acidente radiológico de goiânia

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Acidente radiolgico de Goinia (Csio 137) - Sentena criminal do Juiz Federal Juliano Taveira Bernardes Num sentena de 46 folhas, o juiz federal substituto Juliano Taveira Bernardes, da 8 Vara em Gois, analisou todos os fatos relacionados ao maior acidente radiolgico do mundo: o vazamento de csio 137, ocorrido em setembro de 1987, em Goinia. A deciso condena os responsveis a pagar R$ 1,3 milho para Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. A Comisso Nacional de Energia Nuclear (CNEN), o Instituto de Previdncia e Assistncia dos Servidores do Estado de Gois (IPASGO), o mdico Amaurillo Monteiro de Oliveira e o fsico hospitalar Flamarion Barbosa Goulart, foram condenados pelos danos ambientais ocorridos por causa do acidente com o csio 137. A sentena, proferida em ao civil pblica proposta h quatro anos e seis meses pelo Ministrio Pblico Federal (MPF), em parceria com MP estadual, exclui da relao de rus os mdicos Carlos de Figueiredo Bezerril, Orlando Alves Teixeira e Criseide Castro Dourado, bem como a Unio e o Estado de Gois. A CNEN foi condenada a recolher R$ 1 milho para o Fundo de Defesa de Direitos Difusos, e o IPASGO, o mdico e o fsico a recolher R$ 100 mil cada um para o mesmo Fundo, tudo com juros e correo monetria. O vazamento de csio 137 vitimou, de imediato, quatro pessoas, entre elas, uma menina de seis anos. A morte de pelo menos outras trs pessoas contaminadas diretamente pela bomba do material radioativo tambm est relacionada com o acidente. A contaminao radiolgica tambm foi responsvel por leses graves e problemas de sade em dezenas de vtimas. Alm do recolhimento de R$ 1 milho, a CNEN foi condenada a garantir atendimento mdico-hospitalar, tcnico-cientfico, odontolgico e psicolgico s vtimas diretas e indiretas, reconhecidamente atingidas, at a 3 gerao; viabilizar o transporte das vtimas em estado mais grave para a realizao de exames, caso necessrio; prosseguir o acompanhamento mdico da populao de Abadia de Gois, vizinha do depsito provisrio de rejeitos radioativos, bem como a prestar eventual atendimento mdico, em caso de contaminao. O rgo federal tambm ter de efetivar um sistema peridico de notificao epidemiolgica sobre cncer, e auxiliar e contribuir, no que for necessrio, com o trabalho de monitoramento epidemiolgico permanente da populao de Goinia, atualmente realizado pela Secretaria de Sade do Estado de Gois. No caso de interrupo desse monitoramento por parte do Estado, fica a CNEN condenada a efetiv-lo individualmente, e manter, em Goinia, um centro de atendimento permanente de fsicos e mdicos especializados, caso a prestao desse servios venha a ser interrompida por parte do IPASGO e do Estado de Gois. ( Quadro de Avisos Aviso n 219, de 28.03.2000). Eis a sentena, na ntegra : SENTENA I RELATRIO Trata-se de ao civil pblica proposta em 27/09/95 pelo MINISTRIO PBLICO FEDERAL (MPF), em litisconsrcio ativo facultativo com o MINISTRIO PBLICO ESTADUAL (MPE), com base em inqurito civil pblico instaurado em razo do acidente radiolgico com a bomba de Csio 137, ocorrido nesta Capital, no ms de setembro de 1987. Pela petio de fls. 02/29, aps defenderem a viabilidade da formao de litisconsrcio ativo entre o MPF e o MPE, bem como a legitimidade do Ministrio Pblico para propositura de ao civil pblica que vise reparao de danos causados ao meio ambiente, os Autores narraram, resumidamente, os seguintes fatos. Em 1972, o INSTITUTO GOIANO DE RADIOTERAPIA - IGR, ento com sede na Avenida Paranaba, n 1.587, Setor Central, nesta Capital, devidamente autorizado pela COMISSO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR, ESTADO DE GOIS - CNEN, adquiriu em So Paulo-SP uma bomba de Csio 137, de fabricao italiana, a fim de utiliz-la na prestao de servios radiolgicos. O terreno em que funcionava o IGR era pertencente Santa Casa de Misericrdia, que o vendeu ao INSTITUTO DE PREVIDNCIA E ASSISTNCIA SOCIAL DO ESTADO DE GOIS - IPASGO. Ento, pressionado a deixar o aludido local, o IGR transferiu sua sede a outro endereo, terminando por abandonar no antigo prdio a j obsoleta bomba de Csio 137, sem ao menos comunicar o fato CNEN ou Secretaria Estadual de Sade. Em 04/05/87, iniciou-se a demolio da construo, a mando do ex-scio do IGR, AMAURILLO MONTEIRO DE OLIVEIRA, culminando com a destruio quase total do prdio original, que o deixou sem telhado, portas ou janelas, a despeito da existncia no local, sem quaisquer avisos ou advertncias, da mencionada bomba de Csio 137. No dia 13/09/87, dois catadores de papel adentraram os escombros e levaram consigo, entre outros objetos, a bomba abandonada. Seqencialmente, o objeto radioativo foi partido em duas peas, uma maior, pesando 300 quilos, e outra de 120 quilogramas. A pea menor foi transportada at a casa de ROBERTO SANTOS ALVES, onde foi violada base de marretadas, at atingir-se a janela de irdio, dentro da qual estava armazenada a substncia radioativa. No dia 14/09/87, outras duas pessoas foram at os escombros da antiga sede do IGR e de l levaram a pea maior, posteriormente vendida ao "ferro velho" de propriedade de DEVAIR ALVES FERREIRA, que a depositou na sala de sua residncia. Em seguida, noticia detalhadamente a exordial os captulos do famoso acidente radioativo, agravado pela curiosidade e fascnio despertados pela colorao reluzente da fonte de Csio 137. Conta tambm as providncias tomadas pelas autoridades locais e federais, o atendimento das vtimas contaminadas, assim como o falecimento de quatro delas. Narra a inicial, ainda, a remoo de 14 toneladas de detritos contaminados cidade de Abadia de Gois-GO, onde foi erguido um depsito provisrio para o material radioativo, em local situado a menos de 20 km do centro de Goinia-GO.

Prossegue a preambular dizendo que o ESTADO DE GOIS instituiu a FUNDAO ESTADUAL LEIDE DAS NEVES com a finalidade de amparar as vtimas do acidente. Lembra a edio de lei estadual concedendo penso vitalcia a 118 pessoas, cujos valores tornaram-se mdicos em razo da perda inflacionria. Conclui a narrao dos fatos apontando a situao miservel das vtimas, assim como a condenao penal, em 1 grau, dos proprietrios do IGR (CARLOS DE FIGUEIREDO BEZERRIL, CRISEIDE CASTRO DOURADO, ORLANDO ALVES TEIXEIRA), bem como do fsico responsvel pelo manuseio da bomba de Csio 137, FLAMARION BARBOSA GOULART. Dessarte, com base no art. 37, 6 da CF/88 e art. 14, 1, da Lei 6.938/81, a inicial pleiteia a responsabilizao civil: a) da UNIO FEDERAL, posto que titular do monoplio da explorao dos materiais nucleares e seus derivados; b) da CNEN, cujas atribuies relativas ao poder de polcia e controle dos materiais radioativos no foram preventivamente exercidas; c) do ESTADO DE GOIS, a quem competia a fiscalizao das unidades hospitalares; d) do IPASGO, proprietrio do terreno em que se situava o antigo edifcio do IGR, por no haver promovido as medidas necessrias vigilncia do local, at a remoo dos equipamentos ali abandonados; e) dos demais Rus, mdicos proprietrios do IGR e fsico supervisor da manipulao do material relativo, pela inobservncia das regras afetas respectiva licena de utilizao do aparelho radiolgico. Ao final, foram formulados os pedidos seguintes: A) de INDENIZAO, em face: A.1) da UNIO FEDERAL, com a condenao ao pagamento de R$ 2.000.000,00 ao Fundo Estadual do Meio Ambiente; A.2) da CNEN, pela falta de fiscalizao e controle preventivo, com a condenao ao pagamento da importncia de R$ 1.000.000,00 a ser revertida ao Fundo Estadual do Meio Ambiente; A.3) dos Rus CARLOS DE FIGUEIREDO BEZERRIL, CRISEIDE CASTRO DOURADO, ORLANDO ALVES TEIXEIRA e FLAMARION BARBOSA GOULART, proprietrios e fsico do Instituto Goiano de Radioterapia - IGR, com a condenao ao pagamento individual de R$ 100.000,00, destinados ao Fundo Estadual do Meio Ambiente; A.4) do ESTADO DE GOIS, com a condenao ao pagamento de R$ 100.000,00 ao Fundo Estadual do Meio Ambiente; A.5) do IPASGO - INSTITUTO DE PREVIDNCIA E ASSISTNCIA SOCIAL DO ESTADO DE GOIS, com a condenao ao pagamento de outros R$ 100.000,00, a serem revertidos ao Fundo Estadual do Meio Ambiente; B) de cominao das seguintes OBRIGAES DE FAZER: B.1) de forma concorrente, em face da UNIO FEDERAL, ESTADO DE GOIS e CNEN: B.1.1) garantir o atendimento mdico-hospitalar, tcnico-cientfico, odontolgico, psicolgico s vtimas diretas e indiretas, reconhecidamente atingidas, at a 3 gerao; B.1.2) novo recadastramento, feito em conjunto com tcnicos e cientistas da FUNLEIDE e CNEN, das vtimas potencialmente atingidas, para fins de recebimento de tratamento e penso vitalcia; B.1.3) viabilizar o transporte das vtimas em estado mais grave (do Grupo I), para a realizao dos exames necessrios; B.1.4) elaborar, em regime de urgncia, programa especial que atenda s necessidades bio-psquicas, educacionais e sociais das crianas contaminadas; B.1.5) promover o acompanhamento da populao de Abadia de Gois, vizinha do depsito provisrio de rejeitos radioativos oriundos do acidente com o Csio 137, bem como prestar eventual atendimento mdico, em caso de contaminao; B.1.6) fazer publicar, trimestralmente, no Dirio Oficial da Unio e no Dirio Oficial do Estado de Gois, a relao completa dos materiais radioativos existentes no Estado de Gois, apontando sua localizao; B.1.7) criao de banco de dados de morbi-mortalidade populacional por cncer, a partir da data do acidente (13/09/1987); B.1.8) efetivar sistema de notificao epidemiolgica sobre cncer, em carter permanente; B.1.9) proceder ao monitoramento epidemiolgico permanente da populao de Goinia.

B.2) em face da CNEN, a: B.2.1) manter, em carter definitivo, nesta Capital, um centro de atendimento para as vtimas do Csio 137, com a assistncia permanente de fsicos e mdicos especializados; B.2.2) promover, periodicamente, o monitoramento ambiental de Goinia, principalmente da rea mais prxima ao local do acidente radiolgico, devendo encaminhar relatrios Secretaria de Estado da Sade do Estado de Gois e aos Ministrios Pblicos Federal e Estadual. B.3) em face do ESTADO DE GOIS, a: B.3.1) efetuar o pagamento das penses vitalcias, j institudas por lei estadual, em valores jamais inferiores ao salrio mnimo vigente no pas, e na mesma poca do pagamento do funcionalismo pblico; B.3.2) autorizar, imediatamente, a transferncia dos imveis adquiridos pelo ESTADO DE GOIS e repassados Fundao Leide das Neves, a fim de serem registrados em nome das vtimas, as quais na posse dos mesmos j se encontram; B.3.3) promover, paralelamente CNEN, monitoramento ambiental da cidade de Goinia e dos locais prximos aos focos de contaminao, por intermdio da fundao estadual que cuida do meio ambiente (FEMAGO). A inicial veio acompanhada de grande quantidade de documentos coligidos pelo Inqurito Civil Pblico n 07/92, instaurado pelo Ministrio Pblico Estadual, em parceria com o Ministrio Pblico Federal (fl. 47 a fl. 5.615, vol. 19). s fls. 31/39, o Ministrio Pblico Estadual foi excludo do feito, em deciso que acarretou a interposio do agravo certificado s fls. 5.663/5.664. Emendada a preambular s fls. 5.619/5.621, incluiu-se no plo passivo AMAURILLO MONTEIRO DE OLIVEIRA, responsabilizado por haver determinado a demolio do prdio, sem a cautela devida. Contra esse novo Ru, foi formulado pedido de condenao ao pagamento de indenizao de R$100.000,00, sem referncia ao destino da quantia. Foram citados todos os Rus. Contestao de AMAURILLO MONTEIRO DE OLIVEIRA s fls. 5.666/5.675, aduzindo, preliminarmente: a) a inpcia da petio inicial, diante da "incompatibilidade lgica entre a causa de pedir e o pedido" (fl. 5.667); b) sua ilegitimidade passiva, pois o MPF no teria "ttulo em relao ao interesse que pretende seja titulado" (fl. 5.670). No mrito, afirmou: a) que no tinha o dever de vigilncia, pois na poca do acidente no era nem proprietrio nem possuidor do imvel em que a bomba de csio foi deixada; d) a ausncia de nexo de causalidade, eis "que no exercitou nenhuma conduta capaz de provocar dano ao autor" (fl. 5.674). CARLOS DE FIGUEIREDO BEZERRIL e CRISEIDE CASTRO DOURADO apresentaram contestao s fls. 5.678/5.682, asseverando: a) no possurem legitimidade passiva, haja vista que a bomba de csio era da propriedade do INSTITUTO GOIANO DE RADIOTERAPIA, pessoa jurdica distinta da de seus scios; b) que, quando ocorreu o acidente, o IGR no estava na posse do imvel onde se localizava a cpsula de csio; c) ilegitimidade ativa do Ministrio Pblico, tendo em vista que a inicial limitou-se a noticiar danos individuais; d) ausncia de interesse de agir, porquanto as pessoas prejudicadas j foram indenizadas pelo ESTADO DE GOIS; e) a inaplicao da responsabilidade objetiva prevista na Lei 6.453/77, porque os eventos danosos ocorreram fora de instalaes nucleares; f) que a mera falta de observncia de normas regulamentares no acarreta a responsabilizao civil; g) que o evento ocorreu nica e exclusivamente por culpa das supostas vtimas, a partir de conduta penalmente tipificada como furto da bomba de Csio 137; h) no ter havido dano ecolgico. Contestao da UNIO FEDERAL juntada s fls. 5.694/5.704, pela qual alega, em sntese: a) sua ilegitimidade passiva, tendo em vista que o monoplio da explorao nuclear foi delegado a uma autarquia dotada de personalidade jurdica prpria; b) a prescrio do direito de ao, nos termos do Decreto 20.910/32; c) a inexistncia de danos ambientais atuais a serem indenizados; d) impropriedade da reverso da pretendida indenizao ao Fundo Estadual, em razo da criao do Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD) pelo Decreto 1.306/94; e) que as pretendidas obrigaes de fazer j esto sendo adotadas espontaneamente. FLAMARION BARBOSA GOULART, folha 5.706, limitou-se a ratificar a contestao de CRISEIDE DE CASTRO e CARLOS BEZERRIL. De sua vez, o IPASGO - INSTITUTO DE PREVIDNCIA E ASSISTNCIA SOCIAL DO ESTADO DE GOIS defendeu-se s fls. 5.709/5.713, afirmando: a) a inpcia da petio inicial, por ausncia de indicao do motivo do pedido indenizatrio e de sua parcela de culpa no acidente; b) que no pode ser considerado culpado pelo evento por haver apenas adquirido a rea em que foi abandonada a bomba de csio; c) que o pedido de indenizao foi arbitrado de forma aleatria, sem nenhum parmetro. A CNEN - COMISSO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR, na contestao de fls. 5.726/5.733, apontou sua ilegitimidade passiva, dizendo no ser responsvel pela fiscalizao do exerccio de profisses, ocupaes e locais que utilizem esses materiais e

substncias, eis que suas atribuies abrangem somente a fiscalizao do comrcio de radioistopos artificiais e substncias radioativas. Contestao do ESTADO DE GOIS s fls. 5.738/5.762. Sustentou: a) sua ilegitimidade passiva, pois no tem "nenhuma responsabilidade no traumtico acidente" (fl. 5.740), bem como por no ser detentor do monoplio constitucional da explorao dos recursos radioativos; b) a ilegitimidade ativa e a inocorrncia de interesse de agir por parte do Ministrio Pblico, diante da ausncia de norma expressa de direito substantivo que autorize a utilizao da ao civil pblica; c) a fluncia da prescrio qinqenria; d) a ausncia de prova do dano ambiental; e) que a quantificao do pedido de indenizao pecuniria no seguiu qualquer parmetro ftico ou legal; f) que continua tomando providncias com vistas preservao do equilbrio do ecossistema; g) que as obrigaes de fazer pretendidas j foram todas cumpridas espontaneamente. ORLANDO ALVES TEIXEIRA quedou-se inerte. Rplica do MPF s fls. 5.764/5.781. Na fase de especificao de provas, a UNIO aduziu a perda do objeto da ao (fls. 5.785/5.788 e 5.811/5.815); o MPF rebateu a alegao da UNIO, requerendo o julgamento antecipado da lide, salientando ainda a condenao criminal dos mdicos proprietrios do IGR e do fsico (fls. 5.803/5.806); a CNEN pediu a produo de prova testemunhal (fls. 5.817 e 5.823). Os demais Rus no se manifestaram. s fls. 5.827/5.836 consta deciso saneadora proferida pelo Juiz Federal Urbano Leal Berqu Neto, ilustre titular desta 8 Vara, pela qual: 1) foram rejeitadas as preliminares de inpcia da inicial fundadas em ofensa aos arts. 282, inciso III, e 295, nico, inciso II, ambos do CPC, e na ausncia da descrio da ao, do dano e do nexo causal, argidas pelo Ru AMAURILO MONTEIRO DE OLIVEIRA; 2) foram repelidas as preliminares argidas pelos Rus CRISEIDE DE CASTRO DOURADO, CARLOS DE FIGUEIREDO BEZERRIL e FLAMARION BARBOSA GOULART; 3) foi mantida a UNIO na demanda; 4) remeteu-se a discusso da tese da prescrio para o exame do mrito; 5) foram rebatidas as preliminares de inpcia da inicial, suscitadas pelo IPASGO, e de ilegitimidade passiva ad causam, levantada pela CNEN; 6) indeferiu-se a produo de prova testemunhal requerida pela CNEN, ao fundamento de que desnecessria em face da possibilidade de se provar documentalmente todos os fatos alegados. Pela mesma deciso, restaram desconsideradas, de plano, os seguintes pedidos de imposio de obrigaes de fazer: a) em face da CNEN, de publicar trimestralmente relao de materiais radioativos existentes no Estado de Gois e sua localizao; e b) em relao FEMAGO, de promover, paralelamente CNEN, monitoramento ambiental. Dessa deciso foram interpostos os agravos de fls. 5.840 e 5.843/5.847. Atendendo s diligncias solicitadas na deciso saneadora, a UNIO FEDERAL e o ESTADO DE GOIS colacionaram aos autos documentos comprobatrios do pagamento de penses s vtimas (fls. 5.851/6.425 e 6.438/6.521), conforme determinado, respectivamente, pela Lei 9.425/96 e Lei estadual 10.977/89. s fls. 6.550/6.563, anexou a FUNDAO LEIDE DAS NEVES relatrio alusivo aos servios prestados s vtimas do acidente, alm de juntar documentos relativos doao de imveis a algumas delas (fls. 6.554/6.563). s fls. 6.568/6.570, o IPASGO informa que vem prestando gratuitamente todos os atendimentos mdicos necessrios s vtimas. folha 6.587-verso, a Oficiala de Justia Rosa Nina Mathias de Azevedo certificou que o Governo de Gois extinguiu a FUNDAO LEIDE DAS NEVES. Fls. 6.595/6.647: fichas de atendimento mdico das vtimas. Manifestao final do MPF, requerendo o julgamento antecipado da lide (fls. 6.572/6.580). o necessrio relatrio. II FUNDAMENTAO A despeito do ingresso de novos documentos aos autos por parte de alguns dos Rus, afigura-se-me desnecessria nova abertura de vista, seja porque sobre as novas peas j se manifestou a parte contrria (MPF), conforme reza o dispositivo do art. 398 do CPC, seja diante de sua irrelevncia em face dos integrantes do plo passivo. A) Preliminarmente As preliminares suscitadas pelos Rus, atinentes inpcia da inicial e ilegitimidade passiva, j foram rebatidas na deciso saneadora de fls. 5.827/5.836, o que dispensaria, nos termos do art. 471 do CPC, nova apreciao judicial. Contudo, algumas questes de ordem pblica merecem ser reagitadas (art. 267, 3, do CPC).

A.1) Dos pedidos de indenizao em dinheiro Consoante l-se s fls. 26/27, a exordial veicula pedidos de condenao ao pagamento de quantia certa a serem revertidos ao Fundo Estadual do Meio Ambiente. Acontece que, nos termos do art. 13 da Lei 7.437/85, regulamentado pelo Decreto 1.306/94, a correta interpretao do pedido faz com que o destino das quantias provenientes da eventual condenao seja o FUNDO DE DEFESA DE DIREITOS DIFUSOS, ainda que no haja pedido expresso nesse sentido, como aconteceu com o Ru AMAURILLO MONTEIRO DE OLIVEIRA. Ressalto que a correo dessa deficincia da inicial resume-se a aspectos meramente acidentais do pedido (fundo ao qual sero revertidos os valores). Desse modo, em caso de procedncia do pleito, a sentena no poder ser taxada de extra petita, pois a violao ao art. 460 do CPC pressupe alterao do pedido em face de sua original natureza (mantida condenatria), quantidade (tambm inalterada) ou objeto (que remanesce como de entrega de quantia certa). Ao lado dessas alegaes, defendeu o plo passivo que os valores pleiteados no seguiram qualquer critrio de apurao. De fato, no se preocupou o MPF em mensurar individualmente ou dividir quantitativamente os valores a serem revertidos ao Fundo aludido. No obstante, em se tratando de ao de indenizao por ato ilcito, atenuada a aplicao do par. nico do art. 459 do CPC, pois "o valor estipulado na inicial, como estimativa da indenizao pleiteada, necessariamente, no constitui certeza do quantum a ressarcir, vez que a obrigao do ru, causador do dano, de valor abstrato, que depende, quase sempre, de estimativas e de arbitramento judicial." (STJ, 3 Turma, REsp 136.588/RJ, Rel. Min. WALDEMAR ZVEITER, DJU de 01/06/98., p. 85). Da porque a pretendida irregularidade poderia ser afastada em liqidao de sentena por arbitramento (art. 1.553 do CC e art. 606 do CPC). Pois bem. Ocorre que as quantias despendidas no combate aos efeitos da radiao so notria (art. 334, I, do CPC) e infinitamente superiores soma das verbas pretendidas na presente ao, o que dispensa a eleio de critrio exato. Para ilustrar, somente aps 1991, para a construo do depsito definitivo, foram alocados recursos da ordem de 12,5 milhes de reais (fls. 5.811/5.815). Ao lado disso, a imputao da responsabilidade aos figurantes do plo passivo deu-se na forma solidria (CC, art. 1.518), em que cada um deles poderia ser acionado pela integralidade do valor do dano (art. 904 do CC). Dessarte, dessume-se que a pretensa falta de critrios na formulao do pedido ressarcitrio veio em benefcio dos Rus, o que torna a alegao infrutfera por falta de prejudicialidade (art. 250, par. nico, do CPC). A.2) Dos pedidos de cominao de obrigao de fazer Dessume-se da inicial uma extensa lista de pedidos de cominao de obrigao de fazer. Parte deles mereceu as seguintes consideraes feitas pelo eminente Juiz Federal Urbano Leal Berqu Neto, ao enfocar a contestao da UNIO FEDERAL, quando da deciso saneadora: "Ao compulsar a vestibular, no pedido, alm das indenizaes destinadas a um do fundo para a reconstituio do ambiente lesado, h obrigao de fazer. Em relao a essas obrigaes, adiante mencionadas, nota-se que j foram ou esto, as de carter permanente, sendo cumpridas desde a poca da malsinada ocorrncia, conforme fazem prova, alm da documentao juntada com a inicial, a petio e dos documentos juntados pela Unio (fls. 5.785/5.801) e pela CNEN (fls. 5.811/5.815), nos seguintes moldes: a) quanto a condenao concorrente da Unio, CNEN e Estado de Gois a: a.1- garantir o atendimento mdico-hospitalar, tcnico-cientfico, odontolgico e psicolgico s vtimas diretas e indiretas, reconhecidamente atingidas, at a 3 gerao; O atendimento vem sendo prestado pela Unio atravs da CNEN, e pelo Estado de Gois, atravs da Fundao Leide das Neves (fls. 5.798, I). Essa afirmao corroborada pelos inmeros documentos da Funleide que comprovam estar, as vtimas, recebendo toda assistncia mdica, odontolgica, hospitalar etc. (Volumes 15 a 19). a.2- recadastramento das vtimas para fins de tratamento e penso vitalcia; Foram efetuados, ainda, um recadastramento em 1988 e outro, posteriormente, em meados de 1996/97 (fls. 5.798, II).

Cumprida, portanto, tal obrigao. a.3- viabilizar o transporte das vtimas do grupo I para a realizao dos exames necessrios; Desde o incio foi providenciado o transporte das vtimas (fls. 5.798, III), inclusive via area, quando necessrio, o que corroborado pela anlise da documentao presente nos volumes 15 a 19, que tratam da Funleide. a.4- elaborar programa especial para as crianas contaminadas: A assistncia especial s crianas j vem sendo prestadas, tendo como responsvel pelo atendimento peditrico um mdico com mestrado em Hiroshima alm das crianas terem acompanhamento documentado desde a poca fetal (fls. 5.798, IV). a.5- promover o acompanhamento da populao de Abadia de Gois, vizinha do depsito provisrio de rejeitos radioativos (hoje depsito definitivo), bem como prestar eventual atendimento mdico em caso de contaminao; Conforme as informaes prestadas s fls. 5.811/5.815, a CNEN vem "mantendo um quadro de 20 (vinte) servidores pblicos diretamente envolvidos no Apoio Logstico e na Segurana Radiolgica das reas da cidade de Goinia, devolvidas comunidade em total condies de habitabilidade, e da rea do Depsito de Rejeitos em Abadia de Gois". Mantm, tambm, um "Laboratrio de Monitorao Ambiental que acompanha, em conjunto com outros Institutos da CNEN, na regio sudeste, as anlises de amostras ambientais, tanto da cidade de Goinia, quanto do depsito de Rejeitos em Abadia." A CNEN firmou o Convnio 010, em 23.08.91, com o Governo do Estado de Gois, "que repassa recursos federais para todas as atividades relativas a soluo para os rejeitos gerados no ocidente" tendo como exemplo as aes elencadas nas fls. 5.811/5.814. Ao final, demonstra que forma gastos pela Unio, atravs da CNEN, aproximadamente, 8,5 milhes de reais, sendo que o gasto efetuado pelo Estado de Gois aproxima-se de 4.0 milhes de reais. Alm disso, o prazo previsto para o acompanhamento da CNEN de 50 anos. a.6- publicar trimestralmente, no D.O.U. e no D.O. de Gois a relao completa dos materiais radioativos existentes no Estado de Gois e sua localizao; Providncia invivel. A uma, porque os assuntos nucleares, radioativos etc, dizem respeito a segurana nacional e, por isso, devem ser preservados de publicidade. A duas, porque tal publicidade poder ocasionar efeito inverso ao pretendido, como, por exemplo, tentativas de furto ou roubo de equipamentos, atentados etc. a.7 - criao de banco de dados de morbimortalidade populacional por Cncer, a partir da data do acidente (13.09.87); Tal banco de dados j existe em conjunto com a Associao de Combate ao Cncer/Hospital Arajo Jorge (fls. 5.798, VI). a.8- efetivar, em carter permanente, sistema de notificao e monitoramento epidemiolgico sobre Cncer, da populao de Goinia; Esses servios j so realizados pela Secretaria de Sade do Estado de Gois (fls. 5.799, VII). b) quanto CNEN, isoladamente: b.1- manter, em carter definitivo, nesta Capital, um Centro de Atendimento para as vtimas, com assistncia permanente de fsicos e mdicos especializados; Esse centro de assistncia, com mdicos especializados j existe na Fundao Leide das Neves, que tem suporte tcnico e auxlio, sempre que necessrio, dos profissionais da CNEN, como acima demonstrado. Da, a criao de outro seria, como , despicienda. b.2- promover, periodicamente, o monitoramento ambiental da Goinia, principalmente da rea mais prxima ao local do acidente, encaminhando relatrios Secretaria de Estado da Sade do Estado de Gois e aos Ministrios Pblicos Federal e Estadual. A CNEN j tem um estabelecimento prprio, vizinho a rea do depsito definitivo dos rejeitos do acidente radioativo no Municpio de Abadia de Gois e que j monitora constantemente as reas atingidas (e ainda o far por quase 40 anos) (fls. 5.800).

Quanto cidade de Goinia, inmeros relatrios constantes do bojo dos presentes autos e amplamente noticiados pela mdia demonstraram que o nvel de radiao pro Csio-137 est absolutamente dentro dos limites aceitveis, no oferencendo qualquer risco sade. Alm disso, fica ressalvada, a qualquer das entidades comprovadamente interessadas, inclusive o prprio Ministrio Pblico Federal, a possibilidade de solicitar, a qualquer tempo, que a CNEN faa uma averiguao desses nveis de radioatividade." (Fls. 5.830/5.833). Porm, na parte dispositiva da deciso saneadora, foram expressamente repelidos somente os seguintes pedidos de imposio de obrigaes de fazer: a) em face da CNEN, de publicar trimestralmente relao de materiais radioativos existentes no Estado de Gois e sua localizao; e b) em relao FEMAGO, de promover, paralelamente CNEN, monitoramento ambiental (fls. 5.835/5.836). Dessarte, por entender no operada a precluso pro iudicato em relao aos pedidos que no foram alvo de afastamento expresso (cf., analogicamente, o art. 469, I, do CPC), possvel agora reanalisar a perda de objeto de alguns deles. Nesse prumo, aproveitando a numerao e a fundamentao expostas na deciso saneadora acima transcrita, estou em que, alm dos expressamente excludos, restaram prejudicados somente os pedidos a.2 (recadastramento das vtimas para fins de tratamento e penso vitalcia); a.4 (elaborar programa especial para as crianas contaminadas); a.7 (criao de banco de dados de morbimortalidade populacional por Cncer, a partir da data do acidente); e b.2 (promover, periodicamente, o monitoramento ambiental da Goinia, principalmente da rea mais prxima ao local do acidente, encaminhando relatrios Secretaria de Estado da Sade do Estado de Gois e aos Ministrios Pblicos Federal e Estadual). A prejudicialidade desse ltimo pedido justifica-se porque j verificada a normalidade dos nveis de radiao em Goinia, enquanto a medio da rea prxima ao depsito, por parte da CNEN, imperativo contido no Convnio n 10, de 23/08/91, firmado com o Estado de Gois, que prev a consecuo da tarefa pelos prximos 50 anos (cf. ofcio de fls. 5.811/5.815). O restante das cominaes pleiteadas envolvem obrigaes de fazer de trato sucessivo, motivo pelo qual passveis de interrupo no futuro. Assim, abstratamente, no podem ser desconsideradas pela sentena. Exemplo disso pedido de realizao de monitoramento epidemiolgico permanente da populao de Goinia, atualmente efetivado pela Secretaria de Sade do Estado de Gois, conforme noticiado folha 5.799, item VII. No caso de interrupo desse monitoramento por parte do Estado de Gois, conforme pleiteado, a CNEN poder ser condenada a efetiv-lo individualmente. De outra banda, vejo que mesmo alguns pedidos sujeitos a condio, como pedido de condenao prestao de eventual atendimento mdico da populao de Abadia de Gois, em caso de contaminao, podem ser conhecidos, nos termos da regra prevista no art. 460, par. nico, do CPC. Foi formulado, tambm, pedido contra a CNEN tendente manuteno, em carter definitivo, nesta Capital, de um centro de atendimento para as vtimas do Csio 137, com a assistncia permanente de fsicos e mdicos especializados. Essa assistncia vinha sendo prestada pela recentemente extinta FUNLEIDE, mediante a cobertura de benefcios do IPASGO (cf. fl. 5.798, item I). Nada indica que o servio ser interrompido por parte do IPASGO e do Estado de Gois, sucessor da FUNLEIDE, mas ainda assim existiria interesse processual na fixao desta obrigao na sentena final, se procedente a pretenso. Examinados, ento, os pedidos remanescentes, vejo que pelo que devem ser mantidos. De fato, guardam eles inegvel pertinncia e proporcionalidade em relao funo de reparao, preservao e preveno do meio ambiente, bem assim da sade das vtimas envolvidas, conforme vocacionada a ao civil pblica (art. 1, I, da Lei 7.347/85). A.2.1) Dos pedidos de transferncia de imveis adquiridos pelo Estado de Gois a algumas das vtimas e de pagamento de enses vitalcias em valores jamais inferiores ao salrio mnimo vigente: ILEGITIMIDADE ATIVA DO MPF Sem embargo, entre os pedidos formulados na preambular est o de cominao da obrigao de transferncia dos imveis constantes da Lei estadual 11.375, de 26/12/90 (cpia folha 5.793), s seguintes vtimas: IVO ALVES FERREIRA, ODESSON ALVES FERREIRA, EUNICE ALVES DOS SANTOS e GERALDO GUILHERME DA SILVA. Aqui, ressalto que a instruo processual revelou que somente pende de outorga e registro a escritura de doao de imvel em favor de EUNICE ALVES DOS SANTOS (cf. ofcio de fls. 6.550/3 e certides de fls. 6.654/63). Ao lado desse, foi tambm formulado pedido de condenao do ESTADO DE GOIS ao pagamento, em valores nunca inferiores a um salrio mnimo, das penses vitalcias institudas em favor das vtimas do Csio 137 pela Lei estadual 10.977, de 03/10/89. (1) Dessarte, vejo que referidas solicitaes encampam interesses de ntida ndole individual disponvel, ainda que homognea.

Contudo, nos termos dos artigos 127 e 129, IX, da CF/88, e, mais exatamente, do art. 6, XVI, g, da Lei Complementar 75/93, a legitimidade do MPF promoo de aes em defesa do meio ambiente est limitada, em matria de interesses individuais, queles de conotao indisponvel. Releva aqui dizer no ser caso de ao civil ex delicto, excepcional hiptese de inconstitucionalidade progressiva em que se entende ainda constitucional a norma do art. 68 do CPP, enquanto no institudos os rgos de defensoria pblica, mesmo em face dos arts. 127, 129, XI e 134 da CF/88 (STF: RE 135.328/SP, Rel. Min. MARCO AURLIO, DJU de 01/08/94, RE 147.776/SP, Rel. Min. SEPLVEDA PERTENCE, DJU de 19/06/98, p. 136; STJ, REsp 66.982/SP, Rel. Min. SLVIO FIGUEIREDO, DJU de 24/03/97, p. 9.022). Com efeito, a ao civil pblica ambiental no est vocacionada defesa de interesses individuais disponveis, por mais comovente possa ser a situao dos eventuais beneficirios com a substituio processual. De conseguinte, em relao aos pedidos epigrafados, reconheo a ilegitimidade ativa do Ministrio Pblico Federal. A.3) Da legitimidade passiva da CNEN e da ilegitimidade passiva da Unio Federal De incio, necessrio identificar sob quais fundamentos atribui o MPF a responsabilidade civil pelo acidente UNIO e CNEN. Assim, compulsando a preambular, infere-se que as causas de pedir da ao sustentam, respectivamente, a legitimidade passiva da UNIO, em razo do monoplio que exerce sobre as atividades nucleares, bem como da CNEN, tendo em mente o poder de polcia do controle dos materiais radioativos. Nessa perspectiva, passo a analisar a questo da pertinncia passiva. Com efeito, nos termos da Lei 4.118/62, foi institudo o monoplio da Unio Federal sobre o comrcio dos radioistopos artificiais, entre os quais insere-se a substncia contida na bomba de Csio 137, assim como criada a COMISSO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR - CNEN. De sua vez, o Decreto-Lei 1.982/82 deixou claro que as atividades alusivas ao monoplio institudo pela Lei 4.118/62 foram repassadas, com exclusividade, CNEN e NUCLEBRS, ressalvado o que prescreve artigo 10 da Lei n 6.189/74 (autorizao para construo de usinas termonucleares, da competncia da ELETROBRS), ficando a cargo da Unio, to-somente, o desenvolvimento de pesquisas no campo da energia nuclear (art. 2): "Art. 1 O exerccio das atividades nucleares includas no monoplio institudo pelo artigo 1 da Lei n 4.118, de 27 de agosto de 1962, exclusivo da Comisso Nacional de Energia Nuclear - CNEN e da Empresas Nucleares Brasileiras S.A. - NUCLEBRS ou suas subsidirias, ressalvado o que prescreve artigo 10 da Lei n 6.189, de 16 de dezembro de 1974. Art. 2 O desenvolvimento de pesquisas no campo da energia nuclear fica sob o controle exclusivo da Unio." (Grifei) Aqui, ao contrrio da tese exposta na exordial (fl. 17), no se pode olvidar que essa nova disposio, conferindo exclusividade ao desempenho do monoplio aos entes descentralizados, representou a revogao da regra que at ento cometia ao Departamento de Instalaes e Materiais Nucleares a tarefa do controle das atividades relacionadas com radioistopos. Entrementes, na poca do acidente, as atribuies da COMISSO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR - CNEN vinham expostas na Lei 6.189/74, arts. 1, 2 e 7, redao anterior Lei 7.781/89: "Art. 1 A Unio exercer o monoplio de que trata o artigo 1, da Lei n 4.118, de 27 de agosto de 1962: I - Por meio da Comisso Nacional de Energia Nuclear - CNEN, como rgo superior de orientao, planejamento, superviso, fiscalizao e de pesquisa cientfica. II - Por meio da Empresas Nucleares Brasileiras Sociedade Annima - NUCLEBRS e de suas subsidirias, como rgos de execuo. Art. 2 Compete CNEN: I - Assessorar o Ministrio das Minas e Energia: a) no estudo das medidas necessrias formulao, pelo Presidente da Repblica, da Poltica Nacional de Energia Nuclear; b) no planejamento da execuo da Poltica Nacional de Energia Nuclear.

II - Promover e incentivar: a) a utilizao da energia nuclear para fins pacficos nos diversos setores do desenvolvimento nacional; b) a formao de cientistas, tcnicos e especialistas nos setores relativos energia nuclear. III - Expedir normas, licenas e autorizaes relativas a: a) instalaes nucleares; b) posse, uso, armazenamento e transporte de material nuclear; c) comercializao de material nuclear, minrios nucleares e concentrados que contenham elementos nucleares. IV - Expedir regulamentos e normas de segurana e proteo relativas: a) ao uso de instalaes e de materiais nucleares; b) ao transporte de materiais nucleares; c) ao manuseio de materiais nucleares; d) ao tratamento e eliminao de rejeitos radioativos; e) construo e operao de estabelecimentos destinados a produzir materiais nucleares e a utilizar energia nuclear. V - Opinar sobre a concesso de patentes e licenas relacionadas com a utilizao da energia nuclear; VI - Promover a organizao e a instalao de laboratrios e instituies de pesquisa a ela subordinadas tcnica e administrativamente, bem como cooperar com instituies existentes no Pas com objetivos afins; VII - Especificar: a) os elementos que devam ser considerados nucleares, alm do urnio, trio e plutnio; b) os elementos que devam ser considerados material frtil e material fssil especial ou de interesse para energia nuclear; c) os minrios que devam ser considerados nucleares. VIII - Fiscalizar: a) o reconhecimento e o levantamento geolgico relacionados com minerais nucleares; b) a pesquisa, a lavra e a industrializao de minrios nucleares; c) a produo e o comrcio de materiais nucleares; d) a indstria de produo de materiais e equipamentos destinados ao desenvolvimento nuclear. IX - Pronunciar-se sobre projetos de acordos, convnios ou compromissos internacionais de qualquer espcie, relativos energia nuclear. Art. 7 A construo e a operao de instalaes nucleares ficaro sujeitas licena, autorizao e fiscalizao da CNEN, na forma e condies estabelecidas nesta Lei e seu Regulamento. 1 A licena para a construo e a autorizao para a operao de instalaes nucleares ficaro condicionadas a: I - Prova de idoneidade e de capacidade tcnica e financeira do responsvel;

II - Preenchimento dos requisitos de segurana e proteo radiolgica estabelecidos em normas baixadas pela CNEN; III - Adaptao s novas condies supervenientes, indispensveis segurana da instalao e preveno dos riscos de acidentes decorrentes de seu funcionamento; IV - Satisfao dos demais requisitos legais e regulamentares. 2 A licena ter validade somente para a instalao, o local, a finalidade e o prazo nela indicados, podendo ser renovada. 3 A CNEN poder suspender a construo e a operao das instalaes nucleares sempre que houver risco de dano nuclear." (Texto original sem grifo) De plano, luz do art. 1, II, da Lei 6.189/74, fica afastado qualquer comprometimento com o infortnio por parte da NUCLEBRS, eis que rgo somente de execuo da poltica governamental do setor nuclear. Pela exposio, portanto, no restam dvidas de que o exerccio do monoplio estatal sobre a utilizao da substncia radioativa confere CNEN a responsabilidade civil, in abstracto, por danos advindos das omisses de seus agentes nesse campo de atuao. Resta ento saber se a UNIO, em tese, deve compartilhar a legitimidade passiva ao lado da CNEN, em razo da deteno do aludido monoplio estatal. Antes disso, no se pode olvidar que a CNEN autarquia federal dotada de autonomia administrativa e financeira (art. 3 da Lei 4.118/62), a quem foi conferido patrimnio prprio (art. 17 da Lei 4.118/62), alm dos privilgios estatudos no art. 30 da mesma lei. Dessarte, percebe-se que, apesar de a titularidade do monoplio no haver sido deslocada da competncia material da Unio Federal (cf. atual Constituio, art. 21, XXIII), seu exerccio foi descentralizado s mos da CNEN, autarquia detentora de personalidade jurdica e patrimnio prprios, a quem cabe, portanto, individualmente, suportar os eventuais efeitos da procedncia do pedido. Outrossim, no h falar-se em responsabilidade solidria da Unio. De fato, a inicial imputa Unio a responsabilizao decorrente de sua pretensa omisso no dever de fiscalizao do monoplio de que titular. Contudo, no h como incidir o preceito previsto no art. 1.518 do Cdigo Civil em face da Unio, uma vez que a configurao do dano no decorreu de suas atividades prprias, mas daquelas tarefas fiscalizatrias que haviam sido delegadas com exclusividade CNEN. bem verdade que a Unio poder ser eventualmente responsabilizada sob a forma subsidiria pelas obrigaes decorrentes da atuao de sua autarquia. Essa eventual hiptese, porm, no confere Unio a necessria legitimidade passiva para figurar na presente relao processual. Confira-se, nesse palmilhar, a lio de YUSSEF SAID CAHALI, transcrevendo acrdo da 8 Cmara do TARS, de 16/09/93, publicado in Julgados 87/330: "No caso de demanda indenizatria por ato ou omisso imputvel a entidade autrquica na execuo de servios pblicos que lhe foram cometidos, a ao deve ser dirigida contra a mesma, e no contra a pessoa jurdica estatal que a instituiu: Tratando-se de autarquia, com personalidade jurdica prpria, patrimnio e oramento tambm prprios, responde individualmente pela reparao de danos emergentes de suas atribuies. O Estado no responde, solidariamente, pela omisso daquela, mas apenas subsidiariamente, em caso de exaurimento da entidade autrquica." (Responsabilidade civil do Estado. 2 ed. 2 tir. So Paulo : Malheiros, 1996, p. 183). Nada obstante, defendendo a pertinncia subjetiva da ao, assevera o MPF, em sua rplica, que a responsabilidade da UNIO FEDERAL derivada das normas legais que, de modo geral, impem ao Ministrio da Sade a obrigao "de licenciar a fiscalizar instalaes, equipamentos e agentes que utilizem aparelhos radioagnsticos e radioterapia" (fl. 5.772). Acontece que as causae petendi formuladas na exordial calcaram-se, como j visto, to-s, na responsabilidade da UNIO em razo de falhas na fiscalizao do monoplio da explorao e fiscalizao dos materiais radioativos (fls. 15/17). Desse modo, ao contrrio do pretendido na rplica ministerial, no comportvel o alargamento da causa a outros fundamentos jurdicos alm dos inicialmente elencados (art. 128, c/c arts. 264, pargrafo nico, e 460, todos do CPC), motivo pelo qual a UNIO deve ser excluda do feito.

A.4) Da ilegitimidade passiva dos Rus CARLOS DE FIGUEIREDO BEZERRIL, CRISEIDE CASTRO DOURADO e ORLANDO ALVES TEIXEIRA Por grande infelicidade na confeco da inicial, em vez de proposta em face da pessoa jurdica responsvel pela guarda e manuteno da bomba de Csio 137, foi a ao movida contra os scios-gerentes do INSTITUTO GOIANO DE RADIOTERAPIA IGR, sociedade civil registrada no Cartrio de Registro de Pessoas Jurdicas da 2 Zona de Goinia. O tema da ilegitimidade passiva, ento, foi agitado na contestao de fls. 5.678/5.682. De efeito, no consta dos autos qualquer documentao atinente interrupo do funcionamento do IGR, ou alguma prova que possa indicar ser caso de desconsiderao da personalidade jurdica da sociedade civil. Na verdade, no houve sequer pedido voltado desconsiderao ou ao menos alguma explicao da direta indicao, na inicial, dos scios do IGR, motivo pelo qual, em razo do disposto no art. 20 do CC, afigura-se-me invivel responsabiliz-los per saltum. De outro lado, replicou o MPF dizendo ter "eficcia imediata e aplicabilidade direta a norma constitucional que impe s pessoas fsicas ou jurdicas a obrigao de reparar os danos causados ao meio ambiente" (fl. 5.767). Afirmou ainda que a norma de direito privado que consagra a separao da personalidade jurdica no pode ser alegada, em se tratando de dano ambiental. A uma, ressalto que a responsabilidade civil, de ordinrio, fixada conforme as regras vigentes quando da prtica do ato danoso. Alis, no Direito Penal, foi adotada a teoria da atividade, segundo a qual considera-se praticado o crime "no momento da ao ou omisso, ainda que outro seja o momento do resultado." (Art. 4 do CP) Dito isso, acaso aceita a tese ministerial de que a eficcia das normas constitucionais imediata, ao contrrio do pretendido, a responsabilizao civil no poderia ser feita com base nos ditames da nova Constituio, eis que os fatos danosos ocorreram em setembro de 1987. Nesse sentido, analisando o disposto no 6 do art. 37 da CF/88: "O art. 37, 6, da CF, que dispe sobre a responsabilidade objetiva da pessoa jurdica de direito privado prestadora de servio pblico, pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiro norma de eficcia imediata e no tem efeito retroativo, inaplicvel a fatos ocorridos anteriormente sua vigncia. Isso porque as Constituies no tm, de ordinrio, retroeficcia. (...)" (1 TACSP, 8 Cm., Rel. Juiz TOLEDO DA SILVA, RT 673/104). Nada obstante, a jurisprudncia do STF, adotando a tese da tripartio dos efeitos retroativos da norma, (2) atribuiu Constituio retroatividade mnima automtica. Dessarte, as disposies constitucionais, ainda que no contemplem dispositivo expresso, atingem os efeitos futuros de fatos passados: "J se firmou a jurisprudncia desta Corte no sentido de que os dispositivos constitucionais tm vigncia imediata, alcanando os efeitos futuros de fatos passados (retroatividade mnima). Salvo disposio expressa em contrrio - e a Constituio pode faz-lo -, eles no alcanam os fatos consumados no passado nem as prestaes anteriormente vencidas e no pagas (retroatividades mxima e mdia)." (Grifei - RE n 140.499-GO, 1 Turma, Rel. Min. MOREIRA ALVES, RTJ 156:229). Atentando-se, ento, aos efeitos do ato ilcito, restaria a aplicao das novas regras constitucionais aos danos (efeitos do acidente) registrados em momento posterior promulgao da Constituio de 1988. Acontece que todo o dano ambiental narrado na exordial teve sua fluncia obstada antes da promulgao da Constituio atual, pois, conforme concluses do Relatrio Final da Equipe de Rastreamento Areo, elaborado em outubro de 1987 (fls. 980/996), a cidade de Goinia j estava "isenta de uma contaminao regional pelo Cs-137" (fl. 987), enquanto a contaminao se restringia "aos focos isolados e sob o controle da CNEN" (fl. 987). Sem embargo, cabvel a responsabilizao pelo infortnio, calcada nos preceitos da nova Constituio, em face, porm, de danos que futuramente possam descobertos (efeitos futuros do acidente anterior), dado o diferimento no tempo das conseqncias da radiao, v.g., um cncer hoje no detectvel ou um defeito gentico nas geraes posteriores das vtimas. Veja-se a lio de CARLOS ALBERTO BITTAR: "No acidente de Gois, diversos efeitos produzir-se-o nas pessoas e nos locais atingidos, nos casos em que houve contato direito com o material, com a violao da bomba, o transporte (inclusive por nibus) e guarda pessoal, e indireto, com o desprendimento do p e sua instalao nos locais detectados. De fato, a rpida ascenso atmosfera, pelos trilhes de desintegrao por minuto que as reaes do tomo em cadeia provocam, por ter alcanado pessoas que, no momento, nem sequer se aperceberam e que s no futuro podero ver aparecer sinais da ao da radiotividade, que, como se sabe, vitimou a prpria descobridora do fenmeno." (O Direito Civil na Constituio de 1988. 2 ed. So Paulo : RT, 1991, p. 204).

Dessarte, a despeito desse desencontro jurisprudencial acerca da eficcia retroativa mnima da nova Constituio, sua discusso torna-se estril em razo dos danos narrados na inicial, todos verificados em data anterior ao advento da atual Carta, conduzindo assim ao necessrio raciocnio da inaplicao retroativa das mais recentes normas constitucionais. A duas, ao contrrio do que pretende o MPF, a norma do 3 do art. 225 da CF/88 no derrogou o art. 20 do CC. Na verdade, no direito positivo em vigor, a responsabilidade civil das "pessoas fsicas ou jurdicas" (grifei - 3 do art. 225) no cumulativa. Confira-se, ainda, a Lei 6.938/81, art. 3, IV, ao conceituar o poluidor como sendo "a pessoa fsica ou jurdica, de direito pblico ou privado, responsvel, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradao ambiental" (grifei). Assim, v-se que a legitimidade passiva, abstratamente, deve recair sobre a pessoa (fsica ou jurdica) que esteja exercendo a atividade que deu causa ao dano. No caso, quem explorava a atividade que teria dado ensejo ao acidente, quem solicitou a licena de utilizao do material radiolgico, foi a pessoa jurdica INSTITUTO GOIANO DE RADIOLOGIA, e no a pessoa fsica de seus scios. A imputao cumulativa de responsabilidade pessoa jurdica e scios, atualmente, acontece to-s na esfera penal, nos termos da Lei 9.605/98 (art. 21), talvez em razo de sua precpua finalidade de preveno (geral e especial). Inexiste, contudo, disposio semelhante na rbita civil, at porque a pretenso indenizatria objetiva a recomposio do status quo ante ou, quando no mais possvel, a reparao patrimonial do dano causado, da porque a indenizao no poderia ser multiplicada em face do nmero de scios que a pessoa jurdica possa ter. De fato, o que pode haver o estabelecimento da responsabilidade civil por solidariedade passiva entre os autores do evento danoso (art. 1.518 do CC). Mas, pelo visto, no se podendo desprezar a autnoma atuao da pessoa jurdica de que faziam parte, no restou aos scios nenhuma atividade desvinculada que lhes impingisse a responsabilidade solidria. Palmilhando, porm, as mesmas regras da responsabilidade solidria, em estreita ligao com o mrito da causa, estou em que o tema da ilegitimidade passiva no favorece o fsico hospitalar FLAMARION BARBOSA GOULART, ou tampouco o ex-scio AMAURILLO MONTEIRO DE OLIVEIRA, conforme delinear-se-. Por via de conseqncia, excluo do plo passivo os Rus CARLOS DE FIGUEIREDO BEZERRIL, CRISEIDE CASTRO DOURADO e ORLANDO ALVES TEIXEIRA. B) Da prescrio Sobre o assunto, cumpre dizer que os radioistopos de utilizao mdica foram expressamente excludos da disciplina da Lei 6.453/77, que disps sobre a responsabilidade civil por danos nucleares e a responsabilidade criminal por atos relacionados com atividades nucleares. No fosse o suficiente, a referida lei limitou o conceito de dano nuclear somente queles que envolvam materiais nucleares que se encontrarem em instalao nuclear, ou dela procedentes ou a ela enviados. Confira-se a redao dos artigos 1 e 16 da Lei 6.453/77: "Art. 1 - Para os efeitos desta Lei considera-se: I - "operador", a pessoa jurdica devidamente autorizada para operar instalao nuclear; II - "combustvel nuclear", o material capaz de produzir energia, mediante processo auto-sustentado de fisso nuclear; III - "produtos ou rejeitos radioativos", os materiais radioativos obtidos durante o processo de produo ou de utilizao de combustveis nucleares, ou cuja radioatividade se tenha originado da exposio s irradiaes inerentes a tal processo, salvo os radioistopos que tenham alcanado o estgio final de elaborao e j se possam utilizar para fins cientficos, mdicos, agrcolas, comerciais ou industriais; IV - "material nuclear", o combustvel nuclear e os produtos ou rejeitos radioativos; V - "reator nuclear", qualquer estrutura que contenha combustvel nuclear, disposto de tal maneira que, dentro dela, possa ocorrer processo auto-sustentado de fisso nuclear, sem necessidade de fonte adicional de neutrons; VI - "instalao nuclear": a) o reator nuclear, salvo o utilizado como fonte de energia em meio de transporte, tanto para sua propulso como para outros fins; b) a fbrica que utilize combustvel nuclear para a produo de materiais nucleares ou na qual se proceda a tratamento de materiais nucleares, includas as instalaes de reprocessamento de combustvel nuclear irradiado;

c) o local de armazenamento de materiais nucleares, exceto aquele ocasionalmente usado durante seu transporte; VII - "dano nuclear", o dano pessoal ou material produzido como resultado direto ou indireto das propriedades radioativas, da sua combinao com as propriedades txicas ou com outras caractersticas dos materiais nucleares, que se encontrem em instalao nuclear, ou dela procedentes ou a ela enviados; VIII - "acidente nuclear", o fato ou sucesso de fatos da mesma origem, que cause dano nuclear; IX - "radiao ionizante", a emisso de partculas alfa, beta, nutrons, ons acelerados ou raios X ou gama, capazes de provocar a formao de ons no tecido humano. Art. 16 - No se aplica a presente Lei s hipteses de dano causado por emisso de radiao ionizante quando o fato no constituir acidente nuclear." (Grifei) Nesse prumo, com total acerto, ao comentar a Lei 6.453/77, afirma PAULO DE BESSA ANTUNES: "A Lei n 6.453/77 somente fornece soluo jurdica para os casos de danos nucleares causados por acidentes nucleares ocorridos em instalaes nucleares, conforme estas sejam legalmente definidas, isto , aqueles que possam ser compreendidos pelo inciso VII do artigo 1. Instalao nuclear conceito jurdico normativo. Assim sendo, acidentes com outras fontes radioativas no esto amparados pela tutela fornecida pela presente lei. As vtimas devero, por conseguinte, buscar a suas indenizaes pela via do Direito comum." (Direito Ambiental. Rio : Lumen Juris, 1996, p. 408). Igual esclio traz CARLOS ALBERTO BITTAR (O Direito Civil..., cit., p. 200). Cabe salientar que o recente Decreto 911, de 03/09/93, o qual promulgou a Conveno de Viena sobre Responsabilidade Civil por Danos Nucleares, de 21/05/63, aprovada pelo Decreto Legislativo 93, de 29/02/92, terminou por tambm excluir os radioistopos do conceito de "produtos ou dejetos radioativos" (art. 1, letra g). Outrossim, restam inaplicveis os prazos prescricionais previstos no art. 12 da mencionada Lei 6.453/77, (3) devendo a presente discusso ser norteada pelas regras ordinrias. De outra feita, percebe-se que a presente ao foi proposta em 17/09/95, ou seja, sete anos aps a ocorrncia do acidente radioativo. Em razo disso, o ESTADO DE GOIS e a UNIO FEDERAL suscitaram a questo da incidncia da prescrio qinqenal regulada pelo Decreto 20.910/32 e Decreto-Lei 4.597/42. Neste ponto, devo lembrar que a invocao do aludido prazo prescricional, j que estendido s autarquias (art. 2 do Decreto-Lei 4.597/42), tambm beneficiaria a CNEN e o IPASGO, entidades autrquicas essas que, contudo, no ventilaram o tema. Agora, devo consignar as tentativas que fiz de encontrar alguma causa de suspenso ou interrupo da prescrio, conforme as regras do Cdigo Civil. Comecei analisando o teor da Lei estadual 10.977, de 03/10/89, que concedeu penses s vtimas do acidente, uma vez que, acaso considerada ato inequvoco que importasse em reconhecimento do direito (art. 172, V, do CC), configurar-se-ia causa de interrupo da prescrio. Contudo, alm de no me parecer que a referida lei constitua ato "inequvoco" de assuno de responsabilidade por parte do Governo de Gois, pois estou em que revestiu-se o ato de atitude de caridade para com os vitimados pelo Csio, ainda assim o prazo fatal ter-se-ia operado, nos termos do art. 3 do Decreto-Lei 4.597/42, combinado com a Smula 383 do STF. Ento, perscrutei nos vinte e quatro volumes de documentos anexados por quaisquer aes anteriores que pudessem ter interrompido a prescrio. Nessa linha, deparei-me com a petio inicial de uma outra ao civil pblica, proposta em 19/07/90 (fls. 617/634), a qual, porm, a par de no afastar a incidncia do aludido art. 3 do Decreto-Lei 4.597/42, possua objeto totalmente distinto, a saber, a resoluo de problemas afetos ao depsito provisrio de rejeitos radioativos. Encontrei, ademais, comprovao de que algumas das vtimas ingressaram com ao indenizatria em face da CNEN, conforme cpia da respectiva contestao assinada por essa autarquia, em 15/02/90 (fls. 134/145). Tambm nesse caso, a diligncia no se frutificou. De fato, ainda que se possa sustentar a responsabilidade solidria dos responsveis pelo acidente radiolgico com base no art. 1.518 do CC, fazendo assim valer a interrupo da prescrio prevista no art. 176, 1, do CC, incidiria, de toda forma, o disposto no art. 3 do Decreto-Lei 4.597/42. No bastasse isso, nos moldes do art. 174 do CC, a pretensa interrupo no poderia ser elastecida em favor do MPF, j que inconfundveis os direitos pleiteados. Por conseguinte, vejo que fluiu o prazo prescricional previsto no Decreto 20.910/32 e no Decreto-Lei 4.597/42.

Contudo, defendendo a inaplicao da prescrio qinqenria, afirma o MPF que os direitos no-patrimoniais seriam imprescritveis (fl. 5.773). Ocorre que o referido Decreto 20.910/32 estabelece que o prazo prescricional fulmina, alm das dvidas passivas, "todo e qualquer direito ou ao" (art. 1), no-patrimonial inclusive. Desse modo, no h que se sustentar que somente os direitos patrimoniais estejam sujeitos prescrio. Pelo contrrio. A prescrio atinge, sim, os direitos no-patrimoniais, tanto que o tema pode ser reconhecido at mesmo de ofcio pelo rgo julgador (cf. art. 219, 5, do CPC e art. 166 do CC). Sem embargo, entre os direitos imprescritveis esto os de natureza indisponvel (cf. ORLANDO GOMES. Introduo ao Direito Civil. 11 ed. Rio : Forense, 1995, p. 498), que podem ser traduzidos como aqueles que "constituem diretas irradiaes da personalidade humana" (WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO. Curso de Direito Civil. Parte Geral. Vol. 1. 28 ed. So Paulo : Saraiva, 1989, p. 287). Dessarte, enquadrado o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado no rol dos direitos fundamentais da terceira gerao (inciso LXXIII e 2 do artigo 5, c/c art. 225, todos da CF/88), verifica-se sua elevao categoria de direito indisponvel e, portanto, imprescritvel, qualidade essa, alis, comum a todos os direitos fundamentais previstos na Constituio (cf. JOS AFONSO DA SILVA. Curso de Direito Constitucional positivo. 6 ed. So Paulo : RT, 1990, p. 162; ALEXANDRE DE MORAES. Direito humanos fundamentais. 2 ed. So Paulo : Atlas, 1998, p. 41). Assentando o carter indisponvel do direito integridade do meio ambiente, cf. o seguinte aresto do STF: "(...) O direito integridade do meio ambiente - tpico direito da terceira gerao - constitui prerrogativa jurdica da titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo da afirmao dos direitos humanos, a expresso significativa de um poder atribudo, no ao indivduo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, prpria coletividade social. Enquanto os direitos de primeira gerao (direitos civis e polticos) - que compreendem as liberdades clssicas, negativas ou formais - realam o princpio da liberdade e os direitos da segunda gerao (direitos econmicos, sociais e culturais) - que se identificam com a liberdades positivas, reais ou concretas - acentuam o princpio da igualdade, os direitos de terceira gerao, que materializam poderes de titularidade coletiva atribudos genericamente a todas as formaes sociais, consagram o princpio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expanso e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade. Consideraes doutrinrias." (Grifei - Rel. Min. CELSO DE MELLO, RTJ 164:159). Pois bem. Sem prejuzo de sua indisponibilidade e imprescritibilidade, o direito ao meio ambiente equilibrado no se confunde com as pretenses de carter meramente ressarcitrio dele decorrentes, como as indenizaes patrimoniais advindas de dano ambiental anteriormente verificado. Nesse sentido, a lio de CAIO MRIO DA SILVA PEREIRA: "A prescrio fulmina todos os direitos patrimoniais, e, normalmente, estende-se aos efeitos patrimoniais de direitos imprescritveis, porque estes, como acima ficou explicitado, no se podem extinguir, o que no ocorre com as vantagens econmicas respectivas." (Instituies de Direito Civil. Vol. I. 18 ed. Rio : Forense, 1996, p. 440). Isso, porm, no afasta a incolumidade da pretenso indenizatria referente aos danos que futuramente possam descobertos, em razo do prolongamento no tempo dos efeitos da radiao, conforme j analisado. Essa constatao no passou despercebida por PAULO DE BESSA ANTUNES, ao criticar a fixao do termo a quo da prescrio prevista no art. 12 da Lei 6.453/77: "O direito indenizao, como se sabe, no surge com a acidente, mas com a leso por ele causada, ou mas precisamente, com o conhecimento pela vtima da leso sofrida. Em sendo assim, a perda do Direito de ao, ou melhor, o incio da contagem do prazo para que este Direito se perca (dies a quo) s pode ser aquele que deu margem ao Direito de requerer a indenizao, isto , aquele que deu origem ao. A reparao, como se sabe, s devida a partir do dano. (...) Esse um princpio geral do Direito que no pode ser esquecido e que no h qualquer razo jurdica que justifique a sua excluso em relao responsabilidade nuclear." (Op. cit., p. 409) Sem embargo, a propositura da ao ressarcitria pressupe a demonstrao efetiva do dano resultante do acidente, o que exclui a possibilidade da incluso de danos futuros, sem que isso implique em prejuzo ao ajuizamento de novas aes, medida em que descortinados outros efeitos danosos oriundos do Csio 137. Isso porque, somente suscetvel de ressarcimento o dano futuro quando "se possa demonstrar, no momento da deciso, que ele tem existncia real" (CAIO MRIO DA SILVA PEREIRA. Responsabilidade civil. 2 ed. Rio : Forense, 1990, p. 56).

Abrem-se aqui parnteses para infirmar a lio dos eminentes NELSON NERY JNIOR & ROSA MARIA B. B. DE ANDRADE NERY, segundo os quais a pretenso da pretenso indenizatria por dano ambiental, "por ser de ordem pblica e indisponvel, insuscetvel de prescrio, embora patrimonialmente afervel para efeito indenitrio."( Responsabilidade civil, meio-ambiente e ao coletiva ambiental. In Dano ambiental, preveno, reparao e represso. Coordenador: ANTNIO HERMAN V. BENJAMIN. So Paulo : RT, 1993, p. 290). Na verdade, como bem expe CARLOS ALBERTO BITTAR, a prescrio da ao de responsabilizao por danos nucleares matria inserida nas Convenes internacionais de Paris e de Viena, bem assim encontrada na legislao de todos os pases da Europa ocidental (cf. Responsabilidade civil nas atividades nucleares. So Paulo : RT, 1985, p. 211 e segs.). No por outra razo que o prprio legislador j fixou, no art. 12 da Lei 6.453/77, prazo prescricional aos pedidos de indenizao por danos ocorridos em instalaes nucleares. Da mesma forma, cf. art. 6 do Decreto 911/93, que promulgou no Brasil os termos da Conveno de Viena. Isto posto, os pedidos patrimoniais decorrentes do infortnio, formulados em face da UNIO e do ESTADO DE GOIS, encontramse atingidos pela prescrio. O mesmo, porm, no pode ser dito em relao CNEN e ao IPASGO, luz do vedativo dos artigos 219, 5, do CPC e 166 do CC. Em razo da anterior excluso da Unio Federal do feito, declaro prescrito somente o pedido de condenao do Estado de Gois ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais) ao fundo de que trata o art. 13 da Lei 7.347/85. C) Do mrito C.1) Do acidente radiolgico Conforme restou apurado, o acidente radiolgico foi causado pela violao da bomba de Csio 137, anteriormente abandonada na antiga sede do INSTITUTO GOIANO DE RADIOTERAPIA - IGR. Os fatos aconteceram consoante narrado na vestibular. Eis o resumo, como j relatado acima. Em 1972, o INSTITUTO GOIANO DE RADIOTERAPIA - IGR, ento com sede na Avenida Paranaba, n 1.587, Setor Central, nesta Capital, devidamente autorizado pela COMISSO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR, ESTADO DE GOIS - CNEN, adquiriu em So Paulo-SP uma bomba de Csio 137, de fabricao italiana, a fim de utiliz-la na prestao de servios radiolgicos. O terreno em que funcionava o IGR era pertencente Santa Casa de Misericrdia, que o vendeu ao INSTITUTO DE PREVIDNCIA E ASSISTNCIA SOCIAL DO ESTADO DE GOIS - IPASGO. Ento, pressionado a deixar o aludido local, o IGR transferiu sua sede a outro endereo, terminando por abandonar no antigo prdio a j obsoleta bomba de Csio 137, sem ao menos comunicar o fato CNEN ou Secretaria Estadual de Sade. Em 04/05/87, iniciou-se a demolio da construo, a mando do ex-scio do IGR, AMAURILLO MONTEIRO DE OLIVEIRA, culminando com a destruio quase total do prdio original, que o deixou sem telhado, portas ou janelas, a despeito da existncia no local, sem quaisquer avisos ou advertncias, da mencionada bomba de Csio 137. No dia 13/09/87, dois catadores de papel, de nomes WAGNER MOTA PEREIRA e ROBERTO SANTOS ALVES, adentraram os escombros e levaram consigo, entre outros objetos, a bomba abandonada. Seqencialmente, o objeto radioativo foi partido em duas peas, uma maior, pesando 300 quilos, e outra de 120 quilogramas. A pea menor foi transportada at a casa de ROBERTO SANTOS ALVES, onde foi violada base de marretadas, at atingir-se a janela de irdio, dentro da qual estava armazenada a substncia radioativa. No dia 14/09/87, outras duas pessoas foram at os escombros da antiga sede do IGR e de l levaram a pea maior, posteriormente vendida ao "ferro velho" de propriedade de DEVAIR ALVES FERREIRA, que a depositou na sala de sua residncia. A partir da, vrias outras pessoas mantiveram contato com a substncia radioativa, conforme amplamente conhecido. Vale ressaltar no ter havido controvrsias a respeito da veracidade dos fatos, mas, to-somente, divergncias quanto sua adequao jurdica. caso, pois, de aplicao do disposto no art. 302, caput, parte final, do CPC. C.2) Da responsabilidade civil por danos ambientais decorrentes de condutas omissivas J foi salientado que no se pode aplicar ao caso em tela as novas regras constitucionais previstas nos artigos 21, XXIII, c, e 225, 3. Outrossim, a moldura ftica no permite a incidncia da Lei 6.453/77, que trata de danos em instalaes termonucleares. No obstante, plenamente subsumvel o acidente radiolgico com o Csio 137 ao conceito de dano de ambiental, conforme prev o art. 3, I a III, da Lei 6.938/81: "Art. 3 - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I - meio ambiente, o conjunto de condies, leis, influncias e interaes de ordem fsica, qumica e biolgica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; II - degradao da qualidade ambiental, a alterao adversa das caractersticas do meio ambiente; III - poluio, a degradao da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a sade, a segurana e o bem-estar da populao; b) criem condies adversas s atividades sociais e econmicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condies estticas ou sanitrias do meio ambiente; e) lancem matrias ou energia em desacordo com os padres ambientais estabelecidos; Nessa linha, mostra-se tambm vlida a invocao da regra prevista no art. 14, 1, em combinao com o disposto no art. 3, IV, do mesmo diploma, verbis: "Art. 3 - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: IV - poluidor, a pessoa fsica ou jurdica, de direito pblico ou privado, responsvel, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradao ambiental; Art. 14 - Sem prejuzo das penalidades definidas pela legislao federal, estadual e municipal, o no cumprimento das medidas necessrias preservao ou correo dos inconvenientes e danos causados pela degradao da qualidade ambiental sujeitar os transgressores: I - multa simples ou diria, nos valores correspondentes, no mnimo, a 10 (dez) e, no mximo, a 1.000 (mil) Obrigaes Reajustveis do Tesouro Nacional - ORTNs, agravada em casos de reincidncia especfica, conforme dispuser o regulamento, vedada a sua cobrana pela Unio se j tiver sido aplicada pelo Estado, Distrito Federal, Territrios ou pelos Municpios. II - perda ou restrio de incentivos e benefcios fiscais concedidos pelo Poder Pblico; III - perda ou suspenso de participao em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crdito; IV - suspenso de sua atividade. 1 - Sem obstar a aplicao das penalidades previstas neste artigo, o poluidor obrigado, independentemente da existncia de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministrio Pblico da Unio e dos Estados ter legitimidade para propor ao de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente. (Grifei) Assim, percebe-se que, j na poca da ocorrncia do acidente, contemplava o direito positivo a responsabilidade objetiva por dano ambiental, tornando dispensvel a perquirio em torno da culpa do poluidor, bastando a demonstrao do dano e do nexo de causalidade. Ademais, no caso dos entes de direito pblico, vigorava tambm a responsabilidade objetiva inserida no disposto no art. 107 da EC 01/69. Comentando o aludido art. 14, 1, da Lei 6.938/81, assevera TOSHIO MUKAI: "Portanto, segundo esse texto, o poluidor obrigado a indenizar ou reparar danos que causar ao meio ambiente, e a terceiros, desde que tanto o meio ambiente como os terceiros devero se afetados por sua atividade. Tudo isso sem indagao da existncia ou no de culpa do poluidor. Verifica-se, assim, que o que empenha a responsabilidade do poluidor a sua atividade lesiva ao meio ambiente e a terceiros. Fica, portanto, de fora desse quadro qualquer atividade que no possa ser debitada ao poluidor, tais como a ao de terceiros, vtima ou no, e, evidentemente, nesse rol, ainda se poderia colocar o caso fortuito (evento causado pela ao humana de terceiros) e a fora maior (evento causado pela natureza). Conclui-se, assim, com base nesses raciocnios jurdicos, semelhana do que ocorre no mbito da responsabilidade objetiva do Estado, que no Direito positivo ptrio, a responsabilidade pelos danos ambientais a da modalidade do risco criado (admitindo as excludentes da culpa da vtima, da fora maior e do caso fortuito), nos exatos e expressos termos do 1 do art. 14 da Lei Federal n 6.938/81 - Lei da Poltica Nacional do Meio Ambiente." (Grifei - Direito Ambiental sistematizado. 3 ed. Rio : Forense Universitria, 1998, p. 61)

Das transcries acima, extraem-se as seguintes premissas: 1) a atividade poluidora (ainda que indireta - art. 3, IV, da Lei 6.938/81) que provoca a aplicao da regra da responsabilidade objetiva; 2) a responsabilidade sem culpa por danos ambientais segue os parmetros da responsabilidade objetiva do Estado. Compulsando os autos, denota-se que o MPF imputa a responsabilizao de pessoas jurdicas de direito pblico em razo de condutas omissivas. Neste campo das condutas negativas, de seu turno, a mais abalizada doutrina acaba por deslocar a discusso s raias da teoria subjetiva, que exige a demonstrao de culpa ou dolo. Veja-se a seguinte lio de CELSO ANTNIO BANDEIRA DE MELLO: "Quando o dano foi possvel em decorrncia de uma omisso do Estado (o servio no funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) de se aplicar a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado no agiu, no pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E se no foi o autor, s cabe responsabiliz-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto : s faz sentido responsabiliz-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar o evento lesivo. Deveras, caso o Poder Pblico no estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razo para impor-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as conseqncias da leso. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo sempre responsabilidade por comportamento ilcito. E sendo responsabilidade por ilcito necessariamente responsabilidade subjetiva, pois no h conduta ilcita do Estado (embora do particular possa haver) que no seja proveniente de negligncia, imprudncia ou impercia (culpa) ou, ento, deliberado propsito de violar a norma que o constitua em dada obrigao (dolo). Culpa e dolo so justamente as modalidades de responsabilidade subjetiva." (Curso de Direito Administrativo. 8 ed. So Paulo : Malheiros, 1996, p. 586). Outro no o esclio de CARLOS MRIO DA SILVA VELLOSO (Temas de Direito Pblico. 1 ed. 2 tir. Belo Horizonte : Del Rey, 1997, p. 497). Tambm nesse sentido, STF: 2 Turma, RE 140.270/MG, Rel. Min. MARCO AURLIO, DJU de 18/10/96, p. 39.859; 2 Turma, RE 179.147/SP, Min. CARLOS VELLOSO, DJU de 27/02/98, p. 18; TRF da 4 Regio: 4 Turma, AC 97.401222-5/SC, Rel. desig. Juiz AMIR FINOCCHIARO SARTI, DJU de 17/09/97, p. 75.102; 4 Turma, AC 95.460816-7/RS, Rel. desig. Juiz AMIR FINOCCHIARO SARTI, DJU 06/05/98, p. 988. Nada obstante, conforme ser mais explorado, a regra da responsabilidade objetiva, ainda que por ato omissivo, plenamente aplicvel aos casos em que o dano ambiental tenha sido deflagrado por materiais ou equipamentos sujeitos a monoplio estatal (cf. TOSHIO MUKAI. Direito ambiental sistematizado. 3 ed. Rio : Forense Universitria, 1998, p. 74). C.3) Do nexo causal Entre as vrias teorias relativas ao nexo causal necessrio pretenso indenizatria destaca-se a teoria da causa prxima ou direta, segundo a qual a causa seria a "condio cronologicamente mais prxima do evento que se quer imputar" (YUSSEF SAHID CAHALI, op. cit., p. 95). O Supremo Tribunal Federal, por inspirao do art. 1.060 do Cdigo Civil, no julgamento do RE 130.764/PR, estendeu essa teoria ao campo da responsabilidade extracontratual do Estado: "Ementa: Responsabilidade civil do Estado. Dano decorrente de assalto por quadrilha de que fazia parte preso foragido vrios meses antes. - A responsabilidade do Estado, embora objetiva por forca do disposto no artigo 107 da Emenda Constitucional n. 1/69 (e, atualmente, no pargrafo 6. do artigo 37 da Carta Magna), no dispensa, obviamente, o requisito, tambm objetivo, do nexo de causalidade entre a ao ou a omisso atribuida a seus agentes e o dano causado a terceiros. - Em nosso sistema jurdico, como resulta do disposto no artigo 1.060 do Cdigo Civil, a teoria adotada quanto ao nexo de causalidade a teoria do dano direto e imediato, tambm denominada teoria da interrupo do nexo causal. No obstante aquele dispositivo da codificao civil diga respeito impropriamente denominada responsabilidade contratual, aplica-se ele tambm responsabilidade extracontratual, inclusive a objetiva, at por ser aquela que, sem quaisquer consideraes de ordem subjetiva, afasta os inconvenientes das outras duas teorias existentes: a da equivalncia das condies e da causalidade adequada. - No caso, em face dos fatos tidos como certos pelo acrdo recorrido, e com base nos quais reconheceu ele o nexo de causalidade indispensvel para o reconhecimento da responsabilidade objetiva constitucional, inequvoco que o nexo de causalidade inexiste, e, portanto, no pode haver a incidncia da responsabilidade prevista no artigo 107 da Emenda Constitucional n. 1/69, a que corresponde o pargrafo 6 do artigo 37 da atual Constituio. Com efeito, o dano decorrente do assalto por uma quadrilha de que participava um dos evadidos da priso no foi o efeito necessrio da omisso da autoridade pblica que o acrdo recorrido teve como causa da fuga dele, mas resultou de concausas, como a formao da quadrilha, e o assalto ocorrido cerca de vinte e um meses aps a evaso. Recurso extraordinrio conhecido e provido."

(1 Turma, Rel. Ministro MOREIRA ALVES, DJU de 07/08/92, p. 11.782) Com efeito, l-se do voto do eminente Ministro MOREIRA ALVES que a aludida teoria "s admite o nexo de causalidade quando o dano efeito necessrio de uma causa, o que abarca o dano direto e imediato sempre, e, por vezes, o dano indireto e remoto, quando, para a produo deste, no haja concausa sucessiva." A despeito do prestgio que lhe deu o STF, em muitos casos, a opo pela teoria da causa imediata de todo inconveniente. Na espcie, e.g., a doutrina deixaria margem de responsabilizao civil todos os comportamentos anteriores concausa relativa violao da bomba de Csio 137. de se concordar, ento, com as palavras de ROBERTO BREBBIA, citado por YUSSEF CAHALI: "Este critrio simplista de imputao do resultado condio mais prxima no tempo no pode conduzir a solues que possam ser consideradas aceitveis, pois a experincia indica que o antecedente mais prximo no sempre o que realmente teria determinado o resultado; por exemplo, se uma pessoa danifica dolosa ou culposamente a barra de direo de um veculo ignorando o motorista esse fato, o acidente que ocorrer pela quebra no pode ser imputado ao motorista, no obstante haver este executado a condio mais prxima ao resultado ao colocar em marcha o veculo." (Op. cit., p. 98) Sem rebeldia, porm, ao raciocnio externado pelo STF no RE 130.764/PR, estou em que a utilizao da genrica regra do art. 1.060 do CC no pode ser defendida em face de danos ambientais. que o art. 3, IV, da Lei 6.938/81, aps normatizar o que vem a ser dano ambiental (inciso III), conceituou o poluidor como "a pessoa fsica ou jurdica, de direito pblico ou privado, responsvel, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradao ambiental" (Grifei). Assim, combinado esse dispositivo com o art. 14, 1, da Lei 6.938/81, v-se que o legislador ambiental, distanciando-se da doutrina da causa direta, albergou a teoria da responsabilizao pela autoria indireta do dano ambiental. Por bvio, a exceo teoria da causa direta na fixao do nexo causal do evento danoso no poder conduzir a situaes desarrazoadas, como a da retroatividade infinita. O limite desse critrio, ento, dever ater-se a alguma baliza no tempo. Assim, pode-se estabelecer o fator atinente ltima chance clara de evitar o dano (cf. YUSSEF SAHID CAHALI, op. cit., p. 100/101). Atenuando, portanto, a teoria da causa imediata pura, aconselha-se, na identificao do nexo causal, a verificao de quem teve a melhor ou a mais eficiente condio de impedir o dano ou influenciar para que ele no acontecesse. C.4) Dos danos A configurao de danos ambientais no maior acidente radiolgico do mundo notria, podendo ainda ser aferida a partir da farta documentao coligida aos autos, mormente: pelo dossi elaborado pela CNEN (fls. 972/979); Relatrio de Acompanhamento Areo da Cidade de Goinia (fls. 980/996), tambm assinado por tcnicos da CNEN; Relatrio da CNEN de fls. 997/1.110; bem como pelo livro confeccionado pela Agncia Internacional de Energia Atmica intitulado The radiological accident in Goinia (fls. 1.112/1.195). O acidente radiolgico gerou a contaminao de vrios locais nesta Capital, obrigando a mobilizao de centenas de tcnicos e agentes pblicos, que procederam, entre outras providncias, evacuao de casas e medio individual de dezenas de milhares de pessoas. Alm disso, ocasionou o infortnio a coleta de 14 toneladas de material radioativo, hoje armazenadas em depsito especial erguido em Abadia de Gois-GO. Pacfica, portanto, a configurao das hipteses descritas nos incisos I a III do art. 3 da Lei 6.938/81. Outrossim, foram catalogados danos fsicos que fatalmente vitimaram 4 pessoas, alm de atingir, direta ou indiretamente, outras centenas, das quais 621 foram distribudas, para fins de acompanhamento pela extinta FUNLEIDE, nos seguintes grupos: a) Grupos I: 57 pessoas envolvidas diretamente no acidente, com maior grau de contaminao interna e externa, com queimaduras de pele e radiodermites; Grupo II: 50 pessoas tambm contaminadas, porm sem queimaduras de pele ou radiodermites; e Grupo III: outras 514 pessoas acompanhadas anualmente, com dosimetria baixa ou no detectada, como o caso dos familiares das vtimas dos Grupos I e II, profissionais que trabalharam no acidente e funcionrios da Vigilncia Sanitria estadual. (Conforme relatrio de fls. 6.550/6.553). Sobre o assunto, destacam-se ainda estes documentos: laudo pericial das vtimas fatais, elaborado pela Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP (fls. 2.382/2.397); fichas de acompanhamento mdico das vtimas falecidas LEIDE DAS NEVES FERREIRA, MARIA GABRIELA FERREIRA, ISRAEL BATISTA DOS SANTOS e ADMILSON ALVES DE SOUZA (fls. 2.436/2.582). C.5) Da responsabilidade civil dos Rus remanescentes C.5.1) Da autoria

Pela narrao dos fatos, dessume-se que a causa imediata da ocorrncia do acidente foi o vilipndio do recipiente que isolava os efeitos do material radioativo. Assim, os autores imediatos do infortnio foram os catadores de papel WAGNER MOTA PEREIRA e ROBERTO SANTOS ALVES, os quais, entretanto, no foram includos no plo passivo da relao processual. bem verdade que a bomba de Csio havia sido anteriormente abandonada pelo IGR. Da mesma forma, em se tratando de res derelictae, os referidos catadores no teriam bices, via de regra, aquisio da propriedade de coisas mveis (art. 592 do CC). Contudo, compaixo parte, cuidando-se de material radioativo, as mesmas normas especiais de controle que vigoravam em relao ao IGR tambm condicionavam a aquisio da propriedade da bomba de Csio por parte de WAGNER MOTA PEREIRA e ROBERTO SANTOS ALVES prvia autorizao da CNEN (art. 2 da Lei 6.189/74), conduzindo assim inaplicao da regra do Direito Civil, com a conseqente nulidade do ato de transposio de domnio da coisa mvel. Essa concluso, portanto, deflagra a responsabilidade civil dos catadores de papel pela ocorrncia do acidente a que deram causa direta ao violarem a pea de Csio. Isso no quer dizer que os catadores de papel poderiam ser penalmente responsabilizados pela conduta pois, certamente, no tinham potencial conhecimento da ilicitude do rompimento do invlucro da substncia radioativa, o que afastaria a culpabilidade do fato. Porm, na esfera cvel, inegvel que ambos incorreriam, se acionados, na responsabilidade objetiva prevista na norma do 1 do art. 14 da Lei 6.938/81. De outra banda, restou esclarecido que a responsabilidade por dano ambiental comporta tambm a sujeio passiva dos chamados autores mediatos, nos termos do art. 14, 1, c/c art. 3, IV, todos da Lei 6.938/81. Em face desses autores mediatos, ento, cabe a aplicao da norma extensiva do art. 1.518 do CC, que disciplina a responsabilidade solidria nos ilcitos extracontratuais. C.5.1) Da responsabilidade da CNEN Conforme j sustentado quando da identificao de sua legitimidade passiva, cabia CNEN o exerccio exclusivo do monoplio sobre o controle, o licenciamento e a utilizao dos radioistopos artificiais, entre os quais insere-se a substncia contida na bomba de Csio 137, tudo nos termos da Lei 4.118/62, Lei 6.182/74 e Decreto-Lei 1.982/82. autarquia em tela foi atribuda parcela de responsabilidade civil pelo sinistro, ao argumento de que agiu de forma omissa ao descuidar-se de sua tarefa fiscalizatria da utilizao dos radioistopos. A CNEN no alegou em seu favor a presena de excludente de ilicitude, mas to-somente repassou a culpa do acidente s autoridades da vigilncia sanitria da Unio e do Estado de Gois. Os termos dessa linha defensiva, porm, j foram rebatidos quando da fixao da legitimidade passiva da CNEN, decidindo-se pela incluso, em tese, do comportamento omissivo ao rol de suas atribuies legais. Concretamente, o nexo de causalidade, ainda que indireto, iniludvel. A autarquia poderia ter evitado o comportamento danoso caso seus agentes de fiscalizao tivessem exercido de fato um efetivo controle sobre a utilizao do material radiolgico, h muito abandonado na antiga sede do IGR. Houve falha do servio de fiscalizao do ente estatal. A despeito de imputada CNEN uma conduta omissiva, caso de excepcional aplicao da teoria da responsabilidade objetiva, por se tratar de acidente com material sujeito ao monoplio que lhe foi delegado. Nesse sentido, confira-se a seguinte passagem de TOSHIO MUKAI: "Responsabilidade solidria da Administrao por acidentes ecolgicos decorrentes de causas mltiplas com culpa ou dolo - Nestas hipteses, se o acidente decorrer de culpa grave, in vigilando ou in omittendo da Administrao, ou ainda de aprovaes dela, sejam ilegais ou legais, e em existindo nesta ltima hiptese, sacrifcio especial, considerando-se o que expusemos em relao s duas anteriores, no h dvida de que a responsabilizao solidria emergir. Se, contudo, o acidente ocorrer, independentemente de ato da Administrao (comissivo) ou de sua omisso grave, no se poder falar em responsabilidade solidria. Por outro lado, quando o acidente ecolgico advier de ao ou omisso em relao a materiais ou equipamentos (ou deles decorrentes) de sua titularidade ou cujo manuseio, guarda, fiscalizao etc., ou ainda, cuja competncia constitucional ou legal lhe pertenam quanto explorao, a responsabilidade direta e objetiva da Administrao, em princpio (exemplo: a Lei n 6.453, de 1977; observe-se que os danos resultantes de materiais ilicitamente possudos e no relacionados a qualquer operador devem ser suportados pela Unio` - art. 15)" (Grifei - Direito ambiental sistematizado. 3 ed. Rio : Forense Universitria, 1998, p. 74). Existente, portanto, o especial dever de fiscalizao do monoplio da utilizao de radioistopos, dessume-se que o acidente decorreu de falhas na sua implementao, configurando assim a responsabilidade solidria da CNEN para com os autores diretos (art. 14, 1, da Lei 6.938/81, c/c art. 1.518 do CC).

C.5.2) Da responsabilidade do Estado de Gois O que foi dito em relao CNEN no serve de base responsabilizao do Estado de Gois. Explico. A autarquia federal detm o exerccio do monoplio da fiscalizao e controle do material causador do acidente radiolgico, motivo pelo qual aplica-se-lhe, com perfeio, aqueles ensinamentos do Prof. TOSHIO MUKAI. De outra feita, apontou-se a responsabilidade civil do Estado de Gois no em razo de monoplio algum sobre determinado material ou substncia, mas em virtude de pretenso comportamento omisso de seus agentes incumbidos da polcia administrativa de vigilncia das instalaes mdicas. Acontece que nesse campo de atuao do Estado no comportvel a pura e simples aplicao da teoria da responsabilidade objetiva. Isso porque, em assertiva que no vale em relao aos equipamentos e instalaes sob regime de monoplio, evidente que no h servio de policiamento estatal que funcione de forma to perfeita que possa evitar todos os riscos coletividade. Em cada esquina, ento, deveria haver um policial ou um fiscal ambiental. Como bem acentua CELSO ANTNIO BANDEIRA DE MELLO, a "admitir-se responsabilidade objetiva nestas hipteses, o Estado estaria erigido em segurador universal !" (Op. cit., p. 588). Dessarte, tomo por emprstimo, uma vez mais, a lio de TOSHIO MUKAI: "Responsabilidade solidria da Administrao por aes voluntrias dos particulares que so encetadas de forma clandestina Nestas hipteses, aplica-se a tese da responsabilidade da Administrao por omisso, por culpa grave. Como vimos, o Estado, pelo s fato de manter aparelho administrativo destinado ao exerccio do poder de polcia, em tema de meio ambiente, no pode ser responsabilizado solidariamente com o poluidor ou o predador em todos os casos. Dessarte, somente quando o evento danoso puder ser atribudo diretamente omisso do agente pblico, que haver a responsabilidade da Administrao posto que surge a a culpa in omittendo do Poder Pblico. Em outros termos, a responsabilidade solidria da Administrao, na espcie, depender de fatos que comprovem que ela teve conhecimento do iminente dano e no tomou providncias: aqui, a inrcia que empenhar a responsabilidade solidria. Portanto, h necessidade de se demonstrar que a culpa existiu, pela incria, pelo desmazelo ou pela recusa em impedir o evento danoso, evidentemente, com a condio de que ato lesivo poderia ser impedido pelo Poder Pblico. Dessarte, se o dano ao meio ambiente se deu por ato particular, socapa da vigilncia e fiscalizao da Administrao, a responsabilidade solidria inexistir." (Grifei - Direito ambiental sistematizado. 3 ed. Rio : Forense Universitria, 1998, p. 73/74) Fixadas tais premissas, vejo que a inicial sequer imputou ao Estado de Gois qualquer conduta que configurasse sua culpa (inrcia qualificada) no papel relativo vigilncia sanitria. No fosse somente a ausncia desse fundamento jurdico na exordial (art. 282, III, do CPC), nada h nos autos a indicar que o Estado de Gois tomou conhecimento da situao de abandono da bomba de Csio, at porque no foi comunicado a respeito e no era razovel supor que, num prdio em runas, estivesse armazenado material com tamanho potencial de contaminao. Na verdade, a vigilncia sanitria seguia seu padro normal de eficincia, motivo pelo qual temerrio pensar que tenha afrouxado sua fiscalizao ordinria (cf. CELSO ANTNIO BANDEIRA DE MELLO, op. cit., p. 587). Portanto, a contingncia necessria dessa concluso, embasada no esclio de TOSHIO MUKAI, o reconhecimento da improcedncia do pedido em relao ao Estado de Gois. C.5.3) Da responsabilidade do IPASGO De sua vez, a atuao do INSTITUTO DE PREVIDNCIA E ASSISTNCIA SOCIAL DO ESTADO DE GOIS deixa patenteada sua responsabilidade civil solidria. Cabe ressaltar a inaplicao ao IPASGO dos casos de responsabilidade objetiva prevista no art. 14, 1, da Lei 6.938/81, por no ser a autarquia estadual detentora do exerccio do monoplio nuclear, bem como por no estar a explorao daquela bomba de Csio entre suas atividades, conforme esclio de TOSHIO MUKAI j transcrito no item C.2, acima. Sem embargo. So outros os fundamentos da responsabilidade civil do IPASGO. Em 06/04/87, o IPASGO era o respectivo proprietrio e j havia sido judicialmente imitido na posse do imvel em cujas runas estava a bomba de Csio 137 (cf. auto de evacuao e entrega de fl. 3.149). H controvrsias sobre o fato de que o IPASGO tinha ou no conhecimento da existncia no imvel do material radioativo (cf. Relatrio que concluiu o inqurito instaurado na Polcia Federal - fls. 3.354/3.355).

Nada obstante, independentemente desse esclarecimento, dessume-se aqui a negligncia do IPASGO na verificao do estado das instalaes e na vigilncia de sua propriedade, ainda que em runas. O IPASGO, mesmo no sendo o responsvel pelo abandono da bomba de Csio em seu imvel, foi primeiramente negligente ao no constatar o fato, novamente omisso ao no comunic-lo CNEN ou s autoridades sanitrias, e ainda incorreu em descuidado objetivo ao no providenciar a adequada vigilncia do prdio. dever do proprietrio zelar para que seu imvel no cause transtornos sade e segurana da vizinhana (art. 554 do CC). O art. 1.528 do CC tambm estabelece a responsabilidade do dono pelos danos decorrentes da runa do imvel, se proveniente esta de reparos cuja necessidade seja manifesta. Assim, mesmo que no tenha sido o IPASGO quem demoliu o prdio, ao tornarse seu proprietrio e possuidor, deveria cuidar de repar-lo, pois o alojamento da substncia radiolgica assim o exigia. A inobservncia, portanto, de seus deveres civis de proprietrio fez com que o IPASGO deixasse transcorrer in albis a ltima chance clara de evitar o acidente. Por tudo isso, deve ser solidariamente responsabilizado por seus comportamentos negligentes, que acabaram por contribuir produo do infortnio. C.5.3) Da responsabilidade dos Rus FLAMARION BARBOSA GOULART e AMAURILLO MONTEIRO DE OLIVEIRA Registrada a imperfeio na formulao da preambular, que deixou ao largo do plo passivo a pessoa jurdica responsvel pela explorao mdica do aparelho radiolgico, chegado o momento de se descortinar a participao destes dois Rus. A priori, releva dizer que ambos, ao lado dos scios do IGR, j tiveram sua responsabilidade penal confirmada, por deciso j transitada em jugado do colendo TRF da 1 Regio, pela prtica, em concurso formal, de homicdios culposos (arts. 121, 3 e 4, c/c os arts. 29 e 7