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    arte&construo

    Especial Madeiras

    A madeira na construo

    os ltimos anos temosassistido a um renasci-mento da utilizao demadeira como material

    utilizado no sector da construo.Esta uma realidade Europeia eque cada vez mais tem vindo a

    ser aprofundada no nosso Pas.No domnio tcnico este material

    tem vindo a ser estudado inten-sivamente e os resultados des-ses estudos permitiram que aengenharia e a arquitectura rea-lizassem obras diferentes e emmuitos casos arrojadas.

    Portugal no tem estado alheio

    ao desenvolvimento nesta mat-ria e os nossos tcnicos tm reve-

    lado interesse em aprofundar oseu conhecimento nesta rea.

    Contudo, o conhecimento tc-nico sobre este material permi-te no s construir novas infra--estruturas, como uma daschaves para uma correcta rea-

    bilitao das j existentes, espe-cialmente aquelas onde na sua

    construo a madeira consti-tua um dos principais mate-riais. Por estes motivos, a revis-ta arte&construo lanou oSeminrio "A madeira na cons-truo", sobre o qual publicamosneste Especial as intervenes

    dos especialistas que nele par-ticiparam como oradores.

    Informar e promover o debate entre profissionais sobre o papel da madeira naconstruo, o principal objectivo do Seminrio "A madeira na construo".Conta com a interveno de especialistas (Arquitectos e Engenheiros) nacionaise internacionais, com um curriculum profissional de referncia, e com o apoioinstitucional da Ordem dos Engenheiros, da Ordem dos Arquitectos, da APPC Associao Portuguesa de Projectistas e Consultores, do IPPAR Instituto Portugusdo Patrimnio Arquitectnico, da DGEMN Direco Geral de Edifcios e MonumentosNacionais e da AIMMP Associao das Indstrias de Madeira e Mobilirio de Portugal.

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    ara estes especialistasda Universidade do Minhoo renascimento do inte-resse nas estruturas de

    madeira deve-se principalmen-

    te a trs razes: (1) ambientais,j que sendo este um materialnatural, renovvel e transfor-mvel custa de um baixo con-sumo de energia, a utilizao damadeira ecolgica; (2) o desen-volvimento das tcnicas de clas-sificao permitiu um melhorconhecimento das performancesmecnicas da madeira; (3) odesenvolvimento dos meios deexecuo das ligaes, cujamelhoria na eficincia da suamaterializao no s trouxe

    uma maior preciso dimensionalcomo possibilitou uma maior

    liberdade nas formas arquitec-tnicas.

    A madeira deixou de ser vistacomo um material decorativode aplicaes estruturais limi-

    tadas s construes provisrias.No entanto, o valor da utilizaoda madeira como material deconstruo, s aumentar como conhecimento das suas carac-tersticas resistentes e dos meiosde realizar com ela ligaeseficientes.

    Propriedadesda madeira

    A madeira um material org-nico e natural de estrutura celu-

    lar, de propriedades anisotrpicas(comportamento distinto das

    propriedades fsicas e mecni-cas consoante a direco que seconsidere, nomeadamente, nadireco paralela e perpendiculars fibras) exibindo um compor-

    tamento diferido complexo.Caracteriza-se por ser ummaterial higroscpico, isto ,perde ou ganha humidade emfuno das alteraes de tem-peratura e de humidade relativado ar do local em que se encon-tra. Estas variaes de humidadeno s esto na origem dodesenvolvimento de fendas eempenos como, preciso ter emconta que a maioria das suaspropriedades, fsicas e mec-nicas, dependem do teor de

    gua. Tambm o risco de degra-dao por agentes biolgicos

    funo do valor do teor emgua da madeira.

    As variaes do valor do teorem gua da madeira produzemuma alterao das suas dimen-

    ses. Fruto da anisotropia damadeira, estas variaes dimen-sionais no ocorrem de igualmodo para as direces axial,radial e tangencial. O valormximo verifica-se para a direc-o tangencial e o valor mnimona direco longitudinal, que porser to reduzido pode ser des-prezado. O valor da retracoradial cerca de 50 a 60%daquele apresentado pela retrac-o tangencial. Em resultadoda ortotropia da sua estrutura, na

    qual se distinguem trs direcesprincipais (longitudinal, radial e

    Construir em madeiraNos ltimos anos, o aparecimento de estruturas de madeira lamelada colada contribuiudum modo decisivo para a afirmao da madeira como um material estrutural ,nomeadamente pelo seu emprego em estruturas de grande vo, algumas delas dumabeleza invulgar. Os engenheiros Paulo Cruz e Jorge Branco abordam o renascimentodo interesse por este tipo de estruturas.

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    tangencial), somos obrigados aconsiderar distintos valores paraas propriedades mecnicas damadeira pelo menos em duasdireces: paralela e perpen-dicular s fibras. aqui que resi-de a principal diferena, emcomparao com outros mate-riais empregues em estruturas,como so exemplo o beto e oao.

    A resistncia da madeiradepende fortemente do tempo deaplicao da carga. Perantecargas permanentes obtm-seresistncias que rondam os 60%dos valores atingidos em ensaiosde curta durao, 5 2 minutos(Alvarez, 2000). A madeira tema singular propriedade de podersuportar cargas de curta dura-o bastante superiores s quedeterminam a sua rotura porperodos de longa durao(Carvalho, 1996). Esta proprie-dade torna a madeira um mate-rial estrutural com grande eficciasob cargas dinmicas, como ovento e o sismo. Por outro lado,como as estruturas em madeiracaracterizam-se por possuir

    baixo peso prprio, remanesceuma grande capacidade resis-tente para fazer frente s cargasde curta durao.

    Comportamentoao fogo

    A resistncia ao fogo de umelemento construtivo dadapelo intervalo de tempo, duran-te o qual este capaz de asse-gurar a sua funo (resistente,estanquidade e isolamento)

    numa situao de incndio. Emestruturas de madeira, umconceito que tem mais a ver comas disposies construtivas,que com o prprio material.

    A madeira macia no arderapidamente e, raramente oincndio tem incio em elemen-tos deste material (Alvarez,2000). um material combust-vel mas apresenta uma tempe-ratura de ignio relativamenteelevada: > 400C sem chamapiloto, 300C com um foco de

    incndio actuando por um pero-do de tempo significativo e

    150C com pr-aquecimento(Hartl, 1995).

    Sob aco de um fogo total-mente desenvolvido revela umcomportamento de caractersti-cas favorveis. Inicialmente,forma-se uma camada calcina-da isolante fruto de uma rpidacombusto do material superfi-cial. Debaixo desta capa existeuma outra, camada de pirlise(madeira alterada mas no aindainteiramente decomposta). Sobestas duas camadas, a madei-ra mantm-se inalterada.

    Como a condutividade trmi-ca da camada calcinada decerca de 1/6 da madeira inalte-rada, a camada calcinada fun-ciona como capa de protec-o. Na verdade, esta camadaretarda a progresso da com-busto em profundidade, man-tendo a temperatura no inte-rior, baixa, com as propriedadesfsicas e mecnicas constan-tes. Assim, a perda de resistnciadeve-se, essencialmente, redu-o da seco transversal, e noa uma perda de resistncia domaterial.

    ento possvel concluir que,ao contrrio daquilo que seria deesperar, a madeira, embora com-bustvel, apresenta um melhorcomportamento ao fogo queoutros materiais estruturais, emparticular o ao estrutural.

    Elevadadurabilidade

    A durabilidade da madeira muito elevada, mesmo em con-dies adversas para outros

    materiais, contudo revela sus-ceptibilidade ao ataque de fun-gos e insectos xilfagos, fun-o das condies ambientais.Pode durar sculos debaixo dosolo, exposta s intempries,submersa ou no interior secode uma habitao. No entanto, amesma espcie quando expos-ta a condies ambientais des-favorveis pode desaparecerem poucos anos sem deixarqualquer vestgio.

    O seu grau de susceptibilida-

    de aos ataques de agentes des-truidores bastante varivel e

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    depende, principalmente, daespcie florestal que a produziu(De Aguiar, 1996).

    A massa volmica e a exis-tncia de substncias, nutritivas(como o acar e o amido) outxicas (como a resina), contri-buem para as diferentes dura-bilidades apresentadas pelasdistintas espcies. Interessa-nos utilizar uma madeira densa,correspondente a uma melhor

    qualidade, contudo, a estasest associada uma maior difi-culdade de penetrabilidade dosprodutos de tratamento. Quantomenor for o teor de substnciasnutritivas, menor ser a proba-bilidade de ataque. Desta formaa poca de abate adquire impor-tncia. desejvel o corte dasrvores no Inverno. Nesta esta-o do ano o ciclo vegetativo darvore praticamente estacio-nrio sendo a madeira maispobre em acar e albuminides.

    O teor de humidade da madei-ra tambm condiciona a sua

    durabilidade. Apenas para nveissuperiores a 20-30% do teorem gua, existe a possibilidadede desenvolvimento de fungos.J as trmitas, preferindo asmadeiras com teores em guaacima dos 20-30%, necessitamde temperaturas relativamentealtas para se desenvolverem,pelo que se distribuem pelaszonas quentes e temperadasatacando madeiras em contac-

    to ou prximas do solo.O mtodo de secagem, aque a madeira sujeita, depoisde abatida tem grande impor-tncia no seu comportamento,sob o ponto de vista de dura-bilidade. prefervel uma seca-gem muito lenta que evite o maispossvel a formao de fen-das, visto estas constituremuma porta de acesso aos ata-ques dos xilfagos. Os insectosprocuram as fendas para depo-sitar os ovos enquanto que os

    fungos depositam nelas osesporos.

    Apesar de tudo, em condiesambientais e de utilizao ade-quadas, principalmente quandoseca e ventilada, a madeiraconstitui um dos materiais commaior durabilidade. Alm domais, j existem muitas formasde tratamento disponveis, peloque os problemas de durabili-dade podem ser facilmenteultrapassados, permitindo oaumento da longevidade das

    estruturas de madeira.

    Materialestrutural

    A opo por estruturas demadeira deve basear-se emrazes claras e objectivas. Acimade tudo, trata-se do reconheci-mento das performances fsicase mecnicas da madeira, squais actualmente se acres-centam factores ligados comas preocupaes ambientais.

    Sendo um material natural erenovvel, transformvel custa

    de um baixo consumo energtico,a madeira goza de uma imagemfavorvel face s actuais preo-cupaes ambientais e de eco-nomia de energia. A sua utili-zao na construo poderrepresentar uma forma de valo-rizar os produtos florestais, cons-tituindo, certamente, um exce-lente meio de preservao dasflorestas mundiais.

    As vantagens da utilizao

    da madeira em estruturas aumen-taro medida que o Projectistafor sabendo tirar partido das pro-priedades. As suas propriedadesso anistropicas, alteram-secom as mudanas das condiesclimticas e a durao da cargatambm afecta significativa-mente as suas resistncias edeformaes. As propriedadesno s variam com a espcie,bem como dentro da mesmafamlia de rvores.

    A sua durabilidade demons-

    trada pelas vrias estruturasde madeira que chegaram pra-ticamente intactas aos nossosdias, como so os casos de 29igrejas da Noruega, com mais de800 anos, ou o Templo de Todaiji,no Japo, que data de 1708.Estas construes provam quea madeira quando bem utilizada muito durvel. E, se a baixadurabilidade de algumas esp-cies constituiu no passado umentrave ao seu uso, hoje em dia,este problema facilmente supe-

    rvel pelo recurso a tratamentosde preservao.

    Comparao entre os valores mdios das tenses admissveis e domdulo de elasticidade para a madeira, beto e ao (Govic, 1995)

    Material Massa Flexo Traco (MPa) Compresso (MPa) Corte Mdulo de

    Volmica (MPa) (MPa) Elasticidade

    (kg/m3) // // (GPa)

    Madeira 560 12 12 0.15 11 2.8 1.2 11

    Beto 2400 8 0.6 8 0.6 30

    Ao 7800 170 170 170 100 210

    Tabela 1

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    Sob o ponto de vista das exi-gncias construtivas relaciona-das com o conforto, como sejamo aspecto esttico ou o isola-mento trmico, a madeira ofereceexcelentes performances. Ovalor esttico das construes emmadeira inegvel. O bom iso-lamento trmico que proporcio-na, associado capacidade deabsorver e restituir humidades aoambiente, assegura um ptimoconforto durante todo o ano,contribuindo assim para mini-mizar o consumo de energia.

    No que se refere aos custos daconstruo em madeira, pos-svel conseguir economias face utilizao de outros materiais.Estas economias tm a ver, porexemplo, com o seu menor pesoprprio, que se traduz em fun-daes mais ligeiras, ou com asua durabilidade natural con-duzindo a intervenes de manu-teno mais simples.

    A construo em madeira pornatureza pr-fabricada, o quepoder constituir outra vantagemeconmica a ter em conta, desdeque associada a uma boa pla-

    nificao e estandardizao,sem esquecer a economia ine-rente a um tempo de execuomais curto.

    Comparao comoutros materiais

    O reconhecimento das poten-cialidades estruturais da madei-ra passa pela anlise das suascaractersticas mecnicas epela comparao com outrosmateriais (Tabela 1).

    Dos valores apresentados naTabela 1 podemos concluir quea madeira:

    Apresenta uma elevadaresistncia flexo, sobretudose analisarmos o seu peso (arelao resistncia/peso 1.4vezes superior do ao e 10vezes inferior do beto);

    Boa resistncia aos esforosna direco das fibras (//);

    Reduzida resistncia aocorte. Este aspecto tambmpartilhado pelo beto;

    Reduzidas resistncias compresso e traco na

    direco perpendicular s fibras( ). Com particular incidnciaquando o esforo de traco;

    Mdulo de elasticidadebaixo, cerca de metade do apre-sentado pelo beto e vinte vezesmenor que o evidenciado peloao. Os valores do mdulo deelasticidade tm grande influn-cia nas deformaes dos ele-mentos resistentes e na possi-

    bilidade destes sofrerem encur-vadura. O facto do valor serreduzido, reduz em parte a boaresistncia compresso para-lela s fibras acima referida.

    Suporte tcnicoe regulamentar

    Em Portugal nunca existiu umregulamento especfico paraestruturas de madeira. Existema lgumas pub l i caes doLabora t r i o Nac iona l de

    Engenharia Civil, mas que noforam concebidas com o objec-tivo de serem usadas comoorientao para o dimensiona-mento.

    Com a adopo dos Euro-cdigos esta lacuna foi preen-chida, ao ser contemplada amadeira como material estrutu-ral (Eurocdigo 5). Este docu-mento est organizado em trspartes: a Parte 1-1 diz respeitos regras gerais e s basespara dimensionamento a utilizar

    no pro jecto de es t ru turasde edifcios de madeira; a Parte

    1-2, refere-se s regras para averificao da segurana sobaco do fogo e a Parte 2, con-tm regras para o projecto depontes. A verso de 1993, encon-tra-se publicada em Portuguspelo Instituto Portugus daQualidade desde 1998 sob adesignao de NP ENV 1995-1-1, "Eurocdigo 5: Projecto deestruturas de madeira. Parte

    1.1- Regras gerais e regras paraedifcios", (NP ENV 1995-1-1,1998). Refira-se que nesta norma,so apenas analisados requisi-tos de resistncia, aptido ao usoe durabilidade das estruturas. Nose incluem aspectos construtivos,no so apresentadas as pro-priedades dos materiais e nocobre as condies de dimen-sionamento e resistncia aossismos.

    H quatro anos foi publicadaa verso portuguesa da Parte 1-

    2, NP ENV 1995-1-2, "Eurocdigo5: Projecto de estruturas demadeira. Parte 1.1- Regrasgerais Verificao da resis-tncia ao fogo", (NP ENV 1995-1-2, 2000).

    Em complemen to aoEurocdigo, existe um vastoconjunto de normas europeiasque tratam os mais diversosaspectos relacionados com a uti-lizao da madeira como mate-rial de construo. A ttulo deexemplo, poderemos encontrar

    as propriedades mecnicas dasvrias classes de resistncia

    para a madeira macia na EN338 (1995) e as regras para aquantificao das proprieda-des fsicas e mecnicas damadeira macia ou de lameladoscolados na EN 408 (1995).

    Quebrar o ciclo

    Entregue ao abandono aolongo de vrias dcadas, nos lti-mos anos assistiu-se ao renas-cer do interesse pela construoem madeira. O principal desafioque se coloca actualmente aArqui tectos , Engenhei ros ,Universidades e Empresas, sem dvida o de restituir parteda importncia em tempos deti-da pela madeira. essencialquebrar o ciclo no se faz por-que no se sabe e no se ensi-na porque no se usa. Torna-sefundamental que a investiga-o apoie as indstrias acom-panhando as suas necessidades,util izando as Universidadescomo meios privilegiados paraa formao de tcnicos capazes,aprofundar o desenvolvimentotecnolgico e sensibilizar para

    os benefcios da utilizao damadeira enquanto material deconstruo.

    REFERNCIASAlvarez, R. A., Martitegui, F. A. (2000), Estructurasde Madera Diseo y Calculo, Asociacin deInvestigacin Tcnica de las Industrias de la

    Madera y Corcho, AITIM, 2 edio.Carvalho, A. (1996), Madeiras Portuguesas - estru-

    tura anatmica, propriedades e utilizao, Vol. I eII, Instituto Florestal.De Aguiar, B. (1996), Materiais de Construo

    Sebenta da disciplina de Materiais de Construo,Departamento de Engenharia Civil, Universidade do

    Minho.Edlund, B. (1995), Tension and compression. InBLASS, H. J., AUNE, P., CHOO, B. S. et al. -

    Timber Engineering Step 2, Almere Centrum

    Hout, Lecture B2.EN 338 (1995), Structural timber-strength classes,

    CEN.EN 408 (1995), Timber structures Structural tim-

    ber and glued laminated timber Determination ofsome physical and mechanical properties, Englishversion, CEN.

    Govic, Claude le (1995), Les Assemblages Dans LaConstruction En Bois, Centre Technique du Bois et

    de l Ameublement-CTBA, Paris.Hartl, H. (1995), Behaviour of timber and wood-based materials in fire. In BLASS, H. J., AUNE, P.,

    CHOO, B. S. et al. - Timber Engineering Step 1,Almere Centrum Hout, Lecture A13.

    NP ENV 1995-1-1 (1998), Eurocdigo 5: Projectode estruturas de madeira. Parte 1.1- Regras geraise regras para edifcios. Instituto Portugus da

    Qualidade.NP ENV 1995-1-2 (2000), Eurocdigo 5: Projectode estruturas de madeira. Parte 1.2- Regras gerais

    Verificao da resistncia ao fogo. InstitutoPortugus da Qualidade.

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    arte&construo

    Reabilitar estruturasde alvenaria e madeiras

    O engenheiro Joo Appleton d vrias pistas para avaliar as intervenes no patrimnioe saber optar pelos materiais e tecnologias de aplicao mais adequadas. As operaesde conservao e reabilitao do patrimnio colocam vrios desafios a que precisodar resposta. Para tal, preciso conhecer as estruturas em profundidade.

    a alvenaria ordinria ou de tijo-lo, que encontravam competioregionalizada na construo deterra, onde a pedra escasseava,como sucedia em vrias reasdo vale do Tejo, do Alentejo e doAlgarve, ou de silharia arga-massada ou no, onde a pedraabundava, como no Minho ou nasBeiras.

    No territrio portugus, tantoquanto alcana a histria daNao, e mesmo antes, so demadeira a generalidade dasestruturas de pavimentos, cober-

    turas e escadas, menos vul-garmente as fundaes, paredesmestras ou de travamento; sode alvenaria fundaes, paredese abbadas, estas como estru-tura principal de pavimentos,

    coberturas e escadas. Comterra fazem-se paredes de taipae blocos de adobe.

    Conheceras estruturas

    Em geral, as construes,sejam edifcios ou outro tipo deedificao tm uma estruturavertical formada por paredesde alvenaria ou de terra, estaspodendo considerar-se no extre-mo de uma escala de mate-riais de construo de pare-

    des, no topo da qual esto as decantaria caractersticas de monu-mentos e outras edificaesimportantes, e que passa pelasalvenarias de tijolo macio oufurado, argamassadas com mis-turas de cal e areia, pelas alve-narias ordinrias de pedra maisou menos regular e mida; asaberturas nas paredes partem dereforos geralmente constitudospor arcos de cantaria ou detijolo, que permitem transmitir har-moniosamente as compresses

    instaladas nas paredes.Os pavimentos so predomi-nantemente constitudos porvigamentos dispostos parale-lamente entre si, a distnciasdependentes das caractersticasdos revestimentos e com dimen-ses que variam em funo dosvos a vencer e das cargasque tm de suportar; a sensibi-lidade da madeira a variaes dehumidade desaconselha o seucontacto com o terreno, o quejustifica, em edificaes mais

    importantes, a construo daestrutura do primeiro piso em

    esde tempos muito anti-gos a construo serviu-se de um nmero limi-tado de materiais na

    execuo de estruturas; a madei-ra e a pedra natural, primeiro,depois a terra, a cal e o barro,as argamassas e alvenariasforam sendo utilizadas ao longode muitos sculos segundo pro-cessos que pouco evoluramat que, com a revoluo indus-trial se criaram as condies paraa produo fabril de materiais,nomeadamente o ferro e o cimen-

    to que, mais tarde se juntaram nobeto armado e, ainda maistarde, no beto pr-esforado,ao mesmo tempo que se des-cobriam novas formas de trans-formar a madeira e seus deri-

    vados e, nos nossos dias, metaise ligas metlicas, polmeros efibras vieram completar um lotecada vez mais vasto de materiaise solues tcnicas de que asestruturas podem tirar partido.

    Embora a produo do cimen-to Portland e do ao se tenhamdesenvolvido no sculo XIX, asua aplicao na construofez-se de modo desigual emtodo o mundo e, em Portugal, osculo XX comeou sem que sefizesse sentir a presena destesnovos materiais, que se manti-

    nham num registo meramenteexperimentalista.Assim, nas construes reali-

    zadas at cerca de 1940, osmateriais estruturais dominantescontinuaram a ser a madeira e

    D

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    arte&construo

    abbada, de pedra ou de tijolo,com constituio e configuraoque garantam que so nulasou muito baixas as foras de trac-o e de corte, transmitidasaos apoios, verdade que sismose assentamentos de fundaopodem pr em causa.

    No considerando pontes,estruturas hidrulicas, muralhase torres, em que a pedra assu-me posio dominante, o tijolomacio o material preferidopara a confeco de abba-das, sobretudo no centro e Suldo Pas, com configuraes quevo da volta perfeita ou da asa-de-cesto das abbadas decanho, s de arestas e nervu-ras de arcos simples ou gticos,em que se distinguem as com-plexas e engenhosas abba-das artesoadas, polinervura-das, to caractersticas da pocae do estilo gtico e manuelino.

    O que se disse de pavimentosvale para coberturas e paraescadas, sendo que naquelas,se verifica o desenvolvimento deinmeras geometrias de asnas,estruturas trianguladas de bar-

    ras interligadas e alternada-mente comprimidas e traccio-nadas que se utilizam nas cober-turas mais eruditas, a par deestruturas menos complexas,mais artesanais, constitudaspela simples associao devigas inclinadas que confor-mam os telhados, irregularmenteapoiadas em prumos indivi-dualizados.

    De forma muito sinttica, comas imprecises que decorremdessa mesma simplificao deli-

    beradamente assumida, soassim as estruturas com que hojese depara quem lida com ope-raes de conservao ou rea-bilitao no patrimnio arqui-tectnico, monumental ou habi-tacional. Como conviver comesta realidade o desafio que secoloca a engenheiros que, cha-mados a participar nessas ope-raes, tm de compreender,antes do mais, a natureza eimportncia dos objectos comque se confrontam, tm depois

    de ser capazes de estudar solu-es de interveno que quase

    de certeza se afastam das queclassicamente aprenderam naEscola e, finalmente, tm queassumir, com muito engenho ealguma arte, o conhecimentoque ento adquiriram.

    A questo que se coloca, emtermos de interveno estrutu-ral, a de avaliar quais os ma-teriais e tecnologias de aplica-o mais apropriada, tendo emconta o tipo de edificao emque se intervm, o seu estado deconservao, o valor patrimoniale a profundidade de interveno,j que parece lgico que asopes possam variar em funodo objecto - diferente actuarsobre um edifcio de habitaooitocentista num centro histri-co, ou sobre uma fortificao qui-nhentista -, como tambm emfuno da sua constituio estru-tural - no pode ser indiferenteestar-se a tratar de um pavimentode madeira ou de uma abbada-, do seu estado de conservao- quando a segurana se podetornar questo de sobrevivncia-, ou da intensidade de umainterveno que pode ser mais

    conservao ou mais reabilita-o/reconverso.Face a todos os condiciona-

    mentos, o engenheiro dispor demateriais e solues tradicionaisou inovadoras, considerando-setradicionais as que reproduzemou se aproximam das que estopresentes na construo a inter-vencionar; cabe-lhe conhecer arealidade, dispor de formao e

    informao tcnicas adequa-das, analisar a situao com sen-sibilidade e bom senso e, final-mente, decidir e propor as solu-es a adoptar. Preconceitosa favor ou contra materiais tra-dicionais ou inovadores nopodem caber no pensamento e

    na aco dos projectistas deestruturas.

    Intervenoestrutural

    Uma interveno estruturalnuma construo antiga de valorpatrimonial relevante tem deser subordinada a um conjuntode princpios cuja base assen-

    ta na formao especializada doengenheiro que tem de conhe-cer as caractersticas construtivasdessas edificaes e dos seusmateriais constituintes e quedeve dispor de um estudo dediagnstico que d informaosuficiente sobre as condies de

    conservao e segurana emque se encontra a construoque vai ser intervencionada.Geralmente, haver ainda que terem conta as imposies pro-gramticas e projectuais quederivam da prpria definiodo destino e do uso da edifica-o e de que resultam os cor-respondentes projectos de arqui-tectura e de instalaes espe-ciais, j que raramente o projectode consolidao ou de reforoestrutural um objectivo em si

    mesmo, salvo quando se trata demonumentos de grande valor, deque no se questiona a utiliza-o mas to somente a sobre-vivncia e a preservao.

    A especializao, princpio eexigncia primeira, apresenta difi-culdades evidentes, num pas emque o ensino das matrias tec-nolgicas no o forte dasescolas de engenharia, e ondeo beto e o ao assumiram hdcadas o estatuto de materiaisestruturais nobres, por oposio

    pobreza e ao desprezo a queso votadas as alvenarias e as

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    arte&construo

    DOSSIER

    ILUMINAO

    madeiras; no ignorando asexcepes que se sadam e queprocuram combater o desinte-resse a que ainda se abandonamas matrias relativas s inter-venes tecnolgicas no patri-mnio arquitectnico, conside-ra-se que ainda falta no Pas ainteriorizao da importnciacultural, social e at econmicadestes problemas, para que seassuma com convico um pro-

    grama coerente de ensino, for-mao e especializao de tc-nicos de histria, arquitectura eengenharia ligados ao patrim-nio arquitectnico.

    Assim sendo, a vida prticae a conjugao de alguns esfor-os pioneiros de alguns, emalgumas instituies pblicas eprivadas que vo, apesar das difi-culdades, conquistando lenta-mente adeptos para esta "causa",com entusiasmo suficiente paraenganar a realidade, simulando

    um dinamismo e uma "cultura" queesto longe de existir.O patrimnio corre pois o

    risco de cair em mos no espe-cializadas, ainda menos voca-cionadas para a delicadeza plu-ridisciplinar dos problemas queesse patrimnio levanta; a faci-lidade com que os engenheirostm desvirtuado com beto asestruturas antigas a est parademonstrar a evidncia desserisco, que conta ainda com acolaborao de donos de obra

    particulares ou institucionais,desinteressados ou simples-

    mente desconhecedores daimportncia do que lhes foidado ter.

    O estudo de diagnstico uma fase preliminar do projec-to de importncia transcenden-te, como o para um mdico talestudo antes da medicao ouda cirurgia de um paciente; nessa fase que se fazem ou seconfirmam levantamentos, sefazem avaliaes das caracte-

    rsticas estruturais e de funda-es, se registam, instrumentame observam anomalias, como fen-dilhaes, deformaes, desa-gregaes, etc, ou seja, como estudo de diagnstico quese aprende a conhecer o objec-to a intervencionar, as suascaractersticas e deficincias, oque pode levar, para o obser-vador atento e experiente, compreenso global das estru-turas e do seu comportamento,das causas prximas e remotas

    das anomalias observadas eao estabelecimento dos princ-pios gerais que devem nortearas intervenes, mais ligeiras oumais profundas, locais ou gerais,consolidando apenas ou refor-ando, avaliando os materiais esolues de aplicao maisconveniente, ideias que devemdepois ser testadas ao nvel doprojecto, com suporte em an-lises mais ou menos complexas.

    A necessidade deste estudoainda no est claramente esta-

    belecida no Pas, assistindo-sea intervenes, por vezes muito

    profundas, que parecem ignorara construo existente e o seuestado de conservao, o queconduz frequentemente a pro-jectos incompletos e deficientesque tm como contrapartidaexecues igualmente insufi-cientes, ou correces de rumotardias, s vezes precipitadas esempre onerosas.

    Programa

    de intervenoComo natural, a interveno,

    os princpios a que se devesubordinar e os materiais e tec-nologias a que pode recorrer,ser fortemente influenciadapelo prprio programa de inter-veno, que pode ir do restau-ro, com restituio rigorosa doexistente e recurso exclusivo asolues tradicionais, at reconverso funcional, que impli-ca decerto uma reabilitao

    profunda com reflexos nas solu-es estruturais que, ento, difi-cilmente se contero no usodos materiais e tcnicas deconstruo tradicionais.

    Sobre este assunto convm sermuito claro; as intervenes emconstrues antigas so essen-cialmente de dois tipos queresultam da adaptao dos pro-gramas funcionais s construesou da adaptao das constru-es aos programas funcionais.Exemplifique-se: se for decidida

    a instalao de um hospital numantigo palcio ou de uma pou-

    sada num castelo, no poss-vel esperar que a reconverso sefaa sem sofrimento para a edi-ficao em causa, a qual serdecerto mais ou menos violen-tada, menos ou mais respeitada;pelo contrrio, a reparao deuma ponte medieval, no maisdestinada a trnsito automvel,mas apenas pedonal ou cicls-tico, pode ser feita sem acesintrusivas ou desvirtuadoras. O

    mesmo se pode dizer de inter-venes em Igrejas destinadasao culto ou a certas funes des-sacralizadas de ndole cultural- espaos museolgicos, porexemplo.

    Note-se que os comentriosanteriores no implicam qualquerjuzo de valor em relao aintervenes de reconverso, jque se considera invivel emesmo sem interesse a apli-cao de uma poltica pura edura de conservao minimalista

    que, em ltima anlise obriga-ria no s a recuperar palciosmas a colocar l aristocratas ouburgueses ricos que no subs-tituem um condomnio privadopor tal palcio ou conventos queseriam ocupados por mongesque j no existem, etc, etc. Ouseja, aceita-se como normal eat desejvel que exista patri-mnio arquitectnico e mesmomonumental ao qual seja dadauma utilizao menos "mtica",sendo essencial que tais inter-

    venes sejam tanto mais exem-plares quanto mais profundas

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    Especial Madeiras

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    arte&construo

    sejam, constituindo-se mesmocomo referncias, para outroscasos e para outros interve-nientes.

    Tradioe inovao

    As intervenes estruturaisno patrimnio arquitectnicotm em Portugal uma limitaocomplementar que no podeser esquecida e que tem a vercom a circunstncia de se tratarde uma regio ssmica, ciclica-mente fustigada por sismos vio-lentos e destruidores, nomea-damente em algumas regies doterritrio continental - Algarve,Lisboa e Vale do Tejo, parte doAlentejo - e no arquiplago dosAores: 1531, 1755, 1858, 1909,1980 so algumas datas que,mais ou menos divulgadas,constituem referncias obriga-trias para as preocupaesde, pelo menos, engenheiros,proprietrios e populaes maisafectadas.

    Isto significa mais um condi-cionamento para a escolha das

    solues a adoptar na consoli-dao e reforo das estruturasantigas e constitui, alis, o maisforte argumento para aqueles queassumem a inevitabilidade dorecurso a materiais estruturaismais "confiveis" do que asmadeiras e as alvenarias, orien-tando a sua aco para o sis-temtico uso do beto e doao; as imagens de velhas cons-trues de alvenaria e madeiratotalmente destroadas, redu-zidas a montes de escombros

    fazem esquecer, pela sua bana-lidade, a susceptibilidade dasestruturas modernas, baseadasem materiais que afinal tam-bm so vulnerveis.

    Todas as questes levantadasapontam para o que pareceuma simples escolha dicotmi-ca e talvez maniquesta: de umlado as solues tradicionaisque "reproduzem" o existente,representando o lado bom naptica conservacionista; dooutro, as solues "inovadoras"

    rompendo com o existente erepresentando o lado bom dos

    que entendem necessria amudana. Na verdade, as coisasno so to simples, no existem partida bons e maus, no claro que a opo tenha de serapenas entre solues tradi-cionais e inovadoras.

    A experincia mostra que asintervenes estruturais rara-mente se podem confinar aaces de conservao-con-solidao, com recurso exclusivoa materiais e tcnicas de cons-truo idnticas se no iguais sexistentes nas edificaes inter-vencionadas; por outro lado, amesma experincia demonstraque em nenhum caso impe-rativo o recurso exclusivo amateriais e tcnicas de cons-truo distintas das existentes

    nesses objectos.O caso extremo de conserva-o quase pura estar, por exem-plo, na interveno na Torre deBelm, em que a estrutura deparedes de pedra e abbadascontinua a ser a mesma estrutura,sem introduo de novos ele-mentos, podendo consistir aconsolidao apenas no trata-mento de juntas e de alguma can-taria. O autor experimentou recen-temente um projecto deste tipo,no caso do Palcio de Monserrate,

    em que as estruturas de madei-ra de coberturas e pisos so

    quase integralmente recuperadascom madeira e em que as inter-venes nas paredes de alvenariase resumem a refechamentosde juntas entre pedras e a injec-es de fendas; a inovao muito pontual e resume-se ao tra-

    tamento de alguns apoios deasnas de cobertura em que serecorre ao auxlio de polmeros eaos materiais de injeco defendas que no reproduzem astradicionais argamassas de cale areia.

    No outro extremo podem refe-rir-se operaes de reabilita-o profunda, com ou semreconverso funcional, em queos pavimentos de madeirapodem ser substitudos inte-gralmente por outros, por exem-

    plo de lajes mistas ao-beto eem que se pode fazer apelo apregagens entre paredes e a for-ras localizadas com lminas deargamassa armada. O autorconsidera paradigmtica destaposio a interveno que pro-jectou para a reabilitao daesquadra do Aljube, no antigoConvento de Santa Clara, noPorto, em que fez apelo a con-solidaes de fundaes commicroestacas e construointegral de pavimentos mistos e

    de coberturas de ao. ainda possvel ter todos os

    graus intermdios de interven-o estrutural ou mais radicaisainda. Algumas recuperaes nazona do castelo de S. Jorge, emLisboa, enquadram-se no quepode chamar-se obras purasde conservao, quase de res-tauro, com novos pavimentos ecoberturas de madeira, paredesinteriores de tabique de frontaltecido e paredes exteriores ape-nas consolidadas por prega-gens com tirantes de ao. Tratou-se, neste caso, de uma opocondicionada tambm por umavontade de respeitar uma "ver-dade" integral de que as estru-turas fazem tambm parte eno s as fachadas, e a que nofoi alheia a vantagem de optarpor materiais facilmente trans-portveis para um local quaseinacessvel e que chegam obra quase prontos a aplicar.

    Intermdia tambm a inter-veno projectada na antigaEstalagem do Cavalo, em vora,como o foi a da Capela da Her-dade do Esporo em Reguengosde Monsaraz; ali, o estado dedegradao das paredes e pavi-

    mentos impe demolies,reconstrues, consolidaes ereforos, tendo-se optado pelaconvivncia de paredes e ab-badas de alvenaria com lminasde argamassa armadas comredes de ao distendido e depavimentos e coberturas demadeira com lajes mistas ao-beto em zonas hmidas e em ter-raos, mas mantendo sempre aidentidade original da estruturado edifcio e do seu comporta-mento, ou seja, assegurando

    que ele continua a ser uma estru-tura de alvenaria e madeira, comintromisses deliberadas masque se cr no a desvirtuarem.

    Acredita-se, portanto, na com-plementaridade entre soluestradicionais e inovadoras nasintervenes estruturais no patri-mnio arquitectnico. Cada casotem de ser encarado especifi-camente, fazendo escolhas fun-damentadas no conhecimentodas edificaes, na especiali-zao dos intervenientes e nos

    programas e projectos que orien-tam essas edificaes.

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    arte&construo

    Arq. Javier Estvez Ci-madevila, da Univer-sidade da Corunha,em Espanha analisa

    neste artigo a forma como temevoludo o uso estrutural damadeira em Espanha e sugerecomo poder ser o seu futuro,num cenrio em que se encon-tram inmeros paralelismoscom o nosso pas.

    O uso da madeira como mate-rial estrutural remonta ori-gem das construes huma-nas. A sua disponibilidade natu-r a l a l i a d a s s u a s b o a spropriedades mecnicas e sua

    fcil manipulao tornaram amadeira num material essencialao desenvolvimento das civili-zaes.

    A simples observao daarquitectura das sociedadesprimitivas que subsistem naactualidade mostra como amadeira, utilizada com formas erecursos diversos, continua a serum material bsico usado na

    construo dos seus povoados.O mbito de utilizao damadeira no mundo da constru-o vasto e conheceu nos lti-mos anos um considervelaumento e diversificao de

    produtos, o que promove aindamais as suas possveis aplica-es, na construo de estru-turas; no campo das estruturasauxiliares (andaimes, cimbres,entre outras, onde a madeira temsido e continua a ser um mate-rial insubstituvel); na carpinta-ria de limpos, entendida no seusentido mais amplo j que amadeira continua a ser um mate-

    rial de referncia na construode portas, janelas e revesti-mentos em geral, onde o mer-cado oferece um amplo leque deprodutos que abrangem desdeas solues mais tradicionais ao

    uso cada vez mais alargado detodo o tipo de tbuas.

    Finalmente, finalmente, a inds-tria do mvel, outro dos gran-des sectores em que a madeiracomo material e as tbuas ou pai-nis como produto derivadono tm concorrncia.

    H tambm que fazer refe-rncia ao contributo da madei-ra e seus derivados para outros

    sectores, tal como a indstriaautomvel nos seus primrdios,o clebre "mosquito" (um caa-bombardeiro usado pela RAF),ou o seu uso no fabrico de ma-terial desportivo.

    Um mercadopor descobrir

    Material tradicional e desde sempre utilizado, a madeira viu o seu uso restringidosobretudo a partir do sculo XIX, quando se impem novos materiais como o betoe o ao. No entanto, as suas possibilidades ganharam novo impulso graas aodesenvolvimento de solues inovadoras para fins estruturais. Ainda pouco receptivoao vasto campo de aplicao dos novos produtos e sistemas de madeira, o mercadoespanhol, tal como o portugus tem ainda de vencer a resistncia de ideias

    pr-concebidas que importa desmistificar.

    O

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    Antecedentesem Espanha

    Na tradio espanhola, o uso damadeira centrou-se fundamen-talmente nos seguintes campos:

    - Construo por tabiquesTrata-se de uma soluo cons-

    trutiva caracterstica de locali-dades com abundantes zonasarborizadas, o que permitiu odesenvolvimento desta tipologiapor carpinteiros locais. Em ter-mos de localizao geogrficasitua-se essencialmente na zonapeninsular a norte.

    Este tipo de construo carac-teriza-se pelo uso da madeira naexecuo da trama estrutural dasparedes, geralmente estabili-zadas com enchimentos de alve-naria, pisos e cobertura do edi-fcio.

    - Traves para pavimentos ecoberturas

    A capacidade da madeirapara trabalhos de flexo favo-receu, durante muito tempo, oseu uso na construo de travesde pavimentos e coberturas,como alternativa eficaz cons-

    truo ptrea.Evidentemente, as possibili-dades abertas com o apareci-mento do ao e, posteriormen-te, do beto armado, resultaramno progressivo abandono destatcnica construtiva em favordos novos materiais.

    -Armaduras de coberturaNeste campo englobam-se

    as solues mais elementares dearmadura, como as de cumeei-ra, at s solues trianguladasem que a madeira que conforma

    os membros trabalha funda-mentalmente na traco/com-presso. Deu lugar a uma amplavariedade de tipologias que seusaram profusamente na exe-cuo de tectos em edifcios reli-giosos e civis.

    -Carpintaria de laoTrata-se de uma tcnica cons-

    trutiva de grande interesse emEspanha, cujo maior desenvol-vimento foi alcanado nos scu-los XVI e XVII. Basicamenteconsiste numa estrutura supor-

    tada por um conjunto de arma-duras de traves pregadas, s

    quais se acrescentam pea adi-cionais que seguem comple-xas malhas definidas a partir deesquemas geomtricos basea-dos fundamentalmente na estre-la de oito pontas.

    Esta permite uma soluoque, mantendo a sua funoestrutural, consegue igualmen-te um sofisticado efeito decorativo

    Panoramaactual

    Numa perspectiva histricae dentro do panorama mundial,apesar dos avanos registadospela madeira no campo dasestruturas durante os sculos XVI,XVII e princpios de XVIII, oenorme impulso da engenhariado ferro e a descoberta dobeto armado, fizeram com que,durante o sculo XIX, se verifi-casse um progressivo abando-no da madeira a favor dos novosmateriais.

    A madeira mostrava-se incapazde cobrir vos cada vez maiorese, portanto, de competir com oincessante desenvolvimento das

    estruturas metlicas.O protagonismo da madeira s recuperado a partir dos tra-balhos de Otto Hetzer, em 1906,que constituem o grmen de todoo desenvolvimento posterior deum novo material: a madeiralaminada.

    No entanto, as possibilida-des deste novo material foramdesaproveitadas em Espanha ath relativamente pouco tempo.

    As referncias de obras novasrealizadas com estrutura de

    madeira eram praticamente nulasem Espanha at h cerca de 25anos atrs. No havia fabrican-tes espanhis de madeira lami-na colada e a penetrao no mer-cado era praticamente inexis-tente.

    Por outro lado, Espanha foi umpas em que a construo pr-fabricada em geral teve pou-qussimo xito e, em particular,a de casas pr-fabricadas.

    Podem adiantar-se diversasrazes para explicar este deso-

    lador cenrio do uso da madei-ra at aos anos 80:

    - em primeiro lugar, no que serefere construo pr-fabricada,esta sempre apareceu asso-ciada monotonia e a uma limi-tao criativa devido ao seuinerente carcter repetitivo.Trata-se de uma crtica injusta,provavelmente alimentada poruma m utilizao destes siste-mas ou por realizaes arqui-tectnicas de baixa qualidade,mas que no se sustenta em ter-mos objectivos, pois seria comoargumentar que o reduzidonmero de letras do alfabeto limi-ta a criao de obras literrias.

    - no que respeita ao uso demadeira em estruturas, Espanhasofreu do inconveniente de ter umdesenvolvimento normativo quaseinexistente. A ausncia, at hbem pouco tempo de normas declassificao resistente da madei-ra, bem como de uma normaespecfica de clculo, retraramo seu uso por parte dos tcnicos.

    - Ainda hoje, apesar do pano-rama ter melhorado substan-cialmente, no dispomos denorma bsica de clculo, recor-rendo-se ap l i cao do

    Eurocdigo EC-5 ou a normasestrangeiras sendo frequentes asdiscusses e os problemas quese geram entre os tcnicos e asentidades responsveis pelocontrolo dos projectos.

    - A m imagem da madeiraque se deve, por um lado, aocarcter combustvel do materiale, por outro, possibilidade dese degradar sob a aco deagentes biticos e atmosfri-cos. Da a ideia consideravel-mente difundida de que a madei-

    ra um material perigoso emcaso de incndio e que exige ele-vados custos de manuteno.

    - A pouca ateno que tradi-cionalmente se dedicou ao ensi-no da madeira nas escolas dearquitectura e engenharia faceao ensino do beto e do ao. sintomtico tambm que, ath muito pouco tempo fossereduzidssimo o nmero de publi-caes de mbito tcnico em ln-gua espanhola no domnio dasestruturas de madeira, quando

    comparado com os outros mate-riais. Este problema reflectiu-se

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    numa fraca formao dos tc-nicos neste campo e, por isso,dada a tendncia natural parano projectar num material quese desconhece, num reduzidonmero de obras pensadas econstrudas com estrutura demadeira.

    Certamente este panoramamudou radicalmente a partir demeados dos anos 80, funda-mentalmente por duas razes.Por um lado, o aparecimento dealgumas empresas importadorasde madeira laminada. Por outro,o aumento da divulgao daspossibilidades oferecidas pelamadeira no campo das estrutu-ras, atravs de associaescolgios profissionais e univer-sidades, que deu lugar a umincremento notvel tanto aonvel dos tcnicos qualificados,como do nmero de publicaes.

    Esta mudana teve como con-sequncia imediata um espec-tacular incremento das estrutu-ras de madeira construdas nosltimos anos, algumas de gran-de complexidade e enverga-dura que abrangem as mais

    diversas tipologias e usos.O panorama actual do usoes t ru tu ra l da made i ra emEspanha corresponde aos trsmateriais mais difundidos:

    a) Madeira serradaA aplicao mais frequente da

    madeira serrada o domnio dahabitao unifamiliar, onde usada como soluo de umaparte da estrutura; trata-se geral-mente de estruturas de pavi-mentos realizados em madeirasobre paredes portantes defbrica e na construo daestrutura da cobertura. Estasoluo costuma ser acompa-nhada do uso de painis sand-wich, suportados por tbuas eespumas isolantes, para resol-ver o espao entre eixos deviguetas. No obstante, a suadivulgao ainda escassa e o

    seu uso obedece frequente-mente busca de uma estticade tipo rural ou tradicional, maisdo que ao facto de se estarconvencido sobre os benef-cios da madeira como materialestrutural.

    Outro campo onde se aplica amadeira serrada na reabilita-

    o, na recuperao de pavi-mentos ou de armaduras decobertura.

    Apesar disso, o impulso e asnovas possibilidades da madei-ra laminada, bem como as tc-nicas actuais de consolidaoestrutural mediante o uso deresinas epoxdicas, tem feitodecrescer significativamente oseu uso.

    b) Madeira laminada coladaA utilizao da madeira lami-

    nada colada nos edifcios re-

    sidenciais quase residual.Em qualquer caso, os poucos

    exemplos existentes centram--se exclusivamente em moradiasunifamiliares, onde se aplicam cri-trios e sistemas anlogos aosque caracterizam o uso damadeira serrada.

    Um campo de reduzida utili-zao, mas em clara progressodevido s polticas de recupe-rao do patrimnio histrico, soas obras de reabilitao onde amadeira laminada usada por

    vezes na para substituir total ouparcialmente tanto as estruturasde piso como as de cobertura.

    Mas sem dvida, a aplicaomais generalizada centra-se naconstruo com madeira lami-nada de estruturas de cobertu-ra de edifcios de vo moderadosou grandes e de uso pblico,como piscinas polidesportivos oucentros comerciais.

    Neste domnio, o nmero deconstrues real izadas emEspanha nos ltimos anos

    assinalvel, passando a madei-ra laminada colada a ser umaopo que sistematicamente j considerada pelos tcnicos eas empresas construtoras facea a solues mais convencionaisem ao.

    Tambm se recorre com fre-quncia a este material na cons-truo de infra-estruturas urba-nas do tipo: passerelles pedonais,prgolas, etc.

    Pelo contrrio, outras possveisutilizaes da madeira como

    material estrutural, tais comoestruturas mistas (madeira-ao,

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    rvore e o material delaresultante, a madeira, certamente o elemento doreino vegetal que mais

    tem servido o Homem ao longo dosmilhares de anos da sua evoluo.

    No incio limitava-se a forneceros seus frutos como dieta essen-cial, ou complementar, poste-riormente teve um papel impor-tante na sobrevivncia do homemque a utilizou como arma dedefesa, de ataque ou de caa,assim como para fazer fogo emanter aquecida a sua caverna.

    Mais tarde, foi utilizado comoelemento estruturante e isolan-te das primitivas habitaesque eram construdas de acor-do com as necessidades geo-grficas e climatricas.

    Pouco a pouco, a rvore ouparte desta, vem sendo utiliza-da para vrios fins, quase paratudo. Os primeiros barcos, aspaliadas de defesa das aldeias,a primeira roda, as mquinas deguerra, as mquinas agrcolas,os mveis e utenslios caseirose sobretudo a Casa.

    esta evoluo que durantemilhares de anos, juntamentecom a pedra, o barro e o ferro,coloca a madeira na lista dosmateriais mais utilizados naconstruo.

    A partir dos anos sessenta/setenta os arquitectos e enge-nheiros comeam a ignorar o usoda madeira, preferindo o beto,o ao, o alumnio e at as mat-rias primas sintticas. A madei-ra, de certo modo, cai em desu-so como elemento estruturantee fundamental da construo.

    As recentes preocupaesecolgicas e as responsabili-dades inerentes aos nossosactos levaram a sociedade arepensar algumas questes,sobretudo relativamente utili-zao das matrias primas nossa disposio, de um modoeconmico e calculado.

    Estas preocupaes, conjun-tamente com as evolues tec-nolgicas da indstria das madei-ras, levaram redescoberta destematerial praticamente confina-do construo rural ou rstica.

    Experimentarcom a madeira

    O arquitecto Carlos Castanheira explica neste artigo porque gosta de usar a madeiranas suas construes. Preocupaes ecolgicas aliam-se a uma questo de gosto:do cheiro, do toque, das cores e da textura.

    A

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    A madeira apresenta carac-tersticas nicas pois com-pletamente reciclvel, as suasreservas renovam-se natural-mente, uma fonte de energiafundamental, um meio dedesenvolvimento e prosperida-de de muitas naes e, sobre-tudo, quando aplicada uma pol-tica de explorao convenientee responsvel no afecta o sis-tema ecolgico, pelo contrrio,chega a ser um factor dinami-zador.

    Sendo um material natural, amadeira, como "rvore da vida"mantm-nos ligados terra,neste mundo cada vez maisvirtual e descontextualizado.

    Compreendera floresta

    A desflorestao uma con-sequncia da evoluo doHomem na procura de novos ter-ritrios, de melhores terras de cul-tivo, de novas cidades. O dese-quilbrio resultante das desflo-restaes macias e selvagens,tantas vezes utilizandose quei-

    madas, ou o abate de rvoressem que haja uma preocupao

    ou poltica de reflorestamento,leva a graves problemas eco-lgicos e extino de vriasespcies.

    Alguns pases, que com-preenderam a vital importnciada floresta, conseguiram trans-formar aquilo que era o bem dealguns num bem comunitrio enuma riqueza para os vriosfuturos que se seguem.

    Os pases do chamado terceiromundo, detentores das gran-des florestas do nosso planeta,esto aos poucos a tomar cons-cincia do valor que diaria-mente se lhes escapa e conse-quentemente esto a tomarmedidas de preveno, racio-nando o abate de certas esp-cies e, conjuntamente com gran-des empresas ocidentais deexplorao, a desenvolver pro-gramas de reflorestao.

    A famosa regra utilizada comxito sobretudo na Noruega :por cada rvore abatida, serotrs plantadas.

    Pouco resta das florestasprimitivas do nosso planeta.Na Europa somente 1% flo-

    resta natural. No entanto, eapesar da expanso do Homem

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    durante tantos milhares deanos, 35% do territrio ocu-pado por f lo res tas que oHomem soube dignamente uti-lizar e sobretudo respeitar o seucrescimento natural para pos-terior utilizao, seja na inds-tria, ou seja para o belo prazerde usufruir da natureza.

    Em Portugal, como quase emtudo, no houve uma clara pol-tica florestal, tendo-se pratica-mente eliminado as espciesautctones em favor do Pinhal deLeiria de D. Dinis. Recentementecom o aparecimento do flores-cente negcio do papel, tentou-se transformar a paisagem comeucaliptos finos, de crescimen-to rpido que mais parecemsearas. Os resultados so idn-ticos desflorestao: lucrorpido para as indstrias decelulose, algum dinheiro fcil paraos proprietrios dos terrenos eum rpido empobrecimento daterra e da paisagem.

    Com as novas polticas comu-nitrias, pagou-se: para arrancaras oliveiras, para as plantar,para transformar as searas em

    bosques ou matas de pinheirosmansos, enquanto os sobrei-ros e azinheiras morrem com umadoena com que poucos sepreocupam.

    Os fogos fazem o resto.A indstria nacional desen-

    volveu-se exclusivamente natransformao da madeira depouca qualidade em subprodu-tos como os aglomerados etc.

    Quando se pretende madeirapara a construo de qualidade,seja ela estrutural, para caixi-

    lharias ou para a indstria demobilirio, estamos completa-mente dependentes da explo-rao e indstria de transfor-mao externa.

    At h bem pouco tempo o for-necimento de madeira para aconstruo civil chegava-nosdos pases subtropicais daAmrica do Sul e sia. Com astransformaes scio-polticasdos ltimos tempos foram aber-tos novos mercados, novas pro-venincias em especial dos

    Pases de Leste e tambm daAmrica do Norte.

    A evoluo do Homem tambmpassa pela evoluo do uso damadeira.

    No incio o tronco era utiliza-do na sua forma natural, demodo limitado, limitando a forma,a funo.

    Aos poucos esse mesmo tron-co foi sendo trabalhado, limita-do pela forma, pela funo oupela funo da forma. Hoje possvel obter forma e funescom estruturas que utilizam tec-nologias consequentes da linhaevolutiva do primeiro Homemque pegou no pau para sedefender.

    A madeira cria a possibilida-de de construir a Terra para osHomens.

    Porque gostode madeira

    No utilizo a madeira, emalgumas construes que tive etenho a possibilidade e o privi-lgio de realizar, por razes detradio.

    porque gosto ! gosto do chei-ro; do toque; das cores naturais;

    da textura; dos veios; dos ns;do pinzio e da couoeira; dopilar e da viga, da cavilha e darespiga; do formo e da bitola ...e gosto de carpinteiros.

    Gosto do trabalho deles, dorigor necessrio; do pensarantes de cortar; do cortar apensar, pois no pode emendar;do amaciar da madeira; dosegurar da madeira e verificar odesempeno como um jogador debilhar. No s a construocom madeira que me tem feito

    pensar porque que a nossa, aportuguesa sobretudo, tem queser ou um acto contnuo deconstruo, demolio, cons-truo ou reconstruo de pare-des destrudas, para se escon-der aquilo que no se quer ouno se deve ver.

    Ser que no possvel fazermelhor? ser que c, em Portugal, possvel fazer melhor? para almde se tornar um produto com mode obra intensiva, parece-mesobretudo irracional!

    Tal como construir um mvel,um grande mvel, construir

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    com madeira obriga a prever,pensar, organizar, organizar opensar; pois todas as infra-estruturas tm que estar pre-vistas e instaladas antes edurante a construo que setorna montagem, onde a mon-tagem acto racional.

    E h tambm a vantagem queo tosco j acabado, que o exte-rior tantas vezes parte do inte-

    rior, sem problemas de pontes tr-micas obsessivas; que a viga seconfunde com o caixilho e ocaixilho funciona, tambm, comoviga; o tecto cho e o chotecto, assim sem mais nada,desde que aceite, tolerado.

    Para alm de algumas recu-peraes ou alteraes de cober-turas de construes existentesno me foi fcil arranjar manei-ra de aplicar a madeira nasconstrues que ia realizando.

    Problemas, preconceitos, con-

    celhos de outros tornaram dif-cil, s vezes mesmo impossvel,

    abordar a questo, propor aalternativa, esclarecer que no verdade.

    O beto, material dito eterno;a lage aligeirada, garante denunca mais se ter problemas; otijolo; material bem portuguspois no teve qualquer tipo deevoluo no ltimo sculo; asmassas grossas e as finas; a tintatapa tudo, a tartaruga e a tar-

    taruguinha; os alumnios adoni-sados e os lacados, as coresnaturais e a da casca de ovo etantas tantas coisas mais, cria-ram uma cultura construtivaonde j no havia lugar ao pen-sar, "ns fazemos sempre assim,sempre assim fizemos".

    A dificuldade de no fazersempre assim, no querer fazersempre assim, no tarefa fcil! Os engenheiros e seus pro-gramas de clculo; os clientese suas senhoras; os empreitei-

    ros e "se fosse como habitual eramuito mais barato"; as lojas de

    materiais e suas promoes; aana salazar e os madredeusque, tambm, vendem azule-jos, fazem com que, tantasvezes, a tarefa de projectar sejaredutora.

    O interesse, cada vez mais,levou anlise do que h de bemconstrudo em madeira, c efora. Construes com qui-nhentos e mais anos, arquitec-

    tura moderna dos anos trinta,ambas actuais, quase semprefuturistas, deram fora, razo ejustificao para prosseguir,experimentar.

    A necessidade ou deciso deconstruir casa prpria permitiu rea-lizar algumas das preocupa-es, dos objectivos que cons-cientemente e inconscientementese vinham acumulando nestepercurso de fazer arquitectura.

    Construir com madeira, pois foiesse o objectivo. Nunca pretendi

    fazer uma casa de madeira.Todas as casas de construo

    em madeira utilizam, necessa-riamente; outros materiais. Pedraou beto nas fundaes, ferro emligaes, cermica ou metais nasvedaes.

    A minha casa assim: betotudo o que enterrado e da paracima madeira, protegida daintemprie por chapa de cobre.

    No incio parecia difcil. Foinecessrio escolher as pessoas,

    sobretudo os carpinteiros, amadeira, a madeira e seu preo.Com a continuidade, o entu-siasmo, tambm se pegou aoscarpinteiros. O tempo no ajudouapesar de dever ser vero. Estee outros problemas foram ultra-passados. O projecto realizou-se.Est bem, eu gosto.

    Outras casas se seguiram,depois de verem a minha, paracrer como so Tom, e outras seseguiro ... porque eu gosto ! eos clientes tambm ! ... alguns.

    A casa do carpinteiro, commadeira, j est avanada.

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    o longo dos ltimos dezanos de prtica profis-sional, o uso da madei-ra nas nossas opes

    construtivas tem evoludo cons-cientemente, deixando de seruma preferncia, em detrimen-to de outras matrias-primas,

    para assumir-se como um ele-mento determinante na nossaevoluo plstica e esttica.

    Esta relao casustica, semfundamento cultural de base,resultante de uma sensibilidadeque estabeleceu uma relaoemotiva e tctil com a madeira.No principio apenas como mat-ria fsica, posteriormente comoelemento plstico estruturante deuma pesquisa e opo esttica.

    Esta pesquisa no pressu-pe um conhecimento cientfico

    das caractersticas fsicas oumecnicas da madeira; antes um

    motivo de reflexo, apoiado nasdiversas oportunidades em queutilizamos madeira ou derivadosnos projectos concretizados,que nos permitiu apreender a suanatureza e o seu objecto naarquitectura.

    por isso frequente questio-

    narmo-nos sobre o seu com-portamento em obra, reconhe-cendo a necessidade de umaacurada sensibilidade no seumanuseamento e aplicao.Considerando a imponderabili-dade de uma matria orgnicaviva, que mesmo depois detransformada, reagir em acor-do com a sua natureza peranteo modo da sua utilizao, porvezes de forma muito violenta einesperada.

    A sua utilizao continuada

    implica, assim, uma aprendiza-gem que conduza no s ao

    conhecimento das suas inme-ras potencialidades, mas tambmao respeito pela cultura do seumanuseamento e utilizao.

    A oportunidade de experi-mentarmos a utilizao da madei-ra em sistemas de construointegral, minimizando o recurso

    a outras matrias-primas, evi-denciou o que de mais nobreexiste em si e no acto da sua cor-recta utilizao, que a extraor-dinria beleza do seu envelhe-cimento orgnico.

    Verificamos nas situaes deobras terminadas h j algunsanos, que todas as aplicaesde madeira se apresentam embom estado de conservao,surpreendentes na sua resis-tncia ao desgaste e envelhe-cimento.

    o exemplo da beleza singulardos veios e fibras aparentes

    nos antigos soalhos de pinho,repetidamente lavados comgua e sabo, muito frequentesem igrejas e capelas de provnciaou casas de lavoura. Trata-se demadeira muito seca sem resinaaparente, no esplendor da suanudez orgnica de natureza

    vegetal.

    Contra abanalidade

    Temos por isso a conscinciade que na opo de tratamentoe manuteno, quer seja con-servadora e tradicional ou ino-vadora e contempornea, o fun-damental no violentar a suanatureza.

    Entendemos por isso ser danossa responsabilidade enquan-

    to tcnicos prescritores da suautilizao, ter a sabedoria e a

    A madeira naarquitectura

    Os arquitectosJos Santos e MariaJos Pato reflectemsobre o tema"A Madeirana Construo" no

    mbito da divulgaoe promooda prticada arquitectura,propsito comume neste caso,resultado dainteraco culturalentre a revistaarte&construoe a Ordem dosArquitectos.

    A

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    sagacidade que nos permitadesfrutar ao mximo da sua uti-lizao sem nunca esquecer asua origem.

    Apesar da introduo tenderpara algum dogmatismo na utili-zao da madeira na construo,no esse o entendimento quetemos ou defendemos na rotinada nossa actividade profissio-nal. Apenas entendemos serabsolutamente necessrio terconscincia de que a madeira no um material banal comparvela qualquer composto de inertes.

    Do ponto de vista da formaoe divulgao acadmica as nos-sas referncias mais directas sodo norte da Europa, Finlndiacom Alvar Aalto e todos os seuspercursores, mas tambm daAmrica do Norte atravs deFrank Lloyd Wright.

    Hoje, com o destaque que aMadeira ocupa nas jornadasde reflexo tcnico profissio-nais do sector da construo,outros pases e outros nomesdo-nos testemunho dumadimenso e valor da madeira naconstruo, em que o fascniopela sua utilizao, reforadopelo arrojo e o pioneirismo dastcnicas utilizadas, ultrapassa emmuito o esprito inovador dos sis-temas de pr-fabricao indus-trial disponveis no mercado.

    No obstante em termos deindustrializao e transforma-o da matria - prima, poten-ciando a criao de transfor-mados e sistemas tecnologica-mente avanados que potenciema madeira enquanto opo com-petitiva de mercado, temos aconscincia de que a evoluo

    tem sido to rpida e eficazquanto o mercado da sua utili-zao o exige.

    Casos prticos

    No mbito do nosso contributopara esta reflexo, procuraremosser objectivos, evidenciandoem cada obra apresentada osaspectos que nos parecem maisrelevantes.

    Identificamos o caso de qua-tro habitaes unifamiliares,todas situadas no norte do pas,em Vila Nova de Cerveira eCaminha respectivamente.

    Destinadas ao turismo e usosazonal, so estrategicamentelocalizadas para desfrutar de umenquadramento paisagsticosobre a raia espanhola e oesturio do Rio Minho.

    Ao tratar-se de casas inte-gralmente executadas em madei-ra, excepo das bases deassentamento, estamos a falar deum tipo de obra seca, sem tro-lhas, sem gua cimento e areia,onde o ao ou alumnio s apa-recem esporadicamente comoresultado de uma opo estti-ca ou de coerncia plstica.

    Estes exemplos so paradig-mticos no nosso percurso cria-tivo, identificadas como as Casasde Gondarem 1 e 2 e as Casasde Cristelo 1 e 2.

    Gondarem 1

    (1992-1994)Em Gondarem 1 fomos cha-

    mados de emergncia ao localda obra, onde o dono empreen-dedor e amador deste tipo de

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    construes se encontrava empo-leirado, qual carpinteiro ameri-cano, e completamente deso-rientado com o andamento dasua encomenda, feita a umaempresa do ramo das casastipificadas.

    Por todas as vicissitudes deuma obra j adjudicada, viria aser uma experincia inesquec-vel, um despertar para um tipode desafio muito distante detodos os exerccios acadmicospresentes a uma formao uni-versitria ainda muito prxima eabsolutamente lacnica a esterespeito.

    A nossa interveno acen-tuou-se nos revestimentos inte-riores e nos arranjos exterio-res, integrando uma constru-

    o extremamente rstica numconjunto de muros e percursosque acabaram por assimilar ovolume construdo e torn-lonuma moradia local, sem dvi-da muito feia, mas com um inte-rior surpreendente e muito aco-lhedor, e um exterior devidamentecontextualizado pelos muros degranito e absolutamente rendi-do paisagem dominante apoente sobre o Rio Minho.

    Desta casa, executada emtroncos macios de criptomria

    dos Aores, e profusamenterevestida pelo interior em forra

    da mesma madeira, tratada comleo de l inhaa, f ica-nos oconhecimento profundo de que

    a madeira pode ter a mesmamassa edificante que a pedra.Porm as nossas sensaes ereaces sua densidade, con-forto e perfume natural, nopodem ser equiparadas anenhum outro tipo de construo.

    A estabilizao de humidadeinterior resultante das caracte-rsticas especficas da cripto-mria, acentuam a ausncia decheiros e de p, em que o seuperfume natural purifica a vivn-cia interior.

    Por outro lado a riqueza euniformidade plstica de um

    interior em madeira ainda quemuito rstico, torna mnima anecessidade de decorao,

    onde cada objecto se reveste deum significado inesperado.

    Gondarem 2(1999-2001)

    Em Gondarem 2 o facto de odono da obra ter sido o primei-ro proprietrio da casa deGondarem 1, evita a sequela deum tipo de construo com aqual, tanto ele como ns, no nossentamos particularmente iden-tificados.

    No entanto o fascnio pelamadeira era comum j nessa altu-

    ra, tornando o desafio, tantopara os projectistas como parao dono da obra, um aliciantepotenciador do resultado final.

    Do ponto de vista da nossaopo plstica e esttica desen-volvemos a proposta no interiorde uma forma rectangular pura.Contentora em si, dos cheios evazios, negativos e positivos,resultantes dos espelhos e refle-xos que estruturam a interacodo seu programa interno com afora da natureza envolventeexterior.

    Em termos operativos a pro-posta de execuo, pela suaespecificidade tcnica, limitou apossibilidade de escolha aonvel das empresas habilitadaspara a executar.

    Igualmente ao nvel do projectode execuo a escolha daempresa e o sistema construti-vo disponibilizado condicionarama modulao e estruturaofinais do projecto.

    Tal no obstou a que o resul-tado final fosse rigorosamente odesejado, sublinhando-se ofacto de a empresa ter tido a

    capacidade e competncianecessrias para uma eficazpreparao da obra, incluindotodos os desenhos de produoespecficos para a sua monta-gem, tornando perfeita a nossacooperao ao longo da obra.

    Neste caso no estamos afalar somente de obra seca,estamos a falar de uma obra semcarpinteiros em que o "esqueleto"mecnico da casa aparece empainis pr-fabricados, e monta-se em trs ou quatro dias sem

    chuva. Montadores especiali-zados substituem os carpintei-ros pelo menos at fase dosacabamentos finais.

    O sistema est modulado numgrelha regular de 1,25x1,25 mtspara uma altura mxima de 2,50mts que neste caso foi alteradopara 2,80 mts.

    As paredes interiores e exte-riores so executadas em painissandwich pr-fabricados emsistema homologado e certificadopela empresa, a sua espessura

    final ronda os 11,00 e 15,00cms, respectivamente.

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    A inovao relativamente aosistema homologado reside naopo plstica dos revestimen-tos finais interior e exteriores.Chapas de contraplacado debtula, cortadas em obra e pos-teriormente envernizadas cornatural pelo interior. Tendo sido

    executado o mesmo procedi-mento pelo exterior mas comvelatura, acabamento e sela-gem de topos, executados nafbrica de origem finlandesa.Interiormente estamos a falarde fixao por colagem, noexterior de placagem ventiladacom fixao aparente.

    O resultado final minimalis-ta obrigando a que a obra tenha

    de integrar alguns mveis na suaconcepo, dada a dificuldadede contrariar a sua fora plsti-ca essencialmente resultanteda uniformidade e beleza natu-ral da madeira utilizada nosinteriores.

    Pelo facto de no utilizarmos

    madeira macia aparente pode-r dizer-se que a sua fora tec-tnica no comparvel Casade Gondarem 1, que a sua inte-grao paisagstica atrevidadesafia a envolvente prxima, eno entanto inegvel que asua presena fixa um ponto napaisagem de Gondarem ao qualno somos indiferentes. Comotambm ser inegvel admitir que

    a sua vivncia obrigatoria-mente contempornea e livrede rusticidade.

    Cristelo 1 e 2(2003-2004)

    Como nas fbulas, a nossa pro-

    fisso feita de crculos que sevo fechando e sobrepondo.Dessa sobreposio resulta a ine-vitvel sedimentao, que pode-r apresentar cristalizao sufi-ciente que conduza sublima-o de conceitos.

    Passados quase dez anossobre a obra de Gondarem1, numdesses crculos de sedimentaovoltamos a trabalhar com o

    mesmo investidor A ideia amesma, mas parece ter havidode parte a parte a necessriasedimentao e sublimao.

    Assim, voltamos a utilizar amadeira macia de criptomria,recuperamos o sistema integralde construo em madeira maci-

    a e o seu aroma perfumado,aperfeioam-se os entalhes e asligaes, abandonam-se osmontadores e recuperam-se oscarpinteiros.

    Programa-se a obra ao por-menor e cortam-se os troncos naserrao situada em Rabo dePeixe nos Aores; faz-se umensaio de pr-montagem nointerior de um armazm; des-monta-se tudo e despacha-setoda a madeira num contentor porvia martima.

    A aventura recomea emCristelo na encosta de Moledocom o oceano como horizontee neste caso tambm smboloda distncia que separa umaideia inicial de uma realidadeconstruda.

    Cristelo 1 e 2 so duas habi-taes que se potenciam pelaproximidade e semelhana,repartem os espaos comuns ependuram-se no mesmo muro,aladas sobre o oceano. Cristelo2 deriva da primeira j em cons-

    truo por se tratar de umatipologia evoluda para T3.