ambiente e desenvolvimento

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Ambiente e desenvolvimento

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ESTUDOS AVANADOS 14 (39), 2000 75Ambiente e desenvolvimentoESTUDOS AVANADOS 14 (39), 2000 77MA INDICAO que evidencia o progresso atingido por uma cidadeou regio a ausncia de lixo nas ruas, a existncia de esgotos, agua de boa qualidade e o ar puro. Estas so as caractersticas demuitas regies desde a poca do Imprio Romano e que caracterizam hojeas cidades dos pases industrializados.Por essa razo as preocupaes com a qualidade do ar e da gua, a des-tinao adequada do esgoto e do lixo, bem como a eliminao de resduostxicos, dominaram a agenda ambiental at recentemente.Mesmopasesemdesenvolvimento,ondeumesforoconsiderveltem sido feito neste sentido, a ao das agncias fiscalizadoras da qualidadeambiental como a Cetesb tem sido bastante eficaz.Todos esses problemas ambientais, contudo, so de carter local e asautoridades municipais e s vezes estaduais so responsveis pelas medi-das tomadas e arcam com seus custos de forma direta ou indireta. Se nohouver interesse e empenho dessas autoridades as aes no sero imple-mentadas. intil esperar-se que os habitantes dos pases ricos paguem pelalimpeza do ar de So Paulo ou das guas do rio Tiet, cuja poluio no osafeta. No mximo pode-se conseguir deles auxlios de carter filantrpico que so pequenos ou emprstimos do Banco Mundial que precisaroser pagos.Tal situao est mudando devido emergncia um tipo novo de pro-blema ambiental que a poluio global. Sucede que a emisso de gases,como dixido de carbono (que o resultado da combusto de carvo, pe-trleoegs),estaumentandoemudandoacomposiodaatmosfera.Esses gases, mesmo emitidos na China, circulam por toda atmosfera e, por-tanto, sua presena afeta no s os chineses mas tambm as populaes dospasesindustrializados.Oseuefeitoodeatuarcomoumcobertorqueimpede o calor de escapar da superfcie terrestre para o espao, fazendo asuatemperaturasubir.estefenmenofsicooassimchamadoefeitoestufa que explica por que o interior de um automvel fica to quentenum dia ensolarado, mesmo no inverno (figura seguinte).Mudanas climticase desenvolvimentoJOS GOLDEMBERGU78ESTUDOS AVANADOS 14 (39), 2000O efeito estufaESTUDOS AVANADOS 14 (39), 2000 79O que ocorre o seguinte: a atmosfera transparente luz solar e,assim, a radiao que vem do Sol (e torna nosso planeta habitvel) atinge osolo sem problemas, onde absorvida e reemetida sob a forma de calor.Sucede que a atmosfera um isolante trmico e no deixa este calor escapar.Aatmosferaumisolantetrmicopelapresenadeumapequenaporcentagem de dixido de carbono nela existente (cerca de 370 partes pormilho de volume). Sucede que essa porcentagem est aumentando porqueumdosprincipaisefeitosdaaohumananomeioambientequeimarcombustveisfsseiselanardixidodecarbononaatmosfera.Desdeoincio da Revoluo Industrial, cerca de 200 anos atrs, a quantidade destegs na atmosfera j aumentou 30%, acreditando-se que ir dobrar nos pr-ximos 50 anos. Com isso, prev-se que a temperatura da Terra dever au-mentar um ou dois graus centgrados, o que dever bastar para causar gran-des alteraes no clima terrestre.As atividades industriais do Brasil contribuem pouco para as emissesmundiais de carbono, mas a extenso do desmatamento na Amaznia cer-ca de15.000 km2 por ano coloca o pas entre os dez maiores emissoresmundiais deste gs. por essa razo que em 1992, no Rio de Janeiro, foi adotada umaConveno sobre o Clima. De acordo com ela, os pases industrializadosdevero reduzir suas emisses de gases que provocam o efeito estufa, mas ospases em desenvolvimento no esto sujeitos a tais limitaes porque seucrescimento econmico exige maior consumo de combustveis fsseis.Os grandes emissores so os pases industrializados, mas no vai serfcilaessespasesreduzirsuasemisses.Poressarazo,oProtocolodeKyoto, adotado em 1997 (mas ainda no ratificado), criou vrios mecanis-moschamadosdemecanismodeflexilibizaoparaconseguirreduzirasemisses do conjunto dos pases industrializados em cerca de 5% abaixo doseu nvel de emisso em 1990.Estes mecanismos de flexibilizao so os seguintes:troca de emissesimplementao conjuntadesenvolvimento limpo (CDM)A troca de emisses um mecanismo baseado no mercado. Ele permiteque redues sejam obtidas pela utilizao de diferenas no custo da dimi-nuio de emisses em diferentes pases, uma vez que gases responsveispelo efeito estufa se espalham uniformemente na atmosfera. Os prejuzos80 ESTUDOS AVANADOS 14 (39), 2000resultantes das emisses e os benefcios por suas redues so independen-tes da sua origem. Redues de emisses obtidas na Espanha, por exemplo,podem ser creditadas Alemanha, onde elas teriam maiores custos ao seremrealizadas. Essas trocas so autorizadas apenas entre pases industrializados.A implementao conjunta outro mecanismo por meio do qual umpaspodeimplementarumprojetoqueleveareduesdeemissesemoutro pas, contabilizando-as em sua quota, desde que arque com os custosdoprojeto.Umexemplodeimplementaoconjuntafoioqueocorreuentre o Mxico e a Noruega, que pagou pela troca de lmpadas incandes-centesporoutrasmaiseficientesnoMxico,oquelevouareduesdeemisses contabilizadas na quota da Noruega. O Protocolo de Kyoto res-tringiu esse mecanismo aos pases industrializados e troca realizada entregovernos.O desenvolvimento limpo o terceiro mecanismo criado pelo Protocolode Kyoto. De acordo com ele, os pases industrializados tero de reduzirsuasemissesemcercadeumbilhodetoneladasdecarbonoporano,dentro de 10 anos. Tal procedimento ser muito difcil de ser implementadopor meio de medidas adotadas internamente, principalmente nos EstadosUnidos. Projetos implementados em pases em desenvolvimento, como oBrasil, podero ser aceitos como uma das formas de cumprir o Protocolo,desde que redundem na reduo das emisses de carbono. A novidade comrelao ao mecanismo da implantao conjunta que, alm de entidadespblicas, empresas podero fazer as trocas diretamente entre si.No existe um exemplo melhor de projeto do tipo contemplado pelomecanismodedesenvolvimentolimpodoqueasubstituiodegasolinapor lcool, produzido a partir da cana de acar, como feito no Brasil.lcool um combustvel renovvel porque, ao ser queimado nos veculosque o usam, emite CO2 que recapturado pela cana de acar ao crescer nasafra seguinte.Atualmente o Brasil estaria consumindo o dobro da gasolina que con-some se o Programa do lcool no existisse. Com a atual produo de cercade12bilhesdelitrosdelcoolporano,oBrasilemite10milhesdetoneladas de carbono a menos do que poderia estar emitindo; tal reduocorresponde a 15% de todas as emisses de carbono do pas.Acredita-se que essas redues de emisses tero um valor monetrio depelo menos US$ 20 por tonelada de carbono, cuja emisso for evitada. Dessaforma, o Programa do lcool deveria gerar US$ 200 milhes por ano, semqualquer outro esforo adicional, alm de uma boa negociao diplomtica.ESTUDOS AVANADOS 14 (39), 2000 81O exemplo citado do Programa do lcool representa apenas uma daspossibilidadesparareduziraemissodecarbono.Outrasjforamiden-tificadas,comooreflorestamentodereascomflorestasdegradadasquecompensariam inclusive o desmatamento da Amaznia, que o governo notem tido condies de controlar.Poder-se-ia argumentar que h outros problemas ambientais mais ur-gentes para serem resolvidos, como a qualidade do ar das grandes cidadescomo So Paulo, a poluio da baa de Guanabara, entre tantos, mas elestero de ser enfrentados pelas autoridades locais sem grande auxilio do exte-rior, a no ser emprstimos de bancos internacionais para os quais existemmuitas demandas.A participao no mecanismo de desenvolvimento limpo poder serfeita por entidades pblicas ou privadas, isto , tambm por empresas, comoj mencionado.Nem todos os projetos que impliquem reduo das emisses de gasesque provocam o efeito estufa sero elegveis como objeto de transao me-dianteomecanismodedesenvolvimentolimpo,porqueoProtocolodeKyoto estabelece certos critrios gerais a serem cumpridos, especificamente: que redundem em redues certificveis e mensurveis de gases queprovocam o efeito estufae que contribuam para o desenvolvimento sustentvel.Alm disso, alguns projetos tero mais potencial de levar a reduesde emisses do que outros.Uma interessante anlise foi feita sobre o potencial que uma varieda-de de projetos teria para se qualificar e ser aceita pelo mecanismo de desen-volvimento limpo, conforme dados do quadro apresentado a seguir.Um primeiro esforo para identificar, no Brasil, projetos que se quali-ficariam para o mecanismo de desenvolvimento limpo foi feito por um gru-po da Universidade de So Paulo, em colaborao com a Universidade daCalifrnia (Berkeley).Neste esforo, duas categorias de projetos foram identificados: energia (11); sequestro de carbono (4).Na categoria de energia, os projetos distriburam-se da seguinte for-ma:82 ESTUDOS AVANADOS 14 (39), 2000 eficincia energtica (2); energia renovvel (8); cogerao (1).Na categoria de seqestro de carbono, os projetos eram: reflorestamento permanente (1); plantao de biomassa para outros usos (3).Para acelerar todo o processo o BNDES poderia inicialmente compraros certificados de redues de emisses, o que faria com que certas empre-sas nacionais realizassem projetos sem esperar por aprovao internacional.Esses certificados poderiam ser vendidos mais tarde, no exterior, provavel-mente com gio elevado.Quando o Protocolo de Kyoto for ratificado, o Brasil ser um fortecandidato a captar parte aprecivel dos recursos a serem disponibilizadospara cumprir as metas de reduo dos pases industrializados. Estima-se quea captao anual poder ser de US$ 3 bilhes. Tais recursos estaro associa-dos a investimentos em tecnologias limpas e sero naturalmente um instru-mento de modernizao da economia brasileira.Jos Goldemberg, fsico, professor honorrio do Instituto de Estudos Avanadosda Universidade de So Paulo.ESTUDOS AVANADOS 14 (39), 2000 83Comparao quanto ao pontecial de reduo de gases que produzem efeito estufacom a utilizao do mecanismo de desenvolvimento limpo entre diversos projetosH = Alta probabilidade de satisfazer os critrios do Mecanismo de Desenvolvimento LimpoM = Mdia probabilidade de satisfazer os critrios do Mecanismo de Desenvolvimento LimpoL = Baixa probabilidade de satisfazer os critrios do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo