acordão sobre fraude a execução

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Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL 1.121.461 - RS (2009/0074155-0) RELATOR : MINISTRO SIDNEI BENETI RECORRENTE : CERVECERIA CUAUHTEMOC MOCTEZUMA SOCIEDADE ANONIMA ADVOGADO : MELISSA CRISTINA REIS E OUTRO(S) RECORRIDO : BANCO DO BRASIL S/A ADVOGADOS : MAGDA MONTENEGRO ANA MARIA LONGARAY E OUTRO(S) RELATÓRIO O EXMO SR. MINISTRO SIDNEI BENETI (Relator): 1.- CERVECERIA CUAUHTEMOC MOCTEZUMA SOCIEDADE ANONIMA interpõe Recurso Especial com fundamento nas alíneas "a" e "c", do inciso III, do artigo 105, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Relator o Desembargador MÁRIO JOSÉ GOMES PEREIRA, assim ementado (fls. 350): EMBARGOS DE TERCEIRO. Falta de alegação e consequente prova da posse. Existência de fraude à execução. Parecer do MP em primeira instância. Improcedência dos embargos confirmada. Apelo IMPROVIDO. 2.- Os Embargos de Declaração interpostos foram rejeitados (fls. 380/386). 3.- A Recorrente sustenta que o Tribunal de origem teria violado o artigo 535 do Código de Processo Civil ao deixar de se manifestar explicitamente sobre os temas suscitados em embargos de declaração. Assevera que, no caso, os embargos de terceiro por ela interpostos deveriam ter sido providos, sob pena de ofensa aos artigos 167, I, 2, e 172, II, 2, da Lei 6.015/73, porque, quando da aquisição do imóvel, não havia qualquer gravame no Registro de Imóveis. Nesses termos, se não havia gravame na matrícula do imóvel, a sua aquisição teria Documento: 34618340 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 1 de 6

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Page 1: Acordão Sobre Fraude a Execução

Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 1.121.461 - RS (2009/0074155-0)RELATOR : MINISTRO SIDNEI BENETIRECORRENTE : CERVECERIA CUAUHTEMOC MOCTEZUMA SOCIEDADE

ANONIMA ADVOGADO : MELISSA CRISTINA REIS E OUTRO(S)RECORRIDO : BANCO DO BRASIL S/A ADVOGADOS : MAGDA MONTENEGRO ANA MARIA LONGARAY E OUTRO(S)

RELATÓRIO

O EXMO SR. MINISTRO SIDNEI BENETI (Relator):

1.- CERVECERIA CUAUHTEMOC MOCTEZUMA SOCIEDADE

ANONIMA interpõe Recurso Especial com fundamento nas alíneas "a" e "c", do inciso III, do

artigo 105, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do

Estado do Rio Grande do Sul, Relator o Desembargador MÁRIO JOSÉ GOMES PEREIRA,

assim ementado (fls. 350):

EMBARGOS DE TERCEIRO.

Falta de alegação e consequente prova da posse.

Existência de fraude à execução.

Parecer do MP em primeira instância.

Improcedência dos embargos confirmada.

Apelo IMPROVIDO.

2.- Os Embargos de Declaração interpostos foram rejeitados (fls. 380/386).

3.- A Recorrente sustenta que o Tribunal de origem teria violado o artigo

535 do Código de Processo Civil ao deixar de se manifestar explicitamente sobre os temas

suscitados em embargos de declaração.

Assevera que, no caso, os embargos de terceiro por ela interpostos

deveriam ter sido providos, sob pena de ofensa aos artigos 167, I, 2, e 172, II, 2, da Lei

6.015/73, porque, quando da aquisição do imóvel, não havia qualquer gravame no Registro de

Imóveis. Nesses termos, se não havia gravame na matrícula do imóvel, a sua aquisição teria

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Superior Tribunal de Justiça

sido plenamente regular, não se justificando, assim, possa o bem ser alcançado pelo

Recorrido, na execução que promove contra o alienante.

Acrescenta que o Tribunal de origem não poderia ter negado provimento à

apelação sob a alegação de que a Embargante, ora Recorrente, não comprovou a sua posse

sobre o imóvel, porque essa discussão não foi realizada em primeiro grau de jurisdição nem foi

devolvida no recurso de apelação. Dessa forma estaria configurada ofensa ao 515, § 1º, do

Código de Processo Civil. Quanto ao ponto também sustenta ofensa ao artigo 334, III, do

mesmo diploma, aduzindo que, não tendo a parte contrária arguído a ausência de

comprovação de posse, esse fato teria se tornado incontroverso.

Ainda aponta dissídio jurisprudencial, colacionando precedentes inclusive

desta Corte Superior.

É o relatório.

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Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 1.121.461 - RS (2009/0074155-0)

VOTO

O EXMO SR. MINISTRO SIDNEI BENETI (Relator):

4.- CERVECERIA CUAUHTEMOC MOCTEZUMA SOCIEDADE

ANONIMA opôs embargos de terceiro em face do BANCO DO BRASIL S/A, tendo em

vista a determinação judicial de averbação de hipoteca/penhora na matrícula de imóvel por ela

adquirido (fls. 02/16).

Narra na petição inicial que adquiriu o bem de boa-fé quando não havia

nenhum gravame referenciado no Registro de Imóveis capaz de desautorizar a realização do

negócio jurídico. Sustenta que não houve simulação nem conluio, tendo sido pago o justo

preço pelo bem. Com base nesses argumentos, sustenta que não pode ser atingido pela

execução proposta pelo banco contra o alienante do bem.

5.- O recurso não colhe êxito, como se expõe a seguir.

6.- A sentença julgou improcedentes os embargos, ao entendimento de que

estaria caracterizada fraude à execução, porquanto no momento da alienação do bem a

Embargante já tinha ciência da ação executiva capaz de reduzir o alienante à insolvência (fls.

295/301).

7.- O Tribunal de origem negou provimento ao recurso de apelação da

Embargante, ao entendimento de que a) a Embargante não teria comprovado a posse sobre o

bem, o que seria requisito indispensável nos embargos de terceiro; e b) estaria caracterizada a

fraude à execução, consoante assinalado pela Sentença.

8.- Não se viabiliza o especial pela indicada ausência de prestação

jurisdicional, porquanto a matéria em exame foi devidamente enfrentada, emitindo-se

pronunciamento de forma fundamentada e sem contradições. A jurisprudência desta Casa é

pacífica ao proclamar que, se os fundamentos adotados bastam para justificar o concluído na

decisão, o julgador não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos utilizados pela parte.

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Page 4: Acordão Sobre Fraude a Execução

Superior Tribunal de Justiça

9.- Nos termos da Súmula 375/STJ: "O reconhecimento da fraude à

execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do

terceiro adquirente."

No caso dos autos, o Tribunal de origem entendeu que estava caracterizada

a fraude à execução, porque a Recorrente, quando adquiriu o bem, já tinha ciência do

processo de execução em curso contra o alienante contra o alienante e isso, é o quanto basta,

na linha dos precedentes desta Corte, para que se tenha por caracterizada a "má-fé" ou o

consilium fraudis .

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À EXECUÇÃO. REQUISITOS. SÚMULA Nº 375/STJ. REEXAME DE PROVAS.

INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ.

1. O acórdão recorrido está em harmonia com a jurisprudência desta Corte que se encontra consolidada no sentido de que a simples existência de ação em curso no momento da alienação do bem não é suficiente para evidenciar a fraude à execução, sendo necessário, caso não haja penhora anterior, devidamente registrada, que se prove o conhecimento da referida ação judicial pelo adquirente, para que se possa considerar caracterizada a sua má-fé, bem como o consilium fraudis. Inteligência da Súmula nº 375/STJ.

(AgRg no REsp 1024779/MS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, DJe 20/08/2013);

AGRAVO REGIMENTAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À EXECUÇÃO. TERCEIRO DE BOA-FÉ.

Ante a ausência do registro da penhora, a decretação de fraude à execução depende da prova do conhecimento, por parte do adquirente do imóvel, da existência de ação pendente contra o devedor capaz de reduzi-lo à insolvência (Súmula STJ/375).

(AgRg no Ag 1069714/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/08/2009, DJe 17/08/2009)

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. ALIENAÇÃO DE IMÓVEL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO

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DE QUE O ADQUIRENTE TINHA CIÊNCIA DA DEMANDA EM CURSO. FRAUDE À EXECUÇÃO NÃO CARACTERIZADA. INSOLVÊNCIA DO DEVEDOR. PRESUNÇÃO. DESCABIMENTO.

I - Sem o registro da penhora, o reconhecimento de fraude à execução depende de prova do conhecimento por parte do adquirente do imóvel, de ação pendente contra o devedor capaz de reduzi-lo à insolvência.

(REsp 921.160/RS, Relator o Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, DJ 10.3.08);

Direito civil e processual civil. Execução de título extrajudicial.

Embargos de terceiro. Fraude de execução. Pressupostos. Análise. Embargos de declaração. Presença de omissão.

- “Para caracterização da fraude de execução prevista no art. 593, inc. II, do CPC, ressalvadas as hipóteses de constrição legal, necessária a demonstração de dois requisitos: (i) que ao tempo da alienação/oneração esteja em curso uma ação, com citação válida; (ii) que a alienação/oneração no curso da demanda seja capaz de reduzir o devedor à insolvência” .

- A prova da ciência do adquirente acerca da existência da demanda em curso, incumbe ao credor, a qual é presumida (presunção absoluta) tão-somente na hipótese em que registrada a penhora, nos termos do art. 659, § 4º, do CPC. Precedentes.

- Deve ser declarado nulo o acórdão recorrido para que outro julgamento seja proferido, em obediência ao devido processo legal, quando o Tribunal de origem deixa de apreciar fundamentadamente questões indispensáveis ao irrepreensível deslinde da controvérsia, mesmo que instado a fazê-lo por meio de embargos de declaração.

(REsp 885.618/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, DJ 18.12.07);

PROCESSUAL CIVIL. FRAUDE À EXECUÇÃO. ALIENAÇÃO NA PENDÊNCIA DE EXECUÇÃO. CPC, ART. 593, II, E 659, § 4º. INEXISTÊNCIA DE INSCRIÇÃO DA PENHORA. BOA-FÉ PRESUMIDA DOS TERCEIROS ADQUIRENTES.

I. A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça entende que não basta à automática configuração da fraude à execução a mera existência, anteriormente à venda de imóvel, de ação movida contra o alienante capaz de reduzi-lo à insolvência, somente

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admitindo tal situação quando já tivesse, então, havido a inscrição da penhora no cartório competente (art. 659, § 4º, do CPC).

(REsp 943.591/PR, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, DJ 8.10.07);

PROCESSUAL CIVIL. FRAUDE À EXECUÇÃO. REQUISITOS.

1 - Conforme entendimento majoritário do Superior Tribunal Justiça, no casos em que não há penhora registrada, conforme ocorre na espécie, somente se reconhece a existência de fraude à execução se o credor provar que o terceiro, o adquirente do imóvel, estava também de má-fé, ou seja, que ele, ao tempo da alienação, sabia, assim como o devedor (alienante), da existência do processo de execução e da situação de insolvência.

2 - Presume-se, nesse caso, a boa-fé do terceiro (adquirente), ficando a cargo do credor o ônus de provar o contrário, vale dizer, a má-fé.

3 - Recurso especial conhecido e provido para julgar procedentes os embargos de terceiro.

(REsp 647.176/DF, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, DJ 13.3.06).

10.- Nesse termos, mantido o acórdão recorrido no tocante ao

reconhecimento da fraude à execução, fica prejudicado o exame do Recurso Especial no

tocante à alegação de ofensa aos artigos 334 e 515, § 1º, do Código de Processo Civil; 167,

I, 2, e 172, II, 2, da Lei 6.015/73. Da mesma forma fica prejudicado o exame do recurso

especial no tocante ao dissídio jurisprudencial suscitado relativamente aos temas em questão.

11.- Ante o exposto, nega-se provimento ao Recurso Especial.

Ministro SIDNEI BENETIRelator

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