aneurismas da porção cavernosa da artéria carótida interna causando ataques isquêmicos...

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Aneurismas da porção cavernosa da artéria carótida interna causando ataques isquêmicos transitórios: relato de caso de revisão da literatura. Pontes-Neto OM, Cougo-Pinto PT, Tomaselli PJ, Fabio SC, Abud D INTRODUÇÃO Ataques isquêmicos transitórios (AIT) são eventos clínicos breves de disfunção neurológica decorrentes de isquemia cerebral ou retiniana, geralmente com duração <1h, e sem evidência de infarto agudo. (1) Pacientes com AIT tem alto risco de acidente vascular cerebral subseqüente, de até 17,8% em 90 dias (2), o que torna mandatória uma investigaçào em tempo hábil. Entretanto, o diagnóstico etiológico pode algumas vezes ser obscuro. Nestes casos, causas não usuais devem ser lembradas. OBJETIVOS Relatamos o caso de uma paciente com AAIITT recorrentes de etiologia inicialmente indefinida, e de diagnóstico final inusitado. Foi realizada revisão de literatura a fim de encontrar relatos ou séries de caso similares. RELATO DE CASO Uma mulher de 53a., previamente dislipidêmica, foi admitida na unidade de emergência um dia após um episódio de 20 minutos de duração de paresia à direita, disartria, e uma sensação de que não enxergava com o olho direito. À admissão, estava em bom estado clínico, com PA de 110/70mmHg, sem anormalidades ao exame cardiovascular. O exame neurológico mostrava um reflexo patelar exaltado e uma queda pronada discreta, à direita, achados ausentes após 48 horas. Tomografia computadorizada de crânio, eletrocardiograma, ecocardiograma transtorácico, e ultrassom de artérias carótidas foram normais. Em uso prévio de AAS 100mg ao dia, foram iniciado clopidogrel 75mg e atorvastatina 80mg ao dia, e ela foi encaminhada para maior investigação ambulatorial. No dia seguinte, a paciente retornou após outro evento, com os mesmos sintomas, por 30 minutos. Nova tomografia de crânio foi normal. Ecocardiograma transesofágico não mostrou anormalidades. Uma ressonância magnética e angioressonância mostraram alterações de sinal sutis na artéria carótida interna (ACI) esquerda, na sua porção cavernosa, com sinal sutil extraluminal e irregularidade luminal adjacente, e anormalidades da ACI cavernosa foram observadas na seqüência de T2. Estes achados levaram a realização de uma arteriografia cerebral, que confirmaram a presença de dois aneurismas arteriais da ACI esquerda. Embolização dos aneurismas foi realizada, com posicionamento de endoprótese arterial no segmento subjacente. DISCUSSÃO A embolia de material trombótico advindo de aneurismas intracranianos causando acidente vascular cerebral (AVC) é um fenômeno reconhecido (3). A maior série de casos publicada mostrou 9 casos entre 269 pacientes com aneurismas intracranianos não-rotos (3,3%)(4). Tendo em vista que estudos epidemiológicos mostram uma prevalência de aproximadamente 2% de aneurismas não-rotos na Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo. Conclusão Aneurismas arteriais intracranianos são fonte reconhecida de isquemia embólica, mas sua relevância possivelmente está subestimada. Em pacientes com eventos isquêmicos obscuros, esta possibilidade deve ser considerada, dada a prevalência significativa de aneurismas arteriais intracranianos não-rotos na população geral em todas as idades. References 1. Easton JD et al. Definition and Evaluation of Transient Ischemic Attack: A Scientific Statement for Healthcare Professionals From the American Heart Association/American Stroke Association Stroke Council. Stroke. 2009;40;2276-2293 2. Johnston SC et al.Validation and refinement of scores to predict very early stroke after transient ischaemic attack. Lancet 2007;(369) 9558: 283-92 3.Sutherland et al. Platelet interaction within giant intracranial aneurysms. J Neurosurg, 1982; 56, 53– 61. 4.Qureshi et al. Ischemic events associated with unruptured intracranial aneurysms: multicenter clinical study and review of the literature. Neurosurgery. 46(2):282, February 2000 5.Rinkel GJ et al. Prevalence and Risk of Rupture of Intracranial Aneurysms : A Systematic Review. Stroke. Jan 1998; 29: 251 - 256. Angiorressonância-TOF e ressonância seqüência T2 mostrando alterações de sinal da ACI esquerda Arteriografia cerebral: identificação e exclusão dos dois aneurismas (8mm e 3mm)

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Page 1: Aneurismas da porção cavernosa da artéria carótida interna causando ataques isquêmicos transitórios: relato de caso de revisão da literatura. Pontes-Neto

Aneurismas da porção cavernosa da artéria carótida interna causando ataques isquêmicos transitórios: relato de caso

de revisão da literatura.

Pontes-Neto OM, Cougo-Pinto PT, Tomaselli PJ, Fabio SC, Abud D

INTRODUÇÃOAtaques isquêmicos transitórios (AIT) são eventos clínicos

breves de disfunção neurológica decorrentes de isquemia cerebral ou retiniana, geralmente com duração <1h, e sem evidência de infarto agudo. (1) Pacientes com AIT tem alto risco de acidente vascular cerebral subseqüente, de até 17,8% em 90 dias (2), o que torna mandatória uma investigaçào em tempo hábil. Entretanto, o diagnóstico etiológico pode algumas vezes ser obscuro. Nestes casos, causas não usuais devem ser lembradas.

OBJETIVOSRelatamos o caso de uma paciente com AAIITT recorrentes de

etiologia inicialmente indefinida, e de diagnóstico final inusitado. Foi realizada revisão de literatura a fim de encontrar relatos ou séries de caso similares.

RELATO DE CASOUma mulher de 53a., previamente dislipidêmica, foi admitida na

unidade de emergência um dia após um episódio de 20 minutos de duração de paresia à direita, disartria, e uma sensação de que não enxergava com o olho direito. À admissão, estava em bom estado clínico, com PA de 110/70mmHg, sem anormalidades ao exame cardiovascular. O exame neurológico mostrava um reflexo patelar exaltado e uma queda pronada discreta, à direita, achados ausentes após 48 horas. Tomografia computadorizada de crânio, eletrocardiograma, ecocardiograma transtorácico, e ultrassom de artérias carótidas foram normais. Em uso prévio de AAS 100mg ao dia, foram iniciado clopidogrel 75mg e atorvastatina 80mg ao dia, e ela foi encaminhada para maior investigação ambulatorial. No dia seguinte, a paciente retornou após outro evento, com os mesmos sintomas, por 30 minutos. Nova tomografia de crânio foi normal. Ecocardiograma transesofágico não mostrou anormalidades. Uma ressonância magnética e angioressonância mostraram alterações de sinal sutis na artéria carótida interna (ACI) esquerda, na sua porção cavernosa, com sinal sutil extraluminal e irregularidade luminal adjacente, e anormalidades da ACI cavernosa foram observadas na seqüência de T2. Estes achados levaram a realização de uma arteriografia cerebral, que confirmaram a presença de dois aneurismas arteriais da ACI esquerda. Embolização dos aneurismas foi realizada, com posicionamento de endoprótese arterial no segmento subjacente.

DISCUSSÃOA embolia de material trombótico advindo de aneurismas

intracranianos causando acidente vascular cerebral (AVC) é um fenômeno reconhecido (3). A maior série de casos publicada mostrou 9 casos entre 269 pacientes com aneurismas intracranianos não-rotos (3,3%)(4). Tendo em vista que estudos epidemiológicos mostram uma prevalência de aproximadamente 2% de aneurismas não-rotos na população geral (5), que a parcela de acidentes vasculares cerebrais criptogênicos é significativa, e que limitações de recursos diagnósticos impedem uma avalição exaustiva em grande parte dos casos na prática geral, então a real importância de isquemias embólicas de aneurismas intracranianos como causa de AIT e AVC pode estar subestimada. Fica claro por este caso o benefício de uma investigação precoce e profilaxia apropriada.

Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da

Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo.

ConclusãoAneurismas arteriais intracranianos são fonte reconhecida de

isquemia embólica, mas sua relevância possivelmente está subestimada. Em pacientes com eventos isquêmicos obscuros,

esta possibilidade deve ser considerada, dada a prevalência significativa de aneurismas arteriais intracranianos não-rotos na

população geral em todas as idades.

References1. Easton JD et al. Definition and Evaluation of Transient Ischemic Attack: A Scientific Statement for Healthcare Professionals From the

American Heart Association/American Stroke Association Stroke Council. Stroke. 2009;40;2276-22932. Johnston SC et al.Validation and refinement of scores to predict very early stroke after transient ischaemic attack. Lancet 2007;(369) 9558:

283-923.Sutherland et al. Platelet interaction within giant intracranial aneurysms. J Neurosurg, 1982; 56, 53–61.4.Qureshi et al. Ischemic events associated with unruptured intracranial aneurysms: multicenter clinical study and review of the literature.

Neurosurgery. 46(2):282, February 20005.Rinkel GJ et al. Prevalence and Risk of Rupture of Intracranial Aneurysms : A Systematic Review. Stroke. Jan 1998; 29: 251 - 256.

Angiorressonância-TOF e ressonância seqüência T2 mostrando alterações de sinal da ACI esquerda

Arteriografia cerebral: identificação e exclusão dos dois aneurismas (8mm e 3mm)