os desafios da escola pÚblica … registros são importantes para o desenvolvimento de diversas...
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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE
I
ANÁLISE DAS REPRESENTAÇÕES SEMIÓTICAS DE ALUNOS DO 6ºANO
ACERCA DE GEOMETRIA PLANA.
Autor: Josiane Maria Constantino
Orientadora: Profa. Ma. Emanueli Pereira
RESUMO
Este artigo final é resultado das atividades previstas no Plano Integrado de Formação Continuada do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), ofertado pela Secretaria de Estado da Educação (SEED). A realização da pesquisa teve como suporte teórico a Teoria de Raymond Duval sobre os Registros de Representação Semiótica e as Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Estado do Paraná na disciplina de Matemática. Este artigo busca mostrar que a Matemática vai além de cálculos, pois contribui para a formação do pensamento humano, sendo importante e necessário o diálogo entre os conteúdos estruturantes dessa disciplina, números, álgebra e geometria. Foram explorados conceitos da geometria plana com foco nos registros dos alunos e com base na teoria de representação semiótica de Raymond Duval, que explicita que podemos representar um objeto matemático a partir de diversos registros semióticos e, neste sentido, nunca se deve confundir o objeto com sua representação. Além disso, existem dois tipos de transformações de representações semióticas que são muito diferentes, mas que estão intimamente ligadas, os tratamentos e as conversões. Sendo assim, direcionamos nossa atenção aos registros produzidos pelos alunos numa tentativa de analisar de que forma os alunos do 6º ano realizam os dois tipos de representações semióticas, caracterizadas por Duval (2009), tratamento e conversão, quando desenvolvem tarefas envolvendo conceitos da Geometria Plana.
Palavras-chave: Representações semióticas; teoria de Duval; tratamentos; conversões; geometria euclidiana.
INTRODUÇÃO
As contribuições da Matemática através da sua história sinalizam que a
Matemática vai muito além de cálculos; contribui para a formação do
pensamento humano.
Tendo em vista que a compreensão da Matemática está intimamente
ligada com o pensamento lógico e com a capacidade de abstrair ideias e criar
estratégias,
é necessário que o processo pedagógico em Matemática contribua para que o estudante tenha condições de constatar regularidades, generalizações e apropriação de linguagem adequada para descrever e interpretar fenômenos matemáticos e de outras áreas do conhecimento (PARANÁ, 2008, p.49).
Procurando alcançar tais objetivos, “cabe ao professor a sistematização
dos conteúdos matemáticos que emergem das aplicações, superando uma
perspectiva utilitarista, sem perder o caráter científico da disciplina e de seu
conteúdo” (PARANÁ, 2008, p.49).
O diálogo entre os conteúdos estruturantes da matemática também é
algo relevante quando se pretende viabilizar que os alunos construam relações
entre números, álgebra e geometria, já que há uma grande variedade de
representações semióticas possíveis na Matemática.
Para Duval (2009), representa-se um objeto matemático a partir de
registros semióticos e, neste sentido, nunca se deve confundir o objeto com
sua representação. Esse autor salienta que além dos sistemas de numeração,
as figuras geométricas, as escritas algébricas e formais, as representações
gráficas e a língua natural, são exemplos de representações semióticas.
Relativo à compreensão em Matemática, alinhada às ideias de Duval
(2009), assumimos que o aluno pode representar um mesmo objeto de
diferentes formas, pois “um mesmo objeto pode ter mais de uma
representação” (p.14).
Sendo assim, a nossa atenção é direcionada aos registros produzidos
pelos alunos numa tentativa de analisar se eles realizam os dois tipos de
representações semióticas, caracterizadas por Duval (2009) como tratamento e
conversão, quando desenvolvem tarefas com foco em conceitos da Geometria
Euclidiana.
Revisão de literatura
Tomando como pressuposto teórico que a função da Matemática é
desenvolver o pensamento e o raciocínio lógico, fazer análises, discussões,
conjecturas, apropriação de conceitos e formulação de ideias, têm a
Matemática grande importância para a formação do pensamento humano.
Tendo em vista que as representações semióticas não são somente
para a comunicação, que utilizamos diversos sistemas de representação
semiótica para exteriorizar nosso pensamento, assumimos a importância
destes sistemas diante da aquisição de conceitos matemáticos.
As representações semióticas são propriamente o uso dos diversos
signos que fazem parte de um sistema que utilizamos para representar o nosso
pensamento. Como há uma grande variedade de representações semióticas
usadas na Matemática, para cada sistema de representação utilizado têm-se
diversas possibilidades de uso matemático, sobretudo, na comunicação
presente nas aulas de matemática.
Levando em conta que os objetos matemáticos estão diretamente
relacionados com a sua representação e que os números não são diretamente
perceptíveis, estes são representados através de um sistema de signos, tanto o
sistema de numeração, quanto “as figuras geométricas, a escrita algébrica, as
representações gráficas e a língua natural” (p.14), se caracterizam como
sistemas de representações semióticas, na perspectiva de Duval(2010).
Na Tabela 1 apresentamos os quatro tipos diferentes de registro
presentes nas diversas atividades matemáticas.
Tabela 1 - Tipos diferentes de registro
Representação Discursiva Representação não discursiva
REGISTROS MULTIFUNCIONAIS:
Os tratamentos não são
algoritmizáveis
Língua Natural
Associações verbais (conceituais).
Forma de raciocinar:
Argumentação a partir
de observações, de
crenças...;
Dedução válida a partir
de definição ou de
teoremas.
Figuras geométricas planas ou em
perspectivas (configurações em
dimensão 0,1,2 ou 3).
Apreensão operatória e não
somente perspectiva;
Construção com
instrumentos.
REGISTROS MONOFUNCIONAIS:
Os tratamentos são principalmente
algoritmos.
Sistemas de escritas:
Numéricas (binária,
decimal, fracionária...);
Algébricas;
Simbólicas (línguas
formais).
Cálculo
Gráficos Cartesianos.
Mudanças de sistema de
coordenadas;
Interpolação, extrapolação.
Fonte: MACHADO (2010, p.14)
Esses registros são importantes para o desenvolvimento de diversas
atividades matemáticas, podendo, inclusive, contribuir para a organização do
pensamento e auxiliar nas atividades cognitivas do aluno. Duval (2009)
ressalta que um registro de representação deve permitir três atividades
cognitivas principais: formação, tratamento e conversão.
formação é a seleção de caracteres e determinações que
queremos representar;
tratamento é a transformação dessa representação ficando no
mesmo registro;
conversão é a transformação dessa representação em outro
sistema semiótico, ou seja, passa de um registro para outro.
Um ponto importante, destacado por Duval (2010), é que quando o aluno
é capaz de fazer a coordenação entre os vários registros relacionados a um
mesmo objeto há possibilidade de inferir sobre sua compreensão. Contudo,
enfatiza que não se pode confundir o objeto com a sua representação, pois um
objeto pode ter mais de uma representação, ou seja, pode ser representado de
diversas formas.
Relativo às representações, Duval (2010) fala em transformações de
representações semióticas. Para o autor há dois tipos de transformação que
estão intimamente ligadas, mesmo sendo muito diferentes: os tratamentos e as
conversões.
Duval (2010) define que:
• Os tratamentos são transformações de representações dentro de um mesmo registro: por exemplo, efetuar um cálculo ficando estritamente no mesmo sistema de escrita ou de representação dos números; resolver uma equação ou um sistema de equações; completar uma figura segundo critérios de conexidade e de simetria.
• As conversões são transformações de representações que consistem em mudar de registro conservando os mesmos objetos denotados: por exemplo, passar da escrita algébrica de uma equação à sua representação gráfica. (p.16)
A Figura 2 explicita as distinções existentes entre esses dois tipos de
transformação.
Figura 2 - Distinção de tratamento e conversão.
Fonte: MACHADO (2010, p.15)
Embora ambas as transformações (tratamento e conversão) sejam
importantes no processo de comunicação do pensamento matemático, Duval
(2010) acrescenta que é a conversão, do ponto de vista cognitivo, “a atividade
de transformação representacional fundamental, aquela que conduz aos
mecanismos subjacentes à compreensão” (p.16). O autor acrescenta também
que a conversão compreende o fenômeno da congruência e não-congruência
entre representações pertencentes a dois sistemas semióticos (DUVAL,2009).
Para que haja o fenômeno da congruência na mudança de um registro
de representação para outro, Duval (2009) diz ser necessário três critérios:
correspondência semântica entre unidades significantes que
constituem os registros de representação;
mesma ordem possível de apreensão destas unidades, nos dois
registros de representação;
conversão de uma unidade significante do registro representação de
partida a uma só unidade significante no registro de representação de chegada.
Transformação de uma representação semiótica em
uma outra representação semiótica
Permanecendo no mesmo
sistema: Tratamento
Mudando de sistema, mas
conservando a referência aos
mesmos objetos: Conversão.
Quase sempre, é somente este tipo
de transformação que chama a
atenção porque ele corresponde a
procedimentos de justificação.
De um ponto de vista “pedagógico”,
tenta-se algumas vezes procurar o
melhor registro de representação a
ser utilizado para que os alunos
possam compreender.
Este tipo de transformação enfrenta os
fenômenos de não congruência. Isso
se traduz pelo fato de os alunos não
reconhecerem o mesmo objeto através
de duas representações diferentes.
A capacidade de converter implica a
coordenação de registros mobilizados.
Os fatores de não congruência mudam
conforme os tipos de registro entre os
quais a conversão é, ou deve ser,
efetuada.
A conversão das representações, de um sistema semiótico a outro, além
de compreender uma operação cognitiva, caracteriza uma mudança de forma.
Essa transformação não é evidente, nem espontânea, para a maior parte dos
alunos e dos estudantes. Quando os critérios de congruências não são
atendidos, dizemos que as representações não são congruentes, dificultando
então a passagem entre os sistemas de representação.
A Geometria Plana baseia-se nos chamados conceitos geométricos
primitivos: ponto, reta e plano; que nas Diretrizes da Educação Básica, estão
presentes nos chamados „conteúdo estruturante‟ de Geometrias. Esse
documento indica que o Ensino Fundamental deve ter “o espaço como
referência, de modo que o aluno possa analisá-lo e perceba seus objetos para
então, representá-lo” (PARANÁ, 2008, p.56).
Neste nível de ensino, o aluno deve ser capaz de compreender: os conceitos da geometria plana: ponto, reta e plano; paralelismo e perpendicularismo; estrutura e dimensões das figuras geométricas planas e seus elementos fundamentais; cálculos geométricos; perímetro, área, diferentes unidades de medidas e suas conversões; representação cartesiana e confecção de gráficos (PARANÁ, 2008, p.56).
Considerando que a geometria contribui para que o indivíduo possa
“intuir, conjecturar, descobrir, projetar, representar quando lida com as formas e
o espaço, aprimora a percepção espacial, favorece a compreensão e produção
de desenhos, esquemas, mapas, gráficos, etc.” (SANTOS, 2007, apud
KLUPPEL e BRANDT, 2012, p.3), Duval (1995, apud Almouloud 2010) coloca
que a geometria envolve três formas de processo cognitivo, que estão
interligados e são necessários para a compreensão em geometria:
• visualização para a exploração heurística de uma situação complexa; • construção de configurações, que pode ser trabalhada como um modelo, em que as ações realizadas representadas e os resultados observados são ligados aos objetos matemáticos representados; • raciocínio, que é o processo que conduz para a prova e a explicação (p.126).
Ainda com o intuito de entender e analisar os problemas envolvendo a
geometria surge interpretações autônomas que, segundo o autor, são
classificadas em quatro formas de apreensão:
sequencial: presente nas atividades de construção e/ou descrição
de uma figura;
perceptiva: é a interpretação das figuras geométricas;
discursiva: é a interpretação dos elementos e das propriedades
da figura geométrica.
operatória: está ligada as modificações possíveis de uma figura e
na reorganização desta.
As tarefas com conceitos de geometria envolvem interpretações que se
desenvolvem tanto no registro da língua natural como na língua figural. Nesse
sentido, tarefas com conceitos geométricos requerem transformações entre tais
registros.
A execução de tais tarefas inclui os registros discursivos, figurais e
matemáticos (escritas algébricas). Duval (2011) aponta que o papel dos
tratamentos e das conversões dos registros produzidos pelos alunos podem
sinalizar compreensões em relação à Geometria.
[...] em geometria, mobilizamos a linguagem e a visualização para a
desconstrução de formas, em seguida, pedimos os tratamentos em
um terceiro registro para calcular as relações numéricas. [...] A
conversão das representações é o primeiro limiar da compreensão
em matemática. Ela é também o lugar em que se opera a tomada de
consciência do funcionamento representacional próprio de cada
registro (p.100).
O tratamento, em geometria, se restringe mais aos cálculos algébricos,
enquanto que a conversão envolve mudança de registro entre sistemas
semióticos.
Metodologia
Nesta seção descreveremos as atividades realizadas com os alunos,
bem como as análises feitas à luz da teoria de Duval, sobre representações
semióticas, buscando identificar o tratamento e a conversão, que são conceitos
importantes nessa teoria. Os alunos apresentaram certa dificuldade em realizar
a conversão, seja pela falta de diversidade nos exercícios propostos
normalmente, ou pelo próprio “costume” de resolver sempre o mesmo tipo de
exercício mecânico.
O que observamos, nos livros didáticos, é uma grande quantidade de
exercícios mecânicos e que chamam pouco a atenção do aluno, fazendo com
que este execute os exercícios de forma quase que automática, sem a
interpretação e o raciocínio lógico.
Durante a aplicação das atividades previstas na produção didática, pude
observar certa relutância por parte dos alunos em participar das tarefas, em
que as questões eram mais abertas e exigiam discussões sobre os conceitos
abordados. Isso de certo modo foi um empecilho num primeiro momento,
somente com o tempo é que eles começaram a participar mais efetivamente
das atividades, onde o hábito de fazer somente conforme o modelo
apresentado pelo professor aos poucos foi mudando.
Na aplicação da primeira atividade, tendo o espaço como referência,
eles deveriam reconhecer as figuras geométricas que estavam presentes em
embalagens e objetos do dia a dia, os alunos recebiam várias imagens que
lembravam pirâmides, cubos, paralelepípedos, cilindros, e tinham que
classificá-los em dois grupos conforme os seus próprios critérios. Foi
necessária muita paciência para que eles compreendessem o que estava
sendo pedido, o tempo todo perguntavam o que era para fazer pois, não tinham
autonomia para realizar as atividades . Os alunos tiveram muita dificuldade em
relacionar as figuras com os exemplos do dia a dia.
Enquanto eles estavam apenas manuseando figuras e classificando
conforme seu próprio critério foi mais simples, a partir do momento em que
começamos as discussões eles não conseguiam dar exemplos sem as figuras.
Quando pedi que dessem um exemplo de quadrado, ou quando pedi de
paralelepípedo, eles não sabiam diferenciar um de outro sem as figuras. Em
certo momento um aluno perguntou se a circunferência “era meio quadrada”,
ou seja, enquanto eles estavam com as figuras nas mãos, conseguiam dar
exemplos, mas assim que pedia exemplos sem dizer qual era a figura, eles não
sabiam identificar as formas e nem exemplificar. Isso denota que os alunos
conseguiam realizar o tratamento referente ao manuseio das figuras e a
exemplificação de formas parecidas, mas não a conversão de um registro para
outro, dando exemplos usando somente as formas que conheciam sem utilizar
as figuras, enumerando através da linguagem oral.
Fonte: Autor, 2015
Na segunda atividade, em que se tinha como proposta explorar os
conceitos de polígono, como é formado, relação com o número de lados,
quadriláteros e triângulos e conceitos de aresta, face, vértice, diferenciar círculo
e circunferência e a planificação de sólidos através da manipulação das
embalagens. Os alunos deveriam fazer a planificação destas embalagens,
discutir com os seus colegas apontando as diferenças entre uma embalagem e
outra.
A intenção era que os alunos percebessem os ângulos, as retas,
arestas, vértices, faces diferentes, e escrevessem no papel suas
características. Contudo, tiveram dificuldade em compreender o significado de
alguns termos como ”planificação”, deixando claro que nunca haviam
trabalhado dessa maneira, foi necessário explicar várias vezes para que
entendessem a atividade.
Quanto às características das embalagens a dificuldade foi em utilizar os
termos corretos, apesar de identificarem as características não conseguiam
nominá-las, mostrando que não tinham conhecimento dos conceitos básicos
das figuras planas. No final desta atividade o professor deveria passar partes
do filme do Pato Donald no país da Matemágica, evidenciando a geometria.
Durante a apresentação do filme do “Pato Donald no País da
Matemágica” os alunos se mostraram surpresos com as relações feitas entre
as figuras e os exemplos dados. Embora vários deles já tivessem visto o filme
eles relataram que somente agora começaram a perceber a relação entre as
figuras geométricas e o nosso dia a dia.
Na terceira tarefa, em que os alunos já tinham identificado as formas
geométricas e já tinham feito as planificações, agora deveriam trabalhar um
pouco mais com os conceitos de aresta, face e vértice, identificando e
diferenciando um de outro. Foi escolhida uma das embalagens e eles deveriam
contar quantas eram as arestas, vértices e faces dessa embalagem e, ver se
os mesmos valores se repetiam com as outras embalagens. Vários deles
conseguiram fazer a tarefa, apesar da dificuldade em escrever e a intenção era
que eles registrassem o que estavam fazendo. Ao final desta tarefa deveriam
preencher uma tabela e esperava-se que eles percebessem a relação entre o
número de vértices, faces e arestas de cada figura. Os alunos conseguiram
fazer a contagem do número de vértices, faces e arestas, mas, não
conseguiram realizar o registro dessas contagens e elaborar uma conclusão,
demonstrando mais uma vez a dificuldade em trabalhar com os diferentes tipos
de registro.
A quarta tarefa propunha aos alunos a classificação dos triângulos
conforme seus ângulos e lados. Os alunos receberam triângulos desenhados
em uma folha, de diversos tamanhos e formas, eles deveriam separar os
triângulos em três grupos conforme os lados e pintar cada grupo de uma cor e
depois separá-los conforme os seus ângulos. Na execução dessa tarefa eles
puderam pintar e recortar e, essa ludicidade deixou-os muito a vontade e, com
isso, foi transposta a barreira de escrever os registros. Assim, puderam
perceber os conceitos e definições de cada tipo de triângulo sem apenas
decorar.
Foi muito interessante ver como eles executaram a tarefa e chegaram às
conclusões: “prof eles tem cores iguais”, “nossa ficou grupo de uma cor”. Eles
perceberam que, por exemplo, todos os que tinham ângulos retos estavam de
uma cor e, com isso, começaram a ver a relação entre os ângulos e os lados
dos triângulos. Alguns alunos que tinham pintado os triângulos com pouca
atenção foram corrigindo e arrumando, sem entrar em uma definição mais
complexa, eles deduziram como deveria ser feita a tarefa, desse modo as
definições foram aprendidas sem que fosse necessário exercícios mecânicos e
repetitivos. É possível inferir que os alunos passavam dos desenhos para as
definições mostrando que eles estavam fazendo a conversão dos registros, e
da linguagem figural para a escrita.
A quinta tarefa exigia deles muita comparação e observação para que
pudessem responder, foi necessário várias explicações para que fizessem as
atividades com calma e atenção. A primeira parte fazia referência entre a área
e o perímetro das figuras, como era somente contar os quadradinhos, não
tiveram dificuldade. Mas quando foi solicitado que desenhassem um quadrado
de área 36 e outro de área 64, as dificuldades apareceram, mesmo sendo
alertados sobre as características de um quadrado, eles insistiam em fazer
qualquer figura principalmente retângulos, deixando claro que ainda não tinham
compreendido as definições de um quadrado. Contudo, depois de revisar tais
características a maioria deles conseguiu desenhar os quadrados, bem como,
facilitou a compreensão do restante da tarefa.
Quando foi solicitado que fizessem um quadrado de área 24, muitos
perceberam que era impossível e registraram isso com suas palavras: “não,
porque só dá um quadrado de 25 não 24”; “não consegui porque sempre dá um
retângulo ou fica um buraco”; “não dá o mesmo número de quadradinhos de
cada lado”; “eu tentei duas vezes e não consegui achar a medida certa”. Dessa
forma, começaram a relacionar as medidas dos lados com o conceito de lados
iguais e, perceberam que a área era um produto das medidas dos lados.
Com isso, trabalharam com cálculos, ao fazerem a contagem dos quadradinhos
da malha, desenharem os quadrados de área 36 e 64, investigarem um meio
de desenhar um quadrado de área 24 e, estabelecer as relações necessárias.
Assim, por meio das relações estabelecidas, denota-se que os alunos, atém
do tratamento, trabalharam com a conversão desses registros.
Fonte: Autor, 2015
Na tarefa seis os alunos deveriam representar trapézios, quadrados,
retângulos, em folhas de sulfite, cortando, dobrando, colando, enfim, usando a
sua imaginação, para depois montar e desmontar as figuras mostrando como
elas se relacionam e, assim, entender como as “fórmulas“ para o cálculo da
medida de área de cada figura eram feitas. Os alunos entenderam como as
fórmulas se relacionavam, perceberam que aquelas ”letrinhas” como eles
diziam vinham de algo real, por exemplo, a fórmula da área do triângulo em
que a área do retângulo é dividida por dois, já que dois triângulos formavam um
retângulo. Essas e outras conclusões só foram possíveis porque eles puderam
manusear as figuras, montá-las e desmontá-las, fazendo interpretações
autônomas que, de acordo com o referencial teórico, são classificadas em
quatro formas de apreensão: sequencial, presente nas atividades de
construção e/ou descrição de uma figura; a perceptiva, que é a interpretação
das figuras geométricas; a discursiva, que é a interpretação dos elementos e
das propriedades da figura geométrica e; a operatória, ligada as modificações
possíveis de uma figura e na reorganização desta. Duval (1995, apud
Almouloud 2010)
As tarefas com conceitos de geometria envolvem interpretações que se
desenvolvem tanto no registro da língua natural como na língua figural o que
segundo Duval faz parte da construção do conhecimento geométrico.
Fonte: Autor, 2015
Na sétima tarefa, tinha-se por objetivo dar início ao sistema métrico,
diferenciar metro de metro quadrado e, fixar os conceitos de área e perímetro.
Os alunos mostraram-se empolgados com a possibilidade de cortar, recortar e
medir, eles ficaram muito surpresos com o tamanho que um quadrado de um
metro de lado poderia ter, e quantos alunos poderiam caber neste metro
quadrado. Tiveram uma discussão muito acirrada enquanto mediam a sala de
aula e o corredor, dizendo que a medida estava errada e, que alguns não
tinham feito certo já que deu diferença entre as medidas. Com isso
trabalhamos com as medidas e verificamos se aquilo que eles mediram
correspondia a medida real. Nesse momento foi possível ver que as noções de
tamanho real estavam muito claras para a maioria dos alunos. Foram medidos
vários objetos e depois calculadas as áreas e os perímetros usando as
medidas e a maioria conseguiu fazer as medidas e calcular as áreas
corretamente.
O mais interessante foi ver que alguns resolveram arredondar os valores
para não ter que trabalhar com os decimais, ou seja, trabalharam com vários
conceitos matemáticos, como o arredondamento de dados, estimativa de
tamanho e valores, cálculo mental e as operações básicas como contagem,
adição e multiplicação, para executar a tarefa e não somente com os conceitos
de área e perímetro relativos a geometria plana, percebendo que a geometria e
os cálculos matemáticos estão relacionados. Duval (2011) aponta que, o papel
dos tratamentos e das conversões dos registros produzidos pelos alunos
podem sinalizar compreensões em relação à Geometria.
[...] em geometria, mobilizamos a linguagem e a visualização para a desconstrução de formas, em seguida, pedimos os tratamentos em um terceiro registro para calcular as relações numéricas.(p.100).
O tratamento, em geometria, se restringe mais aos cálculos algébricos,
enquanto que a conversão envolve mudança de registro entre sistemas
semióticos.
Fonte: Autor, 2015
Na oitava tarefa, o objetivo era trabalhar com os conceitos que já foram
abordados sobre a área e perímetro, permitindo aos alunos usar estratégias
para encontrar uma solução. A tarefa era composta de quatro problemas que
relacionavam as definições das figuras geométricas que eles aprenderam e os
conceitos de área e perímetro. Tiveram dificuldades em imaginar as situações
como reais, começaram a fazer algumas coisas absurdas, como, por exemplo,
em um exercício que dizia que para cobrir o piso de uma sala foram usadas
lajotas quadradas de ½ m de lado, perguntava-se: a) Quantas lajotas foram
necessárias para cobrir 1m² de piso? um dos alunos respondeu: “será
necessário 400 lajotas para cobrir 1m²”, conforme imaginavam as cenas eles
resolviam as questões. A principal dificuldade foi a interpretação dos dados, ou
seja, a linguagem discursiva e não a aplicação dos cálculos. Depois de várias
explicações eles realizaram os exercícios e, usando os conceitos das figuras
geométricas, perceberam que apesar das dificuldades de interpretação são
capazes de usar as definições de geometria para resolver as questões,
aplicando os conhecimentos matemáticos que já possuíam.
A nona e a décima tarefa tinham o objetivo de fixar os conceitos de área
e perímetro no dia a dia e fazer uma relação com os diversos conceitos da
geometria plana, como as curvas, retas paralelas, perpendiculares,
concorrentes, ângulos, planos, figuras geométricas e polígonos. O fato de
imaginarem a casa que gostariam os motivou muito. Foi possível abordar
conceitos já adquiridos nas tarefas anteriores. Além disso, os alunos puderam
colocar móveis e fazer a decoração, desde que tudo coubesse dentro da casa
e do terreno, dessa forma as medidas do esboço deveria estar numa escala
real.
Os alunos trabalharam área, perímetro e realizaram os cálculos de
forma lúdica, em seguida montaram o bairro com as casas da turma toda, com
isso foram necessárias ruas e quadras. Os alunos dispuseram as “casas”
conforme eles queriam, desde que respeitando as ruas e espaços das quadras,
retas paralelas e as perpendiculares representavam as ruas e avenidas. Sendo
assim, os conceitos de perpendicularismo e paralelismo ficaram mais claros
para eles quando aplicaram os conceitos geométricos na construção do painel
do bairro. Com isso, é possível inferir que, fizeram a conversão da língua
natural, por meio das definições que eles já sabiam sobre retas paralelas e
perpendiculares, para a língua figural.
Fonte: Autor, 2015
No final da décima tarefa foi feito um debate, valendo-se de imagens
(figura 01 e 02) que continham retas, figuras geométricas, linhas curvas, e
outros conceitos de geometria que eles conheciam e que estavam presentes
no dia a dia. Os alunos indicavam nas imagens e discutiam sobre o que
estavam vendo, como eram usados no dia a dia e davam mais exemplos que
eles conheciam. Alguns disseram que nunca tinham observado como a
geometria estava presente na vida deles, um dos alunos falou: ”nossa prof até
em quadros tem geometria”, quando mostrei algumas figuras de obras de arte.
Desse modo, os alunos foram superando aquela resistência que alguns
possuem com relação à matemática.
Considerações Finais
Na conclusão deste trabalho, destaco a importância do Programa de
Desenvolvimento Educacional (PDE) na formação do professor, pois, por meio
das reflexões e análises tem-se a oportunidade de produzir um trabalho
científico com base na realidade escolar. Estou gratificada pela oportunidade
de aprender e, compartilhar o meu aprendizado com os meus colegas de área.
Destaco também as contribuições dos colegas do Grupo de Trabalho em
Rede (GTR) que auxiliaram na concretização deste trabalho, dando suas
opiniões e trazendo à tona angustias que são de todos nós: o que posso fazer
para ajudar o meu aluno? Como posso ensiná-lo? Como ele aprende? Percebi
que esse trabalho pode levar uma luz a essas e a tantas outras dúvidas, nos
auxiliando em nosso dia a dia em sala de aula.
O objetivo principal deste trabalho centrou-se em analisar os registros
dos alunos no estudo da Geometria Plana, com foco no tratamento e na
conversão segundo Duval. Com base nas descrições das atividades e análises,
é possível inferir que os alunos fazem o tratamento das informações, mas
quando se trata da conversão eles apresentam dificuldades, seja pela falta de
hábito em trabalhar com os diversos registros ou pela falta de oportunidade em
Fonte:
http://revistacasaejardim.globo.com/Revista/Casa
ejardim/foto/0,,32984590,00.jpg acesso em
04/12/14.
Fonte:
http://www.arte.seed.pr.gov.br/modules/gal
eria/uploads/1/normal_tarsila33_8.png
acesso em 04/12/14.
Figura 01 – Obra de
Tarsila do Amaral
Figura 02 – Construção em forma
de esfera.
resolver exercícios que propiciem realizar o registro das conversões da
representação semiótica.
A maior dificuldade centrou-se na interpretação de dados e enunciados
das questões, o momento de registrarem o que estavam vendo e fazendo
também foi uma barreira, mas com o decorrer das atividades foi superada. Os
alunos estavam muito acostumados a somente fazer cálculos e contagens,
escrever nas aulas de matemática foi uma novidade. Neste sentido, o trabalho
teve alguns empecilhos devido à falta de hábito dos alunos em trabalharem
com questões no formato que foram propostas.
É importante ao professor entender como o aluno aprende, contribuir na
formação dos alunos, no desenvolvimento cognitivo e compreender o papel da
sistematização dos conteúdos matemáticos, que superam as simples
aplicações, indo além de exercícios mecânicos ou do ato de decorar conceitos
e definições, sem esquecer o objetivo científico da disciplina. Além disso, é
necessário propiciar ao aluno a oportunidade de trabalhar com diferentes
registros, instigando a vontade de aprender e testar seus conhecimentos,
relacionando as diferentes formas de linguagem, para que esse tenha acesso
às várias formas de representação dos objetos matemáticos.
Finalizando esse trabalho foi possível perceber que, quando o nosso
aluno tem a oportunidade de trabalhar com vários registros referentes ao
mesmo objeto, ele sente-se mais motivado a aprender e faz comparações e
observações relevantes, estando assim mais aberto ao aprendizado.
REFERÊNCIAS
http://www.arte.seed.pr.gov.br/modules/galeria/uploads/1/normal_tarsila33_8.p
ng acesso em 04/12/14.
http://revistacasaejardim.globo.com/Revista/Casaejardim/foto/0,,32984590,00.j
pg acesso em 04/12/14.
ALMEIDA, Lourdes Werle de; SILVA, Karina Pessoa da; VERTUAN, Rodolfo Eduardo.
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