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Paulo Michel da Silva Gomes e José Júlio Ferreira Lima Análise Urbanística de Empreendimentos Localizados na Área de Expansão da Rodovia Augusto Montenegro, Belém do Pará. Paulo Michel da Silva Gomes i José Júlio Ferreira Lima ii (Universidade Federal do Pará) Resumo O presente trabalho identifica tendências urbanísticas ao nível do desenho urbano, ocorridas na última década, visando a consolidação dos recentes empreendimentos localizados no vetor de crescimento da Rodovia Augusto Montenegro, que passa por um processo de intensas transformações, em especial desde o ano de 2005, quando se tornou área de interesse para grandes investimentos imobiliários e de comércio e serviços, voltados para famílias de média e alta renda. As mudanças atuais no padrão de ocupação por assentamentos como conjuntos habitacionais, condomínios fechados e grandes equipamentos comerciais apontam para uma mudança nos padrões socioeconômicos, que por meio do emprego de técnicas de sintaxe espacial são relacionados com a integração global, constitui-se em subsídio para a elaboração de diretrizes urbanísticas para gestão da cidade. Palavras-chaves: Expansão urbana; alterações sócio econômicas; Space Syntax; Belém. Abstract The present study sought to identify urban tendencies at the urban design level, which have been taking place from the last decade, leading to a consolidation of recent estates located at the Augusto Montenegro Rd, which has been under a intense transformation, in special since the year 2005, when the area received the interest of real estate companies for building services and retail investments, for high and medium income people. Changes in the actual patterns of occupation by settlements such as housing estates, condominiums and large retail and services equipment lead to changes of socio economic patterns, and with the use of space syntax techniques area associated with the global integration of the city, and constitute subsidies for design and urban instruments in the urban management of the city. Keywords: Urban Sprawl; alterations of socioeconomic patterns, Space Syntax; Belém. Introdução O presente trabalho apresenta um estudo das alterações ocorridas na área de expansão urbana de Belém, no eixo da Rodovia Augusto Montenegro, a partir de 2005, e indica tendências de ocupação a partir das características seu desenho. Entende-se como tendência de ocupação a consolidação da centralidade de uso do solo bem como das condições de articulação viária. O processo de ocupação de Belém, tem alcançado seus bairros periféricos de forma bastante intensa. Empreendimentos habitacionais e comerciais vêm transformando a paisagem da cidade ao longo da última década, em especial na área de expansão ao longo da Rodovia Augusto Montenegro. Ao longo dos anos 2000, a área começou a passar por um processo de expansão evidente, indicando que o termo periferia pode vir a se tornar inapropriado para a ela se referir. As alterações de uso do solo como a instalação de grandes empreendimentos habitacionais e comerciais trarão grandes alterações no modo de vida naquela parte de população. O investimento feito na produção Relatório Final de Bolsa de Iniciação Científica

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Paulo Michel da Silva Gomes e José Júlio Ferreira Lima

Análise Urbanística de Empreendimentos Localizados na Área de Expansão da Rodovia Augusto Montenegro, Belém do Pará.

Paulo Michel da Silva Gomesi

José Júlio Ferreira Limaii (Universidade Federal do Pará)

Resumo O presente trabalho identifica tendências urbanísticas ao nível do desenho urbano, ocorridas na última década, visando a consolidação dos recentes empreendimentos localizados no vetor de crescimento da Rodovia Augusto Montenegro, que passa por um processo de intensas transformações, em especial desde o ano de 2005, quando se tornou área de interesse para grandes investimentos imobiliários e de comércio e serviços, voltados para famílias de média e alta renda. As mudanças atuais no padrão de ocupação por assentamentos como conjuntos habitacionais, condomínios fechados e grandes equipamentos comerciais apontam para uma mudança nos padrões socioeconômicos, que por meio do emprego de técnicas de sintaxe espacial são relacionados com a integração global, constitui-se em subsídio para a elaboração de diretrizes urbanísticas para gestão da cidade. Palavras-chaves: Expansão urbana; alterações sócio econômicas; Space Syntax; Belém. Abstract The present study sought to identify urban tendencies at the urban design level, which have been taking place from the last decade, leading to a consolidation of recent estates located at the Augusto Montenegro Rd, which has been under a intense transformation, in special since the year 2005, when the area received the interest of real estate companies for building services and retail investments, for high and medium income people. Changes in the actual patterns of occupation by settlements such as housing estates, condominiums and large retail and services equipment lead to changes of socio economic patterns, and with the use of space syntax techniques area associated with the global integration of the city, and constitute subsidies for design and urban instruments in the urban management of the city. Keywords: Urban Sprawl; alterations of socioeconomic patterns, Space Syntax; Belém.

Introdução

O presente trabalho apresenta um estudo das alterações ocorridas na área de expansão urbana de Belém, no eixo da Rodovia Augusto Montenegro, a partir de 2005, e indica tendências de ocupação a partir das características seu desenho. Entende-se como tendência de ocupação a consolidação da centralidade de uso do solo bem como das condições de articulação viária.

O processo de ocupação de Belém, tem alcançado seus bairros periféricos de forma bastante

intensa. Empreendimentos habitacionais e comerciais vêm transformando a paisagem da cidade ao longo da última década, em especial na área de expansão ao longo da Rodovia Augusto Montenegro. Ao longo dos anos 2000, a área começou a passar por um processo de expansão evidente, indicando que o termo periferia pode vir a se tornar inapropriado para a ela se referir. As alterações de uso do solo como a instalação de grandes empreendimentos habitacionais e comerciais trarão grandes alterações no modo de vida naquela parte de população. O investimento feito na produção

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Análise Urbanística de Empreendimentos Localizados na Área de Expansão da Rodovia Augusto Montenegro, Belém do Pará.

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imobiliária, na maioria das vezes, não está aliado a investimentos em infraestrutura. Grupos de maior renda que moram no centro da cidade fizeram uso de poder político com o objetivo de alcançar melhor provisão de infraestrutura nas áreas de seus interesses, enquanto grupos de baixa renda, com pouca influência política, recebem menos atenção quanto às intervenções públicas (LIMA, 2004, p. 154). A migração de classes mais altas para a área da rodovia Augusto Montenegro, anteriormente ocupada por baixa renda levaram a ser alvo de grandes intervenções urbanísticas, ao longo da próxima década.

De acordo com Maricato (2011), o espraiamento de empreendimentos de comércio e serviços (grandes shoppings, hipermercados e universidades) e condomínios residenciais em direção aos bairros periféricos, tem sido observado nos momentos que ocorre aquecimento econômico, o que é observado ao longo do eixo da rodovia Augusto Montenegro. Estes novos usos do solo baseiam-se na utilização intensa de transporte por automóvel, o que faz com que a consolidação do desenho urbano seja dependente da funcionalidade do sistema viário no qual estão inseridos os empreendimentos. As áreas reservadas na margem da rodovia passaram a ser ocupadas com a instalação de grandes supermercados, faculdades, condomínios, um shopping center e melhorias no sistema viário têm começado a criar condições para desenvolver novas centralidades, fazendo com que a população presente nos bairros ligados ao eixo da rodovia Augusto Montenegro (Mapa 1) não precise mais se deslocar até a área central da cidade para ter suas demandas de comércio e serviço atendidas. Estas condições levam alguns a caracterizar a área objeto de estudo como a "Nova Belém", ou seja, o novo centro da cidade, para o qual estão se destinando atualmente os interesses das elites locais.

1. Metodologia.

Para se obter uma visão geral do cenário

socioeconômico e da oferta de infraestrutura na área objeto de estudo, foram utilizadas as informações disponibilizadas pelo banco de dados online do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística- IBGE – para os Censos demográficos,

1Setor censitário é a menor unidade territorial, formada por área

contínua, integralmente contida em área urbana ou rural, com dimensão adequada à operação de pesquisas (CENSO, 2010).

Mapa 1: Localização da área objeto de estudo. Fonte: Censo 2010. Elaboração: Paulo Michel Gomes, 2015.

dos anos 2000 e 2010. O resultado de cada um dos dois Censos fornece informações a respeito de diversas variáveis, como número de moradores, densidade populacional, grau de instrução, entre outras, sendo estas informações referentes a uma área denominada pelo IBGE como setor censitário1.

Tornou-se necessária a seleção de apenas algumas variáveis que foram consideradas mais relevantes para este trabalho, a saber:

x Número total de moradores; x Densidade populacional; x Quantidade de domicílios; x Média de renda.

Paulo Michel da Silva Gomes e José Júlio Ferreira Lima.

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Após a obtenção da malha de setores censitários do município de Belém (disponível no banco de dados online do IBGE), realizou-se, em ambiente GIS2, o agrupamento do desenho dos setores censitários que compõem os oito bairros da área objeto de estudo em grupos de setores censitários, tornando-se possível alcançar uma melhor interpretação quanto à espacialização das informações contidas nos Censos, uma vez que a dimensão reduzida e pontual de setor censitário isolado não se mostrou capaz de ser analisado com a caracterização do desenho urbano local.

Para a junção do desenho dos setores censitários em grupos, inicialmente independentes entre si, buscou-se reunir tipologias habitacionais e certa continuidade da malha viária para tornar comparável as características que se encontram em setores censitários diferentes, porém vizinhos. Foram inicialmente criados 72 grupos de setores censitários e, posteriormente (para o cruzamento dos dados referentes aos setores censitários da área objeto de estudo com os seus respectivos desenhos, em ambiente GIS), foi confeccionada uma tabela base em forma de planilha eletrônica, contendo os dados relativos a todos os setores censitários que compõem o recorte espacial analisado, e informações sobre os domicílios nas tipologias habitacionais presentes em cada um, a saber: densidade populacional, média de renda, entre outras.

Tendo-se realizado a compatibilização dos limites dos setores censitários com os dados dos Censos 2000 e 2010, em ambiente GIS, o arquivo digital resultante passou a ser a base para a análise realizada neste trabalho, através dele pôde-se realizar a comparação histórica das mudanças socioeconômicas e morfológicas ocorridas no período entre os dois Censos, dentro área de estudo. A análise estava, em parte, sujeita à limitação encontrada ao se utilizar apenas as informações dos Censos. Os resultados dos Censos são uma ferramenta eficaz para manipular dados relativos ao perfil socioeconômico ou das condições de moradia da população residente na área objeto de estudo, no entanto não satisfaz se o objetivo for obter informações de outras naturezas, como valor

2 GIS - Geographic Information System - Sistema de

informações baseado em computador que permite a captura, modelagem, manipulação, recuperação, análise e apresentação de dados georreferenciados. (WORBOIS, 1995 apud CÂMARA, 2004).

da terra, dados sobre sistema viário, uso do solo, entre outras.

2. Resultados

A manipulação da base de dados composta pela

malha de grupos de setores censitários com as suas respectivas informações socioeconômicas e de infraestrutura dos Censos 2000 e 2010, em ambiente GIS, proporcionou um panorama a respeito das mudanças ocorridas dentro do período de tempo estudado. Através de representações gráficas, o ambiente GIS foi capaz de espacializar e evidenciar onde as alterações das variáveis dos Censos se deram de modo mais expressivo, tornando possível levantar discussões acerca dos fatores que podem ter influenciado nestas mudanças e seus desdobramentos futuros.

Em ambiente GIS foram gerados mapas temáticos, que mostram, em escala de cores, em quais grupos o valor para as variáveis é maior ou menor. Para as variáveis Número total de moradores, Densidade populacional, Quantidade de domicílios e Média de renda, foram gerados 4 mapas temáticos: Um mostrando a situação da área em 2000, outro para 2010; um mostrando a diferença numérica entre os dois resultados e outro mostrando a taxa de crescimento para a variável, no período de tempo estudado.

Mesmo que as duas primeiras formas de interpretação dos resultados dos Censos, espacializados, mostrem a evolução de cada variável analisada, no período 2000-2010, o mapa com as taxas de crescimento para as variáveis se mostrou mais efetivo em determinar quais áreas sofreram aumento (ou decréscimo) de modo mais significativo, para então investigar-se os fatores que geraram estas mudanças.

A figura 1, que apresenta a taxa de crescimento do número total de moradores dos grupos de setores censitários, exemplifica como se deu a alteração desta variável dentro da área objeto de estudo, permitindo relacionar o dado obtido às transformações ocorridas

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com a implantação de empreendimentos imobiliários, de comércio e serviços, especialmente a partir de 2005.

Figura 1: Taxa de crescimento do número de moradores nos grupos de setores censitários e empreendimentos implantados antes e depois de 2005. Fonte: Censos 2010. Elaboração: Paulo Michel Gomes, 2015.

A figura acima mostra o eixo da rodovia Augusto Montenegro, destacado, e os grupos de setores censitários, sobrepostos com o contorno dos empreendimentos imobiliários instalados antes e depois do ano 2005, e aponta em quais grupos ocorreu um aumento (ou decréscimo) mais relevante. Apesar do aumento natural no contingente populacional, ao longo dos anos, notado nos grupos em laranja-claro, há grupos de setores censitários onde ocorreu um aumento entre 200 a 300%, nos grupos em vermelho-laranja, e de até 761,02%, nos grupos em vermelho. Pode-se atribuir este aumento à implantação de empreendimentos imobiliários instalados no período entre 2000 e 2010, principalmente na rodovia e no entorno dos cruzamentos vários implantados após 2009.

Figura 2: Novos grupos de setores censitários. Fonte: Censo 2010. Elaboração: Paulo Michel Gomes, 2015.

3. Características do desenho urbano na área

objeto de estudo. A análise preliminar da área objeto de estudo

através do resultado dos Censos 2000 e 2010 espacializados em grupos de setores censitários foi capaz de indicar plenamente os pontos onde houveram mudanças mais relevantes no perfil socioeconômico e de infraestrutura dos moradores, sendo que estes pontos mantêm relações importantes com a rodovia Augusto Montenegro, dependendo dela como principal via integradora para conectar a área objeto de estudo às áreas centrais do município. No entanto, para a análise das características do desenho urbano e identificação da hierarquização viária, a utilização dos primeiros grupos de setores censitários se mostrou incompatível com os objetivos principais do plano de trabalho desta pesquisa.

Paulo Michel da Silva Gomes e José Júlio Ferreira Lima.

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Grupo Tipologia Habitacional Nome da Ocupação

1 Condomínio e Ocupação irregular Água Cristal, Bosque Felicidade, Planetário, Mirante do Parque, Ocupação irregular 2 Condomínio, Conjunto Habitacional, Ocupação irregular Catalina, Xavante I e II, Rio das Pedras, Natália Lins, Parque Jardins, Montenegro Empresarial, Ville Lagune, Ville

Solare, Chácaras Montenegro, Ocupações Irregulares 3 Ocupação irregular Ocupação irregular 4 Condomínio, Conjunto Habitacional, Ocupação irregular Parklândia, Augusto Montenegro, Panorama 21, Paulo Fonteles, Carmelândia, Ocupações irregulares 5 Condomínio, Ocupação irregular Enéas Resques, Greenville Exclusive, Jardim Espanha, Ocupações irregulares 6 Condomínio, Conjunto Habitacional Greenville I, Montenegro Boulevard, Benjamim Sodré, Morada do Sol, Ocupação Irregular 7 Condomínio, Ocupação irregular Costa Fortuna, LionVille, Jardim Europa, Ocupações irregulares 8 Condomínio, Conjunto Habitacional, Ocupação irregular Ilha Bela, Rio Leblon, Park Brasil, Ocupações irregulares 9 Condomínio, Conjunto Habitacional, Ocupação irregular Antônio Gueiros, Cordeiro de Farias, Parque União, Cidade Jardim I, Bela Vida, Ocupações irregulares

10 Condomínio, Conjunto Habitacional Greenville II, Jardim Sevilha, Mururé, Orlando Lobato, Pedro Teixeira 11 Conjunto Habitacional, Ocupação irregular Ariri-Bolonha, Carneirinho, Xingu, Ocupações irregulares 12 Condomínio, Ocupação irregular Mario Covas I e II, Adélia Hachen, Ocupações irregulares 13 Condomínio, Conjunto Habitacional, Ocupação irregular Cidade Jardim II, Tapajós, Residencial Cabanos, Itapuã, Canarinho, Zoé Gueiros, Raimundo Jinkings, Ocupações

irregulares 14 Condomínio, Conjunto Habitacional, Ocupação irregular Rio Volga, Bom Jesus, Park Araguaia, Park Amazônia, Ocupações irregulares 15 Condomínio, Ocupação irregular José Homobono I e II, Anísio Teixeira I e II, Ocupação irregular 16 Condomínio, Conjunto Habitacional, Ocupação irregular Satélite, Ilha Porchat, Verano Club, Ocupações irregulares 17 Condomínio, Conjunto Habitacional, Ocupação irregular Maguari, Porto Laranjeiras, Ocupação irregular 18 Ocupação irregular Ranário, 26 de Outubro 19 Condomínio, Ocupação irregular Jardim Maricá, Jardim Portugal, Park Ville, Ocupação irregular 20 Condomínio, Ocupação irregular Fé em Deus, Jardim Bom Clima, Campo Bello, Teotônio Vilela e João Coelho 21 Condomínio, Conjunto Habitacional, Ocupação irregular Vila Nazareno, Vila Roseira, Bela Manoela I e II, Safira Residence Park, Total Life, Tenoné I e II 22 Condomínio, Ocupação irregular Ilha Bela, Rio Leblon, Eduardo Angelim, Residencial Castanheira, Ocupação irregular

Figura 3: Localização dos empreendimentos imobiliários da área objeto de estudo, implantados antes e depois de 2005. Fonte: Censo 2010 e visitas de campo. Elaboração: Paulo Michel Gomes, 2015.

Quadro 1: Grupos de setores censitários e suas tipologias habitacionais.

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Para adquirir uma melhor perspectiva da dinâmica viária da área objeto de estudo, optou-se por reagrupar os 72 grupos de setores censitários em 22 novos grupos (Figura 2 e Quadro 2), tendo como critério o compartilhamento de uma mesma malha viária, mais local, para cada grupo.

Após a definição dos novos grupos de setores censitários, tornou-se necessária a criação de uma nova planilha eletrônica, para recalcular os valores das variáveis utilizadas na primeira análise dos dados dos Censos 2000 e 2010. Esta nova planilha foi agregada ao desenho dos novos grupos, em ambiente GIS, resultando na base desta última etapa do trabalho, que foi realizar a associação das transformações urbanas e socioeconômicas ocorridas no período entre os dois Censos.

4. Espacialização dos dados dos Censos 2000 e

2010 e Sintaxe espacial. Partindo da base de arquivos usada para a

primeira etapa desta pesquisa (desenho dos grupos de setores censitários em ambiente GIS e planilha eletrônica com os dados referentes à área objeto de estudo), adaptada aos novos grupos de setores censitários, realizou-se o processamento das informações relativas às variáveis escolhidas. Em ambiente GIS, foram gerados mapas temáticos para mostrar a evolução de cada variável, entre 2000 e 2010.

Para contribuir para esta análise, elaborou-se uma figura com a localização dos empreendimentos imobiliários presentes na área objeto de estudo (Figura 3). O Quadro 1 traz informações sobre as tipologias habitacionais para cada um dos 22 novos grupos de setores censitários.

Quanto às variáveis com informações do perfil socioeconômico Número total de moradores, Densidade populacional, Quantidade de domicílios e Média de renda, optou-se por calcular a taxa de crescimento no período 2000-2010. Os resultados deste processo foram posteriormente confrontados com o resultado da análise da sintaxe espacial, gerando a conclusão do presente trabalho.

3 A Região Metropolitana de Belém é uma conturbação urbana

formada pelos municípios de Belém, Ananindeua, Marituba, Benevides, Santa Izabel do Pará, Santa Bárbara do Pará e Castanhal.

Metodologia da Sintaxe Espacial. A sintaxe espacial, ou Teoria Lógica Social do

Espaço, é um conjunto de proposições a respeito da correspondência entre arranjos morfológicos dos espaços, e as relações sociais que se desenvolvem neles. Desenvolvida nos anos 1970, na University College London - UCL - a partir dos trabalhos de Bill Hillier e Julienne Hanson, foi difundida através da obra "The Social Logicof Space" (1984).

Para Hillier (2005), o objetivo histórico da sintaxe espacial foi construir a ponte entre a dimensão espacial e a dimensão social da cidade, estudadas separadamente até então, não existindo anteriormente um corpo de conhecimento capaz de dialogar com ambos os aspectos e estabelecer relações entre eles.

Neste trabalho foi utilizado o mapa axial da Região Metropolitana de Belém (RMB)3, elaborado por Guimarães (2013), e trata-se de uma representação de todos os espaços abertos do sistema em questão, através de linhas axiais. O mapa axial foi então processado com o software Depthmap, desenvolvido pela University College London. O software realiza o cálculo do número de mudanças de direção necessárias para ir de um ponto a outro, dentro do sistema, e colore as linhas axiais de acordo com seu grau de profundidade, em uma escala de cores que varia de vermelho - para as linhas com os índices mais elevados - ao azul escuro - para as linhas com os índices sintáticos mais baixos - sendo esta escala de cores utilizada por várias modalidades de análise, dentro do Depthmap. Neste trabalho, utilizou-se a categoria Integração Global, que demonstra o potencial de acessibilidade do espaço em estudo em relação ao conjunto urbano no qual está inserido. Esta medida mostra a profundidade topológica dos espaços: quantas mudanças seriam necessárias para ir de um ponto a todos os outros espaços, dentro do sistema urbano em questão. Hillier e Hanson (1984) estabelecem que um assentamento ou espaço integrado, do ponto de vista da sintaxe espacial, é aquele que apresenta valores de integração global altos, ao passo que o espaço com linhas axiais de menor valor é considerado segregado, dentro do sistema.

Paulo Michel da Silva Gomes e José Júlio Ferreira Lima.

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5. Correspondência da análise do perfil socioeconômico com a Sintaxe Espacial. Após o processamento e geração dos mapas

axiais, seu desenho vetorial foi exportado e manipulado no software editor de imagens vetoriais Adobe® Illustrator, onde somou-se o desenho vetorial dos novos grupos de setores censitários. Partindo deste material, buscou-se identificar, em cada novo grupo, quais vias possuem maior valor de integração global e apontar, assim, quais grupos possuem melhor ou pior conectividade com o sistema viário da RMB.

Um fator que dificultou, em parte, a análise foi o caráter experimental do software Depthmap, ainda em fase de desenvolvimento. O software mostrou-se eficaz na realização dos cálculos dos valores de integração global utilizados e o mapa axial gerado foi fundamental para a presente pesquisa. A dificuldade se deu pela limitação do software quanto às opções de edição do mapa axial. Conforme descrito anteriormente, o mapa axial gerado apresenta os índices de integração global na forma de escala de cores. No entanto, não foi possível encontrar uma opção dentro do software que permitisse manipular ou isolar os grupos de linhas, por cor. Porém o formato digital do mapa axial gerado é executável no software Adobe® Illustrator, onde há a opção de manipular as camadas de cores de forma independente.

Foi identificada, dentro do recorte da área objeto de estudo, a graduação em 7 cores, para os valores da integração global do mapa axial gerado pelo Depthmap (Figura 4). Posteriormente, para cada cor foi criada uma imagem própria, podendo-se visualizar por cores, separadamente, as vias que compõe a malha viária do eixo da rodovia Augusto Montenegro, e apontar quais possuem maior ou menor grau de integração global.

Com base em visitas de campo aos bairros que compõe a área objeto de estudo, determinou-se quais vias têm maior relevância para a dinâmica de mobilidade da área na qual está inserida. Em ambiente

GIS, elaborou-se então um shapefile (formato de arquivo para softwares GIS, que usa a analogia de camadas sobrepostas para compor uma imagem final) com o traçado destas vias (Figura 5), associando ao desenho de cada via seu respectivo valor de integração global (Figura 6). Com isso foi possível perceber de que forma e em que nível as malhas viárias mais locais se conectam ao eixo da rodovia Augusto Montenegro, e se tornou mais clara a relação de dependência de grupos de setores censitários mais distantes, mas que ainda sofrem influência da rodovia, seja como rota para deslocamento até outras regiões da RMB, seja para a utilização de equipamentos de comércio e serviços, já presentes ao longo dela.

Figura 4: Mapa axial de integração global e grupos de setores censitários. Fonte: Censo 2010 e Guimarães (2013). Elaboração: Paulo Michel Gomes, 2015.

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Figura 5: Vias principais da área objeto de estudo. Fonte: Censo 2010. Elaboração: Paulo Michel

Figura 6: Faixas de variação dos índices de integração global – HH. Fonte: Software Depthmap.

Figura 7: Vias principais e índices médios de integração global. Fonte: Censo 2010 e Depthmap. Elaboração: Paulo Michel Gomes, 2015.

Paulo Michel da Silva Gomes e José Júlio Ferreira Lima.

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Relação da integração global com as mudanças no perfil socioeconômico.

O processamento da variável Número total de

moradores, em ambiente GIS, gerou a Figura 8, que mostra a taxa de crescimento da variável, no período entre os dois Censos. Constatou-se também as altas taxas de crescimento populacional nos grupos às margens da rodovia, como o Grupo 1 e 21, com taxas de crescimento de 131,93% e 124,50%, respectivamente. Este comportamento pode ser atribuído ao alto poder de integração global que a rodovia Augusto Montenegro possui, o que faz com que as áreas mais próximas dela despertem maior interesse por parte das construtoras que, desde 2005, têm implantado ali novos empreendimentos

imobiliários, conforme a Figura 3. Alguns grupos (em laranja-claro na Figura 8) mantiveram taxas de crescimento mais baixas, para a variável, por serem áreas relativamente já consolidadas, como os grupos 4, 6, 7, 9, 10 e 13, que possuem conjuntos habitacionais e condomínios implantados antes de 2005 como tipologia habitacional, estando totalmente ocupados. A cor amarela (indicando os valores menores) mostra onde houve uma retração de 18,45% no número de moradores, no Grupo 3, situado no bairro Benguí. Relacionando este resultado ao resultado da análise da sintaxe espacial, pode-se atribuir o êxodo da população deste grupo ao seu alto grau de segregação espacial em relação à sua distância do eixo integrador da rodovia Augusto Montenegro. Uma vez que a renda de sua população é baixa (média de R$ 545,61 em 2010, a

Figura 9: Taxa de crescimento da Média de renda. Fonte: Censo 2010. Elaboração: Paulo Michel Gomes, 2015.

Figura 8: Taxa de crescimento do número de moradores. Fonte: Censos 2000 e 2010. Elaboração: Paulo Michel Gomes, 2015.

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segunda menor, entre todos os 22 grupos), seus habitantes dependem exclusivamente do transporte público para se deslocar a outros pontos da cidade, e as linhas de ônibus que servem a área utilizam a rodovia Augusto Montenegro como rota, tornando o Grupo 3 um dos menos interessantes quanto à localização, sendo este um fator que pode motivar sua população a migrar para áreas mais favorecidas.

Relacionadas à variável Número de moradores,

estão as variáveis Quantidade de domicílios e Densidade populacional. Os grupos onde a densidade populacional, aliada ao crescimento da quantidade de domicílios, aumentou mais expressivamente, novamente são os que estão localizados mais próximos da rodovia Augusto Montenegro, por conta da implantação de empreendimentos imobiliários, que preferivelmente tem sido instalados nas áreas com maiores índices de integração global. Nos grupos 8, 14, 16, 18, 19 e 20, pode-se atribuir o aumento destas três variáveis à presença de ocupações irregulares, que permitem uma maior liberdade para a modificação ou implantação de domicílios, enquanto que nos grupos onde predominam os conjuntos habitacionais já consolidados, há uma maior dificuldade em instalar novas residências, por não haver oferta de espaço necessário.

Quanto à taxa de crescimento da Média de renda dos grupos de setores censitários (Figura 9), observou-se que as maiores taxas ocorreram nos grupos que possuem condomínios como tipologia habitacional e que estão diretamente ligados à rodovia Augusto Montenegro, com exceção do Grupo 8 que possui conexões viárias mais relevantes com a avenida Independência, através da rua Monte Claro (Figuras 5 e 7). A concentração da população com médias de renda mais altas às margens da rodovia demonstra que o grau de integração global desta torna seu entorno imediato a área mais nobre da região, atraindo este

perfil de morador (e de empreendimentos imobiliários com segmentos para faixas de renda mais altas), ao mesmo tempo em que os grupos de setores censitários mais distantes acabam sendo menos atrativos, levando-se em consideração a distância entre eles e a rodovia, concentrando ali a população mais pobre.

6. Subsídios para a elaboração de

instrumentos urbanísticos O estudo aqui desenvolvido pode servir para a

elaboração de diretrizes urbanísticas a serem inseridas em processos de implantação de parcelamentos urbanos. Apesar da inexistência de uma relação mais direta entre a legislação de parcelamento do solo urbano e os ditames do Estatuto das Cidades (BRASIL, 2001), tomando-se os dispositivos incluídos na Lei Federal 6766/79 quanto aos requisitos urbanísticos para remembramentos e mais recentemente para a implantação das tipologias observadas na área de estudo, sugere-se que a possibilidade de obter uma análise mais detalhada da capacidade de integração da malha urbana de entorno de parcelamentos e de um aprofundamento da análise de integração dos arruamentos internos dos assentamentos o estudo será de grande importância para a prática da gestão urbanística.

A constituição de diretrizes viárias, a partir do que é observado nas figuras a seguir, constitui-se na possibilidade de articular a previsão de novas vias com características operacionais que garantam a continuidade da malha viária existente quando da implantação de novos empreendimentos (loteamentos e parcelamentos), bem como ligação entre as diversas regiões da cidade, otimização da circulação. A separação de vários níveis de integração por meio da separação do que foi observado pelo estudo de integração global poderá ser de grande valia para as administrações locais.

Paulo Michel da Silva Gomes e José Júlio Ferreira Lima.

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Figura 9: Linhas do mapa axial apresentadas segundo o grau de integração global e grupos de setores censitários. Fonte: Censo 2010 e Depthmap. Elaboração: Paulo Michel Gomes, 2015.

Conclusões Foi possível constatar, no decorrer deste

trabalho, a grande relevância da rodovia Augusto Montenegro como eixo estruturador para conectar os oito bairros que compõe a área objeto de estudo com o tecido urbano da cidade de Belém. A área, considerada como periférica se levarmos em consideração sua localização em relação às áreas

centrais da cidade, tem demonstrado ter condições de se consolidar como uma nova centralidade urbana nos próximos anos apesar de haver uma série de dificuldades de integração da malha viária devido ao caráter fragmentado com que os empreendimentos s„o implantados. Através da investigação do grau de integração da malha viária da área verificou-se que a implantação de grandes empreendimentos imobiliários ‡s margens da rodovia pouco contribuem

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para compacidade e melhor aproveitamento de infraestrutura, na medida em que contribui para a segregação dos espaços em seu entorno, que dependem em grande medida da acessibilidade por meio do eixo da rodovia. Este é um dos fatores que acentua a fragmentação do tecido urbano na área, fazendo-se necessária a criação de um planejamento que possa favorecer a implantação de um padrão de desenho urbano que propicie uma lógica de continuidade entre os padrões morfológicos que compõem a área, em oposição ao modelo individualista aplicado atualmente.

Referências Bibliográficas

CÂMARA, G.; MONTEIRO, A. M.; FUCKS, S. D.; CARVALHO, M. S. Análise Espacial de Dados Geográficos: Análise Espacial e Geoprocessamento. Cap 1. Brasília, EMBRAPA, 2004.

GUIMARÃES, Gisele Joicy da Silva. Novas centralidades na malha urbana da Região metropolitana de Belém: Estudo Aplicado ao Espaço da Rodovia Augusto Montenegro. 2012. 187 f. Dissertação de mestrado. Universidade Federal do Pará.

HILLIER, B.; HANSON, J. The social logic of space. Cambridge: Cambridge University Press, 1984.

IBGE. Base de Informações do Censo demográfico 2010: resultados do universo por setor censitário. 2010. Disponível no site

IBGE. Sinopse do Censo demográfico, 2010. Disponível no site www.ibge.gov.br.

MARICATO, Ermínia. Impasse da Política Urbana no Brasil. 1ª ed. Petrópolis: Vozes, 2011.

WORBOYS, Michael. GIS: A Computing Perspective. 2ª ed. Florida: CRC press, 1995.

iGraduando da Faculdade Arquitetura e Urbanismo da

Universidade Federal do Pará. Bolsista PIBIC/UFPA. E-mail:

[email protected]

iiDocente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo/Programa

de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo, Universidade

Federal do Pará. E-mail: [email protected]

Paulo Michel da Silva Gomes e José Júlio Ferreira Lima.

Relatório Final de Bolsa de Iniciação Científica

Parecer do Orientador O aluno Paulo Michel Gomes conduziu as atividades previstas no plano de trabalho aprovado pelo PIBIC de forma satisfatória. Apesar de ter tido dificuldades em função da necessidade de maior aprofundamento teórico, o produto obtido corresponde ao que foi a ele confiado. Belém, 10 de agosto de 2015.

Prof. Dr. José Julio Ferreira Lima Faculdade de Arquitetura e Urbanismo –

FAU/ITEC/UFPA

Relatório Final de Iniciação Científica