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15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 1 ANÁLISE PRELIMINAR DA OCORRÊNCIA DE AVALANCHE DE ROCHA NA BACIA DO RIO DO ENTUPIDO, MUNICÍPIO DE QUELUZ, SP Harideva Marturano Egas 1 ; Celso Aluísio Graminha 2 ; Marcio Roberto M. de Andrade 3 ; Marcelo Oliveira Romão 4 Resumo Um evento de avalanche de rocha foi descoberto na região das escarpas fraturadas da Serra da Mantiqueira, no Município de Queluz, Estado de São Paulo. Trata-se de um evento de grande porte, ocorrido no dia 15 de novembro de 2011 e cujos efeitos resultaram em grande quantidade de material rochoso mobilizado, alcançando um volume aparente de cerca de 100.000m 3 . A área estudada localiza-se numa escarpa íngreme na borda sudeste do Maciço de Passa Quatro. A totalidade do volume escorregado foi depositado ao longo do fundo de vale do Rio do Entupido onde ocorreu o fluxo de material rochoso até uma distância de 600mts do ponto de aporte do material, indicando processo com energia muito elevada. As chuvas observadas não configuraram índices característicos de eventos climáticos extremos, revelando que os fatores predisponentes e preparatórios tiveram papel fundamental na deflagração dos processos de escorregamento e avalanche de rocha. Não houve ocorrência de danos envolvendo pessoas ou instalações, sendo a notícia de ocorrência de avalanches de rocha relativamente rara na literatura brasileira. Palavras-Chave Escorregamento de rocha; avalanche de rocha, Serra da Mantiqueira, Maciço de Passa Quatro. Abstract A rock avalanche event was discovered in the region of fractured cliffs of the Serra da Mantiqueira, in the city of Queluz, State of Sao Paulo. It is a large event, held on November 15, 2011 and whose effects resulted in large quantities of rocky material mobilized, reaching an apparent volume of about 100.000m 3 . The study area is located on a steep slope at the southeast edge on Passa Quatro Massif. The entire slipped volume was deposited over Do Entupido river valley bottom where there was rocky material flow to a distance of 600mts of the material input point indicating process with very high energy. The rains have not configured observed characteristic indices of extreme weather events, revealing that the predisposing factors and preparatory played a key role in the initiation of slip processes and avalanche of rock. There was no damage to involving people or premises, and the occurrence of avalanches news relatively rare rock in Brazilian literature. Keywords Rock slide; rock avalanche; Serra da Mantiqueira; Passa Quatro Massif. 1 Geóg., MSc, Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, (12) 3205-0160, [email protected] 2 Geól., MSc, Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, (12) 3208-7843, [email protected] 3 Geól., Dr, Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, (12) 3205-4103, [email protected] 4 Tec., Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, (12) 3208-7843, [email protected]

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15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 1

ANÁLISE PRELIMINAR DA OCORRÊNCIA DE AVALANCHE DE ROCHA

NA BACIA DO RIO DO ENTUPIDO, MUNICÍPIO DE QUELUZ, SP

Harideva Marturano Egas 1; Celso Aluísio Graminha

2; Marcio Roberto M. de Andrade

3; Marcelo

Oliveira Romão 4

Resumo – Um evento de avalanche de rocha foi descoberto na região das escarpas fraturadas da Serra da Mantiqueira, no Município de Queluz, Estado de São Paulo. Trata-se de um evento de grande porte, ocorrido no dia 15 de novembro de 2011 e cujos efeitos resultaram em grande quantidade de material rochoso mobilizado, alcançando um volume aparente de cerca de 100.000m

3. A área estudada localiza-se numa escarpa íngreme na borda sudeste do Maciço de

Passa Quatro. A totalidade do volume escorregado foi depositado ao longo do fundo de vale do Rio do Entupido onde ocorreu o fluxo de material rochoso até uma distância de 600mts do ponto de aporte do material, indicando processo com energia muito elevada. As chuvas observadas não configuraram índices característicos de eventos climáticos extremos, revelando que os fatores predisponentes e preparatórios tiveram papel fundamental na deflagração dos processos de escorregamento e avalanche de rocha. Não houve ocorrência de danos envolvendo pessoas ou instalações, sendo a notícia de ocorrência de avalanches de rocha relativamente rara na literatura brasileira.

Palavras-Chave – Escorregamento de rocha; avalanche de rocha, Serra da Mantiqueira, Maciço de Passa Quatro.

Abstract – A rock avalanche event was discovered in the region of fractured cliffs of the Serra da Mantiqueira, in the city of Queluz, State of Sao Paulo. It is a large event, held on November 15, 2011 and whose effects resulted in large quantities of rocky material mobilized, reaching an apparent volume of about 100.000m

3. The study area is located on a steep slope at the southeast

edge on Passa Quatro Massif. The entire slipped volume was deposited over Do Entupido river valley bottom where there was rocky material flow to a distance of 600mts of the material input point indicating process with very high energy. The rains have not configured observed characteristic indices of extreme weather events, revealing that the predisposing factors and preparatory played a key role in the initiation of slip processes and avalanche of rock. There was no damage to involving people or premises, and the occurrence of avalanches news relatively rare

rock in Brazilian literature.

Keywords – Rock slide; rock avalanche; Serra da Mantiqueira; Passa Quatro Massif.

1 Geóg., MSc, Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, (12) 3205-0160,

[email protected] 2 Geól., MSc, Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, (12) 3208-7843,

[email protected] 3 Geól., Dr, Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, (12) 3205-4103,

[email protected] 4 Tec., Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, (12) 3208-7843,

[email protected]

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INTRODUÇÃO

Este artigo aborda a análise preliminar de um grande movimento de massa ocorrido em novembro de 2011, no Maciço de Passa Quatro (Serra da Mantiqueira), mais especificamente na microbacia do Rio do Entupido, no Município de Queluz, Estado de São Paulo (Figura 1). Este processo gerou, através de grandes desplacamentos de rocha, em partes de uma encosta do maciço, uma avalanche de blocos de rocha canalizados junto ao Rio do Entupido. Notou-se que o processo deflagrado guarda íntima relação com questões estruturais da formação do maciço, principalmente por fraturas na rocha. Com base nas formas e estruturas observadas é possível indicar que este processo é recorrente e de fundamental importância na evolução do relevo.

Para a investigação do evento deflagrador do movimento de massa constituíram dados de precipitação acumuladas nos últimos dias em estações pluviométricas próximas e dados qualitativos de Radar Meteorológico (Pico do Couto/DECEA) correlacionando com o dia e horário do evento. Ainda, foram realizados os mapeamentos preliminares da cicatriz e área de atingimento da corrida através de imagens de satélites e modelos digitais de elevação.

Figura 1. Localização da área de estudo e das estações pluviométricas.

1. CARACTERIZAÇÃO DO MEIO FÍSICO DA ÁREA DE ESTUDO

1.1. Geologia

Os maciços de rochas sieníticas de Passa Quatro e Itatiaia correspondem a intrusões que se destacam no relevo circundante da Serra da Mantiqueira que representa o embasamento regional, inserido na porção central da Faixa Ribeira, de idade arqueana a neoproterozóica altamente metamorfizada e remobilizadas no Ciclo Brasiliano (590-520Ma) (HASUI et al., 1975).

Do ponto de vista morfoestrutural, Salvador & Riccomini (1995) estudando a região denominada Alto Estrutural de Queluz, descrevem numerosas evidências de movimentos tectônicos recorrentes e ativos até os tempos recentes, onde as estruturas de caráter rúptil permitiram o reconhecimento de três fases de movimentações neotectônicas inter-relacionadas.

O controle tectônico-estrutural se reflete na compartimentação morfotectônica a partir da integração dos dados estruturais, da análise dos lineamentos estruturais e da rede de drenagem, que definem trends de lineamentos que correspondem aos principais sistemas de esforços rúpteis identificados na região da área de estudo e ilustrados na Figura 2.

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Figura 2. Modificado de Salvador & Riccomini (1995). Legenda: Direção dos esforços relacionada ao binário transcorrente dextral E-W, com compressão NW-SE e extensão NE-SW. 1) embasamento pré-cambriano; 2) rochas alcalinas (MPQ – Maciço de Passa Quatro, MIT – Maciço de Itatiaia); 3) sedimentos da Formação

Resende; 4) sedimentos quaternários; 5) falha, falha inferida; 6) Reservatório do Funil; 7) Rio Paraíba do Sul; 8) Principais municípios IT – Itatiaia/RJ, CR – Cruzeiro/SP; 9) área do estudo.

2.2 Geomorfologia

O maciço de Passa Quatro apresenta as montanhas mais elevadas do Estado de São Paulo, tendo como ponto culminante a Pedra da Mina com 2.798m de altitude. Conforme a caracterização geomorfológica regional, a área de estudo insere-se no Domínio do Planalto Atlântico, Zona Serra da Mantiqueira, Subzona Serra da Mantiqueira Oriental composta por Escarpas Festonadas que são relevos de transição entre o planalto mineiro e a região do Médio Vale do Paraíba do Sul (Ponçano, et al. 1981).

Neste contexto, observam-se formações superficiais formadas por solos residuais do tipo cambissolos, depósitos de colúvio e corpos de talús que recobrem especialmente as médias e baixas vertentes, estando interdigitados com sedimentos aluviais dispostos de forma alongada e estreita nos fundos de vale que se apresentam encaixados e profundos, onde expõem significativos depósitos de blocos rochosos ao longo das drenagens.

Nas escarpas do maciço é possível verificar uma série de facetas triangulares desenvolvidas a partir da dissecação dos fluxos superficiais. Este tipo de feição geomorfológica é indicador de atividade neotectônica (HAMBLIN; CHRISTIANSEN, 2004), e onde ocorrem estas estruturas, em relevos ainda pouco dissecados, podem ocorrer concentrações de escorregamentos, por apresentar zonas de fraquezas, conforme exemplificado na figura 3.

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Figura 3: Visão do Maciço de Passa Quatro a partir do Vale do Paraíba do Sul. Em último plano, escarpas rochosas com desníveis superiores a 1000m marcadas por facetas triangulares e espigões rochosos. Na

frente escarpamento é possível verificar o depósito de tálus. Na partes mais baixas encontram-se grandes depósitos de colúvios recobrindo o embasamento, em primeiro plano (Foto: Paulo Sampaio, 2015).

3. CARACTERIZAÇÃO DA BACIA DO RIO DO ENTUPIDO

A bacia do Rio do Entupido, afluente da margem esquerda do Rio Paraíba do Sul, tem formato alongado no sentido norte-sul, perpassando por dois compartimentos de relevo diferenciados, sendo um trecho serrano de terras altas a montante na região do Maciço de Passa Quatro, e outro em terras baixas a jusante, relacionadas ao segmento central do vale do Rio Paraíba do Sul. O padrão de drenagem dominante é dendrítico, havendo elementos sub-retangulares em função de inúmeras falhas e sistemas de diáclases com duas direções principais sentido N-S e E-W, aproximadamente.

O perfil longitudinal do Rio do Entupido (Figura 4) demonstra claramente aspectos morfométricos contrastantes entre as duas porções da bacia, principalmente com relação a inclinação média do canal principal do rio e das encostas (Tabela 1). Na região serrana destaca-se o trecho onde se formou o depósito de blocos resultante do escorregamento de rocha em análise (perfil inferior), onde o canal alcança aproximadamente 16° de inclinação.

Tabela 1. Dados morfométricos da bacia do Rio do Entupido levantados na escala 1:50.000 (Folhas Passa Quatro e Cruzeiro, IBGE).

Bacia do rio do Entupido

Trecho serrano (local do estudo)

Trecho do Vale do Rio Paraíba do sul

Área (Km2) 27,6 7,3 20,3

Extensão dos canais (Km) 71,9 19,8 52,1

Extensão do canal principal (Km) 17,7 4,9 12,8

Densidade de drenagem (Km/Km

2)

2,6 2,7 2,6

Inclinação média do canal principal (°)

8 14 5

Inclinação média das encostas (°)

18,8 31,5 14,2

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Figura 4. Perfil longitudinal ao longo do Rio do Entupido e detalhe do trecho onde ocorreu o a deposição de rochas.

Na porção serrana onde as rochas alcalinas estão expostas com frequência é possível observar intenso fraturamento à superfície (Figura 5).

Figura 5. Mapa de fraturamentos em rocha observados à superfície (extraído com base em Google Earth).

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4. CARACTERIZAÇÃO DA OCORRÊNCIA

A ocorrência foi datada de 15 de novembro de 2011 e teria ocorrido no período da tarde, em horário incerto, conforme relato coletado por moradores das adjacências e por técnicos da SABESP que promoveram inspeção no local, pois a bacia apresenta captação de água para o município de Queluz. O fenômeno estudado consiste de uma sequência de processos iniciados pela ocorrência de um grande escorregamento de rocha que produziu um volume estimado em cerca de 100.000m

3 de material acumulado na calha do Rio do Entupido. Por sua vez, esse

material se deslocou por centenas de metros a jusante ao longo do fundo de vale na forma de uma avalanche de rocha (Figura 6).

Figura 6. Em vermelho a área do escorregamento de rocha e em amarelo a área da avalanche de rocha.

(com base em imagem de 30 de julho de 2013 do Google Earth).

4.1 Escorregamento de rocha

O escorregamento de rocha ocorreu na metade inferior de uma encosta da margem esquerda do Rio do Entupido, localizada próxima ao ponto extremo de um espigão local da Serra da Mantiqueira projetado em direção ao vale do Rio Paraíba. Localmente, a altura do topo a base da elevação foi aferida em cerca de 442 metros, sendo que a cicatriz resultante apresenta cerca de 220m de desnível a partir da base junto ao canal do Rio do Entupido. A largura média da cicatriz é de cerca de 200metros, resultando numa área total com cerca de 63.000m

2.

Imagem da área anterior a data da ocorrência demonstra a existência de linhas de fraturas e degraus de abatimento pré-existentes, revelando ter havido a evolução gradual da ruptura na encosta. As observações das imagens aéreas revelaram o forte condicionamento do processo de ruptura por causas estruturais que acompanham traços de fraturas profundas evidenciadas por todo o maciço alcalino, com destaque para planos de fratura com degraus paralelos ao canal do Rio do Entupido com direção aproximada N-S, seccionados por planos sub-ortogonais a esta direção (Figura 7).

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Figura 7. Imagem oblíqua anterior e posterior ao movimento de massa. A – Ortofoto 2010/1011 Emplasa

anterior ao evento; e B da cicatriz resultante do escorregamento de rocha (Google Earth 2013).

Dados topográficos e observações de campo permitem inferir um modelo preliminar (Figura 8) que envolve a ruptura em três blocos principais (superior, médio e inferior), sendo o plano principal de cisalhamento basal destes relacionado a juntas de alívio de pressão oblíquas a superfície topográfica seccionadas por planos verticais relacionados a fraturas residuais de esforços tectônicos. As superfícies expostas evidenciam a alteração intempérica do material junto a estes planos preferenciais demonstradas por colorações diagnósticas (Figura 9).

Figura 8. Modelo interpretativo da encosta anterior ao desplacamento (com base em perfil topográfico elaborado sobre carta 1:10.000 com equidistância de 10 metros).

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Figura 9. Visão parcial das cicatrizes evidenciando o local das rupturas dos blocos e depósitos resultantes (Foto SABESP, 22 de novembro de 2011).

As observações indicam a possibilidade das rupturas terem sido desencadeadas de forma sequencial, iniciada pelo deslocamento de um dos blocos que pode ter desestabilizado os blocos vizinhos. A porção da encosta situada a montante do bloco superior, apresenta solo pouco espesso em substrato rochoso que deve ter contribuído para o escoamento concentrado e infiltração das águas nas fraturas. Preliminarmente, estima-se que a penetração das águas nas fraturas deve ter promovido a perda de coesão nos níveis mais alterados e a elevação de pressões neutras.

A situação atual indica a existência de risco remanescente de escorregamento e rolamento de blocos em porções visualmente instáveis, seja pela presença de blocos soltos em patamares restritos e levemente inclinados na direção do declive, seja pela presença de fraturamento evidente e pontões de rocha.

Conclui-se que o fator predisponente principal do escorregamento foi a redução gradual da coesão em função do intemperismo em planos de fratura inclinados, gerando massas rochosas instáveis passíveis de movimentação por fatores efetivos. O movimento pode ser classificado como escorregamento translacional de rocha (VARNES, 1978; HUTCHINSON, 1988).

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4.2 Avalanche de rocha

O escorregamento de rocha gerou a queda e impacto dos megablocos na base da encosta que se desintegraram em milhares de blocos menores de rocha sã. A inclinação significativa de cerca de 16° do canal do vale do Rio do Entupido e a quantidade de movimento que o material adquiriu com a queda permitiu que os blocos com dimensões variadas transladassem por cerca de 600 metros de extensão ao longo do vale do Rio do Entupido, na forma de um fluxo de elevada energia que ocasionou uma erosão intensa das margens e retrabalhamento do material antes depositado no fundo do vale. A área de influência do fluxo demonstra largura mínima de 25m e máxima de 64m.

As observações de campo evidenciaram que o fluxo se deu com elevada velocidade, com grande volume de fragmentos de rocha em meio seco, neste sentido, o processo foi classificado como avalanche de rocha (HUNGR et al, 2014).

4.3 Pluviometria

Foram avaliados os dados das estações pluviométricas de Passa Quatro (INMET) e Piquete (INPE) mais próximas do local da ocorrência. Outras estações de referência inativas foram utilizadas para a análise das tendências regionais da pluviosidade. Ambas indicaram chuvas de intensidade moderada na data da ocorrência sendo igual a 37mm na Piquete e 45mm na Passa Quatro. Com respeito a chuvas acumuladas, observam-se que a estação Passa Quatro indicou índice de 72mm/72h enquanto que na estação Piquete de 96mm/72h.

Como as estações não refletem precisamente a chuva ocorrida na bacia e no local do evento, foram analisadas de forma qualitativa, as imagens instantâneas do radar Pico do Couto. A partir disso, inferiu-se que as chuvas atingiram taxa de até 50mm/h por volta das 15 horas do dia 14 de novembro de 2011 na bacia do Rio do Entupido, dia anterior ao evento. A partir destas imagens pode-se supor que a chuva acumuladas que atingiram a encosta pode ter assumido valores próximos a 100mm/72h valor este similar ao da estação Piquete. No entanto, segundo relatos dos moradores da região e das próprias imagens de radar, não chovia no momento do colapso, caracterizando a importância da chuva acumulada como efetiva no processo.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo permite melhorar a compreensão dos fenômenos de movimento de massa relacionados com a morfogênese da Serra da Mantiqueira ao longo do Período Quaternário que se processam até os dias atuais;

Ainda, reconhecer a importância dos processos de movimentos de massa altamente destrutivos na problemática dos desastres naturais e a necessidade de incorporar esse tema no planejamento territorial das áreas que envolvem o Maciço de Passa Quatro e de Itatiaia.

Dada a complexidade dos processos naturais em foco, o caso em questão enseja o aprofundamento da investigação para reconhecimento dos fatores condicionantes e equacionamento da fenomenologia envolvida.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem aos Sr. Paulo Sérgio Sampaio pelo apoio nas atividades de campo e a SABESP por ceder material fotográfico da área.

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REFERÊNCIAS

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HAMBLIN, W. K; CHRISTIANSEN, E. H. Earth''s dynamic systems. 10. ed. Upper Saddle River: Prentice Hall, 2004. 759 p. ISBN 0131420666. Disponível em: http://earthds.info/

HASUI, Y. et al. (1975). The Ribeira folded belt. Revista Brasileira de Geociências, São Paulo, 5 (4): 257-266.

HUNGR, et al. (2014). The Varnes classification of landslide types, an update. Landslides 11: 167-194.

HUTCHISON, J. N. (1988). General report: morphological and geotechnical parameters of landslides in relation to geology and hidrology. In: International Symposium on Landslides, 5, Lausanne, 1988. Resumes, Rotterdam, Balkema, p. 3-29.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Levantamento Topográfico Folhas Passa Quatro e Cruzeiro, escala 1:50.000. 1974.

PONÇANO, W. et al, Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo – Escala 1:1.000.000.. São Paulo: IPT - Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo. Publicação 1183, Monografia 5, 1981. 130 p.

SALVADOR, E.D.; RICCOMINI, C. (1995). Neotectônica da Região do Alto Estrutural de Queluz (SP-RJ, Brasil). Revista Brasileira de Geociências, v. 25, n. 3, p. 161-164.

VARNES, D. J. (1978). Slope movements, types and processes. In: Landslides Analysis and Control, Special report 176. National Academic of Sciences, Washington, D. C.