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Ano 6 (2020), nº 1, 913-944 ALTERAÇÕES RECENTES DA LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA E SEUS POSSÍVEIS IMPACTOS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO PREVIDENCIÁRIO NO CONSELHO DE RECURSOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL Dariel Santana Filho 1 Marcelo Borsio 2 Jefferson Guedes 3 Resumo: As novas alterações na legislação previdenciária, particularmente as que visam combater a fraude no âmbito da previdência social, indubitavelmente impactarão o direito processual previdenciário. Mudanças em relação à prova, ao prazo decadencial para revisão dos benefícios, ao prazo prescricional para a data de início do benefício (DIB) de pensão por morte para menores de 16 anos, ao prazo em dobro para os 1 Doutorando em Direito pela UniCEUB-DF. Aluno especial Doutorado em Direito UFBA. Mestre em Direito na Universidade Católica de Petrópolis. Possui graduação em Direito pela Associação Educacional Unyahna (2006). Graduado em Economia pela Universidade Católica de Salvador (2002). Procurador Federal e professor da Associação Educacional Unyahna. 2 Professor Titular do UDF no Curso de Mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas, nos créditos de Direito da Seguridade Social e Previdenciário. Pós- Doutor em Direito da Seguridade Social e Professor Visitante, sob a orientação do Prof. José Luis Tortuero Plaza, pela Universidade Complutense de Madrid (2014). Pós-Doutor em Direito Previdenciário e Professor Visitante, sob a orientação do Professor Giuseppe Ludovico, pela Universidade de Milão (2017). Doutor (2013) e Mestre (2007) em Direito Previdenciário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 3 Doutor em Direito das Relações Sociais (Processo Civil), com tese sobre a Igualdade e Desigualdade no Processo Civil, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo/PUC-SP (2008), Mestre no mesmo Programa de Direito (2001) com dissertação sobre o Princípio da Oralidade. Advogado.

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Page 1: ALTERAÇÕES RECENTES DA LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA E … · 2020. 2. 17. · judicial, em média, é de R$ 3.800,00. Diante desse cenário de constantes reformas da legislação

Ano 6 (2020), nº 1, 913-944

ALTERAÇÕES RECENTES DA LEGISLAÇÃO

PREVIDENCIÁRIA E SEUS POSSÍVEIS

IMPACTOS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO

PREVIDENCIÁRIO NO CONSELHO DE

RECURSOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

Dariel Santana Filho1

Marcelo Borsio2

Jefferson Guedes3

Resumo: As novas alterações na legislação previdenciária,

particularmente as que visam combater a fraude no âmbito da

previdência social, indubitavelmente impactarão o direito

processual previdenciário. Mudanças em relação à prova, ao

prazo decadencial para revisão dos benefícios, ao prazo

prescricional para a data de início do benefício (DIB) de pensão

por morte para menores de 16 anos, ao prazo em dobro para os

1 Doutorando em Direito pela UniCEUB-DF. Aluno especial Doutorado em Direito

UFBA. Mestre em Direito na Universidade Católica de Petrópolis. Possui graduação

em Direito pela Associação Educacional Unyahna (2006). Graduado em Economia

pela Universidade Católica de Salvador (2002). Procurador Federal e professor da

Associação Educacional Unyahna.

2 Professor Titular do UDF no Curso de Mestrado em Direito das Relações Sociais e

Trabalhistas, nos créditos de Direito da Seguridade Social e Previdenciário. Pós-

Doutor em Direito da Seguridade Social e Professor Visitante, sob a orientação do

Prof. José Luis Tortuero Plaza, pela Universidade Complutense de Madrid (2014).

Pós-Doutor em Direito Previdenciário e Professor Visitante, sob a orientação do

Professor Giuseppe Ludovico, pela Universidade de Milão (2017). Doutor (2013) e

Mestre (2007) em Direito Previdenciário pela Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo.

3 Doutor em Direito das Relações Sociais (Processo Civil), com tese sobre a Igualdade

e Desigualdade no Processo Civil, pela Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo/PUC-SP (2008), Mestre no mesmo Programa de Direito (2001) com dissertação

sobre o Princípio da Oralidade. Advogado.

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trabalhadores rurais se defenderem, ao acesso a dados médicos

pelo INSS, dentre outras, certamente provocarão grandes

repercussões no âmbito do processo administrativo

previdenciário, razão pela qual este estudo não se limitou a

apontar as alterações legislativas recentes, dando um passo além,

e demonstrando como meios alternativos para resolução de

conflitos, na seara extrajudicial, apresentam-se como essenciais

para um processo contínuo de desjudicialização das querelas

previdenciárias.

Palavras-Chave: Processo administrativo previdenciário, fraude,

conflitos, prazos, provas.

Abstract: New changes in social security legislation, particularly

those aimed at combating social security fraud, will undoubtedly

impact social security procedural law. Changes to proof, decay

period for revising benefits, statute of limitations for death

benefit start date (DIB) for under-16s, double term for rural

workers to defend themselves, access medical data by the INSS,

among others, will certainly have major repercussions in the

social security administrative process, which is why this study

did not merely point out recent legislative changes, taking it a

step further, and demonstrating as alternative means for conflict

resolution, in the extrajudicial area, they are essential for a

continuous process of dejudicialization of social security

disputes.

Keywords: Social security administrative proceedings, fraud,

conflicts, deadlines, evidence.

INTRODUÇÃO

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s recentes reformas da legislação previdenciária,

especialmente no que concerne ao combate às

fraudes (Lei nº 13.846/19 – mini-reforma

previdenciária) e aos novos ditames

constitucionais, trazidos pela EC nº 103/2019,

certamente impactarão fortementemente o processo

administrativo previdenciário e a judicialização das demandas

relativas aos temas previdenciários, particularmente em relação

às aposentadorias por invalidez e aos auxílios-doença, tornando-

se primordial a adoção de medidas para se mitigar a

judicialização e, no melhor dos cenários, até mesmo provocar a

desjudicialização das controvérsias previdenciárias.

Em 2018, os benefícios por invalidez representaram mais

da metade de todos os benefícios pagos pela previdência social,

sendo a invalidez temporária responsável por 45,89% de todos

os benefícios pagos – representando a concessão de 196.673

auxílios-doença – e a invalidez permanente responsável por

5,52% - representando a concessão de 23.288 aposentadorias por

invalidez4, ou seja, mais da metade (51,41%) de todos os

benefícios pagos pela previdência social.

A desjudicialização dos conflitos previdenciários,

mormente com essa gama de reformas que vêm ocorrendo no

âmbito da legislação previdenciária, deve estar na ordem do dia,

pois o impacto da previdência social no Poder Judiciário,

particularmente, na Justiça Federal, é deveras conhecido e vem

provocando uma especial preocupação por parte das instituições

do país (AGU, CJF, Ministério Público, INSS, STJ, Ministério

da Economia, etc.)

Conforme dados5 lançados pelo Conselho Nacional de

Justiça (CNJ) em 2019, o cenário de judicialização das querelas

previdenciárias se manteve em 2018. Dos 5 (cinco) assuntos

4 Disponível em

http://sa.previdencia.gov.br/site/2019/01/Beps112018_trab_FINAL.pdf. Acesso em

10.11.2019.

A

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mais demandados nos Juizados Especiais Federais todos tratam

de direito previdenciário: 1º) auxílio-doença (520.669 - 6,89%);

2º) aposentadoria por invalidez (355.546 - 4,70%); 3º)

aposentadoria por idade (120.871 - 1,60%); 4º) benefício

assistencial (100.355 - 1,33%); 5º) Benefícios em

Espécie/Restabelecimento (67.206 - 0,89%).

Da mesma maneira, dos cinco assuntos mais

demandados nas Turmas Recursais da Justiça Federal em 2018

quatro estão relacionados ao direito previdenciário5: 2º) auxílio-

doença (100.496 - 5,34%); 3º) aposentadoria por invalidez

(69.034 - 3,67%); 4º) aposentadoria por idade (34.890 - 1,85%);

5º) benefício assistencial (34.668 - 1,84%).

E essa situação não começou agora, ela é corriqueira. No

ano anterior (2017), dos cinco assuntos mais presentes na Justiça

Federal de 2º grau todos estavam relacionados ao direito

previdenciário6: 1º) auxílio-doença (129.913 – 1,37%); 2º)

pedidos genéricos relativos a benefícios em espécie (70.128 –

0,74%); 3º) aposentadoria por invalidez (69.909 – 0,74%); 4º)

aposentadoria por tempo de contribuição (62.819 - 0,66%); 5º)

aposentadoria por idade (56.317 - 0,59%).

Do mesmo modo, naquele mesmo ano (2017), dos cinco

assuntos mais demandados nas Turmas Recursais da Justiça

Federal todos estavam relacionados ao direito previdenciário7:

1º) auxílio-doença (77.270 - 6,38%); 2º) aposentadoria por

invalidez (57.421 - 4,74%); 3º) aposentadoria por idade (34.413

- 2,84%); 4º) benefício assistencial (30.839 - 2,55%); 5º)

aposentadoria por tempo de contribuição (22.133 - 1,83%).

5 Relatório Justiça em Números 2019. Disponível em https://www.cnj.jus.br/wp-

content/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf.

Acesso em 11.11.2019.

6 Relatório Justiça em Números 2018. Disponível em https://www.cnj.jus.br/wp-

content/uploads/2011/02/8d9faee7812d35a58cee3d92d2df2f25.pdf. Acesso em

21.10.2019.

7 Relatório Justiça em Números 2018. Disponível em https://www.cnj.jus.br/wp-

content/uploads/2011/02/8d9faee7812d35a58cee3d92d2df2f25.pdf. Acesso em

21.10.2019.

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E o mesmo quadro se passou nos Juizados Especiais

Federais em 2017, pois quatro dos cinco assuntos mais

abordados nos JEFs em 2017 estavam também relacionados ao

direito previdenciário8: 1º) auxílio-doença (394.972 - 4,85%);

2º) aposentadoria por invalidez 259.449 (3,18%); 4º) benefício

assistencial (119.593 - 1,47%); 5º) aposentadoria por idade

(117.233 - 1,44%).

Para se ter uma melhor compreensão do problema a ser

enfrentado, só no ano de 2017 ingressaram 29,1 milhões de

novos processos no Poder Judiciário e, como visto, a previdência

social é parte significativa neste cenário. Naquele ano, somente

12,1% dos processos foram resolvidos por meio da conciliação.

Não obstante o CPC/2015 obrigar a realização de audiência

prévia de conciliação e mediação, salvo se todas as partes não a

desejarem, a conciliação aumentou em somente 1% nos dois

anos subsequentes a entrada em vigor do novo código.9

Atualmente, segundo o INSS, a Autarquia é demandada

em 7 mil ações judiciais por dia. Segundo o CNJ, 48% das ações

atuais, em 2019, que tramitam na Justiça Federal, possuem

natureza previdenciária.

De acordo com o CJF, o INSS é o maior litigante da

Justiça Federal, mas não é o maior perdedor, pois vence 55% no

JEF e 70% nos Tribunais Superiores. O custo de uma ação

judicial, em média, é de R$ 3.800,00.

Diante desse cenário de constantes reformas da

legislação previdenciária, nas leis e na Constituição, e do

estoque de conflitos já existentes nessa seara, este estudo almeja

delimitar as alterações legislativas mais relevantes e o impacto

dessas mudanças no processo administrativo previdenciário,

8 Relatório Justiça em Números 2018. Disponível em https://www.cnj.jus.br/wp-

content/uploads/2011/02/8d9faee7812d35a58cee3d92d2df2f25.pdf. Acesso em

21.10.2019.

9 Relatório Justiça em Números 2018. Disponível em https://www.cnj.jus.br/wp-

content/uploads/2011/02/8d9faee7812d35a58cee3d92d2df2f25.pdf. Acesso em

21.10.2019.

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bem como entabular procedimentos que colaborem para uma

satisfatória resolução das demandas previdenciárias, que tendem

a aumentar com o combate à fraude, caso não se adotem

mecanismos de atenuação das querelas no próprio processo

administrativo previdenciário.

Nesse sentido, serão apresentadas logo adiante as

principais alterações da legislação, tanto no âmbito do direito

material quanto no direito processual previdenciários, com o

intuito de combater as fraudes, assim como as formas mais

adequadas para resolver os iminentes conflitos na seara

previdenciária, especialmente com a autocomposição

extrajudicial desses.

1. DAS ALTERAÇÕES NORMATIVAS COMO SUPEDÂNEO

PARA POSSÍVEIS AJUIZAMENTOS

1.1 PRINCIPAIS ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI DO

COMBATE ÀS FRAUDES (LEI Nº 13.846/19)

As recentes reformas da legislação previdenciária trou-

xeram várias repercussões em diversos institutos do direito pre-

videnciário brasileiro, tanto no âmbito do direito material previ-

denciário quanto no âmbito do direito processual previdenciário.

A lei nº 13.846/19, acertadamente, buscando combater as

irregularidades na concessão dos benefícios e evitar gastos des-

cabidos por concessões indevidas, implementou o Programa Es-

pecial para Análise de Benefícios com Indícios de Irregulari-

dade, com a finalidade de investigar processos que possuam in-

dícios de irregularidade e potencial risco de realização de gastos

indevidos na concessão de benefícios administrados pelo INSS.

10

10 Art. 1º, I, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 07.11.2019.

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RJLB, Ano 6 (2020), nº 1________919_

Já era passada a hora de se combater a fraude à previdên-

cia social no Brasil e a lei nº 13.846/19 veio nesse sentido, o que

é digno de registro, merecendo os aplausos de todos aqueles que

lutam, incansavelmente, contra a corrupção e todo e qualquer

tipo de fraude neste país, mormente aqueles que laboram corri-

queiramente junto ao INSS, aos Juizados Especiais Federais, à

Justiça Federal, ao Conselho de Recursos da Previdência Social

(CRPS) e aos que enfrentam o desafio de buscar, licitamente, os

benefícios previdenciários a que têm direito.

Noticiários da imprensa e o dia a dia da vivência previ-

denciária mostram, cotidianamente, que variados tipos de frau-

des vêm sendo cometidos contra a previdência social e, logo

abaixo, apresentar-se-á, sucintamente, algumas novidades trazi-

das com as recentes alterações da legislação previdenciária com

o fito de combatê-las.

1.1.1 DAS REVISÕES DOS BENEFÍCIOS ATIVOS

A citada lei implementou o Programa de Revisão de Be-

nefícios por Incapacidade, com o fim de revisar os benefícios

por incapacidade mantidos sem perícia pelo INSS por período

superior a 6 (seis) meses e que não possuam data de cessação

estipulada ou indicação de reabilitação profissional11, tendo

esse programa duração até 31.12.2020, podendo ser prorrogado

até 31.12.2022. 12

Essa medida é extremamente salutar e certamente aju-

dará a combater as fraudes. Pessoas em gozo de saúde plena vêm

recebendo auxílios-doença e aposentadorias por invalidez. Du-

rante muito tempo, pela ausência de perícias regulares por parte

11 Art. 1º, II, a, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 07.11.2019.

12 Art. 1º, § 2º, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 07.11.2019.

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do INSS, muitos indivíduos obtinham o benefício por invalidez

permanente (aposentadoria por invalidez) ou invalidez temporá-

ria (auxílio-doença), seja judicial ou administrativamente, e con-

tinuavam recebendo, mesmo que a condição de invalidez (per-

manente ou temporária) não mais existisse.

Conforme mencionado acima, os benefícios por

invalidez representaram mais da metade (51,41%) de todos os

benefícios pagos pela previdência social, razão pela devem ser

observados com uma lupa especial. Nesse cenário, com a

finalidade de fazer um “pente fino” nesses benefícios

concedidos, foi determinado o acompanhamento por peritos

médicos de processos judiciais13.

1.1.2 A IMPLANTAÇÃO DO BÔNUS POR ANÁLISE DE

PROCESSOS E POR PERÍCIA MÉDICA

Interessante ressaltar que a lei nº 13.846/19 criou dois

bônus para os servidores que atuarem nesses Programas, quais

sejam: 1) por análise de benefícios com indícios de

irregularidade; e 2) por perícia médica em benefícios por

incapacidade. 14

Esses bônus foram instituídos até 31 de dezembro de

2020, podendo ser prorrogados, ficando a prorrogação, entre-

tanto, condicionada à implementação de controles internos que

mitiguem os riscos de concessão de benefícios irregulares, ou

seja, os bônus somente continuarão se, e somente se, diminuírem

os riscos de concessões irregulares. 15

A seleção de processos a serem analisados priorizará os

13 Art. 1º, § 4º, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 07.11.2019.

14 Art. 2º, I e II, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 07.11.2019.

15 Art. 2º, § 2º, lei 13.846/19

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RJLB, Ano 6 (2020), nº 1________921_

benefícios mais antigos16 e o servidor do INSS receberá um

bônus correspondente ao montante de R$ 57,50 (cinquenta e sete

reais e cinquenta centavos) por processo integrante o programa

devidamente concluído, porém somente será pago se as análises

dos processos não gerarem prejuízo às atividades regulares do

cargo que ocupa17, não sendo cumulável com o pagamento de

hora extra ou adicional noturno concernente à mesma hora de

trabalho 18.

Por sua vez, o perito médico receberá um bônus de

R$ 61,72 (sessenta e um reais e setenta e dois centavos) por pe-

rícia extraordinária realizada, também não sendo cumulável com

o pagamento de hora extra ou adicional noturno atinente à

mesma hora de trabalho19.

Tais bônus visam recompensar tanto os servidores da au-

tarquia previdenciária quanto os seus peritos médicos, fomen-

tando uma cultura de produtividade no serviço público federal,

a exemplo do que já ocorre na Receita Federal, com o bônus de

eficiência e produtividade, e na Advocacia-Geral da União, com

os honorários advocatícios.

1.1.3 A CRIAÇÃO DA PENSÃO TEMPORÁRIA POR

MORTE

Outra inovação que merece ser evidenciada é a criação

da pensão temporária por morte. Com essa nova previsão, o ex-

16 Art. 3º, § 3º, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 08.11.2019.

17 Art. 4º, caput e § 1º, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 08.11.2019.

18 Art. 5º, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 08.11.2019.

19 Art. 11, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 08.11.2019.

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cônjuge ou o ex-companheiro(a) receberá a pensão por morte

pelo período que resta da pensão alimentícia fixada em juízo.

Anteriormente, uma ex-companheira com mais de 44

anos, recebedora de pensão alimentícia, caso o ex-companheiro

falecesse, ganharia a pensão por morte pelo resto da vida. Com

base na nova lei, ela somente faria juz à pensão pelo período

remanescente da pensão alimentícia estabelecida por determina-

ção judicial20.

1.1.4 DA COMPROVAÇÃO DE VIDA

Para se evitar pagamentos de benefícios em conta de

indivíduos já falecidos, exigir-se-á que o beneficiário faça

anualmente a comprovação de vida nas instituições financeiras,

mediante identificação por um funcionário da instituição. Não

era incomum o pagamento de benefícios em conta de pessoas já

falecidas. Muitas vezes, quando o INSS percebia o pagamento

indevido, o dinheiro já havia sido sacado por um parente que

tinha a posse do cartão de saque e a recuperação desse montante

era muito difícil, pois o fraudador muitas vezes não possuía bens

ou renda para restituir tal valor.

Uma importante medida trazida pela lei é a ressalva que

ela faz em relação às pessoas idosas acima de 80 (oitenta) anos

ou com dificuldade de locomoção. Para esses indivíduos, o INSS

utilizará meios adequados para que o beneficiário realize a

comprovação de vida, dentre eles a realização de pesquisa

externa21.

1.1.5 DA IMPOSSIBILIDADE DE INSCRIÇÃO POST

MORTEM

20 Art. 222, III, § 5º, lei 8.213/91, acrescentado pela lei nº 13.846/19.

21 Art. 23, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 10.11.2019.

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RJLB, Ano 6 (2020), nº 1________923_

Na trilha do combate à fraude, a inscrição post mortem

do segurado contribuinte individual e de segurado facultativo

não será admitida, isso para evitar que pessoas inscrevam o(a)

falecido(a) após o óbito com a finalidade de pleitar benefícios

previdenciários (ex: pensão por morte)22.

1.1.6 ESTIPULAÇÃO DE CARÊNCIA PARA A

CONCESSÃO DE AUXÍLIO-RECLUSÃO

Além disso, estipulou-se o prazo de carência para

recebimento do benefício de auxílio-reclusão em 24 (vinte e

quatro) contribuições mensais, enquanto anteriormente inexistia

qualquer prazo de carência.

1.1.7 PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO E

CARÊNCIA APÓS A NOVA FILIAÇÃO

Na hipótese de perda da qualidade de segurado, para que

tenha direito ao benefício de auxílio-doença, salário-

maternidade, aposentadoria por invalidez e auxílio-reclusão, o

segurado deverá contar com metade do período de carência

exigido para a concessão do benefício.

Assim, por exemplo, aquele que perdeu a qualidade de

segurado e encontra-se inválido temporariamente, necessitanto

de auxílio-doença, deverá contar com, no mínimo, 6

contribuições mensais a partir da data da nova filiação à

Previdência Social.

1.1.8 AÇÕES REGRESSIVAS EM CASO DE NEGLIGÊNCIA

QUANTO ÀS NORMAS DE SEGURANÇA DO TRABALHO

E DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A

22 Art. 23, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 10.11.2019.

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MULHER

No que tange às ações regressivas, para se buscar a

restituição do que fora pago pelo INSS a título de benefício, a

lei 13.846/19 prescreveu que a Previdência Social ajuizará ação

regressiva contra os responsáveis nos casos de: I - negligência

em relação às normas padrão de segurança e higiene do trabalho;

II - violência doméstica e familiar contra a mulher. Ademais, o

pagamento de benefícios pela autarquia previdenciária em

decorrência desses casos não exclui a responsabilidade civil da

empresa ou do responsável pela violência doméstica e

familiar, respectivamente23.

Outra primordial previsão trazida pela lei em comento foi

a de que o servidor responsável pelas revisões dos benefícios

responderão pessoalmente por suas decisões ou opiniões

técnicas, devidamente motivadas, apenas na hipótese de dolo ou

erro grosseiros24, o que permite uma maior tranquilidade para

que os servidores do INSS cumpram seu papel sem o receio

apontado em pesquisa de campo realizada neste estudo.

1.2 PRINCIPAIS ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA RE-

FORMA PREVIDENCIÁRIA COM A EC Nº 103/19

Abaixo, sinteticamente, algumas alterações que podem

gerar demanda de ações diretas de inconstitucionalidades:

1- Regras de acumulação entre aposentadorias e pensões e a

questão da fonte de custeio antecipada, do §5º do artigo 195,

garantidora da contrapartida dos benefícios.

2- A abrupta saída das doenças graves (lista do Ministério da

23 Art. 23, lei 13.846/19, alterando os artigos 120 e 121 da Lei nº 8.213/19. Disponível

em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm.

Acesso em 10.11.2019.

24 Art. 23, lei 13.846/19, acrescentando o artigo 124-C à Lei nº 8.213/19. Disponível

em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm.

Acesso em 10.11.2019.

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Saúde) como implicação ao pagamento do benefício de

100% da médias das remunerações nos benefícios por

ncapacidade permanente.

3- A questão da razoabilidade, proporcionalidade e critérios

para a instituição das contribuições extraordinárias para

equacionamento de déficits e o descompasso com a má-

gestão causadora do desequlíbrio.

4- Ausência de trato constitucional, com a revogação do § 13º

do artigo 195 da CF, para as novas desonerações para

contratações de jovens de 18 a 29 anos.

5- As polêmicas de lei complentar vindoura sobre as atividades

especiais em exposição perigosa potencial e as demais

atividades que ficarão de fora do contexto protetivo, e, ainda,

o entrechoque que voltará à baila sobre enquadramento por

exposição ou atividade. Haverá ciranda de pressão política

de categorias para os novos enquadramentos em atividade.

O que a Reforma (EC nº 103/19) deixou passar?

6- O triplo cálculo retrocedente no cômputo da nova pensão

por morte: 1) média de todo o período e não mais dos 80%

maiores salários de contribuição; 2) a renda mensal inicial

de 60% mais 2% a cada ano que superar 20 anos de

contribuição (sem diferenciação de gênero) e não mais os

100% da aposentadoria que o instituidor recebia ou 100%

sobre uma pretensa aposentadoria por invalidez; 3) E a

divisão a la OCDE (europealização brasileira) das cotas em

10% para cada dependente, sem retorno ao montante para a

redivisão entre os dependentes existentes, quando da perda

da qualidade de um deles, e não mais a divisão equânime

entre todos, com permanência dos 100% até o último

dependente da classe.

7- Entre muitos outros questionamentos que criarão o novo

buraco previdenciário: o verde e amarelo. A exemplo do

buraco negro, buraco verde, teremos agora o buraco verde e

amarelo nas lacunas entre a EC 103/91 e as normatizações,

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nem que seja em relação às alterações no Decreto nº

3048/99, que só serão publicadas em 2020, ou até mesmo em

relação à vindoura lei complementar e os descompassos com

os atuais dispositivos de lei. Viva o Brasil!

Enfim, as reformas produzirão enxurradas de ações judi-

ciais para o reclame dos direitos dos segurados e dependentes,

quer amparados pela Carta Maior, cujo cenário seria de incons-

titucionalidade de dispositivo da EC nº 103/19, ou mesmo ilega-

lidade, inconstitucionalidade ou interpretação diversa em face

das leis que ocasionaram a mini-reforma previdenciária.

Sabe-se que Tribunais Administrativos não decidem por

inconstituionalidades ainda não declaradas e pacificadas judici-

almente, somente havendo repercussões gerais definitivas, sú-

mulas vinculantes ou ações diretas definitidas, também, no con-

trole concentrado. Assim é para o Conselho de Recursos da Pre-

vidência Social (CRPS).

Mas no esteio das interpretações em face de normas in-

fraconstitucionais, as tais leis de mini-reformas e decretos, ca-

bem julgos diante de lacunas. E será nessa esteira que o CRPS

travará seus debates, quer contra o entendimento de beneficiá-

rios, quer a favor deles: sempre no ideário da justiça equitativa:

a social e a econômica – lado a lado.

2. O IMPACTO DAS REFORMAS LEGISLATIVAS PREVI-

DENCIÁRIAS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO PREVI-

DENCIÁRIO

Com tantas mudanças, certamente o processo adminis-

tratativo previdenciário será impactado em diversos aspectos,

mormente em relação à produção de provas por parte do reque-

rente, aos prazos de defesa, a estipulação do prescricional para

os menores de 16 anos, dentre outros, conforme se verá logo à

frente.

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2.1 DO IMPACTO NA PRODUÇÃO DE PROVAS

A produção de provas no processo administrativo previ-

denciário sofreu alterações significativas com as recentes altera-

ções legislativas trazidas pela lei nº 13.846/19. A primeira alte-

ração marcante trata da exigência de prova documental para a

comprovação da união estável ou a condição de dependente para

fins de obtenção de pensão por morte, sob pena de indeferimento

do pleito.

A partir de agora, para se comprovar a união estável ou a

dependência econômica será exigido início de prova material.

Além disso, os documentos que lastrearão o início de prova ma-

terial devem ser contemporâneos aos fatos e produzidos em pe-

ríodo não superior a 24 (vinte e quatro) meses anteriores ao fa-

lecimento, exceto na existência de caso fortuito ou força

maior25. Na mesma trilha, tal exigência probatória foi estendida

aos benefícios de auxílio-reclusão, pois também neste caso o iní-

cio de prova material deve ser produzido em período não supe-

rior a 24 (vinte e quatro) meses anteriores ao recolhimento à pri-

são do segurado26.

Como se sabe, a união estável por período menor do que

2 anos tem uma importante influência no prazo de recebimento

da pensão por morte, haja vista que nesse caso (união estável

inferior a 2 anos) o(a) companheiro(a) recebe por apenas 4

(quatro) meses o benefício, independentemente de sua idade. A

partir de agora, para que possa receber a pensão por morte por

um período maior, de acordo com a sua idade, o requerente do

benefício deverá apresentar início de prova material

contemporânea dos fatos, produzidos em período não superior a

25 Art. 24, lei 13.846/19, acrescentando o § 5º ao artigo 16 da Lei nº 8.213/19.

Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-

2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso em 11.11.2019.

26 Art. 24, lei 13.846/19, acrescentando o § 5º ao artigo 16 da Lei nº 8.213/19.

Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-

2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso em 11.11.2019.

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24 meses, não podendo se valer somente de prova

testemunhal27.

Dessa maneira, fica afastada a possibilidade de compro-

vação da união estável ou da dependência econômica com base,

exclusivamente, em prova testemunhal. Trata-se, pois, de uma

tarifação de provas, tornando-se a prova documental um pré-re-

quisito para a aceitação da prova testemunhal, não obstante o

fato de que o próprio Código Civil pátrio28 não estipulou tal

condição para a caracterização da união estável, muito menos a

Carta Política vigente29.

Cumpre ressaltar que a comprovação de dependência

econômica é presumida no caso de filhos não emancipados, de

qualquer condição, menores de 21 (vinte e um) anos ou inválidos

ou que tenham deficiência intelectual ou mental ou deficiência

grave; cônjuge e comanheiros(as)30.

Destarte, no que concerne especificamente à dependên-

cia econômica, somente sofrerão impacto com as novas medidas

os demais dependentes, quais sejam: os pais e o irmão não eman-

cipado menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha

deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave31.

Uma alteração que também merece destaque é a relativa

à prova da qualidade de segurado especial. A partir de

01.01.2023, a única maneira de se comprovar o exercício de ati-

vidade rural será o Cadastro Nacional de Informações Sociais

(CNIS), que será atualizado anualmente32. Nesse novo cenário,

27 Art. 23, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 10.11.2019.

28 Art. 1.723, Código Civil: “É reconhecida como entidade familiar a união estável

entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura

e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.

29 Art. 226, § 3º, Constituição Federal: “Para efeito da proteção do Estado, é

reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar,

devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.

30 Art. 16, I, lei 8.213/91.

31 Art. 16, II e III, lei 8.213/91.

32 Art. 38-B, § 1º, lei 8.213/91, acrescentado pela lei nº 13.846/19.

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RJLB, Ano 6 (2020), nº 1________929_

as declarações dos sindicatos rurais perderão a eficácia como

meio de prova do labor rural.

Até lá (01.01.2013), o trabalhador rural, segurado espe-

cial, comprovará o tempo de exercício da atividade rural medi-

ante autodeclaração confirmada por entidades públicas creden-

ciadas e por órgãos públicos33.

No que pertine ao Benefício de Prestação Continuada

(BPC), estabeleceu-se como requisitos probatórios para a con-

cessão, a manutenção e a revisão desse benefício as inscrições

no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e no Cadastro Único para

Programas Sociais do Governo Federal - Cadastro Único34.

2.2 DOS CRITÉRIOS PARA SELEÇÃO DOS PROCESSOS

COM POTENCIAL RISCO DE IRREGULARIDADE

Para que os servidores do INSS realizem esse importante

papel de combate às fraudes, serão considerados processos com

indícios de irregularidade aqueles com potencial risco de despe-

sas indevidas, utilizando-se os seguintes parâmetros35: i) sus-

peita de acúmulo indevido de benefícios (ex: duas pensões por

morte de ex-companheiros falecidos) apontada pelo TCU ou

pela CGU; ii) pagamento indevido de benefícios (ex: pagamento

de aposentadoria rural a trabalhador urbano) indicado pelos

mencionados órgãos; iii) processos identificados na Força-Ta-

refa Previdenciária, composta pelo MPF, pela Polícia Federal e

pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério

da Economia; iv) suspeita de óbito do beneficiário (ex: paga-

mento de aposentadoria à pessoa já falecida); v) benefício de

prestação continuada com indícios de irregularidade (Ex: con-

cessão de benefício de prestação continuada a indivíduo com

33 Art. 38-B, § 2º, lei 8.213/91, acrescentado pela lei nº 13.846/19.

34 Art. 20, § 12, lei nº 8.742/93, incluído pela lei nº 13.846/19.

35 Art. 8ºm lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 08.11.2019.

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renda familiar per capta de R$ 5.000,00); vi) processos tidos

como irregulares pela autarquia previdenciária, com a motivação

devida; vii) benefícios pagos em valores superiores ao teto do

RGPS (Ex: aposentadoria híbrida com valor de R$ 9.500,00).

Por seu lado, os peritos médicos do INSS deverão focar

suas perícias extraordinárias36: i) nos benefícios por

incapacidade mantidos sem perícia pelo autarquia por período

superior a 6 (seis) meses e que não contenham data de cessação

assinalada ou sugestão de reabilitação profissional; ii) nos

benefícios de prestação continuada que não sofreram revisão a

mais de 2 (dois) anos; iii) outros benefícios de caráter

previdenciário, tributário, trabalhista ou assistencial.

2.3 DO PRAZO DECADENCIAL PARA A REVISÃO DE BE-

NEFÍCIOS

Outra novidade foi a atinente ao prazo de decadência. A

legislação anterior estipulava o prazo decadencial de dez anos

para todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário

para a revisão do ato de concessão de benefício37.

O novo dispositivo legal afirma agora que o prazo deca-

dencial de 10 (dez) anos do direito ou da ação do segurado ou

beneficiário para a revisão do seu benefício não se limita apenas

ao ato de concessão, como outrora, estendendo-se agora aos atos

de indeferimento, cancelamento ou cessação de benefício e aos

atos de deferimento, indeferimento ou não concessão de revisão

de benefício38.

2.4 DO PRAZO PRESCRICIONAL PARA O MENOR DE 16

36 Art. 10, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 08.11.2019.

37 Art. 103, lei 8.213/91 (revogado)

38 Art. 103, lei 8.213/91, com redação dada pela lei nº 13.846/19.

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RJLB, Ano 6 (2020), nº 1________931_

ANOS

Uma modificação que também trará impacto ao processo

administrativo previdenciário é o estabelecimento de prazo de

prescrição para o menor de 16 (dezesseis) anos no que se refere

ao benefício de pensão por morte.

De agora em diante, o menor de 16 (dezesseis) anos terá

o prazo de 180 dias para requerer a pensão por morte para que o

recebimento retroaja à data do óbito. Caso contrário, esse menor

receberá o referido benefício a partir da data do requerimento

administrativo. Para os demais, o prazo para que o pagamento

retroceda à data do falecimento será de 90 (noventa) dias39.

2.5 PRAZO DECADENCIAL DE 180 DIAS PARA O SALÁ-

RIO-MATERNIDADE

A Medida Provisória 871/19 chegou a prever o prazo de-

cadencial de 180 dias, contados a partir do parto ou da adoção,

para que a segurada pleiteasse o seu benefício de salário-mater-

nidade, salvo motivo de força maior ou de caso fortuito. No en-

tanto, quando da conversão na lei 13.846/19, esse dispositivo foi

retirado do texto. Assim, neste caso, tudo continua como era an-

tes.

2.6 DO PRAZO PARA DEFESA EM DOBRO PARA OS TRA-

BALHADORES RURAIS – SEGURADOS ESPECIAIS.

Dispõe a nova lei que, constatados indícios de

irregularidade ou erros materiais na concessão de um

determinado benefício, o INSS noficará o beneficiário, o seu

representante legal ou o seu procurador para, querendo,

apresentar defesa, documentos ou quaisquer provas dos quais

contar, no prazo de 30 dias – quando se tratar de trabalhador

39 Art. 219, I, lei 8.213/91, com redação dada pela lei nº 13.846/19.

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urbano – e de 60 dias – quando se tratar de segurado especial,

agricultor familiar ou trabalhador rural individual e avulso40.

Não havendo a apresentação de defesa no prazo

estabelecido ou sendo esta considerada insuficiente ou

improcedente pelo INSS, o benefício será suspenso41 e o INSS

notificará o beneficiário da suspensão, concedendo-lhe 30

(trinta) dias para interposição de peça recursal. Caso não o

beneficiário não interponha o recurso, o benefício será cessado.

2.7 DO ACESSO A DADOS MÉDICOS DOS

BENEFICIÁRIOS DE BPC PELO INSS

O INSS passará a ter acesso, por imperativo legal, a

registro e prontuários médicos do SUS, administrados pelo

Ministério da Saúde, bem como a documentos médico mantidos

por entidades públicas e privadas, sendo necessário para estas

últimas a celebração de convênio para que o acesso seja

assegurado42.

Deve-se alertar, contudo, que apenas os peritos médicos

federais apontados pelo INSS poderão ter acesso aos

documentos acima aludidos, devendo ser preservados a

integridade e o sigilo dos dados acessados pela autarquia

previdenciária.

2.8 DESCONTO DE PAGAMENTOS INDEVIDOS E

INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA

Poderão ser descontados os pagamentos de benefício

40 Art. 23, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 10.11.2019.

41 Art. 23, lei 13.846/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 10.11.2019.

42 Art. 124-B, II e III, lei 8.213/91, com redação dada pela lei nº 13.846/19.

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RJLB, Ano 6 (2020), nº 1________933_

previdenciário ou assistencial realizados indevidamente, seja na

seara administrativa ou judicial, mesmo na hipótese de cessação

do benefício pela revogação de decisão judicial, em montante

que não supere 30% do valor do benefício recebido43.

Ademais, serão inscritos em dívida ativa pela

Procuradoria-Geral Federal os créditos constituídos pelo INSS

em razão de benefício previdenciário ou assistencial pago

indevidamente ou além do devido, mesmo na hipótese de

cessação do benefício pela revogação de decisão judicial44.

2.9 DAS NOVAS ATRIBUIÇÕES DO CONSELHO DE

RECURSO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

No que diz respeito ao Conselho de Recursos da

Previdência Social, a lei nº 13.846/19 atribuiu a esse órgão a

competência para julgar: I - recursos das decisões do INSS nos

processos de interesse dos beneficiários; II - contestações e

recursos relativos à atribuição, pelo Ministério da Economia, do

Fator Acidentário de Prevenção aos estabelecimentos das

empresas; III - recursos das decisões do INSS relacionados à

comprovação de atividade rural de segurado especial45.

E, ainda, com os ditames da Lei nº 13.876/19, incluindo

o inciso IV no artifo 126 da Lei nº 8.213/91: os recursos de

processos relacionados à compensação financeira de que trata a

Lei nº 9.796/96 e à supervisão e à fiscalização dos regimes

próprios de previdência social de que trata a Lei nº 9.717/98.

O CRPS passa a ter tripla atribuição em análise recursal

e de contestação: previdência prestacional do RGPS, Fator

Acidentário de Prevenção e RPPS.

Diante de tantas novidades em relação às normas,

43 Art. 115, II, lei 8.213/91, com redação dada pela lei nº 13.846/19.

44 Art. 115, § 3º, lei 8.213/91, com redação dada pela lei nº 13.846/19.

45 Art. 23, lei 13.846/19, alterando o artigo 126 da Lei nº 8.213/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 10.11.2019.

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_934________RJLB, Ano 6 (2020), nº 1

certamente os conflitos previdenciários aumentarão e soluções

adequadas para enfrentar a questão e mitigar as controvérsias no

âmbito da previdência social se fazem necessárias, devendo-se

valorizar a autocomposição extrajudicial desses conflitos, forta-

lecendo-se o Conselho de Recursos da Previdência Social, con-

forme adiante será demonstrado.

3. O EMPREGO DE MÉTODOS ALTERNATIVOS DE

SOLUÇÃO DE CONFLITOS NO PROCESSO

ADMINISTRATIVO PREVIDENCIÁRIO, À LUZ DO

ATUAL CPC, DIANTE DO NOVO CENÁRIO

Diante de tamanhas mudanças, que certamento trarão

forte impacto nos direitos dos segurados, e da já elevada

litigiosidade das matérias previdenciárias - representando 48%

das novas demandas submetidas à Justiça Federal – novas

medidas devem ser adotadas com a finalidade de mitigar o

processo de judicialização das demandas previdenciárias e de

incentivar a desjudicialização desses conflitos.

Nesse novo quadro que se apresenta, o princípio da

razoável duração do processo administrativo previdenciário

pode ser concretizado com o emprego de técnicas alternativas

de resolução dos conflitos, mormente nas questões que versem

sobre direitos fundamentais, a exemplo dos benefícios

previdenciários.

Nessa toada, devem ser estimulados métodos

alternativos de solução das controvérsias, tais como: arbitragem,

conciliação e mediação. Para tanto, o próprio legislador estendeu

tais métodos à Administração Pública por meio da Lei nº

13.140/15, prescrevendo a mediação como meio de solução de

conflitos e dispondo acerca da autocomposição de conflitos no

âmbito da administração pública, especialmente a ligada à

previdência social, tradicionalmente envolvida em grande parte

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RJLB, Ano 6 (2020), nº 1________935_

dos conflitos levados à Justiça Federal46.

A lei nº 13.140/15, que dispõe sobre a mediação entre

particulares como meio de solução de controvérsias e a

autocomposição de conflitos no âmbito da administração

pública escancarou, finalmente, a possibilidade da

administratação pública previdenciária adotar tal método para

solução dos conflitos previdenciários.

Na mesma toada, o CPC/15 determinou que os tribunais

adotem as diligências necessárias para a criação de “centros

judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela

realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e

pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar,

orientar e estimular a autocomposição”47.

Neste contexto, deve a administração pública

previdenciária, utilando-se dos parâmetros entabulados pelo

CPC/15, fomentar a criação de câmaras previdenciárias de

mediação e conciliação no âmbito extrajudicial, valorizando os

órgãos administrativos previdenciários, especialmente o

Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS), conforme

se demonstrará adiante.

E, neste sentido, a MP 891/19, em seu relatório

preliminar tentou alçar essa condição de composição paritária ao

CRPS, para suas Juntas de Recursos (1ª instância). Os

Conselheiros serão Conselheiros mediadores ou árbitros (a

depender da concordância na assinuatura pelos beneficiários

recorrentes da cláusula arbitral – em que as decisões definitivas

arbitradas proibem o ajuizamento de ações para ambas as partes

– Modelo do Tribunal de Estado francês).

Vejam-se os novos artigos que acabaram por sair do

relatório, diante de insistência imotivada e claudicante da

oposição governista, conforme informações:

46 Disponível em https://www.cnj.jus.br/wp-

content/uploads/2019/09/3e4bc8c071d1c8851b140ed30e4c97ef.pdf. Acesso em

10.10.2019.

47 Art. 165 do CPC/15.

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Art. 126-A. O CRPS poderá fazer uso do procedimento arbitral

previsto na Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, na forma

prevista no Regulamento.

Art. 126-B. Aplica-se ao CRPS, no que couber, o incidente de

resolução de demandas repetitivas previsto nos arts. 976 a 987

do Código de Processo Civil, na forma prevista em Regula-

mento.

Mas o CRPS e a Secretaria de Previdência irão insistir no

modelo, que, alías, inclui a proposta de Incidente de Resolução

de Demandas Repetitivas Administrativo, com a suscitação do

IRDR pela Câmara de Julgamento, suspendendo-se os recursos

em curso, da mesma matéria e objeto, em todas as Unidades

Julgadoras, e com a consequente decisão final em Conselho

Pleno, espalhar-se-ão reflexos terminativos nesses processos

suspensos.

Esses procedimentos recursais administrativos trarão

modernidade aos processos no CRPS, com celeridade e eficácia.

3.1 O CONSELHO DE RECURSOS DA PREVIDÊNCIA

SOCIAL E A AUTOCOMPOSIÇÃO EXTRAJUDICIAL DAS

DEMANDAS PREVIDENCIÁRIAS

A lei nº 13.846/19, como já apontado anteriormente,

atribuiu ao Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS),

órgão colegiado subordinado ao Ministério da Economia, a

competência para julgar: I - recursos das decisões do INSS nos

processos de interesse dos beneficiários; II - contestações e

recursos relativos à atribuição, pelo Ministério da Economia, do

Fator Acidentário de Prevenção aos estabelecimentos das

empresas; III - recursos das decisões do INSS relacionados à

comprovação de atividade rural de segurado especial48.

O CRPS conta, atualmente, com um Conselho Pleno, 4

48 Art. 23, lei 13.846/19, alterando o artigo 126 da Lei nº 8.213/19. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm. Acesso

em 10.11.2019.

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Câmaras de Julgamento e 29 Juntas de Recursos (com 16

Composições Adjuntas). O primeiro tem como atribuições,

dentre outras, uniformizar, em tese, a jurisprudência do CRPS

mediante Enunciados com efeito vinculante; uniformizar, no

caso concreto, mediante Resolução, as divergências

jurisprudenciais entre as Juntas de Recursos nas matérias de

alçada, ou entre as Câmaras de Julgamento em sede de Recurso

Especial49.

Com a aprovação das competências recursais e de análise

de contestações do FAP e das infrações impostas às irregulares

compensações entre regimes previdenciários dos entes

federativos, ao descumprimento de normas gerais de RPPS (Lei

nº 9.717/98), ao irregular ajuste atuário nos regimes

previdenciários dos entes, às irregularidades de custeio dos

fundos previdenciários dos entes, bem como no tocante aos

investimentos dos recursos do fundo previdenciário do ente,

caberá recurso administrativo ao CRPS.

Diante dessas novas atribuições, criaram-se mais 4

Juntas de Recursos, 2 para o FAP e duas para o RPPS, além de

mais duas novas Câmaras de Julgamento, 1 para o FAP e outra

para o RPPS. Elas estarão constando nas alterações do Decreto

nº 3.048/99, em breve publicação.

As Câmaras de Julgamento, por sua vez, devem julgar,

em segunda instância, os recursos especiais contra as decisões

proferidas pelas Juntas de Recurso e realizar o juízo de

admissibilidade do Pedido de Uniformização de caso concreto.

Já as Juntas de Recurso tem, dentre uma de suas competências,

a atribuição de julgar, em primeira instância, os recursos

ordinários interpostos contra as decisões prolatadas pelo

INSS50.

Como se percebe, o papel do CRPS no contencioso

49 O novo CRPS. In: Secretaria Especial da Previdência e Trabalho. Secretaria de

Previdência. Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS. 2019, p. 10.

50 O novo CRPS. In: Secretaria Especial da Previdência e Trabalho. Secretaria de

Previdência. Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS. 2019, p. 9.

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administrativo está bem delimitado. O CRPS conta com 342

servidores administrativos e mais de 600 Conselheiros (sem

contar com os novos do FAP e do RPPS) e obteve a nomeação

de mais 83 em 1º de agosto de 2019 e mais de 50 em dezembro

do mesmo ano.

Contava o CRPS com 55 Assessores Técnicos Médicos

para emitir pareceres em milhares de recursos de matéria

médica, mas com a quantidade expressiva de processos em

estoque, a decisão foi pela devolução dos Peritos Médicos

Federais (PMF) para a Sub-Secretaria de Perícias Médicas, para

que os mais de 3 mil PMFs laudassem os pareceres em sede de

recusros nas Juntas, ganhando a celeridade desejada (centenas e

milhares de mandados de segurança51, ações civis públicas e

inquérios civis públicos, reclamações na Ouvidoria do

Ministério da Economia reclamaram em face da letargia dos

julgamentos de matéria médica no CRPS – essa foi a solução

encontrada e que acabará por “zerar” o passivo recursal em

estoque – resta-nos analisar os números de concessões ou não.

Tal quadro técnico, considerando o ano-base 2019, ficou

responsável por 647.608 processos (Juntas de Recursos) e

63.394 processos (Câmaras de Julgamento), totalizando 716.602

processos administrativos52. Esse era o quantitativo de fevereiro

de 2019. Mas em novembro de 2019, o CRPS contava com 1,6

milhão de recursos em estoque para julgamento, sendo 78% de

matéria médica (auxílio-doença, aposentadoria por invalidez,

auxílio-acidente, aposentadoria especial e BPC/LOAS do

deficiente)

Repisando, o estoque de processos a cargo do CRPS, em

fevereiro de 2019, estava por volta de 800.000 processos, e

poderia ultrapassar a preocupante marca de 1 milhão até o final

51 https://alestrazzi.jusbrasil.com.br/artigos/496253197/demora-na-resposta-do-inss-

seus-problemas-acabaram.

52 O novo CRPS. In: Secretaria Especial da Previdência e Trabalho. Secretaria de

Previdência. Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS. 2019, p. 17.

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deste ano53. E ultrapassou – dobrou, como mostramos acima. E

por quê? A corrida por contagem de tempo para não ser atingido

pela Reforma e a Lei do Pente Fino.

Dessa maneira, e diante dessa nova conjuntura, seria de

todo recomendável que o CRPS adotasse as providências

cabíveis, com amparo na lei de mediação e no CPC/2015, no

sentido de implantar a mediação e a conciliação em sua

estrutura, adotando inclusive mutirões para solucionar o grave

problema do estoque de processos administrativos ainda não

julgados (cerca de 1 milhão), como já salientado acima. São os

tais dispositivos da MP 891 de 2019, que Oxalá estarão na

conversão ou em outro diploma.

Diante desse novo quadro e do estoque já existente,

permanecer com a cultura do litígio na seara administrativa já

demonstrou não ser recomendável, devendo-se adotar a cultura

dialógica, do debate e da autocomposição em sede da

Administração Pública previdenciária por diversos motivos,

dentre os quais se pode destacar: i) mitigação da excessiva

judicialização das demandas previdenciárias, reconhecida por

diversas instituições (CNJ, Conselho da Justiça Federal, INSS,

AGU, etc.), consoante apontado anteriormente; ii) redução dos

gastos públicos, evitando-se a “despesa dupla” com um único

benefício, pois a Administração Pública paga pela estrutura

previdenciária (INSS, CRPS, etc.), que muitas vezes indefere o

benefício, e depois também paga pela estrutura judicial (Justiça

Federal, Jefs, etc.) para examinar a concessão daquele mesmo

benefício; iii) diminuição do tempo de espera do segurado para

a obtenção do seu direito fundamental ao benefício; iv) melhora

da imagem do INSS perante a sociedade, hoje etiquetada como

morosa e ineficiente; v) valorização da cultura da paz em

detrimento da cultura do conflito.

Nessa toada, poderão ser criados no CRPS centros de

53 O novo CRPS. In: Secretaria Especial da Previdência e Trabalho. Secretaria de

Previdência. Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS. 2019, p. 32.

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solução consensual de conflitos previdenciários, que serão

“responsáveis pela realização de sessões e audiências de

conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas

destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição”54.

Para isso, o CRPS “poderá optar pela criação de quadro

próprio de conciliadores e mediadores, a ser preenchido por

concurso público de provas e títulos”55 ou até mesmo optar por

recrutar trabalhadores voluntários para exercerem as funções de

conciliadores e mediadores, especialmente no âmbito dos

centros jurídicos da Faculdades de Direito espalhadas pelo

país56.

Estimular uma cultura de mediação, ou seja, dar azo para

que as partes se responsabilizem e contem com suas próprias

habilidades para encarar e solucionar os atritos, as adversidades,

os problemas, poder gerar um mecanismo extremamente

eficiente para aperfeiçoar os níveis de convivência, de cortesia,

de respeito e de harmonia nas sociedades atuais, caracterizadas

por uma grande e desejável diversidade entre os indíviduos que

a integram.

Nesse sentido, utilizar o CPC/2015 como baliza e

outorgar o protagonismo devido aos órgãos administrativos da

previdência social, especialmente ao CRPS, no sentido de se

fomentar a autocomposição extrajudicial das querelas

previdenciárias, apresenta-se como o modo mais eficaz para a

almejada mitigação da judicialização dos conflitos

previdenciários, sobretudo neste novo contexto de constantes

alterações na legislação previdenciária.

Um processo no CRPS, que não possui custas

processuais, tem celeridade de julgamento até a definitividade

de até 1 ano, enquanto que o trânsito em julgado na Justiça

demora anos e anos. O processo no CRPS custa para a União o

54 Art. 165, CPC/2015.

55 Art. 167, § 6º, CPC/2015

56 Art. 169. § 1º, CPC/2015.

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RJLB, Ano 6 (2020), nº 1________941_

valor de R$ 139 sem considerar os custos com Dataprev, mas

considerando, custa cerca de R$ 145, conforme Ato Informativo

CRPS nº 01 de 2019.

A economia para o Poder Judiciário, com a

desjudicialização previdenciária voltada para o CRPS girará em

torno de R$ 40 bi em 10 anos, levando-se em conta o

encaminhamento de metade das demandas à esfera

administrativa e não à judicial, posto que o índice de reversão de

decisões do INSS pelo CRPS é de 52%57.

A Estratégia Nacional de Desjudicialização

Previdenciária58 assinada entre o Ministério da Economia e o

CNJ garante que o caminho é este. E o CRPS está no centro

dessa estratégia, pois passará a contar com forte mecanismo

processual administrativo para fazer frente ao tamanho de sua

importância para o país e os segurados que dele dependerão.

Com a estratégia e o desafio, merece o CRPS maior e melhor

estrutura administrativa, com a revalorização dos seus quadros,

novos sistemas, novos arcabouços técnicos. É o que se está

buscando. Será alcançado e o CRPS, em pouco tempo, será

modelo de Tribunal Administrativo de vanguarda (e-SisRec em

funcionamento, Conselheiros com acessos a diversos sistemas

de buscas para solução de diligências, novo e moderno

Regimento Interno, nova estrurura administrativa, inclusive com

Comitê de Ética e Conformidade, melhoria nos jetons, a criação

da Escola de Formação e Aperfeiçoamento de Conselheiros e

Servidores do CRPS, que já conta com orçamento próprio de

R$ 540 mil em emendas individuais de parlamentares, tudo para

a qualificação, a capacitação e o aperfeiçoamento dos

Conselheiros atuais e os novos ingressantes.

Esse é o cenário do Novo CRPS para 2020 em diante. A

Corte Social que permite e continuará permitindo amparo

57 https://agora.folha.uol.com.br/grana/2019/10/metade-dos-segurados-reverte-

decisao-do-inss-com-recurso.shtml

58 https://www.cnj.jus.br/estrategia-nacional-integrada-para-desjudicializacao-da-

previdencia-social/.

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previdenciário e assistencial aos beneficiários que fazem jus às

prestações, também às empresas nas relações acidentárias com

os nexos técnicos e o FAP, além da correta posição para os entes

nas relações e gestões dos fundos dos seus RPPS. O esteio da

desjudicialização previdenciária no Brasil.

CONCLUSÃO

Diante do novo panorama em que se encontra o direito

previdenciário, com alterações em seu direito material e também

processual, a autocomposição extrajudicial das contendas

previdenciárias nos moldes prescritos pelo CPC/2015, dando-se

protagonismo aos órgãos administrativos da previdência social,

mormente ao CRPS, além de possível, é de todo recomendável.

Isso porque vários benefícios serão obtidos com essa

mudança de paradigma (da judicialização para a

desjudicialização dos conflitos, dentre os quais pode-se destacar:

i) o direito fundamental previdenciário será entregue de forma

mais célere a quem o possui; ii) os custos serão reduzidos,

podendo-se adotar o trabalho voluntário, com a participação dos

núcleos de prática jurídica das universidades; iii) o elevado grau

de judicialização das demandas previdenciárias será atenuado;

iv) a imagem da administração pública previdenciária será

melhor compreendida e aceita, considerando-se a agilidade que

se implementará nas câmaras extrajudiciais previdenciárias de

mediação e conciliação para solucionar os conflitos.

Nesse caminho, o projeto de conversão da MP 891/19 ou

outro diploma, acrescentando ao artigo 126 da lei nº 8.213/91 as

alíneas “a” e “b”, já deverá contemplar a possibilidade do CRPS

realizar arbitragem e, até mesmo, processar IRDRs (Incidentes

de Resolução de Demandas Repetitivas), dando-se um grande

passo para a mitigação dos conflitos previdenciários e, por

conseguinte, para a desjudicialização desses conflitos.

Diante do exposto, pode-se concluir que as mudanças

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RJLB, Ano 6 (2020), nº 1________943_

legislativas vieram em boa hora, pois o combate à fraude é

essencial para se manter um sistema previdenciário sustentável,

mas é primordial que tais mudanças e o processo administrativo

previdenciário dêem as mãos, pois a mitigação dos conflitos e a

consequente desjudicialização buscada pelas mais importantes

instituições do país somente serão obtidas utilizando-se os meios

necessários para a solução extrajudicial das demandas

envolvendo assuntos previdenciário, bem como outorgando-se o

protagonimo devido à administração pública previdenciária para

a realização desse mister.

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