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    Direito Internacional Público e Privado

    Renata Campettí Amaral

     Editora

    Verbo Jurídico

    Porto Alegre

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    Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

    A485d Amaral, Renata Campetti,O direito internacional: público e privado / Renata

    Campetti Amaral. 6a edição — Porto Alegre : VerboJurídico, 2010. 248 p.

    ISBN: 978-85-7699-244-8

    1. Direito Internacional Público. 2. DireitoInternacional Privado. 3. Tratados Internacionais. 4.Conflitos Internacionais I Titulo.

    CDU: 341.124

    Bibliotecária ResponsávelGinamara Lima Jacques Pinto 

    CRB 10/1204

    Editora Verbo Jurídico Ltda> Matriz: Rua Prof, Cristiano Fischer, 2012

    Porto Alegre, RS

    CEP 91410-000Fone: (51)3076-8686

    Filial: Rua Benjamin Constant, 77/107São Paulo, SP

    Fone: (11)3106-5287verbojuridico@verbojurtdico. com.br 

    www.verbojuridico.com.br

    http://www.verbojuridico.com.br/http://www.verbojuridico.com.br/

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    Direito Internacional

    Colaboração deRodrigo TeUectaea Silva

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    Direito Internacional

    ÍNDICE

    CAPÍTULO I - DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO1 .Introdução à Disciplina................................................................................... 11

    1.1.Origens e Evolução Histór ica.... ...............................................................11

    1.2. Conceito........................................................... .........................................14

    2. Objeto..............................................................................................................15

    3.Fonte s ..........................................................................................................16

    3.1.Tratado s....................................................................................................18

    3.2. Costume............. .........................................................................203.3.Princfpios Gerais do Direito...................................................................... 22

    3.4.Jurisprudência e Doutrina..........................................................................22

    CAPÍTULO II - PERSONALIDADE INTERNACIONAL

    1 .Conceito..........................................................................................................25

    2.Capacidade de Ação..................................................................................... 25

    3.Pessoas Internacionais............................................................................ 27

    3.1.Estados ..........................................................................................................,........  ..............

    3.2.0rganismos Internacionais....................................................................... 35

    3.2.1. Organização das Nações Unidas - ONU...................................37

    3.2.2. Organização dos Estados Americanos - OEA ............. ......................42

    3.3.Indivíduos e Empresas ............................................ ................................44

    4. Santa-Sé.......................................................................................... 45

    5.Organizações Não-Governamentais - ONGs............................................45

    CAPÍTULO III - TRATADOS INTERNACIONAIS

    1 .Teoria Geral dos Tratados ........................................................................... 47

    1.1. Princípios e Classificação dos Tratados ................................................49

    1.2. Interpretação........................................................ ....................................51

    1.3. Validade, Vigência, Execução e Aplicação............................................51

    1.4. Relações e Confli tos com o Direito interno ..........................................54

    1.5. O Sistema Brasileiro de Incorporação de Tratados ..............................55

    2. Tratados em Espécie...................................................................................58

    2.1. Sistema Internacional de Proteção dos Direitos Humanos..................58

    2.2. Estatuto de Roma e Tribunal Penal internacional................................62

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    2.3. Proteção Internacional do Meio Ambiente.......................................;... 65

    2.4. Outras Convenções Internacionais.......................................................70

    2.4.1. Convenção para repressão ao Genocídio ........................................70

    2.4.2. Convenção contra o crime organizado transnacionai ..................... 71

    2.4.3. Convenção contra o tráfico ilícito de entorpecentes....................... 75

    2.4.4 Convenção contra o tráfico de armas ................................................ 77

    2.4.5. Convenção sobre o combate à corrupção de funcionários públicos estrangeiros em transações comerciais internacionais..............78

    CAPÍTULO IV - REPRESENTAÇÃO DIPLOMÁTICA

    1. Missões Diplomáticas ................................................................................81

    1.1 Convenções de Viena de 1961 ............................................................. 82

    1.2. Privilégios e Imunidades........................................................................83

    2. Convenção sobre Relações Consulares de 1963 ..................................86

    CAPÍTULO V - RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DOS ESTADOS

    1. Direitos Fundamentais dos Estados........................................................89

    2. Deveres dos Estados............................ ................................................... .91

    2.1. Dever de Não-ln tervenção.....................................................................91

    2.2. Responsabilidade por Danos Internacionais....................................  92

    2.2.1. Proteção Diplomática...................................... ....................................95

    CAPÍTULO VI - MEIOS DE COMPOSIÇÃO DE CONFLITOS INTERNACIONAIS

    1. Solução Pacífica de Confli tos .................................................................. 99

    1.1. Arbitragem Internacional..................................................................... 100

    1.2. Corte Internacional de Justiça .............................................................. 101

    2. Sanções e Soluções Coercit ivas de Controvérs ias...............................102

    2.1. Rompimento de Relações Diplomáticas..............................................103

    2.2. Retorsão..................................................................................................104

    2.3. Represálias.............................................................................................104

    2.3.1. Embargo..............................................................................................104

    2.3.2. Bloqueio Pacífico ................................................................................ 1052.3.3. Boicotagem..... .................................................................................... 105

    CAPÍTULO VII - DIREITO INTERNACIONAL ECONÔMICO

    1. Princípios do Comércio Internacional - GATT e O MC ..........................107

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    Direito Internacional

    2. Processo de Integração Econômica Internacional ................. .............. 112

    3. Blocos Regionais .......................................................................................113

    3.1. MERCOSUL..................................................................... .........................113

    3.2. União Européia................... .......................................................................121

    3.3. NAFTA eA L CA .......................................................................................... 126

    4. Nomenc latura Util izada no Comércio Internacional .............................128

    CAPÍTULO VIÜ - DOMÍNIO PÚBLICO INTERNACIONAL  

    MARÍTIMO - Conceitos Fundamentais

    1. Mar, Águas Interiores, Mar Territoriai, Zona Contígua e Zona

    Econômica...............................................   ....................   ..............................131

    2. Plataforma Continental............... ..............................................................1363. Alto-Mar,..... .............................  .................................................................137

    4. Rios Internacionais..... ..............................................................................137

    CAPÍTULO IX - DOMÍNIO PÚBLICO INTERNACIONAL AÉREO

    1. Espaço Aéreo............................................................................................ 139

    2. Princípios Elementares..... ....................................................................... 139

    3. Normas Convencionais................................................................................ 140

    4. Nacionalidade das Aeronaves.................................................................... 143

    5. Espaço extra-atmosférico......................................................... ..................143

    6. Código Brasileiro de Aeronáutica - Lei n° 7.565/8 6 .............. .................. 143

    CAPÍTULO X - DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

    1. Conceito e Objeto.................... ..................... ..............................................145

    2. Relação Típica e Relação Atípica...............................................................146

    3. Fontes............................................................................................................146

    4. Origens e Evolução Histórica......................................................................146

    5. Conflitos de Leis no Espaço e Reenvio...................... ...............................149

    6. Elemento de Estraneidade e Fato Jusprivatista Internacional ............... 150

    7. Elementos de Conexão do Direito Brasileiro ........................... ................. 151

    7.1. Família e Direitos Pessoais .............................. ................... ...................153

    7.2. Adoção Internacional...................................................................... .......154

    7.3. Bens...........................................................................................................155

    7.4. Obrigações e Contratos Internacionais.................................................. 156

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    7.5. Pessoa Jurídica............... ......................................................................... 157

    7.6, Sucessão................................................. ........................ ........................ 158

    8. Teoria das Qual if icações .........................................................................159

    CAPÍTULO XI - NACIONAL IDADE

    1. População e Comunidade Nacional.................. .........................................161

    2. Aquisição, Mudança e Perda da Nacionalidade - Opção e Prazos............. 162

    3. Natu ral ização................................................................................................ 167

    4. Posição da Justiça Federai - Jurisprudência............................................169

    CAPÍTULO XII - REGIME JURÍDICO DO ESTRANGEIRO

    1. Estatuto dos Estrangeiros e Vistos ............................................................ 175

    2. Extradição, Expulsão e Deportação................... ....................................... 1783. Asilo Político.......................... .......................................................................183

    4. Refugio..................................... .................................................................. .184

    5. Pessoas Jurídicas Estrangeiras................. ................................................185

    CAPÍTULO XIII - PROCESSO CIVIL INTERNACIONAL

    1. Apl icação da Lei Estrangeira .....................................................................187

    2. Competência Internacional no Brasil.............................................. .......  188

    2.1. Competência Concorrente......................................................... ........... 188

    2.2. Competência Absolu ta.......................................................................... . 189

    3. Sentença Estrangeira e Cooperação Internacional..................................191

    3.1. Cartas Rogatórias.............................................. .......................... .........191

    3.2. Homologação de Sentenças Estrangeiras e Exequatur ...................... 193

    3.3. Precedentes Jurisprudenciais envolvendo Homologação de

    Sentenças Estrangeiras pelo STJ ..................................................................195

    CAPÍTULO XIV - PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS E 

    CONVENÇÃO DE NOVA IORQUE1. Noções Gerais segundo o Decreto Legislativo n 10/58 e oDecreto n 56.826/65. Hipóteses de Procedimento.......................................201

    2. Competência da Justiça Federal .............. ........................ ........................203

    Resolução STJ n. 9/2005 ............................. ............................................... 205

    Ques tões ......................................................................................................... 209

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    Direito Internacional

    Capítulo I

    DIREITO INTERNACIONAL PUBLICO

    1 introdução à disciplina

    1.1 Origens e evolução histórica

    A origem do Direito Internacional Público (DIP) é contem porânea ao nascimento do próprio Estado. O Direito das Gentes, como erachamado o DIP, nasceu no século XV com a formação dos Estados

     Nacionais, de cunho absolutista. Todavia, foi a partir do século XVI, como lançamento dos ensaios do holandês Hugo Grotius (De Jure Belli ac Pacis

     e De Jure Praedae

    ) que a disciplina conquistou espaço no universo jurídico5.

    A doutrina especializada distingue 2 (dois) diferentes períodos na evolução do Direito Internacional Público: o sistema clássico (1648-1918) e o moderno (após o término da Primeira Guerra Mundial)2.

    “O sistema clássico  foi baseado no reconhecimento doEstado soberano como o único sujeito do DIP”3 e distingue-se pelosseguintes aspectos:

    1 SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de Direito Internacional Público. São Paulo, Editora  Atlas, 2002, pg 28.2 JO, Hee Moon. introdução ao Direito Internacional. São Paulo: LTr, 2000, pp. 52 e 65.3 JO, op. cit., p. 52.

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    (I) característica européia, em face do período de colonização;

    (II) aplicação dos princípios da  pacta sant servada  nasobrigações internacionais, da soberania territorial, daimunidade estatal e das regras de proteção diplomática;

    (III) aceitação do uso ilimitado de força e de guerra comodireito inerente ao Estado, facilitando a aceitação da idéia deanexação de território estrangeiro conquistado e dacolonização dos novos continentes4.

    Já o sistema moderno  é marcado pelas seguintes características:

    (I) desvinculação das características européias, ou seja, universalização do DIP, apesar de muitas normas do DIPclássico terem sido mantidas;

    (II) manutenção da paz e segurança internacionais por meioda organização sistemática da sociedade internacional;

    (III) surgimento de novas áreas do DIP, como direito internacional econômico, direitos humanos, direito internacionalambiental, etc.

    Em verdade, foi com o final da Primeira Guerra Mundial(1918), a partir da instituição da Liga das Nações e da criação da Organização Internacional do Trabalho, que o Direito Internacional Públicoganhou notoriedade no contexto internacional. É a partir desse momento

    histórico que o DIP começa a ser visto como um sistema normativo como objetivo de instituir o dever jurídico de cooperação entre entidadesautônomas (Estados).

    Houve uma transformação fundamental no sistema legalvigente àquela época, objetivando reorganizar a comunidade internacional de modo a impedir o uso de força como meio de coação e criaçãode direitos. Sob o ponto de vista histórico-político, esses períodos podem

    ser divididos da seguinte forma: (I) da Revolução Russa até a criação daONU; (II) do estabelecimento da ONU até o período de descolonização

    4 É importante lembrar que, atualmente, essa regra foi proibida pela Carta da ONU, que não permite o uso da força para intervenção em assuntos internos dos Estados.

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    Direito Internacional

    da Ásia e da África (1945-1960); (III) da expansão da comunidadeinternacional até o fim da Guerra Fria, marcada pela dissolução da UniãoSoviética (1960-89); e (IV) da dissolução até hoje.

    Um dos principais efeitos práticos da nova concepção deDireito Internacional Público, inclinado para a regulamentação da paz efundamentado no princípio da não-intervenção e na democratização dedireitos, foi a criação de uma diplomacia multilateral institucionalizada,com atuação marcante em diversos fóruns de debate, dentre os quais sedestacam: a ONU (Organização das Nações Unidas), a OMC(Organização Mundial do Comércio) e a OMS (Organização das Mundialda Saúde). Além disso, é importante sublinhar a sua influência na

    extemalização de disciplinas jurídicas antes restritas ao direito interno decada país, como por exemplo, o Direito Penal Internacional e o DireitoProcessual Internacional,5

     Na atualidade, a grande característica do Direito Internacional Público é a sua enorme expansão, tanto relativamente à extensãode assuntos sob sua égide, quanto ao vigor em direção à maior eficácia desuas normas.

    Ainda nesse particular, é interessante destacar que a sociedade internacional, ao contrário das comunidades internas de cada nação,é organizada de forma descentralizada. Disso resulta que, teoricamente,no plano internacional, não há autoridade superior, nem sujeitosdominantes.

    Os Estados soberanos organizam-se num plano horizontalde autonomia, prontifícando-se a proceder de acordo com determinadasnormas jurídicas, na medida de seu consentimento. A criação das normas

    de Direito Internacional Público é, assim, obra direta de seus destinatários. Dessa forma, entende-se que as normas vigentes entre osEstados pressupõem a existência de uma ordem de coordenação, e não desubordinação, como ocorre no direito interno6.

    Essa análise, no entanto, não está isenta de críticas, tendoem vista que a teorização da igualdade soberana entre todos os Estados éum postulado jurídico que enfrenta notória dificuldade em sua aplicação prática. Note-se, por exemplo, a árdua tarefa na aplicação de sanções a

    5 SOARES, op. clt., pp. 32 e 33.6 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. 10a ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 01.

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    qualquer dos cinco Estados que detêm o poder de veto no Conselho deSegurança da ONU (China, França, Rússia, Grã-Bretanha e EstadosUnidos).

    1.2 Conceito

    O conceito e o conteúdo abrangido pelo Direito Internacional Público podem variar conforme o critério adotado pelodoutrinador estudado. Para oferecer uma visão sistemática do assunto,adotaremos definições comuns à grande maioria da doutrinaespecializada.

    Até fins do século XIX, a doutrina somente atribuía acondição de sujeito do DIP aos Estados. Nesse sentido, Pimenta Bueno(1863) afirmou “o direito internacional público ou das gentes,  jus gentium publicum  ou  jus publicum intergentes ̂ é o complexo dos princípios, normas, máximas, atos ou usos reconhecidos comoreguladores das relações de nação a nação, ou de Estado a Estado, comotais, reguladores que devem ser atendidos tanto por justiça como parasegurança e bem-ser comum dos povos ”

     Na acepção clássica de Direito Internacional Público, oEstado era visto como um ente soberano, soberbo, o único sujeito capazde criar direitos e gerar obrigações no âmbito internacional, motivo peloqual o Estado está sempre presente nas conceituaçoes iniciais dadisciplina. A explicação histórica para essa visão centralizadora encontra-se na idéia de que, por muito tempo, o Estado foi visto como detentor deum poder supremo, ilimitado.

    Todavia, essa noção de soberania incondicionada não é maisabsoluta, eis que, atualmente, o exercício do poder do Estado se encontralimitado por fatores e normas externas a sua própria vontade, como porexemplo, pelos compromissos assumidos na esfera internacional e pelasnormas de DIP7. Nesse contexto e com a evolução da disciplina, passou-se a incorporar ao lado do Estado, as organizações internacionaisenquanto sujeitos do DIP.

    7 SEITENFUS, José Ricardo e VENTURA, Deisy. introdução ao Direito internacional Público. 1a ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 1999, p 27.

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    satisfatoriamente, passando também a regular direitos relativos ao meioambiente, ao comércio internacional, aos direitos humanos, ao direito doconsumidor, entre muitos outros.

    3 Fontes

    A doutrina divide a origem das fontes do DIP em duasconcepções: a positivista  e a objetivista.  A primeira, também chamadavoluntarista, é  defendida pelos italianos, os quais entendem que a única

    fonte do DIP é a “vontade comum dos Estados”, sendo que tal vontade seencontra expressamente manifestada nos tratados e, de modo tácito, nocostume.

    Essa concepção (positivista ou voluntarista), todavia, éinsuficiente para explicar a obrigatoriedade da norma costumeira, a qualse toma cogente para os Estados-membros da sociedade internacional,independentemente da manifestação de vontade destes9.

    Em contraposição, a escola objetivista baseia-se na distinçãoentre  fontes formais  e materiais.  As fontes materiais seriam as“verdadeiras fontes do Direito”, enquanto que as formais seriam apenas“meios de comprovação”. Sendo assim, as fontes materiais seriam, porexemplo, a tradição, a cultura, a história. Já as fontes formais do DIP, ouseja, aquelas por meio das quais se expressa e comprova o direito, seriamos tratados, os princípios gerais do direito e, secundariamente, a

     jurisprudência e a doutrina.

    Tradicionalmente, tem-se considerado como rol das fontesformais do Direito Internacional Público a enumeração prevista no artigo38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça:

     A Corte, cuja função é decidir de acordo com o Direito Internacional as controvérsias que lhe foram submetidas, aplicará:

    a) as convenções internacionais, quer gerais, quer especiais, que estabeleçam regras expressamente reconhecidas pelos 

    Estados l itigantes.

    9 MELLO, Celso D. Albuquerque de. Curso de Direito internacional Público. Vol. 1,12a ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 192.

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    Direito Internacional

    b) o costume internacional, como prova da prática geral aceita como sendo o direito;

    c) os princípios gerais do direito reconhecidos pelas nações  civilizadas;

    d) sob ressalva da disposição do art. 59, as decisões judiciárias e a doutrina dos publicistas mais qualificados das diferentes nações, como meio auxiliar para a determinação das regras de direito.

    Ressalte-se, ainda, que doutrinadores modernos vêmincluindo os atos unilaterais  e as decisões  tomadas por Organizações

    Internacionais Intergovemamentais como fontes do DIP, apesar de taisatos não se encontrarem listados no artigo 38 do Estatuto da Cortê. Sãoexemplos práticos de atos unilaterais a notificação, a renúncia  e oreconhecimento.

    Saliente-se, no entanto, que tais atos não apresentam caráternormativo, marcado pela abstração e generalidade. Ao mesmo tempo,

     porém, é inegável que eles produzem conseqüências jurídicas, criando,eventualmente, obrigações aos Estados.

     Nesse sentido, é preciso analisar de forma crítica o rol defontes previsto no artigo 38 do Estatuto da Corte, lavrado em 1920,quando apenas começava a se desenvolver o Direito InternacionalPúblico, não podendo ser estudado como um rol exaustivo.

    Importante destacar que, a partir dos anos 60, a doutrinaintemacionalista tem se debruçado sobre o fenômeno da existência denormas jurídicas com graus de normatividade menores que as

    tradicionais, mas nem por isso menos significativas. A tais normasdenominou-se soft law, por oposição às tradicionais, que então passarama ser tratadas de hard law.10

    O conceito de soft law emergiu a partir da relevância e daatuação crescente da diplomacia multilateral, seja nos foros diplomáticosde negociação, seja a partir de interpretações dadas aos tratadosmultilaterais elaborados sob a égide das organizações intergover-namentais.11

    10 SOARES, op. clt., p. 136.11SOARES, op, cft., p. 137.

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     No sistema da soft law, o cumprimento das normas jurídicasé meramente recomendado aos Estados, que podem, inclusive, não as

    cumprir, sem que haja sanções aplicáveis aos inadimplentes. Asdenominações dessas regras têm variado bastante, como por exemplo,non binding agreements, gentlemen's agreements, códigos de conduta,memorandos, declaração conjunta, declaração de princípios, ata final,etc.12

    3.1 Tratados

    Entende-se por tratado  o ato jurídico por meio do qual se

    manifesta o acordo de vontades entre duas ou mais pessoas internacionais13.

    As Convenções de Viena de 1969 e 1986 estabeleceram asnormas pelas quais é regido o tratado no Direito Internacional Publico,conceituando-o como “um acordo internacional celebrado por escritoentre Estados regidos pelo Direito Internacional, quer inserido num únicoinstrumento, quer em dois ou mais instrumentos conexos, qualquer queseja a sua designação específica” (art. 2, item 1, da Convenção de 1969).

    Essa Convenção foi assinada pelo Brasil em 1980, e ratificada em 25 desetembro de 2009 (Decreto 7.030, de 14 de dezembro de 2009).

    De acordo com o texto da Convenção de Viena, com preende-se que a palavra tratado designa um acordo regido pelo direitointernacional, qualquer que seja a sua denominação. Nesse sentido,tratado seria a designação genérica, onde estão abrangidas as expressões:convenção, convênio, protocolo, compromisso, etc.

    Apesar disso, algumas diferenciações têm sido utilizadas

     para a designação dos diferentes tratados, de acordo com sua hierarquia efinalidade, tais como:

    12 SOARES, op. cit, p. 138,13 SILVA & ACCIOLY, op. cit., p. 23.

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    Direito Internacional

    Expressão 1 Designação

    Carta Designa tratados hierarquicamente superiores, os quais dispõem sobre a criaçãode entidades internacionais, como porexemplo a Carta da ONU.

    Convenção  | Vem sendo utilizada nos principaistratados multilaterais de característicanormativa, como a Convenção de Vienasobre Direito dos Tratados (1969).

     Acordo Utilizado quando o número de partes é baixo e sua forma é simples. Possuicaracterística administrativa e técnica.

     Ajuste ou Acordo Complementar    j

    I j

    Ato que possibilita a execução de outroanterior, devidamente concluído. Emgeral, são colocados ao abrigo de umacordo-quadro ou acordo-básico.

     Acordo por Troca de Notas   j

    1

    Empregado para assuntos de naturezaadministrativa, bem como para alterar ouinterpretar cláusulas de atos jáconcluídos.

     Memorando de Entendimento Utilizado para registrar princípios geraisque orientarão as relações entre asPartes, seja nos planos político,econômico, cultural ou em outros.

    Protocolo  |

    ;

    Usualmente, designa o documento quevisa a dirimir questões adicionais,

    complementares e interpretativas detratados ou convenções anteriores. Éutilizado ainda para designar a ata finalde uma conferência internacional.

    Protocolo de Entendimento Ato de menor hierarquia que não encerraum acordo de vontades, mas apenas uminício de compromisso.

    Concordata Teimo reservado ao tratado bilateral em

    que uma das partes é a Santa Sé.

    19

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    Essas denominações, contudo, não têm influência sobre oconteúdo do tratado, podendo variar de acordo com a escolha dosEstados-membros. Portanto, a utilização das expressões é, de certa forma,

    livre.O capítulo III tratará mais detalhadamente acerca dos

    tratados internacionais.

    3.2 Costume

    O costume adquire papel fundamental enquanto fonte do

    DIP, uma vez que muitas das relações de direito internacional não seencontram normatizadas. E, por excelência, a fonte formadora das normasde DIP.

    Segundo a doutrina, para a formação do costume internacional é indispensável a existência de 2 (dois) elementos: um de ordemmaterial e outro de caráter subjetivo.

    O elemento material do costume está consubstanciado na

     prática, na repetição ao longo do tempo de um certo modo de procederante a determinado quadro fático. Essa prática reiterada pode ser omissivaou comissiva e aplica-se a quaisquer sujeitos na esfera do DireitoInternacional Público. Não há transcurso de tempo pré-determinado paraa sua formação, devendo ser analisado caso a caso. Nesse sentido, já semanifestou a Corte Internacional de Justiça no julgamento do Caso daPlataforma Continental do Mar do Norte: “o transcurso de um período detempo reduzido não é necessariamente, ou não constitui em si mesmo, umimpedimento à formação de uma nova norma de direito consue-tudinário”14.

    O elemento subjetivo do costume internacional (Opinio  Juris) é o entendimento, a convicção, a crença de que a atitude prática seestima obrigatória por ser necessária, correta, justa, e por assim dizer,digna do bom direito. Do contrário, qualquer conduta internacionalreiterada por qualquer Estado durante um certo lapso temporal, porcomodismo, hábito ou praxe, se enquadraria nessa definição, formando

    assim uma nova norma costumeira.

    14 REZEK, op. cit.,p. 119.

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    Direito Internacional

    A formação de um costume internacional não necessita deque determinada conduta seja praticada reiteradamente por todos osmembros da comunidade internacional, assim como não precisa que todos

    a considerem como justa e correta. Impõe-se, todavia, por uma questão de bom senso, a existência de uma pluralidade de Estados que adotem a prática.15

    Inúmeras situações encontram-se satisfatoriamente reguladas pelo direito costumeiro, de modo que não se vislumbra anecessidade de sua codificação. Tanto é assim que é de praxe a adoção

     pelas Convenções do seguinte preâmbulo: “afirmando que as regras dedireito internacional consuetudinário continuarão a reger as questões que

    não forem reguladas nas disposições da presente Convenção”. 6 Não há desnível hierárquico entre normais costumeiras e

    convencionais. Logo, um tratado é idôneo para derrogar, entre as partescelebrantes, certo norma costumeira. De igual modo, pode um costumederrogar a norma expressa de um tratado.17

     No entanto, é preciso esclarecer que, em termos deoperacionalidade e segurança, os tratados primam sobre os costumes, umavez que, muitas vezes, é árdua e nebulosa a tarefa de verificar a data de

    surgimento do costume, as partes obrigadas, a profundidade dasobrigações, etc. Busca-se, materialmente, a prova do costume em atosestatais, via de regra, aqueles que compõem a prática diplomática, e aindanos textos legais e nas decisões judiciárias que disponham sobre temas deinteresse do direito das gentes18.

    Geralmente é com base em normas costumeiras que seestabelecem as bases estruturais de um tratado ou convençãointernacional. Da mesma forma, algumas convenções internacionais de

    grande relevância não ratificadas pelas partes são consideradas peladoutrina como direito consuetudinário. Um exemplo interessante dessahipótese é o Caso da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados,datada de 1969, que é obrigatória por força contratual àqueles Estadosque a ratificaram e costumeira para aqueles que não o fizeram.

    15 REZEK, op. cit., p, 120.18 SOARES, op. cit., p. 85.,7 REZEK, op. cit., p. 124.18 REZEK, op. Cit., p. 125.

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    3.3 Princípios gerais do direito

    A doutrina destaca que, dentre as fontes de DIP citadas peloartigo 38 do Estatuto da CIJ {vide  item 3 do presente capítulo), os

     princípios gerais do direito são os mais vagos, os de mais difícilcaracterização19. Tais princípios seriam aqueles aceitos por todas asnações in foro doméstico, dentre os quais poderíamos destacar o princípioda boa fé, da não-agressão, da solução pacífica dos litígios, dacontinuidade do Estado, da autodeterminação dos povos, do desarmamento, pacta sunt servanda e rebus sic stantibus.

     Na prática, há exemplos da utilização dos princípios geraisdo direito como fundamento de decisões. No Caso Chorzów Factory 

    (1927), a Corte Permanente de Justiça Internacional (antecessora da CorteInternacional de Justiça) declarou que “é um princípio de direitointernacional, e até mesmo um princípio geral do direito, que qualquerquebra a um acordo acarreta a obrigação de indenização”.

    3.4 Jurisprudência e doutrina

    A alínea d   do art. 38 do Estatuto da Corte menciona asdecisões judiciárias e a doutrina como fontes do DIP. Essa diretriz está

    sujeita ao disposto no art. 59 do mesmo Estatuto, que determina que “adecisão da Corte não é obrigatória senão para as partes em litígio e emrelação a esse caso específico”. Isso significa que os tribunais não estãoobrigados a seguir as decisões anteriores relativas à mesma questão dedireito (stare decisis doctrine).

    Pela expressão decisões judiciárias, entende-se a juris prudência dos tribunais arbitrais, além das decisões dos tribunais eorganizações internacionais. Sua importância vem do fato de que a

     jurisprudência contribui para o desenvolvimento da disciplina, uma vezque interpreta e esclarece as disposições de tratados internacionais e dasnormas costumeiras. Dentre as decisões judiciárias, aquelas emanadas daCIJ são consideradas as de maior relevância para a interpretação dasnormas na esfera internacional.

    Quanto à doutrina, sua caracterização como fonte do DIP é bastante contestada, contudo, não se pode negar sua importância nainterpretação dos textos convencionais, que muitas vezes não sãodevidamente claros e precisos.

    19 SILVA & ACCIÓLY, op. ci t, p. 7.

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    Direito Internacional

     Na verdade, tem-se concebido que a jurisprudência e adoutrina não são formas de expressão do direito, mas sim instrumentosúteis a sua correta interpretação.  Já  a eqüidade e a analogia, por seus

    turnos, são métodos de raciocínio jurídico, critérios norteadores do julgador face à insuficiência do direito ou a completa obscuridadenormativa para o julgamento de um caso concreto20. Sublinhe-se,entretanto, que, para a utilização da eqüidade pelas Cortes Internacionais,é imprescindível a autorização das partes envolvidas21.

    20 REZEK, op. cfL, p. 145.21 O Estatuto da CIJ dispõe em seu artigo 38 que o recurso à eqüidade depende da aquiescência das partes litigantes.

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    Capítulo 11

    PERSONALIDADE INTERNACIONAL

    1 Conceito

     No direito internacional, o “reconhecimento da personalidade internacional significa o reconhecimento de sua existência legalna sociedade internacional”22.

    Como vimos, no DIP Clássico, somente os Estadosfiguravam como sujeitos de direitos e obrigações. Atualmente, além dosEstados, outros entes figuram como sujeitos de DIP, sendo eles asorganizações internacionais e os indivíduos.

    2 Capacidade de ação e personalidade

    A capacidade de ação decorre do reconhecimento da personalidade jurídica de um determinado ente, eis que a capacidade é o“poder de intervir por si mesmo”. Contudo, o exercício de direitos edeveres poderá sofrer limitações, na medida da capacidade conferida a

    22 JO, op. cit, p. 186.

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    um determinado ente pelo Direito Internacional. A capacidade, portanto,varia de um ente para outro.

    A capacidade dos Estados é assegurada a partir de sua

    constituição, desde que haja soberania e independência para tomardecisões. Percebe-se» assim, que a independência e a soberania sãoelementos indispensáveis para assegurar a capacidade do Estado parafigurar como sujeito de direitos e deveres no âmbito internacional. A

     justificativa lógica para essa afirmação decorre do fato de que um Estadonão poderá se encontrar subordinado a outro para manter relações

     jurídicas na comunidade internacional.

     No que se refere às organizações internacionais, sua

     personalidade já foi reconhecida pela Corte Internacional de Justiça.Assim como as empresas no âmbito do direito interno, as organizaçõesinternacionais possuem personalidade independentemente de seusmembros.

     No entanto, o exercício de sua capacidade de ação - que,comovimos, é uma conseqüência da personalidade internacional -dependerádo que dispõem seus acordos constitutivos. Assim, oreconhecimento da personalidade de uma organização não significa,

    necessariamente, que ela possui capacidade para concluir tratados, porexemplo.

    As organizações exercem, portanto, uma “capacidade legalinternacional limitada”, de acordo com as delimitações estabelecidas porseu tratado constitutivo. Além disso, o âmbito de exercício da capacidadeda organização está adstrito aos países que a reconhecem23 e é resultanteda vontade de seus membros (capacidade derivada).

    Por fim, relativamente à capacidade de ação dos indivíduosna esfera internacional, ainda não há consenso acerca dos direitos edeveres que eles gozam no DIP. O entendimento majoritário da doutrina éde que a capacidade do indivíduo estende-se até o limite permitido pelasnormas internacionais aplicáveis diretamente a ele. Ou seja, no momentoem que uma norma internacional confere a possibilidade do exercício dedeterminados direitos diretamente pelo indivíduo, aí está a delimitação desua capacidade.

    23 JO, op. cit. p. 18Ô.

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    Exemplo prático desse entendimento é a permissão doacesso de indivíduos a alguns tribunais internacionais, para proteção deseus direitos. Apesar de a CIJ não aceitar demandas propostas por

    indivíduos, outros tribunais o fazem, dentre eles, o ICSID (tribunalarbitrai ad hoc do Banco Mundial), a Corte Permanente de Arbitragem,em Haia, o Sistema de Resolução de Controvérsias estabelecido no

     NAFTA e a Corte Européia de Direitos Humanos.

    3 Pessoas internacionais

    3.1 Estados

    O Estado é, sem dúvida, o ente mais participativo nasrelações regidas pelo direito internacional. Diversos são os conceitos deEstado, vejamos alguns:

    “Estado soberano independente é aquele que tem exclusividade, autonomia e plenitude de competência, sendo que 

    todas as noções devem ser interpretadas dentro do quadro geral do Direito Internacional" (Rousseau).

    “Estado sujeito do Direito Internacional é aquele que reúne três  elementos indispensáveis para a sua formação: população {composta de nacionais e estrangeiros), territórios (ele não precisa ser completamente definido, sendo que a ONU tem admitido Estados com questões de fronteira, como por exemplo, Israel) e govemo (deve ser efetivo e estável). Todavia, o Estado pessoa internacional plena é aquele que possui soberania"  

    (Celso D. Albuquerque de Mello, 1997, vol. I, p. 329).H0 Estado, personalidade originária de direito internacional público, ostenta três elementos conjugados: uma base territorial, uma comunidade humana estabelecida sobre essa área, e uma forma de governo não subordinado a qualquer  autoridade exterior” (J.F. Rezek, 2005, p. 161).

    Para melhor compreensão, dividiremos o presente estudo

    nos seguintes itens:a) Elementos Constitutivos do Estado

     b) Classificação dos Estados

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    c) Nascimento e Reconhecimento do Estado

    d) Extinção do Estado

    e) Sucessão de Estadosa) Elementos Constitutivos do Estado  - Conforme

    estabelece a Convenção Interamericana sobre os Direitos e Deveres dosEstados, firmada em Montevidéu, em 1933, são quatro os elementosconstitutivos do Estado: a) população permanente; b) território; c)governo; d) capacidade de entrar em relação com os demais Estados,

    a.l) População',  trata-se do conjunto de indivíduos,

    nacionais ou estrangeiros, que habitam o território ém determinadomomento. É, pois, um conceito aritmético, quantitativo, de modo que nãose confunde com o conceito de  povo , que se refere à coletividadedeterminada pelo aspecto social.

    A população estatal moderna é de natureza sedentária,estabilizada no interior das fronteiras do território de determinado Estado.A idéia de uma população nômade não condiz com a realidadeinternacional. A maioria dos governos confrontados com problemas do

    nomadismo transfronteiriço pratica políticas, por vezes brutais, desedentarização dos grupos nômades. No entanto, é importante destacarque um Estado não perde sua qualidade porque pratica ou favorece uma

     política de emigração maciça de sua população ou porque permite uma24ímigraçao estrangeira importante.

    O elemento humano garante a manifestação do princípio dacontinuidade do Estado.

    a.2) Território: A noção conceituai de território relaciona-se a uma área terrestre, somada àqueles espaços hídricos de interesse

     puramente interno, como os rios e lagos que se circunscrevem no interiordessa área sólida. Sobre o território, o Estado soberano exerce jurisdiçãogeral e exclusiva, no sentido de que possui domínio territorial sobre todasas competências de ordem legislativa, administrativa e jurisdicional e quenão enfrenta concorrência de qualquer outra soberania.

    24 DINH, Nguyen Quoc, DAILUER, Daill ier e PELLET, Aían. Direito internacional Púbiico, Fundação Calouste Gulbenkian, 1999, p. 374.

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    Direito Internacional

    O requisito referente à existência de um território determinado  não significa que o território do Estado deva estarabsolutamente delimitado. Um Estado poderá ser reconhecido

    internacionalmente mesmo que suas fronteiras não estejam perfeitamentedefinidas. Além disso, a extensão ou tamanho do território não influisobre o reconhecimento da personalidade internacional.

    A delimitação territorial de um Estado geralmente ocorre por meio do estabelecimento de fronteiras com base em linhas limítrofesartificiais ou naturais. A primeira caracteriza-se pela utilização de linhasgeodésicas (paralelos e meridianos), ou qualquer arranjo ou combinaçãoque se fundamente à base delas. A segunda relaciona-se ao aproveita

    mento de rios e cordilheiras como formas naturais de determinar asfronteiras de Estados vizinhos. O critério natural prevalece sobre oartificial, quando a natureza assim o permite, como por exemplo, noestabelecimento da fronteira entre Argentina e Chile, com base naCordilheira dos Andes.

    a.3) Governo  e Capacidade de manter relações: sãoexigências que se completam, pois é necessária a existência de umgovemo não-subordinado, ou seja, soberano, para que o Estado possa

    exercer sua capacidade de ação no cenário internacional. Não basta aexistência de território bem delimitado, população estável, sujeita àautoridade de um govemo para identificar o Estado enquanto sujeito doDireito Internacional, é preciso encontrar a noção de ente soberano, comcompetências igualitárias a qualquer outro Estado da comunidadeinternacional.

    Importante destacar que a idéia de autonomia não seconfunde com a de soberania, da mesma forma que o conceito deConfederação não se eqüivale ao de Federação. O primeiro indica areunião de Estados Soberanos em tomo de interesses comuns, sejam

     políticos, econômicos ou geopolíticos, sem, no entanto, abdicarem de suasoberania. O segundo, por sua vez, refere-se à união de estadosautônomos na qual há a cessão da suas soberanias para um centro de

     poder único (União Federal), mantendo-se, todavia, um grau variável deautonomia.

     b) Classificação dos Estados — A maioria dosintemacionalistas classifica os Estados com base na sua estrutura,designando-os como Estados simples ou Estados compostos.

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    Os Estados simples caracterizam-se pelos seguintesatributos: são plenamente soberanos e representam um todo homogêneo eindivisível, sendo que não há divisão interna de autonomias. Trata-se daforma mais comum de Estado.

    Os Estados compostos dividem-se em: (I) Estados compostos por subordinação; e (II) Estados compostos por coordenação. Os compostos por subordinação referem-se a grupos de Estados que nãose encontram em situação de igualdade, não possuem plena autonomia enão possuem pleno gozo de alguns direitos (eram os chamados Estadosvassalo, protetorado ou Estado cliente). Tais Estados não mais existem naatualidade. Exemplo dessa situação era a da URSS com os países satélites (Polônia, Hungria, Romência, etc.), onde havia controle por parte daURSS relativamente a aspectos econômicos, militares e comerciais.

    Já os Estados compostos por coordenação ocorrem a partirda associação de Estados soberanos, em situação de igualdade. Exemplodessa situação é a confederação de Estados, onde se busca determinadofim especial a partir da associação. Esse fim especial pode ser, porexemplo, a defesa dos Estados ou a proteção de interesses comuns.Geralmente há uma autoridade central, chamada  Dieta,  a qual não seconstitui em poder supremo, mas apenas em uma assembléia cujasdecisões são tomadas por unanimidade. Atualmente também não háexemplos de confederações de Estados, mas podemos destacar aConfederação Americana, que existiu no período de 1781 a 1789.

    Dentre os Estados compostos por coordenação, a doutrinadestaca ainda o Estado federal  ou federação de Estados.  Trata-se daunião permanente de Estados onde cada um conserva sua autonomiainterna enquanto que a soberania externa é exercida pelo governo federal. 

    A autonomia interna dos Estados é, contudo, limitada pela constituiçãofederal. Desde a Constituição de 1891, o Brasil é um Estado federal.

    c) Nascimento e Reconhecimento do Estado -  o ndo Estado decorre da reunião de seus elementos constitutivos, conformevimos no item a. Contudo, a simples reunião dos elementos não permite,

     por si só, o nascimento do Estado, sendo necessário um elemento deconexão entre eles. A doutrina cita como “elementos de conexão” anacionalidade e os fatores econômicos (capacidade de sobrevivência porseus próprios meios).

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    Pode-se'considerar que o surgimento de um Estado se dá por uma das seguintes formas: (I) separação de parte da população eterritório de um Estado (exemplo: Brasil e Estados Unidos, que surgiram

    após sua libertação da condição de colônias); (II) dissolução total de umEstado, não subsistindo sua antiga personalidade (exemplo:desmembramento da URSS); (IH) fusão para criação de um Estado novo(exemplo: Itália que surgiu da fusão, em 1860, de Modena, Parma,Toscana e Reino de Nápoles, os quais foram incorporados ao Piemonte

     para formar um novo país).

    O reconhecimento é um ato unilateral, por meio do qual sedeclara a aquisição da condição de Estado. É, portanto, um ato deliberalidade, orientado pelos objetivos políticos do próprio Estado.Contudo, para que um Estado passe a possuir direitos e obrigações

     perante a sociedade internacional é necessário o seu reconhecimento pelos demais Estados existentes.

    É importante compreender que o fato de um determinadoEstado não reconhecer um outro não significa que este não possua

     personalidade, mas tão somente que aquele Estado não o reconhece e não

    deseja manter relações com este. Nesse sentido, o reconhecimento dosdemais Estados não é ato constitutivo, mas sim declaratório da qualidadedo Estado como sujeito do Direito Internacional Público.

    É preciso atentar ao fato de que, segundo o direitocostumeiro, é possível que certo Estado negocie em conferência, assineou ratifique tratados coletivos, ou deles seja parte, sem reconhecer todosos outros pactuantes. O reconhecimento mútuo é requisito apenas paracelebração de tratados bilaterais, não de multilaterais.

    Os meios de reconhecimento de um Estado são:

    (I) expresso (declaração, notificação, dispositivo emtratado); ou tácito (por exemplo, por meio do estabelecimento oficial de relações diplomáticas);

    (II) individual (realizado individualmente por cada Estado);ou coletivo (por meio de dispositivo em um tratado

    multilateral ou declaração coletiva);(IIÍ) de facto (provisório e limitado); ou de jure  (definitivo ecompleto).

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    Matéria de interessante análise é aquela relativa aos Micro-Estados. São aqueles Estados que dispõem de um território mais oumenos exíguo, como por exemplo, Andorra (467 Km2), Liechtenstein

    (160 Km2), São Marino (61 Km2), Mônaco (menos de 2Km2) e com uma população inferior a quarenta mil pessoas, todavia, com instituições políticas estáveis e regimes organizados.

    O que diferencia os Micro-Estados dos demais Estados dacomunidade internacional é que, em razão da hipossuficiência ocasionada

     pela pequena dimensão territorial e demográfica, partes de suacompetência (defesa nacional, emissão de moeda) são confiadas a outrem,normalmente a um Estado vizinho, como a França no caso de Mônaco; a

    Itália, no caso de São Marino; e a Suíça no caso de Liechtenstein25.

    c.l) Reconhecimento de Govemo: o reconhecimento doEstado não deve se confundir com o reconhecimento de govemo. Umaruptura na ordem política, como uma revolução ou golpe de estado podedeterminar a instauração no país de uma nova forma de poder, à margemdas prescrições constitucionais pertinentes à renovação do quadro decondutores políticos26. Por exemplo, quando as modificações de um

    Estado se dão em violação a sua Constituição, os governos resultantes degolpes precisam ser reconhecidos pelos demais Estados. São exemplostípicos: os Golpes de Estado ocorridos no Brasil em 1930 e 1964 e naArgentina em 1966.

    Importante atentar para o fato de que o reconhecimento deum Estado, em regra, implica no reconhecimento do govemo que seencontra no poder naquele momento. Contudo, “se a forma de govemomuda, isto não altera o reconhecimento do Estado: só o novo govemo terá

    necessidade de novo reconhecimento”27. Os meios de reconhecimento dogovemo também podem se dar de forma tácita ou expressa; de facto ou de 

     ju re.

    c.2) Reconhecimento de beligerância e insurgência: oreconhecimento de beligerância  ocorre quando parte da população serevolta para criar um novo Estado ou então modificar a forma de govemoexistente, sendo que tal “revolta” evolui ao nível de uma guerrainternacional. Nesse caso, os demais Estados podem passar a considerar 

    26 REZEK, op. cit., p. 239.28 REZEK, op. clt., p. 224.27 ACCIOLY, op. clt-, p. 87.

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    as “partes” do conflito em condições de igualdade jurídica, reconhecendo-lhes a condição de beligerantes. Seu principal efeito é o doreconhecimento dos direitos e deveres de um Estado ao grupo de

     beligerantes, os quais deverão, por exemplo, respeitar normas de guerra.

    Já o reconhecimento de insurgência ocorre quando há umasituação que assume proporções de guerra civil, sem, contudo haver oreconhecimento de seu caráter jurídico, mas de simples situação de fato.O seu reconhecimento não implica em direitos e deveres especiais, masos insurretos não poderão ser tratados como ilegais pelos governos que osreconheçam.

    d) Extinção do Estado -   não há no DIP um entendimento pacífico sobre como se dá a extinção de um Estado. Logicamente, umavez que a criação do Estado se dá pela reunião de seus elementosconstitutivos, sua extinção decorreria do desaparecimento de um deles(exemplo: êxodo total da população). Sendo assim, as hipóteses decriação de novos Estados enumeradas no item c  podem corresponderigualmente à extinção de um Estado, seja pela sua absorção completa deum Estado por outro, pelo desmembramento para formação de novos

    Estados ou pela fusão de Estados. Saliente-se que, atualmente, a Carta das Nações Unidas proíbe a anexação e transformação de um Estado emcolônia.

    e) Sucessão de Estados ~  Quando se aborda o fenômenosucessório no âmbito do direito internacional público é necessáriodestacar a existência do princípio da continuidade do Estado. Segundoessa máxima, o Estado, pelo fato de existir, tende a continuar existindo,ainda que sob outra roupagem política e até mesmo quando ocorrammodificações expressivas na titularidade de sua soberania28. Em outras palavras, é com base nesse princípio que se estabelecerão as regras geraissobre os efeitos jurídicos decorrentes da sucessão de Estados.

    Segundo as Convenções de Viena de 1978 e 1983, asucessão de Estados se dá pela substituição de um Estado (predecessor)

     por outro (sucessor) nas suas responsabilidades internacionais. Asmodalidades de sucessão são classificadas da seguinte maneira: (I) pela

    fusão ou agregação de Estados; (II) pela secessão ou desmembramento deEstados; ou (III) pela transferência territorial.

    28 REZEK, op. cit., p. 289.

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    Quanto aos efeitos jurídicos da sucessão de Estados,vejamos:

    e.l) Sucessão em matéria de Tratados: regulada pela

    Convenção de Viena sobre Sucessão de Estados em Matéria de Tratados,de 1978. A regra geral é de que a sucessão de Estados não afeta ostratados que se referem aos direitos sobre o território (tratadosdispositivos). Essa regra pode, contudo, variar de acordo com a mudançaterritorial ocorrida. Assim, quando um novo Estado é formado pelasucessão do território de um outro, o novo Estado sucedeautomaticamente o Estado predecessor (art. 34). Também quando háfusão de dois ou mais Estados, os tratados firmados pelos Estados predecessores continuam vigentes no território ao qual eram aplicadosantes da fusão, salvo algumas exceções previstas no art. 31. Um Estadoapenas sucede num tratado bilateral se o outro Estado e o novoconcordarem (art. 24). Por fim, a condição de membro de umaorganização internacional, em princípio, não se sucede.

    e.2) Sucessão em Matéria de Bens: regulada pelos artigos 7a 18 da Convenção. Caso haja sucessão da totalidade do território,sucede-se toda a propriedade pública, ou seja, todos os bens do Estado

     predecessor. A convenção estabelece que, salvo disposição em contrário,a passagem dos bens ocorrerá sem compensação ou pagamento. Sehouver sucessão apenas de parte do território, os imóveis relativos àquela

     porção do território passarão ao sucessor, assim como os móveisvinculados às atividades desenvolvida nessa porção do território, salvodisposição em contrário.

    e.3) Sucessão em Matéria de Arquivos: salvo estipulaçãoem contrário, os arquivos (documentos) transferem-se ao sucessor (arts.20 a 24).

    e.4) Sucessão em matéria de Dívidas: regulada pelos arts. 32a 41 da Convenção. A regra geral é de que a sucessão não influencia osdireitos dos credores. Sendo assim:

    *4>Se o Estado sucessor anexa totalidade do território do predecessor - deve-se cumprir com os deveres perante oscredores da dívida do predecessor;

    't S e o Estado predecessor perde parte de seu território - o

    Estado sucessor assume parte da dívida do predecessor;

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    ^Se o Estado predecessor perde totalidade do território emrazão de desmembramento em vários Estados - a dívidadeve ser assumida por cada um dos Estados, conformedisposições do tratado.

    e.5) Nacionalidade: em regra, não se aplica o princípio dacontinuidade no que se refere à nacionalidade. Os Estados envolvidosregularão essa questão por tratado ou na legislação interna. Emdeterminados casos, poderá se dar liberdade aos indivíduos para decidirsobre a escolha da nacionalidade.

    3.2 Organismos internacionais

    As normas internacionais não conceituam o termo“organização internacional”, de modo que sua definição tem sido dada

     pela doutrina. No entanto, suas diferenças em relação ao Estado, comosujeito do Direito Internacional Público, são gritantes, seja em relação aosseus objetivos, seja em relação ao seu aparato organizacional.

    Alguns elementos principais dos conceitos trazidos pelos

    estudiosos são:a) associação voluntária, isto é, nenhum Estado é obrigado

    a participar de uma organização internacional;

    b) formada por sujeitos de Direito Internacional (os sujeitossão os Estados, que passam a ser denominados membros).  Algumasorganizações aceitam membros classificados como observadores,associados  e afiliados, dentre os quais poderão se incluir entidades não-

    govemamentais e Estados ou territórios não-independentes;c) constituída por ato de Direito Internacional,  ou seja,

    tratados internacionais que adquirem um aspecto de norma constitucionalda organização;

    d) de atuação estável segundo normas de Direito  Internacional, o que as confere a condição de ente com personalidadeinternacional;

    e) com ordenamento, órgãos e institutos próprios; f) que realiza finalidades comuns de acordo com os poderes 

    conferidos por seus membros, os quais se encontram definidos no tratadoque criou a organização;

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    g) em virtude de seu estatuto jurídico, tem capacidade dconcluir acordos internacionais no exercício de suas junções e para realização de seu objeto.

    Pelo menos 2 (dois) órgãos têm sido adotados pelasorganizações internacionais, independentemente de seu alcance oufinalidade: uma assembléia geral,  onde são deliberadas as questõescorrespondentes à atuação da organização por parte dos Estados-membros; e uma secretaria, cuja função é de administração, de natureza

     permanente. A assembléia geral não é permanente, pois se reúneanualmente para assuntos ordinários e, em caráter excepcional, de acordocom necessidades especiais. Há, ainda, em algumas organizaçõesinternacionais de vocação política, um Conselho Permanente.

    Quanto ao processo decisório, as organizações internacionais geralmente não operam segundo as normas de deliberação pormaioria. O Estado soberano somente costuma se sentir vinculado àdeterminada resolução caso tenhá sido favorável a ela, ao menos no queseja classificado como importante, e não meramente instrumental.Decisão relativa à matéria instrumental seria aquela referente a questões

    administrativas, como eleições para cargos na organização. Exemplostípicos de insubordinação de Estados membros a deliberações daAssembléia Geral são encontrados na própria Organização das NaçõesUnidas, como por exemplo, no caso das intervenções no Congo e noOriente Médio. Essas condutas dissidentes enfatizam ainda mais o valorrelativo das recomendações da Assembléia.

    A jurisdição das organizações internacionais correspondeaos poderes para executar seus objetivos e está delimitada no tratado

    constitutivo. Sendo assim, as atividades realizadas fora desses objetivossão consideradas ultra vires. Essa regra passou a denominar-se principio da especialidade.  Contudo, se tal extrapolação for necessária para aexecução dos objetivos da organização, a competência da organização écompreendida como tacitamente ampliada {teoria do poder implícito).

    A questão relativa à possibilidade de um tratado institucional de uma organização internacional gerar obrigações a Estados não

    contratantes é de suma importância. Na verdade, a matéria ganha grandecontorno em casos em que uma organização de alcance e finalidadeuniversais, como a ONU, por exemplo, está inserida na discussão. Em

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    Direito Internacional

    regra geral, não há força jurídica na Carta das Nações Unidas ou em outrotratado institucional para vincular Estados não membros. “Na verdade, aimposição de tratado institucional a terceiro é mera via de fato,

    condicionada à potência da organização, à conjunção favorável das forças políticas no seu contexto, e finalmente à debilidade do Estado que façaobjeto da pretendida coação.”29

    As Organizações Internacionais necessitam de um Estadosoberano, que, mediante celebração de um tratado bilateral (acordo desede), facultará a instalação física da organização em algum ponto do seuterritório. Nada impede que a organização tenha mais de uma sede e que

    se localize em país não membro, sendo, todavia, muito remota essa últimahipótese.

    A falta de cumprimento dos deveres de sua qualidade demembro de uma organização internacional pode trazer ao Estadoconseqüências, de acordo com as previsões estabelecidas pelo tratadoconstitutivo e aplicáveis pela própria organização, mediante o voto deseus órgãos. Geralmente elas assumem 2 (duas) formas principais: asuspensão de determinados direitos e a exclusão do quadro de Estados

    membros.Outros exemplos de Organizações Internacionais de alcance

    mundial, além da Organização das Nações Unidas são: OIT (OrganizaçãoInternacional do Trabalho, fundada em 1919 e sediada em Genebra, naSuíça), a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, aCiência e a Cultura, fundada em 1946, com sede em Paris, na França), aFAO (Organização para a Alimentação e a Agricultura, fundada em 1945,como sede em Roma, na Itália), o FMI (Fundo Monetário Internacional),entre muitas outras. Há também aquelas organizações de alcance regional,como por exemplo, o NAFTA (Acordo de Livre Comércio das Américas)e o MERCOSUL.

    3.2.1 Organização das Nações Unidas - ONU

    Com o fim da Segunda Guerra Mundial, a união dos

    Estados em tomo de objetivos comuns ~ superar divergências, preservar a paz, e perseguir níveis mais altos de bem-estar para a população mundial

    29 REZEK, op. cit., p. 254.

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    ~ acabou por ocasionar, juridicamente, a celebração de acordosinternacionais e a criação de organizações, dentre as quais a Organizaçãodas Nações Unidas (ONU) foi o exemplo mais representativo, como

    forma de implementação dessa convergência de interesses30.Em 26-06-1945, em São Francisco, ocorreu a assinatura da

    Carta da ONU (tratado constitutivo da organização) e do Estatuto daCorte Internacional de Justiça - CIJ.

    Atualmente, a presença da ONU no cenário internacional éde inegável importância, ainda que, por vezes, sua credibilidadeinterna/externa seja abalada por iniciativas conjuntas de alguns de seusEstados membros, em áreas de seu interesse, mas sem o seu aval, como

     por exemplo, na invasão do Iraque por parte dos EUA e seus aliados.

    A ONU atua nas mais diversas áreas (direitos humanos,direitos do mar, direitos do meio ambiente, etc.), em atividades quecompreendem, de certa maneira, as esferas legislativa, administrativa e

     judiciária.

    A Carta da ONU estabelece, em seu art. Io, os objetivos daorganização:

    “(1) Manter a paz e segurança internacionais, e para esse fim tomar coletivamente medidas efetivas para evitar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão ou outra qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos e de conformidade com os princípios da justiça e do direito internacional, a um ajuste ou solução das controvérsias ou situações que possam levar a uma perturbação da paz;

    (2) Desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas  no respeito ao princípio de igualdade de direito e de autodeterminação dos povos, e tomar outras medidas  

    apropriadas ao fortalecimento da paz universal;

    (3) Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião;

    30 NASSER, Rabih Ali. A Liberalização do Comércio Internacional nas Normas do GATT-OMC.São Pauio: LTr, 1999, p. 22.

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    Direito Internacional

    (4) Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações  para a consecução desses objetivos comuns”, (grifamos alguns pontos essenciais)

    O art. 2o da Carta enumera os sete princípios que deverser observados pelos Estados-membros:

    (1) igualdade soberana dos membros;

    (2) boa-fé no cumprimento das obrigações internacionais;

    (3) solução dos conflitos por meios pacíficos;

    (4) abstenção da ameaça e da força contra a integridade 

    territorial;(5) assistência à ONU em qualquer ação;

    (6) obrigação dos estados não membros da ONU de cumprir os princípios da ONU;

    (7) não-intervenção em assuntos que sejam, essencialmente, da competência intema dos Estados.

    Segundo a Carta da ONU, Estados não-membros podem participar dos debates do Conselho de Segurança e atentar o Conselho para controvérsias. Além disso, conforme prevê o art. 2, § 6o, para preservar a paz e segurança internacionais, poderá a organização fazercom que Estados que não são membros das Nações Unidas procedam emconformidade com seus princípios.

    Os membros das Nações Unidas são aqueles Estados queassinaram a Carta da ONU e a ratificaram. A admissão de novos

    membros “fica aberta a todos os Estados amantes da paz que aceitarem asobrigações, contidas na presente Carta e que, a juízo da Organização,estiverem aptos e dispostos a cumprir tais obrigações” (art. 4o da Carta).

    A suspensão dos membros se dá por decisão da AssembléiaGeral, mediante recomendação do Conselho de Segurança. Quando umEstado-membro viola de forma persistente os princípios da Carta, poderávir a ser expulso, também por recomendação do Conselho de Segurança.

    Relativamente à composição de receita, geralmente, asorganizações internacionais estabelecem cotizações estatais não

     paritárias. Anteriormente, essa relação girava em tomo da capacidadecontributiva de cada Estado membro, levando-se em conta sua pujança

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    econômica. No entanto, no âmbito da ONU, essa forma de cáiculo foimodificada, na tentativa de evitar o agigantamento de um Estado membroespecífico. Sendo assim, ficou estabelecido um teto individual de 25% da

    receita prevista. A título exemplificativo, na virada do século, os EUAcontribuíam com 25% da receita, o Japão com 20% e a Alemanha com10%.

    Vejamos a seguir um quadro descritivo dos principaisórgãos da ONU:

    | Órgão Função Composição Processo deL .. .  J VotaçãoI Conselho de Manutenção da paz e São 15 Estados- - Cada membro

    1Segurança  i

    da segurança Inter membros, cada (permanente ou(cs) \ nacionais, inclusive um com um não) tem direito a\ mediante o uso de representante. um voto;

    I força, se necessário. Membros - Decisões sobre1 i  Age em nome dos permanentes: questões1 1 demais membros - China; processuais são II sobre questões - França; tomadas por voto1 ^ relativas a: - Rússia; afirmativo de nove1 a) litígios entre - Reino Unido; membros;

    Estados-membros; -Estados - Demais assuntos

    1b) regulamentação de Unidos. - voto afirmativo

    I armamentos; Periodicamente, de nove membros,c) ações em casos de a AG escolhe 10 inclusive os votos

    1 ameaça à paz e miembros não- afirmativos de

    1 agressão; permanentes, todos os membros

    1 d) cumprimento das com mandato de permanentes;1 sentenças da CIJ. 2 anos. - Decisões sobrei  Adota resoluções soluções pacificas1 para a solução de controvérsias =

    pacifica de conflitos e parte envolvida se

    1decide sobre abstém de votar emedidas coercitivas, não poderá vetar.

    1 em caso de Obs: os Membros

    1 ameaças. Ê um Permanentes tem1

    órgão permanente e direito de vetar 

    1suas resoluções qualquer decisão

    1 deverão ser sobre assunto não

    1cumpridas pelas processual, dentre

    !

    Nações Unidas. os quais se j encontram as ] “ações !

    coercitivas”. ]

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    reito Internacional

     Assembléia Principal órgão Representantes - Cada membro !Gerai (AG) deliberativo da ONU. j de todos os tem um voto; j

    Competência geral e Estados- -Questões j

    abrangente de membros. importantes jacordo com as (recomendaçõesfinalidades da ONU j sobre manutenção j(cooperação 1 da paz e ]internacional em segurança, eleição jdiversas áreas). de membros nãoFornece j permanentes dorecomendações ao CS, admissão e jCS e adota expulsão de memresoluções não- bros) = tomadas

    obrigatórias. por maioria de dois terços dosmembros presen- i tes e votantes; i - Outras matérias = maioria dos f  membros presen- j tes e votantes. j

    Ôrgão Função Composição Processo de ~ 1 Votação |

    Secretariado 0 Sôcretário-Geral é o principal funcionário administrativo da ONU, atuando em todas as reuniões da  AG, CS, Conselho Econômico e Conselho de Tutela. Poderá

    0 Secretariado possui diversos funcionários e um Secretário- Geral (indicado pela AG 

    | mediante recomendação

    chamar a atenção do CS para assuntos

     j ao CS), com mandato de 5

    que ameacem a paz e segurança. Não pode solicitar ou receber instruções de gover-nos ou autoridades.

    1anos.

    Conselho Promover coope í Cinqüenta e Decisões tomadas 1Econômico e ração internacional e quatro membros pela maioria dos f Sociai econômica. Coorde da ONU eleitos membros 1

    nar as atividades das pela AG presentes e 1organizações espe i votantes. |cializadas nos 1 I

    41\

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    i I

    campos econômico, social, cultural, educacional, sanitário, etc. 

    mediante consulta ou fazendorecomendações. Pode elaborar  estudos, relatórios, recomendações, prepara projetos de convenções e organiza conferências internacionais. Pode 

    con-sultar ONGs que se ocupem de assuntos de sua competência.

    Conselho de Tutela

    É o responsável por  acompanhar o progresso social dos territórios onde não há governo independente. Hoje não há mais 

    territórios em tais condições.

    Composto pelos membros permanentes do CS.

    3.2.2 Organização dos Estados Americanos ~ OEA

    A OEA surgiu a partir de um longo período de negociações,sendo que em 1948 as Nações Americanas adotaram, em Bogotá, a Carta da Organização dos Estados Americanos. Nesse documento foram

    estabelecidos os objetivos da Organização, cuja principal finalidade égarantir a paz e a segurança do continente, promovendo o bem social ACarta de Bogotá entrou em vigor em 13 de novembro de 1951, com odepósito da 14a ratificação.

    De acordo com o art. 4o da Carta, “são membros da organização todos os Estados Americanos que ratificarem a presente Sendo assim, o ingresso na OEA é facultado a todo Estado americanoindependente. É, pois, uma Organização Internacional de alcance

    regional.

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    Direito Internacional

    Diferentemente do que ocorre na ONU, não existia nessaorganização um processo de candidatura para ingresso, bastando que oEstado ratificasse a Carta. Atualmente, pela reforma de Buenos Aires(1967), há um processo de candidatura, a qual deve ser aprovada pelaAssembléia Geral, após recomendação do Conselho Permanente.

    A Carta não prevê a expulsão dos membros, mas esses poderão denunciá-la. Em caso de exercer o direito de denúncia, o Estadoestará desligado dentro de 2 anos, desde que, até então, haja cumprido asobrigações emanadas da Carta.

    A OEA é composta dos seguintes órgãos:

    |  Reunião de Consulta dos Ministros de Relações Exteriores: j j - tem por finalidade “considerar problemas de natureza urgente e de interesse j  j.;^r3piu^^am:os^t^os íAmenetoos, e para servir de órgão de consulta?’; ; 1

     j I| Conselhos da Organização: || a) Conselho Permanente: trata de assuntos determinados pela AG e pela I| Reunião de Consulta. Dentre suas funções destacam-se: velar pela ji manutenção das relações de amizade entre os Estados-membros, executar !

    decisões da AG, formular recomendações à AG sobre funcionamento da|j[•organização^,;; ^ "' /"V •• ••J

    ppâfquerEslmloosf:EstSdpsÍêstàoírepr£fcfin̂

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    A OEA possui, ainda, vários organismos especializados, taiscomo a Organização Pan-Americana de Saúde, a Junta Interamericana deDefesa (cuja finalidade é traçar medidas de defesa do continente) e oInstituto Internacional Americano de Proteção à Infância.

    3.3 indivíduos e empresas

    A personalidade internacional dos indivíduos vem sendo

    ampliada de acordo com a modernização do DIP. Isso significa dizer queos indivíduos vêm, de certa forma, desvenciliando-se da proteçãoexclusiva do Estado soberano. Isso porque, toda vez que há a aplicaçãodireta do DIP a um indivíduo, há uma diminuição do exercício da

     jurisdição do Estado.

    Essa lógica aplica-se igualmente às empresas. Um exemplodisso é á tentativa de regulamentação internacional das empresas trans-nacionais, de modo que tais empreendimentos não se encontrariam mais

    limitados ao âmbito de aplicação dô direito interno, mas sim ao direitointernacional.

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    Direito Internacional

    Parte da doutrina, contudo, resiste ao reconhecimento da personalidade jurídica dos indivíduos e empresas. Afirma Rezek, “nãotêm personalidade jurídica de direito internacional os indivíduos, etampouco as empresas, privadas ou públicas”31.

    O papel dos indivíduos no direito internacional tem sedestacado, principalmente, quando são abordadas questões relativas aosdireitos humanos. Tais questões serão analisadas no capítulo III, item 2.1.

    4 Sania-Sé

    A Santa-Sé é a cúpula da Igreja Católica, localizada nacidade de Roma. Sua personalidade internacional foi reconhecida a partirdos Acordos de Latrão (1929). Por meio desse tratado, a Itália declaroureconhecer a "soberania da Santa-Sé, no domínio internacional, com osatributos inerentes à sua natureza...” (art. 2o). Declarou tambémreconhecer à Santa-Sé “a plena propriedade, o poder exclusivo e absoluto

    e a jurisdição soberana sobre o Vaticano...”(art. 3o).As relações entre a Igreja Católica e os Estados dão-se por

    meio de concordatas, os quais são tratados internacionais, normalmente bilaterais.

    5 Organizações não-governamentais - ONGS

    As organizações internacionais privadas, que não sãocriadas pelos Estados, mas sim pelos indivíduos, são denominadasorganizações não-govemamentais - ONGs. Essas organizações vêm

     proliferando-se e atuam nas mais diversas áreas (legal, política, social,econômica, educacional, de meio ambiente, de direitos humanos, etc.).

    Atualmente, não há norma internacional que regule acriação o e funcionamento das ONGs, de modo que são regidas pelas leisnacionais do país de constituição. Até o momento, as ONGs não são

    31 REZEK, op. cit., p. 152.

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    consideradas como entes com personalidade jurídica internacional, apesarde algumas organizações internacionais» como a ONU, outorgarem acondição de “observador” a algumas ONGs. Contudo, essa condição não

    as confere o status de sujeito de direito internacional.Exceção, contudo, se faz ao Comitê Internacional da Cruz

    Vermelha, fundado em 1863, ao qual se reconhece personalidadeinternacional por meio. da Convenção de Genebra do ano seguinte.

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    Direito Internacional

    TRATADOS INTERNACIONAIS

    1 Teoria geral dos tratados

    Conforme ensina Marques32, historicamente, foram asregras consuetudinárias que regeram os acordos entre Estados, utilizando-se de princípios gerais, notadamente, o do respeito ao acordado (pacta sunt servanâa), o do livre consentimento e o da boa-fé das Partescontratantes. “No século XX, surgem dois fenômenos novos: oaparecimento das organizações internacionais e a codificação do direitodos tratados, transformando regras costumeiras em regras convencionaisescritas, expressas elas mesmas no texto de um tratado”.

    Os trabalhos desenvolvidos pela Comissão de DireitoInternacional das Nações Unidas, resultaram, em 1969, na Convenção deViena sobre Direito dos Tratados. No Brasil, o texto da Convenção foienviado ao Congresso para aprovação em abril de 1992. Embora aratificação por parte do Brasil ainda não tenha ocorrido, “suas normas são

    tidas como vigentes por expressarem costume internacional”.33

    32 MARQUES, Frederico. Direito Internacional Privado e Mercosul. Disponível em;  . Acesso em: 10 de maio de 2005.33 MARQUES, idem.

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    http://www.dip.com.br/http://www.dip.com.br/

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    A Convenção de Viena define tratado internacional como“um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido

     pelo Direito Internacional, quer conste de um instrumento único, quer dedois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominaçãoespecífica” (Art. 2, a).

    Conforme Rezek34, “tratado é todo acordo formal concluídoentre sujeitos de direito internacional, e destinado a produzir efeitos

     jurídicos”.

    A celebração de tratados se constitui em exercício desoberania. Mas, além do reconhecimento de sua soberania, o Estado, ao

    celebrar tratados, reconhece e se compromete a uma fonte de limitação desuas competências. Por isso, a doutrina costuma afirmar que o comprometimento do Estado por meio de tratados internacionais implica em: (I)manifestação do atributo de soberania; (II) instrumento de limitação doexercício do poder soberano.35

    De maneira geral, a elaboração de um tratado internacionalsegue as seguintes etapas:

    1. Negociacão. Realizada por autoridades nacionais designadas pela ordem constitucional do Estado, muitas vezes acompanhadosde especialistas no assunto sob discussão;

    2. Elaboração do texto. Os tratados são compostos de um preâmbulo, o qual espelha os motivos da realização do tratado,fornecendo elementos para sua interpretação, e do chamado dispositivo,ou seja, o texto ou corpo onde são definidas as obrigações dos Estados-Partes;

    3. Adoção. Segundo a Convenção de Viena (art. 9o), aadoção de um texto efetua-se pelo voto da maioria de dois terços dosEstados presentes, salvo se esses Estados, pela mesma maioria, decidamaplicar outras regras;

    4. Manifestação do Consentimento. O artigo 11 daConvenção reza que o consentimento de um Estado em obrigar-se por umtratado pode manifestar-se pela assinatura, troca de instrumentos

    constitutivos do tratado, ratificação, aceitação, aprovação ou adesão, ou por quaisquer outros meios, se assim for acordado pela partes.

    34 REZEK, op. cit. p. 14.38 SEITENFUS & VENTURA, op. cit., p. 40.

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    4Direito Internacional

    Importante observar que durante o período compreendidoentre a adoção do texto e a manifestação do consentimento, o tratado nãoobriga os Estados-Partes. Entretanto, a Convenção de Viena determina,

    em seu art. 18, que o Estado deve se abster da prática de atos que frustremo objeto e a finalidade do tratado.

    É por meio da manifestação de consentimento que o tratadoatinge sua eficácia jurídica. Em regra, são as normas constitucionais dos

     países que determinam o procedimento interno que resultará noconsentimento do Estado.

    Como vimos, a Convenção de Viena prevê a ratificação

    como uma das formas de expressão do consentimento do Estado. Trata-sede ato por meio do qual a mais alta autoridade do Estado confirma otratado, uma vez aprovado internamente, aceitando que ele seja definitivoe obrigatório e comprometendo-se a executá-lo. O instrumento deratificação é enviado aos outros Estados-Partes e ao Estado depositário,vinculando a partir desse momento, o Estado signatário36.

    A figura do Estado depositário corresponde àquele a quemcabe a manutenção do instrumento original, bem como a distribuição de

    cópias autênticas do texto do ato e demais registros. O Brasil é odepositário de diversos tratados, dentre eles o Tratado da Bacia do Prata eo Tratado de Cooperação Amazônica. Essa função também pode serexercida por uma organização internacional.

    1.1 Princípios e classificação dos tratados

    O principal princípio aplicável aos tratados encontra-se nanorma “pacta sunt servanda”, também reconhecido como princípioconstitucional da sociedade internacional37. Trata-se da aplicação damáxima segundo a qual as partes devem observar os ditames estabelecidos no acordo ao qual se submeteram, ou seja, o que foi pactuadodeve ser cumprido. Outro importante princípio que rege a celebração einterpretação dos tratados é o da boa-fé.

    Quanto à classificação dos tratados no âmbito do DireitoInternacional Público, esta se apresenta segundo diversos critérios, dentreos quais, os mais correntes na doutrina e na prática são:

    38 SEITENFUS & VENTURA, op. ci t., p. 42.37 MELLO, op. cit. p. 208.

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    (I) segundo o número de partes: tratados bilaterais (entredois Estados) e tratados multilaterais (entre mais de dois Estados);

    (II) segundo a possibilidade de adesão de Estados: tratados

    abertos (permitem a participação de Estados que não assinaram o textoinicialmente) e tratados fechados (não permitem a adesão tardia);

    (III) segundo o modo de sua entrada em vigor,  tratados emdevida forma (necessitam da troca de instrumentos de ratificação ou da

     prática, pelos Estados Signatários, de outro ato solene posterior a suaassinatura) e tratados em forma simplificada, também denominadosExecutive Agreements (entram em vigor, no momento de sua assinatura,ou no momento em que o texto dispuser, prescindindo de atos posteriores,

    como o da ratificação);

    (IV) quanto à matéria regulada: os tipos podem variar aoinfinito, como, por exemplo, tratados de paz, tratados de comércio enavegação, tratados de extradição, etc.

    Antigamente, tinha-se no direito internacional público a prática dos tratados secretos.