análise do processo de elaboração das normas internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 análise...

17
www.congressousp.fipecafi.org Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública ABNER RIBEIRO SALAROLI Universidade Federal do Espírito Santo JOSÉ ELIAS FERES DE ALMEIDA Universidade Federal do Espírito Santo

Upload: others

Post on 09-Sep-2020

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

www.congressousp.fipecafi.org

Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade

Pública

ABNER RIBEIRO SALAROLI

Universidade Federal do Espírito Santo

JOSÉ ELIAS FERES DE ALMEIDA

Universidade Federal do Espírito Santo

Page 2: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

1

www.congressousp.fipecafi.org

Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

RESUMO:

O objetivo deste estudo é investigar como o processo de consulta pública pode influenciar a

elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública (IPSAS) emitidas pela IFAC.

Foi possível identificar a participação de vários agentes, as características das sugestões e sua

aceitação pela IFAC. Esta pesquisa teve como base teórica e conceitual a Teoria

Tridimensional do Direito, desenvolvida por Miguel Reale, na qual fato, valor e norma estão

presentes e se relacionam de forma constante, dialética e complementar ao longo do processo

normativo e, no caso em tela, a normatização contábil. Como abordagem metodológica,

recorreu-se à pesquisa documental, à análise de conteúdo e à análise quantitativa, por meio do

teste Qui-quadrado e da interpretação dos resíduos padronizados. A amostra é composta por

sugestões presentes em 123 cartas, sendo possível identificar 59 agentes de diversos países,

dos quais 76% não eram pertencentes ao corpo de membros da IFAC. Sobre o nível de

aceitação das contribuições enviadas, foram identificadas 926 sugestões, das quais 322, de

alguma forma, a IFAC considerou. Verificou-se a expressiva participação do Accounting

Standards Board (África do Sul) e dos australianos Heads of Treasuries Accounting and

Reporting Advisory Committee (HoTARAC) e Australian Accounting Standards Board, sendo

ambas as instituições que mais enviaram contribuições. Além disso, as evidências apontam

que existe maior associação entre as sugestões de órgãos internacionais não membros e

aceitação pela IFAC. Também ocorreu uma forte ligação entre o acatamento e as

contribuições do tipo ‘Forma’. Ainda, para a totalidade da amostra, não houve comprovação

de dependência entre o nível de aceitação e o fato de os itens serem ou não convergentes às

normas emitidas pelo IASB. Entretanto, nos testes para cada pronunciamento ocorreram, em

alguns casos, evidências de associação para ambas as situações: aproximação e

distanciamento das normas privadas, de acordo com a subamostra analisada.

Page 3: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

2

www.congressousp.fipecafi.org

1 INTRODUÇÃO

O desenvolvimento de sólidas normas de contabilidade é condição essencial para o

fortalecimento e globalização dos mercados de capitais (LARSON, 2008). Desse modo, a

harmonização das regras de informação contábil em todo o mundo representa um desejável

atributo, tornando-se a convergência contábil necessária e até mesmo inevitável (BALL,

2006).

A Contabilidade Pública Internacional tem visado à harmonização dos padrões e o

alinhamento de práticas e procedimentos contábeis para os entes públicos. Essa vertente da

ciência contábil representa uma série de esforços para unificar mundialmente a Contabilidade

Governamental.

Frisa-se que a convergência às normas internacionais no setor público é fundamental

para que eventuais questões políticas e governamentais sejam identificadas e equacionadas

por meio de uma avaliação consistente e técnica (NASCIMENTO, 2008). Desse modo,

contribuindo, dentre outras práticas, para que haja na gestão pública a prestação de contas

(accountability) dos representantes eleitos pela sociedade na expectativa de que eles a

representem e que, impreterivelmente, prestem conta de seus atos com eficiência e eficácia

(SLOMSKI, 2003).

Na busca por desenvolver normas convergentes, a atuação da IFAC criada em 1977,

como um organismo internacional e sem fins lucrativos responsável pelo desenvolvimento de

normas internacionais de contabilidade para o setor público coordena esse processo.

Nesse contexto, este estudo visa responder às seguintes questões de pesquisa: Como

ocorre a participação dos diversos entes no processo de criação das normas contábeis

internacionais aplicáveis ao setor público (IPSAS)? Qual a relação entre as características das

sugestões enviadas e a aceitação destas pela IFAC?

Com base no que foi exposto e no intuito de responder às duas questões de pesquisa

propostas, o objetivo geral deste estudo, que utiliza métodos mistos sequenciais (CRESWEL,

2007), é mapear a participação dos entes envolvidos no processo de consulta pública dos

padrões contábeis internacionais aplicáveis ao setor público e verificar a relação entre as

características das sugestões e a aceitação destas pela IFAC.

Assim, a primeira fase da pesquisa consistiu em uma análise das cartas comentário e dos

pronunciamentos visando, por meio da análise de conteúdo, à coleta e à categorização das

sugestões. No que diz respeito à análise de conteúdo de cartas comentário, destacam-se as

pesquisas de Szuster (2011), Larson (2008), Luthardt et al. (2008), Maglio (2011) e Matos

(2013).

Já a segunda etapa implicou uma análise estatística com a pretensão de identificar,

principalmente, a relação entre as contribuições aceitas e as características observadas em

cada sugestão, advindas da primeira fase deste estudo.

As evidências contribuem para identificar de que forma as normas desenvolvidas pela

IFAC refletem o que foi enviado como sugestões pelos participantes do processo, no intuito

de incluir aspectos inerentes às suas realidades na construção de um padrão contábil

internacional. Ademais, foi possível verificar o grau de participação dos países, continentes e

dos entes públicos e privados em todos os processos de consultas públicas. Ainda,

encontraram-se indícios da influência de certas características presentes nas sugestões e sua

aceitação pela IFAC.

Além desta introdução, o estudo está dividido da seguinte forma: 2) Fundamentação

teórica; 3) Procedimentos Metodológicos; 4) Apresentação e análise dos resultados e, por fim,

as considerações finais sobre o estudo, na seção 5.

Page 4: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

3

www.congressousp.fipecafi.org

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1. A IFAC E O PROCESSO DE ELABORAÇÃO DAS IPSAS

A International Federation of Accountants (IFAC), ou Federação Internacional de

Contadores, foi fundada em 7 de outubro de 1977, em Munique, Alemanha, durante o 11º

Congresso mundial de Contadores. Além de promover o fortalecimento da profissão contábil,

a IFAC visa desenvolver e facilitar a adoção de padrões contábeis internacionais de alta

qualidade (IFAC, 2013).

A IFAC atingiu um considerável aumento em seu número de membros, associados,

países e profissionais. É importante salientar que é requerido dos membros, entre outras

coisas, apoiar a missão e os programas desenvolvidos; demonstrar conformidade com as

informações contidas na Declaração de Obrigações de Membros (Statements of Membership

Obligations – SMO); serem operacional e financeiramente viáveis; ter uma adequada

estrutura de governança e contribuir financeiramente (IFAC, 2013).

Na busca por seus objetivos, a IFAC criou, em 1987, o International Public Sector

Accounting Standards Board (IPSASB) ou Comitê de Normas Internacionais de

Contabilidade para o Setor Público. O IPSASB é o responsável pelo desenvolvimento das

Normas Internacionais de Contabilidade do Setor Público ou International Public Sector

Accounting Standards (IPSAS), que são normas de alta qualidade (IFAC, 2013).

Além disso, um importante componente da estratégia do IPSASB é a convergência das

IPSAS às normas emitidas pelo IASB. Para Sutclliffe (2003), isso impede que se tente

"reinventar a roda" no setor público.

As IPSAS são padrões internacionais de alta qualidade, criados para melhorar a

elaboração de demonstrações contábeis no setor público, estabelecendo regras de

reconhecimento, mensuração, divulgação das transações e eventos contábeis (ZEFF, 2007).

A elaboração das IPSAS envolve uma série de atividades e etapas. Os projetos de

norma, adaptados dos pronunciamentos do setor privado, são geralmente precedidos de um

documento de consulta que explora o assunto em detalhes e fornece uma base para discussão

mais aprofundada para o desenvolvimento do tema em questão (IFAC, 2013). Após isso, são

desenvolvidos os chamados Exposure Drafts (EDs), versões preliminares das normas que

serão posteriormente emitidas. Após a sua elaboração, os EDs são disponibilizados para

consulta pública. Os comentários recebidos são analisados pelos membros do IPSASB e ficam

à disposição do público por meio do website da IFAC.

Geralmente, as respostas aos documentos disponibilizados para discussão antecipam

significativas consequências econômicas. E, por intermédio das cartas, os órgãos

normatizadores podem obter evidências ex-ante sobre as potenciais implicações econômicas

do que está sendo proposto (MAGLIO, 2011).

2.2. A TEORIA TRIDIMENSIONAL E A REGULAÇÃO CONTÁBIL

Miguel Reale inova ao argumentar e demonstrar a forma unitária, concreta e dinâmica

em que os elementos de sua teoria (fato, valor e norma) se relacionam. Todavia, para Reale,

essa conrrelação dialética pode ser observável além dos limites da experência jurídica, ou

seja, aplica-se a qualquer aspecto da vida (REALE, 1994). “O artista, por exemplo, inspirado por

determinada realidade factual, projeta sua preferência valorativa, impressionista ou expressionista, e

esta se materializa numa forma expressa por uma pintura ou escultura” (REALE, 1994, p. 124-125).

Nesse contexto, Pohlmann e Alves (2012), ao tratarem do tema regulação, reconhecem

o caráter mutidisciplinar do tema e, sob o enfoque do Direito, abordam a teoria tridimensional

Page 5: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

4

www.congressousp.fipecafi.org

de Reale. Para eles, os temas presentes no processo dialético juridíco-filosófico podem

apresentar contribuições para o assunto regulação, sobretudo quanto aos benefícios desta.

Nesse sentido, registra-se que a aplicação da teoria tridimensional à regulação contábil

foi primeiramente proposta por Pohlmann e Alves (2004). Entretanto, foi Silva (2007) que

efetivamente a transportou para a realidade contábil em sua dissertação. Ainda, Szuster (2011)

utilizou os ensinamentos da teoria de Reale para fundamentar sua tese.

Sendo assim, a Teoria Tridimensional do Direito, de Miguel Reale, apesar de seu

desenvolvimento em outra área do saber, demonstra ser útil para a análise dos componentes

do processo de regulação da Contabilidade (norma, valor e fato), tendo em vista o seu

dinamismo e a sua abordagem dialética (SILVA, 2007).

Desse modo, com a Tabela 1, buscou-se demonstrar como os elementos fato e norma

podem ser reinterpretados de forma a proporcionar a compreensão de seus conceitos em um

cenário contábil. Para tal, os fatores fundamentais foram comparados por Cardoso et al.

(2010). Tabela 1 – Analogia dos elementos da Teoria Tridimensional

Fonte: adaptada de Cardoso et al. ( 2010).

Com o intuito de complementar os mencionados quadros, destaca-se que o valor se

encontra apenas no modelo de Reale (SILVA, 2007). Desse modo, Reale (1999) observa que

o valor é uma das condições fundamentais para que exista uma correlação unitária e concreta

entre fato e norma, formando assim a tríplice relação dinâmica.

Além disso, é possível perceber que as ações humanas estão permeadas por valores e

são orientadas por eles. A exemplo disso, Cardoso et al. ( 2010) salientam que, quando se

considera a prevalência da essência sobre a forma com o intuito de justificar o

reconhecimento de um ativo contábil, verifica-se um valor com elemento de mediação

dialética, promovendo a integração da norma (pronunciamento do CPC) dos fatos

(arrendamento mercantil) orientados por valores (essência sobre a forma).

Outro interessante exemplo, desta vez retirado do conjunto de sugestões enviadas ao

processo de consulta pública das IPSAS, refere-se à possibilidade de realizar reversões de

perdas provenientes de testes de recuperabilidade (impairment). Segundo o órgão responsável

pela contribuição, tal reversão resultaria na manipulação de resultado conforme o julgamento

profissional. Assim, percebe-se a presença do fato (contabilização de reversões) e o valor

defendido pela instituição a fim de evitar a manipulação de resultados (confiabilidade das

ELEMENTO CONCEITO JURÍDICO CONCEITO CONTÁBIL

FATO

O conceito de fato surge como

momento de um processo, um elo de

encadeamento dos atos humanos, quer

em função de atos anteriores, quer

em razão da natureza. "O fato é

algo que somente o é enquanto se

situa no envolver da história,

recebendo significado no contexto ou

na estrutura em que ele ocorre

" (REALE, 1994, p.95)

É qualquer ocorrência que modifique o

patrimônio, seja decorrente de negócio realizado

pela administração (ato) ou não (fato). A

expressão fatos contábeis é mais abrangente, pois

inclui os fatos administrativos. “Os atos

praticados pelos administradores ou donos da

empresa, que afetam o patrimônio empresarial

são denominados fatos administrativos ou

contábeis” (PADOVEZE, 2004).

NORMA

É considerada a forma que o jurista

usa para expressar o que deve ou não

ser feito para a realização de um valor

ou impedir a ocorrência de um

desvalor, integrando algo da realidade

social numa estrutura regulativa

obrigatória. (REALE, 1994, p. 125)

É regra complementar obediente aos princípios

fundamentais (ou à Estrutura Conceitual Básica),

considerada necessária como padrão de conduta

para o registro de fatos e elaboração de

demonstrações e informações contábeis.

Page 6: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

5

www.congressousp.fipecafi.org

informações contábeis), realizando assim a intermediação da (não) inclusão de tal exigência

na norma (IPSAS).

Conclui-se que as demonstrações contábeis são compostas por constantes intenções de

valor atuantes sobre eventos e transações essencialmente econômicos, em uma relação

dinâmica e complementar, formando várias possibilidade normativas, como a convergência

aos padrões internacionais, e esses variados caminhos normativos são convertidos em normas

contábeis pela interferência da autoridade/poder (CARDOSO et al. 2010).

2.3.1 O tridimensionalismo do processo de consulta pública das IPSAS

Por meio dos ensinamentos de Reale é possível construir uma ponte até o processo de

normatização contábil internacional no setor público. Assim, os fatos e valores são

expressados por intermédio das sugestões, o que proporciona à IFAC variadas direções

normativas, das quais uma poderá efetivamente ser transformada em norma.

No tocante aos fatos, cada organismo ou cada pessoa elabora sua contribuição, tendo

por base uma realidade observável. Esta pode representar fatos (econômicos, contábeis) que

poderiam ser contabilizados ou não de acordo com um padrão internacional. Por outro lado, o

projeto de norma (Exposure Draft) pode propor o registro de situações não identificáveis no

contexto de cada respondente ou tratadas por ele de outro modo. Assim, o que se pretende

afirmar é que existe uma base factual observada tanto pelos respondentes quanto pela IFAC.

Entretanto, cada realidade é vista por um prisma valorativo, construído por fatores,

como a história e a cultura (REALE, 1994). Constrói-se então o conceito aplicado de valor.

Os fatos considerados o são conforme certos valores, sejam pertencentes aos respondentes,

sejam pertencentes à própria IFAC.

Desse modo, ao se indicar a inclusão/exclusão de determinado fato, visa-se à defesa de

um valor ou até mesmo uma precaução a um desvalor. Nesse cenário, mencionam-se as

características qualitativas da informação contábil como exemplo de valores. “O atributo da

utilidade da informação contábil, como valor ideal, é objetivado por meio de normas emitidas

por órgão regulador e está presente nas características qualitativas” (CARDOSO et al., 2010).

Pois bem, é da interação entre fatos e valores que advém a norma (REALE, 1994).

Então, é por meio da observação de fatos e guiados por valores diversos que as contribuições

são formuladas e enviadas à IFAC, com intuito de dar ensejo a uma norma condizente com a

realidade, embora esta possa variar consideravelmente de acordo com o ponto de observação.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A população desta pesquisa é formada por todas as sugestões presentes nas cartas

comentário enviadas aos 32 pronunciamentos emitidos pela IFAC. No que se refere à coleta

dos dados, é necessário registrar que, inicialmente, foi realizado um levantamento no site da

IFAC para ter acesso aos dados da população estudada. Entretanto, constatou-se que o website

possuía apenas os dados das seis IPSAS mais recentes, tendo em vista que vários

pronunciamentos foram emitidos há muitos anos.

Para tentar obter os demais dados, estabeleceu-se contato com a IFAC. O órgão

informou sobre a retirada das informações após sete anos e prontificou-se a enviar, por meio

eletrônico, os dados restantes. Contudo, apenas as cartas destinadas à IPSAS 21 foram

enviadas pela IFAC.

Sendo assim, a amostra desta pesquisa constitui-se de 926 sugestões, advindas das

cartas disponibilizadas no site e daquelas enviadas por e-mail, pela IFAC. A quantidade de

Page 7: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

6

www.congressousp.fipecafi.org

cartas que originaram os dados amostrais (sugestões) está descrita por meio da Tabela 2 e a

estatística descritiva, por intermédio da Tabela 3.

Tabela 2 – Cartas por ED

Nº PRONUNCIAMENTO QTD.

01 ED 23 - Redução ao Valor Rec.

Ativo Não Gerador de Caixa 31

02 ED 36 - Ativo Biológico e Produto

Agrícola 15

03 ED 37 - Instrumentos Financeiros:

Apresentação

29 04 ED 38 - Instrumentos Financeiros:

Rec. e Mensuração

05 ED 39 - Instrumentos Financeiros:

Evidenciação

06 ED 40 - Ativo Intangível 18

07 ED 43 - Contratos de Concessão

de Serviços: Concedente 30

TOTAL 123

Em relação aos itens 03, 04 e 05 da Tabela 2, destaca-se que as minutas foram

elaboradas de maneira conjunta e, dessa forma, algumas cartas traziam contribuições

destinadas aos três projetos; entretanto, outros tratavam apenas de um ou dois prospectos de

norma. Para os fins das Tabelas 2 e 3, optou-se por agrupar o número de documentos.

Além disso, apesar de serem enviadas 30 cartas durante o período de consulta pública

desses projetos, uma delas foi designada como confidencial a pedido do próprio órgão

emitente. Logo, 29 cartas comentário foram alvo de análise, em busca de contribuições.

A respeito do item 06 – Ativo Intangível –, foram enviadas 19 cartas, das quais foram

utilizados 18 documentos, pois uma carta não foi disponibilizada pela IFAC.

No item 07 foram listados 34 documentos, mas apenas 30 estavam disponíveis no

endereço eletrônico do órgão.

Tabela 3 – Estatística Descritiva das cartas

ESTATÍSTICA CARTAS PÁGINAS

Média 25 131

Erro-padrão 3,36 22,47

Mediana 29,00 156,00

Moda - 156,00

Desvio-padrão 7,50 50,25

Variância 56,30 2525,50

Mínimo 15,00 55,00

Máximo 31,00 181,00

TOTAL 123 655

Fonte: dados da pesquisa.

Por meio da Tabela 3, percebe-se que a média de cartas e das páginas destas foi de 25 e

131 por ED, respectivamente. Além disso, a média por carta foi de cinco páginas.

Na busca pela consecução da primeira etapa deste trabalho, foram analisados três

grupos de documentos:

as cartas comentário que continham sugestões enviadas por instituições e

pessoas de vários países;

Page 8: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

7

www.congressousp.fipecafi.org

o projeto de norma (Exposure Draft – ED) que foi disponibilizado para

consulta pública;

a versão 2012 da IPSAS emitida após o processo de audiência.

Os outros dois tipos de documentos foram utilizados para averiguar o acatamento ou

não das propostas identificadas e incluídas no banco de dados. Por meio do projeto,

verificaram-se a origem e o contexto da sugestão e, na versão vigente (2012), buscaram-se

evidências de alterações/inclusões advindas das sugestões.

Esses documentos foram produzidos, enviados e posteriormente disponibilizados pela

IFAC em seu site virtual (http://www.ifac.org). Nas cartas estão contidos os dados brutos da

pesquisa, que posteriormente se submeteriam a análises. Com base nelas, as sugestões foram

extraídas para que se pudesse construir um banco de dados. Assim, do exame dos documentos

já descritos, e por meio da análise de conteúdo, as sugestões foram colhidas e classificadas de

acordo com determinadas características (BARDIN, 2007) . Ainda, a definição das categorias

foi baseada em Szuster (2011).

Para o tratamento quantitativo utilizaram-se o teste Qui-quadrado (χ2) e a análise dos

resíduos. O χ2 é um teste não paramétrico e é utilizado quando existem variáveis qualitativas

nominais e/ou ordinais (FÁVERO et al., 2009).

Esse método consiste na comparação entre os valores observados e as frequências

esperadas em uma tabela de contingência que contém células que expõem o resultado da

frequência de uma amostra (AGRESTI, 2002). O objetivo é verificar se as frequências

esperadas diferem significativamente das observadas. A fórmula do teste é dada como segue:

Em que: é a frequência observada e é a frequência esperada. Já as hipóteses se

apresentam do seguinte modo:

H0: não existe relação entre as variáveis

H1: existe alguma relação entre as variáveis

Assim, caso o resultado do χ2

seja maior que o nível de significância do teste (α),

rejeita-se a hipótese de independência entre as categorias (H0). Logo, quanto menor for o p-

valor em relação ao Qui-quadrado, mais forte será a associação entre as variáveis (aceitando-

se H1) (AGRESTI, 2002).

Entretanto, conforme destacam Agresti (2002) e Pereira (2004), a estatística fornecida

pelo Qui-quadrado se limita a demonstrar a ligação entre as variáveis analisadas e não

fornecem, por si sós, detalhes pontuais que expliquem a participação de cada célula da tabela

no valor alcançado pelo χ2

.

Assim, torna-se necessária a análise dos resíduos (diferenças entre os valores

observados e esperados) padronizados. Esses resíduos são calculados em unidades de desvios-

padrão. Valores absolutos maiores que 2 apontam uma falta de adequação entre o valor da

célula e H0 (AGRESTI, 2002).

Pereira (2004) afirma que os valores apresentados pelos resíduos podem sugerir também

a probabilidade de ocorrência de determinado valor observado em uma tabela de contingência

e descreve o cálculo dos resíduos da seguinte forma:

Em que:

Page 9: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

8

www.congressousp.fipecafi.org

O = Frequência Observada;

E = Frequência Esperada;

TG = Total Geral da tabela;

TC = Total da Coluna;

TL = Total da Linha.

Diante disso, neste estudo buscaram-se indícios que demonstrassem a possível relação

entre o grupo de sugestões aceitas e as características presentes em cada contribuição. De

maneira complementar foi analisada a relação entre as características das sugestões e dos

respondentes.

Assim, os testes de independência foram realizados com as diversas variáveis deste

estudo, advindas da análise de conteúdo, as quais ficaram assim definidas:

Forma ou conteúdo (forma ou conteúdo): como “forma”, classificaram-se as

sugestões com caráter essencialmente editorial, ou seja, que não promoviam

discussões conceituais, como edição de parágrafos e correções gramaticais. Já os

itens identificados como “conteúdo”, apresentavam aprofundamento conceitual e

propunham maneiras diferentes de contabilização, entre outras informações;

Aproximação às normas contábeis do setor privado (IFRS) (sim ou não): a

pertinência desta categoria está ligada ao fato de a IFAC elaborar seus

pronunciamentos com base nas normas emitidas pelo IASB. Desse modo,

classificaram-se nessa rubrica todas as sugestões que buscavam o alinhamento às

normas privadas;

Membro IFAC (sim ou não): sob esta classificação, as contribuições foram

identificadas como originadas ou não do corpo de membros da IFAC. Salienta-se

que, para confirmar o mencionado vínculo, foi verificada a lista de todos os

membros no período compreendido entre a emissão da minuta e da IPSAS;

Classes de participantes (organismos de normatização, organizações

governamentais, organismos profissionais de contabilidade, outros, instituições

privadas, instituições de auditoria, organizações internacionais): aqui as

contribuições foram categorizadas de acordo com área de atuação dos órgãos

responsáveis pelas sugestões. A classificação foi fortemente baseada pela

segregação feita pela própria IFAC;

Continentes: indicação do continente de onde vieram as contribuições. A título de

esclarecimento, ressalta-se que a rubrica INTERNACIONAL representa as

entidades que não se limitam a apenas um país.

Destaca-se, ainda, que os testes foram operacionalizados por meio de um software

estatístico. Por meio da Tabela 4, é possível visualizar a organização dos dados amostrais.

Tabela 4 – Distribuição das variáveis

ACEITAÇÃO

APROXIMAÇÃO

IFRS TIPO

MEMBRO

IFAC

NÃO SIM CONTEÚDO FORMA NÃO SIM

NÃO 472 122 509 85 503 91

SIM 260 72 258 74 301 31

TOTAL 732 194 767 159 804 122

Fonte: dados da pesquisa.

Page 10: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

9

www.congressousp.fipecafi.org

A tabela acima apresenta o quantitativo de sugestões para as variáveis “Aproximação

IFRS”, “Tipo” e “Membro IFAC”, de acordo com a variável “Aceitação”.

3.2.2 Hipóteses desenvolvidas

Nesta subseção apresentam-se as hipóteses que foram desenvolvidas e testadas. Em

tempo, observa-se que os testes foram realizados para a totalidade da amostra e também para

cada pronunciamento (subamostra).

H1: a convergência ou não das sugestões às normas do IASB causa influência

na sua aceitação pela IFAC (Aceitação x Aproximação IFRS);

H2: a origem das sugestões causa influência na sua aceitação pela IFAC

(Aceitação x Membro IFAC);

H3: o tipo de sugestões (Conteúdo ou Forma) causa influência na sua aceitação

pela IFAC (Aceitação x Tipo);

H4: a classe dos responsáveis pelas das sugestões tem relação com o fato de

elas serem convergentes ou não para a totalidade da amostra (Classes x Aproximação

IFRS);

H5: o continente dos responsáveis pelas das sugestões tem relação com o fato

de elas serem convergentes ou não para a totalidade da amostra (Continentes x

Aproximação IFRS).

Destaca-se que, com exceção das hipóteses 4 e 5, as demais foram testadas para toda a

amostra e também de maneira individual, conforme será apresentado na próxima seção.

4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS (SEGUNDA QUESTÃO DE

PESQUISA)

4.1 ANÁLISE BIVARIADA DOS DADOS

A Tabela 5 apresenta os resultados para toda a amostra, e é possível concluir que apenas

a primeira hipótese, Aproximação IFRS x Aceitação, não foi comprovada. A próxima tabela

demonstra os achados para cada pronunciamento.

Tabela 5 - Hipóteses para toda a amostra

Hipóteses Resultado χ2 Análise dos resíduos padronizados

H1 Não aceita -

H2 Aceita Associação positiva entre sugestões de não membros e a aceitação delas

H3 Aceita Associação positiva entre sugestões de forma e a aceitação delas

H4 Aceita Associação positiva entre sugestões das Instituições de Auditoria e a

aproximação às IFRS

H5 Aceita Associação positiva entre sugestões da Oceania e à aproximação às IFRS

Associação negativa entre sugestões da América e à aproximação às IFRS

Em relação à H1, conclui-se que, apesar de a IFAC elaborar seus pronunciamentos tendo

por referência as normas emitidas pelo IASB, não ficou comprovado o favorecimento das

sugestões que tem por objetivo a aproximação das normas contábeis privadas, no que se refere

à totalidade da amostra estudada.

No que concerne a H2, constata-se que o corpo de membros da IFAC é composto por

diversos organismos distribuídos pelo mundo e que precisam atender a uma série de

requisitos, inclusive financeiros, a fim de se manterem como tal. Assim, investigou-se a

Page 11: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

10

www.congressousp.fipecafi.org

possibilidade de suas contribuições terem maior destaque, até mesmo por conta da provável

proximidade.

Os resultados obtidos dão indícios de que não houve o referido favorecimento no que

diz respeito a totalidade da amostra estudada. Ao contrário, a análise dos achados evidencia

certo detrimento das sugestões de membros em relação aos não membros.

Dessa forma, os fatos e valores defendidos por participantes não ligados ao corpo de

membros pareceram ter mais espaço à aceitação. Isso também leva à indicação de que a

aderência a sugestões pode ser bem maior do que poderia ser em uma hipotética realidade de

favorecimento de membros, já que atualmente representam uma minoria.

Sobre o resultado de H3, é possível atribuir inúmeros significados ao fato em tela. A

IFAC poderia ter dado prioridade a esse tipo de contribuição tendo em vista o seu baixo

número (17%) ante as sugestões de “conteúdo”, entre outros fatores. Contudo, destaca-se a

questão do favorecimento das contribuições essencialmente editoriais em detrimento do baixo

aproveitamento das contribuições com maior profundidade.

Tabela 6 - Hipóteses para cada ED

Hipóteses ED Resultado

χ2

Análise dos resíduos padronizados

H1

23

Aceita Associação negativa entre as sugestões convergentes às IFRS e a

aceitação delas

H2 Aceita -

H3 Não aceita -

H1

36

Não aceita -

H2 Aceita Associação positiva entre sugestões de não membros e a aceitação delas

H3 Não aceita -

H1 37-

39

Aceita Associação positiva entre as sugestões convergentes às IFRS e a

aceitação delas

H2 Não aceita -

H3 Aceita Associação positiva entre sugestões de forma e a aceitação delas

H1

40

Não aceita -

H2 Aceita -

H3 Não aceita -

H1

43

Aceita Associação positiva entre as sugestões convergentes às IFRS e aceitação

delas

H2 Não aceita -

H3 Não aceita -

Primeiramente, observa-se que as hipóteses aceitas que não estão com a análise dos

resíduos obtiveram os valores destes menores que 2, o que impossibilitou inferências

estatisticamente seguras em relação ao sentido da associação. Verifica-se ainda que, ao

contrário da análise geral, nas subamostras H1 (Aproximação IFRS x Aceitação) foi aceita nos

EDs 23, 37-39 e 43. Entretanto, no caso do primeiro, a associação foi entre as sugestões não

convergentes e a aceitação.

Diante disso, afirma-se, em termos estatísticos, que a IFAC beneficiou as contribuições

que não se relacionavam às IFRS. Isso pode sugerir, quanto ao ED 23, que, apesar de a minuta

ser baseada em normas privadas, a federação deu prioridade às sugestões com abordagens

diferentes dos pronunciamentos do IASB.

Em relação ao resultado de H1 nos EDs 37-39, extraem-se a não independência dos

grupos e a existência de um favorecimento das contribuições que visavam à aproximação das

normas privadas. Esses achados podem ligar-se à possibilidade de o assunto em voga ser mais

abordado em um cenário privado. Isso não significa que o tema não tenha a devida

Page 12: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

11

www.congressousp.fipecafi.org

importância em um contexto público; entretanto, as referências dos respondentes parecem ser

orientadas pelas normas privadas.

No que tangem ao ED 43, diferentemente do resultado geral e semelhantemente ao

resultado da análise advinda dos instrumentos financeiros, verificou-se uma razoável

associação entre as sugestões que foram aceitas pela IFAC e que buscavam a convergência às

normas privadas.

Como uma possível razão, verifica-se que, na minuta solicitante das contribuições, ficou

claro que o objetivo era realizar um espelhamento da norma privada (Contratos de Concessão:

Operador). Com base nisso, esses achados são coerentes com a própria missão do

pronunciamento.

4.2 DETALHAMENTO DO PROCESSO DE CONSULTA PÚBLICA DAS IPSAS

(PRIMEIRA QUESTÃO DE PESQUISA)

4.2.1 Perspectiva dos pronunciamentos

Abordam-se aqui os resultados no que se refere aos sete pronunciamentos colocados em

consulta pública. Sendo assim, a Tabela 7 demonstra o total de sugestões extraídas das cartas

e também possibilita identificar as quantidades referentes a cada ED.

Tabela 7 – Resultados por pronunciamento

MINUTA

CARTAS

SUGESTÕES

ACATADAS

TOTAL

QTD %

ED 23 - Redução ao Valor Rec. Ativo Não

Gerador de Caixa 31 85 29,0 294

ED 36 - Ativo Biológico e Produto Agrícola 15 35 39,7 88

ED 37 - Instrumentos Financeiros:

Apresentação

29

17 32,0 53

ED 38 - Instrumentos Financeiros: Rec. e

Mensuração 33 34,3 96

ED 39 - Instrumentos Financeiros:

Evidenciação 7 19,4 36

ED 40 - Ativo Intangível 18 51 43,6 117

ED 43 - Contratos de Concessão de Serviços:

Concedente 30 104 43,0 242

TOTAIS 123 332 - 926

A minuta que mais recebeu sugestões foi “Redução ao Valor Recuperável de Ativo Não

Gerador de Caixa”, com 294 sugestões (31,7%). Em contrapartida, o ED “Instrumentos

Financeiros: Evidenciação” foi o que menos recebeu contribuições, totalizando 36 (3,9%).

Do período compreendido entre o ED 23 e o ED 40, percebe-se uma queda do número

de cartas. Já o ED 43, o mais atual, marcou uma elevação após alguns anos. Isso pode sugerir

que o tema do projeto (Contratos de Concessão) tenha atraído as atenções dos participantes.

Sublinha-se ainda, em comparação com os demais pronunciamentos, que a média de

cartas aos projetos de instrumentos financeiros foi relativamente baixa (9,67%). Isso sugere

que o assunto abordado tenha sido considerado pela comunidade pública como de menor

relevância. Nesse sentido, revela-se que alguns respondentes indicaram a necessidade de

incluir mais exemplos voltados ao setor público.

No que tange ao percentual de aproveitamento das sugestões (aceitas/total), o projeto

“Ativo Intangível” foi o que alcançou o melhor resultado, com 43,6%. O segundo melhor

Page 13: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

12

www.congressousp.fipecafi.org

índice ficou por conta de “Contratos de Concessão de Serviços: Concedente”, com 43%. Já o

menor resultado, do ED nº 39, com 19%.

Verifica-se que os números encontrados estão alinhados com as impressões advindas da

análise das cartas. Dessa forma, verifica-se que a segunda maior quantidade de sugestões foi

sobre a minuta de Contratos de Concessão. Além disso, o seu índice de aproveitamento – o

segundo – sugere uma maior correspondência da IFAC às propostas dos entes.

Entretanto, o oposto ocorreu com o ED 23 (Impairment), que obteve elevado número de

cartas e sugestões, mas um baixo nível de aderência às contribuições. Sendo assim, as

representações de fatos e valores destinadas a essa minuta foram as que menos influenciaram

a norma final, em comparação com os outros EDs.

Verifica-se que, em todos os pronunciamentos, as contribuições do tipo “CONTEÚDO”

foram superiores em número. Registra-se que o ED “Ativo Biológico e Produto Agrícola”

obteve a maior proporção (26%) de sugestões do tipo “FORMA” em relação à de

“CONTEÚDO”.

Concernentemente à referência às normas privadas (IASB), destaca-se o ED 37 como a

minuta com maior proporção de contribuições (sim/total) visando à harmonização nas normas

privadas (41,5%). Esses achados corroboram os da análise quantitativa individual, em que

ficou provada a associação entre as sugestões aceitas e a aproximação às normas privadas das

contribuições que versavam sobre instrumentos financeiros.

No geral, foi o ED 23 que recebeu a maior quantidade de sugestões convergentes,

embora as análises quantitativas individuais e gerais demonstrassem que essa modalidade de

contribuições não havia sido privilegiada.

O ED 23 alcançou o maior índice e o maior número de participações provenientes de

membros, apesar de estas também não terem sido priorizadas, conforme indícios do teste

estatístico.

Em linhas gerais, constata-se que o envolvimento dos membros caiu consideravelmente

em comparação ao primeiro projeto emitido. Essa realidade é inversamente proporcional ao

aumento do número de membros. Embora, de acordo com o exposto na subseção 2.1.1, os

membros devem seguir os dispositivos da Declaração de Obrigações de Membros (Statements

of Membership Obligations - SMO). Ressalta-se que o § 14 da seção 5 da SMO deixa claro

que os organismos membros são incentivados a comentar as minutas (EDs) elaboradas pelo

IPSASB.

A queda no envio de contribuições por membros também pode ter ligação com os

achados da análise quantitativa em que os testes demonstram indícios de maior aceitação a

sugestões de entes não membros.

4.2.2 Perspectiva dos participantes: entes

Dentre os órgãos, o que mais contribuiu em número de sugestões foi o Accounting

Standards Board (África do Sul), com 153 sugestões (16,5%). A segunda posição foi ocupada

pelo Heads of Treasuries Accounting and Reporting Advisory Committee (Austrália), com 68

contribuições (7,34%). Em relação à quantidade de propostas aceitas, o Accounting Standards

Board também obteve o melhor resultado, 83 sugestões (25%), seguido pelo Australian

Accounting Standards Board, com 29 contribuições (8,7%). A Tabela 8 apresenta os cinco

órgãos com maior quantitativo de propostas.

Tabela 8 – Entes com maior participação

ENTE SUGESTÕES

ACEITAS TOTAL

Accounting Standards Board (África) 83 153

Page 14: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

13

www.congressousp.fipecafi.org

Australian Accounting Standards Board 29 59

Heads of Treasuries Accounting and Reporting Advisory Committee 22 68

KPMG 20 50

Public Sector Accounting Board 13 39

TOTAL 167 369

É interessante ressaltar a diferença de 125% entre o número de sugestões dos dois

mencionados órgãos com maior participação. Ainda, os participantes com menor número de

contribuições foram Föreningen Auktoriserade Revisorer (Suécia) e o senhor Jean-Bernard

Mattret (França), ambos com apenas uma sugestão.

4.2.3 Localização dos participantes: países

Como intuito de detalhar a localização das contribuições, a Tabela 9 traz a distribuição

das sugestões de acordo com os países envolvidos.

Tabela 9 – Sugestões por país

PÁIS ACEITA? TIPO APROXIMAÇÃO IFRS

NÃO SIM CONTEÚDO FORMA NÃO SIM

África do Sul 70 83 95 58 124 29

Argentina 3 2 2 3 5

Austrália 122 69 156 35 144 47

Canadá 69 21 79 11 75 15

Estados Unidos 22 5 26 1 26 1

França 46 19 64 1 54 11

Holanda 10 1 10 1 11

Índia 16 6 17 5 19 3

Internacional 59 41 86 14 80 20

Japão 5 4 7 2 6 3

Nova Zelândia 58 25 64 19 59 24

Paquistão 2 2 - 1 1

Reino Unido 88 43 126 5 98 33

Sudão 6 5 1 5 1

Suécia 5 4 8 1 8 1

Suíça 12 8 18 2 15 5

Tanzânia 1 1 2 - 2

TOTAIS 594 332 767 159 732 194

Dentre os países participantes, a Austrália foi a que mais enviou contribuições (21%).

Salienta-se que a primeira colocação da Oceania ocorre principalmente devido às

contribuições australianas. O segundo maior número ficou por conta da África do Sul (16%).

Todavia, no que se refere ao índice de aceitação, essas posições se invertem. Este país

apresenta o maior resultado (25%), e aquele, o segundo maior (21%).

Com base nisso, evidencia-se o contraste do continente africano concernente às

propostas enviadas. Foi da África que veio a terceira maior parcela de contribuições, sendo

desse continente o segundo país que mais contribuiu, o primeiro com mais sugestões aceitas

(África do Sul) e o órgão mais participativo (Accounting Standards Board). Em contrapartida,

desse mesmo continente vieram dois países cujos níveis de contribuição estão entre os

menores (Tanzânia e Sudão).

Contudo, torna-se necessário realizar mais uma observação em relação ao continente

africano e consequentemente ao Accounting Standards Board (África do Sul). Verificou-se

Page 15: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

14

www.congressousp.fipecafi.org

que foram esses que apresentaram o maior número e a maior proporção (40%) de

contribuições do tipo “Forma”. Esses dados podem justificar o alto índice de aceitação

alcançado, tendo em vista que, pela análise estatística, ficou evidenciado certo favorecimento

das sugestões essencialmente editoriais.

Desse modo, parece ser uma característica do referido órgão uma elevada preocupação

com aspectos formais. Por outro lado, a Europa apresentou o maior número e a maior

proporção (95%) de sugestões de “Conteúdo”, demonstrando mais inclinação a questões

aprofundadas e conceituais.

Oportunamente, constata-se que da América do Sul vieram contribuições apenas da

Argentina (0,54%), enviadas pela Federación Argentina de Consejos Professionales de

Ciências Económicas (FACPE), e todas foram aceitas.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo buscou analisar e mapear o processo de consulta pública das IPSAS no

intuito de se compreender a elaboração das normas internacionais de contabilidade pública.

Como sustentação teórica foi desenvolvida uma analogia à tríplice estrutura realiana à

realidade regulatória contábil e à construção de padrões internacionais aplicáveis ao setor

público.

No que tange aos dados e resultados, entre as áreas de atuação profissional dos

participantes, estavam órgãos regionais responsáveis pela elaboração de padrões, instituições

de auditoria, órgãos governamentais e entidades privadas. Tal fato representa o grau de

heterogeneidade de interesses e pontos de vista dos participantes.

O continente com maior percentual de sugestões aceitas foi a África, com 52%, e o

menor foi da América (23%). Este continente também foi o que mais se distanciou das

normas do IASB, o que pode ter relação com a atuação do FASB (Financial Accounting

Standards Board) em território norte-americano. Frisa-se ainda a baixa participação da Ásia,

com 3,5% do total de contribuições e 3% do montante de sugestões aceitas.

Não foram identificadas contribuições brasileiras nem do restante da América Latina.

Sendo assim, em vista da importância do processo de convergência internacional na área

pública, o Brasil pode ter deixado de contribuir com propostas que buscassem tornar a norma

mais compatível com a realidade brasileira, uma vez que também está envolvido no processo

de convergência às normas da IFAC.

Por meio dos testes estatísticos, verificou-se a possível associação entre as

características das propostas e sua aceitação, no intuito de atender à última parte do objetivo

geral. Nesse sentido, ficou evidenciado que a IFAC não privilegiou as sugestões advindas de

membros, ao contrário, parece ter havido maior aceitação de itens de não membros. Quando

significativos, os testes por pronunciamento também reforçaram esses resultados.

No tocante aos tipos de sugestões, os resultados apontaram uma forte associação entre

os elementos do tipo “Forma” e a aceitação, apesar de sugestões desse tipo estarem em menor

número (17%). Esses resultados também podem explicar o nível de aceitação alcançado pelo

continente africano e pelo Accounting Standards Board (África do Sul), considerando que

ambos apresentaram mais contribuições de “Forma” relativamente aos outros entes. A análise

individual dos pronunciamentos também resultou nessa conclusão.

Em tempo, relata-se como uma das limitações do estudo o uso de informações

provenientes da análise de conteúdo. Frisa-se isso porque essa técnica demanda a apreciação

interpretativa do pesquisador e, em virtude disto, podem ocorrer divergências de

entendimento.

Page 16: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

15

www.congressousp.fipecafi.org

Como sugestões para futuras pesquisas, indica-se o estudo do processo de consulta

pública em outros documentos emitidos pela IFAC, como os consultation papers, documentos

voltados à atuação ética e profissional, além da estrutura conceitual (Conceptual Framework),

com emissão prevista para 2014.

Além disso, sugere-se o aprofundamento dos valores defendidos pelos participantes do

processo de consulta pública, tendo como base a delimitação de temas e/ou pronunciamentos.

A utilização de instrumentos de pesquisa, como questionários, poderiam ser aplicados aos

respondentes, de maneira complementar. Em tempo, um outro instigante foco para estudos

seria a relação entre as idiossincrasias presentes em cada país ou continente e a maneira como

estes elaboram suas contribuições. Assim, estudos voltados às questões geopolíticas,

econômicas, sociais, históricas e culturais poderiam levar a importantes indicações.

REFERÊNCIAS

Agresti, A. (2002). Categorical data analysis (2a ed). New Jersey: John Wiley.

Ball, R. (2006). International financial reporting standards (IFRS): pros and cons for

Investors. Accounting and Business Research, 36(special issue), 5-27.

Bardin, L (2007). Análise de conteúdo (4a ed). Lisboa: Edições 70.

Cardoso, R. L., & Silva, M. A., & ; Mário, P. do C., & Iudícibus, S. de. (2010). Análise da

regulação da contabilidade à luz da teoria tridimensional do direito de Miguel Reale. Revista

Universo Contábil, 6(1), 06-27.

Cardoso, R. L., & Saravia, E., & Tenorio, F. G., & Silva, M. A. (2009). Regulação da

contabilidade: teorias e análise da convergência dos padrões contábeis brasileiros aos IFRS.

Revista de Administração Pública, 43. 773-799.

Creswell, J. (2007). Projeto de pesquisa: métodos qualitativo, quantitativo e misto (2a ed).

Porto Alegre: Bookman.

Fávero, L. P. L., & Belfiore, P. P., & Silva, F. L. da., & Chan, B. L. (2009). Análise de dados:

modelagem multivariada para tomada de decisões. Rio de Janeiro: Elsevier.

IFAC. (2013). Statements-of-membership-obligations. Recuperado em 20 de junho, 2013, de

http://www.ifac.org/sites/default/files/publications/files/statements-of-membership-

obligations-1-7-revised.pdf

Larson, R. K. (2008). An examination of the comment letters do the IASC: special purpose

entities. Research in Accounting Regulation, 20, 27-46.

Luthardt, U. M. T., & Zimmermann, J., & Bulla, J., & Meier, A. R. (2008). Global

Accounting standards - a success story? An empirical investigation of the first FASB & IASB

convergence project [Working Paper Nº 1135270]. SSRN Working Paper Series, Rochester,

NY.

Page 17: Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de … · 2014. 9. 9. · 1 Análise do Processo de Elaboração das Normas Internacionais de Contabilidade Pública

16

www.congressousp.fipecafi.org

Maglio, R. (2011). A content based analysis of comment letters on the IASB discussion

paper financial instruments with characteristics of equity [Working Paper Nº 1795982]. SSRN

Working Paper Series, Rochester, NY.

Matos, E. B. S. de. (2013). Critérios de reconhecimento, mensuração e apresentação das

operações de leasing segundo a minuta de pronunciamento (ed/2010/9) do IASB: análise da

opinião dos usuários da informação contábil. Dissertação de mestrado, Universidade de

Brasília, Brasília, DF, Brasil.

Nascimento, L. S. do. (2008). A reforma da contabilidade governamental brasileira: a

necessária revisão dos preceitos vigentes em face das demandas de informações e do esforço

de harmonização nacional e internacional. Recuperado em 21 de junho, 2013, de

http://www3.tesouro.fazenda.gov.br/Premio_TN/XIIPremio/sistemas/3tosiXIIPTN/a_reforma

_da_contabilidade_governamental.pdf

Pereira, J. C. R. (2004). Análise de dados qualitativos: estratégias metodológicas para as

ciências da saúde, humanas e sociais (3a ed). São Paulo: Edusp.

Pohlmann, M. C., & Alves, F. J. dos S. (2012). Regulamentação. In: S. Iudícibus, & A. B.

Lopes. (Coord.). Teoria Avançada da Contabilidade (2a ed, Chap. 6, pp. 235-272). São

Paulo: Atlas.

Pohlmann, M. C., & Alves, F. J. dos S. (2004). Regulamentação. In: S. Iudícibus, & A. B.

Lopes. (Coord.). Teoria Avançada da Contabilidade (1a ed). São Paulo: Atlas.

Reale, M. (1999). Filosofia do direito (19a ed). São Paulo: Saraiva.

Reale, M. (1994). Teoria tridimensional do direito (5a ed). São Paulo: Saraiva.

Silva, M. A. (2007). Análise da regulação contábil: um ensaio à luz da teoria tridimensional

do direito, da teoria normativa da contabilidade e do gerenciamento da informação contábil,

numa perspectiva interdisciplinar. Dissertação de mestrado, Fundação Getúlio Vargas, Rio de

Janeiro, RJ, Brasil.

Slomski, V. (2003). Manual de contabilidade pública: um enfoque na contabilidade

municipal (2a ed). São Paulo: Atlas.

Sutcliffe, P.(2003). The Standards Programme of IFAC’s Public Sector Committee.

Public Money & Management, 23(1), 29-36.

Szuster, F. R. (2011). Uma análise do valor social considerado pelo Comitê de

Pronunciamentos Contábeis à luz da teoria tridimensional do direito. Tese de doutorado,

Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Zeff, S. A. (2007). Some obstacles to global financial reporting comparability and

convergence at a high level of quality. The British Accounting Review, 39(4), 290-302.