andrade oswald de revista de antropofagia

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  • Introdu~ao de " \u1-!usto de C~lIllpOS I ccsp B ib ioleca S ... r~lo M III. t

  • 'v

    Esta edi~io fae-similar da "Revista de Antropotagia" e uma eontribiJi~io das empresas Editora Abril Ltda. e da Metal Leve SI A. - assinalando os seus 25 anos de atividades para melhQr eOI)heeimento . de uma das mais importantes fases da eultura literaria brasileira. Sio Paulo, 1975

    Jmpresso na Abril SI ~ Cultural e Industrial.

  • REVISTAS RE-VISThS: OS ANTROPOFAGOS

    "Cette brallche trap negligee de /'a1l/hropophagie lie se meurt poi lit, I'mltlzropopJtagie lI 'est poillt mort.e." (Alfred larry, "Amhropophagie", 1-3-1902 ) "Para comer meus prOp nos semelhallt.es His-me sentado Ii mesa." (Augusto dos Alljos, Eu, 1912)

    A UGUSTO DE CAMPOS

    I Das revistas ligadas ao Modernismo, as mais caracteristicas e repre-sentativas foram KLAXO e a REVISTA DE ANTROPOFACIA, ambas publicadas ern Sao Paulo. Tivemos ern 1972 a reedic;ao de KLAXON, reproduzindo fascsimilar-mente, corn capas e cores, os nove numeros originais, que apareceram entre maio de 1922 e janeiro de 1923. Da REVISTA DE ANTROPOFAGIA, ate aqui a mais desconhecida, e sem duvida a mais revolucionaria do nosso Modernismo, nao havia esperanc;a de republicac;ao. Jose Luis Caraldi - garimpador dessas raridades - descobriu uma colec;ao quase completa da revista, que fora de Tarsila, agora pertencen te a Oswaldo Estanislau do Amaral Filho, sobrinho da grande pintora . Faltava apenas uma pagina do "Diario de Sao Paulo", que a sorte fez cair nas maDs de Garaldi e com a qual foi completada a coletanea. Dai nasceu a ideia de repor em circulac;ao esses documen tos explosivos da nossa hist6ria Ii teraria ( viva ), reproduzindo-os , tal como se fez corn KLAXON, ern sua sabo-rosa fisionomia original. E 0 que 0 lei tor tern agora em maos. Pediram-me que escrevesse uma introduc;ao ao volume. Acabou saindo mais longa do que eu imaginava, e mais apaixonada. Sinal, quando menos, de que os nossos "antrop6fagos" continuam a interessar, e de que a "antropofagia" realmente nao esta morta .

  • 2 A . . f' KLAXON Graficamente a mais bela das revistas do pnmelra 01 , d Modernismo, com seus tipos decorativos, sua numera~ao"g~~u a ~ 0 choque visual de suas capas e contracapas: 0 enormc A vertIcal vertebralizando as palavras. Espantosamente fnigil , in genua, amadoristica . Urn primeiro toque-de-reunir modernista, no ambiente hostil da epoca, apos a bravura da Semana. Mas tambem urn salve-se-quem-puder modernoso, on de a maior parte naufraga em ondas subfuturistas ou pos-impressionistas _ ressaca internacional de arte moderna . Os melhores poemas de KLAXON estao na quarta-capa : os anuncios espaciais Coma Lacta, Guarana Espumante e os criativos pseudo-an un-cios de Pantosopho, Panteromnium & Cia , proprietarios da Grande Fabrica Internacional de Sonetos, Madrigais , Baladas e Quadrinhas .

    . Dentro, ha os poemas prometedores de Luis Aranha. Os de Mario de Andrade, ainda incipientes, cheios de tiques, retoricos. De Oswald, nem ha colabora~ao poetica. Urn trecho de A Estrela de Absinto e algumas notas, "Escolas & Ideias", esbo~o ainda imaturo da linguagem dos manifestos posteriores. 0 resto - que fazer ? - era 0 resto. Gui-lherme. Menotti. Serge Milliet. Colabora~ao internacional do 2. ou 3.0 time europeu: Nicolas Bauduin , Guillermo de T orre, Antonio Ferro e uns franceses , belgas e italianos que ninguem sabe mais quem sao. Escassez de materia-prima num terreno movedi~o onde, entre outras ervas, ate poema de Plinio Salgado dava. Ruim , e claro. Confusao teorica. 0 "Balan~o de Fim de Seculo" de Rubens Borba de Moraes ( no n.o 4 ) mistura , numa mesma salada , cubistas, dadaistas, futuristas, unanimistas, bolchevistas e espiritas. Critica impressionista ( e indulgente). De uma resenha de Mario sobre A Mulher que Pecou de Menotti: "Mais urn livro do nosso admiravel colaborador. ( ... ) 0 novo livro de Menotti del Picchi a assim julgamos: Dos me1hores da literatura brasileira. ( .. . ) A Figura de Nora e uma Figura humana. Move-se como poucas outras da fic~ao nacional. ( ... ) Como lingua: virilidade, expressao, beleza . Imagens luxuriantes . Repeti~6es. Adje-

    tiva~ao sugestiva. Descri~6es magnificas. Poesia. ( ... ) Menotti del Picchia e urn artista ." Urn modernismo mitigado, tolerante, nao isento de compromissos com a linguagem convencional e com os valores da tradi~ao . "Sabe 0 que e para nos ser futurista ? E ser klaxico", ja ironizava Oswald . 0 mani -festo do 1.0 numero prometia. Mas de que adiantava Mario de An-drade preferir Perola White a Sarah Bernhardt, se ele continuava perdendo tempo com Guiomar Novaes ("E meu dever explicar porque considero a senhorinha Novaes uma pianista romantica .")? Claro que os nossos modernistas da primeira hora - considenido 0 contexto desinformado e provinciano - podem ser olhados com maior brandura. Mas se estou enfatizando, com crueza , aspectos negativos da produ~ao modernista no primeito e significativo periodico dos mo-

    ~os da Seman a de 22 , e exatamente para que se possa entender a posi~ao critica que, em rela~ao aos seus proprios companheiros, assu-mirao, mais adiante, Oswald e os "antropofagos" mais radicais.

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    3 REVISTA DE ANTROPOFAGIA. Duas fases C'denti~oes" ) nitida-mente distintas. A primeira, revista mesmo, em formato de 33 por 24 em, com modestas 8 paginas : 10 numeros, editados mensalmente, de maio de 1928 a fevereiro de 1929, sob a dire~ao de Antonio de Alcantara Machado, gerencia de Raul Bopp. Depois, veio a nova fase (a da 2.a denti~iio, como esclarecia 0 subtitulo) da revista, agora limi-tada a uma pagina do "Dilirio de Sao Paulo", cedida aos "antrop6-fagos" por Rubens do Amaral, que chefiava a reda~ao do jornal na epoca. Foram 16 paginas, publicadas com certa irregularidade, mas quase sempre semanalmente, de 17 de mar~o a 1.0 de agosto de 1929 (a 16.a pagina saiu, por engano, com 0 mesmo numero da anterior). Nos quatro primeiros numeros, alem do subtitulo, a indica~ao: 6rgiio do clube de antropofagia. A partir do 5.: 6rgiio da antropofagia bra-sileira de letras . Na I.a denti~ao, a revista esta ainda marcada por uma consciencia ingenua nao muito distante da que informou 0 modernismo klaxista, apesar dos seis anos decorridos. Raul Bopp depoe depois ( 1966): "A antropofagia, nessa fase, nao pretendia ensinar nada. Dava apenas li~oes de desrespeito aos canastroes das Letras. Fazia inventario da massa falida de uma poesia bobalhona e sem significado."

    ~ verdade que la esta, no primeiro numero, 0 genial Manifesto An-trop6fago de Oswald, que junto com 0 Manifesto da Poesia Pau Brasil, publica do dois anos antes, resulta na formula~ao mais consistente que nos deixou 0 Modernismo. Mas Oswald ja estava quase sozinho. Nos 10 numeros da revista, 0 unico texto que se identificava plenamente com as ideias revolucionarias do manifesto, era A "Descida" Antro-p6faga, artigo assinado por Oswaldo Costa, igualmente no n .O 1. Urn "double" de Oswald ( ate no nome ) que diz : "Portugal vestiu 0 selva-gem. Cumpre despi-lo. Para que ele tome urn banho daquela "inocen-cia contente" que perdeu e que b movimento antrop6fago agora lhe restitui. 0 homem (falo do homem europeu, cruz credo! ) andava buscando 0 homem fora do homem. E de lantema na mao : filosofia. ( ... ) N6s queremos 0 homem sem a duvida , sem siquer a presun~ao da existencia da duvida: nu, natural , antrop6fago." E lan~a urn dos "slogans" do movimento : "Quatro seculos de carne de vaca! Que horror!" Comparar as incisivas tomadas de posi~ao dos dois Oswaldos com a "nota insistente" publicada "no rabinho do primeiro numero da Re-vista" e assinada por Alcantara Machado e Raul Bopp :

    "Ela ( a "Revista de Antropofagia") esta acima de quaisquer grupos ou tendencias; Ela aceita todos os manifestos mas nao bota manifesto; Ela aceita todas as criticas mas nao faz critica; Ela e antrop6faga como 0 avestruz e comilao; Ela nada tern que ver com os pontos de vista de que por acaso seja veiculo .. A "Revista de Antropofagia" nao tern orienta~ao ou pensamen-to de especie alguma : s6 tern estomago. "

  • Estomago resistente. A ponto de abrigar, sem aparente indigestao, de Plinio Salgado a Yan de Almeida Prado. . . Claro que Oswald e os "antrop6fagos" radicais, que, logo mais, na 2.a denti~ao, refugariam a Anta, opondo-lhe a imagem do Tamandua ("Por isso nao queremos anta, queremos tamandua. 0 nosso bicho e 0 tamandua bandeira . Nossa ban de ira e 0 tamandua. Ele en terra a lingua na terra , para chupar 0 tutano da terra. As formigas grudam na lingua dele, mor-dendo, queimando. Ele engole as formigas .") nao iriam se conformar com essa deforma~ao da imagem do antrop6fago - 0 avestruz, ave de apetite onivoro e estomago complacente e, alias, estrangeira . . . Emblematica da politica cultural da. revista, nessa primeira fase, a imagem do avestruz mostra como a Antropofagia - excetuados os casos de Oswald e Oswaldo - era tomada no seu sentido mais super-ficial pela maioria, nao ultrapassando, no mais das vezes, a ideia da "cordial mastiga~ao" dos adversarios ostensivos do Modernismo. E 0 que explica a assimila~ao indiscrirninada de autores que nada tern a ver com os pressupostos da Antropofagia, ' enquanto movimento. 0 que faz, por exemplo, no n.O 5, urn sr. Peryllo Doliveira, da Paraiba, com seu peda~ de poem a "A Voz Triste da Terra" ("Mas agora meu Deus e impassivel voltar!")? 0 que faz Augusto Frederico Schmidt com 0 poema penumbrista "Quando eu Morrer", no n.O lO? Estomago de avestruz! Mas a despeito da indefini~ao te6rica e poetica, a REVISTA DE AN-TROPOFAGIA nao deixou de contribuir, mesmo nessa primeira fase , como veiculo - 0 mais importante da epoca - para a evolu~ao da linguagem do nosso Modernismo. Nao bastasse 0 Manifesto de Os-wald, associ ado ao bico-de-pena de Tarsila ( uma replica do "Abaporu" ou Antrop6fago, urn dos seus mais notaveis quadros), la estao: 0 fragmento inicial de Macunafma ( n .o 2) , 0 radical "No Meio do Caminho" de Drummond (n.o 3), que reaparece, epigramatico, com "Anedota da Bulgaria", no n.o 8; "Sucessao de Sao Pedro", do melhor Ascenso Ferreira ( n.o 4 ) ; "Noturno da Rua da Lapa" de Manuel Bandeira ( n.o 5) ; "Republica", de Murilo Mendes (n.o 7) , entao bern impregnado de "pau brasil" e bastante a vontade numa revisao desabusadamente poetica e crltica da nossa hist6ria , iniciando a serie que ira integrar 0 volume de poemas Hist6ria do Brasil (1932 ), la-mentavelmente excluido da edi~ao Poesias (1922-55), em 1959. E algumas das primeiras produ~oes de Raul Bopp (Jac6 Pim-Pim), Jorge de Lima, Augusto Meyer e outros. Curiosidades: poemas de Josue de Castro e Luis da Camara Cascudo, cronica de Santiago Dantas. o que ha de mais afinado com 0 espirito irreverente da Antropofagia, em sua face mais autentica e agressiva, e a se~ao Brasiliana, que apa-rece em todos os numeros, e onde se reunem, a maneira do "sottisier" de Flaubert, noticias de jornais, trechos de romances, discursos , car-toes de boas festas, anuncios, circulares - textos "ready made" que denunciam a amena polui~ao da imbecilidade atraves da linguagem cotidiana e convencional. Como 0 anuncio compilado no n .o 3, verda-deiro poema-"trouve":

    "A CRUZ DA TUA SEPULTURA EN CERRA UM MISTE-RIO - Valsa com letra; foi esc rita junto a uma campa. Ven-de-se a rua do Teatro, 26."

  • Alcantara Machado tern, na revista, aproximadamente, 0 papel de Mario em KLAXON. Os editoriais e as resenhas de livros ficam a seu cargo. Disso ele se desincumbe com muita agilidade e certa grac;a, mas na base de urn gosto-nao-gosto que, se tern mais acertos do que erros, nem por isso ultrapassa 0 plano da disponibilidade subjetiva, dentro de uma generica defesa do "moderno". Urn Mario de Andrade folclorizante comparece, ainda, com 0 poema "Lundu do Escritor Di-ffcil" e pesquisas mUsico-regionais. Sintoma da progressiva irritac;ao de Oswald - que, no n,o 5, ja pole-miza com Tristao de Ataide em torno do Cristianismo - e a publica-c;ao do seguinte aviso no n.o 7 :

    SAl BAM QUANTOS Certifieo a pedido verbal de pessoa interessada que 0 meu paren-te Mario de Andrade e 0 pior crftico do mundo mas 0 melhor poeta dos Estados Desunidos do Brasil. De que dou esperan9a.

    JOAO MIRAMAR A irritac;ao viraria descompostura na 2 .a dentic;ao da revista, que brota com dentes muito mais afiados na pagina dominical do "Diario de Sao Paulo" de 17-3-29, urn mes depois de se extinguir a primeira serie .

    4 2 .a Denti9iio . A fase em que a Antropofagia vai adquirir os seus defi-nitivos contornos como Movimento. Raul Bopp permanece, revezan-do-se na direc;ao corn Jaime Adour da Camara. Geraldo Ferraz e 0 Secretario da Redac;ao ("Ac;ougueiro", na terminologia antropofagica ). Com Oswald de Andrade e Oswaldo Costa a rente, os "antropofagos" descarregam todas as suas baterias, sob nome proprio ou atraves de urn diluvio de pseudonimos mais ou menos botocudos ou troeadilhes-cos : Cunhambebinho, Odjuavu, Japi-Mirim, Freuderico, Jaboti , Braz Bexiga, JUlio Dante, Cabo Machado, Tamandare, Pinto Calc;udo, Po-ronominare, Guilherme da Torre de Marfim, Cunhambebe, Coroinha, Menelik ( 0 morto sempre vivo) , Marxilar, Piripipi, Tupinamba, Pao de Lo, Le Diderot, Jaco Pum-Pum, Seminarista Voador e outros . Dcs-tes, sabe-se segura mente que Tamandare, que assinava os terriveis Moquens, era Oswaldo Costa. Pinto Calc;udo ( personagem do Sera-fim ), Freuderico ( Freud + Frederico Engels ou Nietzsche? ), Jaco Pum-Pum ( 0 Pim-Pim era Raul Bopp) tern todo 0 jeito de Oswald. Transferindo-se para a pagina de jornal, a REVIST A DE ANTRO-POFAGIA so aparentemente empobreceu . . Ganhou dinamicidade co-municativa. A linguagem simultapea e descontinua dos noticiarios de jornal foi explorada ao maximo. Slogans, anuncios, notas curtas, a-pe-didos, citac;oes e poemas rodeiam um ou outro artigo doutrinario, fazendo de cada pagina, de ponta a ponta, uma caixa de surpresas, on de espoucam granadas verbais de todos os cantos. Urn contrajornal dentro do jornal. Mas 0 que pretendiam, afinal, os renovados "antropofagos" com 0 terrorismo literario de sua pagina explosiva?

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    Restabelecer a: linha radical e revoluciomlria do Modernismo, que ja sentiam esmaecer-se na dilui~iio e no afrouxamento. E mais do que isso. Lm~ar as bases de uma nova ideologia, a ultima utopia que Oswald iria acrescentar ao que chamaria mais tarde ,"a marcha das utopias". f: disso que tratam os artigos que atuam como "editoriais" da pagina. Alguns dos principais, sob 0 titulo De Antropofagia, datados uma ou outra vez do Ano 375 da degluti~iio do Bispo Sardinha, a maneira do

    - Manifesto Antrop6fago. Os Moquens, de Tamandare COswaldo Cos-ta). E outras interven~oes expHcitas ou implfcitas de Oswald e Oswaldo. A Antropofagia niio quer situar-se apenas no plano literario. Ambi-ciona mais. "A descida antropofagica niio e uma revolu~ao literaria. Nem social. Nem poHtica. Nem religiosa. Ela e tudo isso ao mesmo tempo." CN.o 2 - De Antropofagia). Condenando "a falsa cultura e a falsa moral do ocidente", os "antropofagos" investem contra os espiritualistas, os metafisicos, e os nacionalistas de inspira~ao fascista, mas recusam tambem os extremismos da esqtierda canonica : "Nos somos contra os fascistas de qualquer especie e contra os bolchevistas tambem de qualquer especie. 0 que nessas realidades politicas houver de favoravel ao homem biologico, consideraremos born. f: nosso'" C . .. ) Como a nossa atitude em face do Primado do Espiritual s6 pode ser desrespeitosa, a nossa atitude perante 0 marxismo sectario sera tambem de combate. C ... ) Quanto a Marx, consideramo-Io urn dos melhores "romanticos da Antropofagia". CN.o 1 - De Antropo-fagia). Urn saudavel anarquismo parece animar 0 grupo, enquanto busca a defini~ao de urn novo humanismo, revitalizado pela visiio do homem natural americano. Se niio se preocupam exclusivamente com literatura, nao deixam os "antropofagos" de fazer a crftica interna do Modernismo e 0 corpo de delito de todos quantos, seguidores da primeira hora do movimento, derivaram para uma atitude moderada ou reacionaria. Disso se en-carrega sistematicamente Oswaldo Costa na serie Moqubn , dividida em: I - Aperitivo, II - Hors d'Oeuvre, III - Entradas, IV - So-bremesa, V - Cafezinho. De Hors d'Oeuvre: 0 valor do Modernismo "e puramente historico, documental, igual, num certo sentido, ao do arcadismo, do roman-tismo, do parnasianismo e do simbolismo, entretanto superior a todos eles porque ja representava, de fato, uma tentativa de liberta~ao. C . .. ) Mas niio compreendeu 0 nosso "caso", niio teve cora gem de enfrentar os nossos gran des problemas, ficou no acidental, no aces-sorio, limitou-se a uma revolu~iio estetica - coisa horrfvel - quando a sua fun~ao era criar no Brasil 0 pensamento novo brasileiro. Se 0 indio dos romanticos era 0 indio filho de Maria, 0 indio dele era 0 indio major da Guarda Nacional, 0 indio irmiio do Santissimo. 0 movimento modernista foi, assim, uma fase de transis:ao, uma simples operas:iio de reconhecimento, e nada mais. Dai a pouca ou nenhuma influencia que ele exerceu sobre os espiritos mais fortes da geras:iio. A confusao que trouxe foi tamanha que a sua sombra puder am se acomodar, numa democracia de bonde da Penha, 0 sr. Sergio Buarque de Hollanda e 0 sr. Ronald de Carvalho, 0 sr. Mario de Andrade e 0

  • sr. Gra~a Aranha , e ate 0 sr. Guilherme de Almeida ." o requisit6 rio de Hors d'Oeuvre prossegue: "ao Modernismo, movi-mento unicamente artistico, fa ltou exatamente sensibilidade arl is lica ." ( ... ) Mas 0 movimento modernista nao produziu coisa alguma? Pro-duziu . M ACUNAIMA." Rcssalvando Macullaima, "0 nOS50 Iivro d -dico, a nossa Odisseia", que "os antrop6fagos rcivindicam para si ", O swaldo Costa arremete contra a poesia dos modernistas da epoca: "a nossa poesia se Iibertou dc uns para escorregar noutros preconcei-tos. Ao inves da poesia cssencia l, 0 que temos - l1 a "escola minci ra" e nos intelectuais do nordestc influenci ados pelo sr. M,\ rio de An-drade, a cxce~ao de Jorgc de Lima e de Ascc nso Ferreira, nos quai s ponho as minhas espe ra n ~as - c pocsia de acidcntes, dc ornalOs, de detalhes, de deitos. Pensa mento novo nao cri amos." De Elltradas: "Que espirito novo trouxeram a nossa poesia, por exem-plo, Ronald dc Carva lho e Guilherme de Almcida, que 0 sr. Mario de Andrade nao se cansa dc enaltecc r, c, como, quando e porque Antonio de Alcantara Machado reformou a nossa prosa?" As tra nsi-gencias de Mario de Andrade ("mutirao dc sa bc n~a da r. Lopcs C ha-vcs" ) nao sao poupadas: "Foguetes II pocsia bobalhona dc Augusto Frederico Schmidt , peguem na madcira . Corrcspond~n cia amorosa com 0 que ha dc mais mcdiocrc na intelectu alidadc do Bras il inteiro , zumbaias a Alcantara Machado c outras bcx igas cia nossa Barra J.'uncla Iiteraria. ( . .. ) Quem c1 assificou dc fini ssimo 0 ouvido dc poeta do sr. Alberto de Oliveira , no quc, a 1i;1s , accrtou porquc 0 fa rm ac~ utico e isso mesmo - pl'Je ta de ouvido. Qucm faz di scursos ao sr. Gomes C a rdirn, credo! nao somos n6s, antrop6fagos, que grac;as a Deus lite-ratos nao somos. E 0 sr. Mari o dc Andradc, 0 ccrebro mais confu so da critica contemporanea." Pergunta fin al: "cm setc anos que resultou para n6s da Semana de Arte Moderna?" E m Cafezinho, ultimo arti go da serie de Moquens, rcsumi a-se a carga contra 0 "falso modernismo", comparado ao indio que Oswaldo T eixeira desenhara para 0 centenario dc Alcnca r : "0 indio do sr. T ei-xeira e a fotografi a fi el do falso modernismo brasilciro . Como cle de indio 56 tem a inten~ao do sr. T eixeira , 0 fa lso modcrni smo hrasilciro 56 tern 0 r6tulo." Por tras delc - conclu ia-se - csta a ACA DEMI A. E os modernistas? "Empalhados como passaros dc muscu , vi vcm agora nas es tantes academicas, purgando 0 remorso da Scmana c..I e Arte Mo-dern a." Conselho antrop6fago: "A rapaziada dcvc sc prcvenir contra a mistifica~ao. Deve reagir a pau ." E o pau comeu, brandido pelos Oswaldos c todos os scus pscuc..l unimos, contra os modernistas academizan tes. Em "Mario dc An c..Irac..l c , Alca n-tara e outras expressoes c..Ia timidez academica ou da modernic..l ac..l c ti -mida". E m Gra~a Aranha: "0 academico carioca c um homcm con-fuso e sem espirito, cuja inteligencia inutilmente sc csfor~a em atra-

    . palhar todas as no~oes conhecidas, todas as no~ocs copiadas ." E m Ald ntara Machado: "0 burgues brilhantc" ... "Ficou scndo 0 nosso

    Fran~a JUnior , como ja disse Menotti. Mas para que mais Fran ~a Ju-nior?" . . . "0 que conduziu Ald ntara na estreia foi 0 pre facio dc Pathe-Baby. Por esse caminho, ele ia bem . Traiu-se. Virou importantc. Carioca. Nao nos interessa ." Em Mario de Andrade: " 0 nosso Miss S. Paulo traduzido no masculino" ... "Salva-o 'Macunafma'~" Pro-

  • vavel evangelho de que ele se nega a consciencia. Por que?" Em Gui-lherme de Almeida, "Pierre Louis de celuloide". Em Paulo Prado, que cometeu os "absurd os incriveis de atribuir ao ouro e a luxuria todos os nossos excessos infantis." Nos espiritualistas. Em Tristao de Ataide ("Tristinho de Ataude", "Conselheiro Acacio do Modernismo") e seu Primado Espiritual ("Prima do Espiritual") . Em Tasso da Silveira e Festa "revista caracteristicamente provinciana", "vanguarda que mar-cha ~om mil precau~6es para nao estragar os sapatos. Em August~ Frederico Schmidt, "vate mistico", 0 primeiro prontuariado do "ficha-rio antropofagico". Nos verdeamarelistas. Em l\1enotti del Picchia, "Le Menotti del Piccollo", "a Tosca do nosso analfabetismo litenirio, " 0 Julio Dantas de Itapira". Em Cassia no Ricardo, "cuja ossada, desco-berta por nos, veio confirmar a existencia do hom em fossil da Lagoa Santa". Em Candido Mota Filho: " 0 candido sr. Motta Filho confunde tudo. Depois acha tudo confuso". Em Plinio Salgado, acusado de pastichar Oswald, e na sua Escola da Anta ("a Anta morreu de indi-gestao retorica") . E noutros mais . Em Ribeiro Couto, "vate consular". Em Drummond, que se solidariza com Mario, dizendo que "toda literatura nao vale uma boa amizade" ... o manifesto do Verdeamarelismo, ou da Escola da Anta , publicado no "Correio Paulistano", em 17 de maio de 1929 , e contestado no n .o 10 da revista (12-6-29 ), no artigo Uma adesao que /l ao II OS in-teressa, com implacavellucidez : "Nao! Nao queremos como os graves meninos do verdeamarelo restaurar coisas que perderam 0 sentido --a anta e a senhora burguesa , 0 soncto e a academia. " Diante do ma-nifesto desse arremedo de movimento, pretensamente vanguard ista, mas que afirmava: "Aceitamos todas as institui~oes conservadoras, pois e dentro delas mesmo que faremos a inevitavel renovaC;ao do Brasil, como 0 fez , atraves de quatro seculos, a alma de nossa gente, atraves de todas as expressoes historicas", - 0 tacape an tropofago vibrou sem piedade: "0 que lou vamos nesses cinco abnegados dedi-nhos de mao negra conservadora e uma coragem - a de se declararem sustentaculos de urn ciclo social que desmorona por todos os lados e grilos de urn passado intelectual e moral que nem na Italia esta mais em yoga! Pandegos!" ( . . . ) "Os verdeamarelos daqui querem 0 gihao e a escravatura moral, a colonizaC;ao do europeu arrogante e idiota e no meio disso tudo 0 guarani de Alencar danc;:ando valsa. Vma adesao como essa nao nos serve de nada, pois 0 "antrop6fago" nao e indio de rotulo de garrafa. Evitemos essa confusao de uma vez para sempre! Queremos 0 antrop6fago de knicker-bockers e nao 0 indio de opera.' Descontados os aspectos mais superficiais e panfletarios das investidas da 2.a dentiC;ao, e preciso reconhecer que os antropofagos puseram 0 de do na ferida do Modernismo. Que nascera comprometido, e agora, apenas engatinhando, ja se encaminhava , em rebanho, para as Aca-demias. Nem 0 "conflito fraterno" entre Oswald e Mario pode ser reduzido - como ja quiseram fazer crer - a questoes pessoais ou de suscetibilidade. Se Mario de Andrade foi talvez mais duramente ata-cado do que os outros e porque, de fato, recuou. Em 1924, no posfacio a Escrava que nao e Isaura, ele ja dizia suspeitamente : "acho que urn poeta modernista e urn parnasiano todos nos equivalemos e equipara-mos". E porque os antrop6fagos sentiam na deser~ao progressiva do

  • criador de Macunaima - a epopeia antropofagica que eles admiravam a ponto de querer "confisca-Ia para si" - uma perda bern maior do que as outras . . . Em suma, Oswald e sua tribo de antrop6fagos se insurgiram contra a descaracterizac;ao e a diluic;ao da revoluc;ao mo-dernista . Podem ter-se excedido numa ou noutra tacapada. Mas esta-yam cheios de razao. A despeito do predominio dos artigos e notas de briga, a REVISTA DE ANTROPOFAGIA, nesta 2 .a fase, nao descuidou da colaborac;ao criativa. Sobressaem os dois poemas de Oswald (Sol, com seus cortes bruscos, e 0 reiterativo e lapidar Medita~iio no Horta) , que nao cons-tam de seus Iivros. Raul Bopp publica trechos de seu poema mais significativo, Cobra Norato . Murilo Mendes aparece com a excelente

    Can~iio de Exilio e outras composic;5es da serie da H ist6ria do Brasil. o colaborador inte:nacional e Benjamin Peret, que, mesmo nao va-lendo muita coisa como poeta, representava, de qualquer forma, 0 surrealismo, ainda em plena ebulic;ao. f: certo que varios dos poemas publicados ficam numa zona confinante com a do verdeamarelismo. Caso dos poemas regionalistas de Jorge de Lima . Mas foram os ver-deamarelistas que tentaram grilar 0 terreno da "poesia pau brasil". E, alem disso, ha em geral nos antrop6fagos uma nota sempre mais agres-siva, mais debochada e zombeteira, que falta aos subprodutos bem-comportados e ufanistas dos verdeamarelos . Dois poemas, ainda , me chamam a atenc;ao pela radicalidade de suas proposic;6es. Sao assinados por pseudonimos, mas tern a cara de Os-wald. Urn, no n. D 6, e urn "ready made", extraido da sucessao das palavras no dicionario :

    o POEMA DE CANDIDO DE FIGUEIREDO Z, 1457 zabaneira zabele zabra zabucajo zabumba zaburro zaco

    Cunhambebe

    Outro, urn epigrama contra os verdeamarelistas:

    COMBINAGAO DE CORES

    Verdamarelo Da azul? Nao. Di azar.

    Jac6 Pum-Pum Desenhos (e preproduc;ao de quadros) de Tarsila, Cicero Dias e a

    rev~lac;ao de Pagu (Patricia Galvao), como desenhista e poeta, com-plementam esse quadro criativo.

  • Mas a caixa de surpresas da pagina e cheia de notas instigantes. P?r exemplo, a anedota Con/acio e 0 Antrop6/ago (no n.o 1), oque,. ~,oJe, tern certo sabor maoista. As cita~5es e a defesa de Sade ( n. 5) . Por enquanto Sade espera que a fogueira abrase 0 mundo." A discus sao-'manifesto em torno da Gestalt e da Antropofagia, por Oswald ( n.o 9). A notfcia sobre 0 lan~amento das bases de urn "Direito Antropofagico" pelo jurisconsulto Pontes de Miranda - "urn direito bio16gico, q~e admite a lei emergindo da terra, a semelhanC(a das plantas." (n.o 13) o pen ultimo numero da REVISTA - 19-7-1929 - da noticia da primeira exposi~ao de Tarsila no Brasil, inaugurada no dia anterior no Rio de Janeiro. E anuncia a organiza~ao do Primeiro Congresso Brasileiro de Antropofagia, para 0 estudo de "algumas reformas de nossa legisla~ao civil e penal e na nossa organiza~ao politico-social". Entre essas teses estao: 0 div6rcio, a maternidade consciente, a impu-nidade do homiddio piedoso, a nacionaliza~ao da imprensa, a sup res-sao das academias e sua substitui~ao por laborat6rios de pesquisas. Ilustrando a pagina, "Antropofagia", quadro n.o I do catalogo da exposi~ao de Tarsila. 0 ultimo numero - 1-8-1929 - traz lima ampla reportagem sobre as repercuss6es da mostra. 0 'editorial De Antropofagia e curto e virulento. Entre outras coisas: "Somos pelo ensino leigo. Contra 0 catecismo nas escolas. Qualquer catecismo. Nao e possivel fazer 0 Brasil embarcar na canoa furada da Prima do Espiritual. Reagiremos pois contra toda e qualquer tentativa nesse sentido. Viva Freud e nosso padrinho padre Ckero!"

    Conta Raul Bopp que "cresciam, diariamente, as devolu~6es de jornais, em protesto contra as irreverencias antropofagicas". Por causa dessas

    rea~6es, Rubens do Amaral viu-se compelido a acabar com a pagina. o Congresso de Antropofagia tambem gorou. Raul Bopp : "Despreve-nidamente, a libido entrou, de mansinho, no Paraiso Antropof:igico. Cessou, abruptamente, aquele labor beneditino de trabalho. Deu-se urn "change de dames" geral. Urn tomou a mulher do outr~. Oswaldo desapareceu. Foi viver 0 seu novo romance numa beira de praia, nas imedia~6es de Santos. Tarsila nao ficou mais em casa." Desagregou-se o grupo. Em outubro de 1929 vieram 0 craque da Bolsa e a crise do cafe. Oswald e Pagu se engajaram no Partido Comunista. E 0 criador de Serafim Ponte-Grande, julgando-se curado do "sarampao antro-pofagico", virou "casaca de ferro na Revolu~ao Proletaria". As ideias e concep~6es da Antropofagia foram postas de lado pOl' muito tempo. S6 em 1945 , depois de sua ruptura com os comunistas, e que Oswald, intelectualmente recuperado, se dispos a aprofundar os temas antropofagicos. Eo que fad especialmente em dois estudos: A Crise da Filosofia M essianica (1950) e A M archa das Utopias (1953). Pode-se entao compreender, com maior precisao, a seriedade do pensamento oswaldiano e da tese antropofagica, concebida por ele como "a terapeutica social do mundo 1l10derno". Mas a REVISTA DE ANTROPOFAGIA fica como documento vivo das primeiras refregas, exemplo ate dramatico de uma luta que Oswald travou nas

    condi~5es as mais difkeis, praticamente ilhado, com alguns poucos, contra a mare da geleia geral que acabou envelopando quase todos os seus companheiros da revolu~ao modernista.

  • 5 Sabe-se que a REVISTA DE ANTROPOFAGIA e 0 MANIFESTO ANTROPOFAGO tiveram urn precedente na revista CANNIBALE e no MANIFESTE CANNIBALE DADA de Francis Picabia, ambos de 1920. Nao ha nada de espantoso nisso . Com os sucessos arqueo-J6gicos e etnol6gicos e a yoga do primitivismo e da arte african a, no come~o do seculo, era natural que a metafora do canibalismo entrasse para a semantica dos vanguardistas europeus. Mas, dentro de DADA, o "canibal" nao passou de uma fantasia a mais do guarda-roupa espa-ventoso com que 0 movimento procurava assustar as mentes burguesas. Com Oswald foi diferente. Embora citasse expressamente Montaigne e Freud (Totem e Tabu e de 1912 ), e possive! que e!e tenha recebido aJguma sugestao do canibalismo dadaista, entrevisto nas viagens que fez a Europa, entre 1922 e 1925. Mas a ideologia do Movimento AntropOfago s6 muito artificialmente pode ser assimilada ao Caniba-lismo picabiano, que , por sinal, nao tern ideologia definida, nem cons-titui , em si mesmo, movimento algum. CANNIBALE, revista dirigida por Picabia, "com a colabora~ao de todos os dadaistas do mundo", s6 teve dois numeros: 25 de abril e 25 de maio de 1920. Nao ha nada na revista, nenhum texto, em que se leia qualquer plataforma que pudesse identificar urn "movimento canibal". Quanto ao MANI-FESTO CANIBAL DADA, publicado em DADAPHONE (0 7. e ultimo numero da revista DADA - 7 de mar~o de 1920 ), e urn tipico documento dadaista: " ... dada, s6 e!e, nao cheira a nada, nao e nada, nada, nada. e como vossas esperan~as: nada. como vossos paraisos : nada. como vossos idoles: nada ." Urn niilismo que nada tem a ver com a generosa utopia ideol6gica da nossa Antropofagia. Nao. Nem 0 MANIFESTO ANTROPOFAGO nem a REVISTA DE ANTROPOFAGIA se parecem com os seus antecessores picabianos, por mais que os bandeirinhas da nossa critica judicativa queiram pilhar Oswald em impedimento. Como diz Decio Pignatari: "Toda vez que vern a tona, 0 cadaver de Oswald de Andrade assusta. E sempre apa-rece urn pratico audaz disposto a conjurar 0 cachopo minaz." Mas como observou Benedito Nunes, na lucida serie de artigos 0 Moder-nismo e as Vanguardas (Acerca do Canibalismo Literario), em que pulveriza 0 auto-de-fe de urn dos martins-pecadores da nossa critica literaria, que tentava reduzir mecanicamente as matrizes do "canibal" dada-futurista a "antropofagia" brasileira: "a imagem do canibal estava no ar. Por isso quem se aventure a estabelecer os antecedentes litera-rios privilegiados que ela teve, sera obrigado a recuar de autor, indc-finidamente. " 0 pr6prio Benedito Nunes cita, como exemplo, Alfred Jarrye os Almanaques do Pere Ubu, "urn dos quais registra guloseimas para os amateurs anthropophages". Do mesmo Jarry, eu lembraria um texto talvez ainda mais explicito: 0 artigo Anthiopophagie, que c de 1902, e do qual extrai uma das epigrafes deste estudo. Depois de analisar as dimens6es da Antropofagia na concepc;:ao de Oswald de Andrade, assim conclui Benedito Nunes: "A imagem oswaldiana do antrop6fago e 0 conceito respectivo de assimila~ao subordillam-se, por-tanto, a uma forma de concepc;:iio que os varios eanibalismos literarios

  • da epoca reunidos nao podem preencher." Oswald, de resto, clarificando 0 seu pensamento, distinguiu, em A Crise da Filosofia Messianica, a antropofagia ritual do mero caniba-lismo (antropofagia por gula ou fome): "A antropofagia , ritual e assimilada por Homero entre os gregos e segundo a documenta
  • nao ha somente urn so h h ' b ' I . n 0, a tam em urn protesto") magInava 0 poeta que as so . d d .. . .

    oferecer dId cle a es pnmltIvas seriam capazes de mo e os e comportamento . I . d

    gra - d h SOcia mals a equado a reinte-

  • ANNO I - NUMERO I 500 rs. MAIO - 1928

    Revista ~e lintropofagia Dlrec;:iio de ANTONIO DE ALCANTARA MACHADO Gerencia de RAUL BOPP

    ,

    ENOERE~O: 13, RUA BENJAMIN CONSTANT - 3. PAY. SAlA 7 - CAIXA POSTAL N, 1.269 SAO PAULO

    ABRE-ALAS -+--

    Nos eramos xifopagos. Quasi chegamos a ser derodimos. Hoje somos antrop6fagos. E foi assim que chegamos a perfeic;ao.

    Cada qt.1al com 0 seu tronco mas ligados pelo figado ( 0 que quer dizer pelo odio) mar-cha vamos numa . so direcc;ao. Depois houve uma revolta. E para fazer essa revolt a nos unimos ainda mais. Entao formamos urn so tronco. De pois 0 estouro: cada urn de seu lado. Viramos ca-nibais.

    Ai desco brimos que nunca ha viamos sido outra cousa. A gerac;ao actual coc;ou-se: apare-ceu 0 antropofago. 0 antropofago: nosso pai. principio de tudo.

    Nao 0 indio. 0 indianismo e para nos urn prato de muita sust~tncia. Como qualquer outra escola ou movimento. De ontem, de hoje e de amanha. Daqui e de fora . 0 antropofago come 0 indio e come 0 chamatlo civilizado: so ele fica lambendo os dedos. Pronto para engulir os ir-maos.

    Assim a experiencia moderna (antes: con-tra os outros; depois: contra os outros e contra nos mesmos) acabou despertando em cada con-viva 0 apetite de meter 0 garfa no vizinho. J a comec;ou a cordeal mastigac;ao.

    Aqui se processara a mortandade (esse rar-naval). Todas as oposic;6es se enfrentarao. Ate 1923 havia aliados que eram inimigos. Hoje ha inimigos que sao aliados. A diferenc;a e enorme. Milagres do canibalismo.

    No fim sobrara um Hans Staden. :Bsse Hans Staden con tara aquillo de que escapou e com os dados dele se fara a arte proxima futura.

    E' pois aconselhando as maiores precauc;6es que eu apresento ao genti(') da terra e de tadas as terras a liberrima REVIST A DE ANTRO-POFAGIA.

    E arreganho a dentuc;a. Gente: pade ir panda 0 cauim a ferver.

    Antonio de Alcantara Machado.

    1- MANHA I \1

    o jardim estava em rosa, ao pe do Sol E 0 ventinho de mate que viera do Jaragua Deixando por tudo uma presen

  • 2 Revista de Antropofagia

    RESOLANA

    o morma'Yo e a fuma'Ya cia macega. Treme 0 longe diluido na quentura. o boi desce a recosta em procura da sombra

    mas para logo, abombado. La no alto, voando, voando, bebendo 0 azul,

    subindo sempre - urubu. Feliz . .. o calor queima a terra, ferve no ar. (Memoria de marulhos

    gosto de espuma limo areia branca) A cabe'Ya do alazao e uma chamma esbelta

    cortando 0 campo a trote largo. . Vejo as orelhas agudas que se movem,

    sinto 0 corpo fremente do cavallo.

    E ha tanta harmonia entre 0 choque dos cascos e 0 meu tronco agitado na vibrac;ao febril , que eu compreendo a gloria. animal da carreira: you!

    enrolado na for'Ya do sol. (Rio Grande do Sui) Do Iivro "Giraluz"

    AUGUSTO MEYER

    Estao no Prelo '

    LARANJA DA CHINA DE

    Antonio de Alcantara Machado E

    MACUNAIMA DE

    Mario de Andrade

    A sair brevemente

    Martim-Serere VERSOS

    DE

    Cassiano Ricardo E

    Republica dos E. U. do Brasil POEMAS

    DE

    MENOTTI DE PICCHIA

    Poema --

    Ella vae sozinha, trope

  • /

    Revista de Antropofagia 3

    MANIFESTO ANTROPOFAGO S6 a antropofagia nos une. Social-

    mente. Economicamente. Philoso-phicamente.

    Unica lei do mundo. E~I);'essao mascarada de todos os individual is-mos, de todos os collectivismo. De todas as religioes . De todos os trata-dos de paz.

    Tupy, question.

    or not tupy that IS

    Contra toda as cathecheses. contra a mae dos Gracchos.

    the

    E

    S6 me interessa 0 que nao e meu. Lei do homem. Lei do antropofago.

    Estamos fatigados de todos os ma-ridos catho!icos suspeitosos postos em drama. Freud acabou com 0 enigma mulher e com ontros sustos da psychologia im-pressa.

    o que atropelava a verdade era a roupa, 0 impermeavel entre 0 mundo interior e 0 mundo exterior. A reac

  • 4 Revista de Antropofagia

    SEIS PQETAS PEDRO-JUAN VIGNALE - Sen-tinriento de Germana - Bueno. Alre. - 1927.

    as veTSOS sao de uma ternura f.or te. e grave . Muito differenle daquete plegUls-mo rimado dos poetas que sussurram no rima do dos poetas que sussurr~m no ouv.idinho da amada. Pedro-Ju~n Vlgnale, maestro e entom61ogo, ama !' moderna. E pacta a moderna . Seus dl!lrambos ;m honra de Germana nao sao declara~oes de )1amocado bisonho : antes de qu e te'~ fe convencida e invencive~ num senh menta mUlto alto mas pal pavel. Nada de duvjd.s crudantes au quelxumcs suspl-rados. Nenhuma alusao a mO'l'te salva-dora.

    Atraves da mulher a poeta ama a terra on de ela nasceu : es ta terra . Selltlr uma

    sentir a Dutra.

    En tus manos avidas traes los cielos del Brasil

    O~:vindo a voz c6.1ida de tr6pico e que ele ve

    esa tarde paulista exprimirse sobTe el Tiete hasta inundarlo

    o que e positivam e'nte linda. Esse contracto de poeta, tao profun-

    damente vlgoroso com a tema lirico Bra-sil ".ind. nos dara (pe nso eu) mll!ta cou-sa 6tima.

    JORGE FERNANDES - Livro de poemas - Natal - 1927.

    A poes.ia de Jorge Fernandes machuca. Deante dda fica-se com vontade de gri-tar como a proprio poeta na Enchente:

    La vern cabe~ada . .. E vem me sma. Poes ia handoleira, vio-

    lenta, golpeando a sensibilidade da gente que nem a teju brigando com a cob'ra:

    L~xol Ihol Ao lade disso uma afei~ao caTnal e

    selvagem pela terra sertaneja como de-monstra entre outras a explendida Can-

    ~io do invernOi. E feitio .rude de dizer as cousas. Jorge' Fernandes tern a mao dura: tira lascas das paisagens que caem nas unhas dele . Mao de derrubar sem du-vida. Aquella mesma trahalhadeir. e li-rica Mio nordeatina que dil a nome a uma de suas poesias mais caracteristicas.

    Outra causa: Jorge Fernandes fala uma lingua que nos do Sui ainda nao com-preendemos totalmente -mas sentimos ad-miravel. Eu pelo menos nao percebo tre-chos e brechos de varias poesias suas . No entanto gosto deles . a poema AvoHe. par exemplo (nao sei se par causa da construc~ao particularlssima de certas frazes) espanta como 0 desconhecido. E e bonito que 56 venda.

    a autor do Livro de poemes eviden-te~ente esta passando por urn periodo dOldo de auto-critica de que- saira melho-rado COm certeza. ~Ie mesmo reconhece is so e cac;oa de suas re.mJinisc~ncias par -

    nasi~na s. Dai uma porc;ao de pequenos defeltos nas vesper as d t comple~o desa-pareeimento. Ou eu muito me engano.

    lORGE DE LIMA - Poem ... e Eau negra FuJO - Maceio _ 1927 e 1928.

    - J de Lima e tlma A ascensao de orge d I d r' D ~ soneto Acendedor e am-e ICla. Ful6 Su-pelleR ao poema ERRa negra jeito inteligente como poucos souble lro-curar e achou . Al:!en~oado Manue an-dei-ra. W B R Dos Poemas eu separa O. . , Gostosura de Iirismo vagabundo, al ,gre, levado tlos diabos. Da vontade na gente de repetir a viaj em tendo 0 poe,ma bern guardado na memoria. Separa esse, ~or ser 0 meu predil e'to. Mas '?aO 0 un~co nota vel. Rio de Sao FrancISCo tambem me agrada bastante. Baia de TodoR OR SantoR, Santa Dica, Floriano~Padre Ci-cero-Lampeio' igualmente ten: cousas que a gente nao esquece-. Princlpahnente o primeiro. E do magnifico ChangO yula um bodum danado, rebenta um "tmo infernal. Inutil querer resistir.

    De vez em quando uma descaida sen-timental ou pueril, liv,resca, ora tori .. ou conceituosa que desaponta mas 115,0 a~sombra. Porque nao e ass;m tao {;tcll-mente que se 'rompe com certos cacoetes .literarios. Nao ve . .A cousa e dura como que. Nao tem importancia : Jorge de Li-ma esta ficando cada vez mais eSCo'lado. Por isso duvido muito que em seus livros futuros apare~am versos como Ora~io, Men.!nice, Poem&s dos bons fradinhos, fA voz da igrejinha e 0 Painel de Nuno

    Oon~alves sobretudo. Agora Easa negra Ful6. E' das eousas

    mais manantes que a poe'sia nordes tina nos tem enviado de muj to t empo para ca. Essa n~~a Fulll sim. Bole com a gen-t eo Pinica a ' sensibilidade da gentc. 111-bala 0 sensualismo da gente. Can~a() e historia da 'scravidao sem querer ser. Poesia boa, cheirosa, suarenta, apdito-sa, provocadora.

    Ora se deu que chegou (isso ja faz muito tempo) no bangue dum meu avo uma negra bonitinha chamada negra Fulo

    Essa negra Fulii I Essa negra Fulii!

    0' Fulo? 0 ' Fulo? (ETa a fala da Sinha chamando a negra Fulo) Cade meu frasco de chei'ro que teu Sinhii me mandou? - Ah! foi voce que roubou! Ah! foi voce que raubou!

    a Sinhii foi a~oitar sosinho a negra Fulo. A negra t~rou a saia e tirou 0 cabe~ao. de dentro dele pulou nuinha a negra Fulo.

    Essa negra Fulo! Essa negra Fulii!

    0' Fulii? 0' Fulii? Cade, cade teu Sinhii que Nosso-Senhor me mandou? Ah! foi voce que roubou foi voce, negra Fuli>!

    Essa negra Ful ii I .

    Essa negra Fulii. Pretinha do infermo. Essa negra FulC>.

    A. de A. M.

    Henrique de Resende, Rosacio Fus-.co e Ascanio Lopes - Poemaa -

    Cataguazes - 1928. E' a gente simpatica da Verde de Ca-

    taguazeL . Livro naturahn e'nte des lgual puxando

    para tres lados. , . Henrique de Rezende e a malS velho da

    tllrma. Engenheiro rodoviario vai anotando nas margcns do cadefllo de medi~iies e de caleulos as aspectos dos caminhos qu e el e' abre

    como um cordame de veias no corpo adusto da terra inhospita.

    Nao sei se como engenheiro e bam poe ta. Mas sci que como poeta e bom engenheiro. Seus v eTSOS sao solidamente construidos sabre leito bem empedrado. Nem falta a .rolo compreSSOT de uma auto-critica severa. E esses caminhos tern sombras para a gente repousa r a vista tonta da luz das paisagens. A ermida par exemplo : tao comoven!e e tao bonita.

    Rosario Fusco e um menino. Esta dito tudo: mistura timidez com 3ud a cia, brutalidade co.m ternura, larga a cs ti-lingue paTa choramingar no colo d.~ u rn afecto bom. Tem talento . Quanto a isso nao pode haver duvida. Tem tal ento, von-tade de acertar e uma c1 esen,oltura ot ima na qual a gente nao pode deixar de por a maior das eonfianc;as . Eu gosto muito deste poeminha - Sala de gente pobrc .- do qual tomo a Iib erdade de suprimir a ulti-nlO verso:

    Urn banco. Uma mesa . Um quadro : Nossa Senhora ..... Outro quadro: Sao. Jose.. .. Urn lampeao. Nem ambi~ao de mais eoisas.

    Os defeitos de R osario Fusco sao de-feitos de quem tem dezese t e anos . Em geral porqu,e ha a lguns rnais graves que podem virar cronicos se nao forem CUra-dos lo~o : linguagem meio ell mcio la , quedaz~nha ~aTa 0 lugar-com urn , imagem de efelto, fmal arranjadinho. E outros ma.is .. Porem eu ja dis se e repi to qu~ em R osaflO Fusco a ge n te pode ter sem medi> rnuitissima confian~a.

    A scanio Lopes tam bern e menin. : me-nino. malicioso, gondor, cheio de suben-tendldos . a principal defe ito dele e a me s-rna de R osar io Fusco: a idade que tem. Dal, . ~pesar dele ser brincalhao, certas puertlldades sel1timentais, 0 desejo crial1 -

    ~a de seT acarinhado e 0 t r ma tristeza soando falso nas poesias dele.

    A mata ~ grande demais para 0 fogo pegar caracteriza hem a sua maneira boa : Na modorra enornle do sertao os empregados trabalhavam nos eitos da

    [ro~a can ta ndo cant igas ingenuas. Mas do lado da serra, la longe, come~oU

    [a subir fu:na~a e as cha.mas tampaTam as arvures da

    . . [mata. a fellor dlsse que era uma queimada que

    [saltara 0 acoiro. Ning~em pen sou em apagar 0 fogo . No ceu as gavioes gritavam assustados.

    Ascanio Lopes nao deve abandonar esse seu feitio de gozador a seeo.

    o pessoal da Verde e porlanlo umA su~presa exceJ.lente e cuja excelencia de h?Je ~m deante nio mais surpreendera nmguem.

    A. de A. M.

  • Revista de Antropofagia 5

    POESIA ----

    (Especial, para a "R.evista de Antropofagia")

    FOME

    Em jejum, na mesa do "Cafe Guarany", o poeta antropofago rima e metrifica 0 amorzi-

    [nho de sua vida. Elle tern saudades de ti.

    Elle quer chamar "ti" de: estranha - voluptuo-

    [sa - linda querida. Elle chama "ti" de : gostosa - quente - boa

    [- comida.

    Ouilherme de Almeida,

    A LINGUA TUPY PLINIO VALGADO

    A LI:-lGUA TUPY

    A lingua tupy deve ser estudada com urn novo crite: io. A contribui~ao de todos os que escreveram grammaticas '! dic-cionarios do idiom a falado pelos noS 50S selvagens e certamente muito valiosa, e serve-nos hoje de inicio para as nossas procuras curiosas. Mas os que estud(l.rarn o tupy. DOS primeiros sectllos da colo-

    niza~ao inspiravam-se Dum criteria ~rcadico, do mesmo modo que, conside r and0 C indio, tomavam-no sob 0 ponto de "ista da catechese. Periodo d e Anchieta, depois de Montoya, de F ilgueiras. E e preciso Datar 0 caracterl de utilidade pratica im-mediata, uesses estudos, naquella epoca. o jesuita t inh2. necesEidade dl! uniiicar, tanto quanto possive~, as lingtlas, Jlum typo geral que servisse ao i!I1pe:ialis!I1o catechista. E a necessidadc da ccmpre-hensao urgente entre catcchumenos e evangelizadores. Essa preoccupa~ao uti-litarla DaO podia ter sinao uma orien-ta~ao grammatical. E sendo 0 typo hu-mano dos conquistados reduzido peio do-gma a equivalencia intrinseca do con-quistador. passava para urn segundo l='la-no 0 estudo do seu espirito e do :ieu inS-tineto, e da lingua do gentio so se to-mavam as eonc!usOes finaes. fo rmas paci-ficas passivas da traduc~ao. Q~e 0 indio, como valor psychologico e social ~ra to-

    mado como identico ao homen europeu, nao resta a menor duvida. Basta ver-se envergando 0 habito de Christo, e com 0 titulo de Dom. que the concede F elippe IV, 0 sr. Antonio Camarao, Poty de nas-cimento . . . A lias , uma bulla papal iii de'-c1arara, apos a descooerta do Novo Mun-do, que todos descendiam de Adao e Eva. Os que estudaram 0 tupy, desd e aquelles tem'pos, nae pediam ter outra OTie!ltac;ao que nao fosse a do seu seculo e a das ne-cessidades prementes.

    Muita gente depois veio estudando a lingua de nossos indios, mas com 11m cri-terio pra tico. Sao subsidios curiosos. Abanheenga. quer d izer, lingua de homem, lingua de gente. chamavam os tupys a sua lingua . 0 missionario fo i unifieando, systemat izando as pequenas modahdades no nheengat", ou seja ,lingua boa. Donde nasceu 0 tupy -guarany. As outras tribus fica ram fala ndo 0 seu nheengahyba, lin-gua ruim. Ruim porque nao se submettia a reducC;ao classica do nhe-engatu.

    o eriterio scientifico para 0 estudo das linguas american as procede de 11ar-tius e da sua classificac;ao. 0 ramo bra-sileiro, que vern denominado na c1assifl-ca~ao de Frederico Muller U grupo tupy-guarany", e dividido por Martius em nove galhos. PaTece-me que ha, dahi por dian-te, uma curiosidade maior em relac;ao as linguas selvagens . E em .. ela~ao ao indio,

    tam bern. Liga-se 0 estudo dos idiomas a propria historia do homem. D epois de Lamarck, G. de Sa int Hilaire, Darwin e Spencer, estes assumptos tornam um ou-t ro aspecto. A ult ima t el1tativa para r edu-zir 0 indio a forma europea, e, talve~ a do nosso chamado indianismo. expressao do Tomantismo em nos sa literatura. Mas eSSa preoccupac;ao lamartinizante dos nossos poetas e romanci stas teve a van-tagem de chamar a !!tten~ao brasileira para 0 bugre, ce rcal -o de uma sympathia atraves da qual pudessemos chegar a elle e pesquizal-o melhor. E como esse mo-v'mento de Gon~alves D ias e Jose de Alencar representa 0 primeiro passo para uma comprehensao melhor do indigena, e justo perdoarmos a esses escriptOt'es os prejuizos inherentes ao seu tempo. E e preciso tambem registrar que, no meio de muitoa phantazia, ha expTessoes fieis da psychologia selvagem em muitos tre-chos da poesia e do romance romanticos.

    A opiniao do nosso his toriador Porto Seguro (Varnhagen), tao hostil a pobre rac;a dominada, vern lOgo contrabatida pela sympathia de Couto de Magalhaes, de Barbosa Rodrigues, de Baptista Cae-tano a cuja obra pod.cmos juntar 0 que tern feito Theodoro Sampaio, Candido Rondon, Alarica Silveira, e outros.

    Novos aspectos nos interessam hoje na [ingua dos nossos selvagens 0 da ori-

    (Continua na pag. aeguiote)

  • 6 Revista de Antropofagia

    A (continUayao) ,be LINGUA TUPV

    gem 0 da sua signifi~a~ao como cxpri- , mindo um estagio humano,. e, sobretudo, a intima communhao cosm;l-ca, .essa esp~de de intercomprehensao, de Ill ter sens.-bilidade e corrEspondencia dos el",:,entos idiomaticos representativos dos obJectos, (substantivo) das ac~oes (verbos) c .da)s circumstancias, (adiectivos e adverblOs que resumem toda uma syntaxe. ~runlrtva que p: escindia de prepos.~oes e

    conj'un~Oes, primeiras mC/letas da. deca-dencia na iunc~ao creadora das IInguas.

    A hypotese onamatopaica de H eber, a das intetiec~oes de Horne Tooke, a do poder inherente a natureza . humana, de Max Muller, a materia debaUda por C?n-dillac. Leibnitz. Locke, sao . md.ca~oes curiosas para indaga~oes ma.s remotas, " hoie, pelo menos, nos fazem med.tar . sobre 0 acervo lexico das ra~as que fo-ram de~apparecendo em noSSO con~ment~. A propria origem do "homus amencanus , pensamento que nos perturba d.ante da Lagoo. Santa ou dos S .. mbaquis ~o: Igua-pe; ou na considera~~o phant~s.osa QOS chroni~tas das possivelS m:gra~oes trans-oceanicas precolumbianas; 0 senso das edades a edade da nos sa terra, tuJo .sto se pre~de, de certa forma, 30 estudo do no",o indw e da sua lingua, e 0 as sum-pto 'e hoje muHo mais suggestivo.

    Porem, principalmente depois cias h:r-potheses de Freud, da .sua interpreta~ao pela psychanalyse da v.da socIal ~os po-vos primitivos ("Totem et Tabou ); de -po is do cansa~o das civiliza~oes de que .. Europa presente e uma grande expres-sao' e ao despel'tar de urn seculo em que o se~egalez confraternizou com 0 '" pOilu", e Josephina Backer lan~ou os r equebros yankees do Zanzibar, - e depois de tudo is.to Como sabemos, agua e hy, ou Ig. Quem nos dira que pedra, ita, nao vem da cir-cu.ilstancia de estar scmpre a pcdra iiga-da a agua, nas minas, nas gruta s, 110 mar, ou em lucta, ou em paz? Seixos qu.: rolam, . pedrcgulhos, granitos e iJasaltos emoldurando as cachoelras, penedo3 no mar, tocas onde nascem os corregos ...

    Espuma c tli. Porque a espuma se ori-gina de choques, de violencias. E. tudo 0 que e forte , ardentc, traz, por analo~i:l, 0 t. Tai, raiz que arde, gengibre ; tainha, den tes; tatarana, insecto que queima; tiqul. ra" aguardente, pinga ; talnha, caro~o, se-mente (anaiogia de dent'e) ; tacunhi, membro sexual do macho (ta, duro; cunha, mulher); tacape, arma d ~ ma-tar, etc.

    A consoante t, lembrando tudo 0 que e duro, forte, vlolento, traz sempre idea de atricto, como. se vc em tata, f" go, em tii, espuma. Por is~o , tiquira. Pois tudo (j ' que e qui signif.ica coisa meuda. 'rl ' e violencia que 0 fogo exerce para distil-la r a aguardente , que vae sahlndo aos pingos , qui. E temos tambem Quiriri, ou quirirlm, que quer dizer muitos me{.dos , do mesmo modo que qu'rera. Como se sabe. 0 plural em tupy, entre suas varias formas tem a da repeti~iio de rere, ri-ri.

    Isto dito, vejamos Mantiqueira, 0 nome de nossa grande serra. Man quer dizer

    ve~, enxergar. Tiquera, ou tiquira, quer dizer m eudos, pequen;nos, ra7.urado, pul-verizado. 0 indio, naturalmente , do alto

    d~ serra. via tudo diluido na dis tancia, v.ia tudo tlquera . ..

    E' precis{) notar-se (e chall,lO a atten~ao dos meus Jeitores para este facto) que nem sempre se encontrara a coniirl'1a~ao destas hypothezes na lingua tupy. Por-

    ue tamb em, com ccrteza, ~epois de feitas q ex res-soes iniciaes, a lingua selvagem aS ff P metaplasmas a que nenhum so ["leu os I idioma p6de-se furtar. H.ouve, por ee.rt?, transposiC;oes , e\o:soes , flguras de. dll~ll

    Ilul~ao ou de augmento, modlf.'ca~oes rosocficas sensiveis obe~ .ent:es a I ~ ' S clt-~aterieas, cosmicas e h.stOrlcas, e de tal

    forma que se eontavam dezenas de ,lIale-ctos na epoca da descobe.rta. Accrescen-te-se a isso a obra umf .cadora dos Je-suitas, as influencias h espanholas, por-

    francezas e tapuyas . D e modo tuguezas, h h ue a documenta~ao des ta ypo: e,c se

    q tto diffiei l. A hypoth ese e a.)enas torna mUtrar 0 espi rito que possiv-elmente para mos . . presidiu a forma~ao da Itngua tup y.

    Pa, pe, pi, po, plI, traz .scmpre idea de superficie, pon ta , cxtremldade, contacto, con torno, reves tlll;ento, IlImt e. Sendo su-perfide, tambem e tudo 0 que se refe re a plano, por exemplo a pequcnez, a cha-teza. q'ue Sf confunde quasI com a. s,:-perficle. Donde peua, ou peba, que slgm; fica chato, liso . Cachorro pequeno e yagua-peua, ou yagua-peba. Mas e"pn-mindo esta consonancia tan:bem ponta, extremidade. co isas tao rdaclOnadas com superficie (e a logica Intima das mter-correspondencias sensoriaes) 0 ind:o c!la-ma a aza do passaro pepu, as maos do homem, po, ou plI, Pela mesm~ razao, as cousas que :'e \'estem levam eSJa c~nsonancia. Pelle e pe, ou pi. C,?mo VlmOS, re-re ou riri sao formas do plu ral. Dahi vem ~irit-i, ou perere, muitas pelle;, por-

    que a pelle quando irritada da a idea de que se ml1ltiplica em multas pelkzl!1has. Pelo m enos e a sellsa~ao que s~ lcm, (luando nos sentimos arrepiados. Por-tanto, perer-eca, ou piririca significa:n eS-tremecer . Ligada essa idea ao ar . ao v,en-to, as folhas das arvores, e finalmcntc a outros rumores da natureza, temo.' a s:-gniiica~ao tambem empregada ue IUS-lwrTu; IUliurrO. Mas pe e, p rincipal-mente, a .expressao do contacto entre os sentidos e os mundos sUbjectivo e obje-ctivo. Donde a significac;ao de super-ficie, ' de con torno, de veo ou pelk Por isso, petuna (pelle ou veo p r eto) quer dizer noite. Mas e a noite que se re;.oousa, que se dorme, portanto. pitu6 e 0 verbo rel>Qusar. E 0 dia em que se descanc;a (domingo ou feriado) e par'a 0 indio tam-bem pitu6: Es ta consonancia, _ explime, tambem , por essas intimas analogias 0 reb~ntar 'do superficies. Assim, t f mos pororoca, pip6ca, pereba, puca, (q\1~brar, estalo de onde at.paca, ua-ave ; e puca qucbrar) . Pelo que vimos, pelle piriricada quer diu': pe le que salta irritada. Tudo o que salta, estrebucha, e perereca. Dc on de vern 0 Sacy-perere, ou per,ereg. Mais forte do que pi:irica, e, porem, tiririca, pdo que j il vimos do valor de t. Por-tanto, "ficar tiririca", expressao q,ue usamos tanto, M, perfeitamente idea do estado do individuo que estremece com violencia, ou da pulos de raiva.

    Em outros artigos arranjaremos ('xem-plos int eressantes, nao s6 do ponto de vista das analogias sensoriaes, como ago-ra, mas das sentimentaes, que revelam

    opcra~oes psychologicas mais di fficeis. Hoje foi 56 para mostrar que a lin-

    gua tupy e uma lingua quasi em estado nascente, directamente ligada a natureza, oriunda do contacto immediato ('ntre 0 homem e 0 mundo.

    , PUnio Salgado

  • Revi:::ta de Antropofagia

    Manifesto Antropofago Contra as historias do homem, que

    comec;am no Cabo Finisterra. 0 mun-dn nao datado. Nao rubricado. Sem Napoleao. Sem Cesar.

    A fixaC;ao do progresso por meio de catalagos e apparelhos de televi-sao. S6 a maquinaria. E os transfu-sores de sangue.

    Contra as sublimac;oes antagoni-cas. Trazidas nas caraveUas.

    Contra a verdade dos povos mis-sir narios, definida pela sagacidade de urn antropofago, 0 Visconde de Cayru : - E a mentira muitas vezes rcpetida.

    Mas nao foram cruzados que vie-ram. Foram fugitivos de uma civi-lizac;ao que estamos comendo, por-que somos fortes e vingativos como o Jaboty.

    Se Deus e a consciencia do Uni-verso Increado, Guaracy e a mae dos viventes . J acy e a mae dos ve-getaes.

    Nao tivemos especulaC;ao. Mas ti-nhamos' adivinhac;ao. Tinhamos Po-litica que e a sciencia da distribui-c;ao. E utU system a social planeta-rio.

    As migrac;oes. A fuga dos esta-dos tediosos . Contra as escleroses urbanas. Contra os Conservatorios, e 0 tedio especulativo.

    De Wil1iam James a Varonoff. A transfigurac;ao do Tabu em totem. Antropofagia.

    o pater familias e a creac;ao da Moral da Cegonha: Ignorancia real das coisas+falta de imaginac;ao+sen~ tirnento de authoridade ante a pro-curiosa.

    E' preciso partir de urn p~o~lIndo atheismo para se chegar a Idea de Deus. Mas a carahiba nao p recisava. Porque tinha GlIaracy.

    o objectivo creado reage con;o ~s Allj OS da Queda. Depois Moyses dl-vaga. Que temos n6s com is so ?

    Antes dos portugllezes descobri-rem 0 Brasil, 0 Brasil tinha desco-berto a felicidade.

    Contra 0 indio de tocheiro. 0 in-dio filho de Maria, afilhado de Ca-tharina de Medicis e genro de D. Antonio de Mariz.

    A alegria e a prova dos nove.

    No matriarcado de Pindorama.

    Contra a Memoria fonte do costu-me. A experiencia pessoal renovada.

    Somos concretistas. As ideas to-mam conta, reagem, queimam gente nas prac;as publicas. Suprimamos as ideas e as outras paralysias. Pelos roteiros. Acreditar nos signaes, acre-' ditar nos instrumentos e nas estre\-las.

    Contra Goethe, a mae dos Grac-chos, e a Corte de D. J oao VI.

    A alegria e a prova dos nove.

    A lucta entre 0 que se chamaria Increado e a Creatura-iUustrada pela contradic;ao permanente do homem e 0 seu Tabu. 0 amor quotidiano e o modus-vivendi capitalista. Antro-pofagia. Absorpc;ao do inimig,) sa-cro. Para transformal-o em totem. A humana aventura. A terrena fina-. lidade. Porem, s6 as puras elites conseguiram realisar. a antropofagia carnal, que traz em si 0 mais alto sentido da vida e evita todos os. ma-les identificados por Freud, males cathechistas. 0 que se da nao e uma sublimac;ao do instincto sexual. E' a escala thermometrica do instincto antropofagico. De carnal, e1le se tor-na electivo e cria a amizade. Affe-ctivo, 0 amor. Especulativo, a scien-cia. Desvia-se e transfere-se. Che-gamos ao aviltamento. A baixa an-tropofagia agglomerada nos pecca-dos de cathecismo - a inveja, a usura, a calumnia, 0 assassinato . Peste dos cham ados povos cultos e christianisados, e contra eUa que es-tamos agindo . Antropobgos.

    Contra Anchieta cantando 3,$ onze mil virgens do ceo, na terra de Ira-cerna - 0 patriarcha Joao Ramalho fundador de Sao Paulo.

    A nossa independencia ainda nao foi proclamada. Frase typica de D. J oao vr.: - Meu filho, poe essa coroa na tua cabec;a, antes que a.\-gum aventureiro ? fac;~! Expulsa-mos a dynastia. ~ precIso expul~ar o espirito bragantmo, as ordenac;oes e 0 rape de Maria da Fonte.

    . Contra a realidade social, vestida e oppressora, cadastrada por Freud _ a realidade sem complexos, sem 101lcura, sem prostituic;oes e sem pe-nitenciarias do matriarcado de Pln-dorama.

    OSWALD DE ANDRADE.

    Em Piratininga. Anno 374 da Deglutic;ao do 'Bispo Sardinha.

    7

    BRASILIANA RAC;A

    De uma correspondentia de Sarutaya (Est. de S . Paulo) para 0 Cortelo Paul;' tano, n. de 15-1-927:

    o Sr. Abrahao Jose Pedro offereceu aos seus amigos urn lauto jantar com-memoranda 0 anniversario de seu filhi"-nho Jose e baptizado do pequeno Fuad, que n .. sa data foi levado a pia bapti;mal.

    Foram padrinh'os 0 sr . Rachide Mustafa e sua esposa d. Torgina Mustafa.

    o Sr. Paschoalino Verdi prolerlu urn di!curso de sauda~ao .

    POLITICA Da ~esma correspondencia : o Sr. Rachid Abdalla Mustafa. escrivao

    de paz, muito tern trabalhado para au-gmentar 0 numero ' de eleitores .

    DEMOCRACIA Telegrama de Fortaleza (AB): A bordo do "Itassuss;''' passou por

    e st c porto com destino ao nor te, S. A. D. P edro de Orleans e Bragan~a , acom-panhado d'e sua esposa e lilho.

    S. A. desembarcou, visitando lla Pra~a Caio Prado a es tatua de P , dro II. 0 povo acclamou com enthusiasmo 0 p"incipe. A off:

  • B Revista de

    A "Descida" Antropophaga

    A "descida" agora e outra. o Autor

    Ha quatro seculos, a "descida" para ~ es.cravi~ao. Hoje, a "descida" para Iibertac;ao. 0 DtluvlO, fOi 0 movimento mais serio que se fez no ~.undo: Deus apa-gou tudo, para comec;ar de novo. FOl mte~hgente, pra-tieo e natural. Mas teve uma fraqueza: d;'xou ~oe. .

    o movimento antropophago, - que e 0 mals seno depois db Diluvio - vern para comer Noe. NOE' DEVE SER COMlDO.

    Pen so que nao se deve confundir volta ao .es~~do natural (0 que se quer) com volta ao ~st~do p~lmltlVO (0 que nao interessa). 0 que se quer e slm~hC1dade_ e nao urn novo codigo de simplicidade. Naturahdade, nao manuaes de born tom. Contra a belleza canonica, a bel-leza natural - {eia bruta, agreste, barbara, iHogica. Instincto contra 0 ;erniz. 0 selvagem sem as missan-gas da cathechese. 0 selvagem comendo a cathechese.

    Os PEROS que ainda existem entre nos hao de sorrir por seus dentes de Duro 0 sorriso civilisado de que, reagindo contra a cultura, estamos dentro da cul-tura. Que besteira. 0 que temos . nao e cultura euro-pea: e experiencia deUa. Experiencia de quatro seculos. Dolorosa e pao. Com Direito Romano, canal de Veneza, julgamento synthetico a priori, Tobias, Nabuco e Ruy. o que {azemos e reagir contra a civilisaC;ao que inven-tau 0 catalogo, 0 exame de consciencia e 0 crime de de-floramento. SOMOS JAPY-ASSU' :

    "Ce venerable vieillard Japi Ouassou fut merveil-leusement attentif, comme tous les outres Inuiens la presens aux discours susdicts a quoi il replique ce qui s'ensuit. Je m'esionis extremement 'de vous voir et me manqueray a tout ce ie vous ay promis. Mais ie me es-tonne comme il se peut faire que vous autres P AY ne vouliez pas de femmes. Estes vous descendus du Ciel? Estes nays de Pere et Mere? Quay done! n'estes pas mortels comme nous? D'ou vient que non seulement vous ne prenez pas de femmes ainsi que les aut res Fran-c;ois que ant trafique avec nous depuis quelque quarante et tant d'annees; mais ancore que vous les empechez mainteoant de se servir de nos filles : ce que nous esti-mions " grand honeur et grandheur, pouvans en avoir des enfans".

    (Claude d' Abbeville-"Histoi-re de la Mission des Peres Capucins en !'Isle de Mara-gnan et terres circonvoici-nes.")

    " Contra 0 servili&mo _colonial, 0 tacape ~nheiguara, .gente de g:a.n~e" resol~~ao e valor e totalmente impa-

    clente de sUJelc;ao (Vieira), 0 heroismo sem ro~

  • ANNO I - NUMERO 2 2 500 rs. JUNHO 1928

    Revista ~e Antropofagia Direc~ao de ANT6NIO DE ALCANTARA MACHADO e

    Gerencia etc. de RAUL BOPP

    ENOEREGO: 13, RUA BENJAMIN CONSTANT 3,0 PAY, SAlA 7

    INCITA

  • 2 Revista de Antropofag1a

    LI RICA A ELf:rTO SOARS

    o men amor, rapazes,

    e uma Iindeza de morena bonita das matas de minas gerais!

    De dia men 'arnor vai pro servi.;o cantando cantando: e que friume nao me faz por dentro, gente, ve1-a can tar [assim! Meu anror e mais alegre que 0 sol! Mais alegre que os .cargos da minha terra! Mais alegre que a passarada da minha terra a c;mtar!

    Meu amor disse que gosta muito de mim ... Eu acredito - palavra! - mas desconfio tambem como born mineiro que se preza como en. Porem, a gente nao deve botar a mao no fogo nao. Dizem . . En b6to! Isto e, eu -t6co iia mao no fogo mas deixo outra de reserva ...

    (Catai'uases) - do "Fructa-de-conde"

    Rosario Fusco

    Homisio

    Nesta baifrca Coberta de sape

    Para Raul Bopp

    Esteve homisiado 0 Cabure Que rnatou 0 Ze Tuca no valado. Passava a passoca E rningau de mandi6ca Potranca sempre pronta' 110 potreiro D.o terreiro. Arisco como unla P paca,

    Icava fumo com a faca, Cuava cafe no tripe pra beber

    no coite.

    Urn cabo escondeu no serrado Co~. urn s~ldado, e com cerrado tiroteio - Iro fOJ e tiro veiu-Derarn cabo Cabo e sold~do Docostado do 'coitado.

    Dos CANTOS ~1:UNICIPAIS (Minas)

    Fidelis Flor~ncio

    IOILIO -

    odelo de certo jornal paulista, conse-Unl reporter m . bl P

    . I rtagem na cade'la pu Ica. ara III . ensaclOna repo . b I galU s urn meio muito simples; 0 IU com

    ontrar recorreu a I . - . lint-ras 'aqueles que usam po amas que "rHos (os :m~US pe, d d " . luvas furadas na ponta os edos) foram brancas e .

    nd ele t!remenda surra, seguida de alguns

    resulta 0 pa'l'a . dias de cana brava.

    Vamos agora dar a palavra ao exfor.;ado recordista das rcportagens sensacionaes:

    .. . e na man sao de dore!'. moraes, talvez mais profttndas do que as dores fiskas, depaTou-se-nos comovedor espetaculo. Formara-se entre as 10brega~ paredes, entre Texas de fefTo e oOl"tas inexoraveis, .. tm1 dOce, e puro idilio. o mais antigo dos presos, que pelo seu com-portamento exemplar gosava de uma! certa liberdade, apaixonara-se pel a mais comportada das detentas. Tinham combil1ado 0 casaam!nto, para quando saissem da prisao, e ja escolhido as testemunhas. Todos na cadeia se referiam com simpatia ao projeto. Ela ai fora ter por-que cometera varios infal1ticidios, triste fruto da epoca de deprava

  • ENTRADA

    No fWldo do mato-v irgem nasceu Ma-cunaima herol da nos sa gente. l!:ra preto retmto e fllho do medo da no ite . Houve um momento elll que 0 sllencio foi tao g rande escutando 0 lIIurmurejo do Urari-coera que . a ~ndia tapanhumas pariu uma

    c nan~a fela. Essa CTl

  • 4 Revista de Antropofag ia

    UM POETA R. d MARTIM CERERE - S. Paulo - 1928. Cassiano Icar 0 - .

    Marli.". Cuere na~ e livro inteirarnente nnvn. Ha n';le v{rimento e da coloniza~ao sobretudo. Poeta oratorio (0 que denuncia sua brasi-

    'Iidade) e descritivo. Quando oratorio ou quando descritivo sempre fortemente elo-quente.

    o caso de Cassiano Ricardo e urn caso " prte na no,.a litcratura actaal. Cassiano

    at~ 1925 foi inimigo violento da rea~ao 1ll00lerna. Depois (era fatal) se conver-telt. Houve nisso urn missionario irresis-tivel: 0 Brasil. Se 0 movimento moderno entre nos nao tivesse assumido tambem uma fei~ao nacionalista acredito que Cas-siano continuase inimigo dele. No Martim

    C erue a %ente veri fica isso facilmente: do esplrito llloderno que e universal 0 poeta aceita pouca cousa. Mas 0 tema Brasil do modernismo 0 seduz.

    Por causa dele chegou a romper com 0 seu proprio passado litera rio. N a lista de suas obras publicadas contante do Iivro de agora nao figuram A irauta de Pan, fardi", das Hesprrides e os outros dois volumes anteriores a 1925. sse repudio alias nao tem razao de ser. E constitue uma injusti~a: A irauta d~ Pan principal-mente tern versos que sao dos melhores do parnasianismo brasileiro.

    Pelo que ja ficou dito Iii. no principio e evidente a imposibilidade de criticar M ar-tim Cuere sem repetir uma a uma as cr1-ticas (elogios e reparos) que jil. merece-ram abundantemente Borroes de verde e oll/orelo e Vam os ca(ar papagaios.

    Eu que mesmo nos novos sempre pro-curo 0 novo. 0 que e novo na novidade deles, me contento em reproduzir aqui

    este Mimo poeminha chamado Lua cheia 11. I :

    B oiao d. leite que a Mite leva COlli tIIaos de l1'eva pra "ao sei qu~m beber.

    AI as que e",bora levado ",,,;to de vagarillho vai derratt.ando pillgos broncos pelo caminM ...

    Gosto tanto dessa gostozura que ouso pedir a Cassiano que nao se esque~a de molbar seus livros futuros nesse mesmo leite gorduroso e cheiroso. Puro ,lirismo sem agua.

    Ma,.tim C~,.eri foi impresso com bas-tante cuidado. Alem disso tem bonitas ilus-

    tra~oes de Di Cavalcanti. Algumas mais que bonitas ate : a da capa; a da pagina 19 e outra!.

    A. DE A. M.

    BRAZIL MATINAL A taroe e Um

  • Revista de AntroPQfagia

    MADRUGADA I

    Do livro "Colonia Z e outr05 poemas"

    A lancha da lenha vern chegando, ainda escuro, rnansa, com a sua t6sse rniuda de gazolina e 0 seu rnotorzinho furnegando na popa.

    Vern vindo na volta do rio.

    Para traz, os rnatos cochflarn na nevoa da rnadrugada onde escorre a aza negra dos biguas.

    Urn silvo claro dernora no ar. Chegou.

    A. lenha velO coberta de folhas verdes, palrnas, barnbus, e a lancha parou, em silencio, no rneio do rio, pequenina, esrnagada, como uma forrniga orgulhosa.

    (Porto Alegre) RHY Cirne Lima

    La glacla del amOl PUlo

    Hoy nuestras cabezas estan amparada! por la sonrisa larga de los ~ores y el misterio de las guitarras tnimulas en la f ina oraci6n de las mano;,

    Tres marineros nos dan la alegria de sus ojos azuks para la victoria audaz de tu arnor y el mio!

    La frente de un violinista borracho f>OStiene la inquietud de canciones sofiadas en el cielo de tu alma.

    Las copas e esta noche tienen el alto destino de los sueiios!

    Que bimpara Ie robare al mar para la gracia del amor nocturno?

    Dame, compaiiera mia, la fuerza de tu boca que hace sonar la campana de nUe.5tras esperanzas I

    (Montevideo) ,

    NICOLAS FUSCO SANSONE

    . .

  • /

    Antropofag ia Revista de

    flM DA LlNHA

    Cada can e urn Esse arrabalde chora. Bib6-. I d a agua, do ceo. leproso Imp oran 0 . cercas e

    immundas ranchmhos com cas , endados a tra-paredes de lata velha, rem Buracos pos, empastados de barro secco

    ha 0 con-

    _ venti.ladores naturaes. Mas forto primitivo da liberdade. engol

    e Ao fun do, 0 morro vermelho tlldo na guela do barranco. . tal de

    Gira e vira a hesita~ao sentlmen ar-um catavento que me faz recordar 0 M celie>. Gama.

    Sobre uma cerca a impertinencia ama-reUa dos giras6es dourando tudo. .

    Olba 0 negrinho I Estuda a palsagem. Riscou as caneUas finas por causa das motucas.

    Cum! paque pi paque. Anda aroda, criolinho. Mulatas lavam roupa semeando no ar-

    roio nuvensinbas de sabao. Quando a gente vence a lomba, tola uma

    chuva de seixos pela estrada e e1les cahem Ia em baixo na lagoa morta com urn mer-

    gulh~ nocturno : glu glu glu. . Longe, nos aramaes, roupa lavada acena.

    adeua ... adeus .. .

    SERENATA -r

    lua como urn d soltando a . AIguem an a ilhas frontelras.

    d rosa I~ nas I baliio cor e cae ballio I Nao cae. A ua Evem a lua. . 0 Guahyba, oleo so, ae passear no ceo. ba mais para

    v ue a lua su escuro, espera q S bre 0 veleiro ador-

    . jando. 0 imita-Ia, !nve Voz encacha-

    . m fanal sangra. mecldo, U .

    nha a nOlte : ~ada arra

    meu triste amo Meu amo, Que jaaaa morreu ...

    FI t cavaquinho, violio. Serenata. au a, _ do tremelicando emo,.oes Vern crescen ,

    d bambeando compas-I nas cor as, tremu as . bebendo na f1auta 50S bambos no VIO ... O, urn gole puro e melodioso. .

    da cidade melaneoha Alma dengosa , mestic;a, geme demdom.

    na rua a queixa dolente,

    A lua eseuta, immovel. Pareee uma lan-do cordio "Chora na esquina". tema

    Do livro .. GAITINHA DIl BOCA ..

    Porto Allgft AUGUSTO MEVER

    BREVEMENTE: EM TODAS AS LlVRARIAS:

    REPUBLICA DOS

    Martim-Cerere VERSOS

    DE

    Cassiano Ricardo ESTADOS UNIDOS

    DO BRASIL , ESTA NO PRELO'

    :

    Antologia de 4 poetas mineiros VERSOS

    DE

    MENOTTI DEL

    PICCHIA

    JOAo ALPHONSUS CARLOS DRUMOND DE ANDRADE EMILIO MOURA PEDRO NAVA

    BELO=HORIZONTE _ MINAS

  • Revi:::ta de Antropofagia 7

    PORQUE AMAMOS OS NOSSOS FILHOS Ignacinbo veio pedir-me lima victrola

    romo present.e do sea nr"';__ . . 0 _t..:___ ... ~ 2Dmver-

    sano. 5 UL"""'" a.contecimentos nao -de molanheiro. Presm-

    ~ de anruversano ~ a meninos hem comportados., que nao trocam as anlas pelo futeiJ?1, oem as vigilias do estudo pelas do cmema. Ora Ignadnho tern side justameute 0 ~ desse typo de javen exemplar, que e nnuto commtun no "eo-

    ~. de Edmundo de Amicis e outros livros estrangciros, mas que infelizmente nao parece ter-se dado hem com 0 clima do Brasil Como pais 6Olicitar-me festas)

    E dahl Ignacinho nao e m.ais ttma cr~ ~ Membro do consellio fiscal do Cen-tro dos Preparatorianos e collaborador das paginas de annuncio (as unicas que pre$-tam) do "Fonfon" e do Para T odos" elle adquiriu ji uma personalidade sociai e literaria que nao se coadtrva com as c:aIl;as curt:u nem com as regalias Confe-ridas aos frangotes de 13 annas. Rapazi_ nho de cal~ comprida nao tern dircito a mimes infanm. Socia do Centro dos Pre-paratorianos tambem nao tern. Poeta on prosador ainda que incipiente, tamhem oao.

    Xo men ultimo artigo aiel, em r~ a lingua tupy, do que poderemos chamar as analogias sensoriaes, que sao todo tun mecanismo ampliador do prcxesso onoma-topaico, que assignala 0 periodo crea.dor da liIiguagem, 0 primeiro commercio entre 05 cinc:o sentidos e os mtmdos obj ectivo e subjectivo.

    A forma~ da lingnagem e, na verdade, urn complexo de aetas fixados de posse. Linguagem e apprehensao e determ~ de phenomenos. Na variedade das circums-tancias.

    Da synthese interjectiva 0 espirito agndo da ern~ retornon ao exame minucioso dos fadores do conjuncto emocional. A onomatopea CTeo)1 os grandes pontos de referenda, 05 elementos primordiaes das e:xpressOes directas. A intercorrespon-dencia dos sentidos nuanc;ou essas expres-sOes. IrnpressOes auditivas e visuaes, oHa-ctivas, palataes e tactivas, controverteram-se, carnbiaram-st, ajustaram-se na entro-sagern dos instinetos enriquecidos de expe-riencias. E a expressao obiectiva multi-plicou-se, prismando-se de a~.

    Virnos, no ultimo artigo, que todas as cousas duras. resistentes, sao expressas pela conwnancia I; e que as cousas eJctre-mas, as pontas e as superficies, tradu-zern-se na Iinguagem nascente dos nossOS indios pela coosonancia p. E , a segnir, desenrotarnos todas as consequencias desse facto. Entre os curiosos resultados do processo fonnador da linguagem, encon-tra.rnos a consonancia p, que significa ponta, extremidade como designativa de baixo, rasteiro. A 'aza do passaro, que attinge as grandes alturas e pep6, e as cousas chatas, que se con fundem com 0 chao, se designam por pe,peua,peba. P orque 0 raciocinio .se-guiu este caminho: Extremidade quer dizer limite limite determina superficie; super-fide ~ignifica revestimento; revestime!1to e conjuncto de planos. Portanto ; p1anlce, cllateza das cousas Que com ella se con-fundem . . .

    Vastissimo campo offerece este ass~pto para estudos curiosos. Estas notas sao apenas uma indicac;ao de rumo . p~r:, a apre-ciac;ao da lingua dos povos ~nmltlvos, quO; temos, tao a mao. no Brasil. .Agora, "I passarmos das analogias das Impr~ss6es para a analogia das erno

  • 8

    BRASILIANA II

    IDEAL De urna entrev i ta da nctr iz Margand. ~1a para 0 Para lodos do Rio. n de _ .. 27 :

    0 meu ideal ~ ter 0 applauso das fam ili . " O~1~RCIO

    Tele rama de Fortalesa para a Folho da ,Voil, de P.

  • 03 JU

    Revista de Antropofagia , 1 \ It \ \1 \l II \ n

    E mco : 13, RUA BEIJANII COIISTAIT ~~~~~~~~_~~~~3~.~P~I~Y .~S:.I:I~7 __ ~C~AIU __ PO_ST_a_L_ . _ _l~ __ ! ____ S_A_O __ P_A_U __ LO_ CARNI 9 A

    l llll:l nfcren 'i'l h:, ) I' Fa ' 'II(lad ' d ' 1 '. " ' ' -'_ II C 1', Il.uda na . ~ IIclI II a Pau l Bap li h

    PCI' ' Irn c 'gUlch 1I Uill I) ueo (I ' L 11 ' L . . . ru.:\\" ', ( 1n'1

    n, . cl'lliell1l3 p si li\'isl a qu n

  • 2 de Ant r 0 p 0 f a 9 i a Rev ista - :::::

    BALCAO

    .\ partir deste numero a REVISTA DE ANTROPOFAGIA publicara gra tuitamen te todG e qualquer anuncio de compra e venda de Ji\TOS que the for enYiado.

    LIVROS A' VENDA:

    ~a Livraria Universal (r. 15 de noyem bro n. 19 - S. Paulo ) :

    - S. Leopoldo - Provincia de S. Pedro do Rio Grande do SuI - 2: ed.

    ~Ionteiro Baena - Compendio - Para.

    ~ esta redac

  • Rev i s tad e Ant ro p 0 f a 9 i a

    CONVITE AOS ANTROPOFAGOS

    Y Ot' , n .. i.o cst:io clImprinoo bern 0 ' se lls den' r '$ de antro-pofauo F' YCI',:] d ~. . 1l~1 e que voce enuuhu nUIl1 a timo 0 or. Fer-nando de ~rag:t!h~i. es e que 0 nosso querido ~rario , no espa-~o de .uma so manl1

  • 4 Rev i s t a de

    3 POETAS E 2 PROSADORES

    RUY ern :E LL\f.A - Co-lonia Z >! outr05 poemas - Port e> Alegre - 1928.

    Acho qu e Ruy Cirlie Lima faz versos como crianca faz barquinhos de pape!. Distrai, nao irrita u inguem e chega mesmo a inter essar a gente. A agua da chuva leva os barqninhos. Pronto : desapareceram. De V(;7. em quando urn del es da vollas div~rlidas, a gente lor-ce - afunda! nao Dfunda! - , val pu-lando qu e e uma boniteza. :\ao sal mal5 da memoria.

    Pal sagisla simples da terra gaucha 0 poeta d et e~la violencias e alturas. :\ao se afas ta do quotidi Dnu sossegado, gos-ta qu e se r egala dos quadrinhos in o-centes. :\ao entu ~iasma os leitores. :'lIas os leitores lh c fi cam qu er en do bern .

    Madrugada (que cs t... r evisteca dos meus p ecados public oJ u no seu segundo numer o) e excelent e: c melhor cousa do Co lonia Z. :'lIas (J li vr o tem outras cousas b oas: Moleque, Negro velho,

    Can~ao dos pescadores, Lirismo. Os potmas sao quasi todo~ ass im: A veneziana deixa entrar 0 so l e 0 ve nto cheio de perfumes frescos. As aves acordaram, nu quintalejo. Ha revoadas varando () asu!. Ha marulhos de arroio nas folhaE

    verdes. o galo vae ca n tar.

    A.~ csti lizac;:oes de Angelo Guido nao me agradaram nem um pouco.

    ;-';ICOLAS FUSCO SA1\-SONE - La trompeta de las voces alegres ~ Mon-tevideo - 1925.

    o li vr o e de tres anos atras. Mas como vern de fora pc'l e ser considera-do novidad e aqui.

    o poeta tinh a dezellovc anos quando o escrevcu: diez y nueve trampolinelil de voluntad y de alcgria diz Juan Par-ra del Riego num prdacio em que eu encontro frascs qu e b em poderiam ter sido escritas por Grs.c;:a Aranha. Porem isso nao vern ao casC) o 0 que importa e a maneira desenvolta com que 0 poe-ta solta sua poesia

    como una bandera para que jueguen con ella el sol, e l viento y el mar.

    o Ii vro tern mocidad e ate dizer che-ga: e exa ltado, agil, contente e baru-Ihenlo. Esta cheio de imagens, de ar-fancos, de odes. Em lodas as suas pa-ginas ha ' mar, h il esl. relas, ha frutas, h it manhas" crianCa') correndo, pass a-ros voando. No mp.io de tudo isso Ni-colas' joga se u coracaa pll.ra que tam-bem pule de vi brante ansiedad nueva hasta encontrar el canto mas sano que renueva e impulsa la sangre y la vida en una carrera audaz.

    Naturalmen te esse febre a estas ho-ras jll deve tcr baix:lUo urn tanto. Essa forca ainda incon ti da no La trompeta de lall voces alegres com certeza hoje em dla se poupa mois e tern assim maio res reservas d e clJergia para proe-zas fuluras. Seja como for pacta ,que comeca dilsse modo c certo que conti-nuo sempre

    saltando tOdOB 108 oblltacul08 del mnndQ

    cual si fuera un travieso cabrito ..

    A5 baslante. Tarde comc

  • o sr. Coelho Netto foi co-roado. Quem fez a bruta fes-

    lan~a foi a redac

  • o fa 9 i a e Revistad~ ~~~~~~~~~

    SANGUE BRASILEIRO

    As m:llas espessas eram noiles cseuras de breu com saeis cachilllbando de cocoras.

    Os ti

  • Rev i s t a de ~ t r 0 p 0 f a 9 i a 7

    os TRES SARGENTOS (Episodio da reyolu~ao de 1924 em S. Paulo)

    Em S. Paulo, na primcil'a semnn a de Julho de 1924, as Iw ifes aqu ecid as pOl' prolongad a es tiagem assemelha-val11-se as . da primavera. F avor ecida p ela t emper a tura , acorrera grand e aflu en c ia ao J a rdim da Luz na ultima vez em que a b anda da For caia na simpa tia da mulb er , d iminuiam os pa la\To es ate se d ilui rem nu m sOrI'iso p rom issor ; en tao. ao se depararpm noyament e no decurso do passeio [, r oda do tanqu e dos c isnes. aparen taya a rapariga um r es to de za nga para dizer " que nao r epe t'iss e mais aquela es tupidez' . F in-g ia- e a principio a ind a irritada, por fi m abrandando a te ,.eeit ar as propos-tas de passe io ou de b _ bidas que Ihe faz iam.

    F ecb aya 0 J ard im dcpo is dos nume-r os da banda. E SCC':1\ a - e a mu ltidao aos pouco pelo porloes do parqu e. ene b endo a ca l,ada, rroximas. Ern 0 mome nt o em qu e logo adean te. na aYc nida T iradenl es ou el o lario ria ruas da e ta.;ao. iam s c con trar qu e ti nham eompromi I) para " depoh rI mu \' irg('n~ rc ,> i,l('m a turl o. ~ ~ I ,w l (il~s. {I ~ 'lgua~ ~alr, br a~, i, mfl ~ li m (llt"r;~o. ]fou\'(' I) ca", rI (' Ulll l1Ialu to 9 ! ('anr) 3pren ri('r d ler. 3 guiar aull) l1Io \(I, (. clpar(' (' r na~ ru ,l'> rle S. Pau ll) no ',fl' n,rr(, ,I!' alu-gu(1 - quC' p,'go\'a ('n, pf(,ta ,In o, d('poi,> rJ( ('h('gar numa I(' \a d" '1I1'lIr"nt(, an~l f rlo , I IJ\. "'m QU lro lnf'HJ dc \ Jdc.i df) qUI (,\ br;f('o, J) 'J 0,,0,-mtj mt"tfJ, :JJnd:t mal r"..,'J1m(n t[O,., (',)_ b(," Lllla quI' ('hqlfJU ( 'Ilt frHn!' (. ('(,m ()'" Pl ',) '~n j:lrf'nl ',\ a IJan-r( \("\ m('Zf " dt P(JI' (t)m rrJUJ(1 nt) labl()' " mr'13' ri P ' '-'d., nl) Jarcllrn !' lIbl,r'r,

    ( onlinu a)

  • e Revista de Antropofapia

    BRASILIANA III

    ATITUDE

    Dc uma correspondcncia de Santos para 0 Diario Na-~ional de S. Pau lo, n. de 2-6-1928:

    "Circumstancia curi osa! Mau grado (IS enormeS propor-~oes qu e assumiu a ven tani a, fazendo lern brar um ver~adciro s imollm , 0 Monte Serra t permaneccu impassi~e l. Dlr-se-ia qu e; ell c so pretend e eahir numa no ite tranqu Jlla, en-luarada, ch eia de es trell as. N~o deixa de ser intcrcssa ntc essa a ttitudc fl eugmati-ca, brit&nnica, do Monte Serrat. "

    MOSICA Anlll1c io publi cado no Diario Popular de S. Paulo

    (1928 ) : .. A CRUZ DA TUA SEPULTURA ENCERRA UM MYS-

    TERIO. _ Valsa com letra; foi escripta junto a uma campa. Vend c-s e a rua do Th catro, 26."

    CIVISMO Dl! uma eorrespondencia dc Ti ete para 0 Diario Nacio-

    nal de S. P aul o, n. de 3-5-1928: "Em d ias da semana passada, uma ea ra\'ana do P. R. P.,

    eom pos ta de a lguns membros do directorio e de Antonio Malap,u eta, c idadao lusitano, dirigiu-se com des tin o ao bair-1'0 do Malo Dentro, na doce ilusao dc cncontrarem a lgum Joaquim Sil vcrio.

    L:i , 0 sr. Luiz Gervonett i, qu e c membro influente do Partido Democra ti co, r ecebeu-os com a lli vcz c depois de lhes dar

  • ANNO I ~MERO 4 SOORS. AGOST O ~ 1 ,~,2a

    Revista de Antropofagia Direcc;ao de ANToNIO DE ALCANTARA MACHADO

    Endere~o: 13, RUA BENJAM N CONSTANT - 3. 0 Pay. Sala 1

    A ENTRADA DOS MAMALUCOS

    Pode-se negar poesia a lliada E' impossivel negar a urn anuario demogni.fico.

    Ha dias an do mergulhado no paulista de 1924. Produz os tres efeitos do ceu de Cllritlba (na opi-niao da herma Alberto de Oliveira patinada a Ne-grita). E mais urn. Faz cantar, orar, sonhar e ins-true Entre outras cousas a geI) te fiCLl sabendo que japones nao e atropelado l apendicile nao mata negro, raio nao gos ta de m ulher.

    En tao a parte dedicada aos casamentos (nu-pcialidade diz 0 anuario) e uma gostosura que s6 vendo. A esta tistica da Capital, Santos, Campinas e Ribeirao P r eto constitue nesse penta urn puro madrigal a morena desta terra de mais homens q ue mulheres.

    Vao escutando. Em 1894 houve 456 casamen-tos (;ntre brasileiros, 143 entre brasileiros e estran-geiras, 127 entre estrangeiros e brasileiras, 854 en-tre estrangeiros. 0 imigrante ainda andava arisco. Desgrac;ado. A parcela dos casamentos entre a gen t(! de fora batia sozinha as tres restantes so-madns. E 0 brasileiro (engra

  • 2 '

    ANTROPOFAGiA 56. NAo. ORNITOFAGjA TAMBEM.

    A antropafagia venceu. Niio ha rest,aurante que se prese que nao facta

    figurar em seu menu a saborosa carne humana. o Mntadouro Academia de Letras estli desertO. 0" Rcademicos foram quasi todos devorados. E. para nuo haver falta de comida, arranj emos

    urn succedaneo a carne humana. Que seja. pOl' exemplo. a ornitofagia. E a comida. que vinha pulando. vin, voando. Vamos comer esse sabia que canta nas palmeiras .. . Vamos comer as pombas do pombal . . . Vamos comer "Alhatroz. Albatroz. aguia do

    oceano . . . "

    E viva a ornitofagia. Sabin, pomba, jurity. all>atroz e tudo mais, s6 para

    comida. Para voar ha 0 aeroplano ... E para r ei do oceano, cheg~ LindenLerg. ate 0 dia

    em que seja devorado tambem.

    JO!O DO PRESENTE

    JA'SAIRAM:

    Macunaima de Mario de Andrade __

    7$000 -- pedidos para rua Lopes Chaves n. 108 -- SAO PAULO

    e

    Laranja da China de Antonio de Alcantara Machado

    6$000 -- pedidos para Caixa Postal n. 1269 --

    SAO PAULO

    ::::

    AOOUGUE

    Ii t ra' Ale nil ' ue venho fazer uma proposta R VOCe _ AgO.ra sou : uch'!:re antropp fugo qu e vocc (: -

  • R e-v i 8 tad e Ant r 0 pot a g i

    CIDADE DO NATAL DO RIO

    35000 pntriotas. Fundada em 1599. Nasceu Cidadc como filho de Rei e principe. Padroeira: Nossa Srn hol'a da Apresentavao qu e vcio dcntro dum cai-xote, lento e manso pelo rio . Seculo XVIII. Tern um rio c t em 0 mar. Cam-po da Latecoere. T ennis. Cin emas. Au-tos. Cinco pharmacias. Bispado. Dois jornaes diarios. As mnlheres votam. 0 Presidente guia automoveis e viaja de aviao. 0 secr ctario mais velho roda os quarenta annos. Sa! dc. Macau. AI-godno do S erid6 .

    Ihao do Exercilo. Item da Policia. Mu-sica aos domingos no jardins com aulo-gyros perennes de soldados e c readas e vice-versn. Sorvele, piroli-10, folhado. Uma livraria e dUll s casas de Iivros.

    - Ja chegou 0 ultimo livro de Ar-del?

    - Nao senhora. Temos aqui agora o grande Marden.

    Nao ha r evisla nem Academia de Letras . Cidade pintada de sol com

    Cera de carnauba. Com'os. Assucar de qualro valles largos e verdes. Boiadao histol'ico qu e e m 1799 m andava dese-seis mil cabec;as p ar a Pernambuco. Insti-tuto Historico. Esco-la Domestica nume-1'0' urn no Brasil. Ae-reo - Club - de - Na-tal COIll dois avi6es e seis campos no ser-tao. Grupo-Escolar, grupo-escolar , grupo-escolar. Todo sertao se c.storce no polvo das I'odovias. 0 pneu

    ama~sa 0 chao ver-m elho dos comboios lerd0s, langues, lin-dos. Poetas. Poeti-sas. Ghronis tas ele-gantes. A v e n ida s aber las para todos os ventos. Sem eSC'..llros. Nem burac6es sor-nentos de espanta-gu-ry. Arvor es apara-dinhas es tylo Nurem-

    Desenho de ANTONIO GOMIDE - 1928

    berg. Ruas calc;adas, macias no escor~ H de

    r ego das descidas. Raros-raros ml ' 1 " Associw'i'es de ca ndade. umesmo a ., I

    Meia groza dc gruPGs de Foot-Ba l . Nao h a Rola r y-Club, nem Automovcl-Club n em Street-Cluh. Radi oma nia, .

    _ E' 0 quc Ih t rl igo. Pcgll ci os (II s-cursos de propaganda rio Hoover.

    _ 0 que esla me clizendo?.. . Morros, areins, or6s , mangu e'S, Clrys

    Pcdrns pe'sca-e nra tll s grudados nas ' . I n en 'ober l a. Tr ts ri a em bole com err.

    Ri o Cenlros botes des l es foram no . . I.clatorios. Bata -Opcrarios . Discurso s

    um a a legria de dom ingo. J ornaes do Rio. Politica. Sympalhias furi osas aos Pres tes Julio e Luis Carlos.

    _ Voce va i vcr a suinda de Min ns .. . _ Nem pelege . . . Nolicias de trinta horns. via Aza do

    Laic. Sabbados monotonos com r i n7.[l Iri ste de nada - faz r. Feij ondns he-

    ro i c!l~ . Pcscnria ri c c6 vo. A' noite, pes a de nrnft'l ('Olll fncho. nil s prnins longes d ' Arein Preta , Caj ll eiros. Co-qu ciros. MOllg1lbeirns. Ani l 's do i'lntlll -Club. "E' favo r en lrrgnr cs ln s brc-car la na cntrodG ." "Toil ett e prctn" .

    3

    GRANDE LUIS DA CAMARA CASCUDO

    Jan eiro. F es ta dos Santos-Reis. Con-gos com puitas e ganzas toucos e sur-deadores.

    " Acorda quem esla dormindo na serena madrugadh venhao vel' 0 Rei de Congos general de nossa Armada"

    Dezembro. Lapinhas e Pastoris com musicas de cern annos teimOJtl! e re-cordadores.

    " A remigio bale 0 g,"lo soltando a voz mavlOza"

    Bois. Bumba-Meu-Boi pedindo cmco ded0s para riscar em pap~1 aquellas toa-das roaravilhosas.

    Novembro. Festa da Pari . oelra. Irmanda-de do. Pass os, so-lemniss ima. Confe-dera

  • 4 . ;

    I . Ant r 0 P 0 f 'a g J Ii

    Revfsta de ==

    HISTORIADOR UM POETA E U,M

    Canto do Brasileiro Augus-to Frederico Schimidt-Rio de Janeiro - 1928.

    No principio parece uma r~a~ao con-tr