agnus dei - análise

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A análise do texto musical Passando-se agora a alguns detalhes analíticos da partitura propriamente dita, percebe-se que toda a peça sustenta-se sobre a linha melódica do tenor, remanescente do canto gregoriano. As demais vozes são intercaladas entre as suas notas, desenvolvendo-se um jogo polifônico ágil e dinâmico, com um alto grau de complexidade rítmica (que se contrapõe à linearidade do canto gregoriano). A Messe de Nostre Dame foi inteiramente composta sobre um cantoçhão, como era costume da época. Esse cantochão, porém, foi utilizado como tenor ou cantus firmus. A tessitura polifônica se nos apresenta como se insurgisse do padrão do canto gregoriano que, concomitantemente, participa contrapontisticamente da trama polifônica das vozes superiores, muito embora durante toda a peça essas características apareçam de forma contundente. Essa trama polifônica se caracteriza por um traçado rítmico que se desenvolve ciclicamente, mas retornando com periodicidade. Cria-se, desta forma, um ritmo padronizado ou isorritmo; cada delineamento rítmico, por sua vez, recebe o nome de talea. As demais vozes se entrelaçam abaixo e acima do cantus firmus. Essa característica da peça apresenta-se, no contexto da hipótese aqui apresentada, como sendo extremamente significativa, se se levar em conta que, analogamente, o poder eclesiástico - aqui simbolizado pelo canto gregoriano - se encontrava sutilmente envolto pelas perspectivas sócio-político-econômicas da burguesia em formação, o que veio a ser o principal motivo de sua desestabilização. Um outro composicional utilizado pelo compositor é a fragmentação melódica, ou hoqueto - que se relaciona, do ponto de vista sócio- ideológico, com a fragmentação do poder eclesiástico e a diversificação de idéias no século XIV - propiciando a estruturação de segmentos melódicos extremamente reduzidos que, separados por pausas, delegam a obra uma singular pulsação rítmica. O hoqueto, sendo associado às duas vozes do pentagrama superior, caracteriza-se por um discurso melódico em forma de síncope contrapontística. 4.3 A análise da partitura As observações foram feitas na partitura do Agnus Dei, editada no FINALI 2006. O Agnus Dei da missa é da forma ABA, e na cadência final, observado juntamente com seu âmbito temos que o mesmo está no modo LÍDIO. Observamos as extensões de cada parte sendo: Dó2 até Mi3 no Contratenor Bassus, Dó2 até Fá3 no Tenor, La2 até Dó4 no Contratenor Altus e por fim Dó3 até Dó4 no Superius. O Color no superius vai do primeiro até o terceiro compasso. A estrutura isorítimica começa no qui tolis - quer dizer, depois da

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Page 1: Agnus Dei - Análise

A análise do texto musicalPassando-se agora a alguns detalhes analíticos da partitura propriamente dita, percebe-se que toda a peça sustenta-se sobre a linha melódica do tenor, remanescente do canto gregoriano. As demais vozes são intercaladas entre as suas notas, desenvolvendo-se um jogo polifônico ágil e dinâmico, com um alto grau de complexidade rítmica (que se contrapõe à linearidade do canto gregoriano).A Messe de Nostre Dame foi inteiramente composta sobre um cantoçhão, como era costume da época. Esse cantochão, porém, foi utilizado como tenor ou cantus firmus.A tessitura polifônica se nos apresenta como se insurgisse do padrão do canto gregoriano que, concomitantemente, participa contrapontisticamente da trama polifônica das vozes superiores, muito embora durante toda a peça essas características apareçam de forma contundente.Essa trama polifônica se caracteriza por um traçado rítmico que se desenvolve ciclicamente, mas retornando com periodicidade. Cria-se, desta forma, um ritmo padronizado ou isorritmo; cada delineamento rítmico, por sua vez, recebe o nome de talea. As demais vozes se entrelaçam abaixo e acima do cantus firmus. Essa característica da peça apresenta-se, no contexto da hipótese aqui apresentada, como sendo extremamente significativa, se se levar em conta que, analogamente, o poder eclesiástico - aqui simbolizado pelo canto gregoriano - se encontrava sutilmente envolto pelas perspectivas sócio-político-econômicas da burguesia em formação, o que veio a ser o principal motivo de sua desestabilização.Um outro composicional utilizado pelo compositor é a fragmentação melódica, ou hoqueto - que se relaciona, do ponto de vista sócio-ideológico, com a fragmentação do poder eclesiástico e a diversificação de idéias no século XIV - propiciando a estruturação de segmentos melódicos extremamente reduzidos que, separados por pausas, delegam a obra uma singular pulsação rítmica. O hoqueto, sendo associado às duas vozes do pentagrama superior, caracteriza-se por um discurso melódico em forma de síncope contrapontística.4.3 A análise da partituraAs observações foram feitas na partitura do Agnus Dei, editada no FINALI 2006.O Agnus Dei da missa é da forma ABA, e na cadência final, observado juntamente com seu âmbito temos que o mesmo está no modo LÍDIO. Observamos as extensões de cada parte sendo: Dó2 até Mi3 no Contratenor Bassus, Dó2 até Fá3 no Tenor, La2 até Dó4 no Contratenor Altus e por fim Dó3 até Dó4 no Superius.O Color no superius vai do primeiro até o terceiro compasso. A estrutura isorítimica começa no qui tolis - quer dizer, depois da entonação de cada agnus (Agnus III repete o Agnus I). Como a seção do canto do qui tollis é idêntico em Agnus I e II, as duas declarações disto constituem o dois colors. O primeiro color (Agnus I) tem duas taleas sendo cada uma com doze notas e, o segundo color (Agnus II) seis taleas sendo cada uma com quatro notas (NAWM, 19?? ).Além do tenor, o contratetnor de triplum são também completamente ou em parte isorítmicos. As duas partes superiores estimulam o ritmo com síncopa quase constante. Um motivo característico que esboça um trítono é ouvido várias vezes (compassos 2, 5, e 25, e na forma ornamentada em 19), também em outro movimentos da missa.Observa-se que o estilo do canto é MELISMÁTICO (várias notas entoadas para uma sílaba).A ocasião para a qual o trabalho foi escrito deveria ter sido um de solenidade incomum e magnificência, como já mencionado.