a revogação só exige contraditório e defesa

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RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 23.402 - PR

(2006/0271080-4)

RECORRENTE : LYNX VIGILÂNCIA E SEGURANÇA LTDA

ADVOGADO : RODRIGO AGUSTINI E OUTRO

T. ORIGEM : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ

IMPETRADO : GOVERNADOR DO ESTADO DO PARANÁ

RECORRIDO : ESTADO DO PARANÁ

PROCURADOR : CLEIDE ROSECLER KAZMIERSKI E OUTRO(S)

LITIS. PAS : POLISERVICE SISTEMAS DE SEGURANÇA S/C LTDA

ADVOGADO : LEOBERTO LUÍS BAZZANEZE E OUTRO(S)

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: Trata-se de recurso

ordinário interposto de decisão do Tribunal de Justiça do Estado do

Paraná que denegou a segurança, com cassação da liminar

concedida, em acórdão assim ementado:

MANDADO DE SEGURANÇA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. AUTORIDADE

COATORA. INDICAÇÃO CORRETA. LITISCONSORTE PASSIVO

NECESSÁRIO. INOCORRÊNCIA. LEGALIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO.

INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. ORDEM DENEGADA, POR

MAIORIA.

1. "Autoridade coatora é aquela da qual emana o ato ilegal ou

abusivo de poder e a legitima para dispor de condições para restaurar

o status quo ante".

2. "Apenas quando direito de terceiro for passível de afetação através

de decisão a ser proferida em mandado de segurança, deverá este

integrar a lide na qualidade de litisconsorte passivo necessário".

3. "A revogação só exige contraditório e defesa prévia se o

procedimento licitatório já se concluiu, tendo havido homologação e

adjudicação do objeto da licitação a um dos licitantes, nesta hipótese,

criou direitos subjetivos ao adjudicatário, sem embargo de que,

mesmo neste caso, a Administração não ter o dever jurídico de

contratar. Se a revogação do certame se deu antes da homologação,

não se aplica o disposto no § 3º do art. 43 da Lei nº 8.666/93,

podendo eventual defesa dos direitos da adjudicatária ser feita a

posteriori".

4. "Não há se falar em adjudicação se a licitação sequer foi

homologada".

5. "Existe estreita ligação entre a ilegalidade do ato praticado pela

suposta autoridade coatora e o direito líquido e certo a que visa

preservar o impetrante. Inexistindo a ilegalidade do ato, não há, na

outra ponta, direito líquido e certo a ser amparado pela tutela

jurisdicional". (fls.377/378)

Sustenta a recorrente que os motivos para a revogação do certame

apresentados pela autoridade ora impetrada, qual seja, ofensa à

competitividade e ao interesse público, não encontram respaldo em

justificativa plausível para tanto, defendendo ser inaplicável, in casu,

o teor do art. 49 da Lei 8.666/93.

Aduz que a competitividade, um dos requisitos do procedimento

licitatório, não impõe número mínimo de participantes e, se reduzida

foi a quantidade de interessados, deveu-se às condições postas no

edital de convocação.

Alega que, ofertado preço menor que o exigido no convocatório, o

que foi, inclusive, reconhecido pela comissão de licitação, não cabe

falar em ofensa ao interesse público.

Defende, a título de direito líquido e certo, participar de um certame

probo, impessoal e sem que haja violação dos princípios regentes da

licitação pública, estatuídos no art. 3º da Lei 8.666/93.

Ressente-se, ainda, de ter sido malferido o princípio do devido

processo legal, posto que a convocação para defesa da revogação

serviu apenas para cumprir mera formalidade, posto que

concomitante ao próprio ato revogatório.

Pugna, por fim, pela concessão de liminar, com o fim de obstar a

abertura de novo pregão que tenha por objeto o mesmo indicado no

lote II do pregão n. 468/2005, ou suspender a licitação, caso já

instaurado o novo pregão. Aduz que o fumus boni iuris se faz

presente, uma vez que a autoridade coatora abriu vistas à postulante

com o certame já praticamente revogado, além de não ter ocorrido

nenhum fato superveniente a ponto de ensejar a aplicação do art. 49

da Lei 8.666/93; e o periculum in mora reside na iminência de ser

privada de sua contratação, porque nova licitação está para ser

instaurada.

Após as contra-razões, subiram os autos, opinando o Ministério

Público Federal pelo improvimento do recurso.

Relatei.

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 23.402 - PR

(2006/0271080-4)

RELATORA : MINISTRA ELIANA CALMON

RECORRENTE : LYNX VIGILÂNCIA E SEGURANÇA LTDA

ADVOGADO : RODRIGO AGUSTINI E OUTRO

T. ORIGEM : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ

IMPETRADO : GOVERNADOR DO ESTADO DO PARANÁ

RECORRIDO : ESTADO DO PARANÁ

PROCURADOR : CLEIDE ROSECLER KAZMIERSKI E OUTRO(S)

LITIS. PAS : POLISERVICE SISTEMAS DE SEGURANÇA S/C LTDA

ADVOGADO : LEOBERTO LUÍS BAZZANEZE E OUTRO(S)

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (RELATORA): Temos,

originariamente, licitação, na modalidade de pregão, visando a

contratação de serviços de vigilância desarmada nas dependências

da Biblioteca Pública do Paraná.

A empresa impetrante alega que participou do procedimento

licitatório, chegou a ter reconhecida, pelo Coordenador da Disputa e

sua equipe de apoio, a aceitação de sua proposta, a qual apresentava

o menor preço, mas foi surpreendida, ao visitar o site específico das

licitações eletrônicas, com edital para outro certame contendo o

mesmo objeto. Defende a ausência de fato superveniente, exigência

expressa no art. 49 da Lei 8.666/93 para revogação da licitação,

sendo equivocada a interpretação dada ao princípio pela Casa Civil do

Governador do Estado do Paraná, uma vez que não macula o

interesse público terem participado do certame apenas duas

empresas. Entende que foi inobservado o princípio do devido

processo legal por falta de abertura de prazo para manifestação das

parte, no momento oportuno, ou seja, antes do ato convocatório.

Adverte a recorrente para a necessidade de avaliação das

peculiaridades do pregão, como modalidade de licitação introduzida

pela Lei 10.520/2002.

O pregão tem como peculiaridade a disputa aberta, com lances

verbais entre os participantes com melhores propostas. O iter

obedece ao escalonamento, seguindo o processo de eliminação o

seguinte procedimento: após a abertura dos envelopes e adotando-se

a proposta de menor valor como parâmetro, são eliminados os

concorrentes que apresentaram preço 10% (dez por cento) superior à

proposta mínima. Note-se que, não havendo pelo menos 3 ofertas

dentro desse limite, os autores das melhores ofertas, até o máximo

de 3, serão os que participarão dos lances, dos quais sairá o

vencedor.

Com isso, visa a Administração Pública conseguir um preço ainda

menor que os ofertados inicialmente.

O ato revogatório foi calcado em parecer contrário à homologação,

encaminhado ao Governador, sob o fundamento de falta de

competitividade e ausência de efetivo desconto da proposta de

preços.

A partir desses pontos, deve-se fazer as seguintes ponderações: o

fato de ter a autora vencido a primeira etapa do certame, é titular de

mera expectativa de efetivação do contrato para prestação dos

serviços licitados? Pode a Administração, na defesa do interesse

público, revogar a licitação por fato superveniente devidamente

justificado?

Dentro dos questionamentos, pergunta-se: o fato de terem acudido

ao pregão apenas duas empresas caracteriza falta de

competitividade? E o reduzido valor da proposta de preços, mesmo

dentro do patamar máximo publicado no edital de convocação,

configuraria malferimento a interesse público?

Não há regra determinando o número mínimo de participantes de um

pregão, ou o valor mínimo da proposta, prevendo o art. 49 da Lei

8.666/93:

A autoridade competente para a aprovação do procedimento somente

poderá revogar a licitação por razões de interesse público decorrente

de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e

suficiente para justificar tal conduta, devendo anulá-la por

ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros, mediante

parecer escrito e devidamente fundamentado.

No caso em exame, a assessoria jurídica comprovou a absoluta

legalidade do certame, como atesta o documento de fl. 126. Contudo,

para a assessoria do Governador do Estado, o reduzidíssimo número

de participantes desvirtuou a expectativa de maior competitividade e,

com ela, uma série de conseqüências ligadas ao preço do serviço,

relacionadas com o valor da licitação. Daí a manifestação contrária da

Casa Civil, ao argumento de que faltou ao certame a necessária

competitividade (fls. 128/130).

Para o Judiciário não é nada fácil, diante de um ato plenamente

vinculado, examinar a legalidade da conveniência e oportunidade que

aparece para justificar a revogação do processo seletivo, dentro da

única brecha facultada em lei para o administrador recusar a

proposta.

Com efeito, na modalidade de escolha pelo pregão eletrônico e na

interpretação do disposto no art. 4º, inciso IX, da Lei 10.520/2002,

menos de três ofertas já anuncia a possibilidade de melhoria do valor

da proposta. Entendo pertinente transcrever o dispositivo legal:

Não havendo pelo menos 3 (três) ofertas nas condições definidas no

inciso anterior, poderão os autores das melhores propostas, até o

máximo de 3(três), oferecer novos lances verbais e sucessivos,

quaisquer que sejam os preços oferecidos.

Na hipótese, somente duas empresas se apresentaram com ofertas

quase iguais ao valor maior indicado como possível pela

Administração.

Apesar da difícil tarefa de avaliar o Judiciário, no contexto, o que seja

interesse público, entendo que, efetivamente, não houve

competitividade, não houve disputa, e sim uma praticamente oferta

de serviço pelo máximo do valor estimado pela Administração, o que

dá chancela de legalidade ao ato impugnado, em nome do interesse

público. Observe-se que os pronunciamentos anteriores ao da Casa

Civil foram, eminentemente, técnicos, à luz da legislação, sem

mergulhar no juízo de conveniência administrativa.

Assim encaminhada a questão, em entendimento que está acorde ao

exame feito no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, surgem dois

outros questionamentos, os quais podem ser resumidos a um apenas:

oportunidade para o ato revogatório, antes de se oportunizar o

contraditório. Ora, só existe contraditório quando há em disputa

direito subjetivo e não mera expectativa.

Nos processos licitatórios de qualquer espécie, antes da

homologação, têm os concorrentes expectativa de direito ao

resultado da escolha a cargo da Administração, não sendo pertinente

se falar em direito adquirido. Verifica-se, pelos documentos acostados

aos autos, que o procedimento licitatório ainda estava em curso e, ao

titular de mera expectativa, não se abre o contraditório.

Por fim, é importante registrar que, diante do tempo decorrido, o

sucesso da impetrante, ora recorrente, seria resolvido em

indenização, porque já consumado o ato administrativo impugnado, o

que, aliás, não poderia ser diferente, em se tratando da execução de

um serviço essencial e continuado.

Consta dos autos a notícia de que o pregão, realizado em

substituição ao aqui impugnado, constante do pleito inicial da

recorrente, no sentido de obstá-lo, acabou por realizar-se. O

Desembargador Relator deste mandamus, em 22 de novembro de

2005, ordenou a suspensão dos atos subseqüentes, mas o certame

prosseguiu, com a ordem de citação da empresa vencedora do último

pregão, facultando-lhe a integração na lide, segundo seu interesse.

Com essas considerações, nego provimento ao recurso, confirmando

o acórdão impugnado.

É o voto.

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