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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Sonia Maria da Silva Junqueira
EXPERIÊNCIAS DE ESTUDANTES NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO DE
DERIVADA EM AULAS DE CÁLCULO 1
DOUTORADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
São Paulo 2014
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Sonia Maria da Silva Junqueira
EXPERIÊNCIAS DE ESTUDANTES NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO DE
DERIVADA EM AULAS DE CÁLCULO 1
DOUTORADO EM EDUCAÇÃO MATÉMÁTICA
Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como exigência parcial para a obtenção do título de Doutora em Educação Matemática, sob orientação da Professora Doutora Ana Lúcia Manrique. Ivani Catarina Arantes Fazenda.
São Paulo 2014
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Banca Examinadora:
4
Ao distanciar-se do mundo, constituindo-se na objetividade,
surpreende-se, ela, em sua subjetividade. Nessa linha de
entendimento, reflexão e mundo, subjetividade e objetividade
não se separam: opõem-se, implicando-se dialeticamente.
Paulo Freire
5
Dedicatória
Aos meus pais,
Antonio e Margarida, pelo afeto, dedicação e generosidade, exemplos para minha
vida;
A minha filha Mariana,
pelas críticas despretensiosas e paciência com as leituras;
A meu filho Gabryel,
pela compreensão, carinho e disponibilidade de sempre;
A meu esposo Márcio,
pelo companheirismos de todas as horas e apoio incondicional.
6
Agradecimentos
À Deus, pelo sentido da vida, por esse momento e pela experiência.
À professora Ana Lúcia Manrique, pela amizade, orientação, dedicação, e por acreditar nas
possibilidades.
Aos professores Benedito Antonio da Silva, Maria Cristina Bononi Baruffi, Alessandro
Jacques Ribeiro e Sandra Lúcia Ferreira Acosta Soares, pelos direcionamentos no exame
de qualificação.
Aos professores Arlindo José de Souza Junior, Armando Traldi Junior, Benedito Antonio da
Silva e Sandra Lúcia Ferreira Acosta Soares, por aceitarem o convite para banca
examinadora e pelas preciosas sugestões.
Aos estudantes investigados, os sujeitos da experiência, pela confiança e fundamental
colaboração.
À Universidade Federal do Pampa – Unipampa, pelo tempo concedido em afastamento das
atividades profissionais para conclusão desse estudo.
Aos colegas da Unipampa, em especial para Dionara, Cristiano e Guilherme, pela
disponibilidade assumindo as minhas funções, tornando possível o afastamento.
Aos coordenadores, professores e colegas do Programa de Estudos Pós-graduados em
Educação Matemática da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, pela especial
convivência e contribuições.
À Suzanne, Secretária do Programa, pela competência e cordialidade de sempre.
Aos caros, Amarildo, Thais e Yara, pelas colaborações com a revisão do texto e tradução.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa
concedida.
Aos amigos, em especial à Rosana, por acreditar sempre e pelas palavras de incentivo em
diferentes momentos.
À minha família, pelo amor, apoio e compreensão nas frequentes ausências.
Obrigada!
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SONIA MARIA DA SILVA JUNQUEIRA
A PRÁTICA INTERDISCIPLINAR NO MESTRADO ACADÊMICO: IMPLICAÇÕES NO DESENVOLVIMENTO PESSOAL E PROFISSIONAL DOS ESTUDANTES
RESUMO
Com o objetivo de apontar possibilidades de experiências de estudantes em aulas de Cálculo 1, especificamente, em relação ao conteúdo Derivada, as escolhas teóricas foram conduzidas em torno da relação dialógica de Buber, a relação inter-humana, também das escolhas que conduzem a vida humana Bauman e May e da dimensão da experiência de Larrosa, o campo de subjetividades no qual se assenta a problemática do Cálculo 1. Delineou-se uma pesquisa qualitativa com dados quantitativos, com aspectos interpretativos e descritivos, por meio dos quais se planejou uma análise de conteúdo constituída junto a 186 estudantes de cursos de Engenharias e Licenciaturas, matriculados em uma Universidade Pública Federal. A coleta de dados ocorreu em três abordagens, sendo a primeira e segunda reveladoras de hipóteses subjetivas identificáveis a partir dos relatos dos sujeitos investigados, e a terceira, conduzida por representações exteriorizadas em Mapas Conceituais Iniciais. Concluiu-se que a experiência em aulas de Cálculo 1 tem sentidos de reciprocidade, na ação de mão dupla que engloba conteúdos e sujeitos da experiência; de unicidade, pela subjetividade e identidade de cada sujeito; de imprevisibilidade, pelas incertezas, perigos e possibilidades da experiência; de temporalidade, pois prescinde o reconhecimento de tempos e espaços distintos aos sujeitos da experiência. Os sujeitos investigados deixaram transparecer aspectos aparentemente contraditórios, que, todavia, denotaram complementaridades. Apontaram que estudantes com uma base “mais fraca” em Matemática alcançaram tanto resultados positivos quanto negativos, e que buscas pessoais contribuíram em favor da adaptação e desenvolvimento na disciplina, demonstrando aspectos de corresponsabilidades, embora não unânimes entre os sujeitos, revelando também marcas de um processo particular de escolhas. Ainda, evidenciou-se que o fortalecimento de mecanismos de transparência e de comunicação institucionais pode contribuir para o processo de formação desses sujeitos. Diante do Cálculo 1, os estudantes revelaram emoções, sentimentos. Diante da Derivada se mostraram incipientes, entretanto, revelaram marcas de experiências que se consolidam na construção desse conhecimento. Palavras-Chave: Experiência. Cálculo 1. Derivada. Relação Dialógica. Subjetividades.
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SONIA MARIA DA SILVA JUNQUEIRA
THE INTERDISCIPLINARY PRACTICE IN ACADEMIC MASTERS: IMPLICATIONS IN PERSONAL AND PROFESSIONAL DEVELOPMENT OF STUDENTS
ABSTRACT
Aiming to point the possibilities of students’ experiences in Calculus 1 classes, specifically regarding the derivative content, the theoretical choices were conducted around the dialogic relationship of Buber, the inter-human relationship, and also from the choices that lead the human life according Bauman e May and the dimension of the experience of Larrosa, the field of subjectivity in which the problematic Calculus 1 lies. A qualitative with quantitative data survey was delineated having interpretative and descriptive aspects through which a content analysis was planned Bardin and carried out with 186 students majoring engineering, mathematics, physics and chemistry enrolled in a Public Federal University. The data collection was done through three different approaches, the first and the second revealed subjective hypothesis identified from the investigated subjects’ talk, and the third, conducted by representations shown in Initial Concept Maps. It was concluded that the experience in Calculus 1 classes has been of reciprocity, in a two-way action that includes contents and subjects of the experience; of singleness, by the subjectivity and identity of each subject; of unpredictability, by the uncertainties, dangers and possibilities of the experience; of temporality, because it dispenses the recognition of distinct time and space to the subjects of the experience. The investigated subjects showed aspects apparently contradictory that however, denoted complementarities. They showed that students who had a “weaker base” in mathematics reached as many positive results as the negative ones, and that personal goals contributed to the adaptation and development in the school subject, showing aspects of co-responsibilities although they were not the same among the subjects, revealing marks of a process particular in choices as well. Yet, it was highlighted that the strengthening of the transparency mechanism and institutional communication could contribute to the process of development of those subjects. Facing Calculus 1, the students showed emotions, feelings. Facing the derivative they were incipient. However, they revealed marks of experiences that consolidate themselves in the construction of knowledge.
Key-words: Experience. Calculus 1. Derivative. Dialogic Relationship. Subjectivities.
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SUMÁRIO
1 A PROBLEMÁTICA DO CÁLCULO 1 ..................................................................... 13
1.1 Por que Cálculo 1? Por que Derivada? ............................................................ 13
1.2 A questão e o objetivo da pesquisa ................................................................. 21
1.3 Revisão de Literatura ....................................................................................... 23
1.3.1 A pesquisa de Rezende ............................................................................. 25
1.3.2 A pesquisa de Traldi .................................................................................. 28
1.3.3 A pesquisa de Dall’Anese .......................................................................... 31
1.3.4 A pesquisa de Vieira .................................................................................. 33
1.4 O Dimensionamento da pesquisa .................................................................... 37
2 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS .............................................................................. 40
2.1 A Relação dialógica ......................................................................................... 40
2.1.1 A relação dialógica de Buber ..................................................................... 41
2.1.2 Liberdade, escolhas e a relação “alguém com os outros” .......................... 46
2.1.3 As presenças “Eu-Tu”, “Eu-Isso” e “Alguém-Outros” ................................. 51
2.2 O sujeito e a experiência de si – o Eu .............................................................. 57
2.2.1. Ver a si próprio.......................................................................................... 60
2.2.2 Procedimentos discursivos ........................................................................ 61
2.2.3 Ver além das evidências ............................................................................ 63
2.3 “A experiência é isso que me passa” ............................................................... 65
2.3.1 A experiência e as aulas de Cálculo 1 ....................................................... 69
3 ORIENTAÇÕES METODOLÓGICAS ..................................................................... 73
3.1 A Análise de Conteúdo e as fases da análise .................................................. 74
3.1.1 Aproximação do objeto de pesquisa .......................................................... 76
3.1.2 Os sujeitos e a Instituição em pesquisa ..................................................... 78
3.1.3 O instrumento de coleta de dados ............................................................. 82
3.2 Mapas Conceituais e Mapas Conceituais Iniciais ............................................ 84
4 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE E APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS ...... 91
4.1 Aspectos teóricos na condução das unidades de análise ................................ 91
4.2 Unidades de análise textuais ........................................................................... 94
4.2.1 Unidade 1: O estudante e a sua formação básica ..................................... 95
4.2.1.1 Considerações sobre a unidade 1 .......................................................... 96
10
4.2.2 Unidade 2: O estudante e o professor de Cálculo 1 ................................ 107
4.2.2.1 Considerações sobre a unidade 2 ........................................................ 108
4.2.3 Unidade 3: O estudante e a Instituição ....................................................... 116
4.2.3.1 Considerações sobre a unidade 3 ........................................................ 117
4.2.4 Unidade 4: O estudante e o Cálculo 1 ..................................................... 126
4.2.4.1 Considerações sobre a unidade 4 ........................................................ 127
5 MAPAS CONCEITUAIS E OS SUJEITOS DA EXPERIÊNCIA ............................ 136
5.1 Sobre Mapas Conceituais e Mapas Conceituais Iniciais ............................ 137
5.2 MCIs e o enfoque Regras de Derivação ........................................................ 143
5.2.1 A análise para Regras de Derivação ....................................................... 146
5.3 MCIs e o enfoque Conceito da Derivada ....................................................... 160
5.3.1 A análise para Conceito de Derivada....................................................... 165
5.4 MCIs e o enfoque Aplicação da Derivada ...................................................... 174
5.4.1 A análise para Aplicação de Derivada ..................................................... 178
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 189
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 202
APÊNDICE 1 – Instrumento de Coleta de Dados .................................................... 206
ANEXO I – Parecer Comitê de Ética ....................................................................... 210
ANEXO II - Termo de Consentimento Livre Esclarecido ......................................... 212
ANEXO III - Declaração de Consentimento............................................................. 213
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Relação Dialógica .................................................................................... 52
Figura 2 – Relação Dialógica em Aulas de Cálculo 1 ................................................ 54
Figura 3 – Interação em Processo de Ensino e Aprendizagem de Cálculo 1 ............ 56
Figura 4 – O lugar da experiência em aulas de Cálculo 1 ......................................... 71
Figura 5 – Proposições com diferentes níveis de clareza semântica ........................ 86
Figura 6 – Três estruturas típicas de MCs: (a) radial, (b) linear e (c) rede ................ 88
Figura 7 – Exemplos de proposições com diferentes níveis de clareza semântica
quanto ao termo de ligação no contexto da Derivada. ............................................ 139
Figura 8 – Exemplo de OM...................................................................................... 140
Figura 9 – Exemplo de NM ...................................................................................... 140
Figura 10 – (EP005/MCI)......................................................................................... 148
Figura 11 – (EC013/MCI) ........................................................................................ 149
Figura 12 – (LM013/MCI) ........................................................................................ 152
Figura 13 – (EP030/MCI)......................................................................................... 155
Figura 14 – (LM002/MCI) ........................................................................................ 159
Figura 15 – Taxa de variação instantânea .............................................................. 163
Figura 16 – (EA001/MCI)......................................................................................... 167
Figura 17 – (EA009/MCI)......................................................................................... 169
Figura 18 – (LM012/MCI) ........................................................................................ 171
Figura 19 – (LM034/MCI) ........................................................................................ 172
Figura 20 – (LF005/MCI) ......................................................................................... 179
Figura 21 – (EQ045/MCI) ........................................................................................ 181
Figura 22 – (EP004/MCI)......................................................................................... 183
Figura 23 – (ER007/MCI) ........................................................................................ 184
Figura 24 – (EQ041/MCI) ........................................................................................ 186
12
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Número de sujeitos investigados por curso ............................................. 79
Quadro 2 – Resultados finais de acordo com o percentual de sujeitos e o número de
vezes que cursaram a disciplina de Cálculo 1........................................................... 79
Quadro 3 – Resultados gerais em aprovação e reprovação em Cálculo 1, dos cursos
investigados, no período de 2009/Sem.1 a 2012/Sem.1 ........................................... 80
Quadro 4 – Distribuição do número de alunos por curso e contribuição da formação
básica para a disciplina de Cálculo 1 por abordagem ............................................... 97
Quadro 5 – Distribuição do número de alunos por curso e contribuição do professor
de Cálculo 1 para a disciplina de Cálculo 1 por abordagem ................................... 109
Quadro 6 - Distribuição do número de alunos por curso e contribuição da Instituição
para a disciplina de Cálculo 1 por abordagem ........................................................ 119
Quadro 7 – Descrição dos Conteúdos Programáticos para a disciplina de Cálculo 1,
comum a todos os cursos pesquisados. ................................................................. 122
Quadro 8 – Distribuição do número de alunos por curso e contribuição do conteúdo
na disciplina de Cálculo 1 por abordagem .............................................................. 129
Quadro 9 – Organização de acordo com o número de elaborações de Mapas
Conceituais Iniciais (MCIs), Outros Mapas (OM), Não Mapas (NM) e Mapas em
Branco (MB). ........................................................................................................... 142
Quadro 10 – Resultados a partir dos MCIs considerados conforme os agrupamentos
para Regras de Derivação....................................................................................... 145
Quadro 11 – Resultados a partir dos MCIs considerados conforme os agrupamentos
para Conceito da Derivada ...................................................................................... 164
Quadro 12 – Resultados a partir dos MCIs considerados conforme os agrupamentos
para Aplicação da Derivada .................................................................................... 177
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1 A PROBLEMÁTICA DO CÁLCULO 1
A problemática do Cálculo 1 intitula o primeiro Capítulo deste trabalho e abre
o caminho para uma apresentação não convencional para a Educação Matemática,
por meio da qual se pretende conduzir o leitor a uma experiência única, submergida
por escolhas, ressignificações, descobertas e possibilidades em um constante
movimento dialógico. Para tanto, sabe-se, inconcluso ao longo de toda essa
construção.
1.1 Por que Cálculo 1? Por que Derivada?
O Cálculo 1, que representa um curso inicial de Cálculo Diferencial e Integral,
foi escolhido como pano de fundo para esta investigação1; tal escolha se deve em
parte, pela constatação de que, em um grande número de cursos em que essa
disciplina é ministrada ocorre certa recorrência estrutural, seja na forma como é
ministrada, na abrangência dos objetivos geral e específicos e do ponto de vista da
linearidade dos conteúdos. Aspectos confirmados em levantamento inicial2 realizado
a partir da análise de Planos de Ensino de Cálculo 1 de diferentes Universidades
públicas e privadas brasileiras.
Ao longo dessa etapa inicial de investigação, que se pode nomear de pré-
análise, elegeram-se oito Planos de Ensino elaborados para a disciplina de Cálculo
Diferencial e Integral 1, objetos esses, acessados por meio da rede mundial de
computadores e que foram disponibilizados por diferentes instituições públicas e
particulares brasileiras, ou por professores da disciplina Cálculo Diferencial e Integral
1 Projeto de pesquisa aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa PUC/SP, Parecer nº 265654 em data: 10/12/2012 (Anexo I) 2 Realizado com resultados publicados no 3º Sipemat, encontrados em Junqueira e Manrique (2012).
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1. A referência a essa pré-análise corrobora a justificativa na escolha pelo tema de
investigação. Optou-se, então, por apresentar algumas considerações a respeito.
Nesse estudo preliminar foram encontrados aspectos que demonstraram que
disciplinas de Cálculo 1, em geral, são ministradas atendendo a um número variado
de cursos, tais como, as Licenciaturas em Matemática, Física e Química e as
Engenharias da Computação, Produção, Elétrica, entre outros cursos correlatos.
Uma especial atenção foi dada ao fato de um dos Planos de Ensino destinar-se a 25
cursos diferentes, entre eles, Ciências da Computação, Ciências Autuárias, as
Engenharias Ambiental, Civil, Cartográfica, de Controle e Automação, de Produção,
aos Bacharelados em Química, Física, Estatística, Matemática e as Licenciaturas em
Química, Física, Matemática, destacando que, em algumas modalidades, as turmas
se apresentavam em diurnas ou noturnas. Essa pré-análise revelou também uma
aproximação na comparação realizada sobre os conteúdos programáticos, as
formas de abordagem e os métodos de avaliação, atribuindo certa uniformidade à
disciplina de Cálculo 1.
Encontrou-se na estrutura desses planos a recorrência de uma etapa inicial
de estudo e aprofundamento sobre os vários tipos de Funções Reais, anteriormente
estudadas com maior ênfase no Ensino Médio, para em seguida, uma abordagem
dos estudos introdutórios de Limites, seguido de Derivada e, em alguns casos,
chegando a uma introdução às Integrais.
Desse modo, ao fazer-se a escolha pela disciplina de Cálculo 1, como pano
de fundo da investigação, considerou-se uma estrutura que apresenta certa
uniformidade pedagógica e curricular; e portanto, algum aspecto encontrado na
investigação que se pretende realizar poderia contribuir para a pesquisa na área da
Educação Matemática, no âmbito da investigação dos processos de ensino de
Cálculo Diferencial e Integral 1 e da formação de professores que ministram aulas
dessa disciplina, embora se reconheça que a presente investigação ocorra em um
campo pontual3 de pesquisa.
3 A coleta de dados para esta investigação se deu em uma Universidade Pública brasileira, que será devidamente caracterizada no Capítulo II.
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Outro importante aspecto que favoreceu a opção pelo Cálculo 1 foi motivado
pela pesquisa de mestrado realizada por Junqueira (2010). Na ocasião, entendeu-se
que a disciplina de Cálculo Diferencial e Integral, em sua constituição histórica,
mantinha uma estrutura “solidificada” com uma abordagem bastante favorecida por
elementos da racionalidade técnica, sob a qual se verificou uma espessa massa de
alunos reprovados. Procurou-se, nessa perspectiva, mostrar que o trabalho com o
Cálculo 1 tem seguido uma estrutura sólida no sentido dado por Bauman, que insiste
em manter a forma original, mesmo diante dos desafios e dilemas a superar no
decorrer dos cursos de Cálculo 1. Assim, a disciplina de Cálculo 1 pareceu inserida
em um contexto pedagógico e institucional que pouco se modificou ao longo de
décadas, mantendo sua forma inalterada (JUNQUEIRA, 2010) e que, embora revele
explicitamente em seus próprios resultados, corroborados por pesquisas (BARUFI,
1999; REZENDE, 2003; DALL’ANESE, 2006; VIEIRA, 2013), a necessidade de
alguma ação transformadora parece obstinada em permanecer com a mesma
composição inicial.
Não se pretende, com o presente estudo, discutir se a mudança de “forma”
dos cursos de Cálculo Diferencial e Integral é necessária ou não, assim como, se
trará benefícios, ou não, aos processos de ensino e/ou aprendizagem de Cálculo 1.
No entanto, a solidificação no sentido de (BAUMAN, 2001) entendida como uma
abordagem bastante favorecida por elementos da racionalidade técnica4, destaca-se
como cenário provável do ensino e aprendizagem do Cálculo 1 que, abordagem
essa nem sempre assumida por professores e estudantes dessa disciplina; além de
constituir-se, ao longo de décadas, como objeto de interesse e investigação para
pesquisadores da área da Educação Matemática.
Embora se perceba grande desenvolvimento de pesquisas nesse campo de
investigação, intenções parecem convergir pouco para uma efetiva inovação na
forma como são conduzidas as aulas de Cálculo 1. Em geral, destacam-se os
estudos que sugerem como inovação a implantação ou aplicação de alguma
Tecnologia de Informação e Comunicação, como softwares matemáticos, ambientes
4 A racionalidade técnica, conforme Ramalho, Nuñes e Gauthier (2004) está vinculada as relações de poder, interesses e hábitos específicos, e atinge, em diferentes proporções, tanto os professores formadores/formados quanto o próprio processo formativo. Baseia-se no “treinamento das habilidades”, na qual o professor é um executor/reprodutor (“técnico”) de saberes produzidos por especialistas na condução do processo de ensino e/ou aprendizagem.
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virtuais de aprendizagens, entre outros, com algum fim didático e/ou epistemológico.
Pesquisas na área contribuem para a transformação da estrutura pedagógica e/ou
curricular da disciplina de Cálculo 1, ou seja, sinalizam para possibilidades de
avanço, testam resultados e sugerem formas de trabalho com vistas à inovação. Há
indícios de que se está avançando, porém, lentamente.
Nesse contexto, buscou-se com o intuito de definir o problema de pesquisa
por estudos exploratórios sobre os processos que envolvem a disciplina de Cálculo
1, especialmente, pelos dos altos índices de reprovação, de evasão e de queixas
dos estudantes em relação às dificuldades encontradas ao cursarem essa disciplina.
Reconhece-se que o caráter multifacetado da disciplina de Cálculo 1 deva
afetar não apenas a vida acadêmica dos estudantes, mas também as expectativas
destes e de seus professores, de forma nem sempre positiva. Acredita-se que em
algum momento, os sujeitos, que passaram por essa disciplina, possam dar pistas
de como aconteceu essa passagem e das implicações nos processos de sua
formação. Contudo, na presente pesquisa, opta-se por focar os sujeitos em
formação, assim, não se pretende analisar os sujeitos formadores. E para dar uma
maior sustentação a essa escolha, recorreu-se a um estudo exploratório inicial.
O estudo exploratório apontou Silva (2011) que destaca a Comissão
Internacional de Instrução Matemática (ICMI) que em 1997 decidiu organizar um
estudo sobre o ensino e aprendizagem da Matemática no nível universitário. Esse
autor aponta que em 2001, Derek Holton publicou o trabalho “The Teaching and
Learning of mathematics at University Level”, em que apresenta reflexões pessoais a
partir de tal estudo. Um dos pontos ressaltados por Holton (2001 apud SILVA, 2011),
refere-se aos esforços para se ensinar Matemática e manifesta a intenção de
enfatizar a importância tanto da palavra ‘ensinar’ quanto da palavra ‘Matemática’.
Nessa perspectiva, ensinar significa uma troca que se baseia na tomada de
consciência dos conhecimentos e necessidades dos estudantes, o que possibilita o
estabelecimento de algum diálogo5. Em relação ao processo de ensino, o professor
identifica este processo e tenta aplicar teorias de aprendizagens atualizadas. Quanto
à Matemática, julga que devem ser feitas tentativas a fim de encorajar os alunos
5 A relação dialógica estará presente na fundamentação teórica.
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para que descubram resultados por eles próprios, permitindo que percebam que
essa ciência é mais do que um conjunto de habilidades/algoritmos cuja reprodução é
tradicionalmente solicitada nas avaliações.
Para Silva (2011), a comunidade científica está atenta às questões que
envolvem o processo de ensino e aprendizagem da Matemática e, em particular, do
Cálculo no nível universitário e ressalta que este processo se compõe de diversas
dimensões como: as dificuldades inerentes aos próprios conceitos da Matemática,
as expectativas dos atores envolvidos no processo (aluno ingressante na
universidade, professor do ensino superior, professor da educação básica), dentre
outras.
Em continuidade, na dimensão da afetividade6, em tese realizada com
ingressantes no ensino superior e estudantes na disciplina de Cálculo 1, Garzella
(2013) fala acerca dos impactos negativos ocasionados pelas práticas pedagógicas
adotadas por docentes da disciplina de Cálculo 1 e da notória taxa de reprovação no
processo de ensino e/ou aprendizagem e na vida acadêmica e pessoal dos
estudantes, sujeitos de investigação em seu estudo. Segundo essa pesquisadora,
tais impactos negativos ocorrem de maneira indiscriminada nas instituições e
responde pela oferta de um número crescente de turmas por semestre, na tentativa
de atender aos reprovados, por atrasos na conclusão dos cursos e ainda por
elevado número de evasões da disciplina e, consequentemente, da universidade.
Embora reconheça também o perfil multifacetado do problema, os resultados dessa
pesquisa apontam para as formas de organização da disciplina e a qualidade da
mediação desenvolvida pelo professor em sala de aula como fortes determinantes
do aproveitamento insatisfatório de parcela significativa de alunos, além dos
impactos afetivos dessa experiência, marcadamente negativos em suas vidas
acadêmicas.
Sob outra perspectiva, mas de igual importância, Reis (2001) em sua tese
doutoral, analisa entrevistas semiestruturadas realizadas junto a autores de livros de
Cálculo e de Análise. Por meio de seu trabalho revela a tensão que se estrutura
entre o que se poderia chamar de extremos do ensino dessas disciplinas – o rigor e
6 WALLON (1971); MAHONEY; ALMEIDA (2004); LEITE (2006) compõem o referencial teórico acerca da afetividade na pesquisa realizada por GARZELLA (2013).
18
a intuição. O autor levanta aspectos que revelam como o ensino de Cálculo está
organizado, e destaca duas vertentes de caracterização do pensamento diferencial
que dialogam com os seus objetivos: o pensamento intuitivo, presente na busca pela
produção de significados, e o pensamento rigoroso, presente na busca por
justificações e afirmações. Considera, ainda, que encontrou maior interlocução na
constatação de que a transição do pensamento matemático elementar para o
avançado7 não deve vir necessariamente acompanhada de uma transição do
pensamento intuitivo para o rigoroso. Afirma ainda, que pesquisadores 8defendem
que atividades intuitivas devem preceder atividades que contenham definições e
provas formais. Os impactos na formação e a estrutura rígida da disciplina de
Cálculo 1 são notadas por Reis (2001), para o qual, os professores universitários
reproduzem em suas aulas a sua formação técnico-formal, que também será
reproduzida pelos alunos, futuros professores quando formados. Nesse caso, a
relação dialógica pode ser identificada também na subjetividade construída pela
ação pedagógica: “façam como eu faço” ou “eu faço como meu professor”.
Acredita-se que as argumentações e inquietações de Reis (2001), Silva
(2011) e Garzella (2013) abonem a decisão e escolha pela disciplina de Cálculo 1
como cenário da presente pesquisa, pois nelas se reconhece as próprias
inquietações diante das problemáticas que se colocam.
Tais posicionamentos dão indícios de uma relação dialógica constituída por
contra sensos em aulas de Cálculo 1. Assim, pode-se admitir que se há esse
conflito, então, estão em jogo identidades que devam ser respeitadas. Alcançar o
conhecimento de um objeto matemático requer o diálogo entre essas identidades,
diálogo esse, que permite a experiência entre os vários sujeitos da experiência e os
saberes em jogo.
7 Tall (1995) expressa que o pensamento matemático avançado, faz uso de estruturas cognitivas produzidas a partir de um grande número de atividades matemáticas, buscando um sistema sempre crescente de teoremas demonstrados. Como hipótese, se aceita que, no indivíduo, o crescimento cognitivo do pensamento matemático elementar para o pensamento matemático avançado ocorra a partir da “percepção de” objetos do mundo exterior e da “ação sobre” esses mesmos objetos, construindo estruturas de conhecimento segundo dois desenvolvimentos paralelos, do visual-espacial para o verbal-dedutivo; o outro é constituído por encapsulações sucessivas de processo-para-conceito, acompanhadas do uso de símbolos manipuláveis. 8 Pesquisadores dos grupos do aporte teórico do Modelo dos Campos Semânticos; os do Professor
Roberto Baldino; os apresentados no 8º. International Congress on Mathematical Education; e os realizados dentro da linha do Advanced Mathematical Thinking.
19
Diante desse processo de experiência, discutido em (LARROSA, 2002, 2011),
busca-se a descrição do diálogo que permeia a construção do objeto matemático em
aulas de Cálculo 1.
É dessa forma que se faz necessária a definição de ao menos um conteúdo a
ser explorado nesse contexto, pois a abrangência do Cálculo 1 tornaria o trabalho
exaustivo. Optou-se, então, pela Derivada. No entanto, por que Derivada?
Optar por Derivada se deve também ao fato de tal conteúdo constar em
cursos iniciais de Cálculo Diferencial e Integral. O estudante de Cálculo 1, em geral,
tem contato com a Derivada depois de certo período de aulas da disciplina. Na
maioria das vezes a Derivada é apresentada após a discussão de Limite. Assim, ao
optar por Derivada, tem-se a possibilidade de contar na investigação com um sujeito
capaz de trazer elementos de um período maior de contato com essa disciplina, pois
interessa também, o percurso desse estudante em aulas de Cálculo 1.
Da mesma forma, a Derivada contribui pelo elemento sintetizador que esse
conteúdo assume, verificado também nos Planos de Ensino da disciplina de Cálculo
1 da Instituição lócus desta investigação. Em geral, em um curso inicial de Cálculo
1, a partir do estudo da Derivada é que os alunos são levados às resoluções de
problemas e às aplicações do conhecimento que deveria ser construído ao longo da
disciplina, e talvez até à consciência do motivo de ter que estudar Cálculo 1.
Não é uma regra, mas em geral, antes da abordagem da Derivada, o curso é
essencialmente teórico, e embora se explore o caráter intuitivo para a compreensão
de conceitos, admitem-se também recorrentes definições e demonstrações de
teoremas, ficando as aplicações para a etapa final da disciplina, concomitante com o
estudo da Derivada. No entanto, não se pretende defender aqui que a ênfase nos
processos de aplicação de conceitos signifique uma maior compreensão do objeto
matemático em estudo. Concorda-se que os aspectos que remetem à construção de
cada etapa do aprendizado em Matemática, inclusive as que envolvem a aplicação,
mas também o rigor matemático, precisam ser presentes em aulas de Cálculo 1.
Concorda-se também que, conforme sugere Niss (2003) é nessa interação, entre os
vários domínios dos sujeitos acerca da Matemática e suas diferentes possibilidades,
que a competência matemática poderá ser constituída.
20
Segundo a pesquisa realizada por Ramos (2009) junto a estudantes de um
curso de Licenciatura em Matemática, os que passaram por um curso de Cálculo e
que estudaram aplicações da Derivada, em sua maioria, sabem calcular Derivadas
por meio de regras, mas não conseguem estabelecer as relações entre a função f e
a função Derivada de f. Segundo esse autor, esses estudantes apresentam
dificuldade tanto na manipulação dos resultados obtidos, como no âmbito conceitual
sobre as relações existentes entre uma função e sua Derivada; assim como no
entendimento do conceito de Derivada para efetuar o tratamento de questões
propostas.
Nessa direção, de acordo com Costa e Alvarenga (2010), em relação ao
conceito de Derivada, os estudantes apresentam dificuldades na definição e não
fazem associações em relação às propriedades da Derivada. Os estudos desses
autores foram aplicados a estudantes dos cursos de Ciências Exatas da
Universidade Federal do Sergipe com o objetivo de identificar os erros cometidos e
as dificuldades desses sujeitos na disciplina de Cálculo Diferencial e Integral 1, nos
cursos em que essa disciplina é ministrada.
Nos apontamentos de Pereira Filho, Kaiber e Lélis (2012), realizados com
estudantes de Cálculo Diferencial e Integral 1, do primeiro ano de um curso de
Engenharia Civil no Tocantins, foram relatados que os estudantes pesquisados não
dominam as habilidades esperadas para o trabalho com essa disciplina,
principalmente no que diz respeito a desenvolver atividades algébricas baseadas em
regras. Esses autores acreditam que seja possível engajar os estudantes nos
procedimentos algébricos para que cresça a compreensão dos conceitos, e
ressaltam que mais importante que detectar e apontar os estudos feitos sobre
análise de erros em Matemática é, apossar-se das contribuições dos mesmos
estudos, para indicativos de outros estudos que possam traduzir a realidade e
caminhos que contribuam na construção do conhecimento.
Dessa forma, com base nesses estudos, são observados acerca da Derivada,
que, além dos erros relacionados à manipulação e ao domínio algébricos, e de
aplicação de regras e fórmulas, os sujeitos não estabelecem as relações existentes
entre uma função e a sua Derivada, apresentam dificuldades na compreensão do
21
conceito de Derivada para efetuar o tratamento de uma questão e têm dificuldades
na associação de algumas das propriedades da Derivada de uma função.
Segundo Rezende (2003), para muitos estudantes a definição formal de
Derivada não terá sentido se não for consubstanciada com redes de significações
deste conceito; não apenas, como por exemplo, na relação física (velocidade) e
Derivada (taxa de variação), mas, a partir das ideias geradoras e construtoras do
campo semântico da noção de Derivada. Nesse sentido, esse pesquisador
argumenta que não é meramente assistindo a uma demonstração de um
teorema/proposição que o estudante construirá sua rede de significações. Para
muitos, o sentido pode estar até na simples interpretação do resultado da
demonstração.
Se tais dificuldades são apontadas nos estudos apresentados há que se
considerar que a experiência que fazem estudantes ao passar pela disciplina de
Cálculo 1, e ao depararem-se com um conteúdo novo, no caso a Derivada, possa
talvez levá-los a atingir outras significações nessa passagem, e que não unicamente
a construção do conhecimento do novo. Nesse sentido, aponta-se que há frequentes
conflitos.
1.2 A questão e o objetivo da pesquisa
De fato, é possível que estudantes, mesmo depois de concluída a disciplina
de Cálculo 1, não consigam uma associação entre o conceito de Derivada e o
tratamento de um problema, ou apresentem dificuldades em associar as
propriedades da Derivada de uma função à função que foi diferenciada, entre tantas
outras formas que possam apresentar-se como frequentes dificuldades na relação
entre esses sujeitos e tal objeto.
Nesse aspecto, interessa que o processo de ressignificação do conceito de
Derivada é subjetivo, único e pessoal, ou seja, cada sujeito faz sua leitura e
interiorização possíveis nesse processo que é genuinamente transformador. Cada
22
sujeito da experiência tem à disposição, os meios para atingir essa ressignificação;
contudo, esses meios não são os mesmos e nem prescindíveis da mesma
magnitude para que cada um deles atinja a compreensão esperada do conceito de
Derivada. Assim, tem-se como objetivo de pesquisa, apontar possibilidades da
experiência nos processos de construção do conhecimento em aulas de Cálculo 1,
especificamente neste estudo, para o conteúdo Derivada.
Nessa acepção, inquieta-se em alguns questionamentos: Que experiência
ocorre na passagem dos estudantes pela disciplina de Cálculo 1? Que
transformações decorrem dessa experiência e o que essa produz na forma como
encaram a Matemática a partir de então? O que se modifica no estudante de Cálculo
1 após a conclusão dessa disciplina? Algo acontece? Nada acontece?
Assim, ao tentar constituir a questão de pesquisa, percorre-se um longo
caminho. Entende-se que o sujeito da experiência (LARROSA, 2011) se transforma
ao ser atravessado por um “algo novo”, que pode ser um conhecimento novo; e
nesse processo de ressignificação o sujeito modifica sua forma anterior, é
transformado, e leva em si uma marca dessa passagem. Não obstante, nem sempre
a marca que acompanha esse sujeito da experiência é a marca que se espera que
seja deixada, por exemplo, pelas aulas de Cálculo 1, e nesse aspecto, esse é um
campo de incertezas e perigo.
Segundo Larrosa (1994), uma determinada experiência de si é o que visa
todo processo de formação dos sujeitos, ou seja, de formação da identidade desse
sujeito; por esse lado, o que se espera de um “sujeito formado” é que tenha
determinados comportamentos a partir de uma determinada relação consigo mesmo.
Parte do comportamento esperado, no caso do Cálculo 1, pode incluir que o
sujeito tenha domínio do conceito de Derivada, assim como, que ele seja capaz de
fazer uso de regras de derivação, de relações entre a função e sua Derivada, de
aplicações e de formas de tratar questionamentos relacionados à compreensão
desse conceito.
Nessa direção, define-se a seguinte questão de pesquisa:
23
“O que estudantes revelam sobre o estudo do conteúdo Derivada na
disciplina de Cálculo 1 e sobre suas experiências nesta disciplina?”
Os sujeitos deixam transparecer elementos ligados às regras, à definição ou
às aplicações da Derivada, ou, nada deixam transparecer, nesse contexto. Contudo,
também deixam transparecer elementos que apresentam indícios de uma complexa
relação com a disciplina de Cálculo 1.
É desejável, por meio desta investigação, contribuir para a área de pesquisa
que se insere a partir do campo da Educação Matemática, quer seja nos processos
de formação de professores, bem como, na estrutura curricular, como forma de
fortalecer mecanismos que tornem o ensino de Cálculo 1 um processo menos
conturbado que o estado atual encontrado na problemática em que se coloca essa
disciplina.
Desse modo, é relevante suspeitar que os sujeitos da experiência, em aulas
Cálculo 1, possam ser transformados, seja na sua compreensão de um novo objeto
de conhecimento, como exemplo, a Derivada, ou em relação a outros aspectos
dialógicos e subjetivos que permeiam essa experiência específica. E nesse terreno
conflitante, pode constituir-se a contribuição almejada.
1.3 Revisão de Literatura
Na presente etapa deste trabalho, apresenta-se a Revisão de literatura
realizada, como meio de estruturar e de demonstrar uma intenção de contribuição
acadêmica em torno do Cálculo 1, especificamente do estudo da Derivada, tendo em
vista a experiência que os estudantes vivem na passagem por essa disciplina.
Entende-se que uma visão abrangente de pesquisas e contribuições
anteriores seja prioritariamente necessária para bem conduzir essa investigação e
possa preparar para desenvolvimento de estudos posteriores, além de comprovar a
relevância acadêmica do presente trabalho, pois se abrem caminhos por um cenário
já plenamente constituído.
24
Nessa intenção, recorreu-se a uma busca seletiva por trabalhos que
indicassem familiaridade com o tema mencionado; ou seja, que tivessem relação
com a investigação de compreensões sobre o Cálculo Diferencial e Integral e, de
modo mais específico, à Derivada.
Foram encontradas e selecionadas algumas publicações na temática do
ensino e/ou aprendizagem de Cálculo Diferencial e Integral, que apresentam certa
ênfase na importância da compreensão dos conceitos e na valorização de
aplicações desses conceitos, assim como, a sugestão para buscar o
enfraquecimento das abordagens que desenvolvam habilidades manipulativas e
algorítmicas. Além de estudos relativos aos conceitos fundamentais e clássicos do
Cálculo, em alguns trabalhos se verificam a predominância do uso de recursos
tecnológicos, como uso de tecnologias informáticas. Embora não se tenha intenção
nessa direção de pesquisa, os contextos em que tais trabalhos foram desenvolvidos
em muito contribuem para a pesquisa que se pretende realizar.
Assim, para a presente revisão se elegeram quatro pesquisas nacionais
devido à familiaridade de contextos e possibilidades de comparações dentre essas
produções, as quais levam em conta o ensino de Cálculo Diferencial e Integral e
esta investigação. Entende-se que, do ponto de vista do conteúdo programático, o
curso inicial de Cálculo embora semelhante, dentro ou fora do Brasil, se depara com
fatores que interferem na aprendizagem dos conteúdos abordados em aulas dessa
disciplina, e que são estruturalmente distintos nos contextos nacional e internacional;
tais como: a formação básica dos estudantes; a infraestrutura física e humana das
universidades; os projetos pedagógicos dos cursos de graduação e a formação dos
professores desses cursos.
Nesse sentido, pela aproximação e familiaridade com a temática do Cálculo
Diferencial e Integral e objetivo da presente pesquisa, que considera o processo de
experiência (LARROSA, 2002, 2011) dos estudantes em aulas de Cálculo 1 a partir
da descrição do diálogo que permeia a construção do objeto matemático em aulas
de Cálculo 1, especificamente, a Derivada; foram selecionados os estudos de
Rezende (2003), Traldi (2006), Dall’Anese (2006) e Vieira (2013). Nesse processo
de revisão se destacam, de cada uma das pesquisas mencionadas, os pontos
considerados de maior interesse, quer pela correlação com o objetivo de
25
investigação, ou pelas evidências decorrentes dos contextos em que se
desenvolvem.
1.3.1 A pesquisa de Rezende
Segundo Rezende (2003) muitas pesquisas apontam que um dos grandes
desafios no ensino superior de Matemática ainda é o “fracasso” no ensino de
Cálculo; o que, segundo esse autor, é devido às dificuldades de natureza
epistemológica desse ensino. Nesse sentido, esses aspectos não se restringem à
ordem cultural, econômica ou social brasileira, pois são também vivenciados em
países desenvolvidos.
A pesquisa de Rezende foi elaborada a partir do entrelaçamento dos fatos
históricos e pedagógicos, por meio de um mapeamento das dificuldades de
aprendizagem de natureza epistemológica do ensino de Cálculo, tendo como pano
de fundo as dualidades essenciais e os mapas históricos conceituais do Cálculo.
Assim, apresentou cinco macro-espaços de dificuldades de aprendizagem de
natureza epistemológica do ensino de Cálculo, identificados pelas cinco dualidades
fundamentais do Cálculo e do seu ensino: discreto/contínuo;
variabilidade/permanência; finito/infinito; local/global; sistematização/construção.
Em vista do interesse de pesquisa, apresenta-se uma síntese dos macro-
espaços de dualidades apontados por esse autor; pois em cada uma dessas
dimensões foram evidenciados elementos que possam estar relacionados com a
perspectiva de análise pretendida nesse estudo, que também parece colocar-se em
dualidades.
Quanto ao macro-espaço da dualidade discreto/contínuo, Rezende aponta
que há uma total ignorância caracterizada pelo hiato entre os campos da aritmética e
da geometria no ensino básico de Matemática e pelo círculo vicioso presente na
significação de número real realizada pelos alunos; admitindo que o domínio
numérico da quase totalidade dos alunos se restrinja aos números racionais, pois
não sabem responder o que um número real e porque, conforme Caraça (1989,
26
apud REZENDE, 2003), não conhecem o conceito de continuidade de seu processo
de construção.
No que tange à dualidade variabilidade/permanência, no âmbito do ensino
superior de matemática, há predominância da abordagem estática sobre a
abordagem dinâmica das ideias básicas do Cálculo. No conceito de Derivada, por
exemplo, prevalecem os seus aspectos formal (como sua definição em termos de
limite) e geométrico (como o coeficiente angular da reta tangente) sobre a sua
interpretação em termos de taxa de variação instantânea. Nesse sentido, interpretar
o conceito de Derivada unicamente como “coeficiente angular da reta tangente”
significa ignorar o problema histórico essencial da “medida” instantânea da
variabilidade de uma grandeza, ocorrendo o mesmo com a noção de função. No
estudo das funções reais a variável “x” é assumida tacitamente como a “variável
independente universal”. A ideia de função é estabelecida não no contexto da
“variabilidade”; mas em termos de uma correspondência estática entre os valores
das variáveis “x” e “y”. O gráfico da função é, em geral, “plotado” através de uma
tabela em que valores “notáveis” atribuíveis e a curvatura das curvas, que compõem
o gráfico da função, são geralmente induzidos pelo professor que tenta convencer o
aluno, pelo acréscimo de mais pontos, ou mesmo através de um sofisticado
programa computacional, que a única possibilidade é a dele - professor. Nessa
direção, são estudadas as propriedades algébricas do conceito construído. Estudam,
por exemplo, os zeros de uma função, mas não os seus pontos críticos. Dessa
forma, assegura que a razão principal para as dificuldades de aprendizagem na
resolução de problemas de taxas relacionadas e de otimização é, efetivamente, o
desvio epistemológico do conceito função dado na educação básica.
Quanto ao macro-espaço da dualidade finito/infinito, destaca que, apesar da
complexidade do conceito de infinito, é no mínimo curioso que estudantes não
tenham sequer consciência das dificuldades referentes à noção de infinito, mesmo
tendo já realizado um curso de Cálculo ou mesmo de Análise, levando esse
pesquisador a concluir que cursar ou não as referidas disciplinas, tal como se
encontram organizadas, não faz diferença para a instrução do aluno nesse assunto,
conforme evidências em Sierpinska (1987, apud REZENDE, 2003) e Rezende
(1994). Nesse sentido, os estudantes não reconhecem as situações de
27
indeterminação presentes em cada um dos limites e procuram traduzir e “resolver”
as indeterminações através de uma espécie de álgebra do infinito, por meio da qual
o infinito passa a se comportar como número. Não realizam suas interpretações e
tipificações no contexto da dualidade discreto/contínuo; não reconhecem, enfim, as
especificidades do infinito matemático contínuo. Ainda, a ideia de infinito não
participa e nem contribui de forma significativa na construção das redes de
significações estabelecidas num curso usual de Cálculo.
O macro-espaço local/global invadiu o campo matemático e estabeleceu
com este uma relação de simbiose que possibilitou o desenvolvimento de novas
interpretações e significações no campo da epistemologia. É um produto da
percepção humana do espaço, mas que não se esgota nela. No desenvolvimento
histórico da geometria, Petitot (1985, apud REZENDE, 2013) localizou a contribuição
essencial do Cálculo para o surgimento das primeiras relações solidárias entre o
local e o global. E, é a partir do conceito de função, introduzido no núcleo semântico
do Cálculo por Euler e Lagrange, que vai constituir, junto à noção de limite, a nova
estrutura do Cálculo, que começa a preocupar-se com as questões essenciais dessa
dualidade. De tais correlações inerentes à dualidade local/global se originam
algumas das maiores dificuldades de aprendizagem dos alunos de Cálculo. No
ensino de Matemática, em geral, a participação dessa dualidade é retardada ao
máximo. No entanto, ao ingressar no curso superior e fazer um curso inicial de
Cálculo, o estudante se depara com diversas situações do contexto dessa
dualidade, uma imersão que suscita nos alunos dificuldades de interpretação dos
conceitos e resultados “normalmente” apresentados em um curso de Cálculo.
Os conceitos do Cálculo são definidos, na sua maioria, localmente –
continuidade num ponto, diferenciabilidade num ponto etc.– e estendidos, em geral,
de forma “natural” para o seu estado global – a função é diferenciável se ela o for em
cada ponto do seu domínio; mas, por outro lado, muitos dos seus resultados são de
natureza global - “se f’ > 0 em um intervalo I, então f é crescente em I”. As
deformações vão desde aplicações ingênuas das regras de diferenciação em
cálculos de Derivadas em circunstancias não muito apropriadas até o uso de
interpretações equivocadas do Teorema Fundamental do Cálculo.
28
Quanto ao macro-espaço da dualidade sistematização/construção, esse par
constitui, via de regra, a realização didática do ensino de Cálculo. Em livros textos,
por exemplo, os conceitos são definidos formalmente e os resultados são
demonstrados passo a passo segundo um modelo axiomático que parte da definição
formal de limite e de alguns “postulados fundamentais”, oriundos da Álgebra
Moderna e da Análise Matemática. Nesse sentido, exercícios de cálculos e de
fixação são acrescentados ao final de cada tópico do conteúdo programático para
que o “treinamento” possa ser realizado. Nesta etapa, a influência das técnicas
algébricas é facilmente evidenciada: fatorar polinômios, por exemplo, torna-se
imprescindível para que se efetuem os cálculos de limites. A definição formal de
Derivada não terá sentido algum para o aluno, se não for consubstanciada com as
redes de significações deste conceito com a geometria e com a física. Contudo, para
uma inversão de tal polaridade é preciso trazer à tona a discussão fundamental
acerca da oposição entre o “conhecimento sistematizado” (o dos livros didáticos e
notas de aulas do professor) e o “conhecimento real” (o que traz consigo a sua
história e o seu campo de significações) do Cálculo.
Segundo Rezende para resolver o problema do ensino de Cálculo é preciso
fazer o conhecimento do Cálculo emergir de onde foi submetido pelos atuais ensinos
de Matemática.
1.3.2 A pesquisa de Traldi
A pesquisa de Traldi (2006) destaca que diferentes estudos discutem o
processo de ensino e aprendizagem de conceitos relacionados ao Cálculo
Diferencial e Integral (CDI), como Função, Limite, Números Reais, Continuidade,
Derivadas e Integrais, permitindo a possibilidade de diferentes propostas
fundamentadas nos processos cognitivos abordados por essas investigações.
O estudo realizado por esse autor objetivou a compreensão das
possibilidades de construir-se um grupo de trabalho colaborativo constituído por
professores que ministram a disciplina de CDI, buscando entender a explicitação do
conhecimento desse professor e o desenvolvimento profissional desse formador,
29
pela explicitação também das suas dúvidas, prática letiva e entendimento de
conceitos não discutidos ao longo de sua formação formal, processo que esse autor
sugere levar a uma reelaboração de suas concepções acerca do processo ensino-
aprendizagem.
Os resultados dessa pesquisa apontam para diferentes possibilidades de
transição do trabalho coletivo para o colaborativo, e entre elas, Traldi destaca: os
objetivos em comum, a troca de experiência necessária e de discussão de
conhecimentos didáticos específicos do CDI, a busca de apoio para enfrentar
mudanças curriculares, o clima de camaradagem e a busca de conhecimentos
específicos.
Traldi considera que a didática deve ajudar o professor a tomar decisões que
influenciarão a outros; decisões que devem, portanto, ser acertadas, sobretudo, na
forma como influencia na formação do aluno, com uma totalidade pessoal e social.
As decisões não podem ser atos impositivos, mas partidos de reflexões sobre o processo ensino-aprendizagem, não presos de forma categórica a uma única alternativa (TRALDI, 2006, p. 48).
E sobre esses aspectos didáticos relativos ao CDI destaca contribuições
acerca da revisão das questões relacionadas ao Pensamento Matemático
Avançado, e também de diferentes teóricos, em relação ao que classifica como
riqueza da área. Os elementos apontados por Traldi são pontos que evidenciam a
complexidade e fragilidades das relações envolvendo a área do CDI.
Dessa forma, apresenta que as pesquisas evidenciam que a área de Cálculo Diferencial e Integral é uma área rica: a) rica em noções, ora em conformidade e ora em contradição com as ideias intuitivas dos alunos, o que deve ser levado em conta no seu ensino sob pena de causar obstáculos; b) que apresenta uma diversidade de registros de representações em que seus conceitos são apresentados; c) que tem um caráter unificador que se manifesta, desde que sua abordagem no ensino leve em conta as diversas dimensões Matemáticas de um dado conceito (no quadro da álgebra, da geometria, da geometria analítica); d) que aborda noções que são estudadas na educação básica, número real, infinito, continuidade, limite, função; e) que tem aplicações em outras áreas do conhecimento, conforme Cornu (1991), Sierpinska (1985), Tall (1991), Azcárate e outros (1996) e Vinner (1991) (TRALDI, 2006, p. 28).
30
Em relação ao conceito de limite, concorda-se com Traldi, que Cornu (1991) e
Sierpinska (1985) após estudos acerca das concepções dos alunos, afirmam que a
grande dificuldade envolvendo o processo de ensino e aprendizagem desse
conceito, se encontra no fato de tratar-se de um conceito extremamente amplo, que
impossibilita a generalização de aspectos cognitivos a partir da sua definição
Matemática. Ou seja, saber o que diz a definição do conceito de limite não garante
que ocorra a construção da concepção fundamental desse conceito pelos alunos. A
primeira ideia é intuitiva, os estudantes acreditam ter adquirido o conhecimento do
conceito formal, sendo capazes de realizar atividades que exijam propriedades e a
ideia intuitiva de limite. Nesse aspecto, o processo ensino-aprendizagem do conceito
de limite produz professores conscientes de que a maior parte dos alunos seja
incapaz de dominar o conceito; no entanto, a fim de evitar grande número de
reprovações, propõem exercícios e ensinam os alunos a resolvê-los, buscando a
garantia de alunos aprovados, mesmo que não tenham construído compreensão do
conceito.
A posição desses autores, apresentada por Traldi demonstra que as escolhas
dos professores frente à iminência da reprovação em massa, aparentemente,
evidenciam como agentes externos ao processo ensino-aprendizagem do Cálculo
podem limitar a liberdade de ação dos professores, e consequentemente, a
qualidade do trabalho realizado.
E, sobre o processo de ensino e/ou aprendizagem da Derivada, aponta três
diferentes níveis dos aspectos cognitivos dos alunos e sua evolução, segundo
Azcárate e outros (1996, apud TRALDI, 2006); i) o nível “primitivo” correspondente a
alunos que apresentam uma incapacidade de interpretação do conceito de variação
instantânea de uma função; ii) o nível “aproximação”, correspondente a alunos que
para o conceito de velocidade instantânea têm generalizado sua concepção da
noção de velocidade média entre pontos, e que por coerência se utilizam dessa
apropriação para resolução de situações pontuais por aproximação e; iii) o nível
“limite” relativo a alunos que já têm construídas as concepções de velocidade
instantânea e a noção de taxa de variação de uma função em um ponto dado, e
esses são capazes de descrever e representar situações de variação instantânea de
uma função dada por seu gráfico.
31
Corroborando o caráter da complexidade do processo de ensino-
aprendizagem do CDI e dos apectos didáticos relacionados nesse processo,
concorda-se com a posição de Traldi, fundamentada em Elbaz (1983, apud Traldi,
2006), de que todas as espécies de conhecimento do professor estão integradas e
filtradas pelos valores e crenças pessoais, constituindo-se em um saber que orienta
a prática profissional e que é de natureza essencialmente prática, mais implícito do
que explícito. Dessa forma, concorda-se também que o conhecimento profissional
dos professores, como dos futuros profissionais, seja tanto pessoal, quanto social.
1.3.3 A pesquisa de Dall’Anese
A pesquisa de Dall’Anese (2006) objetivou identificar e analisar argumentos e
metáforas utilizadas por um grupo de alunos de um curso de pós-graduação em
Educação Matemática para taxa de variação, com a finalidade de entender como
aprendem esse tópico. A análise realizada se baseou na Teoria da Cognição
Corporificada e no Modelo da Estratégia Argumentativa.
Embora esse estudo não tenha sido conduzido em um curso inicial de
Cálculo, esse pesquisador destaca que o tópico sobre taxa de variação é conteúdo
programático do Calculo Diferencial e Integral I, curso oferecido, geralmente, no
primeiro semestre de cursos de graduação da área de Ciências Exatas e, nesse
sentido, se aproxima do foco de interesse desta investigação.
Dall’Anese expõe que indicadores estatísticos apontam para os problemas de
ensino e aprendizagem da disciplina de CDI, tanto no âmbito nacional, quanto no
internacional. E, nesse aspecto, destaca intenções de melhoria9 nesse ensino no
cenário nacional, como a proposta de reestruturação a partir da implantação de
módulos de aprendizagem virtual e emprego de recursos computacionais. No âmbito
internacional, destaca o movimento que ficou conhecido como “Cálculus Reform
9 PRODENGE – Programa de Desenvolvimento das Engenharias.
32
Moviment”10, com propostas de mudanças para o ensino de Cálculo; com atividades
propostas para o uso de computadores em exercícios, prática e ideias do Cálculo.
Por meio de seu estudo, propõe-se a olhar para a fala dos alunos de um
curso de Pós-graduação em Educação Matemática, na medida em que informam
sobre os objetos matemáticos que estão sendo constituídos em suas atividades em
aula e em tarefas que envolvam a Derivada de uma função real. Em sua análise
busca compreender o discurso do aluno, que é um recorte das falas e interações de
um grupo de alunos sobre a taxa de variação, sejam essas falas, gestuais, escritas
ou pictóricas. Nesse contexto, pretende-se, na presente investigação, encontrar
aspectos sobre o que deixam revelar os depoimentos dos sujeitos investigados,
estudantes de graduação, em relação ao estudo da Derivada em aulas de Cálculo 1.
Dall’Anese destaca a pesquisa de Nascimento (2001), acerca de professores
que constatam as dificuldades de alunos em curso inicial de CDI, devido ausência
de conceitos naturais e intuitivos embutidos nas estruturas numéricas, geométricas e
variacionais, decorrente da forma como professores da educação básica cumprem o
conteúdo matemático.
Nessa direção, desenvolve uma importante síntese de resultados de
pesquisas, que também são pertinentes a investigação que se pretende realizar;
resultados esses, obtidos a partir de publicações em encontros internacionais como
PME, ICME, ICTM11 e de artigos em periódicos; e dos quais se destacam: 1) Que a
ênfase no aspecto processual pode levar os estudantes à associar a aplicação de
regras e procedimentos ao conceito de Derivada, o que não impede o sucesso nas
tarefas, mas contribui para as falhas em tarefas que envolvem aspectos conceituas
(MANRIQUE; ALMOULOUD, 1998; TALL, 1991, 1997; EVEN; SCHHWARZ, 2003;
AMIT; WINNER, 1990; ARTIGUE, 1991; ORTON, 1983; CASSOL, 1997); 2) A
dificuldade dos alunos em relacionar a ideia de reta tangente à uma circunferência
10 Calculus Reform (Reforma do Cálculo) foi um movimento internacional iniciado na década de 1980, motivado por vários fatores, dentre os quais se destacam a compreensão conceitual dos temas inerentes à disciplina, as questões pragmáticas ligadas à sua aplicabilidade em outros campos profissionais e aos baixos índices de aproveitamento constatados em sua aprendizagem. Tinha como características para o aprendizado de conceitos, teoremas e resolução de problemas; o uso de tecnologias, softwares e calculadoras gráficas (TUCKER e LEITZEL, 1995). 11 (PME) International Conference for the Psycology of Mathematics Education; ( ICME) International Congress on Mathematical Education; (ICTM) International Conference on the teaching of Mathematics.
33
com reta tangente a outras curvas; para estes, a reta tangente à curva é aquela que
tem em comum a esta curva apenas o ponto de tangência (SIERPINSKA, 1995;
VINNER, 1991; DALL’ANESE, 2000); 3) As dificuldades dos alunos em estabelecer
relações entre diferentes formas de representação da Derivada, como exemplo entre
o coeficiente angular da reta tangente e a Derivada num ponto (MEYER, 2003).
O processo de compreensão da taxa média e taxa instantânea de variação,
segundo Dall’Anese não se restringe a passagem de uma fórmula analítica a outra
ou de um gráfico para uma fórmula. Nesse sentido, apontou que existe uma
diferença entre os mecanismos cognitivos para compreensão do gráfico e da fórmula
analítica que contribui para a dificuldade dos alunos com esse tópico e, dessa forma,
a definição formal não é a única responsável por essa dificuldade.
A partir do auxílio da tecnologia informática sugeriu um ambiente onde o
movimento fictivo12, intrínseco da linguagem, se transformou em um movimento
factivo, quando retas secantes coincidiam com uma reta tangente por sucessivas
aproximações e quando a reta tangente à curva num ponto podia se mover, ao
mesmo tempo em que podiam ser vistos os valores do coeficienteangular dessas
retas.
1.3.4 A pesquisa de Vieira
Destaca-se da pesquisa de Vieira (2013) o primeiro Capítulo de sua
investigação, em que apresenta as dificuldades no Ensino de Cálculo Diferencial e
Integral decorrentes de quatro naturezas distintas. A primeira relacionada com a
Educação de uma forma geral; a segunda, oriunda das dificuldades no ensino da
Matemática; a terceira associada aos livros didáticos e uma quarta, de natureza
epistemológica. A sua direção de investigação contribui para esta pesquisa no
sentido de que vai a paralelo às hipóteses que se têm sobre alguns mecanismos que
diretamente influenciam o desenvolvimento dos estudantes em aulas de Cálculo 1.
12 Movimento fictivo é um mecanismo cognitivo nas quais cenas estáticas são descritas em termos dinâmicos, estudado pela primeira vez por LenTalmy (2000) e, especificamente na matemática, por Lakoff e Núnez (2000) e Núnez (2004), conforme apresenta Dall”Anese (2003).
34
Vieira argumenta que educar é um processo social cuja busca resulta na
aproximação entre o conhecimento do professor e do aluno, e que existem
diferentes formas de análise dessas relações sociais em um contexto escolar.
Segundo esse autor, a sociedade atual parece não mais enxergar a Educação como
uma promessa de melhoria das condições de vida, e não é raro encontrar
professores desiludidos com o processo de degradação de sua imagem social.
A escola do século XXI, segundo esse pesquisador, embora constituída de
pessoas, seres que interagem e que buscam incessantemente novos
conhecimentos; mantém-se ainda muito ligada à base tradicional dos processos de
ensino.
Destaca ainda, que os problemas gerados em sala de aula em sua maioria
são considerados de responsabilidade do professor, ocasionando crise e conflitos
escolares, de fundo social e de valores humanos. E menciona que um grande passo
para a melhora do sistema educacional fundamental, médio ou superior no Brasil,
pode ser dado com o uso das novas e atuais tecnologias de informação. Nesse
sentido, ressalta que um novo desafio docente na educação no estudo do Cálculo
Diferencial e Integral será a construção de uma melhor apropriação do objeto de
estudo por meio do uso das novas tecnologias.
Das dificuldades no ensino da Matemática coloca, entre outros fatores, as
metodológicas, as de elaboração e da linguagem dos livros didáticos e as de
formação de professores. Nesse aspecto, destaca a Matemática ser considerada vilã
(VITTI, 1999 apud VIEIRA, 2013) e o problema do contexto (BRASIL, 1998 apud
VIEIRA, 2013). Acrescenta que o ensino da Matemática parece estar dividido entre
conceituação, manipulação e aplicação; e dessa maneira coloca também a forma
como se enquadra o ensino do Cálculo.
Nesse andamento, menciona que pesquisas apontam que o conceito de
função tem sido uma das principais fontes de obstáculos epistemológicos para a
aprendizagem dos conceitos básicos do Cálculo. A origem desse conceito está
relacionada à observação das variações quantitativas presentes nos fenomenos
naturais; no entanto, no ensino médio, é entendido como uma relação entre dois
conjuntos A e B, de forma que a cada elemento de A coresponda um elemento de B.
35
Em relação às dificuldades associadas aos livros didáticos, destaca que, em
geral, estes se constituem na apresentação do Cálculo sistematizado, formal e
logicamente organizados, como resultado do trabalho de pensadores, filósofos e
matemáticos em mais de vinte séculos, frequentemente apresentada pela
sequência: Números Reais, Funções, Limites, Derivadas e Integrais. Ou o Cálculo
em construção, apresentado por uma temática que não obedece necessariamente à
estruturação lógica; mas o desenvolvimento do Cálculo ou a sua
contemporaneidade, baseado numa metodologia problematizada, com situações que
deflagram o processo de construção do conhecimento. O livro didático, segundo
esse autor, tenta mostrar um caminho com vistas à viabilizar a concepção de como o
conhecimento no Cálculo pode ou deve ser construído.
No ambiente da universidade, ressalta que muitos cursos de Cálculo
Diferencial e Integral sob a influência desses recursos, permanecem os mesmos,
trazendo abordagens idênticas às realizadas há décadas; e aponta que as
Tecnologias da Informação poderiam representar fortes mediadoras na negociação
dos significados do Cálculo Diferencial e Integral.
Sobre as dificuldades de natureza epistemológica destaca Tall (1976 apud
VIEIRA, 2013) no sentido de que o cérebro humano não é uma entidade puramente
lógica. Seu funcionamento é complexo e, usualmente, é uma variação da lógica
matemática; sendo que a lógica pura nem sempre é a razão das inspirações, nem a
causadora de erros.
Aplicando essa reflexão ao estudo do CDI, principalmente, no que se refere
ao estudo da Função, e a fim de evitar ideias erroneamente formadas sobre o
significado de função, propõe trabalhar a relação da variabilidade, da variação de
dependência, de taxa de variação, já a partir do ensino fundamental.
Atualmente, segundo esse pesquisador, o aluno constrói a imagem de que
uma função é apenas uma expressão contendo x e y e, desse fato, torna-se
intensamente sofrida a ideia de variabilidade, uma vez que a função é, nesse
sentido, a própria expressão. Dessa forma, a dificuldade aumenta à medida que
passa para outros assuntos, como por exemplo, ao estudo de pontos críticos. Nessa
direção, salienta que a definição formal de função em pouco contribui para a
36
significação desse conceito, que sequer é lembrado diante do “fato” de a função
constituir-se como uma fórmula. Acredita que, frente aos problemas usualmente
propostos, são por vezes utilizados procedimentos parecidos que levam à sensação
de “bem conhecer” um determinado assunto; porém, a partir de pequenas
mudanças, esse entendimento de como agir se torna ausente.
Destaca, também, que um conflito pedagógico frequentemente encontrado
nos cursos de Cálculo é o descompasso entre o que o professor faz - em geral
demonstrar resultados, e o que pede que o aluno faça - exaustivas listas de
exercícios. Ainda destaca que, a fim de tentar minimizar os resultados catastróficos
dos cursos de Cálculo no ensino superior, é comum a realização de cursos
preparatórios, como Pré-Cálculo, Cálculo Zero, Matemática Básica, entre outros. No
entanto, os resultados apresentados em tais disciplinas niveladoras é similar aos
obtidos nos cursos de Cálculo que com ou sem elas continuam a apresentar
resultados preocupantes.
Nesse sentido, Vieira aponta que Rezende (2003) reflete sobre a
responsabilidade dos professores de Cálculo em explicitar as concepções
epistemológicas que perpassam suas ações docentes, ao discutir sobre as
dualidades sistematização/construção; variabilidade/permanência; global/local;
discreto/contínuo; finito/infinito e construção/significação.
Viera deseja ir além em sua pesquisa e mostrar que as TI’s medeiam e
facilitam quaiquer dessas dualidades em cursos de CDI, pois se constituem como
uma nova teconologia da inteligência13 e como protagonistas na construção do
conhecimento, o humano midiático14 da atualidade.
Na presente investigação, não se orienta para a direção das TI’s, mas as
contribuições de Vieira corroboram a intenção de pesquisa, pois dão a dimensão do
cenário que envolve o encontro com o objeto novo em aulas de Cálculo 1 pelos
sujeitos da experiência.
13 Levy (1994). 14 Borba e Villarreal (2005).
37
1.4 O Dimensionamento da pesquisa
Na presente introdução, Capítulo 1 desta pesquisa, apresentam-se a
motivação, o problema e objetivo de pesquisa, assim como a questão central desta
investigação, que busca a partir da lógica do Diálogo e da Experiência encontrar
indícios dos conhecimentos, inquietações e experiências que os estudantes de
Cálculo 1 deixam revelar a partir de sua passagem por essa disciplina, e apresentar
os aspectos desse estudo, que se interpõem a partir desse encontro. Inclui-se
também, a revisão da Literatura que procurou levantar pesquisas direcionadas para
a investigação no âmbito do Cálculo Diferencial e Integral.
A respeito das escolhas teóricas, no Capítulo 2, apresentam-se a
interpretação da relação dialógica do sujeito com o outro e com o objeto, baseada
nas concepções de Buber (2009) e de Bauman e May (2010), admitindo-se ainda
um interlocução dessa perspectiva teórica com a concepção de Larrosa (2002,
2011) acerca da experiência. A partir dessas perspectivas, fundam-se a construção
teórica desta investigação.
As escolhas metodológicas serão apresentadas no Capítulo 3, incluindo o
método escolhido; a forma de seleção dos sujeitos; a caracterização desses sujeitos
da experiência e da Instituição que os representa – representante dessa
comunidade plural; além da justificativa pela opção de uso de Mapas Conceituais
como um dos instrumentos de coleta dos dados.
Os procedimentos de análise dos dados e a apresentação de resultados a
partir das abordagens que coletam relatos dos sujeitos investigados, classificados
em unidades de análise textuais, serão apresentados no Capítulo 4.
No Capítulo 5, apresenta-se a análise dedicada aos Mapas Conceituais,
assim como a discussão em torno do que se denominou de Mapas Conceituais
Iniciais.
Conclui-se esta pesquisa com as considerações finais e conjecturas e as
possíveis contribuições deste estudo.
38
Assim, no próximo Capítulo, apresenta-se a fundamentação teórica. Inicia-se
com uma interpretação da relação dialógica do sujeito com o outro e com o objeto,
uma relação baseada nas concepções de Buber e de Bauman e May. Na sequência,
busca-se um diálogo mais abrangente entre essas concepções e a compreensão de
Larrosa (1994) sobre a experiência de si, o campo das subjetividades e da
experiência (LARROSA, 2002, 2010). Apresenta-se um modelo teórico a fim de
expor lugares e dispositivos que constrõem e medeiam a relação do sujeito consigo
mesmo e o seu processo de experiência e que, portanto, podem estar presente na
construção do conhecimento da Derivada.
39
40
2 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
Neste Capítulo são apresentados os pressupostos teóricos sustentados nas
contribuições filosóficas de Buber (2009) acerca da relação dialógica representada pelo
modo fenomenológico da existência humana, o modo do Eu-Tu, e o modo coisificado,
reflexivo, da atitude Eu-Isso. Valem-se também das contribuições de Bauman e May
(2010) acerca das escolhas, como presenças em uma relação dialógica. Ainda, das
contribuições de Larrosa (1994, 2002, 2011) sobre a experiência dos sujeitos na interação
dialógica, que embora envolva escolhas nem sempre pessoais, sustenta a experiência
que é individual e intransferível.
2.1 A Relação dialógica
Considera-se uma perspectiva filosófico-sociológica, posta diante da complexa
rede de subjetividades que compreende uma relação dialógica, uma relação de
reciprocidade, de um compartilhar em mão dupla, e que não acolhe apenas um encontro
impessoal e desprovido de afetividade, pois ocorre em meio a intrincada interação entre
professores, estudantes, Instituição e conteúdo nos processos de ensino e aprendizagem
de Cálculo 1.
Admite-se que essa relação dialógica compreenda um contexto histórico; um
encontro denominado de diálogo humano, em que alguns limites à liberdade se
posicionem como entraves ao fato de o homem ser o sujeito da própria prática, portanto,
corresponsável nesse processo, e no qual se aceita como sujeito cuja liberdade é
estranhamente limitada, tendo em vista que suas ações subjazem a certo grau dessa
liberdade.
Nesse sentido, Freire (1979) expõe que o homem se revela como um ser situado
no mundo, em um dado espaço/tempo, com uma ação embasada na reflexão sobre esse
41
mundo em transformação, com a finalidade de contribuir para essa transformação, o que
implica que também esteja submetido às limitações do mundo. Assim, a aprendizagem e
o ensino devem pautar-se em uma pedagogia que leve à superação da relação opressor-
oprimido, não havendo restrições formais da instrução, ou seja, uma pedagogia baseada
na dialogicidade – o diálogo entre professor e aluno que possa levar à ação fundante de
uma educação problematizadora focalizada no desvelamento da realidade que se presta
ao aluno - ou seja, o reverso da educação bancária.
Enquanto na prática “bancária” da educação, antidialógica por essência, por isso não comunicativa, o educador deposita no educando o conteúdo programático da educação, que ele mesmo elabora ou elaborada para ele, na prática problematizadora, dialógica por excelência, este conteúdo, que jamais é “depositado”, se organiza e se constitui na visão do mundo dos educandos, em que se encontram seus temas geradores (FREIRE, 1987, p. 102).
Não se desconsidera a relação que Freire (1979) expõe, e sim, consideram-se as
várias nuances de uma relação entre indivíduos, uma relação que assume
comportamentos supostamente contraditórios, perpassando todos os aspectos presentes
nesse processo, até mesmo, opressão, medo, intolerância, como também, motivação,
fortalecimento, incentivo, encorajamento.
Concorda-se que a dialogicidade é uma questão básica para essa abordagem
sociocultural; e que a relação “professor – aluno – instituição – conteúdo” deveria ser
horizontal, com o objetivo de desenvolvimento de uma consciência crítica e libertadora,
que valoriza a linguagem, pela qual os elementos dessa relação procuram a superação da
consciência ingênua para a percepção das contradições sociais.
Nessas circunstâncias, a relação dialógica que ora se apresenta, é uma
abordagem que coloca cada indivíduo no centro da condução de seu próprio processo de
construção de conhecimento e que procura preconizar a experiência desses sujeitos. E,
nessa direção, elegem-se as perspectivas de Buber (2009), Bauman e May (2010) e
Larrosa (1994, 2002, 2011) para encaminhar essa construção teórica.
2.1.1 A relação dialógica de Buber
42
O pensamento de Buber (1878-1965) sofreu forte influência da corrente hassídica15
da mística judaica, comumente caracterizada como filosofia do encontro ou do diálogo. O
pensamento de Buber é dificilmente situável dentro de alguma corrente filosófica do
século XX. Ele conviveu com a comunidade hassídica enquanto criança e após a idade
adulta. Voltou-se também para o pensamento contemporâneo. A mensagem do
hassidismo parece ter fecundado e provocado o pensamento de Buber16.
Buber estudou nas universidades de Viena, Berlim, Leipzig e Zurique e adquiriu
uma notável formação filosófica, artística e literária. Alguns dos nomes que mais
influenciaram diretamente a obra de Buber são Feuerbach, Kant, Nietzsche e
Kierkegaard.
Buber não se filia diretamente a algum movimento filosófico, mas se aproxima de
algumas correntes e métodos; destacam-se: o existencialismo, pois Buber se atém à
realidade concreta e prioriza a práxis; o personalismo, pois em sua obra destaca a
pessoa; o intuicionismo, pela primazia à atitude pré-reflexiva não conceitual existente
entre o homem e o ente que se lhe defronta na relação dialógica.
A filosofia do diálogo exige a intersubjetividade como fato antropológico
fundamental. A relação primordial de Buber torna o fundamento de todas as relações
humanas, assim como é primordial que o homem encontre o seu sentido e se
comprometa com a própria existência no mundo. Em contrapartida, a relação inter-
humana, é compreendida por Buber de duas maneiras: tomando-os por objetos, ou se
colocando na presença deles; expressas pelo que chama de palavras-princípio, Eu-Tu e
Eu-Isso, as quais, considera portadoras do ser, não exprimindo algo existente fora delas,
mas fundamentando uma existência.
O fundamento da antropologia de Buber (2009) está na relação dialógica, a relação
intersubjetiva, inter-humana. Para ele não há existência humana sem comunicação e
diálogo, e os objetos não existem fora dessa interação. Dialógico é, nesse sentido, uma
15 O Hassidismo, corrente mística judaica, reage contra o modo messiânico de se distinguir um homem do outro, ou uma época de outras, ou uma ação de outras. Foi tal ensinamento de um vínculo inseparável entre o mundo e o homem que exerceu uma influência marcante sobre Buber a ponto de este afirmar que o destino inevitável do homem é amar o mundo, pois não é em um pretenso "além" do mundo, mas no seu "interior" que o homem pode encontrar o divino. Von Zuben, N. A. Introdução do tradutor para a obra Eu e Tu. São Paulo: Cortez & Moraes, 2006. 16 Sobre o hassidismo de Buber, ver também, CROMBERG, M. U. Crisálida da filosofia: a obra Eu e Tu de Martin Buber ilustrada por sua base hassídica. São Paulo: Associação Editorial Humanitas: Fapesp, 2005.
43
característica de compartilhamento de sentidos entre o que se chama de relação Eu-Tu, e
que se dá no instante da vivência. Nesse sentido, essa relação é o modo da vivência de
possibilidade, do fenomenológico, de valor existencial, do ontológico. E o relacionamento
Eu-Isso, o modo objetivante.
Buber (2009) faz distinção entre esses dois modos humanos de existir, o modo Eu-
Isso e o modo Eu-Tu. O modo Eu-Isso (modo coisificado) de existir, é o modo explicativo,
acontecido, onde vigora a causalidade, a dicotomia sujeito-objeto, a utilidade e os usos; é
o modo da consciência teórica. Nesse modo é possível a técnica como procedimento de
repetição praticado pelo sujeito sobre o objeto.
Por outro lado, o modo Eu-Tu não admite a dicotomia sujeito-objeto, não é
pragmático. É o modo de existir do devir, do acontecer, da ação enquanto desdobramento
de possibilidades; é o modo humano de existir da cognição, da consciência
fenomenológica, pré-reflexiva, momentânea, na duração do desdobramento da ação.
A grande contribuição de Buber (2009) com sua ontologia do humano se constitui
no reconhecimento da relação Eu-Tu como dialógico. No modo Eu-Tu, o Eu se remete ao
Tu e o Tu se remete ao Eu, como possibilidades, e na reciprocidade, Eu e Tu se envolvem
em uma esfera compartilhada de ação e de produção de sentido, de logos; DIA LOGOS.
Dessa forma, propõe-se a realização da vida dialógica, uma existência fundada no
diálogo.
Uma das manifestações antropológicas mais concretas da existência da esfera "entre" é o fenômeno da resposta. Neste nível palavra e práxis se confundem, isto é, no nível do dialógico, ou em outros termos dialogos é diapráxis, já que existe uma interação "entre" Eu e Tu (ZUBEN, 2009, p. 33 – grifos do autor)
O modo Eu-Tu pode ocorrer na relação com a natureza não humana, com a
natureza humana (inter-humano) ou com o sagrado17. Na esfera do inter-humano, o
momento de vivência do Eu-Tu pode se dar na relação com uma pessoa em particular,
com uma multiplicidade de pessoas, ou na relação consigo mesmo, pois provém da
multiplicidade de possibilidades que se organizam para uma interação dialógica.
17 De acordo com Veríssimo (2010), Martin Buber focaliza em especial o sagrado pela perspectiva do encontro – como presença, existência. Nessa perspectiva a experiência do sagrado é para o humano uma vivência que o eleva a uma condição mais digna, retirando-o do dualismo no qual simplesmente é matéria vã e perecível em confronto com uma visão de sagrado superior.
44
As possibilidades não são criadas, mas também não acontecem sem a presença
humana. A interação dialógica é a consciência de sentido, seja em “si mesmo”, ou com
uma pessoa, ou com uma multiplicidade de pessoas. Assim, o momento de vivência Eu-
Tu é o momento de consciência fenomenológica, não teórica, consciência dialógica, e não
no sentido reflexivo, coisificado que tem o modo Eu-Isso.
Em especial, interessa-se pela relação entre os atores envolvidos no processo
ensino-aprendizagem de Cálculo 1 e nesse pensar sobre a relação entre indivíduos.
Assim, parte-se de Buber (2009)18 com a obra Eu e Tu, pois além de respeitáveis suas
contribuições para a Filosofia e para a Educação; esse autor apresenta uma ampla
discussão de aspectos acerca da dialogicidade. Nesta obra expõe um importante ensaio
alusivo à subjetividade, à ética e à relação, para o qual o Eu-Tu e o Eu-Isso são os termos
da dialética. Toma-se essa direção, pois se entende que é a partir de um processo de
interação dialógica, que sujeitos são capazes de ser transformados ou modificados. É a
partir da relação dialógica que o sujeito se dá a conhecer, e conhece o novo.
Busca-se inicialmente o entendimento da função da palavra, que para Buber (2009)
não é representar ou nomear as coisas, mas fundamentar a existência do homem, e
nesse sentido, ele percorre um caminho diferente do tradicionalmente percorrido pelas
filosofias do sujeito. Ao contrário de postular como relação primordial o sujeito cogniscente
e o objeto conhecido, Buber descreve a relação inter-humana, o modo Eu-Tu, como
origem e fundamento da existência humana.
O mundo é duplo para o homem, segundo a dualidade de sua atitude. A atitude do homem é dupla de acordo com a dualidade das palavras-princípio que ele pode proferir. As palavras-princípio não são vocábulos isolados, mas pares de vocábulos. Uma palavra-princípio é o par Eu-Tu. A outra é o par Eu-Isso no qual, sem que seja alterada a palavra-princípio, pode-se substituir Isso por Ele ou Ela. Deste modo, o Eu do homem é também duplo (BUBER, 2009, p. 43).
Um dos modos do Eu-Tu é o encontro onde a totalidade do homem está presente e
onde existe total reciprocidade. Presume-se, que uma relação onde ocorra a experiência
da transformação, seja um dos modos do Eu-Tu. Dessa forma, a relação Eu-Tu acontece
na presença, ou seja, quando um Tu se apresenta ao Eu. Presença que não pode ser
18 Título original: Ich und Du (Heidelberg: ed. Lambert Schneider, 1974) Trad. Newton Aquiles Von Zuben. 10 ed. rev., São Paulo: Centauro, 2009. (3ª Reimpressão).
45
entendida como um instante cronológico, mas o instante que se presentifica e atualiza o
homem. A palavra proferida é uma atitude efetiva, eficaz e atualizadora do ser, é um ato
do homem através do qual ele se faz homem e se situa no mundo com os outros.
Eu não experiencio o homem a quem digo Tu. Eu entro em relação com ele no santuário da palavra-princípio. Somente quando saio daí posso experienciá-lo novamente. A experiência é o distanciamento do Tu (BUBER, 2009, p. 47).
Relação é reciprocidade. Buber (2009) exemplifica que se pode apreender a
imagem de uma árvore, pode-se senti-la como movimento, filamento fluente de vasos
unidos a um núcleo, sucção de raízes, respiração das folhas. Pode-se classificá-la numa
espécie e observá-la como exemplar de um tipo de estrutura e de vida. Pode-se dominar
sua presença e sua forma que não se reconhece mais nela senão a expressão de uma lei.
Pode-se volatilizá-la e eternizá-la, tornando-a um número, uma mera relação numérica. A
árvore permanece, em todas essas perspectivas, tem seu espaço/tempo, mantém sua
natureza e sua composição. Contudo, simultaneamente, ao observar a árvore, pode
acontecer que um Eu seja levado a entrar em relação com ela; assim, ela não é mais um
Isso, não é um jogo de uma representação ou um valor emotivo. Ela se apresenta diante
do Eu e tem algo a ver com ele, e o recíproco é verdadeiro.
A estrutura da relação dialógica apresentada por Buber (2009) é dual. Há dois
mundos, a relação para Eu-Tu e o relacionamento para Eu-Isso, sendo Tu e Isso duas
fontes pelas quais a eficácia da palavra que se desenvolve constitui a existência humana.
O que emerge do Isso – “das coisas”, provém de um modo convergente da fonte primária
que é o Tu, logo, o Isso é posterior ao Tu.
O Tu é primordial e consequentemente o Isso é posterior ao Tu. "No princípio é relação". A abordagem reflexiva, cognoscitiva de objetos, do Isso, só poderá ser levada a efeito na medida em que passa pelo lugar ontológico do encontro de duas pessoas (BUBER, 2009, p. 26 – grifo do autor).
Eu-Tu e Eu-Isso significam dois mundos, o da relação – para o Eu-Tu; e o mundo
do Isso, o da atitude cognoscitiva, objetivante – o Eu-Isso. Para Buber, essas duas
atitudes são radicalmente distintas, o homem toma uma atitude ou outra, alternadamente.
Eu-Tu e Eu-Isso não são conceitos que exprimem algo externo; a primeira é a relação
ontológica, esteio para o diálogo, e a segunda, o lugar da experimentação, do
46
conhecimento, da utilização, ou seja, o vínculo objetivante. “O mundo como experiência19
diz respeito à palavra-princípio Eu-Isso. A palavra-princípio Eu-Tu fundamenta o mundo
da relação” (BUBER, 2009, p. 45).
Buber (2009) reconhece a liberdade como ponto de partida imprescindível para o
ato educativo, contudo não a vê como fundamento da vida verdadeira, assim como, na
vivência educativa. Ainda, contribui para a compreensão dos limites da liberdade ao
sugerir que o ser humano não reside sedentariamente no indivíduo, nem na esfera
coletiva, existindo uma proclamação do social em detrimento do pessoal.
O homem livre é aquele cujo querer é isento de arbitrário. Ele crê na atualidade, isto é, ele acredita no vínculo real que une a dualidade real do Eu e do Tu, crê no destino e também que ela tem necessidade dele; ela não o conduz em inteiras, mas o espera; o homem deve ir ao seu encontro, mas não sabe ainda onde ela está (BUBER, 2009, p. 78).
A relação dialógica para Buber é aquela que toma lugar principal na formalização
da existência do próprio homem, ou seja, na passagem inter-humana; é um evento
dialógico pelo qual os homens têm assegurada a liberdade de se estabelecerem frente à
subjetividade e à objetividade. Nesse sentido, o Eu-Tu é essa reflexão da relação inter-
humana.
2.1.2 Liberdade, escolhas e a relação “alguém com os outros”
Contribuem nesse debate sobre a relação dialógica, Bauman e May (2010), pois
revelam que a sociologia poderia fornecer observações sobre as experiências humanas e
mostrar as implicações de atos e decisões que conduzem a vida do homem. No dizer
desses autores, pensar sociologicamente significa entender aqueles de quem se cercam,
em suas esperanças, desejos, inquietações e preocupações. Ademais, refletem sobre o
modo como a sociologia pode contribuir objetivamente para a vida pessoal, pois
estabelece limites, molda perspectivas, desenha opções e, também, ressalta
impossibilidades.
Por esse lado, cada um é um ator habilidoso, cujas realizações e o que se é,
dependem do que fazem os outros. Esses autores afirmam que a maior parte das
pessoas já viveu a angustiante prova da ruptura da comunicação. Ainda dessa
19 Aqui experiência está subentendida como significado da experimentação.
47
perspectiva, a sociologia está introduzida no cotidiano, sem a qual, aliás, seria impossível
de conduzir-se na companhia do outro.
Para Bauman e May (2010) se vive atualmente um processo de interação com
outros indivíduos e de direcionamentos para a liberdade de escolha. De certa forma, todos
são livres para escolher e acompanhar suas escolhas até o fim. No entanto, qual o limite
dessa liberdade? Qual o raio de alcance dessas escolhas? A quem se atinge quando são
feitas as escolhas?
[...] a liberdade de escolha não garante nossa liberdade de efetivamente atuar sobre essas escolhas nem assegura a liberdade de atingir os resultados desejados. Mais que isso, demonstramos que o exercício de nossa liberdade pode ser um limite à liberdade alheia (BAUMAM; MAY, 2010, p. 36).
Como representantes de grupos formais e informais constituídos, pode-se
concordar com Bauman e May (2010), que de certa forma, continuamente, ocorrem
ajustamentos a determinadas condições de atuação no interior de um grupo. Assim, atua-
se na fronteira do que fica estabelecido para a função que se deseja desempenhar, e que
se esperam desempenhadas.
Pode-se concordar também, que de certa forma, se é “treinado” segundo os meios
e significados dos agrupamentos, para se tomar, assim, o lugar para a prática da própria
“liberdade”; limitados, porém, a ideias e territórios específicos; pelas perspectivas de
setores representativos da instituição ou do grupo ao qual se pertença.
Nossas ações, assim, tornam-se dependentes do julgamento de pessoas, uma avaliação sobre a qual exercemos controle limitado. Essas pessoas estabelecem as regras do jogo e são, ao mesmo tempo, os árbitros de seu cumprimento. Estão posicionadas por suas instituições para exercer um critério e, quando o fazem, estabelecem os limites de nossa liberdade (BAUMAM; MAY, 2010, p.33).
Nesse sentido, em Educação, a liberdade é sempre limitada a fatores internos ou
externos à ação pedagógica. Todavia, acredita-se que quando um indivíduo consegue
transformar-se a partir dessa relação que é dialógica, nisso consiste a autêntica liberdade
do encontro mútuo entre o ser e o saber.
Baumam e May (2010) admitem que, o que envolve a capacidade de alterar-se ou
modificar-se diante das próprias competências, pode não ter relação com a busca por
atingir metas, e reforçam que nem sempre o resultado depende exclusivamente de si.
48
Nem todas as pessoas que buscam os mesmos objetivos conseguem conquistá-los, porque o número de recompensas disponíveis é limitado. Nesse caso, competimos uns com os outros, e o resultado pode depender apenas parcialmente de nossos esforços (BAUMAM; MAY, 2010, p. 35).
Aparentemente nem sempre ocorre o encontro com total reciprocidade. Na relação
de alguém com os outros, existe uma situação de dependência, pois são os outros que
pronunciam o veredicto quanto à suficiência dos esforços empenhados, e assim, avaliam
se apresentam as características certas para tomada de certa posição. Também, fica-se a
mercê de fatores materiais que acomodam a própria capacidade de alcançar objetivos.
Contudo, isso não significa que as pessoas não sejam livres. As próprias escolhas
e a liberdade estão moldadas pela força das contingências, e saber pensar o equilíbrio da
relação entre a liberdade pessoal e dependência dos outros é atingir o viver bem; assim
como, manter-se em apenas um dos lados desses dois aspectos significa um maior
afastamento do caminho desse viver bem. Em contrapartida, fatores conformadores já se
constituíram em objeto de estudo anterior, quando se buscou a modernidade líquida
(BAUMAM, 2001) como cenário da constituição de identidade de cursos de Licenciatura
em Matemática (JUNQUEIRA, 2010).
Retoma-se, assim, a ideia da fluidez para essa nova discussão, pois essa permeia
as relações sociológicas, uma vez que se está submetida a graus de liberdade
constantemente vigiada, o que leva a se pensar sobre os limites estabelecidos nas
relações inter-humanas.
Uma nova compreensão gerada dessa maneira pode tornar nossa comunicação com “os outros” mais fácil e mais inclinada a conduzir ao mútuo entendimento. Medo e antagonismo podem ser substituídos por tolerância. Não há maior garantia de liberdade individual que a liberdade de todos (BAUMAM; MAY, 2010, p. 27 – grifo do autor)
E, nesse sentido:
Essas são consequências duradouras de escolhas anteriores que, acumuladas, têm efeitos em ações futuras. Nossa liberdade de agir no presente é desse modo conformada por nossas circunstâncias passadas e experiências acumuladas (BAUMAM; MAY, 2010, p. 34)
Opta-se, muitas vezes, por fugir das incertezas e, prefere-se uma imagem mais
comum que proporcione a ilusão de pertencer a um determinado grupo; repetem-se, por
49
isso, comportamentos, pois esses podem levar a crer que se tem exato conhecimento de
quem se é e de onde se está. No entanto, continua-se, muitas vezes sem nenhuma
certeza.
Ter a sensação de ser livre e concomitantemente não ser, entretanto, é parte comum de nossas experiências cotidianas – é também uma das questões que mais confusão provocam, desencadeando sensações de ambivalência e frustração, tanto quanto de criatividade e inovação (BAUMAM; MAY, 2010, p. 31).
Vive-se em constante interação com os outros, e livres para escolher e seguir
essas escolhas até o fim, no entanto, as próprias escolhas nem sempre são decisões
conscientes. Em muito, decorrem de hábitos e, de modo similar, evita-se quebrar regras,
que em geral orientam, não só as ações, mas a forma como são coordenadas com as
ações de outras pessoas que podem antecipar atitudes em diversas situações. Nesse
sentido, Bauman e May (2010) sinalizam que uma coisa é ter a habilidade de alterar ou
modificar competências, outra, muito diferente é ser capaz de alcançar as metas
almejadas. Assim, para alcançar a capacidade de agir livremente é preciso mais do que o
livre arbítrio.
Bauman (2013), em “Sobre a educação e juventude”, declara que no mundo
contemporâneo, compele-se a assumir a vida pouco a pouco, conforme se apresenta,
esperando que cada fragmento seja diferente do anterior, o que exige, constantemente, a
aquisição de novos conhecimentos e habilidades. Nessa direção, cita Gregory Baterson,
famoso pela identificação de tendências culturais ainda embrionárias, que a mais de meio
século, observou a iminente “revolução educacional”, proposta em três níveis presentes
no processo de ensino e/ou aprendizagem. No primeiro nível, o mais baixo, os alunos
seguem repetindo palavra por palavra o que os professores dizem - “aprendizagem
rotineira” - caracterizada por memorizar, construir fortificações contra qualquer informação
transgressora ou inadequada, portanto, irrelevante. Num segundo nível, mais elevado,
situa a formação de estruturas e predisposições cognitivas capazes de orientação em
situação pouco conhecida, assim como a absorção, assimilação e incorporação de novos
conhecimentos. E, um terceiro nível, mais elevado ainda, que controla os momentos em
que “dados anômalos” se tornam numerosos para serem descartados ou negligenciados.
Nesse nível se faz necessária uma revisão radical da estrutura cognitiva para acomodar e
dar significado a esses dados. Mais tarde, Thomas Kuhn (2000 apud BAUMAN, 2013)
50
chamou esse momento de “revolução científica” e sugeriu que todo processo de
conhecimento tende a passar de uma revolução dessas para outra.
Para Bauman (2013, p. 25), na atualidade, todos estão lançados nessa condição
perpetuamente revolucionária. E, aponta que o único propósito invariável da educação
era, é e continuará a ser, a preparação dos jovens para a vida segundo as realidades que
tenderão a enfrentar, ou seja, a realidade de incertezas. Para essa preparação, os jovens
precisam da instrução: “conhecimento prático, concreto e imediatamente aplicável”. E,
para ser “prático”, o ensino de qualidade precisa provocar e propagar a abertura, não a
oclusão mental.
A metáfora dos mísseis descreve uma transformação no cenário social dos dois
principais conjuntos de atores da educação: professores e estudantes. No momento em
que os mísseis balísticos iniciam seu movimento, a direção e a distância de seu percurso
já haviam sido determinados, pode-se calcular com pouco ou nenhum erro, o local em que
o míssil vai aterrissar. Devido a essas qualidades os mísseis balísticos se tornaram ideais
nas guerras de posição – alvos fixos e mísseis, os únicos em movimento. Contudo, por
essas mesmas qualidades, tornaram-se inúteis quando alvos invisíveis aos atiradores
começaram a se mover, imprevisivelmente. Então, foi necessário um “míssil inteligente”,
que pudesse mudar de direção em pleno vôo, dependendo das mudanças e
circunstâncias de seus alvos, ou seja, que identificasse o movimento de seus alvos e que
fosse capaz de aprender com eles o necessário sobre direção e velocidade atuais do alvo.
Na medida em que o alvo continua em movimento e mudando de direção e velocidade, a
plotagem de cada ponto precisa ser sempre atualizada e corrigida, seguindo uma
estratégia de “racionalidade instrumental” às avessas. Os alvos são selecionados
enquanto os mísseis inteligentes avançam, e são os meios disponíveis que decidem qual
fim será escolhido. Assim, a inteligência do míssil e sua eficácia se beneficiarão se seu
equipamento for de natureza generalista ou indeterminada, sem foco em uma categoria
específica de objetivos, nem excessivamente ajustado para atingir um alvo em particular.
Os mísseis inteligentes aprendem no percurso. Assim, como os mísseis
inteligentes, o que é necessário aos atores da educação é que lhes sejam fornecidas a
capacidade de aprender, e aprender depressa. Contudo, o que é menos visível, segundo
Bauman (2013), e não menos crucial que a capacidade de aprender depressa, é a
capacidade de esquecer instantaneamente o que foi aprendido antes. “Os mísseis
51
inteligentes não teriam esse qualificativo se não fossem capazes de “mudar de ideia” ou
revogar “decisões” anteriores sem remorsos nem reconsiderações” (BAUMAM, 2013, p.
21 – grifos do autor).
Nesse aspecto, Bauman (2013) chama atenção para a supervalorização da
informação. Para ele, os filósofos da educação da era sólido-moderna, viam os
professores como lançadores de mísseis balísticos, as realizações de ponta da inventiva
técnico humana da era moderna. Por outro lado, essa visão é muito mais antiga do que a
era moderna. No mundo contemporâneo, o mundo da fluidez, o mundo líquido moderno; o
ato de fazer escolhas, sob condições de incurável incerteza, está constantemente
presente na vida humana.
O que separa a atual agonia da escolha e dos desconfortos que sempre atormentaram o homoeligens, o “homem que escolhe”, é a descoberta ou suspeita de que não há regras prefixadas e objetivos universalmente aprovados a se seguir, que pudessem absorver os escolhedores das consequências adversas de suas opções (BAUMAN, 2013, p. 23 – grifo do autor).
Nesse sentido, o mínimo que se pode esperar é que os sujeitos sejam conduzidos
ao tipo de ensino e/ou aprendizagem conforme apresentado no segundo nível de
Baterson, ou seja, destinada à produção de “mísseis inteligentes”.
2.1.3 As presenças “Eu-Tu”, “Eu-Isso” e “Alguém-Outros”
O dialógico é para Buber (2009) a forma explicativa do fenômeno inter-humano e,
assim, implica a presença ao evento de encontro mútuo. Nesse sentido, presença
significa presentificar e ser presentificado. Contudo, nesse diálogo de presenças, fazem-
se escolhas, nem sempre conscientes, porém necessárias.
Assim, conduzidos pelo aspecto filosófico e sociológico apresentado por Buber
(2009) e Bauman e May (2010), propõe-se, na Figura 1, um diagrama para apresentar a
compreensão que se teve dessa relação dialógica que permeia os processos de ensino
e/ou aprendizagem e a presença inter-humana nessa relação.
52
Figura 1 – Relação Dialógica Fonte: elaborado pela autora
Idealiza-se um esquema que coordene a concepção filosófica de Buber (2009) – a
relação Eu-Tu, com as concepções sociológicas de Bauman e May (2010) – a relação
Alguém-Outros.
Esse modelo de interação entre sujeitos envolve “regras”, segundo o grupo ao qual
pertencem os sujeitos. No entanto, os círculos vazados não limitam os indivíduos em
grupos fechados, permitindo a liberdade de escolhas, a flexibilidade e a mobilidade.
Porém, só se é considerado membro de um grupo, ao submeter-se às regras desse grupo
específico – eis o limite da liberdade. As setas representam aspectos subjetivos, externos
e internos à relação dialógica.
Pode-se admitir que a relação dialógica entre os conjuntos de atores de ambos os
círculos encontra na intersecção Eu-Tu a total reciprocidade (BUBER, 2009) e o mútuo
entendimento (BAUMAM; MAY, 2010). E, da interação dialógica onde ocorre o mútuo
entendimento, ou seja, o lugar do encontro, onde a totalidade do homem está presente e
onde existe total reciprocidade, origina-se um processo competente de ensino
aprendizagem, um processo capaz de transformar e de modificar os sujeitos.
Segundo Zuben (1984), o pronome pessoal Tu empregado por Buber não se refere
necessariamente a pessoas, assim como o Isso da relação Eu-Isso não se refere
unicamente a coisas ou objetos. “Ambos, Tu e Isso podem referir-se a pessoas, seres da
natureza, objetos de arte e mesmo Deus” (ZUBEN, 1984, p. 5).
53
Em “Diálogo e existência no pensamento de Martin Buber”, Zuben (1984) aponta
que se pode perceber que Eu-Tu e Eu-Isso ultrapassam ou se distinguem do modo
ordinário de se abordar as coisas e as pessoas, dirigindo-se a atenção sobre relações de
outro tipo que se estabelecem entre o homem e os seres que o envolvem no mundo
cotidiano, no seu universo cultural individual ou social, e não sobre seres ou objetos
individuais ou sobre as suas conexões causais.
Para Buber, a esfera primordial, quando se trata de relações humanas, é a esfera do "entre", lugar primordial e existencial onde acontecem os eventos autenticamente inter-humanos (ZUBEN, 1984, p. 5 – grifo do autor).
Assim, constituí-se um novo diagrama de forma a inserir o “Isso”, ampliando a
concepção inicial apresentada na Figura 1; pois a afirmação da primazia do diálogo no
qual o sentido mais profundo da existência humana é revelado não deve levar à
conclusão de que a atitude Eu-Isso seja algo negativo, inferior ou um mal. Ao contrário,
ela é uma das atitudes do homem face ao mundo, graças à qual a compreensão das
aquisições da atividade científica e tecnológica da história da humanidade é possível.
A diferença entre as atitudes não é ética mas ontológica. Não se deve distingui-las em termos de autenticidade ou inautenticidade. Enquanto humanas, as duas atitudes são autênticas. Quando, por esta razão, a relação perde o seu sentido de construtora do engajamento responsável para com a verdade do inter-humano, aí então, o Eu-Isso é destruição do si-mesmo, e o homem se toma arbitrário e submetido à fatalidade (BUBER, 2009, p. 30).
Dessa forma, acrescenta-se o círculo que se denomina objetos, o lugar do “Isso”;
que no caso específico, contém o Cálculo 1.
54
Figura 2 – Relação Dialógica em Aulas de Cálculo 1 Fonte: Elaborado pela autora
Nesse modelo, representa-se a interação dialógica que envolve o ensino e a
aprendizagem de Cálculo 1. Completa-se que é, nessa interação dialógica entre o Eu-Tu
e o Eu-Cálculo, que as transformações decorrentes dos processos de ensino e
aprendizagem de Cálculo 1 podem representar momentos de experiência.
Nessa relação, o diálogo é a forma explicativa do fenômeno inter-humano, que
implica a presença ao evento de total reciprocidade (BUBER, 2009). No encontro mútuo, a
transformação implica presença e a reciprocidade é a marca definitiva da atualização do
fenômeno da relação.
Pode-se admitir que, nesse processo de transformação, o indivíduo se depare com
a possibilidade ilimitada de comunicação, pela subjetividade que dialoga com a
objetividade. A distância entre o homem e a objetividade é a possibilidade dialética de
subjetivação.
É este o domínio da subjetividade, onde o Eu toma consciência simultaneamente tanto de seu vínculo quanto de sua separação. A autêntica subjetividade só pode ser compreendida de um modo dinâmico, como a vibração de um Eu no seio de sua verdade solitária. É aqui, também, o lugar onde irrompe e cresce o desejo de
55
uma relação cada vez mais elevada e absoluta, o desejo de uma participação total com o Ser. Na subjetividade amadurece a substância espiritual da pessoa (BUBER, 2009, p. 80).
A dinâmica do movimento de subjetivação significa a mobilidade da existência do
homem como ser, para com outro ente homem, respeitando a manifestação ontológica do
“entre” Eu e Tu. Segundo Buber (2009), o homem transformado em Eu e que pronuncia o
Eu-Isso se coloca diante das coisas em vez de confrontar-se com elas na ação recíproca.
Nesse sentido, toma uma atitude de passividade, sem, contudo ficar indiferente.
No relacionamento Eu-Isso, se o “Isso” está na presença do sujeito-Eu, não se
pode afirmar que o Eu está na presença do Isso. O Eu é determinado pela presença do
outro que está em sua presença-Tu. A alteridade é, portanto, constituinte dessa relação, é
como ser outra coisa que não o Eu, é como dizer algo que seja radicalmente outro. Para
Zuben (1984), talvez essa seja a base da afirmação de que o homem é um ser social.
Nessa direção, entende-se que em uma relação dialógica onde a totalidade do
homem e a reciprocidade mútua estão presentes, o professor pode tornar-se aluno e o
aluno, professor, pois, conforme Bauman (2013, p. 20) “aprendem no percurso”. Uma
relação como essa não passa sem que ocorram experiências. Nesse sentido, admite-se,
ainda, que outros fatores contribuam para a complexidade dos processos de ensino e
aprendizagem de Cálculo 1, e esses se fazem também presentes na relação entre o aluno
e Instituição.
A Instituição ocupa, dessa forma, também papel fundamental, pois pode tornar
mais simples os espaços para que o diálogo, presente na relação dos sujeitos com o
objeto, ocorra, contribuindo significativamente para que haja a reciprocidade e o
entendimento mútuos. A Instituição pode permitir a estrutura necessária para a condução
dos processos de ensino e/ou aprendizagem, contribuindo assim de forma expressiva
para esse encontro.
56
Dessa forma, admite-se a necessidade de complementar-se o diagrama proposto
na Figura 2; e opta-se por incluir o círculo em que a Instituição passa a fazer parte da
intersecção, ocupando também um espaço central nessa relação.
Figura 3 – Interação em Processo de Ensino e Aprendizagem de Cálculo 1 Fonte: Elaborado pela autora
Tem-se presente que se adentra em um campo complexo e ambíguo de estudo, e
assim, levado e submetido aos próprios confrontos e a relações repletas de
subjetividades.
Destarte, nessa composição teórica, busca-se o movimento do desconstruir e
reconstruir uma visão que, ao próprio olhar, não pode ser fincada em concepções
unilaterais. Pretende-se apresentar o movimento do Eu nessa relação que pode ocorrer
entre o Eu-Tu, o Eu-Isso, o Alguém-Outros, ou entre todos, simultaneamente.
O Eu, que se estabelece como sujeito desta investigação, é o sujeito em
“formação”, inserido no processo de ensino e/ou aprendizagem de Cálculo 1, que se
(auto) narra, que faz a experiência de si.
Dessa forma, sobre a constituição da experiência e da experiência de si, Larrosa
(1994, 2002, 2011) apresenta o campo onde se produzem subjetividades, ou seja, um
57
modelo teórico que pretende mostrar a lógica geral dos dispositivos pedagógicos que
constroem e permeiam a relação do sujeito consigo mesmo, e que se pretende
apresentar.
2.2 O sujeito e a experiência de si – o Eu
Concorda-se que conhecer o eu e conhecer o mundo envolve o desenvolvimento
de um meio objetivante de apreensão da realidade, meio este que não exclui o
conhecimento da subjetividade, porém, busca materializá-la no conhecimento.
Pode-se dizer que essa dialética da relação de conhecer desenvolva a superação
da tradição e exija a comunicação com o diferente, com o novo, permitindo o encontro
onde a totalidade do homem e a reciprocidade mútua estão presentes.
É nesse sentido que se acolhe os aspectos apontados por Larrosa (1994)
compostos pela recontextualização e o entrecruzamento de regimes discursivos diversos;
implicando, assim, algum tipo de relação do sujeito para consigo mesmo, e pelos quais
alguns exemplos poderiam ser dados por: "autoconhecimento", "autoestima",
"autocontrole", "autoconfiança", "autonomia", "autorregulação" e "autodisciplina",
permitindo a experiência.
Segundo Larrosa (1994, p. 38), as formas de relação do sujeito consigo mesmo
podem ser expressas quase sempre em termos de ação, com um verbo reflexivo:
“conhecer-se, estimar-se, controlar-se, impor-se normas, regular-se, disciplinar-se”, e
desconsiderando os diferentes tipos de fenômenos que designam, todos esses termos
se avaliam como antropologicamente relevantes na medida em que marcam componentes
que estão mais ou menos subentendidos naquilo que se entende significar ser humano,ou
seja, ser uma "pessoa", um "sujeito" ou um "eu". Todos esses termos quando usados no
contexto pedagógico se articulam normativamente e podem ser elaborados como se
fossem características normativas do sujeito formado ou equilibrado, para os quais as
práticas educativas deveriam contribuir para constituir, melhorar, desenvolver e,
eventualmente, modificar esses sujeitos.
58
Conforme Larrosa (1994), o sujeito construído como o objeto teórico e prático das
pedagogias se individualiza pelo "sujeito individual", caracterizado por certas formas
normativamente definidas de relação consigo mesmo.
O "sujeito individual" descrito pelas diferentes psicologias da educação ou da clínica, esse sujeito que "desenvolve de forma natural sua auto-consciência" nas práticas pedagógicas, ou que "recupera sua verdadeira consciência de si" com a ajuda das práticas terapêuticas, não pode ser tomado como um "dado" não-problemático. Mais ainda, não é algo que possa analisar-se independentemente desses discursos e dessas práticas, posto que é aí, na articulação complexa de discursos e práticas (pedagógicos e/ou terapêuticos, entre outros), que ele se constitui no que é (LARROSA, 1994, p. 40 – grifo do autor).
Larrosa (1994, p. 43) propõe um exercício de desfamiliarização, a fim de ver a ideia
que o sujeito tem de si mesmo. A História ou a Antropologia mostram a diversidade das
auto-interpretações, mas o que se faz, o modo como se comporta e o como se é, na
medida em que isso tem a ver com como se interpreta a si mesmo, também pode ser
posto em uma perspectiva histórico-antropológica, segundo esse autor.
A experiência de si, historicamente constituída, é aquilo a respeito do qual o sujeito oferece seu próprio ser quando se observa, se decifra, se interpreta, se descreve, se julga, se narra, se domina, quando faz determinadas coisas consigo mesmo, etc. E esse ser próprio sempre se produz com relação a certas problematizações e no interior de certas práticas (LARROSA, 1994, p. 43).
Ainda segundo esse autor, a análise da experiência de si tem como objetivo avaliar
as problematizações através das quais o ser se dá como podendo e devendo ser
pensado, e as práticas a partir das quais essas problematizações se formam.
Nesse sentido, concorda-se que se esbarrará nas problematizações presentes nos
processos de ensino e/ou aprendizagem de Cálculo 1, pois se entende que a construção
do conhecimento novo, possibilitada em aulas de Cálculo 1, está marcada pelas práticas e
problematizações que delas decorrem.
Assim, pondera-se que é possível refletir a partir do que os sujeitos podem deixar
revelar da experiência de si, considerando as aulas de Cálculo 1, no entanto, será preciso
atravessar os discursos.
59
Considerando uma aproximação foucaultiana, uma inversão condensada em duas
regras metodológicas é apresentada por Larrosa (1994). A primeira regra se refere a
interrogar os universais antropológicos em sua constituição histórica, isso significa não
tomar como ponto de partida as presentes concepções dominantes da natureza humana,
mas problematizar as ideias com respeito à autoconsciência, à autonomia ou à
autodeterminação, analisando as condições históricas de sua constituição na imanência
de determinados campos de conhecimento. A segunda regra seria tomar as práticas
concretas como domínio privilegiado de análise, não considerando as práticas como
espaço de possibilidades, como entorno organizado ou oportunidades favoráveis para o
desenvolvimento da autoconsciência, da autonomia ou da autodeterminação, mas como
mecanismos de produção da experiência de si, como dispositivos, por meio dos quais se
constitui uma vinculação entre certos domínios de atenção.
Em resumo, o ser humano, na medida em que mantém uma relação reflexiva
consigo mesmo, não é senão, o resultado dos mecanismos por meio dos quais essa
relação se produz e se intercede. Nesse sentido, não há lugar, segundo Larrosa (1994),
para os universais antropológicos, nem tão pouco para ocultar o caráter constitutivo, e não
meramente mediador, da pedagogia.
Nessas circunstâncias, os mecanismos são aqueles nos quais o ser humano se
observa, se decifra, se interpreta, se julga, se narra ou se domina, ou seja, basicamente,
aqueles nos quais aprende (ou transforma) determinadas maneiras de observar-se, julgar-
se, narrar-se ou dominar-se. Dessa forma, para Larrosa:
Um dispositivo pedagógico será, então, qualquer lugar no qual se constitui ou se transforma a experiência de si. Qualquer lugar no qual se aprendem ou se modificam as relações que o sujeito estabelece consigo mesmo (LARROSA, 1994, p. 57).
De certa forma, tomar os dispositivos pedagógicos como constitutivos da
subjetividade é adotar um ponto de vista pragmático sobre a experiência de si. É
reconhecer a contingência e historicidade desses mesmos dispositivos e adotar uma
perspectiva genealógica. A pedagogia é, desse modo, não apenas um espaço neutro ou
não problemático de desenvolvimento ou de mediação, ou um mero espaço de
possibilidades para o desenvolvimento, ou a melhoria do autoconhecimento, da
autoestima, da autonomia, da autoconfiança, do autocontrole, da autorregulação; mas
60
sim, uma produtora de formas de experiência de si nas quais os indivíduos podem tornar-
se sujeitos de um modo particular.
Em contrapartida, colocam-se os sujeitos dessa investigação como sujeitos
submetidos a dispositivos de construção e de mediação da experiência de si, e capazes
de encontrar elementos particulares e (auto) formadores nessa experiência. O sujeito
investigado ao apresentar seus relatos, quando se observa, se decifra, se interpreta, se
descreve, se julga, se narra, se domina, também toma consciência dessa transformação;
e o faz do textual para o representativo, numa tentativa de busca pela objetivação,
considerando que partem de memórias narradas em forma de pequenos textos, ou
relatos, para memórias representadas por meio de Mapas Conceituais Iniciais (MCIs)
sobre Derivadas.
Nesse caminho, um diálogo do Eu consigo mesmo pode ser identificado. O sujeito,
que é o próprio sujeito da experiência (LARROSA, 2002, 2011), expõe a si mesmo
quando se observa revivendo etapas de um dado conhecimento. Ele se julga, analisa a si
próprio e se observa. Ao mesmo tempo em que julga, analisa e observa o outro. Quando
faz esse movimento vê a si mesmo e vê o outro, reflete a si próprio e reflete o outro.
2.2.1. Ver a si próprio
Segundo Larrosa (1994), ver a si próprio é uma das formas privilegiadas de
metaforização do conhecimento, de compreensão do autoconhecimento, mas o
autoconhecimento aparece também como uma modalidade particular da relação sujeito-
objeto.
"Reflectere" significa "virar" ou "dar a volta", "voltar para trás" e, também, "jogar ou lançar para trás". Por outro lado, o termo tem explícitas conotações óticas na medida em que designa a ação mediante a qual as superfícies polidas fazem voltar a luz. Nesse último sentido, e por extensão, "reflexão" significa também a reprodução dos objetos nas imagens oferecidas por um espelho e o processo que tem lugar entre um objeto e sua imagem tal como esta aparece em uma lâmina polida (LARROSA, 1994, p. 59).
Dessa conotação ótica, o autoconhecimento aparece de forma análoga à
percepção que a pessoa tem de sua própria imagem, na medida em que pode perceber a
61
luz que foi lançada para trás por um espelho. Ou seja, haveria um desdobramento entre a
própria pessoa e uma imagem exterior de si. Desse modo, o autoconhecimento é uma
modalidade particular da relação sujeito-objeto. Nesse caso, o objeto percebido é a
própria imagem exteriorizada que, por certa propriedade da luz ao bater em superfícies
polidas, está diante do sujeito que vê. Para que o autoconhecimento seja possível, então,
requer-se certa exteriorização e objetivação da própria imagem, um algo exterior,
convertido em objeto, no qual a pessoa possa ver a si mesma.
No entanto, Larrosa (1994) aponta que a metaforização ótica do autoconhecimento
tem um sentido que não utiliza explicitamente o movimento reflexivo da luz. O
autoconhecimento é, nesse caso, algo como um “voltar o olho da mente para dentro”.
Haveria assim uma espécie de percepção interna dirigida das coisas exteriores, para si
mesmo. “Em si próprio haveriam "coisas" que se fazem visíveis ao se lhes prestar
atenção, ao dirigir a elas o próprio olhar” (LARROSA, 1994, p. 59 – grifo do autor). Essa
seria uma estrutura similar sujeito-objeto, ou seja, um processo de objetivação, embora
sem a exteriorização implícita na metáfora do espelho.
Essas coisas que existem dentro de mim são de alguma forma privadas, só eu posso vê-las, só eu tenho acesso a elas embora, isso sim, possa comunicá-las e "torná-las visíveis para os outros", através de algum procedimento, linguístico ou não, de exteriorização (LARROSA, 1994, p. 59 – grifo do autor).
Nessa acepção, a observação interna reproduziria o esquema ótico sujeito-objeto,
onde o objeto seria o conjunto de "coisas" que há dentro de si e que só pode ser visto
quando se volta o olho da mente para dentro. Contudo, passíveis de se tornarem visíveis
por meio de algum procedimento de exteriorização.
2.2.2 Procedimentos discursivos
Para Larrosa (1994), nos discursos a distribuição histórica do que se vê e do que
se oculta vai a paralelo à distribuição do que se diz e do que se cala. O visível com o
dizível, formas legítimas de olhar se relacionam com as formas legítimas de dizer. O
discurso é, segundo esse autor, numa perspectiva foucaultiana, o resultado sempre
conflitivo do entrecruzamento de regimes discursivos diversos, que dizem, e que fazem
62
falar, que lêem e interpretam seus signos, e que a classificam em função do que expressa
de si mesmo.
Contudo, deve-se levar em conta a autonomia do discurso e a instrução
metodológica de analisá-lo em si mesmo, pois tem suas próprias regras. O enunciado se
relaciona com outros enunciados e não com coisas, com conceitos ou com ideias. O
discurso é condição de possibilidade tanto do mundo de coisas quanto da constituição de
um falante singular ou de uma comunidade de falantes. O sujeito é uma variável do
enunciado.
As "coisas", os "estados de coisas" ou os "conceitos" que se nomeiam não são exteriores ao discurso; são, antes, variáveis do enunciado, a rigor, objetos discursivos. É o discurso, em suma, quem constitui um domínio de objetos como seu correlato (LARROSA, 1994, p. 28 – grifo do autor).
Deve-se ter em conta também a contingência de qualquer distinção entre
linguagem referencial e imaginativa (ciência e literatura) ou entre linguagem
representativa e mascaradora (ciência e ideologia). Tais distinções na perspectiva
foucaultiana são internas ao discurso, são variáveis do discurso. De determinados
regimes discursivos com suas regras se podem determinar o que é um discurso
verdadeiro, fictício ou ideologicamente enviesado. Não se trata, contudo, de diferenciar o
que há de cada uma dessas variantes no discurso, mas sim de determinar as regras
discursivas nas quais se estabelecem.
Nesse sentido, Larrosa (1994) considera que o funcionamento do discurso é
inseparável dos dispositivos materiais nos quais se produz; da estrutura e do
funcionamento das práticas sociais20 nas quais se fala e se faz falar, e nas quais se fazem
coisas com o que se diz e se faz dizer, conforme as práticas sociais analisadas por
Foucault. Da mesma forma, dada em relação aos procedimentos óticos da visibilidade, os
procedimentos discursivos criam ao mesmo tempo o sujeito e o objeto da enunciação.
Nessa perspectiva, tanto o sujeito quanto o objeto são funções do enunciado.
O discurso da pedagogia tal como é tratado em Vigiar e Punir, sobretudo em relação a esse aparato ao mesmo tempo ótico e enunciativo que é o exame,
20 [...] (um confessionário, um manicômio, uma prisão, um hospital, etc.) máquinas óticas e enunciativas que produzem, ao mesmo tempo, o sujeito que vê e as "coisas" visíveis, significantes e significados (LARROSA, 1994, p. 29).
63
constitui simultaneamente a subjetividade do professor e a do aluno (FOUCAULT, 1975 apud LARROSA, 1994, p. 29).
Esclarece ainda, que aprender um discurso legítimo e suas regras não significa
aprender elementos de expressão de si próprio, o que ocorre antes é que, ao aprender a
gramática da auto-expressão, constitui-se ao mesmo tempo o sujeito que fala e sua
experiência de si; pois considera a estrutura geral do expressar-se como a dobradura
reflexiva, sobre si próprio, dos procedimentos discursivos que constituem os dispositivos
de construção e mediação da experiência de si.
Desse modo, o discurso é um operador que constitui ou modifica tanto o sujeito
quanto o objeto da enunciação, o que conta como experiência de si. Ao inserir-se no
discurso, e participar das práticas de descrição e re-descrição de si próprio, aprendendo
as regras da gramática desse discurso, de seu vocabulário e de sua sintaxe, é que a
pessoa se constitui e transforma sua subjetividade.
2.2.3 Ver além das evidências
Muitas vezes em pesquisas, as afirmações, conclusões e indagações nas falas dos
sujeitos parecem evidentes. Assim como, pode ser evidente também, a forma como uma
auto-representação busca descrever momentos da relação dialógica inserida no processo
ensino e/ou aprendizagem de Cálculo 1.
Segundo Larrosa (1994) as evidências são o que todo mundo vê, o que é
indubitável para o olhar, ou, o que tem que aceitar-se apenas pela autoridade de seu
próprio aparecer. Assim, uma coisa é evidente quando se impõe ao olhar com tal
claridade que toda forma de dúvida é impossível. “És o que não vês?! Sim, aí está, olha, é
assim, aí o tens, é evidente! Só um louco ou um cego não o veria!” (LARROSA, 1994, p.
83).
Grande é, sem dúvida, o poder das evidências. Larrosa (1994) destaca que
Foucault se empenhou em mostrar a contingência das evidências e a complexidade de
sua fabricação. Nesse sentido, o que todo mundo vê nem sempre se viu assim. O que se
vê, pode também não ser o que parece.
64
Se o que é evidente, é o resultado de certa disposição do espaço, de uma
particular exposição das coisas e de uma determinada constituição do lugar do olhar,
então, quanto não se parece evidente uma suposição ou uma afirmação; mas, cabe
questionar a veracidade dessa suposição ou afirmação, pois as subjetividades também
constituem uma lente.
Dessa forma, precisa-se admitir a composição do olhar para a pesquisa que se
pretende desenvolver, a perspectiva, ou seja, a forma de constituir esse lugar do olhar. E
assim, admite-se inclusive naquilo que parece evidente, que se é muito menos livre do
que se pensa.
Contudo, Larrosa (1994) identifica que o olhar está constituído por todos esses
aparatos que fazem ver e ver de uma determinada maneira. Mas o que se propõe um
autor que pretende romper as evidências?
Talvez nos ensinar que nosso olhar é também mais livre do que pensamos. E isso porque o que o determina não é tão necessário nem tão universal quanto acreditamos. O que determina o olhar tem uma origem, depende de certas condições históricas e práticas de possibilidade e, portanto, como todo o contingente, está submetido à mudança e à possibilidade da transformação. Talvez o poder das evidências não seja tão absoluto, talvez seja possível ver de outro modo (LARROSA, 1994, p. 84).
Os lugares comuns do discurso são os que todos dizem, ou os que todos sabem.
Algo é um estereótipo quando convoca mecanicamente o assentimento, quando é imediatamente compreendido quando quase não há nem o que dizer (LARROSA, 1994, p. 84).
Nesse sentido, o que mostra que os homens são menos livres do que pensam,
segundo Larrosa (1994), são os procedimentos que fabricam os estereótipos do discurso
humano, os preconceitos da moral e os hábitos dos modos de se conduzirem, quando
falam, julgam ou fazem coisas. E que mostram também, sua contingência e a
possibilidade de falar de outro modo, de julgar de outro modo, de conduzir-se de outra
maneira.
65
Todas as operações de fabricação e captura do duplo21, de constituição e
mediação da experiência de si, indicam o poder das evidências, os estereótipos, os
preconceitos e os hábitos em si mesmos. Mas assinalam também sua finitude e
contingência. Sua análise não promete um duplo mais autêntico ou mais real ou mais
próximo ao que de verdade se é. Não promete uma identidade "verdadeira" à qual, sim,
poderiam se sujeitar.
2.3 “A experiência é isso que me passa”
Larrosa (2011, p. 2) pronuncia: “a experiência é isso que me passa”. Que fique
claro, não se confunda com experimento. Em “Experiência e Alteridade em Educação”, de
forma densa, Jorge Larrosa expõe um resgate ou o que se pode chamar de
ressignificação da experiência. Menciona o uso e abuso da palavra experiência em
Educação, que é quase sempre empregada de forma banalizada, sem a consciência de
suas possibilidades teóricas, críticas e práticas. E com relação ao “isso” da frase
pronunciada apresenta o princípio da alteridade da experiência:
A experiência é “isso que me passa”. Vamos primeiro com esse isso. A experiência supõe, em primeiro lugar, um acontecimento ou, dito de outro modo, o passar de algo que não sou eu. E “algo que não sou eu” significa também algo que não depende de mim, que não é uma projeção de mim mesmo, que não é resultado de minhas palavras, nem de minhas ideias, nem de minhas representações, nem de meus sentimentos, nem de meus projetos, nem de minhas intenções, que não depende nem do meu saber, nem de meu poder, nem de minha vontade. “Que não sou eu” significa que é “outra coisa que eu”, outra coisa do que aquilo que eu digo, do que aquilo que eu sei, do que aquilo que eu sinto, do que aquilo que eu penso, do que eu antecipo, do que eu posso, do que eu quero (LARROSA, 2011, p. 5 – grifo do autor).
O que pode ser também reconhecido como princípio da exterioridade ou da
alienação, significando que não há experiência sem a presença do outro, ou de um algo,
ou de um isso, de um acontecimento definitivo ou exterior ao Eu, estrangeiro ao Eu,
estranho ao Eu, ou seja, aquilo que está fora do sujeito.
21 Entre o sujeito e seu duplo que se tornou visível como imagem no espelho, entre o sujeito e aquilo de si mesmo que se tornou visível ao dar-se ao olhar, se intercala um critério (LARROSA, 1994, p. 35).
66
Na experiência, a exterioridade, a alteridade, ou a alienação não devem ser
apropriadas, mas devem manter-se como são. A experiência não reduz o acontecimento,
mas o sustenta como irredutível.
Nessa direção, sua justificativa para o “me”, da mesma frase, leva ao princípio da
“Reflexividade, Subjetividade, Transformação”. A experiência supõe que algo que não é o
Eu, ou seja, um acontecimento exterior ao Eu, que ao passar, não se coloque apenas
diante do Eu, mas o atravesse.
A experiência supõe, como já afirmei, um acontecimento exterior a mim. Mas o lugar da experiência sou eu. É em mim (ou em minhas palavras, ou em minhas ideias, ou em minhas representações, ou em meus sentimentos, ou em meus projetos, ou em minhas intenções, ou em meu saber, ou em meu poder, ou em minha vontade) onde se dá a experiência, onde a experiência tem lugar (LARROSA, 2011, p. 6).
A experiência se dá por vontade do próprio Eu. Isso porque esse sujeito sensível,
vulnerável e ex/posto, é um sujeito aberto a sua própria transformação, ou seja, à
transformação de suas palavras, de suas ideias, de seus sentimentos, de suas
representações. É, portanto, o Eu, o lugar da experiência. Assim, Larrosa define o
“princípio de subjetividade”, ou “princípio de reflexividade” ou da “transformação”.
E com relação ao “passar”, define que a experiência é um passo, uma passagem,
um percurso. Se a palavra experiência tem o ex de exterior, tem também esse per, com
significado de travessia, passagem, caminho, viagem. Assim, a experiência supõe uma
saída de si para outra coisa, como se fosse uma passagem para o isso de “isso que me
passa”. Assim, Larrosa (2011) define o princípio da passagem, mas dá também outro
sentido a esse território de insegurança, de perigo e de incerteza.
Se a experiência é “isso que me passa”, o sujeito da experiência é como um território de passagem, como uma superfície de sensibilidade em que algo passa e que “isso que me passa”, ao passar por mim ou em mim, deixa um vestígio, uma marca, um rastro, uma ferida (LARROSA, 2011, p. 5 – grifo do autor).
Daí que o sujeito da experiência não seja, em princípio, um sujeito ativo, um agente
de sua própria experiência, mas um sujeito paciente, passional, contudo, não pode ser
67
confundido com passivo, pois não fica indiferente à passagem. Ou, dito de outra maneira,
a experiência não se faz, mas se padece. A este segundo sentido do passar de “isso que
me passa” chama de “princípio de paixão”.
E, dessa forma, apresenta as várias dimensões da experiência. Exterioridade,
Alteridade e Alienação, relativo ao acontecimento, com o que é da experiência, com o isso
do “isso que me passa”; Reflexividade, Subjetividade e Transformação, referindo-se ao
sujeito da experiência, com o quem da experiência, com o me de “isso que me passa”; e
Passagem e Paixão, determinando o movimento da experiência, o passar do “isso que me
passa”.
Larrosa (2011) argumenta ainda, que a palavra experiência está contaminada de
empirismo, portanto, se confunde com experimento; e completa que está também
contaminada pelo pragmatismo, portanto, se confunde com a prática. É preciso apartar
esses sentidos que contaminam à experiência.
A experiência não é a prática, embora se admita que a prática possa dar lugar à
experiência. E, assim, apresenta mais quatro palavras a fim de dar sentido à experiência,
definidas como: Singularidade, Irrepetibilidade, Pluralidade e Liberdade.
A experiência é sempre singular, o que quer dizer que, para cada sujeito, a
experiência é única. A experiência se abre ao real como singular, isto é, como
acontecimento, e acontecimento precisamente singular, e desse modo, é inidentificável,
irrepresentável, incompreensível, incompatível, irrepetível. A experiência também
singulariza o acontecimento. A possibilidade da experiência supõe a suspensão de uma
série de vontades: a vontade de identificar, a vontade de representar, a vontade de
compreender. A possibilidade da experiência supõe, em suma, que o real se mantenha
em sua alteridade constitutiva.
O sujeito da experiência, esse sujeito que temos caracterizado já como aberto, vulnerável, sensível e ex/posto, é também um sujeito singular que se abre à experiência desde sua própria singularidade. Não é nunca um sujeito genérico, ou um sujeito posicional. [...] A possibilidade da experiência supõe, então, a suspensão de qualquer posição genérica desde a que se fala, desde a que se pensa, desde a que se sente, desde a que se vive. A possibilidade da experiência supõe que o sujeito da experiência se mantenha, também ele, em sua própria alteridade constitutiva (LARROSA, 2011, p. 15).
68
A experiência supõe o princípio da Irrepetibilidade. Se um experimento tem que ser
repetido e sempre igual, ao contrário a experiência é irrepetível. E cita Levinas sobre a
experiência de se ter um filho, pois embora se possam ter vários filhos, a experiência de
cada filho é sempre única e irrepetível.
Levinas (1997) diz que todo filho é (como a experiência), de alguma maneira, o primeiro filho, que todo filho é filho único. Porque a experiência da paternidade ou da maternidade é, em cada caso, distinta. Quando alguém tem três filhos, ele não faz três vezes a mesma experiência (LARROSA, 2011, p. 13).
Argumenta que experiência sempre tem algo de surpreendente, como a leitura de
um poema, sempre tem algo de novo. Pensa-se que seja como ouvir uma música
orquestrada, em que cada um é capaz de construir imagens distintas enquanto é
envolvido pela sonoridade.
Para Larrosa (2011), muitas coisas que se aprende na experiência são coisas que
anteriormente já eram conhecidas, mas das quais não se davam conta. A experiência é
esse “dar-se conta”, como ocorre em uma descoberta.
A experiência também é plural, mesmo sendo singular. É uma soma de
singularidades, é a pluralidade. Uma comunidade de experiência (Larrosa, 2011) é uma
comunidade plural, ou seja, é aquela comunidade que não se define pelo que os
indivíduos têm em comum, pois a única coisa que compartilham é o espaço onde
desfecham suas experiências que são únicas, singulares.
E a experiência supõe a liberdade. Mas não a liberdade dependente, e sim o estar
livre. O sujeito da experiência é livre, pois se a experiência ocorre, ela é livre. Nesse
sentido, o sujeito da experiência não depende da tutela de outrem. Sentir-se livre é não
ter certeza do resultado de um acontecimento.
E talvez por isso, tenta-se muitas vezes proteger os sujeitos da experiência, pois
consideram que os protegem de perigos e incertezas, ou seja, do que não há como
prever. A experiência supõe um risco, uma aventura, uma passagem para a incerteza.
69
2.3.1 A experiência e as aulas de Cálculo 1
Em “La experiencia da leitura. Estúdios sobre literatura y formación”, Larrosa (2004)
anuncia que pensar a leitura, do ponto de vista da experiência, não do ponto de vista da
compreensão, mas da experiência e, concretamente, do ponto de vista da experiência de
formação, trata-se de pensar a transformação do sujeito – a leitura é algo que forma. E
pensar a leitura como formação implica pensá-la como uma atividade, que tem a ver com
a subjetividade do leitor, com o aquilo que o leitor é, não somente com o que sabe.
Nessa perspectiva, a leitura como formação apresenta uma relação entre o texto e
a subjetividade, uma relação traduzida como uma experiência de um modo particular. A
experiência é “aquilo que me passa”. Nessa relação o importante não é o texto, mas a
relação com o texto.
Complementa que esse saber da experiência tem características essenciais, de um
saber finito, ligado ao amadurecimento do individuo e revelador da própria finitude
humana. É um saber particular, subjetivo, relativo, pessoal - duas pessoas, embora
enfrentem o mesmo acontecimento, não fazem a mesma experiência. Ainda, nada se
pode garantir, ou seja, nada se pode aprender da experiência do outro a menos que essa
experiência seja de algum modo, revivida. O saber da experiência não está, como o
conhecimento científico, fora dos sujeitos.
Desse modo, busca-se uma forma de apropriar-se do campo da realização da
leitura exposto por esse autor, e pensar em situações ou eventos pelos quais se passam
em aulas de Cálculo 1, e que até possam nada significar, ou em nada sensibilizar, por não
produzirem nenhuma transformação nos sujeitos; e, nesse sentido, não alterariam sua
condição inicial, ou seja, não seriam capazes de alterar a forma anterior, ou de
transformar os sujeitos.
Muitas vezes os estudantes assim se posicionam em relação às aulas de Cálculo 1,
dizendo que nada lhes acontece. Admitem que nenhuma influência foi exercida sobre
eles, ou que nada do que estudaram se agregou a seus conhecimentos, assim, não
restaria sequer uma marca.
Nesse aspecto, poder-se dizer que não fizeram a experiência com o conhecimento
novo proporcionado em aulas de Cálculo 1. Mas, como seria possível chegar ao final de
70
um curso de Cálculo 1 sem ter feito uma passagem, ou uma travessia, sem ter sofrido
qualquer forma de transformação? Argumenta-se que alguma coisa aconteça, ou seja,
que a experiência ocorra, mesmo que não seja da forma planejada.
Para Larrosa (2004), o professor, ao querer transmitir a seus alunos o que um texto
diz, tenta antecipar o resultado de uma leitura, e nessa tarefa as atividades de leitura dos
alunos seriam simples experimentos, simples meios para chegar-se a um saber previsto
de antemão e construído segundo critérios de verdade e objetividade.
Dessa forma, professores de Cálculo 1, analogamente, ao tentarem transmitir a
seus alunos os conteúdos dessa disciplina, como o conceito de Derivada, ou as Regras
de Derivação, assim como as Aplicações da Derivada, não seriam também simples
antecipadores de resultados, ou fazedores de experimentos na busca por resultados
esperados e objetivados em seus planos de ensino? Estariam, portanto, impedindo a
experiência e contribuindo para que nada acontecesse a esses alunos em relação ao
conhecimento matemático específico das aulas de Cálculo 1?
Segundo Larrosa (2004), o professor tem sua experiência de leitura e pode mostrá-
la; mas tal atitude não significa mostrar um saber a que se tenha chegado ainda que dito
como provisório, particular ou relativo. Assim como, ensinar a ler não é colocar o saber do
professor contra o saber ainda insuficiente do aluno, mas sim, colocar uma experiência
junto a outra.
Nessa compreensão, o professor de Cálculo 1 também pode ser submetido. E,
assim como o professor de leitura, pode mostrar sua experiência, colocando-a junto à do
aluno. Essa seria uma relação capaz de levar à descoberta, ao surpreendente, ao novo, à
experiência que transforma, que modifica, que agrega e que deixa sua marca.
Não há sentido em querer proteger-se, ou proteger o outro da experiência, embora
isso seja recorrente nesses espaços de condução muitas vezes guiada, em que se
mostram experiências anteriores, a fim de dar uma direção, ou seja, atingir um resultado
comum, porquanto pode apenas significar um risco, um perigo, pois não se pode prever a
experiência do sujeito.
No entanto, permitir a experiência não é privilégio do professor, pois tudo há de
considerar-se nesse acontecer. O espaço da aula de Cálculo 1 é um espaço plural, no
71
qual se encontra uma comunidade plural, que se admite, conforme Larrosa (2011), não
definir-se pelo que os sujeitos têm em comum, mas pela possibilidade de experiência de
cada um, que são singulares, pois cada sujeito a vivencia de forma distinta, única. A forma
como um sujeito se apropria dos acontecimentos do Cálculo 1, como exemplo, do
conceito de Derivada, é singular, é única e é agregadora para a formação desse sujeito,
quer seja ele estudante de Cálculo de cursos de Engenharia, estudante de curso de
Licenciatura em Matemática, ou seja um futuro professor de Matemática, ou o próprio
formador nesses cursos. Assim, a todos é possível a experiência da descoberta em aulas
de Cálculo 1.
Contudo, dado que a experiência é uma relação, o importante não é o conteúdo,
mas a relação com o conteúdo, e nesse aspecto, não somente a Matemática é agregada,
mas também sentimentos, emoções, sentidos, angústias entre outros. Ao passar por
experiências em Cálculo 1, estudantes e professores são transpassados por essas
marcas. E é nesse sentido que se pretende reconstruir as proposições evidenciadas pelos
sujeitos, e propor que existe uma relação dialógica que considera a existência dos sujeitos
da experiência e os coloca como lugar da experiência (LARROSA, 2011). Dessa forma,
apresenta-se uma última construção dada pela Figura 4.
Figura 4 – O lugar da experiência em aulas de Cálculo 1 Fonte: Elaborado pela autora
72
Na intersecção de todos os círculos pontilhados estão os sujeitos da experiência,
ou seja, os principais protagonistas da relação dialógica ocorrida nos processos de ensino
e/ou aprendizagem de Cálculo 1. Nesse sentido, Professor e Estudantes representam o
lugar da experiência nas aulas de Cálculo 1. O sujeito da experiência é o sujeito livre,
capaz da mobilidade, da fluidez, da flexibilidade. Os círculos pontilhados representam a
possibilidade da mobilidade, da escolha.
Mas, a experiência não depende de outrem, ou de qualquer objeto, pois o lugar
onde se personifica é um território livre, como dito, representado pelos próprios sujeitos da
experiência, nesse caso, os dois conjuntos de atores capazes dessa realização no
momento da duração da aula de Cálculo 1.
Todavia, não há experiência sem a presença do outro, ou de um algo, ou de um
isso, de um acontecimento definitivo, ou exterior ao sujeito que a vivencia, portanto,
estranho, ou seja, aquilo que está fora.
Nesse sentido, a influência de elementos internos ou externos a essa relação que é
dialógica está representada pelas setas, apontadas ora para dentro dos círculos, ora para
fora, representando interações intrínsecas e extrínsecas, que contribuem para que os
sujeitos tenham cada um, a sua experiência particular.
O sujeito da experiência, aquele que é atravessado por ela, jamais é um sujeito
passivo, indiferente, pois ela, em aulas de Cálculo 1, de alguma forma acontece, deixa
sua marca.
No próximo Capítulo, apresentam-se as escolhas metodológicas. Intenciona-se
exibir os elementos que contornaram os estudos e que permitiram conduzir uma linha
metodológica para esse trabalho. Assim como, pretende-se evidenciar o perfil dos sujeitos
investigados e a caracterização do lugar de pesquisa.
73
3 ORIENTAÇÕES METODOLÓGICAS
Esta investigação tem a intenção de impetrar uma pesquisa qualitativa, com
dados quantitativos, em uma dimensão interpretativa e descritiva. Nesta
investigação, recorre-se a uma análise de conteúdo, conforme sugere Bardin22
(2009), e cujos aspectos teóricos, de maior proeminência ao trabalho, serão
destacados no decorrer deste Capítulo. Pretende-se, defender suposições que
admitam aos indivíduos a capacidade de procurar entender o mundo com o qual
interagem, observados os significados subjetivos de suas experiências. Diante
desses significados, apontam-se suposições que ao contrário de estreitar o próprio
ponto de vista, apresentam a complexidade do fenômeno filosófico e social
colocados sob a investigação.
Entende-se que frequentemente, significados subjetivos são negociados
social e historicamente, e são formados pela interação entre os indivíduos,
submetidos a normas históricas e sociais. Dessa forma, admitem-se as
subjetividades dos sujeitos investigados e do pesquisador, que devem ser
reconhecidas, e devem moldar interpretações e posicionamentos na condução da
análise pretendida e das considerações e resultados alcançados.
A estrutura de análise deve constituir-se em duas etapas. Uma primeira
análise relacionada às unidades textuais, propostas a partir dos relatos dos sujeitos
investigados em resposta às abordagens 1 e 2, quando estes serão solicitados a
comentar sobre a disciplina de Cálculo 1, e a comentar sobre seu desempenho nesta
disciplina. Especificamente, nessa etapa, analisar-se-á os relatos de 186 estudantes
de Cálculo 1. E, uma segunda etapa, relacionada à análise de Mapas Conceituais
Iniciais. Nessa etapa, por meio do critério especificado no Capítulo 5, reduzir-se-á o
tamanho da amostra, a fim de atingir o objetivo pretendido nesta pesquisa.
22 Optou-se pela reimpressão revista e atualizada de 2009 da obra de Bardin, do original
L'Analyse de contenu, Presses Universitaires, France, 1977.
74
Ressalta-se que a estrutura proposta para esta investigação implica apenas
em uma demarcação dos espaços de análise, não havendo uma ordem ou
hierarquia entre os contextos propostos.
3.1 A Análise de Conteúdo e as fases da análise
A fim de dar uma forma ao processo de análise se pretende conduzir uma
análise de conteúdo. Nesse sentido, a obra “Análise de Conteúdo” de Laurence
Bardin (2009) sugere a base consistente no rigor metodológico e na organização dos
dados com o propósito da compreensão aprofundada do método, e ao mesmo
tempo, apresenta um caminho multifacetado ao pesquisador.
Segundo Bardin (2009), a Análise de Conteúdo é desenvolvida como um
conjunto de técnicas de análise de comunicações, que utiliza procedimentos
sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, ou seja, um
método que, historicamente e cotidianamente, produz sentidos e significados a partir
da diversidade de amostragem presentes no meio acadêmico.
Em sua obra Bardin se aprofunda na questão do método e técnicas, no que
diz respeito à organização da análise; à codificação de resultados; às
categorizações; às inferências; e à informatização da análise das comunicações.
Para Bardin (2009), a Análise de Conteúdo deve ter como ponto de partida uma
organização.
Nessa perspectiva, a Análise de Conteúdo se faz pela prática, e suas
diferentes fases – desde que construídas a partir de uma amostragem representativa
do universo – se organizam em torno de três diferentes pólos: “1. A pré-análise; 2. A
exploração do material; e 3. O tratamento dos resultados: a inferência e a
interpretação” (BARDIN, 2009, p. 121).
A pré-análise compreende a organização das fontes de informação e demais
materiais selecionados, a fim de alcançar a apropriação do objeto e fixação do
campo no qual o pesquisador deve focar sua atenção. Corresponde a um período de
75
intuições, com fins operacionais a fim de sistematizar as ideias inicias, de modo a
dar consistência ao desenvolvimento do plano de análise que será posteriormente
seguido.
A exploração do material faz referência a uma descrição analítica, por meio da
qual e a partir do material reunido que constitui o corpus da pesquisa, inicialmente
orientado pelas hipóteses de pesquisa e referencial teórico, dão origem a quadros de
referências e suposições coincidentes ou divergentes. Para Bardin (2009), se tais
operações forem convenientemente exploradas, a análise, propriamente dita, não
será mais do que a administração sistemática das decisões tomadas.
Por fim, o tratamento dos resultados obtidos e interpretações, ou seja, a
conclusão a partir da análise. Nessa fase, os resultados são tratados de forma a se
tornarem significativos (falantes). Nesse sentido, o analista, de posse dos resultados
significativos pode fazer inferências e adiantar interpretações acerca dos objetivos
previstos.
Nessa direção, elege-se um corpo formado por estudantes matriculados em
cursos superiores de Engenharias de Alimentos, de Energia Renováveis e de
Ambiente, de Computação, de Produção e Química, e de Licenciatura em
Matemática, Física e Química de uma Universidade Pública Federal. Os estudantes
em questão foram selecionados a partir de um convite direcionado aos sujeitos que
já haviam cursado a disciplina de Cálculo 1 na Instituição em que se coletou os
dados para esta pesquisa.
A escolha por tal campo específico do conhecimento diz respeito a que, nesse
domínio, encontra-se solidificada uma problemática que se coloca sobre essa
disciplina, mencionada na introdução deste trabalho e corroborada na revisão de
literatura. Parte-se, portanto de um cenário no qual a disciplina de Cálculo 1 abarca
resultados fortemente negativos que são visíveis no desempenho de estudantes
dessa disciplina e que, por conseguinte, refletem-se nos resultados das Instituições
de formação superior. Contudo, esta investigação não intenciona revelar os motivos
de resultados aparentemente catastróficos colocados do ponto de vista acadêmico,
mas sim, deseja apresentar o que os investigados revelam sobre o conteúdo de
76
Derivada estudado na disciplina de Cálculo 1 e sobre suas experiências nesta
disciplina.
3.1.1 Aproximação do objeto de pesquisa
Na ocasião, três estudantes do curso de Licenciatura em Matemática, que
doravante serão identificados pelos codinomes de Mariana, Gabriela e Carlos a fim
de preservar suas identidades, foram envolvidos na elaboração de um memorial de
formação, constituído ao longo de três meses. Esses estudantes se encontravam
matriculados a partir do 6º semestre do curso de Licenciatura em Matemática, ou
seja, entrando em fase de conclusão do curso, sendo esse, um dos critérios de
escolha desses sujeitos. Acerca de suas próprias dificuldades em Cálculo 1
revelaram a complexidade dessa relação dialógica. Referiram-se às próprias
dificuldades, quando essas existiram; e às dificuldades de outros, quando não
encontradas complicações em sua própria relação com a disciplina; no entanto,
sempre oferecendo justificativas fora do Cálculo 1 para essas dificuldades.
Primeiramente nos limites mais simples o problema foi o “trabalho” com polinômios, pois a maioria precisava de simplificação para que o limite existisse. Nesse caso, acredita-se na deficiência da escola básica, mas mesmo assim se o professor de cálculo fosse preparado para tal, provavelmente se daria conta que o problema era anterior (Mariana).
O grau de dificuldade, na minha visão, aumentou quando passamos ao cálculo diferencial. Quando o foco das aulas passou a ser então as aplicações, aí todo o transtorno passou. Pude enfim, parar de realizar a maioria dos cálculos mecanicamente, e passei a ter consciência do que estava fazendo e só então verdadeiramente pude considerar que havia aprendido, absorvido finalmente a essência do que me foi transmitido (Gabriela).
Como monitor, percebi que muitos dos alunos que ingressaram em um curso de Ciências Exatas, independente de ser um curso de Engenharia ou de Licenciatura, vem com muita dificuldade de conhecimento de conceitos de matemática básica, dificultando o seu rendimento e até mesmo seu prosseguimento na Universidade, tornando a disciplina de Cálculo I (tão fundamental para o prosseguimento de qualquer curso) em uma “vilã” e em uma grande dor de cabeça tanto para os alunos como para os professores (Carlos).
Tentou-se, junto a esses primeiros sujeitos, levar ao dimensionamento de
fatos relacionados especificamente à Matemática inserida no contexto das aulas de
77
Cálculo 1. No entanto, não falaram muito sobre a Matemática dessas aulas.
Continuadamente, e de forma um tanto superficial, até mencionaram conteúdos que
remetessem ao Cálculo 1. Cabe destacar a compreensão de Mariana apontada no
recorte anterior, “nos limites mais simples o problema foi o “trabalho” com
polinômios, pois a maioria precisava de simplificação para que o limite existisse”,
evidenciando um entendimento distorcido para o cálculo do limite das formas
indeterminadas. Os três estudantes tomaram grande parte do memorial descrevendo
sentimentos, emoções, a relação professor-aluno, a empatia ou não com a disciplina,
dando uma impressão inicial de que talvez não soubessem falar sobre o Cálculo 1,
como se lhes faltassem as palavras, ou o entendimento, talvez a compreensão do
conteúdo.
Enfim, esta disciplina marcou minha vida acadêmica tanto para ampliar meus conhecimentos (constatando a Matemática mais como uma ciência), como para desenvolver em mim um olhar de educador (Carlos)
[ ...] na disciplina de Cálculo I vivenciávamos um novo momento de angústia, com aulas “engessadas” numa abordagem tradicional baseada em quadro e giz, e com pouca ou nenhuma sensibilidade do educador para perceber o quanto aqueles conteúdos que pra ele eram como “2+2=4” se tornavam uma barreira em nosso desenvolvimento enquanto acadêmicos... (Gabriela)
As subjetividades se personificaram nesse momento, e por meio de seus
relatos falaram da base matemática que não tiveram, da didática de alguns
professores, das dificuldades com as listas de exercícios, ou seja, de forma a
apresentar uma justificativa para os resultados nem sempre positivos na disciplina.
Contudo, foi demonstrado também certo encantamento pela disciplina, e até certo
“deslumbramento”. Por não ter dificuldades, o estudante Carlos se demonstrou
seguro ao falar dos conteúdos trabalhados em Cálculo 1, e apontou as dificuldades
que observou em outros estudantes da disciplina.
Dessa forma, percebe-se como oportuno repetir a coleta de dados, porém,
não mais por meio de memoriais, embora permitindo as pequenas narrativas em
forma de comentários ou relatos, pois em alguns aspectos as falas se mostraram
recorrentes nos três memoriais. Assim, acrescentaram-se outros critérios, de forma a
levar o sujeito investigado a revelar aspectos da sua experiência como estudante da
78
disciplina, que inclui considerar aspectos específicos do Cálculo 1, ou seja,
relacionados a algum conteúdo abordado nessa disciplina.
3.1.2 Os sujeitos e a Instituição em pesquisa
A partir de então, propôs-se para a fase principal de coleta de dados,
considerar um número maior de sujeitos e de cursos em que a disciplina de Cálculo
1 tivesse sido ministrada, assim como, a considerar um maior número de semestres
em que esses sujeitos pudessem estar matriculados, com o objetivo de atingir dados
mais representativos do todo. Dessa forma, não se priorizou mais o curso de
Licenciatura em Matemática e nem o sujeito concluinte, mas os sujeitos que haviam
concluído a disciplina de Cálculo 1 em algum curso da Universidade em pesquisa.
Nesse aspecto, levantaram-se informações acerca do perfil dos sujeitos
investigados, e um panorama geral da Instituição no que diz respeito aos resultados
de estudantes matriculados em um dos cursos de graduação mencionados.
Para Bardin (2009), diz-se rigorosa uma amostragem se a amostra for uma
parte representativa do universo inicial, e nesse sentido.
Nem todo o material de análise é susceptível de dar lugar a uma amostragem, e, nesse caso, mais vale abstermos-nos e reduzir o próprio universo (e, portanto, o alcance da análise) se este for demasiado importante (BARDIN, 2009, p. 123).
Nessa perspectiva, a amostra contou com um número de 186 estudantes
matriculados nos cursos de: Engenharia de Alimentos (EA); Engenharia de
Computação (EC); Engenharia de Produção (EP); Engenharia de Energias
Renováveis e de Ambiente (ER); Engenharia em Química (EQ); Licenciatura em
Física (LF); Licenciatura em Matemática (LM) e Licenciatura em Química (LQ),
distribuídos de acordo com o número de sujeitos investigados em cada curso
conforme apresentado no Quadro 1.
79
Quadro 1 – Número de sujeitos investigados por curso
CURSOS EA EC EP EQ ER LF LM LQ Total
Número de sujeitos 13 13 41 50 13 10 39 07 186
Sobre os sujeitos investigados foram levantados aspectos relacionados aos
resultados finais obtidos na disciplina de Cálculo 1, representados pelos dados
apontados no Quadro 2, onde se pode notar que um percentual de
aproximadamente 60% diz respeito a estudantes que foram aprovados na primeira
vez que cursaram a disciplina, em que um percentual próximo aos 40% teria sido
reprovado pelo menos uma vez em Cálculo 1.
Os dados a seguir apresentam a distinção para o número de reprovações
nessa disciplina. A respeito dos percentuais apresentados, referem-se a períodos
distintos, portanto, não podem indicar uma estatística sobre o perfil geral dos
resultados da Instituição ou para os cursos pesquisados.
Quadro 2 – Resultados finais de acordo com o percentual de sujeitos e o número de vezes que cursaram a disciplina de Cálculo 1.
CURSOS Nº de
Sujeitos %
Quantidade de vezes que cursou Cálculo 1
1 vez
% 2
vezes %
3 vezes
% 4
vezes %
EA 13 6,99 5 38,50 6 46,20 1 7,69 1 7,70
EC 13 6,99 6 46,20 6 46,20 1 7,69 0 0,00
EP 41 22,04 22 53,70 15 36,60 4 9,76 0 0,00
EQ 50 26,88 33 66,00 14 28,00 2 4,00 1 2,00
ER 13 6,99 7 53,90 4 30,80 1 7,69 1 7,70
LF 10 5,38 7 70,00 3 30,00 0 0,00 0 0,00
LM 39 20,97 26 66,70 11 28,20 2 5,13 0 0,00
LQ 7 3,76 3 42,90 3 42,90 1 14,30 0 0,00
Total 186 100 109 58,60 62 33,30 12 6,45 3 1,60
80
Sobre o total de aprovação e reprovação gerais nos cursos em questão,
relativos à disciplina de Cálculo 1, têm-se informações a respeito dos dados totais e
atinentes ao período compreendido entre os anos 2009/semestre1 a
2012/semestre1, conforme Quadro 3 a seguir. Para os ano de 2012, semestre 2 e
2013, até o momento dessa coleta de dados, não se obteve informações oficiais.
Quadro 3 – Resultados gerais em aprovação e reprovação em Cálculo 1, dos cursos investigados, no período de 2009/Sem.1 a 2012/Sem.1.
CÁLCULO 1 2009
Sem. 1 2009
Sem. 2 2010
Sem. 1 2010
Sem. 2 2011
Sem. 1 2011
Sem. 2 2012
Sem. 1 Total no período
Nº de Aprovados 95 32 87 105 79 79 108 585
% de Aprovados 49,48 32,32 28,62 52,5 24,01 44,63 26,93 45,73
Nº de Reprovados 97 67 217 95 250 98 293 1117
% de Reprovados 50,52 67,68 71,38 47,5 75,99 55,37 73,07 85,86
Total parcial (TP) 192 99 304 200 329 177 401 1702
% sobre TP 11,28 5,82 17,86 11,75 19,33 10,4 23,56 100
Fonte: Dados Intitucionais
Ainda, a respeito desses dados, nota-se que no semestre 1 de 2012, a
disciplina de Cálculo 1 foi ministrada a 401 estudantes. Nos sete semestres
considerados no período, a disciplina foi ministrada para uma média de 243 alunos
por semestre. Entende-se como relevante apontar essas informações a fim de
apresentar uma comparação plausível acerca do número de estudantes
considerados na amostra deste trabalho, pois embora os sujeitos não sejam
estudantes de um mesmo semestre na disciplina de Cálculo 1, o número de 186
sujeitos que aceitaram o convite para participar desta pesquisa é significativo.
Acerca da Instituição, ou do campus no qual foi perpetrada a coleta de dados
para a presente pesquisa, trata-se de um dos campi de uma Instituição Pública
Federal brasileira, relativamente nova em relação ao tempo em funcionamento, pois
faz parte do programa de expansão das universidades federais no Brasil. Tal
Instituição foi criada com o intuito de minimizar o processo de estagnação econômica
onde está inserida, com a finalidade de viabilizar o desenvolvimento regional, como
um agente de definitiva incorporação da região em que se localiza. Pode-se, além
81
dessa função, apontar que a Instituição em pesquisa atende a estudantes de várias
regiões do Brasil, e passa por um crescente aumento do número de estudantes
matriculados em seus cursos de graduação desde sua criação.
A Instituição em foco tem se mostrado em amplo desenvolvimento.
Atualmente, possui 60 cursos de graduação, 26 de pós-graduação, entre esses 10
mestrados e 1 doutorado. Entre os anos de 2010 e 2012, foram criados 12 novos
cursos de graduação. Verifica-se um crescimento contínuo do número de estudantes
ingressantes e matriculados na Instituição, conforme aponta a Divisão de Dados
Institucionais, e observados os dados de estudantes matriculados, verificou-se um
número de 6.445 matriculados nos cursos de graduação em 2010; 8.030 em 2011 e
9.342 no ano de 2012, demonstrando um crescimento de aproximadamente 45% no
número de matrículas nos cursos de graduação nesse período.
Em relação ao número de estudantes ingressantes nesse mesmo período,
correspondem a 2.855, 2.989 e 3.542, respectivamente; representando um
crescimento de 24% no número de ingressantes na Instituição. Cabe destacar, que o
campus no qual se realizou a coleta de dados, em número de estudantes
ingressantes, apresentou para os anos de 2010, 2011 e 2012, os números 569, 559
e 606, respectivamente, no que se refere a matrículas em cursos de graduação. E
no que diz respeito ao número de estudantes concluintes, desse mesmo campus,
para os anos de 2010, foram 15; para 2011 totalizou 114 e para 2012 foram 117
estudantes concluintes nos cursos de graduação.
Nesse mesmo período o número total da evasão no campus chegou a 257
para o ano de 2010; 462 para 2011 e 553 para 2012; sendo que a área de Ciências
Exatas e da Terra atingiu o maior índice em comparação as outras áreas,
alcançando o total de 189 evadidos em 2010; 241 em 2011 e 412 em 2012. Chama-
se a atenção para esse contexto, pois se acredita que a problemática do Cálculo
seja um dos aspectos a contribuir para esses resultados.
Em tempo, cabe mencionar que a fim de preservar a identidade dos sujeitos
investigados, optou-se por não identificar a universidade em pesquisa. E, para
facilitar a sempre necessária retomada dos dados no processo de análise, os
sujeitos investigados serão nomeados pelas inicias de seus cursos e pelo número do
82
sujeito na organização dada para tratamento dos dados brutos. Dessa forma, ao
referir-se a (EC004), significa que se está remetendo ao estudante investigado de
número 4 do grupo de estudantes matriculados no curso de Engenharia de
Computação. Igualmente, ao referir-se a EC004/AB1 se trata do relato desse
estudante em resposta à abordagem 1 de coleta de dados, analogamente, em
EC004/AB2, referindo-se à abordagem 2. E, ainda nessa direção, ao referir-se a
EC004/MCI significa que se está referindo ao mapa conceitual inicial elaborado por
esse sujeito.
3.1.3 O instrumento de coleta de dados
Intenciona-se lançar mão de um instrumento de coleta de dados que seja
capaz de suscitar a memória dos sujeitos pesquisados frente a sua passagem pela
disciplina de Cálculo 1, mas tal instrumento também deve ser propício a levar esses
sujeitos a lembrança de aspectos específicos do contexto matemático dessa
passagem. Desse modo, preferiu-se abdicar do trabalho com os memoriais,
inicialmente pensado na fase de teste desta investigação, e optar por um
instrumento mais direto, por meio do qual se acreditou ser possível chegar a dados
relevantes aos objetivos desta pesquisa.
Desse modo, o instrumento de coleta de dados foi estruturado de forma a
conter abordagens abertas, previamente definidas, porém capazes de remeter os
sujeitos pesquisados a uma relação informal sobre a temática em questão. Por outro
lado, que também fosse capaz de levar esse sujeito a revelar elementos do contexto
matemático de sua etapa como estudante da disciplina de Cálculo 1, e mais
especificamente acerca do tema Derivada.
Para viabilizar esse processo, apresentou-se aos sujeitos um Instrumento de
coleta de dados (Apêndice 1) por meio do qual se teve acesso a dados que
explicitaram além do perfil desses sujeitos; outras três abordagens de coleta de
dados, relacionadas ao objeto da investigação e que serão descritas a seguir.
83
Abordagem 1 – Comente sobre a disciplina de Cálculo 1. Essa abordagem é
apresentada aos estudantes a fim de que teçam, a partir de suas memórias,
comentários característicos à disciplina de Cálculo 1. “Falem da disciplina”.
Abordagem 2 – Comente sobre seu desempenho na disciplina de Cálculo 1.
Por meio dessa abordagem, espera-se que os sujeitos apresentem elementos que
remetam ao seu próprio desempenho na disciplina de Cálculo 1. “Falem de si”.
Abordagem 3 – Desenhe um mapa conceitual sobre Derivadas de Função
Real. Nessa abordagem os sujeitos são direcionados a explicitar suas concepções
acerca da Derivada. “Falem da Derivada”.
As três abordagens foram apresentadas aos diversos agrupamentos de
sujeitos desta investigação, em momentos de aulas que foram disponibilizadas pelos
seus respectivos professores. A participação dos estudantes foi voluntária.
Acerca da aplicação do instrumento, em relação às abordagens 1 e 2, as
frases foram lidas, antes de os sujeitos iniciarem o preenchimento de seus dados e
comentários. Assim, por meio desse instrumento os estudantes informaram acerca
de si, sobre o ano de ingresso nos cursos, quantas vezes cursaram a disciplina de
Cálculo 1, em que semestre e cursos se encontravam matriculados e teceram os
comentários pertinentes a essas abordagens.
Com relação à abordagem 3, após a leitura das abordagens 1 e 2, os sujeitos
foram orientados, de forma introdutória, a como elaborar um mapa conceitual. Os
estudantes foram orientados sobre as principais características dos mapas
conceituais e sobre como se pode elaborar um mapa conceitual. No instrumento,
apresentou-se como exemplo, um modelo de mapa conceitual que não se
relacionava à Matemática. Cabe destacar que muitos estudantes mencionaram
nunca haver feito um mapa conceitual antes. Após essa etapa de orientação, os
estudantes foram solicitados a desenhar um mapa conceitual sobre Derivada.
A intenção nesta etapa era de conseguir que os estudantes elaborassem o
que se definiu como Mapas Conceituais Iniciais, tal discussão será retomada no
Capítulo 5 deste trabalho.
84
Importante ressaltar acerca do instrumento de coleta de dados, que as três
abordagens foram apresentadas aos estudantes de forma sequencial. Em seguida à
apresentação do instrumento e respectivas abordagens, os estudantes investigados
conduziram suas respostas com pequenos relatos para as abordagens 1 e 2, e
elaboraram os mapas para a abordagem 3, na ordem em que preferiram.
Os estudantes, em diferentes grupos, ocuparam para essa tarefa o espaço de
no máximo duas aulas de cinquenta minutos cada uma; sendo que o tempo de
respostas de cada um variou significativamente, com estudantes entregando suas
observações em pouco mais de trinta minutos, e outros ocupando todo o tempo
aproximado das duas aulas.
3.2 Mapas Conceituais e Mapas Conceituais Iniciais
O processo de aprendizagem baseado no recurso do mapeamento conceitual
se estrutura fundamentalmente na visão ausubeliana estudada por Joseph Novak
(2010). Desse modo, entende-se que a Teoria da Assimilação por meio da
Aprendizagem e da Retenção Significativas foi o referencial teórico subjacente à
proposição do mapeamento conceitual em Ausubel (2000); Novak (2010) e Novak e
Cañas (2010). Contudo, nesse trabalho, recorre-se ao uso de Mapas Conceituais
como instrumento de produção de dados de pesquisa.
Nesse sentido, uma análise de conteúdo por meio de mapas conceituais é
viável no sentido dado por Moreira (2006). Concorda-se, no que se refere ao uso de
mapas como instrumentos didáticos, de avaliação ou de análise de conteúdo, que
esta separação seja um pouco artificial, pois segundo Moreira (2006), os mesmos
mapas usados no planejamento curricular podem ser empregados como recursos
instrucionais. Pretende-se, portanto, nesse aparte de apresentação das escolhas
metodológicas, tecer em aspectos gerais, a compreensão acerca da teoria e uso dos
mapas conceituais e as finalidades específicas para esta pesquisa.
85
O mapeamento conceitual é uma técnica que permite o uso da representação
gráfica para a organização do conhecimento, e que possibilita o entendimento da
estrutura cognitiva idiossincrática de um indivíduo sobre determinado conhecimento
ou área desse conhecimento, conforme afirma Novak (2010).
É, nessa perspectiva, um conjunto de conceitos imersos em uma rede de
proposições, constituídas por um conceito inicial, um termo de ligação e um conceito
final, sendo que o termo de ligação deve expressar a relação entre os conceitos
inicial e final. Em geral, os conceitos são posicionados dentro de figuras como
retângulos, círculos ou outras; mas isso não é uma regra, e as relações entre os
conceitos são indicadas por linhas que interligam os conceitos e nas quais são
postas as palavras ou frases de ligação, que especificam os relacionamentos entre
dois conceitos.
Segundo Novak (2010), o conceito pode ser definido como uma regularidade
percebida em eventos ou objetos, designada por um rótulo. Na maior parte dos
conceitos, o rótulo é uma palavra, embora algumas vezes possam ser usados
símbolos ou mais de uma palavra. As proposições, nessa teoria, são enunciações
sobre algum objeto ou evento nesse universo, seja ele natural ou artificial. As
proposições, em geral, contêm dois ou mais conceitos conectados por palavras ou
frases de ligação a fim de compor uma afirmação com sentido. Tais proposições, por
vezes, são chamadas de unidades semânticas ou unidades de sentido.
De acordo com Cicuto e Correia (2013), baseados em Novak (2010), os três
principais padrões de Mapas Conceituais apresentam proposições: i) limitadas
(proposição com baixa clareza semântica); ii) inadequadas (proposição com erro
conceitual) e iii) adequadas (proposições sem erro conceitual). Segundo esses
autores, Novak (2002, apud CICUTO; CORREIA, 2013) propôs o termo Estruturas
Hierárquicas Inapropriadas ou Limitadas (LIPHs), do inglês Limited or Inappropriate
Propositional Hierarchies, para referir-se aos tipos de erros encontrados nos Mapas
Conceituais que podem ser identificados como proposições com falta de clareza
semântica ou erros conceituais, revelando assim uma compreensão limitada ou
inapropriada sobre o tema mapeado.
86
Os termos de ligação inadequados podem diminuir a precisão da mensagem
das proposições, o que pode ser percebido durante a simples leitura de um mapa.
Nesse sentido, as Estruturas Hierárquicas Inapropriadas ou Limitadas (LIPHs) nos
MCs podem ser, “identificadas como proposições com falta de clareza semântica ou
erros conceituais, revelando uma compreensão limitada ou inapropriada sobre o
tema mapeado” (CICUTO; CORREIA, 2013, p. 6).
Cicuto e Correia (2013) dão exemplos de proposições com diferentes níveis
de clareza semântica, de acordo com o termo de ligação utilizado: (a) não é uma
proposição; (b) proposição limitada; (c) proposição inapropriada; e (d) proposição
apropriada, apresentados na Figura 5, a seguir:
Figura 5 – Proposições com diferentes níveis de clareza semântica Fonte: Cicuto e Correia (2013, p. 6)
Ainda de acordo com esses autores, a Teoria Educacional de Novak (2010)
inclui uma visão humanista para o processo de ensino-aprendizagem, por meio da
qual os seres humanos pensam, sentem e agem, e todos esses elementos devem
ser combinados na criação de novos conhecimentos. Portanto, o desafio educacional
é gerenciar as seguintes formas de aprendizagem: 1) A aquisição de conhecimento
(aprendizagem cognitiva); 2. A mudança na emoção ou sentimentos (aprendizagem
afetiva); e 3. O ganho de aptidão física ou motora (aprendizagem psicomotora).
Apontam, ainda, que Novak (2010 apud CICUTO; CORREIA, 2013) propõe
uma nova definição para a aprendizagem significativa que deve promover a
integração construtiva entre o pensar, o sentir e o agir, levando ao engrandecimento
87
humano e colocando os indivíduos como responsáveis pela condução do seu
processo de aprendizagem, permitindo ainda que a aprendizagem ocorra e atenda
às demandas da sociedade do século XXI, conforme Visser e Visser-Valfrey (2008
apud CICUTO; CORREIA, 2013).
Segundo Novak e Cañas (2010), existe uma importante relação entre a
psicologia do aprendizado tal como vista nos dias atuais e o consenso crescente
entre filósofos e epistemólogos, de que a criação de novos conhecimentos é um
processo que envolve conhecimentos e emoções. Para esses autores, mapas
conceituais podem ajudar a identificar conceitos amplos e gerais possuídos pelo
estudante antes de eles aprenderem conceitos mais específicos.
[...] a criação de novos conhecimentos é um processo construtivo que envolve tanto nosso conhecimento quanto nossas emoções ou nosso impulso de criar novos significados e novos modos de representar esses significados. Os próprios alunos envolvidos na criação de bons mapas conceituais estão se dedicando a um processo criativo, o que pode ser desafiador, especialmente se esses alunos passaram a maior parte da vida aprendendo mecanicamente (NOVAK; CAÑAS, 2010, p. 15).
Um mapa conceitual deve, nesse sentido, referir-se a uma situação ou evento
que se pretende compreender por meio da organização do conhecimento na forma
desse mapa.
Uma importante característica dos Mapas Conceituais se refere à
representação hierárquica dos conceitos, tomando forma com os conceitos mais
inclusivos e gerais no topo dos mapas e os mais específicos e menos gerais
dispostos hierarquicamente abaixo deste. A estrutura hierárquica de uma área
específica de conhecimento também depende do contexto no qual o conhecimento
está sendo aplicado ou considerado. Consequentemente, o ideal é que mapas
conceituais sejam elaborados a partir de alguma questão particular a qual se procura
responder, denominada de questão focal.
Mapas conceituais também se caracterizam pela inclusão de cross links, ou
ligações cruzadas, que são as relações ou ligações entre os conceitos nos diferentes
segmentos ou domínios do mapa conceitual, segundo Novak (2010). Tais ligações
podem auxiliar o analisador de um mapa a ver como um conceito, em um domínio de
88
conhecimento representado no mapa se relaciona a um conceito em outro domínio
ali mostrado. Na elaboração de um conhecimento novo, as ligações cruzadas muitas
vezes representam saltos criativos por parte do produtor de conhecimento.
Conforme aponta Novak (2010), não existem regras fixas para a construção
de mapas conceituais, da mesma forma que não existe uma maneira única, ou a
melhor maneira de representação de um mapa conceitual. Segundo esse autor, o
importante é o sentido que deve ter um mapa conceitual para a utilidade a que se
destina.
Pesquisadores como Kinchin, Hay e Adams (2000 apud AGUIAR; CORREIA,
2013) sugerem que alguns mapas conceituais são elaborados apresentando formas
“radiais” e ou “lineares”, e que esses são persistentes durante o processo educativo
dos alunos que optaram pela aprendizagem mecânica.
Figura 6 – Três estruturas típicas de MCs: (a) radial, (b) linear e (c) rede
Fonte: Aguiar e Correia (2013, p. 7)
Segundo Aguiar e Correia (2013), o aumento do domínio de um tema pode
levar a representação sequencial de conceitos como de um MC linear, partindo de
uma estrutura que inicialmente teria sido dada da forma radial, do mesmo modo que,
89
o estabelecimento de relações entre conceitos pode romper essa linearidade e levar
a construção de mapas conceituais com uma estrutura parecida com rede.
Considera-se, ainda, que a exploração acerca dos Mapas Conceituais
apontou que esses podem ser pensados como ferramentas para negociar
significados, para apresentar as representações explícitas, abertas dos conceitos e
proposições que uma pessoa tem sobre determinado tema, como uma técnica para
exteriorizar o entendimento conceitual e proposicional que uma pessoa tem sobre
determinado conhecimento. Destinam-se, desse modo, a representar relações
significativas entre conceitos na forma de proposições, ou seja, são dispositivos
esquemáticos para representar um conjunto de significados de conceitos encaixados
em um sistema referencial proposicional, conforme Novak e Gowin (1984).
Entende-se que a análise de um mapa conceitual é essencialmente
qualitativa, e não há distinção entre mapa conceitual correto e incorreto. Cabe
destacar, contudo, que esta pesquisa se fixará nos primeiros mapas conceituais
elaborados, o que se denominará de Mapas Conceituais Iniciais (MCIs).
Nesse sentido, Novak (2002) chamou de Mapas Conceituais Preliminares23 a
primeira tentativa de elaboração de um mapa conceitual concluído por uma pessoa
sobre determinado conteúdo. Dessa forma, uma vez concluído um mapa conceitual
preliminar é necessário revisá-lo a fim de adicionar novos conceitos. Para esse
autor, bons mapas geralmente resultam de três ou mais versões. Reconhece-se que
a aprendizagem é um processo contínuo e pode ser estimulada por meio de
organizadores gráficos, sendo importantes as etapas frequentes de revisão e
alteração dos mapas conceituais. Inclusive, considera-se que os processos com
mapas conceituais manuscritos são limitados, quando utilizados em processos de
aprendizagem, uma vez que deveriam ser passados a limpo para incluir as
modificações decorrentes da evolução nesse processo.
Contudo, na presente abordagem em que não se tem uma intenção
instrucional no trabalho com os mapas, optou-se apenas pelos mapas conceituais
manuscritos. Insiste-se que não se lançará mão da reelaboração dos mapas
23 Não se optou por essa nomenclatura, pois esta sugere a necessidade de outras elaborações, e no caso da presente pesquisa se fixará apenas nos primeiros e únicos mapas elaborados pelos sujeitos, tais mapas não serão submetidos à reelaborações.
90
conceituais, e não se irá buscar uma diferenciação ou classificação em bons mapas
sobre Derivada, pois se ambiciona identificar as “marcas” reveladas pela exposição
permitida a partir dos primeiros mapas conceituais desses estudantes investigados.
No Capítulo 5, serão apresentados os critérios ou forma como se elegeram os MCIs
a partir das elaborações dos sujeitos investigados.
Dessa forma, espera-se por meio desse recurso, aproximar-se do objetivo de
pesquisa que pretende considerar as experiências dos sujeitos em aulas de Cálculo
1, especificamente para o conteúdo Derivada. Entende-se que o sujeito investigado
ao expor o seu MCI, também expõe suas concepções objetivas mais relevantes, e o
fato de não refazer esse mapa e de não ser direcionado para uma determinada
estrutura específica nessa construção permite que seja exposta a essência desse
processo de experiência com o conhecimento novo, no caso, a Derivada.
Apresentar-se-á, no próximo Capítulo, a primeira parte da análise, construída
a partir dos relatos dados pelos estudantes investigados em resposta às abordagens
1 e 2. Espera-se também exibir as unidades de análise textuais segundo as escolhas
teóricas e reportadas aos aspectos dialógicos entre o estudante investigado e a sua
formação básica em Matemática; e o professor de Cálculo 1; e a Instituição de
formação; e com o próprio Cálculo 1.
91
4 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE E APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS
Expõem-se as unidades textuais para análise segundo as escolhas teóricas.
As exposições decorrem dos resultados encontrados a partir de dados classificados
em cada uma das unidades de análise consideradas, em que se reportou aos
aspectos dialógicos entre o estudante investigado e: a sua formação básica em
Matemática; o professor de Cálculo 1; a Instituição de formação e com o próprio
Cálculo 1.
4.1 Aspectos teóricos na condução das unidades de análise
Buscou-se na construção das unidades de análise textuais por elementos
convergentes encontrados a partir do referencial teórico que estruturou este trabalho.
Inicia-se pelo sentido da linguagem, conforme argumenta Buber (2009), promovidos
em uma relação dialógica. Acrescentam-se aspectos da relação de “Alguém com os
outros”, conforme propõem Bauman e May (2010), e que interiorizam também uma
relação dialógica. E, finaliza-se pelas observações de Larrosa (2002, 2011) acerca
da experiência nessa relação.
Parte-se, portanto, de perspectivas subjetivas para investigar também
aspectos objetivos do ensino de Cálculo 1, especificamente, sobre a Derivada.
Contudo, entende-se que uma relação objetivante é, também, subjetivante (BUBER,
2009). Dessa forma, não há objetividade sem os aspectos subjetivos dessa
construção.
Do ponto de vista do processo de ensino da Derivada, os aspectos subjetivos
ficaram aparentes nos relatos dos estudantes de Cálculo 1 apresentados por meio
do instrumento proposto na fase principal da coleta de dados desta pesquisa. Os
sujeitos investigados são estudantes de cursos de graduação em Engenharias e
92
Licenciaturas da Instituição lócus desta investigação, conforme apresentado no
Capítulo da metodologia.
Na busca pela formulação das unidades de análise textuais, remeteu-se a um
processo de singularização, por meio do qual se classificam os relatos dos sujeitos a
partir dos aspectos por eles explicitados em pequenos textos. E a partir da
experiência dos sujeitos investigados: a) como estudantes da disciplina de Cálculo 1;
b) na relação do sujeito em formação com o sujeito formador e com a instituição
formadora; c) na compreensão do conteúdo Derivada.
Em torno desses momentos se encontra uma relação genuinamente dialógica,
cujos termos da dialética compreendem sujeito e sujeito; sujeito e objeto, sujeito e
objeto e sujeito. Interações emitidas nas presentes relações dialógicas do modo “Eu-
Tu”, o modo fenomenológico de ser; “Eu-Isso”, o modo coisificado de ser, e de
“Alguém com os outros”, o modo sociológico de ser. São essas interações, que
permitem ao estudante a experiência, quando revive o processo de construção de
seu conhecimento, ao narrar-se ou ao construir os seus mapas conceituais.
Uma das bases do pensamento buberiano, provinda da experiência concreta
com a vida, o logos e a práxis, propõe ao homem a vida fundada no diálogo, postas
frente à categoria fundamental do Eu-Tu, o que possibilita admitir que a ação
educativa é uma reflexão elaborada por meio de um princípio dialógico, que permite
também, perguntar até que ponto há uma esfera dialogal, de abertura, de respeito e
de responsabilidades na relação entre os sujeitos.
Para auxiliar a realização das melhores possibilidades existenciais do aluno, o professor deve apreendê-lo como esta pessoa bem determinada em sua potencialidade e atualidade, mais explicitamente, ele não deve ver nele uma simples soma de qualidades, tendências e obstáculos, ele deve compreendê-lo como uma totalidade e afirmá-lo nesta sua totalidade (BUBER, 2009, p. 131).
Nesse sentido, o diálogo não é um conjunto semântico de oralidade, mas um
evento inesperado que implica uma relação de reciprocidade mútua entre os
sujeitos, e que por meio de um encontro de diálogo extremamente autêntico permite
uma relação genuína entre pessoas.
93
A sociologia poderia fornecer observações sobre as experiências e mostrar as
implicações de atos e decisões que conduzem a vida humana. É assim, um espaço
de atividade contínua que compara o aprendizado com novas experiências, segundo
Bauman e May (2010). Nessa direção, vive-se em um constante processo de
interação com outros indivíduos e de direcionamentos para escolhas a acompanhar
até o fim, ou não; de forma que uma compreensão gerada dessa maneira poderia
tornar a comunicação com “os outros”, mais fácil e mais inclinada a conduzir ao
mútuo entendimento.
Poucas vezes se considera necessário ultrapassar o nível das preocupações
cotidianas para ampliar o horizonte das experiências, atitude que exigiria tempo e
recursos de que muitos podem não possuir ou com que não se dispõem a arcar.
Dada, porém, a tremenda variedade de condições de vida e de experiências no
mundo, cada uma é necessariamente parcial e talvez até unidimensional.
Nessa perspectiva, de acordo com Bauman e May (2010) essas questões só
podem ser examinadas quando juntas, ou seja, se comparadas às experiências
prospectadas a partir da multiplicidade de mundos. Somente dessa forma as
realidades delimitadas da experiência individual poderiam ser reveladas, assim como
a complexa rede de dependência e interconexões na qual elas estão envolvidas.
Esses autores também argumentam que, quando ocorrem disjunções entre as
expectativas e a experiência, pode-se refletir sobre a possibilidade de os grupos a
que se pertence não serem aqueles pelos quais se opta por livre escolha. Dessa
forma, uma transformação exigirá grande esforço de mobilidade perante os grupos.
Nessa direção, o sujeito contemporâneo nem sempre consegue que a
experiência aconteça. Larrosa (2011) assegura que sendo a experiência o que
atravessa, passa e deixa sua marca, nem tudo o que passa efetivamente, deixa
vestígios. A experiência é conduzida pela incerteza, ou seja, há um campo de
possibilidades cujos resultados não são antecipáveis. Nisso é diferente do
experimento, cujas regras são pré-definidas e, geralmente, seus resultados são
controlados. O sujeito da experiência não é ativo, mas é um sujeito que se expõe, é
receptivo. É o sujeito que não se define por imposição ou pela posição que toma,
mas sim pela exposição de si.
94
Assim, pretende-se apresentar o que esses sujeitos da experiência expõem
ou deixam revelar em seus relatos, tendo como cenário as aulas de Cálculo 1, e
como objeto específico para os MCIs, a Derivada.
Entende-se que os sujeitos da experiência são capazes de demonstrar
elementos particulares e auto formadores ao fazer a experiência de si quando se
observam, se decifram, se interpretam, se descrevem, se julgam, se narram. São
capazes de se particularizarem, sem, contudo, deixar de estar em constante contato
com os “outros”, que estão presentes nessa relação dialógica, que é única, no
entanto, não é solitária.
Neste estudo, os sujeitos descrevem suas impressões de forma textual e de
forma representativa, pois partem de memórias expostas, em forma de pequenos
textos ou relatos, para o que se considera “outra forma de narrativa” ou texto,
representada pelos Mapas Conceituais Iniciais sobre Derivadas, cuja análise será
apresentada no próximo capítulo deste trabalho.
É nesse caminho que o aspecto dialógico é ressignificado, e que o sujeito ao
expor a si mesmo, revive etapas da construção de um dado conhecimento, que
envolve outros sujeitos. Quando faz esse movimento vê aos outros e a si mesmo, e
dessa forma pode refletir, ora o outro, ora a si próprio.
4.2 Unidades de análise textuais
Apresenta-se a seguir a descrição das unidades de análise textuais. Os
aspectos considerados como indicadores de pertencimento a cada uma das
unidades estão marcados e influenciados pela subjetividade da pesquisadora. As
classificações que deram origem às unidades levaram em conta a recorrência nos
relatos dos sujeitos investigados relativas às suas respostas às abordagens 1 e 2:
“Comente sobre a disciplina de Cálculo 1” e “Comente sobre o seu desempenho em
Cálculo 1”, referidas no capítulo da metodologia, sofrendo assim o enquadramento
mais conveniente, desse ponto de vista.
95
Constituí-se, assim, unidades que sugerem certo antagonismo, que envolvem
aspectos que ora sinalizam para uma experiência aparentemente negativa, que de
certo modo não possibilitou o encontro desses sujeitos com as especificidades do
Cálculo 1; e ora para aspectos que dão evidências de que os sujeitos possam ter
tido uma experiência positiva, no que diz respeito ao seu contato com as
especificidades dessa disciplina e à construção de um conhecimento novo. Contudo,
entende-se que diferentemente do antagonismo obvio que parecem revelar,
apresentam de si, fatores de complementaridade.
4.2.1 Unidade 1: O estudante e a sua formação básica
Nessa classificação são considerados os relatos dos sujeitos que remetem a
uma relação dialógica entre o estudante e sua formação na Educação Básica. A
forma como os estudantes investigados classificam sua própria formação parece, em
algumas relatos, responsabilizar as deficiências e defasagens decorrentes dessa
etapa de sua educação formal, pelas razões que, além de tornarem o Cálculo 1, uma
disciplina que se impõe em grandes obstáculos aos estudantes, acarretam muitas
vezes um desempenho insuficiente. Porém, em algumas descrições, salientam que
buscaram essa base necessária, encontrando esse suporte em vídeo-aulas na
internet, aulas particulares, ajuda dos monitores, revisão com os professores, entre
outras.
Nesse sentido, essa unidade acolhe as deficiências e defasagens
reconhecidas pelos sujeitos e explicitadas em suas preleções, em expressões como:
“Falta de base do Ensino Médio; Escola fraca; Falta de base matemática”, e isso
remete a uma classificação na unidade 1 de análise, pois tais relatos apontam para a
possibilidade de que tais sujeitos possam ter passado por uma experiência que não
lhes tenha agregado conhecimentos novos em relação à disciplina de Cálculo 1.
Admite-se que nesses casos, a passagem por essa disciplina possa ter deixado
marcas fora do contexto matemático, tais como: angústia, insegurança e reprovação
(não apenas acadêmica) desses sujeitos.
96
Colocam-se, também nessa classificação, os relatos que demonstraram
reconhecimento de uma boa base matemática de nível médio, pois, argumentações
presentes nas falas de alguns estudantes dão indícios de uma forma de relação
dialógica ocorrida entre os sujeitos e sua formação básica que aponta para o
reconhecimento de uma formação condizente com as suas expectativas. Nesse
aspecto, o estudante classifica sua formação básica como eficiente e acredita que
não encontrou dificuldades ao longo da disciplina devido à boa base matemática,
sobretudo, obtida em nível médio. Nessa relação dialógica, evidenciam-se elementos
que possam apontar para a reciprocidade mútua e o respeito às identidades.
Expressões como: “Boa base do Ensino Médio; Escola de qualidade; Boa base
matemática” são elementos que também dão forma a essa unidade de análise.
4.2.1.1 Considerações sobre a unidade 1
Na sequencia, o Quadro 4 exibe uma comparação quantitativa em relação ao
número de sujeitos que em seus depoimentos apresentaram características que se
aproximam das mencionadas sobre os sujeitos pesquisados quando se referem a
sua educação básica. Destaca-se, que foi ressaltado pelos próprios sujeitos, o nível
médio como principal representação dessa formação.
A fim de atingir uma diferenciação pelo caráter apontado nessas
argumentações, recorre-se a duas colunas classificatórias no Quadro 4, indicando
como negativa ou positiva a contribuição da formação básica desses sujeitos para o
seu desenvolvimento em Cálculo 1. Nessa etapa, foram considerados os relatos
dados pelos estudantes pesquisados em relação à abordagem 1 e 2, “Comente
sobre a disciplina de Cálculo 1” e “Comente sobre o seu desempenho em Cálculo 1”.
Os relatos não estão fechados em um único aspecto, podendo ocorrer de um
mesmo estudante participar em posições antagônicas nessa relação, por essa razão,
não se pode presumir que tais argumentações sejam em sua totalidade
contraditórias ou divergentes, pois dizem respeito a etapas ou momentos distintos da
memória dos sujeitos.
97
Quadro 4 – Distribuição do número de alunos por curso e contribuição da formação básica para a disciplina de Cálculo 1 por abordagem24.
Nº SUJEITOS POR CURSO
ABORDAGEM 1 ABORDAGEM 2
Negativa % Positiva % Negativa % Positiva %
EA 13 6 46,15 0 0,00 4 30,77 0 0,00
EC 13 8 61,54 2 15,38 3 23,08 0 0,00
EP 41 13 31,71 3 7,32 11 26,83 2 4,88
EQ 50 20 40,00 4 8,00 2 4,00 6 12,00
ER 13 9 69,23 0 0,00 4 30,77 0 0,00
LF 10 4 40,00 0 0,00 3 30,00 0 0,00
LM 39 12 30,77 1 2,56 4 10,26 1 2,56
LQ 7 4 57,14 0 0,00 2 28,57 0 0,00
TOTAL 186 76 40,86 10 5,38 33 17,74 9 4,84
Admite-se, contudo, que tais argumentações demonstrem visões
complementares, pois tais sujeitos se referem, de forma geral, a aspectos que se
conectam a episódios distintos de sua passagem como estudante na disciplina de
Cálculo 1.
Desse modo, o processo de comparação se assenta em aspectos
quantitativos e qualitativos de investigação, iniciado na comparação do volume das
respostas dadas pelos sujeitos investigados em relação às abordagens 1 e 2.
Ressalta-se que o Quadro 4 compara os resultados que foram classificados
pela pesquisadora como pertencentes à unidade 1, a unidade que analisa a relação
entre o sujeito e sua formação básica, ou seja, à contribuição dessa formação para o
desenvolvimento dos sujeitos em Cálculo 1 do ponto de vista desses sujeitos. Sendo
assim, não há como excluir as subjetividades decorrentes da visão da pesquisadora.
Os dados apontados indicam um percentual relativamente alto de estudantes,
que expuseram como insuficiente a base matemática, dada no Ensino Médio, para
dar conta da disciplina de Cálculo 1; sendo esse, segundo os próprios sujeitos, um
dos motivos das inúmeras dificuldades encontradas ao longo da disciplina e,
consequentemente, do baixo desempenho desses estudantes.
24 Ressalta-se que o somatório dos sujeitos computados nas abordagens 1 e 2 diferem do total de sujeitos investigados, pois alguns estudantes não se enquadraram para as opções “negativa” e “positiva” e outros foram computados em ambas as possibilidades em função de seus relatos.
98
Admite-se, contudo, que o “pensar” sobre essa disciplina parece ter remetido
esses sujeitos a outras lembranças que não são necessariamente sobre os
conteúdos matemáticos abordados em aulas de Cálculo 1.
Dos 186 sujeitos pesquisados, 40,86% mencionaram a possibilidade de um
Ensino Médio deficitário quando solicitados a comentar sobre a disciplina de Cálculo
1. Em relação ao próprio desempenho em Cálculo 1, um percentual menor, 17,74%
dos indivíduos mencionou não ter tido base no Ensino Médio para cursar essa
disciplina.
[...] infelizmente não saímos do Ensino Médio preparados para a disciplina de cálculo 1 (EQ049/AB1).
Mas as minhas dificuldades provinham das deficiências do Ensino Médio, tornando tudo muito novo. Acredito que mesmo que essa disciplina já tenha sido superada, algumas dificuldades ainda persistam (LM028/AB2).
Posturas como essas colocam os sujeitos diante de uma representação que
fazem da própria formação e que parece não ser favorável ao seu próprio
desenvolvimento no curso, e diante da qual se pronunciam, dão justificativas, e
apresentam suas fugas e formas de contornar ou tentar resolver o problema.
O meu desempenho não foi muito satisfatório, pois nunca tinha visto nada sobre cálculo diferencial, ou seja, minha base não era boa o suficiente para fazer uma disciplina de cálculo I bem feita. Precisei rever vários conceitos básicos (EP022/AB2).
Diante da justificativa das ações humanas, Bauman e May (2010) se
pronunciam e, desse modo, as formas segundo as quais se vive, o conforto e a
segurança são expostos ao que se enxerga como desafios, e assim, se é chamado a
explicar e justificar suas ações.
Os valores adotados para orientar e justificar as ações transformam-se no curso da interação social em diferentes contextos. As pessoas são influenciadas de maneiras específicas. Isso se manifesta por meio de uma alteração na hierarquia da importância atribuída a determinados valores. O que significa que elas selecionam, conscientemente ou por padrão, alguns fins em vez de outros (BAUMAN; MAY, 2010, p. 104).
99
Se por um lado, buscam sempre justificar as ações, e nas muitas formas, as
causas dessas ações geralmente são colocadas fora da responsabilidade do agente
da ação, por outro lado, muitas vezes por meio das ações tomadas, remetem a
meios para tentar resolver as situações às quais se encontram expostos, mesmo que
essa exposição, no entender do sujeito da ação, não tenha causa na própria
vontade, mas na vontade alheia.
Contudo, se a representação do sujeito apontou em alguns momentos para a
defasagem do Ensino Médio como um dificultador de sua passagem pelo Cálculo 1,
por outro lado, se identifica que também se tornaram presentes, argumentos pelos
quais os sujeitos admitem ter encontrado no Ensino Médio a base matemática
necessária para cursar a disciplina de Cálculo 1 sem maiores dificuldades, embora
em um número bem menor, 5,38% dos estudantes pesquisados em relação à
abordagem 1 e 4,84% em relação à abordagem 2. Mesmo sendo esse um número
relativamente pequeno, cabe destacar que existe esse número de sujeitos para os
quais a sua preparação em nível médio foi suficiente, e, portanto, manter revisões de
conteúdos dessa etapa em aulas de Cálculo 1 poderia ser um dispositivo
desnecessário e desmotivador para esses estudantes.
Graças a uma base forte de matemática, tive facilidade em aprender os conteúdos de Cálculo I, sem ter estudado tanto, passei com uma média acima de 7,0 (EQ036/AB2).
A 1º parte é a mais fácil devido ao fato desse assunto já ser abordado no segundo grau, a dificuldade está na parte de limites e Derivadas. A meu ver essas partes apresentam maior dificuldade porque é gasto boa parte do semestre revendo funções e sobra pouco tempo para as partes não vistas anteriormente (limites e Derivadas) (EP018/AB1).
Embora alguns sujeitos tenham se referido a uma formação suficiente, tais
dados podem indicar que haja sim, uma lacuna na formação da maior parte dos
estudantes em relação à Matemática, ao menos no que diz respeito aos estudos
realizados na Educação Básica, pois um índice superior a 40% sinaliza para isso.
Contudo, não se pode garantir a partir dos dados coletados, que essa defasagem
ocorra em razão de alguma precariedade em nível médio, embora os conteúdos
apontados como deficitários pelos sujeitos estejam ligados à fundamentação em
Funções, ou seja, a um conteúdo estudado com maior ênfase nos três anos do
100
Ensino Médio. Assim como, não se pode deixar de considerar que, se existe tal
defasagem, talvez ela possa ser anterior a essa etapa da Educação Básica.
Mas, é preciso destacar também o fato de que mais de 50% dos estudantes
investigados não se referiram ao Ensino Médio, nem de forma positiva, nem de
forma negativa. O que poderia ter levado esses sujeitos a não mencionarem o
Ensino Médio, pode, no entanto, esconder modos diversos de ver a problemática em
que se colocam ou são colocados, quando diante do ensino de Cálculo 1.
Acredita-se que uma das razões possa ter relação com as disciplinas
niveladoras, que poderiam ter suprido essa defasagem, ou as outras formas
encontradas pelos sujeitos que tenham provido essa necessidade. Mas, acredita-se
também, que se não mencionaram o Ensino Médio, tal fato pode significar que
outros aspectos se colocam como mais relevantes para esses sujeitos. Dessa forma,
para esse percentual descrito, não se pode admitir que exista defasagem decorrente
da fraca base de Matemática do nível médio.
Acrescenta-se que os dados apresentados podem indicar a importância da
oferta de disciplinas niveladoras, uma recorrência comum nas universidades, e que
intenciona suprir a defasagem da base matemática dos estudantes ingressantes a
fim de assegurar a suficiência desses em disciplinas como Cálculo 1. Em vários
momentos, os estudantes mencionaram a importância de ações como essas para
seu desenvolvimento em Cálculo 1.
[...] há pouca ou nenhuma atenção àquele aluno que saiu de uma instituição de ensino que não lidava com um nível de matemática bom, somente nesse semestre foi implantado o pré cálculo para os alunos obterem um nivelamento, dessa forma podendo ter maior aproveitamento na disciplina (EP026/AB1).
A primeira vez que eu fiz foi um "choque", pois havia muita coisa do Ensino Médio e fundamental, eu já não lembrava mais, só consegui obter êxito na disciplina após fazer um curso de nivelamento fora da universidade (ER003/AB2).
Não obstante, quanto à oferta de disciplinas niveladoras, a Instituição lócus
desta pesquisa oferece em atuais projetos de ensino, cursos de nivelamento e
monitorias em Cálculo 1.
101
Nesse sentido merece especial atenção o curso de Licenciatura em
Matemática, pois a disciplina de Teoria Elementar das Funções (TEF) é ofertada no
primeiro semestre desse curso como disciplina obrigatória. A ementa da TEF propõe
o estudo de “Conjuntos e suas operações; A reta real; Intervalos; Módulo e suas
propriedades; Desigualdades; Funções: definição, domínio, imagem e gráfico;
Funções linear, quadrática, exponencial, logarítmica, trigonométrica, polinomial e
hiperbólica; Funções pares e ímpares; Funções injetivas, sobrejetivas e bijetivas;
Composição de funções; Funções Inversas; Outros tópicos e História da Matemática
pertinente ao conteúdo.”
Na Instituição, a TEF é pré-requisito para o Cálculo 1 para os estudantes da
LM, entretanto, verifica-se que 30,77% dos pesquisados, mencionam encontrar
dificuldade em Cálculo 1 em decorrência de suas defasagens advindas de estudos
deficitários em nível médio. E, em relação ao próprio desempenho em Cálculo 1,
10,26% se referiram à base fraca do nível médio como justificativa de suas
dificuldades.
Nesse sentido, apontam-se alguns aspectos. Em primeiro lugar, e com base
nas exposições desses estudantes da LM, há relativa possibilidade de que a TEF
não esteja suprindo as defasagens decorrentes de um Ensino Médio deficiente, pelo
menos no que se refere ao estudo das Funções. Em segundo lugar, que uma
disciplina de nivelamento com vistas a atender às defasagens em funções não seria
uma saída plausível para o problema do desempenho insatisfatório dos estudantes
em Cálculo 1, pois as dificuldades permaneceram para um número representativo de
estudantes, o que poderia indicar que a defasagem é ainda anterior. E, em terceiro
lugar, não se acredita que medidas pontuais como oferecer uma disciplina de
nivelamento dêem conta da complexidade dos problemas advindos da formação
básica desses estudantes.
Cabe, entretanto, uma pequena discussão dos aspectos mencionados. De
acordo com o Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Matemática da
Instituição em pesquisa, o objetivo da disciplina TEF é aprofundar o estudo de
Funções Reais, suas classificações e a construção de gráficos; resolver problemas
envolvendo funções; e visar à construção do alicerce para a compreensão dos
demais componentes curriculares. Assim, se atingido tal objetivo, a defasagem
102
advinda da escolarização básica não seria um problema em Cálculo 1 para os mais
de 30% dos estudantes.
Porém, concorda-se que os mesmos motivos que permitem que o objetivo da
TEF não seja atingido para um percentual significativo de estudantes da LM, possam
ser também a razão das insuficiências em Cálculo 1.
E, nesse caso, acredita-se que talvez Função não seja o principal problema.
Talvez a dificuldade não esteja em tal conteúdo. Dessa forma, uma possibilidade
pode ser encontrada a partir de pesquisas a fim de identificar os tópicos da
Matemática básica que se apresentam como barreiras à compreensão de conteúdos
da Matemática superior. Tem-se certo que há obstáculos25 nesse percurso, que
podem não ser apenas em razão da qualidade do Ensino Médio. E não se pode
deixar de mencionar que, em geral, os estudantes que optam por um curso de
Engenharia ou, por exemplo, de Licenciatura em Matemática, Química ou Física, têm
relativa inclinação para a Matemática, e em geral passam por uma seleção cuja
exigência é maior em relação às disciplinas específicas.
Talvez a dificuldade desses estudantes em relação ao Cálculo 1 possa estar
sim na Matemática, mas não em um conteúdo específico ou imediato, como um
elemento em aberto em uma sequência de conteúdos, proposta por vezes como um
caminho pelo qual se espera conduzir o sujeito da aprendizagem para alcançar um
conhecimento matemático novo, maior, “superior”. Pois, todo conhecimento se liga
ao mundo do Isso - do objeto a conhecer, nada se integra à soma de conhecimento
senão for antes um Isso. Porém, não se trata de uma simples coisificação. Segundo
Buber (2009) o conhecer não se restringe à comparação de coisas entre coisas.
Toda resposta amarra o Tu ao mundo do Isso. Tal é a melancolia do homem, tal é também sua grandeza. Pois, assim, surgem no seio dos seres vivos o conhecimento, a obra, a imagem e o modelo. [...] Primeiramente o conhecimento: é na contemplação de um face-a-face, que o ser se revela a quem o quer conhecer. O que o homem viu pode considerá-lo como um objeto, compará-lo com outros objetos, ordenar objetivamente, porque nada pode ser integrado na soma de conhecimento, senão na qualidade de um Isso. Na contemplação, porém, não se tratava de coisa entre coisas, de um processo entre processos, era exclusivamente a presença (BUBER, 2009, p. 66).
25 Obstáculo epistemológicos, obstáculos didáticos, obstáculo sociais.
103
Assim sendo, algo mais pode estar dificultando essa “passagem” e
impossibilitando aos estudantes a experiência do encontro com o conhecimento
novo em Cálculo 1, ou seja, de ir além de sua forma atual, de mudar de forma em
decorrência desse conhecimento novo e possível em aulas de Cálculo 1.
A experiência aquilo que “nos passa”, ou que nos toca, ou que nos acontece, e ao nos passar, nos forma e nos transforma. Somente o sujeito da experiência está, portanto, aberto à sua própria transformação (LARROSA, 2002, p. 25-26).
Nessa direção, Rezende (2003) aponta que grande parte das dificuldades de
aprendizagem no ensino de Cálculo seja essencialmente de natureza
epistemológica, cujas raízes do problema estão além dos métodos e das técnicas,
sendo inclusive anteriores ao próprio espaço-tempo local do ensino de Cálculo. No
âmbito do ensino superior de Matemática, esse autor argumenta que há uma
predominância da abordagem estática sobre a abordagem dinâmica das ideias
básicas do Cálculo, por exemplo, para o conceito de Derivada, prevalecendo o seu
aspecto formal sobre o geométrico. Aponta que ocorre algo parecido com funções,
por meio do desvio epistemológico do conceito de função realizado ao longo da
educação básica de modo tendencioso para o campo algébrico, caracterizando
assim, um dos macro-espaços de dificuldades de aprendizagem de natureza
epistemológica do ensino de Cálculo, o macro-espaço da variabilidade/permanência.
A partir dos relatos dos sujeitos e da classificação apontada no Quadro 4 é
possível também evidenciar outro aspecto presente nessa relação dialógica entre o
sujeito e sua formação básica, e que parece apontar para certa exclusão da co-
responsabilidade dos sujeitos investigados em relação a seu papel na própria
formação.
Nota-se, ao tomar-se como base apenas os estudantes investigado dos
cursos de Engenharias, que aproximadamente 43% desses estudantes expõem que
a falta de base decorrente do Ensino Médio é uma das razões para os problemas
enfrentados na disciplina de Cálculo 1. Quando se referem ao próprio desempenho,
aproximadamente 19% desses estudantes apontam a falta de base em nível médio
como razão para o seu baixo rendimento em Cálculo 1. Em relação às licenciaturas,
quando se posicionam quanto à falta de base de Ensino Médio, encontram-se,
104
aproximadamente 35% desses estudantes na abordagem 1 e pouco mais de 16% na
abordagem 2.
A partir dos índices mencionados podem ser evidenciados que os dois grupos
de sujeitos, tanto o das licenciaturas, quanto o das engenharias, parecem concordar
em parte com as dificuldades encontradas na disciplina de modo geral e que uma
das razões do baixo desempenho desses estudantes possa ser colocada sobre a
base matemática dada no Ensino Médio. Pode-se apontar também, ainda com base
nesses dados, que mesmo havendo um número significativo de sujeitos que se
posicionam negativamente frente a sua formação básica na abordagem 2, há uma
representação que, embora aponte para essa posição na abordagem 1, não se
posiciona da mesma forma na abordagem 2.
Com base nos dados brutos são verificados que apenas 14 do total de 186
estudantes investigados colocaram, simultaneamente, a defasagem decorrente do
Ensino Médio como uma das razões das dificuldades na disciplina e de seu próprio
desempenho em Cálculo 1. Nesse aspecto, questiona-se se haveria alguma ligação
entre essas posições e o índice de aprovação/reprovação desses sujeitos.
Verifica-se, também, que desses 14 sujeitos que mencionaram a base fraca
do Ensino Médio nas abordagens 1 e 2, simultaneamente; 1 é estudante do curso de
EA, 4 são do curso de EC, 2 do curso de EP, 3 do curso de ER, 2 do curso de LF, 1
do curso de LM e 1 do curso de LQ. Desses 14 sujeitos, 3 cursaram pelo menos 3
vezes a disciplina de Cálculo 1, enquanto 7 cursaram 2 vezes a disciplina até obter a
aprovação, indicando que pelo menos 10 dos 14 estudantes reprovaram a disciplina
de Cálculo 1 pelo menos 1 vez. Intui-se, desta forma, que a reprovação na disciplina
de Cálculo 1 possa estar na base dos relatos em que a defasagem matemática de
nível médio foi apontada pelos estudantes nas duas abordagens.
Quando se busca pelos estudantes que mencionaram a base fraca do nível
médio apenas na abordagem 1, encontra-se um total de 62 estudantes, sendo 37
que não reprovaram em Cálculo 1, 18 que cursaram 2 vezes a disciplina até obter a
aprovação; 4 que reprovaram 2 vezes e foram aprovados na terceira vez; e 3 que
aprovaram na quarta vez que cursaram a disciplina. Nesse aspecto, chama atenção
o número de estudantes que foram aprovados na primeira vez que cursaram a
105
disciplina, pois esse número excede o número de reprovados pelo menos uma vez, e
pode dar indício de uma justificativa para o estudante não apontar a falta de base do
nível médio em resposta à abordagem 2, pois esta diz respeito ao seu próprio
desempenho.
Com relação aos estudantes que mencionaram a falta de base de nível médio
apenas na abordagem 2, quando comentam sobre o próprio desempenho em
Cálculo 1, encontra-se 18 estudantes, dos quais 8 foram aprovados na primeira vez
que cursaram a disciplina; 6 foram aprovados na segunda vez; e 4 na terceira vez.
Nota-se que ao contrário do aspecto anterior, o número de alunos reprovados na
disciplina de Cálculo 1 excede ao número de alunos que aprovaram na primeira vez,
o que pode corroborar a explicativa anterior e complementar como razão da inclusão
dessa posição em resposta à abordagem 2, quando os sujeitos comentam sobre o
próprio desempenho em Cálculo 1.
Todavia, chama-se novamente atenção ao fato de os estudantes pouco se
posicionarem em relação ao Ensino Médio como um fator positivo para o estudo de
Cálculo 1. Nota-se ao revisitar os dados que entre os estudantes que mencionaram
não ter encontrado dificuldades na disciplina, um percentual bastante pequeno
relacionou ter uma forte base de Ensino Médio como um aspecto favorável ao
desenvolvimento em aulas de Cálculo 1.
Dessa forma, as dificuldades apontadas pelos investigados parecem
constituídas extrinsecamente, ou seja, fora do campo de responsabilidade desses
sujeitos; enquanto fatores ligados ao seu bom desempenho parecem estar
vinculados a aspectos intrínsecos, representados pela busca e dedicação dos
próprios sujeitos na superação dos obstáculos.
Foi bom, porém devido a algumas dificuldades em operações matemáticas que não tinha conhecimento sofri um pouco, assim estudando em dobro para correr atrás do que eu não tinha conhecimento (EP026/AB2).
Na primeira vez que fiz Cálculo I senti dificuldade por ter tido um Ensino Médio fraco, pois na parte de funções não tive um aproveitamento muito bom. Já na parte de limites e Derivadas acabei por dominar até bem a matéria, mas como não tinha ido bem na primeira parte acabei não passando. Na segunda vez fui atrás de livros para me ajudar a entender a parte de funções, desse jeito consegui passar, mas tive que me esforçar muito (ER005/AB2).
106
Deste modo, qual é o papel dos sujeitos na busca dos conhecimentos quando
esses parecem ausentes ou insuficientes para a continuidade de seus estudos em
um curso superior? Nesse sentido, também se questiona onde, como ou quais as
experiências individuais marcaram o movimento de superação desses estudantes.
É preciso, assim, apontar para a urgência da corresponsabilização dos
sujeitos em relação à sua formação básica como suporte para a entrada na
educação superior. Pois, se por ora, a formação básica possa estar comprometida; e
nesse momento não se tem interesse em abalizar motivos ou indicar culpados; é,
contudo urgente resgatá-la, para a continuidade dos processos educativos. Aponta-
se que a forma como o sujeito busca suprir a deficiência nessa formação deve estar
em conformidade às suas necessidades e possibilidades, seja para a participação
em atividades promovidas pela Instituição ou por professores ou a partir de recursos
pessoais de busca para o autoconhecimento.
Nesse sentido, atitudes que levem à superação dos obstáculos que se
colocam aos processos formativos devem ser incentivadas. Dessa forma, concorda-
se com projetos institucionais de nivelamento, além de outros programas e projetos
que possam ser oferecidos aos sujeitos em formação, como modo de colaborar
nessa busca. Acredita-se, contudo, que esse processo é também pessoal e
intrínseco e exige comprometimento e corresponsabilização de todos.
É oferecido aos atores, por assim dizer, escapar ao fardo da liberdade, que inclui a responsabilidade pelas ações praticadas. Dessa maneira, o dever moral mistura-se em meio à tensão com o desejo de autopreservação derivado do pertencimento ao grupo. Essa identidade de grupo (como vimos) pode ser conquistada com consequências desastrosas para aqueles definidos como “os outros”, ou “eles” (BAUMAN; MAY, 2010, p. 109 – grifo do autor).
Discorda-se, de que a falta de base seja a razão para que futuros
profissionais sejam submetidos a uma formação simplificada, reduzida em sua
abrangência e que não gere a necessária transformação dos sujeitos. Discorda-se
ainda, de que os sujeitos sejam submetidos a uma formação que não produza um
profissional qualificado e competitivo para os desafios da contemporaneidade.
107
O sujeito da experiência tem algo desse ser fascinante que se expõe atravessando um espaço indeterminado e perigoso, pondo-se nele à prova e buscando nele sua oportunidade, sua ocasião (LARROSA, 2011, p. 25).
Assim como, não se pode aceitar que ao final de anos em processo de
formação, tantos sujeitos revelem tamanha insegurança e insuficiência em relação a
um conteúdo que se coloca como de imensa relevância à formação desses futuros
profissionais.
4.2.2 Unidade 2: O estudante e o professor de Cálculo 1
Na unidade 2, classificam-se aspectos relativos à relação dialógica entre o
estudante e o professor de Cálculo 126. Acredita-se que a forma como o estudante
vê refletida a figura desse professor se expõe a partir dos relatos dos sujeitos
investigados em modos distintos, porém recidivas para determinados grupos de
sujeitos.
Percebe-se, em alguns relatos, que os sujeitos apontam que o professor de
Cálculo 1: “não tem boa didática; não é experiente (aqui no sentido de prática); não
tem sensibilidade”; entre outros elementos relativos ao trabalho docente. Nesse
sentido, é uma relação dialógica tensa, conflituosa e, por vezes, hostil, por meio da
qual responsabilizam o professor pela não ocorrência do resgate da base
matemática necessária para a aprovação na disciplina de Cálculo 1 e preparação
para a sequência dos estudos nos outros Cálculos.
Por outro lado, alguns estudantes confirmam em seus relatos que aspectos
determinantes para o bom desenvolvimento em Cálculo 1 se relacionem diretamente
com: “A ótima didática do professor; O professor experiente; O professor sensível.”
Nessa classificação, destacam que o professor, suas exigências e abordagens
metodológicas são tidas como responsáveis também pelo desempenho satisfatório
do estudante nessa disciplina.
26 Na Instituição em que se deu essa investigação, os professores são em sua maioria mestres ou doutores em Matemática ou Educação Matemática, havendo professores com experiência anterior na Educação Básica; professores com experiência no ensino de Cálculo de mais de 10 anos; e professores que trilharam exclusivamente o caminho acadêmico até seu ingresso na universidade e relativamente novos na Instituição, sendo este último em maior número.
108
4.2.2.1 Considerações sobre a unidade 2
Os sujeitos investigados colocam no professor da disciplina de Cálculo 1 dois
aspectos distintos acerca da passagem por essa disciplina.
O primeiro aspecto evidenciado nos relatos se apresenta muitas vezes em
tom de desabafo, colocando o professor na posição de um “algoz”, e cujas
exigências e atitudes são qualificadas como desumanas, ou responsáveis pelas
reprovações e abandonos na disciplina de Cálculo 1; devido sobretudo, ao que
consideram “falta” de didática e metodologia. Dessa forma, esses sujeitos depositam
no professor a responsabilidade pela disciplina ser de difícil compreensão e
aprendizagem.
No segundo aspecto, mencionam que justamente porque tiveram um bom
professor de Cálculo 1, com ótima metodologia e didática, é que conseguem
entender a disciplina com coerência e perceber a relação entre os conteúdos, assim
como, sua aplicabilidade. Em alguns relatos, essa posição é tomada pelo mesmo
sujeito investigado, quando se refere a dois momentos – espaço/tempo - distintos em
Cálculo 1. Importante mencionar também que estudantes distintos mostraram essa
postura, que aparentemente se contradiz, ao se referirem a um mesmo professor.
Contudo, merece destaque que em algumas respostas, a classificação “bom
professor” foi paralela à constatação de “aprovação” na disciplina. Sendo o contrário
também mencionado, ou seja, “professor ruim” paralelo à informação “reprovado na
disciplina”.
Cursei com três professores diferentes e o terceiro foi o melhor, os outros foram os piores (LM001/AB1).
Conforme exposto no Quadro 5, a seguir, as porcentagens apontam que
21,51% dos investigados, em resposta à abordagem 1, consideraram que os
professores, devido a didática e ou metodologia ruins, são os responsáveis pelas
dificuldades geralmente encontradas ao cursar Cálculo 1.
109
Quadro 5 – Distribuição do número de alunos por curso e contribuição do professor de Cálculo 1 para a disciplina de Cálculo 1 por abordagem27.
Nº SUJEITOS POR CURSO
ABORDAGEM 1 ABORDAGEM 2
Negativa % Positiva % Negativa % Positiva %
EA 13 1 7,69 0 0,00 4 30,77 4 30,77
EC 13 3 23,08 2 15,38 3 23,08 5 38,46
EP 41 10 24,39 4 9,76 7 17,07 6 14,63
EQ 50 10 20,00 2 4,00 10 20,00 11 22,00
ER 13 5 38,46 0 0,00 4 30,77 4 30,77
LF 10 1 10,00 1 10,00 0 0,00 2 20,00
LM 39 8 20,51 4 10,26 10 25,64 9 23,08
LQ 7 2 28,57 1 14,29 1 14,29 2 28,57
TOTAL 186 40 21,51 14 7,53 39 20,97 43 23,12
Por outro lado, 7,53% dos estudantes encontraram em seus professores de
Cálculo 1 o suporte para cursar a disciplina com relativo sucesso. Em resposta à
abordagem 2; 20,97% se manifestaram negativamente, enquanto 23,12% apontaram
que o professor foi uma parte importante de seu bom desempenho na disciplina. A
alusão à figura do professor aparece tanto na abordagem 1, quando os estudantes
foram solicitados a comentar sobre a disciplina de Cálculo 1, quanto na abordagem
2, quando solicitados a comentar sobre o seu desempenho nesta disciplina. Em
nenhum momento, contudo, os investigados foram solicitados a comentar sobre seus
professores de Cálculo 1.
Como mencionado, cabe destacar que em vários relatos, a referência ao bom
professor apareceu relacionada à aprovação do estudante na disciplina, assim como,
a proposição em contrário, vinculada à reprovação. No entanto, foi possível observar
também relatos em que o estudante se coloca satisfeito com os métodos e didática
do professor, mesmo não tendo um bom desempenho ou tendo sido reprovado na
disciplina.
Desisti 2 vezes, pois não pratiquei o conteúdo e não aprendi o conteúdo proposto pelo professor, ficando desmotivado: Quando peguei um professor com uma didática diferenciada aprendi o conteúdo e passei (EC005/AB1).
27 Ressalta-se que o somatório dos sujeitos computados nas abordagens 1 e 2 diferem do total de sujeitos
investigados, pois alguns estudantes não se enquadraram para as opções “negativa” e “positiva” e outros foram computados em ambas as possibilidades em função de seus relatos.
110
O fato de ter reprovado tem a ver com a forma de ensino que tive, talvez culpa do professor por não estar atuando, na época, em sua área de graduação. No caso em que fui aprovado consegui acompanhar a matéria com auxílio do professor que tinha bastante experiência na área (ER006/AB2).
Na primeira vez que cursei a disciplina não obtive nenhum aproveitamento, pois não consegui entender praticamente nada em relação ao conteúdo, acredito que parte do motivo de não entender nada, tenha vindo do professor, pois na segunda vez que cursei a disciplina com outros professores tive um ótimo aproveitamento e passei com notas excelentes (LM025/AB2).
Destaca-se também os aspectos mencionados pelos estudantes de
Engenharia de Energia Renováveis (ER), no Quadro 5, em que mais de 38%
apontaram, na abordagem 1, o professor como um fator a contribuir para as
dificuldades em Cálculo 1, entretanto, nenhum estudante manifestou o contrário
nesta abordagem. Importante mencionar que tais sujeitos ingressaram no curso de
ER em anos distintos, portanto, cursaram essa disciplina em anos diferentes, sendo
grande a chance de que não estejam se referindo a um mesmo professor; em razão
da mobilidade regularmente encontrada nessa universidade quanto à permanência
do professor na mesma disciplina.
Busca-se assim uma caracterização mais explícita desses dados. O
percentual de 38% se refere a 5 estudantes da ER, e a partir de seus relatos,
destacam-se os pontos principais de suas respostas `a abordagem 1, e
acrescentam-se informações sobre o perfil desses sujeitos e suas respostas à
abordagem 2.
Para o sujeito (ER010), os professores precisariam dar atenção especial aos
estudantes, ter paciência e apresentar uma explicação precisa e clara dos
conteúdos. O estudante em questão cursou 4 vezes a disciplina de Cálculo 1, tendo
ingressado no curso em 2009. Na abordagem 2 manifesta que cursou 4 disciplinas
de Cálculo 1 diferentes, e destaca o papel de cada um dos professores nessa longa
passagem.
111
A primeira vez que fiz no primeiro semestre de 2009, o professor mal ensinava e tocava o conteúdo como se nós alunos já dominássemos a matéria [...] No segundo semestre de 2009 (2ª vez), outra vez a professora considerou o aluno gênio. Utilizando aulas expositivas e sem clareza nas suas explicações, apenas 3 alunos passaram numa turma de 50. Minha terceira vez, já lembrava e havia aprendido alguns conceitos das experiências passadas, porém, talvez pelo fato de estar desmotivado por tanta reprovação acabei reprovando novamente, mas com um excelente professor. Quando finalmente aprovei na disciplina estudando e mais focado e claro com um professor consciente, consegui aprovar (ER010/AB2).
Segundo ER011, o professor de Cálculo 1 era engenheiro e devido às “falhas”
do início, tem dificuldade agora em Cálculo 3. Esse estudante cursou a disciplina
uma vez em 2009, ano de seu ingresso. Na abordagem 2 parece valorizar o nível de
cobrança do professor, mas não os métodos.
O meu desempenho em Cálculo 1 foi bom, devido ao nível de cobrança, pois tínhamos até matéria de Cálculo 2, passei com nota 6,8. Acredito que poderia ter sido melhor aproveitada se fosse melhor dada (ER011/AB2).
Para ER009, o professor mais “tranquilo de passar” não é o que “ensina
melhor”, pois deixa o aluno passar despreparado. “Professor difícil” cobra o conteúdo
completo, mas às vezes não tem dinâmica para dar aulas. Esse estudante cursou
Cálculo 1 uma vez, em 2012, e menciona na abordagem 2 que teve um bom
professor que cobrou o conteúdo integralmente, revisava conteúdos importantes e
dava exercícios.
Em cálculo 1, peguei uma professora boa que nos cobrava conteúdo de forma integral. Inicialmente foi passado o que deveríamos saber e um resumo do mais importante para conhecermos o cálculo 1. Tive de estudar, fazer os exercícios (ER009/AB2).
O professor de Cálculo 1, para ER008, tem que ensinar muito conteúdo em
pouco tempo, dando a matéria de um modo “bruto” (grifo do sujeito). Esse estudante
ingressou em 2010, e foi aprovado na terceira vez que cursou Cálculo 1, quando,
enfim, segundo menciona em seu relato, conseguiu entender melhor o que o
professor explicava.
112
Meu desempenho na disciplina de Cálculo I foi muito bom, apesar de ter concluído na terceira tentativa, tive um aproveitamento muito bom. Nas duas primeiras tentativas minha principal dificuldade foi de assimilar o conteúdo, além do fato de não estar ainda adaptado ao "ritmo" da faculdade. Já na terceira tentativa o conteúdo estava assimilado, e assim pude compreender melhor o que o professor explicava (ER008/AB2).
De acordo com ER007 as dificuldades impostas pelo professor criam uma
barreira entre ele e os alunos. Esse estudante ingressou em 2010 e cursou uma vez
Cálculo 1. Na abordagem 2 manifesta o grande número de repetentes matriculados
em sua turma e o pouco tempo disponibilizado à cadeira.
Eu fui relativamente bem, a minha turma era composta basicamente de repetentes, as exceções era eu e dois alunos. Devido ao semestre ter sido reduzido, ou pouco tempo disponibilizado para a cadeira, achei que o final da disciplina não foi tão proveitoso (ER007/AB2).
É possível notar, a partir dos relatos destacados, que os sujeitos ao
encontrarem algo de negativo em sua passagem pelo Cálculo 1 demonstram,
explícita ou implicitamente, que tal fato está ligado ao professor que ministrava a
disciplina. Mesmo aprovado na primeira vez que a cursou, ER007 demonstrou que
não estava satisfeito em relação à forma como essa tinha sido trabalhada. Isso pode
significar que talvez esse sujeito esperasse ter um melhor desempenho. Nesse
sentido, observa-se uma responsabilização colocada exclusivamente no professor,
e, por conseguinte a retirada da responsabilidade do estudante nessa passagem.
Falta corresponsabilização aos sujeitos?
Enquanto sujeitos deixam de assumir a sua parcela de encargos perante a
disciplina de Cálculo 1, podem estar sobrecarregando outros grupos de sujeitos, que
dessa forma, pelo excesso, também ficam limitados no desenvolvimento de suas
ações. Nesse sentido, Bauman e May (2010) contribuem ao mencionar do que pode
depender a escolha de ação de uma pessoa livre para assumir responsabilidades.
Assim, enquanto todas as pessoas são livres e não podem ser outra coisa senão livres – elas são obrigadas a assumir responsabilidade por tudo que fizerem –, algumas são mais livres que outras, porque seus horizontes e escolhas de ação são mais amplos, e elas, por outro lado, podem depender da restrição dos horizontes de outros (BAUMAM; MAY, 2010, p. 48).
113
Outro fator que pode ser considerado a partir dos relatos dos sujeitos
investigados diz respeito às listas de exercícios propostas pelos professores. Um
número significativo de estudantes relacionou o bom professor com a proposição de
listas de exercícios, uso de apostilas e resolução de exercícios em aula, podendo
indicar que tais práticas dos professores sejam, de certa forma, validadas por grande
número estudantes de Cálculo 1. O fato de o professor não dar listas de exercícios
foi apontado, em alguns relatos, como indicador de uma “didática ruim”. Contudo, se
o professor ofereceu listas extensas ou não fez a correção de todas as questões,
segundo os sujeitos investigados, esse procedimento também foi negativo e
dificultador da aprendizagem desse estudante em Cálculo 1. Desse modo, evidencia-
se indícios de algumas marcas do trabalho educativo nos estudantes.
No começo encontrei algumas dificuldades o que é normal, mas percebi que consegui aprender com as práticas dos exercícios. Pois o professor nos dava lista para fazer. E resolvendo as listas propostas eu consegui aprender (LM010/AB2).
[...] 4ª vez - aprovada; e com facilidade, o método da professora era por apostilas; explicava os conceitos e fazíamos exercícios na aula (EQ024/AB2).
Na primeira vez que fiz cálculo 1 reprovei. Eram feitos poucos exercícios em aula e o professor, que era um engenheiro por formação, parecia mais interessado no resultado final da questão do que no seu desenvolvimento. O fato parece importante, visto que, quando fiz cálculo 1 pela segunda vez, com um professor formado na área da matemática, eram feitos vários exercícios em sala de aula com formação de grupos de estudo. O professor utilizava uma apostila com vários exemplos e exercícios, o que ajudava nos estudos (EA013/AB1).
Em alguns relatos essa didática “melhor” também aparece corroborada pela
proposição de listas, uso de apostilas e resolução de exercícios. Dessa forma,
questiona-se: O que é a Didática no contexto da aula de Cálculo 1?
Marcas do trabalho educativo parecem sinalizar para a presença de uma
Didática do Cálculo 1, inserida na relação com a qualidade da exposição do
professor de Cálculo 1; no foco nos conteúdos dessa disciplina; no fazer muitos
exercícios ou a deixar que os estudantes os façam em aula; além dos procedimentos
de passar listas de exercícios; corrigir essas listas e produzir apostilas de Cálculo 1.
114
Candau (1984) aponta que não se pode reduzir a didática28 ao aparato da
técnica. Parece ainda haver uma falta de clareza entre os sentidos de metodologia e
de didática, que ao serem confundidos pelos sujeitos investigados, dão a entender
que o processo de construção do conhecimento em aulas de Cálculo 1 seja um mero
campo de técnicas.
Em relação às licenciaturas que totalizaram 56 estudantes nos três cursos
investigados, e em resposta à abordagem 1, 11 desses 56 estudantes, ou seja cerca
de 20%, apresentaram uma postura de desaprovação da didática do professor de
Cálculo 1, por outro lado, 6 desses estudantes, ou seja, pouco mais de 10% se
posicionaram favoravelmente nessa direção. Ainda em relação às licenciaturas, os
dados apontam também que 11 sujeitos investigados desabilitam a didática do
professor, na abordagem 2, enquanto 12 estudantes se posicionam de forma
favorável em relação à didática do professor nessa abordagem..
Ainda nessa consideração, nota-se uma elevação no número de relatos em
favor do professor na abordagem 2 e, procura-se clarear essa constatação. Os
dados demonstram que 14 estudantes das licenciaturas mencionam positivamente o
trabalho do professor. Sendo apresentado como fator positivo: as listas de exercícios
(4); a boa explicação do conteúdo (3); a disponibilidade do professor (2); o bom ou
ótimo professor (1); saber o conteúdo (1); a ênfase em determinado conteúdo (1); a
didática do professor (1); e o bom professor devido ao ótimo aproveitamento do
estudante na disciplina (1).
Evidencia-se, nessa dialogicidade, as dimensões em que os estudantes
classificam o “bom” professor de Cálculo 1. Todos os aspectos giram em torno de
uma relação dialógica, contudo, que não parece exprimir reciprocidade. Pois, o modo
como o sujeito classifica o “bom professor” pode não estar em consonância com o
entendimento que esse professor tem do que seja “bom professor”.
28 A didática não poderá continuar sendo um apêndice de orientações mecânicas e tecnológicas. Deverá ser, sim, um modo crítico de desenvolver uma prática educativa, forjadora de um projeto histórico, que não se fará tão-somente pelo educador, mas pelo educador, conjuntamente, com o educando e outros membros dos diversos setores da sociedade (CANDAU, 1984, p. 30).
115
Pergunta-se: O que se passa na relação entre os homens? Realiza-se sempre numa reciprocidade total? Pode ou deve ela sempre realizar-se assim? Não depende ela, como aliás, tudo o que é humano, das limitações de nossa deficiência e não está submissa às restrições das leis internas de nossa existência com o outro? (BUBER, 2009, p. 121).
Para Buber (2009) há diversos modos EU-TU, que por sua natureza não se
realizam na plena mutualidade, e que conservam suas características próprias.
Interessante quando um dos sujeitos reflete explicitamente “o bom professor”
em decorrência de ter tido ótimo desempenho na disciplina, ou adjetiva o sentido de
didática, dando essa qualidade ao professor que considera bom. Nesse sentido,
também se destaca a mesma qualidade para o professor que dá listas de exercícios.
[...] Com a nova professora, conforme o conteúdo era dado, comecei a ligar os pontos e compreender a disciplina, e percebi que o problema estava na explicação do professor anterior, por que as coisas que eu não sabia até então, eram simples. Com esta nova professora pude abrir a mente e entender Cálculo I (EA009/AB2).
A partir dos relatos, corroboram-se as expectativas de que o professor, que
para um determinado aluno é considerado ótimo, para outro, não necessariamente o
será. Portanto, uma busca por mecanismos que padronizem as ações dos
professores poderia não implicar uma inovação nos processos de ensino de Cálculo
1, ou melhores resultados nessa disciplina.
Nessa perspectiva, até que ponto uma inovação é válida, se formas
tradicionais de abordagens de conteúdo, como propor e recorrer à resolução de
listas de exercícios parece “qualificar um bom professor”? Nessa direção, Reis
(2001) questiona a impressão que os estudantes têm de terem aprendido o conteúdo
ao conseguirem resolver os exercícios, impressão essa que para esse autor, parece
compartilhada por muitos professores e autores de livros de Cálculo. No entanto,
outros olhares são possíveis, assim como se considera válida toda proposta de
inovação e tão pouco se desvaloriza as formas tradicionais de abordagens de
conteúdo.
Desse modo, diante da complexa rede de subjetividades que compreende a
relação dialógica em aulas de Cálculo 1, encontra-se uma relação de reciprocidade,
de compartilhamentos, e que não acolhe apenas um encontro impessoal e
116
desprovido de afetividade. Nesse sentido, Buber (2009) expõe sobre as
subjetividades na relação educativa.
Para auxiliara realização das melhores possibilidades existenciais do aluno, o professor deve apreendê-lo como esta pessoa bem determinada em sua potencialidade e atualidade, mais explicitamente, ele não deve ver nele uma simples soma de qualidades, tendências e obstáculos, ele deve compreendê-lo como uma totalidade e afirmá-lo nesta sua totalidade. Isto só se lhe torna possível, no entanto, na medida em que ele o encontra, cada vez, como seu parceiro em uma situação bipolar. E, para que sua influência sobre ele tenha unidade e sentido, ele deve experienciar esta situação, a cada manifestação e em todos os seus momentos, não só de seu lado, mas também do lado de seu parceiro; ele deve exercitar o tipo de realização que eu chamo envolvimento. Entretanto, se acontecer com isso, de ele despertar também no discípulo a relação Eu-Tu, de tal modo que este o apreenda e o confirme igualmente como esta pessoa determinada, a relação específica educativa poderia não ter consistência se o discípulo, de sua parte, experimentasse o envolvimento, isto é, se ele experiências se na situação comum, a parte própria do educador (BUBER, 2009, p. 121-122).
Assim, colocam-se as considerações subjacentes à experiência de cada um
dos sujeitos na passagem pela disciplina de Cálculo 1, como sujeitos e lugar da
experiência na relação dialógica que se estabelece nesse espaço de convivência e
conflito de identidades.
4.2.3 Unidade 3: O estudante e a Instituição
Na proposição pensada para esta unidade, a relação dialógica e subjetivante
que se manifesta ao longo da passagem dos sujeitos pela disciplina de Cálculo 1
inclui a Instituição. No entanto, o que a Instituição tem a ver com o desenvolvimento
e/ou desempenho dos estudantes na disciplina de Cálculo 1?
Admite-se que a relação dialógica desejada entre a Instituição e o estudante é
a de garantia ao acesso às informações e às estruturas necessárias para a
permanência e passagem com sucesso desses estudantes pelas cadeiras ofertadas
nos diversos cursos em que se matriculam. Nessa direção, admite-se também, que
as formas de organização e implantação do currículo são rudimentos dessa relação
dialógica. Dados coletados nesta pesquisa deixam transparecer que elementos
relativos à estrutura curricular da disciplina de Cálculo 1 são mencionados ora como
facilitadores da aprendizagem na disciplina, ora como dificultadores desse processo.
117
Dessa forma, tal unidade foi conduzida pela recorrência nos relatos dos
estudantes investigados que exemplificaram aspectos dificultadores do
desenvolvimento dos investigados, tais como: “a falta de informação para o calouro;
a dificuldade de adaptação ao ritmo da universidade; o fato de a universidade ser
diferente do Ensino Médio; o excesso de conteúdos na cadeira de Cálculo 1; a falta
de um curso de Pré-Cálculo”. Desse modo, permitindo-se ao propor esta unidade,
pensar na relevância da Instituição para o ingresso e permanência desses na
universidade e, sobretudo, no acompanhamento ao longo dos semestres iniciais
como aluno de um curso superior, etapa essa em que é ministrada a disciplina de
Cálculo 1. Em alguns relatos, esse canal de comunicação pareceu inexistente ou
corrompido.
Entretanto, há que se levar em conta também, os aspectos nesses relatos que
se mostraram como positivos em torno dessa relação, tais como: “a informação dada
aos calouros; a qualidade da estrutura para estudos; os elementos facilitadores da
adaptação dos ingressantes”. Tais mecanismos são reconhecidos pelos investigados
e dão indícios da forma como esses compreendem a disposição da Instituição para
atender aos ingressantes, bem como para dar o acompanhamento necessário
durante esse processo. Entende-se que os aspectos positivos apontados podem
colaborar para tornar mais familiar o ambiente novo, e nesse sentido, contribuir para
o desenvolvimento do estudante na disciplina de Cálculo 1.
Considera-se também, que essa relação dialógica inclui as decisões da
Instituição quando busca: “informar a fim de evitar a perda de prazos dos estudantes;
aperfeiçoar os processos de matrículas; orientar a respeito do acesso a documentos;
orientar para a participação em projetos; orientar para o acesso a materiais para
estudos, entre outros”.
4.2.3.1 Considerações sobre a unidade 3
Leva-se em conta, para as considerações relativas à unidade 3, as falas dos
sujeitos que indicaram a Instituição como um elemento a interferir negativa ou
positivamente na passagem dos estudantes pela disciplina de Cálculo 1. Dessa
118
forma, novamente se encontra aspectos que ora colocam as contribuições da
Instituição como adversas ao desenvolvimento e desempenho dos estudantes na
disciplina, e ora como um elemento que, ao contrário, contribui para que os sujeitos
não encontrem ou superem as dificuldades.
Destaca-se que a referência à Instituição foi de relativa significância em
comparação aos outros aspectos apontados, devido ao fato de pouco ter sido citada
e em vista dos relatos em que apareceu implicitamente; mas houve uma recorrência
e, portanto, os dados foram colocados em análise.
Conforme apresenta o Quadro 6, o que permitiu pensar a Instituição como
elemento a contribuir negativamente junto a disciplina de Cálculo 1 foi apontado nos
relatos de 14,52% dos investigados, que deram indícios dessa correlação de forma
explícita, ou implicitamente. Por vezes o estudante se refere ao choque de realidade
ao ingressar, ou seja, expõe que encontrou uma realidade diferente ao deparar-se
com a matemática universitária e foi incomodado por essa situação.
Na abordagem 1, um estudante do curso de Licenciatura em Física deixa
transparecer sua impressão quanto a iniciativa da Instituição em oferecer uma
revisão que considera necessária para reforçar a base matemática. Lembra-se,
nesse sentido, que os conteúdos programáticos da disciplina de Cálculo 1, comuns a
todos os cursos que ofertam essa disciplina, constituem uma iniciativa institucional,
obviamente que corroborada pela comunidade docente.
A disciplina mostra primeiramente uma revisão sobre funções, gráficos de funções para então começar as Derivadas. Muitas vezes a falta de base do aluno em funções o prejudica [...] Alguns cursos disponibilizam a cadeira de pré-cálculo o que ajuda muito antes de começar cálculo 1, pois reforça a base sobre funções (LF010/AB1).
Em continuidade, na analise dos dados relativos à abordagem 2, verifica-se
que 12,37% dos investigados colocam na universidade um dos motivos de seu
desempenho insatisfatório na disciplina de Cálculo 1, enquanto nenhum manifesta a
relação com a universidade como algo positivo para seu próprio desempenho.
Conforme Bauman e May (2010), as próprias ações são pensadas tendo como
modelo as ações dos outros, e para isso, sacam-se sempre de ferramentas
119
explicativas, ou justificadoras. Desse modo, tornam-se perfeitamente comparáveis
aos sujeitos, as ações da Instituição e os resultados de suas próprias ações.
Em geral agimos para alcançar um estado de coisas, seja visando possuir um objeto, receber elogios, impedir que aconteça algo que não nos agrada ou ajudar um amigo. Naturalmente, o modo como pensamos nossas ações é o modelo pelo qual damos sentido às ações dos outros. Nessa medida, a única maneira que temos para conferir sentido ao mundo humano à nossa volta é sacar nossas ferramentas explicativas estritamente no interior de nossos próprios mundos da vida (BAUMAM; MAY, 2010, p. 21).
Na sequência, apresenta-se o Quadro 6 cuja classificação é uma tentativa de
organizar os relatos que indicaram a Instituição como um elemento a interferir
negativa ou positivamente nos resultados dos sujeitos na disciplina de Cálculo 1.
Quadro 6 - Distribuição do número de alunos por curso e contribuição da Instituição para a disciplina
de Cálculo 1 por abordagem29.
Nº SUJEITOS POR CURSO
ABORDAGEM 1 ABORDAGEM 2
Negativa % Positiva % Negativa % Positiva %
EA 13 1 7,69 0 0,00 2 15,38 0 0,00
EC 13 3 23,08 0 0,00 1 7,69 0 0,00
EP 41 7 17,07 0 0,00 3 7,32 0 0,00
EQ 50 2 4,00 0 0,00 4 8,00 0 0,00
ER 13 3 23,08 0 0,00 4 30,77 0 0,00
LF 10 3 30,00 1 10,00 2 20,00 0 0,00
LM 39 5 12,82 0 0,00 5 12,82 0 0,00
LQ 7 3 42,86 0 0,00 2 28,57 0 0,00
TOTAL 186 27 14,52 1 0,54 27 12,37 0 0,00
Seriam os aspectos positivos inexistentes para a Instituição? A Instituição
contribui apenas negativamente para a formação dos sujeitos? Cabe lembrar que as
abordagens colocadas aos sujeitos pediam que comentassem sobre a disciplina de
Cálculo 1 e sobre seu desempenho em Cálculo 1, portanto, não foi solicitado que se
remetessem à Instituição. Ademais, mais de 75% dos investigados não se
manifestaram em relação à Instituição. Dessa forma, não se tem elementos para
responder a tais questionamentos, além de que a Sociologia contribui para o
entendimento da forma como se percebem as ações dos outros.
29 Ressalta-se que o somatório dos sujeitos computados nas abordagens 1 e 2 diferem do total de sujeitos
investigados, pois alguns estudantes não se enquadraram para as opções “negativa” e “positiva” e outros foram computados em ambas as possibilidades em função de seus relatos.
120
Tendemos a perceber tudo que acontece no mundo em geral como resultado da ação intencional de alguém, que procuramos até encontrar, acreditando, então que nossas investigações tiveram êxito. Assumimos que a boa vontade está por trás dos eventos para os quais somos favoravelmente predispostos e que há más intenções por trás daqueles que nos desagradam. Em geral, as pessoas têm dificuldade em aceitar que uma situação não seja efeito de ações intencionais de alguém identificável (BAUMAN; MAY, 2010, p. 22).
Outro aspecto apontado pelos estudantes e considerado nesta classificação
diz respeito à organização da estrutura curricular dos cursos, como exemplo, o fato
de o Cálculo 1 ser disciplina de 1º semestre em sete dos oito cursos citados na
presente pesquisa, excluindo-se destes, apenas o curso de Licenciatura em
Matemática. E, nesse sentido, cabe destacar a referência ao grande volume de
conteúdos cobrados na disciplina.
É a disciplina que estuda funções, limites e Derivadas. [...] No caso das engenharias é apresentada no primeiro semestre ao aluno, causando às vezes um impacto e fazendo com que algumas pessoas até desistam do curso (EA004/AB1).
Os investigados imprimem também responsabilidade à Instituição quando
sinalizam para a falta ou troca de professores durante o mesmo semestre. Sabe-se
que é uma prática institucional recorrer à divisão da disciplina por mais de um
professor. Acredita-se, nesse sentido, que a divisão de uma disciplina por mais de
um professor possa até trazer benefícios quanto às diferentes possibilidades de
abordagens pedagógicas. Contudo, para alguns dos sujeitos pesquisados esse
procedimento é apresentado de forma negativa. Assim, não há como desviar-se de
outras ocorrências também justificáveis pela Instituição, como o afastamento de um
professor para tratar assuntos particulares ou de interesse institucional. Destaca-se
ainda, o fato isolado da greve dos professores federais ocorrida em 2012, que
também foi mencionado.
[...] Porém, durante a disciplina teve alguns contratempos, como a greve que interrompeu a disciplina no meio do semestre e a troca de professores durante o curso, mudando bastante o conceito de aula (LM007/AB1).
Meu desempenho foi bom, também meu cálculo não foi muito completo, pois sofremos com trocas de professores ao longo do semestre. Tive dificuldade com limites, porém Derivada e seus conceitos foi fácil (EC012/AB2).
121
Desse modo, até que ponto os estudantes estão informados acerca de ações
que são institucionais, mas que implicam consequências diretas no desenvolvimento
das aulas? Quando estudantes questionam a troca de professores, têm clareza dos
motivos institucionais envolvidos? Acredita-se que a transparência e clareza das
informações possam colaborar para a melhor continuidade dos processos de
formação. Pensar sociologicamente é dar sentido à condição humana por meio de
uma análise das numerosas teias de interdependência, que segundo Bauman e May
(2010) são as árduas realidades a que se referem para explicar os motivos e os
efeitos de suas ativações.
Em relação aos conteúdos programáticos, na Instituição em pesquisa, para as
disciplinas comuns – Álgebra Linear, Cálculos I, II e III, Cálculo Numérico, Equações
Diferenciais, Geometria Analítica e Probabilidade e Estatística, há um plano oficial
com a descrição dos conteúdos a ser cumpridos pelos professores que ministram
essas disciplinas.
Quanto a esse fato, os estudantes em seus relatos utilizaram expressões que
sinalizam para a dificuldade em vencer o conteúdo, deixando claro que o tempo de
um semestre em aulas e o excesso de conteúdos pudessem ser motivos de
dificuldade na disciplina.
Fui bem em cálculo 1, tive mais dificuldades em limites, mas hoje sinto falta de ter tido mais tempo em aulas. Para quem tem dificuldades na área de exatas um semestre para cálculo 1 é pouco tempo (LF004/AB2).
[...] Sem essas "bases" o tempo disponível para vencer o conteúdo, tempo esse que já é reduzido, torna-se insuficiente para o aprendizado satisfatório do conteúdo (EC006/AB1).
O Quadro 7 apresenta a descrição dos conteúdos programáticos definidos
pela Instituição para a disciplina de Cálculo 1.
A disciplina de Cálculo 1 ministrada na Instituição em pesquisa possui uma
carga horária de sessenta horas semestrais, alocadas em quatro créditos semanais.
Pode-se aceitar que grande parte da carga horária da disciplina seja utilizada para o
trabalho com funções, ou seja, indicando que ocorra uma retomada de conteúdos
relativos ao Ensino Médio, para depois adentrar a introdução ao Limite, restando
122
algo em torno de 1/3 do tempo semestral para a abordagem da Derivada. Assim
sendo, se o trabalho com funções pudesse ser abreviado, talvez contribuísse para
uma maior disponibilização para o estudo do Limite e da Derivada, melhorando o
fator tempo para vencer o conteúdo. Contudo, como abreviar o trabalho com
funções, sendo o objeto do Cálculo 1 justamente o estudo de funções,
principalmente quando se tem evidências das defasagens dos sujeitos ingressantes
em relação a esse conteúdo?
Quadro 7 – Descrição dos Conteúdos Programáticos para a disciplina de Cálculo 1, comum a todos os cursos pesquisados.
1. CONJUNTOS NUMÉRICOS 1.1. Conjuntos. 1.2. Conjuntos numéricos. 1.3. O conjunto dos números reais. 1.4. Intervalos e desigualdades. 2. FUNÇÕES 2.1. Definição, domínio, imagem e gráfico. 2.2. Funções injetora, sobrejetora, bijetora e inversa. 2.3. Função crescente e decrescente. 2.4. Função par e ímpar. 2.5. Função afim ou de primeiro grau. 2.6. Função quadrática ou de segundo grau. 2.7. Função exponencial. 2.8. Função logarítmica. 2.9. Funções trigonométricas. 2.10. Funções trigonométricas inversas. 3. LIMITE E CONTINUIDADE 3.1. Definição e propriedade de limite. 3.2. Limites laterais. 3.3. Limites fundamentais. 3.4. Limites infinito. 3.5. Assíntota vertical e horizontal. 3.6. Limites no infinito. 3.7. Continuidade de funções reais. 3.8. Teorema do Valor Intermediário. 4. DERIVADA 4.1. Definição de Derivada e reta tangente. 4.2. Derivada de funções elementares. 4.3. Regra do produto e quociente. 4.4. Regra da Cadeia. 4.5. Derivada de funções implícitas. 4.6. Derivada da função inversa. 4.7. Derivadas de ordem superior. 4.8. Taxas de variação. 4.9. Diferencial e aplicações. 4.10. Teorema de Rolle e do valor médio. 4.11. Crescimento e decrescimento de uma função.
4.12. Concavidade e pontos de inflexão. 4.13. Traçando o esboço do gráfico de uma função através de Derivadas. 4.14. Problemas de maximização e minimização. 4.15. Formas indeterminadas - Regras de L'Hospital.
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Admite-se também, que o tempo gasto por um professor para ministrar um
determinado conteúdo varie consideravelmente, levando-se em conta aspectos
como o perfil desse professor; dos vários alunos do curso; do próprio curso e até
mesmo da Instituição.
Outra consideração que remete à Instituição tem relação com a oferta de um
curso de “Pré-Cálculo”. Vários estudantes consideraram apontaram esse curso como
suporte para o estudo de Cálculo 1. Contudo, verifica-se que já ocorreu, e ainda
ocorre na Instituição em pesquisa, de ser oferecido o curso de nivelamento, atitude
que tem seu valor, uma vez que alguns estudantes mencionaram que, após
frequentar esse curso, houve uma redução de sua dificuldade na disciplina.
No entanto, verifica-se também que a procura e permanência do estudante
em cursos desse tipo, como é o caso de um Curso de Nivelamento ou de Pré-
Cálculo, é bastante restrita, pois há obstáculos organizacionais que às vezes
impossibilitam a participação de muitos estudantes, como o choque de horários com
outras disciplinas obrigatórias, além dos obstáculos pessoais.
Também nessa direção, está a capacidade de comunicação entre a Instituição
e os estudantes. Embora a Instituição mantenha um canal de notícias via internet, há
evidências de sujeitos que, por falta ou dificuldade de acesso, não encontram
informação a respeito de horário e funcionamento desses cursos.
Foi a minha insônia por dois semestres, no qual encontrei grande dificuldade por curso médio não me preparar, e na universidade não ter Pré-cálculo (EQ021/AB1).
Na Instituição em pesquisa, a oferta do Curso de Pré-Cálculo está, em geral,
vinculada a um projeto de ensino, que é implantado por professores do curso de
Licenciatura em Matemática, e ofertada em horários em que haja disponibilidade
para os professores e bolsistas do projeto. Nesse sentido, pela incompatibilidade de
horário, tem-se observado que a procura por esses cursos nem sempre compreende
um número significativo de estudantes. Outro aspecto diz respeito aos estudantes
que deixam de frequentar esses cursos, pois a partir do momento que encontram
segurança em um determinado conteúdo, para o qual buscaram apoio, passam a
dedicar-se a outras prioridades, pois já supriu a necessidade pontual ou mais
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urgente desse estudante. Nessa direção, a Sociologia tenta explicar no que se
baseiam as escolhas voluntárias dos indivíduos.
Além disso, baseia-se no fato de que a escolha é voluntária porque o ator a praticou por livre opção, sem ser incentivado, empurrado, puxado ou tiranizado, nem o fez por hábito ou súbita irrupção de paixão. Ao escolher os cursos de ação por meio de deliberação consciente e racional, também se antecipa prováveis resultados. Isso exige o exame da situação real na qual a ação terá lugar e dos efeitos que com ela espera-se alcançar. Para tanto, normalmente leva-se em conta tanto os recursos disponíveis quanto os valores que orientam nossas condutas (BAUMAN e MAY, 2010, p. 100).
Portanto, uma saída institucional para reduzir os resultados negativos em
Cálculo 1 seria a criação de uma disciplina de Pré-Cálculo obrigatória na grade
curricular desses cursos? Pois, nesse caso, sem o obstáculo do horário
incompatível, talvez pudesse contribuir para atenuar os déficits na base dos
estudantes e para a redução do conteúdo programático de Cálculo 1, uma vez que
os conteúdos apontados no Quadro 7, nos itens 1 e 2, tratam de revisão do Ensino
Médio. Talvez dessa forma, colaborasse para que melhores resultados fossem
alcançados na disciplina de Cálculo 1.
Acredita-se que essa ação isolada, não é por si só garantia de melhora no
quadro de resultados. Remete-se, dessa forma, aos aspectos já apontados nas
considerações sobre a unidade 1 que trata da relação do estudante com sua
formação básica, no que diz respeito à disciplina de TEF. Ademais, devem-se
considerar os vários fatores organizacionais que envolvem a criação de uma nova
disciplina na grade curricular de um curso.
Volta-se também, a partir dos relatos de alguns sujeitos investigados, a
atenção para o aspecto que diz respeito à adaptação desses estudantes nessa
etapa de formação superior, pois, conforme citado pelos sujeitos, ao ingressar na
universidade encontram um cenário diferente daquele vivenciado no Ensino Médio,
além de vários outros problemas que se particularizam nas dificuldades vivenciadas
por esses estudantes.
A primeira vez em que cursei a disciplina de Cálculo 1, ocorreram problemas familiares e precisei ir para a minha cidade de origem [...] (EP027/AB2).
125
Muitos dos estudantes ingressantes em universidades públicas vêm de outras
cidades ou estados e não estão familiarizados com a nova realidade social, cultural e
econômica que encontram ao ingressar na universidade. É nesse turbilhão de novos
fatos e de assumir novas responsabilidades que se deparam com a disciplina de
Cálculo 1. Bauman e May (2010) contribuem acerca de fatores materiais que
conformam a capacidade de se alcançar objetivos.
Apesar da importância do aspecto determinação, o que dizer se nos faltam meios para efetivar nossas decisões? [...] O que demonstramos aqui é o fato de que a liberdade de escolha não garante nossa liberdade de efetivamente atuar sobre essas escolhas nem assegura a liberdade de atingir os resultados desejados (BAUMAN; MAY, 2010, p. 33).
Um dos relatos se refere ao Cálculo 1 como um dos primeiros choques pelo
qual os estudantes passam quando chegam à Universidade. Sendo considerado um
dos “primeiros choques”, significa que há outros, e a conotação da palavra choque
permite considerar que haja indícios de desconforto e insegurança nessa relação.
A primeira vez que cursei foi quando ingressei, foi um choque a realidade da matemática universitária e a forma como o professor abordava os conteúdos e a impessoalidade, optei por desistir da disciplina [...] (LF002/AB1).
Nesse sentido, o papel da Instituição parece imprescindível desde a chegada
e ao longo da passagem dos estudantes pela disciplina de Cálculo 1. E, assim,
contribui para que nesse processo se tornem mais bem preparados e familiarizados
com a estrutura institucional; com as questões administrativas e pedagógicas; com
as escolhas e opções de matrículas, diminuindo-se assim, uma possível sobrecarga
no semestre. Inclusive, que sejam orientados no que se refere aos aspectos
pessoais que também contribuem para a permanência com sucesso desses
estudantes na Instituição e na cadeira de Cálculo 1, evitando-se desse modo, que
grupos formais e informais se constituam pelas expectativas que lançam sobre os
sujeitos, instalando-se os hiatos de compreensão no interior dessa relação entre os
estudantes e a Instituição. “Quando esses hiatos de compreensão se instalam entre
grupos, costumam ser preenchidos por suposições estereotípicas” (BAUMAM; MAY,
2010, p. 34).
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Neste contexto, salienta-se que não cabe unicamente à Instituição resolver os
problemas relacionados à disciplina de Cálculo 1. Todos os envolvidos nessa relação
dialógica devem contribuir nessa busca que é urgente e necessária por ter-se em
mente a constituição de um profissional qualificado e preparado para a
contemporaneidade. Igualmente, o relato seguinte exprime a importância de todos os
envolvidos na relação dialógica promovida em processo de construção do
conhecimento possibilitado por meio das aulas de Cálculo 1.
Na primeira vez que cursei a disciplina, eu era calouro e ainda não conhecia o "ritmo" de uma universidade, [...] eu não entendia a explicação do professor. [...] Como não tinha nota suficiente para realizar prova substitutiva, já havia reprovado automaticamente, porém, para mim já era algo esperado, nesse semestre reprovei em Cálculo I [...] Consegui mudar a nota para 7,0. Para a terceira prova, estudamos pesado eu e minha namorada, a prova poderia ter consulta ao caderno e livros, o que não ajudou muito, pois estava muito difícil, era janeiro e o último dia do semestre, eu precisava de 3,5 para passar, e aprovei com 6,67 de média (EA009/AB2).
4.2.4 Unidade 4: O estudante e o Cálculo 1
Constituí-se esta unidade para a configuração que ora coloca o sujeito na
posição em que esse considera a sua relação com o conteúdo específico de Cálculo
1 em uma expectativa negativa, devido as suas dificuldades de compreensão e aos
obstáculos para conseguir a aprovação na disciplina; e ora coloca o sujeito satisfeito
com essa relação considerada por si positiva, tanto na passagem pela disciplina,
quanto na possibilidade de novas aprendizagens específicas do Cálculo.
Para organizar a compreensão de acordo com os relatos dos investigados,
inicialmente, foram consideradas as menções dadas em listas ou em rol de
conteúdos que frequentemente são abordados em aulas de Cálculo 1, vencidos com
ou sem dificuldades pelos estudantes. Ou seja, considera-se os relatos que
mencionaram conteúdos de Cálculo 1 e que, de certa forma, poderiam ser
indicadores da dificuldade do estudante na disciplina, podendo assim representar
grandes obstáculos a serem vencidos; ou, que por outro lado, indicasse que a partir
do estudo dos conteúdos citados, o estudante conquistou sua segurança em face
dessa disciplina.
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Para essa classificação, considera-se também, palavras e expressões que
pudessem remeter a uma posição favorável ou não do estudante ao comentar sobre
a disciplina ou seu desempenho em Cálculo 1.
Nesse aspecto, foram consideradas, além de palavras e expressões como
dificuldade, dificuldade de assimilação do conteúdo, susto, medo, angústia,
reprovação, sujeito desmotivado – ou seja, alguns elementos negativos; também,
palavras e expressões com conotações positivas, como: facilidade, fácil
entendimento, disciplina tranquila, aprovação, segurança, motivação, sucesso.
Dessa forma, essa unidade textual diz respeito às considerações dadas pelos
investigados que, ora os colocam como sujeitos para os quais a disciplina de Cálculo
1 representou uma difícil travessia e pouco acrescentou em termos da especificidade
matemática abordada; e ora os colocam como sujeitos para os quais a disciplina de
Cálculo 1 oportunizou o encontro que deixa revelar a facilidade desse sujeito ao
longo de seu desenvolvimento nessa disciplina, e que pode ter acrescentado o
conhecimento novo esperado.
4.2.4.1 Considerações sobre a unidade 4
A partir do instrumento de coleta de dados, sugeriu-se que o estudante
comentasse sobre a disciplina de Cálculo 1 e sobre seu desempenho nessa
disciplina. Supunha-se que aspectos relativos aos conteúdos específicos do Cálculo
1 fossem levantados; no entanto, muitos relatos apontaram para aspectos subjetivos
desse encontro. Surgiram termos como: “Disciplina assustadora”; “Vem como um
susto”; “Foi minha insônia”, “Os exercícios são difíceis”; “Tem muitas fórmulas”; “Há
muito conteúdo”. No entanto, os relatos dos estudantes foram marcados também por
expressões positivas acerca de suas passagens pelo Cálculo 1, como exemplo:
“Disciplina tranquila”; “Conhecimento básico para formação profissional”;
“Aprovação”; “Revisão do Ensino Médio”; “Conteúdo fácil”; “Tive bom desempenho”.
A seguir, um fragmento do comentário feito por um estudante da Engenharia de
Produção, ilustra esse fato. Do comentário, destaca-se as palavras: “calma” e
“tranquilidade”, e o aspecto positivo evidenciado na relação desse sujeito com a
128
disciplina de Cálculo 1. Nesse sentido, Buber (2009) colabora ao apontar que a
palavra, a relação e a reciprocidade são os atos do homem.
Diante da imediatez da relação, todos os meios tornam-se sem significado. Não importa também que meu Tu seja ou possa se tornar, justamente em virtude de meu ato essencial, o Isso de outros Eus ("um objeto de experiência geral"). Com efeito, a verdadeira demarcação, sem dúvida flutuante e vibrante, não se situa entre a experiência e a não-experiência, nem entre o dado e o não dado, nem o outro mundo do ser e o mundo do valor, mas em todos os domínios entre o Tu e o Isso; entre a presença e o
objeto (BUBER, 2009, p. 49).
Há indícios de que para esse sujeito a passagem pela disciplina de Cálculo 1
possa ter deixado marcas relativas às especificidades do conhecimento em
construção, pois o mesmo pondera que levou consigo uma grande carga de
conhecimento.
[...] Passei com calma e tranquilidade pela disciplina, trazendo comigo uma grande carga de conhecimento. Me saí bem nas provas e no final passei com muita tranquilidade na disciplina (EP001/AB2).
Porém, pouco ou quase nada foi dito a respeito da especificidade de
conteúdos geralmente abordados em aulas de Cálculo 1. Em alguns relatos houve
alusão aos tópicos mais gerais, listados como um rol de conteúdos, tais como:
Funções, Limite e Derivada. Entende-se, dessa forma, que esses estudantes
possam ter sinalizado para o formato em que se lhes apresentou a disciplina, ou
seja, a ordem dos aspectos curriculares que acompanharam ao longo da disciplina
de Cálculo 1, iniciado pelo estudo de Funções, seguido de Limite e finalizado em
Derivada. Nesse sentido, confirmam o que apresentam os planos de ensino.
No Quadro 8 é apresentada uma classificação proposta a partir dos
comentários postos pelos pesquisados, levando-se em conta os mecanismos que,
na compreensão da pesquisadora, colocaram os sujeitos classificados de forma
positiva ou negativa perante o seu desenvolvimento na disciplina de Cálculo 1.
Considera-se nessa classificação, mais particularmente, aspectos ligados ao
conteúdo relativo ao Cálculo 1 e à forma como este contribui para o desenvolvimento
do estudante na disciplina. Destaca-se que os sujeitos investigados podem ter se
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posicionado tanto negativamente, quanto positivamente, ou em ambas as
classificações, pois as abordagens 1 e 2 a que foram submetidos permitiram essa
abertura e mobilidade.
O Quadro 8 apresenta o percentual desse encadeamento, mostrando que
58,06% do total de investigados foram recorrentes em apontar para as dificuldades
percebidas na disciplina de Cálculo 1.
Quadro 8 – Distribuição do número de alunos por curso e contribuição do conteúdo na disciplina de Cálculo 1 por abordagem30.
Nº SUJEITOS POR CURSO
ABORDAGEM 1 ABORDAGEM 2
Negativa % Positiva % Negativa % Positiva %
EA 13 5 38,46 3 23,08 9 69,23 7 53,85
EC 13 7 53,85 1 7,69 7 53,85 8 61,54
EP 41 19 46,34 8 19,51 24 58,54 18 43,90
EQ 50 35 70,00 18 36,00 26 52,00 25 50,00
ER 13 9 69,23 2 15,38 5 38,46 7 53,85
LF 10 7 70,00 1 10,00 8 80,00 3 30,00
LM 39 26 66,67 9 23,08 23 58,97 21 53,85
LQ 7 5 71,43 0 0,00 5 71,43 1 14,29
TOTAL 186 108 58,06 42 22,58 107 57,53 90 48,39
Nessa direção, destacam-se os cursos de EQ, ER, LF, LM e LQ. São cinco
cursos cujos percentuais atingiram índices superiores a 65% na abordagem 1.
Verifica-se, nessa classificação, que um número também significativo, porém menor,
mostrou-se de forma positiva, 22,58% na abordagem 1. Do mesmo modo, encontra-
se para a abordagem 2, quando os sujeitos são questionados sobre seu próprio
desempenho, um percentual de 57,53% para a posição negativa, e de 48,39% para
a positiva.
Destaca-se, em relação à abordagem 2, os cursos de EA e novamente as LF
e LQ, que também apresentaram índices bastante elevados ao relacionar o conteúdo
da disciplina de Cálculo 1 como uma dificuldade de desempenho do estudante.
30 Ressalta-se que o somatório dos sujeitos computados nas abordagens 1 e 2 diferem do total de sujeitos
investigados, pois alguns estudantes não se enquadraram para as opções “negativa” e “positiva” e outros foram computados em ambas as possibilidades em função de seus relatos.
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Assim como apontado nas análises das demais unidades, sobressaem-se os
aspectos que se contrapõem e também se complementam a partir dos relatos dos
investigados. Apontam-se duas palavras presentes e que dão sentido às vezes
contraditório ou de certo contrassenso às expressões dos sujeitos, são elas:
“reprovação” e “aprovação”. A palavra aprovação parece representar sentimento de
satisfação, de autoestima elevada, indicando assim que ser “aprovado de primeira”
carrega em si uma conotação positiva perante colegas e professores.
Como sou um privilegiado de ter passado na primeira vez que fiz, posso dizer que o meu desempenho foi bastante satisfatório. Me deu uma boa base para o Cálculo II, posso ficar contente por ter aprendido limites, e principalmente Derivadas, assim como posso falar que domino Derivadas, tenho certeza que minha passagem pelo Cálculo I não foi em vão, pois até agora não estou com dificuldade em Cálculo II, acredito que foi pelo bom desempenho que tive em Cálculo I. Para finalizar vou dizer que: fiquei muito satisfeito com o meu desempenho, pois como já falei estou em um grupo seleto de poucos que conseguiram vencer a disciplina na primeira vez que cursou a mesma (LM013/AB2).
Ser reprovado, entretanto, significa a negação de tudo isso. Se o fato,
aprovado em Cálculo 1 e de “primeira”, pode representar muito mais do que uma
etapa vencida na formação desses sujeitos; ser reprovado na primeira, segunda, ou
terceira vez, pode ser a causa de inseguranças e desistências. Um dos estudantes
na abordagem 2 escreveu apenas “Fui aprovado na 1ª tentativa” (EP029/AB2), e de
fato, para muitos, somente isso basta.
Contudo, em alguns casos, embora aprovados “de primeira”, os estudantes
externaram insegurança e atribuíram à aprovação, ora o fator sorte, ora o fato de ter
decorado o conteúdo, ora o seu empenho pessoal, além de outros aspectos que
revelam um desempenho mediano por parte desses sujeitos. Consideram ainda que
o conteúdo de Cálculo 1 é bastante complexo e requer o conhecimento anterior
(referindo-se ao Ensino Médio – principalmente ao conhecimento de Funções) e
aplicação de muitas fórmulas, além de muita dedicação para fazer os exercícios
propostos.
Foi uma das disciplinas que mais penei para ser aprovado e mesmo assim considero despreparado para enfrentar outras cadeiras que utiliza o conhecimento de cálculo 1, pois às vezes a maneira como o professor explica que a torna mais complicada do que já é, mas creio que o conteúdo é um conteúdo um tanto difícil também (ER012/AB2).
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A expressão “fórmula” apareceu sempre acompanhada de uma conotação
negativa.
Disciplina que pra mim foi bastante difícil. Acho um tanto complexo o conteúdo, [...] A disciplina em si é composta por muitas fórmulas, o que já traz mais uma dificuldade. Sabê-las e saber aplicá-las (EP014/AB1).
Na primeira vez o Cálculo I, a dificuldade foi em relação a limites e Derivadas, alguns conceitos me eram difíceis de entender, porém, funções, por ser um conteúdo já visto na escola, consegui entender perfeitamente. Na segunda vez, função e limites foram relativamente fáceis, porém devido muitas regras e fórmulas na Derivada, no meu foi um pouco complicada (EQ020/AB2).
Conforme já referido, parece existir em alguns relatos um aspecto
contraditório, contudo esse aspecto é complementar, pois trata de momentos
distintos desse estudante na disciplina.
Mas, antes de tudo, cada sentimento tem seu lugar no seio de uma tensão de polaridade; ele toma sua cor e seu sentido não somente em si próprio, mas também em seu pólo oposto; cada sentimento é condicionado pelo seu contrário (BUBER, 2006, p. 91).
Por exemplo, o estudante menciona sua dificuldade na disciplina em um
primeiro contato, e nesse sentido, pode tal fato significar que esse estudante se
deparou com o conhecimento novo. Em uma segunda vez no curso, ao considerar
por si próprio que encontrou facilidade, admite-se que pudesse ter construído
alguma percepção a respeito.
A reprovação, dessa forma, para alguns estudantes está na base de um
processo de amadurecimento, e não poderia significar algo negativo ou angustiante.
Bem, a disciplina de Cálculo 1, na primeira vez em que cursei, me pareceu bem difícil, por nela conter conceitos por mim jamais vistos em matemática. De início começando com tipos de funções, pareceu-me até fácil, mas quando começou a se falar de limites, limites laterais, limites infinitos e Derivadas, entrei em colapso. Entretanto, quando o fiz pela segunda vez, ele não parecia tão assustador assim, já tinha respostas na ponta da língua, e precisei "estudar" bem menos do que a primeira vez. Enfim, acho até que gostei de repetir Cálculo 1, pois saí dali aprendendo fielmente tudo que a disciplina me proporcionou (LM006/AB1).
132
Em um primeiro momento encontrei dificuldade tanto que acabei reprovando na disciplina. No segundo semestre já conhecendo a matéria e trazendo algum conhecimento anterior não encontrei dificuldade e passei para o cálculo II (EP013/AB2).
Salienta-se a concepção de conhecimento prévio31, pois em uma segunda vez
cursando a mesma disciplina, a familiaridade com determinados conceitos já vistos
pode ter permitido essa “maior facilidade” no aprendizado desses estudantes.
Conforme alude Ausubel (2003), conhecimento prévio é definido em função de uma
mudança, na qual certa estrutura cognitiva inclusiva pré-existente está em relação a
um novo conhecimento; no processo de ressignificação desse conhecimento,
ambos, estrutura prévia e conhecimento novo, são modificados e se influenciam
mutuamente durante a experiência de aprender significativamente.
Outro aspecto que se destaca nos relatos dos sujeitos diz respeito ao fato de
o estudante considerar a disciplina de Cálculo 1 importante para sua evolução no
curso, mencionando que essa disciplina serve como base para cursar os Outros
Cálculos ou outras disciplinas, contudo, poucos foram os sujeitos que se referiram à
importância da disciplina para o exercício futuro de sua profissão. Nesse sentido,
pode não haver para alguns estudantes correspondência entre cursar tal disciplina e
sua formação profissional.
A disciplina de Cálculo 1 dá o start ao aluno. É uma das matérias mais importantes em toda a estrutura acadêmica, tendo em vista que ela é a base para o restante do curso (EQ014/AB1).
A cadeira de Cálculo 1 é o primeiro "back" ao entrar na vida acadêmica, pois vem o temido limite, Derivada e suas teorias. Mas para passar pro Cálculo 2 é necessário saber entender e não decorar as regras e exercícios (EQ008/AB1).
Os estudantes, em geral, não vêem ligação entre a sua passagem pela
disciplina de Cálculo 1 e o caráter global de seu curso de graduação. Raros são os
relatos que apontam para a contribuição de tal disciplina para o exercício futuro da
31 Os conhecimentos prévios dos alunos são formados no “predomínio do perceptivo, no uso do raciocínio causal simples, na influência da cultura e da sociedade (canalizadas através da linguagem e dos meios de comunicação), influência da escola” (POZO, 1998, p. 88). E, em Pozo et al (2009), essas causas são classificadas em três grupos que dão origem a diferentes concepções prévias: origem sensorial (concepções espontâneas); origem cultural (concepções induzidas); e origem escolar (concepções analógicas).
133
profissão. A seguir um desses exemplos é apresentado no fragmento de (LM010),
que cita a importância do conhecimento específico sobre funções e Derivadas para o
exercício docente.
É uma disciplina que permite ampliar nossos conhecimentos sobre funções e Derivadas. Sendo assim de suma importância para nós, futuros docentes (LM010/AB1).
A partir dos relatos dos estudantes se encontram expressões que trazem
consigo uma conotação positiva; como anteriormente mencionado em relação à
palavra aprovação. Outros exemplos correlatos podem ser apontados, tais como:
dificuldades superadas, motivado, disciplina mais amada, que podem permitir inferir-
se que os sujeitos passaram pelo Cálculo 1, encararam as primeiras dificuldades, e
foram capazes de avançar com relativa segurança. Contudo, em outros relatos, os
sujeitos também dão exemplos de palavras e expressões que revelam o aspecto
negativo pelo qual observam a disciplina de Cálculo 1, tais como: disciplina
assustadora, temida, insônia, colapso, na primeira vez foi lunático. O fragmento do
relato de (EC004) exprime esses dois aspectos na mesma resposta.
Acredito que seja a disciplina mais amada e odiada ao mesmo tempo (EC004/AB1).
Parece que a disciplina de Cálculo 1 desenha um Capítulo bipolar na
formação dos sujeitos, e nesse sentido contribui Buber (2009) ao referir-se a alma
humana.
[...] a relação perfeita só pode ser concebida como bipolar, como uma "coineidentia oppositorum", como união dos sentimentos contrários (BUBER, 2009, p. 91).
Ao se referirem à disciplina de Cálculo 1 ou a sua passagem por essa
disciplina, os estudantes deixam transparecer aspectos angustiantes desse
encontro, assim como aspectos motivadores. Nesse sentido, nesse jogo de
sentimentos, o que deixam revelar de suas experiências, ou seja, no sentido daquilo
que os atravessa, e que deixa suas marcas?
134
A experiência, assim, se abriga nos aspectos subjetivo, reflexivo e
transformador na passagem desses estudantes pela disciplina de Cálculo 1, e esses
sujeitos são capazes de apresentar elementos constitutivos dessa passagem.
É em mim (ou em minhas palavras, ou em minhas ideias, ou em minhas representações, ou em meus sentimentos, ou em meus projetos, ou em minhas intenções, ou em meu saber, ou em meu poder, ou em minha vontade) onde se dá a experiência, onde a experiência tem lugar (LARROSA, 2011, p. 6).
A questão, contudo, é que é bem maior o volume de aspectos negativos que
os positivos apontados nesses relatos. Nesse sentido, é importante verificar se os
aspectos negativos possam ser as principais marcas deixadas pela disciplina de
Cálculo 1.
Contava-se que tais estudantes, quando solicitados a comentar sobre Cálculo
1, falassem dos aspectos gerais dessa disciplina, por exemplo: de componentes de
sua estrutura curricular; ou acerca da estrutura de um determinado tópico estudado
nessa disciplina. Da mesma forma, quando solicitados a comentar sobre seu
desempenho era esperado que mencionassem suas dificuldades ou facilidades,
porém que essas estivessem vinculadas a uma abordagem específica do conteúdo
dado na disciplina, como por exemplo: a dificuldade em compreender o conceito de
Derivada, ou a dificuldade em resolver um problema envolvendo taxa relacionada, ou
em analisar e elaborar o gráfico de uma função, entre outros.
No entanto, os relatos apontam superficialmente para as dificuldades
específicas e, mais prementemente, para expressões subjetivas e negativas que
parecem deixar muitas marcas na vida acadêmica desses estudantes. Pois, se nada
ou pouco lembram sobre os conteúdos específicos do Cálculo 1, então a experiência
desses estudantes pode estar se consolidando apenas com essas marcas.
O sujeito da experiência tem algo desse ser fascinante que se expõe atravessando um espaço indeterminado e perigoso, pondo-se nele à prova e buscando nele sua oportunidade, sua ocasião. [...] Não um sujeito que permanece sempre em pé, ereto, erguido e seguro de si mesmo; não um sujeito que alcança aquilo que se propõe ou que se apodera daquilo que quer; não um sujeito definido por seus sucessos ou por seus poderes, mas um sujeito que perde seus poderes precisamente porque aquilo de que faz experiência dele se apodera. Em contrapartida, o sujeito da experiência é também um sujeito sofredor, padecente, receptivo, aceitante, interpelado, submetido (LARROSA, 2011, p. 25).
135
Nesse sentido, acredita-se que as marcas não sejam apenas negativas, e
Buber (2009) contribui para essas considerações, pois aponta que:
Muitos movimentos, chamados reflexos, são um instrumento indispensável à pessoa na construção de seu mundo. Não é verdade que a criança percebe primeiramente um objeto, e só então entra em relação com ele. Ao contrário, o instinto de relação é primordial, como a mão côncava na qual o seu oponente possa se adaptar (BUBER, 2009, p. 59).
Assim, concluí-se ao final dessa etapa, que é preciso buscar também os
aspectos objetivantes da relação entre os sujeitos da experiência com o objeto
matemático possibilitado em aulas de Cálculo 1. Dessa forma, propõe-se no
próximo Capítulo, a análise dos Mapas Conceituais sobre Derivadas como uma
forma de buscar esses aspectos, que também devem estar presentes na relação
dialógica, que se mostrou essencialmente subjetiva entre os sujeitos da experiência
em aulas de Cálculo 1.
136
5 MAPAS CONCEITUAIS E OS SUJEITOS DA EXPERIÊNCIA
A fim de trazer os relatos dos sujeitos investigados para o âmbito do contexto
matemático das aulas de Cálculo 1, optou-se pela utilização de Mapas Conceituais
como um dos instrumentos de coleta de dados. A partir dos resultados apresentados
a seguir, pretende-se expor elementos que remetam à construção do conhecimento
sobre o tema Derivada e que ficaram encobertos pelas falas desses estudantes,
quando confrontados nas abordagens 1 e 2, conforme relatos analisados no Capítulo
4 deste trabalho.
Acredita-se que esses sujeitos, por meio de seus Mapas Conceituais devam
exteriorizar os aspectos matemáticos do contexto das aulas de Cálculo 1 e possam
revelar aspectos da experiência, conforme Larrosa (2002, 2011), diante do tema
Derivada. Entende-se que, dessa forma, o sujeito da experiência se exponha a um
processo relacional dialógico, e se pretende na presente etapa destacar o
relacionamento “Eu-Derivada”, no sentido do Eu-Isso dado por Buber (2009), ou
seja, o relacionamento entre o sujeito com o objeto matemático a Derivada; porém, a
experiência não se restringe à coisificação, ao objeto a conhecer, e nesse sentido,
compreende uma relação Eu-Tu, pois transcende, transforma. É a partir da relação
dialógica que o sujeito dá a conhecer-se, e conhece o novo, e a relação Eu-Tu,
assim como o relacionamento Eu-Isso, são os termos dessa dialética.
Ainda, essa exposição dos sujeitos é um processo de escolha, em que a
exteriorização do relacionamento com o objeto está limitada a fatores externos e
internos que influenciam as opções do sujeito da experiência. São opções pessoais,
inerentes a cada um dos sujeitos, desse modo, admite-se também, a limitação do
instrumento de investigação (BAUMAN; MAY, 2010). Vale ressaltar, porém, que por
mais simples que seja essa exposição, ou exteriorização, é possível encontrar
indícios das evidências mais essenciais da experiência consolidada por esses
sujeitos, e nesse sentido, o processo todo já está justificado.
137
5.1 Sobre Mapas Conceituais e Mapas Conceituais Iniciais
Conforme apresentado nas escolhas metodológicas, a visão ausubeliana do
processo de aprendizagem estudada por Joseph Novak fundamentou o uso de
Mapas Conceituais (MC) como uma forma de favorecer a aprendizagem significativa.
Nesse sentido, o mapeamento conceitual talvez não represente uma boa opção para
esta investigação, pois o objetivo deste estudo não se refere à aprendizagem
significativa. Contudo, o recurso dos mapas conceituais como uma técnica que
permite o uso da representação gráfica para a organização do conhecimento, e que
possibilita o entendimento da estrutura cognitiva idiossincrática de um indivíduo
sobre determinado conhecimento ou área desse conhecimento (NOVAK, 2010) há
de constituir-se em importante instrumento para a análise. Acredita-se que o recurso
aos mapas conceituais permitirá o contato com as exteriorizações relevantes dos
investigados a respeito do tema Derivada, como uma exteriorização do
relacionamento Eu-Derivada. No entanto, nesta etapa de análise, considerar-se-á
Mapas Conceituais Iniciais (MCIs) construídos pelos sujeitos.
Inicialmente, para cada um dos 186 investigados nesta pesquisa foi solicitado
que desenhassem um mapa conceitual sobre Derivada. Foram consideradas 171
elaborações, excluindo-se 15 do total de 186, representados pelas folhas deixadas
em branco nessa abordagem. Contudo, alguns dos mapas desenhados para a
Derivada, devido às características estruturais, não se enquadraram como um mapa
conceitual e, dessa forma, buscou-se um meio de seleção para essas elaborações.
Cabe destacar que foram considerados, para fins desta investigação, os
primeiros mapas conceituais elaborados. Nesse sentido, a construção ou elaboração
dos mapas ocorreu em um único momento, sem um trabalho prévio ou em
continuidade para a retomada e reelaboração de novas versões, considerando-se
apenas a primeira versão de cada um dos mapas elaborados.
Desse modo, foram computados os mapas elaborados por estudantes que
cursaram Cálculo 1, matriculados em um dos cursos de graduação em Engenharia
ou Licenciatura de uma Universidade Pública Federal, lócus desta pesquisa, cujo
138
perfil foi apresentado no Capítulo da metodologia. Ressalta-se que esses estudantes
cursaram a disciplina de Cálculo 1em espaços/tempo diferentes.
A fim de encontrar uma forma de selecionar os MCIs pretendidos para
investigação, sondou-se aspectos presentes na Teoria dos Mapas Conceituais que
pudessem colaborar para este processo de análise e, desse modo, apropriou-se da
compreensão das Estruturas Hierárquicas Inapropriadas ou Limitadas (LIPHs),
conforme Novak (2002) citado por Cicuto e Correia (2013). As LIPHs podem ser
entendidas como ferramenta adicional nesta análise. Contudo, não se intenciona
apresentar como as LIPHs são externalizadas a partir dos MCIs, mas sim, apoiar-se
nas proposições com clareza semântica; e para isso, recorrer-se-á aos três
principais padrões de MCs, ou seja, os que apresentam proposições: i) limitadas
(proposição com baixa clareza semântica); ii) inadequadas (proposição com erro
conceitual) e iii) adequadas (proposições sem erro conceitual).
Dessa forma, exemplos de proposições com os diferentes níveis de clareza
semântica são apresentados, conforme Cicuto e Correia (2013), e que de acordo
com o termo de ligação e considerado o contexto da Derivada, podem ser
classificados como: (a) não é uma proposição; (b) proposição limitada; (c)
proposição inapropriada; e (d) proposição apropriada. Para esse fim, valeu-se de
exemplos obtidos por meio dos mapas elaborados pelos investigados.
A seguir, na Figura 7, apresenta-se como podem ser exteriorizadas
proposições com diferentes níveis de clareza semântica. No item (a) expõe-se um
exemplo que não é proposição em razão da ausência do termo de ligação. Os
demais itens, (b), (c) e (d) foram tomados como proposições limitada, inapropriada e
apropriada, respectivamente.
139
Figura 7 – Exemplos de proposições com diferentes níveis de clareza semântica quanto ao termo de ligação no contexto da Derivada.
Fonte: Baseado no modelo de Cicuto e Correia (2013, p. 6).
Pretende-se ainda, destacar que para Cicuto e Correia (2013), tornar as
LIPHs visíveis pode ajudar professores a fornecerem feedbacks precisos para os
estudantes; porém, deseja apropriar-se desse conceito para, então, por meio desse
processo de análise, permitir a exposição das formas mais gerais da relação dos
sujeitos com o objeto Derivada em aulas Cálculo 1. Buscou-se ainda, evidenciar de
que forma as experiências dos “sujeitos da experiência” possam estar se
consolidando em aulas dessa disciplina e, desse modo, contribuir para a tomada de
decisão não só de professores, mas dos conjuntos de atores envolvidos nesse
processo de construção do conhecimento.
A fim de selecionar os MCIs se recorreu ao enquadramento das proposições
de acordo com o nível de clareza semântica, considerando-se apenas como MCIs as
elaborações que apresentaram ao menos uma proposição, podendo ser essas
proposições limitada, inapropriada ou apropriada.
Assim, os mapas elaborados que não apresentaram proposições foram
considerados como “Outros Mapas” (OM)32. Algumas exteriorizações dos sujeitos,
devido a não permitirem uma classificação como mapas, foram enquadradas em
“Não Mapas” (NM)33. As folhas deixadas em branco, ou seja, sem resolução alguma,
32 Como Outros Mapas (OM) estão os mapas mentais e diagramas simples. 33 Como Não Mapas (NM) estão, como exemplo, os textos, as resoluções do cálculo da derivada de uma função e menções do tipo “não sei fazer uma mapa conceitual”.
140
computaram-se como mapas em branco (MB)34. A seguir, apresenta-se um exemplo
de OM e um exemplo de NM, conforme Figuras 8 e 9.
Figura 8 – Exemplo de OM Fonte: (EQ008)
Figura 9 – Exemplo de NM Fonte: (EC008)
34 Nesse caso, apenas se usou a nomenclatura para diferenciar a contagem, pois uma representação, mesmo que NM ou OM podem exteriorizar algo da relação do sujeito com o objeto, contudo, o mesmo não acontece com as folhas deixadas em branco.
141
Porém, para enquadrar as exteriorizações demonstradas pelos sujeitos
mapeadores35 em uma classificação quanto à Derivada, buscou-se pelos aspectos
que colocam as proposições externalizadas em pelo menos um dos dois seguintes
modos. O primeiro, como proposição apropriada, ou seja, com clareza semântica e
sem erro conceitual no contexto matemático da Derivada; e o segundo, como
proposição limitada, ou seja, com baixa clareza semântica. Nesse ínterim, analisou-
se as proposições se apropriadas e/ou limitadas quanto ao nível de clareza
semântica em relação ao termo de ligação, e se apropriadas e/ou limitadas para o
contexto da Derivada. Não se computou para essa classificação em relação à
Derivada as proposições inapropriadas, ou seja, com erros conceituais para o
contexto da Derivada, contudo, um mapa pode ter sido considerado MCI mesmo que
tenha apresentado apenas proposições inapropriadas.
Assim, a leitura inicial para classificação dos MCIs se baseou nas proposições
apropriadas e/ou limitadas, conforme apontam Cicuto e Correia (2013), quanto ao
nível de clareza semântica, a que se acrescentou a adequação conceitual ao
contexto da Derivada.
Desse modo, a partir desses MCIs se reclassificam os que apresentaram
indícios de: (i) Regras de Derivação; (ii) Conceito de Derivada; (iii) Aplicações da
Derivada. Para cada um desses indicativos, acolheu-se uma classificação interna
para as proposições e que oportunamente serão descritas no decorrer deste
Capítulo. Verificou-se que os MCIs podem apresentar proposições que se
enquadram, simultaneamente, em até os três principais padrões de MCs, como
limitado, inapropriado e apropriado. No entanto, tal consideração não invalida a
leitura parcial das proposições adequadas e/ou limitadas para a classificação em (i),
(ii), e/ou (iii).
Ademais, os MCIs que apresentaram todas as proposições inapropriadas não
foram invalidados, pois embora não sejam computados em um dos três itens acima,
contribuem na exteriorização de fatores também relevantes que poderão ser
apresentados ao longo desta análise.
35 Os sujeitos investigados no presente estudo.
142
Nessa direção, verificou-se que em relação aos 186 investigados, 15 não
desenharam mapas deixando a folha correspondente para essa abordagem em
branco; 110 tiveram seus mapas classificados como MCIs, 48 tiveram os mapas
classificados como Outros Mapas (OM) e 13 como Não Mapas (NM). Assim, de
acordo com a sistematização proposta, concluiu-se a contagem dos MCIs e
elaborou-se a seguinte organização, conforme se apresenta no Quadro 9.
Quadro 9 – Organização de acordo com o número de elaborações de Mapas Conceituais Iniciais
(MCIs), Outros Mapas (OM), Não Mapas (NM) e Mapas em Branco (MB).
CURSOS Nº DE
SUJEITOS MCI % OM % NM % MB %
EA 13 07 53,85 02 15,38 00 00,00 04 30,77
EC 13 06 46,16 05 38,46 02 15,38 00 00,00
EP 41 24 58,83 11 26,83 02 04,88 04 09,76
EQ 50 36 72,00 10 20,00 02 04,00 02 04,00
ER 13 04 30,77 07 53,85 00 00,00 02 15,38
LF 10 03 30,00 04 40.00 00 00,00 03 30,00
LM 39 28 71,80 07 17,95 04 10,25 00 00,00
LQ 07 02 28,57 02 28,57 03 42,86 00 00,00
TOTAL 186 110 59,14 48 25,81 13 06,99 15 08,06
Optou-se, no Quadro 9, pela apresentação dos dados por cursos, pois dessa
forma a organização pode favorecer o processo de análise. A partir do Quadro 9, se
verifica que os cursos de LM e EQ apresentaram o maior número de MCIs,
proporcional ao número de mapas elaborados pelos pesquisados do curso. Dos 110
MCIs considerados, esses dois cursos contribuíram com 64 elaborações, chegando
próximo de 60% do total. Por outro lado, os cursos de LQ, LF e ER foram os que
apresentaram o menor número de elaborações, e proporcionalmente, em relação ao
número de sujeitos em cada um desses cursos, ficaram abaixo dos 31% em cada
caso. Por se tratar de uma tarefa de elaboração imediatamente após a entrega dos
instrumentos de coleta de dados, e por não ser mapas conceituais um recurso usual
em aulas desses cursos, considerou-se a possibilidade de alguns estudantes
143
encontrarem limitações na elaboração de seus mapas, e nesse sentido, o resultado
de 110 MCIs elaborados foi representativo.
Na sequência, apresenta-se a análise das três classificações, começando por
(i) Regra de Derivação, em seguida (ii) Conceito de Derivada e finalizando com (iii)
Aplicação da Derivada. Ressalta-se que foram considerados para cada uma das
classificações, 60 com Regras de Derivação; 39 com referência ao Conceito de
Derivada e 25 com consideração acerca da Aplicação da Derivada. Cabe lembrar
que um mesmo mapa pode apresentar referência a mais de uma classificação, e a
separação proposta apenas tem o fim de dimensionar uma possibilidade de análise.
5.2 MCIs e o enfoque Regras de Derivação
Em relação aos aspectos observados nos MCIs dos estudantes investigados
quanto à exteriorização de Regras de Derivação, construiu-se uma segunda
classificação interna a esse contexto, proposta em cinco diferentes agrupamentos,
de acordo com as presença e clareza semântica das proposições.
Para dar continuidade à análise foram levados em conta os MCIs que se
enquadraram em pelo menos um dos agrupamentos apresentados, quanto à clareza
semântica e adequação para o contexto matemático da Derivada. Para efeito de
esclarecimentos, seguem as descrições para a componente analisada Regra de
Derivação e o enquadramento dado para a classificação em cada um dos cinco
agrupamentos adotados nesta classificação.
Agrupamento I – Enquadram-se os MCIs com proposições apropriadas e/ou
limitadas que evidenciaram notações36 para a Derivada, ou se referiram a nomes
usuais dados às Regras de Derivação. Porém, enquadrar um mapa nesse
36 Em geral, em aulas sobre Regras de Derivação são abordados que, para a função y=f(x), a notação de Leibnitz usa os símbolos dx e dy para representar incrementos infinitamente pequenos de x e y, assim como ∆x e ∆y representam incrementos finitos de x e y. A notação de Lagrange para a derivada de f(x), dada por y’= f’(x) equivale à razão incremental dx/dy (razão entre os incrementos infinitesimais de Leibnitz). A notação de Cauchy é representada por Dy= Df(x). Um ponto colocado sobre o símbolo do objeto cuja derivada é tirada é a notação devida a Newton, y ̇ (maneira original de Newton se referir às fluxões).
144
agrupamento não significa afirmar que o mapeador tenha apropriação da
manipulação com tais símbolos, nem que tenha domínio da regra mencionada,
apenas significa que é capaz de apresentar uma proposição adequada a esse
respeito. Ou seja, o sujeito reconhece a existência de tal simbologia ou regra e a
relaciona com seu estudo sobre a Derivada de forma clara. Nada mais se pode
afirmar.
Agrupamento II – Enquadram-se os MCIs em que se identificaram
proposições apropriadas e/ou limitadas que apresentam relação com o cálculo de
Derivadas de funções elementares, como a Derivada de funções polinomiais, função
potência de expoente real, função racional e função algébrica. Esse agrupamento
considera os aspectos elementares em relação à aplicação das Regras de
Derivação, e, portanto, alguns desdobramentos dessas funções, como a Derivada da
composição dessas funções não serão considerados nesse agrupamento. Porém, os
casos relacionados à Derivada da soma, subtração, produtos e ou quocientes
dessas funções se enquadram, assim como, a representação de fórmulas
correspondentes a cada um desses casos.
Agrupamento III – Enquadram-se os MCIs nos quais foram identificadas
proposições apropriadas e/ou limitadas que apresentam o cálculo de Derivadas de
funções elementares, como a Derivada de função Exponencial, Logarítmica e
Trigonométrica, bem como as Derivadas das demais funções elementares que são a
soma, subtração, produtos e quocientes destas funções elementares.
Agrupamento IV – Enquadram-se os MCIs identificados com proposições
apropriadas e/ou limitadas que apresentam o cálculo de Derivadas da composição
das funções elementares, conforme citado nos agrupamentos II e III, e também as
proposições adequadas relacionadas ao cálculo das Derivadas de funções implícitas
e as de ordem superior; quando essas apresentarem cálculos por meio da regra,
excetuam-se, assim, as referências ao nome da Regra ou a relação apresentada em
ordem n de Derivadas.
Agrupamento V – Enquadram-se os MCIs nos quais foram identificadas
proposições apropriadas e/ou limitadas que apresentam o cálculo de Derivadas de
145
funções elementares inversas, bem como as demais funções elementares que são a
soma, subtração, produtos, quocientes e composição destas funções.
Identificou-se, nesse sentido, em alguns MCIs proposições adequadas no
contexto da Derivada, mas que apresentaram clareza semântica limitada quanto aos
termos de ligação utilizados, por exemplo: “Regra da Cadeia → para que serve →
Derivar funções compostas”. Em outros casos, houve a adequação quanto à
Derivada e até alta clareza semântica quanto aos termos, porém descritos dentro de
uma única caixa, não exteriorizando uma proposição do tipo “conceito – termo de
ligação – conceito”, conforme sugere a Teoria dos Mapas Conceituais (NOVAK e
CAÑAS, 2010). Entretanto, isso ocorreu em algumas representações classificadas
como MCIs pelos critérios anteriormente apresentados. Nesses casos, e por se tratar
de MCIs, tais instrumentos foram considerados e computados para o item a que se
enquadrassem no respectivo agrupamento.
Destaca-se o Quadro 10 com os resultados obtidos a partir da contagem dos
MCIs que apresentaram proposições que se relacionam a Regras de Derivação e os
seus respectivos cômputos nos diferentes agrupamentos.
Quadro 10 – Resultados a partir dos MCIs considerados conforme os agrupamentos para Regras de Derivação.
REGRAS DE DERIVAÇÃO
MCIs Regras de
Derivação 37 em MCIs
(%)38 Agrupamentos
I II III IV V
EA 07 04 57,14 03 02 00 00 00
EC 06 05 83,33 04 05 01 00 00
EP 24 16 66,67 07 07 00 00 00
EQ 36 21 41,66 17 06 00 02 00
ER 04 01 25,00 01 01 00 00 00
LF 03 02 66,67 02 01 00 00 00
LM 28 17 60,71 11 12 03 00 00
LQ 02 00 00,00 00 00 00 00 00
TOTAL 110 60 54,55 45 34 04 02 00
37 Os números nessa coluna diferem do somatório dos agrupamentos, pois alguns MCIs foram computados em mais de um agrupamento. 38 Percentagem relativa ao número de MCIs com Regras de Derivação em comparação com o total de MCIs considerados.
146
Cabe acrescentar que as proposições inapropriadas não foram computadas
em nenhum dos agrupamentos, todavia poderão aparecer lado a lado com
proposições apropriadas e limitadas em MCIs considerados, e desse modo, indicar
aspectos que possam colaborar para o andamento da análise e as considerações
pretendidas ao final deste estudo.
No encaminhamento dado para Regra de Derivação, conforme as
proposições exteriorizadas nos MCIs e em relação aos agrupamentos I, II, III, IV e V;
45 foram classificados no agrupamento I; 34 no agrupamento II, 04 no agrupamento
III, 02 no agrupamento IV. No agrupamento V não foram classificados MCIs.
5.2.1 A análise para Regras de Derivação
A partir da classificação posta no Quadro 10, o maior valor de ocorrência foi
evidenciado para o agrupamento I, que englobou proposições adequadas e/ou
limitadas que mencionaram Regras de Derivação e/ou que apresentaram notação
para a Derivada. Assim, dos 110 MCIs selecionados, encontrou-se essa relação 45
vezes. Para ser classificado nesse agrupamento o mapeador não precisou
apresentar desenvoltura com o cálculo das Regras de Derivação, mas revelou
conhecer a existência de tais regras. As formas, ou nomes usuais, mais apontados
foram: regra do produto, regra do quociente e regra da cadeia. Quanto às notações,
as mais apresentadas foram y’e f’(x).
Identificou-se também, 34 MCIs que se enquadraram no agrupamento II, nos
quais foram identificadas proposições adequadas e/ou limitadas que apresentaram
elaborações do cálculo de Derivadas de funções elementares, destacando-se a
Derivada de funções polinomiais. Nos MCIs computados nessa classificação
também foram considerados os casos relacionados à soma, subtração, produtos e
quocientes das funções descritas no agrupamento II, assim como a representação
das fórmulas correspondentes em cada caso.
Os casos classificados no agrupamento III foram poucos, apenas 4 MCIs que
apresentaram cálculo de Derivadas de funções trigonométricas, exponenciais e ou
logarítmicas, indicando que dos 110 MCIs menos de 4% fizeram menção ao cálculo
147
dessas Derivadas. Observaram-se nos MCIs as Derivadas das funções y=sen (x),
y=cos (x), y=ex e de y=ln(x), ou seja, os casos mais simples de Regras de Derivação
para esse tipo de funções.
No agrupamento IV, embora muitos estudantes tenham citado a Regra da
Cadeia, assim como, Derivadas de funções implícitas e Derivadas de funções
superiores em seus MCIs, e por isso tenham sido enquadrados no agrupamento I,
apenas em dois casos houve a resolução da respectiva Derivada da função por meio
de uma dessas regras, indicando que menos de 2% dos MCIs se enquadram nessa
classificação.
Não foram encontrados MCIs que pudessem ser enquadrados no
agrupamento V, ou seja, que apresentassem a resolução de Derivada de função
inversa por meio de sua regra de derivação.
Alguns MCIs foram encadeados sequencialmente, de forma linear, quando um
conceito se liga apenas ao conceito anterior. Evidenciou-se que um grande número
dos MCIs apresentou características radiais – quando os conceitos são ligados a um
conceito central, mas não ligados entre si – e lineares em suas representações,
conforme descrevem Aguiar e Correia (2013), e em um número bem menor, porém
significativo, verificou-se uma forma próxima da estrutura em rede – o
estabelecimento de relações entre conceitos, rompendo a linearidade – conforme se
vê nas Figuras 10 e 11.
Em relação a EP005/MCI (Figura 10), pode-se aceitar que o mapeador
apresenta uma estrutura próxima a de rede, porém ainda bastante limitada em
relação aos conceitos, restringindo-se praticamente a um único contexto, o das
Regras de Derivação. Ainda assim, no campo mais básico dessa abordagem,
apenas se referindo aos nomes de algumas dessas regras. No entanto, em um
determinado movimento neste mapa, o mapeador intentou apresentar uma aplicação
relacionada à Derivada no contexto da Física, contudo não há uma continuidade
nessa construção, que se exterioriza por meio de uma proposição limitada que
relaciona o conceito Derivada a uma frase completa na caixa, no lugar do segundo
conceito, essa última, indicando que toda uma subseção desse mapa poderia ser
construída a partir da frase na caixa. Cabe destacar a sugestão do mapeador,
148
“Calcular a fórmula da posição em função da fórmula da velocidade”. Esse estudante
cursava o terceiro semestre da EP na época da coleta de dados, por essa razão,
provavelmente tenha cursado Cálculo II, e sua inversão pudesse indicar uma relação
com o estudo das Integrais, ou ainda, pudesse indicar uma relação com as
disciplinas de Física I e II, pois são concomitantes com as disciplinas de Cálculo I e II
para esse curso; porém não se pode afirmar se essa construção foi intencional.
Figura 10 – (EP005/MCI)
Encontrou-se uma exteriorização similar no mapa de EC013/MCI (Figura 11),
em que o mapeador também se fixa no contexto das Regras de Derivação, se
restringindo basicamente a esse contexto. A exceção, em relação ao mapa de
EP005/MCI, é que nesse caso, o mapeador acrescentou notações para distinguir f(x)
e sua Derivada f’(x) e algumas fórmulas correspondentes.
149
Há também uma iniciativa aparentemente abandonada de encontrar um
caminho de exteriorização por meio de gráficos, mas o mapeador desiste dessa
abordagem e dá continuidade pela direção das Regras de Derivação.
Figura 11 – (EC013/MCI)
Porém, o que exteriorizam estes mapas parece dar sentido a um vínculo
objetivante, quando se encontram postos no modo Eu-Isso diante do objeto
Derivada, como lugar da experimentação e não da experiência, e nesse sentido,
podem significar apenas a coisificação tanto do sujeito quanto do objeto. A
experiência somente faz sentido no modo Eu-Tu, como consciência fenomenológica,
dialógica. Nesse sentido, não se pode ignorar as subjetividades dos sujeitos, ou seja,
tudo o que está relacionado com a ação que se desenvolve ao exteriorizar suas
escolhas.
Verificou-se que EC013 ingressou no curso de EC no ano de 2011, cursava o
quinto semestre na ocasião da coleta de dados. O sujeito EP005 ingressou em 2012
e cursava o terceiro semestre de EP na mesma ocasião. Esses dois estudantes
foram aprovados em Cálculo 1 na primeira vez que cursavam a disciplina e, embora
150
tenham estudado Cálculo 1 em turmas e anos diferentes, assim como, tenham tido
uma evolução em seus cursos também em espaço/tempo diferentes, ambos
apresentam certa semelhança em seus MCIs. Remetem-se às Regras de Derivação
quando solicitados a desenhar um mapa sobre Derivada, e suas representações são
elementares – superficiais – não há aprofundamento nas representações desses
sujeitos. Pode-se então inferir que passaram por experiências semelhantes em
Cálculo 1?
Conforme Larrosa (2011), não há como saber da real experiência de cada um
desses sujeitos, percebe-se porém, em ambos, um crescente em relação à
construção do conhecimento Derivada. Em EC013/MCI o mapeador parte do
conceito “funções” como o conceito mais inclusivo e chega até o conceito “Derivada”.
Liga esses conceitos por meio de uma seta, com sentido do primeiro para o
segundo, indicando uma hierarquia nessa construção, com isso demonstra que em
um primeiro momento estudou funções, para depois estudar a Derivada, o que
corrobora o mencionado anteriormente sobre os planos de conteúdos programáticos
para disciplina de Cálculo 1. Por meio do movimento, pelo qual este mapeador
descreve sua concepção de Derivada, pode-se admitir certa valorização das técnicas
básicas de derivação. Contudo, quem valoriza?
Nessa direção, EP005/MCI também apresenta seu mapa recorrendo às
técnicas, contudo, em uma de suas proposições diz: “Derivadas → Quais as regras
que lembro → Regra...”. Por que o mapeador anuncia que se lembra das Regras da
Cadeia, Regra do Quociente e a Regra do Produto? Justifica na sequência que tais
regras servem para derivar funções e funções compostas. Portanto, ele não
simplesmente cita essas regras, sabe para que deve utilizá-las e para quais
objetivos. Desse modo, contribui a compreensão de Zuben, (2009) para os termos
da dialética de Buber.
Eu-Isso é proferido pelo Eu como sujeito de experiência e utilização de alguma coisa. A inteligência, o conhecimento conceitual que analisa um dado ou um objeto é posterior à intuição do ser. Eu-Isso é posterior ao Eu-Tu. O Eu de Eu-Isso usa a palavra para conhecer o mundo, para impor-se diante dele ordená-lo, estruturá-lo, vencê-lo, transformá-lo. Este mundo nada mais é que objeto de uso e experiência (ZUBEN, 2009, p. 26).
151
Contudo, questiona-se: “Por que maior segurança em Regras de Derivação?”
Então, corrobora-se em seus MCIs a valorização dessas técnicas?
Acredita-se que mais do que uma valorização das Técnicas ou Regas de
Derivação, esse fato represente que o sujeito, antes de analisar e representar o
objeto passou por uma experiência autêntica diante do conhecimento novo, uma
experiência intensa que foi constituída por Regras de Derivação. Por isso, a
segurança em apresentar esse caminho de construção em seu MCI. Para outros
sujeitos poderia se dar de outra forma, que não por Regras de Derivação, pois a
experiência supõe a suspensão de qualquer posição genérica, conforme aponta
Larrosa (2011).
Entretanto, os MCIs dos estudantes investigados exteriorizam, de forma geral,
uma relação em construção, e de evolução que, geralmente, se inicia nesse
conhecimento. Por exemplo, o mapa de LM013/MCI (Figura 12) em uma estrutura
radial para a linear, mostra também indícios de certezas nessa construção, indicando
que a escolha por essa face da Derivada seria a “mais fácil”, logo, não a única.
Nesse sentido, Larrosa (2011) destaca que a experiência como soma de
singularidades é também plural.
Nessa direção, ressalta-se a afirmação exteriorizada pelo mapeador
LM013/MCI na proposição: “Derivadas → obs: → para mim o mais fácil do conteúdo
de Cálculo 1”. Ainda, em seus relatos para as abordagem 1 e 2 desta pesquisa, esse
estudante mencionou ter ficado muito satisfeito com seu desempenho em Cálculo 1.
Diz ter aprendido Limite e principalmente Derivada, bases do Cálculo II, além de ser
um privilegiado, por fazer parte do seleto grupo de alunos que conseguiram vencer a
disciplina na primeira vez cursada.
152
Figura 12 – (LM013/MCI)
Notadamente, este estudante está convicto de que sabe Derivada e
exterioriza sua compreensão sobre Regras de Derivação. Contudo, da mesma forma
em que outros MCIs, esse sujeito se limita a descrever as regras mais elementares e
utiliza apenas uma forma de notação. Seu mapa também apresenta proposições
limitadas, dentre as quais tenta apresentar fórmulas para as regras que conhece. A
proposição “Regra da Cadeia → só em algum caso → substituir por u”, é limitada do
ponto de vista da teoria de Novak e inadequada se considerado o contexto da
Derivada. Contudo, o que mais pode exteriorizar este mapa? A liberdade de escolha
desse sujeito?
153
Para Bauman e May (2010), nos processos de interação com os indivíduos há
direcionamentos para as escolhas realizadas, para as quais são livres para
acompanhá-las até o fim, porém a liberdade de escolha não garante a liberdade de
atuação sobre elas e nem assegura a liberdade de atingirem-se os resultados
desejados. Em Educação, essa liberdade sempre está limitada a fatores internos ou
externos à ação pedagógica.
Concorda-se com Rezende (2003), que calcular exaustivamente Derivadas de
funções através das regras usuais de derivação não leve o aluno a construir
efetivamente o significado desta operação, e as deformações decorrentes desse tipo
de abordagem contribuam para aplicações ingênuas das regras de diferenciação em
cálculos de Derivadas e em circunstâncias nem sempre apropriadas.
Nesse sentido, Vieira (2013) evidencia que o processo de significação do
conceito de Derivada parece simplesmente realizado por meio do exaustivo uso de
Regras de Derivação, não incentivando o aluno a construir efetivamente esse
conceito.
Em geral, o estudo da Derivada é iniciado por uma abordagem geométrica do
conceito de Derivada, seguida por algumas demonstrações de Derivadas a partir da
definição por Limite, para depois ir para as técnicas de Derivação, comumente
permanecendo um tempo maior nessa última abordagem, que nas duas anteriores.
Nessa etapa, é perceptível também uma maior motivação de grande parte de
estudantes em relação à resolução de exercícios por meio de técnicas de derivação,
pois é muito mais simples que a derivação pela definição, considerando o cálculo
com limites, que muitas vezes apresentam a necessidade de algum artifício
algébrico. É, portanto, desse modo que se entende que o trabalho com as Técnicas
de Derivação corresponde a um campo de representações aparentemente mais
simples e pode ser visto como o lugar onde se inicia o reconhecimento mais
“prazeroso” do estudante quando posto diante do conhecimento “novo”, a Derivada.
Nesse viés, acredita-se que na relação dialógica de alguns sujeitos com o
tópico Regras de Derivação possam estar se consolidando experiências, e não
apenas no que se refere ao emprego de símbolos e manipulações algébricas, mas
154
como uma porta de entrada à compreensão mais abrangente da rede de
significações que engloba o conhecimento da Derivada.
Nota-se ainda, a partir dos MCIs que apontam para as Regras de Derivação,
que os mapeadores não fizeram referência às demonstrações dessas regras,
apenas apresentaram suas fórmulas, ou algum cálculo desenvolvendo a Derivada de
uma função, em geral, de uma função polinomial. Os mapeadores omitem qualquer
forma de demonstração, embora tenham sido apontados o grande número de
demonstrações realizadas em aulas de Cálculo 1, nas abordagens 1 e 2.
Um enfoque poderia ser dado, por exemplo, em decorrência da apresentação
das demonstrações das Regras de Derivação, por meio de uma demonstração
anterior e consistente do Teorema da Derivabilidade e Continuidade39. Contudo,
para que esse fato possa realmente contribuir no fortalecimento da rede de
significações, na qual se insere a Derivada, é necessário cuidado, e aprofundamento
nessa tarefa. Não basta fazer a demonstração desse teorema, como uma repetição
de procedimentos sistematizados. É preciso levar os estudantes ao diálogo com o
objeto que se expõe. É preciso que o estudante seja capaz de falar desse teorema,
e que o teorema “fale” ao estudante, ou seja, faça-lhe “sentido”, atravesse-lhe como
a compreensão na leitura de um texto (LARROSA, 2011). Por exemplo, o recíproco
deste teorema é falso e pode ser explorado. Do mesmo modo, pelo contra recíproco,
o estudante pode ser capaz de ver que se uma função f não é contínua para x=x0,
então f’(x0) não existe. E por que não ampliar essa discussão para a continuidade da
função, ou seja, considerar aspectos da condição local e também global.
Nesse sentido, Rezende (2003) aponta que o estudante em um curso inicial
de Cálculo se depara com diversas situações do contexto da dualidade local/global,
o que suscita em dificuldades de interpretação dos conceitos e resultados
“normalmente” apresentados em um curso de Cálculo. Para esse autor os conceitos
do Cálculo são definidos, na sua maior parte, localmente – continuidade num ponto,
diferenciabilidade num ponto etc.– para depois serem estendidos para o seu estado
global – a função é diferenciável se ela o for a cada ponto do seu domínio etc. Essa
dificuldade pode ser observada em EP030/MCI (Figura 13), pois neste caso, o
39 Se uma função tem derivada finita em um ponto, então é contínua nesse ponto.
155
estudante reconhece que a Derivada existe em um ponto, mas voltando ao aspecto
da dualidade local/global, não está explícito se f é reconhecida pelo mapeador como
uma função diferenciável nesse ponto de seu domínio em que a Derivada existe, ou
se a função f representada pela curva é diferenciável em todos os pontos de seu
domínio.
Os estudantes investigados não exteriorizam em seus MCIs indícios do
reconhecimento da continuidade de uma função. Para apresentar a estrutura do
resultado matemático, o estudante não dá indícios do conhecimento acerca das
condições locais e/ou globais de suas hipóteses, nem das correlações entre elas.
Figura 13 – (EP030/MCI)
156
Ao calcular uma Derivada, por meio de Regras de Derivação, o estudante
compreende as condições necessárias para que essa Derivada exista e possa então
ser calculada?
Entende-se que essa compreensão seja possível, e possa ocorrer mesmo na
simples aplicação de uma regra, mas para isso o relacionamento Eu-Isso – o
relacionamento do sujeito com o objeto – precisa ser intensificado e explorado de
forma abrangente e consistente a fim de que se alcance uma relação Eu-Tu, que
transcenda o sentido da coisificação. Dessa forma, o sujeito poderá ser conduzido às
diferentes possibilidades de experiência.
No entanto, como conduzir os sujeitos da experiência de Cálculo 1 a escolher
outros caminhos de aprendizado, ou a situações que exijam cada vez mais
disponibilidade, aprofundamento e corresponsabilidade desses sujeitos, pois essas
também são condições para a experiência. Bauman (2013) colabora para o
entendimento das escolhas dos sujeitos.
O que separa a atual agonia da escolha e dos desconfortos que sempre atormentaram o homo eligens, o “homem que escolhe”, é a descoberta ou suspeita de que não há regras prefixadas e objetivos universalmente aprovados a se seguir, que pudessem absorver os escolhedores das consequências adversas de suas opções (BAUMAN, 2013, p. 23 – grifo do autor).
Em EP030/MCI, embora de forma ainda ingênua, o mapeador exterioriza sua
compreensão da ideia de função como uma relação de dependência entre as
variáveis x e y. No movimento demonstrado, novamente o estudante parte do
conceito mais inclusivo, funções, para chegar aos conceitos mais específicos:
Derivada e gráfico. Embora essa seja uma construção linear, podem-se admitir
indícios de uma construção inicial do conhecimento de Derivada sendo bem
conduzida, até então; pois o estudante consegue exprimir com clareza semântica a
sua relação com o objeto, além de utilizar-se de mais de uma forma de registro para
expressar sua posição diante do objeto. Curiosamente, nas abordagens 1 e 2 esse
sujeito mencionou a fragilidade de sua formação básica e uma consequente
reprovação na disciplina, contudo, superada na segunda vez que cursou Cálculo 1, o
que admite, garantiu sua aprovação na primeira vez em Cálculo 2.
157
Nesse sentido, destaca-se a falta de base em nível médio fortemente
reiterada nas abordagens 1 e 2 deste estudo. Qual a implicação que essa falta de
base pode acarretar na construção de significações para a Derivada? De que forma
as dificuldades dos sujeitos podem estar vinculadas a sua passagem pelo nível
médio?
Segundo Rezende (2003), para assimilar a estrutura de um resultado
matemático, por exemplo, o estudante precisa também conhecer as condições
locais/globais para o desenvolvimento de suas hipóteses, dos seus resultados e das
correlações entre eles. Assim, se tal habilidade não foi devidamente desenvolvida
em etapa anterior de sua educação superior, que pode ter sido constituída
unicamente na Educação Básica, as consequências para o Cálculo podem ser
catastróficas, conforme sugere.
De fato, a ausência das ideias e problemas essenciais do Cálculo no ensino básico de matemática, além de ser um contra-senso do ponto de vista da evolução histórica do conhecimento matemático, é, sem dúvida, a principal fonte dos obstáculos epistemológicos que surgem no ensino superior de Cálculo (REZENDE, 2003, p. 331).
Nesse sentido, Nascimento (2001 apud DALL’ANESE, 2006) expõe acerca
de professores que constatam que as dificuldades de alunos em Cálculo 1 devido à
ausência de conceitos naturais e intuitivos embutidos nas estruturas numéricas,
geométricas e variacionais, decorrente da forma como professores da educação
básica cumprem o conteúdo matemático.
Acredita-se na validade do apontado por esses autores e corroborado por
suas bem conduzidas pesquisas. Admite-se, também, que as deficiências
apresentadas nas representações dadas por alguns mapeadores têm em sua base a
queixa comum de um ensino básico deficiente. Esse fato foi apontado por um
elevado número de estudantes ao comentar sobre a disciplina de Cálculo 1 e ao
relatar sobre seu próprio desempenho nessa disciplina, nas abordagens 1 e 2. Cabe
mencionar que para os MCIs observados, com exceção do curso de Licenciatura em
Matemática, todos os demais cursos têm no primeiro semestre a disciplina de
Cálculo 1.
158
Nessa direção, verifica-se que EP005 comentou sobre suas dificuldades na
disciplina de Cálculo 1, que foi para ele devida ao tempo de saída do Ensino Médio,
pois fazia quase 10 anos que não entrava em sala de aula, a última vez tinha sido
em um Instituto Federal. Declarou-se inseguro ao entrar na universidade, mas
conseguiu a aprovação na primeira vez que cursou a disciplina. Nesse sentido,
EC013 relatou ter sido aprovado na primeira vez que cursou a disciplina, o que lhe
exigiu muito conhecimento do nível médio, encontrando aí bastante dificuldade, mas
que superou após fazer sozinho estudos da base da matemática que lhe faltava. Do
mesmo modo, EP030 apontou as dificuldades decorrentes de sua falta de base
matemática de nível médio, reprovou em Cálculo 1 uma vez e buscou em estudos
complementares diminuir sua defasagem e, LM002 foi aprovado em Cálculo 1 na
primeira vez que cursou a disciplina, com uma boa nota, mas declarou que apenas
decorava os conteúdos para a prova, não mencionou falta de base de nível médio.
Tem-se assim, quatro situações distintas, porém que se aproximam pela
elaboração de seus mapas. Todos esses mapeadores exteriorizaram aspectos que
valorizam as Regras de Derivação. Constatou-se que LM002/MCI (Figura 14)
conduziu uma resolução de exemplos de casos de derivação no final do seu mapa,
apresentando o cálculo da Derivada de funções básicas, logarítmica, exponencial,
polinomial e trigonométrica. Porém, para todos os exemplos dados considerou
funções simples cujas Derivadas são imediatas. Iniciou seu mapa com a proposição
de que Derivadas são determinadas através de regras. Nessa direção, EP030/MCI
mencionou a inclinação da reta tangente e se referiu à notação y=f’(x) e ao gráfico
de uma função f genérica correspondente, e uma forma de notação para Derivada,
apresentou um mapa simples com aspectos de linearidade; e EC013/MCI também
não avançou no aprofundamento em relação às Regras de Derivação, referiu-se à
Derivada do produto geral de duas funções e da divisão geral de duas funções. O
mapa de EP005/MCI não foi diferente em relação ao aprofundamento em relação às
Regras de Derivação, restringindo-se essencialmente a apontar as regras que
conhecia e os possíveis usos dessas regras.
Desse modo, tais MCIs poderiam colocar os sujeitos em uma mesma
dimensão de abordagem do aspecto Regras de Derivação, em que não
apresentaram um maior aprofundamento, ou não se referiram a nenhuma condição
159
para que qualquer uma das regras apontadas pudesse estar definida, porém foram
diferentes em relação à bagagem que trouxeram em relação à base matemática.
Figura 14 – (LM002/MCI)
Notadamente, com ou sem uma base matemática fortalecida no Ensino
Médio, por meio dos MCIs, os sujeitos exteriorizaram um aspecto da construção
desse conhecimento que parece revelar apenas os pontos mais elementares dessa
abordagem, como se sinalizassem para uma construção inicial desse conhecimento.
Por exemplo, LM002/MCI mencionou o grande número de demonstrações feitas em
aula de Cálculo 1 nas abordagens anteriores, mas também se limitou ao contexto da
superficialidade em seu mapa. Nesse sentido, pode significar que apenas a
160
superficialidade, os casos mais simples, os níveis mais elementares deixam suas
marcas?
As marcas da superficialidade ficaram realmente evidentes nos MCIs desses
estudantes. Mas, esses mapas indicam também que sujeitos com formação básica
distintas estejam construindo mapas similares. Cabe o entendimento de que um
grupo de estudantes aparentemente adentra ao conhecimento da Derivada pelo
caminho das técnicas de Derivação. Acredita-se, contudo, não ser essa a única
abordagem a que são expostos. Provavelmente por opção, por escolha, podem ter
tornado esse caminho por julgá-lo o de melhor acesso, significando que nesse
espaço se encontram mais seguros, mais confortáveis.
Compreende-se, então, que há uma direção nesse processo de construção do
conhecimento da Derivada, que para alguns estudantes investigados parece iniciar-
se pela abordagem das Regras de Derivação. Nesse sentido, vê-se algo de positivo,
há como evoluir, mesmo que com estudantes de Cálculo 1 que apresentam
relevantes dificuldades decorrentes de uma educação básica deficiente. Mesmo com
estudantes que escolham o caminho mais “tranquilo” para dar os primeiros passos
na direção do novo conhecimento. Os aspectos apontados por Rezende (2003)
contribuem nesse sentido, assim como várias outras pesquisas direcionadas para
focos distintos da problemática do Cálculo 1, como exemplo Traldi (2006),
Dall’Anese (2006) e Vieira (2013), apresentadas na revisão de literatura.
5.3 MCIs e o enfoque Conceito da Derivada
Elegeu-se, em continuidade para o processo de análise, o enfoque Conceito
da Derivada, pois este, desempenha um papel central no currículo da disciplina de
Cálculo Diferencial e Integral 1 e, por conseguinte, está presente nas abordagens em
aulas dessa disciplina, cenário desta investigação. Nesse propósito, entende-se que
o conceito de Derivada é passível de ser definido de diferentes formas e é
recomendável que as diferentes formas sejam correlacionadas. Infere-se que
podem, em aulas de Cálculo 1, ocorrer disjunções nas abordagens, evidenciando-se
161
os aspectos formal, dinâmico e estático desse entendimento e, apenas em virtude da
análise que se pretende realizar, far-se-á uso dessas disjunções. Porém, considera-
se que os MCIs em análise nesta etapa podem trazer elementos simultâneos de
mais de um desses aspectos. Assim como, entende-se que o fato de um MCI
apontar para apenas uma dimensão do Conceito da Derivada, não signifique que o
sujeito tenha apenas essa única compreensão.
Nesse propósito, compuseram-se três agrupamentos para o enfoque Conceito
da Derivada, representados em agrupamentos: (I)l; (II) e (III) que serão descritos a
seguir. A partir desses agrupamentos os MCIs dos estudantes investigados serão
classificados.
Agrupamento I (Formal) – Enquadram-se os MCIs em que os sujeitos
investigados apontaram para uma possibilidade de compreensão conceitual da
Derivada, porém, restrita à definição formal, dada por meio do Limite, ou seja,
remeteram à fórmula que compara a Derivada f’ de uma função f em (Conjunto
dos Números Reais), considerando-se um intervalo I do conjunto e uma função f
de I em . Nesse aspecto, se um ponto , diz-se que f é derivável em a, se
existir o limite e o mesmo for finito, conforme Stewart (2006) pode ser definida como:
onde, h = x – a.
Nesta expressão o limite indica a Derivada da função f no ponto a,
representada por f′(a). A Derivada de f em a, se existir, é única, o que também é
verdade se I fosse um conjunto qualquer de números reais e se a fosse um ponto
não isolado de I. Porém, buscar-se-á nos mapas por proposições adequadas e/ou
limitadas, conforme já estabelecido para Regras de Derivação, desse modo,
possíveis erros ou falta de clareza em algumas proposições podem ser encontradas
e consideradas.
Agrupamento II (Estático) – Enquadram-se os MCIs em que se percebem
aspectos de uma compreensão direcionada para a comumente chamada de
Interpretação geométrica estática da Derivada, ou seja, uma interpretação
162
geométrica da taxa de variação onde intuitivamente se trabalha com a noção de
Limite. Nessa direção, incluem-se aspectos que remetam a indícios da compreensão
que, em geral, é resultado de uma abordagem que se inicia pelo estabelecimento de
que a Derivada de uma função f em um ponto a fornece o coeficiente angular
(inclinação) da reta tangente ao gráfico de f no ponto (a, f(a)). Nesse intento, dada
uma curva que representa o gráfico de f, se conhecido um ponto P(a, f(a)), então a
equação da reta tangente à curva em P é dada por y - f(a) = m (x - a), onde m é o
coeficiente angular da reta tangente. Assim, basta o sujeito conhecer o coeficiente
angular m da reta e um de seus pontos, para conhecer a sua equação. Para obter m
para que essa reta seja tangente à curva em um ponto P, considera um outro ponto
arbitrário sobre a curva, Q, cujas coordenadas são (a + ∆x, f(a+ ∆x)). A reta secante
à curva que passa por P e Q fornece o m (inclinação da reta secante). A variação do
coeficiente angular da reta secante fazendo Q se aproximar de P, ou seja, tomando
∆x cada vez menor, permite indicar que quando P está próximo de Q, o coeficiente
angular m da reta secante deve estar arbitrariamente próximo do coeficiente angular
m da reta tangente, ou seja, o coeficiente angular m da reta secante tem um limite m,
o que implica dizer que a reta tangente é a posição limite da reta secante quando Q
tende para P. Uma consequência imediata dessa interpretação da Derivada é que
uma função só é derivável (ou diferenciável) em um ponto de seu domínio se existir
uma reta tangente ao seu gráfico por este ponto. Acredita-se que alguns mapas
possam apresentar indícios de aspectos dessa interpretação e, do mesmo modo que
para o agrupamento II, possivelmente serão encontradas proposições adequadas
e/ou limitadas, porém, interessa para esse estudo se exteriorizam em MCIs indícios
dessa compreensão do conceito da Derivada.
Agrupamento III (Dinâmico) – Enquadram-se os MCIs dos estudantes que
em suas representações remeteram à interpretação da Derivada como taxa de
variação instantânea da função. Entende-se que algumas abordagens sobre o
conceito de Derivada se encontrem fortemente relacionadas a essa compreensão,
como exemplos de um importante indicador gerencial em que a variação de uma
função e a medida desta variação se fazem necessárias em um determinado
momento. Buscar-se-á por aspectos representados nos MCIs que apontem para
essa compreensão e que relacione a Derivada de uma função ao limite das taxas
médias de variação sobre intervalos cada vez menores. Se o intervalo for [x1, x2],
163
então ∆x = x2 – x1, e a variação no valor de y será ∆y= f(x2) – f(x1). A taxa de
variação instantânea será dada pela expressão a seguir:
Em conexão com a interpretação anterior, se esboçada a curva y=f(x), então a taxa
de variação instantânea de f será a inclinação da tangente a essa curva no ponto
onde x=a. Assim, quando a Derivada for grande, os valores de y mudarão
rapidamente, ocorrendo o contrário para quando a Derivada for pequena, conforme
Stewart (2006).
Figura 15 – Taxa de variação instantânea Fonte: Stewart (2006, p. 161)
Contudo, a busca por proposições adequadas e/ou limitadas nos MCIs
permitirá que representações incompletas sejam computadas, portanto as
proposições adequadas e/ou limitadas, ou seja, ainda que explicitem baixa clareza
semântica para o contexto matemático da Derivada serão consideradas, assim como
A figura mostra que
valores de y mudam
rapidamente em P e
lentamente em Q.
164
os MCIs que simplesmente apresentarem referência à Derivada como taxa de
variação instantânea da função, ou que denote indícios dessa compreensão.
A seguir, apresenta-se o Quadro 11 com os resultados computados em cada
um dos agrupamentos para MCIs que apresentaram indícios de Conceito da
Derivada na análise de suas proposições. Ressalta-se que um mesmo mapa pode
apresentar elementos de um ou mais agrupamentos, o que não invalida a contagem
para o item. Assim como, alguns MCIs podem apresentar elementos de outros
agrupamentos e ser contado, simultaneamente, em Regras de Derivação e Conceito
da Derivada, por exemplo.
Quadro 11 – Resultados a partir dos MCIs considerados conforme os agrupamentos para Conceito
da Derivada.
CONCEITO DE DERIVADA
MCIs Conceito de
Derivada40 em MCIs
(%)41 Agrupamentos
I II III
EA 07 03 57,14 01 03 00
EC 06 02 33,33 00 02 01
EP 24 02 8,33 00 02 00
EQ 36 18 50,00 04 16 04
ER 04 01 25,00 00 01 00
LF 03 02 66,67 01 02 00
LM 28 10 35,71 01 08 03
LQ 02 00 0,00 00 00 00
TOTAL 110 38 34,54 07 34 08
A partir dos dados no Quadro 11, verifica-se que a coluna Conceito da
Derivada em MCIs indica o número de mapas nos quais foram encontradas, em
proposições adequadas e /ou limitadas, indícios de uma compreensão do estudante
em que este recorre a elementos da abordagem por conceitos pensada em pelo
menos uma das formas dos três agrupamentos apresentados. Desse modo, um
mesmo mapa pode conter elementos de mais de um agrupamento, como ocorreu
40 Os números nessa coluna diferem do somatório dos agrupamentos, pois alguns MCIs foram computados em mais de um agrupamento. 41 Percentagem relativa ao número de MCIs com Conceito de Derivada em comparação com o total de MCIs considerados.
165
para o curso de LF em que em três MCIs considerados, dois apresentaram indícios
de Conceito de Derivada. Ou ainda, um conjunto de MCIs considerado pode não
apresentar esses elementos em nenhum dos mapas, como o caso da LQ.
5.3.1 A análise para Conceito de Derivada
Conforme apresenta o Quadro 11, evidenciou-se que o agrupamento II
englobou o maior número de proposições adequadas e/ou limitadas com indícios de
elementos de uma construção conceitual da Derivada. Dos 110 MCIs selecionados,
34 receberam esse enquadramento. Cabe lembrar que um mesmo mapa pode ter
sido computado em um ou mais agrupamentos, pois apenas se levou em conta, se o
mapeador exteriorizou indícios dessa compreensão que se alinha ao conceito de
Derivada nas dimensões, conforme apontado nos agrupamentos I, II e III.
Identificou-se também, que apenas 07 dos 110 MCIs considerados se enquadraram
no agrupamento I, e 08 no agrupamento III. Nos MCIs computados a interpretação
da Derivada, conforme apresentada no agrupamento II, ultrapassou em muito a
compreensão formal em termos de Limite dada no agrupamento I e a compreensão
dinâmica como taxa de variação instantânea, conforme explicitada no agrupamento
III.
Verificou-se que o agrupamento II foi o mais presente nos MCIs dos
investigados, nesse sentido, concorda-se com Rezende (2003) que interpretar o
conceito de Derivada tão somente como coeficiente angular da reta tangente
significa ignorar o problema histórico essencial da medida instantânea da
variabilidade de uma grandeza. A presença marcante do agrupamento II pode indicar
que a abordagem por meio da interpretação geométrica estática do conceito da
Derivada seja frequente em aulas de Cálculo 1 e possa ocorrer de forma destacada
das mencionadas nos agrupamentos I e III.
No entanto, a mesma presença pode indicar, assim como em Regras de
Derivação, que a compreensão do conceito da Derivada possa estar se
consolidando por esse caminho, pois talvez esse se abra aos estudantes com uma
maior significação em seu processo de construção do conhecimento, favorecendo a
166
compreensão desses estudantes a respeito da Derivada. Provavelmente, entender o
processo mencionado no agrupamento II seja uma tarefa razoável para os
estudantes, pois ao apontar para elementos geométricos da construção do conceito,
os estudantes podem encontrar sentido para o aspecto formal dado em termos do
Limite, quando muitas vezes, Derivadas são “provadas” por meio de um “jogo” que
relaciona o valor encontrado por meio de regras de derivação ao valor encontrado
pela definição da Derivada. Isso pode não fazer muito sentido para os estudantes, no
entanto, por meio da interpretação conforme se apresenta no agrupamento II,
intuitivamente percebem o Limite quando fazem Q se aproximar de P.
Desse modo, essa abordagem remetida a uma interpretação geométrica
estática pode estar consolidando experiências (LARROSA, 2002, 2011) para esses
sujeitos em aulas de Cálculo 1, e talvez por isso, esse número representativo de
estudantes apresentaram elementos desse agrupamento em seus MCIs.
Contudo, verifica-se também o aspecto da superficialidade. Os MCIs
considerados em Conceito de Derivada, em sua maioria, apresentaram indícios de
uma compreensão superficial, inconclusa, limitada e insuficiente. A presença de
proposições limitadas justifica esse fato, como exemplo EA001/MCI (Figura 16) em
seu MCI exterioriza proposições que apresentam baixa clareza semântica quanto
aos conceitos e termos de ligação utilizados, e são insuficientes no contexto
matemático em que se insere o estudo da Derivada. O que até pode ser devido a
sua não familiaridade com a representação por meio de mapas conceituais, mas
pode significar também a insegurança deste estudante em relação à compreensão
da Derivada. Em seu MCI foi econômico quanto ao número de proposições, que
seguiram uma representação radial, ou seja, com proposições ligadas ao conceito
central, contudo, não necessariamente ligadas entre si; e linear, quando cada
conceito se liga unicamente ao anterior. Seu mapa se caracterizou pela limitação no
número de conceitos.
167
Figura 16 – (EA001/MCI)
Cabe mencionar que os termos de ligação inadequados diminuem a precisão
da mensagem exteriorizada com as proposições, conforme Cicuto e Correia (2013).
A partir do MCI apresentado na Figura 16, evidenciou-se também, que uma das
proposições “Derivada fácil ou difícil solução”, não apresentou verbo no termo
de ligação, o que compromete sua clareza semântica, é, portanto, uma proposição
limitada. Em continuidade a essa proposição, o mapeador faz uma relação entre
conceitos, mas não coloca o sentido na seta, e, portanto não passa a real intenção
de sua mensagem, “solução-depende-função ou função-depende-solução”? A
presença das proposições limitadas permitiu diferenciar as Estruturas Hierárquicas
Inapropriadas ou Limitadas no mapeamento, segundo Novak (2002). Desse modo, a
clareza da proposição “Derivada descreve a reta tangente” é facilmente
destacada na rede de proposições, evidenciando que nessa direção, o mapeador
demonstra o principio de uma compreensão. Uma construção do conhecimento da
168
Derivada parece apontar para o caminho do conceito, contudo, infere-se que ainda é
incipiente, fragmentada, em construção. Nesse sentido, a experiência é uma
possibilidade, pois ocorre na descoberta, na transformação diante do novo.
O sujeito EA001 ingressou no curso de EA no ano de 2008, quando cursou
Cálculo 1 a primeira vez. Relatou que de uma turma de 30 alunos ele foi um dos 7
aprovados na disciplina. Em relato dado para a abordagem 2 mencionou que embora
tenha sido aprovado, não aprendeu o suficiente, pois, diz-se ainda encontrar
dificuldades ao deparar-se com Derivadas, quando de sua participação nesta
pesquisa. Acredita também que essa dificuldade seja decorrência de uma formação
básica deficiente. Assim, infere-se que a superficialidade apresentada em
EA001/MCI pode estar relacionada muito mais a sua compreensão limitada sobre o
conteúdo, do que a sua habilidade para elaborar mapas conceituais.
Embora essa característica da superficialidade apresentada nos MCIs tenha
estado muito presente, também foram encontrados mapas mais conclusivos,
demonstrando uma maior segurança dos sujeitos em relacionar sua compreensão
sobre o tema Derivada. Apontado por Larrosa (2002, p. 24), o sujeito da experiência
pode ser entendido como “uma superfície sensível que aquilo que acontece afeta de
algum modo, produz alguns efeitos, inscreve algumas marcas”, desse modo,
entende-se que a segurança possa estar relacionada a essas marcas ou vestígios
deixados pelas aulas de Cálculo 1.
Em EA009/MCI (Figura 17) o mapeador inicia sua construção pela afirmação
dada pela proposição “Derivadas significam a inclinação da reta tangente a
uma curva”, e dessa forma indica um caminho de construção do conhecimento da
Derivada mais fundamentado do que EA001. Embora se utilize de uma frase dentro
da caixa para o segundo conceito, o que poderia ser expandido, gerando novas
conexões em seu mapa a partir do conceito inclinação, verifica-se que a construção
continua em uma estrutura próxima de um mapeamento em rede, por meio da qual o
sujeito faz outras relações, revelando um contexto de representações que aponta
para regras através de fórmulas, procedimento que é deixado; mas também aponta
para aplicações da Derivada, com um exemplo em Física, o que relaciona de forma
cíclica no mapa à ideia conceitual sobre a Derivada apresentada no início do seu
mapa, revelando uma elaboração mais abrangente, mais inclusiva.
169
Figura 17 – (EA009/MCI)
As iniciativas abandonadas pelo mapeador, uma para Regra de Derivação e
uma rasura na base do mapa, dão indícios da forma como o estudante pensou ao
conduzir sua elaboração. Ao pensar, toma decisão, redireciona sua compreensão.
Essas iniciativas mostram direções tomadas pelo sujeito, cuja habilidade para tomar
decisões é uma escolha consciente, um exercício de liberdade (BAUMAN; MAY,
2010). Entretanto, até que ponto essa liberdade se coloca sob as limitações do
conhecimento desse estudante?
Nessa direção, destaca-se o mapeamento de LM012/MCI (Figura 18), pois
este mapeador também organiza uma estrutura em rede, e se utiliza de conceitos,
em geral, colocados em uma única palavra, demonstra um modelo hierárquico com
conceitos mais inclusivos no topo e conceitos específicos ou pouco abrangentes na
170
base do mapa, embora mapas conceituais não necessariamente prescindam de
apresentar esse tipo de hierarquia (MOREIRA, 2012)42.
Neste mapa, há a presença de exemplos, uma característica observada em
alguns mapas elaborados por estudantes da LM, como em LM002/MCI43; destacou-
se este aspecto pela coincidência dos cursos, pois talvez em pesquisas futuras
possam ser revisitados elementos didáticos pedagógicos evidenciados em mapas
conceituais ou mapas conceituais iniciais.
Entende-se também que a utilização dos exemplos pelo mapeador reforçou a
sua segurança na exteriorização apresentada. Outra característica que remete à
segurança se refere ao traçado acentuado das linhas e ausência de rasuras. Pode-
se inferir que em LM012/MCI as decisões do mapeador foram conscientes. Mais
elementos dessa segurança são evidenciados pelas linhas finalizadas com setas
indicando um sentido entre os conceitos. O conceito de Derivada é nesse sentido,
apresentado por meio de uma aquisição diferenciada progressiva44, pois este
mapeamento se tornou cada vez mais elaborado à medida que o estudante
estruturou sua representação.
Do ponto de vista do contexto matemático, embora incipiente, este mapeador
apresentou uma sistematização adequada em relação à Derivada, suas proposições
foram apropriadas quanto à clareza semântica e quanto ao conteúdo explicitado, e
aparecem em maior número de conceitos. A partir de uma proposição fica evidente
em seu mapa que a compreensão da Derivada está associada à compreensão de
Limite que decorreu das funções, segundo LM012/MCI. O que sustenta essa opção
do mapeador pode estar fundamentado na forma como se constitui a identidade da
disciplina de Cálculo 1.
42 Adaptado e atualizado, em 1997, de um trabalho com o mesmo título publicado em O ENSINO,
Revista Galáico Portuguesa de Sócio-Pedagogia e Sócio-Linguística, Pontevedra/Galícia/Espanha e Braga/Portugal, N° 23 a 28: 87-95, 1988. Publicado também em Cadernos do Aplicação, 11(2): 143-156, 1998. Revisado e publicado em espanhol, em 2005, na Revista Chilena de Educação Científica, 4(2): 38-44. Revisado novamente em 2012. 43 Ver em análise para Regra de Derivação (Figura 14). 44 Processo característico da dinâmica da estrutura cognitiva, no curso da aprendizagem significativa, os conceitos que interagem com o novo conhecimento e servem de base para a atribuição de novos significados vão também se modificando em função dessa interação, esse processo é denominado de Diferenciação Progressiva, segundo Moreira (2012).
171
Figura 18 – (LM012/MCI)
Nessa direção, a hierarquia demonstra uma organização dos conceitos do
mais para o menos inclusivo, tornando seu mapa claro para o leitor, evidenciando
também o aspecto cronológico dos conteúdos programáticos, aspecto esse
corroborado pelo plano comum da disciplina.
Segundo Vieira (2013), uma sequência temática que se coloca como:
Números Reais, Funções, Limite, Derivada e Integral, constitui a apresentação de
um Cálculo sistematizado, formal e logicamente organizado resultado do trabalho de
filósofos, pensadores e matemáticos por mais de 20 séculos. Uma proposta que,
para esse autor se baseia no fato, questionável, de que “a lógica interna consistente
precisa garantir a aprendizagem significativa por parte dos estudantes” (VIEIRA,
2013, p. 41).
Outro MCI bastante significativo é representado por LM034/MCI (Figura 19). A
estrutura apresenta um mapeamento radial e linear. Este mapeador explicita
172
reconhecimento de regras de derivação e também se volta para Conceito e
Aplicação da Derivada. No que diz respeito ao Conceito da Derivada se pode
evidenciar a proposição “Derivadas nos dão equação da reta tangente”. Essa
proposição está apropriada (NOVAK, 2002; CICUTO; CORREIA, 2013), pois o verbo
no termo de ligação torna possível entender completamente a mensagem, porém o
mapeador complementa a informação, com “a equação pode ser obtida pela fórmula
ponto inclinação”. Este mapeador também se utilizou de exemplos em seu mapa, e
quando faz esse complemento, parece ser seu intento reafirmar a proposição
destacada. Conforme apontado anteriormente, os exemplos estão presentes em
vários MCIs de alunos da LM. Este mapeador ingressou na LM em 2012, e cursou
Cálculo 1 uma vez no 1º semestre de 2013. Mencionou em relato que embora tenha
considerado complicado no início, o Cálculo 1 é interessante, e foi a disciplina que
mais gostou de cursar até o momento45.
Figura 19 – (LM034/MCI)
45 Julho de 2013, ocasião em que ocorreu a coleta dos dados deste mapeador.
173
Infere-se que LM034/MCI vivenciou uma relação com a Derivada de forma
abrangente, mas que talvez possa não ter sido integradora nas significações que
envolvem esse conhecimento. Pois, em seu mapa apontou para as três direções:
Regras, Conceito e Aplicação, porém essas três direções não foram interligadas,
uma vez que permaneceu com uma estruturação radial e linear até o fim. Contudo, é
possível afirmar apenas a partir de um único MCI que o estudante tenha sido
exposto a uma visão abrangente, mas não integradora na construção de um
determinado conhecimento?
De fato não se tem certeza da integração ou não. Em suas escolhas para este
mapa expõe as três formas, o que pode apontar para a forma como esse sujeito
consegue visualizar a Derivada, o que não é garantia de que não consiga fazer
integrações entre Regras, Conceito e Aplicações da Derivada.
Vieira (2013) sugere em relação à disciplina de Cálculo o domínio da técnica
sobre o significado. Os resultados encontrados na presente investigação também
apontam para essa possibilidade.
Porém, se não é possível afirmar a integração dos enfoques mencionados, a
partir do mapeamento de LM034/MCI, pode-se confirmar a abrangência das aulas de
Cálculo 1 quando este sujeito remete às três direções de abordagem dessa
disciplina. Nesse sentido, seu mapa é abrangente; o que corrobora o ponto de vista
em relação às escolhas dos sujeitos, quando uns apresentam uma única
possibilidade ao exteriorizar sua compreensão de Derivada, enquanto outros optam
por várias direções. Entende-se que as escolhas exteriorizadas pelos sujeitos em
seus MCIs sobre Derivada vão ao encontro do que representa suas possibilidades
de experiência com esse conteúdo; em outras palavras, as possíveis marcas
deixadas na relação dialógica ocorrida na passagem desses estudantes pela
disciplina de Cálculo 1.
Presume-se, assim, como Rezende (2003) e Vieira (2013), que a noção de
Derivada está, sobretudo, relacionada à taxa de variação instantânea, e nessa
perspectiva, possa ter sentido em diversas áreas do conhecimento. Contudo, esses
autores salientam a prevalência da definição formal do conceito de Derivada em
termos de Limite e sua interpretação geométrica estática como coeficiente angular
174
da reta ao gráfico de uma função em um dado ponto. Os dados desta pesquisa
confirmam mais fortemente essa argumentação geométrica, e acrescentam que,
embora a visão geométrica estática prevaleça, a superficialidade dessa perspectiva
também está presente, assim como a superficialidade da visão formal e dinâmica.
Os investigados deixam revelar por meio de seus MCIs que o conhecimento
construído ao longo da disciplina deixou apenas as marcas mais elementares.
Desse modo, julga-se a necessidade de fortalecer os meios para que essas
marcas (LARROSA, 2011) sejam mais profundas e menos elementares. Vieira
(2013) sugere que as teias da rede de conhecimento precisam se tornar grandes
mediadoras na negociação de significados e unir a Matemática e a Informática para
fortalecer a apropriação do conhecimento. Nesse sentido, sugere-se também um
maior cuidado e atenção à relação dialógica (BUBER, 2009) presente nesse
encontro de possibilidades que se forma em aulas de Cálculo 1.
5.4 MCIs e o enfoque Aplicação da Derivada
Na etapa final deste processo de análise se apresenta o enfoque Aplicação de
Derivada, no qual se acredita seja classificado um número mais reduzido de MCIs,
uma vez que a aplicação da Derivada pode exigir do sujeito uma compreensão mais
bem elaborada do que se refere a Regras de Derivação e ao Conceito de Derivada,
o que não foi demonstrado em um número significativo de MCIs.
Concebeu-se quatro agrupamentos para o enfoque Aplicação da Derivada,
representados em agrupamentos: (I) Gráficos; (II) Problemas Elementares; (III)
Taxas Relacionadas e (IV) Otimizações, que serão descritos a seguir. Essa divisão
foi pensada levando em consideração um caminho de abordagem bastante presente
em aulas de Cálculo 1. A partir dos agrupamentos os MCIs dos investigados foram
classificados e analisados. Cabe lembrar que, conforme os enfoques anteriores, um
mesmo MCI pode exteriorizar aspecto de um ou mais agrupamentos, e quando
ocorrer tal situação, será computado em todos os agrupamentos para os quais
apresentar implicação.
175
Agrupamento I – (Gráficos) – Enquadram-se os MCIs dos estudantes que
exteriorizaram aspectos que remetem à ideia de construção de gráficos a partir de
Derivadas. Ou seja, a partir de seus MCIs os investigados apontaram, por meio de
proposições limitadas e/ou apropriadas, para aspectos que remetem ao uso de
Derivadas para auxiliar a construção de gráficos, pois a Derivada como um
importante recurso para análise de funções contribui para essa elaboração.
Considerou-se que a partir da interpretação estática que faz da Derivada, o
estudante possa ser levado a apresentar aplicações desse conteúdo como um
recurso auxiliar ao esboço de curvas, por exemplo, quando a partir da Derivada
mencionar pontos onde a tangente é horizontal à curva, ou seja, onde a Derivada da
função no ponto de abscissa é zero; ou para encontrar os intervalos para os quais a
função está acima da reta tangente, ou abaixo dessa reta etc. Assim, se o estudante
na referência à análise e elaboração de gráficos de funções apresentar proposições
limitadas e/ou apropriadas que indiquem: o crescimento ou decrescimento da
função; valores críticos e máximos e mínimos relativos; testes da Derivada primeira e
segunda; concavidade e ponto de inflexão de uma curva, para o fim exclusivo de
elaborar um gráfico, então, seu MCI será considerado neste agrupamento. Contudo,
a menção a qualquer um desses aspectos é suficiente para classificar um
mapeamento, portanto, possivelmente representações inconclusas e elementares
poderão ser consideradas como um MCI classificado nesse agrupamento.
Agrupamento II – (Problemas Elementares) – Enquadram-se as
exteriorizações nos MCIs que apontaram para a resolução de problemas cuja
solução pode ser dada por meio da identificação da taxa de variação instantânea de
uma função. Tais problemas são facilmente resolvidos pelos estudantes, aplicando-
se apenas a Derivada de uma função Polinomial, um procedimento que remete
também ao domínio da técnica. Problemas desse tipo são frequentes em aulas de
Cálculo 1, geralmente, vinculados ao contexto da Física, Economia, Biologia etc., por
exemplo, a situação a seguir: “Suponha que a equação horária do movimento de um
corpo é dada por s(t) = t2 + 3t + 5 e que se deseja saber a velocidade do corpo no
instante t=3s. Encontre essa velocidade”. O estudante chega rapidamente ao
resultado derivando uma vez a função s(t) em função do tempo e fazendo as
substituições necessárias. Nesse contexto, enquadram-se também as proposições
176
limitadas e/ou apropriadas em que os estudantes mencionam a aplicação da
Derivada à Física, Química, Economia etc.
Agrupamento III – (Taxas Relacionadas) – Enquadram-se neste
agrupamento os MCIs por meio dos quais os estudantes exteriorizaram ideias
relativas a problemas com variáveis relacionadas, por exemplo, se mencionaram que
se uma variável x é função do tempo t, então a taxa de variação de x em relação ao
tempo é dada por dx/dt, e dessa forma, quando duas ou mais variáveis, todas em
função de t, são relacionadas por uma equação, a relação entre suas taxas de
variação pode ser obtida diferenciando a equação em relação a t. Nessa direção,
provavelmente tais estudantes relacionem suas representações a problemas
clássicos do tema como o problema do cone invertido, do balão esférico etc. Indícios
dessa abordagem remetem a passos, geralmente conduzidos em aulas de Cálculo
1,na seguinte sequência: fazer uma figura; definir variáveis, em geral, em função de
t; escrever os fatos numéricos conhecidos sobre as variáveis e suas Derivadas em
relação à t; obter uma equação em função de t; derivar em relação a t ambos os
membros da equação encontrada; substituir valores de quantidades conhecidas e
resolver o problema. Assim, se os estudantes estabelecerem proposições limitadas
e/ou apropriadas que apontem para essas representações, seus MCIs serão aqui
computados, também os mapas que exteriorizarem apenas menções a problemas
com taxas relacionadas.
Agrupamento IV – (Otimizações) – Enquadram-se os MCIs por meio dos
quais os estudantes exteriorizam aspectos que remetem às aplicações de máximos
e mínimos absolutos das funções que os representam, ou seja, com o objetivo de
determinar máximo e/ou mínimo da função recorrem a otimizações fazendo uso da
Derivada. Considera-se também que para determinar os pontos de máximo e mínimo
globais de uma função contínua seja necessário comparar valores que a função
assume nos pontos críticos, com os respectivos valores nos extremos do intervalo,
quando a função é contínua definida em um intervalo fechado, podendo assim,
assumir valores máximo e mínimo globais ou nos pontos críticos, ou nos extremos
do intervalo. São, nesse caso, situações em que se busca resolver problemas tais
como: maximizar áreas, volumes, lucros e minimizar distâncias, tempo e custos.
177
Problemas desse tipo46, embora abrangentes uma vez que podem ir desde
problemas geométricos a problemas que dizem respeito à Física, Engenharia,
Biologia, Economia etc, são propostos em aulas de Cálculo 1. O maior desafio é
converter o problema em um problema de otimização matemática estabelecendo a
função que deve ser maximizada ou minimizada. Considera-se provável encontrar
nos MCIs a evidência de aspectos que remetam a essa construção, porém admite-se
que possam não significar representações completas; assim, serão consideradas
também as exteriorizações por meio de proposições limitadas e/ou apropriadas nos
MCIs que remetam parcialmente às situações de otimização, como a simples
menção ou referência à situação.
Apresenta-se o Quadro 12 com os resultados computados em cada um dos
agrupamentos para MCIs que apresentaram indícios de Aplicação da Derivada.
Enfatiza-se que um mesmo mapa, pode apresentar elementos de um ou mais
agrupamentos, o que não invalida a contagem para o item. Assim como, podem
apresentar elementos dos demais enfoques já considerados na presente análise.
Quadro 12 – Resultados a partir dos MCIs considerados conforme os agrupamentos para Aplicação da Derivada.
46 “Um fazendeiro tem 2400 pés de cerca e quer cercar um campo retangular que está na margem de um rio reto. Ele não precisa de cerca ao longo do rio. Quais são as dimensões do campo que tem a maior área?” (STEWART, 2006, p. 332). 47 Os números nessa coluna diferem do somatório dos agrupamentos, pois alguns MCIs podem ter sido computados em um ou mais agrupamentos. 48 Percentagem relativa ao número de MCIs com Aplicação da Derivada em comparação com o total de MCIs considerados em cada curso investigado.
APLICAÇÃO
DA DERIVADA MCIs
Aplicação da
Derivada 47 em
MCIs
(%)48
Agrupamentos
I II III IV
EA 07 02 28,57 01 01 00 00
EC 06 02 33,33 00 02 00 00
EP 24 06 25,00 01 05 00 02
EQ 36 07 19,44 00 05 01 01
ER 04 01 25,00 00 01 00 00
LF 03 02 66,67 00 01 01 00
LM 28 04 14,29 01 04 00 00
LQ 02 00 00,00 00 00 00 00
TOTAL 110 25 22,73 02 19 02 03
178
A partir da classificação prévia dos MCIs que exteriorizam aspectos da
aplicação da Derivada se construiu o Quadro 12. A evidência de um percentual bem
mais reduzido nos agrupamentos desse enfoque foi confirmada nesse levantamento,
pois apenas 25 dos 110 MCIs considerados, aproximadamente 23%, apontaram
para essa direção. Desses 25 MCIs, 2 remeteram para o agrupamento I, 19 para o
agrupamento II, 2 para o agrupamento III e 3 para o agrupamento IV, ressaltando-se
que um mesmo mapa pode ter sido considerado em mais de um agrupamento.
Entende-se que o receio dos estudantes em expor, em seus mapas, aspectos
da Aplicação da Derivada possa estar relacionado a uma compreensão limitada
sobre o conteúdo matemático, uma vez que a superficialidade em relação à Derivada
foi demonstrada em diferentes MCIs considerados para os enfoques Regras de
Derivação e Conceito da Derivada, confirmado também, por relatos obtidos nas
abordagens 1 e 2. Contudo, não se pode excluir a possibilidade da limitação de
alguns sujeitos na tarefa de elaboração de mapas, nessa direção, pesquisas futuras
que não considerem apenas uma única versão dos mapas (considerou-se apenas os
MCIs) pode ser um importante mecanismo de investigação e de confirmação de
alguns dos aspectos levantados nesta pesquisa. Admite-se, também, que a maior
escassez nos mapas para aspectos da Aplicação da Derivada esteja também
relacionada ao pouco tempo disponibilizado para essa abordagem em aulas de
Cálculo 1, uma vez que esse enfoque é comumente trabalhado em aulas finais
dessa disciplina, um período conturbado em que muitos estudantes estão muito mais
preocupados com os resultados finais na disciplina, do que com o conhecimento em
construção.
5.4.1 A análise para Aplicação de Derivada
Destaca-se, a partir do Quadro 12, o curso de LF com o maior percentual de
MCIs com aspectos para Aplicação da Derivada em relação aos cursos investigados.
Da LF, 2 dos 3 MCIs considerados apontaram para Aplicação da Derivada, tendo
apontado também para Conceito da Derivada, e 1 MCI para Regra e Conceito da
Derivada, além da referência à Aplicação.
179
Embora seja possível expressar o aspecto quantitativo, os mapas computados
para o curso de LF no enfoque Aplicação da Derivada foram bastante incipientes.
Em um desses mapas estruturalmente radial e linear LF005/MCI (Figura 20) se
encontra a proposição “Taxas relacionadas → encontra-se → Volumes e Áreas”. O
mapeamento em questão foi considerado no agrupamento III, contudo, a
exteriorização apresentada sinaliza que esse estudante possa ter passado por um
processo em que o estudo do tema Taxas Relacionadas tenha sido explorado por
meio de exemplos. Este estudante mencionou, em seus relatos às abordagens 1 e 2,
que cursou duas vezes a disciplina de Cálculo 1, e que foi aprovado com
desempenho “não muito bom”, saindo da disciplina com grandes dificuldades em
Limite e Derivada, e que passou por uma aprendizagem mecânica direcionada a
fazer provas.
Figura 20 – (LF005/MCI)
Este mapeador exteriorizou em seu mapa o que julga encontrar ao resolver
problemas com taxa relacionada – a proposição destacada em questão aponta com
relativa clareza semântica para essa compreensão de análise. Dessa forma, intui-se
também que a ideia de computar a taxa de variação de uma grandeza em termos de
180
uma taxa de variação de outra grandeza mais facilmente medida, para assim achar a
equação que relacione tais grandezas e então diferenciar, deva estar distante da
relação feita por esse estudante.
Nesse sentido, Vieira (2013) apresenta os resultados da pesquisa de Cabral
(1988), em que a pesquisadora focaliza, para um universo de respostas de
estudantes a problemas com taxas relacionadas, quatro níveis de significação: o
aritmético, o algébrico, o funcional e o diferencial, determinando entre eles, uma
hierarquia epistemológica, sendo os dois primeiro níveis os mais comuns. Para
Cabral (1998, apud VIEIRA, 2013, p. 37), “os alunos não conseguem verificar as
quantidades variáveis envolvidas tampouco a relação entre elas”, não sendo
possível assim a quantificação do processo de variação de uma grandeza em
relação à outra.
De outro modo, LM034/MCI49 expõe em seu mapeamento que “Derivadas →
podem ser → usadas na Física”. Em seguida a essa proposição que é apropriada,
busca uma relação entre os conceitos usadas na Física e os conceitos: velocidade,
aceleração e arranco; tomando como termos de ligação as expressões: calculando a
1ª Derivada; calculando a 2ª Derivada e calculando a 3ª Derivada, respectivamente.
No entanto, não faz qualquer referência à função que deve ser diferenciada uma,
duas ou três vezes. Acredita-se que esse estudante saiba tratar-se da função
posição, porém, não expõe isso em seu mapa.
Nessa direção, LM012/MCI50 também sugere as expressões: velocidade,
aceleração e arranco como exemplos de variação instantânea da função.
Novamente não faz nenhuma relação com a função posição. Outros MCIs apontam o
uso da Derivada na Física para achar a velocidade e a aceleração, porém apenas
mencionam a aplicação, tais como: EQ048/MCI com a proposição “Física → para →
achar a velocidade e aceleração”, e EC009/MCI, com “Derivada → serve para →
Aplicações físicas”. Nessa direção, destaca-se que EQ045/MCI (Figura 21) em um
49 Ver MCI (Figura 19) no item 5.3.1 deste Capítulo. 50 Ver MCI (Figura 18) no item 5.3.1 deste Capítulo.
181
mapeamento linear arrisca em uma tentativa de ligação cruzada51, para expor a
utilidade da Derivada no cálculo de velocidades e acelerações.
Figura 21 – (EQ045/MCI)
Nesse contexto, que para fins de análise foram contados no agrupamento II,
verificou-se que à menção à Física, está muito mais presente do que se comparada
a exemplos da Economia, Biologia, ou outras áreas do conhecimento para as quais
os problemas com interpretações firmadas a partir de taxas de variação também
podem ser facilmente resolvidos com o cálculo de uma Derivada. No entanto, a
Física ocupa um papel de destaque. Nesse sentido, admite-se que o estudante de
Cálculo 1, em geral, também é estudante de Física 1, e desse modo, pode haver a
51 Ligações cruzadas são importantes ferramentas auxiliaresna identificação de como um conceito em um domínio de conhecimento se relaciona a outro em outro domínio de conhecimento (NOVAK; CAÑAS, 2010, p.10).
182
maior relação entre esses contextos, pois o estudo da Derivada que é teorizado em
uma disciplina é concomitantemente aplicado em outra. O apelo interdisciplinar
parece, nessa direção, fortalecer o aspecto dialógico dos modos Eu-Isso e Eu-Tu
(BUBER, 2009), pois na duração desse momento de relação entre o sujeito e o
objeto pode ocorrer também a relação entre o sujeito e o próprio sujeito, uma
ressignificação por meio da qual, imediatamente, o sujeito é capaz de relacionar o
conteúdo a prática, vendo um sentido, um significado. Assim, pode-se inferir que
situações em que aplicações sejam concomitantes à teoria sejam positivas para a
experiência dos sujeitos (LARROSA, 2002, 2011).
Portanto, esses estudantes têm lembranças de que as Derivadas podem ser
aplicáveis à Física, e nesse sentido constroem significações para esse
conhecimento; no entanto, seus mapas foram elementares, incompletos,
inconclusos, como os são, os sujeitos da experiência, pois na experiência são
submetidos a constantes descobertas.
Já EP004/MCI (Figura 22) em seu mapeamento com estrutura radial e linear
menciona em proposição apropriada que na Física, a “Equação da posição →
derivando → Equação da velocidade”. Este mapeador se utilizou de muitas frases
completas dentro das caixas e de poucas proposições, indicando que possa ter
limitação para a elaboração de “bons mapas”52; porém seu mapa demonstra uma
relação mais bem elaborada com o contexto matemático da Derivada.
Este mapeador recorreu a uma lista de conceitos antes de fazer sua
representação. Priorizou regras e aplicações. Mencionou a aplicação na Física,
conforme proposição em destaque, e destacou também um exemplo de problema de
otimização, sendo, por isso, seu mapa computado nos agrupamentos II e IV. Esse
estudante cursou Cálculo 1 uma única vez, e seu desempenho não foi excepcional,
segundo seus relatos obteve os melhores resultados na disciplina de Cálculo 1 em
questões para calcular limites de funções usando a Regra de L’Hospital.
Em relação ao exemplo apontado por este mapeador, cabe destacar a
linearidade em “Derivadas → aplicando → encontra-se o máximo e o mínimo”.
52 Neste estudo não se priorizou a elaboração de bons mapas, mas aos mapas elaborados uma única vez pelos sujeitos, que se convencionou chamar de mapas conceituais iniciais.
183
Nesse sentido, esta proposição pode indicar apenas que o estudante reconhece que
existem problemas com máximo – “armazene o máximo” e; mínimo – “usando o
mínimo de material”; no entanto, com um olhar um pouco mais ampliado sobre o
mapeamento se verifica que exterioriza também, que tal fato ocorre como
decorrência da aplicação da Derivada. Assim, a ingenuidade pensada para o uso do
exemplo deve ser retirada, pois embora apresente um mapa ainda inconsistente,
este sujeito expõe aspectos de sua experiência em aulas de Cálculo 1.
Figura 22 – (EP004/MCI)
184
Destaca-se também o mapeamento de ER007/MCI (Figura 23) em que as
relações do sujeito com o objeto parecem mais explícitas. Esse mapeador também
representa a Derivada como uma aplicação usada na Física para o cálculo da
velocidade e da aceleração. Contudo, identificam-se algumas ligações cruzadas que
convergem para aspectos apontados nas abordagens 1 e 2 desta pesquisa. ER007
ingressou na universidade em 2012 e cursou com aprovação Cálculo 1 em seu
primeiro semestre na instituição.
Figura 23 – (ER007/MCI)
185
Em seu MCI, (ER007) expõe que “Funções – é a maior dificuldade →
Matemática Básica”, a única proposição em que coloca um sentido. No topo do
mapa, destaca que o cálculo da Derivada está diretamente relacionado com a
Matemática Básica. Desse modo, entende-se que o sujeito parece querer enfatizar a
relação onipresente da formação básica com a disciplina de Cálculo 1. A
dialogicidade presente na relação desse sujeito com aspectos da formação básica
assenta a importância dessa formação para a compreensão da Derivada.
Contudo, pondera-se que a formação obtida na educação básica não deve ser
entendida como um empecilho para o desenvolvimento dos estudantes em aulas de
Cálculo 1, tampouco para a compreensão da Derivada, pois embora seja um grande
dificultador desse processo, mecanismos que incluem as corresponsabilizações dos
sujeitos da experiência em aulas de Cálculo 1 devem ser priorizados a fim de que
sejam vencidas as defasagens decorrentes de processos de formação deficientes.
Em outro mapeamento, EQ041/MCI (Figura 24) destaca a clareza da
representação. Esse mapeador ingressou na universidade em 2010, e cursou pela
segunda vez a disciplina de Cálculo 1 em 2012, devido ao período em que optou
pelo trancamento de matrícula. Em seus relatos para as abordagens 1 e 2
mencionou que o conteúdo da disciplina de Cálculo 1 requer prática de exercícios.
186
Figura 24 – (EQ041/MCI)
Esse estudante exterioriza em seu MCI que Derivadas de funções determinam
pontos críticos e taxas de variação, e ajudam em problemas práticos de taxas
relacionadas, das quais também resultam retas tangentes à curva, sendo a sua
Derivada obtida pela fórmula apresentada como uma taxa de variação instantânea,
em que ∆x representa uma pequena variação em x, próximo de xo. O mapeamento
em questão apresenta clareza semântica para a interpretação acima, assim como,
aponta para uma direção de leitura, pois apresenta uma estrutura hierarquicamente
organizada com elementos de diferenciação progressiva. Este mapeamento inicial
deixa clara a compreensão do sujeito também no contexto matemático da Derivada,
pois para os conceitos que utiliza, faz relações, utilizando-se de termos de ligação na
sua maioria apropriados, o que demonstra a segurança com as representações
exteriorizadas. No aspecto computado para o enfoque Aplicação da Derivada este
MCI se enquadrou nos agrupamentos III e IV devido a relação dada entre taxa de
187
variação e taxa relacionada, e também por mencionar pontos críticos como
decorrência de Derivadas de funções. Contudo, tal mapeamento não permite, por
exemplo, verificar a real compreensão do sujeito em relação ao ponto crítico. Ponto
crítico ou estacionário pode ser entendido como um ponto do domínio de uma função
onde a primeira Derivada é nula, e essa informação não foi explicitada por
EQ041/MCI. Assim como, não há indícios se o mapeador reconhece que pontos
críticos são sempre pontos de máximo ou de mínimo relativos, ou pontos de inflexão,
este último não significando que a primeira Derivada seja nula.
Nesse sentido, da mesma forma que não se pode ter a real noção da
compreensão desse sujeito no que se refere ao conhecimento relacionado à
Derivada, não há também a real medida de sua experiência; assim como, não pode
ser dimensionada para os demais sujeitos por meio de seus mapeamentos iniciais
submetidos a esta análise. Sabe-se, contudo, que a experiência ocorre, pois as
marcas que expressam em seus MCIs remetem para essa percepção. Algumas
dessas marcas, no entanto, podem ser provisórias – mecanismos decorados são
descartados se entram em desuso. Mas algumas marcas são definitivas, e essas,
mesmo que passem por vários outros processos de aprendizagem tendem apenas a
firmar-se cada vez mais.
Ao final deste capítulo, tem-se como certeza apenas que as subjetividades
permaneceram sempre presentes ao longo desse processo de análise; análise essa
que se percebeu, assim como os MCIs, ser inconclusa, incompleta, inacabada.
Limitou-se, portanto, a apresentar alguns mapas que aqui foram destacados, pois
englobar todos os mapas considerados seria quase impossível aos prazos e
limitações desta pesquisa. Desse modo, também se recorreu a escolhas, por meio
das quais se apegou aos mapas que por algum sentido foram mais representativos,
contudo, tem-se clareza que essas escolhas podem ter encoberto outras
possibilidades de investigação. Assim, conclui-se esta etapa levada pela
colaboração de Paulo Freire acerca do que é puramente uma manifestação humana.
Na verdade, diferentemente dos outros animais, que são apenas inacabados, mas não históricos, os homens se sabem inacabados. Têm consciência de sua inconclusão. Aí se encontram as raízes da educação mesma, como manifestação exclusivamente humana (FREIRE, 1987, p. 41).
188
Nesse sentido, acredita-se que a valorização da relação dialógica que leve a
situações de consciência da inconclusão permanente na relação professor-Derivada-
estudante seja imprescindível para conduzir os estudantes às escolhas pessoais e
fundamentais para a autêntica construção do conhecimento, ou seja, para conduzir
os estudantes à experiência particular em relação ao conhecimento novo
possibilitado em aulas de Cálculo 1.
No próximo capítulo, apresentam-se as conjecturas e considerações acerca
dos resultados obtidos em virtude da conclusão da presente pesquisa.
189
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pretende-se apresentar algumas considerações e conjecturas a respeito da
pesquisa realizada que se iniciou a partir da lógica de uma problemática que parece
firmar-se sobre a construção do conhecimento em aulas de Cálculo Diferencial e
Integral 1. Problemática essa corroborada pelos estudos de Rezende (2003), Traldi
(2006), Dall’Anese (2006), Vieira (2013), além de outros, importantes à justificativa e
ao desenvolvimento desta pesquisa.
Diante de tal problemática, buscou-se responder, “O que estudantes revelam
sobre o estudo do conteúdo Derivada na disciplina de Cálculo 1 e sobre suas
experiências nesta disciplina”.
Embasaram teoricamente esta pesquisa, as contribuições de Buber (2009)
acerca da relação dialógica, representada pelos modos fenomenológico da
existência humana, o modo do Eu-Tu, e o modo coisificado, reflexivo, da atitude Eu-
Isso, ou seja, os modos da relação inter humana; as contribuições de Bauman e May
(2010) acerca dos limites das escolhas ocorridas nas interações humanas e as
contribuições de Larrosa (2002, 2011) sobre a experiência. Os sujeitos da
experiência nesse encontro dialógico, impõem-se em uma relação singular, particular
e intransferível, em meio a qual se consolidam aspectos que envolvem a construção
do conhecimento em aulas de Cálculo 1.
A experiência, embora livre, tem sentidos. Cada sujeito da experiência,
exposto neste estudo, deixou revelar dimensões da dialogicidade ocorrida em aulas
de Cálculo 1. Dessa forma, conjecturam-se algumas dessas dimensões ou sentidos
da experiência.
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Presume-se, em primeiro momento, que um meio para que ocorra uma
passagem com sentido53 pelo Cálculo 1 possa estar na interação dos elementos da
relação dialógica.
Na interação, ocorre um processo de inter-relação, ou seja, uma relação
mútua entre dois ou mais elementos, onde a existência de um implica na existência
do outro. Nesse caso, entende-se que a interação entre dois ou mais elementos,
implica que um elemento prescinde do outro para ter sentido, significado. Parece
ambíguo, mas em um processo em que não se permite a exclusão do outro, os
conteúdos se postos aqui como elementos de uma relação dialógica seriam, então,
dependentes entre si, como se estivessem interligados, metaforicamente, como os
órgãos em um corpo humano, ou como os fios em uma rede, entrelaçados,
enredados e integrados.
No entanto, seria ingênuo admitir que a problemática que se coloca acerca da
passagem dos estudantes pelo Cálculo 1 estaria restrita à interação entre os
conteúdos a que são submetidos os sujeitos da experiência. E é nesse entendimento
que se conjectura um dos sentidos da experiência em Cálculo 1, a reciprocidade.
A reciprocidade é um dos princípios para que a experiência dos sujeitos em
Cálculo 1 ocorra em relação à apropriação do conhecimento novo, ou aquele que
modifica e que advém desse estudo. Assim, não se imagina a interação restrita a
conteúdos; mas sim é preciso buscar a interação que engloba conteúdos e os
sujeitos da experiência como elementos dessa inter-relação. E nesse sentido,
evidencia-se um dos modos de ser da existência humana, apontados por Buber, o
modo Eu-Isso de ser. Mas, esse é o modo da coisificação, do relacionamento entre
sujeito e objeto, e nesse modo não cabe à experiência, pois essa prescinde da
transformação. E a transformação prescinde do modo Eu-Tu, como possibilidade,
relação é reciprocidade.
Desse modo, Eu e Tu se envolvem em uma esfera compartilhada de ação e
de produção de sentido, ou seja, de diálogo. Assim, sujeitos e objetos formam entre
si um processo de interação compreendida em uma relação de reciprocidade e de
53 Trata-se de como se dá sentido ao que se é e ao que acontece, de como se correlacionam as palavras e as coisas, de como são nomeados o que se vê ou o que se sente, e de como se vê e sente aquilo que se nomeia, conforme retrata Larrosa (2011).
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complementaridade para o sujeito, pois o objeto-conteúdo é o que se pretende
conhecer e o sujeito não existe sem o objeto a ser conhecido, assim como o objeto
não é conhecido sem o sujeito. É nessa interação onde a reciprocidade está
presente que tem sentido à experiência.
No relacionamento recíproco, para Bauman e May (2010, p. 60), embora cada
lado da interação seja assimétrico, “ao longo de períodos abrangentes, as ações de
ambos os lados se contrabalançam, porque cada um tem a oferecer algo de que o
outro lado precisa”. A reciprocidade é a marca definitiva da atualização do fenômeno
da relação, segundo Buber (2009), onde é possível a aceitação e a confirmação
ontológica dos dois pólos envolvidos no evento da relação.
Mas, algo mais pode dificultar a “passagem” pelo Cálculo 1, e impossibilitar
que, nesse encontro com o conhecimento novo, seja pelo caráter psicológico,
didático ou epistemológico, transformações relevantes para a construção do
conhecimento ocorram. Algo mais parece limitar o sujeito da experiência de ir além
de sua forma atual, de transformar-se, ou seja, de alterar ou ampliar a forma de sua
compreensão em decorrência do encontro com o conhecimento novo possibilitado
em aulas de Cálculo 1. Contudo, alguma transformação sempre acontece.
Embora ocorram transformações, não há como medir a experiência que
transforma e deixa marcas. Nem como assegurar que de fato tenha ocorrido. Muito
menos há como comparar níveis da experiência dos sujeitos da experiência, em
aulas de Cálculo 1, ou fora delas. A incomensurabilidade da experiência diz respeito
a sua particularidade, característica ou condição de que não se pode medir uma
experiência se comparada a outra experiência. Nessa direção, não há possibilidade
de arrazoamentos, pois cada sujeito da experiência em Cálculo 1 é único, assim
como singular é a experiência de cada um. Segundo Larrosa (2011), a singularidade,
assim como a pluralidade, são também princípios da experiência. Assim, conjectura-
se a unicidade como outro sentido da experiência em relação ao conhecimento novo
propiciado em aulas de Cálculo 1.
A unicidade da experiência em aulas de Cálculo 1 tem relação com a
subjetividade e identidade dos sujeitos ao passar por uma experiência, e como tal
não pode ser medida, ou comparada, pois não apresenta parâmetros que possam
192
ser considerados válidos para esse fim. Mesmo porque, não se trata de um
experimento, mas sim da experiência.
Dessa forma, os sujeitos, repletos de suas subjetividades, têm sua
experiência ou não com o conhecimento novo em aulas de Cálculo 1, e não há
aparato, ou dispositivo, ou indicador que possa medir esse índice. Ou seja, não
existe um experiencímetro54. Nem mesmo se espera que seja criado. Não
funcionaria tal instrumento, pois suas limitações seriam inúmeras em vista das
infinitas possibilidades de manifestação da experiência dos sujeitos, mesmo quando
considerados apenas os aspectos matemáticos da dimensão do Cálculo 1, pois a
incomensurabilidade da experiência não significa incomunicabilidade.
Conforme propõe Larrosa (2011, p. 15), a possibilidade da experiência supõe
“a suspensão de qualquer posição genérica” e, nesse sentido, não há como prever
as experiências que farão os sujeitos em aulas de Cálculo 1. Não há como fazer
generalizações, assim, outro sentido da experiência é a imprevisibilidade.
A imprevisibilidade da experiência em aulas de Cálculo 1 impede dizer quais
experiências ocorrerão ao final de uma aula, por exemplo, sobre Derivada. Portanto,
propor objetivos, e definir um plano de ação para esses objetivos, não significa que
um alvo mirado seja o alcançado. Contudo, podem acertar outros alvos, dessa forma
os planos podem prever possibilidades. A imprevisibilidade da experiência em aulas
de Cálculo 1 expõe uma relação de incertezas e possibilidades, e exige a
criatividade dos membros dessa comunidade de experiência, que pode constituir-se
por estudantes de Cálculo 1, ou professores de Cálculo 1, ou ambos.
Presume-se que estudantes em aulas de Cálculo 1 definam uma comunidade
de experiência. Comunidades de experiência são comunidades plurais, que não se
definem pelo que os indivíduos têm em comum, pois a única coisa que compartilham
é o espaço onde vivenciam suas experiências que são únicas, singulares
(LARROSA, 2011). Ainda, o saber da experiência é um saber particular, subjetivo,
relativo, pessoal – duas pessoas, embora enfrentem o mesmo acontecimento, não
54 Essa palavra foi pensada para designar um instrumento capaz de medir a experiência, ou seja, um instrumento que não existe, logo, tal palavra também não existe. Não foram encontrados registros dessa palavra em dicionário formal da língua portuguesa, portanto, apropriou-se do termo para representar o instrumento impossível.
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necessariamente fazem a mesma experiência. Nesse sentido, há para Bauman e
May (2010, p. 79) comunidades em que se mantêm pessoas reunidas com a
finalidade específica de realizar tarefas, “a finalidade é limitada, o controle sobre o
tempo, a atenção e a disciplina de seus membros também podem ser restringidos”, e
a “autolimitação talvez seja a característica mais explícita e definitiva desse tipo de
comunidade”. Esse tipo de comunidade parece absorver apenas parcialmente as
pessoas. E, diante dessa condição parcial, a experiência exige a criatividade dos
sujeitos.
A criatividade é desse modo, um desdobramento da imprevisibilidade da
experiência. A experiência em aulas de Cálculo 1 exige uma ação criativa. Não só de
professores de Cálculo 1, que também são sujeitos da experiência nesses espaços,
mas também dos estudantes. O estudante criativo em aulas de Cálculo 1 é o sujeito
aberto ao novo, portanto, é aquele que faz descobertas, que é curioso, que é crítico
em relação aos significados dos processos de conhecer, e que busca sempre pelas
melhores formas de dialogicidade com outros sujeitos, consigo mesmo e com os
objetos que pretende conhecer. É o sujeito corresponsável, que também faz
escolhas, toma decisões diante de sua participação no evento dialógico. A
criatividade é essencial à experiência, pois subjaz a descoberta, o encontro com o
imprevisível, quando mesmo sob condições nem sempre favoráveis, o sujeito da
experiência se arrisca. Sujeitos criativos se arriscam. Sujeitos da experiência são
criativos.
Complementa-se que o saber da experiência tem características essenciais,
trata-se de um saber finito, ligado ao amadurecimento de um indivíduo particular,
revelador da própria finitude humana, e, portanto temporal. Desse modo, outro
sentido da experiência em aulas de Cálculo 1 é a temporalidade.
A temporalidade da experiência em aulas de Cálculo 1 implica a existência e o
reconhecimento de tempos e espaços diferentes para cada sujeito da experiência,
mesmo que tenham sido expostos aos mesmos estímulos e as mesmas situações
em sua comunidade de experiência. Assim, buscar consolidar transformações dos
sujeitos da experiência significa ter em mente que nesse processo, a seu tempo,
cada sujeito da experiência passa por transformações singulares de acordo com a
experiência particular de cada um. Não há processo que garanta que, em findado um
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determinado tempo/espaço, sujeitos da experiência estariam atravessados pelas
mesmas experiências, ou sequer há garantias de que passarão por qualquer
experiência. Acrescenta-se que nada se pode garantir e nada se pode aprender da
experiência do outro, a menos que essa experiência seja de algum modo, revivida. O
saber da experiência não está, como o conhecimento científico, fora do sujeito da
experiência. O saber da experiência não está no objeto, mas no próprio sujeito da
experiência. Assim, cada sujeito há seu tempo é tomado pelos acontecimentos
relevantes do encontro dialógico a acontecer em aulas de Cálculo 1, e desse modo,
de posse do acontecido, são capazes de narrar ou exibir algumas marcas
decorrentes dessa passagem.
A partir dessas conjecturas iniciais, assentam-se sentidos da experiência em
aulas de Cálculo 1 declarados como reciprocidade, unicidade, imprevisibilidade e
temporalidade, e alguns desdobramentos desses sentidos, como a
corresponsabilidade, complementaridade e a criatividade dos sujeitos da
experiência. E diante dessas possibilidades da experiência, dá-se prosseguimento
às considerações resultantes desta investigação, que são incompletas e parciais.
Concorda-se com a possibilidade de que a dificuldade dos estudantes frente à
disciplina de Cálculo 1 esteja também posta na Matemática em si; mas não em um
conteúdo específico, como por exemplo, em um aspecto estudado no Ensino Médio,
ou em decorrência de uma modalidade anterior a sua primeira etapa como estudante
do Cálculo 1. Assim como se entende, que ações pontuais, a fim de resolver um, ou
outro foco específico da problemática posta frente à disciplina de Cálculo 1, não
sejam suficientes se não for uma atitude assumida e coordenada coletivamente, ou
seja, aquela que prescinde de corresponsabilidades dos sujeitos.
Embora este estudo mirasse os estudantes de Cálculo 1, estende-se a
corresponsabilidade à abrangência para os sujeitos da relação dialógica nos
processos de ensino e/ou aprendizagem de Cálculo 1. Dessa forma, são sujeitos
dessa corresponsabilidade: professores, instituições formadoras, estudantes e o
próprio Cálculo 1; esse último, cabe distinguir, em face da sua estrutura curricular e
epistemológica.
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O cenário de pesquisa não se limitou ao Cálculo 1, ou a Derivada, mas contou
com elementos de uma relação genuinamente dialógica, que compreende interações
que permitem ao estudante, o sujeito da experiência, quando revive o processo de
construção de seu conhecimento, ao narrar-se, ou ao construir os seus mapas
conceituais; revelar marcas de sua passagem e experiência nessa construção.
A partir da primeira etapa de análise, tem-se uma constatação, sujeitos da
experiência parecem muitas vezes contraditórios, imprecisos, partem de
contrassensos, todavia exteriorizam suas impressões mais particulares. Nesse
processo de análise dos relatos, vários pontos chamaram atenção, justamente pelo
aspecto que se colocava como contraditório, que não necessariamente significou
uma contradição. Em muitos momentos exibiam aspectos de complementaridade.
Os pontos mais fortemente mencionados nos relatos dos estudantes quando
solicitados a comentar sobre a disciplina de Cálculo 1 ou sobre seu desempenho
nessa disciplina, não foram, necessariamente, aspectos específicos dessa disciplina,
mas sim dizem respeito à formação básica dos estudantes e a seus professores de
Cálculo 1.
Não houve um consenso entre os sujeitos. Estudantes com uma base “mais
fraca” em Matemática decorrente de um Ensino Médio talvez insuficiente, ou mal
aproveitado, mostraram resultados positivos (aprovações) e negativos (reprovações)
alcançados ao longo da disciplina. Assim, o sucesso no resultado não é um privilégio
apenas do estudante “bem formado”. Porém, concorda-se plenamente que uma base
bem conduzida ao longo de todas as etapas de formação básica dos estudantes
seria a principal e talvez a única possibilidade para atingir-se uma educação de
qualidade em nível superior de ensino, e consequentemente, uma formação plena
capaz de realmente preparar os sujeitos em formação para os desafios da
contemporaneidade. No entanto, acredita-se que a dificuldade dos estudantes não
se estabeleça simplesmente pela defasagem de conteúdos. Pois dessa forma,
bastariam encontrar os tópicos da Matemática básica que se apresentam como
barreiras à compreensão de conteúdos da Matemática superior e propor situações
que assegurem essa compreensão. Muitos outros obstáculos devem estar
solidificados nesse percurso, e não se constituíram apenas em razão da qualidade
do Ensino Médio ou da formação básica dos sujeitos. Assim, atitudes que levem à
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superação dos obstáculos que se colocam aos processos formativos devem ser
incentivadas. São obstáculos epistemológicos, mas também os de natureza
histórica, social, cultural, que dividem o cenário político das transformações
educacionais no Brasil ao longo de décadas. Ou seja, pontos para novas
investigações, e dos quais não se tem no momento nada a dizer.
Outro ponto importante se refere à menção de muitos estudantes em buscar
por si próprios, alternativas para suprirem suas defasagens em Matemática. Alguns
estudantes demonstraram que por meio de suas capacidades criativas contribuíram
em favor de sua auto adaptação. Nesse sentido, tem-se novamente um sujeito
corresponsável. Porém, muitos dos estudantes apresentaram suas justificativas e
fugas do problema. Evidencia-se assim, um processo particular de escolhas e de
fatores limitadores dessas escolhas, ou seja, são razões puramente sociológicas
impostas aos indivíduos quando tomam decisões, quando fazem suas escolhas.
O professor de Cálculo 1 foi apontado por alguns sujeitos investigados como o
único responsável pelo fracasso dos estudantes nessa disciplina, embora evidências
do contrário também pudessem ser asseguradas, ainda que observadas em uma
parcela menor. Conjectura-se que a ausência de corresponsabilidade dos sujeitos
esteja na base da manifestação que responsabiliza unicamente o professor por uma
ou outra condição. Ainda, em vários momentos, professores foram classificados
como bons ou ruins, de acordo com suas práticas, embora não tenha se assegurado
um ponto em comum, pois para alguns, o que significou ser “bom” não
necessariamente o foi para outros. Desse modo, conjectura-se que pode não existir
um bom método, ou uma boa forma de dar uma aula de Cálculo 1. Nessa direção,
devem-se explorar diferentes métodos, ou seja, optar por variadas formas de
conduzir os processos de experiência em aulas de Cálculo 1, pois cada estudante
reage de uma forma única, que é inidentificável e imprevisível ao professor.
Outro ponto relevante diz respeito à Instituição formadora, conjectura-se que
sua parcela nesse processo de corresponsabilidades deve ser levada por
mecanismos de transparência e de comunicação. Além de garantir elementos de
participação ativa dos processos organizacionais com vistas a possibilidades e não a
mecanismos atravancadores e burocráticos que em nada colaboram para a
finalidade pedagógica. É papel da Instituição também contribuir nessa
197
corresponsabilidade para que ao longo dos processos formadores os estudantes se
tornem mais bem preparados e familiarizados à estrutura institucional e inclusive
sejam orientados no que se refere aos aspectos pessoais que também envolvem a
permanência com sucesso desses estudantes na Instituição e na cadeira de Cálculo
1, evitando-se que os hiatos de compreensão que se instalam entre grupos, sejam
preenchidos por suposições estereotípicas.
Finaliza-se essa parte com o ponto referente ao Cálculo 1 propriamente dito,
pois os sujeitos da experiência se colocam, em sua maioria, inseguros diante desse
objeto. Diante do Cálculo 1 os sujeitos sentem medo, angústia, frustração,
insegurança, e entre outros sentimentos negativos, são reprovados na disciplina. Um
número bem menor, de “privilegiados”, passa exatamente pelo oposto do
mencionado. Então, tem-se uma mesma situação, uma mesma disciplina e pelo
menos duas possibilidades de experiência bem delineadas. O que autoriza
considerar que estudantes de condições distintas possam passar por um mesmo tipo
de experiência, e que estudantes com condições similares possam passar por
experiências distintas. E vice versa, pois a experiência é imprevisível, e
surpreendente.
Infere-se, ainda, acerca do sentimento auto motivador relacionado a uma
aprovação em Cálculo 1, ou desmotivador quando ocorrido o contrário, e quanto
esses sentimentos influenciam a posição dos sujeitos quando se dirigem à própria
formação básica, ou a seus professores de Cálculo 1. O reconhecimento de uma
realidade oposta daquela que parece óbvia também esteve presente. Assim,
conjectura-se em razão da temporalidade da experiência em Cálculo 1, em vista do
“estar pronto”, da maturidade de cada sujeito que, a seu tempo, revelam que a
reprovação não pode ser essencialmente vista como algo negativo. A reprovação,
dessa forma, para alguns estudantes está na base de um processo de
amadurecimento, e não se restringe a algo negativo ou angustiante. A reprovação é
em si uma experiência e como tal deixa suas marcas e até marcas positivas de
superações posteriores.
Desse ponto em diante, pretende-se rever aspectos da análise realizada em
segundo momento em virtude dos Mapas Conceituais Iniciais elaborados pelos
sujeitos da experiência.
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Presume-se a exposição ou a exteriorização de representações dos sujeitos
da experiência acerca da ideia que têm sobre Derivada, um tópico estudado na fase
final da disciplina de Cálculo 1. Acredita-se que os sujeitos da experiência revelaram
os aspectos mais essenciais e elementares presentes na construção desse
conhecimento e que essas possam ter sido as marcas deixadas por esse estudo, em
particular. Esses expõem, também, um processo dialógico, essencialmente subjetivo
do relacionamento que se constituiu entre o sujeito e a Derivada.
Os sujeitos da experiência exibem um processo individual de escolhas.
Independentemente das escolhas realizadas institucionalmente acerca do caminho
de construção do conhecimento do objeto em estudo, indivíduos, que são os sujeitos
da experiência, optam pelas melhores formas para si, de se expressarem; e revelam
suas impressões mais pertinentes acerca do que sabem sobre a Derivada. Por
vezes são incipientes. Em outras são limitados. E em outras são mais gerais. Jamais
são completos, talvez por ser uma das características do humano, a incompletude.
Contudo, mesmo diante da incompletude e das incertezas, fazem escolhas e se
arriscam.
Por meio dos MCIs analisados, verifica-se opções, ou escolhas por caminhos
conscientes de elaboração dos mapas, no entanto, há desistências, como se
encontrassem o imprevisível, o inesperado. E, nesses casos, fazem novas escolhas.
Presume-se que o alcance dessas escolhas se deva muito mais por suas limitações
pessoais diante do conteúdo da Derivada, do que de sua insegurança diante da
elaboração de mapas conceituais.
Um ponto ficou evidente, independente da relação do sujeito com sua
formação básica, com o seu professor de Cálculo 1, com a Instituição em que está
em formação, ou com a própria Derivada, sujeitos da experiência exteriorizam
aspectos de superficialidade em seus MCIs. Não houve a explicitação de um
aprofundamento nos mapas, embora alguns mapas expusessem mais relações entre
os conceitos, além de um número maior de conceitos e de termos de ligação
apropriados; ainda assim, não existiu aprofundamento significativo em termos de
Regras, Conceitos ou Aplicações da Derivada nos agrupamentos investigados. A
superficialidade parece ter sido a marca mais evidente.
199
Conjectura-se, assim, que a experiência dos sujeitos em face da Derivada
possa estar, consolidando-se a partir do que é mais simples, indicando que a forma
superficial possa constituir o início desse processo de construção do conhecimento.
Precisam-se alcançar meios para experiências mais densas e significativas aos
sujeitos da experiência.
Desse modo, a experiência pode estar limitada às marcas mais elementares
das Regras básicas de Derivação, assim como a algum entendimento acerca da
ideia da Derivada como inclinação de uma reta tangente a uma curva em um ponto,
ou a que por meio da Derivada se pode encontrar, por exemplo, a aceleração se
conhecida a velocidade de uma partícula. Obviamente, essas “marcas” não são as
únicas pretensões de instituições formadoras e de seus representantes, muito
menos devem desejar uma formação superficial os estudantes dos cursos
investigados neste trabalho. Contudo, tais marcas são evidentes, e uma opção é
buscar formas de consolidar experiências mais intensas aos sujeitos da experiência.
Conjectura-se que para consolidarem-se experiências mais profundas há de se
respeitar as experiências mais elementares, pois essas parecem ser as primeiras
portas para as experiências mais densas desses sujeitos.
Dessa perspectiva, cabe uma reflexão acerca do evidenciado a partir das
Regras de Derivação. A simples coisificação do objeto poderia ser admitida,
sobretudo pela evidência de aspectos que possam levar a interpretação de uma
valorização de atividades mecânicas ou de repetição, como de incentivo à resolução
de exercícios. Também, em virtude do maior índice de Regras de Derivação na
apresentação dos MCIs, em relação aos aspectos Conceito ou Aplicação da
Derivada, pode-se admitir certa valorização das técnicas.
Para Buber (2009), o modo Eu-Isso significa o lugar da experimentação, do
conhecimento, da utilização, ou seja, o vínculo objetivante. Apesar disso, a
experiência somente faz sentido no modo Eu-Tu, pois neste modo, tem-se o
momento de vivência, de consciência fenomenológica, não teórica, mas dialógica.
Evidencia-se assim, que os sujeitos quando remetidos ao modo Eu-Isso, na simples
elaboração de um MCI sobre Derivada, se arriscam, tomam decisão, fazem suas
escolhas e, se encontram também na condição significante da relação Eu-Tu. Na
duração desta ação, Derivada é mais do que objeto. Na duração desta ação, para os
200
sujeitos da experiência, Regra de Derivação pode ser mais do que a simples
manipulação de técnicas.
Nesse sentido, os estudantes exteriorizam os conhecimentos construídos
acerca da Derivada com os quais têm maior segurança, como em geral o fazem
quando se pronunciam em sala de aula, quando os questionamentos muitas vezes
reafirmam aquilo que já sabem, ou quando sobre as reais e ou principais dúvidas,
preferem consultar um colega, ou um monitor. Não é diferente em aulas de Cálculo
1. Em geral, a verificação de que um grande número de estudantes tem dúvida em
determinado conteúdo se reflete no silêncio, na ausência do diálogo, do que em
perguntas. Portanto, se a relação que se apresenta por meio dos MCIs desses
sujeitos aponta a valorização das Técnicas de Derivação isso pode corroborar que
essa forma tenha sido realmente um dos passos mais simples para esses
estudantes.
Conjectura-se assim, que para alguns estudantes, o único caminho para de
fato passar por uma experiência em relação ao objeto Derivada seja por meio de
Regras de Derivação. Diante da simples atividade de “calcular uma Derivada”,
mesmo que pela aplicação de uma Regra de Derivação, o estudante precisa recorrer
a conceitos anteriormente construídos, e dessa forma faz uma “demonstração”,
demonstra para si. Mesmo que de uma forma mais simples, sem o rigor que pede
uma real demonstração matemática. Por exemplo, ao aplicar a Regra de Leibniz
para calcular uma Derivada compreende o uso dessa regra e não de outra para
determinado contexto, isso já é em si uma justificativa.
Nessa direção, Rezende (2003, p. 329) sinaliza que, ao focalizar o
macro/espaço sistematização/construção, deve-se “construir os campos de
significações dos resultados e ideias básicas do Cálculo para, num momento
posterior, buscar a sistematização desses elementos”.
Acredita-se, dessa forma, que o trabalho com as Técnicas de Derivação
possa e deva significar muito mais do que um espaço para resolução mecânica de
exercícios. Esse é um espaço que pode fortalecer uma maior interação entre o
sujeito e o objeto Derivada, em sua totalidade, e nesse sentido, deve ser explorado e
ser desenvolvido em um processo integrado de construção do conhecimento. Nesse
201
sentido, Regras de Derivação, Conceito de Derivada e Aplicação da Derivada devem
ser apresentadas por meio de uma relação dialógica, através da qual, objetos se
relacionam entre si, de forma integrada e coordenada.
Diante do exposto, é necessário aproveitar os diferentes caminhos de entrada
e de passagem e explorar as várias possibilidades para que o sujeito da experiência
possa crescer em seu conhecimento e possa ter experiências relevantes nessa
construção. Ainda assim, não será possível medir a real experiência de sujeitos da
experiência em aulas de Cálculo 1, contudo é possível admitir que vários caminhos
para a consolidação da experiência estarão abertos. Admite-se a provisoriedade de
algumas marcas nesse processo, mas também a efetividade de algumas
experiências.
Para Larrosa (2002), o sujeito da experiência é o espaço onde têm lugar os
acontecimentos; é o território de chegada ou o espaço do acontecer. É, portanto, o
espaço das incertezas, das escolhas, das dúvidas, mas também das decisões. O
sujeito da experiência é o sujeito exposto.
E nesse processo contribui novamente Paulo Freire (1996) pois sua
dialogicidade pareceu rondar cada página construída ao longo deste trabalho.
Assim, assume-se também como sujeito da experiência, um ser histórico e
socialmente constituído em um território de passagem e de alteridade.
Uma das tarefas mais importantes da prática educativo-crítica é propiciar as condições em que os educandos em relação uns com os outros e todos com o professor ou a professora ensaiam a experiência profunda de assumir-se. Assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque capaz de amar. Assumir-se como sujeito porque capaz de reconhecer-se como objeto. A assunção de nós mesmos não significa a exclusão dos outros. É a "outredade" do "não eu", ou do tu, que me faz assumir a radicalidade de meu eu (FREIRE, 1996, p. 23-24 – grifos do autor).
Assim, reconhece-se ao finalizar essas considerações e conjecturas, como
sujeito da experiência, um sujeito que também se arrisca, que faz escolhas e que se
expõe. Nenhuma certeza nessa passagem, apenas sensações surpreendentes,
geradoras de sentimentos e de constatações, algumas óbvias, e outras não tão
evidentes.
202
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206
APÊNDICE 1 – Instrumento de Coleta de Dados
1 – Perfil
Nome: _________________________________________________________
Ano de nascimento: ______________ Sexo:_____________Data: _________
Curso:_________________________________________ Período:_________
Ano de ingresso no curso: _________________________________________
Já cursou a disciplina de Cálculo 1?
sim ( ) não ( )
Quantas vezes: __________________________________________________
Quando: ________________________________________________________
Abordagem 1
Comente sobre a disciplina de Cálculo 1.
____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
207
Abordagem 2
Comente sobre seu desempenho na disciplina de Cálculo 1.
____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
208
Exemplo de Mapa Conceitual
Mapa conceitual sobre representação da estrutura de conhecimento necessária para a compreensão de por que existem as estações.
Fonte: Novak, 2010.
209
Abordagem 3
Desenhe um mapa conceitual sobre Derivadas de Função Real.
210
ANEXO I – Parecer Comitê de Ética
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE
CATÓLICA DE SÃO PAULO-
PUC/SP
PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP
DADOS DO PROJETO DE PESQUISA Título da Pesquisa:AS SUBJETIVIDADES NO DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS
MATEMÁTICAS DO FUTURO EDUCADOR MATEMÁTICO: O CASO DO ENSINO DE CÁLCULO EM CURSOS DE LICENCIATURA EM MATEMÁTICA
Pesquisador: Sonia Maria da Silva Junqueira Área Temática: Versão: 1
CAAE: 07999212.0.0000.5482 Instituição Proponente: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo-PUC/SP Patrocinador Principal: Financiamento Próprio
DADOS DO PARECER
Número do Parecer: 265.654 Data da Relatoria: 10/12/2012
Apresentação do Projeto: Trata-se de protocolo de pesquisa para elaboração de Tese de Doutorado no Programa de Estudos
Pós-Graduados em Educação Matemática (PEPG em EDM), vinculado à Faculdade de Ciências
Exatas e Tecnologia (FCET) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Projeto de pesquisa de autoria de Sonia Maria da Silva Junqueira, sob a orientação da Profa. Dra.
Ana Lúcia Manrique. O presente projeto tem como objetivo desenvolver investigação no campo das competências
matemáticas do futuro educador matemático e das relações dialógicas envolvidas na construção
dessas competências. A fundamentação teórica considera, principalmente, os estudos de Mogens
Niss sobre competências matemáticas, os aspectos relativos à relação dialógica de Martin Buber e a
relação social do ponto de vista de Bauman e May. Pretende-se, por meio deste trabalho, encontrar pontos de convergências a partir do ensino de
Cálculo Diferencial Integral e o desenvolvimento de competências matemáticas, e dessa forma,
verificar as competências matemáticas específicas desenvolvidas a partir do ensino dessa disciplina. Objetivo da Pesquisa: A pesquisa tem como objetivo primário a investigação no campo das competências matemáticas
Endereço: Rua Ministro Godói, 969 - sala 63 C Bairro: Perdizes CEP: 05.015-001 UF: SP Município: SAO PAULO
Telefone: (11)3670-8466 Fax: (11)3670-8466 E-mail: cometica@pucsp.br
211
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE
CATÓLICA DE SÃO PAULO-
PUC/SP
Continuação do Parecer: 265.654 do futuro educador matemático e das relações envolvidas na construção dessas competências.
Para isso, nosso plano de fundo será a disciplina Cálculo Diferencial e Integral, por meio da
qual, esperamos verificar como competências matemáticas são desenvolvidas a partir do
ensino dessa disciplina.
Avaliação dos Riscos e Benefícios: Não foram identificados possíveis riscos aqueles que vierem a participar da proposta. No que diz respeito aos benefícios, verificamos que não são diretos, todavia, é um estudo de
relevância e benefícios de cunho social. Comentários e Considerações sobre a Pesquisa: A exposição do Projeto é clara e objetiva, feita de maneira concisa e fundamentada, permitindo
concluir que o trabalho tem uma linha metodológica bem definida, na base do qual será
possível retirar conclusões consistentes e, portanto, válidas. Considerações sobre os Termos de apresentação obrigatória: Apresentados a contento, conforme orienta a Resolução CNS/MS n° 196/96, os Regimento e
Regulamento Interno do Comitê de Ética em Pesquisa, campus Monte Alegre da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo - CEP-PUC/SP e o Manual Ilustrado da Plataforma Brasil,
disponíveis para consulta no site: www.pucsp.br/cometica Recomendações: Recomendamos que o desenvolvimento da pesquisa siga os fundamentos, metodologia,
proposições, pressupostos em tela, do modo em que foram apresentados e avaliados por este
Comitê de Ética em Pesquisa. Qualquer alteração deve ser imediatamente informada ao CEP-
PUC/SP, indicando a parte do protocolo de pesquisa modificada, acompanhada das
justificativas. Conclusões ou Pendências e Lista de Inadequações: Sem pendências ou inadequações, portanto, recomendamos a aprovação integral da proposta. Situação do Parecer: Aprovado Necessita Apreciação da CONEP: Não Considerações Finais a critério do CEP:
Endereço: Rua Ministro Godói, 969 - sala 63 C Bairro: Perdizes CEP: 05.015-001 UF: SP Município: SAO PAULO
Telefone: (11)3670-8466 Fax: (11)3670-8466 E-mail: cometica@pucsp.br
212
ANEXO II - Termo de Consentimento Livre Esclarecido
Caro colaborador,
Meu nome é Sonia Maria da Silva Junqueira sou aluna de Doutorado, sob
orientação da Profa. Dra. Ana Lúcia Manrique, do Programa de Pós-Graduação em
Educação Matemática da Faculdade de Ciências Exatas e Tecnologia da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP.
Venho convidá-lo para participar da pesquisa de minha tese de doutorado, que tem
como objetivo investigar aspectos relativos às Competências Matemáticas de futuros
educadores matemáticos desenvolvidas a partir da disciplina de Cálculo 1, em cursos de
Licenciatura em Matemática. Acreditamos que nossa pesquisa possibilitará novas reflexões
sobre os processos de formação inicial de futuros professores de matemática.
A participação nesta pesquisa consiste em disponibilizar planos de ensino
preparados para a disciplina de Cálculo 1, responder a questionários e/ou entrevistas semi-
estruturadas para complementar informações que não possam ser acessadas pela simples
leitura dos planos de ensino e, quando for o caso, elaborar memoriais de formação.
Saliento que as informações obtidas nesta pesquisa serão divulgadas para fins
estritamente acadêmicos, e para tanto asseguro o sigilo sobre sua participação. Os dados
não serão divulgados de forma a possibilitar sua identificação, para preservar sua
identidade, serão utilizados nomes fictícios.
Seus dados serão mantidos sob minha guarda e responsabilidade.
Além disso, estarei disponível para quaisquer esclarecimentos antes, durante e após
a conclusão da pesquisa sobre a metodologia e outros assuntos a ela correlatos, podendo
ser contatado através dos dados que seguem:
Pesquisador Comitê de Ética em Pesquisa55
SONIA MARIA DA SILVA JUNQUEIRA Cel. (12) 91218878 e-mail: soniajunqueira@uol.com.br
Comitê de Ética em Pesquisa da PUC/SP R. Ministro Godói, 969 – sala 63C 05015-001 – Perdizes – São Paulo – SP Tel. (11) 3670-8466 e-mail: cometica@pucsp.br
Você também poderá a qualquer tempo, com ou sem justificativa, retirar o seu
consentimento de participação desta pesquisa sem qualquer ônus e/ou penalização.
Desde já agradeço a sua colaboração para a realização deste trabalho.
55 Esta pesquisa foi encaminhada para análise e revisão do Comitê de Ética em Pesquisa da PUC/SP - Campus Monte Alegre,
obtendo aprovação em 10/12/2012 sob o protocolo de pesquisa e parecer nº 265.654.
213
ANEXO III - Declaração de Consentimento
Fui alertado que não posso esperar benefícios pessoais advindos desta
pesquisa.
Recebi os esclarecimentos necessários de que não existem possíveis
desconfortos e riscos decorrentes do estudo.
Estou ciente de que minha privacidade será respeitada, ou seja, meu nome
ou qualquer outro dado ou elemento que possa, de qualquer forma, me identificar
será mantido em sigilo.
Também fui informado de que posso me recusar a participar do estudo ou
retirar meu consentimento a qualquer momento, sem precisar justificá-lo, e de que,
por desejar sair da pesquisa, não sofrerei qualquer prejuízo.
É garantido o livre acesso a todas as informações e esclarecimentos
adicionais sobre o estudo e suas conseqüências durante a pesquisa; enfim, tudo o
que eu queira saber antes, durante e depois da minha participação.
Enfim, tendo sido orientado quanto ao teor de tudo o que aqui é mencionado
e compreendido sobre a natureza e o objetivo do referido estudo, manifesto meu
livre consentimento em participar, estando totalmente ciente de que não há nenhum
valor econômico a receber ou a pagar por minha participação.
Por estar assim ciente
Assinam o presente em (02) duas vias de igual teor, na presença de duas
testemunhas
Sonia Maria da Silva Junqueira Autora da pesquisa
CPF: 057.863.658-16 RG: 18.225.695-9 SP
Nome: Sujeito participante da pesquisa
CPF: RG:
Testemunha 1: CPF: RG:
Testemunha 2: CPF: RG:
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