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4 Física na Escola, v. 12, n. 1, 2011

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Determinação da velocidade de uma fonte sonora

Este trabalho propõe uma atividade de apren-dizagem sobre ondas sonoras de fácil aplicaçãoa estudantes de nível médio. O objetivo é, utili-zando a aquisição automática de dados atravésdo computador, determinar a velocidade deuma fonte sonora baseada no efeito Doppler-Fizeau. Trata-se de uma proposta que, facilitadapela aquisição automática de dados e mediadapela ação do professor, relaciona teoria e prática.

No que se refere ao estudo dosfenômenos ondulatórios, o efeitoDoppler-Fizeau é um importante

tema a ser trabalhado, visto que descrevesituações comuns no dia-a-dia do estu-dante. Um exemplo disso é a diferença nafrequência do som percebido por umobservador quando passa por ele umaambulância com a sirene em funciona-mento.

Hoje se verifica que, de maneira geral,a metodologia empregada no ensino de fí-sica dificulta a aprendizagem de concei-tos e leis. Essa dificuldade pode estarrelacionada à não utilização de recursosdidáticos, como por exemplo o compu-tador e aplicativos, nas aulas de física.

Este artigo apresenta uma propostametodológica para o ensino do efeito Dop-pler-Fizeau a alunos de Ensino Médio atra-vés do uso de determinadas tecnologiasde ensino, como é o caso do computador,gravador de áudio e aplicativo para análisede dados. Com o estudo aqui apresentadomostraremos como é possível determinara velocidade de um veículo em movimentoem relação a um observador.

Deste modo, apresentamos os resul-tados de um estudo sobre a frequência dosom emitido por uma fonte sonora quan-do em movimento(efeito Doppler-Fi-zeau), através daaquisição automáticade dados. Nessa aqui-sição dos dados foiutilizado como trans-dutor o microfone para captar a frequên-cia emitida pelas fontes sonoras, placa desom como interface para a conversão dosinal analógico em digital e o aplicativoSpectrogram® para o registro e armaze-namento dos dados coletados.

A idéia do experimento que será apre-sentado neste artigo pode ser reproduzidapor qualquer pessoa, sendo então fácil suaaplicação, ou no mínimo demonstração,

Alexandre NovickiInstituto de Física, UniversidadeFederal do Rio Grande do Sul, PortoAlegre, RS, BrasilE-mail: alenovicki@gmail.com

Elder da Silveira LatosinskiInstituto Federal Farroupilha, SãoBorja, RS, BrasilE-mail: eelderr@gmail.com

Rodrigo PogliaInstituto Federal Sul-Rio-Grandense,Venâncio Aires, RS, BrasilE-mail: con.rodrigopoglia@gmail.com

em sala de aula, para estudantes de nívelmédio.

Fundamentação teórica

O computador pode vir a tornar-seuma ferramenta cognitiva no processo en-sino aprendizagem, criando um ambienteem que o aluno construa sua interpreta-ção do mundo real organizando e siste-matizando seus conhecimentos. O profes-sor, atuando como mediador, pode utilizaresta ferramenta no sistema de ensino obje-tivando preparar o aluno para a inserçãono mundo informatizado. Em ciências, ocomputador atua como “instrumentopara a modelagem científica e comosuporte ao laboratório” [1].

A interação no processo de ensino eaprendizagem baseia-se na teoria damediação de Vygotsky, que afirma que odesenvolvimento cognitivo ocorre dentrode um contexto histórico, social e cultural[2, p. 109]. Ainda segundo Vygotsky, odesenvolvimento cognitivo é a transfor-mação de relações sociais em funçõesmentais através da mediação entre instru-mentos e signos. O instrumento é aquiloque pode ser usado para fazer algo, en-quanto o signo é algo que tem significado.Desse modo, o desenvolvimento cognitivo

se dá na apropriaçãode instrumentos e sig-nos, via interação so-cial [2, p. 110-111].

Algumas publi-cações relatam positi-vamente o uso da

aquisição automática de dados [1, 3]. Énessa perspectiva que o presente trabalhotrata o computador como uma versãocontemporânea daquilo que Vygotskychamava de instrumento, propondo umaatividade que faz uso dessa tecnologia.

Ainda segundo Haag (op. cit.) verifica-se que atualmente os professores queutilizam o computador em sua prática ofazem apenas como instrumento para

Hoje se verifica que, demaneira geral, a metodologiaempregada no ensino de física

dificulta a aprendizagem deconceitos e leis

5Física na Escola, v. 12, n. 1, 2011 Determinação da velocidade de uma fonte sonora

confecção de materiais textuais e apresen-tações, ou como simples forma de obten-ção de informações e comunicação a partirda internet. Neste enfoque, a aquisiçãoautomática de dados no laboratório defísica tem um papel importante para a al-fabetização científica, pois avança sobreo uso do grande potencial do computador,permitindo uma nova abordagem referen-te às práticas de laboratório.

O uso do computador como instru-mento para a aquisição automática de da-dos em física permite, segundo Haag [1]:enriquecer as experiências práticas e pro-mover novas abordagens e compreensões;permitir realizar experimentos que, ma-nualmente, são impossíveis; desenvolvernovas habilidades e competências a partirda redução do tempo na aquisição de da-dos; obter nos experimentos medidas maisprecisas.

O efeito Doppler-Fizeau

O efeito Doppler-Fizeau é denominadoassim em homenagem a Johann Chris-tian Andreas Doppler, que o descobriu em1842 e acabou descrevendo o fenômenoteoricamente, bem como ao francês Hip-polyte Fizeau, o qual descobriu o fenô-meno de forma independente em estudossobre ondas eletromagnéticas [4]. Esseefeito é uma característica observada emtodos os tipos de ondas quando estas sãoemitidas ou refletidas por um objeto queestá em movimento em relação ao obser-vador.

Aplicado às ondas sonoras, o efeitoDoppler-Fizeau explica o fato de ouvirmosum som de frequência diferente da fre-quência emitida por uma fonte quandoesta se encontra em movimento relativoao observador. Esse efeito é facilmenteconstatado quando um carro do corpo debombeiros com a sirene ligada se apro-xima ou se afasta de nós. Quando umafonte sonora encontra-se em movimentorelativo a um observador, o efeito Dop-pler-Fizeau pode acentuar-se, atenuar-se,ou até mesmo desaparecer. Isso dependerádos módulos, direções e sentidos das velo-cidades. Se fonte e observador se apro-ximam, o som percebido terá frequênciamaior que a natural, ao passo que quandoos dois se afastam, o som terá frequênciamenor que a natural.

Neste artigo apresentaremos umamaneira de calcular a velocidade de umveículo com o uso da aquisição auto-mática de dados, ancorado teoricamenteao efeito Doppler-Fizeau. Para podermoscalcular a velocidade de um veículo, pri-meiro vamos equacionar esse efeito.

Caso a fonte se aproxime do obser-vador, haverá um encurtamento aparente

do comprimento de onda λ1, portanto afrequência percebida pelo observador fapserá maior que a frequência real da fontef.

(1)

Caso a fonte se afaste do observador,haverá um alongamento aparente docomprimento de onda λ2, portanto a fre-quência percebida pelo observador faf serámenor que a frequência real da fonte f.

(2)

Assim, podemos igualar as expressões(1) e (2) afim de obter uma expressão quepermita calcular a velocidade da fonte

(3)

Metodologia

O experimento realizado para a coletados dados utilizados e analisados nesteartigo ocorreu na rodovia RS 344, km 70,no município de Santo Ângelo, RS. Na rea-lização de tal procedimento utilizou-se umcomputador portátil (notebook) colocadono acostamento da rodovia. Foram peças-

chave na realização do experimento doisautomóveis.

Cabe salientar que não há necessidadede se realizar o experimento em uma ro-dovia. O mesmo pode ser reproduzido emuma rua qualquer de sua cidade.

O processo foi realizado da seguintemaneira:

1°) A uma distância de aproximada-mente 1 km de onde estava colocado onotebook iniciou-se o movimento do veí-culo. Esse movimento foi acelerado atéatingir-se a velocidade de 100 km/h (velo-cidade indicada no velocímetro do veículo),velocidade mantida constante cerca de200 m antes e depois do local onde estavao observador.

2°) Com o uso do microfone internodo computador, capturou-se o som emi-tido pela buzina do veículo, a qual foi acio-nada no trecho percorrido com velocidadeconstante, durante sua aproximação eafastamento.

3°) Com o uso do aplicativo Specto-gram®, previamente instalado no compu-tador, obtiveram-se as frequências durantea aproximação e afastamento do veículo.

Dados coletados e discussão dosresultados

As Figs. 1 e 2 apresentam a tela doaplicativo Spectogram®, onde estão re-presentadas as frequências do som emitidopela buzina durante a aproximação eafastamento do veículo deslocando-secom velocidade constante de 100 km/h.

Ambas as figuras (Fig. 1 e Fig. 2)apresentam as frequências de aproxi-mação e afastamento, porém conformepode ser observado na Fig. 1, a frequênciade aproximação é de 2927 Hz (Frequency(Hz) 2927 ± 8,5). A Fig. 2 apresenta para

Figura 1 - Comportamento da frequência durante a aproximação do veículo comvelocidade de 100 km/h.

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a frequência de afastamento 2500 Hz (Fre-quency (Hz) 2500 ± 8,5). Essas leiturassão realizadas diretamente na tela do soft-ware, posicionando o ponteiro do mousesobre as linhas.

Analisando-se as leituras das fre-quências e considerando a velocidade dosom no ar constante e igual a 344 m/s,determinamos a velocidade da fonte(veículo) com base na Eq. (3) que foi dedu-zida anteriormente.

Frequência de aproximação:fap = 2.927 Hz,

Frequência de afastamento:fap = 2.500 Hz,

(4)

As Figs. 3 e 4 apresentam a tela doaplicativo Spectogram®, onde estão re-presentadas as frequências do som emitidopela buzina durante a aproximação eafastamento de outro veículo deslocando-se com velocidade constante de 40 km/h(segundo indicação do velocímetro).

Semelhante à situação anterior, o po-sicionamento do ponteiro do mouse sobreas linhas nos permite observar na Fig. 3uma frequência de aproximação de836 Hz (Frequency (Hz) 836 ± 9,0), e naFig. 4 uma frequência de afastamento de783 Hz (Frequency (Hz) 783 ± 8,5).

Analisando-se as leituras das fre-quências e considerando a velocidade dosom no ar constante de 344 m/s, podemosdeterminar a velocidade da fonte daseguinte maneira:

Frequência de aproximação:fap = 836 Hz,

Frequência de afastamento:

faf = 783 Hz,

(5)

Como podemos ver das Eqs. (4) e (5),através dessa atividade foi possível chegara um valor de velocidades bastante satisfa-tório em relação ao observado pelo moto-rista no velocímetro do veículo. Dessaforma essa atividade pode então ser con-siderada bastante eficaz dentro do contex-to ao qual está sendo proposta.

Contudo, na determinação da veloci-dade da fonte, dois fatores devem ser con-siderados. Primeiramente a velocidade dosveículos suposta constante foi tomada vi-sualmente pelo motorista através da

Figura 2 - Comportamento da frequência durante o afastamento do veículo comvelocidade de 100 km/h.

observação do velocímetro, sendo impli-cada, portanto, na imprecisão deste ins-trumento, além da dificuldade de manteruma velocidade constante em um veículo,embora o experimento tenha sido reali-zado em um trecho de rodovia em linhareta e sem grandes inclinações.

O segundo fator deve-se à tomada dasfrequências no aplicativo. Essa leitura foirealizada através do posicionamento doponteiro do mouse sobre as linhas, impli-cando aproximações devido à espessuradas linhas e um erro percentual definidoautomaticamente pelo programa.

Conclusão

De acordo com o efeito Doppler-Fi-zeau, um observador percebe a frequênciado som emitido por uma fonte que seaproxima, maior que sua frequência na-tural. Na situação de afastamento da fonteem relação ao observador, este verificauma frequência menor que a natural. Essamudança de frequência percebida peloobservador pode ser observada nas figurasque representam a tela do Spectrogram®.Inicialmente verifica-se uma frequênciaconstante durante a aproximação dafonte, que rapidamente sofre uma reduçãodurante a passagem pelo observador, vol-tando a manter uma frequência constan-te, porém menor que a de aproximação.

Cabe salientar que o tema do qual tra-ta o artigo é de difícil entendimento porparte dos alunos do Ensino Médio. Nessavisão, a atividade aqui proposta relacionaa teoria e prática através do uso da aqui-sição automática de dados, não esquecen-do que o professor deve ser o mediador detal processo. Nesse processo de mediaçãoé importante sabermos que o professor é

Figura 3 - Comportamento da frequência durante a aproximação do veículo comvelocidade de 40 km/h.

7Física na Escola, v. 12, n. 1, 2011 Determinação da velocidade de uma fonte sonora

Referências

[1] R. Haag, I.S. Araujo e E.A. Veit, A Físicana Escola 6(1), 89 (2005).

[2] M.A. Moreira, Teorias de Aprendizagem(EPU, São Paulo, 1999), 195 p.

[3] D. Sias e R. Teixeira, 2008 Caderno Bra-sileiro de Ensino de Física 23, 360(2006).

[4] P.M. Schuster, Revista Brasileira de En-sino de Física 29, 465 (2007).

[5] D.B. Sias, A Aquisição Automática deDados Proporcionando DiscussõesConceituais na Física Térmica do EnsinoMédio. Dissertação de Mestrado Pro-fissional em Ensino de Física, Institutode Física, Universidade Federal do RioGrande do Sul, 2006.

Saiba mais

Alberto Gaspar, Física – Ondas, Óptica e Ter-modinâmica 2 (Ática, São Paulo,2003).

Antônio Máximo e Beatriz Alvarenga, Cursode Física 2 (Scipione, São Paulo, 2007).

Luiz Felipe Fuke, Carlos Tadashi Shigekiyoe Kazuito Yamamoto, Os Alicerces daFísica (Saraiva, São Paulo, 1998).

P.G. Hewit, Física Conceitual (Ed Bookman,Porto Alegre, 2002), trad. Trieste FreireRicci e Maria Helena Gravina, 9ª ed.

R. Haag, L.M. Oliveira e E.A. VEIT, Coeficientede Restituição em Colisões, disponível emhttp://www.if.ufrgs.br/cref/ntef/,acesso em 21/7/2009.

Wilson Carron e Osvaldo Guimarães Car-ron, As Faces da Física (Moderna, SãoPaulo, 2006).

o detentor dos significados aceitos no con-texto da matéria de ensino e assim orien-tará as discussões com os alunos a fim depromover o desenvolvimento cognitivo.Tais considerações são feitas com base nateoria de Vygotsky, referencial adotadoneste artigo.

Resumindo, o experimento permiteque o aluno aproprie-se de um instrumen-to (o computador) no contexto da física.Além disso, este experimento apresentauma maneira simples de demonstrar oefeito Doppler-Fizeau, sendo facilmenterealizável na escola de nível médio. Oaplicativo permite ainda análise de qual-quer som gravado de uma fonte emaproximação ou afastamento em relaçãoao gravador, e consequente determinação

Figura 4 - Comportamento da frequência durante o afastamento do veículo comvelocidade de 40 km/h.

de sua velocidade. Consideramos, assim,ser possível obter valores com boa apro-ximação conforme apresentado nos resul-tados.

Para finalizar, é importante salientarque o professor deve ser além de um me-diador do processo de ensino-aprendi-zagem, um motivador na implementaçãodas novas tecnologias no ensino, sempreestando atento à metodologia utilizada.Para levar o estudante a um melhor en-tendimento de conceitos físicos, é impor-tante que o professor faça uso de novastecnologias, mas de nada adiantará esseuso caso ele mantenha em prática seusvelhos métodos de ensino. Com o uso daaquisição automática de dados, conformefoi feito nesse trabalho, é possível dar um

novo significado ao uso de atividadesexperimentais no laboratório didático defísica [5].

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O sino soando a intervalosregulares

Se o experimentador estiver perto dosino, ele ouvirá sua batida quase que ins-tantaneamente. À medida que se afasta,isso não mais ocorre: ele verá o sino baterantes de ouvir a batida. Porém, se andarmais um pouco, perceberá que a diferençade tempo diminuirá até que para umacerta distância o som e a imagem da batidavoltam a coincidir. Isso ocorre periodi-camente, à medida que o observador forse afastando.

Esta coincidência ocorrerá quando adistância do observador ao campanáriofor igual à distância percorrida pelo sinal

Soluções das Perguntas do Editor do v. 11, n. 2

durante o intervalo de duas batidas. Oobservador ouvirá o primeiro toque e verásimultaneamente a segunda batida. Sa-bendo que o tempo entre batidas do sinoé de 1 segundo, basta tomar a distânciaandada e dividir por 1 s. O resultado é avelocidade do som.

O astronauta fora da naveespacial

O astronauta deve atirar algo paralonge, na direção oposta ao foguete. Deacordo com a conservação de momentolinear, o astronauta adquirirá uma velo-cidade V = (m/M)v, onde m é a massa doobjeto, M a massa do astronauta e v a ve-

locidade do objeto arremessado. Este é oprincípio pelo qual objetos se movem noespaço.

Duas massas sobre uma régua

Faça com a régua uma balança, colo-cando seu meio exatemente equilibradoem um pivô. Ajuste os pesos, um paracada lado a partir do meio da régua, atéque os objetos se equilibrem. Digamos queo peso M se encontre a uma distância Lda régua. O peso padrão m se encontra auma distância l. Das condições deequilíbrio, MgL = mgl (g é a aceleração dagravidade). Isso nos dá, isolando M, ovalor que procuramos.

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