construcao memoria 2010

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  • Biblioteca Digital da Cmara dos Deputados

    Centro de Documentao e Informao

    Coordenao de Biblioteca

    http://bd.camara.gov.br

    "Dissemina os documentos digitais de interesse da atividade legislativa e da sociedade.

  • Cmara dos Deputados 10srie Cadernosdo Museu n 10a co

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    tria

    Braslia, 2010

    srie Cadernos do Museu n 10

    a construo damemria nacional:

    os Heris noPanteo da Ptria

  • Mesa da Cmara dos Deputados53 Legislatura 4 Sesso Legislativa2010

    PresidenteMichel Temer

    1o Vice-PresidenteMarco Maia

    2o Vice-PresidenteAntonio Carlos Magalhes Neto

    1o SecretrioRafael Guerra

    2o SecretrioInocncio Oliveira

    3o SecretrioOdair Cunha

    4o SecretrioNelson Marquezelli

    Suplentes de Secretrio

    1o SuplenteMarcelo Ortiz

    2o SuplenteGiovanni Queiroz

    3o SuplenteLeandro Sampaio

    4o SuplenteManoel Junior

    Diretor-GeralSrgio Sampaio Contreiras de Almeida

    Secretrio-Geral da MesaMozart Vianna de Paiva

  • a construo damemria nacional:

    os Heris noPanteo da Ptria

    Centro de Documentao e InformaoEdies Cmara

    Braslia 2010

    Cmara dos Deputados

  • CMARA DOS DEPUTADOS

    DIRETORIA LEGISLATIVADiretor: Afrsio Vieira Lima Filho

    CENTRO DE DOCUMENTAO E INFORMAODiretor: Adolfo C. A. R. Furtado

    COORDENAO EDIES CMARADiretora: Maria Clara Bicudo Cesar

    COORDENAO DE PRESERVAO DE BENS CULTURAISDiretor: Francisco Carvalho

    CONSULTORIA LEGISLATIVADiretor: Ricardo Jos Pereira Rodrigues

    Pesquisa histrica: Guilherme Lima e Carina CalheirosProjeto grfico: Paula Scherre e Renata HomemDiagramao e capa: Cibele Marinho PazReviso: Seo de Reviso e IndexaoImagens da capa: COBEC/Setor de Digitalizao

    Cmara dos DeputadosCentro de Documentao e Informao CediCoordenao Edies Cmara CoediAnexo II Praa dos Trs PoderesBraslia (DF) CEP 70160-900Telefone: (61) 3216-5809; fax: (61) [email protected]

    SRIECadernos do Museu

    n. 10

    Dados Internacionais de Catalogao-na-publicao (CIP)Coordenao de Biblioteca. Seo de Catalogao.

    A construo da memria nacional : os heris no Panteo da Ptria. Braslia : Cmara dos Deputados, Edies Cmara, 2010. 119 p. (Srie cadernos do museu ; n. 10)

    ISBN 978-85-736-5762-3 Exposio comemorativa da Semana da Ptria.

    1. Heri, biografia, Brasil. 2. Heri, exposio, Brasil. 3. Brasil, histria. I. Srie.

    CDU 929(81)

    ISBN 978-85-736-5761-6 (brochura) ISBN 978-85-736-5762-3 (e-book)

  • ~ SUMRIO ~

    Apresentao para a Exposio Comemorativa da Semana da Ptria: Os Heris Nacionais no Panteo da Ptria ..............71. A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria ...............................................9

    Introduo ............................................................................. 9O que um Panteo? ............................................................12O Panteo na Histria: O Culto Cvico aos Grandes Homens ....................................13Os Pantees na Histria do Brasil ........................................15

    O Panteo ao Fundador da Repblica Benjamin Constant ...... 15

    O Panteo dos Andrada ................................................................. 16

    O Panteo dos Inconfidentes ......................................................... 16

    O Panteo de Caxias ...................................................................... 18

    A Capela Imperial ......................................................................... 18

    O Panteo da Liberdade e da Democracia Tancredo Neves .....................................................................19Os Heris no Panteo da Ptria ...........................................21

    Alferes Joaquim Jos da Silva Xavier ............................................ 21

    Marechal Manoel Deodoro da Fonseca ......................................... 22

    Zumbi dos Palmares ....................................................................... 22

    D. Pedro I ........................................................................................ 22

    Plcido de Castro ........................................................................... 22

    Lus Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias ............................ 22

    Almirante Joaquim Marques Lisboa, Marqus de Tamandar .... 22

    Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes ............................ 22

  • Almirante Barroso .......................................................................... 23

    Jos Bonifcio de Andrada e Silva ................................................. 23

    Marechal do Ar Alberto Santos Dumont ...................................... 23

    Frei Joaquim do Amor Divino Rabelo, .......................................... 23

    Marechal Osorio ............................................................................. 23

    Ildefonso Pereira Correia ............................................................... 23

    Antnio de Sampaio, o Brigadeiro Sampaio ................................. 23

    Sep Tiaraju .................................................................................... 24

    Anna Justina Ferreira Nery ........................................................... 24

    Padre Jos de Anchieta ................................................................... 24

    Jos Hiplito da Costa Furtado de Mendona .............................. 24

    Guisa de Concluso: Quem Faz a Histria? ...........................................................26

    2. Os Heris Nacionais: Biografia ...........................................31Tiradentes (16/8/1746 21/4/1792) ............................................. 31

    Marechal Deodoro da Fonseca (5/8/1827 23/8/1892) ............... 35

    Zumbi dos Palmares (1655 20/11/1695) .................................... 37

    D. Pedro I (12/10/1798 24/9/1834) ............................................ 41

    Plcido de Castro (12/12/1873 9/8/1908) .................................. 44

    Duque de Caxias (25/8/1803 7/5/1880) .................................... 47

    Marqus de Tamandar (13/12/1807 29/3/1897) ..................... 50

    Chico Mendes (15/12/1944 22/12/1988) ................................... 52

    Almirante Barroso (29/9/1804 8/8/1882) .................................. 54

    Jos Bonifcio (13/6/1763 6/4/1838) .......................................... 56

    Marechal do Ar Alberto Santos Dumont (20/7/1873 23/7/1932) ................................................................ 59

    Frei Caneca (20/8/1779 13/1/1825) ........................................... 65

    Marechal Osorio (10/5/1808 4/10/1879) ................................... 69

    Baro do Serro Azul (6/8/1847 20/5/1894) ............................... 72

  • Brigadeiro Sampaio (10/5/1810 6/7/1866) ................................ 74

    Sep Tiaraju (17? 7/2/1756) ....................................................... 77

    Anna Nery (13/12/1814 20/5/1880) .......................................... 80

    Jos de Anchieta (19/3/1534 9/6/1597) ...................................... 83

    Hiplito Jos da Costa Pereira Furtado de Mendona (13/8/1774 11/9/1823) ........................................ 86

    3. Referncias .........................................................................89Anexo .....................................................................................97Ficha Tcnica .......................................................................118

  • 6

  • 7A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Apresentao para a Exposio Comemorativa da Semana da Ptria: Os Heris Nacionais no Panteo da Ptria

    Uma nao mais do que um territrio habitado por uma po-pulao. Ela se constri a partir da existncia de valores comuns e da luta de seu povo para manter e reforar esses ideais que cons-tituem e definem sua prpria identidade. As civilizaes antigas costumavam venerar seus deuses construindo templos e pantees em sua homenagem. As naes modernas, por sua vez, honram os homens que dedicam em alguns casos at sacrificam suas vidas independncia e ao fortalecimento de seu territrio, de sua gente e dos valores que lhes so caros.

    A criao de um panteo em reconhecimento aos heris brasilei-ros, defendida desde 1891 e concretizada quase um sculo depois, em pleno processo de redemocratizao, trouxe para o corao da Rep-blica a lembrana eterna de personagens fundamentais para a con-solidao da nao que conhecemos e amamos, inscrevendo de ma-neira indelvel na histria suas contribuies para a Ptria brasileira.

    Cabe ao Parlamento propor e analisar a inscrio de novas biografias no Livro dos Heris da Ptria. Mas tambm papel da Cmara dos Deputados promover a renovao do interesse da po-pulao na prpria existncia do Panteo da Ptria, na histria de sua construo e nos feitos dos cidados que l esto eternizados.

    O reconhecimento aos heris refora o conceito de nao e da prpria cidadania. Os povos que conhecem e reverenciam os seus antepassados tm conscincia de suas potencialidades e se empe-nham na construo de um futuro melhor para seus sucessores.

    o que estamos fazendo neste momento, por oportunidade da celebrao do 188 aniversrio da nossa Independncia, com a re-alizao, pelo Museu da Cmara dos Deputados, da EXPOSIO COMEMORATIVA DA SEMANA DA PTRIA A CONSTRU-O DA MEMRIA NACIONAL: OS HERIS NO PANTEO DA PTRIA.

  • 8

  • 9A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    1. A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Ricardo Ori1

    Introduo

    Nos ltimos anos, no contexto da renovao da historiografia brasileira, surgiram diversos estudos e pesquisas com novas inter-pretaes e abordagens acerca do papel da memria na construo da identidade nacional. O presente texto objetiva contribuir para o entendimento da memria e da sacralizao do passado como elementos de afirmao da identidade da nao tendo como refe-rncia a exposio temporria, realizada sob os auspcios do Museu da Cmara dos Deputados, intitulada A Construo da Memria 1 Historiador e advogado. Mestre em Direito Pblico pela Faculdade de Direito da Univer-

    sidade Federal do Cear (UFC), onde foi professor do Departamento de Histria. Doutor em Histria da Educao pela Universidade de So Paulo (USP). Autor de livros didticos para o ensino fundamental e de artigos em revistas especializadas sobre ensino de hist-ria e preservao do patrimnio histrico. Atualmente, consultor legislativo da rea de Educao e Cultura da Cmara dos Deputados. tambm 2 secretrio da Associao Brasileira do Ensino de Histria (ABEH) e membro do Conselho Fiscal da Associao Nacional de Histria ncleo regional do Cear (ANPUH-CE).

    CARVALHO, Olavo de (org). O exrcito na histria do Brasil. Rio de Janeiro : Bibliex; Salvador : Obebrecht, 1998. v. 2, p. 208.

  • 10

    Cadernos do Museu n 10

    Nacional: os Heris no Panteo da Ptria. Como bem assinalou o historiador francs Pierre Nora, celebraes, comemoraes, rituais cvicos, esttuas, monumentos histricos e pantees cons-tituem, por excelncia, o que ele convencionou denominar de lu-gares de memria2.

    Tomamos, portanto, como objeto da exposio um lugar de memria da nacionalidade brasileira e pouco conhecido da gran-de maioria da populao. Trata-se do Panteo da Liberdade e da Democracia Tancredo Neves, mais conhecido como Panteo da Ptria, localizado na capital da Repblica. O Panteo da Ptria foi construdo para ser um monumento inspirado nos ideais de liber-dade e democracia do ex-presidente Tancredo Neves. Sua inau-

    2 Para Nora, Os lugares de memria nascem e vivem do sentimento [de] que no h mem-ria espontnea, que preciso criar arquivos, que preciso manter aniversrios, organizar celebraes, pronunciar elogios fnebres, notariar atas, porque essas operaes no so naturais. (...) Os lugares de memria so, antes de tudo, restos. Ele classifica esses lugares de memria em trs categorias: lugares topogrficos (arquivos, bibliotecas, monumentos, museus), lugares simblicos (comemoraes, aniversrios, emblemas, smbolos nacionais) e lugares funcionais (manuais didticos, autobiografias, associaes). NORA, Pierre. Entre memria e histria: a problemtica dos lugares. In: Histria e Cultura. Projeto Histria (Revista do Programa de Estudos Ps-Graduados em Histria do Departamento de Hist-ria da PUC-SP), So Paulo, n. 10, dez. 1993, p. 13.

    DISTRITO FEDERAL (BRASIL). Arquivo Pblico. Braslia : patrimnio cultural da humanidade; projeto Braslia 50 anos. Braslia : GDF, Sec. do Est. de Cultura, 2010.

    Foto Luiz Neto

  • 11

    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    gurao se deu no dia 7 de setembro de 1986, em aluso data mxima da nacionalidade, e nele se encontra o Livro dos Heris da Ptria, onde ficaro gravados para a eternidade os nomes dos que combateram e morreram para que todos os brasileiros fossem livres em sua ptria soberana (PANTEO DA PTRIA, folheto explicativo). Nesse livro j esto inscritos os nomes de Tiradentes, Marechal Deodoro da Fonseca, Zumbi dos Palmares, D. Pedro I, Plcido de Castro, Duque de Caxias, entre outros fruto de proje-tos de lei que tramitaram no Congresso Nacional.

  • 12

    Cadernos do Museu n 10

    O que um Panteo?

    A palavra panteo deriva de pan (todo) e thos (Deus) e signi-fica o templo dedicado a todos os deuses. Um dos antigos pante-es com essa finalidade de que se tem conhecimento o Panteo de Prgamo, na Grcia antiga. Esses templos eram dedicados aos deuses da mitologia de cada regio; por isso existia um panteo egpcio, um panteo grego, entre outros.

    Com a propagao do monotesmo no Ocidente, o espao pas-sou a ser dedicado s pessoas que engrandeceram sua ptria atravs de seus feitos. No Brasil, temos alguns pantees mais conhecidos, como o Panteo dos Andrada, em Santos-SP; o Panteo de Du-que de Caxias, no Rio de Janeiro-RJ; o Panteo dos Inconfiden-tes, tambm conhecido como Museu da Inconfidncia, em Ouro Preto-MG; a Capela Imperial, em So Paulo-SP; alm do Panteo da Ptria e da Liberdade Tancredo Neves, com o Livro de Ao dos Heris da Ptria, em Braslia.

    No mundo, destacam-se outros importantes pantees. Um dos mais antigos e em bom estado de conservao o que se situa em Roma, conhecido como o Panteo de Agripa, construdo no ano 27 a.C. e, aps o incndio de 80 d.C., reconstrudo no ano 125. Tem-se tambm o Panteo de Paris, que foi encomendado por Lus XV em 1764. O Panteo Nacional, formado pela Igreja de Santa Engrcia e o Mosteiro de Santa Cruz, localiza-se em Lisboa, e passou a ter essa funo em 1916. Tambm em Portugal localiza-se o conhecido Panteo dos Bragana, lugar onde descansam muitos dos monarcas e prncipes da quarta e ltima dinastia real portuguesa.

    Em vrios outros pases do mundo, monumentos foram constru-dos com a finalidade de homenagear seus benfeitores e proporcio-nar aos visitantes o reconhecimento dos seus heris nacionais.

  • 13

    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    O Panteo na Histria: O Culto Cvico aos Grandes Homens

    A ideia de glorificar os feitos e realizaes dos governantes re-monta s primeiras civilizaes da Antiguidade. Em Roma, cons-truiu-se um templo com o objetivo de ser consagrado a todos os deuses. Era o Pantheon. No decorrer da histria, o panteo passou a designar o local onde se depositavam os restos mortais de ho-mens ilustres e notveis que prestaram grandes servios ptria.

    Na Frana, em 1791, o processo revolucionrio transformou a Igreja de Santa Genoveva no panteo moderno, como forma de cultuar os grandes homens, com a legenda Aos grandes homens, a Ptria reconhecida. Assim, os deuses e santos so substitudos pelos heris nacionais3.

    Segundo relatos do ento governador do Distrito Federal, Jos Aparecido de Oliveira, no Brasil a ideia de construo do Panteo surgiu no Palcio do Planalto, quando da realizao das cerimnias 3 Sobre a histria do panteo na cultura ocidental, em especial na Frana, consultar BONNET,

    Jean-Claude. Naissance du Panthon: essai sur le culte des grands hommes. Paris: Fayard, 1998.

    CARR, Adam. Panteo, em Roma, Itlia. Disponvel em http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Ac.pantheon1.jpg. Acesso em 27-7-2010.

  • 14

    Cadernos do Museu n 10

    fnebres diante do corpo do presidente Tancredo Neves alado pe-los braos de jovens soldados do Exrcito Nacional. Na Praa dos Trs Poderes, com a concepo arquitetnica inovadora de Oscar Niemeyer, construiu-se, sob o formato de uma pomba, um monu-mento inspirado nos ideais de liberdade e democracia.

    LES Grands Hommes du Panthon. Paris: Ed. du patrimoine, 1999. p. 8.

  • 15

    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Os Pantees na Histria do Brasil

    O Panteo ao Fundador da Repblica Benjamin Constant

    No decorrer de nosso processo histrico, j existiram ideias e propostas acerca da construo de pantees cvicos em homena-gem a determinadas figuras da histria da ptria. Algumas delas surgiram no mbito de discusses no Congresso Nacional.

    Foi o caso da proposta do deputado Aristides Lobo por ocasio dos debates da Assembleia Constituinte de 1890-1891. Como for-ma de homenagear um dos prceres do movimento republicano, Lobo props a criao de um panteo ao fundador da Repblica, Benjamin Constant (1836-1891), conforme relato em tribuna de outro deputado, o Sr. Baptista da Motta:

    No dia seguinte ao da morte deste grande brasileiro republicano, em plena sesso da Constituinte, o saudoso deputado Aristides Lobo apresentou ao Congresso a seguinte indicao, e para essa indicao que eu peo a V.Exa. faa com que a comisso d o parecer respectivo. Entre outros, o art. 3, a que me refiro, diz o seguinte:

    Que seja criado um panteo em honra aos grandes homens da ptria bra-sileira, onde sero inumados os que assim bem merecerem da ptria, con-forme decretarem os futuros Congressos, sendo desde j indicado o Dr. Ben-jamin Constant. (MOTTA, Baptista da. Sesso da Cmara dos Deputados, 9 de novembro de 1911)

    A medida proposta pelos deputados constituintes de 1891 d continuidade criao de uma simbologia para o recm-instalado regime republicano, que necessitava de signos e imagens para sua legitimao perante a sociedade. Nesse sentido, as palavras da his-toriadora Valria Salgueiro so bastante elucidativas:

    O Congresso Constituinte republicano punha em prtica, dessa forma, o princpio positivista de venerao cvica atravs do culto a homens ilustres em substituio adorao dos santos catlicos, erguendo-lhes um panteo do mesmo modo que tradicionalmente se erguiam templos s divindades

  • 16

    Cadernos do Museu n 10

    mticas religiosas. Seguiam, assim, o princpio de Augusto Comte de que os vivos so sempre, e cada vez mais, governados pelos mortos.4

    Embora no tenha sido, de fato, criado um panteo cvico em homenagem aos grandes homens da histria do Brasil, sendo o primeiro a ser alado a essa condio Benjamin Constant, a Cons-tituio de 1891 determinou, em seu art. 8 das Disposies Tran-sitrias, que: O governo federal adquirir para a nao a casa em-que faleceu o Dr. Benjamin Constant Botelho de Magalhes e nela mandar colocar uma lpide em homenagem memria do grande patriota o fundador da Repblica.

    O monumento a Benjamin Constant s foi inaugurado em 1926 e hoje se encontra no Campo de Santana, na cidade do Rio de Ja-neiro, local em que se deu a proclamao da Repblica.

    O Panteo dos Andrada

    Inaugurado em 7 de setembro de 1923, est localizado na Pra-a Baro do Rio Branco n 16, prximo Igreja do Carmo, em Santos-SP. Nele situam-se os restos mortais de Jos Bonifcio e de seus irmos Martin Francisco e Antnio Carlos. Consagrado memria desses trs grandes personagens, o panteo recebe, du-rante todo o ano, visitantes brasileiros e estrangeiros que para l se dirigem a fim de conhecerem a histria do Brasil, que contou com a participao desses trs vultos imortais.

    Na historiografia brasileira, Jos Bonifcio considerado o grande articulador de nossa emancipao poltica, tendo sido con-sagrado com o epteto de O Patriarca da Independncia. Seu nome tambm est inscrito no Livro dos Heris da Ptria.

    O Panteo dos Inconfidentes

    O Governo Vargas reforou a construo do mito do heri nacio-nal em torno de Tiradentes e dos demais inconfidentes, j iniciado desde os primeiros governos da Repblica. Por decreto presidencial 4 SALGUEIRO, Valria. De pedra e bronze: um estudo sobre monumentos. O monumento

    a Benjamin Constant. Niteri: Editora da Universidade Federal Fluminense, 2008, p. 100.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    de 1936, Vargas determina que os restos mortais dos inconfidentes, degredados para a frica, sejam repatriados e depositados em Ouro Preto, em culto cvico nacional. Assim, foi inaugurado em 21 de abril de 1942, em lembrana dos 150 anos da decretao da sentena con-denatria dos inconfidentes, o Museu da Inconfidncia, com a insta-lao do panteo, que abriga 14 lpides funerrias, 13 ocupadas pelas ossadas dos inconfidentes repatriadas do continente africano e uma vazia, dedicada aos participantes do movimento cujos corpos no foram localizados.

    O Museu da Inconfidncia est situado na Praa Tiradentes, na antiga Casa de Cmara e Cadeia de Vila Rica, atual Ouro Preto, Minas Gerais, em belssimo prdio remanescente da arquitetura barroca colonial do sculo XVIII. Alm dos despojos dos incon-fidentes, o panteo tambm abriga o tmulo de Maria Dorotia Joaquina de Seixas, a clebre Marlia de Dirceu, do poeta Tomz Antnio Gonzaga, e um memorial fnebre de Brbara Heliodora da Silveira, esposa e incentivadora de Alvarenga Peixoto.

    Dos inconfidentes mineiros, apenas o nome de Tiradentes est inscrito no Livro dos Heris da Ptria. Alm de heri nacional por excelncia, Tiradentes tambm considerado patrono da nao brasileira (Lei n 4.897, de 1965).

    A historiadora da arte Maria Alice Milliet sintetiza, com muita propriedade, esse momento de nossa histria com a inaugurao do Museu da Inconfidncia e a consagrao de Tiradentes como o verdadeiro mrtir da nao brasileira. Diz ela:

    Enfim a redeno! Ainda que mortos, retornam os inconfidentes terra da qual saram prisioneiros. So agora heris. Em torno do mausolu e do mu-seu constri-se um cenrio maior. O propsito de recuperar o passado colo-nial para integr-lo cultura nacional e de faz-lo reunindo histria e arte converte-se numa das mais eficientes realizaes de patrimnio durante o Estado Novo. Nessa construo, o Museu da Inconfidncia de Ouro Preto pedra fundamental. Primeiro museu institudo fora da capital federal, o

  • 18

    Cadernos do Museu n 10

    SPHAN associa arquitetura, obras de arte e documentos histricos a fim de configurar uma memria e fundar uma tradio.5

    O Panteo de Caxias

    Inaugurado em 1949, est localizado na Avenida Presidente Vargas, no Rio de Janeiro-RJ, em frente ao prdio do antigo Minis-trio da Guerra. Alm de abrigar os restos mortais de Lus Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias, e os de sua esposa Ana Luisa de Loreto Carneiro Viana, duquesa consorte de Caxias, no panteo encontram-se a biografia do patrono do Exrcito e alguns de seus objetos, tais como o sabre recebido pela vitria na Guerra do Para-guai, uma coroa ducal feita em 1950, lpides e insgneas.

    Duque de Caxias6 considerado o patrono do Exrcito brasilei-ro, e no dia de seu nascimento 25 de agosto comemorado o Dia do Soldado.

    A Capela Imperial

    Construda em 1952, est localizada no Monumento Indepen-dncia (1922), que fica s margens do Riacho do Ipiranga, em So Paulo. Abriga os restos mortais de D. Pedro I, de sua primeira es-posa, a imperatriz Leopoldina, e de sua segunda esposa, D. Amlia, todos trasladados de Lisboa por ocasio das comemoraes alusi-vas aos 150 anos da Independncia do Brasil, fato celebrado com pompa pelo regime militar em 1972. Sobre a lpide que encerra os despojos do imperador h a imagem da coroa imperial, uma repro-duo da espada usada em 7 de setembro de 1822 e a representao simblica da primeira Constituio poltica do Brasil, outorgada em 1824. Os visitantes deparam-se com imponente decorao e com o histrico da famlia real portuguesa.

    5 MILLIET, Maria Alice. Tiradentes: o corpo do heri. So Paulo: Martin Fontes, 2001, p. 123-124.

    6 Sobre o culto cvico a Caxias, consultar os excelentes trabalhos da historiadora SOUZA, Adriana Barreto de. Duque de Caxias: o homem por trs do monumento. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2008, e Um heri para a juventude: o Duque de Caxias nas biogra-fias e livros didticos. In: ROCHA, Helenice et al. A escrita da histria escolar: memria e historiografia. Editora FGV, 2009.

  • 19

    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    O Panteo da Liberdade e da Democracia Tancredo Neves7

    Em meio ao processo de redemocratizao vivido pelo pas aps o longo regime militar (1964-1985), eis que surge por parte do poder pblico a ideia de construir um monumento histrico de-dicado aos heris nacionais. A ideia ganha fora na ao do ento governador do Distrito Federal, Jos Aparecido de Oliveira, como forma de prestar uma homenagem pstuma ao ex-presidente Tan-credo Neves, que morreu antes de assumir o cargo maior do pas.

    O Panteo da Liberdade e da Democracia Tancredo Neves, cria-do por Oscar Niemeyer e localizado na Praa dos Trs Poderes, em Braslia, foi inaugurado em 7 de setembro de 1986 e apresenta uma arquitetura modernista que simboliza uma pomba.

    Segundo o Instituto de Arquitetos do Brasil Departamento do Distrito Federal (IAB-DF):

    7 Atualmente o monumento passa por reformas, com a finalidade de atender cada vez me-lhor os brasileiros que ali vo para conhecer um pouco mais sobre a histria do Brasil.

    Panteo da Liberdade e da Democracia Tancredo Neves, em Braslia.

    Foto Luiz Neto

  • 20

    Cadernos do Museu n 10

    O conjunto do Panteo da Liberdade e da Democracia foi criado para come-morar a redemocratizao do pas, registrar a morte de Tancredo Neves e ho-menagear os heris nacionais, especialmente Tiradentes. Inaugurado em 7 de setembro de 1986, o monumento tem forma nica. Para alguns, quando visto de frente, lembra uma pomba (ou duas); para outros, sugere dois troncos de pirmides, invertidos e engastados. O volume opaco, todo revestido de placas de mrmore, apenas rasgado em uma de suas faces pelo vitral de Marianne Peretti. A construo foi implantada na campina circunvizinha da Praa dos Trs Poderes e a ela ligada por meio de uma passarela.

    No interior, bastante escuro e cerimonioso, um hall de distribuio (com mural de Athos Bulco), um pequeno auditrio inferior e o salo superior (com o painel Inconfidncia Mineira, de Joo Cmara, e o Livro de Ao, onde esto registrados os nomes dos Heris da Ptria).

    Complementando o conjunto, Niemeyer projetou quatro grandes elementos escultricos, que foram distribudos na campina: o Monumento do Fogo Sim-blico, ou Pira da Ptria, e trs painis curvos que segundo os guias locais representam Exrcito, Marinha e Aeronutica a proteger nossa democracia.8

    8 GUIA DE OBRAS DE OSCAR NIEMEYER: Braslia 50 anos. Braslia: Instituto dos Arqui-tetos do Brasil: Cmara dos Deputados, Edies Cmara, 2010, p. 78.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Os Heris no Panteo da Ptria

    Diferentemente de outros pantees cvicos, o Panteo da Ptria e da Liberdade Tancredo Neves no contm os restos mortais dos heris nacionais. L est o Livro dos Heris da Ptria, com o nome dos brasileiros que, com abnegao e coragem, sobressaram-se em seus ofcios em favor do pas.

    Os nomes dos homenageados esto inscritos nesse livro de ao, no qual lhes concedido o atributo de Heris da Ptria. Consta, em cada pgina de metal, seus nomes e suas biografias.

    O trabalho de cada parlamentar contribuiu de forma honrosa para o reconhecimento de cada brasileiro na imagem desses cita-dos heris. O seu empenho legislativo confluiu na construo da identidade nacional e na demonstrao dos ideais da democracia e liberdade que afloraram no Brasil desde sculos anteriores.

    A partir da Lei n 11.597, de 29 de novembro de 2007 (Projeto de Lei n 6.345/2005, de autoria do senador Marco Maciel DEM/PE), a inscrio no Livro dos Heris da Ptria passa a ser regula-mentada por alguns critrios bsicos. A escolha dever se proposta por lei, decorridos 50 (cinquenta) anos da morte ou da presuno de morte do homenageado, exceo de brasileiros mortos ou pre-sumidamente mortos em campo de batalha.

    At o momento, os seguintes brasileiros tm status de Heris da Ptria:

    Alferes Joaquim Jos da Silva Xavier

    Includo pela Lei n 7.919, de 11 de dezembro de 1989, converti-da da Medida Provisria n 105, de 13 de novembro de 1989, de autoria do presidente Jos Sarney, por ocasio do bicentenrio da Inconfidncia Mineira.

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    Marechal Manoel Deodoro da FonsecaIncludo pela Lei n 7.919, de 11 de dezembro de 1989, conver-tida da Medida Provisria n 105, de 13 de novembro de 1989, de autoria do presidente Jos Sarney, por ocasio do centsimo aniversrio da proclamao da Repblica.

    Zumbi dos PalmaresIncludo pela Lei n 9.315, de 20 de novembro de 1996 (Projeto de Lei n 1.911/1996, de autoria da deputada Benedita da Silva PT/RJ), por ocasio do tricentenrio de sua morte

    D. Pedro I

    Includo pela Lei n 9.828, de 30 de agosto de 1999 (Projeto de Lei n 4.419/1998, de autoria do Poder Executivo), por ocasio do bicentenrio de seu nascimento.

    Plcido de Castro

    Includo pela Lei n 10.440, de 2 de maio de 2002 (Projeto de Lei do Senado n 56/2000, de autoria do senador Tio Viana PT/AC).

    Lus Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias

    Includo pela Lei n 10.641, de 28 de janeiro de 2003 (Projeto de Lei do Senado n 82/2001, de autoria do senador Maguito Vilela PMDB/GO), por ocasio do bicentenrio de seu nascimento.

    Almirante Joaquim Marques Lisboa, Marqus de Tamandar

    Includo pela Lei n 10.796, de 5 de dezembro de 2003 (Projeto de Lei do Senado n 17/2003, de autoria do senador Maguito Vilela PMDB/GO).

    Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes

    Includo pela Lei n 10.952, de 22 de setembro de 2004 (Projeto de Lei do Senado n 326/1999, de autoria da senadora Marina Silva PT/AC). Deve-se salientar que essa aprovao anterior Lei n 11.597/2007, que estipula a obrigatoriedade de o home-nageado ter morrido h pelo menos 50 (cinquenta) anos para a insero do nome no livro de ao.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Almirante BarrosoIncludo pela Lei n 11.120, de 25 de maio de 2005 (Projeto de Lei n 955/2003, de autoria do deputado Elimar Mximo Da-masceno PRONA/SP), por ocasio do 140 aniversrio da Ba-talha Naval do Riachuelo.

    Jos Bonifcio de Andrada e SilvaIncludo pela Lei n 11.135, de 19 de julho de 2005 (Projeto de Lei n 5.873/2001, de autoria da deputada Telma de Souza PT/SP), por sua contribuio libertao do Brasil do jugo colo-nial portugus.

    Marechal do Ar Alberto Santos DumontIncludo pela Lei n 11.298, de 9 de maio de 2006 (Projeto de Lei do Senado n 70/2003, de autoria do senador Aelton Freitas PL/MG), por ocasio do centenrio do voo do 14 Bis.

    Frei Joaquim do Amor Divino Rabelo,O Frei Caneca, includo pela Lei n 11.528, de 11 de outubro de 2007 (Projeto de Lei do Senado n 306/2004, de autoria do senador Marco Maciel DEM/PE).

    Marechal OsorioIncludo pela Lei n 11.680, de 27 maio de 2008 (Projeto de Lei n 1.140/2007, de autoria do deputado Bonifcio de Andrada PSDB/MG), por sua defesa aos interesses nacionais em impor-tantes conflitos.

    Ildefonso Pereira CorreiaO Baro de Serro Azul, includo pela Lei n 11.863, de 15 de dezembro de 2008 (Projeto de Lei do Senado n 354/2004, de autoria do senador Osmar Dias PDT/PR).

    Antnio de Sampaio, o Brigadeiro SampaioIncludo pela Lei n 11.932, de 24 de abril de 2009 (Projeto de Lei n 7.282/2006, de autoria do deputado Leandro Vilela PMDB/GO), por sua atuao destacada na maioria das campanhas de manuteno da integridade territorial brasileira.

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    Sep TiarajuIncludo pela Lei n 12.032, de 21 de setembro de 2009 (Projeto de Lei n 5.516/2005, de autoria do deputado Marco Maia PT/RS), por ocasio do 250 aniversrio de sua morte.

    Anna Justina Ferreira NeryIncluda pela Lei n 12.105, de 2 de dezembro de 2009 (Proje-to de Lei do Senado n 294/2007, de autoria da senadora Serys Slhessarenko PT/MT).

    Padre Jos de Anchieta

    Includo pela Lei n 12.284, de 5 de julho de 2010 (Projeto de Lei n 810/2003, de autoria do deputado Elimar Mximo Damasceno PRONA/SP).

    Jos Hiplito da Costa Furtado de Mendona

    Includo pela Lei n 12.283, de 5 de julho de 2010 (Projeto de Lei n 4.401/2001, de autoria do Poder Executivo).

    Desde 1989, quando se deu a primeira inscrio de nomes Ti-radentes e Deodoro da Fonseca no Panteo da Ptria, atravs da Medida Provisria n 105, de 13 de novembro de 1989, por ocasio das comemoraes alusivas ao bicentenrio da morte do Mrtir da Inconfidncia e do centenrio da Repblica no Brasil, temos pre-senciado a iniciativa, por parte do Executivo e de parlamentares, de propor a inscrio de nomes para figurar no Livro dos Heris da Ptria. Hoje, tramitam no Congresso Nacional cerca de 30 projetos de lei sobre o assunto, sem contar aqueles que foram arquivados ao trmino da legislatura anterior sem terem sido apreciados.9

    9 Na presente legislatura, esto sendo propostos para figurar no Livro dos Heris da Ptria os seguintes nomes: Machado de Assis, Joana Anglica, Antnio Camargo de Andrade, Antnio Carlos Gomes, as vinte e duas vtimas do acidente durante o lanamento do VLS-1, Marechal Rondon, Drusio Marcondes de Sousa, Eduardo Francisco Nogueira, Eduardo Gomes, Euclides Miragaia, Getlio Dorneles Vargas, Heitor Villa-Lobos, Joo Batista Mascarenhas de Morais, Joo Cndido Felisberto, Joo de Deus Nascimento, Joaquim Aurlio Barreto Nabuco de Arajo, Conde de So Joo das Duas Barras, Jos Gomes Pinheiro Machado, Baro do Rio Branco, Jos Vieira Couto de Magalhes, Jlio Csar Ribeiro de Sousa, Lucas Dantas Torres, Lus Gonzaga das Virgens, Manuel Faustino dos Santos Lira, Maria Quitria de Jesus, Mrio Kozel Filho, Mrio Martins de Almeida, Osvaldo Gonalves Cruz, Padre Roberto Landell de Moura, Srgio Vieira de Melo, os seringueiros soldados da borracha e Vital Brasil Mineiro da Campanha.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Isso se deve em grande parte, no nosso entender, falta de de-finio de critrios mais precisos, apesar da Lei n 11.597, de 2007, que dispe sobre a inscrio de nomes no Livro dos Heris da Ptria. Falta uma maior discusso com os diferentes segmentos da sociedade sobre quem deve ocupar lugar de destaque no panteo nacional. No nosso entendimento, em razo dos inmeros projetos de lei apresentados que sugerem a inscrio de nomes para figu-rar no Livro dos Heris da Ptria, banalizou-se a concesso desse ttulo, e a sociedade brasileira passa ao largo dessa discusso, fican-do sua anlise restrita ao debate parlamentar.

    Se a histria um processo de construo coletiva, toda nao que se preza deve cultuar seus lderes e fatos marcantes de sua his-tria, sem o que no se cria entre os nacionais o sentimento de per-tencimento e identidade. Assim, de certa forma, h determinados setores do governo e da sociedade que veem a instituio de home-nagens a determinadas figuras da histria ptria como instrumento de afirmao da cidadania e de valorizao da identidade nacional.

    Como bem afirmou o historiador Jos Murilo de Carvalho:

    Heris so smbolos poderosos, encarnaes de ideias e aspiraes, pontos de referncia, fulcros de identificao coletiva. So, por isso, instrumentos efica-zes para atingir a cabea e o corao dos cidados a servio da legitimao de regimes polticos. No h regime poltico que no promova o culto de seus heris e no possua seu panteo cvico.

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    Cadernos do Museu n 10

    Guisa de Concluso: Quem Faz a Histria?

    Quem construiu a Tebas das sete portas?

    Nos livros constam os nomes dos reis

    Os reis arrastaram os blocos de pedra?

    (...)

    Tantos relatos

    Tantas perguntas.

    (Bertolt Brecht, Perguntas de um operrio que l)

    Durante muito tempo, o conhecimento histrico produzido a historiografia e seu ensino nas escolas, academias e universida-des privilegiou a figura do heri como sujeito nico e exclusivo do processo histrico10. Essa viso positivista e tradicional da histria, reproduzida nos manuais e compndios didticos, trouxe consequ-ncias danosas para o ensino e a cultura poltica nacional.

    Ao privilegiar a memorizao de datas, fatos histricos e nomes de personagens, o ensino de histria na escola fundamental acabou por incutir nos alunos uma viso de que o seu estudo pouco tem a contribuir para a formao da cidadania de nossas crianas, ado-lescentes e jovens. Reproduziu-se, assim, um ensino de histria que nada a tem a ver com as experincias sociais dos alunos e profes-sores, negando-lhes, portanto, a dimenso de que eles so tambm sujeitos e agentes da transformao da sociedade. Nesse contexto, alunos e professores no percebiam a funo social da histria, ou seja, o quanto o estudo do passado possibilita uma melhor compre-enso do presente por eles vivido.

    10 Conforme MICELI, Paulo. O mito do heri nacional. So Paulo: Contexto, 1988, Coleo Repensando a Histria. Sobre o culto aos heris nacionais, consultar tambm o n 25 da Revista Estudos Histricos do CPDOC, que se dedicou ao tema, bem como FLIX, Loiva,e ELMIR, Cludio (org.). Mitos e heris: construo de imaginrios. Porto Alegre: Ed. Uni-versidade/UFRGS, 1998.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    No mbito da cultura poltica, ao privilegiar o culto figura do heri nacional, criou-se, no imaginrio coletivo da populao brasileira, a ideia de que a soluo para nossos inmeros proble-massociais depende, nica e exclusivamente, da ao isolada de um homem/mulher. Isso est muito presente e enraizado na cultura nacional, sobretudo em poca de eleies, quando grande parcela da populao est espera do salvador da ptria, o heri nacio-nal, que ir nos redimir de nosso passado e nos conduzir a um futuro glorioso.

    Hoje, com o avano terico-metodolgico das cincias sociais e a renovao do ensino de histria, a historiografia contempornea considera que todos fazem a histria, ou seja, todos somos sujeitos histricos. A histria um processo de construo coletiva no qual todos participam: vencedores e vencidos, dominantes e domina-dos, governo e sociedade civil, as minorias tnicas, enfim, os diver-sos segmentos sociais do pas.

    Na produo do conhecimento histrico, que se d sobretudo nos cursos de ps-graduao em Histria das universidades bra-sileiras, a pesquisa realizada por historiadores e demais cientistas sociais tem levado em conta, nas ltimas dcadas, as diversas expe-rincias de vida de homens e mulheres comuns que, no seu cotidia-no de luta e trabalho, constroem a histria deste pas.

    A histria tradicional, que ressaltava a ao isolada e mitificado-ra dos heris nacionais, os feitos, fatos e realizaes dos governantes, est totalmente superada. Como bem disse o poeta Ferreira Gullar:

    A histria humana no se desenrola apenas nos campos de batalha e nos gabinetes presidenciais. Ela se desenrola tambm nos quintais entre plantas e galinhas, nas ruas de subrbios, nas casas de jogos, nos prostbulos, nos colgios, nas usinas, nos namoros de esquinas. Disso eu quis fazer a minha poesia. Dessa matria humilde e humilhada, dessa vida obscura e injustia-da, porque o canto no pode ser uma traio vida, e s justo cantar se o nosso canto arrasta consigo as pessoas e as coisas que no tm voz.

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    Cadernos do Museu n 10

    J a historiadora Silvia Hunold Lara faz uma crtica contunden-te aos monumentos histricos e cvicos11 construdos no decorrer de nossa histria e que glorificam apenas a ao de alguns homens, pertencentes, na sua grande maioria, elite branca letrada:

    Na histria que estamos acostumados a ouvir h sempre grandes homens: heris, mrtires, patriarcas e patronos que so glorificados em pedra e bron-ze, como no Monumento Independncia do Brasil. Austeros, solitrios, brancos e bem nascidos, eles acabam encarnando toda a histria, como se ela pudesse ser feita apenas por poucos indivduos.12

    Uma outra crtica que se pode fazer ao Livro dos Heris da P-tria a quase total ausncia de representantes do sexo feminino. Apenas uma mulher Anna Nery figura no Panteo da Liberda-de e da Democracia. Pergunta-se: onde esto as mulheres que, nos diferentes espaos da sociedade, participaram do processo histri-co nacional?

    Para finalizar, nada como recorrer msica popular brasileira que nos leva reflexo acerca de nosso papel na histria do pas:

    Nosso HeriAh, quem ser o heriDessa nossa Histria

    Que vai tecer o amanh?Quem ser o heriQuem ser a fora

    Que a forca no pode calar?Joo e Maria que se do bom dia Dona Tereza que coloca a mesa o Waldemar que vai trabalhar

    Dona das Dores que nos manda flores o amigo Pedro que j no tem medo

    11 Sobre a construo de monumentos histricos, ver ORI, Ricardo. A histria em praa pblica: a leitura da cidade atravs de seus monumentos histricos. In: Cincias e Letras. Revista da Faculdade Porto-Alegrense de Educao, Cincias e Letras. Porto Alegre, n. 27, jan./jun. 2000.

    12 SO PAULO (cidade). Secretaria Municipal de Cultura. Departamento de Patrimnio Histrico. Ptria amada esquartejada. So Paulo: DPH, 1992, p. 84.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Seu Jos que de muita fQuem ser o heri

    Dessa nova HistriaQuem vai tecer o amanh?

    quem faz cimento, quem carrega areiaQuem amassa o po e ama a lua cheia

    Sabe que a chuva pra se molharJoo e Maria, Waldemar e Pedro

    Joo e Tereza que nossa das DoresJoaquim Jos da Silva Xavier

    Meu povo meu heriEle a fora

    Que a forca no pode calar.

    (msica de Tavinho Moura e Fernando Brant, interpretada por Beto Guedes)

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    2. Os Heris Nacionais: Biografia

    Guilherme Lima13Carina Calheiros14

    Tiradentes (16/8/1746 21/4/1792)

    Se todos quisermos, dizia-nos h quase 200 anos Tiradentes, aquele heri enlouquecido de esperana,

    poderemos fazer deste pas uma grande nao.

    (Tancredo Neves, em 15 de janeiro de 1985)

    A figura de Tiradentes , para ns, singular. nica, mpar. Ele soube morrer como ningum antes tinha sabido ou querido morrer

    para que seu povo pudesse nascer.

    (Oswaldo Aranha)

    13 Graduado em Relaes Internacionais pelo Instituto de Educao Superior de Braslia. tcnico legislativo da Cmara dos Deputados lotado no Museu.

    14 Estagiria de Histria pela Universidade de Braslia lotada no Museu da Cmara dos Deputados.

    Tiradentes diante do carrasco. (MILLIET, Maria Alice. Tiradentes: o corpo do heri. So Paulo: Martins Fontes, 2009. p. 25.)

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    Cadernos do Museu n 10

    Que vens tu fazer, Alferes,

    com tuas loucas doutrinas?

    Todos querem liberdade

    Mas quem por ela trabalha?

    (Ceclia Meireles, Romanceiro da Inconfidncia)

    Joaquim Jos da Silva Xavier, filho de Domingos da Silva dos San-tos e Antnia da Encarnao Xavier, nasceu em So Joo del-Rey, no stio Pombal, atual cidade Tiradentes (MG) mas foi mesmo criado na antiga cidade de Vila Rica, atual Ouro Preto. Sua famlia no era pobre, e a influncia de seus irmos que se haviam orde-nado padres instigou-o prtica autodidata da leitura e da escrita, inclusive de lnguas estrangeiras, como o francs. Apadrinhado por um cirurgio-dentista licenciado, rpido aprendeu, alm do seu ofcio, tambm a arte prottica, o uso de ervas medicinais e demais tcnicas mdicas. Ao aplicar todos esses conhecimentos com tama-nha destreza e competncia, principalmente na cirurgia dentria, recebeu o apelido de Tiradentes.

    MILLIET, Maria Alice. Tiradentes: o corpo do heri. So Paulo: Martins Fontes, 2009. p. 99.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Desde os seus 14 anos, Joaquim era comissrio comercial e traba-lhava no transporte de cargas, tendo, com isso, viajado muito como tropeiro, conhecido muita gente, inclusive maons, e aprendido to-dos os caminhos de Minas Gerais, do Rio de Janeiro e da Bahia.

    Sempre lutou por sua sobrevivncia e comumente questionava-se sobre os impostos abusivos quinto e derrama determinados pela Coroa Portuguesa, principalmente porque encontrava, em suas andanas, pessoas com histricos de grande misria. Tambm minerador, Tiradentes, apesar do duro trabalho comercial, apro-ximou-se, no Rio de Janeiro, das ideias iluministas da Revoluo Francesa e dos Estados Unidos, dos escritos de Voltaire contra o absolutismo e das crticas mordazes nobreza e ao clero. Muitos discursos revolucionrios encontravam-se em curso nos demais estados da colnia. A sua maioria imbudos de ideais liberalistas de independncia e de autonomia.

    No decorrer de sua histria, um fato mudou a trajetria de sua vida de caixeiro-viajante. Ao chegar a um arraial com suas dezoi-to mulas carregadas de variados utenslios para vender, presenciou um fazendeiro, depois de espancar impiedosamente um escravo, pisar e pular em cima deste. Indignado com a situao, partiu para a luta corporal com o espancador e acabou sendo preso e tendo todo o seu material roubado, devido influncia daquele senhor na regio. Obrigado a sobreviver de diferente maneira, entrou para o Exrcito, onde galgou os postos de soldado a alferes. Admirvel e excelente orador, de voz firme e imponente, no tardou a disse-minar as ideias revolucionrias entre seus colegas militares, praas e oficiais, principalmente da cavalaria, conhecida como Drages. Uniu-se tambm a aristocratas mineiros simpatizantes da ideia li-bertadora, a poetas, escritores e, no que ficou intitulada Conjura-o Mineira, tambm conhecida como Inconfidncia, ps-se, junto aos demais, a combater o colonialismo e a tentar promover a inde-pendncia do Brasil. Na investida estavam previstos o comando da tropa pelo coronel Francisco de Paula, a insurreio do povo junto ao alferes, o soerguimento da cabea do governador da provn-cia e a proclamao da Repblica. No entanto, como no tiveram apoio significativo das elites e a colnia no tinha uma burguesia

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    Cadernos do Museu n 10

    organizada, fazia-se necessrio um movimento de libertao dos escravos, para a intensificao da luta armada. Alm disso, dentro do prprio movimento da Inconfidncia Mineira, a despeito das divergncias quanto aos negros, Tiradentes no contava com um traidor, que, preocupado com suas dvidas e com o perdo de Por-tugal, delatou o movimento, que foi sufocado pelas tropas oficiais.

    Os aristocratas e demais pessoas influentes receberam da Coroa Portuguesa penas mais brandas que a do mrtir Tiradentes. Este foi o nico condenado forca, mas seu ideal permaneceu entre os que lutaram e lutariam pela libertao do Brasil.

    FIGUEIREDO Aurlio. Martrio de Tiradentes. (leo sobre tela). (SOUSA, Octavio Tarqunio de. A vida de D. Pedro I. Rio de Janeiro : J. Olympio, 1972. v. 3, p. 238).

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Marechal Deodoro da Fonseca (5/8/1827 23/8/1892)

    Assino o decreto de alforria do ltimo escravo do Brasil.

    (Deodoro da Fonseca, ao renunciar ao cargo de presidente da Repblica)

    Filho de Manoel Souza da Fonseca tenente-coronel perten-cente ao Partido Conservador , Manoel Deodoro da Fonseca nas-ceu no estado de Alagoas e estudou, desde os 16 anos, em escola militar. Teve duas irms e sete irmos, sendo um deles Hermes Ernesto da Fonseca, pai do futuro presidente do pas marechal Hermes. Aos 21 anos, em sua primeira ao militar, integrou as tropas que se dirigiram a Pernambuco para combater a Revoluo

    CARVALHO, Olavo de (org.) O exrcito na histria do Brasil. Rio de Janeiro : Bibliex; Salvador : Obebrecht, 1998. p. 12. SOUSA, Octavio Tarqunio de. Jos Bonifcio. Rio de Janeiro : J. Olympio, 1972. p. lxxx lxxxi

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    Cadernos do Museu n 10

    Praieira. Galgou as patentes militares por coragem e bravura at chegar de marechal.

    Durante o Imprio, participou da brigada expedicionria ao Rio da Prata, do cerco a Montevidu e da Guerra do Paraguai. No ano de 1885, tornou-se presidente da provncia do Rio Grande do Sul e esteve frente do Clube Militar entre 1887 e 1889, chefiando o setor antiescravista do Exrcito. Marechal Deodoro participou das foras de deposio do Imprio em 1889, assumiu a chefia do governo provisrio e foi eleito indiretamente para presidente em 1891, tendo como seu vice o poltico Floriano Peixoto. Instituiu o presidencialismo, o federalismo, os trs poderes de governo, os smbolos nacionais, a separao entre a Igreja e o Estado, o casa-mento civil, a laicizao dos cemitrios, a criao do cdigo penal brasileiro em 1890, a promulgao da primeira Constituio repu-blicana, inspirada no modelo liberal dos Estados Unidos, em 1891, entre outros feitos.

    Deodoro s permaneceu nove meses na presidncia do Brasil, pois em novembro do mesmo ano foi levado renncia pelas for-as legalistas, devido crise poltica e econmica que promoveu a dissoluo do Congresso Nacional e a falncia de vrios bancos e empresas em razo da alta especulao financeira. No entanto, nesse perodo o Brasil aumentou suas indstrias e o seu nvel de urbanizao, alm ter se aproximado diplomaticamente dos Esta-dos Unidos, o que favoreceu o investimento de capital estrangeiro no pas.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Zumbi dos Palmares (1655 20/11/1695)

    (...) Palmares! A ti meu grito!

    A ti, barca de granito,

    Que no soobro infinito

    Abriste a vela ao trovo.

    E provocaste a rajada,

    Solta a flmula agitada

    Aos vivos da marujada

    Nas ondas da escravido! (...)

    (Castro Alves, Saudaes a Palmares)

    BRASIL. Ministrio da Cultura. Para nunca esquecer : ne-gras memrias, memrias de negros. Curadoria Emanoel Araujo. Braslia : Ministrio da Cultura, 2002. p. 9

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    Cadernos do Museu n 10

    A frtil floresta dos Palmares situava-se da vizinhana do Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco, at a zona ao norte do curso inferior do Rio So Francisco, em Alagoas. Os escravos negros fu-gitivos dos cativeiros para l iam em busca de liberdade. Segundo os batavos, em 1643, Palmares j abrigava mais de 6.000 pessoas o quilombo no era constitudo apenas por negros, mas tambm por mulatos, ndios e at mesmo um mouro, segundo o governador Caetano de Melo e Castro e era composto por vrios mocambos. No Mocambo do Macaco, localizado na Serra do Barriga, morava o rei Ganga-Zumba. Este valia-se de um conselho de chefes, do qual fazia parte o seu sobrinho Zumbi.

    PINSKY, Jaime. A escravido no Brasil : as razes da escravido, sexualidade e vida cotidiana, as formas de resistncia. So Paulo : Contexto, 2001. p. 69.

    Embora nascido livre em Alagoas, Zumbi foi capturado aos sete anos de idade e entregue de presente a um padre catlico, que o batizou de Francisco. Com ele, aprimorou o portugus e aprendeu

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    o latim, tornando-se coroinha aos 12 anos. Porm, aos 15 fugiu para o quilombo e foi apadrinhado pelo seu principal comandante.

    Conhecendo a abrangncia das terras e a sua abundncia, o mestre de campo dos paulistas, Domingos Jorge Velho, pediu ao rei de Portugal a concesso de um paralelogramo de terra de 1.060 lguas quadradas justamente no local onde os palmarinos habitavam e viviam. Mesmo depois de negociada a paz com o go-vernador Pedro de Almeida, Ganga-Zumba, rei do quilombo, foi assassinado, e Zumbi assumiu a chefia, negando-se a entregar os armamentos. Devido a isto e cobia dos paulistas, travou-se uma das guerras mais rduas e difceis do Brasil.

    PINSKY, Jaime. A escravido no Brasil : as razes da escravido, sexualidade e vida cotidiana, as formas de resistncia. So Paulo : Contexto, 2001. p. 77.

    Considerado general das armas, Zumbi contra-atacou e venceu as investidas de 1686 e de 1692. Encaminhou os palmarinos para um local mais seguro dentro do prprio quilombo, onde poderiam se recompor para continuar na luta em defesa de suas terras. Mas, dois anos depois de o Mocambo do Macaco ter sido destrudo, foi trado por um companheiro capturado pelo capito Andr Furtado de Mendona, que lhe prometeu a liberdade em troca da delao do esconderijo de Zumbi. O chefe herdeiro do trono do Quilombo dos Palmares, ao correr para abraar o amigo que havia tempo no via, foi apunhalado e morto.

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    Cadernos do Museu n 10

    Zumbi lutou bravamente para a liberdade dos negros e pela au-tonomia do quilombo. O 20 de novembro, data divulgada de sua morte, ficou institudo o Dia da Conscincia Negra, no Brasil.

    PINSKY, Jaime. A escravido no Brasil : as razes da escravido, sexualidade e vida cotidiana, as formas de resistncia. So Paulo : Contexto, 2001. p. 79.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    D. Pedro I (12/10/1798 24/9/1834)

    D. Pedro no morreu. S morrem os homens vulgares, e no os heris.

    (Jos Bonifcio, em carta de Paquet aos filhos de D. Pedro I, em 4 de dezembro de 1834)

    Pas que amo tanto como te amo a ti.

    (D. Pedro I, em carta ao imperador D. Pedro II)

    D. Pedro I nome completo: Pedro de Alcntara Francisco Antnio Joo Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim Jos Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragana e Bourbon foi o primeiro imperador do Brasil (de 1822 a 1831). Nasceu no Palcio de Queluz, Portugal, em 12 de outubro de 1798, filho de D. Joo VI

    BENTO, Cludio Moreira. General Osrio: o maior heri e lder popular brasileiro (bicentenrio). Resende-RJ : Projeto Histrico do Exrcito na Regio Sul, 2008. p. 64-65.

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    Cadernos do Museu n 10

    e D. Carlota Joaquina. Veio ao Brasil com a famlia imperial, em 1808, aos nove anos de idade, em virtude da invaso do territrio portugus por Napoleo.

    O prncipe real de Portugal, Brasil e Algarves era poliglota (es-crevia e falava francs e latim, bem como compreendia ingls e alemo), era poeta e exmio msico, compondo inclusive o Hino da Caeta, at 1911 considerado o Hino de Portugal, e o Hino da Independncia do Brasil. No que tange escravido, D. Pedro tinha uma viso diferente do que era comum poca. Enquanto a maio-ria via as atividades manuais como algo relegado ao escravo, D. Pedro no se importava em trabalhar com as prprias mos. Sobre a escravido o imperador tinha opinio formada; dizia ele: Eu sei que o meu sangue da mesma cor que o dos negros.

    Em 1821, D. Joo VI decidiu retornar a Portugal e deixou D. Pedro regente do Brasil, com a misso de unir portugueses e brasi-leiros. Todavia, no tardou para que o rei portugus o chamasse de volta Europa. Foi emitido, na poca, um documento destituindo a regncia e uma ordem judicial que exigia o retorno imediato do prncipe sua terra natal.

    D. Pedro, no entanto, sensibilizado com o abaixo-assinado de centenas de brasileiros, com pedido para sua permanncia no Bra-sil, pronunciou a clebre frase: Se para o bem de todos e felici-dade geral da nao, estou pronto! Digam ao povo que fico! O passo seguinte foi a independncia. Embora a mensagem do prn-cipe tivesse sido clara, a corte portuguesa buscou meios de retir-lo do Brasil. Tentou persuadi-lo a aceitar o convite dos gregos para ocupar o trono do ento recm-criado Estado Independente da Grcia. Aps serem vitoriosos em luta travada contra os turcos, os gregos viram na figura do regente do Brasil o monarca ideal para ocupar o trono. O prncipe demonstrou-se honrado com a propos-ta, mas recusou a oferta, mantendo-se fiel ao povo do Brasil, terra que aprendera a amar e da qual seria aclamado Defensor Perptuo.

    A corte portuguesa resolveu mandar uma srie de retaliaes, o que levou a conflitos internos entre brasileiros e portugueses.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    D. Pedro se viu na necessidade de pacificar as rebelies e, ao chegar provncia de Santos, recebeu carta de Jos Bonifcio afirmando os planos de aes militares de Portugal sobre o Brasil. Foi ento que, s margens do Ipiranga, declamou: Independncia ou Morte, em 7 de setembro de 1822.

    Aclamao de Dom Pedro I no Campo de Santana. (CARVALHO, Olavo de (org). O exrcito na histria do Brasil. Rio de Janeiro : Bibliex; Salvador : Obebrecht, 1998. v. 2, p. 45).

    A independncia do Brasil causou descontentamento de tropas do exrcito portugus, o que provocou conflitos nas provncias da Cisplatina, Bahia, Piau, Maranho e Gro-Par, vencidas pelas tropas pr-independncia, e levou retirada do exrcito portugus do territrio brasileiro. D. Pedro I reinou no Brasil at 7 de abril de 1831, quando abdicou o trono em favor de seu filho D. Pedro II. Veio a falecer no Palcio Queluz, em Portugal, no dia 24 de setem-bro de 1834.

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    Plcido de Castro (12/12/1873 9/8/1908)

    Se hoje temos o Acre entre os estados da Repblica Federativa do Brasil devemos ao heri Jos Plcido de Castro.

    (Parte final da justificativa do Projeto de Lei do Senado n 56, de 2000)

    Filho do capito Prudente da Fonseca Castro e de Zeferina de Oliveira Castro, Jos Plcido de Castro nasceu na cidade de So Gabriel-RS e, aos nove anos de idade, passou a cuidar de uma re-lojoaria, oportunidade na qual demonstrou sua caracterstica de extrema responsabilidade, profissionalismo e perseverana. Dois anos depois, seu pai faleceu, e Plcido foi aprimorar o ofcio de relojoeiro em Bag, a fim de colaborar no sustento da me e de seus irmos. Aps proclamada a repblica no Brasil, retornou ao lar materno e alistou-se no 1 Regimento de Artilharia de Campanha

    Plcido de Castro. (CARVALHO, Olavo de (org). O exrcito na histria do Brasil. Rio de Janeiro : Bibliex; Salvador : Obebrecht, 1998. p. 48. NOSSO sculo: me-mria fotogrfica do Brasil no sculo XX. So Paulo : Abril Cultural, 1980. v. 1, p. 63).

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    como segundo-cadete e serviu at o posto de segundo-sargento. J no Batalho Antnio Vargas, tornou-se oficial e, no Rio Negro, foi combater a tropa do marechal Isidoro Fernandes. Trabalhou para a pacificao do Rio Grande do Sul, servindo revoluo com ex-mio devotamento, e partiu para o Rio de Janeiro, empregando-se como inspetor de alunos no Colgio Militar.

    Aos 26 anos, foi trabalhar com agrimensura na regio do Ama-zonas e acabou por contrair malria, tendo lutado contra a mo-lstia por muito tempo. Logo depois, ingeriu gua envenenada, contaminada pelo ltex de aacu, e ficou em gravssimo estado de sade. Mas Plcido resistiu bravamente aos males que lhe envol-viam o corpo, pois tinha a mente mais viva do que a de muitos e a vontade de viver mais latente do que antes. J de posse de sua terra amazonense conquistada e requerida ao governo do Acre, foi, aos 29 anos, demarcar o seringal Victoria, de Jos Galdino de Assis Marinho, quando, por causa da pretenso do governo boliviano de entregar a regio para a explorao dos Estados Unidos e da Ingla-terra, os seringueiros se revoltam, e Plcido, frente da Junta Revo-lucionria, proclama, aps trs dias de intenso combate, o Estado Independente do Acre.

    Mesmo com sua sade debilitada pelo clima da Amaznia, fazia frente s investidas, surpreendia o inimigo com ataques nas florestas

    CASTRO, Plcido de. Apontamentos sobre a Revoluo Acreana. Manaus : Valer, 2003. p. 53.

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    Cadernos do Museu n 10

    e, certo de suas responsabilidades, enfrentou com coragem e res-peito os bolivianos para que o Acre fosse definitivamente integrado ao Estado brasileiro. Com a ajuda do ento ministro de Relaes Exteriores do Brasil, baro do Rio Branco, acordos diplomticos foram feitos com o presidente boliviano para que fosse inibido o confronto entre as naes, sendo selado, em 1903, o Tratado de Petrpolis.

    Plcido de Castro tornou-se o maior seringalista da regio e foi governador do Acre de 1902 a 1904. Porm, devido a constantes intrigas polticas, morre em 1908 vtima de uma emboscada.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Duque de Caxias (25/8/1803 7/5/1880)

    SOUZA, Adriana Barreto. Duque de Caxias: o homem por trs do monumento. Rio de Janeiro : 2008. (capa).

    Sigam-me os que forem brasileiros.

    (Duque de Caxias, no comando de tropas brasileiras em combate s foras paraguaias)

    Filho de militares, Lus Alves de Lima e Silva nasceu no arraial de Porto Estrela, provncia do Rio de Janeiro, e j aos cinco anos rece-beu o ttulo de cadete, por meio de autorizao especial concedida diretamente pelo ento prncipe regente, D. Joo. Aos 15 anos foi promovido a alferes, na Academia Real Militar, que em 1821 o pro-moveria a tenente para servir a Guarda Imperial a partir de 1822.

    Seu batismo de fogo veio no ano seguinte, quando foi combater as lutas de independncia na Bahia. Foi assim obtendo promoes aps seguidas vitrias em diversos conflitos, como na Balaiada, no

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    Maranho, pela qual foi condecorado com o ttulo de baro de Ca-xias. Em 1834, conteve o levante revolucionrio que ocorreu em Campinas, So Paulo. Logo em seguida, dirigiu-se a Barbacena para combater uma rebelio. Na Guerra dos Farrapos, foi agraciado com o ttulo de marechal e passou a ocupar o cargo de presidente do Rio Grande do Sul. Ao pacificar a regio, foi condecorado conde de Caxias e nomeado senador da provncia.

    SOUZA, Adriana Barreto. Duque de Caxias: o homem por trs do monumento. Rio de Janeiro : 2008. p. 364.

    Em 1851 retornou ao Rio Grande do Sul para conter as foras expansionistas do caudilho argentino Rosas. Aps o evento, rece-beu o ttulo de marqus de Caxias e em seguida, em 1855, foi no-meado ministro da Guerra.

    Em decorrncia dos fracassos das primeiras tropas na Guerra do Paraguai (1865-1870), Caxias foi obrigado a intervir. Transfor-mou o fracasso em seguidas vitrias, chegando capital, Assun-o, em 5 de junho de 1869. Em seu retorno ao Brasil foi nomeado conselheiro de Estado extraordinrio e agraciado com o ttulo de duque, nico conferido durante o perodo imperial.

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    Assumiu por diversas vezes a Secretaria de Estado da Guerra at retirar-se da vida pblica aps vrias campanhas e, fundamental-mente, por conta de sua viuvez. Preferiu descansar em sua fazen-da, em Santa Mnica, interior da provncia do Rio de Janeiro, local onde faleceu a 7 de maio de 1880. Optou, por meio de testamento, por exquias simples; sua nica demanda foi que seu corpo fosse transportado por soldados e enterrado no Cemitrio de Catumbi, no Rio de Janeiro.

    CARVALHO, Olavo de (org). O exrcito na histria do Brasil. Rio de Janeiro : Bibliex; Salvador : Obebrecht, 1998. v. 2, p. 93.

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    Marqus de Tamandar (13/12/1807 29/3/1897)

    Almirante Tamandar. ATLAS de educao moral e cvica. So Paulo : Formar, 1970.

    O almirante Marqus de Tamandar foi, indiscutivelmente, figura primacial no cenrio militar do Brasil durante o Imprio (...). Ningum grimpou mais alto na

    Marinha de Guerra, atravs de uma esteira sui generis de faanhas e glrias, que tanto o enalteceram e o imortalizaram nos anais da histria nacional.

    (Jos Francisco de Lima)

    Filho de um capito de milcias, Joaquim Marques Lisboa teve na vida as glrias dos empreendimentos navais brasileiros. Dos 15 aos 90 anos, trabalhou para o engrandecimento do pas a bordo dos navios de guerra e nas cadeiras do Superior Tribunal Militar. Nas-cido em Rio Grande-RS, dedicou suas maiores atenes s prticas de navegao e ao comando nas batalhas navais. Entre estas, des-tacam-se a Cabanagem, no perodo de 1835-1836, no Par; a Sa-

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    binada, em 1837, na Bahia; a Revoluo Farroupilha, em 1838, no Rio Grande do Sul; a Balaiada, em 1839, no Maranho, em apoio a Duque de Caxias; e a Guerra do Paraguai, entre 1864 e 1870, desta-cando-se nesta a Batalha de Riachuelo.

    Nas suas prticas de salvamento, auxiliou uma galera americana incendiada em Liverpool e uma nau portuguesa avariada por um tufo. Por sua bravura e empenho, galgou todos os postos da Mari-nha brasileira at o posto de almirante, ressaltando-se sua nomeao para comandante da diviso naval do Rio da Prata. Em suas conde-coraes, foi tambm agraciado com os ttulos de baro, conde e marqus. hoje o patrono da Marinha brasileira, e, no dia de seu nascimento, 13 de dezembro, comemora-se o Dia do Marinheiro.

    LIMA, Jose Francisco de. Marques de Tamandar : patrono da marinha, seu perfil historico. Rio de Janeiro F. Alves, 1983. p. 168.

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    Cadernos do Museu n 10

    Chico Mendes (15/12/1944 22/12/1988)

    Democracia Viva, Rio de Janeiro, n. 41, p. 45, 2009.

    No comeo, pensei que estivesse lutando para salvar seringueiras, depois pensei que estava lutando para salvar a floresta amaznica.

    Agora, percebi que estava lutando pela humanidade.

    (Chico Mendes)

    Chico Mendes foi uma pessoa de grandes propsitos e morreu por eles. Era uma pessoa doce, que tratava todos com leveza e respeito.

    (Senadora Marina Silva, em 3 de dezembro de 2008)

    Nascido em Xapuri, no Acre, entre a viva natureza dos seringais e nela tendo empenhado suas foras braais desde os nove anos de idade, Francisco Alves Mendes Filho cresceu e ampliou suas vises acerca da explorao dos seringueiros com o auxlio de Euclides Tvora.

    Interessado nas notcias do seu pas e do mundo, passou a estu-dar a estrutura capitalista e os ideais marxistas at envolver-se defi-

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    nitivamente com a poltica participou de organizaes sindicais, elegeu-se vereador em 1977 pelo MDB e, posteriormente, foi um dos fundadores do PT no estado do Acre.

    Firmando seu corpo entre as rvores para impedir os tratores de derrub-las, em conflito intenso com os pecuaristas, Chico Mendes dedicou sua vida em prol da conscientizao dos seringueiros e da proteo floresta amaznica. No final da dcada de 80, afirmou: Se descesse um enviado dos cus e me garantisse que minha morte iria fortalecer nossa luta, at que valeria a pena. Mas a experincia nos ensina o contrrio. Ento eu quero viver. No entanto, apesar dos avisos s autoridades das ameaas que constantemente vivia, Chico foi assassinado em 22 de dezembro de 1988, na porta de sua casa, deixando famlia, filhos, amigos e admiradores saudosos de sua marcante presena.

    REBELDES brasileiros : homens e mulheres que desafia-ram o poder. So Paulo : Casa Amarela, 200-?. p. 422-423. Col. Caros Amigos.

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    Cadernos do Museu n 10

    Almirante Barroso (29/9/1804 8/8/1882)

    BRASIL. Marinha. Vultos da histria naval. Rio de Janeiro : Serv. Rel. Pbl. da Marinha. 19-?. p.15

    O Brasil espera que cada um cumpra o seu dever.

    (Almirante Barroso)

    Embora nascido em Lisboa e falecido em Montevidu, foi no Brasil que Francisco Manuel Barroso da Silva tornou-se um heri. Filho do tenente-coronel Teodsio Manuel Barroso e de Antnia Joaquim Barroso da Silva, fez carreira brilhante na Marinha Im-perial brasileira, revelando-se possuidor da audcia e da coragem caracterizadoras dos grandes marinheiros.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Comandou a Diviso Naval em operaes em Santa Catarina, a charrua Carioca, em 1831, o brigue Imperial Pedro, as corvetas Sete de Abril e Bahiana e o patacho Patagnia. Participou com devoo da Cabanagem, no Gro-Par, em 1836, e foi um importante ser-vidor na Guerra do Paraguai em 1865. Foi nomeado por Taman-dar chefe do Estado-Maior e esteve frente da 2 Diviso Naval, que apoiou a reconquista de Corrientes, e substituiu o almirante na Batalha de Riachuelo. Devido a sua viso estrategista e a sua excelncia no direcionamento dos ataques, quando do avano com a fragata Amazonas contra os navios inimigos mais prximos, de-cidiu bravamente a luta em favor do Brasil.

    Galgou, por merecimento, todos os postos da Marinha at che-gar a vice-almirante. Foi agraciado com o ttulo de comendador da Ordem de So Bento de Aviz em 1854 e condecorado por D. Pedro II com a Ordem Imperial do Cruzeiro, em 1865, e com o ttulo ho-norfico de baro do Amazonas em 1866.

    CARVALHO, Olavo de (org).O exrcito na histria do Brasil. Rio de Janeiro : Bibliex; Salvador : Obebrecht, 1998. v. 2, p. 163.

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    Jos Bonifcio (13/6/1763 6/4/1838)

    CARVALHO, Olavo de (org.). O exrcito na histria do Brasil. Rio de Janeiro : Bibliex ; Salvador : Obebrecht, 1998. v. 2, p. 44.

    Cada dia encontro novos motivos para ver em Jos Bonifcio a maior, a mais alta, a mais completa figura brasileira de todos os tempos.

    (Gilberto Freyre)

    Jos Bonifcio de Andrada e Silva nasceu em Santos-SP em 1763. Era filho de D. Maria Brbara da Silva e Bonifcio Jos de Andrada. Seu pai era alto funcionrio da Coroa, embora tambm tivesse outras atividades, como o comrcio. Sua instruo primria foi dada pela prpria famlia e, aos 20 anos, viajou para Portugal a fim de fazer cursos jurdicos, matemtica e filosofia natural na Universidade de Coimbra.

    Assim que terminou seus estudos, em 1801, foi convidado pelo ministro da Marinha e do Ultramar de Portugal para ocupar o cargo de intendente geral das Minas e Metais do Reino Portugus. A partir dessa contratao, os estudos cientficos de Bonifcio passaram a

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    dividir tempo com suas responsabilidades estatais. Destacou-se, em sua trajetria de vida, como homem pblico, mas tambm como naturalista e pesquisador.

    Aps 36 anos de permanncia em Portugal e de visitas aos de-mais pases europeus, Jos Bonifcio, influenciado pelas ideias revolucionrias correntes na Frana, foi autorizado a retornar ao Brasil e acabou por encontrar a sociedade em um momento de grandes transformaes nos campos econmico, poltico e social, em virtude da mudana da famlia real para o Rio de Janeiro. O prestgio de Bonifcio era alto perante a corte e, um ano aps seu retorno, foi nomeado membro do Conselho de Estado, cuja funo era aconselhar o rei D. Joo VI sempre que fosse solicitado. Passou a ganhar cada vez mais a confiana do rei e do prncipe D. Pedro I, que o designou como seu principal ministro em 1820.

    Bonifcio centrou o seu projeto poltico para o Brasil em trs principais temas: o desenvolvimento das cincias, a reforma das sesmarias e da agricultura e a incluso social, abrangendo questes relativas escravido. Junto dele viria seu irmo Martim Francisco para ocupar a pasta do Ministrio da Fazenda, constituindo assim o que ficou conhecido como Gabinete dos Andrada.

    CARVALHO, Olavo de (org.). O exrcito na histria do Brasil. Rio de Janeiro : Bibliex ; Salvador : Obebrecht, 1998. v. 2, p. 42.

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    Cadernos do Museu n 10

    Foi intitulado Patriarca da Independncia por ter colaborado efe-tivamente para a autonomia poltica do Brasil. Foi ministro do Reino e dos Negcios Estrangeiros no incio do imprio de D. Pedro I. Seus projetos arrojados, que determinavam a gradativa abolio do trfico de escravos e da prpria escravido, a reforma agrria e a integrao dos ndios sociedade brasileira desagradavam os senhores de terra, enfraquecendo, assim, o gabinete. Com o fechamento da Assembleia Nacional Constituinte, em 1823, Bonifcio foi preso em sua casa e conduzido ao exlio na Frana junto com seus irmos e outros de-putados. Conseguiu retornar apenas seis anos depois, indo morar na Ilha de Paquet-RJ, de cujo retiro saiu apenas para assumir a cadeira de deputado pela Bahia, como suplente, nas sesses legislativas de 1831 e 1832.

    Andrada, novamente atuante na poltica brasileira, reaproxi-mou-se do imperador, e este, ao abdicar a Coroa em 1831, certo de sua competncia nas reas cientficas e filosficas, indicou-o para tutor de seu filho, o futuro D. Pedro II. Dois anos depois, Bonifcio foi destitudo da tutoria pela Regncia, governo provisrio atuante at que Pedro II atingisse a maioridade. Ficou em priso domiciliar at 1835, quando terminou o processo-crime instaurado contra ele por conspirao e perturbao da ordem pblica. Mudou-se, nos ltimos dias de vida, para Niteri-RJ, onde veio a falecer em 1838.

    Jos Bonifcio deu ao Brasil os seus mximos esforos para que a independncia se tornasse fato e seu desenvolvimento tivesse um efeito socialmente mais distributivo. Trouxe para a sua terra natal os conhecimentos adquiridos no continente europeu, que por muito tempo o abrigou, certo de que, no Brasil, mudanas para melhor haveriam de acontecer e de que ele estava pronto para promov-las.

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    Marechal do Ar Alberto Santos Dumont (20/7/1873 23/7/1932)

    Os meninos esto a jogar o jogo das prendas. Um deles pergunta: Voa o gato? Todos gritam: No! Voa o urubu? [Todos] levantam os braos: Voa! Voa o

    carcar? Voa! Voa o homem? Todos, menos um, gritam: No! Alberto, um dos filhos do engenheiro, levanta os braos e grita: Voa! Risadas dos irmos e dos outros meninos. Alberto tem de pagar uma prenda. Ri-se com os outros, mas teima: Um

    dia, o homem h de voar!

    (Edgar dAlmeida Vitor, Trs vultos-smbolos)

    Aqueles que, como eu, foram os humildes pioneiros da conquista do ar, pensavam mais em criar novos meios de expanso pacfica dos povos do que lhes oferecer

    novas armas de combate.

    (Alberto Santos Dumont, em apelo Sociedade das Naes, em 1926, para que as limitaes da aviao fossem estabelecidas na Conferncia do Desarmamento)

    Alberto Santos Dumont nasceu numa fazenda em Cabangu, distrito de Joo Aires, em Minas Gerais. Sua famlia era abastada

    BARROS, Henrique Lins de. Alberto Santos Dumont. Rio de Janeiro : Index, 1986. p. 98.

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    Cadernos do Museu n 10

    e numerosa. Seu pai, que se havia diplomado na Frana, era en-genheiro filho de francs. Sua me, Francisca de Paula Santos, era filha do comendador e industrial Francisco de Paula Santos, muito rico e respeitado na regio.

    SANTOS DUMONT, Alberto. Os meus bales. traduo A. de Miranda Bastos. Rio de Janeiro : Biblioteca Nacional, 2007. Anexo 1.

    Embora as influncias familiares, o seu percurso nos colgios de engenharia do Brasil e da Frana e a sua disciplina e inteligncia tenham sido determinantes na construo dos dirigveis e aeropla-nos, na verdade Dumont empreendeu seu sonho baseado nos con-tos fantsticos de Jlio Verne, seu autor favorito. Quando, em 1888, assistiu em So Paulo ascenso de um aerstato15, decidiu quegostaria tambm de promover tamanha ventura. Em Paris, desde 1891, fez uma srie de ascenses em balo esfrico, inicialmente como passageiro, posteriormente como piloto, tendo produzido o 15 Aerstato a designao dada s aeronaves mais leves que o ar. Bales so aerstatos sem

    propulso prpria. J os dirigveis tm propulso prpria. Em 1783, os irmos Montgolfier fazem voar o balo de ar quente de sua inveno, mas que no podia se deslocar por si mesmo. Em 1852 ento projetado e construdo, pelo francs Henri Giffard, o primeiro aerstato dirigvel.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    menor balo esfrico do mundo, com 113 metros cbicos, nomeado por ele mesmo de Brasil. Apaixonado pela mecnica, foi o primeiro do mundo a adaptar um motor de exploso navegao area. S alguns anos depois seria usado o gs hlio para encher dirigveis.

    Santos Dumont produziu vrios bales, inovadores e encanta-dores para os que iam assistir s projees e para os engenheiros de todo o mundo. Em 1906, fez ele sua primeira experincia com o 14 bis, com o apoio do Aeroclube de Paris. Foi o primeiro avio m-quina mais pesada que o ar a voar no mundo com autopropulso e no catapultado. Ganhou pelo empreendimento a Taa Archade-acon, em Bagatelle.

    SANTOS DUMONT, Alberto. Os meus bales. traduo A. de Miranda Bastos. Rio de Janeiro : Biblioteca Nacional, 2007. Anexo 1.

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    Cadernos do Museu n 10

    Posteriormente, no mesmo ano, fez outras demonstraes de voo, com duraes cada vez maiores. Um ano depois caiu com o 14 bis, mas continuou a aprimorar aquele que foi um dos seus maiores sucessos, tendo criado sua obra-prima chamada Demoseille. Du-mont sempre se arriscava, pois testava ele prprio seus inventos, que nem sempre demonstravam o desempenho desejado, mas nunca se machucou gravemente por isso; ao contrrio, sentia-se mais esti-mulado em aprimor-los. Entre as suas invenes esto tambm o canho salva-vidas, o aparelho marciano e o chuveiro quente. Du-mont no se beneficiava dos prmios que ganhava, pois comumente distribua os montantes entre os seus operrios e os menos favore-cidos de Paris.

    Desde 1910, Dumont passou a limitar-se ao papel de espec-tador, certo de que outros nobres engenheiros iriam melhorar o que ele havia iniciado. Em 1914 veio ao Brasil visitar uma parte da famlia, mas retornou no mesmo ano a Paris quando, em agos-to, viu a Frana sendo invadida nas investidas da Primeira Guerra Mundial. Ao vislumbrar seus inventos sendo empregados contra a populao civil, com a sensibilidade que lhe era nata, entrou em profundo choque e, tomado de horror, passou a responsabilizar-

    NOSSO sculo: memria fotogrfica do Brasil no sculo XX. So Paulo : Abril Cultu-ral, 1980. v. 1, p, 67.

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    se pelas calamidades que ento assistia. Sem conseguir libertar-se desse sentimento de culpa frente aos atos desumanos das batalhas, pois sabia que a destinao dos avies seria militar, Alberto retor-na novamente ao Brasil em 1928 e, tragicamente, depara-se com a queda do hidroavio Santos Dumont num acidente que matou todos os tripulantes. Em 1932 explode a Revoluo Constituciona-lista contra Getlio Vargas, ento presidente do Brasil, e avies da Unio e de Minas Gerais bombardeiam So Paulo. O Pai da Avia-o no suporta a decepo e enforca-se com uma gravata no ba-nheiro de sua casa em Guaruj-SP.

    Tendo dado tambm bom subsdio literatura brasileira, San-tos Dumont deixou dois livros: Dans Lair (1904), traduzido para o portugus apenas em 1930 sob o ttulo de Os meus bales, e a monografia O que eu vi, o que veremos, publicada em So Paulo

    SANTOS DUMONT, Alberto. Os meus bales. traduo A. de Miranda Bastos. Rio de Janeiro : Biblioteca Nacional, 2007. Anexos 67.

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    Cadernos do Museu n 10

    em 1918 numa tiragem restrita, tendo cado em domnio pblico apenas em 1956. Esses trabalhos justificaram a sua eleio para a Academia Brasileira de Letras, e, embora sua posse jamais tenha chegado a se realizar, as homenagens ao clebre engenheiro perma-necem at os dias de hoje nos meios acadmicos, nas praas popu-lares e no corao grato de cada brasileiro.

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    A Construo da Memria Nacional: Os Heris no Panteo da Ptria

    Frei Caneca (20/8/1779 13/1/1825)

    Frei Caneca. Atlas de educao moral e cvica. So Paulo : Formar, 1970.

    Entre Marlia e a Ptria

    Coloquei meu corao:

    A ptria roubou-mo todo;

    Marlia que chore em vo.

    (Frei Caneca, poema escrito depois de saber que fora condenado morte, em janeiro de 1825)

    Na cerimnia da Ordem dos Carmelitas, no momento da es-colha de seu nome religioso ao tomar o hbito de novio com 17 anos no Convento do Carmo de Recife, Joaquim do Amor Divino

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    Rabelo, em lugar de nomes mais tradicionais daquela ordem, tais como Holanda, Portugal ou Carmelo, optou por Caneca.

    Ao assumir a linhagem dos tanoeiros artesos cujo ofcio era a confeco de barris e tonis para embalar, conservar e transportar mercadorias, principalmente lquidos o novio demonstrava sua simplicidade, pois essas profisses eram geralmente exercidas por homens livres, mas sobretudo por escravos alforriados. Imperioso lembrar que a escolha se deu tambm em homenagem a seu pai, que era um exmio tanoeiro. Caneca tinha apenas 22 anos no mo-mento da sua ordenao para frei, tendo sido necessria autoriza-o especial do nncio de Portugal.

    Frei Caneca nasceu em Recife-PE numa famlia humilde e, des-de pequeno, demonstrou inteligncia viva e grande fora moral. Estudou no seminrio de Olinda-PE, onde obteve os diplomas de professor em filosofia, retrica e geometria, passando, em seguida, a lecionar no Seminrio do Carmo. Foi autor de algumas obras, entre elas o Tratado de eloquncia. Influenciado pelos pensamen-tos liberais advindos das revolues francesa e norte-americana, Caneca promovia em seu discurso as ideias de unidade, universali-dade e igualdade entre os homens, alm de sempre declarar a honra de possuir ancestrais africanos.

    No decorrer da histria do seu ativismo poltico, Frei Caneca foi acusado e preso injustamente por ter participado do treinamen-to de guerrilha na Revoluo Pernambucana, em 1817. Conforme testemunhos e documentos da poca, no h registro de qualquer tipo de posicionamento dele ao lado dos rebeldes. Foi liberto aps quatro anos de encarceramento em Salvador-BA.

    No entanto, foi a partir dessa priso que os termos revoluo, ptria, opresso, cidadania, conflitos regionais deixaram de ser apenas palavras para ganharem significado ainda mais concreto em sua vida, encorajando-o na luta pela efetiva vontade do povo. Assim, em 1824, participou ativamente da Confederao do Equador, movi-mento social e poltico que pretendia implantar um governo prprio

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    para as provncias do Maranho, Cear, Alagoas, Rio Grande do Norte, Paraba e Bahia, baseado no sistema republicano.

    PINSKY, Jaime, A escravido no Brasil : as razes da escravido, sexualidade e vida cotidiana, as formas de resistncia. So Paulo : Contexto, 2001. p. 69

    Frei Caneca esteve no epicentro do maremoto que pretendia virar de ponta-cabea o Imprio centralizador. Ele escrevia textos e correspondncias, participava de reunies e animava os defenso-res do movimento por meio do jornal Typhis Pernambucano. Seus textos, alm de narrar os eventos decorridos da Confederao, ser-viram tambm como roteiro geogrfico e toponmico de algumas regies pouco visitadas, que descrevia como lindssimas e de en-cantar os olhos do viajante. Participou da elaborao dos textos do pacto social de 1824 e do projeto de Constituio da Confederao do Equador. Uma das primeiras medidas do movimento foi a abo-lio do trfico de escravos.

    Durante o conflito, o carmelita incorpora-se em uma das guer-rilhas e, mesmo com o pedido de asilo do presidente da Confedera-o, Manuel de Carvalho Paes de Andrade, o frei segue adiante. O movimento s enfraqueceu aps seguidas baixas, quando Frei Ca-neca foi forado a se render. No houve clemncia para com o car-melita, e ele foi condenado forca aps mais um ano de encarcera-mento. Curiosamente, no entanto, no momento de sua condenao,

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    os carrascos recusaram-se a mat-lo, mesmo torturados, afirmando que preferiam a morte a condenar o mrtir. A Comisso Militar foi obrigada, dessa forma, a alterar a condenao para o fuzilamento.

    Os filhos de Caneca sempre ficaram envoltos em mistrio. En-volta de mistrio tambm se encontra Marlia, nome que aparecia com frequncia em seus poemas de amor, mas que no teve ne-nhum outro tipo de registro. Seu corpo foi colocado junto a uma das portas do templo carmelita, no centro do Recife, sendo recolhi-do pelos religiosos e enterrado em local at hoje no identificado.

    MELLO Evaldo Cabral de (org.). Frei Joaquim do Amor Divino Caneca. So Paulo : Ed. 34, 2001. p. 23.

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    Marechal Osorio (10/5/1808 4/10/1879)

    MAGALHES, Joo Baptista. Osorio : sntese de seu perfil histrico. Rio de Janeiro: Bibliex, 1978. p. XX XXI.

    (...) em matria de servio pblico eu no indago o que so brasileiros na poltica, porm, sim, se cumprem o seu dever em bem da ptria.

    (Marechal Osorio, em sesso no Senado, poucos meses antes de falecer)

    Ao Brasil nunca pode faltar a esperana de feliz xito, quando ele tem a ufania de oferecer to nobre exemplo de bravura e de esprito, como o o general Osorio.

    (Burton, Letters from the battle-fields of Paraguay)

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    Seria um desgraado aquele que, depois de haver combatido com as armas da guerra o inimigo externo, pusesse depois essas mesmas armas ao servio do despotismo, de perseguies e violncia contra seus compatriotas.

    (Marechal Osorio)

    O gacho Manuel Lus Osorio, marqus do Herval, um dos mais populares chefes militares do Brasil no sculo XIX, assentou praa na Cavalaria da Legio de So Paulo aos 14 anos de idade e teve brilhante atuao na Guerra da Trplice Aliana. No ano de 1862, foi oficialmente consagrado patrono da Arma de Cavalaria do Exrcito Brasileiro.

    CARVALHO, Olavo de (org.). O exrcito na histria do Brasil. Rio de Janeiro : Bibliex ; Salvador : Obebrecht, 1998. v. 2, p. 167.

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    Destacou-se pela capacidade ttica, pois compreendia rapida-mente a dinmica de uma batalha e tomava as decises corretas em pleno combate. Era filho de humilde e pequeno proprietrio rural, tendo, portanto, crescido em ambiente rstico do interior do Rio Grande do Sul, em contato constante com pees, o que lhe permi-tiu, como general, falar sempre de igual para igual com os soldados. De acordo com o visconde de Taunay, Osorio superava qualquer outro chefe militar na estima de oficiais e soldados e deles sabia obter tudo quanto desejasse, mesmo nas piores circunstncias. Par-ticipou de batalhas pela Independncia em Sarandi (1822-1823), na Guerra da Cisplatina (1825-1828) e, como tenente, na Batalha do Passo do Rosrio. Atuou bravamente tambm no combate da Revoluo Farroupilha (1835-1845), sob comando de seu amigo Duque de Caxias, e na Guerra contra Oribe e Rosas (1851-1852).

    Combateu na Guerra do Paraguai (1864-1870), quando j era considerado militar respeitado e experiente, tendo recebido por isso o comando do 1 Corpo do Exrcito Imperial e, em seguida, o do 3 Corpo do Exrcito Imperial. Obteve grande reconhecimento por parte do Imprio, sendo condecorado com os ttulos de baro, visconde e marqus.

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    Baro do Serro Azul (6/8/1847 20/5/1894)

    CORREIA, Lencio. Baro do Serro Azul. Paran : D. Plaisant, 1942. p. 25.

    Ildefonso Pereira Correia, o Baro do Serro Azul, era homem justo e varo austero, o apstolo da divindade crist, cuja vida, selada com um sorriso de Deus, foi dignificante e nobre por fecunda em consolaes aos desventura-dos, e consumada, como a dos eleitos ao cu, pela glorificao do martrio.

    (Lencio Correia)

    Nascido em Paranagu-PR, Ildefonso Pereira Correia revelou gosto pela leitura desde muito moo, mas, a mando do seu pai, foi trabalhar com o comrcio em Montevidu, onde permaneceu at os 19 anos de idade. Muito inteligente e responsvel, aps retornar do Rio de Janeiro, onde conclura o curso de Humanidades, mon-tou comrcio significante em Antonina-PR e tornou-se conheci-do na cidade como reputado industrial, devido s fbricas de erva

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    mate por ele construdas no sul do pas, onde a bebida tornara-se fator de riqueza econmica. Foi recompensado pelo mrito agrco-la da Frana e tambm atuou no comrcio de madeiras, abriu gran-des serrarias e organizou um ncleo de imigrantes para o trabalho, obrando dignamente e com excelso patriotismo para o desenvolvi-mento do Paran e do Brasil.

    Os seus investimentos econmicos na famosa terra das arau-crias deram a ele o papel de poltico influente no estado, mesmo com a posterior proclamao da Repblica. Sua ateno discreta com os desvalidos fez dele homem admirado e bem quisto. Abo-licionista convicto, quando se tornou presidente da cmara mu-nicipal de Curitiba comprometeu-se publicamente a promover a emancipao dos escravos do municpio.

    Recebeu a comenda da Imperial Ordem da Rosa pelo impera-dor D. Pedro II e, em 8 de agosto de 1888, recebeu da princesa Isabel, ento r