatoscopia).

    Os vestgios biolgicos, por sua vez, tm vindo a merecer redobrada importncia, pelo contributo decisivo

    que podem trazer a uma investigao. Pois, desde a utilizao da anlise das regies repetitivas do genoma na

    identificao gentica, nos anos 80, que a determinao de perfis de DNA tem sido cada vez mais privilegiada,

    proporcionando o sucessivo aumento do poder de discriminao e sensibilidade, medida que foram introduzidos

    novos polimorfismos e inovaes tecnolgicas e metodolgicas. Uma nova tcnica de anlise de DNA, chamada Low

    Copy Number (LCN) parece oferecer, actualmente, maiores potencialidades de caracterizao de amostras com

    quantidades exguas de DNA (< 100 pg).

    Enquanto o vestgio tradicional de DNA provm de amostras de sangue, smen ou cabelo, o perfil de DNA-

    LCN pode ser obtido de uma impresso digital ou de resduos de contacto labial (queiloscopia) com um objecto ou,

    ainda, de roupa utilizada pelo suspeito.

    10 A Interpol, no Manual de intercmbio e utilizao de dados relativos ao ADN considera que os procedimentos de

    preservao, controlo e arquivo relativos ao local do crime devem conformar-se com as normas ISO/IEC 17025

    5

  • Refira-se ainda que novas cincias vo ganhando o seu espao de interveno, como seja a entomologia

    forense.

    Sector de Local de Crime

    Tendo em considerao a importncia fundamental que a recolha de vestgios num qualquer local de crime

    tem para a produo da prova material e consequentemente para a descoberta da verdade, o LPC, com o intuito de

    melhorar no s a qualidade do trabalho a efectuar no local do crime mas tambm aumentar a interligao com a

    investigao criminal procedeu criao de um Sector, constitudo por peritos com a formao necessria para

    proceder abordagem, anlise, pesquisa, deteco, recolha, acondicionamento e transporte de todos os vestgios (

    excepo dos vestgios lofoscpicos e dos relacionados com incndios e exploses) existentes num qualquer local do

    crime e interpretao cientfico - forense dos factos ocorridos.

    Os elementos que integram este Sector utilizam uma metodologia de trabalho que permite elaborar relatrios

    de exame pericial ao local do crime bastante explcitos, com indicao das tcnicas utilizadas na pesquisa e recolha

    dos diversos vestgios; reportagem fotogrfica completa, croqui e concluso final com uma interpretao tcnica sobre

    os acontecimentos ocorridos no referido local, com o objectivo de cimentar o valor probatrio dos vestgios recolhidos e

    permitir quer aos OPC`S titulares do processo quer s diversas reas do LPC uma melhor informao sobre os

    acontecimentos ocorridos. Em situaes de maior complexidade utilizam tambm a reportagem vdeo para uma melhor

    interpretao dos acontecimentos.

    Este Sector desenvolveu a aplicao de novas tcnicas e produtos qumicos para a pesquisa e recolha dos

    diversos vestgios existentes num local do crime. Com a utilizao destes produtos j possvel proceder-se, por

    exemplo, pesquisa de vestgios hemticos latentes, em situaes recentes ou no, e indicao da espcie no local.

    Permitiu tambm proceder utilizao sistemtica de fontes de luz alternada para a pesquisa dos mais diversos tipos

    de vestgios e consequentemente a utilizao de tcnicas de fotografia forense para fotografar os vestgios latentes que

    sejam visualizados a partir da utilizao desse tipo de fontes de luz e dos diversos tipos de produtos qumicos

    aplicados.

    UTILIZAO DE FONTES DE LUZ ALTERNADA A utilizao de fontes de luz alternada permite empregar uma variedade de comprimentos de onda do

    espectro de luz com o objectivo de identificar, visualizar, documentar e recolher uma variedade de diferentes tipos de

    vestgios tais como cabelos, fibras txteis, sangue, smen, saliva, fludos corporais, hematomas, mordidelas, resduos

    de disparo, lubrificantes, tintas, etc..

    PRODUTOS QUMICOS PARA VISUALIZAO DE VESTGIOS DE SANGUE LATENTES Nos locais de crime em que exista a forte suspeita da anterior existncia de sangue, independentemente da

    altura da ocorrncia dos factos, torna-se possvel a visualizao dos mesmos atravs da aplicao de produtos

    qumicos apropriados. A aplicao destes produtos qumicos no inviabiliza a posterior anlise laboratorial para

    pesquisa de ADN sendo tambm possvel identificar no local se os referidos vestgios so de sangue humano ou no.

    Aplicao de produtos qumicos para deteco e interpretao de vestgios hemticos latentes A misso deste Sector engloba tambm a aplicao de novas tcnicas de interpretao dos acontecimentos

    ocorridos num local do crime (interpretao dos padres de salpicos e manchas de sangue) e de novas tcnicas de

    avaliao e recolha de vestgios com reas das cincias forenses [entomologia forense (determinao do intervalo post

    mortem mnimo), arqueologia forense, botnica, pesquisa de diatomceas na gua, solos, etc.] com a criao de

    protocolos para anlise das mesmas com entidades exteriores a esta polcia.

    INTERPRETAO DOS PADRES DE SALPICOS E MANCHAS DE SANGUE Tem como objectivo fornecer informao valiosa sobre o que aconteceu durante o cometimento do crime e

    qual a ordem em que cada um dos eventos teve lugar, podendo servir como excelente guia na reconstituio dos

    acontecimentos ocorridos no referido local do crime

    A interpretao dos padres das manchas e salpicos de sangue no local efectuada a partir de clculos

    trigonomtricos que permitiro determinar: A indicao do autor do crime;

    A direco que as gotas de sangue percorreram at ao impacto com a superfcie;

    6

  • O ngulo de impacto das gotas de sangue;

    A distncia provvel desde a superfcie de impacto at ao local donde as gotas de sangue

    saram (ponto de convergncia e rea de origem);

    A natureza da fora envolvida no derrame da mancha de sangue e a direco de onde essa

    fora foi aplicada;

    O tipo de objecto que foi utilizado para aplicar essa fora;

    O nmero aproximado de agresses (pancadas) durante o crime;

    A posio relativa, no local do crime, da vitima, suspeito e outros objectos envolvidos no

    cometimento do crime;

    A sequncia dos acontecimentos ocorridos;

    E, em algumas situaes, com que mo os ferimentos foram provocados.

    TRAJECTRIAS E DISTNCIAS DE DISPARO No mbito dos crimes em que esto envolvidas armas de fogo a definio das trajectrias e das distncias de

    disparo so em norma factores extremamente importantes para o cimentar da prova pelo que s se deve proceder

    recolha dos vestgios balsticos ou remoo de um corpo aps se concluir que as interpretao tcnicas atrs

    referidas no so necessrias. Estas tcnicas permitem no s identificar quais as posies do atirador e da vtima

    durante os disparos mas tambm os percursos efectuados pelos mesmos aquando do cometimento do crime

    RECOLHA DE MARCAS DE RODADOS, PEGADAS E VESTGIOS DE FERRAMENTAS RECOLHA DE SOLOS A recolha de solos efectuada atravs de tcnicas de amostragem apropriadas para o efeito para que a sua

    posterior anlise tenha valor probatrio. Tendo em considerao a especificidade deste tipo de material a sua recolha

    s efectuada em casos muito especficos.

    ENTOMOLOGIA FORENSE A Entomologia Forense tem como objectivo, entre outras valncias, o estudo do ciclo de vida dos insectos

    colonizadores de cadveres de forma a definir o intervalo post - mortem mnimo, podendo igualmente ter relevncia

    para a determinao do local do evento e se ocorreu modificao, manuseamento ou transporte do cadver.

    Este estudo efectua-se atravs da recolha de amostras dos mesmos nas diversas fases do seu ciclo de vida

    (ovos, larvas, adultos e pupas) e atravs da recolha de dados meteorolgicos especficos.

    Massas larvares e insectos a recolher no mbito da entomologia forense

    Por fim a criao deste Sector tem tambm como objectivo implementar, no seio da Polcia Judiciria, uma

    nova ferramenta de apoio investigao criminal no mbito do trabalho a efectuar no local do crime estando a

    qualidade do trabalho a efectuar por estes elementos directamente relacionada com a correcta preservao do local do

    crime. Face ao atrs referido e com a finalidade de se proceder recolha de vestgios at agora pouco valorados

    (pegadas, fibras, etc.) torna-se essencial a implementao de procedimentos no local do crime que evitem a destruio

    dos vestgios e/ou a sua contaminao (utilizao de fatos de proteco adequados, criao de caminhos de acesso no

    interior do local do crime, correcta definio de cordes de segurana, presena no interior do local do crime das

    pessoas estritamente necessrias para o efeito, etc.).

    4. Percias

    O apoio da cincia investigao criminal tem procurado atingir trs objectivos principais:

    - o primeiro tentar identificar o autor de um acto criminoso, utilizando os vestgios ou qualquer outra

    evidncia pertencente a um indivduo, encontrados no local do crime, a fim de verificar se possvel estabelecer

    uma ligao entre o ele e o evento;

    - o segundo a constituio de arquivos que permitam a deteco de reincidentes;

    - o terceiro, mais complexo e problemtico, baseado na ideia jamais demonstrada de que existir uma

    etiologia da criminalidade. Certos traos comportamentais ou fenotpicos inerentes, sejam raciais, familiares ou

    hereditrios estariam ligados a uma propenso para praticar actos criminosos. A ambio detectar potenciais

    malfeitores antes que entrem em aco.

    7

  • A primeira aplicao das cincias ditas exactas identificao do criminoso foi tentada pelo criminlogo

    francs Alfonse Bertillhon, em 1882, com o sistema antropomtrico que consistia em estabelecer um vasto ficheiro no

    qual figuravam caractersticas fsicas particulares e vrias medies da cabea, da orelha direita, do p esquerdo e dos

    dedos, tomadas com uma preciso milimtrica.

    Este sistema foi aceite durante 30 anos, mas nunca recuperou dos acontecimentos de 1903, quando se

    constatou que um indivduo chamado Will West, que acabava de dar entrada na Penitenciria de Leavenworth

    Kansas-EUA, possua as mesmas medidas de um outro detido chamado William West, o que, de acordo com aquele

    sistema, significava que eram a mesma pessoa. Atravs da comparao das impresses digitais determinou-se que

    eram pessoas diferentes, verificando-se depois que eram irmos gmeos.

    A antropometria foi, por isso, suplantada por um outro mtodo de identificao, as impresses digitais, muito

    mais simples e incomparavelmente mais eficiente. Foi na Argentina que as impresses digitais, pela primeira vez,

    conduziram a uma condenao. Em 1892, Juan Vucetich, oficial da polcia argentina, cria o 1 gabinete de impresses

    digitais e de identificao digital. Identificou Francesca Rojas como autora do assassnio dos seus dois filhos, a partir

    da impresso digital colhida numa mancha de sangue.

    A utilizao do DNA, desde que Alec Jeffreys, em 1985, descobriu a capacidade de realizar testes de

    identificao humana, constitui um dos maiores avanos no combate ao crime, aps as impresses digitais.

    Logo em 1986, o DNA possibilitou afastar as suspeitas de homicdio que recaam sobre um jovem. A polcia

    inglesa conduzia a investigao dos crimes de violao e homicdio de duas jovens, ocorridos em 1983 e 1986, na

    cidade de Narborough, Leicestershire, e que se suspeitava terem sido cometidos pelo mesmo autor. O primeiro

    suspeito, que chegou a confessar a autoria do segundo crime, foi ilibado pela comparao do seu perfil gentico com

    uma amostra biolgica recolhida no local do crime. Tambm, pela primeira vez na histria, nesta investigao criminal,

    a polcia realizou aquilo que hoje conhecido como mass screen, convidando toda a populao masculina adulta, de

    trs localidades, no total de 5.000 pessoas, a fornecer uma amostra biolgica. Esta operao revelou-se, no entanto, ineficaz pois que o suspeito, Colin Pitchfork, que acabou por ser condenado a priso perptua, em 1988, s foi

    identificado por se ter descoberto que um amigo havia facultado uma amostra de sangue em seu nome.

    Foi em 1987, tambm no Reino Unido que, pela primeira vez, a anlise do DNA contribuu para a

    condenao de Robert Melias, pelo roubo e violao de uma mulher deficiente.

    A caracterizao do DNA, a partir de uma amostra biolgica recolhida no local do crime e ou de indivduos

    suspeitos, rapidamente se transformou em processo rotineiro, dado que permite:

    - conexionar crimes de diferente natureza, seja pelo seu modus operandi, seja pelos vestgios deixados

    no local do crime;

    - auxiliar as polcias a identificar o autor de um crime;

    - identificar possveis reincidentes;

    - afastar a utilizao de falsas ou assumidas identidades;

    - inocentar suspeitos ou mesmo condenados.

    Refira-se, a este propsito que, at Outubro de 2007, nos Estados Unidos, foram retiradas as

    acusaes a 207 condenados, 15 dos quais estavam condenados morte ou no corredor da morte. No seio da Polcia Judiciria desenvolve-se um vasto leque de percias, no domnio da Polcia Cientfica,

    executadas no Laboratrio de Polcia Criminal (LPC), para alm de outras em ramos especializados da interveno

    policial.

    Quanto a estas, sinalizam-se as percias econmico-financeiras e contabilsticas, executadas pelo

    departamento de percia financeiro-contabilstica, as quais, como decorre da sua designao, tm por finalidade

    proceder anlise de documentao referente a actividade de natureza econmico-financeiro; e as percias no domnio

    das tecnologias de informao e comunicao, visando a apreenso e anlise de documentao registada em

    computadores ou aparelhos de comunicao mveis.

    Para alm destas, so efectuadas pelo LPC mltiplas percias de diversa natureza, a saber:

    4.1. Balstica

    Procede-se a uma variedade de actividades conexionadas com armas, munies, projcteis e cpsulas

    deflagradas, designadamente exames identificativos (identificao em termos de calibre, marca, modelo, nmero de

    8

  • srie e origem); determinao do seu estado de funcionamento (assinalar eventuais deficincias e determinar as

    causas das mesmas); avaliar se a arma sofreu alteraes nas suas caractersticas originais; relacionar armas com

    casos pendentes (determinar se a arma examinada foi responsvel por elementos municiais deixados em outro

    qualquer local de crime) e efectuar testes relativos s condies de utilizao de munies e projcteis e de eventuais

    alteraes das suas caractersticas originais.

    A histria da identificao das armas de fogo no se pode situar com preciso no tempo porquanto foi

    iniciada com espordicos estudos e trabalhos de diversos indivduos, em vrios pases, de um modo ou de outro

    conotados com as armas de fogo; no entanto, certo que os trabalhos s comearam no sculo XIX a apresentar um

    carcter cientfico e de rigor, fundamentalmente devido ao progresso nos sistemas pticos de microscopia.

    A ttulo de curiosidade refere-se o caso mais antigo que se conhece, relacionado com a identificao de armas de fogo,

    o qual ocorreu em 1835 na cidade de Londres, aps o homicdio de um indivduo em que o suspeito foi um seu

    empregado; decorrido algum tempo este crime foi investigado por um tal Mr. Henry Goddard (no confundir com Calvin

    Goddard, indivduo que se notabilizou neste trabalho j no sculo XX, nos EUA), o qual ao observar o projctil retirado

    da vtima, reparou que ele apresentava um defeito claramente atribuvel ao molde onde a bala tinha sido fabricada

    (recordemo-nos que naquela altura as armas eram de antecarga e os proprietrios das armas, de um modo geral,

    moldavam as balas eles mesmos com recurso a um molde habitualmente de lato); alm deste pormenor recolheu

    tambm a bucha de papel, que era utilizada para separar o projctil da carga de plvora nas armas de plvora negra;

    posteriormente, ao analisar o molde onde o empregado da vtima fabricava os projcteis da sua prpria arma, verificou

    que aquele originava projcteis com a deformidade observada no projctil assassino e que a bucha de papel tinha sido

    fabricada com papel de um jornal que se encontrava no quarto do referido empregado, tendo deste modo sido possvel

    apresent-lo justia (e, dizemos ns, dever ter sido condenado, com base em to evidentes factos tendo em conta a

    poca).

    Mais tarde, em 1863, ocorreu um caso que, pela importncia da vtima e contornos da ocorrncia merece ser relatada:

    naquele ano, na guerra civil norte-americana o general Stonewall Jackson foi morto no campo de batalha; aps a

    remoo da bala fatal, pela simples identificao do seu calibre (.67) tornou-se claro que a mesma s poderia ter sido

    disparada por um dos seus prprios soldados, pois que o inimigo, as foras Unionistas, utilizavam armas de calibre

    .58, com projcteis de tipo especfico (mini).

    Na sequncia da evoluo cientfica desta rea de conhecimento deve-se referir a publicao, no ano de 1900, pelo Dr.

    Albert Llewellyn, de um artigo que entre outros assuntos abordava o tema de como se deveria fazer a medio de

    campos e estrias nos projcteis.

    Posteriormente a esta data e aps um grande nmero de peripcias, algumas positivas e outras bastante negativas,

    em 1925 foi fundado em Nova York o Bureau of Forensic Ballistics por C.E.Waite, Calvin H. Goddard, Philip O.

    Gravelle e John H. Fisher, pessoas ligadas s foras armadas dos EUA, alguns com elevadas patentes, que

    pretenderam e conseguiram, naquela data, formar um servio que permitisse realizar a identificao /correlao dos

    elementos municiais com as armas, de modo seguro e cientfico.

    Para responder a este desafio, adaptaram um microscpio de comparao de modo a servir para comparar projcteis e

    cpsulas, mediante a construo de peas especificas por si idealizadas, sendo este o marco tido por muitos como o

    nascimento da Balstica Forense como uma ferramenta cientfica ao servio da lei.

    Como reconhecimento pblico de que efectivamente este servio tinha bases cientficas suficientemente slidas para

    se poder constituir como um meio de prova seguro e inquestionvel, refere-se que em 1932, o FBI criou o seu

    laboratrio onde se inclua como hoje, a Firearms and Toolmarks Unit, que entrou em funcionamento com um nico

    elemento.

    Armas So possveis de realizar os exames:

    9

  • Exame identificativo (identificao em termos de calibre, marca, modelo, n. de srie e origem)

    Determinao do seu estado de funcionamento (assinalar eventuais deficincias e determinar as causas das mesmas)

    Avaliar se a arma sofreu alteraes nas suas caractersticas originais Relacionamento das armas com casos pendentes (determinar se a arma examinada

    foi responsvel por elementos municiais deixados em outro qualquer local de crime)

    Relativamente s armas enviadas para anlise conveniente que nos seja fornecida toda a informao

    relativa ocorrncia de modo a mais correctamente se poder decidir pelo tipo de exame/percia mais adequado e

    tambm facilitar a procura de eventuais relacionamentos com casos anteriores (infraco, local da ocorrncia,

    suspeitos, etc;).

    Na rea de Balstica/Vestgios do LPC so ainda examinados outro tipo de objectos, alguns dos quais esto

    representados nas imagens seguintes:

    Munies essencial que as munies apreendidas nos sejam sempre remetidas acompanhando as armas a examinar

    para que se possa dispor de munies idnticas s da ocorrncia em termos de marca, lote, antiguidade e estado de

    conservao. Assim, sero proporcionadas as melhores condies de realizao dos exames comparativos (condies

    de teste ideais).

    No que concerne s munies so realizados os seguintes exames:

    Exame identificativo (identificao em termos de calibre, marca, fabricante e origem) Teste das condies de utilizao Exame para determinar se a munio sofreu alteraes nas suas caractersticas

    originais (determinar por exemplo, se foi recarregada)

    Projcteis Na rea de Balstica/Vestgios do LPC, no tocante a projcteis, so realizados os seguintes exames:

    Exame identificativo (determinao de calibre, marca e origem da munio de onde proveio)

    Determinao do nmero de estrias e campos e medida da respectiva largura (pesquisa no ficheiro GRC de modo a averiguar as possveis marcas de armas responsveis pelo seu

    disparo)

    Exame para avaliar se deformaes so produzidas pela arma ou pelo impacto do projctil

    Exame de balstica identificativa (responsabilizar armas suspeitas pela obteno de elementos municiais, determinar o nmero de armas envolvidas numa ocorrncia, etc.)

    imperativo que nos sejam sempre remetidos bem acondicionados (envolvidos em papel, por exemplo) de

    modo a no sofrerem qualquer efeito originado pelo transporte, e devidamente individualizados referenciados e

    identificados, relativamente ao local de onde foram recolhidos.

    Alm disso caso tenham sido retirados de corpos ou cadveres, QUANDO NO FOR NECESSRIO REALIZAR QUALQUER EXAME BIOLGICO, fundamental que sejam logo limpos/lavados e secos de modo a evitar a sua oxidao/corroso, facto que, a ocorrer, normalmente inviabiliza qualquer exame de comparao, conforme

    seguidamente se pode observar nas fotos de projcteis que nos foram enviados nesse estado.

    Os projcteis recolhidos, no caso de serem manuseados com pinas ou outros utenslios metlicos,

    fundamental proteger as suas extremidades com material suave ou ento segur-los longitudinalmente (base e ogiva)

    para que no sejam impressos vestgios indesejados no projctil que prejudiquem a anlise microscpica.

    Cpsulas deflagradas No que respeita a cpsulas deflagradas, procede-se aos seguintes tipos de exames:

    10

  • Exame identificativo (determinao de calibre, marca e origem da munio de onde proveio)

    Exame para avaliar que tipo de arma foi responsvel pela sua deflagrao (pistola, revlver, etc.)

    Exame de balstica identificativa (responsabilizar armas suspeitas pela obteno de elementos municiais, determinar o nmero de armas envolvidas numa ocorrncia, etc.)

    Comparao sistemtica com casos pendentes essencial que as cpsulas para anlise nos sejam remetidas bem acondicionadas (por exemplo, envolvidas

    em papel) de modo a no sofrerem qualquer efeito originado pelo transporte, e devidamente individualizadas,

    referenciadas e identificadas, relativamente ao local de onde foram recolhidas. A no observncia destes

    procedimentos pode acrescentar vestgios suplementares durante o seu transporte at ao Laboratrio, que aquando da

    realizao do exame podem originar dvidas ao perito, tornando mais difcil ou mesmo impossibilitar a obteno de

    uma concluso mais segura; relativamente no referenciao do local exacto na cena de crime de onde foram

    recolhidas isso implica sempre a impossibilidade de se determinar onde se encontrava(m) o(s) atirador(es) e qual a sua

    movimentao na mesma cena do crime.

    De igual modo que nos projcteis, imperativo, sempre que a cpsula se encontre suja, que a mesma seja

    limpa e/ou lavada e seca de seguida para impedir que se enferruje.

    .

    Cartuchos de caa e seus elementos (buchas, bagos de chumbo, etc;) Os cartuchos de caa e os elementos que compem o seu carregamento podem ser objecto de vrios tipos

    de exames periciais, nomeadamente:

    Exame identificativo (determinao de calibre, marca e origem) Avaliao das condies de utilizao Exame para apurar se o cartucho sofreu alteraes nas suas caractersticas

    originais (determinar se, por exemplo, foi recarregado)

    Determinao do tipo e granulometria dos bagos de chumbo (e, por exemplo, avaliar eventualmente se foram produzidos artesanal ou industrialmente)

    Exame s buchas para determinar qual o seu tipo e a granulometria do carregamento que contiveram

    Exame de balstica identificativa em cartuchos de caa deflagrados (responsabilizar armas suspeitas pela obteno de elementos probatrios, determinar o nmero de armas envolvidas numa

    ocorrncia, etc.)

    essencial que nos sejam sempre remetidos bem acondicionados (envolvidos em papel, por exemplo) de

    modo a no sofrerem efeitos originados durante o transporte, e devidamente individualizados, referenciados e

    identificados, relativamente ao local de onde foram recolhidos.

    Alm disso caso tenham atravessado corpos ou sido retirados de cadveres, DESDE QUE NO SEJAM NECESSRIOS EXAMES BIOLGICOS fundamental que sejam logo limpos e secos. No caso das caadeiras existem muitos factores que condicionam o padro de disperso dos quais aps a realizao

    do disparo apenas ser possvel vir a conhecer apenas alguns.

    Destes elementos sempre desejvel, a fim de se poder realizar uma percia plena, conhecer os seguintes elementos:

    marca e tipo do cartucho utilizado granulometria da carga de chumbo utilizada tipo de bucha do carregamento do cartucho qual o cano/arma que realizou o disparo (so factores determinantes o comprimento do

    cano e o seu estrangulamento)

    De todos estes elementos a bucha normalmente aquele que, quando no entra no corpo da vtima, no

    procurado, perdendo-se, resultando esta perda numa limitao incontornvel realizao de uma percia que pretenda

    determinar a distncia a que foi realizado o disparo.

    11

  • A bucha, pode ter inmeras formas e originar efeitos perfeitamente diversos aquando do disparo conforme se pode

    observar na foto que se segue, razo pela qual determinante a necessidade de se proceder sua busca e

    recuperao.

    Aps a recolha da bucha, a mesma deve ser enviada bem acondicionada, mantendo a sua integridade, tal

    como foi encontrada, de modo a que se possa determinar com segurana o tipo de bucha a que corresponde.

    semelhana do que acontece com outros elementos municiais j descritos, sempre que sejam retiradas de corpos,

    deve-se lav-las suavemente, minimizando alteraes fsicas.

    Viaturas essencial que, SEMPRE QUE POSSVEL, a mesma no seja mexida de modo a ser possvel realizar

    exame pericial que permita relacionar os eventuais projcteis presentes com as perfuraes e assim estabelecer as

    trajectrias.

    Nota: Sempre que se pretenda localizar a direco e local de onde foram realizados disparos, ESSENCIAL que a viatura no seja movida!

    tambm possvel determinar a sequncia de disparos no vidro de uma viatura.

    Outras percias

    Reconstituies de ocorrncias envolvendo disparos de armas de fogo Determinao de trajectrias de projcteis Exame a superfcies apresentando impactos ou perfuraes de projcteis Determinao da localizao dos atiradores (ida ao local) Determinao da distncia de disparo de espingardas caadeiras (preferencialmente

    mediante presena da bucha envolvida, bagos de chumbo do seu carregamento e eventualmente do tipo de

    cartucho utilizado)

    Observao de perfuraes nas roupas para determinar trajectrias Exames a peas de vesturio perfuradas por projcteis (nomeadamente para avaliao

    do padro de disperso tendo em vista a determinao da distncia de disparo)

    No manuseamento e envio de roupas necessrio seguir as seguintes recomendaes:

    Anotar ordem de colocao no corpo e se alguma pea se encontra anormalmente vestida

    No introduzir alteraes dimensionais nas perfuraes e retirar a roupa do corpo, evitando roturas desnecessrias e no fazer cortes que afectem os orifcios de disparo

    Dobrar convenientemente, deixando a zona afectada virada para fora, protegendo a zona afectada com carto, por exemplo, para evitar contaminaes e, durante este processo, evitar a produo de

    rugas desnecessrias

    Enviar amostras de roupa completamente secas em caixas de carto, excluindo material plstico

    QUESITOS TECNICAMENTE IMPOSSVEIS DE RESPONDER EM BALSTICA FORENSE

    Se uma bucha ou bagos de chumbo foram disparados por determinada espingarda caadeira

    Se uma bucha e bagos de chumbo correspondiam a um mesmo cartucho Determinar calibre de uma espingarda caadeira a partir de bagos de chumbo Se um projctil e uma cpsula pertenciam a uma mesma munio Datao de disparo de uma arma de fogo

    12

  • Distncia de um disparo efectuado por pistola, revlver ou carabina

    Informaes a fornecer pela investigao para o arquivo de casos pendentes Pegadas A especificidade, as tcnicas e materiais necessrios para se proceder a uma eficaz recolha deste tipo de

    vestgio tornam incontornvel que a mesma seja efectuada por tcnico com formao e experincia, pelo que se

    considera que a mesma deve ser realizada por elementos desta rea que podero ser contactados sempre que

    necessrio..

    Rodados de vituras A especificidade das tcnicas e materiais necessrios para se proceder a uma eficaz recolha deste tipo de

    vestgio tornam incontornvel que a mesma seja efectuada por tcnicos com formao e experincia, pelo que se

    considera que a mesma deve ser realizada por elementos desta rea que devero ser contactados sempre que

    necessrio.

    Punes e gravaes a frio Sempre que estejam em causa gravaes por uso de punes ou qualquer outro processo semelhante,

    necessrio que alm da gravao suspeita sejam enviados os punes, devidamente preservados desde o momento

    da sua apreenso/envio..

    Selos e brincos de segurana Sempre que estejam em causa gravaes por presso, necessrio que, alm da gravao suspeita, seja

    enviada a ferramenta suspeita de ser a autora, devidamente preservada desde o momento da sua apreenso/envio.

    Cpsulas de garrafas Sempre que esteja em causa a eventual violao de uma cpsula de uma garrafa essencial que a mesma

    nos seja remetida devidamente preservada desde o momento do seu envio, a fim de lhe evitar o acrescentar de danos

    superficiais que dificultem a realizao do exame pericial.

    Vestgios de ferramentas Este tipo de vestgios exige cuidados extremos na sua recolha, tratamento e envio para o laboratrio, pelo

    que se considera que em cada caso seja esta rea de Balstica /Vestgios contactada a fim de melhor se proceder

    consoante as circunstncias.

    Por exemplo: No caso de cortes de cabos ou fios, sempre imperioso que sejam enviadas as duas superfcies suspeitas correctamente identificadas ou referenciadas!

    4.2. Biologia

    A principal actividade desenvolvida pela rea de Biologia do LPC centra-se na realizao de percias

    solicitadas por todas as entidades com poder judicirio, no mbito da Criminalstica. Este tipo de trabalho caracteriza-

    se pela pesquisa exaustiva de vestgios biolgicos no material analisado.

    A colheita de vestgios biolgicos fundamental para a produo da prova material.

    A qualidade dos procedimentos adoptados na colheita de vestgios biolgicos de primordial importncia para as

    anlises de DNA.

    Tal como se verifica a nvel internacional, a utilizao do manual de procedimentos de colheita de vestgios biolgicos

    dever estar sempre associada a uma prvia formao torico-prtica leccionada, directa ou indirectamente, por

    elementos do Laboratrio de Polcia Cientfica.

    Os procedimentos utilizados na colheita de vestgios biolgicos devero ser consentneos com os protocolos e os

    mtodos de anlise de DNA adoptados pelo Laboratrio de Polcia Cientfica.

    Os mtodos de anlise de vestgios biolgicos encontram-se em permanente evoluo, facto que implica,

    necessariamente, o intercmbio de informao com a equipa de Biologia do Laboratrio de Polcia Cientfica.

    A realizao de percias caracteriza-se pela pesquisa exaustiva de vestgios biolgicos no material analisado, facto que

    nos distingue de outros tipos de laboratrios e torna o nmero de ensaios realizados muito superior ao nmero de

    exames pedidos.

    13

    javascript:popUp('teste.htm')

  • Para alm do trabalho realizado a nvel pericial, a rea de Biologia do L.P.C. procede colheita de vestgios biolgicos

    nos locais de crime, quando para o efeito solicitada, elabora o Manual de Colheita de Vestgios Biolgicos adoptado

    pela Polcia Judiciria, ministra aces de formao no mbito da colheita de vestgios biolgicos, equipa e procede

    manuteno das malas de colheita de vestgios biolgicos e gere a utilizao do sistema CODIS (Combined DNA Index

    System

    Combined DNA Index System (CODIS) O objectivo principal de uma base de dados de DNA reside na preveno criminal.

    O sistema CODIS, software de base de dados dos Estados Unidos da Amrica, foi instalado no Laboratrio de Polcia

    Cientfica da Polcia Judiciria, pelo F.B.I., em Dezembro de 2001.

    Como em Portugal no existe legislao em matria de base de dados de DNA, o sistema CODIS ser, por enquanto,

    utilizado apenas para comparar perfis de DNA relativos a cenas de crime.

    Na sequncia da instalao do sistema CODIS foram j introduzidos cerca de 1000 perfis de DNA e no ms de Maio de

    2002, com apenas 132 perfis introduzidos, obteve-se o primeiro resultado positivo que permitiu relacionar dois casos de

    violao de 1998 com um caso de violao de 1997, cujo autor era desconhecido. Desde ento at presente data j

    se obtiveram mais 26 matches (relacionamentos positivos), cujo contributo foi importante para a investigao criminal.

    4.3. Documentos

    Nesta rea so realizadas, essencialmente, as peritagens que incidem sobre os mais diversos tipos de

    documentos e de objectos, com o objectivo da:

    Determinao da autenticidade ou falsidade de documentos; Anlise de viciaes em todo o tipo de documentos (substituio da fotografia e/ou

    manipulao da imagem de titulares, alterao de preenchimentos, substituio de partes de documentos,

    etc.);

    Anlise, classificao e comparao de documentos, de elementos de documentos e de qualquer dispositivo ou material utilizado na produo de documentos com os nossos Registos de

    Contrafaces;

    Anlise, identificao e comparao de dispositivos mecnicos de impresso (mquinas de escrever, impressoras, fotocopiadoras, etc.) e de partes ou acessrios dos mesmos (fitas, esferas,

    margaridas, tinteiros, cartuchos de toner, entre outros);

    Anlise e comparao de dispositivos mecnicos de corte, de dobra, de costura, de fixao, de colagem e de laminao de documentos;

    Anlise e comparao de cunhos e de impresses de carimbo e de selo branco e outras utilizadas em documentos;

    Anlise e identificao da montagem de documentos, no todo ou em parte; Datao absoluta e/ou relativa de documentos ou entradas em documentos (a verificar

    caso a caso);

    Determinao da sequncia cronolgica de entradas em documentos, ou de partes de documentos (a verificar caso a caso);

    Anlise e comparao antropomrficas de fotografias e/ou imagens (a verificar caso a caso);

    Recuperao e reconstituio de documentos danificados por gua, calor/fogo, corte, etc..

    14

    http://intranet/espaco_departamental/lpc/biologia/indexbiologia.htm#manual#manualhttp://intranet/espaco_departamental/lpc/biologia/indexbiologia.htm#formacao#formacaohttp://intranet/espaco_departamental/lpc/biologia/indexbiologia.htm#distrib#distribhttp://intranet/espaco_departamental/lpc/biologia/indexbiologia.htm#distrib#distribhttp://intranet/espaco_departamental/lpc/biologia/indexbiologia.htm#codis#codis

  • I INTRODUO: DOCUMENTOS DE SEGURANA

    Em cincias forenses, a anlise de documentos tem como objectivo esclarecer a natureza de um documento

    para fins judiciais. Tal como noutra cincia qualquer, importa escolher o mtodo e as tcnicas adequadas resoluo

    do problema em causa, que determinar a autenticidade ou falsidade de documentos e, neste caso, averiguar em que

    consiste, bem como as alteraes e manipulaes sofridas.

    No dia a dia utilizamos os documentos com diversas finalidades o que permite distingui-los de uma maneira

    geral entre

    - documentos de identidade e de legitimao

    - documentos fiducirios (ttulos, cheques e notas de banco)

    - documentos diversos cuja variedade impede qualquer referncia mais detalhada.

    A falsificao ou contrafaco de documentos no constituem por si s um crime isolado. Antes pelo

    contrrio, esto associadas a muitos outros tipos de crime, desde a pequena criminalidade ao trfico de drogas, armas,

    veculos e pessoas, imigrao clandestina organizada, ao terrorismo internacional, branqueamento de capitais,

    corrupo e diversos tipos de crimes econmicos e financeiros.

    Os documentos que so mais frequentemente submetidos a exame pericial no Laboratrio de Polcia

    Cientfica so os documentos de identidade, de legitimao de direitos e de propriedade e os fiducirios, todos eles

    normalmente includos no que se chama de documentos de segurana.

    Para atestar a sua autenticidade estes documentos devem satisfazer as seguintes condies:

    - apresentar as caractersticas dos documentos propriamente ditos (suporte, impresso,

    dados relativos ao titular,..)

    - apresentar, sempre que for o caso, outros elementos de garantia (tais como impresses

    de selo branco, carimbos ou outros)

    - apresentar um nmero que faa do documento uma pea nica e que permita regist-lo

    como tal.

    , pois, importante que estas caractersticas sejam visveis e facilmente reconhecveis uma vez que, em caso

    de um qualquer controlo, serviro simultaneamente de identificao e de autenticao.

    Consoante a natureza do documento, poder-se- considerar diversos nveis de segurana. Assim, so de

    alta segurana os documentos de identificao e de viagem bem como as notas de banco; de mdia segurana os

    ttulos e documentos de registo e de propriedade; de baixa segurana as lotarias, os bilhetes de viagem e de

    espectculos, etc. Muitos outros no apresentam qualquer tipo de segurana, no deixando, no entanto, de serem

    documentos e, como tal, submetidos a exame.

    II - ELEMENTOS DE SEGURANA

    Elementos de segurana so dispositivos ou sistemas incorporados no documento e que tm o objectivo de

    prevenir ou dificultar a sua contrafaco ou falsificao e, caso estas aconteam, torn-las evidentes. Uns podem ser

    facilmente reconhecidos pelo pblico em geral, outros requerem equipamentos adequados sua verificao.

    De uma maneira geral, os documentos apresentam os ditos elementos de segurana no papel, na impresso

    e no acabamento e/ou personalizao do documento, dando-se seguidamente destaque aos mais tradicionais.

    PAPEL

    O papel corrente produzido a partir de fibras de celulose provenientes da madeira enquanto que um papel

    de segurana normalmente produzido a partir de fibras de algodo ou linho o que lhe confere uma maior resistncia.

    Tal o caso do papel das notas de banco cuja durabilidade e resistncia esto bem comprovadas se se tiver em

    considerao o seu percurso desde que saem do banco emissor at sua retirada de circulao. Existem ainda outros

    papis, de grande resistncia, em cuja produo se inserem fibras sintticas.

    As marcas de gua so figuras ou smbolos introduzidos no papel aquando da sua fabricao e resultam de

    uma maior ou menor concentrao de fibras no papel. Apresentam contornos bem definidos e so visveis

    15

  • transparncia. A sua imitao difcil e, quando acontece, apresenta um aspecto grosseiro, resultando na maior parte

    dos casos de uma impresso com uma tinta esbranquiada que d a iluso de autenticidade.

    O filamento de segurana um filete metlico, metalizado ou sinttico que tambm introduzido no papel na

    altura da sua fabricao. Pode ser contnuo ou descontnuo, impresso ou no. A sua imitao igualmente difcil e

    normalmente feita simulando-se a sua existncia atravs do desenho de um risco realizado numa das faces do papel

    ou introduzindo um filamento de um qualquer material no meio de duas folhas coladas.

    Outro elemento de segurana introduzido no papel aquando da sua fabricao a incluso de fibras ou

    pequenos discos sintticos. Podem ser coloridos, metalizados e iridescentes e visveis vista desarmada ou apenas

    detectveis quando observados sob radiao ultravioleta.

    Actualmente, tem-se verificado uma tendncia na substituio do papel por outro tipo de suporte,

    nomeadamente pelos polmeros, os quais, apresentando o modelo normalizado de carto de crdito apresentam

    algumas vantagens como o fcil transporte e a maior durabilidade e resistncia, podendo, inclusivamente, ser

    enriquecidos com variados elementos de segurana.

    IMPRESSO

    Os desenhos e cores caractersticos dos documentos de segurana so algo mais do que a criatividade dos

    artistas que os concebem. A sua finalidade uma das principais defesas contra a aco dos falsificadores. Figuras

    humanas, desenhos geomtricos, flores, entranados e um conjunto infinito de temas so executados quase como se

    fosse um s trao e com grande rigor de pormenor.

    As tintas utilizadas so tintas especiais e exclusivas, de tonalidades e combinaes particulares de modo a

    dificultar a sua imitao. So igualmente de grande qualidade para que, por fora do manuseamento dos documentos,

    no quebrem nem descolorem. Podem apresentar caractersticas variadas como por exemplo, serem visveis e

    fluorescentes ou invisveis e igualmente fluorescentes; podem apresentar propriedades magnticas, efeitos

    iridescentes ou serem metalizadas. Podem ainda mudar de cor consoante o ngulo de observao.

    A impresso propriamente dita consiste na transposio para o papel do desenho previamente concebido.

    Por norma no se utiliza apenas um processo de impresso. comum a adopo de dois mtodos em simultneo

    como o off-set e o talhe doce. O primeiro consiste na transferncia de uma imagem de uma matriz plana para um

    cilindro de borracha que, por sua vez, a transporta para o papel. Este processo o utilizado para a impresso de fundo,

    isto , para os detalhes menores e para as nuances de cor.

    No talhe doce a matriz escavada atravs de uma gravao em negativo. A tinta ir preencher as zonas

    escavadas e ao ser transportada para o papel fica depositada em relevo, sendo perceptvel ao tacto.

    Para alm destes dois processos pode existir ainda um outro, o tipogrfico. o normalmente utilizado na

    impresso de nmeros e letras, datas e chancelas.

    As notas de banco so um perfeito exemplo desta combinao de mtodos de impresso cujo intuito no

    tanto o embelezamento seno o dificultar a contrafaco.

    Dentro dos elementos de segurana associados impresso incluem-se ainda a mini e a microimpresso de

    dizeres que, vista desarmada, parecem linhas, o registo frente e verso que consiste num desenho que parcialmente

    feito num lado e noutro do papel e que s se observa completo quando visto contraluz, as imagens latentes visveis

    apenas em determinada posio, as imagens encriptadas que s so visveis atravs de lentes descodificadoras, a

    gravao a laser, a estampagem de pelculas hologrficas, etc..

    ACABAMENTO E/OU PERSONALIZAO DO DOCUMENTO

    A variedade de documentos admite uma inmera combinao de outras caractersticas adequadas ao fim a

    que se destinam. Assim, existem documentos simples, em forma de carto, os que so um folheto dobrado ou os que

    tm o formato de um pequeno livro como os passaportes. Em todos eles h a considerar o corte, a dobragem ou ainda

    a montagem dos cadernos com a necessria colocao de capas e costura das folhas.

    A numerao do documento tambm pode ser produzida de diversas maneiras (manuscrita, impressa,

    perfurada, gravada) e de acordo com um determinado formato.

    16

  • O mesmo se passa em relao ao preenchimento dos dados pessoais dos respectivos titulares que pode ser

    manuscrito, dactilografado ou informtico.

    A fotografia do titular pode ser colada, agrafada, presa com ilhs ou impressa.

    Podem ainda existir laminados a revestir os documentos, sendo ainda possvel estes laminados possurem

    os seus prprios elementos de segurana como impresses, gravaes e hologramas.

    Finalmente, h ainda a considerar a existncia de outros elementos autenticadores como impresses de

    carimbo, de selos brancos, impresses digitais, chancelas, assinaturas, etc., adequadas e obviamente caractersticas

    do documento em causa.

    Isto revela o facto de que, ao analisar um documento, ele tem que ser encarado como um sistema em que as

    diversas caractersticas so consideradas em conjunto para s depois se particularizar algo que no esteja em

    conformidade.

    Assim, o perito em documentos tem que conhecer os diversos processos de impresso, fabrico de papel,

    tintas e elementos de segurana, pois, s assim, poder reconhecer documentos autnticos, contrafeitos ou

    falsificados

    Na avaliao dos documentos em exame, o perito poder proceder a comparaes directas se para isso

    tiver sua disposio os espcimes necessrios. Se tal no acontecer, poder recorrer a descries, bases de dados

    ou a informao diversa de modo a poder tirar as suas concluses. Caso se trate de um documento sobre o qual no

    disponha de qualquer informao, poder sempre fazer uma descrio e uma avaliao do documento tendo em

    considerao o nvel tecnolgico dos elementos que o constituem.

    III - FALSIFICAO E CONTRAFACO

    Os conceitos de falsificao e contrafaco so frequentemente confundidos mas no mbito da anlise de

    documentos, ou seja, tecnicamente, so conceitos distintos. Assim, uma falsificao (ou viciao) um documento

    parcialmente falso pois h uma alterao de um ou mais elementos que constituem o documento, mantendo-se o

    respectivo suporte (papel, carto, etc.) original. A contrafaco pode dizer-se que uma falsificao completa pois

    uma imitao de um documento autntico em que todos os seus elementos, incluindo o suporte, esto reproduzidos.

    FALSIFICAO

    Fazer uma descrio exaustiva dos documentos falsificados praticamente impossvel pois os meios

    utilizados so inmeros. No entanto, os mtodos de falsificao ou viciao podem-se resumir a trs: eliminao,

    acrescento e substituio, muitas vezes combinados entre si.

    A eliminao de um elemento de um documento, por exemplo, qualquer escrito, pode-se fazer por rasura

    qumica (lavagem qumica utilizando-se um qualquer reagente ou at lixvia) ou por rasura mecnica (mediante a

    utilizao de uma simples borracha ou por raspagem com o auxlio de uma lmina). No primeiro caso, verifica-se que

    qualquer reagente qumico ataca o papel e, aps a sua evaporao, deixa uma certa fluorescncia na zona de

    aplicao, facilmente reconhecida com uma observao luz ultravioleta.

    No caso de uma rasura mecnica, no se verifica qualquer tipo de alterao na fluorescncia do papel mas,

    tratando-se de um processo mecnico, por muito leve que seja a aco abrasiva sobre o papel, verifica-se sempre um

    levantamento das fibras de celulose ou uma zona mais fina que a rea circundante.

    Os acrescentos podem-se fazer por emenda, sobreposio de traos ou acrescentos propriamente ditos. o

    caso das alteraes de datas ou de quantias, das anotaes margem de qualquer documento ou do acrescento de

    um qualquer texto no seguimento de outro.

    A sua deteco baseia-se essencialmente na observao sob condies de iluminao especficas em

    aparelhos como o comparador videoespectral os quais, funcionando com uma vasta gama de radiaes e utilizando

    uma determinada combinao de filtros, permitem observar diferentes reaces das tintas utilizadas. Casos h em que

    os mtodos fsicos no so suficientes, tornando-se necessria a realizao de uma anlise qumica dessas tintas.

    17

  • O acrescento de textos dactilografados pode ser facilmente reconhecido pois aparecem problemas de

    alinhamentos e espaamentos e, se a mquina no do mesmo modelo, diferenas nos tipos impressos. O mesmo

    no se passa em relao a outros equipamentos pois, hoje em dia, com o recurso a uma grande variedade de tcnicas

    de impresso disponveis a partir de um qualquer computador domstico surge o problema da identificao do

    equipamento, por si prprio ou por comparao.

    A falsificao por substituio , na maioria das vezes, uma combinao da eliminao e acrescento.

    A substituio da fotografia do titular de um documento de identificao ou de viagem uma das fraudes

    mais comuns, largamente utilizada em crimes econmicos, trfico de droga ou de pessoas, mudanas de identidade ou

    imigrao ilegal.

    A par da substituio de uma qualquer fotografia, surge a utilizao ou imitao de outros elementos

    autenticadores como carimbos ou selos brancos e tambm, se for caso disso, a reposio de laminados danificados ou

    a sua substituio por outros.

    De igual modo, se verificam, frequentemente, a substituio ou alterao dos dados constantes no

    documento quer por qualquer tipo de rasura, acrescento ou at substituio integral da pgina.

    CONTRAFACO

    Qualquer documento pode ser integralmente imitado e, por tal contrafeito. Assim, o papel, o tipo de

    impresso, o preenchimento, os carimbos, os selos brancos, as assinaturas e chancelas, os laminados e quaisquer

    outros elementos de segurana devem ser cuidadosamente avaliados e determinada a sua falsidade. O prprio teor

    das informaes registadas no documento, por exemplo, uma numerao no conforme, a referncia a uma

    determinada localidade ou servio emissor inexistente, a presena de erros ortogrficos ou at a utilizao de um

    elemento autenticador como um selo branco que no corresponda ao fim a que se destina o documento, so

    normalmente indiciadores de uma contrafaco.

    A fabricao de moeda-papel falsa um dos crimes de contrafaco mais frequentes. No obstante na

    reproduo de notas de banco ser, actualmente, muito comum a utilizao de um sistema informtico vulgar, existem

    contrafaces, muitas vezes escala internacional, em que so utilizados os mtodos tradicionais que, embora muito

    mais laboriosos, so largamente compensadores pelo seu alcance.

    Nestes casos a contrafaco realiza-se por partes distintas. Numa primeira fase, procede-se produo das

    matrizes fotogrficas com a necessria seleco de cores, depois preparam-se as respectivas chapas de impresso e,

    por fim, a impresso propriamente dita com os acabamentos necessrios. bvio que os elementos de segurana

    existentes (e as notas de banco so quase um autntico catlogo de elementos de segurana) quer a nvel do papel,

    dos diversos tipos de impresso utilizada, das tintas ou dos hologramas, so imitados de melhor ou pior forma

    consoante a arte do contrafactor e dos meios tcnicos de que dispe.

    IV - OUTRAS SITUAES

    Existem outras situaes dentro da anlise forense de documentos que, at pela sua curiosidade, devem ser

    referidas.

    o caso dos documentos fantasistas que, por serem completamente falsos, constituem contrafaces de

    documentos de um tipo que no existe de todo ou que mencionam entidades emissoras inexistentes ou fazem

    referncia a pases fictcios. So, na generalidade, documentos que aparentam ser semelhantes a autnticos, no

    obstante, e frequentemente, apresentarem uma certa simplicidade, onde os elementos de segurana ou no existem

    ou so francamente mal imitados. O seu nico xito o facto de que, por serem fictcios, no so conhecidos e, por

    isso, podem passar por verdadeiros.

    Por vezes surgem para anlise documentos que so considerados autnticos, no obstante a sua obteno

    ter sido fraudulenta, isto , mediante a apresentao de documentos falsos ou de documentos pertencentes a outrem.

    claro que, nestas situaes, a anlise laboratorial nada mais pode adiantar uma vez que apenas faz uma

    abordagem puramente tcnica ao documento, nada sabendo do que est por trs dele. Competir ento investigao

    criminal averiguar os factos que concorreram para a sua obteno.

    18

  • Situao anloga a dos documentos furtados em branco, cujo impresso , por conseguinte autntico, que

    so posteriormente preenchidos e autenticados de modo fraudulento. Trata-se, nestes casos, de emisses falsas em

    que os meios autenticadores verdadeiros so indevidamente usados sem qualquer registo legal ou so tambm eles

    forjados e utilizados com o intuito de fazer passar o documento como tendo sido legalmente emitido.

    V - METODOLOGIAS NA ANLISE DE DOCUMENTOS

    Como j anteriormente referido, a anlise forense de documentos, tal como qualquer outra cincia, utiliza

    mtodos tcnico-cientficos adequados a servir os seus propsitos, ou seja, determinar a autenticidade ou falsidade de

    um documento.

    Na maior parte dos casos recorre-se aplicao de mtodos de anlise no destrutivos, no s porque so

    suficientes para o esclarecimento dos factos mas tambm porque interessa manter os documentos intactos como

    meios de prova que so. Noutras situaes, tal no possvel e o recurso a tcnicas destrutivas ou semi-destrutivas

    inevitvel.

    AMPLIAO E ILUMINAO

    A lupa estereoscpica o mais precioso auxiliar do perito em documentos. Associada aos diversos nveis de

    ampliao est uma adequada iluminao, o que determinante para evidenciar pormenores que, de outro modo,

    poderiam ficar ocultados. Assim, uma iluminao em direco oblqua aconselhvel na observao de superfcies

    lisas pois reduz alguma reflexo. a normalmente utilizada para observao de documentos impressos ou manuscritos

    e elementos de segurana.

    No limite da iluminao oblqua considera-se a luz rasante que utilizada para observao de pormenores

    superficiais. O seu ngulo de incidncia permite evidenciar esses pormenores e, por isso, revela-se extremamente til

    na observao de rasuras mecnicas, vincos, marcas tipogrficas ou o relevo da impresso em talhe doce.

    A luz transmitida permite iluminar o documento por baixo, isto , atravessando-o, e utilizada na observao

    de, entre outros, rasuras, marcas de gua ou escritos tapados com tinta correctora.

    A luz coaxial, a que incide directamente na vertical sobre o documento em observao, utilizada para

    estudo de fenmenos relacionados com a reflexo como o caso da retro-reflexo, uma caracterstica particular de

    alguns laminados que lhes permite apresentar imagens invisveis de outro modo.

    A utilizao de diversos filtros, polarizadores ou coloridos, pode ser igualmente conveniente, pois, podero

    evitar alguns fenmenos de reflexo ou evidenciar diferenas de colorao, por exemplo, em cruzamentos de traos de

    tintas.

    As tcnicas utilizando luminescncia so largamente utilizadas na observao de tintas pois permitem

    distinguir tintas diferentes ou visualizar escritos que foram apagados. A luminescncia acontece quando a luz que

    incide num objecto (excitao) absorvida pelas suas molculas levando-as a um estado de energia superior (estado

    excitado). Como este estado energtico no estvel, as molculas retornam ao seu estado inicial e, como resultado,

    alguma da energia que foi absorvida emitida em forma de luz.

    Consoante o comprimento de onda da luz utilizada, obtm-se vrios tipos de luminescncia que vo do

    ultravioleta ao infravermelho, passando obviamente pela luz visvel. Como o olho humano no consegue detectar todos

    os tipos de luminescncia, recorre-se a equipamentos como o comparador videoespectral j referido, que conjugam

    filtros e cmaras sensveis que convertem a radiao numa imagem visvel num monitor.

    Para alm dos fenmenos da luminescncia, utilizam-se ainda os fenmenos da reflexo e da absoro na

    observao de documentos. A reflexo , geralmente, considerada de duas maneiras: difusa e em espelho. Esta

    acontece quando o ngulo de incidncia (radiao) igual ao ngulo de refraco (deteco). Esta forma de reflexo

    mais utilizada na observao de superfcies lisas e reflectoras. Na observao de documentos utiliza-se a reflexo

    difusa porque o ngulo de refraco menos crtico que com a reflexo em espelho.

    Tcnicas, utilizando os fenmenos de reflexo nas zonas do ultravioleta e do infravermelho, so largamente

    utilizadas na observao de rasuras.

    19

  • RECUPERAO DE ESCRITOS OU IMAGENS VINCADAS

    Um outro tipo de tcnica a utilizada no estudo de vincos. Para tal, utilizam-se equipamentos como o ESDA,

    placas de gelatina ou a j referida iluminao com luz rasante.

    O ESDA (Electrostatic Detection Apparatus) um aparelho que apresenta uma base onde se coloca o

    documento a examinar e onde aplicada uma carga electrosttica que, tal como acontece no tambor de uma

    fotocopiadora, cria uma diferena de potencial elctrico que influenciada pelo documento. A diferena de carga pode

    ser visualizada aplicando um toner que se ir acumular nas zonas correspondentes aos vincos. Apesar de muito

    sensvel, este mtodo depende da presso exercida aquando da escrita, do tipo de instrumento utilizado e do papel.

    ESPECTROSCOPIA

    Os diversos tipos de materiais que constituem os documentos, por exemplo, papis, tintas e plsticos podem

    ser analisados e comparados atravs das suas propriedades fsicas, nomeadamente pelos seus espectros.

    Quando um qualquer composto submetido a um determinado tipo de radiao verifica-se uma interaco

    entre esta e a matria, sendo absorvida a parte da radiao correspondente s frequncias vibratrias da amostra.

    Esta absoro depende da geometria molecular, do tipo de ligaes existentes na molcula e das massas atmicas

    que, no seu conjunto, determinam o seu espectro vibracional o qual caracterstico de cada substncia e representado

    por uma curva que constitui ento o seu espectro.

    Na anlise de documentos, as tcnicas mais utilizadas so a espectroscopia de Raman e a espectroscopia

    de infravermelhos com transformada de Fourier (FTIR). Na primeira, a amostra irradiada com luz monocromtica com

    um comprimento de onda de 685 nm, possibilitando a comparao de diversos tipos de materiais sem os danificar,

    como o caso da comparao de tintas no prprio documento sem necessidade de as remover.

    A espectroscopia de FTIR utiliza um espectrmetro de infravermelho que, ao ser equipado com um

    interfermetro, permite efectuar a leitura das frequncias de vibrao de uma amostra submetida irradiao. O

    espectro de infravermelhos obtido atravs de um interferograma a partir da aplicao da funo matemtica da

    transformada de Fourier feita por computador e apresenta um padro caracterstico para cada substncia. Esta tcnica

    pode ser igualmente utilizada no estudo comparativo de tintas e de polmeros que constituem os laminados que

    revestem os documentos.

    CROMATOGRAFIA DE CAMADA FINA (TLC/HPTLC)

    A cromatografia uma tcnica de separao de uma amostra nos seus componentes. Atravs desta tcnica,

    uma pequena amostra do material a examinar aplicada, aps extraco, numa placa de vidro revestida com uma

    camada absorvente especial. Esta placa de vidro depois colocada numa tina com uma pequena quantidade de

    lquido (eluente) que, por capilaridade, ir arrastar selectivamente ao longo da placa os componentes da amostra. A

    separao ocorre porque os componentes da amostra sero atrados pelo revestimento da placa de modos diferentes

    consoante a sua maior ou menor afinidade com este.

    A cromatografia largamente utilizada na separao de cores das tintas de acordo com a composio dos

    seus pigmentos, e pode ser aplicada a tintas de diversos tipos, de esferogrficas a tinteiros de impressoras, desde que

    os seus pigmentos sejam solveis. O seu estudo e comparao baseiam-se no nmero, forma e distncia percorrida

    por cada uma das manchas separadas.

    Tcnicas, utilizando a microscopia electrnica com microanlise de raios X e a eletroforese capilar, podem

    ser igualmente usadas no estudo de documentos, nomeadamente para anlise de tintas, toners e papis.

    VI - CONCLUSO

    A variedade das situaes no permite uma descrio exaustiva dos problemas que se deparam ao perito

    em documentos e nem sempre possvel satisfazer os quesitos que lhe so apresentados. Tal , muitas vezes, o caso

    da problemtica da datao de documentos e de escritas para a qual a comunidade cientfica ainda no encontrou

    respostas adequadas.

    20

  • O desenvolvimento de novas tcnicas de anlise adaptadas peritagem de documentos tem trazido alguns

    avanos mas refora a necessidade de conhecimentos muito especficos e de competncias com um grande grau de

    exigncia.

    No se pretendeu com o presente escrito dar uma noo completa do que a anlise de documentos, mas

    antes abordar alguns tpicos que podero ajudar a entender a complexidade da questo que a sua anlise pericial.

    , pois, um tema que est longe de ser esgotado e que se depara diariamente com novos desafios em busca de

    solues.

    Sector de Moeda Neste Sector so realizadas todas as percias relacionadas com a contrafaco de moeda-papel. Para alm

    de notas, so aqui examinados planos de notas, estudos para produo de notas, papis, chapas de impresso,

    nylonprints, fotolitos, numeradores, tintas, colas, instrumentos de escrita, vernizes, sprays, tinteiros de impressoras e

    um conjunto variado de materiais e equipamento utilizado na contrafaco de moeda-papel, que pode abranger

    tecnologia de ponta ou materiais e maquinaria correntes, utilizados de forma mais ou menos artesanal. O

    manuseamento prvio ao exame de todo o material deve obedecer s recomendaes indicadas.

    As peritagens mais frequentes compreendem:

    Determinao da autenticidade ou falsidade das notas Anlise, classificao e comparao de notas com os nossos Registos de Contrafaces Relacionamento de contrafaces (a verificar caso a caso) Determinao da sequncia de produo das notas (a verificar caso a caso) Anlise, estudo e comparao de dispositivos mecnicos de impresso (impressoras,

    chapas e redes de impresso, numeradores, nylonprints, fotolitos, etc.), de partes ou acessrios dos mesmos

    (tinteiros, tintas, cartuchos de toner, etc.) e/ou de material de acabamento (instrumentos de escrita, vernizes,

    sprays, etc.) com as notas

    No cumprimento dos Artigos 4 e 5 do Regulamento N 1338/2001 do Conselho da Unio Europeia foi

    criado, por Despacho Ministerial Conjunto dos Ministros da Justia e das Finanas, o Centro Nacional de Anlise de

    Notas portugus, responsvel pela anlise e classificao das contrafaces do euro. Seguindo a prtica portuguesa

    desde que foi institudo o Laboratrio da Polcia Judiciria, o NAC (como vulgarmente chamado), encontra-se sediado

    na rea de Documentos do LPC. Nesse mbito, para alm da peritagem das notas de euro e de todo o material

    relacionado com a sua contrafaco, o NAC responsvel pela comunicao ao Banco Central Europeu (BCE) de

    todas as contrafaces de euro detectadas no nosso pas, bem como pelo seu registo no sistema informtico do BCE e

    classificao de acordo com as normas europeias em vigor para todos os Estados Membros.

    Assim, imprescindvel que com o pedido de Exame a notas de euro seja tambm comunicada informao

    referente a:

    Data de deteco da(s) nota(s) Modo de deteco da(s) nota(s) Se foi(foram) detectada(s) antes ou depois de colocada(s) em circulao Concelho e freguesia onde foi(foram) detectada(s) a(s) nota(s) Se a respectiva produo foi descontinuada (i.e., se foi desmantelada a respectiva

    fbrica)

    Se j existe, relativamente a essa(s) nota(s), um nmero de referncia da Europol (i.e., um nmero de processo dado pela prpria Europol no caso de investigaes transnacionais)

    Somente com a introduo, na base de dados do BCE, de todos os dados administrativos referentes a cada

    um dos casos ser possvel investigao obter resultados de pesquisa teis e completos.

    Para melhor se familiarizar e/ou rever alguns aspectos de pormenor da segurana das notas de euros, clique em cima

    da foto que se segue:

    Estrutura dos indicativos das contrafaces de Euros

    21

    http://intranet/espaco_departamental/lpc/documentos/recomendacoes.htmhttp://intranet/espaco_departamental/lpc/documentos/moeda.htm#indicativos#indicativos

  • As contrafaces de notas de euro so classificadas em classes comuns ou classes locais, podendo cada

    uma delas ter, ou no, variantes (subclasse que corresponde a uma modificao e/ou melhoria tcnica na produo da

    contrafaco da classe me).

    Classes Comuns - contrafaces que preenchem um ou mais dos seguintes requisitos:

    Tcnica de reproduo impresso em offset Nmero de notas contrafeitas mais de 200 entradas na base de dados do BCE

    (seizures) por um nico pas ou mais de 70 entradas provenientes de vrios pases

    Qualidade da contrafaco uma boa qualidade de reproduo a nvel tcnico ou de percepo pelo pblico

    Classes Locais todas as contrafaces detectadas em cada pas e que no estejam classificadas como classes comuns

    Ao longo do tempo, as contrafaces podem ser reclassificadas de classes locais para classes comuns ou de classes

    genricas para classes locais. Assim, a duas notas pertencentes a uma mesma contrafaco podem, em alturas

    diferentes, ser atribudos dois indicativos distintos.

    Os indicativos de classificao de contrafaces de notas de euro obedecem a uma estrutura fixa, que pode ser indicada como: XXY Z, correspondendo a:

    XX Cdigo ISO de denominao do pas

    Y Srie da nota

    - Denominao

    Z Letra de cdigo relativa ao processo principal de impresso da nota

    Nmero sequencial da classe (00000 quando a classe genrica)

    Letra sequencial, utilizada no caso de existirem variantes

    Para melhor compreenso, apresentam-se alguns exemplos:

    EUA0050 C00001 classe comum nmero 1 de contrafaco de notas de 50 euros da srie A, impressas em jacto de tinta ou por reproduo electrofotogrfica

    EUA0020 P00002 classe comum nmero 2 de contrafaco de notas de 20 euros da srie A, impressas em offset ou por processo equivalente

    PTA0100 K00014a variante a da classe local portuguesa nmero 14 de contrafaco de notas de 100 euros da srie A, impressas em jacto de tinta

    ESA0005 L00005 classe local espanhola nmero 5 de contrafaco de notas de 5 euros da srie A, impressas por reproduo electrofotogrfica policromtica

    DEA0010 A00008 classe local alem nmero 8 de contrafaco de notas de 10 euros da srie A, com o desenho alterado (p.e., reprodues do desenho promocional do euro)

    FRA0050 M00001 classe local francesa nmero 1 de contrafaco de notas de 50 euros da srie A, obtidas por manipulao de uma nota genuna de denominao inferior ou de uma nota genuna de outros pases

    ITA0200 S00007 classe local italiana nmero 7 de contrafaco de notas de 200 euros da srie A, obtidas por composio de notas

    ATA0500 B00009 classe local austraca nmero 9 de contrafaco de notas de 500 euro

    Sector de Anlise Instrumental O exame forense de documentos engloba a aplicao de mtodos de anlise no destrutivos

    preferencialmente