anÁlise de imagem dos cartazes do festival de cinema...

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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ CAMPUS DE CURITIBA DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE DESENHO INDUSTRIAL CURSO DE TECNOLOGIA EM DESIGN GRÁFICO GUILHERME ALENCAR COCA 1364510 ANÁLISE DE IMAGEM DOS CARTAZES DO FESTIVAL DE CINEMA DE CANNES DE 1970 A 1979 TRABALHO DE DIPLOMAÇÃO CURITIBA 2019

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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁCAMPUS DE CURITIBA

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE DESENHO INDUSTRIALCURSO DE TECNOLOGIA EM DESIGN GRÁFICO

GUILHERME ALENCAR COCA1364510

ANÁLISE DE IMAGEM DOS CARTAZES DO FESTIVAL DE CINEMA DE CANNES

DE 1970 A 1979

TRABALHO DE DIPLOMAÇÃO

CURITIBA2019

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GUILHERME ALENCAR COCA1364510

ANÁLISE DE IMAGEM DOS CARTAZES DO FESTIVAL DE CINEMA DE CANNES

DE 1970 A 1979

Trabalho de Conclusão de Curso apre-sentado à disciplina de Trabalho de Di-plomação, do curso superior de Tecno-logia em Design Gráfico do Departa-mento Acadêmico de Desenho Industri-al da Universidade Tecnológica Federal do Paraná.

Orientadora: Prof.ª Lindsay Jemima Cresto (MSc)

CURITIBA2019

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TERMO DE APROVAÇÃO

TRABALHO DE DIPLOMAÇÃO Nº 699

ANÁLISE DE IMAGEM DOS CARTAZES DO FESTIVAL DE CINEMA DE CANNES DE 1970 A 1979

por

Guilherme Alencar Coca

Trabalho de Diplomação apresentado no dia 28 de junho de 2019 como requisitoparcial para a obtenção do título de TECNÓLOGO EM DESIGN GRÁFICO, do CursoSuperior de Tecnologia em Design Gráfico, do Departamento Acadêmico deDesenho Industrial, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. O aluno foiarguido pela Banca Examinadora composta pelos professores abaixo, que apósdeliberação, consideraram o trabalho aprovado.

Banca Examinadora: Prof. Alan Ricardo Witikoski (Dr.)DADIN – UTFPR

Profa. Daniela F. F. Da Silva (MSc.)Professora Responsável pela Disciplina TDDADIN – UTFPR

Profa. Lindsay Gemima Cresto (MSc.)OrientadoraDADIN – UTFPR

“A Folha de Aprovação assinada encontra-se na Coordenação do Curso”.

UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁPR

Ministério da EducaçãoUniversidade Tecnológica Federal do ParanáCâmpus CuritibaDiretoria de Graduação e Educação ProfissionalDepartamento Acadêmico de Desenho Industrial

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RESUMO

Este trabalho tem o objetivo de entender e analisar os cartazes de divulgação doFestival de cinema de Cannes e também sua importância para o cinema e comoobra de design. O trabalho foi elaborado em três etapas, na qual a primeira é expos-ta a história do festival de Cannes; na segunda procurou-se entender a mídia cartazcomo um todo e como foi usada pelo cinema; e na terceira etapa foram feitas asanálises de imagem dos cartazes do Festival de Cannes das décadas de 1970 a1979. A análise de imagem foi feita a partir do método semiótico da autora MartineJoly, elaborando-se uma tabela, e a partir desta elaborou-se sínteses que foram usa-das nos textos do estudo. O trabalho demonstrou como os cartazes de divulgaçãousam certas estratégias de design, e também como esses cartazes conversam comoutros cartazes de sua época.

Palavras-chave: Festival de Cannes. Cinema. Design. Cartazes.

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ABSTRACT

This work aims to understand and analyze the posters of the Cannes Film Festivaland its importance for the cinema and as a design work. The work was elaborated inthree stages, in the first one is exposed the history of Cannes Festival; in the secondit was tried to understand the media poster as a whole and how it was used by thecinema; and in the third stage the image analysis of the posters of Cannes Festivalfrom the decades of 1970 to 1979 were made. The image analysis was made fromthe semiotic method of the author Martine Joly, elaborating a table, and from this,was elaborated syntheses that were used in the study texts. The work showed howthe publicity posters use certain design strategies, and also how these posters talk toother posters of their day.

Keywords: Cannes Film Festival. Cinema. Design. Posters.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Palácio dos Festivais em 1952...................................................................14

Figura 2 - Palácio dos Festivais em 2014...................................................................14

Figura 3 - Cartaz La Loie Fuller de Jules Cheret, 1897..............................................18

Figura 4 - Cartaz de divulgação da estreia do cinematógrafo, 1895..........................20

Figura 5 - Cartaz de divulgação de Cinématographe Lumière, 1896.........................20

Figura 6 - Cartaz de Arrivée d’un Train, 1896.............................................................21

Figura 7 - Cartaz de A La Conquéte du Pôle, 1912....................................................22

Figura 8 - Cartaz de Das Cabinet Des Dr. Caligari, 1919...........................................24

Figura 9 - Attack of the 50 Foot Woman de 1958.......................................................25

Figura 10 - Vertigo de 1958.........................................................................................25

Figura 11 - Superfly de 1972.......................................................................................25

Figura 12 - Miami Film Festival 2018..........................................................................30

Figura 13 - Miami Film Festival 1985..........................................................................30

Figura 14 - Cartaz do Festival de Cannes 1970.........................................................32

Figura 15 - Album Pet Sounds dos The Beach Boys..................................................33

Figura 16 - Cartaz do Festival de Cannes 1971.........................................................34

Figura 17 - Dawn of the Dead (1978)..........................................................................35

Figura 18 - Investigation of a Citizen Above Suspicion (1970)...................................35

Figura 19 - Star Wars (1977).......................................................................................35

Figura 20 - Bandeira de Provença-Alpes-Costa Azul.................................................36

Figura 21 - Cartaz do Festival de Cannes 1973.........................................................37

Figura 22 - Investigation of a Citizen Above Suspicion (1970)...................................38

Figura 23 - Badlands (1973)........................................................................................38

Figura 24 - Jaws (1975)..............................................................................................38

Figura 25 - Cartaz do Festival de Cannes 1972.........................................................39

Figura 26 - All the President's Men 1976....................................................................40

Figura 27 - The China Syndrome 1979.......................................................................40

Figura 28 - Festival de Berlim de 1965.......................................................................41

Figura 29 - Cartaz do Festival de Cannes de 1975....................................................42

Figura 30 - Festival de Berlim (1983)..........................................................................43

Figura 31 - Festival internacional de cinema de Gijón (2016)....................................43

Figura 32 - Sundance film festival (1995)...................................................................43

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Figura 33 - Cartaz do Festival de Cannes de 1978....................................................44

Figura 34 - Festival de cinema de Berlim (1978)........................................................45

Figura 35 - Festival de cinema de Veneza de 1932....................................................45

Figura 36 - Festival de cinema de Veneza (1949)......................................................45

Figura 37 - Cartaz do Festival de Cannes de 1974....................................................47

Figura 38 - M.A.S.H. (1970)........................................................................................48

Figura 39 - The Discreet Charm of the Bourgeoisie (1974)........................................48

Figura 40 - Nashville (1976)........................................................................................48

Figura 41 - Disco Loose Ends, Jimi Hendrix, 1974.....................................................49

Figura 42 - Cartaz do Festival de Cannes de 1976....................................................50

Figura 43 - Cartaz do filme Chinatown (1978)............................................................52

Figura 44 - Cartaz do Festival de Cannes de 1977....................................................53

Figura 45 - Cartaz do Festival de Cannes de 1979....................................................54

Figura 46 - Obra de Jean-Michel Folon I, 1987..........................................................56

Figura 47 - Obras de Jean-Michel Folon II, 1987.......................................................56

Figura 48 - Cartaz do filme Uma Viagem para a Luz (1978)......................................56

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Ficha de análise........................................................................................27

Quadro 2 - Cartazes de Cannes, recorte da década de 1970....................................28

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...........................................................................................................82 O FESTIVAL DE CANNES......................................................................................102.1 A PALMA DE OURO..............................................................................................122.2 OUTROS EVENTOS.............................................................................................132.3 OS CARTAZES......................................................................................................13

3 HISTÓRIA DOS CARTAZES...................................................................................163.1 CARTAZES DE CINEMA.......................................................................................18

4 ANÁLISE DOS CARTAZES.....................................................................................264.1 INFORMAÇÕES COMUM AOS CARTAZES........................................................294.2 CARTAZES TIPOGRÁFICOS...............................................................................31

4.2.1 Análise do cartaz de 1970..................................................................................31

4.2.2 Análise do cartaz de 1971..................................................................................33

4.2.3 Análise do cartaz de 1973..................................................................................36

4.3 REFERÊNCIA AO CINEMA..................................................................................38

4.3.1 Análise do cartaz de 1972.................................................................................39

4.3.2 Análise do cartaz de 1975..................................................................................41

4.3.3 Análise do cartaz de 1978..................................................................................44

4.4 SURREALISMO....................................................................................................46

4.4.1 Análise do cartaz de 1974..................................................................................46

4.4.2 Análise do cartaz de 1976..................................................................................49

4.4.3 Análise do cartaz de 1977..................................................................................52

4.4.4 Análise do cartaz de 1979..................................................................................54

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................57REFERÊNCIAS...........................................................................................................59APÊNDICE A — TABELA DE ANÁLISE CARTAZ DE 1974.....................................64

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1 INTRODUÇÃO

Quando vamos a uma sala de cinema nos deparamos com uma sucessão de

cartazes nas paredes, ou em cavaletes, em outdoors, de filmes em exibição ou dos

que estão por vir, as estreias. Faz parte da identidade das salas de cinema, uma

mancha gráfica vista de longe, cobrindo as paredes e corredores do local e que, ao

nos aproximarmos, revela a particularidade de cada filme. Enquanto a sucessão de

imagens de uma obra cinematográfica nos situa no momento presente da trama, o

cartaz vem antes para nos fazer prever, para anteciparmos o que nos espera na sala

de cinema.

Mas o lugar dos cartazes não é apenas nas salas de projeção comuns. Os

eventos que celebram o cinema, as grandes premiações e festivais também são pal-

co para essas peças gráficas, de fato, em alguns casos, é o primeiro momento de

exibição delas. Isso acontece principalmente em festivais, onde os filmes têm suas

primeiras sessões e são apresentados a crítica e aos produtores de cinema.

Nesses eventos, em meio aos cartazes dos filmes, existe o próprio cartaz do

festival. Ano a ano, os eventos que celebram o cinema também divulgam um ou

mais cartazes, e a ideia deste trabalho é analisar o papel dos cartazes na divulgação

do festival, como se relacionam com o cinema, com cartazes de filmes, e como cele-

bram o cinema e o próprio festival.

Para isso o evento escolhido foi O Festival de Cannes. Os critérios usados

para a escolha foram: a sua importância para o cinema, sua história e abertura a te-

mas políticos e sociais, tentando refletir e estar de acordo com as vanguardas de

sua época; a sua longevidade, com mais de 70 edições, que reforça sua importância

histórica, mas também amplia a quantidade de cartazes passiveis de análise, o que

nos leva ao terceiro critério: a diversidade de elementos artísticos e de design.

O objetivo foi analisar os cartazes do Festival de Cannes para compreender o

papel do festival e a importância do cartaz na sua divulgação. A partir do recorte es-

tabelecido, que abrange a década de 1970, foi possível fazer os seguintes questio-

namentos: Houve mudanças no festival e como as mudanças refletiram na divulga-

ção e na identidade do festival? Esses cartazes tentavam inovar, dialogavam com a

arte, o design, e o cinema da época? Havia semelhança com os cartazes dos filmes

deste período?

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Dada a importância do Festival de Cannes para o cinema, e também sua rele-

vância em momentos de clamor político e de transformação social, é possível perce-

ber, na visão deste graduando, que os cartazes de divulgação do evento podem re-

fletir esse prestígio. A partir disto, talvez seja possível entender como o design gráfi-

co está presente nos cartazes, como influencia ou está sendo influenciado pelo perí-

odo artístico, pelos movimentos de design e pelo cinema.

Há uma variedade de elementos visuais, de cores, texturas, linhas e formas,

tipografia, entre outros, que estabelecem a noção de que os cartazes dialogam com

o design de uma determinada época. Entender o papel do cartaz como mídia, como

divulgação do evento é também compreender sua importância para o design gráfico.

O projeto de trabalho de diplomação teve como base, em seu primeiro capítu-

lo, a história do Festival de Cannes, tomando como referência o site onde encon-

tram-se os arquivos oficiais do festival. Desta forma, possibilitando localizar histori-

camente os objetos de análise, os cartazes. No capítulo seguinte foi realizado um

panorama da história dos cartazes e sua utilização no começo da indústria, e quan-

do e como os cartazes de cinema surgem, para que finalmente pudesse se chegar

na análise dos cartazes no último capítulo.

Foram analisados 10 cartazes, sendo versões únicas para cada ano, come-

çando em 1970 até o cartaz do ano de 1979. As questões políticas e sociais nas

quais estão inseridas, bem como sua variedade artística e visual foram os motivos

da delimitação do período. Para a análise de imagem, foi usado como base, o méto-

do semiótico da autora Martine Joly, (2005), do livro Introdução à Análise de Ima-

gem, e com este, elaborou-se um roteiro com os seguintes tópicos: Análise do regis-

tro visual (Signos plásticos; Signos icônicos); Análise do registro verbal (Signos lin-

guísticos); Síntese (Relação entre os registros visuais e registros verbais). E a partir

desse roteiro foi criada uma tabela de análise, no qual foram feitas as análises indivi -

duais de cada cartaz, um exemplo pode sere visto no apêndice A. Outros autores fo-

ram usados para auxiliar a análise, como Donis A. Dondis (1997), na análise do re-

gistro visual e Ellen Lupton (2013) para entender a tipografias na análise do registro

verbal, entre outros.

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2 O FESTIVAL DE CANNES

O cinema foi criado no final do século XIX pelos irmãos Lumière e durante o

século XX teve seu alvorecer. Logo tornou-se uma forma de arte e entretenimento

muito popular, e assim como as grandes exposições e bienais divulgavam e celebra-

vam a vanguarda do que se fazia em arte, os festivais de cinema também vieram

para mostrar o que se tinha de mais interessante e novo no cinema. Os festivais são

a reunião de diretores, atores e atrizes consagrados, mas também o local onde no-

vos artistas podem surgir. Além das exibições foram adicionadas premiações em

muitos festivais, tornando-se, também, cerimônias competitivas. Ao longo dos anos a

indústria cinematográfica se aglutinou em torno desses eventos por ser um local de

visibilidade para grandes e pequenas produções e portanto um bom local para se fa-

zer negócios.

Foi como parte da 18ª Bienal de Veneza, em 1932, que ocorreu a primeira ex-

posição internacional de cinema, o Festival de cinema de Veneza. A exposição in-

cluiu 29 filmes, dentre estes, alguns que viriam a se tornar clássicos do cinema,

como Grande Hotel de Edmund Goulding e Frankenstein de James Whale. Em

1934, na segunda edição, foi incluída a primeira premiação, Coppa Mussolini, na

qual concorriam 19 países. Já em 1935, com seu sucesso internacional, o festival

passou a ser anual, e a despeito de algumas interrupções, tal como durante a Se-

gunda guerra mundial, o Festival de Veneza continuou uma das mais prestigiadas

celebrações de cinema.

Outros Festivais internacionais de cinema foram criados ao redor do mundo,

após Veneza. Berlinale, o festival de Berlim criado em 1951 é um dos maiores, exi-

bindo cerca de 400 filmes de vários gêneros, anualmente. O Festival de Sundance,

nos EUA, fundado em 1978, é focado em filmes independentes e novos diretores.

Aqui no Brasil temos a Mostra internacional de cinema de São Paulo, de 1977, que

exibe mais de 300 filmes, e também há o Festival do Rio, inciado em 1999. Além dos

citados, um dos mais importantes e antigos é festival estudado neste trabalho.

A história do Festival de Cannes começa no ano de 1938, durante a mostra

de um outro evento, o Festival internacional de cinema de Veneza. Naquele ano pré-

guerra, os favoritos foram superados pela pressão política, dando aos filmes da pro-

paganda nazista Olympia, e o filme italiano Luciano Serra, Piloto (THE HISTORY,

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2018), os prêmios principais. Os participantes protestaram resultando na saída dos

EUA, Grã-Bretanha e França do festival.

Em resposta à Mostra de Veneza autoridades francesas resolvem criar o Fes-

tival internacional de cinema de Cannes, que teria o diferencial de ser aberto a todos

os países, que escolheriam seus filmes participantes e teriam jurados represen-

tando-os. A realização aconteceria em setembro de 1939, porém, neste mesmo mês,

a França entrou em guerra com a Alemanha, cancelando o festival. Durante a Se-

gunda guerra mundial, autoridades de Cannes tentaram manter o festival vivo, mas

apenas com o fim da guerra o projeto pode continuar, em 1946.

É importante notar deste começo o caráter político no qual Cannes debutou,

houve a escolha de colocar em suas diretrizes a liberdade de participação dos paí-

ses, e justiça na premiação. Posteriormente, quando a necessidade de se manter

em par com o seu tempo se mostrou inevitável, os organizadores não hesitaram em

mudar, como é possível ver a seguir.

O 21º Festival de Cannes foi uma edição marcante que aconteceu sob um cli-

ma de mudança, de acordo com os acontecimentos daquele mês. Em maio de 1968

a França viveu uma onda de protestos iniciada por estudantes franceses da Univer-

sidade de Nanterre, os protestos extrapolaram para vários temas e mobilizaram vári-

os setores. Não foi diferente com o festival, que tomou rapidamente um caráter polí-

tico e virou um centro de reuniões e protestos. Membros do júri renunciaram, direto-

res retiraram seus filmes da competição e o festival foi interrompido após alguns di-

retores, entre eles, François Truffaut e Jean-Luc Godard, impediram a exibição do fil -

me Peppermint frappé de Carlos Saura (THE HISTORY, 2018). Como consequência

dos eventos de 1968, foi criado em 1969 o Directors’ Fortnight (THE HISTORY,

2018), um evento paralelo e independente a Cannes de filmes, curtas e documentá-

rios do mundo inteiro.

Depois dos acontecimentos de 1968, os organizadores entenderam que havia

a necessidade de dar uma reposta modernizando e mantendo o festival em conso-

nância com as ideias da época. Já em 1969, a seleção dos filmes foi baseada em to-

tal liberdade criativa dos filmes, o que acarretou na escolha de filmes com temática

revolucionária, como If de Lindsay Anderson (THE HISTORY, 2018), mantendo-se de

acordo com o clima da época e dos protestos do ano anterior.

Uma mudança importante em prol de uma maior independência do festival

aconteceu durante a década de 70. Em 1972, o festival passou a ter autonomia na

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decisão de quais filmes seriam selecionados. Deixando o modelo anterior no qual a

indicação era feito pelos países dos filmes. No ano seguinte o novo delegado-geral,

Maurice Bessy abrangeu a seleção a novas categorias de filmes. E em anos posteri-

ores outras novas seções foram criadas, como a L'Air du temps (THE HISTORY,

2018), com filmes baseados em temas atuais.

Em 1975, uma bomba abalou as estruturas do principal salão de exibição do

festival, antes do dia de estreia. No ano seguinte um novo dispositivo explosivo foi

descoberto e recolhido pela policia francesa. Ano este que Taxi Driver, de Martin

Scorcese, foi aclamado como o vencedor do prêmio principal. O filme recebeu

aplausos e vaias. O contínuo aumento da violência no final, e o flerte com o terroris-

mo por parte do personagem, acabou por dividir a plateia e crítica, abalados pelos

clima das tentativas de atentado do anterior. A discussão sobre violência permane-

ceu, mas o apelo estético de Taxi Driver venceu as críticas.

Discussões e polêmicas fazem parte da história do Festival de Cannes até os

anos mais recentes. Por exemplo, em 2013, o filme de Abdellatif Kechiche, Azul é a

cor mais quente ganhou o prêmio principal. Porém, nesta ocasião, o júri liderado por

Steven Spielberg reconheceu as atrizes principais, Léa Seydoux e Adèle Exarcho-

poulos como merecedoras do prêmio, juntamente ao diretor. A atitude do júri foi em

solidariedade as desavenças ocorridas entre as atrizes e o diretor.

2.1 A PALMA DE OURO

A folha de palmeira dourada é parte importante da identidade do festival, é

seu símbolo, sua marca. Ela vem do seu prêmio principal a Palm d’Oro (Palma de

Ouro). O troféu foi criado em 1954, pelo joalheiro Lucienne Lazon (THE HISTORY,

2018), que após uma competição consagrou-se como o designer vencedor. A ideia

era homenagear o brasão de armas da cidade de Cannes, com uma base lapidada

em forma de coração e a folha de palmeira dourada por cima.

Anteriormente, de 1946 a 1954, o prêmio principal do festival era o Grand

Prix, foi substituído pela Palma de ouro em 1955, de 1964 a 1974, voltou a ser o

Grand Prix, mas a partir de então a Palma volta a ser o principal prêmio, desta vez,

definitivamente. Virando, então, o principal símbolo do festival, e também compondo

sua marca.

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2.2 OUTROS EVENTOS

Cannes é importante não só pelo prestígio da mostra, mas também para in-

dústria. Durante os dias de festival, para incentivar a indústria cinematográfica, acon-

tece, de forma paralela, o Marché du Film (Mercado dos filmes). O mercado reúne

cerca de 12000 participantes de vários países que tem a oportunidade de conhecer

por volta de 1400 filmes e projetos (THE HISTORY, 2018).

Outra mostra que acontece paralelamente ao festival é a Semaine de la

Critique (Semana da Crítica). O objetivo é dar a oportunidade para que novos talen-

tos exibam seus primeiros filmes.

2.3 OS CARTAZES

Os cartazes são a principal peça de divulgação da cerimônia. Desde 1946,

cada ano, descontadas suas eventuais pausas, é confeccionado um cartaz com sua

arte e diagramação feitas por artistas e designers como: Jouineau Bourduge (cartaz

de 1973), George Lacroix (1974), W. SIUDMAK (1975, 76,77) (ALL CANNES, 2018).

Em alguns anos, agências de design e publicidade detém a autoria, como o cartaz

de 1985 da The Agency Information and Strategy in recognition E. Muybridge, e o

cartaz de 1997 da The agency DDB Arts (ALL CANNES, 2018). Até mesmo ilustra-

ções de diretores de cinema foram usados para divulgar a amostra, como no ano de

1994 com uma ilustração de Frederico Fellini, e em 1983 com um trabalho de Akira

Kurosawa.

O primeiro festival aconteceu no pós-guerra, em 1946, em um cassino antigo

de Cannes. E em eventos subsequentes o local muda para o Palais des Festivals

(Palácio dos Festivais) (Figura 1), que em 1982 foi substituído por uma nova versão

(Figura 2).

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Figura 1 - Palácio dos Festivais em 1952

Fonte: THE HISTORY, 2018

Figura 2 - Palácio dos Festivais em 2014.

Fonte: RAPOLD, 2018

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A faixada do Palácio dos Festivais serve de painel para o cartaz do evento,

dando grande destaque a peça gráfica, como pode ser visto na figura 1 e figura 2.

Além disso a cidade de Cannes fica decorada com o cartaz do festival, bem como

cartazes e banners de filmes e outras peças com a identidade visual do festival.

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3 HISTÓRIA DOS CARTAZES

Como e em que contexto o cartaz surgiu como mídia de divulgação. Essa his-

tória começa na revolução industrial do século XIX, quando o aumento na produção

de bens de consumo mudou o modo como a sociedade funcionava.

Durante a revolução industrial, a mecanização ajudou a aumentar a produtivi-

dade e a criar mais produtos, que se popularizaram e atenderam uma gama maior

de indivíduos. Mais pessoas foram pras cidades, tanto pra trabalharem quanto para

consumirem, e com mais pessoas trabalhando nas fábricas aumentou-se a necessi-

dade de serviços nas cidades, levando mais gente pra esses novos centros da vida

moderna. O que aconteceu foi uma revolução cultural, que acarretou em todo um

novo modo de se viver nos centros urbanos. Haviam novas necessidades, novos

hábitos, como a prática do lazer, de se divertir e aproveitar a cidade. Desta forma,

surgiram museus, teatros, parques e novos locais pra fazer compras, as lojas de de-

partamentos.

Com tantas pessoas e coisas acontecendo nas cidades, é possível imaginar

que havia muita informação que precisava ser comunicada para que o convívio pu-

desse se tornar praticável. Afinal, você precisava descobrir onde era o museu, ou o

qual era a utilidade daquele produto na loja. Era preciso duas coisas inicialmente:

Que a informação pudesse ser produzida e circular em maior quantidade, e que

mais pessoas soubessem ler. E foi o que aconteceu.

Ocorreram avanços tecnológicos relacionados a impressão que permitiram o

aumento da produtividade, como inovações técnicas na fabricação do papel,

usando-se a polpa da madeira (CARDOSO, 2000), e a mecanização da impressão.

A consequência dessa maior produtividade é a maior circulação de jornais, livros, re-

vistas, embalagens e, é claro, cartazes, que por sua vez aumentam a quantidade de

leitores nas cidades.

Este é contexto que o cartaz surge. Ele vem atender as necessidades de di-

vulgação que os novos hábitos de lazer e consumo trazem e o que permitiu isso foi a

expansão tecnológica na área da impressão. O que veio melhorar a produção dos

cartazes foram as novas formas de impressão, como a litografia, antes, os cartazes

eram impressos por tipografia, em tinta preta e as ilustrações eram feitas por xilogra-

vura (HOLLIS, 2000). Já na litografia, era possível imprimir em muitas cores – as ar-

tes eram transferidas à mão para a superfície das pedras litográficas, sendo que

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cada pedra era pintada com apenas uma cor (HOLLIS, 2000), e a impressão final

era o conjunto das várias pedras, com várias cores. A litografia também permitiu que

os designers tivessem maior controle da parte textual, pois podiam desenhar suas

próprias letras, ao contrário de antes que estavam limitados a um certo número de ti -

pos já prontos (HOLLIS, 2000).

A produção litográfica com muitas cores não era compatível com a necessida-

de de se produzir em larga escala. Foi Jules Chéret que estudou e desenvolveu sis-

temas que produziam ilustrações e a parte escrita usando de três a quatro cores

(HOLLIS, 2000) como em seu famoso cartaz La Loie Fuller (Figura 3). Muitos artis-

tas seguiram o estilo de Chéret, sendo Henri de Toulouse-Lautrec um dos mais fa-

mosos.

Os cartazes criados durante o século XIX atendiam a demanda publicitária

dos produtos das lojas de departamentos, das peças de teatro, circos, entre outras

coisas, e eram fixados por toda a cidade, em paredes, nas linhas de bondes, trens,

estradas. A demanda dessas peças impressas aumenta ainda mais durante o século

XX, acompanhando o crescimento econômico e populacional das cidades. E é du-

rante o começo do século XX que o cinema tem sua ascensão como forma de entre-

tenimento.

O interessante de se notar aqui, na indústria do entretenimento, é que

o que era vendido não era apenas o espetáculo, mas sim o que ele represen -

tava: o sonho, a aventura, o romance (CARDOSO, 2000), e com isso eram

possível se vender um modo de viver, que incluía certa roupa ou acessório do

artista de cinema. A partir daí o cartaz, e o designer gráfico, ganham uma im -

portância a mais: divulga-se e vende-se o filme, mas também uma gama de

produtos relacionados a essa experiência.

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3.1 CARTAZES DE CINEMA

Para podermos entender qual é a história dos cartazes de cinema, precisa-

mos entender um pouco de como foi o começo do cinema, desta forma vai ser pos-

sível alinhar os avanços técnicos e estéticos do cinema, com os dos cartazes. En-

tenderemos qual foi o papel do cartaz de cinema ao longo da história.

Segundo Flávia Cesarino Costa no artigo “Primeiro Cinema” é possível orga-

nizar o início do cinema da seguinte forma:

O período do primeiro cinema pode ser dividido em duas fases. A primeiracorresponde ao domínio do “cinema de atrações” e vai dos primórdios, em1894, até 1906-1907, quando se inicia a expansão dos nickelodeons e o au-mento da demanda por filmes de ficção. A segunda vai de 1906 até 1913-1915 e é o que se chama de “período de transição”, quando os filmes pas-sam gradualmente a se estruturar como um quebra-cabeça narrativo, que oespectador tem de montar baseado em convenções exclusivamente cine-matográficas. É o período em que a atividade se organiza em moldes indus-triais. Há interseções e sobreposições entre o cinema de atrações e o perío-do de transição, uma vez que as transformações então ocorridas não eramhomogêneas nem abruptas. (MASCARELLO, p. 25)

Figura 3 - Cartaz La Loie Fuller de JulesCheret, 1897

Fonte: BIOGRAPHY, 2019

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Em consonância com o que já foi referenciado nesse capítulo, de que, a ex-

pansão das grandes cidades durante o século XIX determinaram também uma ex-

pansão na busca por entretenimento público (circos, teatros, exposições, etc), o ci-

nema também viria se tornar mais uma destas formas. Na primeira fase do “cinema

de atrações” o principal local onde eram exibidos os filmes, em Paris principalmente,

eram os cafés. Os cafés concentravam uma gama de possibilidades de entreteni-

mento, além do típico beber, comer, ler jornais e livros, era possível assistir apresen-

tações artísticas e musicais. O equivalente americano eram os vaudeviles, que eram

apresentações teatrais dos mais diversos tipos: De peças e apresentações circen-

ses, a palestras e declamações de poesias.

Em 28 de dezembro de 1895, no Salon Indien du Grand Café 1, em Paris,

ocorreu a primeira apresentação pública de cinema, feita pelos criadores do cinema-

tógrafo, os irmãos Auguste e Louis Lumière, que, apesar de não terem sido os pri -

meiros a inventarem um mecanismo de reprodução de imagens em movimento, fo-

ram os que ficaram mais famosos, e dominaram o mercado nesse primeiro período,

isso porque, a máquina era leve e funcional, usava filmes de 35mm e captava as

imagens em 16 quadros por segundo – um padrão nas primeiras décadas (MASCA-

RELLO, 2006).

Os irmãos Lumière costumavam fazer filmes de caráter documental, feito em

plano único, com cenas cotidianas e de atualidades, essas também eram as caracte-

rísticas que influenciaram os primeiros anos do “cinema de atrações”. Também teria

sido com filmes assim que os irmãos fizeram sua primeira apresentação no Grand

Café em Paris.

A apresentação de dez filmes curtas num salão do Grand Café, que ficava no

Boulevard des Capucines, bairro de Paris, foi divulgado por um cartaz tipográfico

que convidava os espectadores a conhecer o invento do Cinématographe Lumière, e

também listava as atrações a serem exibidas (Figura 4). Nessa época os cartazes ti-

pográficos dominavam a divulgação de eventos da época. Desta mostra, o curta de

apenas 49 segundos, L'arroseur arrosé, ficou mais famoso por ser tido como a pri-

meira obra de ficção, seu cartaz mostra uma plateia de homens, mulheres e crianças

assistindo a cena de L'arroseur arrosé (Figura 5), que também está retratada na ima-

gem: Um jardineiro sendo atormentado por um menino.

1 Salon Indien du Grand Café foi um salão que ficava no estabelecimento Grande Café, no centrode Paris. (Salon Indien du Grand Café)

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Figura 4 - Cartaz de divulgação da estreia docinematógrafo, 1895

Fonte: LA PREMIÈRE, 2019

Figura 5 - Cartaz de divulgação de Cinématographe Lumière, 1896

Fonte: ARROSEUR, 2019

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O interessante de se notar aqui quanto ao cartaz de L'arroseur arrosé é a de

entender a sua diferença entre os outros cartazes litográficos, como os de Jules

Cheret. Inclusive, Cheret teria enviado aos Lumière um projeto de cartaz para a

inauguração do cinematógrafo, mas foi recusado (GUTIERREZ, 1995).

Veja no cartaz que representa a dançarina americana Loie Fuller, pro cabaré

Foliè Bergerè (Figura 3). A ilustração esbanja sensualidade e movimento como era a

dança de Loie. Cheret está preocupado em atrair o público ao espetáculo com a su-

gestão destas qualidades no cartaz. Por sua vez, o cartaz de Cinématographe Lu-

mière, procura atrair o público mostrando a experiência pelo qual as pessoas passa-

ram ao assistir esse novo espetáculo, era preciso ser divulgado o que seria encon-

trado no porão do Grand Café.

No cartaz feito por H. Brispot para o filme Arrivée d’un Train de 1896 (Figura

6), mais uma vez o público vê a si próprio no cartaz, representado por homens, mu-

lheres, crianças, um policial e até uma figura religiosa, na fila para entrar no Grand

Café de Paris. A ideia na qual o espectador identifica-se no cartaz reflete a preocu-

pação dos irmãos Lumière e de outros empresários do cinema em manter certos pa-

râmetros morais para esse tipo de espetáculo, desta forma distanciando-se dos car-

tazes de cabaré.

Figura 6 - Cartaz de Arrivée d’un Train, 1896

Fonte: LA PREMIÈRE, 2019

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No final da primeira fase do cinema, o cinema de atrações, os filmes passam

de serem predominantemente documentais e de plano único, e passam para filmes

ficcionais que começam a ter mais planos. Um dos principais nomes dessa fase é

Georges Méliès com seus filmes imaginativos, surreais e fantásticos. No filme La

conquête du pôle (Figura 7), um grupo de expedicionários viajam em uma aventura

até o polo norte. O cartaz, assinado pelo brasileiro Cândido Aragonèse Faria, mostra

uma cena fantástica com carros voadores, balões e dirigíveis. Nota-se aqui que o

cartaz de Aragonèse já mostra certa liberdade imaginativa que vai de encontro com

as qualidades dos filmes de Meliès. Porém, ainda está enquadrado nas regras da

então jovem indústria cinematográfica, ainda presa a poucos empresários como Lu-

mière e a Companhia Pathé que criavam certas regras e padronizavam os cartazes.

Ao contrário dos cartazes de teatro, exposições que estavam em sintonia com

o movimentos de arte da época, os cartazes de cinema acabavam fechados no seu

próprio universo, e manteve-se assim pelo menos até que se chegasse no segundo

período do cinema.

Figura 7 - Cartaz de A La Conquéte du Pôle, 1912

Fonte: ARCHIVE, 2019

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A disponibilidade de filmes aumenta quando surge a figura do distribuidor, em

1905, que compram os filmes e alugam para os exibidores. Isso ajudou a diminuir os

custos para o exibidor o que levou a um barateamento no ingresso. Surgem então

os nickelodeons, os “teatros de um nickel”, eram salas de cinema pequenas e pelo

baixo custo da entrada atraíam principalmente as classes mais pobres, o que rendeu

ao cinema o apelido de “teatro de operários”.

A indústria continua mudando rápido durante os anos seguintes, há uma nova

visão que quer incluir a classe média, mudando a visão do “teatro dos operários”

para um entretenimento de “todas as classes sociais” (MASCARELLO, 2006). Os fil-

mes passam a ser exibidos em novos locais, maiores e com mais requinte, há mu-

danças também na tecnologia dos rolos de filme que passam a permitir longa-metra-

gem e a própria linguagem do cinema muda, criando algo próprio, uma linha narrati-

va dentro de uma sucessão de cortes entre planos. Este é o segundo período do ci-

nema, o período da transição.

Talvez agora, com o amadurecimento da linguagem, com o crescimento do

mercado, com grandes produtoras e também produtores independentes, o cinema

possa se atentar ao que se passa nos outros meios artístico.

Em 1919, o filme de Robert Wiene, Des Cabinet des Dr. Caligari foi um marco

no expressionismo alemão. As histórias do expressionismo traziam temas de questi-

onamento existencial, insanidade, traição e os cenários, as maquiagens refletiam

essa temática com jogos de luzes e sombras, formas retorcidas, tudo contribuía para

o clima que o expressionismo queria passar. O cartaz de Otto Stahl-Arpke (Figura 8)

embarca na cenografia de Wiene e reproduz a cena de Dr. Caligari, criando uma

ilustração desforme que conversa diretamente com o filme se distanciando somente

na cor, impossível nos filmes preto e branco.

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Ao passar dos anos a diversificação e o crescimento da indústria nos presen-

tearam também com uma maior variedades de cartazes. É possível ver nos cartazes

de Vertigo e Attack of the 50 Foot Woman (Figura 9 e Figura 10), ambos de 1958,

um pouco dessa diversificação. Enquanto em Attack of the 50 Foot Woman mostra

logo no cartaz o que se deve esperar do filme, em Vertigo, o designer gráfico Saul

Bass, cria formas mais simples que tentam nos contar a essência da história de for-

ma mais indireta. Além disso, a estética de Bass transpõe o cartaz e se torna a intro-

dução do filme com uma sequência de tipografia animada, uma das mais icônicas da

história do cinema. O estabelecimento da indústria tornou atores e atrizes, bem

como diretores, famosos, o que criou a necessidade de se ter o nome, ou mesmo a

imagem desses artistas destacados no cartaz.

Como foi possível ver, os cartazes de cinema tiveram uma trajetória que pas-

sou de cartazes tipográficos que divulgavam e resumiam a apresentação de forma

textual, e passou a ganhar um papel maior na divulgação dos filmes ganhando seu

valor estético junto as vanguardas artísticas de sua época, como em SuperFly de

1972 (Figura 11) com sua tipografia psicodélica. Os cartazes se diversificam e se tor-

nam tão plurais quanto a variedade de filmes e gêneros, atendendo as necessidades

Figura 8 - Cartaz de Das Cabinet Des Dr. Caligari, 1919

Fonte: GERMAN, 2019

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de cada obra cinematográfica, se tornando com a passagem dos anos, parte funda-

mental da vivência do cinema, indispensável nas salas de divulgação exibição.

Figura 9 - Attack of the 50 FootWoman de 1958

Fonte: ATTACK, 2019

Figura 10 - Vertigo de 1958

Fonte: VERTIGO, 2019

Figura 11 - Superfly de 1972

Fonte: SUPERFLY, 2019

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4 ANÁLISE DOS CARTAZES

Para a análise de imagem dos cartazes, decidiu-se usar o método semiótico

de Matine Joly (2005), do seu livro “Introdução a análise da imagem”. O método de

Joly sugere que façamos uma divisão da análise em três momentos: Análise do re-

gistro visual, análise do registro verbal e síntese. A sugestão é que se comece pela

análise do registro visual, que tem duas partes: A análise dos signos plásticos que

contém o aspecto físico, formal da imagem; e a análise dos signos icônicos que tem

o aspecto figurativo. Em um segundo momento é feita a análise do registro verbal,

onde são analisados os signos linguísticos, onde tenta-se compreender os aspectos

plásticos do texto bem como seu conteúdo.

As análises do registro visual e verbal tem dois momentos. O primeiro é a

fase de denotação, onde o observador tenta entender e descrever a imagem ou o

texto da forma que é, de um jeito mais formal. A segunda parte é a conotação, mo-

mento no qual tenta se entender os significados dos signos descritos na fase de de-

notação.

Por último é feita a síntese. É nesse momento que descreve-se uma análise

conjunta dos signos plásticos, icônicos e linguísticos e tenta-se criar um significado

conjunto, ou geral para a imagem em questão.

Precisou-se então escolher quais signos plásticos seriam interessantes para

uma análise de um cartaz de divulgação de um festival de cinema, os signos escolhi-

dos foram: Linhas e formas, Enquadramento, equilíbrio, cor e textura3. E para os sig-

nos linguísticos: Fontes e famílias4. Foi elaborado então uma tabela elencando os

signos e com espaço para descrever a análise denotativa e conotativa (Quadro 1):

3 O entendimento dos signos plásticos usados foram retirados de alguns autores, são eles: DON-DIS,1997; ARNHEIM, 2005; LUPTON, 2014.

4 A referência usada foi Pensar com tipos (LUPTON, 2013) e os sites What the font (WHAT, 2019)e Fonts (ITC, 2018) ajudaram a identificar e saber mais sobre as fontes.

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Quadro 1 - Ficha de análise

Fonte: Autoria própria

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O objeto desse trabalho sendo os cartazes do Festival de Cinema de Cannes, e

por este ter um tempo de vida muito longe, foi necessário fazer um recorte temporal. Defi-

niu-se, portanto, o período da década de 1970, pelas questões políticas e sociais nas

quais estão inseridas, bem como sua variedade artística e visual. Foram analisados 10

cartazes, sendo versões únicas para cada ano, começando em 1970 até o cartaz do ano

de 1979.

Para tentar compreender como os cartazes e seus elementos se relacionam

foram criadas categorias para que se desse destaque a certos pontos. Durante a

análise foi possível perceber quais signos se repetiam, que temas eram recorrentes

e portanto foi possível organizá-los da seguinte forma: Informações comuns aos car-

tazes, cartazes tipográficos, referência ao cinema e surrealismo.

Quadro 2 - Cartazes de Cannes, recorte da década de 1970

Fonte: Autoria própria

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4.1 INFORMAÇÕES COMUM AOS CARTAZES

Conforme a análise foi se desenvolvendo, certas perguntas e associações fo-

ram surgindo de elementos que antes não estavam claros o porquê. Quando se ana-

lisa os signos que compõem o cartaz, somos forçados a fazer certas perguntas que

por sua vez nos levam a certas repostas, e o mais interessante foi perceber como al-

gumas dessas respostas se repetiram, criando um padrão, uma necessidade de co-

municar certas informações.

Os cartazes de um festival de cinema são uma peça de divulgação, uma peça

publicitária, que portanto necessitam informar o seu leitor. A análise dos signos lin-

guísticos mostrou que os cartazes tinham a necessidade de informar o público as

seguintes informações: O título do festival, Festival International du Film Cannes, o

ano e/ou a edição, e a data do evento. Por óbvio essas informações estão contidas

em todos os cartazes e concluem seu objetivo primário de dizer o que o cartaz divul-

ga e a data do evento.

Porém, não foi apenas as informações textuais de divulgação que foram re-

correntes em todos os cartazes. Em uma olhada rápida sobre o recorte, dos 10 car-

tazes dos anos 1970, percebi a princípio que a partir do ano de 1972 todos os carta-

zes tinham ilustrações, e que céu e mar, algumas vezes montanhas, cores quentes

de um dia ensolarado, eram recorrentes, estavam em todos. A associação mais clara

foi relacionar essas paisagens com um ambiente costeiro, me fazendo então chegar

a conclusão de que havia uma necessidade de vincular o festival a esse ambiente. A

cidade de Cannes fica na costa sul da França, e o festival se passa em Maio, prima-

vera caminhando para o verão, e assim para temperaturas mais quentes. Não foi

possível descobrir se foi algo imposto pela direção do festival, mas o fato é que os

cartazistas do período analisado decidiram por inserir elementos que remeteram a

essa percepção, era importante para eles ambientar o leitor do cartaz e localizar a

cidade de Cannes.

Nos cartazes de 1972 e 1973 foi usada uma inserção fotográfica de praias,

vemos céu, mar e ondas de forma bem próxima e clara (Quadro 2). Nos cartazes se-

guintes o ambiente costeiro ficam mais ao fundo e compõem o cenário onde as figu-

ras principais das ilustrações estão.

Foi possível verificar que os cartazes têm o ambiente costeiro como um ele-

mento comum logo em um primeiro vislumbre dos cartazes em conjunto. Porém os

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cartazes de 1970 e 1971 eram cartazes tipográficos e não exibiam nenhuma ilustra-

ção que pudesse ambientar o festival. A pergunta mais lógica era: Será que esses

cartazes também tinham essas características mas transmitidas de outra forma? Ou

era um padrão visto a partir de 1972?

Durante a análise das cores foi possível constatar que o cartaz de 1970 pos-

suía as cores vermelho, branco e azul colorindo a tipografia e o fundo, as mesmas

cores da bandeira francesa, localizando o festival na França. De forma similar as

únicas cores, tirando o preto, do cartaz de 1971 são as mesmas cores empregadas

no “25” (vermelho, amarelo e azul) podem se referir a bandeira da região administra-

tiva francesa chamada Provença-Alpes-Costa Azul, onde fica Cannes.

A ideia de relacionar, de uma forma ou de outra, o cartaz ao local do evento, é

uma estratégia de divulgação que não está restrita ao Festival de cinema de Can-

nes, o Festival de cinema de Miami por exemplo, também exibe praias em cartazes

mais antigos e mais recentes como pode ser visto nas figuras 12 e 13.

Figura 12 - Miami Film Festival 2018

Fonte: ARCHIVES, 2019

Figura 13 - Miami Film Festival 1985

Fonte: ARCHIVES, 2019

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4.2 CARTAZES TIPOGRÁFICOS

Dentro do recorte escolhido alguns cartazes têm como seu principal elemento

visual a tipografia, e portanto, estão focados em transmitir a mensagem linguística.

Há uma sequência do ano de 1970 a 1973 nos quais os signos linguísticos têm um

destaque maior, e a partir de 1974 até 1979 a parte textual perde gradualmente seu

destaque, seguindo um modelo no qual é restringida ao topo do cartaz em uma for-

matação padrão.

Dos cartazes que foram considerados tipográficos, os de 1970 e 1971 são os

que apresentam praticamente apenas elementos textuais, enquanto os de 1972 e

1973 a tipografia está sobre um fundo fotográfico. Para esta categorização, contudo,

a análise do cartaz de 1972 foi deixado para um agrupamento posterior, por apre-

sentar elementos que o tornam mais relevante em outra classificação.

Como já foi dito neste trabalho, a mensagem textual a ser transmitida é sem-

pre a mesma em todos os cartazes, então a análise dos cartazes a seguir está foca-

da em entender como a disposição desses elementos textuais e suas características

podem contribuir para o entendimento do cartaz.

4.2.1 Análise do cartaz de 1970

O cartaz do festival de Cannes de 1970 (Figura 14) apresenta como centro

elementos tipográficos que contém o título e as informações de divulgação do even-

to. Usa-se uma tipografia comumente usada para títulos, a Cooper Black, que possui

um corpo grosso e serifas arredondadas, provendo grande destaque. A Cooper

Black foi criada em 1922 por Oswald Bruce Cooper, mas ganhou popularidade nos

anos 1970, como na capa do disco Pet Sounds dos The Beach Boys (PATRICK,

2014) (Figura 15).

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As caixas de texto do cartaz, as que estão em Cooper Black, criam um rastro

de cor, como se tivessem sido arrastadas de baixo pra cima, na diagonal, da direita

pra esquerda. Esse rastro cria uma forma conjunta entre tipografia e elementos

plásticos. É o que dá um certo dinamismo ao cartaz.

Pra além disso, essa mancha gráfica que une tipografia e formas também

apresentam as cores vermelho e azul, num fundo branco, que localizam o cartaz na

frança, pois são as cores da bandeira francesa.

Figura 14 - Cartaz do Festival de Cannes 1970

Fonte: ALL CANNES, 2018

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4.2.2 Análise do cartaz de 1971

O cartaz do festival de Cannes de 1971 (Figura 16) é mais uma vez um cartaz

tipográfico. O texto ocupa de forma generosa o fundo branco, mas não há sangra-

mentos. Há uma centralização que permite que o cartaz seja simétrico quando pen-

sado a partir da vertical. Porém, podemos ver uma certa assimetria quando olhamos

para a parte superior em relação a inferior. Esse contraste de peso ocorre pois o tex-

to “25” ocupa mais da metade do cartaz, além de possuir uma forma de texto dese-

nhado em fitas coloridas, que podem remeter a ideia de negativos de filmes.

Figura 15 - Album Pet Sounds dos The Beach Boys.

Fonte: HAVERS, 2019

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Os elementos textuais que compõem o cartaz estão formatados de maneira a

parecer que estão deitados. Portando, a forma de fitas do “25” ajudam a dar tridi-

mensionalidade ao cartaz, e os textos que divulgam as informações do festival

acompanham esse efeito tridimensional sendo desenhados com uma leve perspecti-

va e distorção de suas formas. A perspectiva nos chama para dentro do cartaz, as li-

nhas de fuga (linhas que vão em direção ao ponto de fuga) direcionam o olhar para

25 no topo. Essa forma de texto deitado, em perspectiva, remete a uma certa estéti-

ca que pode se verificar na década através de alguns cartazes de filmes como:

Dawn of the Dead (1978), Investigation of a Citizen Above Suspicion (1970) e Star

Wars (1977) (Figuras 17, 18 e 19).

É interessante notar uma certa hierarquia. O “25” é elemento principal, no

topo, maior, colorido, com forma diferenciada. O resto do texto vem em seguida em

preto, num tamanho menor, mas em caixa alta. Dentro desse texto temos uma nova

hierarquia, que diferencia parte do texto num tamanho maior e em bold, em quanto

outras linhas estão em caixa normal da fonte Helvética. Essa hierarquia cria três blo-

Figura 16 - Cartaz do Festival de Cannes 1971

Fonte: ALL CANNES, 2018

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cos de informação: O “25” como elemento principal e o Anniversaire que acompanha

o “25”, apesar de estar escrito na fonte do texto da sequência, pois está separado

deste por uma linha preta; O segundo bloco é “festival international du film”, “Can-

nes” e “1971” pois estão todos em bold e num tamanho maior; e o terceiro bloco são

os textos “le rendez-vous mondial du cinema” e “du 12 au 27 mai” que estão versão

normal da Helvética.

O cartaz possivelmente usa as cores vermelho, amarelo e azul não apenas

para trazer vivacidade, mas também para localizar o local do evento. As cores quen-

tes, amarelo e vermelho, em contraste com o azul-escuro, podem representar uma

ideia de calor e mar, pois Cannes é uma cidade costeira. Além disso, estas são as

cores da bandeira da região administrativa francesa de Provença-Alpes-Costa Azul,

onde fica Cannes (Figura 20).

Figura 19 - Star Wars (1977)

Fonte: Star Wars, 2019

Figura 17 - Dawn of the Dead(1978)

Fonte: Dawn, 2019

Figura 18 - Investigation of aCitizen Above Suspicion

(1970)

Fonte: Investigation, 2019

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4.2.3 Análise do cartaz de 1973

O cartaz do festival de Cannes de 1973 (Figura 21) traz uma foto e parte dos

seus elementos textuais enquadrados numa moldura de bordas arredondadas. Essa

estratégia visual de criar uma moldura nos leva para dentro do cartaz, assim como

uma tela de cinema nos leva para dentro do filme. O recorte da foto esconde parte

da paisagem, as linhas do horizonte e das ondas na diagonal levam nosso olhar

para um ponto de fuga além do que o cartaz pode nos mostrar, é um convite. Uma

vez dentro da fotografia estamos na praia, uma bela paisagem, mar e céu azulado,

espuma branca, como deve ser a costa de Cannes. O cartaz está localizando o

evento num lugar de costa e mar.

Figura 20 - Bandeira de Provença-Alpes-Costa Azul

Fonte: Provença-Alpes-Costa Azul, 2019

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O tom de azul de mar e céu é um fundo relativamente uniforme para contras-

tar com o texto em branco, e também em laranja “Cannes”. O laranja é cor comple-

mentar ao azul e se destaca do fundo, dando ênfase ao nome do festival. Também é

uma cor quente e portanto adiciona um clima ensolarado ao cartaz.

As fontes usadas no texto do centro da fotografia são 3, todas em caixa alta. A

que escreve Festival international du film remete aos letreiros neons de estabeleci-

mentos variados, que incluem cinemas, talvez essa seja a maior referências a filmes

aqui. A palavra “Cannes” se destaca pela cor e pelas formas que dão tridimensionali-

dade, enquanto o número “73” está grande, porém, mais discreto numa fonte de cor-

po mais fino. As fontes diferentes criam uma dinâmica e separam os grupos de texto

com informações diferentes a serem destacadas. Primeiro mostra-se que é um festi-

val internacional de cinema, depois destaca-se que é Cannes, e depois o ano.

Pode-se notar também que a escolha de enquadrar uma fotografia em uma

moldura branca é usada em cartazes de cinema da época (Figura 22, 23 e 24).

Figura 21 - Cartaz do Festival de Cannes 1973

Fonte: ALL CANNES, 2018

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4.3 REFERÊNCIA AO CINEMA

Tratando-se de um festival de cinema, não é de se espantar que uma das es-

tratégias visuais na divulgação é referenciar de alguma forma a sétima arte. Durante

a análise, com exceção ao de 1970, todos os cartazes exibiram elementos visuais

que puderam ser relacionados com o cinema. Os principais elementos foram as fitas

de película de filme, a lente de câmera de cinema, e de forma simbólica a represen-

tação de olhos está relacionado ao audiovisual. A referência a estes signos é bastan-

te recorrente entre os cartazes de outros festivais de cinema, mostrando como são

fortemente relacionados a cinematografia, e ainda, como essa é uma estratégia re-

corrente na divulgação destes festivais, exemplos de outros festivais usando estes

elementos poderão ser visto durante as análises.

Para exemplificar as referências ao cinema, foram escolhidos os cartazes de

1972, 1975 e 1978, como pode ser visto a seguir.

Figura 22 - Investigation of aCitizen Above Suspicion (1970)

Fonte: Investigation, 2019

Figura 23 - Badlands (1973)

Fonte: Badlands, 2019

Figura 24 - Jaws (1975)

Fonte: Jaws, 2019

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4.3.1 Análise do cartaz de 1972

O cartaz do festival de Cannes de 1972 (Figura 25) tem escrito no topo o texto

Festival international du film que indica se tratar de um festival de cinema. Das pon-

tas da esquerda e da direita, saindo “f” e do “m” desse texto, descem duas linhas

que criam uma margem e enquadram os outros elementos no interior (o texto e o

pássaro), mas não o fundo. De fato, o texto no topo acaba funcionando como uma

margem, assim como a linha branca. Podemos perceber essa escolha de enquadra-

mento usando linhas em outros cartazes de cinema como está exemplificado nas Fi-

gura 26 e 27.

Ao fundo uma linha separa o céu e a onda do mar, enquadrando a paisagem

na regra dos terços, portanto, criando uma composição harmônica e equilibrada.

Este equilíbrio é quebrado pela figura da gaivota que corta a paisagem numa diago-

nal e traz movimento ao cartaz. São esses elementos, céu e mar, e ave marinha

(gaivota) que situam o cartaz em uma paisagem costeira, localizando o evento na ci-

dade de Cannes.

Figura 25 - Cartaz do Festival de Cannes 1972

Fonte: ALL CANNES, 2018

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Compondo o primeiro plano, além da ave, estão os textos. Em destaque, com

corpo de texto maior, vemos “Cannes, du 10 au 24 mai” e o ano “1972”, este último

tem seu alinhamento central deslocado pela posição das asas da gaivota, reforçan-

do a ideia de movimento e dinâmica neste lugar do cartaz. Além disso o ano “1972”

ganha uma ênfase por estar em vermelho, enquanto o restante do testo está em

branco, e também está na sua forma itálica, o que permite que o texto acompanhe a

linha diagonal que as asas da ave criam. A escolha foi por uma tipografia humanista

com corpo irregular, como os tipos antigos do começo da impressão tipográfica, as

quais eram feitas em papéis de baixa qualidade e criavam formas irregulares no de-

senho dos tipos impressos. Talvez, usar uma fonte com essas características sobre

um cartaz fotográfico crie uma composição inusitada de tecnologias de tempos dife-

rentes convivendo no mesmo cartaz, criando também um aspecto rudimentar.

Por fim, é interessante perceber que a asa da gaivota se mescla com a ima-

gem de uma película de filme. A película é um signo relacionado ao cinema. A junção

da gaivota que representa a natureza e o ambiente costeiro de Cannes, e a película

que representa o cinema, temos um ícone que resume a proposta do cartaz de divul-

gar um festival de cinema.

Figura 26 - All the President's Men1976

Fonte: All the President's Men, 2019

Figura 27 - The China Syndrome1979

Fonte: The China, 2019

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Como exemplo de cartazes de outros festivais de cinema, temos o cartaz do

Festival de Berlim (Figura 28) onde vemos a película de filme sendo representada

como um signo relacionado ao cinema.

4.3.2 Análise do cartaz de 1975

O cartaz do festival de Cannes de 1975 (Figura 29) tem suas informações de

divulgação escritas no topo do cartaz com uma fonte sem serifa estilizada, toda em

caixa alta. Há uma hierarquia apenas em relação a “du 9 au 23 mai”, a data do even-

to, que está localizado na segunda linha, centralizado e num tamanho menor. A fonte

ITC Busorama combina Art Déco e ao slogan Flower Power dos anos 70 (ITC,

2018). Portanto combina um estilo mais clássico com a psicodelia do movimento hip-

pie dos anos 1970. O texto está sobre um fundo azul ciano escuro, que desce para

um azul de tonalidade média. A escolha de uma cor mais uniforme e escura que con-

trasta com o branco da tipografia, e situar o texto no topo, revela a intenção do carta-

zista de não permitir que a informação textual e a ilustração compitam, cada uma

tem seu espaço, e neste caso a ilustração tem um destaque maior.

Figura 28 - Festival de Berlim de 1965

Fonte: 15TH BERLIN, 2019

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Um pouco acima do centro do cartaz temos uma linha do horizonte que sepa-

ra céu e terra. Acima temos linhas paralelas a linha do horizonte, são linhas azuis

onduladas, que juntamente a variação de azuis-claros e um pouco mais escuros,

dão volume as formas macias das nuvens. Entre as nuvens vemos olhos, dezenas

deles espalhados. No contexto de cartaz de divulgação de um festival de cinema os

olhos podem representar o aspeto visual do audiovisual. Pode referenciar as câme-

ras de cinema também. Esses olhos estão nas nuvens, no céu, o mesmo céu que

engloba a parte superior da cabeça do homem. É como se os olhos do homem, es-

condidos pelas nuvens, se multiplicassem pelo céu. Uma cabeça nas nuvens remete

a uma ideia de uma cabeça no mundo dos sonhos, da imaginação.

Abaixo da linha do horizonte temos a cor sólida de um vermelho saturado,

que dá ao solo um aspecto de uma superfície dura, que contrasta com o azul do

céu. Assim como no céu, temos vários elementos esféricos no chão, que embora

não estejam simétrico aos olhos do céu, as laranjas igualam o peso de elementos

entre céu e terra. As laranjas estão distribuídas pelo solo e diminuem de tamanho

conforme se aproximam da linha do horizonte, criando o efeito de perspectiva. Assim

como as montanhas no horizonte, todas as laranjas apresentam rachadura, o que

Figura 29 - Cartaz do Festival de Cannes de1975.

Fonte: ALL CANNES, 2018

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nos faz imaginar que são feitas de um material duro também. A única laranja total-

mente aberta está no primeiro plano a direita e revela uma lente de câmera que

aponta para frente, para quem olha o cartaz, assim como os olhos. A lente é uma su-

gestão a câmeras de cinema. A união de lente e laranja também pode referenciar o

filme Laranja Mecânica de 1971.

O cartazista enquadra o cartaz num plano geral para que possamos ver os

elementos centrais e a paisagem ao mesmo tempo. Nessa cartaz surrealista, essa

plano se torna mais importante pois nos permite ver a interação entre o homem no

primeiro plano e o fundo. O homem está com a cabeça nas nuvens e as nuvens co-

brem seus olhos. Essa combinação desafia a perspetiva. Além disso, o homem sen-

tado na cadeira tem sua camisa aberta e revela um peito transparente, e as formas

das nuvens simulam as formas de um peito e abdome. Ele tem em uma mão uma la-

ranja rachando, e na outra uma borboleta com um olho humano na asa. Com tantos

olhos, com a lente de câmera, o dedo apontando o expectador, tudo sugere que ao

observarmos o cartaz, este nos observa de volta.

Outros festivais de cinema também relacionam olhos e lentes de câmera ao

cinema, e os referenciam em seus cartazes, como pode ser visto nas figuras 30, 31

e 32 abaixo.

Figura 30 - Festival de Berlim(1983)

Fonte: 33RD BERLIN, 2019

Figura 31 - Festivalinternacional de cinema de

Gijón (2016)

Fonte: PROGRAMA 54, 2019

Figura 32 - Sundance filmfestival (1995)

Fonte: 1995 FESTIVAL, 2019

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4.3.3 Análise do cartaz de 1978

O cartaz do festival de Cannes de 1978 (Figura 33) tem suas informações de

divulgação escritas no topo do cartaz, com uma fonte sem serifa transicional que

passa uma certa neutralidade, mas, ao mesmo tempo, por usar uma família de corpo

fino, traz elegância e sutileza ao cartaz. O texto está todo em caixa alta e dá ênfase

ao título e ano do festival, deixando em um tamanho menor as informações dos dias

que ocorrem o festival. O texto fica de forma mais discreta no topo, dando espaço

para a paisagem retratada.

A paisagem que compõe o fundo trata-se de um lugar costeiro. Vemos um de-

gradê de um céu vermelho alaranjado se tornando azul perto da linha do horizonte,

que traceja fina e forma pequenas montanhas de topo triangular arredondado. A mis-

tura de do laranja e azul no céu pode no indicar um entardecer. O mar começa com

um tom rosa no meio do cartaz e desce para um azul-claro, que progride num degra-

dê para um azul mais escuro. No meio do mar podemos ver duas machas rosas, que

possivelmente representam um reflexo do céu, ou a sombra do objeto que flutua aci-

Figura 33 - Cartaz do Festival de Cannes de1978.

Fonte: ALL CANNES, 2018

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ma. As cores são pintadas provavelmente com aquarela e nos deixam ver a textura

do papel, vemos portando que as forma simples e delicadas foram desenhadas e

pintadas a mão. Essa paisagem costeira que preenche o fundo do cartaz está aí

para fazer alusão ao local do evento. Cannes, assim como a ilustração é uma cidade

de costa com algumas montanhas no horizonte.

Se já sabemos o local do evento, agora o cartaz quer nos mostrar do que se

trata. A película de filme é o signo escolhido para representar o cinema. Ela está no

centro da composição, enquanto o fundo é relativamente simétrico, o negativo de fil-

me quebra a simetria se formando a partir de linhas curvas que se desenham na dia-

gonal. Isso dá movimento e maleabilidade ao objeto. Enquanto no fundo temos uma

textura de papel pintada com aquarela, a película de filme parece um recorte colado,

uma textura mais lisa, que contrasta com o fundo. Dentro da película, a sequência

de imagens retrata uma cena de uma abraço entre um homem e uma mulher, uma

cena de amor, um tema recorrente que traz identificação por parte do público.

Podemos verificar o uso da película em cartazes de outros festivais de cine-

ma. (Figura 34, 35 e 36).

Figura 34 - Festival de cinema deBerlim (1978)

Fonte: 28TH BERLIN, 2019

Figura 35 - Festival de cinemade Veneza de 1932

Fonte: 1ST VENICE, 2019

Figura 36 - Festival de cinema deVeneza (1949)

Fonte: 10TH VENICE, 2019

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4.4 SURREALISMO

As ilustrações irreais com características oníricas são o tema mais recorrente

nos cartazes de Cannes da década de 1970. Durante as décadas 1960 e 1970, o

surrealismo tornou-se recorrente na produção de cartazes de filmes em parte da

Europa, isso porque havia certa liberdade na produção, de fato, muitos designers

nem sequer viam o filme para o qual estavam criando o grafismo (CRASTES, 2018).

No caso do festival de Cannes, alguns dos artistas convidados para

trabalharem nos cartazes desse período, como SIUDMAK, Fólon e George Lacroix

tinham o surrealismo como principal tema artístico, criando uma série de 1974 a

1979 que compartilham dessa mesma característica.

A seguir os cartazes de 1974, 1976, 1977 e 1979 são analisados e

exemplificam o surrealismo do período.

4.4.1 Análise do cartaz de 1974

O cartaz do festival de Cannes de 1974 (Figura 37) traz logo no topo o nome

do festival e as informações de data grafados numa tipografia geométrica sem serifa

e em caixa alta, com as datas “du 9 au 24 mai” fazendo em caixa baixa e tamanho

menor. A fonte geométrica apresenta certa impessoalidade, está ali para apresentar

a informação e não para concorrer com a ilustração, que é o destaque e chama mais

atenção no cartaz. É possível que seja por isso também, que o texto tenha sido des-

locado para o topo, dando mais espaço continuo para o resto da imagem.

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Do topo a metade temos um quadrado que forma o céu, que desce de um tom

escuro de azul até um bem claro, e com bastante luminosidade, quase branco. Logo

baixo o azul retoma uma cor mais escura e saturada com detalhes em branco, que

ilustram as ondas, é o mar. Este é o plano de fundo da imagem, uma praia com on-

das de um dia ensolarado, é possivelmente a forma do cartaz nos dar a informação

de como é o local do evento que está divulgando.

No plano seguinte temos objetos arredondados e vermelhos, enfileirados e

justapostos, são cadeiras de cinema. Para além do que podemos ler no topo do car-

taz, o cartazista está nos localizando numa sala de cinema a beira mar. De certa for-

ma está reforçando o texto por meio da imagem.

Logo a frente, num plano americano, que vemos metade do corpo do indiví-

duo, temos um toque de surrealismo, pois encontramos um homem sem cabeça

com um olho alado no lugar desta. A figura humana vesta um paletó azul, gravata

vermelha e preta, com uma camisa amarelo dourado por baixo. As cores são todas

semelhantes ao que se encontram no resto do cartaz, mas pela forma que foram in-

tercaladas, criam contraste. O azul do paletó rima com o azul do mar, o vermelho da

poltrona com a gravata, o amarelo da camisa com o dourado das asas.

Figura 37 - Cartaz do Festival de Cannes de1974.

Fonte: ALL CANNES, 2018

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A figura do homem está centralizada, há uma simetria e um equilíbrio no car-

taz quando verificamos isso olhando do centro para os lados. E no centro dessa si-

metria temos o olho. Nosso olhar é naturalmente atraído primeiramente pelo olho.

Está no centro, hipnotizante, e mesmo as linhas laterais que formam o trapézio do

torço humano, levam na direção do olho. As mãos e cotovelos postas a formar um

triângulo, direcionam a ponta deste para o centro do cartaz. As asas douradas saem

de traz do olho para formar um “v” que mais uma vez acaba por redirecionar nossa

percepção para o centro. Além disso as asas talvez representem duas coisas: o voo

do olhar dentro de um mundo imaginário do cinema; e/ou também a própria premia-

ção com sua textura dourada, como a de um troféu.

Podemos relacionar o olho com o “visual” do audiovisual, ou com a câmera ci -

nematográfica. Mas percebamos aqui, que está câmera está nos olhando de volta. O

observador do cartaz é colocado no lugar da tela desse cinema a beira-mar.

Podemos verificar tendências surrealistas em outros cartazes de cinema da

época (Figuras 38, 39 e 40).

Figura 38 - M.A.S.H. (1970)

Fonte: M.A.S.H., 2019

Figura 39 - The Discreet Charm ofthe Bourgeoisie (1974)

Fonte: EBERT, 2000

Figura 40 - Nashville (1976)

Fonte: NASHVILLE, 2019

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O autor do cartaz, Georges Lacroix, também fez um cartaz para a versão fran-

cesa do disco Loose Ends de Jimi Hendrix (Figura 41).

4.4.2 Análise do cartaz de 1976

O cartaz do festival de Cannes de 1976 (Figura 42) tem suas informações de

divulgação escritas no topo do cartaz com uma fonte sem serifa estilizada, toda em

caixa alta. Há uma hierarquia apenas em relação a “13-28 Mai 1976”, a data do

evento, que está localizado na segunda linha, centralizado e num tamanho menor. A

fonte usada chama-se Quirinale (WHAT, 2019), uma fonte pouco conhecida, de pon-

tas arredondadas com uma formato bom para títulos, não recomendada para texto

corrido. O texto está sobre um fundo azul ciano de saturação média e luminosidade

média, que desce em um degradê, ganhando luminosidade e perdendo saturação,

até chegar no branco, a cor do tecido. A escolha de uma cor mais uniforme e escura

que contrasta com o branco da tipografia, e situar o texto no topo, revela a intenção

do cartazista de não permitir que a informação textual e a ilustração compitam, cada

uma tem seu espaço, e neste caso a ilustração tem um destaque maior.

Figura 41 - Disco Loose Ends, Jimi Hendrix, 1974

Fonte: LOOSE ENDS, 2019

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O cartaz enquadra seus elementos num plano geral nos permitindo ver toda a

paisagem e seus elementos. A paisagem é costeira, fazendo talvez uma referência a

paisagem de Cannes, localizando o festival. No topo temos o céu, que a partir das

bordas e da sua parte inferior se dobra, revelando a forma de um tecido. Por sua vez

o tecido se desdobra como se fosse uma cortina de teatro, como em um espetáculo,

revelando um segundo céu atrás do primeiro, um céu noturno. As dobras do tecido

funcionam como setas que direcionam nosso olhar para o centro do céu/tecido, onde

podemos ver uma rosto humano.

O tecido também revela, dentro de um semicírculo, um portal que nos mostra

uma construção com colunas greco-romanas o que nos faz imaginar que o portal

nos leva para algum lugar do passado.

Aplicando as regras dos terços é possível notar que o cartazista reservou um

terço do cartaz para a parte inferior do cartaz, onde está a terra e água e dois terços

para céu. Abaixo da linha do horizonte, temos as formas pontiagudas que dão forma

Figura 42 - Cartaz do Festival de Cannes de 1976.

Fonte: ALL CANNES, 2018

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as montanhas, com suas rachaduras e aspecto duro. Na linha do horizonte, as mon-

tanhas assumem uma cor ciano que conforme se aproxima do primeiro plano, passa

para tons de castanho, até chegar numa mistura de castanho e vermelho no primeiro

plano. A diferença de tonalidade das montanhas e rochas se dá pela perspectiva at-

mosférica, que faz com que as cores percam saturação e tendam para o azul confor-

me se aproximem da linha horizonte. Isso possibilita percebemos a extensão da pai-

sagem.

É possível notar uma relativa simetria entre os lados esquerdo e direito do

cartaz. As montanhas, a forma como contornam a água, e mesmo as dobras do teci-

do no céu, são similares do lado direito e do esquerdo. Na vertical, se traçarmos

uma linha ao centro, perceberemos primeiro que os elementos principais do cartaz

estão todos alinhados.

Um desses elementos é uma concha flutuando com uma pérola fragmentada,

e dentro há uma película de filme enrolada. A pérola de um material duro e quebradi-

ço, parecendo um a consistência da casca de um ovo, e de dentro dela vemos “nas-

cer” a película de filme, uma referência ao cinema.

Assim como a concha, temos mais acima a figura de uma mulher alinhada ao

centro do cartaz. Ela está nua, sentada de costas em uma pedra, olhando para o

portal. E acima, a própria forma triangular do tecido levantado direciona nosso olhar

para o um rosto feminino. Talvez este seja o rosto da mulher sentada nas pedras, re-

fletido de forma surreal no céu/tecido. Os olhos, num contexto de cartaz de divulga-

ção de um festival de cinema, podem representar o aspeto visual do audiovisual.

A concha está disposta de forma a lembrar a concha da obra O Nascimento

de Vênus de Botticelli, e desta forma sugere que a mulher do cartaz possa ser pró-

pria Vênus. Desta forma, a Vênus olha para o portal do passado e tem seu rosto re-

velado no céu, olhando para nós, no presente.

Os olhos e um rosto feminino flutuando no cartaz do filme Chinatown (1974)

mostra uma situação surreal (Figura 43).

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4.4.3 Análise do cartaz de 1977

O cartaz do festival de Cannes de 1977 (Figura 44) tem suas informações de

divulgação escritas no topo do cartaz na fonte Baskerville Old, uma fonte transicional

sem serifa, que dá um ar elegante e clássico. A fonte está grafada toda em caixa alta

e há uma diferença hierárquica apenas em relação a “12-27 Mai”, a data do evento,

que está localizado na segunda linha, centralizado e num tamanho menor. O texto

está sobre um fundo azul-escuro de saturação alta, iluminação média. A escolha de

uma cor mais uniforme e escura que contrasta com o branco da tipografia, e situar o

texto no topo, revela a intenção do cartazista de não permitir que a informação textu-

al e a ilustração compitam, cada uma tem seu espaço, e neste caso a ilustração tem

um destaque maior. O azul-escuro do topo passa lentamente para azul mais claro,

com menos saturação e mais luminosidade, até chegar ao branco das nuvens perto

do horizonte.

Figura 43 - Cartaz do filme Chinatown(1978)

Fonte: CHINATOWN, 2019

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O cartaz enquadra seus elementos num plano geral nos permitindo ver toda a

paisagem e seus elementos, como as nuvens, a lente, a mulher ao centro, cada um

em planos diferentes. Estão todos alinhados, centralizados, e a partir deste centro

percebemos a simetria entre os lados esquerdo e direito. Há por outro lado uma as-

simetria em certos pontos. Como nos braços, em que um está rente ao corpo, e o

outro braço segura o vestido junto ao peito. O seio do lado esquerdo está desnudo

em quando o outro coberto, e o vestido esvoaça mais para o lado direto do que para

o outro. Existe também uma quebra de simetria (e de expectativa) quando nosso

olhar percorre a parte inferior do cartaz e se deposita na figura do pavão, não existe

um contrapeso do outro lado.

A palavra céu pode ser um sinônimo para paraíso. A indicação de montanhas

acima das nuvens pode sugerir que ali vemos um vislumbre do éden. E das nuvens

do paraíso que vemos surgir uma lente emanando uma luz. Como em um projetor de

cinema, e se de fato é um projetor, o filme exibido se passa no mar, ou numa costa

(como em Cannes). E a película exibe uma mulher que sai de uma folha de papel

amassado, ou talvez de um embrulho. A cena remete a obra O Nascimento de Vê-

nus de Botticelli, e desta forma sugere que a mulher do cartaz possa ser própria Vê-

Figura 44 - Cartaz do Festival de Cannes de1977.

Fonte: ALL CANNES, 2018

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nus. É difícil dizer se a mão que segura o vestido, o faz para cobrir a nudez, ou para

desnudar o outro lado.

Vênus é a deusa da beleza, e ao seu lado direito tem um pavão, uma ave que

veste penas longas como um vestido, e também é conhecido pela sua beleza e exu-

berância. Para justificar ainda mais a natureza divina do que está sendo representa-

do, temos uma concha espiralada, que é tipicamente associada a proporção áurea,

um padrão perfeito da natureza. Se isso não for o bastante, temos na parte inferior

do cartaz mais nuvens, o que pode sugerir que talvez a cena que presenciamos ain-

da se passe no céu.

4.4.4 Análise do cartaz de 1979

O cartaz do festival de Cannes de 1979 (Figura 45) tem suas informações de

divulgação escritas no topo do cartaz, com uma fonte sem serifa transicional que

passa certa neutralidade, mas, ao mesmo tempo, por usar uma família de corpo fino,

traz elegância e sutileza ao cartaz. O texto está todo em caixa alta e dá ênfase ao tí -

tulo e ano do festival, deixando em um tamanho menor as informações dos dias que

ocorrem o festival. O texto fica de forma mais discreta no topo, dando espaço para a

ilustração.

Figura 45 - Cartaz do Festival de Cannesde 1979.

Fonte: ALL CANNES, 2018

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O texto colado a borda do topo fica alinhado e contrasta com o leve desali-

nhamento da linha do horizonte, que por sua vez é formada na transição de cores do

azul para o laranja. O azul pode representar o céu, enquanto o laranja avermelhado

deixa o clima quente. A sensação que a linha que se forma entre azul e laranja forma

o horizonte não vem apenas da linha em si, mas da diferença da saturação do laran-

ja avermelhado, que passa de menos para mais, conforme se aproxima do primeiro

plano onde está a figura do homem.

Enquanto o fundo é feito basicamente de cores, é só a partir do segundo terço

que começamos a ver formas e linhas que compõem a figura, criando uma composi-

ção que respeita as regras dos terços, e chama nossa atenção para essa região do

cartaz. E para que possamos ver com ainda mais detalhes, o cartazista nos deixa

próximo ao sujeito ilustrado, enquadrando-o em primeiríssimo plano para que dessa

forma sejamos capazes de perceber as linhas finas e pretas, que dão forma ao rosto

e ao chapéu de formas arredondadas. A delicadeza e o arredondamento das formas

e linhas criam uma sensação de que o chapéu é macio, e de que o personagem

possa ser amigável. O que nos faz duvidar desta amistosidade são os olhos com la-

terais pontiagudos e que não revelam uma expressão. Isso se junta ao fato de que a

escolha do enquadramento que não revela a boca.

As formas pouco detalhadas, o chapéu que arqueia para dentro do rosto e

vira um nariz, o tom de pele laranja avermelhado e um retângulo dentro do chapéu

que nos permite ver outra paisagem, nos deixam diante de uma obra em um contex-

to imaginativo, surreal. O interessante aqui é tentar imaginar que esse retângulo

deve representar uma tela de cinema, no qual podemos ver outra realidade e ali en-

contramos um terceiro olho, que também nos observa como os outros dois. Talvez

aqui, o cartazista use o olho como um símbolo para a câmera do cinema, ou sim-

plesmente uma relação com o sentido visual que está atrelado ao cinema.

O autor do cartaz foi o artista belga Jean-Michel Folon, que tinha na figura de

um homem usando um chapéu um personagem comum em suas obras. Segundo

Christopher Masters (MASTERS, 2005), o Everyman, ou Homem comum, normal-

mente era representado em paisagens vazias ou cercado por arranha-céus. O Every-

man pode ser visto nas figuras 46 e 47.

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No cartaz do filme Uma Viagem para a Luz (1978) podemos ver semelhanças

com o cartaz de Cannes 1979. Vemos um homem de chapéu, com olhos no chapéu

dentro de uma composição surreal (Figura 48).

Figura 46 - Obra de Jean-Michel FolonI, 1987

Fonte: FOLON, 2019

Figura 47 - Obras de Jean-Michel Folon II, 1987

Fonte: FOLON, 2019

Figura 48 - Cartaz do filme UmaViagem para a Luz (1978)

Fontes: UMA VIAGEM, 2019

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Parte do objetivo deste trabalho era entender como o Festival de Cannes du-

rante a década de 1970 divulgava o evento por meio dos seus cartazes, se existia

uma identidade visual recorrente, uma regra, um padrão. O começo da década apre-

sentou cartazes com características tipográficas que deram lugar a ilustrações ela-

boradas e surrealistas.

Foi possível perceber, também, que havia estratégias de design recorrentes,

ligadas a signos dos cinemas ou a soluções de design da época, ou ainda a movi-

mentos artísticos. Cada cartaz apresentou mais de uma dessas estratégias. Durante

a pesquisa nota-se, por exemplo, que o uso de signos ligados ao cinema (como a

câmera, películas de filmes, etc.) eram comum tanto ao Festival de Cannes, durante

todo o período analisado, quanto a outros cartazes de divulgação de festivais de ci-

nema, como os Festivais de Veneza, Berlim, entre outros. Foi interessante perceber

a necessidade que os festivais de cinema tinham de usar esses signos para mostrar

que se tratavam de cartazes relacionados ao audiovisual, e talvez ainda tenham

essa necessidade, deixando para futuras pesquisas a possibilidade de um recorte

mais abrangente que mostre se essa estratégia persiste.

Outra estratégia comum tanto dentro do recorte quanto relacionado a cartazes

de outros festivais, era necessidade de situar o cartaz ao seu local. Em Cannes, sig-

nos relacionados a praia ou as cores da França foram usados pra cumprir esse obje-

tivo, e quando buscava-se comparar a outros festivais, o mesmo artifício estava pre-

sente.

Observou-se também a variação das características artísticas das vanguar-

das de arte e design, que inevitavelmente variam com o passar das décadas. Foi o

caso do surrealismo que ocupou boa parte da década analisada.

Portanto, o que se pode perceber foi como realmente existem certas estraté-

gias de design recorrentes dentro desse nicho de cartazes de festivais de cinema, o

que levanta novas perguntas sobre a possibilidade destas se estenderem a outros ti-

pos de festivais e premiações, como os de música, literatura, etc. Será que o uso

destes signos relacionados ao cinema, ou a necessidade de referenciar Cannes

como uma cidade de praia na França foi um método que perdurou por mais déca-

das? Será que isso se repete em outros tipos de festivais? Essas são perguntas que

ficam para possibilidade de novos trabalhos na área.

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É importante reforçar também os fundamentos do design gráfico que ajuda-

ram a fundamentar esse trabalho. Os conhecimentos sobre composição, linhas e for-

mas, equilíbrio, cor, textura, tipografia tornaram possível desvendar parte das sensa-

ções e significados dos cartazes. A análise semiótica da imagem permitiu aprofundar

a análise, entender possíveis relações, como entre certos símbolos e o cinema,

como o mar e Cannes, e só então, com esse entendimento, foi possível estabelecer

relações com outros festivais e com outros cartazes de cinema.

De uma maneira geral, acredito que seja importante concluir aqui, reafirman-

do que a análise e a exposição de informações deste trabalho corrobora com a notá-

vel importância do Festival de Cannes para o cinema, e que o seu material de divul -

gação tem relevância histórica para o cinema e para o design. Desde o seu início, o

festival demonstrou apreço pela liberdade e coerência, sendo criado para que todo e

qualquer cineastra, de qualquer país, pudesse ter sua arte exposta e competindo.

Os cineastra tiveram força e voz em maio de 1968 para se juntar as manifestações

da época. Cannes é um local de celebrar o cinema mas também de se discutir sobre

o mundo. Acredito, portando, que a partir das análises, constatou-se parte desse

sentimento de liberdade, inovação, audácia nos cartazes. Como nas obras de 1974

e 1975 com seus temas surrealista flertando com o onírico, com o intrigante. Ou

mesmo nos cartazes de 1976 e 1977 que trazem aspectos quase renascentistas e

demonstram esse espírito de passagem, de um novo momento depois do Pós-guer-

ra, de liberdade e de busca de direitos, tão presente em outras obras dos 1960 e

1970.

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APÊNDICE A — TABELA DE ANÁLISE CARTAZ DE 1974

A seguir está na íntegra, como exemplo, a análise do cartaz de 1974, feita a partir das tabelas de análise.

Ano: 1974

Análise do Registro Visual

Signos Plásticos

Denotação Conotação

Linhas e formas Próximo ao centro da imagem temos uma

linha do horizonte separando céu e mar.Um pouco abaixo uma linha ondulada delimita o espaço das cadeiras, dali até a parte inferior do cartaz, formando um retângulo.As cadeiras têm formas arrendondadas, e as linhas que formam seu topo estão interlaçadas.

A frente, as linhas criam um trapézio que formam a figura de um torço humano.A posição dos braços e mãos do torço humano formam um triângulo.

Acima do torço, no centro do cartaz, está uma forma circular, com círculos concêntricos, este é o olho.

Saindo do círculo, nas diagonais, duas linhas curvas criam uma forma de “v” ou “u”, e completam seu caminho com mais curvas criando a forma de asas.

Linhas horizontais sustentam o texto no topo do cartaz.

As linhas criam os limites, formando retângulos, dos planos e nos ajudam a criar a sensação de perspectiva linear no qual temos céu ao fundo, depois o mar e depois as cadeiras e por fim a figura humana no plano mais próximo.

As formas geométricas que as figuras criam ajudam a diferenciar o olhar para o centro da imagem. O trapézio tem sua base maior na parte inferior da imagem e afina em direção ao centro. As mãos formando um triângulo também direcionam para o centro. As asas se encontram, ou saem do olho, criam mais linhas imaginárias que nos levam nessa direção.

Por fim a própria forma do olho, com círculos concêntricos, nos levam mais a esse ponto do cartaz.

Enquadramento O cartaz exibe o recorte de uma cena.

Não há bordas, parte da ilustração sangrapara fora do cartaz.

Podemos dizer que a figura do torço humano e o olho estão em um plano americano, ou seja, a figura não é mostrada na sua totalidade, apenas da cintura para cima. E é enquadrada de maneira que é possível visualizar o fundo.

O uso do plano americano nos aproxima da figura permitindo ver os detalhes da roupa, das mãos, do olhos, das asas. Nosfaz encarar o olho e a figura humana, e faz com que essa imagem nos encare também.

EquilíbrioA mancha gráfica de texto no topo do Na vertical o cartaz é simétrico, o que

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cartaz, com a primeira linha ocupando de uma ponta a outra, e as outras alinhas ao centro, abaixo da primeira.

Se olharmos pela horizontal, vemos que alinha do horizonte ajuda a dividir o cartaz próximo ao seu centro. Para cima temos amaior parte do olho com as asas, e o textono topo, tudo no fundo azul do céu. Há menos elementos nessa parte do cartaz, mais espaços “vazios”. A parte de baixo é preenchida com poltronas de cinema bem como o torço de um homem a frente. Há portanto uma assimetria nesse sentido.

Se pensarmos o cartaz pelo eixo vertical podemos ver que há simetria. Centralizados ao centro estão a figura humana, com o olho acima, a asa que sai do olho tem sua contraparte de forma simétrica do lado oposto. As cadeiras de cinema também tem sua contraparte no lado oposto.

ajuda a concentrar nossa atenção na figura central da imagem.

Na horizontal há contrastes no fundo, entre céu e as cadeiras. O olho e as asas têm como fundo o céu, uma cor uniforme, que ajuda a destacar criando um peso visual diferente entre a parte superior, quetem mais respiro, menos elementos, e a inferior com mais elementos.

CorDa ponta superior até a metade do cartaz temos o céu em azul. Na ponta superior tem-se uma azul-escuro, saturação médiae luminosidade baixa. Conforme descemos nosso olhar para o centro do cartaz, percebemos que esse azul muda para tons mais claros vai ganhando luminosidade, até um azul bem claro, se aproximando ao branco.

Logo após, a linha que separa céu e mar é de volta um azul mais escuro, de saturação e luminosidade média, que volta a ficar mais claro conforme descemos o olhar. Há também no mar, formando as ondas, a cor branca.

As poltronas estão num tom de vermelho, com uma saturação média pra alta e uma luminosidade média.

O olho tem sua parte mais externa em branco, seu interior é azul-claro e o centronegro. As asas são num tom de amarelo dourado que vai perdendo saturação e ganhando luminosidade.

Por fim, o corpo humano veste uma roupaazul, com uma camisa amarela, com tons de dourados em alguns pontos, e gravata vermelha com listras pretas.

Céu e mar estão em azul, para trazer o fresco do oceano de um dia ensolarado, mas também para contrastar com vermelho das cadeiras em primeiro plano.

Depois o azul é retomado no paletó e o vermelho na gravata. As cores são usadas de forma contrastante diferenciando cada plano, e se repetem pela imagem, mesmo em objetos e planosdiferentes. Como, por exemplo, a cor amarelo dourado das asas também tem um tom parecido na camisa por baixo do paletó.

Textura

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As asas por sua coloração dourada e por como a luz ilumina o material criando pontos de luz, sugerem um material metalizado, ouro, ou folhado a ouro. Embora não fique tão explícito. Apesar das penas serem distribuídas com um certo padrão de forma a criarem uma sensação orgânica, têm linhas grossas e que criam uma sensação estática de dureza.

O olho tem uma superfície lisa e o ponto de luz próximo ao centro sugere que é reflexiva.

As poltronas também se mostram lisas e em algumas delas podemos perceber em suas bordas um brilho, sugerindo que, pelo menos as bordas, tem um material reflexivo. O centro das poltronas parecem mais fosca.

A luz e sombra nas roupas mostram partes lisas e outras enrugadas. Existe uma certa luminosidade, mas o paletó parece mais fosco quando comparado à gravata, que apresenta pontos de luz refletidos, e que portanto simula um material mais reflexivo, como a seda.

A superfície metálica dourada das asas trazem certo luxo, ou nobreza. Bem como a superfície brilhosa da gravata que lembra seda e traz elegância a vestimenta da figura.

As poltronas são lisas e iguais, não ranhuras ou riscos, indicando que são novas.

Signos icônicos

Denotação Conotação

Representações icônicas

Céu e mar representando um lugar costei-

ro.

Olho com asas.

Cadeiras vermelhas

Homem de paletó

A representação de céu e mar localiza o evento do cartaz num cidade de costa, de praia, em Cannes.

O cartaz tem uma ilustração surrealista que coloca cadeiras de cinema ao ar livre,em frente ao mar. Sugere então que o cartaz divulga algo relacionado a cinema.

A figura humana, de terno, pode sugerir a importância, o requinte, ou a seriedade daocasião. Que sabemos se tratar de uma premiação.

A ideia de premiação pode estar contida nas asas, que por sua cor dourada, nos remete ao dourado de troféus. E ao mesmo tempo pode ser uma indicação deliberdade, de voo da imaginação, condizente com certos temas de cinema ecom o mundo surreal que exibe o cartaz.

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Por fim o olho pode ser relacionado a lente da câmera de filmagem, representa o “visual” do audiovisual.

É possível concluir portanto que a forma como os elementos da imagem foram configurados, nos colocam no lugar de sermos vistos pelo “Olho indivíduo do cartaz”. Ele nos observa de sua sala de cinema a beira mar.

Análise do registro verbal

Denotação Conotação

Tipo, fonte e família O texto está todo na fonte Avant Guard,

um tipo sem serifa geométrico. Está todo o texto em caixa alta e com um espaçamento muito próximo. A exceção fica em “du 9 au 24 mai” que está em caixa baixa e em um tamanho menor.O texto está centralizado, acompanhando a simetria da imagem.

A forma geométrica da Avant Guard combina com a simetria e as formas geométricas do olho e dos blocos que compõem a ilustração.As tipografias geométricas são normalmente associadas com rigidez e impessoalidade.

O texto está bem visível, mas não está ali para concorrer com a ilustração. O destaque do cartaz é a ilustração.

Conteúdo

Síntese

O cartaz do festival de Cannes de 1974 traz logo no topo o nome do festival e

as informações de data grafados numa tipografia geométrica sem serifa e em caixa

alta, com as datas “du 9 au 24 mai” fazendo em caixa baixa e tamanho menor. A fon-

te geométrica apresenta certa impessoalidade, está ali para apresentar a informação

e não para concorrer com a ilustração, que é o destaque e chama mais atenção no

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cartaz. É possível que seja por isso também, que o texto tenha sido deslocado para

o topo, dando mais espaço continuo para o resto da imagem.

Do topo a metade temos um quadrado que forma o céu, que desce de um tom

escuro de azul até um bem claro, e com bastante luminosidade, quase branco. Logo

baixo o azul retoma uma cor mais escura e saturada com detalhes em branco, que

ilustram as ondas, é o mar. Este é o plano de fundo da imagem, uma praia com on-

das de um dia ensolarado, é possivelmente a forma do cartaz nos dar a informação

de como é o local do evento que está divulgando.

No plano seguinte temos objetos arredondados e vermelhos, enfileirados e

justapostos, são cadeiras de cinema. Para além do que podemos ler no topo do car-

taz, o cartazista está nos localizando numa sala de cinema a beira mar. De certa for-

ma está reforçando o texto por meio da imagem.

Logo a frente, num plano americano, que vemos metade do corpo do indiví-

duo, temos um toque de surrealismo, pois encontramos um homem sem cabeça

com um olho alado no lugar desta. A figura humana vesta um paletó azul, gravata

vermelha e preta, com uma camisa amarelo dourado por baixo. As cores são todas

semelhantes ao que se encontram no resto do cartaz, mas pela forma que foram in-

tercaladas, criam contraste. O azul do paletó rima com o azul do mar, o vermelho da

poltrona com a gravata, o amarelo da camisa com o dourado das asas.

A figura do homem está centralizada, há uma simetria e um equilíbrio no car-

taz quando verificamos isso olhando do centro para os lados. E no centro dessa si-

metria temos o olho. Nosso olhar é naturalmente atraído primeiramente pelo olho.

Está no centro, hipnotizante, e mesmo as linhas laterais que formam o trapézio do

torço humano, levam na direção do olho. As mãos e cotovelos postas a formar um

triângulo, direcionam a ponta deste para o centro do cartaz. As asas douradas saem

de traz do olho para formar um “v” que mais uma vez acaba por redirecionar nossa

percepção para o centro. Além disso as asas talvez representem duas coisas: o voo

do olhar dentro de um mundo imaginário do cinema; e/ou também a própria premia-

ção com sua textura dourada, como a de um troféu.

Podemos relacionar o olho com o “visual” do audiovisual, ou com a câmera ci -

nematográfica. Mas percebamos aqui, que está câmera está nos olhando de volta. O

consumidor do cartaz é colocado no lugar da tela desse cinema a beira-mar.

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Relação com outros cartazes de Cannes:

O cartaz de 1974 como os outros cartazes apresenta a necessidade de locali-

zar o evento em Cannes. Além disso, certos signos como o olho e as poltronas de ci-

nema, também são uma forma de contextualizar o cartaz como algo relacionado a

filmes.

Relação com outros cartazes:

Podemos verificar tendências surrealistas em outros cartazes de cinema da

época (Figura 1).

Figura 1 – Cartazes “M.A.S.H.” (1970), “The Discreet Charm of the Bourgeoisie”

(1974) e “Nashville” (1976)

O autor do cartaz, Georges Lacroix, também fez um cartaz para a versão fran-

cesa do disco Loose Ends de Jimi Hendrix (Figura 2).

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Figura 2 – Disco Loose Ends, Jimi Hendrix.