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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE SERVIÇO SOCIAL ANDRÉA ARAUJO FERRAZ ADOÇÃO E REFLEXÕES ACERCA DOS ADOTANTES FORTALEZA 2013

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Page 1: ADOÇÃO E REFLEXÕES ACERCA DOS ADOTANTES E RE… · adoção um sentido para o atual panorama da adoção no Brasil, bem como visa à compreensão da escolha do adotado. Num contexto

CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

ANDRÉA ARAUJO FERRAZ

ADOÇÃO E REFLEXÕES ACERCA DOS ADOTANTES

FORTALEZA

2013

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ANDRÉA ARAÚJO FERRAZ

ADOÇÃO E REFLEXÕES ACERCA DOS ADOTANTES

Monografia submetida à aprovação da Coordenação do Curso de Serviço Social da Faculdade Cearense, como requisito parcial para obtenção do diploma de Bacharel em Serviço Social.

Orientadora: Profª. Ms. Joelma Maria Freitas

FORTALEZA

2013

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Bibliotecário Marksuel Mariz de Lima CRB-3/1274

F368a Ferraz, Andréa Araújo

Adoção e reflexões acerca dos adotantes / Andréa Araújo

Ferraz. Fortaleza – 2013.

66f. Orientador: Prof.ª Ms. Joelma Maria Freitas.

Trabalho de Conclusão de curso (graduação) – Faculdade

Cearense, Curso de Serviço Social, 2013.

1. Adoção. 2. Família. 3. Abandono. I. Freitas, Joelma

Maria. II. Título

CDU 364

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ANDRÉA ARAUJO FERRAZ

ADOÇÃO E REFLEXÕES ACERCA DOS ADOTANTES

Monografia como pré-requisito para

obtenção do título de Bacharelado em

Serviço Social, outorgado pela Faculdade

Cearense – FAC, tendo sido aprovada pela

banca examinadora composta pelos

professores.

Data de aprovação: ____/ ____/____

Banca Examinadora

___________________________________________________ Professora Ms. Joelma Maria Freitas (Orientadora)

___________________________________________________ Professora Ms. Eliane Nunes de Carvalho

___________________________________________________ Professora Ms. Valney Rocha Maciel

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Dedico este trabalho ao meu esposo, André Luiz Rêgo do Carmo, pela paciência, incentivo, apoio e companheirismo. Um profissional exemplar que eu admiro e no qual me inspiro.

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AGRADECIMENTO

Em primeiro lugar, a Deus, por toda sua força divina, ao qual eu sempre recorri

nos momentos de dificuldade.

À minha mãe, exemplo de perseverança e paciência, que ao longo da vida me

ensinou a ser honesta e não desistir dos meus sonhos.

Aos meus amigos de faculdade, Alfredo Monteiro, Ana Lia Hermes, Milena

Cunha, Wiliana Medeiros e Edna Rosa, que eu tive o prazer de conhecer e

aprender com cada um deles ao longo do curso, bem como as colegas Jessica

Sousa e Elisabeth Paiva, pela paciência e compreensão no meu último

semestre de faculdade.

À minha orientadora, Joelma Freitas, que gentilmente aceitou ser minha guia

nessa caminhada, pela paciência, palavras de conforto e sabedoria.

Aos meus professores do Curso de Serviço Social que contribuíram para minha

formação profissional e, especialmente, às professoras Eliane Nunes e Valney

Rocha, pela disponibilidade e paciência, não apenas como integrantes da

banca, mas como mestres significativos na minha vida acadêmica.

Às minhas amigas desde a adolescência, Juliana Oliveira e Kelvia Castro, que

compreenderam a minha ausência e que contribuíram cada uma do seu jeito,

pra ajudar a me tornar quem sou hoje.

A todos que por algum motivo me ajudaram e pediram a Deus por mim para

que eu pudesse chegar a essa conquista.

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“Talvez não tenha conseguido fazer o melhor, mas lutei para que o melhor fosse feito. Não sou o que deveria ser, mas Graças a Deus, não sou o que era antes”. (Marthin Luther King)

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RESUMO

A presente monografia trata-se de uma pesquisa bibliográfica e de campo, de cunho qualitativo, que discorre sobre o processo de adoção, buscando compreender desde suas formalidades e nuances burocráticas até a motivação dos pais adotivos e o perfil do adotando escolhido. Assim, busca-se realizar o confronto entre a literatura acerca do assunto e a experiência prática do processo de acolhimento da criança ou adolescente narrada pelos adotantes entrevistados, sempre observando a legislação brasileira e suas modificações mais recentes. Para tanto, a pesquisa elegeu como categorias de análise a família, a criança e o adolescente, bem como a adoção propriamente dita e suas modalidades. Como fundamento teórico, o trabalho faz menção a autores especialistas na área da adoção, em especial, CAMARGO (2006), SANTOS (1997), VARGAS (1998) e WEBER (2002). Com o fim de atingir seu objetivo, foi realizado um levantamento bibliográfico acerca do tema em discussão, bem como entrevista com casais em diferentes estágios no processo de adoção, oportunidade em que seus relatos foram confrontados com a literatura acerca do assunto, o que ajudou a confirmar a existência de um perfil de exclusão que acaba por se enquadrar no conceito de adoção tardia.

Palavras Chaves: Adoção. Família. Abandono.

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ABSTRACT

This monograph is a bibliographic and field research, of a qualitative nature, which talks about the adoption process, seeking to understand since their formalities and bureaucratic nuances until the motivation of adoptive parents and the profile of adopting chosen. Thus, it tries to make the confrontation between the literature on the subject and the practical experience of the process of acceptance of the child or adolescent narrated by adopters interviewed, always observing the Brazilian legislation and its most recent modifications. For both, the search has elected as categories of analysis the family, the child and the adolescent, as well as the adoption itself and its modalities. As a theoretical base, work mentions authors experts in the field of adoption, in particular, CAMARGO (2006), Santos (1997), Vargas (1998) and Weber (2002). With the purpose of achieving its objective, a bibliographic survey was carried out on the subject under discussion, as well as interviews with couples at different stages in the adoption process, opportunity in that their reports were confronted with the literature about the subject, which has helped to confirm the existence of a profile of exclusion that ends by fall within the concept of adoption late.

Key Words: Adoption. Family. Abandonment.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................. 10

ADOÇÃO .......................................................................................................... 14

1.1 Evolução Histórica da Adoção: da Antiguidade à Contemporaneidade ..... 14

1.1.1 Antiguidade ....................................................................................... 14

1.1.2 Idade Média ...................................................................................... 17

1.1.3 Idade Moderna e Contemporânea .................................................... 17

1.2 Definição de adoção ............................................................................... 19

1.3 A evolução da legislação brasileira acerca da adoção ............................ 21

1.4 O processo de adoção no Brasil ............................................................. 24

1.3.1 Estágio de convivência ..................................................................... 26

1.3.2 A constituição da adoção .................................................................. 26

1.3.3 Cadastro de adotantes ...................................................................... 27

1.5. Modalidades de adoção ......................................................................... 28

FAMÍLIA ADOTIVA X ADOTANDO .................................................................. 33

2.1 Um breve histórico da família .................................................................. 33

2.2 Família adotiva e afetividade .................................................................. 37

2.3 A criança e a questão do abandono ........................................................ 39

2.4 A realidade das crianças institucionalizadas ........................................... 42

ADOÇÃO E REFLEXÃO ACERCA DOS ADOTANTES ................................... 45

3.1 A motivação da adoção ........................................................................... 47

3.2 O perfil da criança a ser adotada ............................................................ 50

3.3 O perfil da exclusão e a adoção tardia .................................................... 52

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 57

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................. 60

APÊNDICE ....................................................................................................... 65

ANEXOS .......................................................................................................... 66

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INTRODUÇÃO

A presente pesquisa busca compreender o processo de adoção,

desde suas formalidades e nuances burocráticas até a motivação dos pais

adotivos e o perfil do adotando escolhido, sempre procurando realizar o

confronto entre a literatura acerca do assunto e a experiência prática do

processo de acolhimento da criança ou adolescente narrada pelos adotantes.

A despeito da abordagem pelas grandes mídias, principalmente por

meio de enredos de novela e programas televisivos envolvendo temáticas de

família, a adoção ainda não alcançou posição de destaque, sobretudo por

enfrentar muitos percalços relacionados ao preconceito e à ignorância acerca

do tema por pessoas do senso comum, muitas vezes arraigada pelo aspecto

de caridade presente nas primeiras adoções registradas na história do Brasil.

Assim, a legislação brasileira foi sendo alterada na tentativa de

desburocratizar o processo de adoção. Segundo o Estatuto da Criança e do

Adolescente, a adoção constitui medida excepcional e irrevogável, somente

aplicável quando esgotados os recursos de manutenção da criança ou do

adolescente na família natural ou extensa.

Entretanto, o percurso realizado até a finalização da adoção não é

simples, a começar pela habilitação dos pretendentes à adoção. Analisando-se

superficialmente os aspectos cotidianos mais frequentes que os motivam a

viver a experiência de adoção de uma criança ou adolescente, logo são

reveladas inúmeras circunstâncias, tais como problemas de infertilidade,

relação de caridade e benevolência, altruísmo, tentativa de reestruturação da

relação conjugal, bem como outras situações peculiares que somente os casos

concretos podem demonstrar (SANTOS, 1997).

Todavia, a depender dos motivos que levam à adoção, torna-se mais

provável uma situação de conflito, a qual pode culminar na devolução do

adotando, estigmatizando-o ainda mais. Portanto, a preparação do adotante é

imprescindível e envolve peculiaridades muitas vezes não encontradas na

relação de filiação biológica. Nesse contexto, é importante ressaltar ainda que

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a estabilidade familiar e a aceitação da criança pela família extensa serão

essenciais para o sucesso da experiência da adoção.

Afora uma infindável lista de variáveis envolvidas no processo de

adoção, é preciso destacar ainda o problema daquelas crianças e adolescentes

que não preenchem um perfil com requisitos mais comuns de preferência entre

os adotantes.

Daí, revela-se interessante um aprofundamento na questão relativa

ao perfil dessas crianças que se encontram em abrigos e instituições de

acolhimento por muito mais tempo que o desejado. Assim, tais crianças ficam

sujeitas a sentimentos de rejeição, culpa e inferioridade, implicando, portanto,

em sérias dificuldades de adaptação numa futura família adotante (CAMPOS,

2013).

A motivação para a realização desta pesquisa teve como origem a

curiosidade despertada em torno do assunto depois do contato com a disciplina

da graduação “Direito e Legislação Social”, oportunidade em que foram

abordados os direitos e garantias previstos na Constituição Federal, em

especial, aqueles inerentes às crianças e aos adolescentes.

Além disso, o tema vez ou outra foi levantado em conversas

conjugais, momento no qual era feita uma reflexão acerca do desejo de um dia

adotar uma criança, bem como suas implicações e as transformações que tal

decisão poderia ensejar, como os familiares reagiriam a tal determinação e o

que seria preciso para estarmos preparados para enfrentar a situação.

Somado às pretensões pessoais, o tema tem nítida relevância para

o Serviço Social, tendo em vista a necessidade de os profissionais da área lidar

com inúmeros aspectos - sociais, psicológicos e pedagógicos. Além disso, é

necessário um exercício profissional e intelectual acerca do assunto visando

encontrar a melhor forma de trabalhar com os mitos e preconceitos que rondam

o processo de adoção e que, muitas vezes, atingem os próprios profissionais

do Serviço Social.

De forma geral, o presente trabalho enfoca na evolução história da

adoção um sentido para o atual panorama da adoção no Brasil, bem como visa

à compreensão da escolha do adotado. Num contexto mais específico, a

pesquisa busca entender como se dá o processo de decisão dos pretendentes

em relação à adoção, em especial, suas motivações e qual o perfil escolhido.

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A escolha das categorias que delinearão o desenvolvimento da

presente pesquisa está diretamente relacionada com o tema relativo à adoção

e suas vertentes, em especial, a realidade das crianças e adolescentes fora

dos parâmetros comuns de escolha dos candidatos ao processo adotivo.

Contudo, para iniciar tal debate, é importante, antes de tudo,

entender os fatores e as características que levam os interessados pela adoção

à escolha de um determinado perfil, o que revela a existência de verdadeiros

mitos e preconceitos que impregnam a sociedade em relação a essa questão.

Assim, três vertentes vão se revelar fundamentais para a compreensão do

tema investigado, quais sejam a família, a criança e o adolescente, e, por

último, as motivações do processo de adoção.

Para a compreensão do processo de adoção, é imprescindível o

estudo do comportamento da família e de seu papel, uma vez que esta

influenciará diretamente o conjunto de valores que incidirão sobre a

personalidade e o caráter da criança ou do adolescente adotado ao longo de

sua vida.

Outro elemento indispensável ao desenvolvimento da pesquisa em

torno do processo de adoção é o estudo acerca da criança e do adolescente,

objeto principal do trabalho em tablado. O estudo das nuances que envolvem o

desenvolvimento e a formação da criança/adolescente é importante para o

delineamento das temáticas que envolvem o processo de adoção.

Nessas circunstâncias, é preciso verificar o respeito aos direitos das

crianças e adolescentes, bem como promover um debate em torno das

fragilidades e da burocracia que ainda envolve o processo de adoção no Brasil,

razão pela qual ainda se encontram tantas crianças à espera de uma família.

Além disso, o tipo de pesquisa que será utilizado no trabalho em

questão será do tipo qualitativa, a qual pode ser definida como o caminho do

pensamento a ser seguido. Tal espécie de metodologia ocupa um lugar central

na teoria, sendo basicamente um conjunto de técnicas a ser adotada para

construir uma realidade (Minayo, 2003).

Reunindo todos esses pressupostos, o trabalho foi dividido em três

capítulos: no primeiro, Adoção, fez-se um breve resumo da evolução histórica

da adoção desde os povos antigos até a Idade Contemporânea, oportunidade

em que se observou como o instituto era visto de acordo com a época e a

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cultura de cada povo. Além disso, também foi feito um breve resumo da

evolução legislativa acerca da adoção no Brasil, bem como foi demonstrado

como se dá o processo atualmente de acordo com a Lei Federal n.º

12.010/2009, o conceito e as modalidades da adoção.

Já no segundo capítulo da presente pesquisa, Família adotiva x

adotando, basicamente foram abordados os referenciais teóricos, momento no

qual se abordou a história da família e suas mudanças ao longo do tempo.

Além disso, também foi discutida a questão da afetividade da família adotiva e

a distinção entre laços sanguíneos e socioafetivos, inclusive ressaltando a

importância da priorização do melhor interesse da criança e do adolescente.

Neste capítulo, também foi debatida a questão do abandono e a realidade das

crianças institucionalizadas.

No terceiro e último capítulo desta monografia, Reflexões acerca da

relação entre adotantes no processo de adoção, a pesquisa adentrou de vez na

questão da adoção, oportunidade em que foram entrevistados três casais, em

diferentes estágios no processo de adoção. Após, foi realizada a transcrição

das entrevistas, onde alguns trechos foram escolhidos e reproduzidos no

presente trabalho como forma de mostrar correlacionar a literatura que trata de

adoção com o relato dos casais.

Por último, as considerações finais, enquanto resumo da

compreensão de todos os elementos que envolvem o objetivo da pesquisa,

entendendo as circunstâncias envolvidas no processo de adoção.

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ADOÇÃO

Ao longo dos tempos, o instituto da adoção foi se moldando de

acordo com a época e a cultura das sociedades que contribuíram para o seu

desenvolvimento, passando desde a visão simplista de instrumento de

perpetuação do nome da família adotante até a moderna concepção de vínculo

familiar definitivo e irrevogável, o que confere ao adotado uma série de direitos

até então não conquistados.

Assim, para o início do estudo do tema relativo à adoção, é muito

importante um aprofundamento em torno da forma como esta se desenvolveu

em meio às características de cada período da História, oportunidade em que

será feita uma dedicada análise de como a adoção era abordada nas Idades

Antiga, Média, Moderna e Contemporânea, assim como na legislação

brasileira.

1.1 Evolução Histórica da Adoção: da Antiguidade à Contemporaneidade

1.1.1 Antiguidade

A adoção é instituto milenar, tanto que a maioria dos povos antigos,

dentre os quais hebreus, egípcios, gregos e romanos, já a praticava como

forma de acolhimento de crianças pelas famílias como se fossem seus filhos

naturais, a fim de que se pudesse dar continuidade ao culto doméstico dos

antepassados.

Nesse contexto, a adoção tinha finalidade essencialmente religiosa,

uma vez que cabia aos filhos a responsabilidade pelos cultos fúnebres de seus

antecedentes, razão pela qual o fato de transformar uma pessoa estranha em

descendente recebia caráter secundário. Portanto, a relevância dada à adoção

se resumia em torno de encontrar aquele que encomendaria o espírito de seu

adotante aos deuses mediante as celebrações depois da morte.

Desde a Antiguidade, hindus, egípcios, hebreus, gregos e romanos

enxergavam no acolhimento dessas crianças a solução para a falta de filhos

naturais que pudessem propiciar a continuidade da família e, assim, evitar a

desgraça representada pela morte sem descendentes (SILVA FILHO, 2012).

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Para tais povos, a ausência de um familiar que pudesse viver o tempo do luto

era tida como uma infelicidade insuperável.

Coube aos povos orientais dar início à sistematização do instituto da

adoção. No Código de Hamurabi, escrito por volta dos anos 1.700 A.C,

dedicava 9 dispositivos ao tema. Em princípio, deixava prescrito que se um

homem adotasse uma criança e lhe desse seu nome como filho, criando-o,

este, quando crescido, não poderia ser reclamado por outra pessoa.

Aprofundando tal análise, Cunha (2011) assegura acerca do Código de

Hamurabi que

Ali, se alguém desse seu nome a uma criança, a criasse como filho e lhe ensinasse uma profissão, bastava para que a adoção fosse concretizada, não podendo o menor mais ser reclamado pelos pais biológicos. O que não impediria, todavia, do adotando retornar à casa paterna, pois caso ele se voltasse contra o seu pai ou mãe adotivos, seria devolvido à família de origem. Estavam previstos naquele código, hipóteses que permitiam aos pais biológicos reclamar o filho de volta: se o pai adotivo não ensinasse um ofício ao adotado, se o adotante não tratasse o adotado como filho e se tivesse renegado o mesmo em favor dos filhos naturais. Constata-se, dessa maneira, que a adoção era uma espécie de contrato onde adotante e adotando tinham obrigações recíprocas.

Nas Leis de Manu (II a.C. - II d.C.), seguidas principalmente pelo

povo hindu, a adoção exigia determinados requisitos prévios, principalmente a

necessidade de que o adotado tivesse conhecimento dos rituais religiosos e

fosse da mesma casta do adotante. Isso significa que

o pai e a mãe, de mútuo consentimento, podiam dar o seu filho a uma terceira pessoa, que fosse da mesma casta que o filho e lhe mostrasse afeto, exigindo-se para tal um ritual próprio que consistia nos pais fazerem uma libação de água. (SOUSA, 2012, p.21)

Já na Grécia, a adoção ganhou uso mais regular e com regras mais

objetivas, tornando-se ato solene que exigia a intervenção de um magistrado,

exceto se fosse manifestação de última vontade do adotante mediante previsão

em testamento, o que somente poderia ser feito pelo homens maiores de 18

anos, já que as mulheres não eram consideradas cidadãs. Além disso, a

adoção era causa de rompimento dos laços com a família de origem, bem

como poderia ser revogada no caso de ingratidão.

Mas foi em Roma que a adoção ganhou contornos mais

sistematizados e se desenvolveu na seara jurídica, influenciando os países do

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Ocidente juntamente com a difusão do direito romano. Distanciando-se do

cunho religioso que antigamente a carregava com mais rigor, a adoção passou

a se aproximar de uma finalidade econômica, uma vez que servia para a

transferência de mão de obra de uma família para outra, bem como política, já

que as famílias romanas eram divididas em castas e, por meio da adoção,

plebeus poderiam vir a se tornar patrícios.

Na sua forma mais clássica, a família romana era chefiada pelo

pater famílias, o qual desempenhava todas as funções religiosas, econômicas,

e era também detentor de todos os bens materiais do núcleo familiar. Além

disso, carregava a simbologia do senhor do lar, cujo poder só se acabaria com

a sua morte. Em meio a esse contexto, a adoção poderia ocorrer de três

formas: ad-rogação (arrogatio), adoção propriamente dita (adoptio) e a adoção

por testamento (adoptio per testamentum).

No caso de ad-rogação, um pater familias era adotado por outro

pater familias, oportunidade em que este passava a ser detentor do patrimônio

daquele, bem como senhor de sua família. Para que isso fosse possível, o

adotante deveria ter a idade mínima de 60 anos e ter uma diferença de pelo

menos 18 anos de idade para o adotado.

Na adoção propriamente dita, a qual era chamada pelos romanos de

adoptio (SILVA FILHO, 2012), o adotado mudava para a família do adotante, o

que poderia representar também uma mudança de classe social. Naquela

época, a sociedade romana era estática e desigualmente dividida em classes,

razão pela qual a adoção às vezes assumia a condição de mecanismo para

ascensão social. Assim, “era necessário que interrompesse o poder do pai

natural e colocasse o filho debaixo do poder do pai adotivo. Aplicava-se a

disposição da Lei das XII Tábuas, que declarava extinto o pátrio poder, se o pai

emancipasse o filho por três vezes”.

E, por fim, a adoção poderia ocorrer por meio de testamento, a qual

somente tinha efeitos após a morte do testamenteiro, com o fim de deixar o

nome, principalmente, e bens materiais ao adotado.

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1.1.2 Idade Média

Na Idade Média, a adoção teve escassa aplicação. Em razão da

rígida casta social da época, não se admitia da família de um grande senhor

feudal a presença de indivíduos de classes inferiores, tais como artesãos e

plebeus. Logo, a mudança entre camadas da sociedade que outrora se viu no

direito romano não se aplicava no que se convencionou na Idade Média

(SENADO, 2013).

Além disso, a influência da Igreja Católica não só lançou as bases

do feudalismo, visto que esta era uma grande proprietária de terras, assim

como direcionou o pensamento do homem medieval. Nesse período, a família

cristã era fortemente baseada na ideia do matrimônio. Assim, os dogmas

católicos não consentiam com o reconhecimento parental de um filho estranho

à relação advinda do sacramento que representava a união indissociável de um

homem e uma mulher, sobretudo quando tal reconhecimento visava burlar as

regras que proibiam o reconhecimento de filhos frutos de adultério ou incesto.

A Igreja Católica também não tolerava a adoção porque esta

representava a chegada de um herdeiro, o qual impedia a “donatio post

obitum”, vinda de grandes senhores feudais que não tinham descendentes para

receber seus bens após sua morte e que, consequentemente, ficavam para

aquela primeira.

Em meio a todo esse contexto, a adoção começou a cair em desuso

e ficar à margem dos costumes medievais, somente retomando sua

sistematização, tal como visto em outro momento no direito romano, após a

Revolução Francesa.

1.1.3 Idade Moderna e Contemporânea

Diferentemente da Idade Média, época na qual predominou o

teocentrismo, ou seja, Deus como fundamento e centro de tudo, a Idade

Moderna viveu o desenvolvimento do antropocentrismo, que via o homem

como o centro das atenções. Com a transferência da base do saber da época

da religião para a ciência, o homem passou a questionar a fé e encontrar na

razão o fundamento para o entendimento dos eventos (SENADO, 2013).

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Nessa época, houve a transição entre o antigo sistema feudal e o

capitalismo, o qual surgia em meio ao desenvolvimento do comércio e a

ascensão de uma nova classe social: a burguesia. Além disso, no campo

político, vê-se o nascimento dos Estados Nacionais, enquanto o campo cultural

é inundado pelo pensamento dos renascentistas e a Reforma Protestante

sacode a Religião da época.

Segundo Silva Filho (2012), é nesse contexto que três legislações se

destacam à época: o Código promulgado por Cristiano V, na Dinamarca (1683);

o Código Prussiano, na Alemanha (1751); e, o Codex Maximilianus, da Bavária

(1756). Contudo, foi a partir do Código Prussiano que partiu a inspiração direta

para o Código Napoleônico (1807), o qual colocou a legislação francesa acerca

da adoção em outro patamar de evolução.

Quase extinta na Idade Média, a adoção somente voltou a estar de

fato no centro das atenções depois da Revolução Francesa (1789), movimento

fortemente influenciado pelos princípios iluministas da liberdade, igualdade e

fraternidade (SILVA FILHO, 2012).

Os artigos 343 a 360, do título XIII do Livro I, do Código Civil liderado

pelo Napoleão Bonaparte cuidavam de ver a adoção como ato essencialmente

contratual e submetido a rígidos requisitos para sua validade, inclusive

precisando do consentimento das partes, razão pela qual a qualidade de filho

adotivo somente era adquirida na maioridade.

Além disso, segundo a redação do art. 343, a adoção somente

poderia ser feita por pessoas de um ou outro sexo maiores de 50 anos, com

diferença de idade em relação ao adotando não inferior a 15 anos. Além disso,

somente poderiam adotar aqueles que não tinham filhos ou descendentes

legítimos à época da adoção, o que fortalecia a tradição patronímica.

Por outro lado, com o advento da Primeira Guerra Mundial, os órfãos

de guerra passaram a ocupar os legisladores, oportunidade em que a adoção

assume contornos de caridade e preocupação social. Nessa época, a Itália se

adianta com a promulgação da Lei n. 1.143, de 17 de julho de 1917, e passa a

prever que “a adoção poderia ser feita antes mesmo de aqueles órfãos

completarem 18 anos de idade, portanto, sem ser preciso o seu

consentimento”, o que também se aplicava àqueles nascidos de pais

desconhecidos em tempos de guerra.

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No mesmo caminho, a França promulga nova Lei em 19 de junho de

1923, que permite definitivamente a adoção de menores bem como torna mais

amplos seus efeitos, influenciando decididamente as legislações da Espanha,

Brasil e Uruguai ao longo do século XX.

1.2 Definição de adoção

Ao longo dos tempos, o instituto da adoção foi sofrendo

transformações em razão das várias influências que experimentou de acordo

com a época, seja por força dos costumes, seja por conta das leis

disciplinadoras da matéria. Portanto, seus aspectos e consequências sempre

foram objeto de evolução até o tempo atual.

É bem verdade que, na Antiguidade, a morte sem descendentes era

considerada uma verdadeira desgraça familiar. Nesse sentido, Pereira (2006,

p. 387) explica que “a necessidade de propiciar os deuses familiares levou os

povos antigos a criar situações jurídicas especiais destinadas a assegurar um

continuador do culto doméstico, a quem não tivesse descendente”.

Com o desenvolvimento do direito romano, é possível afirmar que a

adoção passou a desenvolver uma feição mais sistemática, influenciando

principalmente os países do Ocidente. Segundo Filho (2012, p. 23), “não teria

desaparecido a inspiração religiosa, mas desempenhou papel importante no

âmbito da família, visando corrigir as divergências do parentesco civil (agnatio)

e de sangue (cognatio), além da finalidade política”.

E é justamente no campo jurídico que é possível se encontrar a

definição mais técnica para a adoção. No Brasil, a lei não tratou de conceituar o

instituto, o que ficou a cargo dos pensadores jurídicos, razão pela qual é

possível encontrar uma pluralidade de definições a respeito do tema. Todavia,

é necessário destacar que, em sua grande maioria, os conceitos de adoção

envolvem a criação de vínculo de parentesco com natureza „civil‟, a fim de

distinguir do natural.

Clóvis Beviláqua (1859-1944) foi responsável pela elaboração do

Código Civil de 1916, primeiro diploma legal brasileiro a tratar o tema de forma

sistematizada. Em sua concepção, a adoção seria o ato civil pelo qual alguém

aceita um estranho como filho. Respeitando seu raciocínio, tal definição pode

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levantar algumas críticas, uma vez que a adoção também pode ocorrer dentro

da própria família, o que afastaria o caráter de „estranho‟ entre os envolvidos.

Numa definição similar de adoção àquela anteriormente apontada,

Rodrigues (2002, p. 380) fala em “ato do adotante, pelo qual traz ele, para a

sua família e na condição de filho, pessoa que lhe é estranha”.

Ademais, em conceito bem mais aprofundado, a jurista Diniz (2010,

p. 522-523) afirma que

“A adoção vem a ser o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha”. Dá origem, portanto, a uma relação jurídica de parentesco civil entre adotante e adotado. É uma ficção legal que possibilita que se constitua entre o adotante e o adotado um laço de parentesco de 1º grau na linha reta”.

Também ilustrando o assunto, é possível acrescentar ao debate que

“a adoção é ato jurídico que estabelece entre duas pessoas uma relação

análoga àquela que resulta da paternidade e da filiação. É ato solene, bilateral

e complexo, que, por ficção, estabelece o parentesco” (FILHO, 2012, p. 17).

Através das definições apontadas, é razoável afirmar que a adoção

estabelece um parentesco civil entre adotante e adotado, os quais passam a

desenvolver laços de paternidade e filiação definitivos e irrevogáveis. Além

disso, tal vínculo deve ser livre de qualquer resquício preconceituoso ou

discriminatório.

Isso porque a Constituição Federal de 1988, a norma legal mais

relevante do sistema legal brasileiro, amplia o conceito de família e torna

indiferente a origem da filiação - biológica ou civil. Conforme seu art. 227, §6º,

“os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os

mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações

discriminatórias relativas à filiação”. Essa redação foi reproduzida de forma

idêntica no art. 20 da Lei n.º 8.069/90, mais conhecida como Estatuto da

Criança e do Adolescente (ECA).

Inclusive, também cabe ao ECA reiterar a previsão constitucional

que veda qualquer qualificação discriminatória à adoção quando afirma

expressamente que esta “atribui a condição de filho ao adotado, com os

mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer

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vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais” (art. 41, Lei

n.º 8.069/90).

É preciso superar o raciocínio de que a adoção é um vínculo de

filiação fictício, uma vez que a via adotiva é uma realidade bilateral em que a

relação pai-filho é constituída sem qualquer distinção em relação à filiação

biológica, inclusive, com orientação das leis que regem o país nesse sentido.

Nesse sentido, Ost (2009) tece comentário que vai ao encontro do

raciocínio ora demonstrado quando diz que

“Adotar é muito mais do que criar e educar uma criança que não possui o mesmo sangue, ou a mesma carga genética, é antes de tudo uma questão de valores, uma filosofia de vida. A adoção é uma questão de consciência, responsabilidade e comprometimento com o próximo. É o ato legal e definitivo de tornar filho, alguém que foi concebido por outras pessoas. É o ato jurídico, que tem por finalidade criar entre duas pessoas relações jurídicas idênticas às que resultam de uma filiação de sangue”.

O sentido da adoção é exatamente, mediante processo legal e

formal, tomar como filho aquele concebido por terceiro. Isso implica dizer que a

adoção é um fato resultante da atuação humana e que “embora as causas

sejam diferentes, não se consegue distinguir os laços que se formam entre

filhos criados por aqueles que não os geraram e entre filhos criados pelos pais

biológicos” (FILHO, 2012, p. 64).

Logo, quem adota deve ter a consciência e a devida preparação

acerca da importância em não existir distinções entre o filho natural e o adotivo,

sob pena de causar maior sentimento de rejeição neste e, assim, provocar

novos traumas e conflitos internos que repercutirão negativamente na formação

do adotado.

1.3 A evolução da legislação brasileira acerca da adoção

No Brasil, os primeiros registros históricos de adoção remetem ao

período da colonização, época em que famílias ricas acolhiam filhos de

terceiros em suas casas, os quais eram comumente chamados de “filhos de

criação”. Tal prática estava não só relacionada à caridade, como também à

exploração de mão de obra gratuita (MAUX, 2009). Logo, a adoção nada se

assemelhava ao interesse genuíno pelo acolhimento de abandonados.

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Até meados do século XIX, época em que ainda vigiam as

Ordenações do Reino de Portugal, a adoção permaneceu sem regras formais,

sendo muito comuns as chamadas “Rodas dos Expostos” ou também

conhecidas como “Rodas dos Enjeitados”. Como bem explica Filho (2012, p.

31), estas

“originaram-se na Idade Média, e no Brasil foram implementadas de acordo com os costumes de Portugal. Eram construídas por um cilindro giratório no qual os bebês eram depositados na parte que dava para a rua. Logo após, as freiras giravam a roda e pegavam os recém-nascidos sigilosamente, sem que houvesse necessidade de identificar sua origem. Desta maneira, os casais que não podiam ter filhos buscavam uma criança para criar através das Rodas dos Expostos”.

Foi somente no início do século XX que a matéria foi sistematizada:

coube ao jurista Clóvis Beviláqua apresentar o Projeto do Código Civil

Brasileiro. Apesar de opiniões contrárias, cujos idealizadores viam na adoção

um instituto antiquado e sem função à época, o Projeto foi aprovado e

convertido na Lei n.º 3.071, de 01 de janeiro de 1916.

Prevista no Capítulo V, do Título V, do Livro de Família, mais

especificamente entre os artigos 368 a 378 do Código Civil de 1916, a adoção

era revogável e somente era autorizada para casais sem filhos, sendo que os

pretendentes deveriam ser maiores de 50 anos de idade e com diferença não

inferior a 18 anos em relação ao adotado. Além disso, o adotado não perdia o

vínculo com a família biológica. Por tais circunstâncias limitadoras, a legislação

civil ainda era muito rígida e restritiva em relação ao tema da adoção.

Objetivando aliviar os requisitos para a adoção, o Código Civil de

1916 foi alterado através da Lei n.º 3.133, de 08 de maio de 1957, a qual

diminuiu a idade mínima dos pretendentes à adoção para 30 anos e a diferença

em relação para o adotado, para 16 anos. Além disso, não mais era obrigatório

que o casal adotante não tivesse filhos legítimos, mas era necessário estarem

casados há pelo menos 5 anos.

Menos de uma década depois, veio a Lei n.º 4.665, de 08 de junho

de 1965, a qual estabeleceu a legitimação adotiva, que atribuía a condição de

filho para todos os efeitos legais ao adotado retirado da condição de abandono

e exposição até 7 anos de idade, exceto para fins de sucessão quando

concorria com filho biológico nascido posteriormente.

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Com a promulgação da Lei n.º 6.697, de 10 de outubro de 1979,

restou instituído o Código de Menores, o qual previu definitivamente a

legitimação adotiva, a qual poderia envolver: infante exposto, cujos pais fossem

desconhecidos ou houvessem declarado por escrito que a criança poderia ser

dada; menor abandonado propriamente dito até 7 anos de idade, cujos pais

tivessem sido destituídos do pátrio-poder; e, ainda, filho natural reconhecido

apenas pela mãe, impossibilitada de prover sua criação (art. 1º).

Nessa época, a adoção passou a ter mais de uma modalidade:

simples e plena. Na forma simples, o menor de 18 anos em situação irregular

passava por um estágio de convivência com o adotante e, mediante

autorização judicial, poderia ter seu apelido alterado através averbação no

registro de nascimento. Por outro lado, na forma plena, o adotado, menor de

até 7 anos de idade, assumia a condição irrevogável de filho, inclusive com

direitos sucessórios em relação ao adotante.

Em período mais recente, a Constituição Federal de 1988 deu um

grande salto no que se refere aos temas envolvendo a família. Conforme seu

art. 227, “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao

adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde,

à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,

à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,

além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,

exploração, violência, crueldade e opressão”.

Assim, a fim de materializar tal regra constitucional e disciplinar

largamente os direitos e deveres infanto-juvenis, foi publicada a Lei Federal n.º

8.069, de 13 de julho de 1990, também conhecida como Estatuto da Criança e

do Adolescente (ECA). A referida lei revogou o antigo Código de Menores, cuja

incidência era nitidamente voltada ao menor em situação irregular, ao mesmo

tempo em que difundia a cultura da internação e segregação para carentes e

delinquentes como a única solução na maioria dos casos.

Rompendo diversos paradigmas, o Estatuto da Criança e do

Adolescente passou a adotar uma visão mais humana ao tratar a criança e o

adolescente como sujeitos de direito e pessoas em desenvolvimento, às quais

devem ser asseguradas proteção integral e absoluta prioridade. Assim,

crianças e adolescentes passaram a contar com a primazia no recebimento de

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socorro, precedência de atendimento nos serviços públicos, preferência na

formulação e execução de políticas públicas, bem como com a destinação

privilegiada de recursos públicos.

Não à toa, o ECA se utiliza de critério meramente cronológico e

considera criança a pessoa com até 12 anos incompletos, enquanto o

adolescente é aquela pessoa que conta com 12 anos completos e 18 anos

incompletos. Ao completar 18 anos, a pessoa atinge a maioridade civil. Tal

distinção é de suma importância no que diz respeito às medidas aplicáveis à

prática de ato infracional, uma vez que à criança somente se aplica medida de

proteção, mas não medidas socioeducativas, as quais se aplicam

exclusivamente a adolescentes e, excepcionalmente, a pessoas entre 18 e 21

anos de idade.

Via de regra, as medidas de proteção são cabíveis sempre que os

direitos reconhecidos no ECA forem ameaçados ou violados por ação ou

omissão da sociedade e do Estado; por falta, omissão ou abuso dos pais ou

responsável e em razão da conduta da criança ou do adolescente. Em

situações mais extremas de violação aos direitos da criança e do adolescente,

a autoridade competente pode, inclusive, determinar o acolhimento

institucional, a inclusão em programa de acolhimento familiar ou colocação em

família substituta.

1.4 O processo de adoção no Brasil

No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente é o principal

diploma legal no que concerne à guarda, tutela e adoção, tendo esta última

sido radicalmente alterada pela recente Lei n.º 12.010/2009, a qual reformulou

integralmente o processo de colocação de criança ou adolescente em família

substituta em caráter definitivo.

Conforme previsto no art. 39, §1º, do Estatuto da Criança e do

Adolescente, com a redação dada pela Lei n.º 12.010/2009, “a adoção é

medida excepcional e irrevogável, à qual se deve recorrer apenas quando

esgotados os recursos de manutenção da criança ou adolescente na família

natural ou extensa”.

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Analisando-se a força do vínculo jurídico criado pelas formas de

colocação da criança ou adolescente em família substituta, a guarda é a que

tem a ligação mais frágil, justamente por ser uma fase transitória enquanto não

encerrados os processos de tutela ou adoção, bem como cabível em situações

de ausência de pais ou responsáveis. Em seguida, na tutela, há perda ou

suspensão do poder familiar, cabendo ao tutor à administração de bens do

menor.

Já a adoção é aquela que cria o vínculo jurídico mais forte, já que a

mesma é medida irrevogável, através da qual se extingue o vínculo do

adotando com sua família biológica e forma-se um novo com a família do

adotante. Além disso, a excepcionalidade da adoção decorre da importância

que o ECA dá à criação das crianças e adolescentes em sua família natural,

tomando sua colocação em família substituta como hipótese extraordinária.

Na redação original do Estatuto da Criança e Adolescente, o

adotante deveria contar com idade mínima de 21 anos. Todavia, à época da

sua entrada no ordenamento jurídico brasileiro, a maioridade civil era atingida

nessa idade, conforme previa o art. 9º do Código Civil de 1916. Com a chegada

do novo Código Civil em 2002, a maioridade civil foi alterada para 18 anos de

idade, o que foi seguido pela reforma promovida pela Lei n.º 12.010/2009,

mantendo-se inalterada a exigência de que o adotante deve ser pelo menos 16

anos mais velho que o adotado.

De igual forma, percebe-se que a mencionada lei tentou

acompanhar as alterações da vida moderna, inclusive reconhecendo as novas

formas de família. Assim, o ECA substituiu a palavra “concubinos” e passou a

adotar as expressões “companheiros” e “união estável” como requisitos para a

adoção em conjunto, na qual deve ser comprovada a estabilidade familiar.

Em se tratando de adoção, o ECA toma como princípio o melhor

interesse da criança, ou seja, esta somente será admitida quando apresentar

reais vantagens para o adotando, bem como estar fundadas em legítimos

motivos. Tal premissa é extremamente importante no momento de decidir pela

manutenção da criança na sua família natural ou da sua colocação em família

substituta.

O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece ainda que “a

adoção depende do consentimento dos pais ou do representante legal do

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adotando”, o qual “será dispensado em relação à criança ou adolescente cujos

pais sejam desconhecidos ou tenham sido destituídos do poder familiar” (art.

45, §1º). Todavia, no caso do adotante ser maior de doze anos de idade, seu

consentimento também será necessário.

1.3.1 Estágio de convivência

Uma importante formalidade no processo de adoção é o estágio de

convivência entre os adotantes e a criança ou adolescente, o qual acontecerá

por prazo determinado pelo juiz responsável, conforme as particularidades que

envolvem cada caso. Sua dispensa somente ocorrerá caso o adotando já se

encontre sob a guarda legal ou tutela do adotante durante tempo suficiente

para que seja analisada a conveniência da formação do vínculo.

É importante destacar que a guarda não pode ser meramente fática,

pois, antes da alteração feita pela Lei n.º 12.010/2009, dispensava-se o estágio

de convivência quando a criança tinha menos de 1 ano de idade ou já se

encontrava a tempo suficiente para avaliação com os adotantes, o que

facilitava a chamada adoção à brasileira, a qual será melhor discutida adiante.

Além disso, no caso da adoção por pretendentes que residam fora

do país, brasileiros ou estrangeiros, estes devem cumprir estágio de

convivência no território brasileiro por, no mínimo, 30 dias. O ponto relevante

desta regra não é o fato de o adotante ser estrangeiro, mas domiciliado fora do

Brasil, razão pela qual o estágio deve ser realizado no país pelo tempo mínimo

exigido em lei, independente da idade do adotando.

Por fim, o ECA ainda estipula que uma equipe interprofissional a

serviço da Justiça da Infância e da Juventude acompanhará o estágio de

convivência, a qual será responsável por elaborar um minucioso relatório que

irá subsidiar a decisão da autoridade judiciária acerca da conveniência do

deferimento do pedido de adoção.

1.3.2 A constituição da adoção

O vínculo da adoção se dá exclusivamente por meio de uma

sentença judicial, cuja inscrição no registro civil conterá o nome dos pais como

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adotantes, bem como de seus ascendentes. Assim, o mandado judicial

cancelará o registro civil original do adotado, oportunidade em que no registro

novo não será possível constar qualquer observação sobre a origem do ato.

Logo, nenhum vínculo dos pais biológicos constará na nova certidão

de registro civil do adotado, cabendo aos adotantes, inclusive, o direito de

requerer a modificação do prenome da criança ou adolescente, observada sua

manifestação de concordância sobre a alteração.

Apesar de a lei fazer questão de desvincular o registro civil do

adotado de seus pais biológicos, o adotado tem direito de conhecer sua

origem, além de obter acesso sem restrições do seu processo de adoção após

completar 18 anos de idade. Em sendo menor, o acesso ao processo de

adoção também poderá ser requerido, assegurada orientação e assistência

jurídica e psicológica.

1.3.3 Cadastro de adotantes

O art. 50 do ECA prevê que “a autoridade judiciária manterá, em

cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em

condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção”.

Complementando tal previsão, a Lei n.º 12.010/2009 incluiu o §5º neste mesmo

artigo para também registrar que “serão criados e implementados cadastros

estaduais e nacional de crianças e adolescentes em condições de serem

adotados e de pessoas ou casais habilitados à adoção”. A finalidade de tal

previsão é claramente aumentar as possibilidades de adoção.

Todavia, como forma de preparar melhor os pretendentes à adoção,

a reforma promovida pela citada lei também cuidou de lhes garantir orientação

psicossocial e jurídica no momento de sua inscrição no cadastro de adotantes.

Assim, como forma de capacitar os eventuais interessados em adotar,

determina-se ainda seu contato com crianças e adolescentes aptos à adoção

que estejam em programas de acolhimento familiar ou institucional.

Tal regramento não significa que os adotantes escolham quem

querem adotar, visto que eles ainda estão em processo de habilitação, mas

sim, determina o contato com crianças e adolescentes aptos à adoção, a fim de

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que possam verificar como é o dia a dia dos mesmos e com isso tomar uma

decisão mais firme acerca da adoção.

Via de regra, as crianças e adolescentes são inscritos no cadastro

da sua comarca de origem, oportunidade em que será tentado encontrar algum

habilitado. Não havendo sucesso, a autoridade judiciária deverá então

inscrever a criança ou adolescente nos cadastros estadual e nacional,

sucessivamente. Somente quando esgotadas as chances de se encontrar

pretendentes residentes no território nacional é que surge a possibilidade de

deferimento para o pedido de adoção internacional.

Entretanto, o próprio Estatuto cuida de trazer a exceção à regra,

prevendo que em casos de adoção unilateral 1 ou quando o pedido for

formulado por parente com o qual a criança ou adolescente mantenha vínculos

de afinidade e afetividade será dispensada a inscrição prévia do pretendente

no mencionado cadastro, mas desde que este esteja domiciliado no Brasil.

Outro caso excepcional que autoriza a dispensa do cadastro é

aquele no qual o pedido é feito por quem já detém a tutela ou guarda legal de

criança maior de 3 anos ou adolescente, com a ressalva de que “o lapso de

tempo de convivência comprove a fixação de laços de afinidade e afetividade e

não seja constatada a ocorrência de má-fé” (art. 50, §13, III, do ECA).

É preciso deixar claro, contudo, que a dispensa do cadastro prévio

nessas hipóteses não significa necessariamente que o pedido de adoção será

deferido. Na verdade, o processo de adoção terá seu desenvolvimento normal

a fim de se constatar se aquele pedido atende ao melhor interesse da criança

ou adolescente, oportunidade em que o relatório a cargo da equipe

multiprofissional da Justiça da Infância e da Juventude será essencial. Apesar

daquela criança ou adolescente estar no seio da família extensa, o caso

concreto pode perfeitamente indicar que o melhor é sua retirada e colocação

numa família substituta.

1.5. Modalidades de adoção

1 A adoção unilateral será melhor discutida posteriormente no item 1.5

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Todo processo de adoção resulta nos mesmos efeitos, ou seja, trata-

se de ato com efeitos irrevogáveis, na medida que permite a alteração do nome

da criança ou adolescente, confere direito de herança e torna definitiva a

filiação. Todavia, é comum que a adoção seja tratada por meio de

modalidades, conforme as características dos adotantes.

No caso da adoção conjunta, quem se habilita como pretendente à

adoção é um casal, o qual deve ser casado ou manter união estável, desde

que comprovada a estabilidade familiar, nos termos do art. 42, §2º, do Estatuto

da Criança e do Adolescente. No caso de casal divorciado, a adoção somente

poderá ser aceita caso o estágio de convivência com a criança ou adolescente

tenha sido iniciado quando o casal ainda estava junto, bem como deve haver

acordo prévio sobre a guarda e o regime de visitas entre os ex-companheiros,

oportunidade em que também não deixará de ser avaliado o grau de afinidade

e afetividade com aquele que não tem a guarda.

Importante ressaltar que a definição de casal tem sofrido influências

ao longo do tempo, não havendo mais que se restringir o termo exclusivamente

a relacionamentos entre homem e mulher. Atualmente, vem se mostrando cada

vez mais comuns núcleos familiares compostos por indivíduos do mesmo sexo,

o que também deve ser levado em consideração no caso da adoção, inclusive

tendo tal tema sido retratado em programas de televisão, tais como novelas. O

mais importante a ser observado é aquilo que for melhor para o interesse do

menor.

Em que pese o preconceito ainda remanescente acerca do assunto,

numa sociedade em que se trabalha a questão do reconhecimento da união

estável homoafetiva, o discurso em torno do respeito às diferenças e o

combate à discriminação caminha ao encontro de uma nova visão acerca da

adoção por casais formados por indivíduos do mesmo sexo. Inclusive, o Poder

Judiciário tem começado a admitir tal possibilidade, multiplicando-se decisões

pelo país nesse sentido. Perguntada se os valores repassados por um casal

homoafetivo não poderiam prejudicar o adotando, uma juíza de Aparecida-GO,

que autorizou a adoção de uma criança por um casal de homossexuais que

vive em união estável há 8 anos, disparou: "se a orientação sexual dos pais

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influenciasse diretamente a dos filhos, nenhum homossexual poderia ter sido

concebido e educado dentro de um modelo heterossexual de família"2.

Por outro lado, a adoção unilateral, apesar da nomenclatura, não se

trata de uma modalidade de adoção realizada pela pessoal solteira, mas sim,

ocorre quando o companheiro ou cônjuge resolve adotar o filho do parceiro. Tal

possibilidade está prevista no art. 41, §1º do Estatuto da Criança e do

Adolescente. Nesse caso, mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e

o cônjuge ou concubino do adotante e os respectivos parentes.

Ainda em relação às estipulações previstas no Estatuto da Criança e

do Adolescente, o mesmo autoriza a chamada adoção póstuma, a qual ocorre

quando o pretendente à adoção falece no curso do processo. Todavia, tal

hipótese somente é aceita se o pretendente tiver manifestado inequivocamente

sua vontade, conforme redação do art. 42, §6º, do ECA.

Já no caso da adoção intuitu personae, os pais biológicos escolhem

a quem entregar a criança ao invés de deixá-la numa instituição de acolhimento

ou mesmo no Conselho Tutelar. A peculiaridade dessa situação consiste no

fato de que a família biológica não quer simplesmente que a criança seja

adotada, mas que seja adotada por determinada pessoa ou casal específico. O

cerne da questão se encontra na confiança depositada pelos genitores da

criança naquela pessoa em especial.

Tal modalidade revela atenção especial por parte da equipe

multidisciplinar das Varas da Infância e da Juventude e pelos respectivos

juízes, haja vista ainda serem muito comuns casos de rapto ou tráfico de bebês

para o exterior, assim como negociação ou acordos entre a mãe biológica e os

pretendentes à adoção. Não são raros casos de mães que buscam

recompensa ou promessas de pagamento em troca de bebês negociados ainda

na fase uterina.

Um registro especial cabe para o que popularmente se

convencionou chamar adoção à brasileira: tal prática consiste no ato de uma

pessoa registrar filho alheio como sendo próprio. Todavia, é preciso registrar

que a mesma, além de não ser meio legítimo de adoção, constitui crime

2 Fonte: Tribunal de Justiça de Goias. Disponível em <

http://m.g1.globo.com/goias/noticia/2013/04/justica-autoriza-adocao-de-crianca-de-4-anos-por-casal-de-lesbicas-em-go.html >. Acesso em 30 set 2013.

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previsto no art. 242 do Código Penal Brasileiro: “Dar parto alheio como próprio;

registrar como seu o filho de outrem; ocultar recém-nascido ou substituí-lo,

suprimindo ou alterando direito inerente ao estado civil: Pena - reclusão, de

dois a seis anos”.

Apesar desta modalidade de adoção não ter amparo na legislação, o

Poder Judiciário vem começando a desenvolver o conceito de filiação

socioafetiva. Isto porque se leva em consideração que o afeto é o elemento

mais importante na formação do vínculo adotivo. A respeito do tema, Lima

(2011) comenta acerca do assunto:

“A filiação socioafetiva encontra sua fundamentação nos laços afetivos constituídos pelo cotidiano, pelo relacionamento de carinho, companheirismo, dedicação, doação entre pais e filhos. Está cada vez mais fortalecida tanto na sociedade como no mundo jurídico, ponderando a distinção entre pai e genitor, no direito ao reconhecimento da filiação, inclusive no direito registral, tendo-se por pai aquele que desempenha o papel protetor, educador e emocional [...]. O afeto passou a ter valor jurídico, decorrente da consagração de princípios constitucionais, passando a filiação a ser vista pelos seus valores culturais, sociais, morais e no conflito existente entre o fato e a lei, o afeto deve se sobrepor à mera presunção. A paternidade biológica passa a ter papel secundário, vindo a paternidade a existir não pelo fator biológico ou pela presunção da filiação, mas em decorrência da convivência afetiva, adaptando a norma positiva ao caso concreto, à realidade social”.

A adoção à brasileira ocorre sem o conhecimento das autoridades e

alheia aos trâmites legais, comprometendo os interesses da criança, os quais

devem sempre ser resguardados. Nessa situação, os adotantes não passam

pelo Cadastro Nacional da Adoção, tampouco tem o acompanhamento

psicossocial necessário para enfrentar a situação que envolve o acolhimento

desta criança.

Aproveitando o ensejo, resta ainda a adoção internacional, a qual é

aquela realizada por sujeitos domiciliados fora do Brasil, sejam estrangeiros ou

brasileiros, conforme determina o art. 51 do Estatuto da Criança e do

Adolescente. Amplamente modificada após a chegada da Lei n.º 12.010/2009,

a adoção internacional prevê maior rigor para sua concessão, tendo em vista a

dificuldade das autoridades brasileiras em fiscalizar e vigiar a família recém

formada.

Em menor ou maior frequência, o Conselho Tutelar e seu grupo

profissional podem acompanhar a adoção nacional, assim como prestar

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assistência psicológica em qualquer tempo. No caso da adoção internacional,

este acompanhamento mais próximo resta completamente prejudicado, uma

vez que a criança ou adolescente adotado estará no exterior.

É por isso que o Estatuto da Criança e do Adolescente determina

ainda que a adoção é a única forma de colocação de criança ou adolescente

em família substituta residente no exterior, vedando, portanto, a possibilidade

de concessão de guarda aos adotantes, conforme ressalva expressa contida

no art. 33, §1º, do ECA.

Como o ECA determina que adoção se dá em caráter excepcional,

razão pela qual se prefere a manutenção da criança ou adolescente no seio de

sua família natural, a adoção internacional também só poderá ser admitida

quando esgotadas as possibilidades de encontrar uma família substituta no

Brasil. Se o adotando for adolescente, é necessário ainda consultá-lo acerca do

pedido de adoção internacional e decidido pela equipe multiprofissional que

este se encontra preparado para tal.

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FAMÍLIA ADOTIVA X ADOTANDO

O processo de adoção é algo muito complexo, razão pela qual é

fundamental se investigar como se dá o comportamento de cada sujeito

envolvido, a fim de se tentar entender quais seus anseios e angústias no

caminho à formação de um laço tão forte quanto aquele formado entre

adotante e adotado.

De um lado, encontra-se a família adotiva, a qual terá sua identidade

completamente reconstruída para que possa acolher uma criança ou

adolescente que não tem sua linhagem sanguínea como se fossem frutos

naturais, iguais a filhos biológicos. Neste contexto, percebe-se a reunião de

uma série de expectativas, diretamente moldadas por preferências e pré-

conceitos de seus integrantes em torno da questão.

Do outro lado, encontramos a criança ou o adolescente em condição

de adoção, o qual carrega suas frustrações decorrentes da entrega para

orfanatos e instituições de acolhimento ou mesmo do abandono, bem como a

esperança de encontrar uma família que lhe possa dar carinho, atenção e amor

que em outro momento lhe foi negado pelos seus pais biológicos (PACHECO,

2008).

Da união destes personagens é que resultará uma unidade familiar

com história e identidade próprias, tal quais outras milhares de famílias

construídas tendo por fundamento o respeito mútuo e o compromisso com o

fortalecimento de seus laços e vínculos, os quais vão sendo construídos

naturalmente ao longo do tempo.

É claro que nesta relação também serão vistos conflitos dos mais

variados tipos se a filiação biológica impõe aos pais situações conflituosas, a

filiação adotiva compartilha das mesmas dificuldades, além daquelas naturais à

formação de um relacionamento entre indivíduos sem qualquer tipo de ligação

pretérita.

2.1 Um breve histórico da família

Ao longo da História, não há dúvidas de que a família sempre

exerceu papel fundamental na organização dos povos, sendo o alicerce de

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qualquer sociedade organizada. Em meio à necessidade de viver em

comunidades, o homem encontrou na família uma rede básica de

compartilhamento de sentimentos e responsabilidade com pessoas interligadas

por laços de parentesco.

Complementando tal raciocínio, Valente (2007, p. 175) discorre

sobre o tema dizendo que

“a família, independente de sua organização, contexto e história, representa a sede de vivências e experiências significativas na vida do ser humano. É nela que se inicia a história de cada um, a construção de significados, a aprendizagem afetiva, o reconhecimento da identidade individual e coletiva, preparando o indivíduo tanto para experiências pessoais como para o processo de socialização. É a família a base de apoio para o enfrentamento de conflitos e desenvolvimento humano, representando a responsabilidade de uma geração no cuidado e preparação da outra”.

A família é basicamente um grupo social, onde seus integrantes

contam com direitos e obrigações: os membros de uma família devem guardar

respeito e assistência reciprocamente; pais devem prestar alimentos e meios

de subsistência aos filhos, os quais também podem contribuir para a

subsistência familiar, etc. Assim, Casey (1992, p. 195) ressalta que a família é

um conceito, uma criação da mente humana, da cultura, não um objeto

material. Portanto, considerá-la tão somente uma relação biológica limita sua

investigação e dificulta ainda mais sua compreensão.

Também é certo que sua definição foi sendo alterada através das

épocas, sempre sofrendo influências sociais, econômicas, políticas e culturais,

razão pela qual a definição de papeis de seus integrantes também foi sendo

modificada: na sua forma mais clássica, a família era constituída por um

homem e uma mulher, bem como seus descendentes (PACHECO, 2008); na

atualidade, com o declínio da chefia do núcleo familiar como atividade

exclusivamente masculina e a crescente ascensão profissional da mulher, bem

como a difusão de valores de respeito e aceitação das diferenças, a família

assumiu inúmeras configurações, o que tornou comuns conceitos como família

monoparental (um só ascendente) ou homoparental (ascendentes do mesmo

sexo), antes vistos como verdadeiros tabus.

Acerca da complexidade de formas que a família assumiu ao longo

dos tempos e seu estudo, Casey (1992. P. 197) afirma que

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“A verdade é que a família, em qualquer das suas formas, é apenas um conceito heurístico que nos ajuda a explicar a estrutura econômica e política de uma sociedade particular. Não constitui uma entidade perfeitamente configurada, que pudesse ser estudada por si mesma. Não se pode construir uma casa simplesmente colocando um tijolo em cima do outro. [...] Tem de haver um plano arquitetônico: a capacidade de perceber, principalmente e antes de mais nada, a

totalidade da estrutura acabada”.

Em especial, para se compreender como a família brasileira chegou

ao panorama atual e com isso interpretar melhor seu papel de destaque no

desenvolvimento do processo de adoção, é necessária uma análise do seu

modelo original, o qual remonta à época do Brasil Colônia.

Segundo Pacheco (2008), o modelo de família dominante era

basicamente patriarcal ou paternalista, cabendo à figura do homem decidir

acerca de tudo que envolvia seus integrantes, desde a instrução e profissão até

a escolha do marido ou esposa de seus descendentes. Além disso, o contato

entre genitor e filhos era mínimo, cabendo às amas de leite o contato e as

brincadeiras do dia a dia.

Quando a corte portuguesa se transferiu para o Brasil, no início do

século XIX, com ela veio o modelo de família burguesa, o qual já havia se

consolidado há algum tempo em solo europeu. Foi nesse modelo familiar que a

mulher assumiu papel de maior destaque com seu papel de mãe. Assim, a

dedicação e a atenção que a mulher concedida aos compromissos do lar

funcionava como uma medida de valorização e realização pessoal perante a

sociedade.

Via de regra, o homem trazia para si a condição de provedor do lar,

enquanto a mulher ficava responsável pelo cuidado e educação dos filhos, bem

como pela conservação da casa por meio das atividades domésticas.

Ratificando tal afirmação acerca do que se convencionou chamar modelo de

família nuclear, Alves (2009, p. 8) explica que

“O chefe da família cuidava dos negócios e tinha, por princípio, preservar a linhagem e a honra familiar, procurando exercer sua autoridade sobre a mulher, filhos e demais dependentes. As mulheres, depois de casadas, passavam da tutela do pai para a do marido, cuidando dos filhos e da casa no desempenho das atividades domésticas”.

No entanto, é necessário registrar que, apesar das modificações e

influências sofridas pela família deste então, é justamente esse modelo que

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ainda perdura em muitos lares atualmente, principalmente nas camadas mais

populares da sociedade brasileira, onde o espaço social ocupado pela mulher é

justamente o espaço da casa.

Na transição para o século XX, após o desenvolvimento da

cafeicultura e alguns acontecimentos políticos significativos para a História do

Brasil no século anterior (abolição da escravidão, proclamação da República), o

país vivenciou o início do desenvolvimento da industrialização e, com isso, a

expansão dos espaços urbanos, o que facilitou a diminuição do rigor do modelo

familiar patriarcal.

Não à toa, o ingresso da mulher no mercado de trabalho, a

atribuição da educação dos filhos a cargo da escola e o desenvolvimento

métodos de controle de natalidade ajudaram a construir o cenário propício para

as alterações mais profundas no modelo familiar brasileiro.

Foi nesse contexto que a família passou a assumir inúmeras

configurações alternativas àquele modelo tradicional composto por um homem,

uma mulher e seus filhos. Conforme lista Alves (2009, p. 10-11), hoje é

possível encontrarmos

casamentos sucessivos com parceiros distintos e filhos de diferentes uniões; casais homossexuais adotando filhos legalmente; casais com filhos ou parceiros isolados ou mesmo cada um vivendo com uma das famílias de origem; as chamadas “produções independentes” tornam-se mais freqüentes; e, mais ultimamente, duplas de mães solteiras ou já separadas compartilham a criação de seus filhos.

Além disso, indo mais a fundo na questão da alteração do padrão de

família encontrada no Brasil, percebe-se uma drástica mudança no

comportamento da mulher, que passou a se ocupar menos com as atividades

domésticas e ir para o mercado de trabalho. O desenvolvimento dessa

tendência resultou na menor taxa de fecundidade da história do Brasil, a qual

atingiu a média de 1,9 filhos por mulher (IBGE, Censo 2010), enquanto tal

índice já chegou a incríveis 6,28 filhos por mulher na década de 60.

Da mesma forma, diminuíram os lares chefiados pelos homens,

oportunidade em que a mulher assumiu de vez posição de destaque ao

confrontar o universo masculino. Exemplificando tal panorama, o IBGE (Síntese

de Indicadores Sociais, 2012) constatou que, na última década, a proporção de

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mulheres chefes de família cresceu mais do que quatro vezes, subindo de

3,4% para 18,4% nos casais com filhos.

Não só o ingresso no mercado de trabalho, mas também o aumento

do nível de escolaridade e a elevação da média etária à época do casamento

entre as mulheres influenciam diretamente na decisão de ter filhos, sejam

biológicos ou adotivos. Se antes a mulher dedicada ao lar tinha status no meio

social, a mulher moderna preferiu sua independência, influenciando

diretamente sua visão acerca da maternidade.

2.2 Família adotiva e afetividade

Com a transformação das estruturas tradicionais da família, o afeto

passou a ter importância social, psicológica e jurídica. A realidade vista nos

tempos atuais demonstra que a convivência familiar permite perfeitamente a

reunião de pessoas que compartilham valores e respeito mútuo,

independentemente da existência de laços sanguíneos entre si.

Nessa situação, é possível afirmar que o afeto permite a reunião de

um grupo de pessoas em razão de um destino comum, não um ancestral

comum, razão pela qual é considerado um verdadeiro fato social e não

biológico. Esclarecendo melhor tal questão, Miranda (2012, p. 1) afirma acerca

do tema que

“o afeto é o ponto central para constituição e desenvolvimento salutar de uma família, em especial dos filhos, que necessitam de um relacionamento afetivo com os pais para o desenvolvimento sadio da sua personalidade. O afeto recebido dos pais proporciona às crianças uma compreensão melhor dos problemas modernos, maior capacidade de superação frente aos obstáculos e equilíbrio emocional. As experiências vividas no início da vida irão determinar como o ser irá se comportar em sociedade, se agressivamente ou respeitando os demais integrantes do grupo social.”

Daí, importante registrar o que se passou a chamar de filiação

socioafetiva, ou seja, aquele vínculo de filiação baseado na manifestação de

uma vontade. Acerca do tema, Ávila (2011, p. 59) afirma que esta é

“[...] erguida sob pilares de convivência, carinho e responsabilidade, que resultam na formação social, cultural e principalmente moral, não só do filho, mas também dos pais que ensinam e aprendem as regras de bem viver”.

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Dentre os possíveis exemplos de filiação socioafetiva, Fujita (2011)

lista a própria adoção, independente da orientação sexual do casal, a filiação

decorrente da chamada “adoção à brasileira”, bem como a filiação socioafetiva

consistente no filho de criação.

É importante deixar claro que o tema da afetividade vem ganhando

bastante relevância, sobretudo em razão de decisões do Poder Judiciário que

têm começado a reconhecer a chamada filiação socioafetiva. Isto porque é

inegável que a família hoje é fruto de uma série de transformações e que não

mais resume a laços biológicos.

Ilustrando o destaque sobre este tema em alguns processos

judiciais, é necessário afirmar que a Justiça brasileira tem começado a negar a

anulação de registros de nascimento civil quando demonstrada a existência da

adoção afetiva, sob a justificativa de que a filiação é um verdadeiro estado

social. Num julgamento realizado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do

Sul, foi dito que:

Ora, a filiação, mais do que um fato biológico, é um fato social. O que se deve ter em conta é que o recorrente, mesmo sem ser pai biológico do recorrido, é seu pai afetivo, tanto que é assim se qualifica, na medida em que é responsável pelo seu desenvolvimento desde tenra idade e assim prossegue, como afirmado na petição inicial. Avulta que mesmo após de o ter registrado como sua filha, o apelante permaneceu desempenhando o papel de pai da criança, sendo que não foi induzido em erro ou coação, porquanto reconheceu a paternidade em relação à apelada, de forma absolutamente regular, livre e consciente, mostrando-se a revogação juridicamente impossível. [...] Nesse contexto, assim como se dá com o reconhecimento espontâneo da paternidade extramatrimonial, o desfazimento do ato só pode se dar quando demonstrado nítido vício de vontade, o que não ocorre aqui, porque é o próprio apelante quem afirma ter realizado o registro. Logo, não pode agora, por qualquer motivo – sobretudo pelo fato de apelada estar a exigir alimentos dos avós paternos em outro feito –, pretender simplesmente desfazer-se da filha, que o tem como pai, assim, o chama e o reconhece, desfrutando do estado de filha afetiva. O fato que inexistir o vínculo biológico não dispõe de significado, por ter surgido entre ambos a filiação socioafetiva. (Apelação Cível Nº 70012751236, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Berenice Dias, Julgado em 09/11/2005) (destaque nosso)

O ponto fundamental da filiação socioafetiva consiste justamente em

considerar a convivência familiar como elemento mais importante até que o

vínculo biológico, bem como tê-la como verdadeiro elemento criador da filiação.

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É esta convivência que permite a criação de um estágio comportamental de

interdependência entre os sujeitos desta relação.

Em razão dessa interdependência de sujeitos, é fundamental que se

tente garantir a estabilidade da filiação socioafetiva, tal como acontece com a

filiação biológica, a qual é irrevogável e independe da vontade das partes, já

que decorre de uma previsão legal.

Logo, é importante que este tipo de filiação também seja visto de

forma natural e duradoura pelo círculo de convivência destes personagens,

sempre visando ao melhor interesse da criança e do adolescente. Nesse

sentido, Pacheco (2008, p. 41) afirma com bastante sentido e sensibilidade que

“Adotar, ser, pai e mãe, construir um ambiente que permita que um outro ser humano se desenvolva plenamente, faz parte de um movimento bem mais amplo do cuidar, que não necessariamente se expressa mediante um único modelo de família. O que é necessário e fundamental neste movimento de cuidar são certos tipos de vínculo, que por se constituírem dentro de um ambiente de confiança e de presença constante, permitem que um ser humano se desenvolva e cresça. São funções, que se desempenhadas com interesse, amor e dedicação, propiciam vida”.

Admitir que um pai, por exemplo, possa simplesmente decidir

romper o vínculo afetivo com a criança ou adolescente acolhido no seio de sua

família poderia causar consequências negativas inimagináveis ao equilíbrio

psicológico do filho. Portanto, da mesma forma que um filho natural tem direitos

e deveres em relação aos seus pais, o filho afetivo deve ter igual condição

perante os mesmos.

Entretanto, a realidade de muitas crianças passa longe de ter

qualquer tipo de contato que lembre o afeto que ora se discute. Com a

crescente pauperização da sociedade em decorrência do inchamento dos

centros urbanos e a exclusão social de centenas de milhares, muitas crianças

são abandonadas, o que revela um grave problema social a ser trabalhado.

2.3 A criança e a questão do abandono

Apesar do sensível avanço que os direitos da criança e do

adolescente sofreram com o advento da Constituição Federal de 1988 e o

Estatuto da Criança e do Adolescente - Lei n.º 8.069/90, oportunidade em que

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os princípios da proteção integral e da absoluta prioridade à criança e ao

adolescente ganharam grande destaque, verifica-se que muitos direitos ainda

não são respeitados, sobretudo quando se fala de um verdadeiro problema

social: o abandono.

Não é irrelevante reiterar que toda criança tem direito à vida, à

saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à

cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e

comunitária, cabendo à família e ao Poder Público a efetivação desses direitos,

conforme previsto na Constituição Federal.

Todavia, não é isso que é visto na prática: grandes veículos de

comunicação 3, 4 e 5 noticiam crianças recém-nascidas encontradas em lixões e

beiras de rios por conta de mães que largam seus filhos à mercê da própria

sorte. Tudo isso decorre de um processo de exclusão e negligência históricas,

o que justifica a necessidade de se buscar uma maior compreensão para que

seja urgentemente combatido e evitado de todas as formas.

No início, o abandono estava relacionado a valores morais impostos

à mulher pela sociedade (WIBRANTZ e GOBBO, 2011). Assim, até meados do

século passado, uma mulher não poderia ser mãe solteira, sob pena de sofrer

toda sorte de preconceito e discriminação. Logo, era comum que essas

mulheres abandonassem seus filhos como forma de evitar a marca negativa da

maternidade sem a figura presente de um pai.

Por isso, em tempos mais remotos, a Roda dos Expostos,

geralmente instalada em hospitais e igrejas, permitia, por exemplo, tanto

senhoras de castas sociais mais elevadas esconderem um eventual adultério,

quanto uma miserável, que não deseja ou não pode cuidar dessa criança, ou

mesmo uma jovem considerada „moça de família‟, proteger sua honra da

discriminação de seu círculo social.

Apesar de muitas críticas, a Roda dos Expostos levou algum tempo

até ser completamente abolida, tendo a última delas sido desinstalada da

3 Fonte: Portal G1. Disponível em: < http://g1.globo.com/goias/noticia/2013/05/bebe-

abandonado-e-encontrado-no-meio-do-mato-em-niquelandia-go.html>. Acesso em: nov. 2013 4 Fonte: Portal G1. Disponível em: < http://g1.globo.com/sp/vale-do-paraiba-

regiao/noticia/2013/10/crianca-e-abandonada-pelos-pais-em-lorena-apos-recusar-pedir-esmola.html>. Acesso em: nov. 2013. 5 Fonte: Portal Meio Norte. Disponível em: < http://www.meionorte.com/noticias/geral/mae-

deixa-crianca-dentro-de-cesto-de-lixo-em-hospital-no-maranhao-215647.html>. Acesso em: nov. 2013.

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Santa Casa de Misericórdia de São Paulo apenas em 1948, depois de ter

acolhido mais de 5.700 crianças, das quais uma considerável parte morria logo

após o abandono em razão do estado de desnutrição e outras enfermidades

(WIBRANTZ e GOBBO, 2011).

Não que o preconceito contra mães solteiras tenha deixado de

existir, mas as causas para o abandono começaram a ganhar novos contornos:

com o desenvolvimento da industrialização e o crescente êxodo rural em busca

de melhores condições do que no campo, os centros urbanos não conseguiram

absorver adequadamente a massa de pessoas que migravam em busca de

oportunidades de trabalho.

E, com isso, toda uma camada paupérrima da sociedade foi sendo

jogada para uma área completamente marginalizada, sem qualquer

intervenção do Poder Público, alheia a mínimas condições de sobrevivência e

dignidade - falta de saneamento básico, inexistência de unidades de atenção à

saúde, precariedade das organizações assistenciais. Para se ter uma rápida

ideia do problema, segundo o Censo 2010 do IBGE, existem cerca de 3,2

milhões de domicílios em aglomerados subnormais, como são chamadas as

favelas.

Essas condições subumanas resultam em mães cada vez mais

precoces, sem qualquer estrutura familiar e sem condições financeiras de

suportar a chegada de um filho, o qual, se não criado em meio a um ambiente

de miséria com outras várias crianças em igual condição, acabará sendo

doado, muitas vezes clandestinamente.

Registre-se que a legislação penal brasileira prevê que abandonar

pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por

qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono é

crime (art. 133 do Código Penal). Portanto, há uma grave diferença para a mãe

se esta doa o filho ou o abandona. Esclarecendo tal raciocínio, é preciso anotar

que o que é crime é o abandono da criança, não a doação.

A respeito do tema envolvendo a doação, Gozzo (2008) fala que não

acredita que o prazer seja a justificativa real para que uma mãe resolva

entregar um filho para adoção, tampouco se leva uma gravidez adiante sem

qualquer condição econômica por mero desejo de assim fazê-lo. Na verdade,

explica a pesquisadora, a mãe, via de regra, não abandona um filho porque

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não o quer, mas sim porque não se sente em condições, sejam psicológicas,

econômicas ou familiares, de mantê-lo ao seu lado.

De qualquer forma, o abandono não pode ser tratado como uma

decisão fácil para a mulher, muito menos como algo que não merece amparo

pelos órgãos assistenciais. Antes de marginalizar quem abandona, é preciso

tentar compreender os motivos para tal ato, muitas vezes desesperado, e

perceber que nem toda mulher tem resiliência suficiente para superar

condições tão adversas sozinha.

Se a mãe não tem condições de criar esta criança ou se esta é

abandonada, ela acabará sendo levada para uma instituição de acolhimento,

local onde esperará pelo encontro de uma família substituta. Todavia, nem

sempre a vida desta criança institucionalizada será fácil, pois muitas vezes esta

fase significa um novo trauma na vida do acolhido.

2.4 A realidade das crianças institucionalizadas

Apesar de o Estatuto da Criança e do Adolescente priorizar a

manutenção da criança ou adolescente na família natural ou extensa, é preciso

ter ciência de que nem sempre isso é possível, ante a inexistência de

condições propícias para a convivência e o desenvolvimento. Se, por um lado,

algumas famílias não têm condições de cuidar de seus filhos, do outro, a falta

de responsabilidade e de vontade de cuidar são mais forte.

Na falta de um ambiente propício para o desenvolvimento físico e

psicológico dessa criança ou adolescente, o caminho natural é a sua

institucionalização. E cabe o Estatuto da Criança e do Adolescente prever os

princípios e critérios orientadores dos abrigos, os quais foram acrescentados

pela recente Lei n.º 12.010/09, que modificou integralmente a adoção:

I - preservação dos vínculos familiares e promoção da reintegração familiar; II - integração em família substituta, quando esgotados os recursos de manutenção na família natural ou extensa; III - atendimento personalizado e em pequenos grupos; IV - desenvolvimento de atividades em regime de co-educação; V - não desmembramento de grupos de irmãos; VI - evitar, sempre que possível, a transferência para outras entidades de crianças e adolescentes abrigados; VII - participação na vida da comunidade local; VIII - preparação gradativa para o desligamento;

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IX - participação de pessoas da comunidade no processo educativo. (BRASIL, 1990, Art. 92)

Todavia, o acolhimento em abrigo deve ser visto como uma etapa

excepcionalíssima, já que o mais desejado, conforme já mencionado, é a

manutenção da criança ou adolescente com sua família de origem, ambiente

em que poderá vivenciar o cotidiano de seus semelhantes em todas as formas

(conflitos e experiências positivas e negativas).

Além disso, o acolhimento institucional deve primar por funcionar

como espaço de proteção, tendo em vista que este jamais será capaz de

substituir o papel natural da família. Entretanto, apesar de não poder substituí-

la integralmente, é perfeitamente possível oferecer carinho, amor, proteção e,

sobretudo, valores para a formação da criança ou adolescente acolhido,

sempre levando em consideração que sua vinda não foi porque quis, mas por

circunstâncias familiares que aquela ou aquele não deram causa.

Também é preciso ressaltar que a permanência da criança e ou do

adolescente na instituição de acolhimento é provisória6, apesar de que esta

condição não deve ser colocada como objetivo a ser perseguido. O ponto

crucial na sua permanência institucional é o amadurecimento e a preparação

da família substituta que irá receber a criança, evitando-se, assim, o seu

retorno posterior ao abrigo com o insucesso do acolhimento.

A bem da verdade, é preciso reconhecer que, apesar de o ECA

estipular que a falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo

suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar (BRASIL, 1990, art.

23) a vinda da criança ou adolescente para a instituição de acolhimento está

relacionada a uma condição de vulnerabilidade, exclusão social ou situação de

risco.

Se o abandono por si só já é um trauma significativo, a colocação

em abrigos pode representar um evento ainda mais danoso à formação do

acolhido, funcionando como verdadeiro elemento estigmatizador. Isso porque,

segundo Ávila (2011, p. 63),

6 “A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional não

se prolongará por mais de 2 (dois) anos, salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada pela autoridade judiciária”. (BRASIL, 2010. Art. 19. §2º)

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“Nas instituições em geral o sistema de funcionamento deixa a desejar, pois o sistema é de massificação onde tudo o que lá é realizado, acontece com todos juntos, as atitudes não são independentes, então o que é feito para um, será igualmente realizado para todos. [...] Além dessa situação, ainda tem a falta de vontade própria destas crianças, pois não há estímulo, as mesmas não podem sequer demonstrar o que gostariam, ou seus verdadeiros sentimentos”.

Logo, tais experiências massificantes podem comprometer a

construção da própria identidade pelo menor acolhido, tendo sido demonstrado

em algumas pesquisas que este apresenta um grande prejuízo no seu

desenvolvimento, o que compreende desde a linguagem até o intelecto.

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ADOÇÃO E REFLEXÃO ACERCA DOS ADOTANTES

Ultrapassada a análise da forma como a adoção foi tomando feições

e características próprias ao longo da História, influenciada diretamente pelas

mais diversas culturas e povos, com suas próprias leis e costumes, bem como

vistos os personagens envolvidos no processo, onde se misturam variados

modelos de família, a questão social do abandono e a marginalização de

crianças e adolescentes em instituições de acolhimento, é necessário conduzir

o debate em torno de um enfoque mais prático acerca da questão.

Objetivando compreender melhor a tomada da decisão de ter como

filho uma criança gerada por terceiros, bem como os obstáculos enfrentados a

partir da consolidação desta decisão, dentre os quais estão os preconceitos

envolvidos e a burocratização do processo, desde a inscrição no cadastro de

adotantes até a decisão judicial autorizando a constituição desta filiação,

procedeu-se à entrevista de casais em diferentes estágios dentro do processo

de adoção.

A fim de preservar a identidade destes casais, estes serão

abordados daqui por diante por nomes fictícios, assim como o nome das

crianças envolvidas. É preciso ressaltar que as demais informações pessoais

são verdadeiras, a fim de melhor ilustrar o perfil dos entrevistados, assim como

seus relatos, todos colhidos pessoalmente. Assim, os casais entrevistados são:

a) Casal 1: José, 44 anos, servidor público, ensino superior

completo; Maria, 42 anos, servidora pública, ensino superior

completo; estado civil: casados; filhos biológicos: 2 (dois),

sendo um de 15 anos e, o outro, de 12 anos;

b) Casal 2: Francisco, 46 anos, assistente administrativo,

ensino médio completo; Ana, 43 anos, fisioterapeuta, ensino

superior completo; estado civil: casados; filhos biológicos:

nenhum

c) Casal 3: Pedro, 42 anos, comerciário, ensino médio

completo; Luísa, 41 anos, assistente social, ensino superior

completo; estado civil: casados; filhos biológicos: nenhum.

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Antes da aplicação das perguntas da entrevista propriamente dita,

os casais se mostraram bastante abertos e receptivos ao tema, não havendo

qualquer interdição prévia quando indagados se havia algum tema sobre o qual

não se sentiam confortáveis. É preciso dizer, aliás, que os entrevistados foram

além das perguntas que lhes foram formuladas, sempre narrando com

surpreendente riqueza de detalhes sobre o tema posto em discussão.

Sobre os casais, em específico, „José‟ e „Maria‟ são casados há mais

de 15 anos, tendo tido 2 filhos naturais. No momento, estes estão inscritos no

cadastro de adotantes, bem como colhendo informações acerca da adoção,

razão pela qual podem ser considerados num estágio de pré-adoção.

O segundo casal, „Francisco‟ e „Ana‟, formalizou seu matrimônio com

faixa etária média de 40 anos. Após insucesso de Ana na tentativa de

engravidar naturalmente, o casal encontrou uma criança com pouco mais de 3

anos, com a qual realizam estágio de convivência. Atualmente, pode-se dizer

que o casal está no transcurso do processo de adoção propriamente dito à

espera da decisão judicial declarando Lucas como seu filho.

Por fim, o terceiro casal, „Pedro‟ e „Luísa‟, já tinha a ideia

amadurecida acerca da adoção e estavam inscritos no cadastro de adotantes

quando do surgimento de criança dada para adoção logo após o parto. Depois

de devidamente inscritos no cadastro de adotantes e tendo passado por todo o

processo legal, hoje o casal já concluiu o processo de adoção de „João‟.

Portanto, concluindo o grupo de entrevistados, tem-se um casal no estágio pós-

adoção.

Tendo em vista os diferentes estágios em que se encontram os

casais entrevistados, ou seja, antes, durante e depois do processo de adoção,

é perfeitamente possível traçar-se um paralelo entre o que a doutrina

especializada no assunto afirma e a prática experimentada por aqueles,

incluindo suas angústias, o preconceito, alguns mitos. Além disso, o discurso e

a prática podem ser vistos com todas suas nuances, acertos e erros, conforme

será detidamente analisado.

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3.1 A motivação da adoção

Sabe-se que o processo de adoção é algo muitas vezes formal e

demorado, oportunidade em que os envolvidos vivenciam uma série de

expectativas e frustrações ao longo do desenvolvimento dessa difícil jornada.

Entretanto, é necessário estabelecer o ponto de partida, a origem dessa

decisão. Então, qual o motivo para adotar?

Segundo Weber (2002), a expressiva maioria daqueles que desejam

adotar uma criança o faz como forma de solucionar um problema de

infertilidade. Na entrevista com os casais 2 e 3, a questão da infertilidade e a

dificuldade de engravidar como motivos para a adoção veio à tona de forma

muito forte, conforme pode ser visto em suas respostas:

„Ana’: “casamos numa idade considerada avançada, por isso sabia que uma gravidez natural poderia não vir [...] mas sempre desejei muito ser mãe, poder cuidar, ter nos braços uma criança, acompanhá-la em cada momento da vida [....], fui criada católica, seguindo todas as linhas da Igreja, por isso jamais pensei em ter um filho que não fosse pelo casamento, horrível pensar em algo do tipo. Quando casamos, já tinha em mente tentar engravidar, mas o tempo foi passando, procuramos o médico para acompanhar e nada, foram muitas tentativas sem resultado. E quanto mais o tempo passava, mais eu me desesperava, não aguentava mais aquilo, porque eu tinha que ser mãe”. „Francisco’: “Desde o namoro que ela já falava em ter um filho. Eu concordei, mas não tivemos sucesso [...] tinha consciência de que a idade era uma barreira muito difícil pra gente. O médico disse que não tínhamos nada de saúde que impedisse, mas o tempo era o principal fator. Não dependia da gente. [...] Nem estávamos casados e a questão de ter um filho já estava transformando tudo numa crise. Depois do casamento, essa criança não vinha, ela não engravidava [...] e tudo era um desânimo. Eu pensei até que ansiedade dela era que atrapalhava tudo”. „Luísa‟: “meu marido já era estéril desde que a gente começou o relacionamento, então já pensávamos em adotar e só alguns anos depois eu precisei fazer a histerectomia do surgimento de um mioma, e aí realmente ficaram os dois estéril, então a gente, aí a gente disse, agora vamos pensar na possibilidade concreta, porque sempre a gente acaba deixando pra depois, não que agora a gente não está com condições financeiras, aquela coisa quando se inicia um casamento, não é assim?” „Pedro‟: „desde o começo eu deixei claro que eu não podia ter filhos, então sabia que uma hora ela ia tentar me convencer sobre a adoção. No começo do casamento a coisa estava um pouco difícil, mas teve uma

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hora que deu um sentimento mais forte, o João apareceu pra gente, não teve como segurar”.

Todavia, verifica-se que o altruísmo, característica geralmente mais

comum em países desenvolvidos, tem sido apontado como motivação de forma

ascendente, conforme ressalta Weber (2002). Sobre o assunto, a pesquisadora

afirma que

“quem tem motivação mais altruísta acha que não se deve escolher a criança, mas ficar com a criança designada e apresenta menor tendência de fazer exigências em relação às características físicas da criança a ser adotada, mas, assim como quem adotou por infertilidade, tem receio de adotar uma criança que viveu muitos anos em instituições”.

Também dando sua contribuição, Santos (1998) ressalta que, no

caso da mulher, a adoção não se dá por generosidade ou altruísmo, mas pelo

desejo de „maternar‟ ou mesmo de preencher algum tipo de carência,

colocando o motivo da adoção no campo da necessidade. Assim, muitas vezes

a impossibilidade de gerar um filho desperta em algumas mulheres um

sentimento de inferioridade ou diferença em relação a mães biológicas,

podendo encontrar na adoção uma forma de disfarçar esta situação.

O relato sincero de „Ana‟ (casal 2), quando perguntada como se

sentia em relação à impossibilidade de engravidar naturalmente, ilustra bem

este raciocínio quando ela narra que

“eu corria para o banheiro pra chorar toda vez que uma colega no trabalho chegava dizendo que estava grávida. Aquilo era uma tortura, me fazia mal demais, eu sofria, me sentia incompleta e totalmente frustrada. E o pior é que todas as colegas percebiam, porque eu não conseguia ficar naquele ambiente, todo mundo dando parabéns, sorrindo, e eu não entrava naquele clima [...], eu preferia me isolar. Eu não admitia não poder ser mãe, achava aquilo tudo injusto, por que todas as conhecidas conseguiam e eu, não?! Eu rezava todos os dias pedindo essa criança”.

Acrescentando ao debate e realizando intercâmbio de

conhecimentos com a Psicologia, Teixeira (2000, p. 17) faz uma análise direta

e concreta acerca dos motivos que levam à adoção, oportunidade em que

também conclui que a infertilidade e o altruísmo são os motivos mais comuns

para a adoção ao dizer que

“A adoção é um tema social que chama a atenção na medida em que denuncia, por um lado, a infertilidade ou a esterilidade de alguém, e

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por outro, o número cada vez maior de crianças que, abandonadas em consequência de um sistema político-econômico e social, ficam sem os cuidados necessários e vitais ao seu desenvolvimento como pessoa. A adoção constitui-se então, em um processo legal e social que viabiliza a possibilidade de reparação tanto para estas crianças que, impedidas de viver com seus pais biológicos, passam a ser acolhidas por outras famílias, como para aquelas pessoas que, marcadas pela esterilidade ou infertilidade, têm a possibilidade de realizar seu desejo de ter filhos. Ou mesmo para muitas pessoas que, sensibilizadas pela situação dessas crianças, ainda que tenham seus próprios filhos, optam por adotá-las, por uma necessidade consciente de ajudar”.

Por outro lado, é extremamente necessário ressaltar que, se essa

adoção é motivada pela condição de generosidade ou altruísmo, dificilmente

haverá um processo de incorporação e adaptação satisfatório, ainda que

atendidas algumas necessidades objetivas do adotado. De acordo com Santos

(1998), na perspectiva de objeto de boa ação dos adotantes, o adotado não

terá como ocupar o lugar de filho e sujeito no contexto familiar.

Ilustrando a motivação altruísta, talvez por já ter tido 2 filhos

biológicos, o casal 1 respondeu:

„José’: “a gente primeiramente pensa na questão social, Deus nos deu muita sorte em nossa vida, em relação a uma família estruturada, a educação, a possibilidade de ter uma boa educação que os pais conseguiram nos dar, a questão do emprego, temos estabilidade. [...] Como eu falei, eu acho que adoção primeiro é um gesto humano, adotar é pegar e trazer pro seio da família, é humanitário, é um gesto de amor eu acho. Eu quero dar as mesmas coisas que eu dei pros meus filhos, adotar é um gesto de amor, mas não espero ser congratulado por isso, eu faço isso porque eu tenho esse pensamento não quero que ninguém diga que eu faço isso porque eu sou bonzinho, não, eu quero fazer isso porque eu sinto que eu tenho que fazer isso é uma questão pessoal minha, não é caridade não, a gente trata isso como algo natural normal se a gente tivesse 8 filhos a gente ainda pensaria em adoção,” „Maria’: “queremos proporcionar isso a uma pessoa que já venha assim com a certa dificuldade que a gente imagina que as oportunidades serão bem reduzidas, então a gente quer repartir tudo isso o que a gente teve e tem com uma pessoa que não tenha. [...]: é uma oportunidade da gente melhorar a vida dessa criança, dar uma oportunidade pra outra pessoa, oportunidade que nossos filhos tem e diminuir, melhorar essa questão social, porque a gente sabe a quantidade de crianças que tem um lar, mas não tem amor, carinho, que falta tudo, não é esse negocio de apadrinhar, você vai dar o seu dinheiro ali e acha que tá fazendo a sua parte, mas não falta o dinheiro, falta o carinho a presença, tô mais preocupada com isso”.

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Conforme explica Ebrahim (2001), o altruísmo está mais presente

nos casos de adoção tardia do que entre os adotantes convencionais, ante a

preocupação em atender às necessidades do outro como justificativa para as

adoções. No grupo de adotantes tendentes à adoção tardia, há maior presença

de filhos biológicos, bem como a situação civil é mais variada, aparecendo

ainda como justificativas a situação de abandono das crianças, o amor ao

próximo e valores religiosos.

3.2 O perfil da criança a ser adotada

Não custa reconhecer que a maioria dos casais aponta para a idade

como critério básico para a adoção, onde a preferência de escolha geralmente

recai sobre crianças recém-nascidas. Segundo Camargo (2006), isso se dá

porque, em geral, quanto menor a idade da criança, maior será a facilidade de

integração e adaptação de ambos os lados - pais adotivos e criança adotada. É

justamente nessa fase que os pais têm maior possibilidade de imprimir sua

personalidade e suas expectativas na formação da criança, bem como esta tem

menor chance de ser submetida a traumas que interferirão na sua evolução.

Numa das entrevistas, „Luísa‟ discorreu sobre o interesse em

vivenciar a experiência de ser mãe em todas as suas fases, em especial

quando a mulher nunca teve um filho biológico, oportunidade em que disse:

“Na realidade pra quem não tem filhos essa experiência de você ter um bebezinho, de você ir construindo, ver ele crescendo é muito forte porque é aí quando a gente consegue se sentir mãe [...] o meu marido diz que se um dia a gente adotar uma outra criança, eu quero de novo um bebê porque pra gente de novo construir já desde o berço aquela história do amor”.

Por outro lado, a questão da idade também pode remeter ao modelo

de família contemporâneo, onde o homem e a mulher desempenham atividade

profissional fora de casa ao longo do dia, o que impede um maior contato e a

presença constante na formação da criança. Logo, a falta de disponibilidade

para um convívio mais próximo e constante poderia se tornar um empecilho no

trabalho de adaptação de uma criança maior, conforme ressaltado por „Maria‟

(casal 1):

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“A gente tem um pensamento assim, da criança que venha pra gente de não ser uma criança que traga essa bagagem assim, por isso mesmo a gente se preocupa com a faixa etária, a gente quer uma criança de até 3 anos e meio de idade, justamente pra que essa carga de trauma não venha tão acentuada, justamente porque a gente trabalha o dia inteiro ficaria mais difícil da gente ficar junto dessa criança, porque a gente ficaria com ela mais no período da noite e no final de semana, então uma criança que venha com uma carga maior de trauma e problemas assim eu acho que ela precisa ter pais que acompanhem mais de perto, com mais horas por dia a gente pensa assim, uma criança de até 3 anos a possibilidade de ter menos trauma é maior”. (grifo nosso)

Entretanto, também é importante deixar claro que o raciocínio muito

comum de que os primeiros meses de vida são os mais propícios para a

afirmação de uma relação parental substituta não significa negar a existência

da possibilidade de adoção para crianças mais velhas (DINIZ, 1991, p. 70). É

extremamente urgente se iniciar uma discussão acerca de inúmeras crianças

que estão fora de um determinado perfil de preferência mais comum por

pretendentes à adoção, ficando praticamente condenadas a uma vida em

instituições de acolhimento.

Nesse sentido, Santos (1997) ressalta que em diversos casos a ideia

de que a criança que é recém-nascida e que apresenta características físicas

semelhantes às do casal não irá apresentar problemas de adaptação e conduta

devido à identificação com os pais adotivos e, sobretudo, por não tornar

explícita a condição de pais/filhos adotivos revela verdadeiro mito em torno da

adoção. Ilustrando bem tal raciocínio, ainda que a entrevistada não tenha

afirmado expressamente algo nesse sentido, „Luísa‟ narrou que

“independente do sexo de 0 a 2 anos que a única coisa que eu queria, uma criança menorzinha, mas sem preferência de cor e sexo, que é uma das coisas que acaba limitando a demora no processo de adoção, tendo em vista que a maioria das pessoas só querem menina e branca, e aí como eu sou parda e meu marido é branco e na minha família e na dele, tem loiros e tem negros [...]” (grifo nosso)

Portanto, verifica-se que a semelhança física entre o adotado e os

pais adotivos também é levada em consideração em alguns casos. Na

verdade, tal interesse revela uma forma de evitar o enfrentamento da situação

perante terceiros e desconhecidos. Santos (1997, p. 163-164) é firme nesse

raciocínio ao discorrer que

“a semelhança física entre o casal ou pessoa interessada e a criança é [...] legitimado pela maioria dos profissionais da área -, o que

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entendo merecer uma reflexão mais aprofundada, pois se por um lado, acredita-se que esta semelhança favorecerá a identificação entre as duas partes, por outro verifica-se que a ênfase nos caracteres físicos semelhantes pode estar ancorado numa visão preconceituosa da adoção e tem reforçado este preconceito, na medida em que busca mascarar/esconder a filiação adotiva do meio social mais amplo. [...] tenho observado empiricamente que esta é uma preocupação presente nos setores médio e alto da nossa população, sendo que nas camadas populares é comum os filhos de criação ou adotivos apresentarem características físicas diferenciadas dos pais, não tendo eles uma preocupação prioritária a esse respeito”.

Narrando sua experiência prática na Vara de Menores de Curitiba,

Jojima (1991, p. 154) conta que ao indagar acerca da possibilidade dos

pretendentes optarem pela adoção de uma criança negra, aqueles de cor

branca justificam sua não aceitação sob o argumento de que “sua negativa é

motivada, não pelo fato de serem preconceituosos, mas que a sociedade o é, e

que a criança no futuro seria marginalizada e discriminada” sendo criada por

pais tão diferentes fisicamente, o que lhe traria ainda mais sofrimento.

A bem da verdade, “se a adoção é um ato de amor, não há que se

questionar se o beneficiário do sentimento é neonato ou adolescente, saudável

ou enfermo, [...] é preciso terminar com a tendência de se escolher como se

escolhe mercadoria” (FRANCO JUNIOR, 1991, p. 210). Assim, ainda que as

características físicas sejam completamente destoantes, o importante é que os

pais e filhos adotivos tenham uma relação de segurança e equilíbrio emocional

para enfrentar a situação com calma e preparo, deixando de lado os traumas e

falsos personagens, diante da preocupação com que os outros podem achar.

Ainda que a adoção seja trabalhada pelos profissionais envolvidos

no assunto de forma a atender as expectativas dos adotantes e atingir o maior

número de crianças e adolescentes em condição de abandono, há que se

reconhecer a existência de um contingente expressivo à espera em instituições

de acolhimento e que se insere no conceito de adoção tardia.

3.3 O perfil da exclusão e a adoção tardia

A adoção é um grande desafio, pois envolve o acolhimento e a

aceitação de uma pessoa em sua integridade, com suas qualidades, mas

também com suas dificuldades e entraves. No caso da adoção de uma criança

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maior ou mesmo um adolescente, as dificuldades e obstáculos são ainda mais

acentuados, haja vista se tratar de uma pessoa que já tem uma história

pregressa e com isso tem personalidade e outros elementos subjetivos melhor

formados que uma criança recém-nascida, a qual tem mais facilidade de

incorporar o “molde” educacional imposto pelos pais adotivos.

No caso da criança recém-nascida, os pais adotivos acreditam que a

adaptação será mais tranquila, o que poderá ajudar no estabelecimento de

uma convivência saudável e o mais semelhante possível com uma relação de

filiação natural, na qual há a relevância do fator sanguíneo. Assim, acredita-se

que haverá menor chance de traumas e será mantido um ambiente tranquilo e

acolhedor em que será possível apagar as cicatrizes da rejeição e do

abandono deixas pelos pais naturais.

Segundo Vargas (1998) e Weber (1998), tardia é a adjetivação

utilizada para designar a adoção de crianças maiores de dois anos de idade. E

Vargas (1998) complementa, afirmando que

“Tais crianças ou foram abandonadas tardiamente pelas mães, que, por circunstâncias pessoais ou socioeconômicas, não puderam continuar se encarregando delas ou foram retiradas dos pais pelo poder judiciário, ou, ainda foram „esquecidas‟ pelo Estado desde muito pequenas em „orfanatos‟ que, na realidade, abrigam uma minoria de órfãos como já levantado anteriormente”. (1998, p. 35)

Entretanto, baseada em pesquisas estrangeiras, Vargas (1998)

defende que é possível uma criança maior, considerada „idosa‟ para a adoção,

ter a oportunidade de recuperar sua identidade a partir da vivência com a

família substituta, na qual as novas figuras parentais têm a oportunidade de

oferecerem uma base segura e indispensável para o desenvolvimento das

competências e o talento de quem foi escolhido para ser adotado.

Essa segurança se projeta justamente na percepção da criança ou

adolescente de que não será novamente abandonado e que também não está

sozinho no mundo, que há alguém que lhe demonstre carinho e proteção. Tudo

isso somente é possível quando os pais adotivos estão seguros do amor que

sentem, deixando o acolhido livre para expressar seus sentimentos e

compreender toda a rotina de adaptação ao núcleo familiar do qual passará a

fazer parte.

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É preciso deixar claro, no entanto, que a inserção desta criança maior

ou adolescente no seio de uma nova família não é tarefa fácil, sobretudo

quando retirada forçosamente de sua família natural por meio de decisão

judicial, hipótese em que Bowlby (1976) citado por Vargas (1998, p. 36) afirma

que várias pesquisas demonstraram que as crianças que foram

“passadas de uma figura materna para outra durante seu terceiro e quarto anos de vida desenvolveram personalidades muito anti-sociais e tornaram-se incapazes de estabelecerem relações satisfatórias com outras pessoas”

Ilustrando o estabelecimento destas relações, Gil (1991) afirma que

o processo de integração do adotado tardiamente passa por três estágios bem

definidos. Num primeiro momento, a criança ou adolescente procura agir de

forma a agradar os pais adotivos, o que pode gerar grande ansiedade nos

sujeitos envolvidos na relação. Além disso, essa etapa geralmente é curta a

ponto de atitudes de afetividade nem serem percebidas de tão sutis e rápidas.

Já no segundo estágio, o qual é mais longo, a criança ou

adolescente adotado demonstra medo de ser novamente abandonado e sofrer

nova rejeição. É comum que a família adotiva seja colocada em teste,

oportunidade em que o adotado poderá perceber o quanto tem valor e é amada

por aquele núcleo familiar.

Nessa fase, a insegurança e a baixa autoestima são comuns, tendo

em vista o medo de que a família descubra que aquela criança ou adolescente

não tem valor, gerando até mesmo reações hostis por pensar que não deve

gostar daqueles pais que acabarão por abandoná-lo novamente. Nessa

situação, Gil (1991, p. 141) ilustra tal raciocínio narrando que “a fim de rejeitar

antes de ser rejeitada, a criança ameaça partir, prepara as malas, e diz aos

pais que ela não lhes ama”.

Quando o processo de integração atinge o terceiro e último estágio,

é quase certo que o comportamento do adotado tenha sido precedido por

períodos de progressão ou regressão. Ainda segundo Gil (1991), a vivência da

maternagem inicial que faltou ao adotado é permitida mediante

comportamentos regressivos, onde são elaboradas as perdas e o luto das

ligações afetivas pretéritas.

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Exemplificando tais comportamentos regressivos, Campos (2013)

menciona casos de crianças que fazem xixi na cama, ainda que não tenham

mais idade para este tipo de comportamento e/ou não façam mais enquanto

estão no abrigo; a vontade de utilizar fraldas ou mamadeiras e, o mais

inusitado, querer entrar na barriga da mãe adotiva ou mamar em seu peito, o

que se acredita ser uma tentativa de vivenciar aquilo que foi perdido no

passado com os novos pais adotivos. Em claras palavras, “é como se a criança

retornasse ao estado imaginário de recém-nascido e quisesse viver uma

espécie de segundo nascimento”.

Acerca desse comportamento regressivo, Vargas (1998, p. 37)

acrescenta ainda ao debate afirmando que

“o „fantasma intra-uterino‟ leva a criança a buscar, através um contato corporal pele a pela, boca a boca, a realização do desejo de se reintroduzir no corpo materno, de voltar a viver na barriga da mãe (no caso, de habitar pela primeira vez). O relato de algumas mães cujos filhos recém-adotados verbalizaram querer „morar na sua barriga‟, „ter nascido da sua barriga‟, „entrar na sua barriga pra sair de novo‟, é um exemplo dessa frase [...]. O desejo de renascer da barriga desta mãe é um ponto importante na identificação do processo de filiação que a criança, começa a estabelecer com as novas figuras parentais”.

Outras circunstâncias relevantes experimentadas por Campos

(2013) se referem à agressividade em particular contra a mãe adotiva e aos

sentimentos de vulnerabilidade, impotência e culpa. Isso se justifica por que a

figura maternal é carregada de simbolismo, permitindo que a criança veja o

fantasma da genitora na mãe adotiva. Além disso, os pais adotivos se cobram

demais, chegando a sentir a necessidade de provar sua capacidade para o

exercício da figura de pai ou mãe antes mesmo da concretização da adoção.

Acerca desta insegurança gerada nos pais adotivos e da

necessidade de provação como bons pais, Pacheco (2008, p. 54) é bastante

objetiva ao mencionar que

“A idealização no processo adotivo, compreendendo aí não só a idealização da criança, mas também a idealização dos pais torna tudo mais difícil para todos. os pais adotivos frequentemente se cobram uma paternidade “melhor” ou “maior” do que os pais biológicos. De fato, eles não precisam amar mais: precisam sim, ter a possibilidade de amar e se colocar sinceramente, aceitando os fatos pertencentes ao processo adotivo como eles realmente são. Muitas crianças, por exemplo, que cresceram em abrigos, costumam sentir falta dos mesmos, dos amigos que lá ficaram; outras, por terem tido sempre uma relação mais “coletiva” com a maternagem, sem nenhuma

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relação de exclusividade com as cuidadoras, não conseguem corresponder às expectativas idealizadas dos pais adotivos, não “valorizam” da forma esperada por eles, aquela relação tão direta de amor entre os pais e filhos. Se os pais puderem entender e aguardar com calma e afeto que a criança ultrapasse esse momento, abrindo mão da fantasia do filho ideal, existem grandes possibilidades de tudo dar certo. A adoção tem particularidades, principalmente no início do processo; mas depois, uma vez estabelecido um vínculo de confiança verdadeiro, a relação entre pais e filhos adotivos é como qualquer relação entre pais e filhos” (grifo nosso)

No mesmo sentido, Pereira e Pereira (2012, p. 46) narram sua

experiência com a adoção tardia com muita humanidade ao dizer que

“não adianta idealizarmos um modelo de filho, independentemente de ser biológico ou adotivo. O biológico também é diferente do que idealizamos. É nosso dever construir uma nova história com ele e dar oportunidade a quem já perdeu muito, com tão pouca idade”.

Não há como se negar que todo esse processo de inserção e

acolhimento da criança maior é difícil e cheio de obstáculos a serem

enfrentados com calma e atenção, tanto pelos adotantes, quanto pela equipe

multidisciplinar responsável por acompanhar o estágio de convivência. Por

outro lado, também é importante ressaltar que tais dificuldades devem ser

vivenciadas, principalmente pelo adotado, para que este esteja preparado para

as novas relações afetivas a serem experimentadas com os pais adotivos. A

dificuldade maior neste tipo de adoção também exige maior preparação por

parte dos pais adotivos e segurança na sua decisão.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sem sombra de dúvidas, a adoção é um tema extremamente

instigador e de extrema relevância nos tempos atuais, sobretudo em razão das

milhares de crianças e adolescentes que aguardam uma família substituta na

tentativa de reconquistar aquilo que lhes foi negado na fase mais tenra da vida:

amor. Assim, o tema é bastante atual e rende interessantes debates, os quais

podem contribuir para a diminuição da cultura do abandono e ajudar a traçar

um final mais digno para tantas e tantas crianças institucionalizadas.

É incrível perceber que o instituto da adoção foi se modificando ao

longos dos tempos, sofrendo influências da época e das sociedades na qual foi

adotada. Assim, de um lado, temos a prática da adoção como forma de garantir

a perpetuação do nome familiar em detrimento de qualquer outro sentimento

ligado à filiação, tal como acontecia nos povos antigos, tais como egípcios,

hebreus, gregos e romanos.

Por outro lado, vimos a adoção sofrer forte pressão da Igreja

Católica durante a Idade Média sob o falso discurso de que esta promoveria o

reconhecimento de filhos frutos do adultério ou incesto, quando, na verdade, o

que se procurava era proteger a doação póstuma deixada por ricos senhores

feudais que não tinham descendentes. Todavia, tal influência não demorou a

cair, ante o florescimento das ideias iluministas e da Reforma Protestante da

Idade Moderna, época na qual a adoção começou a integrar o movimento de

codificação dos Estados Nacionais.

Em especial, no Brasil, a adoção assumiu ares de caridade e forma

de exploração de mão de obra gratuita durante o Período Colonial, o que revela

descaso e falta de amparo social para as crianças abandonadas no tempo em

que o país servia à Coroa Portuguesa. Foi neste período que a famigerada

Roda dos Expostos mais recebeu bebês deixados pelas suas mães, muitas

vezes, integrantes das classes mais altas da sociedade que não poderiam

macular o nome da família com o fruto de uma relação extraconjugal ou

incestuosa, bem como outras.

Em período mais recente, o Brasil experimentou importante

transformação de suas leis, principalmente por conta da Constituição Federal

de 1988, também chamada de Constituição Cidadã em razão da enorme lista

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de direitos e garantias que prevê. No rastro desta, veio o Estatuto da Criança e

do Adolescente - Lei Federal n.º 8.069/90, que revogou o antigo Código de

Menores, ultrapassada e obsoleta lei muito mais voltada para a segregação de

jovens infratores. Assim, o ECA estabeleceu um importante marco sobre os

direitos da criança e do adolescente, sobretudo por tratá-los como sujeitos de

direito e garantir-lhes prioridade e proteção integral.

Todavia, o ECA sofreu nova alteração: desta vez, no que se refere à

adoção, através da Lei Federal n.º 12.010/2009. Dentre suas particularidades,

a mais importante, talvez, seja a criação do Cadastro Nacional da Adoção, o

qual centraliza uma lista de pretendentes à adoção em todo o país e, assim,

agiliza o processo de encontro entre a criança adotanda e a família substituta.

Ultrapassada a vertente histórica, chega-se à discussão em torno da

definição de adoção, a qual revela ato pelo qual o adotante traz para sua

família uma pessoa originalmente estranha como se filho fosse, formando

vínculo irrevogável. Apesar de alguns autores, principalmente da literatura

jurídica, afirmarem que a adoção é um vínculo fictício, tal raciocínio precisa ser

superado, ainda mais quando a questão da paternidade socioafetiva cada vez

mais ganha força.

Assim, é importante ressaltar que a família também pode ser

compreendida como um local de acolhimento onde são construídas as bases

humanas e morais de seus integrantes, bem como trabalhados os conceitos de

proteção, respeito, dignidade e compartilhamento.

Nessa perspectiva, a família tem papel fundamental no

desenvolvimento da criança ou adolescente adotado, razão pela qual figura

como personagem imprescindível no processo adotivo e importante fator a ser

considerado no desenvolvimento da pesquisa acerca da adoção.

No que se refere às modalidades da adoção, é possível afirmar que

o jeito “à brasileira” de se adotar infelizmente ainda é muito comum, apesar da

adoção ser, hoje, bem mais corriqueiro em campanhas na televisão e outros

meios de comunicação do que em outras épocas. Contudo, isso não é

suficiente. É preciso um acompanhamento mais próximo por profissionais do

Serviço Social, da Psicologia e outras áreas afins para que, primeiro, o

abandono da criança seja evitado e, em segundo, a adoção deixe a

informalidade e a ilegalidade de lado.

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Portanto, o acompanhamento da família, tão importante como

elemento básico da sociedade organizada, é de extrema importância para a

diminuição da marginalização de crianças e adolescentes no país, dando-lhe

suporte psicossocial e apoio do Poder Público.

Mas é no contato com aqueles sujeitos que vivenciaram ou que

ainda estão no processo de adoção que a pesquisa ganha em riqueza de

detalhes. Nas entrevistas com os casais que estão à procura de uma criança

para adotar ou que já adotaram, é possível ver a sinceridade no acolhimento da

criança adotada, com todas suas virtudes e limitações.

Mas, por outro lado, a experiência prática da adoção confirma a

literatura acerca do assunto quando afirma a existência de um perfil de

exclusão, ou seja, crianças e adolescentes fora de um padrão comum

escolhido pelos pretendentes. Logo, outra questão sensível é levantada: a

adoção tardia.

Assim, toma-se conhecimento de uma massa de crianças maiores

de 2 anos de idade que passam anos e anos em instituições de acolhimento

com a baixa expectativa de encontrarem uma família substituta. Apesar de a

Constituição Federal e o Estatuto da Criança do Adolescente disporem que

toda criança tem direito à convivência familiar e comunitária, esses direitos são

repetidas vezes negados a crianças que já passaram dos dois anos de idade

Portanto, se o abandono da família natural já gera um pesado

trauma, a permanência nestes abrigos, muitas vezes, revela um segundo

abandono, o qual deve ser muito bem trabalhado pelos profissionais que as

acompanham, sob pena de crescerem sem a possibilidade de desenvolverem

seu real potencial humano.

Diante desse contexto, é possível afirmar que a marginalização

destas crianças e adolescentes deve ser duramente combatida, em especial,

tentando buscar desmistificar muitos preconceitos que ainda rondam a adoção.

É preciso deixar de lado sentimentos egoístas que tratam a criança como uma

mercadoria que tem características melhores ou piores e que atendem

interesses pessoais do adotante.

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APÊNDICE

Questionário aplicado com os entrevistados:

1. Identificação: nome, profissão, estado civil, idade, número de filhos que

tinha antes do início do processo de adoção;

2. Quais os motivos que o levaram a querer adotar?

3. A opção pela adoção foi de ambas as partes?

4. Como foi que se deu o processo de adoção?

5. Como você se preparou para tornar-se candidato(a) à adoção?

6. A possibilidade de a criança ter problemas/traumas pela rejeição da

família de origem é considerada?

7. As consequências da questão biológica/genética da criança são

consideradas?

8. O que pensa sobre a adoção?

9. Como a família, amigos reagiram com a notícia da adoção?

10. Em que momento familiares, amigos, rede social, foram informados

sobre a adoção?

11. Qual a sua preferência de criança? Por quê?

12. Que trâmites jurídicos ocorreram durante o processo de adoção?

13. Quais os sentimentos vinculados à adoção?

14. Quais são/eram suas expectativas em relação ao adotado?

15. Qual a avaliação do estágio de convivência?

16. Em algum momento você cogitou uma criança maior de 2 anos? Se não,

qual o motivo?

17. Como será tratada a questão da adoção com a criança?

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ANEXOS

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Prezado(a) Participante:

Sou estudante do curso de graduação na Faculdade Cearense. Estou realizando uma

pesquisa sob supervisão da professora Joelma Freitas, cujo objetivo é entrevistar possíveis

candidatos à adoção ou adotantes e ter contato com suas experiências e expectativas na

escolha da criança a ser adotada.

Sua participação será dada através de uma entrevista, a qual será gravada se assim

você permitir e que tem duração aproximada de 20 minutos, a depender do desenvolvimento

dos temas abordados.

A participação nesse estudo é voluntária e se você decidir não participar ou quiser

desistir de continuar em qualquer momento tem total liberdade de fazê-lo.

Na publicação dos resultados desta pesquisa, sua identidade será mantida no mais

rigoroso sigilo. Serão omitidas todas as informações que permitam identificá-lo (a).

Mesmo não tendo benefícios diretos em participar, indiretamente você estará

contribuindo para a compreensão do fenômeno estudado e para a produção de conhecimento

científico.

Atenciosamente,

__________________________________

Andrea Araújo Ferraz

Matrícula 09001333

______________________________

Local e data

_____________________________________

Profª. Ms. Joelma Freitas

Orientadora

Consinto em participar deste estudo e declaro ter recebido uma cópia deste termo de

consentimento.

____________________________________

Assinatura do (a) participante

____________________________________

Local e data