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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURS CURSO DE DIREITO
A REPETIÇÃO DO INDÉBITO DOS TRIBUTOS SUJEITOS AO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO
GABRIELA DIPPE MACIESKI
Itajaí, 18 de maio de 2007.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURS CURSO DE DIREITO
A REPETIÇÃO DO INDÉBITO DOS TRIBUTOS SUJEITOS AO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO
GABRIELA DIPPE MACIESKI
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor Mestre Alexandre Macedo Tavares
Itajaí, 18 de maio de 2007.
AGRADECIMENTO
Cada conquista de minha vida está ligada a alguns apoiadores de minhas iniciativas. Pessoas companheiras que de uma forma ou de outra sempre oferecem a motivação necessária para a realização dos meus ideais.
Agradeço primeiramente a Deus, por me proporcionar uma família digna e de princípios, por me conceder a oportunidade de estudar este curso, bem como me conduzir durante todo o caminho. Peço a ele forças para não falhar na minha trajetória.
A todos os familiares que em mim acreditam, especialmente aos meus pais, Feliciano e Soraya.
Ao meu querido namorado Rodrigo, por todo amor, incentivo, companheirismo e compreensão.
Aos meus irmãos Eduardo e Danielle, pela amizade intensa. A minha avó Nancy, pela bondade e o respeito sempre demonstrados.
A todas as pessoas que me incentivaram ao longo desta caminhada, em especial às amigas e colegas de classe Fernanda da Silva e Juliana de Souza Fermino.
Em especial, ao meu Orientador Professor MSc. Alexandre Macedo Tavares, pela paciência, confiança e ajuda depositada no desenvolvimento deste trabalho.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus pais Feliciano Macieski e Soraya Maria Dippe Macieski, pela paciência, convívio pacífico, ensinamentos morais, auxílio, investimentos confiados e o incentivo empreendido durante toda minha vida e jornada acadêmica.
A Nancy Nabte Belkys Dippe, João Chede Dippe (in memoriam), Carlos Eduardo Dippe, Júlio César Dippe, Maria Gorete Macieski, Stefano Macieski e Antônia Macieski (in memoriam).
A todos meus professores, em especial ao professor Facchini, quem sempre apoiou e acolheu com dedicação especial os estudantes do curso de Direito.
E aos professores que por vezes me instigaram na busca do novo.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, 18 de maio de 2007.
Gabriela Dippe Macieski Graduanda
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Gabriela Dippe Macieski, sob o
título A Repetição do Indébito dos Tributos Federais sujeitos ao Lançamento por
Homologação, foi submetida em 18/06/2007 (dezoito de junho do ano de dois mil
e sete) à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Alexandre
Macedo Tavares (orientador), Leonardo Matioda (examinador) e Diego Richard
Ronconi (examinador) e aprovada com a nota 9.3 (nove ponto três).
Itajaí, junho de 2007.
Alexandre Macedo Tavares Orientador e Presidente da Banca
Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
CTN Código Tributário Brasileiro
N. Número
P. Página
TJSC Tribunal de Justiça de Santa Catarina
UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí
ED. Edição
CC/1916 Código Civil Brasileiro de 1916
CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002
ART. Artigo
ARTS. Artigos
STJ Superior Tribunal de Justiça
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Crédito Tributário1
“O Crédito Tributário é o vínculo jurídico, de natureza obrigacional, por força do
qual o Estado (sujeito ativo), pode exigir do particular, o contribuinte ou
responsável (sujeito passivo), o pagamento do Tributo ou da penalidade
pecuniária (objeto da relação obrigacional)”.
Lançamento2
“(...) é ele que opera a efetiva constituição do credito tributário, tornando-o líquido
e certo, logo, juridicamente exigível. (...) a ocorrência concreta do fato jurídico
tributário (fato gerador in concreto) não é, por si só, capaz de conferir exigibilidade
ao Tributo. Essa exigência há de ser concreta e individualmente formalizada por
um ato administrativo específico (Lançamento)”.
Lançamento como ato3
“Embora não se desconheça que o trabalho da fiscalização pode demandar diversas providências, tais como o levantamento e análise da documentação do contribuinte, a obtenção de dados e informações de terceiros, declaração de pessoas relacionadas com as atividades dos devedores, laudos de entidades especializadas, etc. (...) esses elementos e documentos constituem meros atos preparatórios do Lançamento, pelo fato de que apenas interessa o resultado da ação fazendária, o último ato praticado que positivará o Lançamento.”
1CARVALHO, Paulo de Barros Carvalho. Curso de direito tributário, 11 ed. São Paulo: Saraiva,1999, p. 255. 2TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário. 3ª ed. Florianópolis: Momento Atual, 2006. p. 118. 3MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário. 6ª ed. São Paulo: Dialética, 2005. p.278.
Lançamento como procedimento4
“O procedimento administrativo de Lançamento tem duas fases: a oficiosa e a
contenciosa. Concluída a primeira fase com a determinação do valor do Crédito
Tributário, é feita a notificação ao sujeito passivo. E a partir daí somente pode ser
modificado em virtude de (a) impugnação do sujeito passivo; (b) recurso de ofício;
(c) iniciativa da própria autoridade administrativa, nos casos previstos em lei
(CTN, art. 145)”.
Lançamento Direto ou de Ofício5
“O Lançamento Direto ou de Ofício é aquele efetuado pelo agente público
competente sem qualquer ajuda do sujeito passivo. Nessa modalidade de
Lançamento, o fisco age por conta própria, diretamente, verificando a ocorrência
do fato gerador determinando a matéria tributável, calculando o montante do
imposto devido, identificando o sujeito passivo e promovendo sua notificação. É o
Lançamento por excelência, em que a atuação privativa do agente fiscal é
inafastável. Esta modalidade de Lançamento está prevista no art. 149 do CTN”.
Lançamento por Homologação ou Autolançamento6
“Por homologação é o lançamento feito quanto aos tributos cuja legislação atribua
ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da
autoridade administrativa no que concerne à sua determinação. Opera-se pelo ato
em que a autoridade, tomando conhecimento da determinação feita pelo sujeito
passivo, expressamente a homologa (CTN, art. 150)”.
Lançamento Misto ou por Declaração7
“(...) o Lançamento será Misto ou por Declaração quando efetuado com base na
declaração do sujeito passivo ou de terceiro, isto é, quando um ou outro, na forma
da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre
matéria de fato, indispensável à sua efetivação (CTN art.147)”.
4MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, 27 ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p.192. 5HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 15ª ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 502. 6MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.195. 7TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p. 120.
Obrigação Tributária8
“Trata-se de autêntica relação jurídico-tributária, não se diferenciando das demais
relações de direito-obrigacional comum, tendo como nota característica a
participação do Poder Público em seu pólo-ativo”.
Repetição do Indébito Tributário9
“A repetição do indébito tributário é uma obrigação de devolução, decorrente de
um pagamento indevido de um tributo, formando um vínculo entre o particular e a
Administração Pública, que consiste na devolução dos indébitos advindo desse
pagamento. Essa consideração é a regra geral do instituto disposto no art.165 do
CTN. A exceção é o art.166 do mesmo diploma legal. Como toda exceção é um
desvio de regra, do comum, do usual, o referido artigo é essência de sua
polêmica pelas peculiaridades que ampara. Se o ordinário é o direito à devolução
das quantias pagas indevidamente, a exigência do art.166 referido consiste no
artifício legal que o Fisco utiliza-se para não satisfazer tal direito”.
Tributo10
“Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela
se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e
cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada (artigo 3° do
CTN)”.
Tributos diretos ou que não repercutem11
“(...) são aqueles cuja carga econômica é suportada pelo contribuinte, isto é, por
todo aquele que tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua a
respectiva hipótese de incidência tributária (caso do ISS a ser pago pelo
advogado, relativamente aos honorários percebidos em razão de serviços
profissionais prestados)”.
8MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.213. 9ESTRELA, Eduardo Caldeira. A repetição de indébito nos tributos indiretos. Aspectos conceituais e polêmicos. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 796, 7 set. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7236>. Acesso em: 18 maio 2007. 10Art. 3°. Código Tributário Nacional - Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966. 11TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p 70.
Tributos indiretos ou que repercutem12
“(...) são aqueles cuja carga econômica é suportada não pelo contribuinte, mas
por terceira pessoa que não realizou a situação definida em lei como necessária à
instauração do liame jurídico-obrigacional de pagar o respectivo tributo
(geralmente é o consumidor final da mercadoria ou produto). Convém registrar
que esta classificação, em rigor, não é jurídica, posto que irrelevante ao Direito
Tributário saber quem suporta a carga econômica do imposto. Trata-se, como é
cediço, de classificação adotada pela Ciência das Finanças. Importa, pois, à
província do Direito Tributário, saber quem efetivamente realizou o fato jurídico
tributário (...) pouco importando haver ou não repasse deste encargo ao preço
final do produto, mercadoria ou serviço”.
12 TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p 70.
SUMÁRIO
RESUMO.....................................................................................XXIIIII
INTRODUÇÃO ................................................................................... 1
CAPÍTULO 1.........................................................................................4
O PAGAMENTO COMO FORMA REGULAR DE EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO ..................................................................................... 4 1.1 TRIBUTO: CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA ESPECÍFICA.....................4 1.2 OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA .............................................................................7 1.3 ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA ....................................................8 1.3.1 Obrigação Tributária principal ....................................................................9 1.3.2 Obrigação Tributária acessória ...............................................................10 1.4 ELEMENTOS DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA..............................................12 1.4.1 Sujeitos ......................................................................................................13 1.4.2 Fato gerador ...............................................................................................17 1.4.3 Objeto..........................................................................................................21
CAPÍTULO 2.......................................................................................24
O LANÇAMENTO COMO ATO CONSTITUTIVO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO.................................................................................... 24 2.1 CRÉDITO TRIBUTÁRIO.................................................................................24 2.2 A CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO PELO LANÇAMENTO .......26 2.3 LANÇAMENTO: CONCEITO, FUNÇÃO E NATUREZA JURÍDICA ..............28 2.4 O LANÇAMENTO COMO ATO OU PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO ..32 2.5 MODALIDADES DE LANÇAMENTO .............................................................34 2.5.1 Lançamento Direto ou de Ofício ...............................................................35 2.5.2 Lançamento Misto ou por Declaração......................................................36 2.5.3 Lançamento por Homologação ou Autolançamento ..............................39
CAPÍTULO 3.......................................................................................44
A REPETIÇÃO DO INDÉBITO DOS TRIBUTOS LANÇADOS POR HOMOLOGAÇÃO ............................................................................ 44 3.1 PRESSUPOSTO DO DIREITO À RESTITUIÇÃO: PAGAMENTO INDEVIDO OU A MAIOR QUE O DEVIDO.............................................................................44 3.2 FUNDAMENTO LEGAL DO PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO........................................................................................................48 3.3 FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO À RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO......................................................................................53 3.3.1 Princípio da legalidade ..............................................................................54
3.3.2 Princípio da moralidade administrativa ...................................................55 3.3.3 Princípio da vedação do enriquecimento sem causa .............................57 3.4 A RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO E O PRAZO PRESCRICIONAL QÜINQÜENAL .......................................................................59 3.5 A TESE DOS CINCO MAIS CINCO VINCULADA À RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO DOS TRIBUTOS AUTOLANÇADOS..................................................62 3.6 A LEI COMPLEMENTAR N° 118/05 E A SUPERAÇÃO DA TESE DOS CINCO MAIS CINCO SEDIMENTADA PELO STJ...............................................63 3.7 O ART. 166 DO CTN E A RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO.......65
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................69
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS............................................73
RESUMO
A presente monografia aborda a questão da Repetição do
Indébito dos Tributos sujeitos ao Lançamento por Homologação, tema este que
vem desafiando a doutrina e a jurisprudência pátria. Mediante a utilização do
método indutivo, objetivou-se com este trabalho analisar a sistemática da
compensação de um indébito tributário. Através da pesquisa, obtiveram-se os
seguintes entendimentos: a) o direito a Repetição de Indébito tem fundamento
constitucional nos princípios da legalidade, moralidade administrativa, direito a
propriedade e no princípio universal que veda o enriquecimento sem causa; b) no
âmbito do direito tributário o direito à Repetição do Indébito não é condicionado à
prova do erro do pagamento, nos termos como exigido nas pretensões
repetitórias vinculadas às relações jurídicas de direito privado; c) antes do
advento da Lei Complementar 118/05 o prazo prescricional da Repetição do
Indébito de um Tributo Lançado por Homologação poderia ser de até dez anos
(tese dos cinco mais cinco); d) após a vigência da Lei Complementar 118/05,
marcada para 09 de junho de 2005, independentemente da modalidade de
Lançamento do Tributo, o prazo prescricional da Repetição do Indébito é de cinco
anos a contar da data do pagamento indevido; e) a restituição de Tributos que
comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro –
Tributos indiretos- somente será feita a quem prove haver assumido referido
encargo, ou no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente
autorizado à recebê-la (CTN, art. 166).
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto a Repetição do
Indébito dos Tributos sujeitos ao Lançamento por Homologação.
O seu objetivo é demonstrar quais os pressupostos do
direito à restituição dos Tributos pagos indevidamente ou a maior do que o
devido, assim como identificar quais são os fundamentos legais que embasam o
alcance deste direito.
Para tanto, principiar-se-á, no Capítulo 1, tratando de
conceituar a natureza jurídica do Tributo e da Obrigação Tributária, determinando
quais as espécies existentes, bem como os elementos constituintes da obrigação.
Encerra-se o capítulo, demonstrando a possibilidade da extinção da Obrigação
Tributária através do pagamento.
No Capítulo 2, tratar-se-á do conceito do Crédito Tributário,
bem como da maneira pelo qual o mesmo é constituído, dando ênfase à teoria do
Lançamento Tributário e aos elementos que lhe conferem contornos jurídicos, tais
como natureza jurídica, função e suas modalidades (Lançamento Direto ou de
Ofício, Lançamento Misto ou por Declaração e o Lançamento por Homologação
ou Autolançamento).
No Capítulo 3, apresentar-se-á uma breve introdução sobre
os pressupostos necessários ao direito à restituição de Tributos indevidamente
pagos, especificamente, o direito à restituição do Indébito dos Tributos Lançados
por Homologação, enfatizando-se algumas particularidades vinculadas ao tema,
tais como a existência de fundamento constitucional implícito a tal direito, a
questão do prazo prescricional aplicável antes e depois da Lei Complementar
118/05, bem como o obstáculo ao direito de restituição dos Tributos indiretos,
representado pelo art. 166 do CTN.
Os problemas que impulsionaram a presente pesquisa foram
os seguintes:
2
� Assim como previsto no Código Civil, em seu art. 87713, é a prova do erro uma condição de ação da Repetição do Indébito Tributário?
� Existe prazo prescricional para pleitear a restituição de um Tributo indevidamente pago e lançado por Homologação? No caso de existência, qual seria este prazo?
� Todo e qualquer Tributo indevidamente pago comporta restituição, independentemente da observância de qualquer condição?
Em relação aos problemas formulados foram levantadas as
seguintes hipóteses:
a) a prova do erro do pagamento poderá ser condição do
pedido de Restituição do Indébito Tributário;
b) o prazo prescricional da restituição do Indébito de um
Tributo lançado por Homologação poderá existir;
c) uma vez pago indevidamente, o respectivo valor do
indébito tributário poderá ser restituído ao contribuinte,
independentemente da observância por parte deste de
qualquer condição, salvo o próprio comprovante de
recolhimento.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo14, sendo que nas diversas fases da
pesquisa foram acionadas as Técnicas do Referente15, da Categoria16, do
Conceito Operacional17 e da Pesquisa Bibliográfica18.
13“Àquele que voluntariamente pagou o indevido incumbe a prova de tê-lo feito por erro”. Art. 877, Código Civil Brasileiro. Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002. 14Método indutivo - “Pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 8° ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2003. p. 104. 15Técnicas de referente - “(...) a explicitação prévia dos motivos, dos objetivos e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p.62.
3
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre a Repetição do Indébito dos Tributos sujeitos ao Lançamento por
Homologação.
16Categoria - “(...) a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 31. 17Conceito operacional - “Quando nós estabelecemos ou propomos uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos, estamos fixando um Conceito Operacional”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 45. 18Pesquisa bibliográfica - “(...) técnica de pesquisa, instrumento posto a serviço da pesquisa Científica para auxiliar o Pesquisador na utilização do(s) método(s)”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 107.
CAPÍTULO 1
O PAGAMENTO COMO FORMA REGULAR DE EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO
1.1 TRIBUTO: CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA ESPECÍFICA
É de relevante importância, para o estudo a ser realizado,
que se conceitue primeiramente o que vem a ser Tributo, bem como o ramo do
direito que o tem como objeto, ou seja, o Direito Tributário.
O Direito Tributário, segundo Tavares19:
(...) é o ramo didaticamente autônomo do Direito que abriga um complexo de normas, valores e princípios que lhe são inerentes, disciplinadores do nascimento, fiscalização, exigibilidade e extinção do Tributo, fruto de uma relação jurídica de Direito Público, instaurada entre o Fisco e contribuinte.
Para a definição do objeto de estudo do Direito Tributário, ou
seja, o Tributo, parte-se do texto do próprio Código Tributário Nacional que, em
seu art. 3°, dispõe:
Art. 3º. Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.
Ser “compulsório”, para fins do disposto no art. 3º do CTN,
não quer dizer simplesmente “ser obrigatório”, até mesmo porque, em princípio,
toda prestação jurídica é obrigatória. A compulsoriedade a que se reporta o
dispositivo legal em mira, como aponta Tavares, “há de ser vista no momento do
19TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.5.
5
nascimento da obrigação, e não na etapa subseqüente voltada ao cumprimento
desse dever jurídico20”.
O pagamento do Tributo deve ser feito em dinheiro ou com
outros bens de valor monetário apurável e que estejam previstos em lei.
O Tributo consiste numa obrigação de adimplemento de uma
obrigação jurídica, e não numa simples ação de liberalidade do contribuinte de
doar algo ao Estado. Esta obrigação não se confunde com modalidades punitivas
estatais, por isso, diga-se, que sua origem não é decorrente de uma sanção por
ato ilícito.
Em outros termos, a tributação jamais poderá ser fruto de
penalidade em razão de condutas contrárias ao ordenamento jurídico. O Tributo
não constitui conseqüência de um castigo!
A efetiva cobrança tributária é sempre ex lege, ou seja,
criada por lei. É o que impõe a Constituição da República Federativa do Brasil de
1988, em seu artigo 150, I, in verbis:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados e Municípios:
I - exigir ou aumentar Tributo sem lei que o estabeleça.
A cobrança “mediante atividade administrativa plenamente
vinculada” diz respeito ao Lançamento Tributário, regrado pelo artigo 142 do
próprio Código Tributário Nacional:
Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito pelo Lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do Tributo devido, identificar o sujeito passivo, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
20TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.55.
6
Parágrafo único. A atividade administrativa de Lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.
Entretanto, o agente administrativo, tendo conhecimento do
fato gerador, não pode furtar-se à constituição do Crédito Tributário, através do
respectivo Lançamento.
Dispondo o Código Tributário Nacional que o Tributo há de
ser cobrado mediante atividade administrativa plenamente vinculada, como
ensina Tavares, “quer significar que a autoridade administrativa não pode
preencher com seu juízo pessoal, subjetivo, o campo de indeterminação
normativa, buscando realizar em cada caso, a fiel interpretação da lei21”.
Esta deverá prefigurar com rigor e objetividade os
pressupostos para a prática de atos e o conteúdo que estes devem ter. Em outras
palavras, nada fica à critério da autoridade administrativa. Contendo a lei
indeterminações, devem estas ser preenchidas pela edição de ato normativo,
aplicável a todos que estiverem na mesma situação hipoteticamente prevista.
O que determinará a natureza jurídica específica do Tributo
é o fato gerador da respectiva obrigação. Este fato gerador significa um conjunto
de elementos que devem estar presentes em sua universalidade.
Como ensina Ataliba22:
É o fato concreto, localizado no tempo e no espaço, acontecido
efetivamente no universo fenomênico, que - por corresponder
rigorosamente à descrição prévia, hipoteticamente formulada pela
lei – dá o nascimento à Obrigação Tributária.
Se determinado fato, que dentro das regras gerais do Direito
Tributário pode ser considerado como fato gerador, vier a ocorrer, há
automaticamente a hipótese de incidência tributária, devendo o contribuinte,
recolher aos cofres públicos o Tributo devido.
21TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.61. 22ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 5º ed. São Paulo: Malheiros, 1992.p.61.
7
Conclui-se, por fim, que Tributos são as receitas derivadas
que o Estado recolhe do patrimônio dos indivíduos, baseado no seu poder fiscal
(poder de tributar, às vezes consorciado com o poder de regular), mas
disciplinado por normas de Direito Público que constituem o Direito Tributário.
1.2 OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA
A palavra obrigação possui vários significados, o que
dificulta sua efetiva conceituação. Na linguagem coloquial, como ensina Diniz,
“obrigação corresponde ao vínculo que liga um sujeito ao cumprimento de dever
imposto por normas morais, religiosas, sociais ou jurídicas23”.
Obrigação jurídica in genere nada mais é do que o vínculo
jurídico pelo qual uma pessoa (credora) pode exigir de outra (devedora) uma
prestação consistente em entregar alguma coisa (dar), ou em praticar certo ato
(fazer), ou, ainda, em abster-se de certo ato ou fato (não fazer), sob pena de
sanção24.
Com relação à Obrigação Tributária, ensina Soares de Melo
que “trata-se de autêntica relação jurídico-tributária, não se diferenciando das
demais relações de direito-obrigacional comum, tendo como nota característica a
participação do Poder Público em seu pólo-ativo25”.
A respeito do tema, preceitua Harada que “a Obrigação
Tributária, deste modo, é o poder jurídico onde o Estado tem o direito de exigir de
alguém o cumprimento de uma prestação26”.
Sua natureza é eminentemente ex lege, ou seja, decorrente
da própria lei tributária que a impõe. Segundo preceitua Federighi27:
Seu nascimento não depende da manifestação de vontade do sujeito passivo, dirigida a sua criação. Aliás, ainda que o devedor (sujeito passivo) ignore ter nascido a Obrigação Tributária, esta o
23DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil. Vol 2. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p.27. 24HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p. 482. 25MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.213. 26HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p. 482. 27FEDERIGHI, Wanderley José. Direito tributário: parte geral. 3º ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.90.
8
vincula e o submete ao cumprimento da prestação que corresponda a seu objeto.
O particular fica determinado a pagar uma prestação de
cunho patrimonial, prevista na legislação. A prestação pode servir para pagar o
Tributo, ou penalidade, dependendo de como é definido pela lei o ato praticado.
1.3 ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA
A Obrigação Tributária é de duas espécies: principal e
acessória. O Código Tributário Nacional, no dispositivo 113, § 1° e 2°, dispõe:
Art. 113. A Obrigação Tributária é principal ou acessória.
§ 1. ° A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de Tributo ou penalidade pecuniária e extingui-se juntamente com o crédito dela decorrente.
§ 2. ° A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos Tributos.
No que diz respeito às fontes pelos quais surgem, as
obrigações podem ser: legais, quando decorrem diretamente da lei; contratuais,
quando nascem da vontade compactuada pelas partes do negócio jurídico em
questão; decorrente de fato ilícito, quando nascem da prática de um ato contrário
a norma; ou, ainda, pela declaração unilateral da vontade.
Machado28, a respeito do tema exposto, escreve que:
As fontes da Obrigação Tributária são a lei e o fato gerador. A primeira é fonte formal. A última consiste em fonte material, entretanto, as duas são indispensáveis, pois não há Obrigação Tributária sem a descrição legal da hipótese de seu surgimento. Mas só a descrição legal não basta. É preciso que ocorra o fato descrito na hipótese. A previsão legal- (hipótese de incidência) - mais a concretização desta - (fato gerador) - criam a Obrigação Tributária.
28MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.144.
9
Quanto ao objeto as obrigações em geral podem ser de dar
e de fazer, compreendidas nestas últimas as positivas e negativas, isto é, as
obrigações de fazer, não fazer e tolerar.
1.3.1 Obrigação Tributária principal
Obrigação Tributária principal é aquela que surge com a
ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de Tributo ou penalidade
pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente (C.T.N., art.
113, § 1º).
Primeiro, quando se diz que a Obrigação Tributária surge
com a ocorrência do fato gerador, não está negando a natureza legal da
Obrigação Tributária, pois, somente a lei em sentido estrito29, pode definir uma
dada situação como hipótese de incidência do Tributo, como disposto no art. 97,
III, do Código Tributário Nacional:
Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:
I- (...)
II-(...)
III - a definição do fato gerador da Obrigação Tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3° do art. 52, e do seu sujeito passivo.
Assim, deve-se interpretar a afirmação constante da parte
inicial do mencionado dispositivo legal no sentido de que a Obrigação Tributária,
prevista de forma abstrata e genérica na lei, concretiza-se com a ocorrência do
fato gerador.
Segundo, a Obrigação Tributária principal consiste em uma
obrigação de natureza patrimonial, que é a de dar coisa incerta, porque antes da
ocorrência do fato gerador o objeto da prestação tributária não está
29Lei em sentido estrito – “(strictu sensu), entendida como norma jurídica aprovada pelo legislativo e sancionada pelo executivo, ao contrário da lei em sentido amplo que se entende como qualquer norma jurídica emanada do estado que obriga a coletividade, assim os tributos só podem ser criados ou aumentados através de lei strictu sensu. É importante frisar que em relação à criação de tributos não existem exceções, ou seja, todos os tributos devem ser criados por lei (em sentido estrito)”. Disponível em: <http://www.vemconcursos.com/opiniao/index.phtml?page_sub=5&page_id=1155>. Acesso em 25 de junho de 2007.
10
especificamente individualizado, sendo apenas indicado pelo seu gênero,
prestação pecuniária e esta não é determinada, mas determinável.
Disso resulta que a Obrigação Tributária prevista
abstratamente na lei e concretizada com a ocorrência do fato gerador tem a
natureza de obrigação ilíquida, já que o Lançamento é que lhe conferirá liquidez.
Terceiro, o § 1º do art. 113 do CTN, ao fazer menção de que
a Obrigação Tributária nasce com a ocorrência do fato gerador, consagra a
natureza declaratória do Lançamento, que visa declarar uma situação pré-
existente, qual seja, aquela existente no momento da ocorrência do fato gerador.
Quarto, o dispositivo em tela dispõe ainda que a Obrigação
Tributária principal tem por objeto o pagamento de Tributo ou penalidade
pecuniária.
Carvalho30 critica o legislador por colocar o pagamento da
penalidade pecuniária como objeto da Obrigação Tributária principal:
(...) porque estaria negando a cláusula do art. 3º do Código Tributário Nacional, quando afirma que o Tributo não constitui a sanção do ato ilícito, embora o Tributo e a penalidade correspondam a uma prestação de natureza patrimonial.
Quinto, a cláusula final do § 1º do art. 113 prescreve que a
obrigação principal extingue-se com o crédito dela decorrente. Vale ressaltar, por
oportuno, que não existe Crédito Tributário sem Obrigação Tributária precedente,
mas pode existir Obrigação Tributária sem Crédito Tributário, subseqüente caso
em que o Fisco decai do direito de constituir o crédito pelo Lançamento (CTN. art.
173).
1.3.2. Obrigação Tributária acessória
A Obrigação Tributária acessória decorre da legislação
tributária e tem por objeto o cumprimento de prestações, positivas ou negativas,
30CARVALHO, Paulo de Barros Carvalho. Curso de direito tributário, p. 210.
11
nelas previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos Tributos,
consoante redação do dispositivo 113 do CTN, em seu § 2º:
Enquanto a Obrigação Tributária principal só pode decorrer de lei, a Obrigação Tributária acessória pode ser estabelecida por qualquer das normas que integram a legislação tributária. Pode decorrer de uma norma regulamentar ou complementar31.
A Obrigação Tributária acessória visa atender aos
interesses do Fisco no tocante a fiscalização e arrecadação dos Tributos e
corresponde a qualquer exigência feita pela legislação tributária que não seja o
pagamento do Tributo.
Assim, a mencionada obrigação pode consubstanciar uma
obrigação de fazer (declaração de bens, exibição de livros, prestação de
informações, etc), obrigação de não-fazer (não destruir documentos e livros
obrigatórios pelo prazo exigido por lei) e tolerar (exame em livros e documentos,
não impedir a fiscalização, etc).
Carvalho32 designa as Obrigações Tributárias acessórias
como deveres instrumentais ou formais:
Deveres, com o intuito de mostrar, de pronto, que não têm essência obrigacional, isto é, seu objeto carece de patrimonialidade. E instrumentais ou formais, porque, tomados em conjunto, é um instrumento de que dispõe o Estado - Adminis-tração para o acompanhamento e consecução dos designos tributários.
O § 3º do art. 113 do CTN prescreve que a não observância
da obrigação acessória faz com que a mesma se converta em obrigação principal,
relativamente à penalidade pecuniária. O legislador quer significar nessa regra
que a Obrigação Tributária acessória, que originariamente não tem essência
econômica ao ser descumprida pelo contribuinte, ao fazer incidir a penalidade
pecuniária, passa a ter valor econômico, e nesse sentido se deve entender a sua
conversão em obrigação principal. 31ICHIHARA, Yoshiaki. Direito tributário. 7° ed. São Paulo: Atlas,1997.p. 116. 32CARVALHO, Paulo de Barros Carvalho. Curso de direito tributário, p. 206.
12
Soares de Mello33 afirma que a legislação ordinária deve
estabelecer as penalidades para o descumprimento desses deveres, que nem
poderiam ser rotulados de acessórios, porque nem sempre têm efetiva conexão
com a obrigação principal (não-incidências, isenções, imunidades, etc).
Para aclarar o tema, precisa é a lição de Machado34:
As obrigações acessórias não precisariam existir se não existissem as obrigações principais. São acessórias, pois, neste sentido. Só existem em função das principais, embora não exista necessariamente um liame entre determinada obrigação principal e determinada obrigação acessória. Todo o conjunto de obrigações acessórias existe para viabilizar o cumprimento das obrigações principais.
A Obrigação Tributária acessória, portanto, tem o objetivo de
viabilizar o controle dos fatos relevantes para o surgimento de obrigações
principais.
1.4 ELEMENTOS DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA
Os elementos da Obrigação Tributária são os seguintes: a)
sujeito ativo, que é a pessoa jurídica de direito público ou privado competente
para exigir Tributos, como será explicado mais adiante; b) sujeito passivo, que
consiste na pessoa física ou jurídica obrigada por lei ao cumprimento da
prestação tributária, denominado contribuinte ou responsável; c) causa, a lei, em
razão do princípio da legalidade tributária, pelo que a vontade jurídica dos
indivíduos é inapta para criá-la; d) objeto, o cumprimento de uma prestação
positiva ou negativa determinada por lei.
Na mesma linha de pensamento preceitua Harada35: “da
definição supra de Obrigação Tributária podem-se extrair seus elementos
constitutivos, quais sejam, a lei, o fato, os sujeitos e a prestação ou objeto”.
33MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.214. 34MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.143. 35HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p. 483.
13
1.4.1 Sujeitos
O art. 119 do CTN prescreve que o “sujeito ativo da
Obrigação Tributária é a pessoa jurídica de direito público titular da competência
para exigir o seu cumprimento”. Este dispositivo merece alguns comentários.
Em primeiro lugar, a definição legal de sujeito ativo funda-se
na competência tributária para exigir o cumprimento da prestação tributária e não
para instituir Tributos. Em segundo lugar, e como corolário natural da observação
anterior, não é somente a União, os Estados, Distrito Federal e os Municípios, que
podem exigir o cumprimento da prestação tributária.
A CRFB/88, ao disciplinar as contribuições parafiscais em
seu art. 149, confere à União a competência privativa para a instituição de
contribuições corporativas, ou seja, de interesse de categorias profissionais ou
econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas.
Sobre o tema, consigna-se lição de Tavares36 :
Denomina-se de parafiscal, portanto, todo o Tributo que, por força de delegação da capacidade tributária ativa (legalmente atribuída pelo titular da competência tributária), é arrecadado e fiscalizado por terceira pessoa (pública ou privada), perseguidora de finalidades públicas ou de interesse público, as quais passam a dispor dessa receita para a consecução dos seus objetivos. Sempre que, por delegação legal, um Tributo for arrecadado e fiscalizado por pessoa diversa daquela que possui competência para instituí-lo, em benefício de suas próprias finalidades, faz-se presente o fenômeno da parafiscalidade.
Carvalho preleciona que: “o sujeito ativo, que dissemos ser o
titular do direito subjetivo de exigir a prestação pecuniária, no direito tributário
brasileiro pode ser um pessoa jurídica pública ou privada (...)37”
Sujeito passivo da Obrigação Tributária, por sua vez, é a
pessoa, física ou jurídica, obrigada por lei ao cumprimento da prestação tributária
36TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.46. 37CARVALHO, Paulo de Barros Carvalho. Curso de direito tributário, p. 212.
14
principal ou acessória, esteja ou não em relação direta e pessoal com a situação
que constitua respectivo fato gerador.
O CTN, adotando a mesma sistemática empregada na
definição de Obrigação Tributária (art. 113, §§ 1º e 2º) e de fato gerador (arts. 114
e 115), define em separado sujeito passivo da Obrigação Tributária principal (art.
121) e sujeito passivo da Obrigação Tributária acessória (art. 122).
Assim, sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa,
física ou jurídica, obrigada ao pagamento de Tributo ou penalidade pecuniária
(CTN, art. 121).
Sujeito passivo é a expressão genérica que comporta duas
espécies: contribuinte e responsável (CTN, art. 121, parágrafo único). O sujeito
passivo necessariamente deve ser definido em lei (CTN, art. 97, III) porque o
princípio da tipicidade tributária, visando a maior proteção de quem deve pagar o
Tributo, impõe que a lei defina todos os elementos da Obrigação Tributária para
que não sobre espaço algum que possa ser preenchido pela Administração.
Contribuinte é a pessoa física ou jurídica que tenha relação
de natureza econômica, pessoal e direta com a situação que constitua o
respectivo fato gerador (CTN, art. 121, parágrafo único, I).
Assim, o contribuinte é sujeito passivo direto, sua
responsabilidade é originária, e existe uma relação de identidade entre a pessoa
que nos termos da lei deve pagar o Tributo e a que participou diretamente do fato
gerador, dele se beneficiando economicamente.
Assim, normalmente a lei confere a obrigação de pagar o
Tributo à pessoa que tenha relação econômica com a situação que constitua o
fato gerador, ou seja, a pessoa que dela auferiu uma vantagem econômica. Daí a
lição de Harada38:
Assim, verificado tal pressuposto de fato, sobressai logo a sua atribuição à pessoa, cuja capacidade econômica ele traduz. A
38HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p. 480.
15
identificação do contribuinte, portanto, incumbe ao intérprete: independe de menção na lei. (...) basta que a lei refira-se a venda, compra, rendimento, propriedade imóvel, para se entender que os contribuintes dos impostos que recaem sobre estas operações são o vendedor, o comprador, o que perceba rendimentos, ou quem detenha a propriedade econômica do prédio ou do terreno. Desta forma, constituindo o fato gerador um índice, uma medida da capacidade contributiva do cidadão, nada mais normal que seja o contribuinte a pessoa obrigada ao pagamento do Tributo.
Por outro lado, o contribuinte de direito não se confunde com
o contribuinte de fato, também denominado meramente pagador de Tributo. O
contribuinte de fato não integra a relação jurídica Tributária e, em conseqüência,
não tem a obrigação legal de pagar o Tributo.
Entretanto, o art. 121, parágrafo único, II, do CTN, define
responsável como sendo a pessoa que, sem revestir a condição de contribuinte,
sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.
Assim, não tendo relação de natureza econômica, pessoal e
direta com a situação que constitua o fato gerador, o responsável é sujeito
passivo indireto, sendo sua responsabilidade derivada da lei e não da referida
relação. A obrigação do pagamento do Tributo lhe é cometida pelo legislador
visando facilitar a fiscalização e arrecadação dos Tributos.
Todavia, a lei não pode atribuir a responsabilidade tributária
pelo pagamento de Tributo a qualquer terceira pessoa, como dispõe o art. 128 do
Código Tributário Nacional:
Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste Capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade tributária pelo Crédito Tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.
Podem ser feitos os seguintes comentários ao art. 128 do
Código Tributário Nacional: a) primeiro, o responsável é um terceiro, mas o
16
legislador não tem liberdade para designar qualquer terceiro como responsável
tributário porque o mencionado dispositivo legal determina que esse terceiro deva
ter uma vinculação de qualquer natureza com o fato gerador da respectiva
obrigação; b) segundo, a atribuição da responsabilidade tributária à terceira
pessoa só pode ser feita lei formal, porque o responsável é espécie de sujeito
passivo e esse só pode ser determinado por lei em sentido estrito (CTN, art. 97.
III); c) terceiro, a lei, ao designar o terceiro como responsável tributário, pode
excluir a responsabilidade tributária do contribuinte, através da figura da
substituição tributária, ou atribuí-la ao mesmo em caráter supletivo do
cumprimento da Obrigação Tributária.
Torres39 estabelece as seguintes diferenças fundamentais
entre o contribuinte e o responsável:
a) o contribuinte tem o débito (debitum, Schuld), que é o dever de prestação e a responsabilidade (Haftung), isto é, a sujeição do seu patrimônio ao credor (obligatio), enquanto o responsável tem a responsabilidade (Haftung) sem ter o débito (Schuld), pois ele paga o Tributo por conta do contribuinte; b) a posição do contribuinte surge com a realização do fato gerador da Obrigação Tributária; a do responsável, com a realização do pressuposto previsto na lei que regula a responsabilidade, que os alemães chamam de fato gerador da responsabilidade (Haftungstatbestand).
O sujeito ativo da Obrigação Tributária se identifica na
condição de credor e é, em princípio, o próprio Estado. Assim, o direito positivo
nacional o define: sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público
titular da competência para exigir o seu cumprimento.
Entretanto, até entes de direito privado podem ser
autorizados a cobrar certos Tributos, na condição de sujeitos ativos de obrigação
desta natureza, por delegação da respectiva pessoa jurídica de direito público, tal
como ocorre com as contribuições chamadas parafiscais.
39TORRES, Ricardo Lobo. Normas de interpretação e integração do direito tributário. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p.67.
17
Já o sujeito passivo da Obrigação Tributária é a pessoa
física ou jurídica, privada ou pública de que se exige o cumprimento da prestação.
Na obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de Tributo ou
penalidade pecuniária, na acessória, a pessoa obrigada às prestações que
constituem seu objeto.
1.4.2 Fato gerador
Preliminarmente, é de se acentuar que o Código Tributário
Nacional adotou a denominação fato gerador para caracterizar a situação de fato
ou situação jurídica que, ocorrendo, determine a incidência do Tributo.
A vantagem de tal qualificação reside no fato de deixar
claro que o momento em que ocorre o fato gerador é aquele mesmo em que se
concretiza a Obrigação Tributária.
Todavia, Ataliba40 adotou a locução hipótese de incidência
para significar a descrição genérica e abstrata da situação feita pela lei,
reservando a expressão fato imponível para o fato efetivamente ocorrido. O CTN
emprega uma única vez, no art. 104, II, a expressão hipótese de incidência.
O CTN, como define em separado a Obrigação Tributária
principal (art. 113, § 1º) e a Obrigação Tributária acessória (art. 113, § 2º), adota a
mesma técnica, definindo o fato gerador da obrigação principal no art. 114 e o fato
gerador da obrigação acessória no art. 115.
Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em
lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. Assim, a lei refere-se de forma
genérica e abstrata a uma situação como hipótese de incidência do Tributo,
correspondendo à Obrigação Tributária abstrata. Quando a situação descrita na
lei materializar-se, ocorrerá a incidência do Tributo.
40ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária, p. 65.
18
A hipótese de incidência só pode ser definida em lei formal41
(CTN, art. 97, III), já que o legislador exige lei para esgotar todos os elementos da
Obrigação Tributária, não deixando espaço algum que possa ser preenchido pela
Administração. Com relação ao significado da lei formal:
No direito, a lei ordinária é um ato normativo primário e contém, em regra, normas gerais e abstratas. Embora as leis sejam definidas, normalmente, pela generalidade e abstração ("lei material"), estas contêm, não raramente, normas singulares ("lei formal" ou "ato normativo de efeitos concretos").Exemplo de lei formal:– Lei orçamentária anual (Constituição, art. 165, § 5o);– Leis que autorizam a criação de empresas públicas, sociedades de economia mista, autarquias e fundações (Constituição, art. 37, XIX)42.
De qualquer maneira, a simples ocorrência da situação
definida em lei basta por si mesma para concretizar a Obrigação Tributária. A
situação prevista na lei tributária como hipótese de incidência pode corresponder
a um fato, ao conjunto de fatos ou a uma situação jurídica, como deixa claro o art.
116 do CTN. Assim, um único fato, como a saída da mercadoria de
estabelecimento comercial, industrial ou produtor, por exemplo, configura a
hipótese de incidência do ICMS.
Por outro lado, a hipótese de incidência do imposto de renda
corresponde a um conjunto de fatos, qual seja, a série de rendas auferidas pelo
contribuinte durante o ano-base. A hipótese de incidência pode referir-se também
a uma situação jurídica, como a transmissão da propriedade em relação ao IPTU.
Fato gerador da obrigação acessória, consoante o art. 115
do CTN, é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável43, impõe a
41 Lei formal – “(...) é uma espécie de ato legislativo, emanada pelo Poder Legislativo por meio de processo próprio, destinado à elaboração de leis ordinárias ou complementares, perpassando por ambas as casas e incorrendo, ao cabo, em sanção ou veto pelo chefe do Executivo, goza de presunção de constitucionalidade. Uma vez publicada, subentende-se que válida e eficaz. É imperativa a sua aplicação. É de extrema importância que assim o seja, principalmente para a segurança jurídica ”. Art. 66, §1º, da CRFB/88. 42 Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_ordin%C3%A1ria>. Acesso em 25 de junho de 2007. 43Legislação tributária aplicável ou legislação tributária:“A expressão legislação tributária compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas
19
prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal (pagamento
de Tributo e de penalidade), como apresentação de declaração de bens, exibição
de livros obrigatórios, não destruição de documentos e livros obrigatórios pelo
prazo prescrito na lei, etc.
Enquanto a hipótese de incidência da Obrigação Tributária
principal só pode ser definida em lei (CTN, art. 97 III), a hipótese de incidência da
Obrigação Tributária acessória pode decorrer de lei, decreto ou norma
complementar, já que o art. 115 do CTN emprega a expressão legislação
tributária, cujo conceito é dado pelo art. 96 do CTN.
O fato gerador pode ser instantâneo ou complexivo,
conforme lição de Falcão 44:
Instantâneos são os fatos geradores que ocorrem num momento dado de tempo e que, cada vez que surgem, dão lugar a uma relação obrigacional tributária autônoma. Complexivos ou periódicos são os fatos geradores cujo ciclo de formação se completa dentro de um determinado período de tempo e que consistem num conjunto de fatos, circunstâncias ou acontecimentos globalmente considerados.
Exemplificando, pode-se dizer que fato gerador instantâneo
é a saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte, em relação ao ICMS;
é a entrada da mercadoria estrangeira no território nacional, quanto ao imposto de
importação; é a transmissão da propriedade de um bem imóvel, no que concerne
ao imposto de transmissão; fato gerador complexivo, periódico ou de formação
sucessiva, dá-se com o imposto de renda, no regime de declaração.
A importância do fato gerador para o estudo do Direito
Tributário é constatada através do conhecimento dos efeitos por ele produzidos.
Soares de Melo45 fixa com propriedade os efeitos do fato gerador:
complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes. Art. 96 do CTN. 44FALCÃO, Amilcar de Araújo. Introdução ao direito tributário. Rio de Janeiro: Edições Financeiras, 1959, p.98. 45MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.216.
20
(...) fixa o momento em que se materializa a Obrigação Tributária principal prevista abstratamente na lei (CTN, art. 113, § 1º); (...) identifica o sujeito passivo da Obrigação Tributária porque, enquanto a situação prevista em lei não ocorre, o sujeito passivo fica indeterminado em razão da generalidade da norma jurídica; (...) fixa os conceitos de incidência, não-incidência e isenção; incidência é a concreção da situação prevista abstratamente na lei; não-incidência é a não materialização da situação prevista na lei, isenção é a ocorrência do fato gerador, mas com a dispensa legal do pagamento do Tributo; (...) determina o regime jurídico da Obrigação Tributária, e, assim, a lei a ser aplicada será aquela que estiver vigorando no momento da ocorrência do fato gerador, ainda que no momento do Lançamento esteja revogada ou modificada (CTN, art. 144), e salvo disposição de lei em contrário, quando o valor tributário esteja expresso em moeda estrangeira, como ocorre, por exemplo, com os impostos aduaneiros, no Lançamento far-se-á sua conversão em moeda nacional ao câmbio do dia da ocorrência do fato gerador da obrigação (CTN, art. 143); (...) distingue os Tributos in genere porque é o exame do fato gerador que determina a sua natureza jurídica específica (CTN, art. 42); (...) diferencia os impostos in specie em razão também do exame do fato gerador, permitindo que a Constituição discrimine os impostos de competência privativa em relação a cada ente político; (...) classifica os impostos em diretos e indiretos, porque o fato gerador do imposto direto é uma situação com certa permanência, como a existência, a propriedade e a profissão, enquanto o fato gerador do imposto indireto corresponde a atos ou situações acidentais, como o consumo; (...) estabelece os princípios de atuação da discriminação constitu-cional de rendas no Brasil; (...) define a competência impositiva e determina os casos de invasão de competência e de bitributação; (...) permite a distinção entre Tributo vinculado e não vinculado, porque o fato gerador do Tributo vinculado corresponde a uma ação estatal específica relativa ao contribuinte, enquanto o Tributo não vinculado refere-se a uma situação inteiramente estranha a atividade estatal; (...) serve de índice, de medida, da capacidade contributiva do indivíduo porque a lei tributária quando define uma dada situação como hipótese de incidência do Tributo parte da premissa de que essa situação revela uma determinada capacidade contributiva; (...) permite a definição da base de cálculo do Tributo, porque essa sendo a sua expressão econômica deve guardar certa identidade com o fato gerador.
21
Os elementos do fato gerador são os seguintes, segundo
Harada46:
Objetivo, correspondente a situação descrita em lei para, ocorrendo, fazer com que a Obrigação Tributária, prevista abstratamente na lei, se concretize. Tal situação pode constar apenas de um fato (fato gerador instantâneo ou simples) ou de um conjunto de vários fatos (fato gerador complexo, complexivo ou periódico). (...) subjetivo, referente aos sujeitos ativo e passivo da Obrigação Tributária.
Do próprio conceito de Obrigação Tributária pode-se
observar que o fato gerador é a situação prevista em lei que uma vez ocorrida faz
nascer a Obrigação Tributária. Se o fato ocorrido obrigar o contribuinte a pagar
alguma quantia à Fazenda Pública, tem-se a obrigação principal, se apenas
obrigá-lo a fazer ou deixar de fazer algum ato, sem implicar em pagamento, tem-
se a obrigação acessória.
1.4.3. Objeto
O objeto da obrigação principal, como já visto, consiste na
prestação a qual se obriga o sujeito passivo e apresenta natureza patrimonial. É
sempre uma quantia em dinheiro, onde dar não tem o sentido de doar, mas de
adimplir o dever jurídico. Já o objeto da obrigação acessória é não patrimonial.
Não há a necessidade de dispêndio de valor pecuniário para o seu cumprimento.
A respeito do objeto da Obrigação Tributária principal e
acessória, pondera Tavares47:
Levando-se em consideração o que preceitua o art. 113 do CTN, tem-se como objeto da obrigação principal o comportamento do sujeito passivo, relativo à entrega de dinheiro aos cofres públicos (obrigação de dar), a título de Tributo ou penalidade pecuniária, uma vez realizada completa e rigorosamente a descrição hipotética (hipótese de incidência). (...) temos que o objeto da Obrigação Tributária acessória é todo e qualquer comportamento humano, reclamado pela respectiva legislação tributária, despido
46 HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p. 485. 47TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.112.
22
de cunho patrimonial, isto é, não condizente com a entrega de dinheiro aos cofres públicos. Circunscreve-se, por conseguinte, a prestações positivas ou negativas de interesse da arrecadação ou fiscalização (= obrigação de fazer, não fazer, tolerar).
Também preleciona Soares de Melo48:
(...) a obrigação principal tem por objeto o pagamento do Tributo ou penalidade pecuniária (...) enquanto a acessória tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse de arrecadação ou da fiscalização dos Tributos.
Na Obrigação Tributária, segundo Machado, existe o dever
do sujeito passivo de pagar Tributo ou a penalidade pecuniária (obrigação
principal) ou, ainda, de fazer ou não fazer ou de tolerar tudo aquilo que a
legislação tributária estabelece no interesse da arrecadação ou da fiscalização
dos Tributos. Essas prestações, todavia, não são desde logo exigíveis pelo sujeito
ativo. Tem este apenas o direito de fazer contra o sujeito passivo um Lançamento,
(espécie de cobrança de Obrigação Tributária), criando assim um crédito. O
crédito, esse sim é exigível49.
O CTN distinguiu a Obrigação Tributária do Crédito
Tributário, explanando o conteúdo daquele no dispositivo 113, enquanto que o
Crédito Tributário encontra-se previsto no art. 139.
Acerca da distinção entre Obrigação e Crédito tributário,
leciona Machado50 :
A Obrigação Tributária é um primeiro momento, seu conteúdo não é determinado e o seu sujeito passivo ainda não está formalmente identificado. Por isto mesmo a prestação respectiva ainda não é exigível. Já o Crédito Tributário é um segundo momento na relação de tributação. No dizer do CTN ele decorre da obrigação Principal e tem a mesma natureza desta. (...) na Obrigação Tributária existe o dever do sujeito passivo de pagar o Tributo, ou a penalidade pecuniária (obrigação principal) ou, ainda, de fazer,
48MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.213-214. 49MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.141. 50MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.141.
23
não fazer ou de tolerar tudo aquilo que a legislação tributária estabelece no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos Tributos. Essas prestações, todavia não são desde logo exigíveis pelo sujeito ativo. Tem este apenas o direito de fazer contra o sujeito passivo um Lançamento, criando, assim, um Crédito Tributário. O crédito, este sim, é exigível.
Para Carvalho51:
Em várias passagens do texto da Lei n. 5172/66 deparamos com a estranha separação entre obrigação e crédito. Posta de lado a influência que o legislador porventura tenha sofrido da velha teoria dualista da obrigação civil (...) a verdade é que não se pode cogitar de obrigação sem crédito ou de crédito sem obrigação. O direito de crédito é a outra maneira de nos referirmos ao direito subjetivo que o sujeito ativo tem para exigir a prestação. A ele se contrapõe o débito, como o dever jurídico atribuído ao sujeito passivo de cumprir o que dele se espera. Um e outro integram o vínculo obrigacional, na condição de elementos indispensáveis. Exista o crédito em estado de incerteza ou de iliquidez, de qualquer forma é uma realidade jurídica ínsita a toda obrigação. Soa mal, portanto, quando declara o legislador, ingenuamente, que a obrigação nasce com a realização do fato gerador, mas o Crédito Tributário se constitui pelo Lançamento.
Portanto, quando ocorrer o fato jurídico tributário, inaugura-
se a relação obrigacional, com o crédito para o sujeito ativo e o débito para o
sujeito passivo. Como tal crédito, ou débito, nem sempre vem imediatamente
determinado, certo e líquido, faz-se necessário um ato administrativo, conhecido
por Lançamento Tributário, no qual se procede à formalização da dívida,
especificando, assim, o conteúdo material do objeto da prestação.
51CARVALHO, Paulo de Barros Carvalho. Curso de direito tributário, p. 209-210.
CAPÍTULO 2
O LANÇAMENTO COMO ATO CONSTITUTIVO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO
2.1 CRÉDITO TRIBUTÁRIO
A Obrigação Tributária principal consiste no pagamento de
Tributo ou de penalidade pecuniária. O Crédito Tributário nada mais é do que a
própria Obrigação Tributária principal formalizada pelo Lançamento, tornando
líquida e certa a obrigação que, até então, se apresentava ilíquida.
O art. 139 do CTN, que diz respeito ao Crédito Tributário,
apresenta em sua redação:
Art. 139. O Crédito Tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta.
Através deste dispositivo, Harada52conclui que em relação à
matéria, a Obrigação e o Crédito tributário se confundem, tendo em vista que as
partes representadas são as mesmas, o objeto é idêntico e o vínculo jurídico, é o
mesmo.
A respeito do Crédito Tributário, entende o autor:
Surgida a obrigação, deve a Fazenda declarar a sua existência, através do Lançamento, apurando o quantum e identificando o sujeito passivo, quando então aquela obrigação passará a existir sob a denominação de Crédito Tributário53.
Carvalho conceitua o Crédito Tributário como o direito
subjetivo de que é portador o sujeito ativo de uma Obrigação Tributária e que lhe
52HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p. 500. 53HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p. 500.
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permite exigir o objeto prestacional, representado por uma importância em
dinheiro54.
Ensina Machado55:
(...) pela Obrigação Tributária o Estado ainda não pode exigir o pagamento do Tributo. Pode, sim, diante de uma Obrigação Tributária principal, como diante de uma Obrigação acessória descumprida (motivo pelo qual surge a Obrigação principal) fazer um Lançamento.
Desta forma, constitui um crédito de direito, e somente desta
maneira poderá exigir o objeto da prestação obrigacional, através de seu
pagamento.
Carvalho56 escreve com propriedade:
O Crédito Tributário, portanto, é o vínculo jurídico, de natureza obrigacional, por força do qual o Estado (sujeito ativo), pode exigir do particular, o contribuinte ou responsável (sujeito passivo), o pagamento do Tributo ou da penalidade pecuniária (objeto da relação obrigacional). (...) uma vez constituído, o Crédito Tributário somente se modifica, ou se extingue, ou tem a sua exigibilidade suspensa ou excluída, nos casos previstos em lei, fora dos quais não pode a autoridade administrativa, dispensar o seu pagamento, nem suas garantias, sob pena de responsabilidade funcional (CTN, art.141).
Ainda, segundo Tavares57:
Para que se opere o nascimento válido de uma Obrigação Tributária, (...) se revela imprescindível que a pessoa (física ou jurídica) realize perfeita e rigorosamente a hipótese de incidência tributária. Em outros termos, o nascimento da Obrigação Tributária pressupõe realização da sua respectiva hipótese de incidência (chamada pelo CTN de fato gerador). Existe a Obrigação Tributária, contudo, o Tributo não pode ser exigido.
54CARVALHO, Paulo de Barros Carvalho. Curso de direito tributário, p. 255. 55MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.189. 56CARVALHO, Paulo de Barros Carvalho. Curso de direito tributário, p.190. 57TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.115.
26
A respeito do tema exposto, afirma Soares de Melo58:
(...) a Obrigação Tributária, não sofre qualquer modificação diante da ocorrência do respectivo fato gerador. O Crédito Tributário (que tem seu nascimento concomitantemente à obrigação) é que sofre alterações em razão de procedimentos e situações de naturezas fáticas e jurídicas.
Pode-se conceituar o Crédito Tributário como a “prestação
pecuniária de índole tributária”, de acordo com a óptica da Fazenda Pública; do
ponto de vista do contribuinte, trata-se de “débito tributário”, como ensina
Jardim59.
Federighi60 ensina que o Crédito Tributário, para sua fiel
formação, deve obedecer ao seguinte esquema cronológico e lógico:
(...) a obrigação deve ser hipoteticamente prevista em lei, em obediência ao princípio da estrita legalidade da tributação; o sujeito passivo deve praticar concretamente o fato previsto na norma (o fato gerador constitui hipótese e um acontecimento concreto vinculativo do contribuinte ou responsável ao pagamento do Tributo); o Estado deve tornar exigível tal obrigação; fá-lo pelo Lançamento, que é ato administrativo pelo qual se acrescenta à Obrigação Tributária, já nascida, o requisito da exigibilidade.
Assim, o princípio da estrita legalidade impõe que a lei
prescreva rigorosamente todos os elementos fundamentais da planta genérica do
Tributo, encampando, por sua vez, força vinculante, ou não é auto aplicável61.
2.2 A CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO PELO LANÇAMENTO
Como já exposto, a Obrigação Tributária, por si só, não
acarreta a possível cobrança do Tributo devido pelo sujeito passivo. Faz-se
necessária a constituição do Crédito Tributário, pela via do “Lançamento”.
58MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.275. 59BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981.p.498. 60FEDERIGHI, Wanderley José. Direito tributário: parte geral, p.115. 61TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.16.
27
A competência da constituição do Crédito Tributário é
exclusiva da Administração. Somente ela possui autonomia para realizar o
Lançamento.
A respeito do tema exposto, pondera Machado62:
A constituição do Crédito Tributário é de competência privativa da autoridade administrativa. Só esta pode fazer o Lançamento. Ainda que ela apenas homologue o que o sujeito passivo efetivamente fez, como acontece nos casos do art. 150 do CTN, que cuida do Lançamento dito por Homologação. Sem essa homologação não existirá, juridicamente, o Lançamento, e não estará por isto mesmo constituído o Crédito Tributário.
O CTN, em seu art. 142, apresenta o seguinte texto:
Art. 142. Compete privativamente a autoridade administrativa constituir o Crédito Tributário pelo Lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do Tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Ao conferir exclusiva competência ao funcionário público
para constituir o crédito, o dispositivo em tela não poderia permitir nenhum
entendimento em sentido contrário, entretanto, a realidade jurídica é outra, tendo
em vista que na maioria dos Tributos, as Obrigações Tributárias são liquidadas
sem qualquer prévia interferência da autoridade administrativa.
Nesse sentido, entende Soares de Melo63:
(...) o devedor tributário sempre teria que aguardar o Lançamento do Tributo para que, somente após este ato, pudesse cumprir sua obrigação mediante o recolhimento do valor tributário. Ademais, seria razoável argumentar que a citada norma (parágrafo único do art. 142) não contemplaria norma programática ou simples
62MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.190. 63MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.276.
28
sugestão; ao contrário, seria peremptória, mandamental, impondo efeito punitivo à sua transgressão (...).
Harada64, em comentário ao tema, escreve que:
O Lançamento é um procedimento administrativo no sentido de que um agente capaz procede à averiguação da subsunção do fato concreto à hipótese legal (ocorrência do fato gerador), a valoração dos elementos que integram o fato concreto (base de cálculo), a aplicação da alíquota prevista na lei para a apuração do montante do Tributo devido, a identificação do sujeito passivo e, sendo o caso, a propositura de penalidade cabível.
Para Tavares, o Crédito Tributário nada mais é do que a
Obrigação Tributária acertada e liquidada pela autoridade fiscal, através do
Lançamento Tributário65.
O Crédito Tributário, portanto, através do Lançamento, é o
vínculo jurídico que obriga o contribuinte ou responsável, junto ao Estado, ao
pagamento de Tributo ou de penalidade pecuniária. Este surge da ocorrência do
fato gerador descrito em lei tributária ou norma, sendo necessário que ocorra tal
fato e que o Estado individualize e quantifique o valor devido com o Lançamento,
para então exigir o seu pagamento.
2.3 LANÇAMENTO: CONCEITO, FUNÇÃO E NATUREZA JURÍDICA
O art. 142 do CTN conceitua o Lançamento como sendo “o
procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da
obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do
Tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da
penalidade cabível”.
No dizer de Carvalho66:
Lançamento é o ato jurídico administrativo, da categoria dos simples, modificativos ou assecuratórios e vinculados, mediante o
64HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p.500. 65TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.118. 66CARVALHO, Paulo de Barros Carvalho. Curso de direito tributário, p.264-265.
29
qual se declara o acontecimento do fato jurídico tributário, se identifica o sujeito passivo da obrigação correspondente, se determina a base de cálculo e a alíquota aplicável, formalizando o crédito e estipulando os termos da sua exigibilidade.
Atos jurídicos administrativos simples são aqueles que
resultam da emanação de vontade de um único órgão, ou, como prefere
Calvacanti67, “os atos que se complementam pela manifestação de uma só
vontade, e produzem as suas conseqüências jurídicas independentemente da
manifestação de outra vontade”.
Harada, a respeito do tema, escreve que “uma vez
constituído o Crédito Tributário, este só pode ser modificado ou extinto, ou ter sua
exigibilidade suspensa ou excluída, nos casos previstos no CTN, entretanto, de
regra, o Lançamento é definitivo68”.
A respeito do conceito de Lançamento, leciona Tavares69:
Cabe frisar, ab initio, que o conceito operacional de Lançamento Tributário não é unívoco. Múltiplos são os significados que lhe são emprestados. Tal caráter é fruto da formulação com que o CTN estruturou essa categoria jurídica: a) ora é concebido como um “procedimento” (CTN, art. 142, caput); b) ora como uma “atividade” (art. 142, parágrafo único); ora como um “ato” administrativo (art. 150, caput).
Ademais, conceitua com propriedade:
Embora o termo “Lançamento” seja multímodo, didaticamente podemos defini-lo como um ato jurídico plenamente vinculado e obrigatório, constitutivo do Crédito Tributário, que compete privativamente à autoridade administrativa realizar, tendente a verificar a ocorrência da hipótese de incidência da Obrigação Tributária correspondente, determinar a matéria tributável, calcular ou por outra forma definir o quantum do Tributo devido, identificar
67CALVACANTI, Themístocles Brandão. Tratado de direito administrativo. v.1. São Paulo: Freitas Bastos, 1960, p. 243. 68HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p.502. 69TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.117.
30
o sujeito passivo e, se for o caso, propor a aplicação da penalidade cabível70.
No final do procedimento administrativo a que alude o art.
142 do CTN, haverá sempre a emissão de um documento formal, que confere
caráter de liquidez e certeza ao Crédito Tributário. “É o Lançamento que
representa o título jurídico, que confere à Fazenda a exigibilidade do crédito71”.
Tavares72 entende que a função do Lançamento é operar a
efetiva constituição do Crédito Tributário, tornando-o líquido e certo. Neste
sentido, pontifica que:
(...) Obrigação Tributária corresponde ao próprio credito tributário ainda ilíquido e incerto, devida à falta do ato administrativo de Lançamento. Daí a função do Lançamento: é ele que opera a efetiva constituição do credito tributário, tornando-o líquido e certo, logo, juridicamente exigível. (...) a ocorrência concreta do fato jurídico tributário (fato gerador in concreto) não é, por si só, capaz de conferir exigibilidade ao Tributo. Essa exigência há de ser concreta e individualmente formalizada por um ato administrativo específico (Lançamento) (...).
Entretanto, não há consenso na doutrina a respeito da
natureza jurídica do Lançamento, ou seja, se esta teria natureza meramente
declaratória ou também constitutiva.
No Direito Tributário brasileiro moderno, alude Baleeiro73:
(...) é praticamente pacífico que o Lançamento seja considerado como ato de natureza meramente declaratória, pois não cria, não extingue nem altera um direito, ele apenas determina, faz certo, apura, ou reconhece um direito preexistente, espancando dúvidas e incertezas.
70TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.117. 71HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p.502. 72TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.118. 73BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro, p.503-504.
31
Todo ato constitutivo tem por fim adquirir, modificar ou
extinguir algum direito, ao passo que o ato declaratório limita-se a declarar um
direito preexistente.
Para Tavares74:
Inobstante a função constitutiva do Crédito Tributário, nos dias atuais, encontra-se pacificado o entendimento segundo o qual a natureza jurídica do Lançamento é eminentemente declaratória. Destarte, com o Lançamento, não se constitui ou desconstitui direito algum, apenas há a constituição do Crédito Tributário, coisa absolutamente diferente da Obrigação Tributária, que nasce a partir da efetiva ocorrência da hipótese de incidência abstratamente prevista na norma jurídica.
Tavares sustenta, ainda, que o art. 144 do CTN “proclama a
retroeficácia do Lançamento (efeito ex tunc), relativamente aos elementos
quantificadores da Obrigação Tributária; efeito intimamente ligado à carga
declaratória de um ato jurídico75”.
Seguindo a mesma linha de interpretação, afirma
Machado76:
A natureza jurídica do Lançamento Tributário já foi objeto de grandes divergências doutrinárias. Hoje, porém, é praticamente pacífico o entendimento segundo o qual o Lançamento não cria direito. Seu efeito é simplesmente declaratório. Entretanto, no Código Tributário Nacional o Crédito Tributário é algo diverso da Obrigação Tributária. Ainda que, em essência, crédito e obrigação sejam a mesma relação jurídica, o crédito é um momento distinto. É um terceiro estágio na dinâmica da relação obrigacional tributária. E o Lançamento é precisamente o procedimento administrativo de determinação do Crédito Tributário. Antes do Lançamento existe a obrigação. A partir do Lançamento surge o crédito.
74TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.119. 75TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.120. 76MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.192.
32
Por fim, pode-se conferir “o caráter híbrido do Lançamento:
exsurge como um ato administrativo constitutivo do Crédito Tributário e
substancialmente declaratório da Obrigação Tributária correspondente77”.
Realmente, o Lançamento constitui o Crédito tributário,
declarando a preexistência da Obrigação Tributária que surge em virtude da
ocorrência de fato gerador definido em lei.
2.4 O LANÇAMENTO COMO ATO OU PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
Melo acredita que o Lançamento não consubstancia um
autêntico “procedimento” administrativo, “que poderia trazer importantes
conseqüências; mas trata de expressão equivocada porque procedimento tem por
conformação uma série de atividades devidamente interligadas, compondo um
todo unitário78”.
Em relação ao tema, leciona:
Embora não se desconheça que o trabalho da fiscalização pode demandar diversas providências, tais como o levantamento e análise da documentação do contribuinte, a obtenção de dados e informações de terceiros, declaração de pessoas relacionadas com as atividades dos devedores, laudos de entidades especializadas, etc. (...) esses elementos e documentos constituem meros atos preparatórios do Lançamento, pelo fato de que apenas interessa o resultado da ação fazendária, o último ato praticado que positivará o Lançamento79.
As atividades anteriores ao Lançamento são importantes
para justificar a sua razão e conferir-lhe liquidez e certeza. Entretanto, a coleta
desses elementos não é suficiente para permitir a exigibilidade do Crédito
Tributário.
77TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.120. 78MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.277. 79MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.278.
33
Para Machado80:
O procedimento administrativo de Lançamento tem duas fases: a oficiosa e a contenciosa. Concluída a primeira fase com a determinação do valor do Crédito Tributário, é feita a notificação ao sujeito passivo. E a partir daí somente pode ser modificado em virtude de (a) impugnação do sujeito passivo; (b) recurso de ofício; (c) iniciativa da própria autoridade administrativa, nos casos previstos em lei (CTN, art. 145).
Em contrapartida, difere da tese acima Carvalho81:
Decididamente, é insustentável a tese do Lançamento como procedimento administrativo, lamentando-se que o legislador do Código haja inserido esse conceito no dispositivo do art. 142, agravando a incoerência como permitir que o agente público possa vir a propor a aplicação de penalidades, nas hipóteses de descumprimento das obrigações tributárias.
São palavras do mesmo doutrinador:
Lançamento é ato jurídico administrativo e não procedimento, como expressamente consigna o art. 142 do Código Tributário Nacional. Consiste, muitas vezes, no resultado de um procedimento, mas com ele não confunde. O procedimento não é essência do Lançamento, que pode consubstanciar fato isolado, independentemente de qualquer outro. Diz, quando muito, com o estádio de formação do ato, jamais com seus pressupostos estruturais, que estão contidos no próprio ato82.
Inúmeras são as teses que classificam o Lançamento ora
como procedimento, ora como ato administrativo. Os autores, majoritariamente,
defendem a tese de que o Lançamento configura um ato administrativo, tese a
qual defendo, tendo em vista que o Lançamento é composto de várias etapas
(procedimentos), todas elas com a finalidade de efetivar o “ato” do Lançamento
por si só.
80MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.192. 81CARVALHO, Paulo de Barros Carvalho. Curso de direito tributário, p. 262. 82CARVALHO, Paulo de Barros Carvalho. Curso de direito tributário, p. 265.
34
2.5 MODALIDADES DE LANÇAMENTO
O Código Tributário Nacional adota três modalidades de
Lançamento: o Lançamento Direto ou por Ofício, o Misto ou por Declaração e o
por Homologação ou Autolançamento.
A respeito das diferentes classificações, ressalta Cassone83,
que o Lançamento poderá ser:
(...) com base na declaração do sujeito passivo (art. 147 do CTN). Feito com base nas declarações prestadas pelo contribuinte. (...) Lançamento de Ofício (art. 149 do CTN), o Estado, na sua condição de sujeito ativo, independentemente de qualquer iniciativa do contribuinte, constitui o título. (...) por homologação ou Autolançamento (art. 150 do CTN). O contribuinte (sujeito passivo) realiza os atos materiais necessários à satisfação do Crédito Tributário; ou, opera o Lançamento, efetuando o pagamento do Tributo, enquanto o sujeito ativo se limita a homologá-lo – o que não o impede de manter uma fiscalização genérica, nem o obriga a aceitar os valores lançados pelo sujeito passivo.
Portanto, concluí-se que há diferentes modalidades de Lançamento, com especificações peculiares, principalmente no que tange à formalização da informação ao fisco sobre a Obrigação Tributária, quando existente.
2.5.1 Lançamento Direto ou de Ofício
O Lançamento será classificado como “Direto” ou de
“Ofício”, quando feito por ato da autoridade administrativa, mesmo quando o
sujeito passivo não lhe repasse nenhuma informação a respeito do fato gerador
emanado.
O art. 149 do CTN dispõe a respeito deste tipo de
modalidade:
Art. 149. O Lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos: I - quando a lei assim o determine;
83CASSONE, Vittorio. Direito tributário. 9ª ed. São Paulo: Atlas, 1996. p.116.
35
II - quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária; III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade; IV - quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória; V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte; VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação; VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação; VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do Lançamento anterior; IX – quando se comprove que, no Lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade essencial. Leciona a respeito do “Lançamento de Ofício” Tavares84:
Diz-se Direto ou de Ofício, quando o Lançamento é realizado por iniciativa da autoridade administrativa, independentemente de qualquer colaboração do sujeito passivo (CTN, art.149). Nessa modalidade de Lançamento a apuração do quantum debeatur é feita por conta da autoridade administrativa, que notifica o contribuinte para que proceda ao respectivo pagamento.
Segundo Machado, “qualquer Tributo pode ser lançado de
ofício, desde que não tenha sido lançado regularmente em outra modalidade85”.
Para aclarar o tema, escreve Horvath86:
Usualmente esses Lançamentos instrumentalizam-se em auto de infração, em que, além de declarar todos os aspectos do fato gerador da obrigação principal, ou acessória, aplica (ou considera) também a infração que teria sido cometida pelo sujeito passivo, indicando as capitulações legais, tendo sido vislumbrada à
84TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.120. 85MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.195. 86HORVATH, Estevão. Lançamento tributário e “autolançamento”. São Paulo: Dialética, 1997.p.60.
36
existência de dois atos, e duas realidades jurídicas distintas, ou seja, o ato de Lançamento propriamente dito e o ato de aplicação de sanção.
No mesmo sentido, dispõe Harada87:
O Lançamento Direto ou de Ofício é aquele efetuado pelo agente público competente sem qualquer ajuda do sujeito passivo. Nessa modalidade de Lançamento, o fisco age por conta própria, diretamente, verificando a ocorrência do fato gerador determinando a matéria tributável, calculando o montante do imposto devido, identificando o sujeito passivo e promovendo sua notificação. É o Lançamento por excelência, em que a atuação privativa do agente fiscal é inafastável. Está prevista essa modalidade de Lançamento no art. 149 do CTN.
Pode-se concluir que no Lançamento Direto ou de Ofício, o
ímpeto de explanação da legislação tributária constitui papel exclusivo do Fisco,
bem como a ele pertence o encargo de enviar a notificação ao sujeito passivo.
2.5.2 Lançamento Misto ou por Declaração
Tavares88 conceitua:
(...) o Lançamento será Misto ou por Declaração quando efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, isto é, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensável à sua efetivação (CTN art.147).
A respeito do tema, o autor Chimenti escreve: “Lançamento por Declaração é aquele feito em face da declaração prestada pelo contribuinte ou por terceiro (art. 147 CTN), sem a obrigação do pagamento antecipado89”.
Segundo Machado90:
87HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p. 502. 88TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.120. 89CHIMENTI, Ricardo Cunha. Direito tributário. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 115. 90MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.195.
37
Por Declaração é o Lançamento feito em face de declaração fornecida pelo contribuinte ou por terceiro, quando um ou outro presta à autoridade administrativa informações quanto à matéria de fato indispensável à sua efetivação (CTN, art. 147).
O Lançamento Misto, também conhecido como por
Declaração, está previsto no art. 147 do CTN, nos seguintes termos:
Art. 147. O Lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação: §1°. A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a reduzir ou a excluir o Tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o Lançamento; §2°. Os erros contidos na declaração e apuráveis pelo seu exame serão retificados de ofício pela autoridade administrativa a que competir a revisão daquela. Em comentário ao tema, preceitua Harada91:
A atividade do Lançamento depende de declaração a ser prestada, pelo sujeito passivo, ou pela terceira pessoa legalmente obrigada, (...) Daí a denominação Lançamento por Declaração, ou Lançamento Misto, por depender da ação conjugada do agente público e do particular. (...) Normalmente, a declaração do sujeito passivo ou de terceira pessoa goza de presunção de veracidade. Porém, em relação ao valor ou ao preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, sempre que houver indícios de que o sujeito passivo ou a terceira pessoa agiram com reticência, insinceridade ou omissão, o art. 148 do CTN autoriza o agente administrativo a desprezar a declaração apresentada, podendo arbitrar o valor ou o preço, mediante processo regular, isto é, com base em elementos idôneos de que dispuser, vedada qualquer arbitrariedade.
91HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p. 503.
38
Neste sentido, dispõe Melo92:
O devedor tributário tem a obrigação de informar ao fisco todas as operações, estados, fatos e situações ocorridas num preciso momento, ou relativas a um determinado período de tempo. Mediante esses dados, a Fazenda tem condição de proceder a sua consideração e, de conformidade com a legislação aplicável, emitir o ato de Lançamento. (...) Os erros contidos na declaração, e apuráveis pelo seu exame, serão retificados de ofício pela autoridade administrativa a que competir a revisão daquela (§ 2° do art. 147 do CTN). Isto acontece quando o fisco constata erros de cálculo, ou na informação dos valores sem amparo documental, etc., passando a desconsiderar os dados incorretos da declaração, e, conforme o caso, promove o Lançamento do Tributo no valor efetivamente correto.
Conclui-se que a modalidade de Lançamento por
Declaração, ou Misto, consiste na realizada pela autoridade administrativa em
face de uma declaração fornecida pelo contribuinte ou responsável, que
anteriormente ao recolhimento, informa ao Fisco a matéria tributável devida.
A finalidade da declaração é informativa, como está
especificada no caput do artigo 147 do CTN. Feita esta, o sujeito ativo inicia a
fase de apreciação, solicitando perícias ou informações mais detalhadas quando
existente obscuridade ou dúvidas em relação à declaração do contribuinte.
Encerrada esta fase, o sujeito ativo procederá à fixação do
Lançamento e notificará o sujeito passivo. Esta notificação ocorre no momento em
que o sujeito passivo é informado a respeito da homologação da sua declaração,
ou do quantum tributário fora apurado como devido ao Fisco. O sujeito passivo
poderá retratar sua declaração sem necessidade de impugnação, desde que tal
retratação ocorra antes da notificação, decorrido este prazo, deverá o mesmo
impugná-la, se objetivar futura alteração do valor a ser cobrado. Torna-se
necessária, portanto, a prática de vários atos, figurando um verdadeiro
procedimento, o que destaca esta modalidade de Lançamento das demais
existentes.
92MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.283.
39
2.5.3 Lançamento por Homologação ou Autolançamento
O Lançamento por Homologação, segundo Machado93, é
aquele:
(...) feito quanto aos Tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa no que concerne a sua determinação. Opera-se pelo ato em que a autoridade, tomando conhecimento da determinação feita pelo sujeito passivo, expressamente homologa (CTN, art. 150).
O doutrinador afirma que “o objeto da homologação não é o
pagamento: é a apuração do montante devido, de sorte que é possível a
homologação, mesmo que não tenha havido pagamento94”.
O artigo 150 do Código Tributário Nacional dispõe acerca
desta modalidade de Lançamento:
Art. 150. O Lançamento por Homologação, que ocorre quanto aos Tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa. § 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao Lançamento. § 2º Não influem sobre a Obrigação Tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito. § 3º Os atos a que se refere o parágrafo anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação. § 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o Lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.
93MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.195. 94MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.195.
40
Chimenti95 conceitua este tipo de Lançamento como “uma
forma de pagamento antecipado sujeito à condição posterior da homologação e
que quando praticada a homologação, extingue-se o Crédito Tributário (art. 156,
VII, do CTN)”.
Para Federighi, “no Lançamento por Homologação, o
contribuinte (sujeito passivo) realiza os atos materiais necessários à satisfação do
Crédito Tributário96”.
Cassone97 afirma que:
O contribuinte opera o Lançamento, efetuando o pagamento do Tributo, enquanto o sujeito ativo se limita a homologá-lo – o que não impede de manter uma fiscalização genérica, nem o obriga a aceitar os valores lançados pelo sujeito passivo.
Horvath98 conceitua o Autolançamento:
É um ato de intervenção do particular no procedimento de aplicação do Tributo (ou procedimento de gestão tributária), consistente no cumprimento de um dever chamado de “colaboração”. Isso não obstante, é necessário deixar claro que não é pelo fato de ser designado por “dever de colaborar” que o Autolançamento deixa de constituir-se num dever concreto que se tem de cumprir, queira-se ou não se queira, sob pena de sofrer as sanções previstas na lei que o estabeleça.
Comenta, a respeito do tema exposto, Harada99:
Nessa modalidade de Lançamento, o sujeito passivo antecipa o pagamento to Tributo sem prévio exame do Fisco. No momento em que a autoridade toma conhecimento da atividade exercitada (...) e a homologa, opera-se simultaneamente a constituição do Crédito Tributário e sua extinção (§1°art. 150). Não homologado o pagamento antecipado, abre-se oportunidade para Lançamento de Ofício para haver eventual diferença. Faltando a homologação, a Obrigação Tributária subsiste (...) (§2°art. 150). (...) no
95CHIMENTI, Ricardo Cunha. Direito tributário, p. 116. 96FEDERIGHI, Wanderley José. Direito tributário: parte geral, p.117. 97CASSONE, Vittorio. Direito tributário, p.116. 98HORVATH, Estevão. Lançamento tributário e “autolançamento”, p.164. 99HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p. 504.
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Lançamento de Ofício levar-se-á em conta os pagamentos parciais realizados pelo sujeito passivo, inclusive, para o efeito de graduação da penalidade pecuniária (§3°art. 150). (...) salvo em caso de dolo, fraude ou simulação, o prazo para homologação é de cinco anos, facultado à lei do poder público tributante a fixação de prazo menor. Esgotado o prazo, ocorre a decadência do direito de revisão por parte da autoridade administrativa, considerando-se tacitamente homologado o Lançamento, operando-se a extinção definitiva do Crédito Tributário representado pelo pagamento antecipado feito pelo sujeito passivo (§4°art. 150).
A figura do Lançamento por Homologação constitui um ato
jurídico de natureza confirmatória, pois o agente público, por exemplo, ao verificar
o implemento das prestações tributárias de determinado contribuinte, declara, de
maneira expressa, que existiam obrigações, mas que estas foram devidamente
pagas até o presente momento.
Para o autor Melo100:
Inexiste Lançamento Tributário em razão de não ter sido celebrado nenhum ato privativo da autoridade administrativa, que se mantém totalmente inerte, revelando-se a prescindibilidade da formalização do crédito tributário, diante da desnecessidade de se positivar o requisito da exigibilidade. O posterior conhecimento fazendário dos atos realizados pelo sujeito passivo, inclusive o pagamento do Tributo, pode acarretar um ato expresso da Fazenda, singularmente rotulado de “homologação de Lançamento”, mas que não deveria ter esta fisionomia jurídica, pelo fato de que o devedor tributário não realiza Lançamento algum, em conseqüência do que não se estaria homologando Lançamento, mas simplesmente confirmando a legitimidade do procedimento particular.
Harada101 destaca em sua obra:
(...) o §4° do artigo 150 do CTN considera tacitamente homologado o Lançamento ao prazo de cinco anos a contar da data da ocorrência do fato gerador, extinguindo-se o Crédito Tributário, salvo nas hipóteses de dolo, fraude ou simulação.
100MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário. p.286. 101HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p.505.
42
A responsabilidade pela correta interpretação e aplicação da
legislação tributária é sempre do sujeito passivo, que pode prevenir-se contra a
aplicação de penalidades mediante a utilização do instituto da consulta, previsto
no artigo 161, §2° do CTN, que dispõe:
Art. 161. O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição das penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei ou em lei tributária. § 1º Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados à taxa de um por cento ao mês. § 2º O disposto neste artigo não se aplica na pendência de consulta formulada pelo devedor dentro do prazo legal para pagamento do crédito. Demonstra-se que na pendência de consulta formulada pelo
devedor, dentro do prazo legal para o pagamento do Crédito Tributário, não se
aplicam as penalidades como forma de garantia, nem se cobram os juros
moratórios.
A respeito do pagamento antecipado como forma de
extinção do Crédito tributário, escreve Machado102:
(...) o crédito sob condição resolutória da ulterior homologação (CTN, art. 150, §1°). Isto significa que tal extinção não é definitiva. Sobrevindo ato homologatório do Lançamento, o crédito se considera extinto por força do estipulado no art. 156, VII, do CTN. Se a lei fixar um prazo para a homologação, e a autoridade não praticar expressamente, ter-se-á a homologação tácita no momento em que se expirar o prazo.
Nos dizeres de Tavares103:
(...) Homologação ou Autolançamento, é o Lançamento que ocorre no âmbito dos Tributos cuja legislação atribui ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, operando-se pelo ato em que a referida autoridade,
102MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.195 - 196. 103TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.120-121.
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tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa (CTN, art. 150). (...) Se nos for permitido o uso, entendemos que, perante o ordenamento jurídico pátrio, a expressão, “Autolançamento” possui alcance sistematicamente limitado, cingindo-se à atividade reflexiva do sujeito passivo voltada a pôr em prática o comando normativo tributário, atividade esta que, a rigor, não obstante integre o seu procedimento, não consiste no ato autônomo de Lançamento (accertamento).
Nesta classificação de Lançamento, quem fornece os
documentos necessários à formação do Crédito Tributário, tais como: o envio de
notas fiscais ao Fisco, a escrituração em livros contábeis, o pagamento
antecipado do Tributo devido e a informação do cumprimento desta obrigação,
junto à Fazenda, será sempre o sujeito passivo ou contribuinte. Contudo, a
competência para a homologação expressa ou tácita104 constitui dever exclusivo
da autoridade administrativa competente.
Os valores pagos indevidamente, ou a maior do que aqueles
realmente devidos poderão ser restituídos ao contribuinte que eventualmente foi
prejudicado. Trata-se de um direito do sujeito passivo, previsto em lei, mais
precisamente na CRFB/88 e no CTN.
104 Homologação expressa ou tácita – “A homologação pode ser expressa, praticada por um ato da autoridade em que esta afirme estar de acordo com a apuração, ou tácita, que se opera pelo decurso do prazo de que dispõe a autoridade para fazer a homologação. Ressalte-se que só há homologação tácita se tiver havido pagamento, porque tal homologação é a condição para que se opere a extinção definitiva do crédito tributário, nos termos § 1º, do art. 150, do CTN”. Disponível em:<http://www.hugomachado.adv.br/conteudo.asp?home=1&secao=2&situacao=2&doc_id=128>. Acesso em 27 de junho de 2007.
CAPÍTULO 3
A REPETIÇÃO DO INDÉBITO DOS TRIBUTOS FEDERAIS LANÇADOS POR HOMOLOGAÇÃO
3.1 PRESSUPOSTO DO DIREITO À RESTITUIÇÃO: PAGAMENTO INDEVIDIDO OU A MAIOR QUE O DEVIDO
De acordo com o art. 165 do CTN, o sujeito passivo tem
direito à restituição do Tributo que houver pagado indevidamente. Tal direito não
depende de prévio protesto105, não sendo necessário que o sujeito passivo
declare que o fez de maneira coercitiva.
Machado106 ensina:
O Tributo decorre da lei e não da vontade, sendo por isso mesmo irrelevante o fato de haver sido pago voluntariamente. Na verdade o pagamento do Tributo só é voluntário no sentido da inocorrência de atos objetivando compelir alguém a fazê-lo. Mas é óbvio que o devedor do Tributo não tem alternativas. Está obrigado por lei a fazer o pagamento.
105 Protesto tributário – “Ainda nesse âmbito dos instrumentos arrecadatórios à disposição do Fisco, também em 2006, ocorreu a publicação da Portaria 321 da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, de 6 de abril, que autorizou que certidões de dívida ativa da Fazenda Nacional fossem levadas a protesto. Transformou, assim, a relação jurídica tributária em relação de mera coordenação em que há pactuação livre entre as partes, fato impróprio para a relação tributária em que, de um lado, têm-se o fisco com toda sua força, inclusive decorrente dos atributos de auto executoriedade e presunção de legitimidade dos atos administrativos, e de outro o contribuinte para o qual é imposta a injusta carga tributária. As regras de direito privado não podem ser aplicadas para tal relação de direito público, sujeita ao rigoroso cumprimento da lei em face dos princípios da estrita legalidade, tipicidade fechada e reserva absoluta da lei formal, que tiram da administração qualquer flexibilidade. É incompatível com a juridicidade se agregar ao imenso arcabouço de poderes da administração pública, também os instrumentos de cobrança próprios de direito privado em que as partes de forma livre acordam seus pactos e obrigações. Representa tal ação, ainda, desprezo ao Poder Judiciário que se manifestou pela ilegalidade de tal procedimento conforme decisão da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (DJU 1 de 20/2/2006 p. 205) nos autos do REsp 287.824-MG (2000/0119099-7).”. Disponível em: <http://conjur.estadao.com.br/static/text/51542,1>. Acesso em 26 de junho de 2007. 106MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.216.
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Afirma o doutrinador Vaz107:
A expressão “independente de prévio protesto”, em princípio, poderia se referir ao processo judicial, em razão do termo técnico-jurídico “protesto” nele inserido. Entretanto, o art. 168 do CTN se refere (...) às decisões não só na via judicial como na esfera administrativa, o que conduz à conclusão de que o “protesto” também possa ser admissível no processo administrativo fiscal.
Esta elucidação é importante, pois o Código Civil de 1916,
no dispositivo 965108, hoje consubstanciado no artigo 877 do Código Civil vigente,
demonstrava em regra expressa que quem pagasse voluntariamente só teria
direito à restituição se provasse que o fez por erro. Aliás, esta regra chegou a ser
invocada pelo Fisco para não restituir Tributos, mas a tese foi repelida pelos
Tribunais e hoje, diante do CTN, dúvida não pode mais haver quanto ao direito à
restituição109.
O art. 165 do CTN menciona três hipóteses de cabimento de
restituição:
Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do Tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos: I - cobrança ou pagamento espontâneo de Tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; II - erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento; III – reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.
107VAZ, Carlos de. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário. Coordenador: Hugo de Brito Machado. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 1999. p.88. 108“Ao que voluntariamente pagou o indevido incumbe prova de tê-lo feito por erro”. Art. 965, Código Civil de 1916. 109MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário, p.216.
46
Em comentário ao artigo, escreve Vaz110:
Os dois primeiros incisos referem-se às hipóteses em que “o Tributo foi pago indevidamente ou a maior”, mediante cobrança pelo sujeito ativo ou de forma espontânea pelo sujeito passivo (contribuinte), em face da legislação aplicável ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorridas.
E completa111:
A restituição de quantia paga ou recolhida a maior que o devido, a título de Tributo ou contribuição, administrados pela Secretaria da Receita federal, é um direito do sujeito passivo (contribuinte), seja pessoa física ou jurídica, e na Constituição Federal a matéria está, de certa forma, também compreendida no art. 5°, inciso XXII, ao garantir o “direito de propriedade”, uma vez que o dinheiro porventura tenha sido pago a maior ou indevidamente aos cofres públicos faz parte do patrimônio financeiro do contribuinte, o inciso XXXIV, alínea a, ao assegurar a todos, independentemente de pagamento de taxas, “o direito de petição aos poderes públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso do poder e, ainda, no inciso XXXV, segundo o qual, “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito.”
No direito privado, exige-se como requisito para o exercício
do direito à repetição, a prova de que o pagamento se deu por erro ou foi feito sob
protesto. A presunção é de que se alguém pagou indevidamente certa quantia a
outrem, o fez no cumprimento de uma obrigação, ainda que unilateral, como se dá
no contrato de mútuo e doação, por exemplo. Portanto, não se pode pleitear a
restituição sem demonstrar que o pagamento foi efetuado por erro, já no direito
tributário, basta evidenciar-se a inexistência de Obrigação Tributária para que
caiba a devolução do valor pago, a título de Tributo.
Sobre o tema, escreve Amaro112:
O CTN é expresso ao reconhecer o direito à restituição, independentemente de prévio protesto (vale dizer, sem
110VAZ, Carlos de. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.88. 111VAZ, Carlos de. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.88. 112AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 3° ed.rev. São Paulo: Saraiva, 1999. p.395-396.
47
necessidade de nenhuma ressalva prévia quanto ao caráter indevido do pagamento), e ainda que o pagamento tenha sido espontâneo (art. 165). O pagamento de certa quantia, a título de Tributo, embora sem nenhuma ressalva, não implica, portanto, “confissão de dívida tributária”.
Entretanto, isto não significa que em toda e qualquer
situação nunca se tenha que provar a matéria de fato, a qual substancie a
formulação de algum ressarcimento, no âmbito tributário.
A respeito da legitimidade para o pedido de restituição do
indébito tributário, em princípio, pertence ao sujeito passivo da obrigação,
disposto no art. 121 do CTN:
Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de Tributo ou penalidade pecuniária. Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se: I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador; II - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.
Esta é a hipótese dos Tributos considerados diretos. A
respeito deste modo de classificação dos Tributos, ensina Soares de Melo113:
Os impostos têm sido objeto de diversas classificações: a) direto, quando o valor econômico é suportado exclusivamente pelo contribuinte, como é o caso do IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – art. 155, III, da Constituição). O proprietário do automóvel arca com o ônus do Tributo cujo valor não é repassado a terceiro.
Aos Tributos indiretos, compete, alternativamente, ao
contribuinte de fato, sujeito passivo indireto, salvo se ele autorizar ao contribuinte
de direito promover a restituição114. Este é o caso dos Tributos referidos no art.
113MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.61. 114MATTOS, Aroldo Gomes de. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário. Coordenador: Hugo de Brito Machado. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 1999. p.51.
48
166 do CTN, ou seja, os que comportem, por sua natureza, a transferência do
respectivo encargo financeiro.
A respeito dos Tributos indiretos ensina Soares de Melo115:
(...) indireto, quando a respectiva carga financeira tem condição de ser transferida a terceiro, como é o caso do IPI (Imposto sobre produtos industrializados – art. 153, IV, da Constituição). O contribuinte do Tributo é o industrial, que fica obrigado a recolher o seu respectivo valor, mas pode vir a ser ressarcido (financeiramente) por ocasião do pagamento do preço por parte do adquirente.
Em síntese, pode-se concluir que o direito à restituição do
Tributo pago a maior ou indevidamente parece ter fundamento não só na
Constituição da República Federativa do Brasil, mas também no Código Tributário
Nacional.
3.2 FUNDAMENTO LEGAL DO PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO
A primeira questão consiste em saber se o direito à
restituição dos valores pagos indevidamente, a título de Tributo, tem fundamento
constitucional. Os autores e estudiosos do tema afirmam em unanimidade que “o
fundamento do direito à restituição possui base na norma, bem como nos
princípios constitucionais”.
Merece destaque o entendimento de Mörschbächer116,
citado por Machado:
O Código Tributário Nacional, quando inseriu em seu texto disposições específicas sobre a restituição de Tributos pagos indevidamente (arts. 165 a 169), não o fez obviamente para conferir direitos novos ao contribuinte, pois estes já decorrem do sistema da Constituição, senão para cumprir funções próprias da lei complementar, hoje lhe atribuídas pelo artigo 146, incido III, da Constituição, de estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária.
115MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p.61. 116MACHADO, Hugo de Brito. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.10.
49
No mesmo sentido, tem entendimento o autor Machado117:
O direito à restituição do que tenha o contribuinte pago indevidamente tem inegável fundamento na Constituição, na medida em que esta garante que o Tributo é devido na forma da lei e o legislador, por seu turno, está sujeito a limitações na definição do dever jurídico tributário. Assim, ainda que o ordenamento infraconstitucional nada estabeleça a respeito do direito à Repetição do Indébito, tal direito existirá, induvidosamente, por força dos preceitos da própria Constituição.
Contudo, completa seu raciocínio:
(...) não obstante os autores, à unanimidade, tenham afirmado o fundamento constitucional do direito à restituição do Tributo indevidamente pago, parece não existir entre eles a plena convicção da resposta oferecida (...). É o que se percebe nas respostas ofertadas aos desdobramentos da questão, nas quais os autores entraram em profunda divergência. A propósito da questão de saber se o art. 166 do Código tributário Nacional é compatível com o sistema de princípios constitucionais, segundo o qual o contribuinte tem direito de não ser compelido a pagar Tributo cuja cobrança não se faça nos exatos termos da Constituição e das leis, e de qual a interpretação do art. 166 do CTN que o coloca de acordo com a Constituição118.
Além da Carta Magna, o Código Tributário Nacional, em seu
artigo166, estabelece:
Art. 166. A restituição de Tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.
117MACHADO, Hugo de Brito. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.11. 118MACHADO, Hugo de Brito. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.11.
50
Para Troianelli 119:
O fundamento dessa restituição reside nos seguintes princípios, a começar pelos constitucionais, pois - não se devendo deslembrar que o Direito é um só – a Constituição, no Brasil, é a primeira e uma das mais opulentas fontes do Direito Tributário. (...) Como regulamento legal do axioma constitucional, pode-se referir vasto elenco de normas: arts. 165, 166 e 170 do CTN.
Entre os meios e recursos para se implementarem tais
ordenamentos constitucionais, já previa o CTN em seu dispositivo 165 o direito da
restituição do Tributo pago indevidamente. Todavia, o art. 166 subseqüente
restringiu a restituição dos Tributos que comportem transferência de encargos
financeiros, à condição de que sejam oferecidas provas condizentes pela parte
interessada em recebê-la.
Segue o entendimento de Gomes de Mattos120:
Mas, para fins de restituição, não se referiu o retromencionado art. 166 do CTN a todos os Tributos nem a repercussão jurídica (“os que comportem, por sua natureza, a transferência do respectivo encargo financeiro”); isso implica em dizer que existem outros tipos (“os que não comportam, pela sua natureza, a transferência do respectivo encargo financeiro”).
Sobre o tema, comenta Grecco121:
Se há dois tipos de Tributo (classificados segundo a ótica adotada pelo Código), a conclusão imediata é a de que a exigência contida no art. 166 só se aplica a uma das categorias, ou seja, a dos Tributos que comportem transferência. Para os outros, que não comportam, não há a exigência indicada no art. 166, qual seja a prova da assunção do respectivo encargo financeiro.
119TROIANELLI. Gabriel Lacerda. Fundamentos constitucionais do direito ao ressarcimento do indébito tributário. Revista Dialética de Direito Tributário n.°27. São Paulo: 1998. p. 20-27. 120MATTOS, Aroldo Gomes de. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.50. 121GRECO, Marco Aurélio. IOF – Câmbio – Restituição de Indébito. Revista de direito tributário n° 31. São Paulo, 1985. p. 188.
51
Alguns doutrinadores entendem que o art. 166 do CTN é
inconstitucional, porque aplicável, quase sempre, somente ao ICMS e ao IPI.
Vejamos entendimento do autor Troianelli122, que segue esta corrente:
Para que o enriquecimento injustificado seja também ilícito é necessário que, além da existência de empobrecimento de terceiro, haja nexo causal entre o empobrecimento de uma parte e o enriquecimento de outra. Na hipótese em exame, o enriquecimento injustificado do Estado será sempre ilícito, já que entre o empobrecimento do contribuinte e o enriquecimento do Estado haverá sempre, como nexo causal, o ato normativo ou administrativo que implique a exigência do Tributo indevido. O enriquecimento injustificado do contribuinte, por outro lado, só seria ilícito se ele, sabedor do caráter indevido do Tributo, transferisse o encargo a terceiro maliciosamente, com o intuito de, após, buscar a Repetição do Indébito.
Soares de Melo123 afirma que o art. 166 aplica-se aos
impostos indiretos:
Apenas os Tributos que venham a compor processo econômico é que poderão gerar o fenômeno da repercussão. As incidências tributárias que gravam o patrimônio do contribuinte, agregando-se a custos, despesas e acréscimos às margens de lucro, formam um montante (...) que passa a ser suportado pelos adquirentes, usuários e tomadores. (...) inaplicável o art. 166 do CTN no caso de não ser identificado terceiro, como acontece nas operações realizadas com consumidores finais de bens e serviços, porque acabaria sendo inviabilizada a restituição do sujeito passivo, o que caracterizaria o locupletamento da Fazenda, que recebera os valores sem causa jurídica.
Para Mörschbäher, citado por Machado, o art. 166 do CTN
aplica-se tanto nos casos de repercussão financeira (IPI e ICMS), como de
repercussão jurídica (substituição) 124:
122TROIANELLI, Gabriel Lacerda. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário. Coordenador: Hugo de Brito Machado. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 1999, p.12. 123MELO, José Eduardo Soares de. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.12. 124MACHADO, Hugo de Brito. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.13.
52
(...) se encontram submetidas ao art. 166 do Código, não apenas os Tributos indiretos – aos quais, sem dúvidas, se destina em particular dispositivo – mas também outra qualquer incidência tributária indireta que possa estar inserida em Tributo tipicamente direto. (...) no imposto de renda (imposto incontroversamente direto), como é o caso das incidências na fonte (incidência indireta).
Há outra corrente que entende que o art. 166 do CTN aplica-
se aos casos de repercussão jurídica, ou seja, substituição tributária. Machado
Segundo125 escreve:
Quando o art. 166 do CTN se refere aos Tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro, deve-se entender que tais Tributos sejam apenas aqueles que, por sua natureza financeira, possam ser transferidos, tais como o ICMS, o IPI e o ISS, nos casos em que o Tributo vem lançado e efetivamente destacado no documento fiscal. (...) aplica-se ainda nos casos de substituição, em que se tem a nítida distinção jurídica entre o obrigado ao recolhimento do Tributo e aquele que efetivamente suporta o seu ônus.
O doutrinador Machado126 conclui:
a) O art. 166 do CTN é compatível com o sistema de princípios constitucionais, segundo o qual o contribuinte tem direito de não ser compelido a pagar Tributo cuja cobrança não se faça nos exatos termos da Constituição e das leis, desde que não seja visto como um obstáculo ao exercício do direito à restituição do Tributo pago indevidamente.
b) A interpretação do art. 166 do CTN que o coloca de acordo com a Constituição é apenas aquela que o entende aplicável somente aos casos de repercussão jurídica, como tal entendida a autorização, por lei, ao responsável pelo recolhimento do Tributo, para que este cobre de terceiro, que é o contribuinte direto, a quantia correspondente ao Tributo, como acontece, por exemplo, nos casos de substituição tributária.
125MACHADO, Hugo de Brito Segundo. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.14. 126MACHADO, Hugo de Brito. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.16-17.
53
c) A legitimidade para pedir a restituição do indébito tributário é do sujeito passivo da relação tributária, que efetuou o correspondente recolhimento, ou, nos casos de repercussão jurídica do contribuinte que efetivamente suportou o respectivo encargo financeiro.
d) Em se tratando de imposto incidente na operação de venda, pelo industrial, a restituição há de ser feita a este, que é o contribuinte, e daí decorre que, sendo não cumulativo o imposto, como acontece com o ICMS, o intermediário atacadista, bem como o varejista que compra do atacadista, são obrigados a estornar o crédito respectivo, que na verdade é indevido, pela mesma razão que indevido fora o pagamento feito pelo contribuinte.
Conclui-se, portanto, que o fundamento do pedido de
Restituição do Indébito Tributário tem base legal na Constituição de 1988 e no
CTN.
3.3 FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO À RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO
Sendo norma de hierarquia superior às demais leis, a
CRFB/88 representa importantíssimo instrumento de análise para averiguar o
direito de restituir Tributos indevidos, tendo em vista que seus princípios são
conceitos universalizados e não podem sofrer modificações legislativas
indisciplinadamente.
A respeito do tema, comenta Troianelli127:
É induvidoso, portanto, que o direito à restituição de Tributo pago indevidamente recebe amparo dos princípios constitucionais. O direito do contribuinte de ressarcimento do indébito tributário, seja via restituição, seja via compensação, funda-se em sólidas raízes constitucionais, sendo um corolário dos direitos à propriedade e ao devido processo legal, bem como dos princípios da legalidade e da moralidade.
127TROIANELLI, Gabriel Lacerda. Fundamentos constitucionais do direito ao ressarcimento do indébito tributário. Revista Dialética de Direito Tributário n° 27. p. 30.
54
O direito à restituição do indébito tributário repousa nos
princípios constitucionais mais utilizados pelo Direito Tributário, ou seja: o
princípio da legalidade, da moralidade administrativa e o da vedação do
enriquecimento sem causa. Entretanto, cabe ressaltar que tal direito tem
embasamento também nos princípios da segurança jurídica, da proporcionalidade
e da razoabilidade, que não trataremos neste trabalho, mas que certamente
representam uma grande importância ao direito estudado neste trabalho.
3.3.1 Princípio da legalidade
A respeito do princípio da legalidade, escreve Santos128:
Em obediência ao princípio da legalidade, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, exigir ou aumentar Tributos sem lei que o estabeleça, conforme disposto no art. 150, I, da CR/88. Caracterizado o indébito tributário, não pode haver lei válida a exigir ou aumentar Tributo. Com efeito, estaria o princípio da legalidade sendo frontalmente ferido pela recusa da restituição.
Para Troianelli129:
A ofensa ao princípio da legalidade decorre, necessariamente, do fato de que o denominado indébito tributário não é, na verdade, Tributo, pois, sendo todo Tributo, por definição, legal e devido, não pode uma quantia paga indevidamente a título de Tributo ter natureza tributária.
Leciona Tavares130:
Dentre os enunciados principiológicos genéricos existentes em nosso arcabouço jurídico, é o princípio da legalidade, seguramente, um dos mais senão o mais importante de todos os princípios gerais que irradiam seus benéficos efeitos na seara tributária, isto porque a sujeição do Estado ao postulado da legalidade e à jurisdição, são elementos indispensáveis à
128SANTOS, Cairon Ribeiro. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário. Coordenador: Hugo de Brito Machado. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 1999, p.74. 129TROIANELLI, Gabriel Lacerda. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.120. 130TAVARES, Alexandre Macedo. Compensação do indébito tributário. Curitiba: Juruá, 2001. p. 37.
55
formação de um legítimo e verdadeiro Estado Democrático de Direito. (...) aparece sob duas vertentes bem definidas: (1) como legítima garantia e direito de qualquer cidadão contra eventuais abusos perpetrados pelo Estado, quando assegura que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei” (CF, art. 5°, II), e; (2) como mecanismo controlador de qualquer atividade estatal específica (...).
Pode-se concluir que a legalidade, como princípio da
Administração, contido no artigo 37 da CRFB/88, demonstra que a Administração
Pública está sujeita aos “mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e
deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato e expor-se a
responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso” 131.
Portanto, a cobrança indevida de Tributo imposto ao sujeito
passivo, seja ele contribuinte ou responsável, deverá ser restituída de maneira
que este não se prejudique por atos da Administração imprevisíveis, mas
errôneos e felizmente reparáveis.
3.3.2 Princípio da moralidade administrativa
Segundo Soares de Melo132:
Constitui princípio alçado à estatura constitucional (art. 37), como um dos fundamentos basilares dos atos dos representantes das pessoas jurídicas de direito Público, evidenciando-se que não basta o ato administrativo conter seus elementos normais (competência, motivo, objeto, finalidade, forma), para projetar seus efeitos jurídicos, tornando-se imprescindível o comportamento moral, ético, honesto e justo. (...)A moralidade Administrativa restará prejudicada, no caso de parcelamento de débitos tributários, inclusive quando acompanhado de confissão de dívida, quando o Fisco promove penhora de bens do contribuinte, impossibilitando o pleno exercício de suas atividades pessoais ou particulares.
Meirelles133 ensina com propriedade:
131MEIRELLES, Helly Lopes. Direito administrativo brasileiro. 33 °ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 82. 132MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário, p. 40.
56
Por considerações de Direito e de Moral, o ato administrativo não terá que obedecer somente à lei jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, porque nem tudo que é legal é honesto, conforme já proclamavam os romanos: “non omne quod licet honestum est”.
Nos dizeres de Tavares134 :
É um princípio que deita raízes na velha máxima de Pompônio acerca da proibição do locupletamento da Administração Pública à “custa da jactância alheia”; largamente difundida pela doutrina pátria como a vedação do enriquecimento sem causa; do locupletamento ilícito.
Leciona sobre o tema Martins135 :
(...) A questão que se coloca para a reflexão dos estudiosos é a seguinte; pode o legislador ordinário reduzir o direito à compensação – conferindo ao Poder Público o direito de ser ‘caloteiro’ – sem Tributos, ferir o princípio da ‘moralidade pública’? Pode apenar o contribuinte com a pena da liberdade, se atrasar o pagamento de Tributos e de outro lado, retirar deste o direito de ressarcir-se imediatamente do que lhe foi exigido ilegalmente, consagrando a favor do poder Público o dito ‘ façam o que eu digo, mas não façam o que eu faço’, sem violentar o princípio da moralidade pública?
A configuração do desvio de poder e do princípio da
moralidade é objeto de análise de Osório136:
A doutrina clássica desenvolveu mecanismos de controle de uma legalidade substancial dos atos administrativos e, nesse sentido, proporcionou espaço para o desenvolvimento dos princípios da legalidade e moralidade administrativas, aí incluída a possibilidade de se controlar mais amplamente conceitos jurídicos indeterminados. (...) A imoralidade da lei não se deixa perceber pelo mero subjetivismo judiciário, pois aí haveria arbítrio. Percebe-
133MEIRELLES, Helly Lopes. Direito administrativo brasileiro,p. 83. 134TAVARES, Alexandre Macedo. Compensação do indébito tributário, p. 39. 135MARTINS, Ives Gandra da Silva. A compensação dos tributos e a moralidade pública, in Repertório IOB de Jurisprudência nº 6/97, março de 1997, Caderno 1, p. 141-142. 136OSÓRIO, Fábio Medina. Improbidade administrativa, 2º ed. Porto Alegre: Síntese, 1998, p. 155-156.
57
se a imoralidade administrativa pelo conjunto dos princípios, de concepções doutrinárias, jurisprudenciais, hermenêuticas de um dado sistema que, em seu todo, repele determinadas soluções ou opções do legislador, por reputá-las inconstitucionais. (...) A moralidade administrativa abrange padrões objetivos de condutas exigíveis do Administrador Público, independentemente, inclusive, da legalidade e das efetivas intenções dos agentes públicos.
3.3.3 Princípio da vedação do enriquecimento sem causa
A lei brasileira não decretou nenhum princípio geral no
sentido de qualificar o enriquecimento sem causa como fonte especial das
obrigações do Estado e do particular, a serem respeitadas.
Não obstante, o princípio da vedação do enriquecimento
sem causa está consagrado pelo Direito Pátrio, atuando como norma jurídica,
informando e conformando soluções jurídicas a serem aplicadas a determinada
hipótese.
O que conta é a circunstância de, na expressão do autor
Madrazo, funcionar como “fundamento do direito das obrigações, regra de ouro
das transferências patrimoniais, padrão ou medida com o qual se julga a equidade
de um negócio ou de uma situação jurídica137”.
Iure naturae et aequum est, neminem, cum alterius
detrimento et iniuria, fieri locupletiorem138, ou seja, enriquecimento sem causa é
aquele em função do qual alguém, em detrimento de outrem, vê acrescido seu
patrimônio.
Segundo Pereira139:
O pagamento indevido é considerado uma modalidade de enriquecimento sem causa. A vedação ao enriquecimento sem causa e o conseqüente direito à Repetição do Indébito pelo solvens é fundada no princípio de equidade, conhecida desde o
137MADRAZO, Francisco. Orden juridico y derecho judicial. Buenos Aires: Depalma, 1985. p.96. 138POMPÔNIO,LXII.títuloVI,14.Disponível em:http://www.adunicamp/org.br/publicacoes/erosgraus> Acesso em 16 de março de 2007. 139PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 19ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 183.
58
Direito Romano através das "conditiones sine causa", que era o meio técnico através das quais devia aquele que se locupletasse de coisa alheia restituí-la ao seu legítimo dono.
Assim, sempre que alguém recebesse de outrem alguma
coisa, sem justa causa que legitimasse o pagamento, “o Pretor deferia ao solvens
uma ação especial denominada condictio indebiti, para reclamar a devolução do
indevido140”.
O Código Civil de 1916 não trazia regra expressa sobre o
enriquecimento sem causa, agora previsto no art. 876 do Código Civil, que assim
dispõe:
Art. 876. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.
Inicialmente, a doutrina civilista e a jurisprudência eram
uníssonas em afirmar que se o solvens efetuou o pagamento consciente e
voluntariamente, o seu ato representaria uma liberalidade141. Inexistindo, portanto,
o erro do solvens, ficaria eliminado o direito à repetição142.
Posteriormente, alguns doutrinadores franceses começaram
a pregar pela desnecessidade da prova do erro, bastando a simples inexistência
de justa causa do pagamento143.
Ensina com clareza Venosa144 :
Também, aqui entre nós, a jurisprudência começou a dispensar a prova do erro naquelas hipóteses em que o solvens era colocado em situação na qual não teria outra saída senão o pagamento, como no caso de Tributos em que há sanção legal imediata pelo inadimplemento.
140RODRIGUES, Sílvio. Direito civil. 28ª ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 408. 141RODRIGUES, Sílvio. Direito civil, p. 411. 142MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. 34ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 435. 143RODRIGUES, Sílvio. Direito civil, p. 412. 144VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. São Paulo: Atlas, 2001, p. 205.
59
Nesses casos, bastava a prova da ilegalidade ou
inconstitucionalidade do Tributo para o direito à Repetição do Indébito145. Assim, o
conceito de voluntariedade ficou restrito ao adimplemento que, sem prejuízo para
o devedor, poderia deixar de ser feito.
3.4 A RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO E O PRAZO
PRESCRICIONAL QÜINQÜENAL
Quando um Lançamento Tributário é indevido, feito por
qualquer das modalidades previstas no CTN, pode ensejar, se houve pagamento,
a restituição do valor indevidamente pago.
A respeito do direito à restituição de Tributo pago
indevidamente ensina Harada146:
(...) o Tributo indevido, exigido ou pago voluntariamente, deve ser restituído em virtude do princípio da legalidade tributária. Por isso, não há necessidade de o contribuinte fazer a prova de que efetuou o pagamento por erro, como se exigia antigamente com base em noções de direito privado. (...) a ação de Repetição de Indébito é a ação do contribuinte contra a Fazenda Pública, visando à restituição de Tributo pago indevidamente. (...) Daí porque a legitimidade para propor a ação só poderia ter quem foi parte na relação jurídica tributária, e não o consumidor final, também conhecido como contribuinte de fato, ou seja, aquele que suportou o encargo do Tributo, o qual nenhuma obrigação tem perante o fisco e, conseqüentemente, nenhum direito tem diante da Fazenda Pública, que sequer o conhece.
O artigo 168 do CTN prevê o prazo para o exercício do
direito ao ressarcimento dos Tributos pagos indevidamente, vejamos:
Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso de prazo de 5 anos (cinco) anos, contados: I – nas hipóteses dos incisos I e II do art. 165, da data da extinção do Crédito Tributário;
145GONÇALVES, Carlos Roberto. Sinopses jurídicas. Direito das obrigações: Parte Especial, Tomo I – Contratos. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 179. 146HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário, p.581.
60
II – na hipótese do inciso III do art. 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória.
Sobre o tema, leciona Machado147:
(...) o prazo para tanto é, nos termos do art. 168 do Código, de cinco anos contados da extinção do Crédito Tributário, que em se tratando de Lançamento por Homologação somente resta consumada com a homologação, expressa ou tácita. Na prática, portanto, como a Fazenda Pública não costuma fazer homologações, a homologação geralmente é tácita, consumando-se com o decurso do prazo de cinco anos contados do pagamento.
Alguns autores entendem que quando se trata de Tributo
exigido por lei inconstitucional, o prazo da prescrição é contado a partir da
declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal. Contudo,
para Oliveira Lima148:
Se o contribuinte, supondo constitucional determinada exação, recolhe o valor exigido pelo Estado, e percebe mais tarde a inconstitucionalidade da exigência, não fica proibido de buscar a recuperação imediatamente, nem sua iniciativa fica na dependência de que o STF reconheça a inconstitucionalidade da norma. (...) A pretensão à Repetição nasce com o pagamento, sendo irrelevante a modalidade de Lançamento que estaria sujeita pretensa exação, bem assim o fato do pagamento indevido ter decorrido de obediência à lei inconstitucional, cujo vício somente mais tarde tenha sido reconhecido.
Machado149 comenta:
Hugo de Brito Machado Segundo e Paulo de Tarso de Vieira Ramos entendem que não existe prazo para a propositura de ação fundada na inconstitucionalidade da lei tributária, porque os dispositivos do Código Tributário Nacional referem-se apenas ao
147MACHADO, Hugo de Brito. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.21. 148MACHADO, Hugo de Brito. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.21. 149MACHADO, Hugo de Brito. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.21
61
pedido perante a autoridade administrativa, que não pode conhecer de questões constitucionais.
Outra discussão relevante quanto à restituição dos Tributos
pagos indevidamente, diz respeito à natureza decadencial ou prescricional do
prazo para sua reivindicação.
Sobre o tema, comenta Leal150:
É de decadência o prazo estabelecido pela lei, pela vontade unilateral ou bilateral, quando prefixado ao exercício do direito pelo seu titular. E é de prescrição, quando fixado, não para o exercício do direito, mas para o exercício da ação, originando-se ambos do mesmo fato, de modo que o exercício da ação representa o próprio exercício de direito, o prazo estabelecido para a ação deve ser tido como prefixado ao exercício do direito, sendo, portanto, de decadência, embora aparentemente se afigure de prescrição.
Segundo Vaz, “em se tratando de compensação, como
sendo um direito potestativo do contribuinte, este prazo é o de decadência151”.
Gomes de Mattos152 averba que, a distinção entre estes dois
institutos é problemática, antiga e complexa, continuando a desafiar a argúcia dos
juristas. O autor apresenta uma tabela, para efeitos didáticos, onde constam as
hipóteses em que é permitida a restituição com seus prazos respectivos:
Para pleitear restituição de pagamento indevido (CTN art. 168), nos casos de erro de direito e de fato (art. 165, incs. I e II), nas modalidades de: 1) Lançamento por Declaração (CTN, art. 147) e ex officio (idem art. 149): Prazo Prescricional: 5 anos - da extinção do Crédito Tributário (CTN, art. 168, inc. I) . 2) Lançamento por Homologação (idem art. 150, § 1°) sem manifestação expressa do fisco:
150LEAL, Câmara. Da prescrição e decadência, 2ºed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. p.124. 151VAZ, Carlos. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.110. 152MATTOS, Aroldo Gomes de. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p. 57.
62
Prazo Prescricional: 5 anos + 5 anos – 5 anos da homologação do Lançamento (CTN, art. 150, § 4°) + 5 anos para a repetição (idem art. 168, inc. I). 3) idem nos casos de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória (CTN, art. 165, inc. III, c/c art. 168, inc. II). Prazo Prescricional: 5 anos – da decisão administrativa definitiva ou do trânsito em julgado da decisão judicial (CTN, art. 168, inc. II). 4) Para ajuizar ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição (CTN, art. 169). Prazo prescricional: 2 anos – da data da denegação (CTN, art. 169).
Nesse preciso sentido, consolidou-se a jurisprudência do
STJ153, anteriormente ao advento da Lei Complementar 118/05:
O prazo para o exercício do direito de ação que tutela a Repetição de Indébito tributário, havendo homologação tácita do Lançamento, prescreve em cinco anos, contado da extinção do Crédito Tributário, que, por sua vez, dão-se outros tantos após a ocorrência do fato gerador. Na prática, são dez anos.
Portanto, se não houver homologação expressa, o término
do direito de pleitear a restituição ocorrerá após o transcurso do prazo de cinco
anos, contados da ocorrência do fato gerador, somados a mais cinco anos,
contados da data que ocorreu a homologação tácita.
3.5 A TESE DOS CINCO MAIS CINCO VINCULADA À RESTITUIÇÃO DO
INDÉBITO DOS TRIBUTOS AUTOLANÇADOS
O ordenamento jurídico-tributário brasileiro assegura aos
contribuintes o direito de serem ressarcidos dos valores indevidamente recolhidos
aos cofres públicos, a título de Tributo.
153 REsp n° 71.714-RS, 2ª Turma, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, unânime, in DJ Seção 1, de 11-12-95, p. 43.201.
63
Tavares154 leciona a respeito do prazo para o pedido de
restituição do indébito dos Tributos ao Lançamento por Homologação
(autolançados), que figura objeto de repercussão no meio jurídico:
Por oportuno, cumpre ressaltar que, com o advento da Lei Complementar número 118, de 09/02/2005, a pretexto do que a doutrina convencionou de chamar de “interpretação autêntica”, o legislador implementou alteração à tese dos cinco mais cinco prestigiada pelo Superior Tribunal de Justiça, com esteio no art. 3° que dispõe:Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei nº 5.172/66, de 25 de outubro de 1966- Código Tributário Nacional, a extinção do Crédito Tributário ocorre, no caso de Tributo sujeito a homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o §1º do art. 150 da referida Lei.
Até o advento da Lei Complementar de 05 de junho de
118/05, o entendimento dos Tribunais era de que o prazo para pleitear eventuais
restituições de Tributos pagos indevidamente, poderia ser de 10 (dez) anos, pois
se a homologação se desse expressamente antes do decurso de prazo de 5
anos, o prazo seria menor. Após este dispositivo, entende-se que tal prazo
consiste em 5 (cinco) anos.
3.6 A LEI COMPLEMENTAR N° 118/05 E A SEPARAÇÃO DA TESE DOS
CINCO MAIS CINCO, SEDIMENTADA PELO STJ
A respeito da “tese dos cinco mais cinco” ensina, Buono155:
No caso de Tributos lançados por homologação, a doutrina e jurisprudência remansosas, lastreadas na chamada “Tese dos Cinco mais Cinco” consagrada pelo Superior Tribunal de Justiça, sedimentaram interpretação segundo a qual o contribuinte possuía o direito de pleitear a restituição no prazo de cinco anos a contar da homologação pelo Fisco, que poderia ocorrer expressa ou tacitamente, dentro do prazo de cinco anos a contar da ocorrência do fato gerador, na forma disposta no Art. 150, § 4º do CTN. O Art. 3º da Lei Complementar nº118/2005, auto-intitulado
154TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.259. 155BUONO, Fernando. Da prescrição do direito à repetição de indébito fiscal. Análise das inovações introduzidas pela Lei Complementar nº118, de 9 de fevereiro de 2005. Disponível em: <http://www.apet.org.br/artigos/ver.asp?art_id=228>. Acesso em 15 de maio 2007.
64
interpretativo, irrompeu com essa exegese doutrinária e jurisprudencial consolidadas, notadamente com o entendimento consagrado pelo Superior Tribunal de Justiça, órgão jurisdicional competente para decidir em última instância sobre questões relacionadas à interpretação de lei federal (CF, Art. 105, III, “a” e “c”), como no caso sob foco. E o Art. 4º da mesma Lei, reportando-se ao Art. 106, I, do Código Tributário Nacional, determinou a incidência retroativa da interpretação consignada no Art. 3º, de forma a atingir eventos jurídicos consumados antes da sua vigência.
Dispõe o art. 3º desta Lei Complementar:
Art. 3º. Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional, a extinção do Crédito Tributário ocorre, no caso de Tributo sujeito ao Lançamento por Homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1º do art. 150 da referida Lei.
Não obstante tal norma faça menção de que se destina a
corroborar com a correta interpretação do disposto no art. 168 do Código
Tributário Nacional - CTN, a mesma encerra comando de natureza material a
reger as relações de cunho tributário, mormente porque dispunha sobre
prescrição em matéria tributária, representando, em verdade, inovação legislativa.
Nesse sentido tem se manifestado o STJ, consoante se tira
do seguinte precedente:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - IMPOSTO DE RENDA - VERBAS INDENIZATÓRIAS - PRESCRIÇÃO - TESE DOS "CINCO MAIS CINCO" - ORIENTAÇÃO DA PRIMEIRA SEÇÃO - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA - INADMISSÃO - SÚMULA 168/STJ - LC 118/2005 - APLICAÇÃO RETROATIVA - IMPOSSIBILIDADE - AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (...) 3. Por outro lado, mesmo que afastado esse óbice, cumpre ressaltar que esta Primeira Seção, no julgamento dos EREsp 327.043-DF - sessão do dia 27.4.2005 -, sufragou o entendimento de que as disposições da LC 118/2005 não possuem caráter interpretativo, pois representam inovações no plano normativo, razão pela qual não podem ser aplicadas retroativamente.(...)
65
(AgRg nos EResp nº 639.083/PR, Rel. Min. Denise Arruda, 1ª Seção, DJ 20.06.2005)
Daí a denominação “Tese dos Cinco mais Cinco”: cinco anos
a contar do fato gerador para o Fisco homologar, expressa ou tacitamente, o
Lançamento; mais cinco anos a contar da homologação para o contribuinte
pleitear a restituição que julgar devida. Isso porque se considera consumada a
extinção do Crédito Tributário com a homologação, expressa ou tácita, do
Lançamento.
Sobre o tema, entende o STJ:
O art. 3º da Lei Complementar 118/2005, a pretexto de interpretar estes mesmos enunciados, conferiu-lhes, na verdade, um sentido e um alcance diferente daquele dado pelo Judiciário. Ainda que defensável a "interpretação" dada, não há como negar que a Lei inovou no plano normativo, pois retirou das disposições interpretadas um dos seus sentidos possíveis, justamente aquele tido como correto pelo STJ, intérprete e guardião da legislação federal. Tratando-se de preceito normativo modificativo, e não simplesmente interpretativo, o art. 3º da LC 118/2005 só pode ter eficácia prospectiva, incidindo apenas sobre situações que venham a ocorrer a partir da sua vigência. (AgRg nos EResp nº 639.083/PR, Rel. Min. Denise Arruda, 1ª Seção, DJ 20.06.2005)
Portanto, quanto à Lei Complementar n. º 118/2005, conclui-
se que o STJ tem entendimento no sentido de que esta inovou o plano normativo,
não se acatando a tese de que a mencionada norma teria natureza meramente
interpretativa, restando limitada a sua incidência às hipóteses verificadas após a
sua vigência, em obediência ao princípio da irretroatividade da lei fiscal.
3.7 O ART. 166 DO CTN E A RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO
Como dispõe o artigo 166 do CTN, a repetição dos tributos,
que admitem transferência de encargo financeiro e foram pagos indevidamente ao
Fisco, será feita para aqueles que comprovem ter ostentado o referido encargo e
assumido o pagamento do montante indevido.
66
Para Mörschbächer156:
O direito à restituição daquilo que se pagou indevidamente ao cerário a título de Tributo repousa, sem sombra de dúvidas, na própria Constituição, que se acha estruturada no sentido de valorização da iniciativa privada e conseqüentemente, dos frutos dela havidos, e mais diretamente no respeito à propriedade privada, no seu mais amplo espectro, atendida a função social, tanto é que a própria Constituição que define as situações de perda da propriedade, nos casos de desapropriação por necessidade ou utilidade pública ou por interesse social, sempre mediante justa e prévia indenização.
Encontram-se submetidas ao regramento do artigo 166 do
CTN, não apenas os Tributos indiretos157 – aos quais, sem dúvidas, se destina em
particular o dispositivo – mas, também outra e qualquer incidência tributária
indireta que possa estar inserida em Tributo tipicamente direto158. Em síntese,
pois, deve-se afirmar, com absoluto rigor técnico, que as denominadas restrições
contidas no artigo 166 do CTN “dizem nada mais e nada menos, com as
genericamente denominadas incidências tributárias indiretas, que constituem
regra nos Tributos indiretos, e exceção nos Tributos diretos” 159.
Ensina o doutrinador Machado160:
(...) Tributos que comporte, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro, são somente aqueles Tributos em relação aos quais a própria lei estabeleça dita transferência. (...) pois a natureza a que se reporta tal dispositivo legal só pode ser a natureza jurídica que é determinada pela lei correspondente, e
156MÖRSCHBÄCHER, José. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário. Coordenador Hugo de Brito Machado, p.253. 157 “Para a doutrina e a jurisprudência, tributo indireto, consoante critério econômico ou financeiro, é aquele em que ocorre o fenômeno da repercussão. Este seria a transferência da carga fiscal para um terceiro. Teríamos, então, um "contribuinte de direito" - obrigado ao recolhimento ante o Fisco competente - e um "contribuinte de fato" - suportando o ônus financeiro”. Disponível em: <http://www.aldemario.adv.br/artigo1.htm>. Acesso em 18 de maio de 2007 158 “Caracteriza-se tributo direto quando numa só pessoa reúnem-se as condições de contribuinte (aquele que é responsável pelo cumprimento de todas as obrigações tributárias previstas na legislação)”. Disponível em: <http://www.portaltributario.com.br/tributario/tributosdiretos.htm>. Acesso em 18 de maio de 2007. 159MÖRSCHBÄCHER, José. A repetição do indébito e a compensação no direito tributário, p.254. 160MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. Coordenador Hugo de Brito Machado, p. 140.
67
não por meras circunstâncias econômicas que podem estar ou não, presentes, sem que se disponha de um critério seguro para saber quando se deu, e quando não se deu tal transferência.
A aplicação do art. 166 do código tributário Nacional na
restituição de Tributos cobrados indevidamente constitui questão ainda não
resolvida satisfatoriamente pela jurisprudência.
Leciona com propriedade Tavares161:
Eis que surge o brilho da proposta que ora se apresenta, qual seja a de se buscar o sentido e alcance do art. 166 do CTN em elementos hauridos exclusivamente da Ciência jurídica, in casu, com espeque em interpretação conjugada com o enunciado prescritivo do art. 128 do próprio Digesto Tributário, de modo a somente se exigir a denunciada prova da não transferência do encargo financeiro, para efeito de pretensa restituição do indébito, quando a própria lei atribuir a responsabilidade tributária a uma terceira pessoa, por obra do regime jurídico da substituição tributária.
Afirma o autor que o art. 166 do CTN classifica os Tributos
conforme critérios adotados pela Ciência das Finanças, dividindo os Tributos em
diretos162 e indiretos163, “no intuito de instrumentalizar o referido óbice à
restituição do indébito tributário, representado juridicamente pela exigência da
prova da não repercussão econômica do Tributo164”.
161TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.258. 162Tributo direto - “Caracteriza-se tributo direto quando numa só pessoa reúnem-se as condições de contribuinte (aquele que é responsável pelo cumprimento de todas as obrigações tributárias previstas na legislação)”. Disponível em: <http://www.portaltributario.com.br/tributario/tributosdiretos.htm>. Acesso em 18 de maio de 2007. 163Tributo indireto - “Para a doutrina e a jurisprudência, tributo indireto, consoante critério econômico ou financeiro, é aquele em que ocorre o fenômeno da repercussão. Este seria a transferência da carga fiscal para um terceiro. Teríamos, então, um "contribuinte de direito" - obrigado ao recolhimento ante o Fisco competente - e um "contribuinte de fato" - suportando o ônus financeiro”. Disponível em: <http://www.aldemario.adv.br/artigo1.htm>. Acesso em 18 de maio de 2007. 164TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.250.
68
Para o doutrinador Amaral165:
Entre nós é unânime a opinião de que o imposto direto ‘recai sobre o contribuinte que suporta o encargo financeiro em caráter definitivo’. E o imposto indireto ‘é aquele cuja incidência possibilita transferência da carga tributária ao operador que se situa na etapa subseqüente do processo circulatório, por exemplo ICM e IPI’.
Reiterando que a aplicação do art. 166 do CTN restringe-se
ao ICMS e IPI, por serem os únicos Tributos juridicamente feitos para
repercutir166, obtempera167 Coelho168:
Quando o CTN se refere aos Tributos que, pela sua própria natureza, comportam a transferência do respectivo encargo financeiro, está se referindo aos Tributos que, pela sua constituição jurídica, são feitos para obrigatoriamente repercutir, casos do IPI e do ICMS, entre nós, idealizados para serem transferidos ao consumidor final. A natureza a que se refere o artigo é jurídica. A transferência é juridicamente possibilitada. A abrangência do art. 166, portanto, é limitada, e não ampla.
Conclui-se assim que o único regime jurídico de incidência
do dispositivo em questão, no que diz respeito à restituição do indébito tributário,
é aquela na qual a própria lei determina a existência ou não do contribuinte, bem
como seu substituto ou responsável, para requer o direito infringido.
165AMARAL, Luiz. Da repercussão econômica jurídica dos tributos. Revista dos Tribunais, nº 675, jan.1992, p.68. 166 Tributos diretos ou que não repercutem – “são aqueles cuja carga econômica é suportada pelo contribuinte, isto é, por todo aquele que tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua a respectiva hipótese de incidência tributária (caso do ISS a ser pago pelo advogado, relativamente aos honorários percebidos em razão de serviços profissionais prestados).” Tributos indiretos ou que repercutem – “são aqueles cuja carga econômica é suportada não pelo contribuinte, mas por terceira pessoa que não realizou a situação definida em lei como necessária à instauração do liame jurídico-obrigacional de pagar o respectivo tributo (geralmente é o consumidor final da mercadoria ou produto). Convém registrar que esta classificação, em rigor, não é jurídica, posto que irrelevante ao Direito Tributário saber quem suporta a carga econômica do imposto. Trata-se, como é cediço, de classificação adotada pela Ciência das Finanças. Importa, pois, à província do Direito Tributário, saber quem efetivamente realizou o fato jurídico tributário (...) pouco importando haver ou não repasse deste encargo ao preço final do produto, mercadoria ou serviço”. TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p 70. 167TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário, p.254. 168CÔELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 4° ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p.709.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como objetivo investigar, à luz da
legislação, da doutrina e da jurisprudência nacional, a Repetição do Indébito dos
Tributos sujeitos ao Lançamento por Homologação.
O interesse pelo tema abordado deu-se em razão de sua
especificidade e pela diversidade de entendimento acerca da matéria manifestada
na prática pelas autoridades administrativas.
O direito à restituição de valores pagos indevidamente,
embora não seja muito sedimentado, é um direito constitucional que objetiva a
defesa da parte prejudicada em relação à atuação do Fisco, assegurando ao
cidadão, parte mais fragilizada, o desfecho e aceitação de eventuais solicitações
propostas em juízo.
Para seu desenvolvimento lógico o trabalho foi dividido em
três capítulos.
O primeiro tratou de abordar as bases introdutórias do direito
tributário, assim como suas categorias pertinentes. Desta forma, dentro dos
moldes do artigo 3° do Código Tributário Nacional, tem-se que o Tributo é toda
prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa
exprimir, que não constitua sanção ou ato ilícito, instituída em lei e cobrada
mediante atividade administrativa plenamente vinculada.
Quanto ao conceito de Obrigação Tributária, ficou claro que
é o vínculo jurídico, previsto em lei, pelo qual o Estado possui o direito de exigir o
cumprimento de determinada prestação. Poderá ser classificada como principal,
quando surge com a ocorrência do fato gerador e tem por objeto o pagamento de
Tributo ou penalidade pecuniária, extinguindo-se juntamente com o crédito dela
decorrente, ou como acessória, quando há uma obrigação de fazer, a fim de
viabilizar o cumprimento das obrigações principais as quais assessoram.
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Assim, percebe-se que a Obrigação Tributária nasce através
da ocorrência do fato gerador previsto em lei e tem como finalidade determinar
qual será o Crédito Tributário devido ao Estado, que é o destinatário maior dos
valores arrecadados a título de Tributo.
Encerrou-se o capítulo, com breves considerações a
respeito da extinção da Obrigação Tributária através do pagamento, modalidade
usual de extinção prevista em lei (CTN, art. 156, I).
O segundo capítulo foi destinado a tratar do Lançamento
Tributário como ato constitutivo do Crédito Tributário. Iniciou-se apresentando o
conceito desta categoria tributária, e sua constituição através do Lançamento.
Após, discorreu-se sobre o conceito, função e natureza
jurídica do Lançamento, relacionado este como ato ou procedimento
administrativo. Como visto, é o Crédito Tributário, pois, constituído pelo
Lançamento, o qual tem por função tornar líquida e certa a Obrigação Tributária
até então juridicamente inexigível. É esta liquidez e certeza que possibilita a sua
cobrança, sendo a sua natureza jurídica meramente declaratória, segundo a
opinião da maioria dos especialistas no ramo.
No terceiro e último capítulo, tratou-se da Repetição do
Indébito dos Tributos Lançados por Homologação. Este capítulo apresentou os
pressupostos do direito à restituição, tal qual o pagamento indevido ou a maior
que o devido.
No tocante aos princípios constitucionais que asseguram tal
direito, demonstrou-se alguns dos principais, os quais especificamente fazem
parte da segurança jurisdicional do contribuinte ou responsável, que são: o
princípio da legalidade, da moralidade administrativa e da vedação do
enriquecimento sem causa.
Analisou-se sobre a inovação à ordem jurídica, tendo em
vista que até a Lei Complementar 118/05, tínhamos o dispositivo 168, I, do CTN,
afirmando que o prazo para Repetição do Indébito contava-se da extinção do
Crédito Tributário, e o art. 156, VII, do CTN, dispondo no sentido de que a
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extinção do Crédito Tributário se dava com o pagamento antecipado e a
Homologação do Lançamento, nos termos do disposto no art. 150, §§1°e 4°. Por
força disto, os Tribunais firmaram a posição no sentido de que o prazo para a
repetição seria contado da extinção do Crédito Tributário pela Homologação
tácita, ocorrida após cinco anos da ocorrência do fato gerador. Eis que surgiu a
denominada tese dos cinco mais cinco, aplicável particularmente à hipótese da
Repetição do Indébito dos Tributos Lançados por Homologação.
De acordo com a orientação sedimentada pelo Superior
Tribunal de Justiça, tem-se que toda Restituição de um Tributo Lançado por
Homologação, objeto de pedido formulado antes da vigência da Lei
Complementar 118, designada para 09 de junho de 2005, poderia ter o prazo de
até dez anos para ser ajuizada, e após tal data, submetem-se ao prazo de cinco
anos, independentemente de quanto tempo já se passou desde o Indébito.
Por fim, retomam-se as três hipóteses básicas da pesquisa:
a) a prova do erro do pagamento poderá ser condição do
pedido de Restituição do Indébito Tributário;
b) o prazo prescricional da Restituição do Indébito de um
Tributo lançado por Homologação poderá existir;
c) uma vez pago indevidamente, o respectivo valor do
indébito tributário poderá ser restituído ao contribuinte,
independentemente da observância por parte deste de
qualquer condição, salvo o próprio comprovante de
recolhimento.
No que se refere à primeira hipótese, restou confirmada,
tendo em vista que, diferentemente do Direito Civil, no Direito Tributário a
restituição do tributo indevidamente pago não se sujeita à prova do erro, já que a
obrigação tributária decorre da vontade da lei, mostrando-se irrelevante a vontade
do contribuinte (= obrigação ex lege) para o estabelecimento do vínculo
obrigacional.
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Com relação à segunda hipótese, restou parcialmente
comprovada, pois, antes da Lei Complementar 118/05, o prazo prescricional
aplicável à restituição do Tributo indevidamente pago, Lançado por Homologação,
era de dez anos (tese dos cinco mais cinco), conforme jurisprudência
predominante do STJ.
No que toca a terceira hipótese, não restou comprovada,
tendo em vista que o artigo 166 do Código Tributário Nacional dispõe que a
restituição de Tributos que comportem, por sua natureza, a transferência do
respectivo encargo financeiro, somente será feita a quem prove haver assumido
referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este
expressamente autorizado a recebê-la. Logo, no caso dos denominados Tributos
indiretos169 a prova da não transferência do encargo financeiro constitui condição
de admissibilidade do direito a sua Repetição do Indébito.
Consigna-se, finalmente, que o presente trabalho não
procurou esgotar o tema, mas, tão-somente, enfocar algumas questões pontuais
relacionadas ao direito à Repetição do Indébito dos Tributos sujeitos ao
Lançamento por Homologação. Destaca-se, todavia, que a presente investigação
bibliográfica é apenas o início de um estudo que certamente merece maior
aprofundamento face às opiniões divergentes, notadamente em razão do conflito
de interesses que existe entre o Fisco e os contribuintes.
169“Para a doutrina e a jurisprudência, tributo indireto, consoante critério econômico ou financeiro, é aquele em que ocorre o fenômeno da repercussão. Este seria a transferência da carga fiscal para um terceiro. Teríamos, então, um "contribuinte de direito" - obrigado ao recolhimento ante o Fisco competente - e um "contribuinte de fato" - suportando o ônus financeiro”. Disponível em: <http://www.aldemario.adv.br/artigo1.htm>. Acesso em 18 de maio de 2007.
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