agradecimentos - repositório aberto · 2019. 6. 5. · cedh – convenção para a proteção dos...
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AGRADECIMENTOS
Há contributos de natureza diversa que não podem deixar de ser realçados. Por essa
razão, desejo expressar os meus sinceros agradecimentos:
À minha orientadora, Professora Doutora Anabela Leão, pelo aconselhamento,
disponibilidade e apoio prestados.
Aos meus pais, por todo o apoio incondicional que me têm dado ao longo da vida, por
todos os sacrifícios feitos e pelo amparo e motivação que nunca se cansaram de me dar.
À minha irmã, por toda a motivação e por ser sempre o meu pilar.
Ao Pedro e à Mafalda, por todo o apoio prestado e paciência que demonstraram.
A todos os demais, que tenham, de alguma forma, me auxiliado, os meus mais
sinceros agradecimentos.
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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RESUMO
Na União Europeia, tendo em vista a criação de um procedimento único e que
conferisse os mesmos resultados em todos os seus Estados-Membros, foi criado o Sistema
Europeu Comum de Asilo (SECA). O mesmo engloba várias diretivas que, entre outras
coisas, indicam qual o Estado Membro responsável pela análise do pedido de asilo e os
requisitos para concessão de estatuto de refugiado ou proteção subsidiária. Atualmente, a
Europa vive assolada por uma crise de refugiados internacional, que têm chegado ao seu
território através de países como a Itália e a Grécia, colocando vários desafios à União
Europeia e aos seus instrumentos sobre a melhor forma de responder a esta crise.
Aos requerentes de asilo são-lhes também reconhecidos direitos fundamentais em
vários documentos internacionais, com destaque para a Convenção de Genebra de 1951 (na
medida em que lhes seja atribuído o estatuto de refugiado), a Declaração Universal dos
Direitos do Homem, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e a Carta
Europeia dos Direitos Fundamentais, entre outros. No plano interno, o direito de asilo está
consagrado no artigo 33.º n.º 8 da CRP e na Lei de Asilo.
Ao abrigo da CEDH foi criado um tribunal, o Tribunal Europeu dos Direitos do
Homem, responsável pela análise de reclamações de violação por parte dos Estados
Contratantes de disposições da Convenção. Ora, o TEDH já várias vezes foi chamado a
pronunciar-se sobre alegadas violações da Convenção por parte dos Estados aquando da
aplicação das regras ditadas pelas diretivas que integram o SECA. Um caso em particular, o
F.G. c. Suécia, chama a atenção para a avaliação feita pelos Estados Membros do risco de
violação potencial da Convenção por parte do TEDH aquando da transferência de requerentes
de asilo para o país de origem, quando seja suscetível de violar o artigo 3.º da CEDH.
O contributo da jurisprudência do TEDH é de elementar importância, na medida em
que, não só oferece mais um parâmetro de proteção de direitos fundamentais, como ainda leva
a que os Estados e a própria União avaliem as suas condutas para evitar futuras condenações.
Oferece também um meio que a União Europeia pode ter em linha de conta aquando da
adoção de novos instrumentos legislativos, fazendo com que a União Europeia conforme a
sua atuação em coordenação com a jurisprudência emanada do TEDH, como aconteceu
aquando da adoção dos novos instrumentos jurídicos que compõem o SECA.
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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Abstract
In the European Union (EU), regarding the creation of a single procedure that
conferred the same results on all of his member states, it was created the Common European
Asylum System (CEAS). It includes several directives that, among other things, state the
member state responsible for the analysis of the asylum request and the requirements for the
concession of the statute of refugee or affiliate protection. Nowadays, Europe is in the middle
of an international refugee crisis, which have been arriving to European territory through
countries like Italy and Greece, placing several challenges to EU and its instruments about the
best way to respond to this crisis.
To the asylum applicants is recognized fundamental rights in several international
documents, highlighting the 1951 Geneva Convention (in that is assigned the refugee status),
the Universal Declaration of Human Rights, the European Convention of Human Rights
(ECHR) and the European Charter of the Human Rights, among others. Internally, the asylum
right is evoked on article 33 paragraph 8 of the Constitution of the Portuguese Republic and in
the Asylum Law.
Under the ECHR was created a court, the European Court of Human Rights (ECtHR),
responsible for the analysis of violation claims by Contracting States of the provisions of the
Convention. Now, the ECtHR was called already several times to pronounce about the alleged
violations of the Convention by the member states when applying the rules laid down by the
CEAS directives. In a particular case, F.G. vs. Sweden, calls the attention to the evaluation
done by the member states for the potential risk of the Convention violation by the ECtHR
when transferring asylum seekers to the country of origin, when likely violates the article 3 of
the ECHR.
The contribution of jurisprudence of the ECtHR is elementary important, because not
only offers one more parameter of the protection of the human rights, but leads a way to the
member states and the EU itself evaluate their own conducts to prevent future convictions. It
offers a way that the EU can take into account when adopting new legislative instruments,
making the EU confirms its acting in coordination with the jurisprudence emanated of the
ECtHR, how happened when it was adopted new legal instruments that make up CEAS.
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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SUMÁRIO
Lista de Siglas 5
Introdução
Enquadramento 6
Sequência adotada no trabalho 9
Parte I – O Sistema Europeu Comum de Asilo
Capítulo 1. A formação do Sistema Europeu Comum de Asilo 12
Capítulo 2. O Procedimento da Concessão de Asilo à luz do Sistema Europeu Comum de
Asilo 16
Capítulo 3. A Crise Atual de Refugiados na Europa e a Resposta da União Europeia 19
Parte II – Enquadramento Jurídico-Fundamental
Capítulo 1. Base Normativa Internacional 23
Capítulo 2. Base Normativa Portuguesa 25
Capítulo 3. Direitos Fundamentais em Análise 28
Parte III - O Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: O Tribunal
Europeu dos Direitos do Homem
Capítulo 1. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e a sua competência 35
Capítulo 2. As Decisões do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e o Sistema Europeu
Comum de Asilo: Notas Gerais 41
Capítulo 3. O Caso F.G. c. Suécia – um caso em análise 47
Conclusão 53
Bibliografia 56
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Lista de Abreviaturas e Siglas
ACNUR – Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados
CEDH – Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais
CRP – Constituição da República Portuguesa
UE – União Europeia
EM – Estados-Membros
IOM – International Organization for Migration
N.º - Número
SECA – Sistema Europeu Comum de Asilo
TEDH – Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
TJUE – Tribunal de Justiça da União Europeia
TFUE – Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia
TUE – Tratado da União Europeia
UE – União Europeia
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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Introdução
O presente trabalho tem por objecto a reflexão sobre o contributo jurisprudencial do
TEDH para a aplicação e reforma do SECA, através da análise de decisões que determinam
ou não a violação de um direito previsto na CEDH aquando da aplicação do SECA pelos EM.
Enquadramento
A Convenção de Genebra sobre o Estatuto de Refugiado de 1951 (Convenção de
Genebra de 19511), estabelece que o termo refugiado é aplicável a qualquer pessoa que
“receando com razão ser perseguida em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, filiação
em certo grupo social ou das suas opiniões políticas, se encontre fora do país de que tem a
nacionalidade e não possa ou, em virtude do dito receio, não queira pedir a proteção daquele
país” (artigo 1.º-A). Ora, nas palavras de ANDREIA SOFIA PINTO OLIVEIRA, “o
elemento central do conceito do refugiado – que permite distingui-lo de outros estrangeiros,
destacando-os, por exemplo, dos imigrantes – é a circunstância de existir um receio fundado
de perseguição em caso de regresso ao país de origem”23. Realça-se que a perseguição tem
de ser motivada por um dos motivos enunciados no corpo do artigo 1.º-A da Convenção de
Genebra de 1951, acima transcrito. Acrescente-se ainda o facto de que o conceito dado por
este instrumento jurídico “deixa de fora pessoas que são obrigadas a fugir dos seus países de
origem por força dos conflitos armados (nacionais ou internacionais) ou por neles se
verificarem graves e indiscriminadas violações de direitos humanos”4. Nesta medida,
instrumentos de direito internacional regional como a Convenção de Adis-Abeba, de 1969,
respeitante a África e a Declaração de Cartagena sobre os refugiados, aplicável na América
Latina, alargam esta definição5.
1 Aprovada para adesão pelo Decreto-lei n.º 43 2001 (alterado pelo Decreto-Lei n.º 281/76, de 17 de abril,
publicada no Diário da República I, n.º 229, de 01.10.1960, iniciando a sua vigência em Portugal em 22.03.1960. 2 OLIVEIRA, Andreia Sofia Pinto – “Refugiados”, em Enciclopédia das Relações Internacionais, Lisboa, Dom
Quixote, 2014, pág. 453. 3 Para apreensão do conceito de imigrante, sugere-se a leitura de GOMES, Carla Amado e LEÃO, Anabela
Costa, “Ser e deixar de ser imigrante: notas sobre o contencioso dos imigrantes em Portugal”, em O Contencioso
de Direito Administrativo Relativo a cidadãos estrangeiros e ao regime de entrada, permanência, saída e
afastamento do território português, bem como do estatuto de residente de longa duração – Jurisdição
Administrativa e Fiscal – Coleção Formação Inicial. Centro de Estudos Judiciários, maio de 2016, pág, 159 e
segs. 4 OLIVEIRA, Andreia Sofia Pinto - cit., pág. 453. 5 Idem, cit., pág. 454
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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O direito de asilo tem uma particularidade: é um direito fundamental de que os
nacionais não podem ser titulares6, sendo uma proteção conferida por um Estado que não o de
origem, àqueles que, perseguidos ou ameaçados de perseguição, entram no território de outro
Estado com essa finalidade7.
O Conselho da Europa foi instituído após a Segunda Guerra Mundial, mais
precisamente, a 5 de maio de 1949, com a assinatura em Londres do Estatuto do Conselho da
Europa, no pós-Segunda Guerra Mundial. Segundo IRINEU CABRAL BARRETO, “uma das
características mais importantes e distintas do Conselho da Europa consiste em promover os
valores europeus e, neste contexto a preeminência do direito. (…) Nalguns domínios, como o
dos Direitos Humanos, o nível de exigência fixado é superior ao que está estabelecido pela
comunidade internacional no seu conjunto”8. Nesse sentido, a CEDH “enquadra-se no
movimento de dotar a Europa de uma carta comum de direitos e liberdades que resuma os
valores políticos e culturais das democracias ocidentais. Desejaram os países europeus um
sistema que impossibilitasse a instalação de regimes ditatoriais e a renovação das
atrocidades ocorridas durante a Segunda Guerra Mundial”9. O texto final da CEDH foi
assinado em Roma a 4 de novembro de 1950, tendo entrado em vigor a 3 de setembro de
195310.
Ora, Portugal assinou a CEDH a 27 de janeiro de 1977, tendo passado a estar a vigor
em relação a Portugal a partir do depósito do instrumento de ratificação, a 9 de novembro de
197811.
IRINEU CABRAL BARRETO aponta que a CEDH é “um tratado internacional com uma
especial característica”, uma vez que se destina “a ser aplicada internamente nas Altas
Partes Contratantes que a ratificarem, regulando as relações entre essas Altas Partes e as
pessoas sujeitas à sua jurisdição visando assegurar a estas uma série de direitos e garantias
fundamentais”12. Todos os membros do Conselho da Europa já integraram a CEDH no seu
6 OLIVEIRA, Andreia Sofia Pinto - “Asilo”, em Enciclopédia da Constituição portuguesa, Lisboa: Quid Iuris,
2013, pág. 38 7 CUNHA, Damião, - “Anotação ao artigo 33.º”, em Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Anotada,
Coimbra: Wolters Kluwer Portugal, Tomo I, pág. 754. 8 BARRETO, Irineu Cabral – “Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada”, Coimbra: Edições
Almedina, S.A., 5.ª ed., 2015, pág. 24. 9 Idem, cit., pág. 27. 10 De realçar que a CEDH tem 16 Protocolos em anexo, não tendo ainda o Protocolo n.º 15 entrado em vigor.
Dados das adesões disponível em http://www.coe.int/en/web/conventions/full-list/-/conventions/treaty/005 11 CEDH foi assinada por Portugal em 22.09.1976, aprovada para ratificação pela Lei n.º 65/78. 12 BARRETO, Irineu Cabral – Cit., pág. 42
http://www.coe.int/en/web/conventions/full-list/-/conventions/treaty/005
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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ordenamento interno, obrigando os juízes e funcionários nacionais a agirem em conformidade
com a CEDH13.O TEDH foi criado com o fim de assegurar o respeito da CEDH.
No quadro da UE, composta por 28 EM14, é reconhecido pela própria que “as
suas políticas podem ter impacto nos direitos humanos, e procurando que os cidadãos se
sintam «mais próximos da UE, esta promulgou a Carta dos Direitos Fundamentais da União
Europeia no ano 2000”15. Ora, foi no artigo 18.º da aludida Carta que pela primeira vez se
consagra o direito de asilo a nível europeu, tendo o artigo 19.º dado corpo ao princípio da não
repulsão. De realçar que a Carta, com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, tornou-se
juridicamente vinculativa (artigo 6.º TUE).
Ora, o artigo 78.º do TFUE prevê a criação de um sistema europeu comum de asilo,
sendo que é apontado por VICENT CHETAIL que, apesar de ser considerado relativamente
recente, quando comparado com outras iniciativas regionais para a proteção de refugiados, a
verdade é que o SECA é muito mais ambicioso, dado que o seu objetivo é criar um verdadeiro
sistema comum. Este sistema não está apenas limitado à definição de refugiado e ao estatuto
legal dos mesmos conferido pela Convenção de Genebra de 1951, mas inclui procedimentos
de asilo, a determinação do estado responsável pelo exame do pedido de asilo, bem como
novas formas de proteção16.
Tal como salientado pelo mesmo Autor, o n.º 2 do artigo 78.º do TFUE significa que
estabelecer um sistema comum passou a ser um dever legal de todos os EM e das instituições
da UE e que os componentes chave do SECA, anteriormente tratados em documentos
políticos e legislação secundária, tornaram-se objetivos basilares, os quais impunham padrões
comuns ou uniformes17.
A Convenção de Genebra de 1951, apesar de não consagrar o direito do asilo, não
deixa de ser o instrumento mais importante no direito dos refugiados, uma vez que à sua
13 Nesse sentido, AGÊNCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA UNIÃO EUROPEIA – “Manual de
Legislação Europeia sobre Asilo, Fronteiras e Imigração”, Bélgica: Serviço das Publicações da União Europeia,
2015, pág. 16 14 Integram a UE: Alemanha, Áustria, Bélgica, Bulgária, Chipre, Croácia, Dinamarca, Eslováquia, Eslovénia,
Espanha, Estónia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Malta,
Países Baixos, Polónia, Portugal, Reino Unido, República Checa, Roménia, Suécia. No entanto, note-se que no
dia 23 de junho de 2016, houve um referendo no Reino Unido para decidir acerca da permanência do mesmo na
UE, tendo a maioria decidido pela saída do Reino Unido da UE. 15 Nesse sentido, AGÊNCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA UNIÃO EUROPEIA, cit., pág. 21 16 Nesse sentido, CHETAIL, Vicent, - “The Commom European Asylum System: Bric-à-brac or System?”, em
Reforming the common European Asylum System: the new European refugee law. Leiden: Brill, 2016. 17 Idem, cit., pág. 19 e 20
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criação presidiu o objetivo de definir o estatuto jurídico dos refugiados, destacando-se quatro
aspetos importantes do seu conteúdo: a definição de quem é refugiado (artigo 1.º); a proibição
do repulsão dos refugiados para países que aleguem ser vítimas de perseguição (artigo 33.º);
reconhecimento de um estatuto aos refugiados (artigos 12.º a 29.º); e a proibição da
perseguição criminal de quem se encontre ilegalmente num Estado, caso tenha vindo
diretamente de território onde a sua vida e/ou liberdade estavam ameaçadas18.
Uma nota para o direito de asilo na ordem jurídica portuguesa que, na lei ordinária se
encontra previsto na Lei de Asilo, Lei 27/2008, de 30 de junho, que estabelece as condições e
procedimentos de concessão de asilo ou proteção subsidiária e os estatutos de requerente de
asilo, de refugiado e de proteção subsidiário, e para a previsão na Constituição da República
Portuguesa do direito de asilo no seu artigo 33.º, nomeadamente no n.º 8 que preconiza que “é
garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos ou gravemente
ameaçados de perseguição, em consequência da sua atividade em favor da democracia, da
libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa
humana”. Ora, neste âmbito, ANDREIA SOFIA PINTO OLIVEIRA distingue entre asilo
constitucional e asilo convencional. Asilo constitucional será aquele que deriva da previsão da
CRP, ao passo que asilo convencional é distinguido pela autora como o “casamento que a
União Europeia promoveu (…) entre o direito de asilo e a definição de refugiado contida na
Convenção de Genebra” no seu artigo 1.º-A19.
Sequência adotada no trabalho
Para atingir o objetivo a que este trabalho se propôs, começa-se, na primeira parte do
mesmo, pela análise do SECA, de forma breve, nomeadamente os instrumentos legislativos
que o compõem e o procedimento de asilo num EM, desde o momento em que o requerente
de asilo entra no país e requer o pedido de asilo até ao momento da decisão. Segue-se depois
uma breve referência à crise de refugiados de 2015, que ainda continua atualmente, bem como
dos desafios que a UE e os seus instrumentos enfrentam para dar uma resposta satisfatória.
18 Nesse sentido, OLIVEIRA, Andreia Sofia Pinto – “O direito de asilo na Constituição Portuguesa: âmbito de
proteção de um direito fundamental”. Lisboa: Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, 2005, pág.
66 e seguintes. 19 Neste sentido, OLIVEIRA, Andreia Sofia Pinto – “Algumas questões sobre os pressupostos do
reconhecimento de proteção internacional a estrangeiros em Portugal2, em Estudos de Homenagem ao Professor
Doutor Jorge Miranda, vol. I, Coimbra: Coimbra Editora, 2012.
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Na segunda parte deste trabalho serão referidos os principais instrumentos
internacionais em termos de direitos fundamentais, quer em termos gerais quer os previstos
especificamente para refugiados e requerentes de asilo, seguindo-se uma breve menção dos
direitos previstos. Ressalva-se que como é objetivo do trabalho fazer uma análise às decisões
do TEDH em casos que estejam em discussão a violação de direitos fundamentais por parte
das autoridades nacionais aquando da aplicação do SECA, tomou-se como base os direitos
previstos na CEDH suscetíveis de ser afetados pela aplicação do mesmo.
Tomaram-se ainda em especial consideração a Convenção de Genebra, dado que é
instrumento base do estatuto dos refugiados, e os artigos 18.º e 19.º da Carta de Direitos
Fundamentais, que preveem especificamente um direito de asilo e de não repulsão, sendo
certo que a Carta dos Direitos Fundamentais é um instrumento da UE que, com o Tratado de
Lisboa, se tornou juridicamente vinculante, como ressalvado anteriormente. Será também
feita uma breve incursão sobre o direito de asilo na ordem jurídica interna portuguesa.
Por fim, na última parte será atingido o objetivo último deste trabalho, que
incide sobre a abordagem feita pelo TEDH quando analisa casos em que estejam em
discussão a violação da CEDH pela aplicação do SECA e o contributo que a sua
jurisprudência presta para a aplicação do SECA consentânea com os princípios elementares
dos direitos humanos, sendo que num primeiro momento iremos fazer uma passagem por
várias decisões do TEDH, e, num último ponto, dissecar um caso em especial, tendo-se dado
primazia a uma decisão recente e que tivesse suscitado questões interessantes em termos de
determinação do risco da violação de um artigo da CEDH. Acresce que aqui também se fará
uma breve incursão sobre a competência do TEDH e sobre a adesão da UE à CEDH.
Duas notas finais para concluir as considerações introdutórias. A primeira prende-se
com o facto de não ser objetivo deste trabalho a análise pormenorizada dos direitos
fundamentais em causa, ou seja, o que preenche o conteúdo de cada direito, mas sim como, de
uma forma generalizada, determinada ação ou omissão de um Estado, na aplicação do SECA,
violou ou não determinado direito e de que forma o fez. Assim, por exemplo, aquando da
análise de algum acórdão onde esteja em causa o principio da não repulsão sob pena de
violação de determinado artigo da CEDH, não se procederá a uma análise detalhada quer do
princípio da não repulsão quer do próprio artigo da CEDH, mas apenas uma referência breve
quer ao princípio quer ao conteúdo de cada direito e em que medida o TEDH considerou que
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determinada ação violou direitos previstos na CEDH. Esta limitação prende-se com a própria
extensão do trabalho.
A segunda prende-se com a nomenclatura usada neste trabalho. De facto, neste
trabalho será usada a expressão de direitos fundamentais, nesta incluindo-se os direitos
fundamentais e os direitos humanos. De facto, segue-se de perto SUZANA TAVARES DA
SILVA neste plano, que utiliza a expressão direitos fundamentais em sentido amplo,
englobando nesta expressão os direitos fundamentais constitucionais, “de matriz nacional (…)
e que se prende com a força (efetividade) dos direitos individuais e das garantias
institucionais na arena da luta que os grupos sociais travam no contexto da dinâmica própria
do princípio democrático e do desenvolvimento económico nacional” e os direitos humanos
de “matriz universal” e que se reconduzem “à tentativa generalizada de expandir a
salvaguarda de valores essenciais à dignidade da pessoa humana e a liberdade dos povos”20.
Acresce ainda que a aludida autora aponta para uma terceira “categoria” de direitos
fundamentais, os “direitos fundamentais federativos ou de clube”, tratando-se estes de “um
conjunto de direitos fundamentais reconhecidos por comunidades de Estados que promovem
em conjunto determinado tipo de políticas”21.
20 SILVA, Suzana Tavares da, - “Direitos Fundamentais na Arena Global”, Coimbra: Imprensa da Universidade
de Coimbra, 2011. Págs. 21 e 22. 21 Idem, cit., pág. 22.
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PARTE I – Sistema Europeu Comum de Asilo
Capítulo 1 - A formação do Sistema Europeu Comum de Asilo
Desde o Conselho Europeu de outubro de 1999, que a União Europeia tem envidado
esforços no sentido de criar um sistema europeu comum de asilo que assente num
procedimento comum de asilo e num estatuto uniforme para a proteção internacional. Ora o
artigo 78.º do TFUE dá corpo a estes esforços, uma vez que aponta como tarefa da UE o
desenvolvimento de “uma política de asilo”, usando mesmo a expressão sistema europeu
comum de asilo quando impõe ao Parlamento Europeu e ao Conselho que adotem as medidas
necessárias para atingir tal objetivo (n.º 2 do aludido artigo).
Ora, a realidade é que “o problema dos fluxos migratórios, das deslocações forçadas,
dos refugiados, da imigração e dos requerentes de asilo atingiu, nos séculos XX/XXI, uma
escala global, abarcando todos os Estados-membros, sem exceção. Consequentemente, novos
instrumentos jurídicos foram criados, novas medidas políticas e procedimentos foram
adotados pelos Estados-membros da União Europeia”22.
Acresce que, o SECA reveste especial importância na Europa devido ao Espaço
Schengen. Ora a criação deste espaço permitiu que os cidadãos da UE e de outros países que
nele se integrem, “bem como os membros das suas famílias, têm o direito de entrar no
território dos Estados-Membros da União sem autorização prévia”23. Ora, a este direito
acresce o direito dos estrangeiros de circular livremente durante três meses se possuírem título
de residência, como estatui o artigo 21.º da Convenção de aplicação do Acordo de Schengen,
ao declarar que “os estrangeiros detentores de um título de residência emitido por uma das
Partes Contratantes podem, ao abrigo desse título, bem como de um documento de viagem,
desde que estes documentos sejam válidos, circular livremente durante um período máximo
de três meses no território das outras Partes Contratantes”. De salientar ainda que o Código
das Fronteiras de Schengen (Regulamento (CE) n.º 562/2006, alterado pelo Regulamento n.º
1051/2013), no seu Capítulo I do Título III, trata da supressão das fronteiras internas,
estatuindo no artigo 20.º que as “fronteiras internas podem ser transportas em qualquer local
22 RODRIGUES, José Noronha – “Política de asilo e de direito de asilo na União Europeia”, em “Scientia
Ivridica – Revista de Direito Comparado Português e Brasileiro”, Braga: Universidade do Minho, 2010, Tomo
59, pág. 8. 23 Nesse sentido, AGÊNCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA UNIÃO EUROPEIA, cit., pág. 21,
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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sem que se proceda ao controlo das pessoas, independentemente da sua nacionalidade”24. Ou
seja, na prática, as fronteiras que existem no Espaço Schengen são as externas, aquelas que
delimitam o Espaço Schengen face aos Estados que não o integram, existindo uma liberdade
de circulação dentro do aludido espaço. No entanto, pode esta liberdade ser limitada, como se
viu no caso do artigo 21.º da Convenção de aplicação do Acordo de Schengen, ou ser
reintroduzido o controlo fronteiriço nas fronteiras internas a título temporário, como o
previsto no artigo 23.º e seguintes do Código das Fronteiras de Schengen.
O SECA desenvolveu-se em duas fases. Na primeira fase foi fixado o objetivo de
harmonizar as normas dos diferentes Estados-Membros, tendo por base norma mínimas
comuns. Assim sendo, os instrumentos legislativos criados foram a Diretiva 2005/85
(procedimentos para conceder ou retirar o estatuto de refugiado), a Diretiva 2003/9
(acolhimento dos requerentes de asilo) e Diretiva 2004/83 (reconhecimento e conteúdo do
estatuto de refugiado), tendo também sido determinado o Estado responsável pela análise de
um pedido de asilo (Regulamento de Dublin) e criado a EURODAC, uma base de dados de
impressões digitais que visa auxiliar na determinação do EM responsável pela análise do
pedido. Todos estes instrumentos foram, entretanto, revistos, no que se apelida de segunda
fase do SECA25.
De facto, o Programa da Haia, adotado pelo Conselho Europeu a 4 de novembro de
2004, desencadeou novos e mais ambiciosos objetivos para o SECA, como estabelecimento
de um procedimento comum de asilo e de um estatuto uniforme válido em toda a União
Europeia. De facto, “o Programa da Haia convidou a Comissão Europeia a concluir a
avaliação dos instrumentos legais da primeira fase e a apresentar os instrumentos e as
medidas da segunda fase”26.
O Pacto Europeu para a Imigração e o Asilo, de 24 de setembro de 2008, apontou as
grandes disparidades que existiam nos EM no que se refere à concessão de proteção, tendo
apelado a novas iniciativas, nomeadamente propondo a criação de um procedimento de asilo
único que comporte garantias comuns, completando assim o Programa da Haia.27 No Pacto
foram assentes cinco compromissos fundamentais: organizar a imigração ilegal tendo em
24 Neste sentido, AGÊNCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA UNIÃO EUROPEIA, cit., pág. 30. 25“SECA (Sistema Europeu Comum de Asilo”. (Online). (Consultado em 21 de julho de 2016). Disponível em
http://euroogle.com/dicionario.asp?definition=1177. 26 Diretiva 2013/32/EU do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de junho de 2013, considerando 6. 27 Diretiva 2013/32/EU do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de junho de 2013, considerando 7.
http://euroogle.com/dicionario.asp?definition=1177
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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conta as prioridades, as necessidades e as capacidades de acolhimento determinadas por cada
EM, e favorecer a integração; lutar contra a imigração ilegal, nomeadamente assegurando o
retorno dos estrangeiros em situação irregular ao seu país de origem ou a um país de trânsito;
reforçar a eficácia dos controlos nas fronteiras; edificar uma Europa do asilo; e criar uma
parceria global com os países de origem e de trânsito, promovendo as sinergias entres as
migrações e o desenvolvimento.28
Com o Programa de Estocolmo, que estabelece as prioridades dos EM da UE nos anos
de 2010 a 2014, para o espaço de justiça, liberdade e segurança29, foi reiterado o compromisso
de estabelecer um espaço comum de proteção e solidariedade baseado num processo comum
de asilo e num estatuto uniforme para as pessoas a quem é concedida proteção internacional,
assente em elevados padrões de proteção e em procedimentos equitativos e eficazes. Pretende-
se que casos semelhantes sejam tratados de forma similar e produzam os mesmos resultados.30
Nas palavras de CECILIA MALMSTROM, comissária para os Assuntos Internos, “o SECA
facilitará o acesso ao procedimento de asilo para pessoas que procuram proteção; conduzirá
a decisões mais justas, céleres e de melhor qualidade em matéria de asilo; garantirá que as
pessoas suscetíveis de serem alvo de perseguição não serão de novo expostas a esse perigo;
proporcionando condições dignas tanto para os que solicitam asilo como para aqueles a
quem é concedida proteção internacional na União Europeia”31.
Atualmente, ao abrigo do SECA, pode ser concedido asilo a qualquer pessoa que
procure escapar a perseguições ou a ofensas graves, sendo o mesmo idêntico em toda a UE32,
e o mesmo composto pela Diretiva “Procedimentos de Asilo” (Diretiva 2013/32/UE do
Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de junho de 2013), pelo Regulamento de Dublin
(Regulamento UE n.º 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de junho de
2013), pela Diretiva “Condições de Acolhimento” (Diretiva 2013/33/UE do Parlamento
Europeu e do Conselho de 26 de junho de 2013), pela Diretiva “Estatuto de Refugiado”
(Diretiva 2011/95/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de dezembro de 2011) e
28 Pacto Europeu sobre a Imigração e o Asilo. (Online), (Consultado em 30 de junho de 2016). Disponível em
http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Ajl0038 29 Programa de Estocolmo. (Online) (Consultado a 17 de julho de 2016). Disponível em http://eur-
lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Ajl0034 30 Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de junho de 2013, considerando 8. 31 COMISSÃO EUROPEIA, Sistema Europeu Comum de Asilo. Luxemburgo: Serviço das Publicações da
União Europeia, 2014, pág. 1. 32 Idem, cit., pág. 3.
http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Ajl0038http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Ajl0034http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Ajl0034
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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pelo Regulamento EURODAC (Regulamento UE n.º 604/2013 do Parlamento Europeu e do
Conselho de 26 de junho de 2013)33.
Há que acrescentar ainda um outro ponto importante, ressalvado por JOSÉ
NORONHA RODRIGUES, com o qual não podemos deixar de concordar. De facto, com a
proliferação de instrumentos jurídicos diferenciados nos vários EM, fomentava-se o
denominado “asylum shopping”, isto é, os requerentes de asilo privilegiavam a sua entrada no
espaço europeu através daqueles EM cujos procedimentos de asilo fossem mais benéficos no
sentido de conferir a proteção requerida, descredibilizando assim o instituto de asilo na União
Europeia.34
Assim, o SECA visa apresentar um denominador comum a todos os EM, criando um
sistema comum a todos, visando favorecer a integração e impor garantias comuns aos
requerentes de asilo, lutar contra a imigração ilegal, entre outros, evitando também decisões
díspares dentro da UE.
33 Para mais desenvolvimento na matéria acerca da Reforma do SECA, sugere-se a consulta de CHETAIL,
Vicent, “The Common European Asylum System: Bric-à-brac or System?, em Reforming the common European
Asylum System: the new European refugee law. Leiden: Brill, 2016, pág. 3 a 38. 34 Nesse sentido, RODRIGUES, José Noronha – cit., pág. 8.
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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Capítulo 2. O procedimento da Concessão de Asilo à luz do Sistema Europeu Comum de
Asilo35
Neste capítulo irá ser feita uma referência geral ao procedimento de asilo na UE.
O procedimento para requerer asilo é agora idêntico pelos EM da União Europeia. O
direito de asilo é um direito fundamental, sendo que, pela Convenção de Genebra de 1951,
constitui uma obrigação fundamental. Ora, enquanto outros instrumentos regionais foram
adotados tendo em vista detalhar e complementar a Convenção de Genebra de 1951, o SECA
foi mais além: desde a sua conceção que foi implementado como medida de acompanhamento
da política de integração da UE para compensar a abolição de fronteiras internas36. De realçar
que o SECA foi “baseado na completa e inclusiva aplicação da Convenção de Genebra de
1951 relativa ao estatuto dos refugiados, completada pelo Protocolo de Nova Iorque de
1967”37, ou seja, na base do SECA esteve a Convenção de Genebra de 1951, tendo sido,
aquando da elaboração dos diversos instrumentos jurídicos, as suas disposições incorporadas
nos mesmos, nomeadamente na Diretiva Estatuto de Refugiado. Isto é reforçado pelo próprio
direito primário da UE, uma vez que o TFUE dispõe que a política comum de asilo “deve
estar em conformidade com a Convenção de Genebra, de 28 de julho de 1951, e o Protocolo,
de 31 de janeiro de 1967, relativos ao Estatuto dos Refugiados, e com os outros tratados
pertinentes” (artigo 78.º 2.º período).
Como anteriormente realçado, na UE a concessão de asilo é uma matéria muito
sensível, uma vez que estamos perante um espaço onde existem fronteiras abertas e livre
circulação dentro do território dos EM. É da responsabilidade dos EM garantir que os
requerentes de asilo são tratados condignamente, com justiça e que o seu caso é tratado de
acordo com regras uniformes, por forma a que, apesar de o pedido ser apresentado em países
diferentes, o resultado possa ser sempre semelhante38.
A Diretiva “Procedimentos de Asilo” (Diretiva 2005/85/CE do Conselho de 1 de
dezembro de 2005, reformulada pela Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do
35 COMISSÃO EUROPEIA, Sistema Europeu Comum de Asilo. Luxemburgo: Serviço das Publicações da
União Europeia, 2014. 36 CHETAIL, Vicent, “The Commom European Asylum System: Bric-à-brac or System?, em Reforming the
common European Asylum System: the new European refugee law. Leiden: Brill, 2016, pág. 4. 37 Condições para beneficiar do estatuto de refugiado e do estatuto de beneficiário de proteção internacional.
(online). (Consultado em 30 de junho de 2016). Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/legal-
content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Al33176 38 COMISSÃO EUROPEIA, cit., página 3.
http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Al33176http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Al33176
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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Conselho de 26 de junho de 2013) cria um sistema para garantir que as decisões neste âmbito
sejam tomadas de forma justa e célere e que todos os Estados-Membros analisam os pedidos
com a mesma elevada qualidade39. De facto, por norma, o procedimento de apreciação da
concessão de asilo não deverá demorar mais de seis meses (artigo 31.º n.º 3). Foram tomadas
medidas de proteção de pessoas com necessidades de assistência especial (artigo 24.º), como
por exemplo, a nomeação pelas autoridades nacionais de uma pessoa qualificada para
representar menores que não estejam acompanhados (artigo 25.º n.º 1). Criou-se o
procedimento “de fronteira” (artigos 32.º e seguintes) e “acelerado” (artigo 31.º n.º 8), para
analisar pedidos de asilo que sejam presumivelmente infundados, bem como a
impossibilidade de requerentes que efetivamente não precisem da proteção deixar de poder
apresentar, sucessivamente, novos pedidos de asilo, tendo em vista adiar indefinidamente o
seu repatriamento.
A Diretiva “Condições de Acolhimento” (Diretiva 2003/9/CE do Conselho de 27 de
janeiro de 2003, reformulada pela Diretiva 2013/33/UE do Parlamento Europeu e do
Conselho de 26 de junho de 2013) visa assegurar que existem condições de acolhimento dos
requerentes de asilo e o respeito pelos seus direitos fundamentais enquanto aguardam pela
decisão do pedido de asilo, como por exemplo, o acesso dos requerentes do pedido de asilo a
habitação, cuidados de saúde e emprego40. Com a reformulação, deu-se especial ênfase à
criação de normas comuns em matéria de detenção dos requerentes de asilo, mas respeitando
os direitos fundamentais, prevendo-se a detenção apenas em casos especialmente previstos na
Diretiva e garantias jurídicas, como o acesso a assistência jurídica gratuita (artigos 8.º a 11.º)
A Diretiva “Estatuto de Refugiado” (Diretiva 2004/83/CE do Conselho de 29 de abril
de 2004, reformulada pela Diretiva 2011/95/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 13
de dezembro de 2011) define as condições para que a proteção internacional possa ser
concedida, sendo aqui prevista uma panóplia de direitos aos refugiados, nomeadamente, a
preservação da unidade familiar (artigo 23.º), o acesso à educação e ao emprego (artigos 26.º
e 27.º), o acesso a cuidados de saúde (artigo 29.º), medidas de proteção de menores não
acompanhados (artigo 31.º), entre muitos outros.
O Regulamento de Dublin (Regulamento CE n.º 343/2003 do Conselho de 18 de
fevereiro de 2003, reformulado pelo Regulamento CE n.º 603/2013 do Parlamento Europeu e
39 Idem, cit., pág. 4. 40 Nesse sentido, idem, cit., pág. 5.
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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do Conselho de 26 de junho de 2013) determina o processo de determinação do Estado
responsável pela análise do pedido de asilo. Com a reformulação deste Regulamento visou-se
criar procedimentos para proteger os requerentes de asilo, como por exemplo, a instituição de
novas possibilidades de reunificação familiar (artigos 8.º a 11.º), e a previsão do direito a um
recurso efetivo, com previsão de obrigações para os EM adotarem na sua legislação nacional
para efeitos do mesmo (artigo 27.º).
O Regulamento Eurodac (Regulamento CE n.º 2725/2000 do Conselho de 11 de
dezembro de 2000, reformulado pelo Regulamento CE n.º 603/2013 do Parlamento Europeu e
do Conselho de 26 de junho de 2013) permite o acesso das autoridades policiais, em
determinadas circunstâncias, às bases de dados europeias de impressões digitais dos
requerentes de asilo. Este Regulamento tem estreita ligação com o Regulamento de Dublin, na
medida em que visa, essencialmente, a aplicação do Regulamento de Dublin (artigo 1.º).
Assim, em suma, o processo para requerer asilo é idêntico em toda os EM da UE. Ao
requerente de asilo são recolhidas as suas impressões digitais e transmitidas às bases de dados
da EURODAC, sendo as mesmas utilizadas para ajudar a identificar o país responsável pelo
pedido de asilo. Está previsto que seja realizada uma entrevista ao requerente de asilo com um
assistente especializado em direito da União Europeia (artigos 14.º a 17.º), com ajuda de um
intérprete, caso seja necessário, a fim de que se apure se reúne as condições para beneficiar do
estatuto de refugiado ou de proteção subsidiária. Caso seja concedida ao requerente o estatuto
de refugiado ou a proteção subsidiária, o mesmo fica imbuído de determinados direitos,
nomeadamente acesso ao mercado laboral e a cuidado de saúde (artigos 26.º e 30.º da Diretiva
Estatuto de Refugiado). Caso seja negado o asilo, o requerente tem a faculdade de recorrer aos
tribunais. Esse órgão jurisdicional pode anular a decisão da não concessão, concedendo ao
requerente o asilo, nos termos do artigo 46.º da Diretiva Procedimento de Asilo. Caso o
tribunal confirme a decisão da não concessão, o requerente pode ser repatriado para o seu país
de origem ou de trânsito41.
41 COMISSÃO EUROPEIA, cit., pág. 2.
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Sistema Europeu Comum de Asilo e Direitos Fundamentais: o “apport” jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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Capítulo 3. A crise atual de refugiados na Europa e a resposta da UE
Atualmente, a UE está a viver uma das piores crises migratórias de sempre, com a
atual crise de refugiados. De facto, têm entrado muitos refugiados na Europa, essencialmente,
em países como a Itália e a Grécia, expondo algumas fragilidades do SECA, pelo que se fará
em seguida uma breve referência a crise atual e formas de reação da UE.
De facto, só durante o ano de 2015, foi estimado pela IOM que 1.046.599 migrantes
entraram na Europa através de várias rotas de trânsito através de África, Ásia ou Médio
Oriente, sendo certo que só podem ser considerados refugiados, no sentido legal do termo,
após procedimento de asilo que conceda o estatuto de refugiado. No ano de 2016, até 4 de
julho de 2016, neste ano civil chegaram à Europa 234.584 pessoas, sendo que 226.535
chegaram por mar, e 8.049 por terra. No Mar Mediterrâneo contam-se 2.899 mortos ou
desaparecidos.
As tendências dos países de chegada são, atualmente, a Itália, a Grécia e a Bulgária. À
Itália têm chegado, essencialmente, pessoas provenientes da Eritreia, Nigéria, Sudão,
Somália, Costa do Marfim e Gâmbia. Já à Grécia têm chegado, nomeadamente, sírios,
iraquianos, afegãos, paquistaneses e iranianos, ao passo que na Bulgária regista-se um maior
fluxo de iraquianos, sírios e afegãos. De realçar que se têm registado na Hungria e na Sérvia
um aumento de chegadas na ordem dos 69% e 21%, respetivamente, tendo como comparação
os períodos compreendidos entre 19 a 25 de junho e 26 de junho a 3 de julho.
As principais rotas usadas pelos migrantes são a Rota Central Mediterrânica da Líbia
para Itália por mar, a Rota Mediterrânica Ocidental que vai através dos enclaves espanhóis de
Ceuta e Melila ou através do Estreito de Gibraltar, e a Rota Mediterrânica Oriental e Balcãs
Oriental, dos Balcãs ou da Turquia para a Grécia.
Até 21 de Junho de 2016, 2.759 dos requerentes de asilo foram realocados, sendo
1.970 “originários” da Grécia e 789 da Itália. Portugal, por exemplo, recebeu 302 dos
requerentes de asilo.
O Conselho da União Europeia reagiu a esta crise e adotou em setembro de 2015 duas
decisões (Decisão (UE) 2015/1523 do Conselho de 14 de setembro de 2015 e Decisão (UE)
2015/1601 do Conselho) de realocar 160.000 requerentes de asilo da Itália e da Grécia, para
assim ajudar estes países a lidar com a pressão desta crise de refugiados. Assim, os
requerentes de asilo que tenham uma grande probabilidade de ter os seus pedidos de asilo
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reconhecidos e aceites (artigos 3.º de ambas as Decisões) serão realocados da Grécia e da
Itália para outros EM, onde verão os seus pedidos de asilo analisados e apreciados (nos
termos dos artigos 4.º das Decisões). Caso os pedidos sejam bem-sucedidos, o requerente será
reconhecido com o estatuto de refugiado com o direito de residir no EM para onde foram
realocados. As realocações serão feitas num período de dois anos, com o orçamento da UE a
prover apoio financeiro os EM participantes (artigos 10.º). De realçar, que países como o
Reino Unido não receberam qualquer requerente de asilo nestes termos 4243.
Ora, esta solução encontrada pelo Conselho de Justiça e dos Assuntos Internos tem um
problema que consiste no facto de que é uma solução de médio/longo prazo, não respondendo
às exigências imediatas da situação, no sentido de que até serem realocados, os requerentes
podem sofrer de situações em que os seus direitos fundamentais sejam postos em causa, sendo
que na Grécia já foi apontada como não respeitando as condições mínimas de acolhimento de
requerentes de asilo44.
Foram também aplicadas pela Comissão Europeia outras medidas para responder à
tragédia humana no Mediterrâneo, nomeadamente, as Conclusões dos Representantes dos EM
sobre a reinstalação de pessoas com clara necessidade de proteção internacional e propostas
de alteração do Regulamento de Dublin e da Diretiva Procedimentos de Asilo, prevendo a
criação de um mecanismo de recolocação em situações de crise e uma lista comum de países
de origem seguros, respetivamente45. Daqui se infere que de facto o SECA não tem
mecanismos capazes de por si só, poderem dar resposta às atuais exigências.
O que é facto é que tal fluxo de pessoas em busca de asilo, tendo desde 2015, entrado
na Europa cerca de 1.300.000 requerentes de asilo, comporta sérias dificuldades na sua
resolução. Alojar tal número de pessoas em condições dignas, dar acesso a educação,
cuidados de saúde, emprego e proteção social, não é de facto de solução fácil, estando
42 Os dados referidos nos primeiros seis parágrafos deste capítulo foram retirados de uma análise feita a dados
que constam do sítio da International Organization for Migration, disponível em http://migration.iom.int/europe/
(consultado em 04 de julho de 2016). 43 Sobre a participação do Reino Unido no SECA, sugere-se a consulta de “The UK, the Common European
Asylum System and EU Immigration Law. (online). (Consultado em 21 de julho de 2016). Disponível em:
http://migrationobservatory.ox.ac.uk/policy-primers/uk-common-european-asylum-system-and-eu-immigration-
law 44 Para melhor explicitação da visão do TEDH em relação a esta questão, consultar, por exemplo, caso MSS c.
Bélgica e Grécia, TEDH, Queixa n.º 30696/09, 21 de janeiro de 2011. 45“Condições para beneficiar do estatuto de refugiado e do estatuto de beneficiário de proteção internacional”.
(online). (Consultado em 30 de junho de 2016). Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/legal-
content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Al33176
http://migration.iom.int/europe/http://migrationobservatory.ox.ac.uk/policy-primers/uk-common-european-asylum-system-and-eu-immigration-lawhttp://migrationobservatory.ox.ac.uk/policy-primers/uk-common-european-asylum-system-and-eu-immigration-lawhttp://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Al33176http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Al33176
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também a UE a viver a sua própria crise, com a atual crise económica e financeira de alguns
EM, sendo um deles a Grécia que já gastou mais cerca de 2 mil milhões de euros com os
refugiados46, e com o referendo que levou os cidadãos britânicos às urnas para optarem pela
saída da própria UE.
Mas outros problemas se colocam quando países como a Dinamarca aprovam leis que
permitem confiscar aos refugiados dinheiro e joias que transportem com eles, causando uma
onda de indignação pela Europa fora, uma vez que tal medida fez com que se revivesse um
período negro da história recente, como foi o tratamento dado pelos nazis aos judeus. No
entanto, tal como salienta Teresa de Sousa esta lei “é uma medida extrema que antecipa uma
nova realidade política que se generaliza na Europa: os grandes partidos europeus estão a
perder terreno eleitoral para as forças xenófobas e nacionalistas”47.
Uma das medidas adotadas para tentar, pelo menos amenizar a crise, foi tomada pela
Alemanha, cujas autoridades emitiram instruções internas para suspenderem a aplicação do
Regulamento de Dublin, no que respeita a cidadãos sírios. De acordo, com essas instruções,
datadas de 21 de agosto de 2015, os procedimentos ao abrigo do Regulamento de Dublin que
já tivessem iniciado deveriam ser cancelados, por forma a que a Alemanha se tornasse o EM
responsável pela análise desses pedidos. Também deveriam ser revogadas quaisquer ordens
de retorno para transferências ao abrigo do aludido documento. Assim, entre janeiro e julho
de 2015, a Alemanha registou 44.417 requerentes sírios. Ora, aqui a Alemanha, antes da
tomada de decisões pelo Conselho Europeu relativas à recolocação dos requerentes de asilo,
chamou a si a responsabilidade de ela própria analisar, independentemente de não ser o país
que, à luz do Regulamento de Dublin, seria responsável por essa análise48.
Uma medida que seria de aplicar, tendo em conta a solidariedade que deve existir
entre os EM e a busca de uma solução que possa distribuir o “fardo” dos refugiados, seria a
instituição de quotas para a receção dos requerentes de asilo e análise dos seus pedidos de
asilo, o que foi parcialmente conseguido através das aludidas Decisões do Conselho Europeu.
Apesar de inicialmente os primeiros-ministros da Hungria, República Checa, Eslováquia e
Polónia terem declarado que qualquer proposta para a instituição de quotas obrigatórias e
46SOUSA, Teresa, “Podem ficar com as alianças”. (Online) Público (26 de janeiro de 2016). (Consultado em 30
de junho de 2016)., Disponível em: https://www.publico.pt/mundo/noticia/podem-ficar-com-as-aliancas-
1721456 47 Idem. 48 Asylum Information Database, (Online). (Consultado em 26 de junho de 2016). Disponível em
http://www.asylumineurope.org/news/24-08-2015/germany-halt-dublin-procedures-syrians
https://www.publico.pt/mundo/noticia/podem-ficar-com-as-aliancas-1721456https://www.publico.pt/mundo/noticia/podem-ficar-com-as-aliancas-1721456http://www.asylumineurope.org/news/24-08-2015/germany-halt-dublin-procedures-syrians
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permanentes seria rejeitada49, a verdade é que a Hungria acabou por aceitar receber mais
migrantes oriundos da Itália e da Grécia50.
Em suma, a Europa tem vivido uma crise de refugiados, que colocou em crise o
SECA, uma vez que os refugiados têm privilegiado a entrada na Europa pela mesma via
(nomeadamente através da Itália e da Grécia), que não têm meios suficientes para acolher
condignamente os refugiados e tramitar os seus processos de uma forma célere, concluindo-se
que o SECA não instituiu mecanismos que, por si só, sejam capazes de responder às atuais
exigências. Assim, a UE tentou criar soluções que visassem garantir o respeito pelos direitos
fundamentais, como por exemplo, a realocar os refugiados noutro EM. No entanto, este
processo peca por ser lento e pelas reações dos EM, que têm colocado entraves, como acima
referido.
De realçar também que, em abril, a Comissão Europeia elaborou uma comunicação
dirigida ao Parlamento Europeu no sentido de reformar o SECA, tendo por objetivo, por
exemplo, reformar o Regulamento de Dublin no sentido estabelecer um sistema justo e
sustentável na determinação do EM responsável pela análise do pedido de asilo e obter maior
convergência no sistema de asilo da UE, transformando as atuais Diretivas Procedimento de
Asilo e Estatuto de Refugiado em regulamentos51.
49 BBC News, “Migrant crisis: Hungary migrants start walk to border”(4 de setembro de 2015). (online)
(Consultado em 30 de junho de 2016). Disponível em http://www.bbc.com/news/world-europe-34155701 50 BBC News, “Migrant crisis: Migration to Europe explained in seven charts” (4 de março de 2016), (online)
(Consultado em 30 de junho de 2016). Disponível em http://www.bbc.com/news/world-europe-34131911 51 Nesse sentido, COMISSÃO EUROPEIA, “Communication from the Comission to the European Parliament
and the Council towards a reform of the common european asylum system and the enhancing legal avenues to
Europe” (online). (Consultado em 21 de julho de 2016). Disponível em: http://ec.europa.eu/dgs/home-
affairs/what-we-do/policies/european-agenda-migration/proposal-implementation-
package/docs/20160406/towards_a_reform_of_the_common_european_asylum_system_and_enhancing_legal_a
venues_to_europe_-_20160406_en.pdf; COMISSÃO EUROPEIA, “Reforming the Common European Asylum
System and developing safe and legal pathways to Europe” (online). (Consultado em 21 de julho de
2016).Disponível em: http://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-is-new/news/news/2016/20160406_2_en.htm;
COMISSÃO EUROPEIA, “The Common European Asylum System (CEAS)” (online). (Consultado em 21 de
julho de 2016). Disponível em: http://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-we-do/policies/european-agenda-
migration/background-information/docs/20160406/factsheet_-_the_common_european_asylum_system_en.pdf
http://www.bbc.com/news/world-europe-34155701http://www.bbc.com/news/world-europe-34131911http://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-we-do/policies/european-agenda-migration/proposal-implementation-package/docs/20160406/towards_a_reform_of_the_common_european_asylum_system_and_enhancing_legal_avenues_to_europe_-_20160406_en.pdfhttp://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-we-do/policies/european-agenda-migration/proposal-implementation-package/docs/20160406/towards_a_reform_of_the_common_european_asylum_system_and_enhancing_legal_avenues_to_europe_-_20160406_en.pdfhttp://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-we-do/policies/european-agenda-migration/proposal-implementation-package/docs/20160406/towards_a_reform_of_the_common_european_asylum_system_and_enhancing_legal_avenues_to_europe_-_20160406_en.pdfhttp://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-we-do/policies/european-agenda-migration/proposal-implementation-package/docs/20160406/towards_a_reform_of_the_common_european_asylum_system_and_enhancing_legal_avenues_to_europe_-_20160406_en.pdfhttp://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-is-new/news/news/2016/20160406_2_en.htmhttp://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-we-do/policies/european-agenda-migration/background-information/docs/20160406/factsheet_-_the_common_european_asylum_system_en.pdfhttp://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-we-do/policies/european-agenda-migration/background-information/docs/20160406/factsheet_-_the_common_european_asylum_system_en.pdf
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PARTE II – Direitos Fundamentais
Capítulo 1. Base Normativa Internacional
Atualmente, existe uma proliferação de textos internacionais que, de forma direta ou
indireta, protegem os refugiados, conferindo-lhes, por exemplo, um estatuto próprio, fazendo-
se neste capítulo uma breve referência aos mesmos.
Assim, um importante instrumento legislativo no que toca aos refugiados/requerentes
de asilo é a Convenção de Genebra de 1951. Esta convenção consolida instrumentos legais
internacionais que existiam previamente relativos aos refugiados. Estabelece padrões básicos
para o tratamento de refugiados, sem, no entanto, impor limites para que os Estados possam
desenvolver esse tratamento. Assim, é importante na medida em que nela foi definido o
conceito refugiado (artigo 1.º) e nela é estabelecido quer os direitos dos requerentes de asilo
quer as responsabilidades das nações concedentes. Com a emergência de novas situações
geradoras de conflitos e perseguições, colocou-se em evidência a necessidade de providencias
que colocasse os fluxos de refugiados sob a proteção das provisões da Convenção, pelo que
um Protocolo relativo aos Estatutos dos Refugiados foi ratificado, assinado e entrou em vigor
a 4 de outubro de 1967, em que os países foram levados a aplicar as provisões da Convenção
de 1951 sem limitação temporal e espacial, algo que existia na Convenção52.
Em termos de instrumentos gerais, que preconizam um conjunto de direitos
fundamentais não apenas para refugiados, mas que se aplicam a todos os indivíduos, a que
tem mais relevo, é desde logo, a Declaração Universal dos Direitos do Homem. A DUDH é
um marco na história dos direitos humanos, tendo sido adotada pela Assembleia-Geral das
Nações Unidas em 1948 pela Resolução 217(III) da Assembleia-Geral, como o padrão
comum para todas as pessoas e todas as nações. Foi a primeira vez que os direitos humanos
fundamentais, através da DUDH, foram reconhecidos como universalmente protegidos.53
Nela estão previstos, nos seus trinta artigos, um conjunto de direitos fundamentais aplicáveis
a qualquer pessoa, independentemente do país em que se encontrem. De facto, tomando o
52 Nesse sentido, CHETAIL, Vincent “Are refugee rights human rights? An Unorthodox questioning of the
relations between refugee law and human rights law”, em Ruth Rubio-Marín ed.), Human Rights and
Immigration, Oxford, OUP, 2014, pág. 14 e seguintes. 53 Nações Unidas, “A Declaração Universal dos Direitos do Homem”. (Online). (Consultado em 30 de junho de
2016). Disponível em http://www.un.org/en/universal-declaration-human-rights/index.html
http://www.un.org/en/universal-declaration-human-rights/index.html
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caso português, no n.º 2 do artigo 16.º da CRP foi estatuído que “os preceitos constitucionais
e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de
harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem”. Ora, conforme escrevem
GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, a DUDH, “apesar de ser inicialmente uma
Declaração das Nações Unidas sem força jurídica, se tornou o primeiro instrumento de
universalização dos direitos humanos”, sendo certo que, “ela impõe-se como princípio de
interpretação constitucional em matéria de direitos fundamentais: princípio da interpretação
em conformidade com a Declaração Universal54”. Ou seja, através do artigo 16.º n.º 2, os
direitos fundamentais “ficam impregnados dos princípios e valores da Declaração”,
projetando-se a DUDH “sobre as normas constitucionais, moldando-as e emprestando-lhes
um sentido que caiba dentro do sentido da Declaração ou que dele se aproxime”55.
A DUDH “viu-se explicitada em diversos instrumentos, sendo uns de âmbito
planetário, como os Pactos das Nações Unidas sobre os Direitos Civis e Políticos e sobre os
Direitos Económicos, Sociais e Culturais, e outros, de alcance regional, como a Convenção
Europeia dos Direitos do Homem, a Convenção Interamericana dos Direitos do Homem e a
Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos”56.
Quanto aos Pactos das Nações Unidas sobre os Direitos Civis e Políticos e sobre os
Direitos Económicos, Sociais e Culturais, ambos são “importantes no âmbito da
consciencialização dos Estados para o reconhecimento e o respeito pelos direitos e
liberdades dos indivíduos enquanto expressão do valor da dignidade da pessoa humana.
Todavia, estes Pactos são documentos de soft directives, especialmente destinados aos
Estados, e não direcionados especificamente para os indivíduos, o que permite compreender
a quase nula efetividade dos respetivos preceitos, “guardados” apenas para ineficazes
comités”57
54 CANOTILHO, J.J; MOREIRA, Vital – “Constituição da República Portuguesa Anotada”. Coimbra: Coimbra
Editora, 4.ª ed., Volume I, 2007, pág. 367. 55 MIRANDA, Jorge – “Manual de Direito Constitucional – Direitos Fundamentais”, Coimbra: Coimbra Editora,
5:º ed., Tomo IV, fevereiro 2012 , págs.. 183 e 184. 56 BARRETO, Irineu Cabral -cit., pág. 23. 57 SILVA, Suzana Tavares, cit, pág. 19.
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Capítulo 2 - Base Normativa Portuguesa
Façamos agora uma breve incursão pelo plano interno português, que prevê o direito
de asilo quer na sua Constituição, quer numa lei ordinária, a denominada Lei do Asilo.
No plano interno português, o direito de asilo encontra-se consagrado expressamente
no artigo 33.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), mais concretamente no seu n.º
8, que estatui que “é garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos
ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência da sua atividade em favor da
democracia, da libertação socia e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos
da pessoa humana”. O n.º 9 do aludido artigo acrescenta que “a lei define o estatuto de
refugiado político”.
Ora, nas palavras de DAMIÃO DA CUNHA, nestes dois artigos é regulada “a
situação de pessoas que se encontram em perigo (ou em exposição a determinados perigos)
de verem lesados determinados direitos fundamentais e que procuram, no território nacional,
a proteção (o “refúgio”) conferida pela ordem jurídico-constitucional portuguesa (o asilo e o
estatuto de refugiado)”58. O mesmo autor adianta que o que aqui está em causa é um direito
subjetivo que garante a quem se encontre a ser ameaçado de perseguição ou perseguido a
proteção do Estado Português, sendo que também é imposto ao Estado Português o dever de
garantir o asilo nos casos previstos no corpo do artigo.59 Como é que o Estado cumpre esse
dever? Através de um processo de concessão de asilo que não imponha condições impossíveis
ou inexigíveis e a conceder ao requerente de asilo a devida proteção enquanto o processo de
concessão de asilo decorre.60
Este direito de asilo assume três dimensões: uma dimensão internacional, uma
dimensão pessoal e uma dimensão constitucional objetiva. Uma dimensão internacional
“enquanto direito dos Estados a acolher e dar refúgio a quem seja perseguido ou ameaçado
de perseguição por outro Estado; uma dimensão pessoal, enquanto direito subjetivo do
perseguido a obter refúgio e asilo noutro Estado e a não ser remetido para o país de onde
provém; uma dimensão constitucional objetiva enquanto meio de proteção dos valores
58 CUNHA, Damião, cit., pág. 746. 59 Nesse sentido, idem, cit., pág. 754. 60 Idem, cit., pág. 754.
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constitucionais da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da
liberdade e dos direitos da pessoa humana”61.
É também apontado por VITAL MOREIRA e GOMES CANOTILHO que o facto de
ser a lei a definir o estatuto de refugiado político, não significa que a lei tenha total liberdade
na conformação do mesmo, uma vez que para a definição do estatuto de refugiado político
terá sempre que ter em conta as disposições constantes nos instrumentos jurídicos
internacionais, nomeadamente a Convenção de Genebra62.
Atualmente, a denominada Lei do Asilo (Lei da Concessão de Asilo ou Proteção
Subsidiária), é a Lei n.º 27/2008 de 30 de junho, alterada pela lei n.º 26/2014 de 5 de maio.
Esta lei, tal como estatuído no seu artigo 1.º “estabelece as condições e procedimentos de
concessão de asilo ou proteção subsidiária e os estatutos de requerente de asilo”, sendo que
transpôs para o direito nacional as diretivas emanadas pela UE, nomeadamente a Diretiva
Estatuto de Refugiado, Diretiva Condições de Acolhimento e Diretiva Procedimentos de
Asilo.
O artigo 3.º da aludida lei trata da concessão do direito de asilo, sendo que àqueles a
quem for concedido o direito de asilo é conferido o estatuto de refugiado (artigo 4.º).
“A grande novidade desta lei é o grau de densificação que nela se alcança sobre a
interpretação que deve ser dada ao conceito de refugiado que consta da Convenção de
Genebra, em particular, naqueles aspetos que estavam detetadas, desde há muito,
divergências profundas nas práticas dos Estados”63. De facto, no artigo 5.º e 6.º da Lei do
Asilo são elencados o que é suscetível de ser atos de perseguição e o que são agentes de
perseguição. Ora, da enumeração do artigo 5.º do que é suscetível de ser considerado ato de
perseguição resulta que, as graves violações de direitos humanos que fundamentam o pedido
de asilo, “além de graves, deverão ser ainda discriminatórias, para que se possa considerar
existir perseguição, na medida em que elas atingem uma pessoa ou grupo de pessoas
identificado pela sua pertença étnica (…), religião, opiniões políticas e pertença a um grupo
social”64.
61 CANOTILHO, J.J Gomes; MOREIRA, Vital – cit., pág. 536. 62 CANOTILHO, J.J Gomes; MOREIRA, Vital, cit., pág. 537. 63 OLIVEIRA, Andreia Sofia Pinto – “O novo direito do asilo português”, em Jorge Miranda (coord.), Estudos
em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia, Coimbra: Coimbra Editora, 2010, pág. 175. 64 Idem, cit., pág. 176.
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No entanto, para que seja concedido asilo em Portugal não basta apenas que esteja
cumprido o requisito do artigo 3.º da Lei do Asilo e 33.º n.º 8 da CRP. É necessário também
que não se verifique nenhuma causa de exclusão, nos termos do artigo 9.º da Lei do Asilo. De
facto, “a determinação de quem pode ser beneficiário de proteção internacional não se faz
(…) apenas a partir destes pressupostos positivos, que se têm de preencher para se poder
requerer estatuto de refugiado, mas também de pressupostos negativos ou cláusulas de
exclusão, condições que, uma vez verificadas, impedem o reconhecimento do estatuto de
refugiado”65. São, essencialmente, três os motivos que podem impedir a concessão de asilo: a
prática de crimes graves de direito comum, a prática de atos contrários aos fins e princípios
das Nações Unidas e a existência de perigo ou fundada ameaça para a segurança ou ordem
pública66.
A Lei de Asilo estabelece também o procedimento de asilo, que se aplica tanto aos
pedidos de asilo, como aos pedidos de proteção subsidiária, nomeadamente a quem deve ser
dirigido o pedido de asilo e como deve ser realizado (13.º), o direito de permanência no
território nacional dos requerentes de asilo até à decisão sobre a admissibilidade do mesmo
(arrigo 11.º), quais os deveres dos requerentes de proteção internacional, nomeadamente que
elementos devem apresentar para justificar o pedido de proteção internacional (artigo 15.º), o
direito do requerente prestar declarações (artigo 16.º), a tramitação acelerada quando o pedido
de asilo seja considerado infundado quando se verifique as causas do artigo 19.º, quais os
pedidos inadmissíveis (artigo 19.º-A), entre outros67.
65 Idem, cit., pág. 178. 66 Nesse sentido, idem, cit., pág, 178. 67 Para melhor desenvolvimento nesta matéria, se bem que o artigo em causa analise a Lei do Asilo na sua versão
originária, sugere-se a consulta de OLIVEIRA, Andreia Sofia Pinto – “O Procedimento de asilo na lei n.º
27/2008, de 30 de junho”, em Estudos em Comemoração dos 20 anos da Escola de Direito da Universidade do
Minho, Coimbra: Coimbra Editora, 2014.
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Capítulo 3. Direitos Fundamentais em Análise
Quanto ao direito de asilo per si, o mesmo não se encontra especificamente previsto
quer na Convenção de Genebra de 1951, quer na CEDH. No entanto, ao nível da UE
encontra-se previsto num documento que, por força do Tratado de Lisboa, é vinculativo aos
EM e às suas instituições, que é a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
De facto, no artigo 18.º da aludida Carta está estatuído que “é garantido o direito de
asilo, no quadro da Convenção de Genebra de 28 de julho de 1951 e do Protocolo de 31 de
janeiro de 1967, relativos ao Estatuto dos Refugiados, e nos termos do Tratado da União
Europeia e do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia”. Ora, é importante aqui
salientar que o direito de asilo aqui referido é aquele previsto no artigo 78.º TFUE, sendo
certo que este direito será “progressivamente descrito, detalhado e desenvolvido pelas novas
normas de direito secundário que se vão adotando”68. No que toca à Convenção de Genebra
de 1951, esta não menciona o direito de asilo no seu articulado, pelo que levou a que fosse
apenas reconhecido pelos Estados Contratantes uma proteção imperfeita aos refugiados ao
não ser previsto especificamente o direito de asilo, sendo por isso a proteção conferida pela
Carta, ao prever especificamente no artigo 18.º o direito de asilo, algo mais que a proteção
dada pela Convenção69. CRISTINA GORTÁZAR entende que neste artigo está reconhecido
“o direito individual a receber asilo na União Europeia”, sendo que a Diretiva de
Reconhecimento “reconhece que os Estados concederão o estatuto de refugiado ou o estatuto
de proteção subsidiária àqueles que cumpram os requisitos explicitados na própria
diretiva”70.
Está também prevista a proibição das expulsões coletivas e o princípio da não repulsão
estatuído pelo artigo 19.º da Carta, que estatui no seu n.º 1 que “são proibidas as expulsões
coletivas”, sendo que no seu n.º 2 consta que “ninguém pode ser afastado, expulso ou
extraditado para um Estado onde corra sério risco de ser sujeito a pena de morte, a tortura
ou a outros tratos ou penas desumanos ou degradantes”, sendo que este último direito
também é acolhido pela Convenção de Genebra de 1951. No entanto, há que realçar que o
artigo 19.º n.º 2 da Carta vai mais longe que a própria Convenção, na medida em que estende
este direito não só aos refugiados, mas também aos imigrantes, o que não acontece com a
68 GORTÁZAR, Cristina, “Anotação ao artigo 18.º”, em Mariana Canotilho e Alessandra Silveira (coord.) -
Carta dos direitos fundamentais da União Europeia: comentada. Coimbra: Almedina, 2013, pág. 233. 69 Idem, cit., pág. 234. 70 Idem, cit., pág. 235.
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Convenção de Genebra, que apenas aplica este princípio aos que cabem na categoria de
refugiados71.
Quando se fala em requerentes de asilo político ou em refugiados, quais os direitos
fundamentais dos mesmos que contendem com a concessão de asilo? Quais os direitos que
um requerente de asilo tem?
No fundo, “um refugiado tem direito a um asilo seguro. Contudo, a proteção
internacional abrange mais do que a segurança física. Os refugiados devem usufruir, pelo
menos, dos mesmos direitos e da mesma assistência básica que qualquer outro estrangeiro,
residindo legalmente no país, incluindo determinados direitos fundamentais que são inerentes
a todos os indivíduos. Portanto, os refugiados gozam dos direitos civis básicos, incluindo a
liberdade de pensamento, a liberdade de deslocação e a não sujeição a tortura e a
tratamentos degradantes.”72
Da mesma maneira, também se pode afirmar que “os direitos económicos e sociais
que se aplicam aos refugiados são os mesmos que se aplicam a outros indivíduos. Todos os
refugiados devem ter acesso a assistência médica. Todos os refugiados adultos devem ter
direito a trabalhar. Nenhuma criança refugiada deve ser privada da escolaridade.”73
No entanto, aos refugiados não são apenas preconizados direitos, mas também
têm certas e determinadas obrigações, como por exemplo, a sujeição às leis do seu país de
acolhimento.74 Assim é, pelo que vem estatuído no artigo 2.º da Convenção de 1951, que
estatui que “cada refugiado tem, para com o país em que se encontra, deveres que incluem
em especial a obrigação de acatar as leis e regulamentos e, bem assim, as medidas para a
manutenção da ordem pública”.
Mas importa salientar antes de mais que, nas palavras de ANDREIA SOFIA PINTO DE
OLIVEIRA, “num direito como o asilo a questão do procedimento assume importância
fundamental dada a dependência completa e absoluta deste direito de um procedimento
destinado a provar que determinado indivíduo reúne as condições necessárias para lhe ser
reconhecido o direito ao asilo. O direito de asilo é um direito cuja efetivação depende,
fundamentalmente, do procedimento através do qual se reconhece a um determinado
71 Idem, cit., pág. 247. 72 ACNUR – “Proteção de Refugiados: perguntas e respostas”. Lisboa: ACNUR, 1996, pág. 2. 73 Idem. 74 Idem, pág. 3.
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indivíduo o estatuto de refugiado”. 75 De facto, o que se pode retirar é que o próprio
procedimento é um direito em si, fundamental para ser concedido ou não ao requerente de
asilo o mesmo. Sendo certo que o próprio procedimento é também ele próprio o motor para a
efetivação de todos os outros direitos fundamentais inerentes ao refugiado.
Assim sendo, entre os direitos relevantes, permitimo-nos destacar o direito de qualquer
pessoa à vida, previsto no artigo 2.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que
prescreve que “o direito de qualquer pessoa à vida é protegido pela lei. Ninguém poderá ser
intencionalmente privado da vida (…)”. Também o artigo 3.º da Declaração dos Direitos do
Homem vai no mesmo sentido quando declara “todo o indivíduo tem direito à vida, à
liberdade e à segurança pessoal”, bem como o artigo 2.º da Carta Europeia dos Direitos
Fundamentais da União Europeia, o artigo 6.º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e
Políticos, entre outros. Nas palavras de Irineu Cabral Barreto, em consequência deste artigo,
“o Estado tem obrigações negativas e positivas. Negativas, no sentido de se abster de
provocar a morte de maneira voluntária e irregular. Positivas, em dois sentidos; no sentido
de tomar as medidas necessárias para a proteção da vida das pessoas contra terceiros e, em
algumas circunstâncias particulares, contra elas próprias”76.
O artigo 3.º da CEDH prescreve a proibição de tortura, na medida em que “ninguém
poderá ser submetido a torturas, nem a penas ou tratamentos desumanos ou degradantes”.
No mesmo sentido vai o artigo 5.º da DUDH, o artigo o artigo 7.º da PIDCP, a Convenção das
Nações Unidas contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou
Degradantes, a Convenção Europeia para a Prevenção da Tortura e das Penas ou Tratamentos
Desumanos ou Degradantes e os artigos 3.º e 4.º da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais
da União Europeia. Este artigo da CEDH “contém não só uma proibição universal como uma
garantia absoluta: a tortura e os tratamentos desumanos e degradantes não encontram
justificação na Convenção, quaisquer que sejam as circunstâncias que os provocaram ou o
comportamento da vítima, mesmo na reação a um perigo público ameaçando a vida da
Nação, como o terrorismo ou o crime organizado”77. Nesta medida, pegando nestas palavras
de IRINEU CABRAL BARRETO, não se pode deixar de entender a particular importância
75 OLIVEIRA, Andreia Sofia Pinto – A recusa de pedidos de asilo por inadmissibilidade, em Estudos em
Comemoração do 10.º Aniversário da Licenciatura em Direito da Universidade do Minho. Coimbra: Almedina,
2004. pág. 82. 76 BARRETO, Irineu Cabral, cit., pág. 81. 77 BARRETO, Irineu Cabral, cit., pág. 92.
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deste artigo nos tempos atuais quer na Europa quer no resto do mundo, devido ao clima de
terror instalado com os cada vez mais frequentes atentados terroristas que têm acontecido.
Particular importância reveste também este artigo entendido numa outra perspetiva.
Uma vez que “a convenção não garante, como tal, o direito de asilo nem o direito, para um
estrangeiro, de entrar ou residir num país determinado ou de não ser expulso; nem tao pouco
a convenção consagra o direito ao asilo político”, “a expulsão ou a extradição de uma pessoa
para um país onde existem razões para acreditar que ela será submetida a um tratamento
contrário ao artigo 3.º pode suscitar a questão de uma eventual violação deste mesmo artigo,
porquanto o Estado que expulsa, na medida em que expõe o indivíduo a um risco de
tratamento contrário ao disposto neste artigo, torna-se responsável por essa eventual
violação”78. Relevo também para, “em princípio, a transferência para um Estado
intermediário que é parte na Convenção não dispensa o Estado das suas responsabilidades a
este nível, se o Estado intermediário vem, a final, a expulsar a pessoa para um país onde ela
corre risco de maus tratamentos”79.
O artigo 5.º da CEDH prevê o direito à liberdade e à segurança, na medida em que
“toda a pessoa tem direito à liberdade e segurança. Ninguém pode ser privada da sua
liberdade”, salvo em exceções previstas no próprio artigo. Neste sentido dispõem também os
artigos 3.º da DUDH, o artigo 9.º da PIDCP e o artigo 6.º da Carta Europeia dos Direitos do
Homem.
Os refugiados/requerentes de asilo têm também direito a um processo equitativo e
célere na apreciação do seu pedido de asilo, como também em qualquer outro processo que
possam ter pendentes nos tribunais. Este direito encontra-se consagrado no artigo 6.º da
CEDH, no artigo 10.º e 11.º n.º 1 da DUDH, do artigo 14.º do PIDCP, nos artigos 47.º e 48.º
da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Nas palavras de Irineu Cabral
Barreto, “para uma efetiva proteção dos Direitos Humanos não é suficiente uma consagração
substantiva; será necessário estabelecer garantias fundamentais de processo de modo a
reforçar os mecanismos de salvaguarda destes direitos”80.
Os refugiados/requerentes de asilo têm, como qualquer outra pessoa, direito ao
respeito pela sua vida privada e familiar, previsto no artigo 8.º da CEDH, no artigo 12.º do
78 Idem, cit., pág. 102. 79 Idem, cit., pág. 103. 80 Idem, cit., pág. 148.
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PIDCP e nos artigos 7.º e 8.º da Carta de Direitos Fundamentais da UE, entre outros. Este
artigo reveste enorme importância, nomeadamente, quando se fala em famílias de requerentes
de asilo que, pelas mais variadas razões, se encontram separadas, e estes pretendem reunir-se
e, no ca