acordos comunitários para a ecovila

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ecovila permacultura

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Acordos comunitrios para a ecovila

Muita gente pensa que uma ecovila um lugar em que as pessoas vivem em casasecolgicas, cultivam seus prprios alimentos, produzem energia de fontes alternativas e colecionam geringonas tecnolgicas capazes de reduzir sua pegada ecolgica sobre a Terra. Em parte, verdade, sim. Mas essas caractersticas, que dizem respeito cincia e s novas tecnologias verdes esto longe de sero que realmente sustenta ou serve como base para uma comunidadedesse tipo.

Costumo dizer que de nada servem as novas tecnologias se as pessoas no tiverem ferramentas para buscar umaconvivncia rica e harmoniosa, feita de trocas de saberes, festas e atividades desenvolvidas de forma coletiva (como mutires de trabalho, por exemplo). Nesse sentido, construir uma habitao menos agressiva ao planeta, gerar energia a partir do sol, consumir produtos mais ecolgicos, enfim, fazer escolhas mais conscientes apenas a pontinha do iceberg. O que faz uma comunidade prspera e mais sustentvel so asrelaes interpessoais e, nesse ponto, convenhamos, bastam duas pessoas para que os conflitos comecem a aparecer

Por isso, no adianta querer evitar os conflitos, ocultar sentimentos, mgoas, frustraes. A boa ecovila, aquela mais madura, conquistada com o tempo, precisa criar condies e espaos reais para que as pessoas manifestem,com confiana e tranquilidade, tudo o que sentem, sem receios e ansiedades. Muito mais difcil do que fazer um telhado verde, concorda?Pois bem, uma das maneiras de se caminhar em direo boa convivncia e a todos os benefcios que ela traz aos moradores pelo menos, nos primeiros anos da comunidade, quando ela ainda mais sonho do que aes a elaborao colaborativa de ummanual de acordos comunitrios.

Um estudo feito pela Rede Mundial de Ecovilas (GEN, na sigla em ingls) mostrou que boa parte das iniciativas de ecovilas que no se perpetuaram no tempo/espao no tinhamregras ou acordos comunitrios claros, bem definidos. Sinceramente, no sou muito f de regras, porque elas, de certo modo, remetem-me a uma ideia de rigidez, inflexibilidade, imparcialidade que beira a falta de empatia e capacidade de ouvir o outro. Mas, na prtica, no ter regras, por outro lado, tambm no parece ser uma boa opo basta pensar que cada pessoa tem uma noo particular do que seja liberdade, respeito ao prximo e por a vai.Na Itlia, para citar um exemplo real, a ecovila de Damanhur nasceu com um conjunto bastante extenso de regras, que tinha a ver com a poca em que ela nasceu. Era o auge dos anos 60-70, quando as ideias de contracultura, liberdade de expresso e amor livre estavam mais do que na moda. Seu fundador pensou, ento, que para fazer a comunidade funcionar era preciso compor uma longa lista de deveres e direitos, que pudessem prevenir conflitos e evitar anarquismos distorcidos. A ideia era experimentar, vivenciar as regras, de tal modo que elas pudessem ser incorporadas por todos e, assim, com o tempo, simplesmentedeixariam de existir.Na Ecovila Clareando, estamos em fase de votao de um texto-base que, em breve, ir compor nossa primeira verso dos acordos comunitrios. Ele surgiu a partir da necessidade que os moradores apresentaram de ter regras claraspara algumas questes do cotidiano, como barulho, gesto de animais domsticos e de criao, poltica de alimentos, cuidados com a terra e a gua, princpios de construo sustentvel, administrao de funcionrios nas obras etc.

Quando li, pela primeira vez, as dez pginas que compem o manual de acordos, sinceramente, fiquei um pouco decepcionada. Algumas regras me soaram caretas, outras bvias demais para aquele documento. Depois, com mais calma, tornei a ler, com olhos e corao mais abertos, e percebi que aquelas palavras, na verdade, traduzemdesejos da comunidadeque nem sempre equivalem aos meus anseios de vida em ecovila embora o manual tenha sidoconstrudo de forma colaborativa, com reunies e discusses coletivas. Ali estava, para mim, mais uma lio: viver em comunidade mais ou menos como um casamento, em que preciso ceder algumas vezes, em nome do bem-estar do outro (e de ns mesmos)

Nos meus mais remotos sonhos de ecovila, as pessoas surgiam em meus pensamentos como seres quase iluminados, dotados de uma capacidade imensa de ouvir o outro, ponderar, refletir e, quando necessrio, abrir mo de vontades pessoais para permitir e colaborar com a construo de uma alternativa viva de assentamento humano mais sustentvel e amoroso. Ingenuidade? Sonho? Talvez, hoje sinto que era uma viso romntica demais, que partia do pressuposto de que todo mundo estaria disponvel para rever hbitos, comportamentos, vises de mundo. No to simples assim. Quase ningum se muda para uma ecovila pronto e disposto a se reinventar um pouquinho a cada dia, da mesma maneira que ningum tem nas mos a frmula do sucesso de uma ecovila Da, a necessidade das regras, que devem servir unicamente para nos fazer caminhar em direo ao nosso sonho, um passo a mais por dia. Se ainda no estamos prontos, precisamos de artifcios que nos levem at nosso destino, entende?

Seja como for, algo em mim no mudou (ainda?): avontade de viver com menos regrase exigncias egicas e mais abertura de esprito, mais compaixo. Domingo ser dia de votarmos item por item do manual, que somente entrar em vigor nos casos em que as regras forem aprovadas por umamaioria de 70%dos integrantes da comunidade. Esse processo me lembrou uma questo dirigida a mim por uma professora com quem tive aulas num curso tcnico que fiz anos atrs. Qual a misso da educao ambiental?, ela me perguntou. Pensei por alguns instantes e respondi, em confisso: Deixar de existir, porque quando no precisarmos mais falar tanto sobre ela ser sinal de que j aincorporamospor completo. mais ou menos por a