aas1f 2007 revolucao verde em mocambique revisto03.12.2008

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    Revoluo Verde em Moambique: Ser Possvel, Provvel ou Vivel

    no Contexto das Estratgias Actualmente Dominantes1?

    Antnio Alberto da Silva Francisco2

    1. Introduo ............................................................................................................................... 2

    1.1. Contexto da pesquisa em que se insere este artigo .............................................................. 3

    1.2. Problemtica e questes relevantes para debate ................................................................. 4

    2. Mil e Uma Razes Justificam uma Revoluo Verde em Moambique ..................................... 6

    2.1. Oito razes para uma revoluo verde em Moambique ..................................................... 6

    3. RVM Necessria, mas ser Possvel e Provvel no Futuro Imediato? .................................. 17

    3.1. Que tipo de revoluo? . ................................................................................................... 17

    3.2. e justifica-se falar de estratgia? ..................................................................................... 18

    4. Em que Cenrios poder a RVM ser Possvel, Vivel e Sustentvel? ...................................... 19

    4.1. Modelo de enquadramento: matriz de alternativas de crescimento .................................. 19

    4.2. Caractersticas dos Cenrios de Viabilidade ou Inviabilidade da RVM ................................ 21

    5. Consideraes Gerais e Finais ................................................................................................ 27

    5.1. Consideraes sobre a viabilidade ou inviabilidade da RVM .............................................. 27

    5.2. Estamos aqui porque duas famlias ricas ofereceram 150 milhes de US dlares? ............ 28

    6. Referncias Bibliogrficas ...................................................................................................... 29

    1Artigo para Conferncia sobre o Desenvolvimento Agrrio: Estratgia de Desenvolvimento Agrrio no Contexto daRevoluo Verde - Oportunidades para o Empowermentdas Comunidades Rurais em Moambique, Maputo 17-18 deAgosto 2007, Fundao para o Desenvolvimento da Comunidades.2Professor Associado da Faculdade de Economia da Universidade Eduardo Mondlane e Director de Investigao doInstituto de Estudos Sociais e Econmicos (IESE), Maputo, [email protected].

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    1. Introduo

    Este artigo contm duas mensagens principais. A primeira que Moambique precisa de uma

    revoluo verde, se por revoluo verde (RV) se entender a transformao profunda e progressivadas instituies e tecnologias nas zonas rurais, capaz de contribuir para a crescente integrao daeconomia rural na economia nacional. Mil e umas razes justificariam uma revoluo verdemoambicana (RVM); oito das principais razes so enunciadas na seco 2 deste artigo.

    A segunda mensagem do artigo que a possibilidade e viabilidade de uma RVM podem sermelhor ajuizadas e debatidas, considerando alguns dos cenrios de desenvolvimento susceptveisde vingar nas prximas dcadas. A qualidade e sucesso de uma RVM no so pr-determinados,nem to pouco inevitveis. A prova disso que, nos anos seguintes independncia nacional em1975, Moambique optou por um rumo tambm apelidado de revolucionrio, mas avesso oumesmo contrrio (politica, econmica e tecnologicamente), primeira revoluo verde; a

    revoluo tecnolgica que beneficiou vrios pases latino-americanos e asiticos, nas dcadas de60 e 70. Pases como Mxico, ndia, Paquisto e Filipinas aumentaram significativamente aproduo de cereais e auto-suficincia alimentar nacional (Dao, 2007; Ross, 1998: 137-162;Todaro, 2000: 393-394; Wikipedia, 2007).3

    Os recentes pronunciamentos da liderana poltica e governamental, em defesa de uma revoluoverde em Moambique, por mais entusiastas que possam parecer, ainda no revelam substncia econvico suficientes, para demonstrar que representam uma adeso genuna revoluo verdeem frica. O facto do Presidente Armando Guebuza assumir a liderana em prol da RVM,

    proporciona um ambiente favorvel ao seu reconhecimento poltico interno. Mas isto, por si s,poder no ser suficiente para impedir que esta iniciativa se converta, como tantas outras, numentusiasmo passageiro; um projecto feito refm da mquina de burocratas, voluntariosos e bem-

    intencionados.

    Se bem que o futuro seja imprevisvel e falvel, no significa que no possa ser antecipado, emmuitos casos com satisfatria exactido. Pensar no futuro no perda de tempo. Pelo contrrio,

    pensar no futuro a melhor maneira de antecipar o leque de oportunidades, ameaas e desafiosexistentes, aumentando as chances de sobrevivncia (Francos, 2007). Nesta perspectiva, quatrocenrios de desenvolvimento possveis so identificados na quarta seco do artigo.

    Os quatro cenrios considerados no so produto da imaginao do autor do artigo. Eles resgatamos cenrios amplamente debatidos, h alguns anos atrs, no mbito da elaborao da Agenda2025. O cenrio de desenvolvimento que se tornar dominante, depender menos do passadoremoto, do que do passado recente e futuro imediato.

    A partir dos quatro cenrios possveis, pode-se concluir que o sucesso ou insucesso dodesenvolvimento de Moambique, nas prximas duas ou trs dcadas, ir girar em torno docrescimento econmico a dois nveis: a) O ritmo das taxas de crescimento; b) A natureza edireco da estrutura do crescimento econmico. Neste contexto, a possibilidade da RVM se

    3Isto no significa que a fome tenha sido erradicada em tais pases, mas as causas so de ordem institucional e no faltade alimentos ou fraca de capacidade de produo para satisfazer as necessidades nacionais.

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    tornar realista e efectiva, depender do rumo (cenrio) que prevalecer. Os cenrios seroaflorados de forma resumida, sem entrar em detalhes sobre a sua estrutura, construo,

    pressupostos e elementos constituintes. O objectivo equacionar e fornecer enquadramento geralpara a questo enunciada no ttulo.

    Se as condies institucionais actuais no mudarem substancialmente nos prximos anos, oCenrio 1 (estratgia de crescimento assente na ajuda externa e parceria do Governo e doadores)continuar a dominar a economia formal. Neste cenrio, a RVM ser redundante, porque servirapenaspara opovo ver e garantir que o doador continue a subsidiar o sector pblico.

    Uma hiptese mais dramtica equacionada no Cenrio 2 corresponde ao Cenrio doCaranguejo na Agenda 2025. Se este cenrio vier a acontecer, a RVM tornar-se- totalmenteimprovvel e impraticvel. Moambique ficaria mergulhado em crises cclicas, retorno aototalitarismo ou ausncia generalizada de autoridade, excluso social, novos conflitos armados,ou outra guerra civil.

    Nos dois restantes cenrios, a RVM tem possibilidade de vingar e tornar-se realidade. O Cenrio3 admite a hiptese de uma RV com impacto parcial, maior ou menor, dependendo dos seusefeitos de excluso social. O Cenrio 4 apresenta a alternativa mais promissora, com umatransformao ampla e inclusiva das instituies e da tecnologia, cujos benefcios seroapropriados directamente pelas zonas rurais. Este cenrio, o mais desejvel, tambm o maisdifcil de concretizar, por causa da dimenso das transformaes que exigir. Dificilmenteconcretizar-se-, se os valores polticos e morais que dominam actualmente as estratgias maisinfluentes, no forem revistos, transmitindo confiana e esperana aos cidados moambicanos.

    1.1. Contexto da pesquisa em que se insere este artigo

    Em resposta ao convite que me foi endereado, talvez seja til referir em poucas palavras, ocontexto da pesquisa deste artigo. Parte da investigao usada aqui, para enquadrar a questo da

    possibilidade e viabilidade de uma RVM, remonta a trabalhos anteriores, nomeadamente:projeces e cenarizaes sobre a economia de Moambique, ou partes dela, como: os chamadoscorredores de desenvolvimento; economia do Vale do Limpopo e do Vale do Zambeze; oscenrios prospectivos considerados no mbito da definio da estratgia de desenvolvimento rural(EDR) (MPD, 2006).4

    Desde que a aposta na economia socialista e socializao do campo foi abandonada pelo Governode Moambique, h 20 anos atrs, a economia nacional deixou de ser subjugada e moldada peloum modelo econmico de inspirao marxista-leninista. Desde ento, a ideia segundo a qual,Moambique est a desenvolver uma economia de mercado, tornou-se comum, mas esconde mais

    do que esclarece sobre a natureza e as caractersticas da matriz, ou melhor, das matrizeseconmicas principais e concorrentes na actual economia nacional.

    4Um ms depois desta Conferncia da FDC, o Conselho de Ministros do Governo de Moambique, em sesso de 11 deSetembro de 2007, aprovou a Estratgia de Desenvolvimento Rural (MPD, 2007).

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    No sendo este o lugar apropriado para debater a natureza do mercado, no Moambique de hoje,convm sublinhar um dos seus elementos de enquadramento geral. 5 Em vez de um padro deacumulao, principal e dominante, a economia moambicana agrega actualmente diversos

    padres de reproduo econmica e sociopoltica, num mosaico hbrido e impreciso. A dinmicada economia moambicana oscila, entre uma economia mercantilista crescentemente

    informalizada, alguns enclaves econmicos capitalistas, com dificuldades de competir a crescenteeconomia subterrnea ou oculta, uma extensiva economia de subsistncia precria, e umaeconomia de ajuda internacional substancial, que garante a reproduo e estabilidade do sector

    pblico (Abrahamsson e Nilsson, 1994; Castel-Branco, 1996; CEC, 2003; Francisco, 2003;Francisco e Paulo, 2006; Guebuza, 2004a; Newitt, 1995; Osman, 2003; Mosca, 2005; Hamela,2003; Negro, 2001, 2002; Serra, 1993; Wuyts, 1981, 2001).

    1.2. Problemtica e questes relevantes para debate

    A revoluo verde aparentemente um assunto novo para Moambique. Num passado no muito

    distante, Moambique viveu uma experincia directamente relacionada com o contedo de umarevoluo verde: a questo da transformao radical da apropriao fundiria e das relaessociais de produo; destruio das formas de acumulao capitalista e conjugao dos interessesdiversos, dos actores econmicos em competio pela sua sobrevivncia e afirmao nasociedade moambicana.

    Processos to complexos e controversos, como foram as sucessivas transformaes queMoambique viveu, no ltimo meio sculo, dificilmente podero gerar consensos quanto estratgia de desenvolvimento nacional e rural. No lugar do debate franco e aberto, o espao

    pblico continua a ser geralmente ocupado pelo vazio e fraqueza de debate; de vez em quando preenchido pelo velho slogan da Constituio de 1975: agricultura como base e indstria o seu

    factor dinamizador e decisivo.No admira que a referncia palavra revoluo continue a provocar mltiplos e contraditriossentimentos. Depende de como cada um viveu a experincia da revoluo socialista: foi como

    protagonista ou oponente?... Como vtima, beneficirio, simpatizante ou simples observador?

    A estratgia de socializao das zonas rurais, implementada na primeira dcada da independncia,gerou danos e prejuzos (no s nos ex-colonos, como tambm na maioria dos ex-colonizados),apenas compensados pelos proveitos e benefcios, acumulados principalmente pela minoria(recm-urbanizada) de protagonistas e promotores da revoluo socialista (Abrahamsson e

    Nilsson, 1994: 45; Newitt, 1995).6

    A ideia que o continente africano e Moambique em particular, no aderiram 1 revoluo

    verde, por falta de oportunidade ou de apoio financeiro externo, enganadora e em nada ajuda aperceber a resistncia a uma revoluo verde, intimamente integrada no sistema capitalista

    5 Na conferncia inaugural do novo instituto de investigao, Instituto de Estudos Sociais e Econmicos (IESE),realizada em 19 de Setembro prximo, novos detalhes sobre os cenrios discutidos neste artigo foram compartilhados(http://www.iese.ac.mz/lib/publication/Francisco,Antonio_Projeccoes.pdf).

    6Quase logo a seguir independncia criou-se uma retrica poltica pblica, em que as vises eram descritas como sej estivessem realizadas (Abrahamsson e Nilsson, 1994: 45).

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    internacional. Moambique independente no aderiu 1 revoluo verde, porque comeou porapostar na transformao do Pas numa zona libertada do sistema capitalista mundial. A

    prioridade poltica centrou-se na mudana radical das relaes de apropriao fundiria, nasubstituio da produo capitalista e pr-capitalista, por formas de produo colectivistas eestatais. No se tratou de uma oportunidade perdida, involuntria ou acidental. Tratou-se de uma

    opo explcita por uma via que, na perspectiva da revoluo verde, representou uma verdadeiracontra ou anti-revoluo (Dao, 2007; Moyo and Yeros, 2006; Holt-Gimenez et al., 2006; Moyoand Yeros, 2006; Ross, 1998: 137-162; Rahman, 2004: 41-60; Todaro, 2000: 393-394).7

    Isto explica, pelo menos em parte, que o simples facto da nova revoluo verde ser apoiada porfundaes filantrpicas internacionais, como a Rockfeler e a Bill & Melinda Gates, tenha

    provocado reaces crticas imediatas, como a do Food First (Holt-Gimenez et al., 2006). Noobstantes as suas motivaes e alternativas questionveis, algumas das reaces crticas tmfundamento e razo de ser; devem-se ao facto dos promotores da revoluo verde se refugiaremnuma aparente neutralidade tcnica das transformaes em causa; na ideia enganadora que os

    problemas de produo e produtividade encontrem soluo principal na tcnica, atravs da

    introduo de sementes melhoradas, novas prticas e tcnicas agrcolas modernas.No h dvida que a tecnologia desempenha um papel crucial na transformao revolucionria docampo e da sociedade em geral. Sementes melhoradas, fertilizantes, prticas de irrigao etcnicas modernas, podem ser teis e beneficiar a generalidade dos produtores,independentemente do seu tamanho e modelo de gesto e produo. Mas a ideia de neutralidadetorna-se enganadora, quando se ignora que as instituies sociais e as polticas econmicasgovernamentais, implementadas conjuntamente com novas tecnologias, no so neutrais ousecundrios para economia rural. Como argumentou Garrett Hardin (1968), no famoso ensaiointitulado Tragdia dos Comuns, existem problemas (demogrficos, de gesto de recursosnaturais e do ambiente, entre outros), que no podem ser solucionados por meios tcnicos; tais

    problemas exigem mudana nos valores polticos, morais e institucionais (Hardin, 1968; Todaro,

    2002: 393).Em Moambique, semelhana de outras partes do mundo que viveram processosrevolucionrios contraditrios entre si, as reaces provocadas pela RV variam conforme os

    pressupostos e expectativas das pessoas, quanto s transformaes rurais preconizadas. Ostraumas e as frustraes de uns, ou os proveitos e sucessos de outros, provocados pela anteriorrevoluo socialista, devero continuar a influenciar, para bem ou para mal, as percepes e

    posies sobre o formato, objectivos e mtodos de uma RVM.

    Questes como as seguintes necessitaro de resposta e debate franco, profundo e aberto: se aanterior tentativa de socializao do campo em Moambique e a chamada nova revoluo verdemerecem o epteto de revoluo, o que as distingue, de facto? Apenas a cor? Apenas o facto de a

    anterior ter sido considerada vermelha ou mesmo sangrenta, enquanto que a nova se espera queseja verde e pacfica? O que est por de trs da cor?

    7 Processo idntico aconteceu mais recentemente no Zimbabwe, pas onde a reforma agrria se transformou numarevoluo perversa e regressiva; uma autntica contra revoluo verde, que tem convertido um dos principais celeirosde frica num candidato a pedinte e dependente da esmola internacional.

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    Se a distino entre as duas revolues fosse simplesmente o facto de a vermelha ser sangrenta ea verde ser pacfica, j no seria mau; mas de momento nem isso poder ser garantido. O grandedesafio continuar a ser: como converter a actual agricultura moribunda, num sector produtivodinmico, eficaz, competitivo e socialmente progressivo?

    2. Mil e Uma Razes Justif icam uma Revoluo Verde em Moambique

    Tentar reunir mil e uma razes para justificar uma revoluo verde seria gratuito. Mas se asrazes so muitas e variadas, a expresso mil e uma razes visa sublinhar precisamente esseaspecto, bastando ento nomear algumas das principais razes.

    Como se poder depreender das oito razes expostas de seguida, todas elas poderiam serdesmultiplicadas em vrios motivos e aspectos mais detalhados e especficos. Alm disso, ficarevidente que a questo da revoluo verde, ultrapassa a mera transformao tecnolgica e que os

    problemas da economia rural e da agricultura em particular, no podem ser solucionados por

    meios meramente tcnicos.As oito razes apresentadas a seguir, foram seleccionadas pensando no ditado popular, contrafacto no h argumentos. No no sentido de que os dados e informaes apresentados comofactos, no possam suscitar interpretaes diferentes das aqui expostas. Certamente que sim; masindependentemente das leituras e interpretaes que os dados suscitem, ajudar o debate se cadauma das razes seleccionadas assentar em factos especficos da estrutura e dinmica demogrfica,social, econmica, tecnolgica, poltica e cultural de Moambique. Desta forma, procura-seantecipar e separar, na medida do possvel, a controversa sobre a possibilidade e viabilidade deuma RVM, da parte menos controversa do debate: os factos e fundamentos que sustentam anecessidade de uma transformao profunda e radical da economia e das condies de vida, naszonas rurais de Moambique.

    2.1. Oito razes para uma revoluo verde em Moambique

    1 Crescimento demogrfico economicamente insustentvel

    Os dados e tendncias demogrficas da populao de Moambique, mostram que nas prximasduas dcadas, cerca de 9 milhes de pessoas sero adicionadas aos 21 milhes existentesactualmente. Por volta de 2025 Moambique ter cerca de 29 milhes de habitantes (Tabela 1).

    A populao moambicana faz parte do grupo de populaes no mundo, que mal iniciaram atransio demogrfica, de um equilbrio assente em taxas de mortalidade e fecundidade elevadas,

    para um novo equilbrio assente em taxas baixas. A transio demogrfica moambicana poderter iniciado na zona Sul do Pas (Arnaldo, 2003). Mas s uma anlise detalhada dos dados doCenso de 2007, permitir saber sobre a situao recente e perspectivas dessa mesma transio.

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    Em princpio, uma revoluo verde efectiva ebem sucedida contribuiria para que ocrescimento demogrfico da populaomoambicana se tornasse progressivamentesocial e economicamente sustentvel.

    Se bem que a grave crise econmica, registadana primeira dcada da independncia, tenhasido revertida, aps a introduo do Programade Reabilitao Econmica (PRE) em 1987,grande parte da recuperao tem apenascompensado de forma parcial (Figura 1), osefeitos desastrosos do retrocesso econmico,nos primeiros dez anos de independncia(Abrahamsson e Nilsson, 1994; Francisco,2002, 2003; Newitt, 1995; Sulemane, 2002).

    Este no o momentoadequado para explorar aligao entre a transiodemogrfica, produoagrcola e revoluo verdeefectiva. Mas oportunorecordar, a partir daexperincia histrica mundial,que nenhuma populaoconseguiu desenvolver-se,sem ser capaz de assegurar o

    seu prprio sustentoalimentar, quer por via da

    produo de excedentes, querpela aquisio de rendimentos para compra de excedentes de outros pases. Por desenvolvimento,entende-se, progressos sobretudo na esperana de vida da populao, reduo da fecundidade e damortalidade, melhoria nutricional, oportunidade de acesso educao e servios de sade dequalidade. (Conley et al., 2007; Livi-Bacci, 1992; Raham, 2004; Toffler e Toffler, 2006).

    2 xodo como opo para fugir do ciclo vicioso da pobreza no campo

    O crescimento populacional ainda se concentra no espao rural, o qual representa mais de 95%dos quase 800 mil km2de territrio nacional (terra firme e guas interiores). H vrias dcadasque este panorama tem vindo a alterar progressivamente. As taxas positivas de crescimentourbano so e continuaro elevadas, enquanto que o crescimento rural tende a diminuir, podendonum curto espao de tempo atingir taxas negativas.

    Por ocasio da Independncia em 1975, a populao urbana moambicana representava menos de10% da populao total. A Figura 2 ilustra a trajectria de urbanizao em Moambique, no

    Regio/Provncia

    Superfcie

    (K m2 ) (%)

    Populao2005 (1000

    hab.) (%)

    Populao2025 (1000

    hab.) (%)

    DensidadePopul.

    Total 799,380 19,420 28,542 36

    Rural 12,050 62% 12,427 44%Urbana 7,370 38% 16,115 56%

    Norte 293,292 37% 6,293 32% 9,345 33%Niassa 129,061 999 1,526 12Cabo Delgado 82,625 1,617 2,289 28Nampula 81,606 3,676 5,530 68

    Centro 335,406 42% 8,180 42% 12,084 42%Zambzia 105,008 3,710 5,376 51Tete 100,724 1,512 2,284 23Manica 61,656 1,320 2,036 33Sofala 68,018 1,638 2,388 35

    Sul 170,682 21% 4,948 25% 7,113 25%Inhambane 68,615 1,381 1,998 29Gaza 75,709 1,305 1,879 25Maputo Prov. 26,058 1,045 1,510 58Maputo Cid. 300 1,217 1,726 5,754

    Fonte: INE,2004; UN, 2006: http://esa.un.org/unpp

    Tabela 1: Superfcie Tot al; Projeco da Populao e da Densidade

    Nota: Projeco entre 2015 e 2025 com base na taxa de crescimento de UN, 2006

    Populacional por Regies e Prov ncias, Moambique, 2005 e 2025

    Agri cult ura

    Total de Cereais

    Produo Alimentar

    Produo No-Alimentar

    0

    50

    100

    150

    200

    250

    300

    350

    400

    1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005

    (Index:1999-2001=100)

    Anos

    Figura 1: Evolu o dos ndi ces de Produ o AgrcolaMoambique 1960-2005

    Agr icul tu ra Total de Cereais Produo Alimentar Produo No -Alimentar Fonte: FAO, 2006

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    ltimo meio sculo. Partindo de quase 150 mil pessoas, em 1950, a populao urbana atingiuperto de um milho em 1975, mas em 2005 rondava os sete milhes de habitantes. Ou seja, emmeio sculo, a populao urbana aumentou cerca de 40 vezes mais, enquanto que a rural apenas

    duplicou.8

    A este ritmo de crescimento, porvolta de 2025 a populao urbanaser igual ou ligeiramente maiordo que a rural. Trata-se dumatransformao social profunda esem precedentes na Histria deMoambique (FAO, 2006; MPD,2005, 2006; UN, 2007).

    Obviamente, a velocidade docrescimento urbano depender dosdeterminantes do xodo rural e

    factos especficos da dinmica doscentros urbanos. Uma revoluo verde com impacto positivo e extensivo no campo, certamenteno pararia o processo de urbanizao; mas poderia refrear a sua intensidade, contribuindo parauma urbanizao social e economicamente sustentvel. Acima de tudo, poderia contrariar oafluxo migratrio urbano com alguma eficcia, sem ser preciso recorrer a mtodos compulsivos eineficazes, como aconteceu com a famigerada operao produo na dcada de 80.

    A falta de plos economicamente viveis e duradoiros nas zonas rurais, priva o campo dealternativas eficazes para competir com os centros urbanos, atraindo jovens rurais em busca deoportunidades de emprego e melhores condies de vida. A urbanizao tornar-se- cada vezmais problemtica (social, poltica e economicamente), se os centros urbanos continuarem a atrairmigrantes rurais, sem que novas oportunidades de emprego e vida decente, acompanhem o rpidocrescimento urbano. Aos poucos, o xodo rural vai transferindo os problemas rurais para oscentros urbanos, deixando antever o agravamento de tenses sociais urbanas. Neste sentido aRVM poderia beneficiar e contribuir para a harmonizao e integrao mais equilibrada entrezonas rurais e urbanas.

    3 Fora de trabalho rural dependente de crianas e jovens em idade deestudar em vez de trabalhar

    No incio da corrente dcada, cerca de um tero da populao rural, envolvidas em actividadesagro-pecurias, eram crianas e jovens, dos 10 aos 19 anos de idade. Como ilustra a Figura 3,segue-se em ordem de proporo: o grupo dos 20-29 anos, com 23% e restantes grupos etrios:18% dos 30-39 anos; 13% dos 40-49 anos; 8% de 50-59 anos e 7% com mais de 50 anos de idade(INE, 2002, 2003).

    8As Naes Unidas estimam que a populao urbana tenha atingido 35% em 2007, tendo crescido no perodo 2000-2005 a uma taxa mdia anual de 4,3%, contra menos de um por cento (0,9%) nas zonas rurais(http://esa.un.org/unup/p2k0data.asp).

    0

    5

    10

    15

    20

    25

    30

    1950 1970 1990 2005 2015Pj. 2025Pj.

    0.2 0.52.9

    7.110.5

    14.49

    6.38.9

    10.7

    13.4

    14.2

    14.46

    Pop(Milhes)

    Anos

    Figura 2: Evolu o da Popu lao Urbana e Rural, 1950-2025

    Urbana RuralFonte: UN, 2007

    (em Milhes de Habitantes)

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    Na realidade, o peso do efectivo de crianas em actividades domsticas e agrcolas seria superior,se os menores de 10 anos, fossem includos nas estatsticas. Isto reflecte a baixa eficincia dasociedade em geral e da economia rural, em

    particular. As crianas continuam a desempenharum contributo crucial nas lides caseiras (apanharlenha, carregar gua, limpar) e nas tarefasagrcolas e pecurias.

    Nenhuma revoluo verde poder ser bemsucedida, se no criar condies sociais eeconomicamente viveis, para que a economiarural possa dispensar o enorme efectivo detrabalhadores, em idade escolar, preparando-se,

    para uma vida economicamente activa eprofissionalmente produtiva e saudvel.

    4 Involuo da produtividade agrcola e retrocesso tecnolgico agrrio

    No incio da dcada 70, a utilizao produtiva de terra agrcola em Moambique rondava 12,5%da superfcie de 78,5 milhes de hectares, ou 27% dos 36 milhes de hectares de terra arvel.Passado trs dcadas, somente 5% da superfcie total, ou 11% da terra arvel, so utilizados parafins produtivos.

    A Figura 4 mostra que a produo agrcola per capita regrediu drasticamente depois daindependncia em 1975. Desde ento os nveis mantiveram-se muito abaixo do pico atingido em1970. Apesar da ligeira recuperao na ltima dcada, os nveis de 1960 ainda no foramalcanados (FAO, 2006).

    Esta imagem da produo agrcola agregada consistente com a trajectria dos produtosindividuais histricos, tais como: caju, cana-de-acar, ch e milho (Figura 5). Recentemente,alguns destes produtos (e.g. cana de acar), registaram recuperaes assinalveis; mas em geral,os principais produtos agrcolas continuam a no assentar em modelos comerciais e empresariaiscompetitivos (FAO, 2007).

    O aumento da produo agrcola deriva da expanso das reas de cultivo e no da melhoria deprodutividade; esta possui nveis muito inferiores mdia da regio da frica Austral (0,7-0,9t/ha, contra 1,2 t/ha na frica Austral (Stage e tal., 2006).

    0

    20

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    1961 1970 1980 1990 2000 2003 2005

    143159

    98

    Index:1999-2001=1000

    Ano s

    Figura 4: Evoluo da Produo Agrco la per Capita emMoambique, 1961-2005

    Fonte: FAO, 2006

    Milho

    Cana de Aucar

    Caju

    Ch

    0

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    400

    600

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    1000

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    1400

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    200

    400

    600

    800

    1000

    1200

    1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005

    TonMet

    Anos

    Figura 5: Evoluo de Alguns Prod utos Agrcolas, Moambique 1960-2006

    Milho

    Cana de Aucar

    Caju

    Ch

    Fonte: FAO, 2007

    Ano base = 1996

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    A maioria dos agricultores moambicanos recorre a prticas primitivas de cultivo, sem qualquerrecurso a sementes melhoradas, pesticidas, fertilizantes, sistemas de irrigao e tcnicasmodernas. Enquanto a taxa mdia de uso de fertilizantes triplicou no continente asitico, de 37

    kg/ha em 1980/81 para 109 kg/ha em 2000/01, na fricaSubsariana, a taxa manteve-se abaixo de 10 kg/ha. Comodemonstra a Figura 6, Moambique s utiliza 5,9 kg/h defertilizantes (Camara and Heinmann, 2006: 6; Dao, 2007;FAO, 2006; INE, 2004).

    Nestas circunstncias, no surpreende que a populaomoambicana tenha duplicado de forma insustentvel,sabendo que a agricultura representa 40% do nvel alcanado,no incio da dcada de 1970.

    preocupante o contraste entre o elevado nvel defecundidade e reproduo da populao (cerca de 5,5 filhos

    por mulher em idade reprodutiva) e o baixo nvel de fertilidadeagrcola. Sobre isto, a RVM deveria contribuir para minimizara fraca sustentabilidade econmica do crescimentodemogrfico em Moambique.

    5 Questes agrrias depois dos brancos partirem: tragdia dos anti-comuns

    Eduardo Mondlane, primeiro Presidente da Frelimo, partido poltico no poder desde aindependncia, no seu livro intitulado Lutar por Moambique, citou um provrbio africano quesintetizava bem a questo agrria na poca colonial: Quando os brancos vieram para a nossaterra ns tnhamos a terra e eles tinham a bblia; agora ns temos a bblia e eles tm a terra

    (Mondlane, 1977: 17).Olhando para a experincia agrria, ao longo de mais de 30 anos de independncia, somoslevados a pensar que de nada serviu a bblia, nem outras fontes de inspirao moral, poltica eideolgica. At hoje no se conseguiu encontrar forma de garantir que, aps a partida dos colonos

    brancos, os moambicanos rurais sentissem que possuem mais do que a bblia. Sobre isto,declaraes como a seguinte, ilustram bem o sentimento de agricultores, por exemplo noChkw:

    At o colono que no era nosso pai (era padrasto) deu-nos dois hectares, mas essesdois hectares depois vieram a ser arrancados pelo nosso pai (a Frelimo), que at tevea coragem de levar a pouca terra que o branco nos concedeu Afinal quem quermais bem ao menino: o amante ou o pai? (Val, 2006: 130).9

    Mondlane certamente no antecipou as consequncias dramticas da sua viso para Moambiqueindependente, expressa no Captulo 10O Futuro:

    9Uma outra declarao: A Frelimo afinal no veio libertar-nos. Veio sim tirar o passarinho da gaiola mas amarrando-lhe uma perna para s esvoaar, mas sem poder ir longe. Isto porque os portugueses colonizaram-nos mas pelo menosderam-nos entre 0,5 a dois hectares de terra, terra essa que a Frelimo arrancou-nos. O que interessa para ns estarlivre do colono, mas estar de novo preso em formas inapropriadas de viver e trabalhar? (Val, 2006: 130).

    Figura 6: Uso de Fertilizantes (Kg/ha)em frica, 2002

    S. Tom & Principe - Zambia 12,39 South Africa 65,42Angola - Botswana 12,43 Mauritius 250Djibouti - Algeria 12,79 Egypt 437,52Liberia - Senegal 13,61 To tal 752,94Eq. Guinea - Rwanda 13,71Central Africa Rep. 0,31 Ethiopia 15,10Namibia 0,37 Benin 18,76Burkina Faso 0,38 Kenya 31,03Somalia 0,48 Libya 34,10Sierra Leone 0,56 Zimbabwe 34,16Gabon 0,92 Lesotho 34,24Niger 1,11 Cote d'Ivore 35,16Congo 1,24 Tunisia 36,81Congor RD 1,57 Swaziland 39,33Tanzania 1,79 Malawi 43,00Uganda 1,82 Morocco 47,52Burundi 2,58 T ot al 4 34 ,1 4Madagascar 3,09Gambia 3,20Guinea 3,56Comoros 3,75Sudan 4,28Chad 4,86Cape Verde 5,24Nigeria 5,50Cameron 5,86

    Mozambiq ue 5,93Mauritania 5,94Togo 6,79Eritrea 7,35Ghana 7,42Guinea-Bissau 8,00Mali 9,01

    Total 102,91

    Source:Camara and Heinmann, 2006: 6

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    O governo de qualquer pas em vias de desenvolvimento tem como finalidade oficialo progresso econmico e social assente em largas bases. Creio que uma dascondies necessrias para o conseguir eliminar as foras econmico-sociais quefavorecem as minorias. Por isso no entendo apenas minorias raciais: estas perderoautomaticamente os seus privilgios especiais quando se fundar um Estado africano.Em muitos aspectos existe grande perigo na formao de grupos africanos

    privilegiados; instrudos dum lado, ignorantes do outro; operrios fabris dum lado, dooutro camponeses. Paradoxalmente, para evitar a concentrao de riqueza e serviosem pequenas reas do pas e nas mos de poucos, necessrio um forte planeamentocentral (Mondlane, 1977: 250).

    De facto, em poucos anos, os brancos no s perderam seus privilgios especiais, mas tornaram-se uma raa em vias de extino, sobretudo nas zonas rurais de Moambique. Mas nem por isso,como ilustram as citaes acima, a populao negra rural, os chamados colonos assimilados eindgenas, iriam ter motivo para acreditar que a independncia tinha-lhe permitido conquistarmais que a bblia, recuperando as terras expropriadas pelos colonizadores portugueses.

    A preocupao de Mondlane em eliminar os alicerces que favorecessem o surgimento de novasminorias nacionais, foi contemplada na Constituio de 1975, ao estipular que a terra passava a

    propriedade exclusiva do Estado. Pelo menos em termos jurdicos, o Estado converteu-se nonico monopolista fundirio, senhor e gestor absoluto do principal activo de Moambique.

    O forte planeamento centralizado, introduzido por Samora Machel, sucessor de Mondlane eprimeiro Presidente deMoambique independente,conduziu ao igualitarismoilustrado pela curva de Lorenz eo coeficiente de Gini da Figura7. A crescente concentrao oudesigualdade, na posse deexploraes agrcolas durante o

    perodo colonial, foi

    interrompida depois daindependncia. De umcoeficiente de Gini de 0,366 em1970, passou-se para um Ginide 0,105 em 2000. Passou-se

    para um igualitarismo ruralquase absoluto, mas queinfelizmente no representaequidade sustentvel. umigualitarismo produzido poruma estratgia de colectivizaoe estatizao da produo e comercializao rural, da desvalorizao monetria dos activos

    fundirios no mercado formal e proibio legal da apropriao privada da terra.

    A prorrogativa constitucional, segundo a qual A terra no deve ser vendida, ou por qualqueroutra forma alienada, nem hipotecada ou penhorada (Constituio 2004, art. 109) mantm-se,mas aplicada parcial e fingidamente, incluindo no prprio sector formal e pblico.

    Na prtica, por via oficiosa ou informal, os cidados tem encontrado maneira de contornar a lei eafirmar seus direitos de facto, procurando minimizar os prejuzos e danos, causados pelaimposio de direitos de jure monopolistas do Estado, refugiando-se na economia informal.

    0

    20

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    60

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    100

    0 20 40 60 80 100

    Figura 7: Comparao das Curvas de Lorenz e Coeficiente de Gini da Distribui o doNmero de Explo raes Agrcolas em 1970 e 2000, Moambique

    Igualdade Actual Colonial

    Gini indepedncia = 0,105

    Proporod

    a

    extenso

    %

    Fonte: Presidncia do Conselho, 1973: 16; INE, 2002

    Gini colonial = 0,366

    Proporo da repartio de exploraes

    %

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    Quem ganha com isto a economia informal, mas no s. Ganha tambm a elite poltica,sobretudo aquela que, de um lado, se proclama defensora dos desfavorecidos, e do outro, acumulae negocia terra informalmente.

    Este quadro institucional poder continuar a fomentar igualitarismo, mas nunca ir proporcionarcondies de equidade, o que diferente de igualdade nivelada por baixo e fictcia. O custo destasituao institucional est ainda por avaliar, mas os efeitos negativos de longo prazo soinmeros, alguns dos quais bem visveis. Algumas so expostas nos exemplos de involuodramtica da economia rural, ilustrados pelas Figuras 1, 4, 5. Outros exemplos so, como mostraa Figura 8, a inutilidade da titulao oferecida pelo Estado e os efeitos de anti bancarizao dosistema de crdito, numa situao em que os camponeses e empresrios agrcolas esto reduzidosa meros inquilinos do Estado.

    A guerra civil acabaria por converter o drama econmico rural numa tragdia sem precedentes.Com o fim da guerra civil em 1992, a tragdia rural amainou, visto que a populao recuperou odireito de lutar pela sua sobrevivncia em paz. Mas o drama da economia rural moribundacontinua por resolver.

    Enquanto isso, as foras econmico-sociais que favorecem as minorias, as tais foras queMondlane acreditava que era necessrio eliminar, para que o progresso econmico assentasse emlargas bases, renascem por intermdio das novas minorias endinheiradas (Couto, 2005: 25).10

    Seja qual for a estratgia que venha a dominar o processo da RVM, esta s poder tornar-seefectiva se enfrentar a real questo agrria e fundiria com frontalidade e franqueza. Sobretudo,

    10A maior desgraa de uma nao pobre que, em vez de produzir riqueza, produz ricos. Mas ricos semriqueza. Na realidade, melhor seria cham-los no de ricos mas de endinheirados. Rico quem possuimeios de produo. Ricos quem gera dinheiro e d emprego. Endinheirado quem simplesmente temdinheiro. Ou que pensa que tem. Porque, na realidade, o dinheiro que o tem a ele (Couto, 2005: 23).

    Figura 8: Acesso Posse de Ttulo de Terra e a Crdito Formal Rural em 2000-01,Moambique

    Com ttulocompleto,

    0.8%

    Ttuloprecrio,

    3%

    Sem ttulo,97%

    Figura 8a: Posse de Ttulo das parcelas agro-pecurias em Moambiqu e, 2000-2001

    INE, 2002: 10

    Comcrdito

    4%

    Semcrdito

    96%

    Figura 8b: Exploraes com acesso a crditoform al, 2000-2001

    INE, 2002: 50

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    se enfrentar o problema sem preconceitos, ressentimentos ideolgicos e interesses dissimulados, espera que a questo fundiria seja resolvida por default, no se base a partir de qu, de onde oucomo.

    So poucas as pessoas que defendem, que um sistema que produz misria igual para todos,poder oferecer alternativas positivas para um crescimento efectivo, duradoiro equitativo e

    sustentvel em Moambique. Mas menos so ainda os lderes polticos, no poder ou na oposioparlamentar, que apontam estratgias concretas e progressivas, para uma viabilizao daagricultura e da economia rural. Implcita ou explicitamente, a RVM ir forar as lideranas

    polticas e governativas a mostrar como pretendem lidar com trabalhadores agrcolas rurais:reconhec-los como camponeses com dignidade e direitos prprios, ou continuar a trat-los comosbditos ou meros inquilinos do Estado?

    Desde a Constituio de 1975, persiste no documento fundamental do Estado moambicano, opilar institucional que tem conduzido ao que designo tragdia (moambicana) dos anti-comuns.Refiro-me a tragdia dos anti-comuns, para distinguir este tipo de armadilha social, daidentificada como tragdia dos comunspor Hardin (1968). Segundo Hardin, o livre acesso e ademanda irrestrita de um recurso finito, termina por condenar estruturalmente o recurso a uma

    super-explorao. Ora, em Moambique, o acesso juridicamente gratuito terra, geridoadministrativamente por polticos e burocratas, ao converter a terra em capital improdutivo, emvez de super-explorao tem conduzido sua sub-explorao, super-ociosidade e super-desvalorizao econmica no mercado formal. Na economia informal, procura-se valorizar oactivo desvalorizado por fora da Lei, mas uma valorizao especulativa e improdutiva(Acemoglu 2004, 2005; Bruce, 2007; Francisco e Paulo, 2006; Hamela, 2003; ODriscoll eHoskins, 2002; de Soto, 1989, 2002).

    O que est em causa no optar por uma privatizao por mera privatizao, sem qualquerregulao efectiva e economicamente sensata pelo Estado. Tal opo, por si s, no valorizaria aterra, nem viabilizaria a agricultura. Como em muitos outros aspectos da vida, o necessrioraramente se converte no suficiente. Muito provavelmente, aconteceria o mesmo que aconteceucom a privatizao generalizada das empresas estatais, em que se acreditou que o mercado seencarregaria de as tornar produtivas e competitivas.

    A crena errada e mope nas virtudes do mercado, j no passado conduziu a lamentveisinterpretaes a favor de outro fundamentalismo do Estado. Ms interpretaes e polticasdesastrosas podem derivar destes dois tipos de fundamentalismo: o do mercado e do Estado. Se atransferncia do monoplio do Estado, para um monoplio ou oligoplio privado, no garantemaior concorrncia e eficincia produtiva, tambm a transferncia do monoplio estatal da terra,

    para um grupo de novos latifundirios endinheirados, dificilmente trar soluo satisfatria eduradoira, para os desafios criados pela desastrosa gesto em que a terra continua mergulhada.

    A questo da posse individual da terra, tanto em Moambique como em toda a frica Austral,constitui apenas uma parte, talvez mesmo a parte menor da questo fundiria e agrria nacional.Isto bem ilustrado na Figura 9.

    Na maioria dos pases da frica Austral, os dois principais sistemas de posse e gesto do uso daterra, so estatal e o consuetudinrio. S na frica do Sul que o sistema de propriedade privadae propriedade individual se tornou dominante, ocupando mais de 70% do territrio nacional. NoLesoto, cerca de 95% no sistema costumeiro, incluiu arrendamentos em reas urbanas, mas toda aterra mantm -se subordinada monarquia. Em Moambique, a percentagem de 183% na Figura

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    9, visa sublinhar a duplicidade e sobreposio de vrios direitos de propriedade. Nos termos da leivigente, o Estado tem 100% do direito de juresobre a terra, mas na prtica, os direitos de factoeconsuetudinrios assumem predominncia. Pelo menos 80% da posse de terra corresponde aodireito consuetudinrio, enquanto o direito de propriedade privada apenas cobre 3% do territrionacional (Mutangadura, 2003: 2-3).

    Desconhece-se a real dimenso do prejuzo econmico e custo social do monoplio absoluto daterra pelo Estado. Vamos esperar que a colocao da RVM na agenda poltica acabe por forar aslideranas a enfrentar a questo agrria com seriedade e responsabilidade. A questo agrria emMoambique, que no contexto da socializao do campo girava em torno da transformao daeconomia colonial numa economia socialista (OLaughlin, 1981: 32), foi revisitada ereconsiderada por Marc Wuyts (2001), no mbito do que designou transio e reconstruo deMoambique. Infelizmente, esta reflexo ainda no mereceu a devidamente ateno.

    A questo agrriapermanece na encruzilhadade foras diversas:

    defensores genunos dosdesfavorecidos; interessesestabelecidos proclamadoslegtimos defensores dosinteresses pblicos, algunsdeles, mais para dissimularseus interesses privados;tabus, traumas e

    preconceitos ideolgicos.Nestas circunstncias, aquesto agrria continuar a

    agir como factor regressivo, em vez de progressivo e estruturante, do desenvolvimento deMoambique. Isto paradoxal, do ponto de vista de uma estratgia apostada no combate

    pobreza e reduo da dependncia externa, assentes numa economia de mercado saudvel.11

    Moambique precisa de garantir que a terra cumpra a sua funo social, de garante dasobrevivncia e auto-sustento da populao. S que isto no ser conseguido com o principalactivo do Pas reduzido a capital improdutivo na economia formal, enquanto prospera naeconomia informal como mero capital especulativo. No ser conseguido enquanto prevalecer omito que a funo social poder ser melhor realizada por vias no-lucrativas e anti-lucrativas. sabido que sem sucesso financeiro e econmico, nenhum agente econmico nem nenhumaeconomia nacional, conseguem realizar objectivos sociais, a longo prazo. A transformao da

    terra em capital produtivo no tem que ser conseguida contra a propriedade privada, mas simcontra as formas de apropriao monopolista, ociosa e improdutiva, quer sejam privado-latifundirias quer estatais.

    11 Amartya Sem recorda que a influncia poltica na procura do proveito econmico um fenmeno bem real nomundo em que vivemos. A denncia dos defensores dos pretensos benefcios sociais decorrentes da proibio daconcorrncia remonta a Adam Smith. Smith defendia que os interesses estabelecidos tendem a sair vencedores porcausa do seu melhor conhecimento dos seus prprios interesses (no o seu conhecimento do interesse pblico(Sem, 136).

    2 3 3 5 5 8

    40 41 44 4472

    84100

    1625

    720

    016 13 5

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    15

    80

    81 70 8872

    6043 43

    95 14

    0

    40

    80

    120

    160

    200

    Percentagem

    Pases

    Figura 9: Sistemas de Poss e da Terra na fri ca Austral, emPercentagem do Territr io Nacional

    In di vi du al /P ri vad o Es tat al e o ut ro s C on su et ud in r ioFonte: Mutangadura, 2003: 2-3

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    6 Economia rural assente numa economia de subsistncia precria

    A dinmica demogrfica e a economia de subsistncia, tm compensado os efeitos de choques e

    rupturas radicais, de natureza poltica e econmica, mas no foram capazes de evitar adeteriorao profunda da produtividade e do padro de vida dos moambicanos. Tanto no perodocolonial, como no perodo depois da independncia, a produo de subsistncia actuou como umamortecedor das flutuaes econmicas, dos surtos de desemprego e crises do mercado formal,urbano e rural, bem como da base de sustentao para a reforma e velhice da populao (Castel-Branco, 1996; Francisco e Paulo, 2006; Watts, 2001).

    A Figura 1, no incio desta seco, ilustra a tendncia dos ndices de produo agrcola alimentare no-alimentar, indicando que aps a independncia, a produo no-alimentar foi a que registouquedas mais dramticas. Este impacto conduziu transformao da estrutura produtiva agrria,como ilustrado a Tabela 2, com um aumento proporcional da produo alimentar de auto-consumo, nas dcadas mais recentes.

    7 Indicadores de condies de vida rural contraditrios

    Em contraste com os indicadores sobre pobreza e crescimento econmico, que tm sido positivosao longo de mais de uma dcada, outros indicadores importantes sobre condies bsicas de vida,

    so menos animadores e alertam para a debilidade da melhoria do nvel de vida da populao.

    A Tabela 3 apresenta os valores recentes da desnutrio crnica em Moambique. Destaca-se aamarelo, as provncias onde a situao tem piorado. Dados relativamente recentes, revelaram quea prevalncia de malnutrio nas crianas moambicanas, em vez de melhorar, piorou entre 1997a 2003.

    Tabela 2: Comparao da Estrutura da Economia Rural Antes e Depois da Independncia,Moambique 1970 e 2000-01

    Regio Plantaes eAgriculturaEmpresarial

    Camponeses

    Produocomercializada

    Auto-consumo Venda de Fora de Trabalho

    Pas1970 30% 15% 55%

    Trabalho sazonal para plantaes locais e tambm para asplantaes na Tanznia, Zimbabwe e Malawi.Ao longo do ano, 20 a 30% dos homens adultoscamponeses encontravam-se a trabalhar nas minas dafrica do Sul em contrato peridicos, mdia por ano.Trabalho sazonal nas machambas dos colonos.

    Pas2000 4% 39% 57%

    No final da dcada de 1990, cerca de 49% dos agregadosfamiliares, tinham pelo menos um membro contratado notrabalho assalariado, enquanto 43% realizava trabalhosazonal

    Fonte: INE, 2002, 2003; Dava et al.1998, Wuyts, 2001, Francisco e Paulo, 2006 : 83.

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    Os ndices de malnutrio crnica (baixa altura para a idade) passaram de 36%, em 1997, para41%, em 2003. A prevalncia de baixo peso para aidade, permanece nos 24% enquanto a prevalnciade crianas com peso insuficiente, ronda os 14%.

    Nas reas rurais, os nveis de malnutrio sosubstancialmente mais elevados do que em reasurbanas, chegando a 46% de malnutrio crnica e27% de insuficincia de peso. A malnutriocrnica hoje responsvel por metade dos bitosregistados em crianas com menos de cinco anosde idade (INE, 2004; PNUD, 2006: 308; UNICEF,2006: 30).12

    O relatrio da UNICEF de 2006 sobre a situaonutricional da criana no mundo aponta como

    causas principais do seu retrocesso nutrvel, odeclnio na produtividade agrcola, as recorrentescrises alimentares associadas seca e os elevadosnveis de pobreza. O HIV/SIDA surge tambm

    como ameaa sria melhoria da nutrio, na frica Austral, incluindo Moambique (UNICEF,2006).

    8 Uma Agenda 2025 para mltiplas estratgias, no contexto de falta demassa crtica para uma RVM efectiva e progressiva

    A Agenda 2025 dos poucos documentos polticos genuinamente pluralista e fruto de umcontributo intelectual reconciliador, tolerante e sensato de analistas polticos, acadmicos e

    profissionais de trincheiras polticas e ideolgicas diferentes. Infelizmente, como temacontecido com outros documentos programticos, aps a sua concluso e aprovao, a Agenda2025 foi praticamente remetida ao esquecimento.13

    O argumento que a Agenda 2025 superficial ou irrelevante, para a investigao cientfica, porno aprofundar aspectos cruciais para o futuro desenvolvimento fraco. Serve mais paratestemunhar a falta de massa crtica e debilidade do trabalho analtico e de investigao que odocumento poderia ter inspirado.

    No era suposto que a Agenda 2025 fosse prescritiva e deliberativa, quanto estratgia de

    desenvolvimento a seguir nas prximas dcadas. O mais importante que equacionou comsuficiente abertura intelectual, cenrios de desenvolvimento possveis, a tomar em considerao

    12Entre os pases da frica Austral, com dados disponveis, Moambique regista a taxa de desnutrio mais elevada,assente em 24 por cento com baixo peso, contra 10 e 13 por cento, respectivamente na Suazilndia e Zimbabwe(PNUD, 2006: 308; UNICEF, 2006: 30).

    13 Uma excepo foi o compromisso eleitoral em 2004, do ento candidato Armando Guebuza a Presidente daRepblica. Entre outras referncias Agenda 2025, parece ter sido deste documento que a a expresso sobre o espritode deixa-andar(Guebuza, 2004).

    Tabela 3: Percentagem de DesnutrioCrnica em Crianas Menos de 5 anos,

    Moambique

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    no futuro imediato. A Figura 10 ilustra o mosaico de alternativas estratgicas dedesenvolvimento: Cenrios do Cabrito, do Caranguejo, do Cgado, da Abelha e Ideal. Competiaaos analistas e investigadores procurarem estudar e apontar caminhos e direces para se evitar oscenrios regressivos e maximizar os progressivos.

    Dificilmente poder uma revoluo verde converter-se num movimento inclusivo, abrangente emobilizador, se o processo for tratado com esprito burocrtico, no estilo do da palavra de ordem

    que certos burocrticos militantespretendiam instituir na AdministraoPblica: Deciso Tomada, MissoCumprida.

    Nesta perspectiva, duas tendnciaspodero conduzir a RVM aoinsucesso: 1) A tendncia

    burocratizante de processos detransformao real, como a

    transformao das relaes de sociaisde produo a nvel rural. 2) A

    propenso para o sectarismo eexcluso poltico-ideolgica,nomeadamente se conduzir restrioda liberdade de expresso, anlise

    crtica, investigao independente e debate aberta de ideias.

    3. RVM Necessria, mas ser Possvel e Provvel no Futuro Imediato?Seria imprudncia intelectual, da parte de quem acredita que Moambique necessita dumarevoluo verde, se acreditasse que a necessidade de uma revoluo verde suficiente para setornar possvel e vivel. Poder esta nova RVM tornar-se realmente efectiva, duradoira esobretudo progressiva?

    No este o espao apropriado para debater se a adeso da actual liderana poltica e do Governo nova revoluo verde ou no inspirada, num entendimento genuinamente diferente e maisrealista do que foi a estratgia da socializao do campo. A dvida justifica-se, nem que seja

    porque uma outra hiptese no pode ser descartada. Que a adeso RVM poder ser meramentetctica, ou uma outra forma de convenincia para maximizar a captao dos recursos e proveitos

    da ajuda internacional.

    3.1. Que tipo de revoluo? .

    improvvel que uma RV tenha xito em Moambique, se os valores polticos e morais quelideram as estratgicas dominantes na sociedade moambicana, no forem revistos com franquezae passarem a inspirar confiana poltica no cidado, sobretudo nas zonas rurais. Tal mudana

    Figura 10: Cenrios Possveis da Agenda 202 5

    1111

    "Agenda 2025": Cenrios Possveis em Moambique 2025

    0

    20

    40

    60

    80

    100

    Ideal

    Mo. Actual (Cab)

    C1 Guerra (Caranguejo)

    C2 C/R (Cgado)

    C3 M&R (Abelha)

    Viso 2025

    Fonte: Agenda 2025

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    dever afectar as prprias percepes e expectativas sobre questes como revoluo eestratgia.

    Um processo de mudanas polticas profunda que destabilize profundamente a produo, aprodutividade e a eficincia da sociedade em geral, merece ser considerado revolucionrio? Semerecer, no admira que o conceito de revoluo seja frequentemente acolhido com apreenso ereceio. De facto, muitos dos processos considerados revolucionrios, se fossem reavaliados luzdos seus impactos de longo-prazo, em vez das conquistas de curto prazo, certamente acabariam

    por se reclassificados como contra-revolucionrios. Digo contra-revolucionrio, no sentido dosefeitos regressivos duradoiros em termos de produo, produtividade e eficincia da sociedadeem geral.

    Ser praticamente impossvel encontrar uma resposta consensual, quanto avaliao daexperincia de revoluo socialista em Moambique. Os acontecimentos so ainda muitorecentes. Tanto as vtimas da revoluo socialista como os actores e defensores do seu projecto emodelo inspirador continuam activos e influentes na poltica actual e mquina governativa eestatal.

    Consciente deste ambiente e antecedentes histricos, para efeitos deste trabalho, a definio deRevoluo Verde que me parece mais adequada e operacional em Moambique a seguinte:

    Revoluo verde o processo de transformaes profundas das condies sociaise tecnolgicas de produo dos agricultores rurais, atravs de mudanasestruturantes e geradoras de maior produtividade, equidade e lucratividade, emque os proveitos beneficiem cada vez mais os agentes econmicos rurais, emtermos de melhoria da sua segurana alimentar, padro de vida individual eoutras formas efectivas de sair da armadilha da pobreza e dosubdesenvolvimento.

    Propositadamente, a definio anterior sublinha explicitamente a questo da lucratividade embenefcio das zonas rurais. Quero com isto romper com o preconceito e tendncia aindageneralizada de se dissimular a importncia do aumento de valor e do crescimento lucrativo, porde trs de um floreado de palavras obscuras, difusas e destitudas de substncia.

    Tanto o refgio numa postura tecnicista, mesmo quando os problemas em causa soprincipalmente problemas no-tcnicos, como a crena que os objectivos sociais so avessos aolucro, ou possam realizar-se sem uma base financeira, so contraproducentes. A transformao

    profunda e modernizao da agricultura rural no podem ser alcanadas por vias meramentetecnolgicas. Do mesmo modo, sem sucesso financeiro e econmico, nenhum objectivo social

    poder ter possibilidade de sobreviver e sustentar-se a longo prazo.

    3.2. e justifica-se falar de estratgia?

    O mbil principal de uma estratgia, seja ela qual for, o conflito de interesses, choque devontades antagnicas, e disputas e luta pela sobrevivncia. No jogo real da vida, a estratgia oinstrumento operativo de gesto de conflitualidades, conquista de superioridade e vantagens sobreOutro (inimigo, oponente ou concorrente).

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    semelhana do conceito de revoluo, tambm no este o espao apropriado para uma anliseexaustiva do significado e utilidade prtica do conceito de estratgia. Esta frequentementevulgarizada e reduzida mera definio de intenes, objectivos e finalidades. Isto, em nadaajuda, na formulao e implementao de uma RVM. A questo da revoluo verde assumecarcter e dimenso da realidade estratgica, no em termos poltico-militares, mas sim em tanto

    que contexto poltico-econmicos, por exemplo de conquista e preservao de vantagenscompetitivas. Nesta perspectiva, a definio de estratgia que melhor parece captar pensamentoestratgico relevante a seguinte, proposta por Francisco Abreu:

    A cincia e arte de, luz dos fins de uma organizao, estabelecer e hierarquizarobjectivos e gerar, estruturar e utilizar recursos, tangveis e intangveis, a fim dese atingirem aqueles objectivos, num ambiente admitido como conflitual oucompetitivo(ambiente agnico) (Abreu, 2002:20).

    Esta definio proporciona a identificao de quatro elementos fundamentais de enquadramentoconceptual: 1) Duas vontades conscientes e incompatveis em confronto; 2) Um jogo de somatendencialmente nula: para que um dos jogadores ganhe tem o outro que perder; 3) O uso da fora

    ou a ameaa do seu emprego, o que quer dizer que no se trata de persuadir, por exemplo, massim de obrigar a aceitar; 4) A possibilidade de afectar a sobrevivncia do antagonista, poraniquilamento ou pela dissoluo das suas qualidades especficas (Abreu, 2004: 28-29).

    Se tomarmos como bom o conjunto de elementos anteriormente enunciados, como sublinhaAbreu, devemos excluir do campo da relao estratgica, todas as relaes que no sejamconflituais ou competitivas. Isto significa, em relao RVM, que na estratgia econmica ouempresarial no h violncia (como numa situao de guerra). Mas a razo de ser do uso do termoestratgia resultado do facto que a realidade estratgia pressupe um clima de rivalidade,conflitualidade e conflito de interesses. Se a questo da RV no envolvesse choque de interesses,no haveria necessidade de estratgia, mas quando de programao e planeamento.

    4. Em que Cenrios poder a RVM ser Possvel, Vivel e Sustentvel?

    A questo principal a responder neste artigo encontra-se enunciada no ttulo: Ser a revoluoverde possvel, vivel e sustentvel, no contexto das estratgias de desenvolvimento dominantesem Moambique?. Para responder a esta questo central, recorre-se a um modelo de cenarizaosimples de hipteses ou opes de estratgias alternativas de crescimento econmico.

    4.1. Modelo de enquadramento: matriz de alternativas de crescimento

    O modelo analtico em que assentam os cenrios, inspira-se na conjugao de abordagensrelevantes e complementares, para uma anlise sistemtica dos determinantes das dinmicasexterna e interna do crescimento econmico. Trs fontes principais merecem ser mencionadas,mesmo que sejam aqui apenas afloradas de forma muito resumida.

    Primeiro, considera-se a lgica de anlise estratgica enquadrada no modelo SWOT/TOFA(Triunfo, Oportunidades, Fraquezas e Ameaas) e outras metodologias de cenarizao,conjugando as componentes internas e externas do crescimento, espelhadas atravs de uma

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    aproximao matricial (Abreu, 2002; Capricon, 1995; de Carvalho, 2006; Fernandes e Abreu,2004; Franco, 2007; Porter, 1980, 1996).

    A segunda fonte corresponde ao Princpio de Pareto ou Princpio 80/20, segundo o qual grandeparte dos efeitos/resultados/produtos (na ordem dos 80%, mas podendo ser mais ou menos do queesse valor) deriva geralmente de um reduzido conjunto de causas/insumos/factores determinantes(mais ou menos os 20%) (Kock, 1989).

    A terceira fonte incluiu um conjunto de contribuies tericas recentes, para um quadro analticounificador de formulao de estratgias de crescimento acelerado, operacional e sustentado numraciocnio econmico slido.14Digno de nota, a abordagem proposta por Hausmann, Rodrik eVelasco em 2005, no artigo Growth Diagnostics (diagnstico do crescimento). Hausmann et al(2005) defendem uma abordagem analtica e operacional, focalizada na identificao deconstrangimentos principais, em vez do comum arrolamento de uma vasta lista de possveisfactores determinantes; muito caracterstico da abordagem do Consenso de Washington,amplamente usada no passado por agncias doadoras e de ajuda multilateral aos pases emdesenvolvimento.

    A metodologia de Hausmann et al (2005) contempla o mtodo da rvore de decises, atravs dediferentes ramos de deciso com incio em duas opeselevado custo de financiamento e baixoretorno. O objectivo principal determinar os baixos nveis de investimento privado e deempreendedorismo, procurando-se a raiz causal dos problemas, em particular osconstrangimentos que mais limitam o crescimento econmico. Se bem que os autores doDiagnstico do Crescimento no mencionem explicitamente o Princpio de Pareto, na sualgica de identificao de hipteses e opes estratgicas de crescimento, com destaque para osconstrangimentos do crescimento, as duas abordagens afiguram-se complementares.

    Nas seces seguintes, a aproximao matricial das alternativas estratgicas de crescimentoconsideradas nos quatro cenrios possveis, sintetizada na representao da Figura 11, composta

    por quatro posies celulares que correspondem a diferentes tipos de aproximaes estratgicas.Os quatro cenrios considerados, cada um correspondendo a uma das clulas da matriz, so osseguintes:

    Cenrio 1:Muitas Oportunidades e muitos Pontos Fracosconjugam-se no tipo de cenrioestratgico actual. Poder conduzir a uma estratgia defensiva ou tentativa de manutenodo status quo o mximo possvel; alternativamente, pode tambm conduzir mudanaradical da estratgia. Na Figura 11, a designao Progresso em Muletas visa sublinhar arelao estratgica dominante: dependncia e manuteno de um stock persistente e bsicode ajuda externa, sem o qual a ruptura da estabilidade social e econmica seria inevitvel,

    podendo empurrar o pas para o Cenrio 2.

    Cenrio 2: Muitos Pontos Fracos e Grandes Ameaas conduzem a uma estratgiaregressiva, conducente a uma situao certamente pior do que a actual. A designaoTragdia dos anti-comuns no Cenrio 2 foi comentada acima, na 5 razo para uma

    14Na dcada passada uma vasta literatura internacional tem estado a ser desenvolvida em torno da pesquisa sobre asfontes do crescimento econmico acelerado no mundo, particularmente em vias de desenvolvimento (Acemoglu, et al,2001; Acemoglu et al., 2003; Acemoglu et al., 2004; Aghion and Aghion, 2003; Dawson, 2007; Felipe, 2006;Hausmann et al., 2005; Pritchett, 2001; Rodriguez, 2005; Rodrik, 2004).

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    RVM. Refere-se ao tipo de armadilha social, em que o livre acesso e a demanda irrestritade um recurso finito, termina por condenar estruturalmente o recurso sub-explorao,super-ociosidade e super-desvalorizao econmica. Pior do que um cenrio anterior, deestagnao, o cenrio 2 caracteriza-se pelo retrocesso institucional, do padro de vida e dasociedade em geral.

    Cenrio 3: Muitas Ameaas e muitos Pontos Fortes conduzem a aproximaes deintensificao ou especializao em progressos efectivos, com possibilidade de efeitos deexcluso social e econmica. Contrariamente aos dois cenrios anteriores, envolve umaestratgica de desenvolvimento progressivo, no qual uma RVM poder ter lugar, mesmoque o seu impacto seja parcial e restrito, dependendo dos efeitos de excluso social quegerar.

    Cenrio 4: Muitas Oportunidades e muitos Pontos Fortesconduzem a aproximaes maispr-activas, diversificadas e inclusivas. Tal como o anterior, mas de forma mais ampla eextensiva, envolve uma estratgia de desenvolvimento progressivo. Pressupe um quadroinstitucional favorvel ao crescimento econmico acelerado, com uma transformao ampla

    e inclusiva das instituies e da tecnologia, cujos benefcios sero apropriados pelos actoresendgenos.

    4.2. Caractersticas dos Cenrios de Viabilidade ou Inviabil idade da RVM

    Os cenrios enunciados sero aflorados, de forma resumida, sem se entrar em detalhes tcnicossobre a sua estrutura, construo, pressupostos e elementos constituintes. O objectivo aqui compartilhar o enquadramento para as respostas alternativas questo enunciada no ttulo.

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    Assim, de forma resumida, as caractersticas dos quatro cenrios possveis so apresentadasseguidamente.

    4.2.1. Cenrio 1: Progresso em Muletas

    O cenrio 1 corresponde ao cenrio que designo como Progresso em Muletas. Progresso emmuletas porque a estabilidade social e econmica de Moambique assenta na dependnciaexterna, principal contribuinte (at do ponto de vista fiscal) para o sustento do consumo pblico,no-produtivos e em menor proporo tambm algum produtivo.

    Em troca da extensiva ajuda externa, ao longo dos anos passados o Governo mostrou-se maispreocupado em retribuir com um discurso que designo por wishful thinking. Este termo ingls de difcil traduo em portugus. Significa tomar os desejos por realidade e tomar decises, ouseguir raciocnios, na base desses desejos, em vez dos factos ou da racionalidade adequada sociedade real.

    O Cenrio 1 corresponde ao que na Agenda 2025, se designa como o Cenrio do Cabrito.Prefiro no distrair a ateno com metforas do reino animal. Mas o fundamento para este cenrioenvolve situaes como as seguintes: corrupo, deixa-andar, intolerncia, excluso social, quese continuar a aumentar, poder eventualmente conduzir a conflitos ou mesmo guerra. AAgenda 2025 elegeu a Paz e Estabilidade Socialcomo varivel determinante, cujo retrocessotem implicaes significativas para o futuro.

    Todavia, como diz a expresso citada por Francisco e Paulo (2006: 3): Num pas do faz doconta, tudo acaba em tanto faz. A filosofia do cabrito como onde est amarrado, caractersticada racionalidade econmica prevalecente durante a presidncia de Joaquim Chissano, o que se

    pode esperar da revoluo verde num tal cenrio?

    Se Moambique continuar neste cenrio, em termos macroeconmicos e fiscais assente naracionalidade econmica do PARPA (Plano de Aco de Reduo da Pobreza Absoluta),aprovado pelo Governo e seus parceiros internacionais, improvvel que a revoluo verdevenha a desempenhar qualquer papel relevante. Neste cenrio, por volta de 2025, Moambique

    poder atingir um PIB na ordem dos 30 mil milhes de dlares. Se crescer taxa dos anosrecentes, mantendo a estrutura e composio da economia actuais, dentro de dcada e meia aeconomia moambicana poder ser cinco vezes maior do que actualmente (6-7 mil milhes dedlares). Mas pouco mudar, sobretudo em termos de dinmica rural-urbana.

    Este o cenrio correspondente situao actual, que uns designam por deixa-andar, enquantooutros preferem chamar de deixa-fazer. Se o actual ambiente institucional se mantiver, significaque iremos manter a instabilidade que conhecemos, acabando eventualmente no tanto faz;comsurpresas como as da noite passada, cada vez mais frequentes. Ontem, meia-noite, assisti aimagens terrveis na nossa televiso, ao mostrar mais trs vtimas de assassinato em Maputo.Aprenderemos a conviver com estes assassinatos sistemticos. Mas como simultaneamente temosuma ajuda externa garantida, vamo-nos consolando que nem somos os piores na regio; frica doSul tem maior incidncia de crimes. No somos os melhores, nem os piores.

    Num quadro destes, a RV no precisa de ser real e efectiva. Basta que seja fictcia, uma revoluopara doador ver. Num quadro consumista de ajuda para investimento improdutivo, no

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    precisamos de transformar radicalmente a agricultura, para que se integre cada vez mais naeconomia nacional. Podemos continuar a crescer, alegadamente a 7-8% ao ano, mas com aestrutura social e econmica prevalecente no iremos longe em termos de desenvolvimento doPas.

    Papel da Revoluo Verde no C1? Fictcia

    Wishful thinking

    Revoluo Verde para Ingls ver

    Abandonar o campo a alternativa

    indigncia e pobreza

    PIBpcapita Moambique

    PIBpcapita Rural

    PIBpcapita Urbano

    $413 $555 $776 $1,084 6.5

    $250 $316 $418 $555 5.2$625 $809 $1,095 $1,492 5.8

    Mdia

    2000-'252010 2015 2020 2025

    C1. Variveis Relevantes

    Capital HumanoProgresso desiquilibrado e temporrioMelhoria lenta do desenvolvimento humanoEducao informal a mais relevante para o cidado

    Capital SocialInjustia social e corrupo endmicaEstado de Direito aparenteCultura de silncio e de irresponsabilizao socialPoltica da terra pseudo-colectivismoEstatgia de migrao reactivaDesenvolvimento rural negligenciadoInstituies fracas e rectivas

    Economia e desenvolvimentoElevada dependncia externa, apoiada no PARPAEconomia maioritariamente controladaFraca capacidade de captao de receitas pblicasFraca competitividade e elevada informalidadeUrbanizao a 4% ao anoVolume do PIB em 2025: +/- $30 mil Milhes de USD

    Governao e LideranaFraca participao do cidado no exerccio do poderBipartidarizao polticaCentralizao, dirigismo e burocratismo"Deixa-andar" ou "deixa-fazer"Liderana voluntarista, populista e demaggicaInformao livre mas ineficazFalta de viso de longo prazo ("Wisfull thinking")

    Figura 12: CENRIO 1: Cenrio de Tendncia, "Progr esso em Muletas"

    $30,938

    0

    5000

    10000

    15000

    20000

    25000

    30000

    35000

    2000 2004 2005 2010 2015 2020 2025

    PIBemM

    ilhesde$US

    Cenrio 1: Cenrio de Tendncia - Progresso em Muletas,Moambiqu e 2000-2025

    PIB-C1

    (em Milhes de USD)

    Anos

    4.2.2. Cenrio 2: Tragdia dos Anti-comuns

    O Cenrio 2 faz referncia ao que designo como Tragdia dos Anti-comuns, termo explicadona seco 2. Refere-se ao tipo de armadilha social, em que o livre acesso e a demanda irrestrita deum recurso finito, termina conduzindo o recurso no a uma super-explorao (Tragdia doscomuns, segundo Hardin), mas sub-explorao, super-ociosidade e super-desvalorizaoeconmica.15

    um cenrio pior do que o actual, resultante do retrocesso para situaes de conflitos, comoadmite a prpria Agenda 2025; escalada de crises cclicas, sociais, econmicas e polticas. Por

    isso, na Agenda 2025, este cenrio designado por Cenrio do Caranguejo. Cada actor anda

    15Isto no significa que certos grupos de interesses no beneficiem com a crise ou mesmo a tragdia social e humana.Tal j aconteceu, por exemplo, durante a guerra dos 16 anos. As duas foras beligerantes (Frelimo e Renamo) tiraram

    proveito das suas posies radicais, at ao momento em que a intransigncia e continuao da guerra poderia pr emrisco a sua sobrevivncia. No final, com o Acordo de Paz de 1992, as foras em conflito saram parcialmentevencedoras, significando que o principal derrotado acabou por a sociedade em geral, nomeadamente os produtoresindividuais e empresrios produtivos.

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    aos ziguezagues ou to depressa vai para a frente, como retrocede, provocando crises cclicas,seguidas de momentos de recuperao lenta e tnue devido desestruturao causada pela crise.

    Nos crculos do politicamente correcto, este cenrio no admitido como uma possibilidade toreal quanto as outras mais positivas. Muitos analistas e sobretudo os polticos associados ao podere do Governo procuram ser positivos, nem que seja fingidamente e fora. Em vez de discutiremos perigos de retrocessos iminentes, admitem a nvel informal, nos bastidores das conversasformais; no em locais apropriados, onde os riscos, perigos e ameaas deviam ser debatidos sriae francamente.

    Papel da Revoluo Verde no C2?

    Nenhum

    Contra-revoluo verde

    Zonas rurais em ambiente regressivo

    Sair do campo esperana de melhoria

    Tenso nas zonas urbanas aumenta

    PIBpcapita Moambique

    PIBpcapita Rural

    PIBpcapita Urbano

    Mdia

    2000-'252010 2015 2020 2025

    $307 $308 $320 $333 0.4$62 $64 $69 $76 -2.4

    $766 $972 $1,292 $1,735 5.4

    C2. Variveis Relevantes

    Progresso desiquilibrado e regressivoNo h melhoria do desenvolvimento humanoEducao informal a mais relevante para o cidado

    Capital SocialCorrupo e agravamento de conflitos sociaisEstado predator e totalitrio"Cultura de roubar tudo!" institucionaliza-sePoltica da terra pseudo-colectivista e especulativa

    Estatgia de migrao regressivaAnti-desenvolvimento ruralInstituies fraas e anti-desenvolvimento econmico

    Economia e desenvolvimentoDecrescimo do apoio externo, por diversos factoresUrbanizao a 4% ao ano e desordenamentoImpacto de crises externas (e.g. Crise do petrleo)Fraca competitividade e elevada informalidadePIB per capital urbano cresce, mas o rural decresceEconomia mais ou menos reprimidaVolume do PIB em 2025: < a $25 mil Milhes USD

    Governao e LideranaLiderana totalitria e f undamentalistaExcluso generalizada da participao do cidadoCentralizao, dirigismo e burocratismo"O socialismo do possvel"Informao maioritariamente reprimida

    Figura 13: CENRIO 2: "Tragdia dos Anti-Comuns" - Regresso e Involuo Econmica

    Capital Human

    PIB-Nacional,$16,474

    PIB rural, $948

    PIB Urbano,$24,036

    0

    5000

    10000

    15000

    20000

    25000

    30000

    2000 2004 2005 2010 2015 2020 2025

    PIB

    emM

    ilhesde$US

    Cenrio 2: Ruptura Regressiva - "Tragdia dos Comuns", Moambique2010-2025

    PIB-Nacional PIB rural PIB Urbano

    (em Milhes de USD)(em Milhes de USD)

    Anos

    Existem vrias razes, internas e externas, que podem empurrar Moambique, para uma situaopior do que estamos a viver. Porque que no procuramos debater quais as consequncias, porexemplo, de uma crise de petrleo, em que o barril passe para mais de 100 ou 150 dlares? Aaproximao dos 100 dlares uma questo de meses. Da para a frente, o que poder acontecer aMoambique? Estaremos a preparar-nos ou pelo menos a pensar nisso?

    As economias ricas esto, neste momento, mais ou menos prontas para enfrentar o quadro de 100

    dlares ou mais, por barril de petrleo. Em Moambique nem se fala em tal assunto. Porqu?Parece que crise passa ao lado.

    Tem-se falado da abertura de fronteiras na frica Austral, para circulao de mercadorias(excepto a fora de trabalho). Mas sobre isso, estamos bastante atrasados, para conseguirmos uma

    posio competitiva e vantajosa.

    Enfim, sem alongar muito mais neste ponto, o aspecto importante do cenrio 2 que, em caso deagravamento da situao econmica actual, tal como no cenrio 1, s existir uma alternativa para

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    o campons tentar fugir da pobreza. Certamente no ser a revoluo verde, mas sim a imigrao,o abandono do campo para as zonas urbanas ou para os pases vizinhos. De imediato, no existemoutras alternativas para se fugir da indigncia e pobreza absoluta prevalecente nas zonas rurais deMoambique.

    4.2.3. Cenrio 3: Progresso Efectivo e Exclusivo

    O terceiro cenrio um cenrio de progresso efectivo, mas socialmente exclusivo.Contrariamente aos dois cenrios anteriores, no cenrio 3 dominaria uma estratgia dedesenvolvimento progressivo, no qual uma RVM poderia ter lugar, um impacto relativo, dealgum modo restrito, dependendo dos efeitos de excluso social que provocar.

    Neste processo efectivo mas exclusivo, a RV tem um papel a desempenhar. Ser um processo derevoluo na perspectiva criticada por Eric Holt-Dimenez (2006). De qualquer forma, um

    processo desses significar mais e melhor progresso do que se pode esperar dos cenrios 1 e 2.

    Na perspectiva do Cenrio 3, Moambique poder crescer mais rapidamente do que tem crescido.Mesmo que no cresa mais rpido, o progresso derivaria mais da mudana da estruturaeconmica nacional, do que de um maior nvel da taxa de crescimento. Se a economia deMoambique conseguir concentrar-se em produtos com maior valor acrescentado, do que possuiactualmente, em vez do PIB aumentar para cerca de 30 mil milhes, poder atingir por volta de2025, cerca de 40 ou 50 bilies de US dlares.

    Papel da Revoluo Verde no C3?

    Fertilizantes como mercadoria estratgica

    Predomnio da abordagem tecnolgica

    RV menos verde do que em C4, mas

    com progressos em sectores importantes

    Melhora a produtividade agrcola

    Melhoria parcial da segurana alimentar

    PIBpcapita Moambique

    PIBpcapita Rural

    PIBpcapita Urbano

    Mdia

    2000-'252010 2015 2020 2025

    $456 $613 $955 $1,486 8.2$280 $393 $551 $773 7.0

    $688 $853 $1,300 $1,959 7.2

    C3. Variveis Relevantes

    Progresso efectivo, mas socialmente exclusivoMelhoria dos indicadores de desenvolvimento humanonfase nas mudanas tecnolgica

    Capital SocialReduo da corrupo, mas discriminatriaTransacionabilidade dos Ttulos de TerraProteco da propriedade privadaCultura de responsabilizaoProcesso de urbanizao mais acelerado (4,4%)Aumenta transparncia da Administrao PblicaMigrao selectiva favorvel ao crescimento

    Economia e desenvolvimentoAumento da competividade em alguns sectoresReduz dependncia externa, aumenta investimento produtivoReduo da informalidade a favor do formalidadeMelhoria do padro de vida pro-urbanoEstratgia energtica com incidncia nos bio-combustveisInstituies favorveis ao crescimento tecnolgicoVolume do PIB em 2025: > $40 mil Milhes USD

    Governao e LideranaMelhoria da participao do cidado no poderAumento da descentralizao e dinmica pblica localLiderana profissional, mas tecnicista e administrativaInformao livre e operativa

    Figura 14: CENRIO 3: Progresso Efectivo e Exclusivo

    Capital Human$42,886

    0

    5,000

    10,000

    15,000

    20,000

    25,000

    30,000

    35,000

    40,000

    45,000

    50,000

    2000 2004 2005 2010 2015 2020 2025

    Cenrio 3: Progresso Efectivo e Exclusivo, Moamb ique 2007-2025

    PIB-C2

    (em Milhes de USD)

    PIBemM

    ilhesde$US

    Anos

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    4.2.4. Cenrio 4: Progresso Efectivo e Inclus ivo

    O quarto cenrio designa-se Cenrio efectivo e inclusivo. Tal como o anterior, mas de formamais abrangente, extensiva e sistemtica, envolve uma estratgia de desenvolvimento

    progressivo. Pressupe um quadro institucional bastante favorvel ao crescimento econmico

    acelerado, com uma transformao ampla e inclusiva das instituies e da tecnologia, em que osprimeiros benefcios so os actores endgenos.

    Neste cenrio o desenvolvimento rural representar uma verdadeira transformao revolucionria,tanto em termos tecnolgicos como institucionais e sociais. Aqui, sim, a revoluo verdedesempenhar um papel primordial. Neste caso poderemos antecipar, que a economia nacionalcresa at ao ano 2025, 10 vezes mais, atingindo pelo menos os 60 mil milhes de US dlares.

    O Cenrio 4 constitui assim a alternativa estratgica mais promissora, porque aponta para umatransformao ampla e inclusiva das instituies e da tecnologia, com benefcios apropriadosdirectamente pelas zonas rurais. o cenrio mais desejvel, mas tambm o mais difcil deconcretizar, por causa da dimenso das transformaes que exigir.

    Papel da Revoluo Verde no C4?

    Abordagem poltica e tecnicamente racional

    Desenvolvimento rural e RV articulados

    Aumento substancial da produtividade agrcolae da segurana alimentar rural

    PIBpcapita Moambique

    PIBpcapita Rural

    PIBpcapita Urbano

    Mdia

    2000-'252010 2015 2020 2025

    $448 $689 $1,169 $2,115 10.3$322 $518 $835 $1,344 10.0

    $616 $877 $1,485 $2,770 9.1

    C4: Variveis Relevantes

    Desenvolvimento humano inclusivoMelhoria substancial do desenvolvimento humanoEducao e formao/informal relevante

    Capital SocialJustia social melhora substancialmenteRespeito efectivo pela propriedade privadaCultura de responsabilizao e transparnciaEstado de Direito inclusivo consolida-sePoltica de migrao progressivaMultipardirarismo real e amploPapel activo na integrao da frica Austral

    Economia e desenvolvimentoReduo da dependncia externaUrbanizao desacelera, por viabilizao economica ruralAumento da competitividade e diminuio da informalidadeDesenvolvimento rural efectivo e diversificadoEstratgia de bio-combustveis reduz dependncia energticaMelhoria do padro de vida efectivaEconomia maioritriamente livreVolume do PIB em 2025: > $60 mil Milhes de USD

    Governao e LideranaAdiministrao Pblica melhora eficcia e eficinciaAumenta participao e incluso social do cidadoDescentralizao progressivaLiderana unificadora e profissionalInformao livre e instituicionalmente protegidaViso estratgica progressiva e inclusiva

    Figura 15: CENRIO 4: Progresso Efectivo e Incl usivo

    Capital Human

    $5,989

    $60,121

    0

    10000

    20000

    30000

    40000

    50000

    60000

    70000

    2000 2004 2005 2010 2015 2020 2025

    Cenrio 4: Progresso Efectivo e Inclusivo, Moambique2010-2025

    PIB-C4

    (em Milhes de USD)

    PIBemM

    ilhesde$US

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    5. Consideraes Gerais e Finais

    5.1. Consideraes sobre a viabi lidade ou inviabilidade da RVM

    Quanto possibilidade de avano, do maior ou menor sucesso da revoluo verde em

    Moambique, o ponto importante a reter dosquatro cenrios considerados, que talrevoluo contribuir para a mudana daactual estrutura econmica, a favor dumamaior acumulao de riqueza nas zonas rurais.Em parte, esta a mensagem da estratgia dedesenvolvimento rural (EDR), concluda emfinais de 2006, para ser aprovada peloConselho de Ministros.

    De forma resumida, a minha apreciao sobre

    o papel actual da RV em Moambique, reservada seno mesmo cptica. Nascondies actuais, a RVM ainda fico ouuma aspirao com fracas perspectivas deimplementao prtica. Pelo que parece, fala-se de RV por fora das circunstncias, modaou convenincia de parecer que existe boavontade de mudana.

    Na prtica, a poltica consumista e demaximizao dos benefcios da ajuda externa,

    parece sobrepor-se a qualquer estratgia

    realmente produtiva. So ainda muito fracasas indicaes, tanto do Governo como dosseus parceiros internacionais, que a economiaesteja a ser encaminhada para um ciclo mais

    produtivo e virtuoso, em vez do actual cicloconsumista e economicamente improdutivo.

    Num quadro destes no acredito que a RVpossa ter algum papel positivo a desempenhar.

    Quero terminar concluir esta apresentaocom uma breve referncia declarao de

    Abuja, Nigria, de Junho 2006, sobre a qualainda nada ouvi nesta conferncia. Adeclarao de Abuja de 2006 contmrecomendaes concretas, algumas das quaisdeveriam ser cumpridas at meados deste ano.At que ponto estamos a monitorar taisrecomendaes, quando nem se fala delas? O Governo sabe ou fala delas? Duvido!

    Caixa 1: Revoluo Verde Africana

    Na Declarao de Abuja, da CimeiraAfricana de Fertilizantes, de Junho 2006,

    os principais aspectos acordados foram osseguintes:

    Criar comerciantes agrcolas rurais para toda africa rural

    Estabelecer facilidades de garantia de crdito arainsumos agrcolas a nvel nacional

    Criar subsdios atravs de bons investimentospara os pobres e pessoas mais vulnerveis

    Organizar centros de compra e distribuio defertilizantes a nvel regional; eliminar barreirascomerciais; promover o fabrico local defertilizantes

    Criar um mecanismo africano para financiar odesenvolvimento de fertilizantes

    Designar os fertilizantes, orgnicos e inorgnicos,como uma mercadoria estratgica semfronteiras

    Aumentar o nvel mdio de uso de fertilizantes noContinente Africano, dos actuais 8 quilogramaspor hectare para uma mdia mnima de 50quilogramas por hectares at 2015.

    At meados de 2007, tomar medidas apropriadasdestinadas a reduzir o custo de compra defertilizantes a nvel nacional e regional,especialmente atravs da harmonizao depolticas e regulamentos que permitam garantir olivre movimento de mercadorias atravs dasfronteiras, livre de taxas alfandegrias e outras, eo desenvolvimento de capacidade para o controlode qualidade.

    Como medida imediata , eliminar as taxas etarifas sobre fertilizantes e matrias-primas parao fabrico dos mesmos

    Tomar medidas concretas destinadas a melhorar oacesso dos fazendeiros a fertilizantes, atravs dodesenvolvimento e aumento de comerciantes deinsumos agrcolas e de redes comunitrias naszonas rurais. Pede-se ao sector privado e aosparceiros de desenvolvimento que apoiem estasaces.

    Melhorar, com efeito imediato, o aceso aosfertilizantes por parte dos agricultores,

    concedendo, com apoio dos parceiros dedesenvolvimento, subsdios dirigidos a elementosespecficos do sector de fertilizantes, comespecial ateno os agricultores pobres, mulher ejovens.

    http://www.africafertilizersummit.org/FAQ.html

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    Aquela declarao contm recomendaes precisas sobre fertilizantes, sobre o papel dosfertilizantes na melhoria da produtividade agrcola, do comrcio e outros intervenientes. Ser queaqueles que se comprometeram com a declarao de Abuja de 2006 iro prestar contas sobre oque est, ou no, a ser feito?

    Na prtica, para que uma revoluo verde possa contribuir para a concretizao do objectivoimediato de auto-suficincia alimentar de Moambique, preciso que a sociedade moambicanase capacite a diversos nveis. Mas se a opo for viver custa da ajuda e da dependncia externa,em vez da criao de bases prprias nacionais de prosperidade e proteco social relativamenteindependentes, para que serve a RVM?

    H vrias dcadas que a agricultura em Moambique permanece globalmente invivel einsustentvel. As causas so predominantemente polticas e institucionais; so tambmtecnolgicas, mas esta s poder contribuir se o ambiente institucional se tornar favorvel.

    O sucesso ou fracasso da Revoluo Verde no dependem da boa vontade de entusiastas,animados por qualquer esprito de altrusmo e voluntarismo. Depende da conjugao e correlaode foras entre as instituies, no quadro das alternativas possveis. Nas actuais condies desupremacia de elites polticas que concentram o poder de deciso nos centros urbanos, ainiciativa, vontade e chance de mudana nas zonas, ter que partir dos prprios urbanos. Istoenvolve progressos tecnolgicos, mas tambm avanos institucionais, na gesto, na cultura,formao, prticas profissionais e de investigao.

    As evidncias disponveis no permitem concluir que o processo de libertao dos agricultores daarmadilha da pobreza, esteja de facto, a ocorrer em Moambique. Pode ser uma aspirao, oucomo sugerem os dados sobre a incidncia da pobreza rural, a proporo da populao rural pobre

    pode estar a diminuir. Mas isso deve-se a motivos totalmente diferentes, dos que poderoassociar-se implementao com sucesso de uma revoluo verde em Moambique.

    5.2. Estamos aqui porque duas famlias ricas ofereceram 150 milhes deUS dlares?

    Relacionando os pontos analisados nas seces anteriores, importante comentar uma observaofeita nesta Conferncia. Um dos intervenientes afirmou que este encontro surgiu, simplesmente

    porque duas das famlias mais ricas do mundo, decidiram disponibilizar 150 milhes de USdlares, para uma suposta nova revoluo verde em frica.

    Discordo totalmente desta interpretao e recuso-me a olhar as coisas com tanto cinismo. Oumelhor. Posso entender o cinismo por detrs de tal observao; mas discordo que se reduza aimportncia de uma conferncia como esta, ao anncio de 150 milhes de dlares. Se aceitarmos

    passivamente esta banalizao, dificilmente chegaremos a bom porto; mesmo que de imediatoningum saiba ao certo, onde ir desaguar esta nossa navegao intelectual.

    A realidade estratgica da nova revoluo verde africana caracteriza-se por uma confluncia depercepes mltiplas e contraditrias: cepticismo, cinismo ou oposio da parte de uns;optimismo e entusiasmo da parte de outros; gulosos e astutos aproveitadores das oportunidades definanciamento, entre outros; e para alm destes, um enorme nmero de observadores, ausentes,marginalizados e a leste do se passa sua volta.

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    De uma coisa podemos estar mais ou menos certos. Voluntrios para ajudar as famliasRockefeller e Gates, a gastarem os milhes dlares que elas prprias no conseguem gastarsozinhas, no faltaro. Uma outra certeza que, tarde ou cedo, com ou sem ajuda das referidasfamlias ricas americanas, o continente africano vai ter que decidir, como ou se ir realmenteenfrentar o dilema de no ser capaz de assegurar o seu prprio sustento alimentar.

    Ser que vamos decidir, assumindo a responsabilidade pelo nosso prprio destino, semcondicionarmos a nossa deciso ao financiamento que eventualmente ser mobilizado fora docontinente? O