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X Encontro Nacional de Engenharia de Sedimentos 1
ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE OS MODELOS SHALSTAB E SINMAP
NA IDENTIFICAÇÃO DE ÁREAS SUSCEPTÍVEIS A ESCORREGAMENTOS TRANSLACIONAIS
Gean Paulo Michel1; Masato Kobiyama
2 & Roberto Fabris Goerl
3
RESUMO --- Os escorregamentos de terra são fenômenos naturais que podem ser responsáveis por grande parte da produção de sedimentos em uma bacia. A identificação de áreas susceptíveis a escorregamentos pode auxiliar na estimativa do volume de sedimentos produzido por determinado evento chuvoso capaz de desencadear esses fenômenos. O presente trabalho realizou uma comparação entre dois modelos de estabilidade de encosta, SHALSTAB e SINMAP, que consideram aspectos hidrológicos, pedológicos e topográficos da bacia em suas formulações. Os modelos foram aplicados à bacia do Rio Cunha, município de Rio dos Cedros/SC, onde inúmeros escorregamentos foram registrados em novembro de 2008. Foram coletadas amostras de solo para realização de ensaios e determinação dos parâmetros de entrada dos modelos. Os modelos foram calibrados com dados de chuva de três pluviômetros existentes na região. Foram elaborados dois índices para avaliar o desempenho dos modelos. O SHALSTAB demonstrou melhor desempenho na identificação de áreas susceptíveis a escorregamentos, por isso recomenda-se seu uso para estimativa do volume de sedimentos produzido por escorregamentos. Entretanto, recomenda-se o uso do SINMAP para fins menos específicos como zoneamento de perigo e orientação da expansão urbana.
ABSTRACT --- Landslides are natural phenomena that may be responsible for most of the sediment yield in basins. The identification of areas prone to landslides can support the estimation of the sediment volume yielded by rainfall events that trigger landslides. The present paper held a comparison between two stability slope models, SHALSTAB and SINMAP, which consider hydrological, pedological and topographic aspects of the basin in their formulations. The models were applied to the Cunha River basin, Rio dos Cedros municipality/SC, where numerous landslides occurred in November 2008. Soil samples were collected to perform tests to determine the input parameters of the models. The models were calibrated with data obtained at three rain gauges. SHALSTAB shows a better performance in the identification of areas susceptible to landslides and it is recommended to estimate the volume of sediment yielded by landslides.
1Mestrando do Programa de Pós Graduação em Engenharia Ambiental da UFSC, Campus Universitário, Trindade, Florianópolis, SC. [email protected] 2Professor Doutor do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFSC. Campus Universitário, Trindade, Florianópolis, SC. [email protected] 3Doutorando do Programa de Pós Graduação em Geografia da UFPR, Centro Politécnico, Jardim das Américas, Curitiba, PR. [email protected]
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The SINMAP is, however, recommended to less specific uses like hazard zoning and urban expansion guidance.
Palavras-chave: Escorregamentos, SHALSTAB, SINMAP
1. INTRODUÇÃO
A identificação e mapeamento de áreas susceptíveis a escorregamentos de terra são
procedimentos importantes no gerenciamento de bacias hidrográficas. Eles podem contribuir na
elaboração de mapas de risco, estimativa de produção de sedimentos e planejamento de medidas
estruturais para proteção de infraestruturas (Korup, 2005). Os escorregamentos são um dos
principais processos erosivos em encostas e, portanto, tem um importante papel na produção de
sedimentos na bacia (Burton e Bathurst, 1998). Os impactos de escorregamentos e alta produção de
sedimentos podem ser sérios e imensos, implicando, por exemplo, em grande sedimentação nos
reservatórios e assoreamento do leito dos rios (Bathurst et al., 2005).
Em se tratando de reservatórios, há de se ponderar diversos aspectos, sendo que um dos mais
relevantes é sua vida útil. A vida útil de um reservatório depende diretamente da quantidade de
sedimentos acumulados dentro do mesmo. Koi et al. (2008) comentaram que os escorregamentos
podem ser os maiores responsáveis pela produção de sedimentos em uma bacia e, além disso, um
escorregamento pode contribuir para o incremento da produção de sedimentos durante décadas. Os
escorregamentos, além de gerarem sedimentos que cedo ou tarde alcançarão a rede fluvial,
esporadicamente causam variabilidade na produção de sedimentos da bacia (Korup et al., 2004;
Mikoš et al.,2006). Kobiyama et al. (2011) relataram que a produção de sedimentos devido a
ocorrência de escorregamentos é intermitente e irregular ao longo do tempo, sendo este processo
significativamente diferente da erosão superficial. Desta maneira, buscando um melhor manejo de
reservatórios, barragens e até mesmo estações de tratamento de água, devem-se despender esforços
na localização de áreas susceptíveis a escorregamentos.
Os escorregamentos de terra que ocorrem no Brasil, segundo a classificação de desastres
naturais estabelecida pelo Centre for Research on the Epidemiology of Disasters - CRED, são
classificados como desastres hidrológicos. Isto devido ao mecanismo de desencadeamento destes
escorregamentos que está diretamente ligado à incidência de chuva e consequentemente saturação
do solo. Além disso, devido à capacidade destes fenômenos de mobilizar grandes quantidades de
sedimentos, eles também podem ser considerados hidrossedimentológicos. A identificação de áreas
susceptíveis a escorregamentos pode ser realizada através da modelagem matemática. Por
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conseguinte, os modelos que abordam tais fenômenos, além de hidrogeomorfológicos, podem ser
considerados hidrossedimentológicos.
Bathurst et al. (2005) ressaltam a necessidade de modelos geotécnicos/hidrológicos, com
embasamento físico e espacialmente distribuídos, que possam prever os efeitos das características
da bacia na incidência de escorregamentos e produção de sedimentos. Portanto, o presente trabalho
apresenta uma comparação entre dois modelos de estabilidade de encostas, SHALSTAB (Dietrich e
Montgomery, 1998) e SINMAP (Pack et al., 1998), que podem ser aplicados na identificação de
áreas susceptíveis a escorregamentos e auxiliar na estimativa da produção de sedimentos
relacionada a este fenômeno.
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
2.1 Modelo de Estabilidade de Encosta Infinita
Durante a ocorrência de um escorregamento, o plano de ruptura no solo se forma quando as
forças estruturantes tornam-se menores que as forças desestruturantes. A relação entre estas forças
pode ser expressa pelo fator de segurança (FS), que, segundo Bishop (1955), é tradicionalmente
definido como a relação entre a real resistência ao cisalhamento do solo e a resistência ao
cisalhamento mínima necessária para prevenir falhas.
Para análise de escorregamentos translacionais rasos, classe de escorregamentos muito
recorrente no Brasil, é comum usar o modelo de estabilidade de encosta infinita, aplicado para
situações onde o comprimento da encosta é muito maior que a profundidade do solo. O modelo de
estabilidade de encosta infinita compara os componentes desestabilizadores da gravidade e os
componentes restauradores do atrito e da coesão em um plano falho paralelo à superfície do solo,
desprezando-se os efeitos das margens.
A formulação do modelo de estabilidade de encosta infinita baseia-se na Lei de Mohr-
Coulomb, onde, no momento da ruptura de uma encosta, as forças cisalhantes igualam-se as forças
estruturantes, isto é:
φστ tan)( ⋅−+= uc (1)
onde τ [N/m²] é a tensão cisalhante no momento da ruptura; c [N/m²] é a coesão do solo; σ [N/m²] é
a tensão normal; u é a poro-pressão [N/m²]; e φ [graus] é o ângulo de atrito interno do solo. A
Figura 1 mostra um esquema ilustrativo do modelo de encosta infinita, onde P representa o peso do
solo.
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Figura 1 – Esquema ilustrativo do modelo de encosta infinita.
Selby (1993) propôs uma formulação para aplicação da Equação (1) a encostas infinitas, onde
o comprimento da encosta é consideravelmente maior que a espessura do solo. Esta formulação
considera uma largura unitária da encosta, portanto a análise é bidimensional. A tensão cisalhante é
representada pela componente do peso do solo paralela a encosta. A poro-pressão (u) é
caracterizada pela pressão a que está submetida a água situada nos poros do solo e atua no sentido
de aliviar a componente do peso do solo perpendicular a encosta (σ). Então, o modelo de
estabilidade de encosta infinita descrito por Selby (1993) é:
φθρθρθθρ tan)²cos²cos(cossin ⋅⋅⋅⋅−⋅⋅⋅++=⋅⋅⋅⋅ hgzgcczg wssrs (2)
onde ρs é a densidade do solo úmido [kg/m³]; z é a profundidade do solo[m]; θ é a declividade da
encosta [graus]; ρw é a densidade da água [kg/m³]; h é a altura da camada de água[m]; cr é a coesão
das raízes [N/m2]; e cs é a coesão do solo [N/m2].
Através da Equação (2), pode-se obter o fator de segurança FS do modelo de estabilidade de
encosta infinita ao dividir a parcela da equação que representa as forças estruturantes do solo (lado
direito), pela parcela da equação que representa as forças desestruturantes (lado esquerdo), como
demonstrado pela Equação (3).
θθρ
φθρθρ
cossin
tan)²cos²cos(
⋅⋅⋅⋅
⋅⋅⋅⋅−⋅⋅⋅++=
zg
hgzgccFS
s
wssr (3)
Desta maneira, onde as forças que promovem a estabilidade são exatamente iguais as forças
que levam a instabilidade, o FS é igual a 1; onde FS < 1, a encosta está propensa a falha; e onde FS
> 1, a encosta teoricamente está estável. Não se pode designar um valor que representa a
estabilidade absoluta, apenas um aumento da probabilidade de estabilidade com o aumento do valor
de FS (Selby, 1993).
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Observa-se que o FS decai com o aumento da altura da coluna de água devido à redução das
tensões efetivas. Portanto, períodos chuvosos, que elevam a altura do lençol freático, conduzem à
redução do FS da encosta, sendo que quanto maior a intensidade e a duração da chuva, maior se
torna a probabilidade de formação de superfície de ruptura no solo. Visto que as condições de
estabilidade da encosta são diretamente influenciadas por fatores hidrológicos, há a necessidade de
introdução de um modelo hidrológico para determinação da umidade do solo.
2.2 Modelo Hidrológico de Estado Uniforme (Steady State)
O modelo hidrológico de estado uniforme que é utilizado no presente trabalho é baseado no
trabalho de Beven e Kirkby (1979) e O’loughlin (1986). O modelo assume um estado uniforme de
recarga que simula o padrão de variação espacial da umidade (altura da coluna d’água) que ocorre
durante uma época chuvosa. A Figura 2 mostra o modelo hidrológico de estado uniforme.
Figura 2 – Representação do modelo hidrológico. (Modificado de Montgomery e Dietrich, 1994)
Na Figura 2, a [m²] representa a área de contribuição a montante, b [m] é o comprimento de
contorno da fronteira inferior de cada elemento e q [m/d] é a taxa de recarga uniforme. O’Loughlin
(1986) definiu a umidade (wetness) como a parcela saturada do solo em um dado estado uniforme
de recarga. Desta maneira, o nível de saturação do solo é obtido através da relação entre a água que
entra no sistema sob forma de recarga uniforme e a água que sai dele através da camada saturada do
solo. A Equação (3) representa a formulação final do modelo hidrológico de estado uniforme.
z
h
Tb
aqW =
⋅⋅
⋅=
θsin (4)
θcos⋅⋅= zKT sQ (5)
onde W é a umidade do solo [m/m]; T é a transmissividade do solo [m²/d]; e Ks é a condutividade
hidráulica saturada, sendo constante ao longo do perfil de solo.
a
θ
b
z
h
q
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2.3 SHALSTAB
O SHALSTAB (Shallow Landsliding Stability Model) é um modelo determinístico distribuído
baseado na combinação do modelo de estabilidade de encosta infinita e no modelo hidrológico de
estado uniforme. As simulações do modelo são realizadas através de uma extensão do ArcView 3.2,
que utiliza o MDT em formato raster para extração dos valores de elevação, pelo qual
posteriormente são calculadas as áreas de contribuição específica e as declividades. Dessa maneira,
cada célula contém um valor único dos parâmetros morfométricos, possibilitando a sua análise
individualmente.
Ao resolver a Equação (2) em função de h/z, que representa a proporção saturada da espessura
do solo, obtém-se o grau de saturação necessário para que ocorra a desestabilização da encosta. O
modelo SHALSTAB baseia-se nesta relação para predizer os locais com maior probabilidade de
falha.
zg
c
z
h
ww
s
⋅⋅⋅⋅+−⋅=
ρφθφ
θ
ρ
ρ
tancos)
tan
tan1( 2 (6)
Baseando-se apenas na Equação (6), duas condições extremas podem ser definidas:
instabilidade incondicional ou estabilidade incondicional. A primeira situação ocorre quando a
razão h/z na equação é igualada a zero (ausência de coluna de água) e a relação entre os parâmetros
de resistência do solo não são capazes de compensar a elevada declividade da encosta (Equação
(7)). A segunda situação acontece quando a razão h/z é igualada a uma unidade (camada de solo
completamente saturada) e a relação entre os parâmetros de resistência do solo ainda assim é maior
que a declividade da encosta (Equação (8)).
zg
c
s ⋅⋅⋅+≥
ρθφθ
2costantan (7)
zg
c
ss
w
⋅⋅⋅+−⋅≤
ρθρ
ρφθ
2cos)1(tantan (8)
Quando as duas primeiras condições não são estabelecidas, ou seja, quando o solo está
parcialmente saturado, pode-se igualar a Equação (4) e a Equação (6) para realizar o acoplamento
entre o modelo de estabilidade de encosta infinita e o modelo hidrológico de estado uniforme:
zg
c
bT
aq
ww
s
⋅⋅⋅⋅+−⋅=
⋅⋅
⋅
ρφθφ
θ
ρ
ρ
θ tancos)
tan
tan1(
sin 2 (9)
Ao reescrever a Equação (9) em função das varíáveis q e T (variáveis hidrológicas), tem-se a
formulação final adotada pelo SHALSTAB.
⋅⋅⋅⋅+−⋅⋅⋅=
zg
c
a
b
T
q
ww
s
ρφθφ
θ
ρ
ρθ
tancos)
tan
tan1(sin
2 (10)
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O SHALSTAB usa a Equação (10) para designar o grau de estabilidade de uma encosta. Os
parâmetros de entrada requeridos pelo modelo são: c, φ , ρs, e z. Além disso, um modelo digital de
terreno (MDT) de boa qualidade faz-se necessário para provimento do restante das outras variáveis
a, b e θ. Desta maneira a resposta do modelo é gerada em função de um “parâmetro livre” (q/T)
responsável pela classificação do terreno segundo o grau de estabilidade. Dietrich e Montgomery
(1998) originalmente propuseram sete classes de estabilidade. As duas classes extremas são
referentes à satisfação das Equações (7) e (8), e representam áreas incondicionalmente instáveis e
incondicionalmente estáveis, respectivamente. Outras cinco classes são geradas em função do
parâmetro livre q/T. Embora a classificação gerada em função de valores de q/T possa ser utilizada
na comparação direta entre o grau de estabilidade de duas áreas, a contextualização dos resultados
gerados pelo modelo necessita da estimativa dos reais valores destes parâmetros hidrológicos.
2.4 Embasamento teórico do SINMAP
O SINMAP (Stability Index Mapping) é um modelo estocástico distribuído para mapeamento
de índices de estabilidade em encostas e também utiliza o conceito de modelo hidrológico de estado
uniforme (steady-state) e o clássico modelo de encosta infinita para determinação de estabilidade
(Pack et al., 1998). Através do MDT são obtidas as variáveis topográficas, declividade e área de
contribuição. A qualidade destas informações depende da escala do mapeamento básico utilizado. O
modelo é aplicado através do software Arcview 3.2, onde o índice de estabilidade é calculado para
cada célula (pixel) separadamente.
O SINMAP faz a classificação da estabilidade do terreno com base na variação espacial da
declividade e da área de contribuição, e de outros parâmetros ligados às características climáticas e
pedológicas. O conjunto de parâmetros ligados ao solo e à precipitação possui uma série de
incertezas associadas, relacionadas tanto aos métodos de determinação quanto à variabilidade
espacial e necessidade de regionalização dos valores dos parâmetros. Por isso, o modelo trabalha
em termos de limites máximos e mínimos para estes parâmetros.
Dessa maneira, o índice de estabilidade (SI) é definido como a probabilidade de uma região
ser estável, assumindo distribuições uniformes de parâmetros sobre esses intervalos de incerteza.
Normalmente os valores de SI podem variar entre 0 (mais instável) e 1 (menos instável). No
entanto, em locais onde adota-se parâmetros mais conservadores (no sentido de favorecer a
desestabilização) e ainda assim resultar em estabilidade, o SI assumirá valores superiores a uma
unidade quando considerados os valores médios dos parâmetros. A Tabela 1 mostra as classes de
estabilidade utilizadas pelo modelo SINMAP.
Tabela 1 - Definição das classes de estabilidade do SINMAP
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Índice de Estabilidade
Classes de Estabilidade
Intervalo dos Parâmetros
Possível influência de fatores não modelados
SI > 1,5 Incondicionalmente
Estável Instabilidade não prevista
São necessários fatores desestabilizantes significativos para
gerar instabilidade
1,5 > SI > 1,25 Estabilidade
moderada Instabilidade não prevista
São necessários fatores desestabilizantes moderados para
gerar instabilidade
1,25 > SI > 1,0 Estabilidade baixa Instabilidade não prevista São necessários fatores
desestabilizantes mínimos para gerar instabilidade
1,0 > SI > 0,5 Limiar inferior de
instabilidade Combinação pessimista
prevê instabilidade Fatores desestabilizantes não são
necessários para gerar instabilidade
0,5 > SI > 0,0 Limiar superior de
instabilidade Combinação otimista
prevê estabilidade Fatores estabilizantes podem gerar
estabilidade
0,0 > SI Incondicionalmente
Instável Estabilidade não prevista
Fatores estabilizadores são necessários para gerar estabilidade
O modelo SINMAP baseia-se na Equação (3) para o cálculo do FS. Posteriormente, para
cálculo da altura do grau de saturação da camada de solo, incorpora o modelo hidrológico de estado
uniforme. Assumindo que a altura máxima da coluna d’água é igual à altura da coluna do solo, tem-
se:
⋅⋅
⋅= 1 ,
sinMin
θbT
aqW (11)
O modelo adota o maior valor de umidade igual a 1, sendo que valores maiores resultam em
escoamento superficial.
A relação q/T quantifica a umidade relativa em termos do estado de recarga uniforme,
assumido em relação a capacidade do solo para escoamento da água. Apesar do termo ‘estado
uniforme’ ser usado para determinar o fluxo lateral, o valor de q não representa a média de recarga
de longos períodos (anual, por exemplo). Pelo contrário, é a taxa de recarga efetiva, para um
período crítico de clima úmido, capaz de desencadear escorregamentos de terra.
Substituindo a Equação (11) na Equação (3), tem-se a formulação final adotada pelo
SINMAP:
θ
φθ
θ
sin
tan]1 ,sin
Min1[cos ⋅⋅
⋅⋅
⋅−⋅+
=
rbT
aqc
FS
a
(12)
onde ca é a forma adimensional da coesão (ca = (θρ cos⋅⋅⋅
+
zg
cc
s
sr )); e r é a relação entre a densidade
da água e a densidade do solo úmido (s
wrρ
ρ= ).
Alguns parâmetros de entrada do modelo SINMAP são descritos em termos de limites
mínimos e máximos. São eles: T/q [m], ca, e φ . Para ρs é requerido apenas o valor médio.
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Devido à variação aleatória dos parâmetros de entrada entre seus limites, existe uma
distribuição de probabilidade de FS superar uma unidade. Assumindo-se que a variável T/q seja
representada por x, temos que x1 é seu limite inferior e x2 seu limite superior. Da mesma forma,
representando a tanΦ por t, tem-se que t1 é seu limite inferior e t2 seu limite superior. Por fim, c1
representa o limite inferior da coesão adimensional e c2 o limite superior.
O menor valor de c e t (ou seja, c1 e t1), combinado com o maior valor de x (ou seja, x2),
constitui o pior cenário (mais conservador) dentro das condições estabelecidas e assumindo as
incertezas dos parâmetros de entrada. Se, sob esta condição, o FS (mínimo valor possível) é maior
que um, a área é considerada incondicionalmente estável.
θ
θθ
sin
)1,sin
1(cos 121
min
trb
axMinc
FSSI
⋅⋅
⋅−⋅+
== (13)
Para áreas onde o mínimo fator de segurança é menor que um, há possibilidade de falha. Para
estas regiões o SI é definido por:
)1Prob( >= FSSI (14)
Ainda considerando a distribuição de c, t e x podemos prever o melhor cenário, que combina
os limites superiores de c e t (ou seja, c2 e t2) e o limite inferior de x (ou seja, x1), e origina o
máximo valor de FS.
θ
θθ
sin
)1,sin
1(cos 212 trb
axMinc
FSSI máx
⋅⋅
⋅−⋅+
== (15)
Se, sob esta condição, o FS (máximo valor possível) não alcançar uma unidade, a probabilidade de
o FS ser maior que um é nula, e a região é considerada incondicionalmente instável.
3 .MATERIAIS E MÉTODOS
3.1 Área de Estudo
Em novembro de 2008, diversos municípios de Santa Catarina, principalmente os localizados
no Vale do Itajaí, sofreram com a ocorrência de inúmeros escorregamentos e inundações (Goerl et
al., 2009a e 2009b; Rocha et al., 2009; Kobiyama et al., 2010). O município de Rio dos Cedros foi
severamente atingido, onde 96 pessoas ficaram desabrigadas e 8561 foram diretamente afetadas.
Devido à incidência relativamente alta de escorregamentos nesta cidade, optou-se por selecionar
uma sub-bacia do município para realizar o trabalho. A área selecionada foi a bacia do Rio Cunha
devido a ocorrência de severos escorregamentos no dia 23 de novembro de 2008 (Figura 3).
X Encontro Nacional de Engenharia de Sedimentos 10
Figura 3 – Local e altimetria da bacia do rio Cunha – SC
A bacia do Rio Cunha possui a área de 16,2 km² e a altimetria varia de 90 m a 860 m. O rio
Cunha apresenta a declividade média de 8% e amplitude altimétrica de 640 m. Conforme o CPRM
(2011) encontra-se na bacia Gnaisse (94% da área) e Folhelho (6% da área). Em relação à
pedologia, segundo EMBRAPA (2006), os Cambissolos (Ca32) são predominantes na bacia,
ocupando cerca de 65% da área total, associado principalmente ao relevo montanhoso. Ainda
segundo EMBRAPA (2006), os cambissolos compreendem solos constituídos por grande
heterogeneidade de material mineral, com horizonte B incipiente subjacente a qualquer tipo de
horizonte superficial. A classe comporta desde solos fortemente até imperfeitamente drenados, de
rasos a profundos, de diversas colorações, de alta a baixa saturação e atividade química de fração da
argila.
3.2 Parâmetros de Entrada dos Modelos
Dados Topográficos
Para a elaboração do MDT foram utilizadas curvas de nível de intervalo de 5 m, obtidas
através do perfilamento digital com o sensor Leica ADS-40. As curvas de nível foram interpoladas
pela extensão Topo to Raster do ArcGis 9.3 onde gerou-se um raster de grade regular com
resolução de 5 m.
Além disso, foi elaborado o inventário de cicatrizes de escorregamentos ocorridos no dia 23
de novembro de 2008 na bacia para calibração dos modelos. As cicatrizes foram determinadas
através da análise visual de ortofotos da bacia na escala 1:5000. Além disso, utilizou-se GPS
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diferencial Trimble R3 e 5700 e estação total Leica TPS-407 para aquisição de pontos de
escorregamentos ocorridos na bacia, complementando as informações observadas nas ortofotos.
Dados de Chuva
Os dados de chuva da região referentes ao período chuvoso do ano de 2008 foram convertidos
em uma taxa de recarga uniforme. A amplitude deste período chuvoso foi determinada por Michel
et al. (2011). O valor de recarga uniforme equivalente a 15,33 mm/d foi utilizado como parâmetro
de entrada dos modelos.
Os dados de chuva foram extraídos de três pluviômetros instalados na cidade de Rio dos
Cedros representados na Figura 3. O intervalo dos dados é horário.
Grande parte da bacia é coberta por floresta e as observações de campo não mostraram sinais
de escoamento superficial concentrado (ravinas, sulcos, caminhos preferenciais), portanto o
presente trabalho adotou a hipótese de que a taxa de recarga do solo é igual à intensidade de
precipitação.
Dados de Solo
As características pedológicas exercem grande influência sobre a estabilidade das encostas, já
que ditam a resistência ao cisalhamento dos solos e a capacidade de transmitir lateralmente a água
que infiltra no solo durante a chuva. As características do solo da bacia foram determinadas a partir
de ensaios de cisalhamento direto, análise granulométrica e determinação da densidade do solo
úmido. Foram coletadas amostras deformadas e indeformadas na superfície de ruptura de um dos
escorregamentos, posteriormente foram realizados ensaios em laboratório. Optou-se por aplicar o
valor médio de cada parâmetro para a totalidade da bacia.
Através do ensaio de cisalhamento direto foram estimados os parâmetros de c e Φ. A análise
granulométrica das amostras permitiu que o valor de Ks fosse estimada através do software
HYDRUS-1D, modelo Rosetta Lite Version 1.1. Este software utiliza as porcentagens de areia, silte
e argila no solo, para estimativa de Ks. Segundo Ohta et al. (1983), o valor de Ks na modelagem
hidrológica pode ser considerado 10 vezes maior que o valor medido devido a possível formação de
fluxos preferenciais na camada de solo, que aumentarão drasticamente a condutividade de campo.
A estimativa da profundidade do solo da bacia foi realizada através de observações em
campo. A profundidade em que se formaram as superfícies de ruptura (em torno de 10 m) foi
adotada como a profundidade do solo para toda a bacia. Para cálculo da densidade do solo úmido,
as amostras indeformadas de solo, ainda presentes nos moldes, foram saturadas e pesadas.
Posteriormente aplicou-se uma relação simples de massa sobre volume para cálculo da densidade
do solo úmido. A Tabela 2 mostra o valor médio de cada parâmetro mensurado.
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Tabela 2 - Valores médios dos parâmetros mensurados
Parâmetro Valor Médio Ângulo de atrito (φ ) 31,2º
Coesão (c) 11,9 kPa Condutividade Hidráulica Saturada (Ks) 3,8 m/d
Densidade do solo úmido (ρs) 1815 kg/m³ Profundidade do solo (z) 10 m
Como o SHALSTAB é um modelo determinístico, os valores da Tabela 2 foram adotados
como parâmetros de entrada. Na aplicação do SINMAP que é modelo estocástico, os valores da
Tabela 2 foram variados em mais e menos 20%, gerando assim um intervalo de valores.
A calibração dos modelos SHALSTAB e SINMAP é normalmente realizada através da
verificação da coincidência espacial entre as cicatrizes de escorregamento, anteriormente mapeadas,
e as áreas designadas instáveis pelo modelo. Quanto maior a coincidência entre o inventário de
escorregamentos e a área designada instável pelo modelo, melhor foi considerado seu desempenho.
Um mecanismo de calibração comumente utilizado foi a variação dos parâmetros de entrada
buscando melhorar o desempenho do modelo, porém deve-se ponderar o crescimento exacerbado de
áreas consideradas instáveis dentro da bacia que compromete a veracidade dos resultados finais.
Considerando que os dados pedológicos foram obtidos através de ensaios e estão menos sujeitos a
incertezas, realizou-se a calibração através da variação dos parâmetros hidrológicos (taxa de recarga
uniforme) conforme metodologia adotada por Michel et al. (2011).
3.3 Comparação entre os Modelos
A comparação entre o desempenho dos dois modelos e análise de sua eficácia foi realizada
através do cálculo de dois índices propostos por Sorbino et al. (2010), denominados de Índice de
Acerto (IA) e Índice de Erro (IE). O IA representa a porcentagem de área definida como instável
pelo modelo que coincide com a área de ocorrência de escorregamentos (inventário de cicatrizes),
ou seja,
100⋅=instável
dentro
A
AIA (16)
onde Adentro é a área classificada como instável que coincide com o inventário de cicatrizes; Ainstável é
a área das cicatrizes de escorregamentos. O IE é a razão percentual entre as áreas computadas como
instáveis pelo modelo que não coincidem com o inventário de cicatrizes e áreas da bacia que não
foram afetadas por escorregamentos:
100⋅=estável
fora
A
AIE (17)
onde Afora é a área classificada como instável que não coincide com o inventário de
escorregamentos; e Aestável é a área não afetada por escorregamentos. No caso de semelhança entre
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os índices, Sorbino et al. (2010) propõem que seja calculada a razão entre IA e IE, sendo que quanto
maior esta razão, melhor o desempenho do modelo. A Figura 4 ilustra as definições das áreas para a
realização do cálculo dos índices.
Figura 4 – Áreas utilizadas no cálculo de IA e IE. (Modificado de Sorbino et al., 2010)
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1 Resultados do SHALSTAB
A simulação com o SHALSTAB gerou o mapa de estabilidade da bacia do Rio Cunha (Figura
5) hierarquizado em 7 classes estabelecidas por Dietrich e Montgomery (1998). O modelo
estabelece a condição de estabilidade para todas as áreas planas, mesmo em condições de saturação
do solo. Áreas com maior declividade têm grande relação com a instabilidade, mesmo com reduzido
grau de saturação. A magnitude da área de contribuição influencia fortemente na classificação
realizada pelo modelo, visto que regiões que têm concentração de linhas de fluxo, ou seja, onde o
relevo é convergente, quase sempre geram padrões de classificação com menores níveis de
estabilidade.
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Figura 5 – Mapa de susceptibilidade a escorregamentos com os modelos SHALSTAB.
Observa-se que todos os escorregamentos coincidiram com as duas classes de maior
instabilidade. Dos escorregamentos mapeados, um foi enquadrado na classe incondicionalmente
instável e os outros seis na segunda classe de maior instabilidade. Em contrapartida, apenas 12,84%
da área total da bacia foi enquadrada nestas duas classes. Isto demonstra que, embora a classe
incondicionalmente instável não tenha sido a classe com maior incidência de escorregamentos, a
resposta do modelo foi satisfatória. A Tabela 3 mostra a distribuição de área em cada classe, bem
como a distribuição dos escorregamentos.
Tabela 3 – Distribuição da área e dos escorregamentos.
Classe Área (km²) Área (%) N º de Esc. Esc. (%) Incond. Instável 0,23 1,43 1 14,29
log q/T < -3,1 1,85 11,41 6 85,71 -3,1 < log q/T < -2,8 1,73 10,67 0 0,00 -2,8 < log q/T < -2,5 1,69 10,45 0 0,00 -2,5 < log q/T < -2,2 0,91 5,65 0 0,00
log q/T >-2,2 0,20 1,21 0 0,00 Incond. Estável 9,58 59,18 0 0,00
Total 16,2 100 7 100 Para que uma célula seja enquadrada na classe incondicionalmente instável, algumas
condições específicas devem ser estabelecidas, como a permanência de uma camada de solo espessa
sobre uma superfície de alta declividade. Muitas vezes esta combinação de fatores não pode ser
X Encontro Nacional de Engenharia de Sedimentos 15
encontrada na realidade, pois grandes declividades geralmente implicam em altas taxas de erosão,
limitando a espessura do solo. Portanto, esta condição que pode ser descrita matematicamente
reflete uma incoerência física do modelo.
As classes geradas que são representadas em função de log q/T utilizam os parâmetros
hidrológicos para o cálculo do grau de saturação e consequentemente da estabilidade da encosta. O
enquadramento da maioria dos escorregamentos na classe mais instável que depende dos
parâmetros hidrológicos e uma pequena porcentagem de área enquadrada nesta mesma classe
(11,41%) demonstram que o modelo capturou corretamente os fatores hidrogeomorfológicos que
governam a estabilidade das encostas na bacia.
4.2 Resultados do SINMAP
A simulação realizada com o SINMAP gerou 6 classes de estabilidade. Cada classe representa
uma faixa de valores de índice de estabilidade, representando a probabilidade de uma célula
alcançar um fator de segurança maior que um. O mapa do índice de estabilidade gerado pelo
SINMAP está apresentado na Figura 6.
Devido à similaridade das equações utilizadas pelos dois modelos, os resultados gerados são
bastante semelhantes. Áreas com alta declividade têm menores índices de estabilidade, bem como
as regiões com relevo côncavo, que tendem a ter maiores áreas de contribuição e consequentemente
maior umidade.
A Tabela 4 mostra a distribuição de área e escorregamentos em cada classe de estabilidade.
Os escorregamentos enquadraram-se nas 3 classes de menor estabilidade, onde, segundo a
classificação gerada pelo SINMAP, o índice de estabilidade é menor que um. A classe
incondicionalmente instável não teve incidência de escorregamentos, sendo que, da mesma maneira
que no modelo SHALSTAB, o enquadramento de células nesta classe depende de condições
específicas. A classe com maior número de escorregamentos foi o limiar superior de instabilidade
(0,0 < SI <0,5), com 5 escorregamentos, seguida pelo limiar inferior de instabilidade com 2
escorregamentos. O enquadramento de 71,43% dos escorregamentos na classe mais instável
dependente das relações hidrológicas e a pequena área (4,4%) classificada desta maneira sugere que
o modelo SINMAP também está capturou corretamente os fenômenos hidrogeomorfológicos que
governam a estabilidade das encostas na bacia. Em contraponto, para que todos os escorregamentos
incidissem em áreas consideradas instáveis, mais de 30% da área da bacia foi classificada desta
maneira.
X Encontro Nacional de Engenharia de Sedimentos 16
Figura 6 – Mapa de susceptibilidade a escorregamentos com os modelos SINMAP.
Tabela 4 – Distribuição da área e dos escorregamentos.
Classe Área (km²) Área (%) N º de Esc. Esc. (%) Incond. Instável 0,03 0,20 0 0,00
0,0 < SI <0,5 0,71 4,40 5 71,43 0,5 < SI < 1,0 4,16 25,70 2 28,57 1,0 < SI <1,25 2,43 15,00 0 0,00 1,25 < SI <1,5 1,80 11,10 0 0,00
Incond. Estável 7,08 43,60 0 0,00 Total 16,2 100 7 100
4.3 Comparação entre os Modelos
Os modelos foram calibrados através da determinação da chuva crítica, critério adotado por
Michel et al. (2011). Desta maneira, assumiu-se que para o modelo SHALSTAB a área instável era
representada pela classe “incondicionalmente instável” ou por log q/T menor que -3,4. Já para o
modelo SINMAP, foi assumido que a área instável era representada pela classe
“incondicionalmente instável” ou por SI menor que uma unidade. Os valores de IA e IE para os dois
modelos estão apresentados na Tabela 5.
Tabela 5 – Índice de Acerto e de Erro para os modelos SHALSTAB e SINMAP.
SHALSTAB SINMAP Índice de Acerto (IA) 19,55% 94,12%
Índice de Erro (IE) 6,35% 30,22%
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Embora baseado em princípios semelhantes, os dois modelos apresentaram os valores de IA e
IE bastante diferentes. Isto ocorreu devido ao processo de calibração utilizado e a tipologia de cada
modelo. O SHALSTAB é um modelo determinístico, no qual a resposta é dada em termos de
ocorrência de falha ou não. Seu processo de calibração resultou numa grande redução de área
instável dentro da bacia, até o ponto em que apenas algumas células instáveis restassem dentro do
inventário de escorregamentos. Isto levou a um baixíssimo IE, visto que poucas áreas dentro da
bacia foram classificadas como instáveis, porém refletiu em um IA relativamente baixo quando
comparado ao modelo SINMAP.
Como o SINMAP é um modelo probabilístico, sua resposta é dada em termos de
probabilidade de falha. A distribuição probabilística realiza inúmeras combinações com os
parâmetros de entrada, desta maneira as áreas instáveis, ou seja, aquelas que apresentam
probabilidade de falha ocupam uma área consideravelmente grande dentro da bacia. Isto elevou a
aproximadamente 94% o IA do modelo, o que representa um altíssimo índice de acerto, porém
também refletiu em um alto IE, o que indica que grande parte da área dita instável pelo modelo não
apresentou ocorrência de escorregamentos.
Para Sorbino et al. (2010), o modelo que melhor descreve o fenômeno seria aquele que
obtivesse a maior relação IA/IE. Os valores de IA/IE para os modelos SHALSTAB e SINMAP
foram 3,08 e 3,11, respectivamente. Baseado neste princípio pode-se dizer que o SINMAP obteve
melhor desempenho que o SHALSTAB. Porém, os valores obtidos pela relação IA/IE são bastante
semelhantes, sendo insuficientes para levar a uma conclusão definitiva. Além disso, o IA e IE são
calculados com base na área do inventário de cicatrizes e, considerando-se a complexidade do
fenômeno estudado e o método como o inventário é elaborado, não se pode afirmar que toda a área
delimitada pela cicatriz era instável no momento de ocorrência do fenômeno. A desestabilização de
apenas uma pequena área, representada por poucas células instáveis, pode acarretar na
desestabilização de um volume de solo muito maior devido ao relaxamento das tensões atuantes no
maciço, fazendo com que um grande volume de solo presente nos arredores desta área também se
desestabilize.
Uma metodologia utilizada por Dietrich et al. (2001) demonstra que a melhor adaptação de
um modelo a uma bacia se dá quando o inventário de escorregamentos coincide com as áreas
classificadas como instáveis e ao mesmo tempo estas áreas representam uma pequena porcentagem
da bacia. A Figura 7 mostra um gráfico relacionando as classes de estabilidade dos modelos e a
porcentagem cumulativa de área e escorregamentos em cada classe.
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Figura 7 – Porcentagem cumulativa de área e de escorregamentos mapeados em cada classe de estabilidade. a) SHALSTAB; b) SINMAP.
A Figura 7a mostra que, para o modelo SHALSTAB, todos os escorregamentos estão
enquadrados nas classes “incondicionalmente instável” e “log q/T < -3,4”. Tomando-se este valor
como o limiar da estabilidade, apenas aproximadamente 6% da área da bacia foi classificado como
instável. Para o SINMAP (Figura 7b) os escorregamentos foram todos enquadrados até a classe “0,5
< SI < 1,0”. Tomando-se este valor como limiar de estabilidade, a soma da área classificada como
instável na bacia é de aproximadamente 30%.
Através da avaliação dos resultados obtidos com os dois modelos pode-se dizer que o
SHALSTAB, quando calibrado corretamente, pode ser usado no delineamento mais preciso de
locais propícios a escorregamentos translacionais. O SINMAP, embora tenha apresentado
resultados satisfatórios quanto à classificação das áreas apresentadas no inventário de cicatrizes, não
obteve êxito em delimitá-las precisamente, sendo seu uso mais propício à análise de perigo e gestão
territorial. Desta maneira, por conseguir representar os efeitos topográficos e hidrológicos da bacia
e enquadrar todos os pontos de escorregamento em classes de baixa estabilidade sem classificar
demasiada área desta maneira, o SHASLTAB pode ser considerado mais apto a identificar áreas
susceptíveis a escorregamentos translacionais na bacia do Rio Cunha.
5.CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os escorregamentos são fenômenos naturais que fazem parte da dinâmica natural da evolução
da paisagem. A ocupação e uso de áreas sujeitas ao impacto deste tipo de fenômeno tem causado
grandes perdas sociais e econômicas, incluindo redução da vida útil de reservatórios. A
identificação e o mapeamento de áreas susceptíveis a escorregamentos são importante ferramentas
na no gerenciamento de bacias, devido, principalmente, ao seu baixo custo e ampla aplicabilidade,
inclusive no projeto de reservatórios.
a) b)
X Encontro Nacional de Engenharia de Sedimentos 19
A ocorrência de escorregamentos depende de inúmeros fatores e a modelagem matemática
tenta, através da análise de dados topográficos, pedológicos e hidrológicos, descrever os processos
envolvidos na estabilidade das encostas. Os modelos SINMAP e SHALSTAB apresentaram
desempenhos satisfatórios quando aplicados à bacia do Rio Cunha, no município de Rio dos
Cedros/SC. A topografia, além de representar a declividade do terreno, rege as linhas de fluxo,
indicando os locais onde haverá maior concentração de água e consequentemente maior
probabilidade de falha. É evidente a necessidade de dados topográficos de qualidade que tenham a
capacidade de gerar um MDT que represente verdadeiramente as condições do relevo local e
aperfeiçoe o resultado da modelagem.
A comparação direta entre os dois modelos revelou que o SHALSTAB teve melhor
desempenho aplicado a Bacia do Rio Cunha devido a sua capacidade de detectar os pontos de
escorregamento sem designar grandes porcentagens de área instável dentro da bacia. A
discretização dos parâmetros de entrada para as diferentes formações da bacia poderia melhorar a
resposta dos modelos. Desta maneira, recomenda-se a aplicação do SHALSTAB para delineamento
de áreas susceptíveis a escorregamentos translacionais rasos, podendo assim ser utilizado para
estimativa de volume de sedimentos gerados durante um evento. O SINMAP poderia ser aplicado
para fins menos específicos, como zoneamento de perigo e orientação da expansão urbana.
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