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35Física na Escola, v. 17, n. 1, 2019

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Este texto analisa um caso especial do efeitoDoppler quando observador e fonte estão semovendo em meios diferentes. É possível per-ceber, a partir de uma análise simples, que nessasituação há a possibilidade de ocorrência do efei-to Doppler mesmo quando a fonte e o obser-vador estão em repouso um em relação aooutro. Também notamos que é possível quenão ocorra Doppler mesmo que haja movi-mento relativo entre fonte e observador.

Introdução

Oefeito Doppler, tal como éapresentado em textos de nívelmédio, analisa o que acontece

com a frequência observada caso haja mo-vimento relativo entre uma fonte de ondase um observador.

Para o caso de ambos, observador efonte, se moverem, temos que [1]

(1)

Nessa equação temos que fobs é a fre-quência percebida pelo observador; ffonte éa frequência original da fonte; vobs é avelocidade do observador em relação aomeio; vfonte, a velocidade da fonte em rela-ção ao meio e v, a velocidade de propaga-ção da onda naquele meio, respectivamen-te, em relação ao meio (o sinal consideradopara vobs e vfonte é positivo se apontar nosentido observador → fonte). Essa equa-ção mostra de forma muito clara que,caso o movimento relativo entre fonte eobservador seja de aproximação, afrequência observadaserá maior que a fre-quência da fonte. Ocontrário ocorre casoo movimento rela-tivo seja de afasta-mento.

Contudo, em ge-ral, os textos paraEnsino Médio [1-3]consideram apenas asituação em que fon-te e observador estãono mesmo meio. Deuma maneira mais geral, é possível quefonte e observador estejam em meiosdiferentes e interessa-nos saber como afrequência observada varia em função davelocidade do observador e da fonte emrelação aos seus meios e da velocidade dosom em relação a esses mesmos meios.

Gildo Luiz de Sales NetoInstituto Federal de Educação, Ciênciae Tecnologia do Rio Grande do Norte,Mossoró, RN, BrasilE-mail: gildoluizsalesneto@gmail.com

Marcelo Nunes CoelhoInstituto Federal de Educação, Ciênciae Tecnologia do Rio Grande do Norte,Mossoró, RN, BrasilE-mail: marcelo.coelho@ifrn.edu.br

Será possível haver efeito Dopplermesmo sem movimento relativoentre fonte e observador? E serápossível não haver efeito Dopplermesmo que haja movimentorelativo?

As respostas a essas perguntas podemser fornecidas ao analisarmos a situaçãoem que fonte e observador se encontramem meios diferentes. O que aconteceria seo observador e a fonte estivessem emmeios diferentes onde as ondas tambémse propagam com velocidades diferentes?Considere a situação descrita na Fig. 1.

Nesse caso, fonte e observador foramcolocados em meios diferentes. A fonte,então, emite ondas com uma frequênciaffonte e que se propagam com velocidade v1

no meio 1 e v2 no meio 2. Interessa-nossaber qual a frequência fobs detectada peloobservador.

Para resolver esse problema, vamosconsiderar a interface que separa os doismeios (marcada pela letra I na Fig. 1). Aonda produzida pela fonte, ao atravessara interface, refratará, alterando sua

velocidade. A frequên-cia, entretanto, não sealtera na mudança demeio.

Por causa disso,vamos dividir o pro-blema em duas etapas:i) Calculamos a fre-quência detectada pelainterface por causa domovimento da fonte.ii) Calculamos a fre-quência detectada peloobservador por causa

do movimento dele, considerando ainterface como a fonte das ondas.

Ao fazer isso, consideramos a inter-face como observador na etapa i) e comofonte emissora na etapa ii). Por conse-quência, dividimos o problema originalem dois problemas, cada um acontecendo

Doppler mesmo sem movimento relativo?

Estudando o efeito Doppler noEnsino Médio, consideramos a

situação em que fonte eobservador estão no mesmomeio. De uma maneira maisgeral, é possível que fonte e

observador estejam em meiosdiferentes, e a frequênciaobservada pode variar emfunção da velocidade doobservador e da fonte em

relação aos seus meios

36 Física na Escola, v. 17, n. 1, 2019Doppler mesmo sem movimento relativo?

em um único meio.Como cada etapa envolve apenas um

meio, podemos utilizar a expressão geralpara o efeito Doppler, exibida acima(Eq. (1)). Primeiro, a frequência percebidapela interface (finter) por causa do movi-mento da fonte é calculada por

Como a interface não se move emrelação a qualquer meio, vinter = 0 e aequação fica

(2)

Lembrando que v1 é a velocidade daonda no meio 1. Agora vamos considerara segunda etapa, em que a fonte emissora

é a interface e o observador perceberá umafrequência fobs diferente por causa de seupróprio movimento. Aplicando a equaçãogeral, temos

Mais uma vez, como a interface nãose move, a equação assume a forma

(3)

Substituindo finter dessa última equa-ção pela expressão que encontramos naetapa 1, ficamos com

(4)

Não ocorre efeito Doppler mesmoquando há movimento relativo

Observe, a partir da equação deduzidaacima, que a frequência percebida só seráigual à frequência emitida pela fonte se

Conclui-se que, para fobs = ffonte(situação em que não há efeito Doppler),

(5)

A razão v1/v2 é sempre positiva (tendoem vista que consideramos o módulo davelocidade da onda no respectivo meio).Se fonte e observador estiverem se mo-

vendo no mesmo sentido, seus sinais serãoiguais e, portanto, a razão à direita serápositiva.

Como a velocidade da onda no meio1 é diferente da velocidade da onda no meio2, para que fobs = ffonte, a velocidade dafonte, vfonte, será necessariamente diferenteda velocidade do observador, vobs. Ou seja,para que não haja efeito Doppler é neces-sário que as velocidades do observador eda fonte sejam diferentes. Sendo assim, épossível não haver efeito Doppler mesmohavendo movimento relativo.

Ocorre efeito Doppler quando avelocidade relativa é nula

Considerando as velocidades doobservador e da fonte como sendo iguaise não nulas (vobs = vfonte = v ≠ 0), temosque

Uma vez que v2 ≠ v1, o termo variávelé diferente de 1. Logo, há efeito Doppler(variação na frequência) mesmo quandonão há movimento relativo entre obser-vador e fonte. Caso o observador e a fonteestejam parados, v = 0, fobs = ffonte, nãohavendo efeito Doppler. Logo, para que oefeito não aconteça, ou a velocidade doobservador e da fonte são nulas ou obe-decem à proporção da Eq. (5).

Essa equação confirma o que é ditonos livros de física do Ensino Médio: seobservador e fonte tiverem velocidadesnulas, a frequência percebida será a mes-ma, independentemente do meio onde se

Figura 1: Uma fonte emissora de ondasestá situada no meio 1. Um observadorestá situado no meio 2. A interface,imóvel, entre os dois meios é representadapor I.

Figura 2: Gráfico da frequência percebida vs. velocidade da fonte para o caso de observador e fonte estarem no mesmo meio.

37Física na Escola, v. 17, n. 1, 2019 Doppler mesmo sem movimento relativo?

Figura 3: Gráfico da frequência percebida vs. velocidade da fonte para o caso de observador e fonte estarem em meios diferentes. Afonte encontra-se no meio 1; o observador, no meio 2.

encontram.Porém, no caso de observador e fonte

estarem em meios diferentes, ter veloci-dade relativa nula não é condição suficien-te para que percebam a mesma frequência.

Outro ponto digno de nota é o casoem que a fonte está parada e o observadorse move, ou vice-versa. Nesse caso, umdos fatores da Eq. (4) assumirá o valor de1. Ou seja, para o caso de o observador,por exemplo, não se mover, só nos inte-ressa saber a velocidade de propagação dosom no meio da fonte. Sendo assim, só éimportante conhecer a velocidade do somno meio em que há movimento (do obser-vador ou da fonte).

Para efeito de comparação, analisa-remos como se comporta a frequênciapercebida pelo observador em função domovimento relativo fonte–observador pormeio de gráficos nas duas situações aseguir (em ambos os casos, observador efonte movem-se no mesmo sentido).

Nesses gráficos, a velocidade do obser-vador é constante em cada curva (valoresda velocidade do observador estão indica-dos na figura), sendo a velocidade da fonteo termo variável, representado no eixo dasabcissas. No eixo das ordenadas consta afrequência percebida pelo observador emfunção do movimento da fonte.

Além disso, o segmento de reta para-lelo ao eixo x representa as situações emque não há efeito Doppler. Logo, a inter-seção das curvas com esse segmento mos-

tra o caso em que a frequência percebidaé igual à emitida, que foi escolhidaarbitrariamente como 400 Hz.

Primeiro, vamos analisar a situaçãoque envolve um único meio de propagação(Fig. 2). A frequência percebida para ummesmo meio, como dito acima, será igualquando fonte e observador tiverem amesma velocidade. Olhando no gráfico, afrequência percebida só é de 400 Hz quan-do vobs = vfonte. Na curva verde, por exem-plo, a frequência percebida é de 400 Hzquando vfonte é igual a 200 m/s, que cor-responde à velocidade do observadorrelativo a essa curva. Logo, velocidaderelativa ser nula é condição suficiente paranão haver efeito Doppler, desde que nomesmo meio.

Contudo, quando os meios (da fontee do observador) são diferentes, a verifi-cação é outra (Fig. 3). A frequência só nãovaria se a razão entre as velocidades depropagação da onda nos dois meios forigual à razão entre as velocidades da fontee do observador, conforme indicado naEq. (5).

O ponto A mostra a situação ondeambos estão parados. Conforme se espera,a frequência percebida é a mesma que foiemitida. Porém, nos pontos B, C e D, ondetambém não ocorre variação na frequên-cia, fica claro a partir do gráfico que asduas velocidades não são iguais. Ascoordenadas desses pontos foram colo-cadas no lado direito do gráfico.

Ao fazermos a razão entre vfonte e vobs,verificaremos a proporção. No caso dessegráfico, v1 = 1500 m/s e v2 = 340 m/s.Aplicando a Eq. (5), temos

Além disso, a velocidade da onda emum dado meio só influencia na frequênciapercebida se houver movimento nessemeio (da fonte ou do observador). Logo,caso haja um meio intermediário separan-do fonte e observador, ou até mesmo nmeios intermediários (Fig. 4), a velocidadedo som nesses meios não influenciará noresultado, tendo em vista que não hámovimento em nenhum deles.

A verificação disso é bastante simples:basta considerar as duas etapas utilizadasneste trabalho para se determinar aEq. (4). Ao se fazer isso, como não hámovimento nesses meios intermediários,restará

Como esse fator vale 1, a frequênciapercebida não será alterada.

Uma vez que não há movimento nosmeios 2 e 3, a frequência não mudaránesse trecho. Ou seja, as únicas veloci-dades de propagação que nos interessamsão aquelas do meio 1, onde está a fonte,e a do meio 4, onde está o observador. Os

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meios intermediários vão apenas mudaro intervalo de tempo entre a emissão daonda e sua percepção pelo observador, semgerar efeito algum na altura do som.

Conclusão

Por intermédio da extensão do fenô-meno Doppler para meios diferentes, épossível determinar um conjunto de ideias

Referências

[1] N.V. Bôas, R.H. Doca e G.J. Biscoula, Física 2: Termologia, Ondulatória e Ótica (Editora Saraiva, São Paulo, 2016).[2] K. Yamamoto e L.F. Fuke, Física para o Ensino Médio (Editora Saraiva, São Paulo, 2016), v. 2.[3] A. Máximo, B. Alvarenga e C. Guimarães, Física: Contexto e Aplicações (Editora Scipione, São Paulo, 2016), v. 2.[4] H.D. Young e R.A. Freedman, Física II: Termodinâmica e Ondas (Addison Wesley, São Paulo, 2008).[5] D. Halliday, J. Walker e R. Resnick, Fundamentos de Física (LTC, Rio de Janeiro, 2009), v. 2.[6] H.M. Nussenzveig, Curso de Física Básica (Edgard Blucher, São Paulo, 2002), v. 2.

Figura 4: Caso em que há meios de propagação diferentes separando fonte e observador.As interfaces são marcadas por I1, I2 e I3.

que incluem aquelas observadas para ocaso de um mesmo meio, além de algu-mas outras. Consequentemente, a Eq. (4)é uma equação mais geral para o efeitoDoppler, implicando a equação apresen-tada nos livros de Ensino Médio como umcaso particular.

Comprova-se que, de fato, se obser-vador e fonte estiverem parados em

relação aos meios, a frequência percebidapelo observador é a mesma que a frequên-cia emitida pela fonte, mesmo quandofonte e observador se encontram emmeios diferentes.

Um resultado importante diz respeitoà condição para não ocorrência do efeitoDoppler. A condição de velocidade relativanula entre a fonte e o observador somenteé válida quando as velocidades de propa-gação do som nos dois meios forem iguais.Caso não sejam, tal condição passa a serde que a razão entre as velocidades nosdois meios seja igual à razão entre as velo-cidades da fonte e do observador conformeexpresso na Eq. (5).

Finalmente, a velocidade de propa-gação em um meio somente influenciaa frequência percebida se houver movi-mento da fonte ou do observador nessemeio. Logo, caso existam outros meiosentre a fonte e o observador, o efeitoDoppler é dependente apenas das velo-cidades de propagação do som nosmeios onde estão imersos a fonte e oobservador.

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