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NÍSIA FLORESTA: a pioneira feminista brasileira Ananda Neves Arnoud Guimarães¹ Mayanne Júlia Tomaz Freitas¹ Maria Eulina Pessoa de Carvalho² Universidade Federal da Paraíba Introdução Este artigo é oriundo de uma disciplina cursada no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba, na qual as autoras deveriam apresentar a vida e obra de um/uma educador/a em forma de síntese, que pudesse contribuir direta ou indiretamente com suas respectivas pesquisas. Nossos objetos de investigação abarcam o gênero como categoria de análise em sua relação com a educação formal das mulheres, seja no ensino superior ou na educação básica. A escolha pela autora e educadora Nísia Floresta se deu em função de sua importância na luta pela educação feminina e na sua prática de questionamento acerca do lugar de submissão das mulheres no século XIX. Neste estudo, buscamos analisar a partir das publicações encontradas nos periódicos CAPES, o que tem sido produzido sobre essa grande precursora da educação feminina Apresentaremos um esboço acerca da vida e obra de Nísia Floresta, em seguida realizaremos a análise das publicações encontradas. Vida e obra Dionísia Gonçalves Pinto, mais conhecida por Nísia Floresta Brasileira Augusta, nasceu em 12 de outubro de 1810, no sítio Floresta, localizado no município de Vila de Papary, que hoje recebe seu nome. Filha de Dioniso Gonçalves Pinto, advogado português, e da brasileira Antônia Clara Freire, descendente de uma das principais famílias da região. Aos treze anos de idade, em 1823, casa-se com Manuel Alexandre Seabra de Melo, porém o matrimônio terá a duração de apenas alguns meses, resultando em seu retorno a casa dos pais. Em 1828, enamora-se de Manuel Augusto de Faria Rocha, com o qual passa a conviver e tem ¹Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação PPGE/UFPB. Integrante do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Ação sobre Mulher e Relações de Sexo e Gênero (NIPAM). ² Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação PPGE/UFPB. Membro do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Ação sobre Mulher e Relações de Sexo e Gênero (NIPAM). Anais do VI Seminário Nacional Gênero e Práticas Culturais João Pessoa – PB | 22 a 24 de novembro | 2017 | ISSN 2447-5416

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NÍSIA FLORESTA: a pioneira feminista brasileira

Ananda Neves Arnoud Guimarães¹ Mayanne Júlia Tomaz Freitas¹

Maria Eulina Pessoa de Carvalho² Universidade Federal da Paraíba

Introdução

Este artigo é oriundo de uma disciplina cursada no Programa de Pós-Graduação em

Educação da Universidade Federal da Paraíba, na qual as autoras deveriam apresentar a vida e

obra de um/uma educador/a em forma de síntese, que pudesse contribuir direta ou

indiretamente com suas respectivas pesquisas. Nossos objetos de investigação abarcam o

gênero como categoria de análise em sua relação com a educação formal das mulheres, seja

no ensino superior ou na educação básica. A escolha pela autora e educadora Nísia Floresta se

deu em função de sua importância na luta pela educação feminina e na sua prática de

questionamento acerca do lugar de submissão das mulheres no século XIX.

Neste estudo, buscamos analisar a partir das publicações encontradas nos periódicos

CAPES, o que tem sido produzido sobre essa grande precursora da educação feminina

Apresentaremos um esboço acerca da vida e obra de Nísia Floresta, em seguida realizaremos

a análise das publicações encontradas.

Vida e obra

Dionísia Gonçalves Pinto, mais conhecida por Nísia Floresta Brasileira Augusta,

nasceu em 12 de outubro de 1810, no sítio Floresta, localizado no município de Vila de

Papary, que hoje recebe seu nome. Filha de Dioniso Gonçalves Pinto, advogado português, e

da brasileira Antônia Clara Freire, descendente de uma das principais famílias da região. Aos

treze anos de idade, em 1823, casa-se com Manuel Alexandre Seabra de Melo, porém o

matrimônio terá a duração de apenas alguns meses, resultando em seu retorno a casa dos pais.

Em 1828, enamora-se de Manuel Augusto de Faria Rocha, com o qual passa a conviver e tem

¹Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação PPGE/UFPB. Integrante do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Ação sobre Mulher e Relações de Sexo e Gênero (NIPAM). ² Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação PPGE/UFPB. Membro do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Ação sobre Mulher e Relações de Sexo e Gênero (NIPAM).

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sua primeira filha Lívia Augusta de Faria Rocha, nascendo no ano de 1830. Sua trajetória com

a escrita inicia em 1831, ainda no estado de Pernambuco, como colaboradora do jornal

Espelho das Brasileiras, na produção de artigos que tinham como tema a condição da mulher

nas culturas antigas. Nesse mesmo ano, nasce seu segundo filho, que morre oito meses depois

(ALMEIDA; DIAS, 2009; DUARTE, 2010).

Nísia residiu em diversas cidades do país, a exemplo de Goiânia e Olinda, mudando-se

para Porto Alegre após a morte de seu pai, assassinado por contrariar o interesse de

representantes da elite pernambucana. Em 1838, após o falecimento de seu segundo

companheiro, Nísia muda-se para o Rio de Janeiro onde funda o Colégio Augusto, que foi

umas das primeiras instituições exclusivas para meninas e que tiveram sobre sua direção

alguém de nacionalidade brasileira (em sua maioria eram gerenciadas por estrangeiros),

tornando-se um dos mais conceituados da Corte (ALMEIDA; DIAS, 2009; DUARTE, 2010,

GUSMÃO, 2012).

Inovador, o modelo de educação do referido colégio distinguia-se dos demais por

romper com os limites de uma educação feminina voltada a prendas domésticas, ao ensino

superficial das línguas portuguesa e francesa, e das quatro operações matemáticas. A

instituição dirigida por Nísia oferecia uma introdução ao estudo de línguas como o latim,

francês, o inglês e o italiano, além de disciplinas como história e geografia, o incentivo a

prática da educação física e limitava o quantitativo de alunas por turma como estratégia para a

obtenção de uma maior qualidade de ensino (DUARTE, 2002; CASTR0, 2010)

O Colégio Augusto foi alvo de inúmeras críticas por oferecer o ensino de disciplinas

consideradas inúteis às mulheres. Como naquela época a educação feminina estava voltada ao

preparo da mulher para um bom desempenho da vida doméstica de modo a cumprir com a sua

função social, não havia a percepção da necessidade de uma educação equivalente entre

homens e mulheres (FERNANDES; SILVA, 2016; KAVAWEJCZYK, 2010).

Foi por meio da sua atuação no colégio Augusto que Nísia Floresta pôde materializar

ideias levantadas em suas obras literárias a respeito da importância da educação feminina.

Além de impulsionar a emancipação das mulheres no Brasil,

Nísia viveu por 75 anos e durante esses anos morou em alguns estados brasileiros e

fora do País. É considerada uma das primeiras feministas brasileira, por defender os direitos

das mulheres. Sua obra é constituída por 15 títulos em português, francês e italiano. São

poemas, ensaios, romances e relatos de viagens. Uma das suas primeiras obras, intitulada

Direitos das mulheres e injustiça dos homens (1832), uma tradução livre da obra

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Vindications of the rights of woman, de Mary Wollstonecraft, a escritora aborda o direito das

mulheres à educação e ao trabalho, contrapõe a ideia da superioridade intelectual masculina,

reivindicando o respeito às mulheres e o reconhecimento destas como inteligentes e capazes

intelectualmente, embora destaque sua rejeição a mudanças radicais na estrutura da sociedade

(DUARTE, 2002; DUARTE, 2010)

Ela tinha como projeto a educação feminina, e além dessa primeira obra direcionada

às mulheres escreveu: Conselhos a minha filha (1842); Opúsculo humanitário (1853) e A

Mulher (1859). Na obra Opúsculo Humanitário, escrita quando residia na Europa, Nísia

desenvolve uma defesa ainda mais contundente dos direitos femininos, fazendo um resgate

histórico das condições das mulheres desde a antiguidade clássica e relacionando a

prosperidade e desenvolvimento de uma nação ao cuidado e compromisso com a educação

feminina. Elaborou ainda quadros descritivos com números oficiais do sistema educacional

vigente, destacando a preocupante divergência no número de meninas nas escolas em relação

ao número de meninos.

Contudo, é importante ressaltar que não se pode dissociar os limites do pensamento e

das obras de Nísia Floresta ao contexto histórico em que foram produzidas. A escritora estava

submetida a um jogo de forças e influências, sendo impulsionada, de um lado, por um

pensamento liberal mais progressista e de outro por ideais moralistas cristãos.

O moralismo cristão estava presente por meio de sua romantização do papel de esposa

e mãe dedicadas, afirmando que a educação deveria iniciar no berço, mediante a

amamentação, e permanecer sob a orientação materna, no ambiente privado: o lar. O conceito

de educação de Nísia não possibilitava uma ampliação do universo feminino, apenas

constituía uma nova delimitação do papel da mulher na sociedade, agora valorizada enquanto

“mãe de família”, reafirmando que a instrução feminina junto a uma educação moral

dignificariam as mulheres e fariam delas melhores esposas e mães (DUARTE, 2002;

CASTRO, 2010).

Percurso metodológico

A pesquisa é de cunho bibliográfico, e foi realizada a partir do portal de periódicos

CAPES, com a finalidade de analisar o que se tem produzido sobre a educadora feminista

Nísia Floresta. Assim, na primeira busca colocando por assunto Nísia Floresta, encontramos

um total de (164) artigos. Ao refinarmos a pesquisa, a partir da seleção de “periódicos

revisados por pares” (112), e depois por “linguagem”, no nosso caso selecionando as

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publicações apenas em português, chegamos ao total de (43) artigos encontrados.

Mesmo com um número de 43 títulos, não utilizamos todos os achados, pois parte

destes tratavam-se da cidade Nísia Floresta que fica localizada no Rio Grande do Norte,

região do Nordeste brasileiro. Dessa forma, nossa pesquisa finalizou com um número de 13

títulos que direta ou indiretamente trazem alguma contribuição sobre Nísia Floresta e sua

atuação no século XIX. A seguir no QUADRO 1, em síntese, apresentamos informações

pontuais dos títulos encontrados.

QUADRO 1: PRINCIPAIS INFORMAÇÕES SOBRE OS TÍTULOS ENCONTRADOS

Autoria Título Periódico/Ano Tipo de Publicação

Palavras-Chave

TAMBARA, E. A Educação Feminina no Brasil ao final do século XIX.

História da Educação (1997)

Artigo

História da Educação. Educação da Mulher.

AGUIAR, N. Patriarcado, Sociedade e Patrimonialismo.

Sociedade e Estado (2000)

Artigo

Brasil. Patriarcado. Patrimonialismo. Feminismo. Teoria.

SOLHET, R. Nísia Floresta e

mulheres de letras

no Rio Grande do

Norte: pioneiras

na luta pela

cidadania

Estudos Feministas (2005)

Resenha

-

RONCADOR, S.

O demônio familiar: lavadeiras, amas-de-leite e criadas na narrativa de Júlia Lopes de Almeida

Luso-Brazilian Review (2007)

Artigo

-

BORGES, J. V. Gênero e história de mulheres na historiografia

Estudos Feministas (2008)

Resenha

-

DUARTE, C. L. As viagens de Nísia Floresta: memória, testemunho e história.

Estudos Feministas (2008)

Artigo

Literatura de viagem. Literatura de autoria feminina. Nísia Floresta.

DUARTE, C. L.;

Pensar o outro ou quando as

Estudos Feministas

Apresentação

-

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MUZART, Z. L. mulheres viajam (2008) ALMEIDA, C. R. S.; DIAS, E. T. D. M.

Nísia Floresta: o conhecimento como fonte de emancipação e a formação de cidadania feminina.

Rhela (2009) Artigo Educação. Conhecimento. Emancipação. Inclusão.

PAIVA, K. B. Contar, é preciso Estudos Feministas (2009)

Resenha -

MATOS, M. Movimento E Teoria Feminista: é possível reconstruir a Teoria Feminista a partir do Sul Global?

Revista de Sociologia Política (2010)

Artigo

Teoria e movimento feminista. Justiça. Participação política. Transversalidade. Interseccionalidade de gênero.

SCAVONE, L. Perfil da REF dos anos 1999-2012

Estudos Feministas (2013)

Artigo

Revista de Estudos Feministas. Política editorial. Temas publicados. Tendências editoriais.

GOMES, C. M. O femicídio na ficção de autoria feminina brasileira

Estudos Feministas (2014)

Artigo Violência de gênero. Femicídio. Estrupo.

ESTACHESKI, D. L. T.; MEDEIROS, T. G.

A atualidade da obra de Mary Wollstonecraft

Estudos Feministas (2017)

Resenha -

Fonte: Produzido pelas autoras, 2017.

Dos 13 títulos encontrados, 4 são resenhas de livros publicados na Revista de Estudos

Feministas (REF), 1 é uma apresentação de um número temático da mesma revista, e 8 são

artigos que estão distribuídos em seis periódicos, em sua maioria publicado na REF. Apenas

uma das publicações é do final dos anos 1990, enquanto as demais datam a partir dos anos

2000, tendo a mais recente publicada neste ano (2017). Das produções analisadas apenas três

já trazem no título o nome de Nísia Floresta e apenas uma apresenta seu nome nas palavras-

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chave. No próximo tópico adentraremos nas publicações a fim de analisar as contribuições

desse material.

Analisando as publicações

A análise das publicações supracitadas objetivou identificar de que forma a escritora e

educadora Nísia Floresta é apresentada nos textos, assim como situar de que modo ela

contribui com determinadas produções no campo de estudos feministas.

No texto escrito por Estacheski e Medeiros (2017), uma resenha do livro

“Reivindicação dos direitos das mulheres” de Mary Wollstoncraft, Nísia Floresta aparece

uma única vez como a precursora do feminismo no Brasil e aponta uma de suas primeiras

obras “Direito das mulheres e injustiça dos homens”, que seria a também a tradução do livro

de Wollstoncraft, escrita em 1832. Além da tradução da obra, Matos (2010), ao falar da

história do feminismo no Brasil, cita Nísia em nota de rodapé como a primeira brasileira a

tentar desconstruir os estereótipos de gênero e a dominação das mulheres em meados do

século XIX.

A produção acadêmica sobre Nísia se estende na resenha do livro “Vozes femininas do

Império e da República”, no qual a obra é constituída por 13 autoras mulheres que relatam

histórias de outras mulheres. Uma das autoras é Constância Duarte, pesquisadora que tem se

dedicado a investigar vida e obra de Nísia Floresta, dando a ela seu devido destaque, em

função do caráter inovador de suas ideias e práticas educativas na educação das mulheres do

século XIX, na qual ultrapassem uma educação voltada ao meio doméstico e pensasse numa

formação multifacetada (PAIVA, 2009).

Solhet (2005), em sua resenha sobre os livros “Nísia Floresta: vida e obra” e

“Literatura feminina no Rio Grande do Norte: de Nísia Floresta a Zila Mamede”, destaca

todo esforço empreendido pela autora Constância Lima Duarte em suas investigações sobre

Nísia Floresta, revelando, inclusive a necessidade da pesquisadora de viajar a diversos países

nos quais Nísia residiu a fim de obter mais informações sobre sua vida e publicações. Em suas

produções, Constância divide a análise da vida e obra de Dionísia em cinco partes: a sua

biografia, considerando seu contexto social e cultural, a militância em diversas frentes, como

a feminista, indianista, nacionalista; sua trajetória na educação feminina; além das suas

principais obra e relatos de viagens. Descreve Nísia como uma mulher de significativa

atuação política, social e literária, cujas obras mantiveram-se desconhecidas por muitos anos.

Exalta ainda o esforço de Nísia na militância pelo respeito às mulheres e reconhecimento de

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seu potencial e inteligência.

Também na resenha do livro “História &.... gênero” o nono livro de uma coleção de

“História &....reflexões”, tal obra trata de história de mulheres e atuação no movimento

feminista, assim a autora cita Nísia Floresta ao lembrar que o primeiro capítulo deste livro

dedica-se a apresentar sua atuação século XIX e a questão do voto das mulheres no Brasil em

1934 (BORGES, 2008).

Nísia Floresta está entre as mulheres que realizou viagens, escreveu e relatou sobre

elas no século XIX (DUARTE; MUZART, 2008). Como uma viajante ilustre, seus escritos

são considerados por Duarte (2008) como muito além de meros relatos, tendo em vista a

sensibilidade e erudição de sua produção, atravessado por uma grande pessoalidade que

demonstram a falta de pretensão na publicação dessas obras. Para Nísia, esses escritos seriam

apenas uma forma de compartilhar suas emoções com os familiares que permaneciam no

Brasil. A autora afirma que as viagens realizadas eram uma forma de lidar com a morte e suas

narrações possuíam bastante informações autobiográficas. Nísia é novamente exaltada como

uma mulher pioneira em várias frentes, capaz de romper com vários limites, especialmente do

espaço privado, reservado as mulheres.

Alguns críticos apontam a grande contribuição para a educação feminina deixada por

Nísia, ela também é considerada uma das mais importantes intelectuais abolicionistas do

século XIX, lembrada por Roncador (2007), ao falar do aleitamento feito pelas amas-de-leite

e então citar trechos de seu livro “Opúsculo humanitário”, escrito em 1853. Quando pensado

sobre as contribuições do feminismo para a mudança de valores na sociedade brasileira, Nísia

apontada ao lembrar-se de sua produção sobre o direito das mulheres (GOMES, 2014), e seu

ativismo feminista (SCAVONE, 2013).

Aguiar (2000, p.307) cita Nísia Floresta em seu texto ao apontar “para a falta de

acesso das mulheres à educação, a postos de trabalho e aos cargos públicos como indicações

de uma injustiça dos homens, como denominou o sistema patriarcal”.

O artigo desenvolvido por (Tambara, 1997), objetivou realizar uma investigação das

concepções ideológicas relacionadas a educação feminina no século XIX. A autora descreve

Nísia Floresta como uma mulher de grande circulação entre os campos intelectuais da Europa.

Enfatiza que a grande luta de Dionísia foi o combate aos preconceitos relacionados a

educação das mulheres. Esta defendia uma maior participação do Estado no controle da

qualidade da educação ministrada nas escolas particulares, questionando a mercantilização da

educação no país e baixa qualificação das professoras. Descreve como revolucionária a

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concepção de Nísia acerca da integração entre educação e trabalho, tendo em vista que esta

compreendia que as meninas deveriam habituar-se ao trabalho, entendendo-o como uma

virtude necessária nos âmbitos da vida.

Dentre as publicações aqui descritas, o artigo elaborado por Almeida e Dias (2009),

apresenta um estudos mais detalhado de sua vida e obra. As autoras ressaltam uma

consciência antecipadora de Floresta, afirmando que a mesma objetivava impulsionar a

emancipação das mulheres pela via do conhecimento. Aponta Nísia como grande influência

na prática educacional do século XIX, descrevendo-a como uma pessoa de personalidade

arrojada, que rompeu com limites impostos às mulheres, de um lugar educacional e social de

eterno resguardo. Em suas obras, Dionísia articulava ideias europeias ao contexto brasileiro,

indignando-se com os rumos da educação feminina e propondo formas de melhorar e

modificar esse sistema. Apesar de reconhecer seu pioneirismo e inovações, afirmam que

constantemente Nísia Floresta transitava entre o conservadorismo e o vanguardismo, pois ao

mesmo tempo em que indignava-se com o quadro ideológico de seu tempo, não pretendia

grandes alterações acerca da libertação da mulher do espaço privado. Apesar disso, as autoras

afirmam ainda que Nísia teria como meta formar e modificar consciências, e sua grande

característica e diferencial é ser uma mulher a frente de seu tempo.

Em uma análise geral, pudemos observar que os artigos e resenhas, em sua maioria

(10), fazem referência a autora aqui destacada de forma sintética, reconhecendo seu

pioneirismo na militância pela educação feminina, mas pouco adentrando nos conteúdos de

suas obras. Destacamos as produções desenvolvidas por Tambara (1997), Duarte (2008) e

Almeida;Dias (2009), que apresentam um maior panorama sobre as obras da autora, fazendo

um resgate de sua história de vida e contexto histórico e social de sua época, proporcionando

uma compreensão mais complexa e crítica de suas contribuições.

Considerações finais

A escolha da educadora Nísia Floresta está relacionada as nossas pesquisas de

mestrado, visto que ela traçou todo seu percurso de vida em prol da educação feminina por

acreditar que a mulher pode ocupar os vários e espaços da vida pública e privada e que deve

ser reconhecida por essa atuação, partindo da perspectiva de uma educação feminina

emancipatória.

Nos artigos e resenhas pesquisados pudemos perceber um termo comum que

perpassava as análises sobre Nísia: pioneirismo. Não podemos desconsiderar os limites das

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obras da autora, inserida em contexto histórico e cultural de forte discriminação às mulheres,

que viviam constantemente reclusas, sem acesso a uma educação para além das aprendizagens

do lar. Nísia Floresta contestou o lugar atribuído a mulher na sociedade, ousou romper

padrões e questionar estereótipos. A frente de seu tempo, escreveu ensaios sobre educação,

poemas e narrativas de viagens; e lutou pelo reconhecimento da importância social da mulher.

Todavia, apesar de sua grande importância, pudemos perceber que ainda não há um

grande quantitativo de estudos sobre a obra e vida de Nísia Floresta. Apenas três entre os

artigos apresentados dedicam-se realmente a desenvolver um estudo e análise sobre Nísia, sua

produção e importância.

É de suma importância a realização de pesquisas que busquem resgatar a história dessa

autora, percursora na luta pela educação das mulheres, valorização e reconhecimento das

potencialidades femininas. O conhecimento das obras da referida educadora é fundamental

aos pesquisadores e pesquisadoras que se dedicam aos estudos de gênero e pretendem romper

com a lógica de submissão das mulheres em nossa sociedade.

Referências AGUIAR, N. Patriarcado, Sociedade e Patrimonialismo. Sociedade e Estado. v.15, n.2, 303-330, jun./dez. 2000. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/se/v15n2/v15n2a06.pdf>. Acesso em: set. 2017. ALMEIDA, C. R. S.; DIAS, E. T. D. M. Nísia Floresta: conhecimento como fonte de emancipação e a formação da cidadania feminina. Rhela. v.13, p.11-27, 2009. Disponível em: <http://revistas.uptc.edu.co/index.php/historia_educacion_latinamerican/article/view/1531>. Acesso em: set. 2017. CASTRO, L. M. A contribuição de Nísia Floresta para a educação feminina: Pioneirismo no Rio de Janeiro oitocentista. Revista Outros Tempos. Dossiê História e Educação. v. 7, n. 10, 2010. Disponível em: <http://www.outrostempos.uema.br/OJS/index.php/outros_tempos_uema/article/view/108> Acesso em: ago. de 2017. DUARTE, C. L. Nísia Floresta Brasileira Augusta. Em: FÁVERO, M. L. A.; BRITTO, J. M. (org.). Dicionário de educadores no Brasil. 2 ed. Rio de Janeiro. Editora UFRJ, 2002. ______. Nísia Floresta: vida e obra. Natal: Ed. Da UFRN, 1995. DUARTE, C. L.; MACEDO, D. M. C. P. Literatura feminina do Rio Grande do Norte: de Nísia Floresta a Zila Mamede. Natal: Sebo Vermelho/UnP, 2001. Resenha de: SOLHET, R. Nísia Floresta e mulheres de letras no Rio Grande do Norte: pioneiras na luta pela cidadania. Revista de Estudos Feministas, Florianópolis, n.13, v.1, 179-199, jan./abr. 2005. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/ref/v13n1/a16v13n1.pdf>. Acesso em: set. 2017.

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______. As viagens de Nísia Floresta: memória, testemunho e história. Revista de Estudos Feministas. Florianópolis, n. 16, v.3 set/dez 2008, p. 1047-1060. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ref/v16n3/21.pdf>. Acesso em: set. 2017. ______.; MUZART, Z. L. Pensar o outro ou quando as mulheres viajam. (Apresentação da revista – Artigos Temáticos). Revista de Estudos Feministas. Florianópolis, n. 16, v.3 set/dez

2008, p. 1005-1008. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/ref/v16n3/18.pdf>. Acesso

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