filipe santos fernandes da costa - adelinotorres.info · 2016-04-20 · de um órgão de...
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UNIVERSIDADE TCNICA DE LISBOA INSTITUTO SUPERIOR DE ECONOMIA E GESTO
Mestrado em Desenvolvimento e Cooperao Internacional
REGULAR A GLOBALIZAO : A REFORMA DO SISTEMA
INTERNACIONAL PARA A PROMOO DO DESENVOLVIMENTO
Filipe Santos Fernandes da Costa
Presidente: Doutor Adelino Torres Professor Catedrtico do Instituto Superior de Economia e Gesto da Universidade Tcnica de Lisboa
Vogal: Doutor Jos Alberto Rebelo Reis Lamego Professor Auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Vogal: Dr. Augusto Carlos Serra Ventura Mateus Professor Catedrtico Convidado do Instituto Superior de Economia e Gesto da Universidade Tcnica de Lisboa
Orientador: Professor Doutor Augusto Mateus
Lisboa, Julho/2008
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Glossrio
ADM Armas de Destruio Macia
AG Assembleia-Geral (das Naes Unidas)
AIEA Agncia Internacional de Energia Atmica
APD Ajuda Pblica ao Desenvolvimento
CEB Conselho Coordenador dos Dirigentes do Sistema das Naes Unidas
CDS Conselho de Desenvolvimento Sustentvel (das Naes Unidas)
CNU Carta das Naes Unidas
CPJP Conselho Pontifcio Justia e Paz
CS Conselho de Segurana (das Naes Unidas)
DSE Direitos Especiais de Saque
DOMP Departamento de Operaes de Manuteno da Paz (das Naes Unidas)
ECOSOC Conselho Econmico e Social (das Naes Unidas)
FMI Fundo Monetrio Internacional GATT General Agreement on Tariffs and Trade / Acordo Geral sobre Tarifas e Comrcio
IDE Investimento Directo Estrangeiro
IDH ndice de Desenvolvimento Humano
IFI Instituies Financeiras Internacionais
NATO/OTAN North Atlantic Treaty Organization / Organizao do Tratado do Atlntico Norte
NBQ (Armas) Nucleares, Biolgicas e Qumicas
OCDE Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico
OIM Organizao Internacional para as Migraes
OIPC Organizao Internacional de Polcia Criminal (INTERPOL)
OIT Organizao Internacional do Trabalho
OMA Organizao Mundial do Ambiente
OMC Organizao Mundial de Comrcio
ONG Organizao No Governamental
ONU Organizao das Naes Unidas
OPEP Organizao dos Pases Exportadores de Petrelo
PAE Programa de Ajustamento Estrutural
PD Pases Desenvolvidos
PIB Produto Interno Bruto
PMA Pases Mais Atrasados
PNB Produto Nacional Bruto
PNUA Programa das Naes Unidas para o Ambiente
PNUD Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento
PVD Pases em Vias de Desenvolvimento
SDN Sociedade das Naes
TNP Tratado de No Proliferao (Nuclear)
TRIM Trade Related Investment Measures / Medidas de Investimento Relativas ao Comrcio
TRIP Trade Related Intellectual Property Rights / Direitos de Propriedade Intelectual Relativos ao Comrcio UNCTAD/CNUCED United Nations Conference on Trade and Development / Conferncia das Naes Unidas sobre Comrcio e Desenvolvimento
UIP Unio Inter-Parlamentar
USD United States Dollar / Dlar dos Estados Unidos (da Amrica)
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REGULAR A GLOBALIZAO : A REFORMA DO SISTEMA INTERNACIONAL PARA PROMOO DO DESENVOLVIMENTO
Filipe Santos Fernandes da Costa
Mestrado em: Desenvolvimento e Cooperao Internacional
Orientador: Professor Doutor Augusto Mateus
Provas concludas em:
RESUMO: A realidade demonstra que as actuais instituies internacionais no
foram capazes de promover convenientemente o desenvolvimento
sustentvel internacional ou assegurar as condies de segurana que o
permita. Para reorientar o Sistema Internacional para a promoo do
desenvolvimento sustentvel internacional necessria uma profunda
reviso da sua arquitectura e funcionamento, no sentido de criar uma
verdadeira governana democrtica global; uma reforma capacitadora da
ONU, que lhe confira um papel centralizador do Sistema Internacional e a
transforme no efectivo instrumento de promoo da segurana e
desenvolvimento planetrios.
PALAVRAS-CHAVE: Integrao e globalizao: geral1; Organizaes Internacionais2; Emprstimos internacionais e os problemas da dvida3; Ajuda Externa4; Governo, Guerra, Lei e Regulao5; Papel das Organizaes Internacionais6.
Classificao do Journal of Economic Literature: 1 F - International Economics; F0 General; F02 - International Economic Order; Noneconomic International Organizations; Economic I ntegration and Globalization: General 2 F - International Economics; F1 Trade; F13 - Commercial Policy; Protection; Promotion; Trade Negotiations; International Organi zations 3 F - International Economics; F3 - International Finance; F34 - International Lending and Debt Problems 4 F - International Economics; F3 - International Finance; F35 - Foreign Aid 5 N - Economic History; N4 - Government, War, Law, and Regulation 6 O - Economic Development, Technological Change, and Growth; O1 - Economic Development; O19 - International Linkages to Development; Role o f International Organizations
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REGULATING GLOBALIZATION : REFORMING THE INTERNATIONAL SYSTEM FOR DEVELOPMENT PROMOTION
Filipe Santos Fernandes da Costa
Masters of Science in: International Cooperation and Development
Oriented by: Augusto Mateus, PhD.
Concluded on:
SUMMARY: Reality shows that current international institutions have failed to
properly promote international sustainable development, or guarantee the
enabling security environment. In order to redirect the International System to
the promotion of international sustainable development an in-depth revision of
its architecture and functioning is necessary, as to create a truly democratic
global governance. A reform that will enable the UN, granting it a centralizing
role in the International System and making it the effective instrument for the
promotion of planetary security and development.
KEYWORDS: Economic Integration and Globalization: General7; International Organizations8; International Lending and Debt Problems9; Foreign Aid10; Government, War, Law, and Regulation11; International Linkages to Development, Role of International Organizations12.
Classificao do Journal of Economic Literature: 7 F - International Economics; F0 General; F02 - International Economic Order; Noneconomic International Organizations; Economic I ntegration and Globalization: General 8 F - International Economics; F1 Trade; F13 - Commercial Policy; Protection; Promotion; Trade Negotiations; International Organi zations 9 F - International Economics; F3 - International Finance; F34 - International Lending and Debt Problems 10 F - International Economics; F3 - International Finance; F35 - Foreign Aid 11 N - Economic History; N4 - Government, War, Law, and Regulation 12 O - Economic Development, Technological Change, and Growth; O1 - Economic Development; O19 - International Linkages to Development, Role o f International Organizations
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5
ndice
Glossrio...........................................................................................................2
Resumos e palavras chave...............................................................................3
ndice................................................................................................................5
Lista de quadros e tabelas................................................................................6
Prefcio.............................................................................................................7
Agradecimentos................................................................................................8
Introduo....9
Captulo I - A Globalizao e o Sistema Internacional...18
I.1 Desafios ao Sistema Internacional...19
I.2 Globalizao e Desenvolvimento.20
Captulo II - Segurana e Desenvolvimento...................................................22
II.1. Responsabilidade de proteger.................................................................24
II.2. Dever de prevenir....................................................................................31
Captulo III - O Desenvolvimento Internacional.........................40
III.1. A problemtica do Desenvolvimento Internacional..........................41
III.2. Novas perspectivas para o Desenvolvimento Internacional...................49
Cap. IV - Reforma do Sistema ONU para a promoo do Desenvolvimento 54
IV.1. Reforma da Organizao das Naes Unidas.......................................56
IV.2. A ONU e o Desenvolvimento...................................................61
Captulo V - Uma nova arquitectura do Sistema Internacional.......................64
V.1. Reforma do Conselho de Segurana da ONU.....................................65
V.2. Criao de um Conselho de Desenvolvimento Sustentvel da ONU......71
Concluso.............................................90
Bibliografia......................................................................................................98
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Lista de quadros e tabelas
Figura 1: a esfera poltica do Sistema Internacional...13
Figura 2: a esfera econmica do Sistema Internacional....14
Figura 3: Globalizao e Desenvolvimento..21
Figura 4: Responsabilidade de Proteger..28
Figura 5: evoluo da percentagem da populao que vive com < 2 USD por dia por regies seleccionadas..........................................................................................................................43
Figura 6: a fome no mundo em percentagem e por regies seleccionadas em 2004.............44
Figura 7: percentagem das exportaes mundiais de bens por regies, 1948-200545
Figura 8: percentagem das importaes mundiais de bens por regies, 1948-2005...45
Figura 9: composio das regies geogrficas da OMC...45
Figura 10: rcio das exportaes e importaes de bens e servios no PIB (2004 em %)....46
Figura 11: exportaes de bens e servios per capita (2004 em USD)..47
Figura 12: o Sistema da Organizao das Naes Unidas...60
Figura 13: Case study A dependncia de APD pela Repblica da Guin-Bissau..63
Figura 14: clculo do impacto de uma taxa de 0,05 por cento aplicada ao volume de transaces financeiras internacionais em 1995.....................................................................83
Figura 15: proposta de uma nova arquitectura para o Sistema Internacional em torno da ONU97
Figura 16: Estruturas do Conselho de Segurana e do Conselho de Desenvolvimento Sustentvel propostas. ...........................................................................................................97
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Prefcio
Da anlise das insuficincias do Sistema Internacional no garantir da paz e
da segurana e na promoo do desenvolvimento sustentvel universal,
nasce o desafio de abordar a temtica da sua transformao em torno da
Organizao das Naes Unidas.
O primeiro passo a reforma da prpria ONU. Reforma do seu
funcionamento corrente, com a promoo de maior transparncia,
optimizao de recursos e combate corrupo. Mas reforma sobretudo no
sentido estrutural, da responsabilizao, da representao e da eficcia, com
o reforo da Assembleia-Geral da ONU, composta por representantes dos
Estados-membros e dos povos, e o alargamento e capacitao do Conselho
de Segurana, com a entrada de importantes pases do Sul e o alargamento
do seu mandato e dos meios operacionais ao seu dispor.
O segundo passo a reorganizao do Sistema Internacional em torno da
ONU e a sua reorientao para a promoo do desenvolvimento. A criao
de um rgo de governao global democrtica para as questes
econmicas, sociais e ambientais: um Conselho de Desenvolvimento
Sustentvel, a par do Conselho de Segurana. A subordinao
coordenao poltica por esse Conselho das instituies internacionais mais
relevantes: Banco Mundial e Fundo Monetrio Internacional; Organizao
Mundial do Comrcio; Organizao Internacional do Trabalho e Organizao
Internacional das Migraes, e a criao de uma Organizao Mundial do
Ambiente.
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8
Agradecimentos
Ao Professor Doutor Augusto Mateus, que me concedeu a honra de ser o
orientador deste trabalho de mestrado, pela sua disponibilidade e apoio.
Ao Professor Doutor Adelino Torres, por todo o acompanhamento e ateno
dispensados.
A alguns colegas e amigos, como Nuno Mota Pinto, Jos Conde Rodrigues,
Srgio Alves, Filipe Batista e Ins Drummond.
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Introduo
No centro do Sistema Internacional deveria hoje estar uma Organizao das
Naes Unidas (ONU) que assegurasse a paz mundial e estabelecesse as
condies econmicas, sociais e polticas que a sustentassem, coordenando
o Fundo Monetrio Internacional (FMI), o Grupo do Banco Mundial (BM) e a
Organizao Mundial do Comrcio (OMC), que promoveriam o
desenvolvimento global. Na busca da paz e do desenvolvimento necessrio
transitar para uma nova ordem mundial, que possvel a partir das
instituies internacionais actuais. O actual Sistema Internacional, desenhado
aps a II Guerra Mundial, necessita de uma profunda reforma aos nveis da
segurana e econmico. A eficcia reclama essa reforma, partindo da actual
arquitectura e promovendo a transparncia nos mecanismos de
funcionamento e gesto da ONU, bem como a sua responsabilizao
escala mundial, no s perante os governos dos Estados, mas tambm face
aos parlamentos representativos dos seus povos e sociedade civil. No
centro da necessidade de reforma da governana global est a premente
necessidade de legitimidade, cuja falta conduzir imobilizao e
incapacidade de aplicar novas polticas de segurana e desenvolvimentistas.
No de todo a primeira vez que a questo da governao mundial se
coloca. J em 1795, Kant relacionou a paz mundial com o estabelecimento
de um governo dos governos, da lei universal e da cidadania mundial13,
baseado no ainda num sistema institucional de governana democrtica
13 Kant, I. (1995) A Paz Perptua e Outros Opsculos, Lisboa: Edies 70.
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10
mas sim numa pura federao de Estados soberanos, no quadro legal do
poder absoluto destes, consagrado em 1648 pela Paz de Vesteflia. Os cinco
pilares fundamentais de Vesteflia14 eram: primeiro, que s os Estados-
nao15 eram entidades soberanas e; segundo, que essa soberania era
exercida sobre um territrio fsico pelo estabelecimento de fronteiras. Em
terceiro lugar, que era evidente que os governos centrais dos Estados eram
os agentes mais poderosos do mundo. Quarto, que nenhuma lei existia acima
dos Estados e que o Direito Internacional derivava dos tratados estabelecidos
entre os Estados soberanos, consagrando o direito inalienvel no-
interferncia nos assuntos domsticos. Em quinto por fim e como corolrio
dos precedentes surgia que, na ausncia de Direito Internacional, a guerra
entre Estados soberanos era um meio legtimo de resolver disputas.
Da os esforos subsequentes para civilizar as guerras, o que sendo ainda
reflexo de uma inaceitvel legitimidade da guerra um primeiro passo na sua
classificao como nefasta, cujos efeitos devem ser restringidos pela criao
de princpios restritivos da conduta de guerra jus in bello16, gnese da
posterior ilegalizao da guerra de agresso17.
14 Valaskakis, K. (2001), Westfalia II: por un Nuevo Orden Mundial, Futuribles 265, Junho de 2001. 15 Embora o termo nao seja difusamente empregue para classificar populaes de estados mutinacionais, a correspondncia entre Estado e comunidade nacional permite a utilizao generalizada da expresso Estado-nao, os dois componentes do conceito Estado-nao ou seja, Estado e nao referem-se a processo histricos convergentes mas distintos: a formao dos estados modernos e a construo das naes modernas in Habermas, J. (1998), The Postnational Constellation, Cambridge (MA, EUA): The MIT Press, pg. 299 traduo do autor. 16 in Rawls, J. (2000), A Lei dos Povos, Coimbra: Quarteto Editora, pg. 104. 17 O restringir da guerra o incio da paz. in Waltzer, M. (1977, 3 Ed. 2000) Just and unjust wars, New York: Basic Books, pg. 335 traduo do autor.
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11
Mas a ordem de Vesteflia, j com 350 anos, est cada vez mais
desactualizada pela prevalncia de novos valores e pelas transformaes
criadas e aceleradas pelo processo de globalizao18.
As mudanas necessrias para garantir um novo ciclo passam por
reconhecer, em primeiro lugar, que os Estados j no so a nica fonte de
soberania legal. A sua soberania, cada vez mais ligada dos eleitorados,
pode reflectir-se a vrios nveis. O poder soberano, constata-se, existe em
outras instncias: supranacionais; sub-estatais ou no-estatais. Em segundo
lugar, que o sistema de autoridade baseada no territrio fsico est a ser
questionado, e o poder, muitas vezes sem rosto19, exercido para alm e
apesar das fronteiras. Em terceiro lugar, que os Estados j no esto
sozinhos na cena internacional: outros actores tm emergido, desde logo as
empresas multinacionais. Em quarto, que muitos elementos formativos do
Direito Internacional surgiram nos ltimos decnios, como os direitos
humanitrio ou ambiental, todos eles limitando a soberania absoluta dos
Estados. Em quinto lugar, podemos afirmar que a novel opinio pblica
mundial est a virar-se contra a guerra, pelo menos na sua concepo
vestefliana de recurso natural e legtimo.
A criao da ONU em 1945 resultou do compromisso entre a lgica do
sistema legal internacional de Vesteflia e a lgica do sistema legal baseado
numa comunidade internacional. Contriburam para gerar esse compromisso
os horrores das duas guerras mundiais e a anlise das inexorveis
18 Podemos comear por pensar a globalizao como alargamento, aprofundamento e acelerao das interligaes escala mundial de todos os aspectos da vida social contempornea in Held, D., McGrew, A. G., Goldblatt, D. e Perraton, J. (1999), Global Transformations, Cambridge, pg. 2 traduo do autor. 19 Prera, A. I. (1999), El poder sin rosto, Frana: documento de trabalho.
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mecnicas que a elas conduziram20. O perodo entre 1914 e 1945 foi
devastador. Mais de 50 milhes de pessoas morreram s nos seis anos da II
Guerra Mundial, entre 1939 e 1945. O terror nuclear revelou-se no final da
guerra. Com o apoio das cinco potncias vencedoras da II Guerra Mundial21
foi construdo um novo sistema internacional baseado em primeiro lugar na
ONU, instituda pela Carta de So Francisco em 1945, e em segundo nas
Instituies Financeira Internacionais (IFI) basilares criadas em Bretton
Woods em 194422: o FMI e o Banco Mundial. Um terceiro pilar proposto em
Bretton Woods foi a criao da OIC; uma proposta reconvertida no menos
ambicioso GATT23, que no constituiu uma organizao internacional, sendo
apenas um acordo legal provisrio, mas que finalmente acabou por evoluir
para a actual OMC. Este sistema com estes trs pilares sobreviveu at agora
seis decnios e , ainda, o centro da arquitectura econmica internacional.
Os tratados institutivos da ONU criaram tambm o Conselho Econmico e
Social (ECOSOC), para coordenar os programas econmicos e sociais, as
agncias especializadas e as agncias subsidirias das Naes Unidas. Um
acordo, em 1947, entre o ECOSOC e o FMI e o Banco Mundial consagrou os
ltimos como agncias especializadas da ONU. Na substncia, contudo, o
20 Nesses meados do Sculo XX assistiu-se a uma verdadeira revoluo humano-cntrica, que mudou os princpios internacionalmente reconhecidos. Ningum questionar hoje, pelo menos enquanto princpio, que os Direitos Humanos devem estar acima da soberania dos Estados, ou a invalidade de pressupostos racistas ou colonialistas ou ainda que o unilateralismo, embora actualmente enfatizado pela potncia hegemnica, no natural, acarretando at custos elevados prpria. No obstante e desde ento, estas duas lgicas a dos Estados e a da comunidade internacional tm entrado sistematicamente em choque nos sucessivos esforos para estabelecer e desenvolver instituies para uma governao democrtica global. 21 EUA; Rssia; China; Reino Unido e Frana. 22 Aps a Segunda Guerra Mundial, em Bretton Woods, os EUA tentaram recriar uma ordem econmica internacional liberal, interrompida pelo perodo 1914-45, semelhana da previamente existente, sob conduo do Reino Unido, mas criando um quadro de instituies transnacionais (o GATT, seguido da OMC, o FMI e o Banco Internacional para a Reconstruo e Desenvolvimento ou Banco Mundial). 23 GATT General Agreement on Tariffs and Trade / Acordo Geral sobre Tarifas e Comrcio em vez de Organizao Internacional de Comrcio (OIC).
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13
acordo foi uma declarao de independncia que apenas requer que o FMI e
o BM dem a devida considerao s recomendaes da ONU, mantendo
completa independncia administrativa e financeira. A ligao ONU limita-
se a permitir que os seus representantes assistam s reunies do Conselho
de Governadores das IFI, e a estas terem oficiais de ligao na ONU.
O Sistema Internacional criado em 1944-5 visava os objectivos mutuamente
complementares de criar estruturas que garantissem a segurana mundial e
a sua governana poltica, a par da cooperao econmica, que preveniriam
a III Guerra Mundial. sua cabea sentaram-se os cinco vencedores da II
Guerra Mundial, os cinco membros permanentes e com direito a veto do
Conselho de Segurana da ONU. O sistema ento organizado funciona
actualmente de forma no muito diferente da original, dividindo-se claramente
em duas esferas, a poltica e a econmica.
Figura 1: a esfera poltica do Sistema Internacional24.
24 G7 = Grupo das sete naes mais industrializadas: EUA, Japo, Alemanha, Frana, Reino Unido, Itlia e Canad.
Sociedade
Civil Global
Estados
G7
Conselho de
Segurana da ONU
Secretariado da ONU
Assembleia-
Geral da ONU
-
14
Figura 2: a esfera econmica do Sistema Internacional.
A actual arquitectura do Sistema Internacional, criada no contexto do ps II
Guerra Mundial e forjada ao longo da Guerra Fria, precisa de ser
profundamente reformada para gerir o Sculo XXI. A extenso da catstrofe
da primeira metade do Sculo XX inspirou ao arrojo na construo de um
Sistema Internacional. Nada de semelhante aconteceu no fim da Guerra Fria.
O momento actual o posterior ao efmero clima de optimismo utpico do
final do Sculo XX impulsionado pelo fim da Guerra Fria, determinado pela
imploso dos regimes comunistas europeus, aps a natural exausto da sua
capacidade para manter o esprito humano fechado e desinserido da
estrutura da realidade, como previra Voegelin25. No obstante o seu impacto
de consequncias universais que permitiu liberdade individual ganhar
mais espao de aco e deixou democracia liberal, apoiada na economia
de mercado e nos valores do capitalismo, o campo indisputado para a sua
25 Voegelin, E. (1987), The New Society of Politics, Chicago: The Chicago University Press.
Estados
G7
FMI
Banco Mundial OMC
Secretariado e Agncias
Especializadas da ONU
Assembleia-
Geral da ONU
Sociedade
Civil Global
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15
afirmao enquanto melhor regime26 o fim da Guerra Fria no iniciou a
esperada nova era de paz e desenvolvimento sustentvel global e equitativo.
Violentos conflitos tnicos e/ou religiosos, terrorismo, redes criminosas
transnacionais e Estados falhados impulsionam novos tipos de ameaas que,
a par do agravar do fosso entre Pases Desenvolvidos (PD) e Pases em Vias
de Desenvolvimento (PVD) e de novos problemas econmicos, ambientais e
sociais, minam a segurana e a prosperidade. O optimismo utpico do final
do Sculo XX ignorava a exploso das tenses nacionais libertas pelo fim de
Estados comunistas plurinacionais. Ignorava a crescente instabilidade
provocada pela canalizao das frustraes de imensas novas geraes em
concepes teolgicas radicais no Magreb, no Sahel, no Mdio Oriente, no
Centro e Sudeste Asiticos, e da irradiando violentamente para todo o
mundo. A religio recuperou um lugar quase exclusivo na esfera poltica,
sendo utilizada como instrumento unificador ou fraccionador das sociedades,
como elemento definidor de alteridade27, ganhando um peso crescente em
diversas reas do globo, at por antagonismo ao inverso e j multissecular
processo de desvanecimento enquanto autoridade primordial na afluente
Civilizao Ocidental28. O optimismo ignorava sobretudo a crescente misria
da frica Subsariana, que mais do que no convergir economicamente com o 26 O que acabou por levar emergncia de utpicas profecias que identificaram tal regime como uma espcie de terra prometida, com a consequente predio da chegada ao fim da histria, numa perspectiva hegeliana Fukuyama ,F. (1992), O Fim da Histria e o ltimo Homem, Lisboa: Gradiva. J Huntington [Huntington, S. (1998) The Clash of Civilizations and the Remaking of the World Order, Londres: Touchstone Books] define a globalizao como um processo de expanso da cultura ocidental e do sistema capitalista sobre os demais modos de vida e de produo, que conduzir inevitavelmente a um choque de civilizaes. 27 Segundo a linha de demarcao amigo/inimigo em Schmitt, C. (1996), The concept of the political, Chicago: The Chicago Press University. 28 tambm religio que Huntington vai buscar a origem das linhas de fractura civilizacional, enumerando pontos de confluncia/choque como Sarajevo, cidade de confluncia/choque entre um povo sem destrinas tnicas mas dividido em Croatas/Cristo Ocidentais; Srvios/Cristo Ortodoxos e Bsnios/Muulmanos, e onde o conflito aberto estalou aps o desaparecimento do comunismo abafador Huntington, S. (1998) The Clash of Civilizations and the Remaking of the World Order, Londres: Touchstone Books.
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16
mundo desenvolvido, recuou economicamente enquanto mergulhou, desde o
decnio de 90 do sculo passado, em mltiplos conflitos. Conflitos de uma
violncia cada vez mais grosseiramente devastadora de vidas e hipotecadora
da viabilidade futura das sociedades e suas economias. Ignorava que o
mundo j no estava to dividido entre Oeste e Leste, mas cada vez mais
dividido entre Norte e Sul. Segundo os Relatrios sobre Desenvolvimento
Humano, elaborados em 1996 e 1999 pelo Programa das Naes Unidas
para o Desenvolvimento (PNUD), em 1993 apenas 5 dos 23 bilies de
dlares do PIB global tiveram a sua origem nos pases em desenvolvimento,
embora estes respondam por quase 80% do total da populao mundial. Os
20% mais pobres viram a sua parcela de participao no rendimento global
cair de 2,3 % para 1,4% nos ltimos trinta anos. Ao mesmo tempo, a fatia dos
20% mais ricos cresceu de 70% para 85%. Com isso, a razo de participao
no bolo do PIB entre os pases mais ricos e os mais pobres duplicou de
30:1, em 1960, para 74:1, em 1997.29
Demonstrado o efeito do sistema vigente, ao abordar a questo da promoo
do desenvolvimento (...) s pode haver uma concluso: temos que comear
o debate sobre como alcanar uma globalizao responsvel que seja
politicamente moldada e conseguida. Antes de mais pressupe-se (...) a
crtica (...) ideologia neoliberal de globalismo, ao seu unidimensionismo
econmico, ao seu pensamento nico, ao seu autoritarismo de mercado-
mundial, que se apresenta como no-poltico e contudo actua de forma
altamente poltica.30 Para reorientar o Sistema Internacional para a
29 in Castells, M. (2002) O Fim do MIlnio, Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian, pg. 89. 30 in Beck, U. (2000) What is Globalization?, Cambridge: Polity Press, pg. 129 traduo do autor.
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17
promoo do desenvolvimento sustentvel mundial urge acompanhar a
intensificao da globalizao econmica com uma intensificao da
governana econmica global e das actividades de regulao e superviso
internacionais. A desregulamentao e globalizao das economias
nacionais deve ser acompanhada por novas formas de regulao no domnio
global31. Estas transformaes reclamam um autntico multilateralismo, pois
no estaro j exclusivamente ligadas ascenso de uma potncia ou bloco
hegemnico isolado. Os modelos contemporneos de globalizao
econmica devem reflectir uma tendncia cumulativa, no quadro de novas
formas multilaterais de regulao e de controlo. Para promover o
desenvolvimento sustentvel escala global necessrio regular a
globalizao e globalizar a regulao.
Vivemos num mundo de velhas regras e novas ameaas, que exige novas
definies de interesse nacional e de interveno humanitria, uma nova
arquitectura financeira global e novas formas de organizar as instituies
internacionais. As regras e instituies existentes, criadas para tratar as
questes de segurana e econmicas do sculo passado, no s foram j
ento insuficientes, como esto cada vez mais incapazes de responder a
toda uma nova gerao de ameaas ordem mundial.
S um novo multilateralismo, baseado em instituies internacionais
reforadas e com capacidade de resposta e iniciativa operacional, pode
impulsionar a segurana e o desenvolvimento globais.
31 (...), a globalizao sucintamente traada. A integrao econmica global, evidente sobretudo no que se refere aos mercados financeiros, minou radicalmente a autonomia dos Estados-nao, produzindo um mundo sem fronteiras. in Callinicos, A. (2002), Contra a Terceira Via Uma Crtica Anticapitalista, Oeiras: Celta Editora, pg. 13.
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18
Captulo I
A Globalizao e o Sistema Internacional
Globalizao denota a crescente magnitude, acelerar e aprofundar dos
impactos dos fluxos e interaces transcontinentais, transformando a escala
de organizao humana, que agora liga as comunidades mais distantes e
expandindo o alcance das relaes de poder atravs das regies e dos
continentes do mundo, no devendo contudo ser entendida como
prefigurando a emergncia de uma harmoniosa sociedade mundial. A
interaco pode criar novas formas de animosidade e conflito, por via da
xenofobia, alm de que uma parte substancial da populao mundial est
ainda grosso modo excluda dos benefcios da globalizao. O processo de
globalizao, desigual e assimtrico, afecta todos os Estados mas em
grandezas diferente, sendo uns mais vulnerveis que outros. No haver
dvida de que os pases mais atrasados so os que viram uma maior
diminuio do seu poder relativo, sendo que a situao prvia ao acelerar
desta dinmica era j consideravelmente assimtrica e hierarquizada em seu
desfavor.
A Era em que vivemos aumentou a necessidade, a importncia e o papel das
instituies internacionais e alimentou o debate sobre as suas misses. No
insuficiente quadro do actual sistema internacional e a apesar dele, a
globalizao desregulada est a deixar um rasto de perigosa instabilidade e
crescente desigualdade.
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19
I.1. DESAFIOS AO SISTEMA INTERNACIONAL
iluso de um novo mundo unipolar ps-Guerra Fria seguiu-se o velho
mundo anrquico em que os EUA, sem rival no plano da guerra
convencional, no podem deixar de considerar as ameaas no-
convencionais ou os arsenais estratgicos da Rssia que reemerge na
cena internacional catapultada pela apreciao da matrias-primas, por
enquanto no seu espao tradicional e da China e o desafio que esta
representa Pax Americana, com uma viso divergente da poltica
internacional32 apoiada pelo seu crescente poderio econmico, diplomtico e
militar.
Neste mundo anrquico em que no conseguem dar resposta a todas as
necessidades securitrias, os EUA apostam declaradamente na manuteno
da sua vantagem singular no plano tecno-militar, enquanto promovem o
reforo do investimento em defesa pelos seus aliados por todo o globo, mas
sobretudo impulsionando uma cooperao mais estreita com os seus pases
irmos (Canad, Reino Unido, Austrlia e Nova Zelndia), o desenvolvimento
do pilar europeu da NATO e libertando finalmente a Alemanha e o Japo dos
impedimentos projeco de foras resultantes da II Guerra Mundial, ao
reclamar a participao destes, a seu lado, em conflitos como o do
Afeganisto e o do Iraque. O que nos recorda a crescente necessidade de
maior integrao e representao no Sistema Internacional por parte do
Mundo rabe e mesmo do conjunto dos pases da Organizao da 32 A viso do mundo destes dois pases diverge em seis matrias cruciais: a melhor forma de organizar o sistema internacional; as regras que governam as aces dos Estados nas relaes internacionais; como os Estados devem organizar a sua relao com outros; as estruturas internacionais atravs das quais os Estados podem agir militarmente; a proporo adequada entre ofensiva, defesa e armas de dissuaso e estratgicas; e o efeito da globalizao no papel dos Estados. in Feigenbaum, E. (2001) Chinas challenge to Pax Americana, Washington Quarterly, vol. 24, n. 3, pg. 31 traduo do autor.
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Conferncia Islmica, actores incontornveis sobretudo no ps-ideolgico
ressurgimento das religies.
Quanto esfera econmica do Sistema Internacional e alm do desafio da
integrao da China, ganha fora a contestao ordem internacional
econmica vigente pelo Sul, com a presso da parceria diplomtica
trilateral33 do Brasil, da frica do Sul e da ndia, cada um arrastando atrs de
si os anseios da Amrica Latina, da frica Subsariana e do Sul da sia,
respectivamente. A Amrica Latina, que balana entre a difuso da
democracia liberal e a prosperidade, juntando-se Europa e Amrica do
Norte no Mundo Ocidental, ou o mergulhar em ditaduras com economias
fechadas plenas de crime com conflitos tnicos e sociais, sendo inegvel que
as diferentes raas tm correspondncias sociais predominantes em grau
mais grave do que no Hemisfrio Norte. A frica sofre com pobreza, guerra,
doena e fome enquanto a sia do Sul desponta lentamente para o caminho
seguido pelo Sudeste Asitico.
I.2. GLOBALIZAO E DESENVOLVIMENTO
O debate sobre globalizao implica um outro debate, mais geral, sobre a
riqueza e a pobreza, ou sobre desenvolvimento e subdesenvolvimento.34
Considerando a 3 e actual vaga de globalizao35, alicerada nos finais dos
anos 70, do ponto de vista do desenvolvimento, conclumos que a mesma se
33 Alde, C. (2005) The new diplomacy of the South: South Africa, Brazil, India and trilateralism, Third World Quarterly. London: vol. 26, N.. 7; pg. 1077. 34 in Espada, J. C. (2002) Riqueza e Pobreza, Cascais: Principia, pg. 13. 35 O Banco Mundial considera trs vagas de globalizao: a primeira entre 1870 e 1914, seguida de uma interrupo pelo incio da I e at ao fim da II guerras mundiais, uma segunda de 1945 a 1980 e finalmente a terceira, aps 1980.
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caracteriza pela abertura de grandes PVD como China, ndia, Mxico,
Vietname - ao comrcio internacional e ao IDE.
Agrupando os PVD em dois grandes grupos: os que aderiram globalizao
e os que no o fizeram; a lista do primeiro grupo conta com mais de trs mil
milhes de pessoas (ao incluir China e ndia), apesar da lista do segundo
grupo ser maior, ao incluir 2/3 dos PVD, representando apenas um milhar de
milho de pessoas, Dollar e Kraay demonstraram que em 1980, ou seja no
incio da 3 vaga, os globalizadores eram, enquanto grupo, mais pobres dos
que os no-globalizadores: 1.488 USD PIB pc (PPP) e 1.947 USD PIB pc
(PPP) respectivamente, j em 1997 a posio estava invertida:
globalizadores 2.485 USD e no globalizadores 2.133 USD.
Figura 3: Globalizao e Desenvolvimento36.
Decnios 60 70 80 90 Taxa de Crescimento Mdio Anual do PIB per capita no grupo: Desenvolvidos
4,7%
3,1%
2,3%
2,2%
Taxa de Crescimento Mdio Anual do PIB per capita no grupo: Globalizadores
1,4%
2,9%
3,5%
5,0%
Taxa Anual de Convergncia: Globalizadores vs Desenvolvidos -3,2% 0,19% 1,16% 2,7%
Taxa de Crescimento Mdio Anual do PIB per capita no grupo: No-Globalizadores
2,4%
3,3%
0,8%
1,4%
Taxa Anual de Convergncia: No-Globalizadores vs Desenvolvidos -2,2% 0,19% -1,47% -0,78%
No se deve de todo contrariar a globalizao, mas sim, pelo contrrio,
conseguir a incluso de todos os Estados e indivduos na sua dinmica e
submete-la ao controlo dos mesmos. O que importa, insistimos, regular a
globalizao e globalizar a regulao.
36 Dollar, D., Kraay. A, (2003) Trade, Growth and Poverty, Development Research Group, World Bank. Note-se que enquanto grupo os globalizadores tiveram fraco desempenho nas dcadas de 60 e 70. A denominao de globalizadores, contudo, aplica-se a este grupo apenas porque aderiram ao processo de globalizao somente no decnio de 70, provavelmente em resultado do seu fraco desempenho nos anos anteriores (notrio no caso dos da China e da ndia)
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Captulo II
Segurana e Desenvolvimento
As Naes Unidas existem para apoiar a manuteno da paz e da
segurana e para assistir os Governos e os povos na construo de um
mundo em que todos estejam livres do medo e de necessidades. As lies
dos ltimos 60 anos ilustram que estes objectivos esto interligados:
segurana e desenvolvimento so pr-condies para a paz sustentvel.37 A
importncia da segurana, neste trabalho, enquanto funo do Sistema
Internacional e pr-condio indispensvel para o desenvolvimento. Sem
segurana no sobrevive, ou no nasce, tecido econmico e social do qual
participe o conjunto de uma sociedade38. O Banco Mundial, em As vozes dos
pobres39, afirma que a insegurana fsica a principal preocupao entre as
populaes mais pobres do globo.
Vivemos num mundo de ameaas novas e evolutivas, ameaas que no
poderiam ter sido antecipadas quando a ONU foi fundada em 1945
37 in Relatrio do Secretrio-Geral Ban Ki-moon ao Conselho de Segurana das Organizao das Naes Unidas (23 de Janeiro de 2008) Assegurar a paz e o desenvolvimento: o papel das Naes Unidas no apoio reforma do sector da segurana, pg 1. traduo do autor. 38 Ser muitas vezes possvel, mesmo em zonas ou pases em conflito aberto, estabelecer uma ilha de segurana em torno de, por exemplo, uma explorao de extraco petrolfera, com sorte off-shore. actividade econmica que no pode de forma alguma ser confundida com desenvolvimento, uma vez que no gera tecido econmico e social disperso em benefcio da generalidade da sociedade. Este contexto cria, no poucas vezes, a antagnica e perniciosa situao de proporcionar a uma elite suficientemente vasta o conforto e at os recursos para financiar um conflito, tantas vezes justificativo da existncia ou exclusividade dessa mesma elite, prejudicando a sua disponibilidade para construir a paz, a que a reduo misria generalizada de outros conflitos impele as partes. 39 Deepa, N., Chambers R., Saha, M. e Petesch, P. (2000) Voices of the Poor: Crying Out for Change, New York: Oxford University Press.
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ameaas como o terrorismo nuclear, e Estados falhados dos quais nasce
pobreza, doena e guerra civil.
No mundo actual, uma ameaa a um uma ameaa a todos. Globalizao
significa que um grande ataque terrorista em qualquer parte do mundo
desenvolvido pode ter consequncias devastadoras para o bem-estar de
milhes no mundo em desenvolvimento. () A eroso de um qualquer
Estado enfraquece a segurana de todos os Estados contra ameaas
transnacionais como terrorismo ou crime organizado.
H seis grupos de ameaas com os quais o mundo tem que se preocupar
nos decnios vindouros:
guerra entre Estados;
violncia no interior dos Estados, incluindo guerras civis, violao dos
Direitos Humanos em grande escala e genocdio;
pobreza, doenas infecciosas e degradao ambiental;
armas nucleares, radiolgicas, qumicas e biolgicas;
terrorismo; e
crime organizado transnacional.
As boas notcias so que as Naes Unidas e as nossas instituies de
segurana colectivas mostraram que podem funcionar. Mais guerras civis
terminaram por negociao nos ltimos 15 anos do que nos 200 precedentes.
No decnio de 1960, muitos acreditavam que por esta altura 15 a 25 Estados
teriam armas nucleares; o Tratado de No Proliferao Nuclear ajudou a
prevenir isso.40
40 in Relatrio do Painel de Alto Nvel sobre Ameaas, Desafios e Mudana da ONU (2004) Um mundo mais seguro: a nossa responsabilidade partilhada, pgs. 1 e 2 traduo do autor
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Contudo, com o fim da Guerra Fria e o libertar das presses subjugadas pela
lgica bipolar, ficou patente, e sem desculpa, a incapacidade da comunidade
internacional em conseguir responder eficazmente s vrias exigncias de
interveno humanitria, enquanto aco coerciva contra um Estado para
proteger populaes dentro das suas fronteiras. Desde o incio dos anos 90
que se constata que no existiam regras acordadas para tratar casos como
Somlia, Ruanda, Burundi, Congo, Bsnia-Herzegovina, Kosovo, Birmnia,
Libria, Serra Leoa, Nigria, Costa do Marfim, Darfur/Sudo e tantos outros.
Alis, as divergncias de opinio comeam a montante da questo da
definio de regras. Comeam na existncia, ou no, desse direito de
interveno. Tambm no existe ainda uma efectiva resposta global ao
terrorismo ou regras especficas para os ataques preventivos contra pases
que se creia estarem a desenvolver armas de destruio macia. Estas so
duas questes diferentes, embora com pontos de contacto, como sejam os
princpios que se devem aplicar a qualquer aco militar em qualquer parte.
O cerne da questo, nas intervenes em pases que albergam terrorismo
internacional ou constituem uma ameaa, pela potencial combinao de
agressividade externa e armas de destruio macia, cai no mbito dos
limites legtima defesa pelos Estados e no no mbito do seu direito, ou
dever, de intervir para proteger povos que no o seu.
II.1. RESPONSABILIDADE DE PROTEGER
As catstrofes humanitrias libertas pelo fim da Guerra Fria sobretudo
conflitos internos como guerras civis, genocdios ou limpezas tnicas
demonstraram que os princpios da no-ingerncia no servem. O mundo
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no pode mais ficar a assistir, reagindo apenas quando determinada crise
atravessa fronteiras, constituindo assim uma ameaa mais convencional
paz e segurana internacionais.
No decurso dessas crises humanitrias, e apesar delas, a comunidade
internacional no produziu regras sobre como e quando intervir e sob que
autoridade. Vigoram ainda as doutrinas cardinais do ps-1945, que se
aplicam guerra entre Estados e no aos conflitos intra-Estado. A Carta das
Naes Unidas veda explicitamente a possibilidade dos Estados usarem a
fora nas suas relaes internacionais e protege explicitamente a jurisdio
domstica de qualquer interferncia externa. Uma vasta doutrina proibindo a
interveno nos assuntos internos dos Estados est bem estabelecida no
Direito Internacional. Esta uma questo que no pode, quando
preocupados com a relao entre segurana e desenvolvimento,
fundamentalmente nos PVD, ser remetida para o esquecimento pelo
inevitavelmente mais premente enfoque no terrorismo transnacional.
A reorientao do Sistema Internacional no sentido de desenvolver o direito
de ingerncia humanitrio e dar primado ao direito de interveno sobre a
soberania dos Estados41 opera-se com base na responsabilidade de
41 Uma razovel Lei dos Povos guia as sociedades bem-ordenadas no seu contacto com os regimes fora da lei ao especificar o objectivo que devem possuir e ao indicar os meios que podem ou devem evitar usar. A sua defesa , no entanto, apenas a sua primeira e mais urgente tarefa. O seu objectivo a longo prazo o de eventualmente trazer todas as sociedades a honrar a Lei dos Povos e a tornarem-se membros de pleno direito dessa sociedade de povos bem ordenados. Deste modo, estariam assegurados os direitos humanos em toda a parte. () Para conseguir este objectivo de longo prazo, os povos bem-ordenados devem estabelecer novas instituies e prticas que sirvam de uma espcie de centro confederativo e de frum pblico para as suas opinies comuns e polticas para com os regimes no bem-ordenados. Podem faz-lo dentro de instituies como as Naes Unidas ou formando alianas separadas de povos bem-ordenados para certos assuntos. Este centro confederativo pode ser usado quer para formular quer para expressar a opinio das sociedades bem-ordenadas. A elas podero expor publicamente as instituies injustas e cruis dos regimes opressores e expansionistas e as suas violaes dos direitos humanos.
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proteger. Pode tambm incorporar novas estratgias, como intimaes
individuais do Tribunal Penal Internacional42, ou de tribunais especiais de
crimes contra a humanidade, a dirigentes por crimes de guerra ou genocdio.
Em 1999, Koffi Annan, enquanto Secretrio-Geral da ONU, lanou uma
anlise minuciosa dos acontecimentos que levaram queda de Srebrenica,
no contexto da guerra civil inter-comunidades religiosas ento em curso na
Bsnia, e encomendou um estudo independente sobre as aces das
Naes Unidas durante o genocdio no Ruanda em 1994.
Estas avaliaes realaram as obviamente presumveis insuficincias em
termos de mandatos e meios com que se depara a actuao das Naes
Unidas. Tiveram a virtude de fundamentar os ensejos por uma reforma,
determinando a necessidade de aumentar a capacidade das Naes Unidas
para realizar operaes de manuteno da paz as misses dos capacetes
azuis nomeadamente, pelo assegurar de uma rpida capacidade de
projeco de foras e a atribuio clere de mandatos susceptveis de
satisfazer as necessidades no terreno. O desafio , portanto, desbloquear o
processo de anlise e deciso, criando mecanismos de resposta eficazes.
Tambm evidente ficou a necessidade de definir normas de interveno
Nem mesmo os regimes fora da lei so insensveis a estas crticas, especialmente quando a sua base uma razovel e bem fundada Lei dos Povos que no pode facilmente ser rotulada como uma mera ideia liberal ou Ocidental. Ao longo do tempo, gradualmente, os povos bem-ordenados podem pressionar os regimes fora da lei para que mudem de atitude; mas, s por si, esta presso no ter possibilidade de produzir efeitos. Poder ser necessrio apoi-la por uma firme negao econmica ou outra, ou a recusa de admisso dos regimes fora da lei como membros de pleno direito em prticas cooperativas de benefcio mtuo. in Rawls, J. (2000), A Lei dos Povos, Coimbra: Quarteto Editora, pgs. 102-103. 42 Em Julho de 2002 e com 92 Estados-membros, entrou em vigor o Tribunal Penal Internacional, que visa trazer justia no Estados mas sim indivduos, acusados de violaes graves dos direitos humanos e da lei humanitria internacional, tais como genocdio, crimes de guerra ou crimes contra a humanidade.
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militar claras para as misses de manuteno de paz da ONU, e garantir uma
maior coordenao entre a ONU e as organizaes regionais.
O Relatrio Brahimi43 identifica e analisa as insuficincias da misso de
manuteno da paz e segurana mundiais pela ONU, sendo precursor do
projecto de reforma apresentado pela equipa liderada por Gareth Evans,
numa iniciativa impulsionada pelo Governo Canadiano, que compreendeu ser
fundamental as crises humanitrias serem colocadas no como uma
discusso sobre o direito de interveno mas sim da responsabilidade de
proteger que os Estados soberanos devem aos seus cidados. 44
43 O Relatrio Brahimi surgiu da solicitao, em Maro de 2000, pelo ento Secretrio-Geral da ONU, a um grupo de peritos internacionais chefiado por Lakhdar Brahimi, ex-Primeiro-Ministro da Arglia, para que examinasse o funcionamento das operaes de paz das Naes Unidas, a fim de identificar as reas e as misses em que a manuteno da paz seria mais eficaz e apresentar propostas no sentido de melhorar essas operaes. O Relatrio do Grupo para as Operaes de Paz da ONU que se tornou conhecido sob a designao de Relatrio Brahimi apresentou sugestes sobre as condies mnimas necessrias para o xito das misses de manuteno da paz da ONU. Entre elas referem-se a atribuio de um mandato claro e especfico, a obteno do consentimento das partes em conflito e recursos suficientes. Na sequncia deste relatrio, as Naes Unidas e os seus Estados-membros introduziram uma srie de medidas destinadas a melhorar as actividades da ONU no domnio da manuteno da paz. O Departamento de Operaes de Manuteno da Paz (DOMP) foi autorizado a aumentar os efectivos de pessoal da sua sede a fim de apoiar as misses no terreno e reforou os seus gabinetes de conselheiros militares e da polcia. Criou uma Unidade de Boas Prticas destinada a analisar as lies extradas de misses anteriores e aconselhar os integrantes das misses sobre questes relacionadas com a igualdade entre homens e mulheres, a conduta dos capacetes azuis, o planeamento dos programas de desarmamento, desmobilizao e reintegrao e ainda o funcionamento do Estado de Direito. Foi criado um mecanismo de financiamento pr-mandato, destinado a assegurar os fundos necessrios ao arranque de novas misses, tendo ainda a base logstica do DOMP em Brindisi (Itlia) recebido financiamento para a aquisio de stocks estratgicos para colocao rpida no terreno. O DOMP reorganizou ainda o Sistema de Foras e Meios de Reserva da ONU, uma lista dos recursos especficos dos Estados-membros, incluindo pessoal militar e civil especializado, bem como material e equipamento disponvel para misses de manuteno da paz da ONU. O sistema prev que as tropas sejam disponibilizadas em 30 a 90 dias a contar do incio de uma nova operao. Registaram-se igualmente progressos no que se refere obteno de mandatos claros e realistas do Conselho de Segurana. Em suma, Brahimi defendeu a necessidade de uma doutrina robusta e de mandatos realistas, acompanhados por um sistema de resposta rpida que inclua vrias brigadas multinacionais coerentes, criadas pelos Estados-membros. Estas brigadas permanentes, so apresentadas como um primeiro passo na criao de uma fora militar permanente da ONU. A inexistncia de tal fora tem feito com que a ONU no tenha garras na cena internacional, pois a sua coaco est sempre condicionada vontade e coordenao dos Estadosmembros em providenciar e aplicar foras. 44 in Evans, G. e Sahnoun, M. (2002), The Responsibility to Protect, Foreign Affairs, November/December 2002.
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Para cumprir este desafio fundamental reformar o mecanismo aplicvel.
Sintetizando o relatrio apresentado pela Comisso Internacional sobre
Interveno e Soberania dos Estados45:
Figura 4: Responsabilidade de Proteger46
1. A responsabilidade de proteger: princpios fundamentais. 1.1. Princpios bsicos:
- Soberania implica responsabilidade, a responsabilidade pela proteco da populao cabe em primeiro lugar ao seu prprio Estado;
- Quando a populao est, ou na iminncia de estar, sujeita a grande mal como resultado de uma guerra interna, insurreio, represso ou falhano do Estado e o Estado em causa no est disposto ou incapaz de o evitar ou de lhe pr cobro, o princpio da no-ingerncia cede perante a responsabilidade internacional de proteger47.
1.2. Fundamentos: Os fundamentos da responsabilidade de proteger, enquanto orientadores da comunidade internacional de Estados, consistem em:
- obrigaes inerentes ao conceito de soberania; - responsabilidade do Conselho de Segurana da ONU, sob a Carta das Naes
Unidas (artigo 24), em manter a paz e a segurana mundiais; - obrigaes legais especficas sob a declarao dos Direitos Humanos e proteco
humana, tratados e convenes, lei humanitria e lei nacional; - a prtica em evoluo dos Estados, das organizaes regionais e do prprio
Conselho de Segurana. 1.3. Elementos: A responsabilidade de proteger compreende trs responsabilidades especficas:
45 A Comisso Internacional sobre Interveno e Soberania dos Estados, cujo relatrio Responsabilidade de Proteger foi publicado em Dezembro de 2001, foi co-presidida por Gareth Evans, Presidente e Director Executivo do Grupo sobre Crises Internacionais e ex-Ministro dos Negcios Estrangeiros australiano, e Mohamed Sahnoun, diplomata argelino, Conselheiro Especial do Secretrio-Geral da Organizao das Naes Unidas para frica. 46 Este relatrio subscreve a norma emergente de uma responsabilidade de proteger civis de violncia em larga escala uma responsabilidade detida, em primeiro lugar, pelas autoridades nacionais. Quando um Estado falha na proteco dos seus civis, a comunidade internacional tem a responsabilidade de agir, atravs de aces humanitrias, aces de monitorizao e presso diplomtica e pela fora se necessrio, ainda que apenas com o ltimo recurso. Em caso de conflito ou uso de fora, esta tambm implica um claro compromisso internacional na reconstruo da sociedade estilhaada. in Relatrio do Painel de Alto Nvel da ONU sobre Ameaas, Desafios e Mudana (2004) Um mundo mais seguro: a nossa responsabilidade partilhada, pg. 4 traduo do autor. 47 O princpio de que os Estados no devem nunca interferir nos assuntos domsticos de outros estados provm imediatamente do paradigma legalista e, menos imediatamente e mais ambiguamente, daquelas concepes de vida e liberdade que sustentam o paradigma e o fazem possvel. Mas estas mesmas concepes parecem tambm requerer que algumas vezes ignoremos esse princpio; e o que poder ser chamado de regra do ignorar, mais do que o princpio em si mesmo, tem sido o foco do interesse e discusso moral. Nenhum Estado pode admitir travar uma guerra de agresso e defender as suas aces. J a interveno entendida de forma diferente. A palavra no definida como uma actividade criminosa, e embora a prtica de interveno muitas vezes ameace a integridade territorial e a independncia poltica dos estados invadidos, pode por vezes se justificada. de importncia fundamental desde logo referir, contudo, que esta tem sempre que ser justificada. in Waltzer, M. (1977, 3 Ed. 2000) Just and unjust wars, New York: Basic Books, pg. 86 traduo do autor.
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- a responsabilidade da preveno abordar tanto as causas estruturais como as imediatas de um conflito interno ou de outras situaes que ponham as populaes em risco;
- a responsabilidade de reagir responder s situaes humanitrias prementes que requeiram medidas apropriadas, sejam medidas coercivas como sanes ou prossecuo internacional ou, em casos extremos, interveno militar;
- a responsabilidade de reconstruir providenciar, especialmente aps uma interveno militar, total assistncia na recuperao, reconstruo e reconciliao, abordando as causas do mal que a interveno se destinou a evitar ou pr cobro48.
1.4. Prioridades: - preveno a mais importante dimenso da responsabilidade de proteger: as
opes de preveno, com o mximo de empenho e recursos, devem ser sempre esgotadas antes de ser contemplada a possibilidade de uma interveno;
- o exerccio da responsabilidade quer de preveno quer de reaco deve sempre envolver a ponderao de medidas menos intrusivas e coercivas, antes das mais coercivas e intrusivas serem aplicadas.
2. A responsabilidade de proteger: princpios para interveno militar 2.1. A medida da causa justa: Uma interveno militar com o propsito de garantir proteco humana uma medida excepcional e extraordinria, implicando a ocorrncia ou eminncia de um mal grave e irreparvel sobre seres humanos, do seguinte tipo:
- perda de vidas em grande escala em curso ou presumvel, com intenes de genocdio ou no, que seja o produto de aco deliberada do Estado, sua negligncia ou incapacidade de agir, ou situao de Estado falhado;
- limpeza tnica em grande escala em curso ou presumvel, quer seja levada a cabo matando, por meio de expulses foradas, actos de terror ou violaes.
2.2. Os princpios da interveno: - inteno correcta o propsito primrio da interveno, apesar de quaisquer outros
motivos que os Estados interventores possam ter, dever ser o de terminar ou evitar sofrimento humano. A correco da inteno melhor assegurada em operaes multilaterais, claramente apoiadas pela opinio pblica local e pelas vtimas em questo;
- ltimo recurso uma interveno militar s pode ser justificada quando tiverem sido exploradas todas as opes no-militares para prevenir ou resolver pacificamente o conflito, e existam razes que levem a acreditar que medidas menores no seriam eficazes.
- meios proporcionais a escala, durao e intensidade da interveno militar deve ser a mnima necessria para assegurar o objectivo;
- perspectivas razoveis deve existir uma possibilidade razovel de sucesso em evitar ou por fim ao sofrimento que justifica a interveno, e em que as consequncias da aco no sejam susceptveis de ser piores do que as consequncias da inaco.
2.3. Autoridade correcta: - no existe melhor nem mais apropriado organismo do que o Conselho de
48 O PNUD desempenha um papel activo nas situaes de crise e de ps-conflito apoiando a implementao de programas de desenvolvimento da capacidade (..) quer de justia, quer de segurana de longo prazo orientados para o desenvolvimento sustentado. Ao implementar as recomendaes do relatrio Brahimi sobre o sistema de justia criminal no desenvolvimento da capacidade de aplicao da Lei, as Naes Unidas alcanaram significativos progressos no apoio s reformas dos sistemas judicirio e prisional nas administraes em ps-conflito em contextos de construo da paz. (..) Desde 1991, [note-se que desde o fim da fim da Guerra Fria e do emergir de inmeros conflitos internos em mltiplos Estados], operaes da manuteno da paz tem tido a tarefa de assistir as autoridades nacionais na criao de novas instituies policiais (...) em mais de 25 pases. Hoje, mais de 11 mil polcias da Naes Unidas esto em 18 operaes de paz, () in Relatrio do Secretrio-Geral Ban Ki-moon ao Conselho de Segurana das Organizao das Naes Unidas (23 de Janeiro de 2008) Assegurar a paz e o desenvolvimento: o papel das Naes Unidas no apoio reforma do sector da segurana, 24 e 25, pg. 8 traduo do autor.
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Segurana das Naes Unidas (CS) para autorizar uma operao militar com propsitos de proteco humana. A tarefa no ser portanto encontrar alternativas ao CS mas sim reforma-lo, transformando-o num melhor CS;
- a autorizao do Conselho de Segurana deve ser sempre prvia execuo de qualquer aco de interveno militar;
- o CS deve lidar solicitamente com quaisquer pedidos para intervir onde existam alegaes de perca de vidas humanas em grande escala ou limpeza tnica, devendo, nesse contexto, procurar uma adequada verificao do factos e das condies no terreno, que possam possibilitar uma interveno militar;
- os cinco membros permanentes devem acordar no utilizar o direito de veto em matrias em que os seus interesses vitais no estejam envolvidos para obstruir a aprovao de resolues que autorizem intervenes militares com o propsito de proteger vidas humanas e que de outro modo renam apoio maioritrio no seio do CS;
- se o Conselho de Segurana rejeitar a proposta ou for incapaz de a tratar num limite de tempo razovel, as opes so:
o submeter a matria considerao de uma Sesso Especial de Emergncia da Assembleia-Geral sob o procedimento Unidos para a Paz;
o aco de uma organizao regional ou sub-regional na sua rea de jurisdio, no mbito do Captulo VIII da Carta da Naes Unidas, sujeita a autorizao subsequente do CS;
o o CS dever ter em conta em todas as suas deliberaes que, se no conseguir cumprir a sua responsabilidade de proteger em situaes dramticas e chocantes que reclamem aco, os Estados interessados podem no excluir a possibilidade de agir por outros meios para fazer face gravidade e urgncia da situao, e que a estrutura e credibilidade da ONU poder ser prejudicada por isso.
2.4. Princpios operacionais: - objectivos claros mandatos claros e inequvocos em qualquer situao e recursos
condizentes; - abordagem comum pelos parceiros envolvidos, unicidade de comando, cadeia de
comando e comunicaes claras e inequvocas; - aceitar as limitaes, incrementos e gradualismos na aplicao das foras, sendo o
objectivo a proteco de uma populao e no a derrota de um Estado; - regras de entrada em aco que respeitem o conceito operacional, que sejam
precisas, que reflictam o princpio da proporcionalidade e que estejam absolutamente sujeitas lei humanitria internacional;
- aceitar que a proteco das prprias foras no se pode tornar o objectivo principal; - mxima coordenao possvel com organizaes humanitrias.
Regressando ao Desenvolvimento, veja-se que actualmente Cerca de 65%
do oramento da Manuteno de Paz destina-se a frica. Mas para resolver
o problema dos conflitos em frica, preciso tratar das suas causas
profundas. A Manuteno de Paz tem que ser acompanhada por processos
polticos de resoluo de conflitos e o desenvolvimento tem que ser prioritrio
para se conseguir uma Paz duradoura.49
49 Prioridades do Secretrio-Geral da ONU, Ban Ki-moon, (1 de Janeiro de 2007) Uma ONU mais forte para um Mundo Melhor traduo do autor
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II. 2. DEVER DE PREVENIR
Enfrentar os desafios colocados pelas ameaas de hoje implica levar a srio
a preveno; as consequncias de deixar ameaas latentes chegarem a
manifestar-se, ou permitir que ameaas existentes se difundam, demasiado
grave.
O desenvolvimento tem que ser a primeira linha de defesa de um sistema de
segurana colectiva que leve a preveno a srio. Combater a pobreza ir
no s salvar milhes de vidas como tambm fortalecer a capacidade dos
Estados para combater o terrorismo, o crime organizado e a proliferao. O
desenvolvimento faz-nos todos mais seguros. () Claro que s vezes, a
preveno falha. Por vezes as ameaas tm que ser tratadas por meios
militares. A Carta da Naes Unidas fornece um quadro claro para o uso da
fora. Os Estados tm um inerente direito auto-defesa, consagrado no
artigo 51. O Direito Internacional consuetudinrio permite aos Estados usar
fora militar apenas se a ameaa de ataque for eminente, nenhum outro meio
o poder evitar, e o uso for proporcional. O Conselho de Segurana das
Naes Unidas tem a autoridade para agir preventivamente, mas raramente o
fez. O CS necessita de estar preparado para ser mais pr-activo no futuro,
tomando aces decisivas mais cedo. Estados que temam a emergncia de
ameaas distantes tm a obrigao de trazer essas preocupaes ao CS.50
As mais evidentes ameaas segurana transnacional, que requerem uma
resposta mais pr activa, so duas: o terrorismo e a proliferao de Armas
Destruio Macia (ADM) ou melhor, Nucleares, Biolgicas e Qumicas
50 in Relatrio do Painel de Alto Nvel da ONU sobre Ameaas, Desafios e Mudana (2004) Um mundo mais seguro: a nossa responsabilidade partilhada, pgs. 2-4 traduo do autor
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(NBQ). A possibilidade destes dois factores, sobretudo se combinados,
ameaarem a segurana mundial de um dramatismo sem precedentes.
uma corrida contra o tempo que est a ser tratada de forma displicente. A
ameaa que a referida combinao constitui no s a auto-evidente como
tambm a que decorre de gerar uma enorme potencial conflituosidade, ao
impulsionar a extenso do conceito de legtima defesa preventiva51 e a
corrida aos armamentos NBQ52.
No plano da construo de uma resposta global contra o terrorismo
necessrio apostar em duas vertentes, ambas relacionadas com uma j h
muito devida estreita cooperao internacional baseada na transparncia: o
fechar dos seus canais de financiamento, com tudo o que isso implica de
alterao das regras financeiras em todo o mundo, desde as off-shores a
51 Acerca da polmica sobre a validade da prtica da legtima defesa preventiva de referir que a leitura stricto sensu do princpio subjacente prpria legtima defesa e ao Direito Internacional Pblico que a regula, nomeadamente o artigo 51 da Carta das Naes Unidas, exclu claramente a possibilidade de legtima defesa preventiva. Com a exigncia da ocorrncia de um ataque armado, aquele preceito [artigo 51 da CNU] parece admitir apenas a legtima defesa repressiva e no a legtima defesa preventiva, o que perverte o conceito e o conduz a um absurdo. in Gonalves Pereira, A. e Quadros, F. (1993) Manual de Direito Internacional Pblico, Coimbra: Livraria Almedina. J Oscar Shachter [Shachter, O. (1991), International Law in Theory and Practice, Drodrecht (Netherlands): Nartinus Nijhoff Publishers.] distingue entre legtima defesa preventiva e antecipada, sendo que a primeira pode ir ao ponto de prevenir, por meio de aco militar, a possibilidade de um Estado desenvolver meios que possibilitem uma agresso futura e a segunda, menos polmica, ser a mera antecipao militar a uma agresso iminente, como defende Tuscoz, J. (1993), Droit International, Paris: Presses Universitaires de France: (...) o Direito deve ceder por vezes perante as exigncias da estratgia militar, um Estado que est na iminncia de ser atacado pode, legitimamente, recorrer fora antes da ofensiva. Esta questo torna-se to pertinente quanto os dias passam. O Compndio da Doutrina Social da Igreja, divulgado em 25 de Outubro de 2004 pelo Conselho Pontifcio Justia e Paz (CPJP), do Vaticano, condena a guerra preventiva, pois sem provas claras de que um ataque esteja iminente, no se pode deixar de tomar em considerao srias questes morais e jurdicas, considerando ainda ser necessrio identificar as ameaas concretas Paz e garantida a legitimidade internacional, interpretando que a Carta das Naes Unidas apenas admite o uso da fora em caos de legtima defesa e nunca sem autorizao do Conselho de Segurana. Este documento do CPJP aponta ainda as Armas de Destruio Macia e o terrorismo como as mais srias ameaas. Sobre esta polmica da legtima defesa preventiva patente que pelo menos a antecipada assume uma validade imposta pelos nossos tempo, No , por exemplo, razoavelmente expectante aguardar a efectivao de um agresso com qualquer armamento NBQ para proceder ento a uma resposta de legtima defesa repressiva, por esta menos dvidas legais suscitar. 52 Como poderia dizer um ditado norte-coreano ou iraquiano: a melhor maneira de no ser invadido por posse de ADM possui-las mesmo!
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segredos bancrios; e o aprofundar da cooperao entre os servios
policiais e de informaes, no s a nvel nacional, mas sobretudo a nvel
internacional, eventualmente com o alargamento da misso e o
desenvolvimento da estrutura da Organizao Internacional de Polcia
Criminal (a Interpol), cada vez mais integrada no sistema da ONU53.
tambm necessrio continuar a desenvolver os preceitos do Tratado de
No Proliferao (TNP)54, j reforados pela Conferncia de Reviso e
53 O histrico da relao entre a OIPC e a ONU, e o seu acelerar nos ltimos anos, reflecte bem o estmulo do terrorismo do novo milnio. A primeira iniciativa de criar uma coordenao entre Polcias de Investigao Criminal datada de 1914. A OIPC foi criada em 1946. Foi-lhe reconhecido estatuto consultivo como Organizao No-Governamental na ONU em 1949. Em 1971, a ONU reconhece a OIPC como Organizao Inter-Governamental. Com o novo milnio marcado pelo terrorismo transfronteirio, a relao aprofunda-se com maior rapidez: em 2004 inaugurado o escritrio de ligao da OIPC na ONU em Nova Iorque e nomeado um representante especial da OIPC junto da ONU. Em 2005 foram emitidos os primeiros Avisos Especiais da OIPC-ONU sobre Indivduos Sujeitos a Sanes da ONU contra os Talib e a Al-Qaeda, na sequncia da Resoluo 1671 do Conselho de Segurana da ONU, de 29 de Julho de 2005, instruindo o Secretrio-Geral a tomar os passos necessrios cooperao entre a ONU e a INTERPOL, correspondida pela Resoluo AG-2005-RES-05 da Assembleia-Geral da OIPC, em 19-22 de Setembro de 2005, que aprovou o Pedido do Conselho de Segurana das Naes Unidas para assistir as Naes Unidas no Contra-Terrorismo. Note-se tambm que em 2002 foi lanado o sistema I-24/7, que interliga bases de dados das Polcias de Investigao Criminal dos 183 Estados-parte da OIPC, e em 2003 foi criado o Centro de Comando e Coordenao, tambm com funcionamento permanente 24 horas sobre 7 dias por semana, em Frana, junto do Secretariado-Geral da OIPC/INTERPOL. 54 O Tratado de No-Proliferao Nuclear foi impulsionado pelos Estados Unidos e pela ento Unio Sovitica com o objectivo de evitar uma guerra nuclear e instaurar uma cooperao internacional para a utilizao civil da energia nuclear. Este tratado, datado de 1970, encontra-se presentemente ratificado por 187 pases, desde logo as cinco potncias nucleares reconhecidas, que so precisa e coincidentemente os Estados membros permanentes do Conselho de Segurana da ONU: EUA; Rssia; Frana; Reino Unido e China, proibindo a sua posse a todos os restantes signatrios do acordo. No so partes a ndia e o Paquisto, potncias nucleares que realizaram testes atmicos; Israel, que se calcula dispor de cerca de 100 ogivas nucleares, embora nunca tenha reconhecido publicamente a posse de armas nucleares, Cuba e a Coreia do Norte, que entra, sai e suspende ao sabor das negociaes, agora bilaterais, com os EUA. O Tratado de No-Proliferao Nuclear est baseado na distino entre as cinco potncias nucleares, que fabricaram ou accionaram uma arma nuclear antes de 1 de Janeiro de 1967, e os pases que no estavam dotados de armas nucleares. Nos termos do tratado, as potncias nucleares comprometem-se em no transferir armas nucleares para outrem ou ajudar qualquer pas a adquiri-las. O tratado contm o compromisso recproco dos Estados no detentores de armas nucleares no desenvolverem ou comprarem essas armas, garantindo-lhes o acesso ao uso pacfico da energia atmica, condicionando ao controle da AIEA (Agncia Internacional de Energia Atmica), com sede em Viena. ainda de referir que o combate proliferao de NBQ completado pela Conveno sobre Armas Biolgicas e a Conveno sobre Armas Qumicas, que at com base no exemplo do TNP, foram concebidos de forma a serem mais intrusivos.
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Extenso do Mandato do Tratado de No-Proliferao realizada em 1995,
que concluiu pela sua manuteno por tempo indefinido e sem condies,
colocando nfase na tnica do desarmamento.
A ameaa, sem precedentes, constituda por terroristas e Estados marginais,
instveis ou imprevisveis55 armados com ADM no pode ser tratada por um
regime de no proliferao antiquado e fracamente aplicado. A comunidade
internacional tem o dever de prevenir os desastres securitrios, a par dos
humanitrios, mesmo que o preo seja a violao da soberania de um Estado
e ainda que o Direito Internacional proba os Estados de interferirem nos
assuntos uns dos outros, com fora militar ou de qualquer outra forma.
Se responsabilidade de proteger implica que um Estado tenha a
responsabilidade de proteger as vidas, liberdades e direitos humanos bsicos
dos seus cidados, e que, se falhar ou for incapaz de cumprir essa
obrigao, a comunidade internacional tem a responsabilidade de entrar em
cena, j o dever de prevenir a responsabilidade dos Estados trabalharem
em conjunto para prevenir que governos nefastos, instveis, imprevisveis
e/ou patrocinadores de terrorismo obtenham ADM ou os meios de as aplicar.
Tal como a responsabilidade de proteger, o dever de prevenir comea pela
premissa de que as regras que governam o uso da fora, idealizadas em
1945 e incorporadas na Carta das Naes Unidas, so inadequadas. A
manuteno da paz e da segurana no Sculo XXI exige que a comunidade
internacional seja pr-activa e no reactiva e que os Estados-membros da
ONU assumam responsabilidades, a par dos seus direitos.
55 Coreia do Norte, Paquisto, Iro, quase todos os Estados do Mdio Oriente e Pennsula Arbica, sia Central
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Um dever de prevenir sustentar-se-ia em trs vertentes essenciais. A
primeira o controlar no s da proliferao de ADM mas tambm das
pessoas que as possuem. A segunda consiste em colocar a nfase na
preveno, apelando comunidade internacional que actue atempadamente
e que desenvolva uma lista de potenciais medidas dirigidas a determinados
Governos, especialmente medidas que no impliquem o uso da fora. A
terceira, que este dever de prevenir deve ser exercido colectivamente,
atravs de uma organizao global.
Ao abrigo da Carta das Naes Unidas, o Conselho de Segurana pode
actuar quando determinar a existncia de uma ameaa paz ou segurana
internacionais. Nada o impede de identificar um Governo nefasto ou instvel
ou imprevisvel, que possui ou ambiciona adquirir ADM, como uma ameaa
paz e segurana e tomar medidas contra ele como demonstram as
sanes CS/AIEA contra Iro e Coreia do Norte56. Esta responsabilidade
aplicar-se-ia aos casos onde acordos restritivos de programas de ADM
como Tratado de No-Proliferao, Conveno sobre Armas Biolgicas ou
Conveno sobre Armas Qumicas no tenham conseguido impedir um
regime perigoso de obter armas perigosas, ou quando um Estado se retira
das suas obrigaes, ou quando as ilude, ou quando existe uma falha nas
regras que precisa de ser preenchida de forma a evitar que tal regime se
aposse de ADM ou dos meios de as aplicar.
56 O risco da proliferao nuclear e outras armas pende sobre as nossas cabeas como a espada de Dmocles. O Conselho de Segurana tomou passos importantes no sentido da no-proliferao na Coreia do Norte e no Iro. in Prioridades do Secretrio-Geral da ONU, Ban Ki-moon (1 de Janeiro de 2007), Uma ONU mais forte para um Mundo Melhor traduo do autor.
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Mas por qu caracterizar este tipo de regimes? Por que as sociedades
abertas so sujeitas a escrutnio, criticismo e contramedidas pelos seus
opositores, internos e externos. As sociedade abertas so o principal aliado
dos tratados sobre armas NBQ e, sobretudo, a melhor garantia da sua no
utilizao. Por outro lado, a comunidade internacional pode descobrir tarde
demais o perigo que constitudo por uma sociedade fechada. A maior
ameaa potencial para a segurana internacional so os dirigentes
agressivos, cujo poder sobre o seu territrio e populao to grande que
no importa o quo brutais, agressivos ou irracionais se tornem que nenhuma
fora dentro da sua sociedade os poder travar. O seu poder absoluto
precisamente por terem isolado a populao, submetido a oposio interna,
fechando a sociedade, restringindo a informao tanto quanto possvel. Tais
dirigentes podem querer apenas consolidar e exercer o seu poder, mas se
optarem por ser uma ameaa para outros pases ou apoiar grupos terroristas
ser muito mais difcil saber o que esto a fazer e tomar medidas eficazes
para os travar. Os principais acordos sobre no-proliferao estigmatizam
armas e no regimes e dirigentes. Tratar as prprias armas e no os regimes
que as desenvolvem ou adquirem foi seguramente considerado uma base
mais objectiva para abordar o problema. S que esta abordagem trata da
mesma forma a Coreia do Norte e a Noruega. essa falha que faz com que
o sistema de no-proliferao seja acusado de ser vulnervel e de apenas
conseguir restringir os pases que no precisam de ser restringidos.
verdade que o TNP, pedra angular dos esforos internacionais neste
campo, ajudou no-proliferao nuclear na maioria dos casos e forneceu
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mesmo um caminho para os Estados que pretendiam terminar os seus
programas nucleares, como a frica do Sul57, o Brasil e a Argentina58.
Para serem eficazes, as medidas a aplicar tm que ser adequadas ao Estado
em causa. Quando um Estado procura as ADM pelo seu valor de dissuaso,
as garantias de segurana ou proteco dadas por outro Estado, ou grupo de
Estados, podem ser alternativas aceitveis. Quando um Estado transacciona
tecnologias sensveis por necessidades financeiras, um apoio econmico,
pela assistncia das Instituies Financeiras Internacionais, ajuda bilateral
directa ou incentivos comerciais, pode ser o mais apropriado.
A aco coerciva pode assumir a forma de sanes, penalizaes e
restries econmicas, incluindo eventualmente medidas dirigidas aos
dirigentes dos Estados, suas famlias ou seus associados directos. Aces
contra os fluxos financeiros ou os comrcios sensveis, que forneam o
suporte financeiro para o programa de armamento do Estado, incluindo
medidas contra o comrcio de mercado negro, podem tambm ser traves
eficazes. Aco coerciva pode tambm significar embargos, formais ou no,
para bloquear a transferncia de armas ou tecnologias e materiais relevantes.
Tudo isto no exclui a possibilidade do uso da fora para tratar as situaes
mais perigosas colocadas pela proliferao. Em Junho de 2003 e trs
meses aps a invaso do Iraque por alegada posse de ADM59, pelos EUA e
Reino Unido (e mais aliados) revelia do Conselho de Segurana da ONU
57 Em 1993, e nas vsperas de entregar o poder maioria negra, a ditadura racista procedeu ao desmantelar voluntrio do programa nuclear sul-africano. 58 Tambm nestes dois pases o advento da democracia foi a causa, embora numa perspectiva completamente diferente: os programas nucleares das ditaduras militares no foram prosseguidos pelos regimes democrticos que lhes sucederam. 59 Cuja existncia se comeou a dar como no provada a 1 de Maio de 2003, quando o presidente norte-americano declarou concluda a operao de invaso do Iraque.
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a Unio Europeia anunciou uma estratgia contra a proliferao
identificando medidas coercivas, incluindo, como ltimo recurso, o uso da
fora de acordo com as disposies da Carta das Naes Unidas.
Posteriormente, mas ainda nesse mesmo ms, o G8 (G7 mais Rssia)
abordou o mesmo assunto, considerando a proliferao de ADM e a
expanso do terrorismo internacional as mais prementes ameaas
segurana internacional, e anunciando que a fora sob o eufemismo de
outras medidas de acordo com o Direito Internacional pode ser usada para
tratar delas. Tambm o ento Secretrio-Geral da ONU, j um ano antes, em
2002, havia apelado ao CS que desenvolvesse critrios com vista a emitir
autorizaes atempadas para o decretar de medidas coercivas neste campo
e tambm que abordasse a melhor forma de responder a indcios de
genocdio e outras violaes comparveis dos Direitos Humanos.
Nenhum Estado deve suportar sozinho a obrigao de impedir ou reprimir um
regime agressivo de obter ADM. O Conselho de Segurana ser o melhor
instrumento para a aplicao de medidas colectivas, pela legitimidade sem
paralelo que a ONU confere s suas aces e que faz com que seja mais
fcil os Estados-membros as prosseguirem e mais difcil os Estados visados
evadirem-nas. Recorrentes faltas de consenso no seio do Conselho de
Segurana permitem que alguns Estados continuem a avanar com os seus
programas de ADM, provocando a reaco unilateral de outros Estados e
deteriorando ainda mais a estrutura e a credibilidade da ONU. Dada a
propenso do Conselho de Segurana para a paralisia, meios alternativos de
aplicao de medidas de combate proliferao so considerados. O
segundo meio mais legtimo seria a organizao regional concernante, dado
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ser tambm a mais provavelmente afectada pela ameaa emergente. Aps
essa, eventualmente outra organizao regional (mormente a NATO), com
menos relao directa com o alvo, mas com suficiente multilateralismo para
permitir uma deliberao sria sobre o exerccio de um dever colectivo. Aps
essa alternativa s sobra a aco unilateral, ou uma sua sucednea
coligao, o modelo das coalitions of the willing.
De qualquer forma, o recurso fora deve estar sujeito a certos princpios de
precauo. Todas as alternativas no-militares que possam alcanar o
mesmo fim devem ser esgotadas antes da fora ser usada, a menos que
esteja j demonstrado que sero inteis. A fora dever ser exercida na
menor escala, pelo mais curto perodo de tempo e na mais baixa intensidade
considerada indispensvel para alcanar o objectivo. O objectivo em si deve
ser razoavelmente alcanvel quando contraposto possibilidade de se
causar um mal maior, ou piorar a situao. Em suma, o uso da fora deve ser
guiado pelos princpios fundamentais do jus in belli: tem que ser uma medida
de ltimo recurso, usada na proporo do mal que se quer anular e com o
devido cuidado para poupar civis.
A proteco humanitria est a emergir como um princpio orientador da
comunidade internacional. Na mesma linha, o dever de prevenir dever
surgir como uma orientao no s para o processo decisrio do Conselho
de Segurana mas tambm dos governos nacionais na formulao das suas
prioridades de poltica externa. Aceitar este princpio, obrigaria tambm todos
os Estados a aceitar que h critrios especficos que tm que ser
preenchidos antes de uma aco preventiva ser autorizada.
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Captulo III
O Desenvolvimento Internacional
A populao mundial quase quadruplicou entre o incio e o fim do Sculo XX.
Cresceu a uma taxa anual mdia de 1,4% ao longo do Sculo XX, contra
0,4% e 0,5%, respectivamente, nos dois sculos precedentes, e apenas 0,1%
no conjunto dos dezoito sculos anteriores. Este crescimento deve-se no
fertilidade, que se reduziu, mas a um forte aumento da esperana de vida
mdia, proporcionado pelo progresso cientfico na rea da medicina e a
generalizao de polticas pblicas de sade. No obstante a exploso
demogrfica verificada durante todo o Sculo XX, a produo mundial de
bens e servios mais do que correspondeu, aumentando 19 vezes,
provocando uma quintuplicao do rendimento mdio per capita, com
especial incidncia na segunda metade do sculo. Em termos estritamente
econmicos, este significativo progresso, embora generalizado, foi
acompanhado por um aumento de desigualdades, quer entre pases, quer no
interior dos prprios pases. Em termos internacionais, enquanto o
rendimento mdio per capita da populao dos PD aumentou cerca de seis
vezes, a frica Subsariana e a sia do Sul continuaram a no conseguir que
o crescimento econmico ultrapasse o da populao.
Analisando a esperana de vida comparada entre as vrias regies do globo,
Amartya Sen ilustra que a pobreza extrema est agora fortemente
concentrada em duas regies especficas do mundo: sia do Sul e frica
Subsariana. Tm os mais baixos nveis de rendimento per capita de todas as
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regies, mas essa perspectiva no nos d uma ideia adequada da natureza e
contedo das respectivas privaes, nem da sua pobreza comparativa. ()
Em 1991 havia 52 pases com esperana de vida nascena inferior a 60
anos, com uma populao combinada de 1,69 mil milhes. 46 Desses pases
so da sia do Sul e da frica Subsariana, sendo s seis de fora destas duas
regies (Afeganisto, Camboja, Haiti, Laos, Papua Nova Guin e Imen),
sendo que a populao combinada destes seis pases apenas 3,5% da
populao total (1,69 mil milhes) dos 52 pases com baixa esperana de
vida. Toda a sia do Sul, excepto Sri Lanka (i. e., ndia, Paquisto,
Bangladesh, Nepal e Buto) e toda a frica Subsariana excepto frica do Sul,
Zimbabu, Lesoto, Botsuana e uma coleco de pequenas ilhas (por
exemplo, Maurcias e Seychelles) pertencem ao grupo dos outros 46 pases
com baixa esperana de vida 60.
Considerando que O desenvolvimento a longo prazo exige um grau
suficiente de segurana que facilite a reduo da pobreza e o crescimento
econmico61, analismos desafios e respostas presentes ao Sistema
Internacional na esfera da segurana. Identifiquemos agora alguns dos
principais desafios colocados ao desenvolvimento sustentvel.
III.1. A PROBLEMTICA DO DESENVOLVIMENTO INTERNACIONAL
Os agentes decisivos na montagem de uma nova economia global foram os
governos e, em particular, os governos dos pases mais ricos, o G7 e as suas 60 in Sen, A. (2000) Development as Freedom, First Anchor Books Edition, Nova Iorque, pg. 99 traduo do autor. 61 in Relatrio do Secretrio-Geral Ban Ki-moon ao Conselho de Segurana das Organizao das Naes Unidas (23 de Janeiro de 2008) Assegurar a paz e o desenvolvimento: o papel das Naes Unidas no apoio reforma do sector da segurana, 11, pg. 5 traduo do autor.
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instituies de suporte internacionais: o FMI; o Banco Mundial e a OMC. Trs
polticas interrelacionadas criaram as fundaes para a globalizao:
desregulao da actividade da economia interna (a comear pelos mercados
financeiros); liberalizao do comrcio e investimento internacionais; e
privatizao de empresas pblicas (muitas vezes vendidas a investidores
estrangeiros).62
O mecanismo para levar o processo de globalizao maioria dos pases no
mundo era simples: presso poltica, tanto atravs de presso governamental
directa como da impo
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