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Formação e Emissão de Partículas numa Caldeira Doméstica Alimentada a Pellets
José Pedro dos Reis Madeira
Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em
Engenharia Mecânica
Júri
Presidente: Professor Doutor Luís Rego da Cunha Eça
Orientador: Professor Doutor Mário Manuel Gonçalves da Costa Vogal: Professor Doutor João Luís Toste Azevedo
Outubro de 2011
i
ii
Resumo
As partículas emitidas por caldeiras domésticas são maioritariamente constituídas por
partículas de dimensão inferior a 2,5 µm. De forma a melhorar a compreensão deste fenómeno,
é necessário compreender a sua formação no interior da câmara de combustão. Neste
contexto, o presente trabalho teve como principal objectivo melhorar o conhecimento acerca
dos processos de formação de partículas no interior de uma caldeira doméstica. Com esse fim
em vista, o estudo incluiu a caracterização detalhada do processo de combustão no interior da
câmara de combustão de uma caldeira doméstica, tendo incluído medidas locais de
temperatura, concentração de espécies químicas e partículas. O estudo incluiu ainda a
caracterização química e morfológica das partículas. Os resultados obtidos revelaram que (i) as
partículas de dimensões inferiores a 0,1 µm se formam rapidamente no início do processo de
combustão, onde a taxa de oxidação é também elevada; todavia, essa taxa decresce
rapidamente em resultado do decréscimo significativo da temperatura; (ii) o diâmetro
correspondente à quantidade máxima de partículas aumenta ligeiramente desde o queimador
até cerca de 4/5 da altura da câmara de combustão, indicando alguma tendência para a
formação de agregados; na parte final da câmara observa-se um decréscimo do diâmetro
correspondente à quantidade máxima de partículas, em resultado de alguma fragmentação de
agregados; (iii) o carbono presente nas partículas decresce significativamente ao longo da
câmara de combustão e os elementos inorgânicos tendem a condensar e solidificar com o
decaimento da temperatura ao longo da câmara; e, finalmente (iv) as pequenas partículas
apresentam-se envoltas por compostos inorgânicos que se depositaram nelas por
condensação heterogénea.
Palavras-chave: biomassa, pellets, caldeira doméstica, partículas
iii
Abstract
The particles emitted by domestic boilers are mostly composed of particles smaller than
2.5 µm. To improve the knowledge of this phenomenon it is necessary to understand the
particle formation inside the combustion chamber. In this context, the present work had as a
major goal the improvement of the knowledge about the particle formation processes inside a
domestic boiler. With that goal in mind, this study included the detailed characterization of the
combustion process inside the combustion chamber of a domestic boiler, including local
temperature, gas species concentration and particle measurements. The study included also
the particle chemical and morphological characterization. The results revealed that (i) particles
smaller than 0,1 µm are quickly formed at the beginning of the combustion process, where the
oxidation rate is also high; however, this rate rapidly decreases due to the significant
temperature drop; (ii) the diameter corresponding to the maximum amount of particles slightly
increases from the burner until 4/5 of the combustion chamber height, indicating some tendency
to form aggregates; in the combustion chamber final zone is observed a decrease in the
diameter corresponding to the maximum amount of particles, as consequence of some
aggregate fragmentation; (iii) the carbon present in the particles significantly decreases along
the combustion chamber and the inorganic elements tend to condense and solidify with the
temperature decay across the chamber; and finally (iv) the small particles are wrapped by
inorganic compounds that deposited on them by heterogeneous condensation.
Keywords: biomass, pellets, domestic boiler, particles
iv
Agradecimentos
Gostaria de manifestar a minha gratidão para com o Professor Mário Costa por me ter
dado a oportunidade de realizar o presente trabalho, e por toda orientação e apoio dados no
seu decorrer.
Ao Ulisses, por todo o conhecimento que me transmitiu sobre o tema e a instalação
experimental, por toda ajuda dada no decorrer dos trabalhos, especialmente no tratamento de
resultados. Ao Anton, por todos os detalhes técnicos que me transmitiu, por todos os conselhos
dados, pela camaradagem e por toda a ajuda dada no decorrer dos trabalhos e ensaios
práticos. Gostaria também de agradecer ao Pratas pela organização dos elementos de medida
e por todo o apoio técnico dado durante a realização dos ensaios. Agradeço ao Wang pela sua
ajuda na medição de temperaturas, e ao Jorge pelo suporte de sondas.
Gostaria de agradecer a todos os meus colegas do laboratório pelo bom ambiente de
trabalho proporcionado, em especial ao António pela grande camaradagem e amizade.
Agradeço a todos os meus bons amigos, cujas palavras e acções foram determinantes
para uma melhor atitude da minha parte no decorrer do curso, especialmente ao meu amigo
Tiago pela grande amizade e por todas as palavras sensatas que me deram especial alento em
todos os momentos.
Gostaria de agradecer à minha família, em especial aos meus pais e irmão, por todo o
amor e compreensão, por sempre terem acreditado em mim e me terem tornado na pessoa
que sou hoje. A vocês o meu Muito Obrigado.
v
Índice
Resumo .......................................................................................................................................... ii
Abstract ........................................................................................................................................ iii
Agradecimentos ............................................................................................................................iv
Lista de figuras ..............................................................................................................................vi
Lista de Tabelas ........................................................................................................................... viii
Abreviaturas .................................................................................................................................. ix
1. Introdução ......................................................................................................................... 1
1.1. Motivação ...................................................................................................................... 1
1.2. Objectivos ...................................................................................................................... 3
1.3. Revisão bibliográfica ..................................................................................................... 4
1.3.1. Combustão da biomassa ....................................................................................... 4
1.3.2. Mecanismos de formação de poluentes gasosos ................................................. 6
1.3.3. Mecanismos de formação de partículas ............................................................... 8
1.3.4. Estudos antecedentes ......................................................................................... 14
1.4. Estrutura da dissertação ............................................................................................. 17
2. Instalação experimental .................................................................................................. 18
2.1. Caldeira e equipamento auxiliar ................................................................................. 18
2.2. Técnicas de medida ..................................................................................................... 23
3. Resultados e discussão .................................................................................................... 28
3.1. Condições experimentais ............................................................................................ 28
3.2. Temperaturas e concentrações de espécies químicas ................................................ 30
3.3. Partículas ..................................................................................................................... 32
4. Fecho ............................................................................................................................... 41
4.1. Conclusões................................................................................................................... 41
4.2. Sugestões para trabalho futuro .................................................................................. 42
5. Referências ...................................................................................................................... 43
vi
Lista de figuras
Figura 1 – Balanço de carbono resultante da combustão de biomassa. ...................................... 2 Figura 2 – a) Perfis da concentração de oxigénio na vizinhança e no interior do resíduo
carbonoso; b) Variação da taxa de reacção em função da temperatura do resíduo carbonoso
nas três zonas. .............................................................................................................................. 6 Figura 3 – Formação de fuligem numa chama de pré-mistura (Bockhorn, 1994). ..................... 10 Figura 4 – Formação de fuligem a partir de uma partícula de carvão (Fletcher et al., 1997). .... 12 Figura 5 – Formação de partículas na combustão de biomassa (adaptado de Wiinikka, 2005).13 Figura 6 – Instalação experimental. ............................................................................................ 18 Figura 7 – Dimensões da caldeira (em milímetros). ................................................................... 19 Figura 8 – a) Interior da câmara de combustão; b) instalação durante a realização de medidas
de partículas. ............................................................................................................................... 20 Figura 9 – a) Esquema da câmara de combustão, localização das portas de medida (valores
em milímetros) e detalhes do queimador. ................................................................................... 20 Figura 10 – Pormenor da resistência de aquecimento. .............................................................. 21 Figura 11 – Cesto de recolha de cinzas. ..................................................................................... 21 Figura 12 – Pormenor do ventilador de extracção, visível após remoção do cesto de recolha de
cinzas. ......................................................................................................................................... 21 Figura 13 – Representação esquemática da instalação experimental, incluindo as técnicas de
medida. ........................................................................................................................................ 24 Figura 14 – Representação esquemática da sonda usada para as medidas das concentrações
das espécies gasosas no interior da câmara de combustão (dimensões em milímetros). ........ 25 Figura 15 – Representação esquemática da sonda de termopar tipo R usada para as medidas
de temperatura no interior da câmara de combustão. ................................................................ 25 Figura 16 – Representação esquemática da sonda em quartzo usada para as medidas de
partículas no interior da câmara de combustão (dimensões em milímetros). ............................ 26 Figura 17 – Dekati Low Pressure Impactor. ................................................................................ 27 Figura 18 – Porta-filtro Tecora. ................................................................................................... 27 Figura 19 – Imagem do SEM/EDS. ............................................................................................. 27 Figura 20 – Pellets de pinho ........................................................................................................ 28 Figura 21 – Perfis radiais de concentração de espécies químicas obtidos através da porta 4 em
dias diferentes, para a condição de operação da caldeira estudada (tabela 3). ........................ 30 Figura 22 – Perfis radiais de concentração de espécies químicas e temperatura obtidos através
das portas 1, 2, 3, 4 e 5, para a condição de operação da caldeira estudada (tabela 3). .......... 31 Figura 23 – Perfis axiais de concentração de espécies químicas e temperatura obtidos através
das portas 1, 2, 3, 4 e 5, para a condição de operação da caldeira estudada (tabela 3). .......... 32 Figura 24 – Concentração total de partículas recolhidas nos treze substratos do impactor e no
porta-filtro total............................................................................................................................. 32
vii
Figura 25 – Distribuição dos diâmetros das partículas em diversos pontos de medida. ............ 33 Figura 26 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1 no
substrato 3. .................................................................................................................................. 34 Figura 27 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 2 no
substrato 3. .................................................................................................................................. 34 Figura 28 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 3 no
substrato 3. .................................................................................................................................. 35 Figura 29 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 4 no
substrato 3. .................................................................................................................................. 35 Figura 30 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 5 no
substrato 3. .................................................................................................................................. 35 Figura 31 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1, posição r =
5 cm, no substrato 3. ................................................................................................................... 36 Figura 32 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 2, posição r =
7,5 cm, no substrato 3. ................................................................................................................ 36 Figura 33 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 3, posição r =
10 cm, no substrato 3. ................................................................................................................. 37 Figura 34 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1 no
substrato 2. .................................................................................................................................. 38 Figura 35 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1 no
substrato 4. .................................................................................................................................. 38 Figura 36 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1 no
substrato 5. .................................................................................................................................. 38 Figura 37 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1 no
substrato 6. .................................................................................................................................. 39 Figura 38 – Evolução da composição de partículas (carbono e oxigénio) e concentração de
espécies químicas gasosas (CO2, O2, CO) em função da temperatura. .................................... 39 Figura 39 – Evolução da composição das partículas (potássio, cloro, sílica e oxigénio) em
função da temperatura. ............................................................................................................... 40
viii
Lista de Tabelas
Tabela 1 – Especificações do combustível admitido. ................................................................. 23 Tabela 2 – Descrição dos analisadores de gases. ..................................................................... 25 Tabela 3 – Condições de funcionamento da caldeira. ................................................................ 28 Tabela 4 – Análise química do combustível utilizado. ................................................................ 29
ix
Abreviaturas
SEM – Scanning Electron Microscope
EDS – Energy Dispersive X-Ray Spectrometry
DLPI – Dekati Low Pressure Impactor
ELPI – Electrical Low Pressure Impactor
TSPD – Thermophoretic Sampling Particle Diagnostic
PAH – Polycyclic Aromatic Hydrocarbons
PCB – Polychlorinated Biphenyls
TOC – Total Organic Carbon
FTIR – Fourier Transform Infrared Spectroscopy
TEM – Transmission Electron Microscopy
PSAP - Particulate Soot Absorption Photometer
1
1. Introdução
1.1. Motivação A actual conjuntura socio-económica está a motivar uma procura incessante por fontes
de energia alternativas viáveis aos combustíveis fósseis. Os combustíveis fósseis tiveram um
papel fundamental no decorrer de uma das mais importantes épocas da evolução humana.
Estes foram os combustíveis de eleição na era da Revolução Industrial e potenciaram ainda o
aparecimento dos caminhos-de-ferro com a invenção da máquina a vapor, que tinha como
fonte de energia química o carvão mineral. Em meados do século XIX, com a descoberta da
refinação do petróleo, obtiveram-se vários combustíveis com diferentes características. Os
combustíveis descobertos nessa época impulsionaram o surgimento de novos tipos de
equipamentos capazes de transformar a energia química disponível numa outra forma de
energia necessária à existência e desenvolvimento da sociedade humana. Foi deste modo
possível ter mais combustíveis que servissem, por exemplo, o propósito da procura de
aquecimento e a possibilidade de confeccionar alimentos de forma mais célere. Estes
combustíveis começaram também a ser utilizados para transformar a sua energia química em
energia mecânica, e, graças a uma grande densidade energética, podem ser armazenados e
utilizados numa plataforma móvel que possibilita o transporte de pessoas e bens entre
distâncias consideráveis. Com o reconhecimento desta última característica surge também uma
grande variedade de meios de transporte e, posteriormente, um crescimento exponencial na
quantidade de meios de transportes públicos e particulares pelo mundo inteiro.
Paralelamente ao advento da refinação do petróleo são criadas condições para se gerar,
conduzir e consumir electricidade e eventualmente surgem centrais de produção de energia
eléctrica alimentadas a carvão ou a derivados de petróleo. Com a massificação do consumo de
energia eléctrica surgem cada vez mais centrais alimentadas a combustíveis fósseis. Com o
desenrolar da evolução humana chegou-se à situação actual e aos dois principais problemas
associados ao consumo de combustíveis fósseis: o seu desaparecimento e a poluição inerente
ao seu uso.
A combinação destes dois factores deu origem à procura por fontes alternativas de
energia face ao petróleo e ao carvão mineral. De entre todas as formas alternativas de energia
face aos combustíveis fósseis, a biomassa é indiscutivelmente uma alternativa forte.
O uso da biomassa surge devido à necessidade de recorrer a uma fonte de energia
renovável e claramente ecológica. Segundo Coelho e Costa (2007), o termo biomassa pode ser
aplicado a uma grande variedade de materiais, tais como a madeira, desperdícios vegetais,
resíduos de origem animal e ainda as fracções orgânicas de resíduos sólidos urbanos.
2
De entre as variedades acima mencionadas, os desperdícios de madeira são largamente
os mais utilizados. Pela disponibilidade do recurso, pela facilidade em o tornar utilizável, pela
razoável densidade energética e, ainda, pelas baixas emissões de poluentes tornou-se o
recurso de eleição para os consumidores de biomassa.
Grande parte deste tipo de biomassa resulta de desperdícios da indústria transformadora
da madeira e é composta por lenha, pontas e ramos de árvores, casca de árvores e serradura.
Na sociedade actual é possível assegurar a renovação deste recurso, desde que existam
politicas responsáveis de florestação e de agricultura. Assim sendo, um dos problemas
inerentes ao uso de combustíveis fósseis, a não renovação da sua disponibilidade, é evitado.
Porém, o aproveitamento energético mais usual da biomassa passa pela sua combustão
e este processo dá origem a produtos de combustão potencialmente nocivos. Tal como referido
por Rabaçal (2010), a emissão de CO2 deste tipo de combustíveis dá origem a um balanço
neutro de carbono dado que a molécula de CO2 é absorvida no ciclo de crescimento da
biomassa (Figura 1).
Figura 1 – Balanço de carbono resultante da combustão de biomassa.
No entanto é gerado outro tipo de emissões nocivas ao ambiente e à existência humana,
tais como aerossóis, que pela sua composição e reduzida dimensão são potencialmente
cancerígenos. As emissões destes compostos químicos devem ser evitadas a todo o custo,
devendo, para isso, investir-se em elementos filtrantes na exaustão das instalações de queima.
Contudo, extremamente importante saber como se formam e que factores potenciam a sua
formação e emissão.
A par da composição química e percentagem de cinzas presentes na biomassa, os
factores que mais influenciam a emissão de partículas são as condições de queima. Estas
condições ditam a eficiência da combustão assim como a geração de poluentes. A emissão de
espécies gasosas foi já alvo de um estudo extenso no presente laboratório por Rabaçal (2010),
3
imperando agora a necessidade de se realizarem estudos respeitantes à formação e emissão
de partículas.
São maioritariamente emitidas dois tipos de partículas, inorgânicas e fuligem. As
primeiras são decorrentes da percentagem de cinzas no combustível e a sua concentração na
exaustão tende a ser proporcional à percentagem de cinzas no combustível. Por outro lado, a
concentração (na exaustão) das partículas decorrentes da formação de fuligem depende das
condições de queima da biomassa. Estas condições de queima podem ser influenciadas pelo
combustível, pelo próprio projecto da câmara de combustão, pela distribuição do ar de
combustão na câmara e, ainda, pela carga térmica imposta à instalação. É importante frisar
que a formação de fuligem no interior da chama não implica a sua emissão do sistema.
Dependendo das condições de queima, poderá haver condições para que as partículas
formadas na câmara de combustão sejam oxidadas antes de serem expelidas pela exaustão.
A reduzida dimensão destas partículas levanta graves problemas à sua captação na
exaustão, sendo que reduzir a sua formação na câmara de combustão é de crucial importância.
Tal como já referido, a emissão deste tipo de partículas influencia negativamente o meio
ambiente e a saúde humana. Os efeitos negativos na saúde humana surgem através da
inspiração destas partículas e, devido à sua reduzida dimensão, existe uma deficiente filtração
daquelas no aparelho respiratório levando a uma posterior absorção destas partículas pelo
organismo. Esta absorção poderá desencadear doenças respiratórias e até doenças
oncológicas, daí a crescente preocupação com este tipo de poluente.
1.2. Objectivos Recentemente, Fernandes e Costa (2011) quantificaram e caracterizaram a emissão de
partículas na exaustão de uma caldeira doméstica para vários níveis de carga térmica. Os
autores verificaram que as partículas emitidas eram maioritariamente constituídas por
partículas de dimensão inferior a 2,5 µm. De forma a melhorar a compreensão deste fenómeno,
é necessário compreender a sua formação no interior da câmara de combustão.
Neste contexto, o presente trabalho teve como principal objectivo melhorar o
conhecimento acerca dos processos de formação de partículas no interior da caldeira
doméstica estudada por Fernandes e Costa (2011). Com esse fim em vista, o estudo incluiu a
caracterização detalhada do processo de combustão no interior da câmara de combustão,
incluindo medidas locais de temperatura, concentração de espécies químicas e partículas. O
estudo incluiu, ainda, a caracterização química e morfológica das partículas.
4
1.3. Revisão bibliográfica
1.3.1. Combustão da biomassa
O processo de combustão de biomassa passa por várias etapas distintas,
nomeadamente, as partículas de combustível passam em primeiro lugar por uma etapa de
secagem e aquecimento, seguido da volatilização e, após a sua ignição, tem lugar a
combustão do seu resíduo carbonoso (Coelho e Costa, 2007).
A secagem e o aquecimento promovem um conjunto de alterações físicas na partícula,
em que se destacam, pela sua importância, a remoção de humidade e o aquecimento da
partícula, podendo, no entanto, ocorrer formação de fissuras se a taxa de aquecimento for
bastante elevada. Este processo é endotérmico e dependente da temperatura e da dimensão
das partículas. A energia necessária para este processo depende da humidade relativa das
partículas, das suas dimensões e, ainda, de algumas propriedades físicas, tais como a
condutibilidade térmica e a capacidade calorífica. De referir, ainda, que a secagem tem
normalmente lugar assim que a partícula atinge cerca de 105 °C e que o processo de
combustão não tem condições para se desenrolar caso a humidade relativa da biomassa seja
superior a 60%.
Após a secagem e aquecimento segue-se a volatilização, ou seja, a libertação de
matéria volátil que está presente no combustível sólido. A taxa de aquecimento da partícula, a
dimensão da partícula, a temperatura final e o intervalo de tempo a que a partícula permanece
a essa temperatura são as variáveis que mais influenciam a libertação de matéria volátil. Estas
variáveis influenciam diferentemente a libertação de compostos voláteis das partículas de
combustível sólido. Diversos estudos experimentais revistos por Coelho e Costa (2007) indicam
que a libertação de voláteis:
• é proporcional à taxa de aquecimento até valores de cerca de 104 K/s;
• é proporcional à temperatura final que a partícula atinge;
• é proporcional ao tempo de permanência da partícula a essa temperatura; e
• é inversamente proporcional ao tamanho da partícula.
De entre as espécies químicas gasosas que constituem os produtos da volatilização
destacam-se H2O, CO2, CO, hidrocarbonetos leves (tal como o CH4), H2 e, ainda,
hidrocarbonetos pesados (denominados por alcatrões). Na biomassa todo este processo se
desenrola maioritariamente no intervalo de temperaturas compreendido entre 200 °C e 260 °C.
Com o decorrer das fases anteriormente descritas surgem condições para se dar a
ignição da matéria combustível. O processo de ignição tem sido alvo de extensos estudos
durante as últimas décadas, não existindo, no entanto, ainda um consenso generalizado sobre
o desenrolar deste processo e quais os factores que o promovem. No que toca ao tipo de
reacção existente no processo de ignição, existe a distinção entre reacções homogéneas e
5
heterogéneas, neste caso referentes à ignição unicamente dos voláteis e à ignição conjunta
dos voláteis e da superfície sólida, respectivamente. Os diversos estudos revistos por Coelho e
Costa (2007) referem a existência de um diâmetro crítico das partículas para a ocorrência de
ignição homogénea. As principais conclusões apontam para que acima do diâmetro crítico
existem reacções homogéneas com a ignição dos voláteis e posteriormente da superfície;
abaixo do diâmetro crítico existem reacções heterogéneas levando à ignição conjunta dos
compostos voláteis e da superfície combustível. Outros autores ressalvam a possibilidade de
ocorrerem reacções heterogéneas quando são atingidas dadas combinações entre diâmetro,
taxa de aquecimento e pressão parcial de oxigénio disponível para a ignição e combustão das
partículas combustíveis. Estudos recentes demonstram que a temperatura de ignição diminui
com o aumento do diâmetro das partículas, com a concentração de oxigénio em redor das
mesmas e com o teor de matéria volátil.
Finalmente ocorre a combustão do resíduo carbonoso resultante do processo de
volatilização. Este resíduo é composto na sua maioria por carbono e cinzas, podendo também
incluir pequenas quantidades de hidrogénio, oxigénio e azoto. É comum que o resíduo
carbonoso apresente uma forma esférica, principalmente se se tratar de uma partícula
pequena, e poderá apresentar fissuras decorrentes do processo de volatilização. O
aquecimento da partícula pode também levar à sua dilatação, o que implica o crescimento do
seu grau de porosidade interna.
Considerando as várias reacções existentes no decorrer da combustão do resíduo
carbonoso, a que mais importa ser considerada em equipamentos de combustão
convencionais é a reacção heterogénea de oxidação do resíduo carbonoso com o oxigénio.
Segundo Coelho e Costa (2007), esta reacção, sendo muito mais lenta que a volatilização, é
controlada quimicamente (pela cinética química) ou fisicamente (pela difusão).
Hampartsoumian et al. (1989) conseguiram definir três zonas de temperatura que determinam
os factores que controlam a reacção heterogénea da oxidação do resíduo carbonoso. As zonas
foram designadas por zona I, zona II e zona III, como mostra a Figura 2. Na zona I, devido às
temperaturas relativamente baixas, a combustão é controlada quimicamente. Na zona II a
temperatura da partícula é mais elevada e a oxidação é mais rápida. Nesta zona combustão é
controlada pela cinética química e pela difusão de oxigénio para a superficie e interior da
partícula porosa. Finalmente, na zona III, devido à elevada temperatura, a reacção dá-se de
forma tão rápida que a sua velocidade é apenas controlada pela reposição de oxigénio em
redor da partícula para que esta continue a oxidar.
6
Figura 2 – a) Perfis da concentração de oxigénio na vizinhança e no interior do resíduo carbonoso;
b) Variação da taxa de reacção em função da temperatura do resíduo carbonoso nas três zonas.
O carbono à superfície da partícula pode reagir com o oxigénio, com o dióxido de
carbono e com o vapor de água, segundo as reacções:
𝐶 + 𝑂2 → 𝐶𝑂2 (1)
2 𝐶 + 𝑂2 → 2 𝐶𝑂 (2)
𝐶 + 𝐶𝑂2 → 2 𝐶𝑂 (3)
𝐶 + 𝐻2𝑂 → 𝐶𝑂 + 𝐻2 (4)
Tal como descrito pelas reacções acima, o principal produto é o monóxido de carbono,
que, posteriormente, reage com a molécula de oxigénio, para formar dióxido de carbono
segundo a reacção:
𝐶𝑂 + 12� 𝑂2 → 𝐶𝑂2 (5)
1.3.2. Mecanismos de formação de poluentes gasosos
A combustão de biomassa gera, a par da emissão de partículas, emissões gasosas
poluentes sendo na sua maioria compostas por dióxido de carbono (CO2), monóxido de
carbono (CO), hidrocarbonetos não queimados (HC) e óxidos de azoto (NOx).
O CO e os HCs são originados por fenómenos semelhantes. Em sistemas de combustão
com chamas de difusão, como é o caso do presente estudo, existem duas fontes maioritárias
de produção de CO e HCs: as regiões de mistura pobre e as regiões de mistura rica. Estes dois
extremos promovem obviamente dois mecanismos de formação diferentes, dadas as
7
diferenças existentes entre si. Nas regiões de mistura excessivamente pobre, o processo de
combustão é de tal forma lento que apenas se obtém a oxidação parcial dos produtos de
combustão, resultando daí a emissão de CO e HCs. No outro extremo da razão de
equivalência, nas regiões onde existe uma mistura excessivamente rica, não existe oxigénio
disponível para que haja oxidação completa do combustível enquanto este está na câmara de
combustão, motivando assim emissões apreciáveis de CO e HCs.
Os óxidos de azoto (NOx) servem para designar o conjunto formado pelo óxido de azoto
(NO) e pelo dióxido de azoto (NO2), e estes podem ser formados a partir da oxidação do azoto
molecular existente no ar de combustão ou da oxidação dos compostos de azoto existentes no
combustível. No caso presente, e dado que a biomassa é um combustível com azoto na sua
composição, é necessário considerar quatro mecanismos conhecidos de formação destes
óxidos, nomeadamente, o mecanismo térmico, o mecanismo imediato, o mecanismo com óxido
nitroso (N2O) como intermédiário e o mecanismo de formação de NO a partir do azoto presente
no combustível.
O mecanismo térmico explica a formação de NO a partir do azoto atmosférico através
das equações:
𝑂 + 𝑁2 ↔ 𝑁𝑂 + 𝑁 (6)
𝑁 + 𝑂2 ↔ 𝑁𝑂 + 𝑂 (7)
𝑁 + 𝑂𝐻 ↔ 𝑁𝑂 + 𝐻 (8)
sendo o conjunto das três reacções designado por mecanismo de Zeldovich estendido. Este
mecanismo é habitualmente negligenciado para temperaturas inferiores a 1800 K.
O mecanismo imediato, resultante das reacções de radicais de hidrocarbonetos com
azoto molecular, é talvez aquele que é mais preponderante a baixas temperaturas, e é descrito
pelas seguintes reacções:
𝐶𝐻 + 𝑁2 ↔ 𝐻𝐶𝑁 + 𝑁 (9)
𝐶 + 𝑁2 ↔ 𝐶𝑁 + 𝑁 (10)
𝐻𝐶𝑁 + 𝑂 ↔ 𝑁𝐶𝑂 + 𝐻 (11)
𝑁𝐶𝑂 + 𝐻 ↔ 𝑁𝐻 + 𝐶𝑂 (12)
𝑁𝐻 + 𝐻 ↔ 𝑁 + 𝐻2 (13)
𝑁 + 𝑂𝐻 ↔ 𝑁𝑂 + 𝐻 (14)
O mecanismo com N2O como intermédiário é um mecanismo importante em chamas
pobres de pré-mistura e na combustão em leito fluidizado e é regido pelas equações:
𝑂 + 𝑁2 + 𝑀 ↔ 𝑁2𝑂 + 𝑀 (15)
𝐻 + 𝑁2𝑂 ↔ 𝑁𝑂 + 𝑁𝐻 (16)
8
𝑂 + 𝑁2𝑂 ↔ 𝑁𝑂 + 𝑂𝑁 (17)
Finalmente, o mecanismo de formação de NO a partir do azoto presente no combustível
ocorre de acordo com as seguintes reacções globais:
𝑁 𝑝𝑟𝑒𝑠𝑒𝑛𝑡𝑒 𝑛𝑜 𝑐𝑜𝑚𝑏𝑢𝑠𝑡í𝑣𝑒𝑙 → 𝐻𝐶𝑁 → 𝑁𝐻𝑖 �
𝑁𝑂 �⎯⎯⎯⎯�𝑁2
𝑂2 �⎯⎯⎯�𝑁𝑂
(18)
Este mecanismo é fortemente dependente da fracção de azoto presente no combustível e da
concentração local de oxigénio. É particularmente importante na combustão de carvão, sendo
que, no presente trabalho, devido à quantidade de azoto presente no combustível, se espera
uma contribuição apreciável deste mecanismo para a formação de óxidos de azoto.
1.3.3. Mecanismos de formação de partículas
Os processos de formação e emissão de partículas resultantes de processos de
combustão de combustíveis sólidos não estão ainda explicados e definidos de forma concreta,
e a combustão da biomassa não é excepção. Dado que as partículas geradas pela sua
combustão estão sujeitas a fenómenos de aglomeração, é necessária uma breve exposição
acerca destes fenómenos.
As partículas sólidas ou líquidas, que pela sua reduzida dimensão se encontram
suspensas em gases designam-se como aerossóis. Segundo Wiinikka (2005), a dimensão
destes aerossóis pode variar de poucos nanómetros até às dezenas de micrómetros, podendo
ser constituídos por elementos em estados físicos diferentes. O seu tamanho e a sua
composição química dependem das interacções decorrentes dos processos de transporte e do
seu equilíbrio termodinâmico. Os aerossóis estão sujeitos a fenómenos de agregação tais
como coagulação, condensação e nucleação. No entanto, os aerossóis estão também sujeitos
a fenómenos de redução da sua dimensão característica tais como a sua fragmentação e
evaporação, assim como a fenómenos de eliminação provocados por impactos e deposições
em superfícies adjacentes ao volume onde se confinam.
A coagulação de aerossóis é um processo em que os aerossóis colidem entre si devido
ao seu movimento relativo, formando partículas maiores. Existem duas possibilidades de
ocorrência de coagulação, diferindo entre si nos fenómenos que as regem. A coagulação
térmica, fenómeno espontâneo e muito frequente em partículas menores que 1 µm, e a
coagulação cinemática, que resulta da predominância da intensidade do movimento relativo
entre partículas em relação à gravidade, forças eléctricas e efeitos aerodinâmicos. Grandes
taxas de coagulação de aerossóis estão associadas a concentrações elevadas e diâmetros
9
submicrométricos. Com a ocorrência da coagulação, as concentrações de aerossóis descem e
o seu diâmetro aumenta, dando origem a uma queda abrupta da taxa de coagulação. A
coagulação origina um aerossol final cujo volume e massa são iguais à soma dos volumes e
massas dos aerossóis que lhe deram origem.
Quando há uma elevada concentração de partículas sólidas e as espécies gasosas
possuem uma baixa pressão de saturação, pode ocorrer condensação sobre as partículas
sólidas sem que haja a formação de novo núcleo. Este processo é denominado de
condensação heterogénea. A taxa de condensação depende da troca de massa e calor entre a
partícula e a fase contínua/líquida. Reacções químicas na superfície da partícula sólida
também podem levar ao crescimento do aerossol, cuja ocorrência é mais propícia em
partículas sólidas jovens com bastante actividade catalítica. A condensação origina um
aerossol de tamanho superior devido à transferência de massa da fase gasosa para uma
partícula sólida sem alterar o número total de aerossóis.
A nucleação é também denominada de condensação homogénea devido à formação de
novas partículas exclusivamente a partir da fase gasosa. Este tipo de condensação é menos
frequente do que a condensação heterogénea. Todavia, quando existe um défice de pontos
para a ocorrência de condensação heterogénea, ou quando a pressão do gás é muito superior
à sua pressão de saturação, pode ocorrer nucleação. A nucleação origina um incremento do
número de aerossóis e da sua massa. É no entanto um fenómeno que possui pouca expressão
para o balanço final do número (e massa) de aerossóis presentes num gás, aquando da
contabilização de todos os fenómenos.
Passando dos aspectos gerais da aglomeração de aerossóis para a emissão de
partículas a partir de instalações de combustão, é possível dividir estas partículas em duas
categorias distintas. Segundo Wiinikka (2005), estas podem ser partículas primárias ou
secundárias. As partículas primárias são formadas a altas temperaturas na zona de
combustão, ao passo que as partículas secundárias são formadas na pluma dos gases de
exaustão ou na atmosfera. A categoria importante para o presente trabalho é a que contém as
partículas primárias.
As partículas primárias podem ser constituídas por espécies orgânicas ou inorgânicas,
ou até uma combinação de ambas. Existe uma distribuição multimodal de tamanho nestas
partículas, sendo as mais finas produzidas através da conversão de gás para partícula,
formando nanopartículas que, por sua vez, se tornam maiores através da coagulação e
crescimento superficial. As partículas com maior dimensão (mas ainda contidas na fracção
submicrométrica) são produzidas através de matéria inorgânica, presente no combustível, que
permanece na fase sólida ou líquida. Das partículas que se formam através de precursores
gasosos em sistemas de combustão apenas interessa considerar para o presente trabalho as
partículas de fuligem e as partículas inorgânicas, ambas produzidas no interior da câmara de
combustão.
10
A combustão incompleta é a principal causa da formação de partículas de fuligem, sendo
estas essencialmente compostas por carbono. A maior parte das reacções químicas que dão
origem a este tipo de partículas são irreversíveis. Apesar da complexidade da formação da
fuligem, existem autores que explicitam as bases da sua formação (Bockhorn, 1994). A figura 3
mostra uma simplificação do seu processo de formação.
Figura 3 – Formação de fuligem numa chama de pré-mistura (Bockhorn, 1994).
Existe aplicação industrial para a fuligem, tal como produção de tinta de impressão ou
como constituinte do material de um vulgar pneu de borracha – Warnatz et al. (2006) defendem
que pode representar 60% da matéria-prima necessária. Sendo extremamente indesejável
como produto final em processos de combustão, a sua presença é extremamente apreciada
em câmaras de combustão de caldeiras devido à sua elevada contribuição para a transferência
de calor por radiação. É assim desejável produzir fuligem nas zonas primárias da combustão,
deixar que radie para a envolvente e posteriormente proporcionar a sua oxidação.
A fuligem forma-se em condições ricas de combustão, em que há uma maior
probabilidade de colisão entre hidrocarbonetos (provenientes da pirólise) provocando a sua
aglomeração do que a probabilidade de se oxidarem e originarem CO ou CO2. No equilíbrio,
origina-se fuligem quando a razão carbono/oxigénio se torna superior à unidade.
Porém, quando se trata de chamas de difusão, haverá sempre formação de fuligem
mesmo em condições de um elevado excesso de ar. Isto deve-se à inevitabilidade da
existência de condições localmente ricas para a combustão no lado do combustível. Os
hidrocarbonetos existentes nestas zonas, fragmentam-se em pedaços menores que colidem
entre si e reagem com os gases envolventes para formar anéis aromáticos. A estes anéis são
11
adicionados grupos alquilos dando origem a hidrocarbonetos poliaromáticos (PAH na literatura
inglesa). Crê-se que o posterior crescimento destes hidrocarbonetos poliaromáticos seja o
precursor da formação de fuligem. O momento da génese da partícula surge quando o
hidrocarboneto poliaromático atinge entre 500 e 2000 u.m.a. (unidades de massa atómica),
dando origem a núcleos de fuligem cuja dimensão se situa entre 1 e 2 nm. Após a formação
dos núcleos, as partículas tendem a crescer por reacções de superfície e coagulação, sendo
que, numa última fase, quando a coagulação já não é possível, dá-se a aglomeração dos
compostos de fuligem. Grande parte da fuligem originada nestas condições é posteriormente
oxidada quando atinge a frente de chama, por reacção com oxigénio molecular e o radical OH.
Em certas condições também o oxigénio atómico, a água e o dióxido de carbono podem ser
importantes para essa reacção. A oxidação da fuligem está intrinsecamente ligada à
concentração de oxigénio e à temperatura, embora com o decaimento da temperatura, o
oxigénio perca importância para a reacção. Isto levanta problemas caso se recorra à adição de
ar à temperatura ambiente dado que pode levar ao decaimento da temperatura e reduzir a taxa
de oxidação de partículas de fuligem. É importante que a partícula permaneça em condições
propensas à sua oxidação durante um intervalo de tempo adequado, caso contrário poderá
contribuir para a emissão de aerossóis. No caso de combustíveis sólidos, como, por exemplo,
carvão, estima-se que a nucleação de partículas de fuligem se dê na envolvente da partícula
em combustão. Os compostos voláteis deste tipo de combustível são os precursores dessa
formação. Ao se libertarem do resíduo carbonoso originam um escoamento exterior ao resíduo.
Este escoamento, devido a fenómenos de impulsão, origina uma esteira a jusante do resíduo
em que existem condições para a formação de fuligem. A figura 4 mostra esse fenómeno.
Um outro tipo de aerossóis causados pela queima de combustíveis sólidos é formado por
partículas inorgânicas, tipicamente contidas no combustível como cinza. Este tipo de partículas
possui uma ampla distribuição de tamanhos, podendo ir da gama submicrométrica a alguns
milímetros. As cinzas de maior dimensão são normalmente retidas na câmara de combustão,
em recipientes apropriados para esse efeito, ao passo que as cinzas de menor dimensão
podem contribuir para as emissões ou para a formação de depósitos nas paredes da câmara
de combustão. Dando especial atenção à formação de partículas de cinza que contribuam para
a emissão de aerossóis, importa discutir a formação das que têm menor dimensão.
A figura 5 representa esquematicamente o processo de formação de partículas, incluindo
fuligem, na combustão de biomassa (Wiinikka, 2005). Tipicamente as partículas de cinza
podem separar-se em duas categorias, uma que engloba as partículas de dimensão
submicrométrica, e outra categoria que engloba as restantes partículas de cinza nos aerossóis.
Esta divisão é também fomentada por diferentes mecanismos de formação e crescimento das
partículas. Existem vários estudos sobre estes fenómenos na combustão de carvão
pulverizado, e dadas as semelhanças entre os mecanismos que gerem a formação de
partículas na combustão de carvão e na da biomassa, é possível extrapolar alguns resultados
obtidos desses estudos. Na combustão de carvão pulverizado, o combustível (tipicamente
12
partículas de carvão menores do que 100 µm) é injectado pelos queimadores na câmara de
combustão juntamente com ar, cuja função é transportar o combustível e alimentar a
combustão. A combustão destas partículas combustíveis segue o processo descrito na secção
1.3.1.
Figura 4 – Formação de fuligem a partir de uma partícula de carvão (Fletcher et al., 1997).
As partículas de cinza cujo tamanho está compreendido entre 1 µm e 20 µm são
produzidas pela fusão de compostos minerais na superfície de partículas em combustão, ao
passo que as que têm tamanho inferior a 1 µm são formadas através da vaporização e
posterior condensação de uma pequena porção de compostos minerais. A maioria dos
compostos minerais (> 99%) une-se para formar gotículas de cinza na superfície do resíduo
carbonoso. Se as partículas de resíduo carbonoso se mantivessem intactas durante a
combustão, obter-se-ia uma partícula de cinza por cada partícula de combustível. Contudo isso
não acontece, e dada a fragmentação do resíduo carbonoso durante o processo de combustão,
este pode dar origem a algumas partículas (3 – 5) de 10 µm a 20 µm de diâmetro, juntamente
com um grande número de partículas na ordem de 1 µm a 3 µm.
A restante fracção dos compostos minerais vaporiza durante a combustão do resíduo
carbonoso. Desta fracção, os óxidos metálicos refractários (tais como SiO2, CaO, MgO) sofrem
uma redução pelo CO presente no resíduo carbonoso formando vapores inorgânicos (neste
caso SiO, Ca, Mg). Estes vapores difundem-se para longe da partícula de resíduo carbonoso e
quando se encontram numa zona rica em oxigénio voltam a oxidar-se para os compostos
iniciais com uma baixa pressão de vapor. Devido a este factor, estes compostos dão origem a
aerossóis extremamente finos por via da nucleação. Posteriormente aumentam de tamanho por
colisões moleculares na esteira da partícula de resíduo carbonoso. A dimensão destas
partículas situa-se abaixo de 0,2 µm, podendo seguidamente dar origem a agregados com
<1µm, com 15 a 25 partículas. Este tipo de agregados submicrométricos é formado por uma
estrutura estratificada, no seu cerne estão presentes partículas provenientes de óxidos
13
refractários e na camada exterior noutros compostos inorgânicos que condensaram
posteriormente. No caso do carvão, a fracção vaporizada depende essencialmente das
condições de combustão e tipo de carvão. Grandes fracções de compostos vaporizados estão
relacionadas com altas temperaturas e com a presença de elementos de cinza que vaporizem
facilmente.
Uma grande percentagem da informação obtida em relação ao carvão é também
aplicável à combustão de biomassa, com as principais diferenças a deverem-se à diferente
percentagem de cinzas presente em cada combustível. É também importante referir que a
composição das cinzas de biomassa é dominada por sais alcalinos com baixos pontos de
fusão.
Figura 5 – Formação de partículas na combustão de biomassa (adaptado de Wiinikka, 2005).
Wiinikka (2005) afirma que o primeiro passo na formação de aerossóis submicrométricos
a partir da combustão da biomassa é originado pela vaporização de compostos inorgânicos
presentes na biomassa. O cloro é libertado em duas fases, sendo a primeira a temperaturas
até 500 °C, e a segunda no intervalo compreendido entre 700 °C e 900 °C. A massa libertada
em cada fase é variável, podendo situar-se entre 20% e 70% na primeira fase e grande parte
do restante libertar-se-á na fase seguinte. Os compostos alcalinos tendem a libertar-se para a
fase gasosa durante a combustão do resíduo carbonoso. No intervalo de temperaturas entre
700 °C e 830 °C todo o KCl evapora, podendo mesmo haver dissociação das moléculas e o
14
potássio reagir com a sílica e formar silicatos de potássio. Entre 830 °C e 1000 °C o potássio
presente em K2CO3 dissocia-se em KOH e K, e acima destas temperaturas o potássio pode
dissociar-se dos silicatos formados assim como do resíduo carbonoso. A temperatura de
combustão e composição de cinzas influenciam bastante a libertação de cloro, potássio e
enxofre para a fase gasosa. Sabe-se que a libertação de potássio é já intensa quando a
temperatura excede 700 °C, e que a partir de 1150 °C pode haver a libertação de até 90 % de
potássio para a fase gasosa. Caso a biomassa possua um valor razoável de sílica, o potássio
pode integrar-se com a matriz de sílica e tornar-se menos passível de ser vaporizado. Um outro
caso é a elevada presença de cloro que pode dar origem a uma elevada libertação de potássio
através de KCl devido à alta pressão de vapor deste composto. Quanto ao enxofre, até 500 °C
pode ter uma libertação de 55%, podendo (no caso de altas percentagens de sílica no
combustível) haver um forte incremento na sua libertação a partir de 800 °C.
1.3.4. Estudos antecedentes Fernandes e Costa (2011) conduziram um trabalho experimental que visou a
quantificação e caracterização das partículas sólidas emitidas durante o funcionamento de uma
caldeira doméstica alimentada a pellets. As partículas resultantes da combustão de biomassa
nesta instalação foram recolhidas com o auxílio de um impactor de baixa pressão com três
estágios, e a posterior pesagem dos elementos de recolha de partículas permitiu quantificar as
partículas recolhidas em cada um dos três estágios. Este estudo revelou que uma grande parte
das partículas emitidas tem um tamanho acima de 10 µm e ainda que outra grande
percentagem de partículas emitidas tem um tamanho inferior a 2,5 µm. Análises num SEM
revelaram três tipos de estruturas características: partículas ultra finas (< 100 nm), partículas
submicrométricas e partículas/agregados micrométricos. As partículas ultra finas são
maioritariamente compostas por O, K, Cl, Na e S; ao passo que as restantes partículas,
formadas a partir da fuligem, são constituídas por C, O, Ca, Mg, K e P.
Sippula et al. (2007) realizaram medições de partículas e emissões gasosas numa lareira
doméstica de 8 kW. Neste trabalho recorreram a um impactor para remover partículas maiores
que 1 µm e paralelamente a um ELPI para quantificar partículas na ordem de 0,029 – 10,2 µm.
A amostragem foi levada a cabo durante 60 a 90 min. De referir que antes da amostragem
nestes equipamentos se procedeu a uma diluição dos gases da combustão usando ar filtrado
permitindo a obtenção de uma taxa de diluição média na ordem de 80:1. Verificaram que o
aumento de matéria inorgânica na composição do combustível e a não totalidade da queima do
combustível originava um aumento na emissão de partículas.
Wiinikka et al. (2006) estudaram a influência do conteúdo de cinzas do combustível na
formação de aerossóis a altas temperaturas na combustão de pellets de biomassa. Os autores
usaram um impactor de baixa pressão de 13 estágios que recolhe partículas na ordem de 0,03-
15
10 µm. De referir que neste caso existiu formação de partículas devido a fenómenos de
nucleação de vapores inorgânicos que são demasiado pequenas para serem recolhidas.
Precedendo este dispositivo estava uma sonda de diluição rápida. Para análise das amostras
utilizaram uma balança com precisão de 0,001 mg e ainda um microscópio electrónico e de
difracção de raios X. Os autores obtiveram várias conclusões, de entre as quais se destacam a
distribuição bimodal de partículas em torno da região PM2.5, com um modo fino e um modo
grosseiro claramente distintos; na região da chama há domínio das partículas provenientes da
combustão incompleta (fuligem e outros hidrocarbonetos) que tendem a oxidar na zona quente
e rica em oxigénio.
Wiinikka et al. (2004) analisaram os parâmetros críticos para a emissão de partículas
provenientes da queima de biomassa em leito fixo. Os métodos de recolha e análises de
partículas são semelhantes aos utilizados no trabalho anteriormente descrito, com recurso a
uma diluição de 50:1. As suas conclusões são de que com o aumento da temperatura da
parede há uma redução de emissão de fuligem e de cinza grosseira mas há um aumento de
emissão de cinza submicrométrica; afirmam também que existe uma grande influência no
ângulo da injecção de ar na emissão de fuligem. A conclusão final aponta para a redução da
temperatura de combustão do resíduo carbonoso e um aumento de temperatura na zona
secundária de combustão com vista a diminuir a emissão total de partículas.
Wiinikka e Gebart (2005) estudaram a influência da taxa de distribuição de ar na
formação de partículas devido à queima de biomassa em leito fixo. Concluíram que a
distribuição de ar para combustão tem um grande efeito na emissão de partículas, em
particular, uma grande percentagem de ar primário leva a uma maior temperatura na chama e,
consequentemente, a uma maior vaporização dos elementos da cinza e também a um aumento
do número de partículas finas. No entanto é com ar primário e secundário igualmente
distribuídos que se obtém um menor número de partículas grosseiras. Contudo este tipo de
partículas é facilmente retido, e as condições de queima devem ser optimizadas para a
geração mínima de partículas finas dado que essas são as mais difíceis de captar e ainda
porque são as mais prejudiciais à saúde.
Johansson et al. (2004) compararam as características de emissões de caldeiras
residenciais antigas e modernas alimentadas a troncos de madeira e pellets de madeira. Em
conjunto com o registo das emissões gasosas também procederam ao registo das emissões de
partículas. No que às partículas diz respeito usaram duas linhas separadas de amostragem,
uma para concentração mássica total e outra para a concentração em número e distribuição
por tamanho. A segunda linha estava equipada com um ELPI para a concentração numérica de
partículas e distribuição por dimensão, enquanto a concentração mássica por dimensão estava
a cargo de um DLPI. Além das várias conclusões referentes à comparação entre caldeiras
antigas e modernas, com uma eficiência superior reportada nas caldeiras modernas, há ainda
outras conclusões de relevo. Os autores reportaram um aumento nas emissões de CO
aquando do funcionamento com grandes excessos de ar e que os autores apontam como
16
sendo provavelmente devido ao arrefecimento do processo de combustão. A elevada emissão
de CO surge acompanhada de emissões de componentes inoxidados tais como carbonos
orgânicos (TOC), PAH, metano e ainda outros compostos orgânicos voláteis. Até ao valor de
100mg/MJ na concentração dos TOC a concentração mássica de partículas emitidas foi
independente das restantes emissões; a partir deste valor a concentração mássica de
partículas. Concluíram também que a emissão de partículas submicrométrica é potenciada por
condições pobres de combustão / regimes pobres.
Glasius et al. (2008) conduziram um estudo sobre o impacte ambiental decorrente da
combustão de madeira modelando uma variação espacial numa área onde se haviam registado
baixas emissões. Os autores recorreram a vários aparelhos para quantificar a distribuição de
tamanhos das partículas e, entre outras medidas, medir a fuligem transportada pelo
escoamento recorrendo a um PSAP. Este artigo visou obter nova informação sobre a
exposição das populações às partículas e PAH emitidos a partir da combustão de madeira.
Concluíram que as concentrações de PM2.5 são bastante elevadas ao início da noite apesar de
não haver um grande número de equipamentos de queima de madeira. Foi possível inferir qual
o grau de exposição da população a este tipo de partículas.
Fitzpatrick et al. (2007) levaram a cabo um estudo sobre a emissão de espécies
oxigenadas a partir da combustão de pinho e a sua relação com a formação de fuligem. Os
autores procederam à recolha de amostras de fuligem em três pontos distintos da câmara de
combustão recorrendo a filtros de quartzo 1,2 µg com o auxílio duma bomba para a sucção e
deposição nos filtros. Foram recolhidos gases existentes na chama através de uma sonda
dotada de um filtro aquecido para remover partículas, seguindo a jusante por uma linha
aquecida a 190 °C até um FTIR. Este dispositivo foi calibrado para detectar 65 espécies
simultaneamente, tendo em conta que só detecta espécies para as quais foi calibrado. Os
produtos de combustão mais tóxicos e mais prejudiciais ao ambiente são os hidrocarbonetos,
espécies orgânicas oxigenadas, PAH, fuligem, monóxido de carbono e fumo. Durante a fase de
remoção de material volátil, as emissões destes produtos foram máximas, contudo as emissões
de monóxido de carbono e de hidrocarbonetos ocorreram durante a combustão do resíduo
carbonoso. Verificaram que as concentrações estiveram no seu máximo aquando da maior
taxa de combustão da biomassa. Concluíram que as partículas derivadas da combustão de
biomassa possuem maiores funcionalidades inerentes ao oxigénio do que a fuligem
proveniente da queima de hidrocarbonetos e absorvem os principais produtos da pirólise tais
como ácidos orgânicos, aldeídos e fenóis.
Wiinikka et al. (2006) conduziram um trabalho experimental com vista a obter medições
do interior de uma câmara de combustão para estudar a formação de aerossóis a alta
temperatura na combustão de pellets de madeira. Recorrendo a uma sonda de diluição rápida,
um DLPI e restantes periféricos, obtiveram uma distribuição espacial da formação de partículas
sólidas numa caldeira a biomassa. Deparam-se com bimodalidade na distribuição de tamanhos
nas partículas na região de PM2.5. Concluíram que na zona de combustão pobre em oxigénio
17
domina a presença de partículas finas, decrescendo a sua concentração a um mínimo logo
após a zona de combustão rica em oxigénio. Registaram também um aumento de diâmetro das
partículas ao longo da zona de pós combustão. As partículas de fuligem derivadas da
combustão incompleta dominam a emissão de partículas finas, sendo posteriormente oxidadas
nas zonas de alta temperatura e com alta disponibilidade de oxigénio. Traçaram a evolução e
transformação de estados físicos dos compostos das cinzas ao longo da temperatura na
câmara de combustão.
1.4. Estrutura da dissertação A presente dissertação está organizada em quatro capítulos, dos quais o presente
constitui a introdução. O segundo capítulo é dedicado à descrição da instalação experimental,
dos equipamentos de medidas e, ainda, à descrição do procedimento experimental. Os
resultados e discussão constituem o terceiro capítulo. Finalmente, o quarto capítulo é
reservado às conclusões do presente trabalho, e, ainda, às sugestões de trabalhos futuros.
18
2. Instalação experimental
2.1. Caldeira e equipamento auxiliar No presente trabalho foi utilizada uma caldeira da marca Anselmo Cola, modelo TERMO
IDEAL CERAMIC 22 kW com extracção forçada (Figura 6). Como produto da União Europeia
respeita a norma EN 14785:2006 que regulamenta a operação de queimadores de pellets,
requisitos e métodos de teste. As suas dimensões exteriores são 1204 mm de altura (excluindo
o painel de controlo do equipamento), 602 mm de largura, 638 mm de profundidade (Figura 7)
e tem uma tara de 210 kg. A estrutura e a câmara de combustão são constituídas por aço e
ferro fundido. Funciona com o auxílio de corrente eléctrica para o sistema electrónico de
gestão, resistência de ignição, actuação da bomba de água, ventilação da exaustão e
movimento do sem-fim de alimentação. Trata-se do mesmo equipamento usado por Rabaçal
(2010) e Fernandes e Costa (2011), modificada no decorrer do presente trabalho para
possibilitar a realização de medidas no interior da câmara de combustão.
Figura 6 – Instalação experimental.
19
Figura 7 – Dimensões da caldeira (em milímetros).
A caldeira possui um circuito interno de água destinado a um sistema de aquecimento
central e um circuito opcional para aquecimento de águas sanitárias, tendo este último sido
anulado. O equipamento dispõe de uma bomba que promove a circulação da água entre o
permutador de calor da caldeira e um permutador de calor exterior. O depósito de pellets da
caldeira tem uma dimensão de aproximadamente 66 litros (45 kg de pellets) e a alimentação de
pellets para a câmara de combustão é feita com o auxílio de um parafuso sem-fim localizado
no fundo do depósito. Este parafuso é actuado por impulsos e desloca as pellets por uma calha
ascendente, sendo depois libertadas alguns centímetros acima do queimador.
A câmara de combustão da instalação possui um queimador central e está ladeada por
um permutador de calor em ferro fundido, cuja forma envolve as paredes laterais, traseira e
topo da câmara de combustão. A parte frontal da câmara possui uma porta em ferro fundido
com uma janela de vidro cerâmico com dimensões de 300 mm x 300 mm. Abaixo do queimador
encontra-se o cesto para armazenagem de cinzas libertadas durante o processo de
combustão. Existe ainda uma parede metálica que envolve o permutador, havendo um
espaçamento entre ambos. Nesse espaço passam os gases de exaustão que seguem em
direcção ao ventilador, proporcionando a transferência de calor entre os gases e a água do
permutador. A figura 8 mostra imagens do (a) interior da câmara de combustão e a (b)
instalação em operação. Na figura 8a) pode observar-se algumas das portas construídas nas
paredes laterais da câmara de combustão para a introdução de sondas. Estas portas foram
concebidas no decorrer deste trabalho, possuindo um diâmetro interno de 27 mm. Utilizaram-se
tampas de latão para tamponar as portas quando não estavam a ser utilizadas.
20
a) b)
Figura 8 – a) Interior da câmara de combustão; b) instalação durante a realização de medidas de partículas.
A figura 9a) mostra um esquema da câmara de combustão, indicando a localização das
portas de medida e mostrando detalhes do queimador, sendo que a figura 10 mostra a
resistência de aquecimento situada na grelha. A câmara de combustão possui simetria interna
entre a localização do queimador e as paredes laterais, estando o eixo central do queimador
distanciado de 16 cm de cada parede lateral da câma de combustão.
Figura 9 – a) Esquema da câmara de combustão, localização das portas de medida (valores em
milímetros) e detalhes do queimador.
21
Figura 10 – Pormenor da resistência de aquecimento.
As figuras 11 e 12 mostram o cesto de recolha de cinzas e o ventilador, respectivamente.
Figura 11 – Cesto de recolha de cinzas.
Figura 12 – Pormenor do ventilador de extracção, visível após remoção do cesto de recolha de
cinzas.
Resistência
22
A presente caldeira possui também um sistema electrónico de gestão que, entre outras
funções, procede ao arranque da caldeira, à sua paragem e monitoriza a temperatura da água
com vista a fazer a modulação da alimentação das pellets. O sistema possui uma interface que
permite configurar alguns parâmetros de funcionamento da caldeira, de entre os quais importa
salientar a regulação dos impulsos do sem-fim. A regulação destes impulsos está directamente
relacionada com a quantidade de pellets fornecida por unidade de tempo. No sistema
electrónico de gestão encontram-se dois parâmetros para esta regulação, potência máxima e
modulação. Em ambos, o seu valor predefinido é zero. Este valor indica a percentagem de
redução de impulsos do sem-fim, face às condições de projecto. A redução máxima permitida é
de 30% para a potência máxima e 11% para a modulação.
A instalação dispõe, ainda, de sensores de temperatura para monitorizar a temperatura
do depósito de pellets, temperatura da água do permutador de calor e temperatura dos gases
de exaustão. Possui também sensores de pressão que monitorizam a pressão da água no
interior do permutador, e outros que monitorizam a pressão do ar na câmara de combustão. A
monitorização destes parâmetros possibilita ajustes automáticos durante o funcionamento da
caldeira, tais como, por exemplo, a actuação da bomba de água.
O consumo de pellets foi avaliado com recurso a uma balança digital Sartorius com uma
sensibilidade de 20 gramas, ligada a um computador através de uma porta RS 232. O valor da
massa foi registado automaticamente a cada minuto e a perda de massa registada permite
calcular o consumo horário de pellets da caldeira.
O funcionamento normal da instalação segue o padrão definido pelo fabricante
contemplando as fases de arranque, aquecimento, funcionamento estacionário, modulação,
limpeza e paragem. No ecrã do painel de controlo há uma constante informação sobre a fase
em que se encontra o funcionamento da caldeira. A fase de arranque começa com uma
verificação dos sensores de pressão e temperatura da instalação, seguindo-se o aquecimento
da resistência e o carregamento de pellets para o queimador juntamente com a extracção de
gases que promove a depressão necessária ao funcionamento da caldeira. Eventualmente
ocorre a ignição das pellets que estão junto à resistência e surge uma pequena chama.
Seguidamente, o sensor de temperatura montado na exaustão detecta a presença de chama e
o funcionamento fica condicionado à detecção de uma chama estável. Após a detecção de
chama estável, tem lugar uma alimentação de pellets constante, que eleva a temperatura da
água no interior da caldeira. Assim que a temperatura é de 54 °C a bomba de água entra em
funcionamento fazendo circular a água do permutador principal para o circuito exterior,
podendo aqui considerar-se que termina a fase de aquecimento da caldeira. Entre 54 °C e 75
°C, tem lugar a fase de funcionamento em regime estacionário. Esta fase é caracterizada por
uma alimentação regular de pellets que conduz a uma libertação constante de energia térmica.
Durante o funcionamento estacionário da instalação, ocorre a cada 11,5 min um ciclo de
limpeza que dura 30 s. É caracterizado por um aumento no fornecimento de ar e por um
decréscimo acentuado no fornecimento de pellets, levando, assim, a uma limpeza parcial do
23
queimador, arrastando para fora cinzas e pequenas partículas de combustível. Deste modo
evitam-se obstruções ao fornecimento de ar para a combustão.
Caso a temperatura atingida pela água de circuito interno seja superior ao valor definido,
no presente caso 75 °C, o sistema induz a modulação da combustão reduzindo a alimentação
de pellets a um mínimo, até que a temperatura da água esteja 6 °C abaixo da temperatura
definida.
Finalmente, uma das condições de projecto deste equipamento é dada pela
especificação do seu combustível que tem de obedecer ao padrão definido pela norma DIN
51731. A tabela 1 resume essas características das pellets.
Tabela 1 – Especificações do combustível admitido.
Característica Especificação
Poder calorífico inferior > 17,28 MJ/kg
Massa volúmica 680 - 720 kg/m3
Humidade relativa < 10%
Diâmetro 6 ± 0,5 mm
Cinzas < 1,5%
Comprimento Min: 6 mm; max: 30 mm
Composição 100% madeira não tratada sem substâncias aglutinantes ou resíduos
2.2. Técnicas de medida
A figura 13 representa esquematicamente a instalação experimental e equipamentos de
medida utilizados no presente trabalho. De forma a assegurar o funcionamento da caldeira em
regime estacionário é necessário remover o calor produzido, utilizando para isso um
permutador de calor que promove a troca de calor entre a água do circuito interno da caldeira e
a água da rede. Os termopares representados na figura 13 foram colocados à entrada (T1) e à
saída (T2) do circuito de água da caldeira.
A amostragem dos gases para a medição das concentrações de espécies químicas
gasosas no interior da câmara de combustão foi efectuada recorrendo a uma sonda de aço
inoxidável de arrefecimento convectivo indirecto com recurso a água. A sonda foi colocada nas
portas acima descritas para se fazer o atravessamento da câmara de combustão. A figura 14
representa esquematicamente a sonda utilizada, onde as principais dimensões estão
indicadas.
A amostra é recolhida através do tubo central da sonda, com 3 mm de diâmetro. Dois
tubos concêntricos exteriores envolvem o tubo central de modo a permitir a passagem da água
de arrefecimento. Tal como representado na figura 13, a amostra de gases é extraída da
câmara de combustão e é condicionada num sistema onde a humidade é retirada num
24
condensador e em gel de sílica, e em que as partículas são recolhidas em filtros sendo
posteriormente enviada uma amostra limpa e seca para os vários analisadores que medem a
concentração das espécies em percentagens volúmicas secas. Na tabela 2 estão listados os
analisadores utilizados para a medição da concentração das espécies gasosas juntamente com
o seu princípio de funcionamento. Para obter os valores das concentrações de espécies
químicas gasosas realizaram-se dois atravessamentos da câmara de combustão, por porta, em
sentidos diferentes. Em cada ponto de medida foram registados os valores médios dessas
concentrações, obtidos ao longo de 2 minutos em cada atravessamento.
Figura 13 – Representação esquemática da instalação experimental, incluindo as técnicas de
medida.
Os analisadores foram calibrados com misturas padrão antes de cada sessão de
medidas. Os sinais analógicos provenientes dos analisadores são transmitidos para um
computador usando placas de conversão A/D, onde os dados são registados a cada segundo.
Para a medição da temperatura nos dois pontos assinalados na figura 13 (T1 e T2)
foram utilizados termopares do tipo K (Ni-Cr/Ni-Al), apropriados para medições de temperaturas
inferiores a 1000 °C. Os sinais analógicos provenientes dos termopares são transmitidos para
um computador, usando uma placa de conversão A/D, onde os dados são registados a cada
segundo.
BOILER
FluegasPellets
Waternetwork
T1
T2
Weighbridge
220 V
RS 232
Filter
N2 Exhaust
Exhaust
Pump
Pump
Filter
LPI
12 bit A/D
CO and CO2analyzers
O2 analyzerNOx analyzerHC analyzer
Silica gel
Cotton filter
Zero gas andspan gas
Diaphragm pump
Termocouple R
CondenserWater out
Water in
25
Figura 14 – Representação esquemática da sonda usada para as medidas das concentrações das
espécies gasosas no interior da câmara de combustão (dimensões em milímetros).
Tabela 2 – Descrição dos analisadores de gases.
Espécie Analisador Princípio de funcionamento
O2 Horiba
Modelo CMA-311 A Paramagnetismo
CO2 Horiba
Modelo CMA-311 A Não dispersivo de infravermelhos
CO Horiba Modelo VIA-510 Não dispersivo de infravermelhos
NOx Horiba PG-250 Quimiluminescência
HC Amluk Modelo FID E 2020 Detecção por ionização de chama
A figura 15 representa esquematicamente o termopar tipo R usado para as medidas de
temperatura na câmara de combustão. Este termopar do tipo R (Pt/Pt-13%Rh) é apropriado
para medições de temperaturas até 1700 °C. O sinal analógico proveniente dos termopares foi
transmitido a um computador usando uma placa de conversão A/D onde os dados são
registados a cada meio segundo. Em cada ponto de medida, foi registado o valor médio da
temperatura obtido ao longo de 30 segundos em cada atravessamento.
Figura 15 – Representação esquemática da sonda de termopar tipo R usada para as medidas de
temperatura no interior da câmara de combustão.
26
A recolha da amostra de partículas do interior da instalação foi feita recorrendo a uma
sonda em quartzo projectada a partir dos dados de Strand et al. (2004) e adaptada às
necessidades da instalação. O projecto da mesma fez parte da presente dissertação. A figura
16 mostra a representação esquemática da sonda em quartzo para as medições de partículas.
Figura 16 – Representação esquemática da sonda em quartzo usada para as medidas de partículas
no interior da câmara de combustão (dimensões em milímetros).
A adição de azoto tem como função congelar as reacções existentes no ponto de
recolha. O caudal de azoto, de 20,0 l/min, foi monitorizado através de um caudalímetro digital
Omega FMA-A2317 calibrado. A quantificação das partículas recolhidas foi feita recorrendo a
um DLPI (figura 17). Este dispositivo permite a recolha de partículas presentes num
escoamento de ar, com diâmetros aerodinâmicos compreendidos entre 0,03 – 10 µm. Possui
13 estágios em cascata e é atravessado por um caudal de 10 l/min, assegurado pela bomba
acoplada ao equipamento.
Como se pode observar na figura 13, usou-se também um porta-filtro da Tecora (figura
18) que permitiu fazer a recolha da totalidade das partículas presentes no escoamento. O filtro
é composto por microfibra de quartzo e será doravante denominado de filtro total.
A bomba de membrana usada para auxiliar a recolha de amostra do interior da câmara
de combustão foi posicionada a jusante do porta-filtro, fazendo passar através deste 15,5 l/min
de amostra diluída. A diluição da amostra recolhida foi feita numa proporção de
aproximadamente 1:12.
A deposição de partículas nos vários substratos do impactor foi avaliada recorrendo a
uma balança Kern com uma sensibilidade de 0,01 mg. O valor medido foi registado na folha de
cálculo fornecida pela Dekati para estimar a distribuição de partículas por diâmetros
aerodinâmicos. A pesagem do filtro total envolveu sempre uma secagem prévia do mesmo. Os
ensaios tiveram uma duração compreendida entre 30 e 150 minutos, dependendo do ponto de
medida e da concentração de partículas registada.
Os filtros de ambos os impactors foram analisados no microscópio electrónico de
varrimento (SEM na literatura inglesa), figura 19, com o intuito de avaliar os elementos
químicos e a morfologia das partículas captadas. O SEM permite obter imagens nítidas de uma
27
área seleccionada da amostra através da irradiação da mesma por um feixe de electrões. O
microscópio electrónico está equipado com um espectrómetro de dispersão de energia de raio-
X (EDS). A análise química associada à microscopia electrónica de varrimento é feita através
do feixe electrónico incidente sobre a amostra. Desta forma é possível caracterizar a
composição elementar do volume da amostra com uma resolução cujo diâmetro mínimo é de
aproximadamente 1 µm. A determinação da análise quantitativa é feita por comparação da
intensidade das riscas espectrais características de uma amostra com a intensidade das
mesmas riscas, obtidas nas mesmas condições instrumentais, mas em amostras de elementos
puros (ou de composição bem conhecida).
Figura 17 – Dekati Low Pressure Impactor.
Figura 18 – Porta-filtro Tecora.
Figura 19 – Imagem do SEM/EDS.
28
3. Resultados e discussão
3.1. Condições experimentais No presente trabalho foram obtidas medidas para uma condição de operação da
caldeira. A tabela 3 mostra as condições de funcionamento da caldeira.
Tabela 3 – Condições de funcionamento da caldeira.
Consumo de pellets (kg/h)
Carga térmica (kW)
Oxigénio nos gases de escape (%)
Temperatura dos gases de escape (°C)
3,42 16,1 16,6 172,6
As pellets utilizadas são do mesmo lote utilizado por Rabaçal (2010) e Fernandes e
Costa (2011). Trata-se de pellets produzidas e comercializadas pela Vimasol (Guimarães) a
partir de resíduos da indústria de transformação de madeira (serradura de pinho). A figura 20
mostra uma amostra das pellets utilizadas neste trabalho e a tabela 4 apresenta a análise
química do combustível utilizado no presente trabalho.
Figura 20 – Pellets de pinho
29
Tabela 4 – Análise química do combustível utilizado.
Análise imediata (% massa, base tal e qual) Voláteis 80,5
Carbono fixo 10,9 Humidade 7,3
Cinzas 1,3
Análise elementar (% massa, base seca) Carbono 46,0
Hidrogénio 6,2 Azoto 0,5
Enxofre <0,01 Oxigénio 47,3
Composição das cinzas (% massa)
SiO2 20,9 Al2O3 6,2 Fe2O3 21,6 CaO 26,2 SO3 0,3 MgO 4,3 TiO2 0,0 P2O5 4,2 K2O 11,5 Na2O 2,5
Cl 0,04 Outros óxidos 2,3
Poder calorífico e dimensões
PCI (MJ/kg) 16,9 Diâmetro médio das pellets (mm) 6
Comprimento médio das pellets (mm) 18
30
3.2. Temperaturas e concentrações de espécies químicas
Esta secção apresenta e discute os resultados experimentais detalhados de temperatura
e concentração de espécies químicas obtidos no interior da câmara de combustão.
A figura 21 mostra perfis radiais de concentração de espécies químicas obtidos na porta
4 em ensaios experimentais distintos. Como se pode observar, os resultados obtidos no dia 19
de Agosto são muito semelhantes aos obtidos no dia 25 de Agosto, com diferenças máximas
na ordem de 10%. Uma boa repetibilidade, tal como aqui mostrado, é fundamental em
trabalhos de cariz experimental como o presente.
Figura 21 – Perfis radiais de concentração de espécies químicas obtidos através da porta 4 em
dias diferentes, para a condição de operação da caldeira estudada (tabela 3).
A figura 22 mostra os perfis radiais de concentração de espécies químicas e temperatura
obtidos através das portas 1, 2, 3, 4 e 5 para a condição de operação da caldeira estudada
(Tabela 3). A figura revela que a principal zona de reacção se situa entre as portas 1 e 3, onde
os gradientes das quantidades medidas são mais intensos, sendo que, a partir da porta 3, as
concentrações de O2, CO2, CO e HC revelam o fim da zona de reacção principal.
Junto às paredes laterais da câmara de combustão, nas portas 1 e 2, observam-se
elevadas concentrações de O2, não só devido à ausência de reacção química nessas zonas,
mas também devido ao elevado excesso de ar associado ao funcionamento deste tipo de
caldeira.
No que se refere às concentrações de NOx, verifica-se que atingem os valores máximos
logo nas portas 1 e 2, onde as temperaturas são inferiores a 1200 ºC, longe, portanto, das
temperaturas para as quais o mecanismo térmico de formação de NO começa a ser relevante.
Isto sugere que o mecanismo do combustível de formação de NO deve ser o principal
contribuinte para as emissões de NOx. Na realidade, observando os valores da temperatura
medidos, verifica-se que estes nunca são superiores a 1200 ºC em toda a câmara de
O2,
CO
2 (d
ry v
olum
e %
)
NO
x(d
ry v
olum
e pp
m)
31
combustão. Na parte final da câmara de combustão, portas 4 e 5, as concentrações de NOx
tendem a estabilizar em torno de 60 ppm, valor próximo do medido na exaustão da caldeira.
Figura 22 – Perfis radiais de concentração de espécies químicas e temperatura obtidos através das
portas 1, 2, 3, 4 e 5, para a condição de operação da caldeira estudada (tabela 3).
A figura 23 mostra os perfis axiais de concentração de espécies químicas e temperatura
obtidos ao longo do eixo central do queimador através das portas 1, 2, 3, 4 e 5 para a condição
de operação da caldeira estudada (Tabela 3). De uma forma geral, as evoluções representadas
NO
x (d
ry v
olum
e pp
m)
O2,
CO
2 (d
ry v
olum
e %
)
CO
(dry
vol
ume
%)
HC
(dry
vol
ume
ppm
);Te
mpe
ratu
re (º
C)
32
na figura 23 permitem identificar a zona de reacção, sendo que as medidas de partículas foram
essencialmente obtidas nestas posições, como discutido na secção seguinte.
Figura 23 – Perfis axiais de concentração de espécies químicas e temperatura obtidos através das
portas 1, 2, 3, 4 e 5, para a condição de operação da caldeira estudada (tabela 3).
3.3. Partículas
Como foi referido na secção 2.2, as partículas foram recolhidas de vários pontos do
interior da câmara de combustão usando o impactor, com treze substratos, e um porta-filtro
total. A figura 24 mostra a concentração total de partículas recolhidas nos treze substratos do
impactor (identificado por LPI na figura) e no porta-filtro total (identificado por Filter na figura).
Como se pode observar os resultados obtidos são razoavelmente consistentes, sendo que os
valores obtidos com o porta-filtro total são sistematicamente superiores aos obtidos com o
impactor. Este é um resultado esperado dado que uma pequena fracção de partículas se
deposita fora do substrato no caso do impactor, enquanto no porta-filtro todas as partículas se
depositam no filtro.
Figura 24 – Concentração total de partículas recolhidas nos treze substratos do impactor e no
porta-filtro total.
O2CO2CO
NOxHCT
O2,
CO
2 (d
ry v
olum
e %
)
NO
x (d
ry v
olum
e pp
m)
0
20
40
60
80
100
02468
10121416
0
400
800
1200
1600
2000
Axial position (cm) Axial position (cm)0 5 10 15 20 0 5 10 15 20
CO
(dry
vol
ume
%)
HC
(dry
vol
ume
ppm
); T
(ºC
)
012345678
LPIFilter
500700900110013000
20
40
60
80
100
120
Temperature (ºC)
PM(m
g/N
m3 )
33
A figura 25 mostra a distribuição dos diâmetros das partículas em diversos pontos de
medida. Verifica-se que, ao longo do eixo central do queimador, a quantidade total de
partículas decresce significativamente desde a porta 1 até à porta 2. Isto revela que as
partículas se formam rapidamente no início do processo de combustão, possivelmente
partículas de fuligem, sendo que a sua taxa de oxidação, entre a porta 1 e 2, é também
elevada. Aparentemente, após a porta 2, a taxa de oxidação da fuligem decresce rapidamente,
provavelmente, em resultado do decréscimo significativo da temperatura observado nessa
região.
É interessante observar que o diâmetro correspondente à quantidade máxima de
partículas aumenta ligeiramente desde a porta 1 até à porta 4, indicando alguma tendência
para a formação de agregados. Entre a porta 4 e a porta 5, observa-se um decréscimo do
diâmetro correspondente à quantidade máxima de partículas, presumivelmente em resultado
de alguma fragmentação de agregados.
Figura 25 – Distribuição dos diâmetros das partículas em diversos pontos de medida.
Nas três posições de medida afastadas do eixo central do queimador verifica-se que a
taxa de oxidação de fuligem é aparentemente menor do que a observada ao longo do eixo
central entre a porta 1 e 2. Dado que esta região corresponde à frente de chama (ver figura
22), pode concluir-se que as taxas de formação e destruição de fuligem são aqui muito
Port 1
0 5.0Radial position (cm)
7.5 10.0
Port 2
Port 3
Port 4
Port 5
0
20
40
6080
0.01 0.1 1 10
0
20
40
60
80
0.01 0.1 1 10
0
20
40
60
80
0.01 0.1 1 10
0
20
40
60
80
0.01 0.1 1 10
0
20
40
60
80
0.01 0.1 1 100
20
40
60
80
0.01 0.1 1 10
0
20
40
60
80
0.01 0.1 1 10
0
20
40
60
80
0.01 0.1 1 10
Particle diameter Dp (µm) Particle diameter Dp (µm)
Particle diameter Dp (µm)
Particle diameter Dp (µm)
dm/d
log(
Dp)
(mg/
Nm
3 )
dm/d
log(
Dp)
(mg/
Nm
3 ) dm/d
log(
Dp)
(mg/
Nm
3 )
34
semelhantes. Apesar de tudo é notória alguma formação de agregados entre a porta 2 na
posição r = 7,5 cm e a porta 3 na posição r = 10 cm.
Subsequentemente, as partículas foram analisadas num SEM equipado com EDS. As
figuras 26 a 30 mostram a composição química e imagens típicas da morfologia dos agregados
nas portas 1 a 5 ao longo da linha central do queimador, respectivamente. Refira-se que os
resultados dizem respeito às partículas retidas no substrato 3. Cada uma das amostras foi
analisada em cinco áreas de 50 µm x 50 µm, tal como se pode observar nas figuras.
A escolha do substrato 3 de cada ponto de medida deve-se à elevada quantidade de
partículas que este apresenta face aos outros substratos, tal como observado por Wiinikka et
al. (2006) num trabalho semelhante. O diâmetro médio das partículas retidas no substrato 3 é
da ordem de 0,1 µm.
Figura 26 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1 no substrato 3.
Figura 27 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 2 no substrato 3.
As figuras 26 a 30 mostram o decaimento consistente da concentração de carbono
desde a porta 1 até à 5, tal como discutido acima. A par deste facto, é possível observar um
aumento da concentração de elementos inorgânicos desde a porta 1 até à porta 5. Isto deve-se
ao facto destes compostos, que existem na fase gasosa na zona de reacção principal entre a
porta 1 e 3, tenderem a condensar e solidificar com o decaimento da temperatura. Na análise
35
destes elementos é interessante observar a mudança de aspecto das partículas, sugerindo
mudança de fase dos elementos inorgânicos, principalmente nas portas 3, 4 e 5.
Figura 28 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 3 no substrato 3.
Figura 29 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 4 no substrato 3.
Figura 30 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 5 no substrato 3.
Nas portas 3 e 4 pode observar-se que pequenas partículas (provavelmente fuligem)
apresentam-se envoltas por compostos inorgânicos que se depositaram nelas por
condensação heterogénea. Na porta 5, além da redução drástica da concentração de carbono
36
devido à sua oxidação, pode observar-se que se formam compostos cristalinos, sugerindo que
as temperaturas nesta zona não são suficientes para garantir a fluidez desses compostos.
Nesta porta, é também visível a fragmentação de grande parte dos agregados formados nas
portas 3 e 4.
As figuras 31 a 33 mostram os resultados obtidos na porta 1, posição r = 5 cm, na porta
2, posição r = 7,5 cm e porta 3, posição r = 10 cm, respectivamente, todas no substrato 3.
Figura 31 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1, posição r = 5 cm, no substrato 3.
Na porta 1, posição r = 5 cm, e porta 1, posição r = 0 (figura 26) quer as concentrações
de carbono, quer de elementos inorgânicos apresentam uma grande semelhança, devido à
proximidade entre os dois pontos de medida e estágio inicial do processo de combustão.
Figura 32 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 2, posição r = 7,5 cm, no substrato 3.
Entre a porta 2, posição r = 7,5 cm (figura 32) e a porta 2, posição r = 0 (figura 27)
existem diferenças substanciais nos resultados obtidos. Com efeito, a concentração de carbono
em r = 7,5 cm é notoriamente superior à registada em r = 0. A elevada concentração de
carbono nas partículas em r = 7,5 cm deve-se à escassez de oxigénio nesta zona da câmara
37
de combustão, o que associado às elevadas temperaturas torna esta região particularmente
propensa à formação de fuligem. Por outro lado, as diferenças na percentagem dos
componentes inorgânicos observadas deve-se a fenómenos moderados de condensação (e
nucleação) em r = 0.
Figura 33 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 3, posição r = 10 cm, no substrato 3.
Entre a porta 3, posição r = 10 cm (figura 33) e a porta 3, posição r = 0 (figura 28) podem
observar-se diferenças razoáveis na concentração de carbono e nas concentrações de
elementos inorgânicas. Em r = 10 cm, atendendo à morfologia e composição das partículas,
conclui-se que, devido às reacções de combustão, a condensação de compostos inorgânicos é
pouco significativa.
Finalmente, as figuras 26 e 34 a 37 mostram a composição química e morfologia das
partículas recolhidas na porta 1 no substrato 2 a 6. Verifica-se que a percentagem de carbono
é semelhante nos vários substratos, tal como acontece com a percentagem de compostos
inorgânicos. Estes dados permitem concluir que nesta zona em particular os compostos
existentes formam agregados de vários tamanhos. Esta observação sugere que a variação dos
dados recolhidos no impactor resulta apenas da variação da dimensão média dos agregados,
sendo a sua composição aproximadamente homogénea. Estes resultados são semelhantes
aos obtidos por outros autores, por exemplo, Wiinikka et al. (2006).
38
Figura 34 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1 no substrato 2.
Figura 35 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1 no substrato 4.
Figura 36 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1 no substrato 5.
39
Figura 37 – Composição química e morfologia dos agregados recolhidos na porta 1 no substrato 6.
A figura 38 mostra a evolução da composição de partículas (carbono e oxigénio) e
concentração de espécies químicas gasosas (CO2, O2, CO) em função da temperatura.
Observa-se que a formação de partículas de fuligem, compostas essencialmente por
carbono, se torna mais intensa com o aumento da temperatura. Ao observar os valores das
concentrações das espécies químicas gasosas (CO2, O2, CO) é possível confirmar que a
formação de partículas de fuligem se dá preferencialmente em zonas pobres em oxigénio,
sendo assim consequência de combustão incompleta.
Figura 38 – Evolução da composição de partículas (carbono e oxigénio) e concentração de espécies químicas gasosas (CO2, O2, CO) em função da temperatura.
O outro tipo de partículas recolhido nas medições realizadas é formado a partir dos
compostos presentes nas cinzas do combustível. Estes compostos tendem a sofrer alterações
do seu estado físico no intervalo de temperaturas considerado. Estes compostos podem ainda
sofrer transformações químicas motivadas por oxidação, redução e dissociação dos seus
elementos constituintes. A figura 39 mostra a evolução da composição de alguns elementos
40
inorgânicos presentes nas partículas (potássio, cloro, sílica e oxigénio) em função da
temperatura.
Figura 39 – Evolução da composição das partículas (potássio, cloro, sílica e oxigénio) em função da temperatura.
É possível observar que as concentrações de potássio e de cloro tendem a sofrer um
incremento com a redução da temperatura. Este facto deve-se essencialmente à condensação
de compostos que possuam cloro e/ou potássio na sua composição, tais como KCl e K2SO4,
entre outros. Sendo o oxigénio uma espécie que está presente em grande parte dos compostos
inorgânicos, o aumento da sua concentração segue o aumento da concentração de compostos
condensados com a redução da temperatura, tais como K2CO3 e K2SO4, entre outros.
41
4. Fecho
4.1. Conclusões
As principais conclusões deste trabalho:
• As medidas detalhadas de temperatura e concentração de espécies químicas no
interior da câmara de combustão revelaram que a zona principal de reacção se
situa entre as portas 1 e 3, onde os gradientes das quantidades medidas são
mais intensos, sendo que, a partir da porta 3, as concentrações de O2, CO2, CO
e HC revelam o fim da zona de reacção principal.
• As concentrações de NOx no interior da câmara de combustão atingem valores
máximos nas portas 1 e 2, onde as temperaturas são inferiores a 1200 ºC, longe,
portanto, das temperaturas para as quais o mecanismo térmico de formação de
NO começa a ser importante. Isto sugere que o mecanismo de formação de NO
a partir do azoto presente no combustível deverá ser o principal contribuinte para
as emissões de NOx.
• Verificou-se que, ao longo do eixo central do queimador, a quantidade total de
partículas decresce significativamente desde a porta 1 até à porta 2. Isto revela
que as partículas se formam rapidamente no início do processo de combustão.
Após a porta 2, a taxa de oxidação da fuligem decresce rapidamente,
provavelmente, em resultado do decréscimo significativo da temperatura
observado nessa região.
• O diâmetro correspondente à quantidade máxima de partículas aumenta
ligeiramente desde a porta 1 até à porta 4, indicando uma tendência para a
formação de agregados. Entre a porta 4 e a porta 5, observa-se um decréscimo
do diâmetro correspondente à quantidade máxima de partículas,
presumivelmente em resultado de alguma fragmentação de agregados.
• As análises químicas das partículas revelaram uma redução consistente da
concentração de carbono desde a porta 1 até à 5. A par deste facto, foi possível
observar um aumento da concentração de elementos inorgânicos desde a porta
1 até à porta 5. Isto deve-se ao facto destes compostos, que existem na fase
gasosa na zona de reacção principal entre a porta 1 e 3, tenderem a condensar
e solidificar com o decaimento da temperatura.
42
• Nas portas 3 e 4 pode observar-se que as pequenas partículas apresentam-se
envoltas por compostos inorgânicos que se depositaram nelas por condensação
heterogénea. Na porta 5, além da redução acentuada da concentração de
carbono devido à sua oxidação, pode observar-se que se formam compostos
cristalinos, sugerindo que as temperaturas nesta zona não são suficientes para
garantir a fluidez desses compostos.
4.2. Sugestões para trabalho futuro
Como trabalho futuro sugere-se a realização de caracterizações semelhantes à
presente, para outras condições de operação da caldeira e, sobretudo, outro tipo de pellets,
nomeadamente pellets de resíduos agrícolas.
Outro aspecto que poderá ser considerado diz respeito à optimização da admissão do ar
de combustão, nomeadamente avaliar o impacto da separação do ar de combustão em
primário, secundário e terciário na formação e emissão de partículas.
Finalmente, seria interessante desenvolver uma estratégia para separar a fuligem da
matéria inorgânica e, ainda, determinar a reactividade das partículas de fuligem para diversos
tipos de pellets.
43
5. Referências
Bockhorn, H. “Soot Formation in Combustion, Mechanisms and Models”, Springer Series in
Chemical Physics, Springer-Verlag, Berlin, 1994
Coelho, P., Costa M., “Combustão”. Edições Orion, 2007.
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