a trajetoria tecnologica da petrobras n (1)

Upload: carlosmagnotolentinofilho

Post on 19-Feb-2018

222 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    1/25

    A TRAJETRIA TECNOLGICA DA PETROBRS NAPRODUO OFFSHORE

    Andr Tosi Furtado

    1. INTRODUO

    Os pases perifricos costumam absorver de fontes externas grande parte da nova tecnologia queutilizam em seus processos produtivos, principalmente quando esta de ponta e requer um certograu de performance. Entretanto, mesmo que assumam uma posio de receptores de novastecnologias, um grupo importante de empresas de mdio e grande porte realiza um significativoesforo tecnolgico. Esse esforo volta-se, principalmente, para um determinado tipo de inovao, denatureza incremental, que se destina adaptao e introduo de melhoramentos em processos ouprodutos existentes. As inovaes so introduzidas preferencialmente sobre bases tcnicas jmaduras conformando um certo tipo de trajetria tecnolgica, especfica a esses pases. A trajetriatecnolgica das empresas, apoiada em inovaes incrementais, pode levar a uma posio comercialcompetitiva, mas dificilmente ocorre o mesmo no plano da inovao, quanto mais na fronteiratecnolgica (Katz, 1976; Lall, 1982; Fransman, 1986).

    Este trabalho, baseando-se no estudo de caso da produo brasileira de petrleo offshore, trata demostrar que uma empresa de grande porte pertencente a um pas perrifrico pode posicionar-se nafronteira tecnolgica, mesmo que tenha uma trajetria tecnolgica centrada em inovaesincrementais. Existem melhores condies para que isto ocorra no contexto de certos setores em queos desnveis de capacidade de inovao entre as empresas dos pases centrais e da periferia somenores. A Petrobrs talvez seja uma das melhores ilustraes dessa tese. Essa empresa logrou

    alcanar uma posio de liderana em escala internacional na produo de petrleo offshore agrandes produndidades. A altura da lmina dgua na qual se produz petrleo e gs naturalrepresenta uma importante fronteira tecnolgica para essa indstria. Alguns pases desenvolvidoscom grandes indstrias de petrleo offshore (grandes companhias e fornecedores) disputam aliderana nessa rea, fundamentalmente os Estados Unidos e os pases europeus que operam noMar do Norte (Reino Unido, Noruega e Frana). A presena da estatal brasileira nesse camporepresenta certamente uma destacvel exceo.

    Esse estudo de caso serve para aprofundar a reflexo em duas importantes temticas relacionadascom a dinmica tecnolgica. Em primeiro lugar, de que forma as tecnologias organizadas emsistemas competem entre si e quais so os fatores que influem sobre esse processo. Em segundolugar, como se comportam especificamente as trajetrias tecnolgicas em pases perifricos e quais

    so as condies para que as empresas inovadoras desses pases alcancem a fronteira tecnolgica.Os dois prximos captulos desse artigo esto destinados a introduzir essa discusso. No quartocaptulo, apresenta-se especificamente a problemtica da indstria do petrleo offshore. Realiza-seuma rpida descrio da importncia que o offshore profundo tem para o futuro dessa indstria e faz-se uma apresentao dos principais sistemas tecnolgicos em competio nessa rea, destacando aliderana adquirida pelo sistema desenvolvido pela Petrobrs. Em seguida, num quinto captulo,analisa-se a trajetria tecnolgica dessa empresa, ressaltando as principais etapas que ela percorreuat alcanar sua posio de destaque atual. Na concluso, elabora-se uma reflexo sobre os fatoresdeterminantes que permitiram o sucesso dessa trajetria tecnolgica apoiada em inovaesincrementais.

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    2/25

    2

    2. COMPETIO ENTRE SISTEMAS TECNOLGICOS

    A mudana tcnica no ocorre ao acaso ou est exgenamente determinada. Ela faz parte

    plenamente da mudana econmica. As organizaes produtivas so tambm organizaes queaprendem. Nesse sentido, a mudana tcnica est associada experincia dos agentes econmicos,o que a torna um processo especfico s circunstncias e localizado. A sucesso de sucessos efracassos determina a maneira pela qual os agentes realizam o processo de aprendizagem. Por essarazo, trata-se de um processo cumulativo que tambm garante, em determinadas seqncias,rendimentos crescentes de aprendizagem.

    Portanto, os agentes que utilizam e transformam as tecnologias seguem certos padres evolutivos.Esses padres evolutivos so chamados de trajetrias tecnolgicas. Esta definida como o conjuntode caractersticas evolucionrias e cumulativas que condicionam o desenvolvimento e as mudanasexperimentadas por tecnologias quando se difundem e so utilizadas na produo e em servios(OCDE, 1992). Esses padres so definidos por maneiras normais de solucionar problemas dentro

    do quadro de um certo paradigma tecnolgico (Dosi, 1982).

    As trajetrias tecnolgicas possuem caractersticas prprias, como o fato de atravessarem certosestgios evolutivos. No incio de sua evoluo, uma trajetria tecnolgica apresenta um grandeespectro de possibilidades. Nesse estgio costumam competir diversos sistemas tecnologicos, cadaqual apresentando potenciais para tornar-se dominante. Existem vrios caminhos possveis, cada umdeles constitui um determinado conjunto de tecnologias inter-relacionadas entre si.

    Entretanto, a medida em que uma trajetria tecnolgica progride, o nmero de sistemas tecnolgicosem competio tende a reduzir-se. Apenas um tende a prevalecer sobre os demais, em virtude dosrendimentos crescentes de adoo (Arthur, 1989). De forma que a tecnologia que se beneficia deuma maior adoo no incio de uma trajetria pode adquirir uma vantagem decisiva sobre as demais.

    A partir de um certo estgio, mesmo que ela no seja a mais eficiente, ela se torna dominante e asdemais so descartadas. Esse processo de estreitamento do raio de opes apenas umadeterminada tecnologia chamado de lock in. Portanto segundo essa perspectiva, o impulso inicialque dado a uma determinada tecnologia pode explicar que ela venha a se tornar hegemnica.

    O grau de incerteza que existe ex antesobre a evoluo das diferentes tecnologias em competioimplica, como coloca corretamente B. Arthur (1989), em um importante potencial de ineficincia quedepender de qual for a tecnologia que vier a vencer. Nesse contexto, algumas variveis poderodesempenhar um papel importante para a escolha tecnolgica tais como os interesses econmicosdas organizaes envolvidas no processo de inovao, o mercado, os agentes institucionais e asforas polticas.

    O lock in em apenas um determinado sistema tecnolgico pode ser considerado como um casoextremo, onde uma tecnologia ganha um avano suficiente para eliminar as demais. Depende, comoressalta adequadamente Ruttan (1996), de que os rendimentos crescentes sejam estveis.Entretanto, na maioria dos casos convivem vrios sistemas em competio porque as economias deescala e os ganhos de adoo do sistema tecnolgico lder no so suficientes para possibilitar aevico das demais tecnologias. As possibilidades de escolha tecnolgica se mantmsuficientemente diversificadas, mesmo que com o amadurecimento das trajetrias ocorra umareduo da gama de opes.

    A escolha entre sistemas tecnolgicos, tendo em vista o carter localizado do processo deaprendizagem, torna-se uma competio entre empresas e mesmo entre espaos econmicos, cada

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    3/25

    3

    qual apostando no desenvolvimento de um determinado sistema tecnolgico. Muitas vezes acompetio de tecnologias uma competio entre pases cujos governos apoiam seus gruposempresariais nacionais, atravs de mltiplos mecanismos como o fomento P&D industrial e ofinanciamento das primeiras sries de produo. Mas as grandes empresas multinacionais, mesmo

    sem o apoio de seus respectivos governos, estabelecem acirradas competies entre si para fazerprevalecer seu prprio sistema tecnolgico em escala mundial.

    Que elementos iro determinar que uma tecnologia seja mais usada do que as demais em sua etapainicial de desenvolvimento? Existem fatores determinantes que so, pelo lado da oferta, o potencialde desenvolvimento de uma determinada tecnologia. Esse potencial est relacionado s expectativasque as empresas tm do retorno de seus investimentos em inovao, as quais esto condicionadas,a sua vez, pelas oportunidades tecnolgicas e pelo grau de apropriabilidade da tecnologia (Nelson,1988). As oportunidades tecnolgicas so dificilmente previsveis com preciso, dado o grande graude incerteza que caracteriza a atividade de busca tecnolgica. Entretanto, esses fatores no sosuficientes para dar conta da evoluo tecnolgica.

    Pelo lado da demanda, existem outros elementos de ordem econmica que podem ter reflexos sobreessa escolha tais como o tamanho do mercado, a influncia sobre os demais mercados e asoportunidades produtivas (acesso a preo favorvel a determinados insumos). O ambiente de seleodas tecnologias tem tambm uma grande importncia para o desfecho da competio tecnolgica.Esse ambiente incorpora a influncia de fatores poltico-institucionais. A rea energtica constitui umaimportante ilustrao da importncia que os fatores poltico-institucionais tm para a competiotecnolgica. Nessa rea, onde as tecnologias usadas tm grande repercusso sobre o meio-ambiente, a mobilizao da populao dos pases desenvolvidos contra as ameaas da tecnologianuclear de gerao eltrica frustrou as apostas que os governos desses pases e grandes gruposempresariais haviam feito nesse sistema tecnolgico.

    Em sntese, uma grande variedade de fatores, que atuam no incio de uma determinada trajetria

    tecnolgica, podem induzir a adoo de um dado sistema tecnolgico mais do que outro. Essesfatores tm uma influncia muito duradoura. Eles so muito variados e dependem do contextoespecfico em que ocorre essa etapa de constituio de uma tecnologia. No caso que iremos analisar,veremos que a baixa do preo do petrleo no mercado mundial desde meados da dcada de 80modificou fortemente o ambiente de seleo das tecnologias de produo favorecendo a adoo deinovaes poupadoras de custo.

    3. TRAJETRIA TECNOLGICA NOS PASES PERIFRICOS

    A competio tecnolgica, tal como a analisamos no item anterior, ocorre fundamentalmente entre asgrandes empresas dos pases desenvolvidos. Essas empresas posicionam-se na fronteira

    tecnolgica e disputam a liderana com outras grandes empresas.As empresas dos pases perifricos se contentam em acompanhar a certa distncia a evoluointernacional. Isto porque no tm capacitao tecnolgica e nem porte suficientes para alavancargrandes volumes de investimentos com forte contedo de risco. Os governos costumam ser maisfracos e os mercados internos de menor tamanho.

    As vantagens competitivas das empresas dos pases perifricos relacionam-se ao acesso vantajoso adeterminados insumos (matrias-primas, mo-de-obra) ou a mercados internos protegidos. Os paseslatino-amricanos tm o seu processo de industrializao muito centrado na proteo do mercado

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    4/25

    4

    interno. Em base a esse tipo de protecionismo, as empresas desenvolveram determinadasseqncias evolutivas de mudana tcnica que so especficas a esses pases (Katz, 1987).

    O tamanho mais reduzido dos mercados, a maior dificuldade de acesso a insumos de qualidade

    similar aos do exterior, infra-estruturas deficientes, instabilidade macro-econmica so alguns dosprincipais traos que diferenciam o ambiente seletivo das empresas de pases perifricos. Essasespecificidades, ao mesmo tempo em que so limitantes, constituem importantes desafiostecnolgicos. As empresas tm de realizar uma srie de esforos tecnolgicos para adaptar osprodutos e processos que transferem s condies locais. As menores escalas de produodemandam importantes esforos de adaptao em matria de engenharia de processo. Odesenvolvimento da produo requer, na falta de fornecedores confiveis, a internalizao deatividades industriais que extrapolam o campo de atuao normal de uma firma em um pasdesenvolvido Essas atividades resultam em importantes esforos de engenharia, nas reas demanuteno, desenho e at fabricao de bens de capital.

    O ambiente competitivo especfico dos pases em desenvolvimento tem levado s empresas a

    apresentar um certo padro de mudana tcnica, que configura um estilo prprio de trajetriatecnolgica. Nesse contexto, algumas empresas bem sucedidas apresentam um nvel adequado decapacitao tecnolgica para operar eficientemente suas plantas produtivas, adquirir e colocar emfuncionamento novas plantas, e aumentar constantemente a produtividade atravs da introduoregular de inovaes incrementais. Entretanto, essa capacitao insuficiente para alcanar afronteira tecnolgica, sobretudo no que se relaciona capacidade de inovar. Essas empresasconseguem apenas ser boas seguidoras, contando dificilmente com uma capacidade de inovao altura para ocupar uma posio de liderana na fronteira tecnolgica.

    A rigor poderamos afirmar que os pases perifricos tm uma trajetria prpria que segue a certadistncia a trajetria tecnolgica internacional. Esta ltima se desloca em funo da competio entresistemas situados na fronteira tecnolgica internacional.

    Ao passo que a trajetria dos pases perifricos acompanha essa evoluo a certa distncia, a qualest determinada pelo tamanho do gap tecnolgico que os separa dos pases avanados. Nessesentido podemos supor que a capacitao das empresas depende em grande parte do nvel relativoda economia nacional ou regional. De fato, a capacitao tecnolgica dessas empresas estrelacionada, em grande medida, qualidade das interaes com mltiplos agentes inovadores dentrode sistemas nacionais de inovao (Freeman, 1988; Lundvall, 1988; Nelson, 1993).

    Nesse contexto, difcil conceber que empresas e indstrias de pases perifricos possam ter umaposio de destaque no plano da inovao internacional, mesmo porque a trajetria tecnolgicadesses pases no converge com a trajetria dominante1. Ela se move em ambientes prprios, deeconomias que sofrem da escassez crnica de recursos e so pouco propensas a inovaes radicais.

    Portanto, no se justifica que a trajetria tecnolgica de uma empresa de pas perifrico, apoiada

    1Katz (1976) tem refletido sobre a possibilide de empresas de pases perifricos lograrem processos de catching up. Isto

    seria possvel em setores maduros com poucas inovaes radicais e uma baixa velocidade de deslocamento da fronteiratecnolgica. Nestes, as empresas de pases perifricos apoiadas em processos de aprendizagem focalizados em inovaesincrementais, poderiam alcanar o nvel de produtividade internacional. Entretanto sintomtico o paralelo que Katzestabelece entre maior nvel de produtividade e fronteira tecnolgica internacional. Temos toda a razo de pensar que amudana tcnica e a fronteira tecnolgica no possam ser reduzidas produtividade dos fatores, embora existamimportantes relaes. Isto porque a inovao tecnolgica mais radical de produto. Mas quando esse tipo de inovaotende a diminuir de importncia, as inovaes de processo redutoras de custo tendem a predominar. Nesse contexto, aprodutividade dos fatores um bom indicador.

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    5/25

    5

    essencialmente em inovaes incrementais, possa ter condies de sucesso nvel da fronteiratecnolgica internacional.

    Considerando todos esses pontos levantados pela literatura sobre mudana tcnica em pases

    perifricos, como se explica que a Petrobrs tenha logrado alcanar uma posio de lideranatecnolgica internacional?

    Este fato, um pouco fora do comum, deve chamar a ateno para a complexidade do tema dacompetio tecnolgica, sobretudo quando se trata de sistemas para o setor energtico. No campoda energia se travam as mais importantes competies tecnolgicas deste fim de sculo, que tmimportantes desdobramentos scio-ambientais (Martin, 1996). A compreenso desse contexto ficaainda mais dificultada porque no existe um quadro terico muito consolidado a respeito de como astecnologias j estabelecidas competem com as novas. Sabe-se que as antigas tecnologias acabamdeixando o frente da cena, no campo da energia, porque a partir de certo momento esgotam seupotencial de inovaes e aumentam as externalidades ambientais negativas (Kemp & Soete, 1993).Em decorrncia, os custos de produo e de uso tendem a aumentar significativamente. Em

    compensao, sabe-se menos a respeito do comportamento inverso, ou seja, quando as tecnologiasantigas so regeneradas pelas novas, e tm seu perodo de sobrevida prolongado por essa razo.Esse perodo costuma ser ainda mais longo quando as tecnologias dominantes usufruem desubstanciais economias de aprendizagem e de adoo.

    A indstria do petrleo tipicamente uma indstria originria da segunda revoluo industrial, ondeas inovaes radicais ocorreram entre as ltimas dcadas do sculo passado e meados deste. Pode-se dizer que essa indstria estava sofrendo um certo fenmeno de rendimentos decrescentes no ps-guerra. Isso ocorria porque os custos no paravam de crescer sobretudo quando se tratava dopetrleo marginal a ser descoberto e explorado com novos mtodos de produo, o chamadopetrleo de fronteira. Entretanto, a emergncia de um novo paradigma tcnico-econmico apoiadonas tecnologias da informao est de certa forma regenerando a trajetria tecnolgica dessa

    indstria. Os novos petrleos, sobretudo aqueles localizados em guas profundas esto tendo umreganho de interesse muito em funo dos importantes avanos que foram obtidos na tecnologia deproduo(Boy de la Tour, 1984, 1996).

    Se a trajetria tecnolgica de um pas perifrico como o Brasil ocupa uma posio de destaque naevoluo da tecnologia offshore porque esse processo de regenerao da indstria do petrleopassa por uma redinamizao de bases tcnicas existentes, muito mais do que por saltos ou grandesdescontinuidades tecnolgicas. Certos estudos j mostraram que as inovaes incrementais tm umpapel decisivo para o dinamismo econmico, mesmo nos pases desenvolvidos (Enos, 1962;Hollander, 1965; Rosenberg, 1976; Sahal, 1982). Podemos supor, como o faz Sahal (1982), quequando um desenho bsico est definido (technological guidespost), as inovaes se dofundamentalmente no sentido de favorecer a sua difuso. Entretanto, no contexto das guas

    profundas no h ainda propriamente o domnio de um dado sistema, seno a competio entresistemas tecnolgicos alguns mais e outros menos emergentes.

    A produo de petrleo em guas profundas tipicamente um caso de uma nova atividade industrial, para aqual ainda no h um sistema tecnolgico hegemnico. at possvel que nenhum dos sistemas atualmenteem competio venha ser dominante dado as caractersticas prprias da difuso tecnolgica nesse setor. Emtodo caso essa competio se trava entre diversos sistemas tecnolgicos que representam as principais regiesprodutoras. Nesse contexto, uma empresa petroleira de pas perifrico assume a liderana tecnolgica apoiadaem inovaes incrementais aplicadas a um sistema existente. As grandes companhias que optaram porsistemas tecnolgicos novos tiveram menos sucesso. Temos consequentemente uma maior sobrevida de umsistema existente a partir de inovaes incrementais, ao passo que sistemas novos ainda no lograramdesenvolver seqncias de aprendizagem suficientemente produtivas para tornarem-se dominantes.

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    6/25

    6

    4. A INDSTRIA MUNDIAL DE PETRLEO E GS NATURAL OFFSHORE

    O petrleo e o gs natural produzidos em guas profundas devero ocupar um lugar importante noabastecimento energtico mundial. De fato, observa-se que a produo mundial de petrleo e de gsnatural manteve-se em crescimento constante, desde 1985, acompanhando o consumo energtico.Projeta-se que os hidrocarbonetos so e devem continuar sendo a principal fonte de energia usadano mundo no horizonte dos prximos 25 anos. A participao destes estimada em 56% doabastecimento energtico mundial para o ano 2020 (Alazard et Montardet, 1993). Nesse contexto, ooffshore desempenhar um papel cada vez mais importante na determinao do montante dasreservas e da produo mundial de petrleo e gs natural, embora os hidrocarbonetos provenientesdestas jazidas sejam de maior custo. Hoje, 30% da produo de petrleo proveniente dasplataformas martimas. Explica-se, em parte, o desenvolvimento da produo offshore pelo impactoque os dois choques do petrleo provocaram na organizao e no nvel tecnolgico da indstria dopetrleo. O desenvolvimento da produo offshore se deu fora do mbito dos grandes exportadores

    da OPEP, como recurso dos pases desenvolvidos importadores para reduzir sua dependnciaexterna.

    A indstria offshore nasce verdadeiramente nos anos 50 no Golfo do Mxico. Desde ento ela seexpande para o Mar do Norte, que se torna a principal provncia petrolfera offshore. Odesenvolvimento dessa indstria tem sido acompanhado pelo aumento da profundidade das lminasdgua. O descobrimento de novas jazidas em offshore est ocorrendo em guas cada vez maisprofundas, nas principais zonas produtoras do Golfo do Mxico, Mar do Norte, frica, Amrica do Sule sia. Portanto, o aumento do potencial de produo de petrleo requer que se desenvolvamtecnologias capazes de produzir a grandes profundidades (Boy de la Tour et alii, 1986).

    O desafio tecnolgico que colocado para a indstria do petrleo offshore encontra-se

    principalmente do lado do desenvolvimento de sistemas de produo que sejam adequados valorizao de jazidas localizadas em guas profundas. De fato, a tecnologia para perfurao agrandes profundidades j existe desde a dcada de 60, podendo em princpio alcanar 5000 metros.A mesma observao se aplica tecnologia de levantamento geofsicos submarinos. O grandegargalo tecnolgico consiste em instalar sistemas de extrao, condicionamento e transporte depetrleo e gs natural que sejam confiveis e tenham custos competitivos.

    As condies desse desafio tecnolgico variam de acordo com a regio produtora. Mesmo o termo deguas profundas tem uma acepo varivel dependendo da provncia geolgica. No Mar do Norte,

    jazidas localizadas sob lminas dgua superiores a 200 metros so denominadas de guasprofundas; j no Brasil e no Golfo do Mxico, consideram-se profundidades superiores a 400 metros.

    O avano para essas reas vem ocorrendo desde a dcada de 80. Entretanto, a evoluo tecnolgicana indstria do petrleo foi muito afetada pela evoluo dos preos. Desde o incio da dcada de 80,o volume de investimentos na explorao e desenvolvimento de petrleo sofreu uma quedasubstancial (Tabela 1). Esses investimentos retomaram a partir do final da dcada de 80,principalmente fora dos Estados-Unidos. O ambiente no qual ocorreram os investimentos desde asegunda metade da dcada de 80 esteve condicionado pela busca de custos de produo maisbaixos. Entretanto, uma das caractersticas centrais da evoluo tecnolgica foi que a produooffshore continuou aumentando de 735 milhes de toneladas em 1985 para 900 milhes detoneladas, em 1992. Nesse quadro, o desenvolvimento da tecnologia em guas profundas temprosseguido, embora outros projetos de fronteira como o xisto bituminoso ou as areias asflticasforam praticamente paralisados (Boy de la Tour, 1994).

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    7/25

    7

    Tabela 1

    Investimentos em Explorao e Produo da Indstria Mundial de Petrleo (bilhes de US$)

    1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992

    Estados-Unidos 37,0 52,2 48,1 24,8 24,0 24,5 18,5

    Resto do Mundo 35,1 39,2 35,8 29,6 30,5 36,0 44,0

    Total 72,1 91,4 83,9 54,5 54,5 60,5 62,5

    Fonte: IFP, 1992

    4.1 Os grandes desafios tecnolgicos da indstria do petrleo aps o contra-choque de 1986

    A queda abrupta do preo do petrleo, em 1986, criou uma nova realidade para a indstria. Ascotaes que haviam alcanado 40 US$ por barril, no incio da dcada, e vinham se mantendo em 29US$, para o Arabian Light, no preo oficial da OPEP, despencaram naquele ano para chegar em 10US$. A cotao voltou a subir mas se estabilizou desde ento em torno de 16-20 US$, se excluirmoso curto perodo de exploso dos preos em 1990, quando as tropas iraquianas invadiram o Kuwait e aevoluo excepcional recente (1996-97). Esse novo cenrio gerou uma srie de constrangimentospara as grandes companhias de petrleo que eram responsveis pelo desenvolvimento de grandeparte dos petrleos mais difceis, situados na parte martima da plataforma continental.

    De forma geral, tanto para o offshore como para o onshore, a indstria do petrleo foi impelida abuscar novas solues que resultassem em cortes dos custos de explorao e produo. Esse novoambiente de seleo das inovaes foi certamente redirecionando as trajetrias tecnolgicas naindstria para a busca de solues mais econmicas.As novas tecnologias desempenharam um importante papel na introduo de inovaes poupadorasde custos. As inovaes que mais impactaram a atividade do setor foram a ssmica 3D (trsdimenses), a qual melhorou consideravelmente a eficcia dos levantamentos ssmicos na detecode reservas, reduzindo as necessidades de perfurao e melhorando o conhecimento do subsolo, e aperfurao horizontal, que melhorou o aproveitamento dos reservatrios e reduziu tambm anecessidade de perfurao (Boy de la Tour, 1994). importante ressaltar que a primeira inovaoderivou fundamentalmente do desenvolvimento e aplicao de novos instrumentos e mtodos

    informticos indstria de prospeco geolgica.Do lado dos sistemas de produo martimos, as inovaes comearam a ser pautadas pelanecessidade de reduo de custos. O custo desses sistemas costuma variar entre centenas demilhes e bilhes de dlares. A plataforma Hibernia, que est prevista para entrar em operaodurante o ano de 1997 no Mar rtico, dever custar entre US$ 5 e 6 bilhes, incluindo-se odesenvolvimento dos poos. De forma que um dos principais objetivos das inovaes introduzidasnos sistemas de produo passa a ser a reduo de custos. Em todo mundo, presenciou-se aemergncia de novos conceitos de plataformas mais econmicas, como as plataformas semtripulao (unmanned), que so completamente automatizadas e podem ser controladas a distncia.Em guas profundas tenderam a predominar dois tipos de conceitos como veremos a seguir.

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    8/25

    8

    4.2 Os conceitos de sistemas de produo offshore

    O desenvolvimento da produo offshore fez-se, em grande medida, a partir de plataformas fixas.

    Essa tecnologia foi desenvolvida entre as dcadas de 30 e 50, primeiro na Venezuela e depois noGolfo do Mxico. Ela consiste em grandes estruturas metlicas que repousam sobre o subsolomarinho. Nesse sistema, a rvore de natal (conjunto de vlvulas que controla a produo do poo) eas unidades de processamento da produo esto posicionados sobre a plataforma: a chamadacompletao seca.

    A tecnologia de perfurao seguiu uma evoluo diferenciada. O desafio principal consistia naconstruo de sondas martimas mveis. As primeiras sondas foram instaladas sobre barcaas noGolfo do Mxico no final dos anos 30. Porm, sondas especificamente adaptadas para essa funoforam desenvolvidas posteriormente. Os barcos sondas foram introduzidos nos anos 40, mas averdadeira inovao consistiu nos jacks-ups ou plataformas auto-elevatrias, que datam da dcadade 50 (George, 1994). Na mesma poca, foram lanadas sondas sobre as plataformas semi-

    submersveis. Posteriormente, na dcada de 60 dentro do quadro do programa Mohole, patrocinadopela National Science Foundation, desenvolveu-se a tecnologia de perfurao de posicionamentodinmico, para grandes profundidades 2

    Vrias outras tecnologias complementares foram desenvolvidas paralelamente para possibilitar aproduo offshore: as mais importantes eram as de colocao e dutos de escoamento da produo ede ssmica em meio martimo.

    Esse conjunto de tecnologias permitiu a expanso contnua da produo offshore, inclusive para oMar do Norte que, a partir da dcada de 70, passou a rivalizar com o Golfo do Mxico em ordem deimportncia para o volume de investimentos. Todavia, no incio da dcada de 80 ficou cada vez maisclaro que embora existisse tecnologia e de perfurao para atuar em guas profundas, o mesmo no

    ocorria com a de produo. O sistema tecnolgico de produo apoiado em plataformas fixas,constitudo no golfo do Mxico deveria de ser radicalmente reformulado para alcanar profundidadesmaiores.

    Na verdade, a extenso das tecnologias j postas em funcionamento no Golfo do Mxico, nasdcadas de 50 e 60, para o Mar do Norte j demandara importantes aprimoramentos: asprofundidades em que passara a se trabalhar excediam os 100 metros de lmina dgua e asestruturas, que tiveram de ser fabricadas para explorar as jazidas localizadas no centro e ao nortedessa regio, eram de gigantescas dimenses. Elas foram fabricadas para enfrentar condiesclimticas extremamente adversas tais como enormes ondas que podiam alcanar 30 metros dealtura. No caso das plataformas de concreto, essas estruturas eram capazes de estocar grandesvolumes de produo e at mesmo de enfrentar o gelo.

    2 O Programa Mohole inicia-se em 19557 baixo a cobertura da American Miscelaneous Society (AMSOC). Em 1958comea a ser apoiado pela NFS com a finalidade de desenvolver tecnologia para perfurar um poo at o magma terrestre.Buscava-se alcanar essa profundidade perfurando a partir das guas profundas do Pacfico. Havia para isso a necessidadede desenvolver um novo tipo de embarcao. Em 1961, o barco CUSS I perfura sob a lmina dgua de quase 3.000metros. Posteriormente, entre 1968 e 1969, o Glomar Challenger, o primeiro barco de posicionamento dinmico controladopor computador, especialmente concebido para o Programa Mohole e sua continuao o JOIDES (Joint OceanographycInstitution for Deep Earth Sampling), chega a perfurar a mais de 6.000 metros de profundidade (Duque Dutra, 1993). Oprograma Mahole teve que ser abandonado por oposio do Congresso americano porque seu objetivo parecia delirante,tanto do ponto de vista econmico como tecnolgico (Salomon, 1992). Porm, os 25 milhes de dlares da poca gastos noprograma serviram para viabilizar a inovao radical da sonda de posicionamento dinmico.

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    9/25

    9

    As primeiras aplicaes da tecnologia de completao molhada, a qual consiste em colocar a rvorede natal debaixo dgua, foram introduzidas no Mar do Norte. Mas elas foram consideradasmarginais, por terem a finalidade de viabilizar a produo em regies de difcil acesso e sem infra-estrutura de escoamento. Foi nessa regio que se desenvolveram os primeiros sistemas de produo

    flutuante (SPF), durante a dcada de 70. Esses sistemas eram compostos de rvores de natalmolhadas (ANM), template, riserse barco que efetuava o processamento e estocagem da produo.Esse sistema foi aplicado Bacia de Campos, cujo desenvolvimento iniciou-se praticamente namesma poca. As vantagens eram as seguintes: permitir uma produo rpida; a utilizao de poosde explorao; por em operao campos marginais a custos mais baixos; recuperar as instalaes ereutiliza-las; melhorar o escoamento da jazida; pr em funcionamento campos em guas profundas(Susbielles, 1980).

    Mesmo assim, o SPF foi concebido inicialmente como sendo apenas um sistema de produo feitopara operar provisoriamente ou em campos marginais. As plataformas fixas continuavam sendo osistema de produo dominante. A necessidade de se pensar em novos conceitos surgiu apenasquando tornou-se imperioso valorizar reservas a grandes profundidades.

    De fato, as plataformas fixas sejam elas de ao ou cimento no podem ser utilizadas em guasprofundas, por uma questo de custos crescentes. Esses tendiam a aumentar exponencialmente deacordo com a profundidade. A plataforma da Shell Oil instalada em Bullwinkle no Golfo do Mxico auma profundidade de 411 metros , at 1996, a plataforma fixa mais profunda do mundo. Suainstalao, ocorrida em 1988, constitui uma proeza em termos de engenharia dada a dimenso das

    jaquetas.

    Em funo dessa limitao tcnica do sistema de produo dominante, a dcada de 80 presenciou aemergncia de novos conceitos que deveriam substituir a plataforma fixa no desenvolvimento decampos em guas profundas. Eram solues que deveriam permitir a explorao da jazida a partir dervores de natal secas (instaladas sobre a superfcie da gua), mas que utilizavam novos tipos de

    plataformas capazes de ter uma certa flexibilidade de movimento entre a superfcie do mar e osubsolo. Entre as solues mais importantes tnhamos as plataformas de torre complacente, de torrearticulada e de pernas atirantadas, esta ltima denominada em ingls de tension-leg(TLP). Das duasprimeiras solues, apenas um projeto de torre complacente foi implantado no Golfo do Mxico paraa Exxon, a 305 metros de profundidade.

    Em compensao, a TLP teve um maior sucesso, sendo desenvolvida para profundidades bemsuperiores a da torre complacente. Ela constituiu-se na tecnologia preferida das grandes companhias,que apostaram em seu desenvolvimento para solucionar o desafio da produo em guas profundas.Existem, na atualidade, seis TLP em funcionamento: trs no Golfo do Mxico (Jolliet a 536, Auger a871 e Mars a 896 metros) e trs no Mar do Norte (Hutton a 149, Snorre a 310 e Heidrun a 345metros). A plataforma de Heidrun foi implantada em 1995 e a primeira a ser construda em

    concreto. Em 1996 foi instalada a nova TLP pela Shell no campo de Mars, a mais profunda daatualidade.

    Um outro conjunto de tecnologias que despertou grande interesse da parte das empresas lderes foi odo bombeio multifsico e da separao associada ao bombeio submarino. Essas tecnologias podemfacilitar o aproveitamento de jazidas em guas profundas, trazendo os hidrocarbonetos para guasmais rasas onde eles seriam processados em plataformas tradicionais. Elas permitiro um melhoraproveitamento da energia dos poos, na medida em que o bombeio for realizado a partir do fundo domar, melhorando o fator de recuperao dos reservatrios. Entretanto, essas tecnologias ainda estohoje, uma dcada depois dos primeiros projetos haverem sido lanados, em estgio experimental espera de uma aplicao em escala industrial. A Petrobrs junto com outras operadoras (Exxon,

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    10/25

    10

    Shell, Total, BP, Texaco e AGIP), empresas de bens de capital (Aker, Kvaerner, Weir Pumps) e oInstituto Francs do Petrleo participam do seu desenvolvimento (Offshore, dezembro de 1994).Provavelmente, essas tecnologias que ainda se encontram em fase de teste para guas rasas,devero tardar algum tempo at tornar-se operacional em guas profundas.

    4.3 Comparao entre SPF e as TLP

    Em lugar de escolher a tecnologia da TLP para desenvolver a produo em guas profundas, ondeliderava a Shell Oil, filial americana da Royal Dutch Shell, a Petrobrs optou por um sistema deproduo alternativo. Analisaremos mais adiante as razes que levram a essa escolha singular. Aquitrataremos de fazer uma breve comparao entre os dois sistemas.

    O SPF operado pela Petrobrs manteve a sua liderana nos recordes de profundidade, embora aShell Oil, com a implantao da TLP de Auger em 1994, tenha adquirido uma efmera liderana nainstalao de plataformas e poos. Entretanto, a Petrobrs restabelecceu rapidamente sua

    incontestvel vantagem no desenvolvimento de sistemas de produo em guas profundas. Nomesmo ano, ela instalou uma ANM a 1027 metros de profundidade. Paralelamente, implantou a maiorplataforma semi-submersvel e a nica especificamente desenhada para guas profundas a 910metros e dutos at 886 metros assumindo, novamente desde ento, a liderana mundial emprofundidade de poo, plataforma e sistema de dutos.

    O que nos importa no apenas saber quem detm a liderana, mas se o sistema adotado pelaPetrobrs resulta ser operacional e mais econmico que a TLP. Embora existissem srias dvidasinicialmente quanto a possibilidade de extenso dos SPF para grandes profundidades, devido aquestes de segurana e operacionalidade, esse sistema logrou responder aos principais desafiosque lhe foram colocados graas a uma srie de aperfeioamentos e modificaes que foram sendointroduzidos nos sistemas de amarrao e conexo, alm do desenvolvimento da tecnologia de

    instalao. Ao passo que a TLP demonstrou no ser ainda uma tecnologia completamente madura.Algumas das plataformas apresentaram srios problemas de estabilidade como o efeito deressonncia (ringing). Por isso, as empresas de engenharia esto pensando em introduzir uma novagerao de TLP, denominadas de TRP (Tension Raft Jacket) cuja base desta vez de concreto, seencontraria a uma profundidade muito maior, estabilizando a plataforma (LeBlanc, 1995).

    Desempenho mais satisfatrio dos SPF foi acompanhado tambm por uma maior rentabilidadeeconmica. Na realidade, esses sistemas apresentaram uma srie de vantagens sobre os demais,como um menor tempo de instalao, a possibilidade de servirem como unidades provisrias deproduo e a possibilidade de remoo para novos espaos. O sistema de produo de Marlim I, queenvolveu a construo de uma nova plataforma, custou no total US$ 1,331 bilhes para umaproduo de 100.000 bbl/dia de petrleo e de 1.017 mil m3/dia de gs natural. J o sistema baseado

    numa TLP de Auger apresentou um custo total quase equivalente a US$ 1,2 bilho para umaproduo de 46.000 bbl/dia de petrleo e de 3.450 mil m3/dia de gs natural. A Tabela 2 mostraalgumas comparaes de custo de desenvolvimento entre o SPF e a TLP.

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    11/25

    11

    Tabela 2

    Comparao do Custo de Desenvolvimento de Alguns Sistemas deProduo Offshore em guas Profundas

    Capacidade deProduo(mil bep/dia) (*)

    Custo total dedesenvolvimento(milhes de US$)

    Custo deDesenvolvimento /Capacidade deproduoUS$/bep/dia)

    Piloto Marlim 50.000 295 5.900Marlim I 106.000 1.331 12.556Albacora I 206.000 1.916 9.273Auger 68.085 1.200 17.625(*) Inclui gs natural

    Fonte: Serplan-Petrobrs, 1992 e Abbott et alii, 1995

    Deve-se salientar que muitas da semi-submersveis usadas nos SPF da Petrobrs so plataformasde perfurao recondicionadas. O que no foge da regra internacional. Apenas 2 das 24 plataformassemi-submersveis de produo em uso no mundo so novas, entre as quais a Petrobrs XVIII queopera no campo Marlim. As diferenas de custo entre sistemas novos e recondicionados sosubstanciais, como indica uma comparao entre o piloto de Marlim (uma plataforma recondicionada)e Marlim I (Tabela 2)

    As grandes companhias operadoras tm reconhecido que os SPF apresentam melhores custos eopes para o desenvolvimento de campos produtores em guas profundas. Todavia, a soluo quevem sendo apontada por companhias como a BP para o desenvolvimento dos campos em guas

    profundas situados nas West Shetlands a FPSO (Floating production Storage Offloading System)(Frazer, 1995). As novas verses desse sistema integram num nico barco a unidade deprocessamento e o sistema de ancoragem, anteriormente ligado a uma monobia. No incio de 1995haviam 27 FPSO em funcionamento no mundo e 11 estavam em construo. Entre os que esto emfuncionamento 40% so novas construes, enquanto o restante de unidades reconvertidas. Ocusto do FPSO pode variar bastante dependendo dessas caractersticas, do tamanho e sofisticao,entre US$ 50 e 750 milhes (OGJ, 8/5/95).

    O uso do barco est se mostrando ainda mais vantajoso que o da plataforma pela sua maiorcapacidade de carregamento tanto de unidades de processamento como de estocagem de petrleo emesmo de gs natural. Existem novos desenvolvimentos que podero embutir unidades deprocessamento de gs natural (liqueficao ou produo de metanol). Essa nova orientao da

    indstria est tendo repercusses importantes para o desenvolvimento de novos sistemas pelaPetrobrs.

    5. A TRAJETRIA TECNOLGICA DA PETROBRS

    A Petrobrs constitui um caso interessante para estudos de capacitao tecnolgica em nvel dafirma de pases em desenvolvimento. Alm de monopolizar a indstria de petrleo nacional,configura-se na maior empresa do Brasil. Faturava, em 1993, US$ 15 bilhes e investia US$ 118,5milhes em P&D, o que tambm lhe conferia a liderana da pesquisa industrial no pas. Fruto desses

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    12/25

    12

    investimentos, direcionados fundamentalmente implementao de um esforo tecnolgico prprio, aempresa tem logrado avanos significativos na produo de petrleo em guas profundas. Taisavanos tm merecido grande destaque e projetado a Petrobrs no mbito da indstria do petrleointernacional.

    O sucesso empresarial na indstria do petrleo se relaciona a um conjunto de fatores associados sestratgias adotadas pela prpria firma, endgenos, e a outros tantos que lhe so exgenos, prprioss caractersticas da indstria, estrutura do mercado consumidor, e ao comportamento daeconomia. Retomando a viso evolucionista (Nelson e Winter, 1982), a trajetria tecnolgica daempresa pode ser definida como a interao dos processo de aprendizagem cumulativo realizadopela empresa com o ambiente externo que incentiva e seleciona determinadas rotinas e estratgiasinovativas.

    O ambiente de seleo externo no se restringe apenas ao mercado. Merecem realce na indstria dopetrleo, os condicionantes macro-econmicos, polticas setoriais, aspectos geopolticos, aspectosgeolgicos e de localizao das reservas.

    5.1 A trajetria da Petrobrs no perodo que precede o salto para aproduo.

    A Petrobrs adotou desde sua criao uma estratgia no campo da tecnologia que poderamosconsiderar de realista no quadro de um pas perifrico. O pas carecia de experincia produtiva naindstria do petrleo; no dispunha igualmente de um tecido industrial de fornecedores. Portanto, odesafio que desde o incio se colocava empresa era de implantar atividades produtivas ao longo dacadeia petrolfera e ao mesmo tempo iniciar e consolidar o processo de implantao de uma rede defornecedores.

    Nesse contexto, a estratgia inicialmente desenvolvida pela Petrobrs consistia em se qualificar comoum bom comprador de tecnologia externa. Essa tecnologia vinha na forma de importantes projetosindustriais, como as refinarias de petrleo e os servios industriais, dirigidos s reas de explorao-produo. O esforo tecnolgico da empresa dirigia-se para a formao de recursos humanos. Logoaps sua criao constituiu o CENAP (Centro de Aperfeioamento e Pesquisa de Petrleo), emcolaborao com a Universidade do Brasil, com a finalidade principal de formar recursos humanos.

    A formao de RH tinha, na realidade, duas finalidades principais: dotar os quadros tcnicos de umacapacidade de compra de tecnologia; e depois aprimorar a capacidade operacional dosequipamentos em uso. Mas a prpria atividade de formao de recursos humanos levou, em seubojo, um embrio de pesquisa industrial. Assim atuava dentro do CENAP um setor de pesquisa eanlise que realizava tarefas de apoio produo: testes de petrleo, anlise de rochas e guas, os

    primeiros estudos sobre rendimento e exames para o controle de qualidade simulados em plantaspilotos (Gomes de Freitas, 1993). Em virtude da constituio de um ncleo de tcnicos capacitadosem desenvolver atividades de P&D, foi a se consolidando, dentro da empresa, a vontade deinstitucionalizar essa funo dentro da empresa. Em 1963, ainda no governo democrtico, propostaa criao de um centro de P&D na empresa. Esse centro foi criado institucionalmente em 1966,passando a se chamar Cenpes. Mas o seu verdadeiro desenvolvimento somente ocorreria na dcada70, quando ele foi transferido para a Ilha do Fundo, dispondo a partir de ento de instalaes degrande porte adequadas s suas necessidades. Durante essa dcada o centro ampliariaconsideravelmente o seu porte. Surgiram as principais superintendncias de Pesquisa Industrial(1976), Engenharia Bsica (1976) e de Explorao de Petrleo (1979).

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    13/25

    13

    Porm mesmo contando com um centro de P&D, a Petrobrs estava longe de ter alcanado umaposio que a habilitasse a inovar. De fato, embora fosse uma importante emanao do processo deaprendizagem tecnolgica que se constitua dentro da empresa, o Cenpes estava longe de haver

    formado os elos com os departamentos operacionais que impeliriam uma sinergia suficiente entreoperao e difuso de tecnologia. Na realidade, os departamentos operacionais prosseguiam em suaprpria lgica de serem bons compradores e operadores de tecnologia importada, sem sentiremnecessidade de recorrer propriamente gerao interna de tecnologia.

    As atividades de P&D, que se estabeleceram dentro do Cenpes durante a dcada de 70, estavamprincipalmente voltadas para o downstream. As equipes que se expandiram estavam relacionadas pesquisa qumica (Diquim), de Refino (Diter) e Petroqumica (Dipol). O setor de engenharia bsica,tambm, orientava suas atividades para a elaborao e prestao de servios na rea de refino epetroqumica. A consolidao dessas atividades permitiu que a empresa melhorasse sua capacidadede negociao de pacotes tecnolgicos, resultando num maior domnio sobre o processo detransferncia de tecnologia. Por outro lado, ela possibilitou que o Cenpes iniciasse pesquisas visando

    a desenvolver tecnologias de processo. Todavia, esses desenvolvimentos ocorreram em reasmarginais, como o processo de converso lcool etlico em eteno para a alcoolqumica.

    O verdadeiro entrosamento entre Cenpes e os departamentos operacionais somente aconteceu como deslocamento do eixo dinmico da empresa do downstreampara o upstream.

    5.2 A guinada para o upstreama partir de 1980

    Durante as dcadas de 80 e 90, abrangidas pela terceira e quarta etapas da trajetria, a empresa levada a enfrentar diversos desafios, o mais importante dos quais se relaciona com odesenvolvimento da produo.

    5.2.1 A produo offshore

    O grande salto produtivo que a empresa realizou se deu com o desenvolvimento em grande escalada produo offshore durante a primeira metade da dcada de 80. Nesse perodo, a produo depetrleo triplicou, passando de uma mdia diria de 182 mil bbl, em 1980, para 546 mil bbl, em 1985(Tabela 3).

    Tabela 3Produo de petrleo (mil bbl/dia)

    1980 1985 1990 1992 1995*Terra 107 154 188 198 190Mar 75 392 443 455 500Total 182 546 631 653 690* at setembro anualizadaFonte: Petrobrs

    Os investimentos necessrios para o desenvolvimento e implantao de sistemas de produo nomar costumam ser muito elevados (Giraud & Boy de la Tour, 1986). Os sistemas permanentes,constitudos por plataformas, tubulaes submarinas, cabeas de poos, entre outros, envolveminvestimentos da ordem de centenas de milhes de dlares, podendo ultrapassar a barreira do bilho

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    14/25

    14

    como vimos anteriormente. A implantao e operao desses sistemas requer que a empresadetenha um certo nvel de capacitao tecnolgica.

    Sendo a tecnologia offshore de fronteira, o seu desenvolvimento exigiu que as companhias

    petroleiras e os seus fornecedores realizassem um esforo interno em P&D, consideravelmente maiorao que costumam fazer. As companhias dos pases europeus, especialmente, foram impelidas adesenvolver internamente a engenharia bsica dos sistemas de produo martimos (Bell andOldham, 1988), uma vez que concentraram seus interesses no Mar do Norte, aps o primeiro choquedo petrleo.

    Na Petrobrs, a prioridade que essa empresa deu a produo de petrleo no mar a partir de meadosda dcada de 70 provocou um efeito semelhante. A empresa necessitou desenvolver um esforotecnolgico interno muito maior ao que realizara at ento. Por conta dessa mudana, a atividade deengenharia bsica se expandiu e se consolidou na empresa. Os investimentos em P&D cresceramconsideravelmente ao longo da dcada de 80, alcanando 0,7% do faturamento da empresa no finalda dcada.

    5.2.2 O salto para a inovao

    O novo patamar de capacitao tecnolgica no foi alcanado de forma sbita, mas resultou de umlongo processo de aprendizagem e maturao. As condies necessrias para o salto tecnolgicoforam sendo criadas desde o incio dos anos 80, quando a empresa ampliou suas importaes detecnologia e de bens de capital permitindo que se iniciasse o processo de aprendizagem in house.

    Quando montou os primeiros sistemas martimos permanentes, a empresa absorveu um importantefluxo de tecnologia proveniente de agentes externos.

    Na realidade, a consolidao de uma capacidade de concepo de sistemas de produo offshore,

    no emanou propriamente do Cenpes. Ela surgiu diretamente nos departamentos operacionais. Emfuno da implantao de unidades de produo antecipada, desde o final da dcada de 70,formaram-se grupos de engenheiros capazes de conceber esses sistemas do Depro (Departamentode produo) e no Gespa (Grupo Especial de Sistema de Produo Antecipada), que reunia tcnicosde vrios departamentos (Gomes de Freitas, 1993). A concepo e operao desses sistemasprodutivos requeria uma dose importante de criatividade por parte das equipes brasileiras e foram oembrio dos conceitos posteriormente desenvolvidos pelo Cenpes. Com esses sistemas buscava-seantecipar a produo de campos martimos antes que os sistemas permanentes de produo,constitudos em geral por uma plataforma fixa, fossem implantados.

    Os sistemas de produo antecipada (SPA) eram compostos de uma ANM, de risers flexveis, deuma monobias e de um barco que estocava a produo. Essa produo era posteriormente

    encaminhada a uma plataforma de processamento que separava os diversos elementos (petrleo,gs e gua) e fazia a reinjeo e o bombeamento. A produo em base a esses sistemas atingiu seuauge em 1983 (ela cresceu de 2,7 mil bbl/dia em 1977 para 90 mil bbl/dia em 1983) (Alvarenga,1985).

    Em 1983, os diversos grupos de engenheiros, que ajudaram concepo dos SPA, foram integradosna Superintendncia de Engenharia Bsica do Cenpes. Ao mesmo tempo, se produzia uma novaorientao dos investimentos da empresa. Procedeu-se a implantao dos sistemas de produopermanente na Bacia de Campos. Volumosos investimentos foram mobilizados com essa finalidade.A tecnologia empregada foi adquirida de empresas de engenharia estrangeiras, o setor deengenharia bsica incumbindo-se de fazer o desempacotamento. Esse desempacotamento foi muito

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    15/25

    15

    bem sucedido, na medida em que para a etapa seguinte, a empresa logrou adquirir o domnio dacapacidade de realizar o projeto bsico. Os sistemas de produo permanentes implantados no PloNordeste da Bacia de Campos (7 plataformas fixas entre 1986 e 1987) tiveram o projeto deengenharia bsica gerado na Superintendncia de Engenharia Bsica do Cenpes.

    Enquanto a capacitao em projeto, adquirida at meados dos 80, tinha por finalidadereproduzir tecnologias em uso, o desenvolvimento de sistemas de produo em guas maisprofundas que 300 metros representava um desafio muito maior para a empresa. Tratava-se de umaautntica inovao. Os reservatrios gigantes, descobertos em meados da dcada de 80 na Bacia deCampos, boa parte situados em profundidades de 400 a 2000 metros, colocavam um novo desafiopara a empresa. Para enfrenta-lo a Petrobrs teve que romper com a sua estratgia anterior dedesenvolvimento tecnolgico. At ento, ela buscava adquirir externamente tecnologias jcomprovadas internacionalmente para depois domina-las, adotando uma estratgia de empresaseguidora. Mas o desenvolvimento dos novos campos em guas profundas, de longe os maioresdescobertos at ento no pas, oferecia uma oportunidade nica para que ela optasse por soluesprprias, uma vez que essa tecnologia ainda no estava disponvel internacionalmente.

    A Petrobrs poderia ter buscado contratar, de empresas estrangeiras, o desenvolvimento datecnologia necessria explotao dos campos em guas profundas, mesmo que essa tecnologiaainda no estivesse disponvel. Existiam concepes novas adequadas a essas condies naprancheta das empresas de engenharia e dos centros de pesquisa europeus e americanos. Mas aPetrobrs optou pelo desenvolvimento interno. A razo reside no domnio que ela adquirira sobre atecnologia dos SPF a partir da operao e concepo de sistemas de produo antecipada. Outrarazo talvez seria o custo elevado e a prpria incerteza associados a esses novos desenvolvimentos.

    Para enfrentar o desafio da inovao, a Petrobrs criou, em 1986, um grande programa tecnolgico oPROCAP 1000 (Programa de Capacitao Tecnolgica em Sistemas de Explotao para guasProfundas), de dimenso multi-institucional, cuja meta principal era desenvolver tecnologia para

    produzir petrleo at 1000 metros de profundidade. Esse programa representa, sem dvida, umaimportante opo da empresa que buscava consolidar uma trajetria tecnolgica baseada emsistemas de produo flutuantes, iniciada anteriormente.

    Ademais dos SPA, a Petrobrs comeou a utilizar as plataformas semi-submersveis, j na primeirametade da dcada de 80, no lugar das fixas, como sistemas permanentes de produo em reas comprofundidades de gua superiores a 200 metros. Essa soluo apresentava custos sensivelmenteinferiores a de outros sistemas para essas profundidades. De fato, como mencionamos, os custosdas plataformas fixas aumentam exponencialmente com relao a profundidade. Essas plataformasforam adotadas no Plo Nordeste da Bacia de Campos, porque a profundidade mdia era pequena(80 a 100 metros). Mas quando se tratou de implantar sistemas de produo em profundidadessuperiores a 200 metros a empresa recorreu ao uso de sistemas flutuantes de produo.

    Esses sistemas de produo flutuantes constam basicamente de uma unidade flutuante (semi-submersvel ou navio) com facilidade de processamento e sistemas de controle, risers flexveis, linhasde fluxo, rvores de natal molhadas (ANM) e manifolds submarinos, navio-tanque paraarmazenamento de leo e sistema monobias de escoamento. O navio-tanque e a monobias podemser substitudos por oleodutos. (Freire 1986, p. 66)

    Havia, em 1986, onze SPF operando na Bacia de Campos, os quais produziam 145.000 bbl/dia. Amacia utilizao desses sistemas permitiu que a Petrobrs se tornasse lder mundial nessatecnologia. Partindo, pois, de uma tecnologia importada, a empresa comeou a adapta-la scondies locais de produo e aos seus propsitos, atravs de um processo cumulativo de

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    16/25

    16

    inovaes incrementais. Essa tecnologia que, como vimos anteriormente, havia sido desenvolvidadurante a dcada de 70 no Mar do Norte, com a finalidade de antecipar a produo e explorarcampos marginais, apresentava importantes vantagens: menor custo fixo, um tempo de implantaomais curto e o seu carter modular que permitia ir acompanhando o desenvolvimento de um campo.

    A escolha tecnolgica fundamental que a Petrobrs fez na poca foi buscar adapta-la para aproduo permanente. Entre 1977 e 1983, foram concebidos e postos em operao 14 SPA(Sistemas de produo Antecipada). O domnio que a empresa adquiriu sobre essa tecnologia, queexigiu o desgargalamento de certos problemas, como os de conexo, processamento e escoamentoda produo, permitiu transformar os SPA em sistemas de produo permanentes, ou seja, em SPF.

    Iniciando a trajetria tecnolgica original, a Petrobrs buscou introduzir aperfeioamentos quepossibilitassem esticar o uso dos SPF para profundidades de at 400 metros. Esse domnio foialcanado em meados da dcada de 80. Todavia, a parte da tecnologia embutida no hardwareaindaera quase toda adquirida de fontes externas. As plataformas semi-submersveis foram compradas noexterior; o sistema de tubulaes flexveis tambm3. O que a empresa desenvolveu, durante aprimeira metade da dcada de 80, em hardware, em associao com os estaleiros navais nacionais,

    foi a capacidade de reconverter as sondas semi-submersveis em plataformas de produo.O Procap representou, de fato, uma soluo de continuidade com a trajetria tecnolgica que aPetrobrs adotara. A estratgia desse programa consistia essencialmente em esticar a trajetriatecnolgica dos SPF para profundidades cada vez maiores. Contudo, para adequar os SPF scondies muito mais difceis das guas profundas, era necessrio alcanar um domnio muito maiorsobre essa tecnologia, tanto em hardwarecomo em software. Em hardware, a estratgia do programaconsistia em absorver a tecnologia existente internacionalmente para depois redesenh-la,adicionando melhoramentos e modificaes que permitissem adapt-la s novas condies deproduo. De modo que o projeto bsico das plataformas semi-submersveis, aptas a operar noscampos gigantes de Marlim e Albacora, foi adquirido de uma firma estrangeira. A Diviso de projetosbsicos de explotao coordenou um programa de transferncia de tecnologia, junto empresa de

    engenharia sueca Gotaverken Arendal, para desenvolver uma plataforma semi-submersvel degrande porte (100.000 bbl/dia). Dado que essa plataforma fora concebida originalmente para aperfurao, os tcnicos da Petrobrs precisaram adaptar o projeto bsico, dando origem a plataformaPetrobrs XVIII. Em decorrncia do domnio adquirido, novas modificaes foram introduzidas quepermitiram definir um novo projeto prprio de plataforma concebida para operar nas condiesespecficas da Bacia Campos. Esse processo de adaptao e aprimoramento possibilitou um corte daordem de 30% dos custos (Gomes Freitas, 1993). Todavia, essa nova plataforma 100% Petrobrs,chamada de Vitria Rgia, ficou em nvel de conceito bsico sem aplicaes.

    Nessa mesma linha, no quadro do Procap, a Petrobrs redesenhou e aperfeioou um conjunto deequipamentos complementares que foram adaptados para atuar em lminas dgua de at 1000metros. Entre esses se destacam as ANM, os templates manifolds, os sistemas de ancoragem e derisers flexveis, as monoboias, etc. O desenvolvimento das principais tecnologias de hardware foirealizado pela prpria empresa, embora em certos casos empresas nacionais ou estrangeirasparticipassem de alguns dos projetos do Procap. O VOR (veculo de operao remota), um robsubmarino concebido e fabricado pela empresa de engenharia carioca Consub para operar sob 1000metros, foi o nico equipamento de porte desenvolvido por uma empresa nacional.

    3 A Coflexip, que constituiu uma joint-venture com o Bradesco chamada de Basflex, iniciou suas atividades na usina de

    Vitria, em 1984.

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    17/25

    17

    Alguns desses desenvolvimentos conceituais no foram comercializados posteriormente, como noscasos da plataforma semi-submersvel, da ANM, do Octos 10004 ou do VOR. Entretanto, osconhecimentos adquiridos pelos projetos foram decisivos para que a Petrobrs enfrentasse o desafiodas guas profundas. Esses conhecimentos foram repassados aos fabricantes de bens de capital ou

    incorporados em novos projetos conceituais que foram posteriormente implantados.

    Ao mesmo tempo, dentro do quadro do Procap, a estatal brasileira adquiriu uma importantecapacitao tecnolgica em servios complementares (software), que talvez seja um dos seus maisimportantes trunfos na atualidade. Assim, o Cenpes desenvolveu junto ao departamento de produoa capacidade de instalar ANM, templates manifolds e risers sem o recurso de mergulhadores, emgrandes profundidades. Normalmente, usam-se mergulhadores para instalar cabos-guias quepossibilitam a descida das partes desse equipamento com preciso at o local de produo. Como omergulho est limitado operacionalmente em at 400 metros, torna-se extremamente difcil instalarANM em profundidades superiores a essa. Com tal propsito, a Petrobrs desenvolveu umconhecimento operacional que praticamente nico no mundo de instalar ANM a grandesprofundidades. O mesmo ocorreu com a instalao de dutos. Esse know-how foi o objeto da

    outorgao do prmio da OTC (Offshore Technology Conference), em 1992. Os recordes premiadosforam os de instalao de ANM, monobias e de dutos a grandes profundidades.

    A explicao mais lgica para que a Petrobrs tenha adotado uma estratgia tecnolgica, baseadaem inovaes incrementais, o seu menor custo e risco. Entretanto, a empresa no desconsiderou aperspectiva da descontinuidade tecnolgica. Com efeito, sempre houveram dvidas quanto spossibilidades de esticar a tecnologia dos SPF para profundidades superiores a 1000 metros.

    Os pontos crticos dos SPF so a questo da segurana associada a instalao e operao deequipamentos como as ANM, que se tornam cada vez mais caros a medida em que aumenta aprofundidade. O risco de exploses na cabea do poo (blow-out), constitui um importante desafio.Por outro lado, h o problema das conexes entre a cabea de poo e a plataforma, principalmente,

    dos risers flexveis. Estes, alm de serem cada vez mais caros, a medida em que a profundidadeaumenta, colocam o problema do peso que pode ser to grande a ponto de afundar a plataformasemi-submersvel. Uma das mais importantes solues desenvolvidas pela empresa, no quadro doProcap, foram os sistemas hbridos que permitem o uso de conexes rgidas apoiadas no solo atuma certa altura, a partir da qual so ligadas s plataformas por risers flexveis. Eles representamuma soluo de continuidade para a estratgia de esticar a tecnologia dos SPF.

    Pressintindo o esgotamento da tecnologia dos SPF, a Petrobrs comeou a pensar em termos dedescontinuidade tecnolgica. No contexto do Procap, a empresa buscou dominar, em nvel deprojeto, tecnologias como as da TLP e do bombeio multifsico. A TLP, como mencionamosanteriormente, uma tecnologia j operada em alguns locais, competindo em profundidade com a daPetrobrs. A Petrobrs ciente desses desenvolvimentos, realizou no contexto do Procap um contratode transferncia de tecnologia com a joint-venture americano-norueguesa Fluor-GVA.Posteriormente, os tcnicos do Cenpes desenvolveram o projeto conceitual de uma TLP para operarnas condies da Bacia de Campos, em profundidades de at 1000 metros.

    A tecnologia do Bombeio Multifsico, como vimos anteriormente, ainda se encontra em estgioexperimental. A Petrobrs participa de contratos de cooperativos que servem para financiar a P&Dexecutada nesse campo por determinadas empresas e centros de pesquisa. Esses contratoscoperativos permitem a Petrobrs ter acesso aos conhecimentos obtidos com os desenvolvimentosdessa tecnologia.

    4 A Petrobrs desenvolveu um projeto original de template manifold para atuar em guas profundas e em terrenos

    arenosos: O Octos 1000.

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    18/25

    18

    A estratgia tecnolgica da Petrobrs teve at o momento fortes traos de empresa de pasperifrico, uma vez que, ao invs de optar por um sistema tecnolgico novo, mais ousado, escolheuaperfeioar a base tcnica que j dominava, baseada nos sistemas flutuantes de produo (SPF),

    mesmo que esse sistema ainda no operasse em guas profundas. Mesmo assim, essa estratgiano ignorou a possibilidade de descontinuidade, mantendo em permanncia um monitaremento dasprincipais evolues tecnolgicas da indstria. Esse tipo de estratgia tem sido muito bem sucedida epermitiu que a empresa mantivesse a liderana mundial em guas profundas.

    5.3 Tendncias recentes na dcada de 90

    Para desenvolver os novos conceitos tecnolgicos gerados pelo PROCAP 1000, a Petrobrs teve quesuperar uma srie de dificuldades externas, dentre as quais sobressaiu-se a sua realidade financeira.Os planos elaborados pela empresa demandavam investimentos anuais da ordem de US$ 4 bilhes.Entretanto, apenas a metade desses recursos foram executados nos ltimos anos, colocando a

    empresa numa situao difcil de ter que rever seus planos iniciais (Furtado e Muller, 1994).

    A realidade financeira da empresa, que veio se agravando desde a segunda metade da dcada de80, no era condizente com essas metas de investimento. O faturamento da empresa caiuaproximadamente da metade, em termos reais, durante a dcada de 80, comprometendo fortementesua capacidade de investimento. Note-se que essa queda no teve origem na retrao da produomas, sim, no valor das tarifas fixadas pelo governo.

    Frente a esse quadro relativamente desfavorvel, a empresa foi levada a dar continuidade a suaestratgia incrementalista na dcada 90, somente que desta vez alinhando-se com a evoluo daindstria internacional. Nesse contexto, at mesmo a estratgia tecnolgica elaborada no quadro doProcap 1000 est sendo revista. Os planos de industrializar conceitos prprios de plataformas semi-

    submersveis, como a Vitria Rgia, para valorizar campos de guas profundas esto sendopaulatinamente deixados de lado, espera de dias melhores. Aparentemente a Petrobrs XVIII tersido a nica plataforma nova encomendada pela empresa. Agora a empresa est partindo parasolues mais econmicas.

    As novas iniciativas voltadas para o desenvolvimento da produo em guas profundas tm secaracterizado pela escolha de solues mais modestas. De fato, a terceira unidade, a ser instalada nocampo de Marlim, com capacidade de produo de 100.000 bbl/dia, dever ser uma plataforma semi-submersvel de perfurao transformada pelo estaleiro nacional Verolme Ishibrs. O custo doempreendimento est sendo avaliado em US$ 165,5 milhes, o qual bem inferior ao da PetrobrsXVIII que foi de US$ 272 milhes.

    Entretanto, as mudanas na estratgia da empresa so ainda mais radicais, j que ela vmmanifestando interesse em abandonar o conceito das plataformas semi-submersveis para aproximar-se daquele dos FPSO. A Petrobrs est acelerando a transformao de navios petroleiros usadosnessas unidades. Os custos estimados situam-se na faixa dos US$ 100 a 160 milhes (GazetaMercantil, 8/11/95). Est sendo prevista a instalao de um FPSO no campo de Barracuda que serrecorde mundial de profundidade em 840 metros de lmina dgua (OGJ, 8/5/95).

    Essa mudana de postura frente inovao est alterando a natureza dos programas tecnolgicosda empresa. O Procap 2000, que continuao do programa homnimo, pretende permitir que aempresa alcance profundidades de produo de at 2000 metros, posssibilitando a valorizao detodo o potencial de reservas existentes na Bacia de Campos, estimado em torno de 8 bilhes de

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    19/25

    19

    barris. Os projetos desse programa, ao todo onze, podem ser reagrupados em duas categoriasimportantes: os projetos que so destinados a melhorar o desempenho dos SPF (perfurao eestabilidade de poos horizontais e alta inclinao; controle de blow-outs, de escoamento daproduo, etc.); e aqueles destinados a trabalhar com conceitos completamente novos (sistema de

    separao submarina, bombeio multifsico, bombeio centrifugo, novos conceitos de plataformas comcompletao seca e molhada). Os esforos destinados ao desenvolvimento de novos componentesdos SPF como ANM, template, risers e plataformas e as tcnicas de colocao desses sistemas, queforam to importantes para o Procap 1000, esto curiosamente ausentes desse programa.

    6. CONCLUSO SOBRE A TRAJETRIA TECNOLGICA DAPETROBRS

    A Petrobrs reconhecidamente uma empresa que se encontra na fronteira tecnolgicainternacional, no que diz respeito explorao e produo de petrleo e gs natural em guas

    profundas. E o que talvez seja mais importante, ela considerada como sendo a empresa lder nessecampo. Este fato atualmente matria de consenso em todos os foros internacionais que trabalhamsobre o tema. Os maiores recordes de produo em guas profundas so detidos por essa empresae no existe perspectiva de que esse processo seja revertido no curto prazo.

    O fato que uma empresa de um pas em desenvolvimento assuma a liderana, por um perodobastante longo superior a dez anos, em um campo de vanguarda do avano tecnolgico, , semduvida, um fenmeno singular em toda a histria do petrleo. Essa observao se torna ainda maiscontundente se levarmos em considerao que a trajetria tecnolgica dessa empresa se apoia eminovaes incrementais.

    De fato, como tratamos de demonstrar ao longo desse artigo, quando a Petrobrs enfrentou o desafio

    de produzir em guas cada vez mais profundas, ao invs de apostar em inovaes radicais, ou seja,no desenvolvimento e na adoo de sistemas verdadeiramente novos, ela, ao contrrio, optou poruma estratgia tecnolgica de natureza incrementalista, a qual consistia no melhoramento eaperfeioamento do sistema de produo que ela dominava: o SPF.

    Essa estratgia conformou uma trajetria tecnolgica que se enquadra nos moldes que foramdescritos por certos autores sobre a mudana tcnica em pases em desenvolvimento (Katz, 1976 e1987; Bell, 1984; Lall, 1982; Fransman, 1986). De certa forma a empresa brasileira adotou essatrajetria tecnolgica por falta de escolha. Os escassos recursos financeiros e tecnolgicos,associados ao imperativo de aumentar a produo interna de petrleo, no ofereciam outra opo ano ser a de buscar aperfeioar o sistema que j operava.

    Causa certa perplexidade que a Petrobrs tenha alcanado a liderana tecnolgica, atravs umatrajetria tecnolgica apoiada em inovaes incrementais, em um campo de to grande importnciacomo o offshore profundo, no qual competem as grandes empresas de pases lderes. Na realidade,essa indagao no tem uma resposta simples. Combinaram-se, por um lado, importantesoportunidades e, por outro, escolhas tecnolgicas que resultaram ser adequadas.

    As oportunidades surgiram principalmente no campo da geologia. As descobertas que foram feitaspela Petrobrs resultaram ser, na segunda metade da dcada de 80, as maiores realizadas at entonessas profundidades. Elas de certa forma justificaram que a empresa se empenhasse pioneiramenteem desenvolver os sistemas de produo. Para se ter uma ordem de grandeza, as descobertas feitasnos campos de Marlim e Albacora eram da ordem de vrios bilhes de barris, enquanto os campos

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    20/25

    20

    em guas profundas no Golfo do Mxico correspondiam, na poca, apenas a centenas de milhes debarris. O campo de Auger apresenta reservas estimadas de 220 milhes de bep.

    Essa situao atualmente j est evoluindo consideravelmente a medida em que a produo em

    guas profundas torna-se cada vez mais factvel. J existem 3 a 4 bilhes de bep descobertos noGolfo do Mxico. Estima-se que esse potencial chegue entre 9 a 15 bilhes de bep (Bourgeois, Abril1995). Na zona de guas profundas situadas no oeste das Ilhas Shetland, as estimativas variam de 4a 8 bilhes de bbl (Beckman, agosto 1995).

    Entretanto, as oportunidades geolgicas no constituem uma razo suficiente para explicar o sucessoda trajetria tecnolgica da Petrobrs, mesmo que, no caso brasileiro, houvesse uma necessidadeimperiosa de aumentar a produo para atender a demanda interna. Na realidade, as principaisrazes desse sucesso foram a escolha apropriada do sistema de produo e uma estratgia dedesenvolvimento tecnolgico coerente, de carter incrementalista. De fato, ao no apostar em novossistemas e ao apoiar seus desenvolvimentos em melhoramentos do SPF, a Petrobrs fez,pioneiramente, a opo tecnolgica que acabaria vingando em toda indstria.

    A razo, que fez com que a trajetria tecnolgica dominante na indstria do petrleo convergisse coma da Petrobrs, reside essencialmente na alterao do ambiente de seleo das tecnologias a partirdo contra-choque do petrleo. As estratgias de busca para desenvolver a produo em guasprofundas, que predominavam nessa indstria at ento, apelavam para inovaes radicais. Asexpectativas que foram colocadas nos novos sistemas de produo acabaram no se confirmandofrente ao quadro relativamente deprimido dos investimentos que caracterizou a indstria desde ocontra-choque. Entretanto, a indstria do petrleo esteve longe de ficar estagnada tecnologicamente.Ao contrrio, sob o impulso das novas tecnologias introduziram-se uma srie de inovaes quepermitiram redinamizar a base tecnolgica existente. Essa evoluo acabou sancionando a opotecnolgica da Petrobrs, a qual foi determinada pela sua posio de empresa de pas perifrico.

    Como a aprendizagem tecnolgica um processo de natureza cumulativa, a vantagem inicialadquirida pela empresa brasileira, foi se consolidando a medida em que novas descobertasgeolgicas foram sendo feitas e em que novos conceitos foram sendo implantados. Vimos, no inciodeste artigo, que os sistemas tecnolgicos com um avano inicial sobre os demais podem tornar-sehegemnicos, devido aos rendimentos crescentes de adoo. Entretanto, para que o processoaprendizagem tecnolgica da empresa brasileira fosse bem sucedido, ela teve que adotar umaatitude cada vez mais ativa frente inovao, a qual se traduziu no lanamento de importantesprogramas tecnolgicos.

    Deve-se salientar que a postura de organizar e lanar grandes programas tecnolgicos com afinalidade de desenvolver tecnologia para guas profundas quase nica no contexto da indstria dopetrleo, na qual predomina um certo recuo dos investimentos em P&D das grandes empresas,

    principalmente durante a dcada de 90 (Economides, 1995). O Procap o nico programatecnolgico de mbito internacional para guas profundas junto com o Deepstar. Este um programaapoiado por um consrcio de companhias petroleiras encabeado pela Texaco que tem por finalidadedesenvolver tecnologia de guas profundas a custo acessvel no Golfo do Mxico. A Petrobrs,atravs do Procap, tem assumido uma posio de liderana institucional ao ter promovidopioneiramente projetos industriais associados. Essa formula assume uma importncia crescente nosdesenvolvimentos futuros da indstria do petrleo (Mercier, 1995).

    Entretanto, o avano tecnolgico adquirido pela empresa estatal no foi suficiente para que o Brasillograsse se tornar um exportador de tecnologia, de equipamentos ou de servios na indstriaoffshore. A relativa fraqueza do spill over da atividade inovativa da Petrobrs para os fornecedores

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    21/25

    21

    nacionais se deve a certas particularidades da trajetria tecnolgica setorial. De fato, as operadoras(companhias petroleiras) detm parcialmente o controle da tecnologia que usam, a outra parteestando em mos de fornecedores. Como os mais importantes fornecedores so empresasmultinacionais e a indstria nacional de bens de capital carece cruelmente de capacitao tecnolgica

    em produto, no propiciou-se um ambiente favorvel ao desenvolvimento de um plo exportador.

    No resta dvida que esses fornecedores estrangeiros esto realizando um importante aprendizadooperando junto a Petrobrs em guas profundas. Nesse caso, se destaca a empresa francesaCoflexip que recebeu o prmio Distinguished Achievement Award da Offshore TechnologyConference de 1995 pela produo de tubos flexveis e sobretudo pela colocao desses tubos emgrandes profundidades (JTP, abril 1995). Ora, a maioria dos mtodos de colocao de tubos agrandes profundidades, como a instalao de risers flexveis sem mergulhadores e os mtodos decolocao vertical de sistemas de conexo em forma de jota previamente amarrados ANM, narealidade, foram desenvolvidos em estreita colaborao com a Petrobrs e foram patenteados poresta empresa. Portanto, em grande parte, o mrito da Coflexip incumbe empresa brasileira. Essesmtodos esto sendo aplicados com sucesso por Coflexip em outras zonas produtoras como as do

    Mar do Norte.A empresa brasileira, cada vez mais consciente da fraqueza tecnolgica dos fornecedores nacionaise da generalizao dos SPF como sistema tecnolgico dominante, agora na forma de FPSO,preocupa-se menos em desenvolver os seus componentes, deixando essa incumbncia para osfornecedores internacionais, como demonstra a anlise que fizemos da carteira de projetos do Procap2000.

    Certamente a experincia bem sucedida da Petrobrs demonstra que estratgias tecnolgicasapoiadas em inovaes incrementais tm alguma chance de serem bem sucedidas e mesmo dealcanarem a fronteira tecnolgica. O fato que a evoluo econmica recente tenha sancionadoinovaes poupadoras de custo, ao invs de inovaes mais radicais de produto, certamente influiu

    nesse quadro. Entretanto, no pode se deixar de reconhecer que a indstria do petrleo apresentamelhores chances de sucesso para as empresas de pases em desenvolvimento, ao se comportarcomo uma indstria tecnologicamente madura. Com um coeficiente de gasto em P&D sobre ofaturamento de 0,8% nos Estados-Unidos em 1993, ela se coloca muito abaixo de outras indstriascomo a de sade (10,6%), automobilstica (4%), eletro-eletrnica (5,5%), qumica (4%), informtica(8%), aro-espacial (4,2%) (BusinessWeek, 27/6/94). Nesse contexto, os gastos de P&D no campoda explorao e produo realizados pela Petrobrs ocupam uma respeitvel posio dentro docenrio internacional. Com um gasto de US$ 45 milhes a empresa brasileira est em sexto lugar noranking internacional, perdendo apenas, em ordem de importncia, para Schlumberger (270), Arco(118), Halliburton (100), Elf (100) e o Instituto Francs do Petrleo (92) das instituies queresponderam ao PetroResearch do Journal of Petroleum Technology (JPT, abril e maio 1994).Certamente esto ausentes importantes empresas como a Royal Dutsch Shell, Exxon, Mobil e

    Texaco que realizam gastos provavelmente superiores aos da empresa brasileira. Entretanto, ovolume do dispndio realizado por essa empresa, que sem dvida o maior entre os pases emdesenvolvimento, associado a um tamanho relativo que a coloca entre as grandes, mostra comopuderam se criar condies para que ela alcanasse a fronteira tecnolgica em determinadasatividades.

    Comparativamente aos demais setores industriais, os setores maduros, onde existem importantesempresas nos pases em desenvolvimento, oferecem maiores oportunidades a processos de catchingup e at mesmo de leapfrogging. Mesmo assim, esses fatores estruturais no podem de formaalguma ocultar a importncia das trajetrias tecnolgicas das empresas nesses processos.

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    22/25

    22

    BIBLIOGRAFIA

    ABBOTT, P.A. DSOUZA, R.B. SOLBERG, I.C. & ERIKSEN, K. Evaluating deepwater developmentconcepts. Journal of Petroleum Technology, p. 314-321, April 1995

    ALAZARD, N. et MONTARDET, L. Ressources ptrolires pour le XXI sicle: quel avenir?. Revue delInstitut Franais du Ptrole, v.48, n.1, janvier-fvrier, p. 69-82, 1993

    ALVARENGA, M. M. Produo de petrleo no Brasil: evoluo e perspectivas in LBRE LAROVRE, E. PINGUELLI ROSA, L. e RODRIGUES, A. P.(eds) Economia & tecnologia da energia.Rio de Janeiro: Finep-Ed. Marco Zero, 1985

    ARTHUR, B. Competing technologies, increasing returns, and lock-in by historical events. TheEconomic Journal, n.99, March, p. 116-131, 1989

    BECKMAN, J. Action in dormant areas spurring revival of european E&P. Offshore, p. 31 e 80, August

    1995

    BELL, R. M. Learning and the accumulation of industrial technological capacity in developing countriesin FRANSMAN, M. & KING, K. Technological Capability in the Third World. London: Macmillan, 1984

    BELL, R.M. et OLDHAM, C. H. G. Oil companies and the implementation of technical change in offshore operations: experience in development drilling and the design and operation of productionfacilities in the North Sea. SPRU: report n.2, April 1988

    BOURGEOIS, T. M. Brief: Auger Tension-leg Platform: conquering the deepwater Gulf of Mexico.Journal of Petroleum Tecnology, p. 312-313, April 1995

    BOY de la TOUR, X. GADON, J-L. et LACOUR. J.-J. Nouveaux ptroles: quel avenir?. Revue delInstitut Franais du Ptrole, v.41, n.4, p. 1-20, juillet-aot 1986

    BOY de la TOUR, X. Technologies ptrolires: les nouvelles frontires. Revue de lEnergie, n. 456,p.105-112, fvrier 1994

    BUSINESS WEEK Whats the word in the lab? Collaborate, p. 78, june 27, 1994

    DOSI,G.Technological paradigms and technological trajectories. A suggested interpretation of thedeterminants and direction of technical change. Research Policy, v.11, p. 147-162. 1982

    DUQUE DUTRA, L. E. Evolution technologique, structure industrielle et trajectoire des entreprises:

    revision thorique et tudes des activits de prospection et dexploration ptrolire. Tese deDoutorado, Universidade de Paris-Nord, 1993

    ECONOMIDES, M. J. The state of r&d in petroleum industry. Journal of Petroleum Technolgy, p. 586-588, July 1995

    ENOS, J.L. Invention and innovation in the petroleum industry, in The rate and direction of inventiveactivity: economic and social factors. Princeton University Press for National Bureau of EconomicResearch, Princeton, New Jersey, 1962

    FRANSMAN, M. Technology and economic development. Great Britain: Wheatshead Books, 1986

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    23/25

    23

    FRAZER, F. Atlantic corridor likely hotspot for FPSO development. Offshore, p. 36, August 1995

    FREEMAN, C. Japan: a new national system of innovation?"1988, in DOSI G. et alii (eds)Technical

    Change and Economic Theory. Pinter Publishers, 1990

    FREIRE, W. Explorao e produo em aguas profundas. Brasil Mineral, n. 36, p. 63-86, Novembro1986

    FURTADO, A. e MULLER,N. Competitividade da indstria de extrao e refino de petrleo. Nota tcnica setorial docomplexo qumico. IE/UNICAMP-IEI/UFRJ-FDC-FUNCEX, Campinas, 92 p. 1994

    GAZETA MERCANTIL, Velhos navios exploraro petrleo. p. C-1, 8 de novembro 1995

    GEORGE, D. Offshores own oublication: recording the events (1954-1994). Offshore, p. 34-56, April1994.

    GIRAUD, A e BOY DE LA TOUR, X. Gopolitique du ptrole e du gaz. Paris : Ed. Technip, 1987.

    GOMES DE FREITAS, A. Capacitao tecnolgica em sistemas de produo para guas profundas.Campinas: Tese de Mestrado: DPCT-Unicamp, julho de 1993.

    HOLLANDER, S. The sources of increased efficiency. MIT University Press, 1965.

    INTITUT FRANAIS DU PREOLE. Lindustrie paraptroliere franaise p Rsultats de lenqute1992. Sminaire annuel COPREP=CEP&M, 32 p. Paris : 21 octobre 1992.

    JOURNAL OF PETROLEUM TECHNOLOGY, 1994 Petroresearch Survey Reports on R&DWorldwuide, April 1994.

    JOURNAL OF PETROLEUM TECHNOLOGY, 1994 Petroresearch Survey Tracks Petroleum BudgesPlan, May 1994.

    JOURNAL OF PETROLEUM TECHNOLOGY, Weidler, Coflexip receive OTC Achievement Awards. p.269, April 1994.

    KATZ, J. Domestic technology generation in LDCs: A review of research findings in KATZ, J. (ed.)Technology generation in latin-american manufacturing Industries. London: Macmillan, p. 13-55, 1987.

    KEMP, R. & SOETE, L. The greening of technological progress, an evolutionary perspective. Futures,v 24, n. 5, p. 437-457, 1992.

    LALL, S. Technological learning in the third world : some implications of technology exports inSTEWART, F & JAMES, J. (eds) The economics of new technologies in development countries.London: Frances Pinter, p. 157-179, 1982.

    LALL, S. technological capabilities and industrialization. World Development, v. 20, n. 2, p. 165-186,1992.

    LEBLANC, L. Deep draft hulls key to production in ultra-deepwater. Offshore, p. 26, August 1995.

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    24/25

    24

    LUNDVALL, B. Innovation as an interactive process: from user-producer interation to the nationalsystem of innovation, in DOSI, G. et alii (eds) Technical change and economic theory. London e NewYork: Pinter Publishers 1988

    MARIN, J-M. Energy technologies :systemic aspects, technological trajectories and institutionalframeworks. Technological Forecasting and Social Change, v 53, n. 1, p. 81-95, December 1994.

    MERCIER, J.A. Forecast 95 Positive, negative features in technology transfer. Offshore, p. 26-29,December 1994.

    NELSON, R.R. (ed.) National innovation systems. A comparative analysis. New York and Oxford:Oxford University Press, 1993.

    NELSON R.R. Institutions supporting technical change in the United States. (1988), in G. DOSI et alii(eds) Technical change and economic theory. Pinter Publishers, 1990.

    NELSON R.R. E WINTER, S. An evolutionary theory of economic change. Cambridge, Mass: HarvardUniversity Press, 1982.

    OCDE Technology and Economic. The key relationships. OCDE, Paris, 1992.

    OFFSHORE, Subsea production technology. Subsea processing Can it happen? Offshore, p. 35-41,December 1994.

    OIL & GAS JOURNAL, OTC presentation highlight spread of subsea technology. Oil & Gas Journal, p.19-22, May 8 1995.

    ROSENBERG, N. Perspectives On Technology, London: Cambridge University Press, 1976.

    RUTTAN, V. Induced innovation and path dependence: a reassessment with respect to agriculturaldevelopment and the environment. Technological Forecasting and Social Change, v. 53, n. 1, p. 41-50, 1996.

    SAHAL, D. Alternative conceptions of technology. Research Policy, v. 10, n. 1, p. 2-24, 1982.

    SALOMON, J.J. Le destin technologique, Paris : Collection Folio/Actuel Gallimard, 1992

    SERPLAN PETROBRS, Situao atual e perspectivas. Dezembro de 1992.

    SUSBIELLES, G. Ls ouvrages ptroliers en mer. Revue de lInstitut Franais du Ptrole, v. XXXV, n.

    4, p. 621-684, Juillet-Ao

  • 7/23/2019 A Trajetoria Tecnologica Da Petrobras n (1)

    25/25

    25

    DEPARTAMENTO DE POLTICA CIENTFICA E TECNOLGICATEXTOS PARA DISCUSSO

    1. Dagnino, Renato. O Planejamento do desenvolvimento tecnolgico e as prioridades globais.1989.2. Bilbao, Santiago. Bibliografia preliminar de Josu de Castro. 1989.3. Furtado, Andr. Energia no Brasil. 1989.4. Vessuri, Hebe M.C.Sociologia de la cincia. 1989.5. Furtado, Andr. Cultural and scio-economic crossimpcts: the case of Brazil. 1989.6. Vessuri, Hebe M C. We must invent or we will be lost: the power of science in Latin America. 1990.7. Szmrecsnyi, Tams. Histria do pensamento econmico. 1990.8. Vessuri Hebe, M C. Las cincias sociales em Argentina. Examen de actividades y perspectivas de

    desarrollo. 1990.

    9. Vessuri, Hebe M C. Enfoques y orientaciones em la sociologia de la cincia. 1991.10. Gitahy, Leda; Rabelo, Flvio; Costa, Maria Conceio da. Inovao tecnolgica, relaes industriais e

    subcontratao. 1991.11. Gitahy, Leda; Rabelo, Flvio. Educao e desenvolvimento tecnolgico: o caso da indstria de

    autopeas. 1991.12. Carvalho, Ruy de Quadros. Projeto de primeiro mundo com conhecimento e trabalho do terceiro?

    1992.13. Szmrecsnyi, Tmas. Efeitos e desafios das novas tecnologias na agroindstria canavieira, 1993.14. Dagnino, Renato. How European science policy researchers look at Latin America? 1994.15. Szmrecsnyi, Tams. Origens da Liderana Cientfica e Tecnolgica Paulista no Sculo XX. 1996.

    16. Saenz, Tirso W. Cincia e Innovacion Tecnolgica en Cuba: Situacion actual y perspectivas. 1996.17. Costa, Maria Conceio da. Mudanas institucionais e privatizao na dcada de 90: uma

    comparao entre Europa e Amrica Latina no setor de telecomunicaes. 1997.

    Prximo Texto:

    Silva, Elizabeth Bortolaia. Teorias sobre trabalho e tecnologias domsticas. Implicaes para o Brasil. 1997