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A Situação da Paternidade Envolvida e Não-Violenta em Portugal

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A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 1

A Situao da Paternidade Envolvida

e No-Violenta em Portugal

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Maio 2016

A Situao da Paternidade Envolvida

e No-Violenta em Portugal

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Autores do Relatrio: Sofia Jos Santos, Cristina Verssimo, Maria Neto, Tatiana Moura, Alexandre de Sousa Carvalho, Brbara Guimares.

Edio de Texto: Alexandre de Sousa Carvalho,Sofia Jos Santos.

Coordenao Temtica: Instituto Promundo e Promundo-Europa

Coordenao Executiva: Tatiana Moura

Produo e Disseminao: Brbara Guimares

Design GrficoBrbara Guimares

Citao Sugerida: Santos, Sofia Jos; Verssimo, Cristina; Neto, Maria; Moura, Tatiana; Carvalho, Alexandre de Sousa; Guimares, Brbara (2016), A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal, Instituto Promundo, Promundo-Europa e Escola Supe-rior de Enfermagem de Coimbra, Coimbra: Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra.

Este Relatrio baseou-se no Relatrio:Levtov R, van der Gaag N, Greene M, Kaufman M, and Barker G (2015). State of the Worlds Fathers: A MenCare Advocacy Publica-tion. Washington,DC: Promundo, Rutgers, Save the Children, Son-ke Gender Justice, and the MenEngage Alliance, disponvel aqui .

ISBN 978-989-95840-8-2 [Suporte: Impresso]ISBN 978-989-95840-9-9 [Suporte: Eletrnico]

http://sowf.men-care.org/

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A Situao da Paternidade Envolvida

e No-Violenta em Portugal

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NDICE

Ficha TcnicaAcrnimosPorqu um relatrio sobre pais e paternidades em Portugal?

1 Paternidade e CuidadoTrabalho de Cuidado no Remunerado Licena de Paternidade Evoluo da Legislao sobre Licena de Paternidade em Portugal Evoluo do Gozo da Licena de Paternidade em PortugalPaternidade e Cuidado em Ao em Portugal Seleo de Atores no Terreno Seleo de Estudos e Publicaes sobre Portugal Seleo de Projetos e Campanhas em Portugal

2 Envolvimento dos Pais na Sade Reprodutiva e na Sade Materno-infantilContracetivosAborto

3 Paternidade e Violncia Contra a Mulher e as Crianas4 Boas Prticas de Entidades Patronais

Exemplo de Boas Prticas: XEROX Portugal

5 Recomendaes

iiiviii1569111214141819

242528

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Referncias Bibliogrficas

Legislao PortuguesaLicena de PaternidadeInterrupo Voluntria da Gravidez

Anexos

Recursos teis

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5257

Recomendaes dirigidas s entidades patronais

Recomendaes dirigidas a decisores e decisoras polticas, chefias e prestadores e prestadoras de servios privados e pblicos 39

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Postais Destacveis 59

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NDICE DE FIGURAS

Postais DestacveisPostal 1Frente - A que tenho direito?Verso - Licena de Paternidade em dias na EuropaPostal 2Frente - Como tratar do Processo de Paternidade no TrabalhoVerso - Informaes teisPostal 3Frente - Quais os Benefcios do Gozo da Licena de PaternidadePostal 4Postal da Campanha MenCare em Portugal Eu sou Pai, 2014. Postal 5Postal da Campanha MenCare em Portugal Eu sou Pai, 2014. Postal 6Postal da Campanha MenCare em Portugal Eu sou Pai, 2014.

QuadrosQuadro 1 - Trabalho de cuidado no remunerado

IlustraesIlustrao 1 - Mdia de minutos dirios gastos nestas atividades por gnero, em 1999 Ilustrao 2 - Mdia de minutos dirios gastos nestas atividades por gnero, em 2015Ilustrao 3 - Licena de Paternidade em dias na EuropaIlustrao 4 - Quais os Benefcios do Gozo da Licena de Paternidade?Ilustrao 5 - A que tenho Direito?Ilustrao 6 - Evoluo no uso das licenas de parentalidadeIlustrao 7 - Pap d licenaIlustrao 8 - campanha do dia do Pai 2014, Eu Sou PaiIlustrao 9 - Principais situaes de perigo registadas na CNPCJR, comparao de 2009 a 2014.Ilustrao 10 - Nmero de homens que foram pais enquanto trabalhadores da Xerox/ nmero de pais trabalhadores da Xerox que pediram licena de paternidade no obrigatria.

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IMAGES - International Men and Gender Equality Survey Eurofound - European Foundation for the Improvement of Living and Working ConditionsCITE - Comisso para a Igualdade no Trabalho e no EmpregoCIG - Comisso para a Igualdade de GneroCRR - Center for Reproductive RightsDGS - Direo Geral de SadeVIH - Vrus da Imunodeficincia Humana APF - Associao para o Planeamento da FamliaOMS - Organizao Mundial de SadeIVG - Interrupo Voluntria da GravidezIG - Interrupo da GravidezUE - Unio Europeia

Acrnimos

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PORQU UM RELATRIO SOBRE PAIS E PATERNIDADES EM PORTUGAL?

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A paternidade importa. Em todas as sociedades e em todos as fases da vida da criana, as relaes entre pai e filho e pai e filha - sejam elas positivas, negativas ou ausentes - tm um impacto profundo e abrangente ao longo de toda a vida. A participao dos pais enquanto cuidadores tem do mesmo modo um impacto profundo na vida das mulheres, da famlia, da comunidade e dos prprios homens (Levtov et al., 2015).

Aproximadamente 80% dos homens sero prximos de uma criana em algum momento das suas vidas enquanto pais (biolgicos ou adoptivos), familiares, professores, formadores, ou simplesmente enquanto membros da comunidade onde a criana vive. Quer sejam pais biolgicos, adoptivos, padrastos ou detentores da guarda legal; quer sejam irmos, tios ou avs; quer estejam em relaes heterossexuais ou homossexuais, quer vivam com as crianas ou no, a participao diria dos homens nas ta-refas de cuidado influencia a vida das crianas, das mulheres e dos homens, e tem um impac-to profundo no mundo sua volta.

Ao longo dos ltimos anos as mudanas no local de trabalho1 e nos lares tm trazido mu-danas na participao dos homens enquan-to cuidadores ativos e envolvidos ou seja, a situao da paternidade tem vindo a mudar (Ibidem).

Portugal est a par com muitos outros pases da Unio Europeia (UE) em termos de progresso global rumo igualdade de gnero e tem uma das polticas de licena de parentalidade mais pro-gressistas ao nvel da UE, tanto em termos de durao do tempo de licen-a como do montante de subsdio parental que atribudo. No entanto, apesar desta tendncia positiva registada, a verdade que muitos homens sentem ainda um conflito grande entre os papis tradicionalmente atri-budos ao homem e o seu papel de cuidadores (Wall et al., 2010; Aboim, 2010), sendo estes papis no raras vezes entendidos como opostos ou irreconciliveis. Alm disso, a importncia do trabalho de cuidado dos ho-mens tem estado tambm muito ausente dos debates pblicos, das po-lticas pblicas, da investigao cientfica e dos esforos de promoo da igualdade de gnero. Do mesmo modo, a situao de crise financeira e econmica que Portugal vive coloca inmeros desafios a uma paternidade envolvida e cuidadora e, por consequncia, igualdade de gnero.

A paternidade envolvida uma das mudanas mais emocionantes e com maior capacidade transfor-madora que est a acontecer na vida dos homens e das mulheres em Portugal e no mundo. Este Relatrio tem a ambio de dar visibilidade a esta mudana.O progresso at agora alcanado apenas o princpio de um caminho longo e que se quer tambm mais abrangente.

1 Por mudanas no local de trabalho devem ser tomadas em conta vrias dimenses, desde as mudanas nas polticas labo-rais na qual se incluem as licenas de paternidade - e nas suas condies, tais como as evolues da taxa de desemprego, a precariedade laboral ou os perodos de intermitncia entre desemprego e atividade; e ao progresso no que concerne ao acesso (mais equitativo) ao mercado laboral por parte das mulheres.

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Pretende-se com este Relatrio:

Apresentar a situao da paternidade em Portugal em reas distintas, como a rea do cuidado, a da sade sexual e reprodutiva, a da sade ma-terno-infantil e a da violncia contra a mulher e a criana;

Consciencializar todos e todas para a importncia de uma paternida-de envolvida;

Mapear os esforos e os atores que tm contribudo para esta causa, identificando-os e explicando as suas iniciativas e resultados;

Apontar as ideias e recomendaes que podem ser teis na discusso e promoo da igualdade de gnero atravs da promoo de uma parentali-dade envolvida e no-violenta.

Este Relatrio foca-se em casais heterossexuais e na relao de paternida-de e maternidade com as crianas, no estando, por isso, as relaes ho-mossexuais diretamente includas. Este Relatrio enfatiza a importncia da paternidade envolvida e no-violenta, independentemente da orientao sexual dos pais.

A paternidade envolvida uma das mudanas mais emocionantes e com maior capacidade transformadora que est a acontecer na vida dos ho-mens e das mulheres em Portugal e no mundo. Este Relatrio tem a am-bio de dar visibilidade a esta mudana. Apesar dos sucessos, o progresso at agora alcanado apenas o princpio de um caminho longo e que se quer tambm mais abrangente. Uma mudana rumo a uma paternidade mais envolvida, cuidadora e equitativa deve ser apoiada e promovida como parte de uma agenda de gnero mais ampla que desafia as estruturas e mentalidades que nos restringem no desenvolvimento como seres huma-nos completos numa sociedade mais justa e igualitria.

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Globalmente, homens e mulheres partilham de forma no equitativa a diviso do trabalho de cuidado (Seplveda, 2013), entendido aqui como trabalho do-mstico e de cuidado no pago desenvolvido tanto em casa como na comuni-dade. Este desequilbrio afeta negativamente no apenas homens, mulheres e crianas, mas tambm as dinmicas de gnero e a prpria economia (Levtov et al., 2015). As licenas parental e de paternidade tm um enorme potencial para um maior envolvimento dos homens na vida das crianas, enquanto si-multaneamente protegem o trabalho de pais e mes no mercado de trabalho remunerado durante o perodo ps-parto, apoiando assim a igualdade no que toca o trabalho no remunerado no lar (Levtlov et al., 2015). A redistribui-o equilibrada das atividades de cuidado dos/as descendentes estratgica na conciliao da vida profissional com a pessoal, conduzindo a uma maior interveno das mulheres na esfera pblica e corrigindo assim assimetrias no acesso a oportunidades, a recursos e realizao profissional de todos e todas. Porm, apesar de existir um crescente nmero de convenes internacionais e de regulao nacional que refere e protege a importncia do envolvimento dos homens em trabalhos de cuidado, muito est por alcanar para uma redis-tribuio mais justa e equitativa do trabalho entre homens e mulheres (Barker, 2014), assim como em desenhar e implementar legislao que facilite cada vez mais o envolvimento dos homens nas tarefas de cuidado e numa paterni-dade envolvida ao longo da vida.

1PATERNIDADE E CUIDADO

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Atualmente, 40% do trabalho formal e remunerado no mundo realizado por mulheres (World Bank, 2012). No entanto, os homens ainda no assumem 50% das tarefas de cuidado (ex.: tarefas domsticas, cuidado de crianas e/ou idosos) (World Bank, 2013). A percentagem de trabalho de cuidado no remunerado que homens e mulheres assumem varia muito de sociedade para sociedade e tambm de famlia para famlia (Levtov et al., 2015). De uma for-ma generalizada, as mulheres so responsveis por uma maior percentagem de trabalho de cuidado no pago. Mesmo em pases ou sociedades em que os homens contribuem mais hoje do que no passado, o desfasamento entre ho-mens e mulheres nesta matria tem teimosamente persistido (Ibidem).

Globalmente, as razes que levam os homens a no participar de forma igua-litria no trabalho de cuidado no remunerado dependem essencialmente de trs fatores (Levtov et al., 2015; Van den Berg, 2015):

Normas sociais e socializao no que toca a relaes de gnero que reforam a conceo de que o trabalho de cuidado um trabalho de mulheres;

Normas que referenciam as tomadas de de-ciso nos espaos da casa e que mantm uma diviso tradicional do trabalho baseado no g-nero e que reforam a desigual distribuio do/e trabalho entre homens e mulheres.

Contexto econmico e laboral;

A diviso desigual do trabalho de cuidado no re-munerado afeta negativamente mulheres, crian-as e homens, bem como a prpria economia (Arajo & Veiga, 2015; vila & Ferreira, 2014). Do mesmo modo, limita a participao das mu-lheres na esfera laboral, na sua educao e no seu empoderamento econmico. As meninas tambm tendem a participar mais no trabalho de cuidado no pago do que os rapazes, o que pode limitar a sua participao na sua educao (ILO, 2009) uma vez que tm menos tempo para ir escola ou para outras actividades que promovam o seu desenvolvimento pleno e bem estar.

Quadro 1: Trabalho de cuidado no remunerado (Ferrant et al., 2014: 3).

Refere-se a todos os servios no pagos prestados dentro de casa para os seus

elementos, incluindo os cuidados de pessoas, trabalho domstico e trabalho comunitrio voluntrio (Elson, 2000).

No pago= quem desenvolve a ativida-de no remunerado por essa atividade

Cuidado= a atividade fornece o que necessrio para a sade, bem-estar, a manuteno e a proteo de alguma

coisa ou de algum

Trabalho= a atividade envolve esforo mental e fsico e custosa em termos de

recursos e de tempo.

Trabalho de Cuidado no Remunerado

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Alguns estudos mostram que a discrepncia entre homens e mulheres face ao trabalho de cuidado no pago est a diminuir, particularmente em pases de rendimento elevado e no que diz respeito s tarefas de cuidado relativas a crianas: os pais passam cada vez mais tempo com os seus filhos e/ou filhas (Bianchi et al, 2006; Sandberg e Hofferth, 2005) e o nmero de pais que fica em casa para cuidar das crianas, enquanto as suas parceiras trabalham, est lentamente a aumentar. Porm, esta diminuio da discrepncia de tempo de-dicado a tarefas domsticas deve-se mais ao facto de as mulheres gastarem cada vez menos tempo nessas actividades, dando maior prioridade a passar tempo com as crianas do que a desenvolver trabalho domstico (Bianchi et al, 2006).

na histria da famlia que se encontra muitas vezes a narrativa que suporta a diferenciao social entre homens e mulheres (Aboim, 2010). Portugal parti-lha com outros pases europeus uma construo e noo muito tradicional de famlia, onde o homem visto como o provedor econmico e a autoridade da casa e a mulher tida como a responsvel pela prestao de cuidado e traba-lho domstico. Durante a guerra colonial, devido ao envio de muitos homens para a guerra, as mulheres tiveram a oportunidade de entrar no mercado de trabalho, principalmente em funes no sector agrcola ou ocupando cargos de colarinho branco. Porm, foi apenas depois da Revoluo dos Cravos, a 25 de Abril de 1974, que a entrada macia das mulheres no mercado de trabalho aconteceu, bem como os processos de mudana em matria de papis de gne-ro no seio da famlia e em contexto laboral (Silva, 1983). Nas ltimas dcadas, a passagem de modelos familiares organizados em torno de uma diferenciao de gnero forte para modelos referenciados por uma crescente paridade conju-gal tem refletido profundas mudanas no estatuto das mulheres (Aboim, 2006; 2007), desafiando os cdigos de masculinidade tanto enquanto homens como enquanto pais. Hoje, o ideal de um homem cuidador ganhou fora simblica e institucional no pas (Aboim, 2010). Uma das evidncias precisamente a licena de paternidade: o consenso social e poltico sobre a importncia da licena de paternidade paga e o quadro regulamentar que lhe diz respeito. Se a manuteno da desigualdade de gnero no seio da famlia ainda , infelizmen-te, uma realidade persistente, tambm verdade que os homens esto cada vez mais a entrar nas esferas domsticas e a assumir trabalho de cuidado, em Portugal (Torres, 2004; Wall, 2005). Os dados mostram que em 1999 a desi-gualdade de gnero era patente tanto no trabalho domstico como no cuidado em Portugal e que, em 2015, ainda que ligeiramente menor, continua a ser um trao da sociedade portuguesa.

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Ilustrao 2 - Mdia de minutos dirios gastos nestas atividades por gnero, em 2015 (UNWOMEN, 2015)

O estudo IMAGES revela que a participao dos homens em tarefas de cuida-do e na paternidade tem efeitos positivos na vida das mulheres, crianas e dos prprios homens, demonstrando mesmo ser um elemento decisivo para a re-duo da violncia e para a promoo da justia social. Homens com atitudes equitativas de gnero tm mais possibilidades de serem felizes, de conversar com a sua companheira e de terem vidas sexuais mais felizes Tudo isto se tra-duz na melhoria da sua sade fsica e mental, com uma diminuio dos nveis de stress e de doenas cardacas. Do mesmo modo, as mulheres cujos maridos ajudam nas tarefas domsticas e no cuidado dos filhos revelam maiores nveis de satisfao na relao conjugal bem como na sua vida sexual, contribuindo ainda para uma gestao saudvel, para a sua ascenso no mercado de trabalho e para a preveno de doenas.

Outros estudos do Promundo (Barker et al., 2011; Barker et al., 2012) mos-tram tambm que, mesmo quando os homens realizam tarefas de cuidado, muitas vezes no se sentem apoiados pelos seus familiares, amigos ou colegas de trabalho. E a ideia de que homens e meninos no sabem ou no devem realizar esta funo ainda propagada pelas prprias mulheres. Alm disso, muitos homens, apesar de reconhecerem, em abstrato, a igualdade de gnero, no a colocam em prtica nas suas rotinas dirias. , por isso, necessrio um trabalho profundo de consciencializao e sensibilizao.

2 OCDE (s/d) Balancing paid work, unpaid work and leisure, disponvel aqui.

Ilustrao 1- Mdia de minutos dirios gastos nestas atividades por gnero,em 1999 (OCDE, s/d)2

http://www.oecd.org/gender/data/balancingpaidworkunpaidworkandleisure.htm

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Como princpio base, a licena de paternidade assenta na convico de que importante para o trabalhador conseguir um equilbrio saudvel entre a vida pessoal e a vida profissional, particularmente para aque-les trabalhadores que tm filhos/as. A licena de Paterni-dade e Parental3 so essenciais para aumentar a partici-pao dos pais na vida dos filhos, pois simultaneamente protegem mulheres e homens no mercado de trabalho remunerado durante o perodo aps o nascimento e apoiam a igualdade de gnero no que diz respeito atri-buio de trabalho no remunerado e remunerado em cada agregado familiar (Levtlov et al., 2015). Com efei-to, a licena de paternidade leva a uma diviso de traba-lho domstico mais equilibrada em termos de gnero e contribui tambm para que mulheres progridam de igual modo nas suas carreiras (Ibidem).

Licena de Paternidade

Perodo de licena - paga ou no paga reservada aos pais (homens) pelo nascimento dos seus filhos e/ou filhas e que usada exclusivamente pelo pai.

Licena de Paternidade

medida que os pais se envolvem mais e dividem/partilham as tarefas de cuidado e trabalho domstico, a emancipao econmica das mulheres progride.

medida que os pais se envolvem cada vez mais desde cedo na vida dos filhos, os indicadores de desenvolvimento infantil melhoram.

medida que os pais se envolvem, os indicadores relacionados com a sade materna melhoram.

medida que aumenta a participao masculina nas tarefas de cuidado, a sade fsica e mental dos homens melhora.

medida que a participao masculina nas tarefas de cuidado aumenta, a violncia contra mulheres e crianas diminui.

Ilustrao 3 - Quais os Benefcios do Gozo da Licena de Paternidade?

Quais os Benefcios do Gozo da Licena de Paternidade?

3 A licena de parentalidade inclui a licena de maternidade, a licena de paternidade e a licena conjunta. Corresponde ao perodo de tempo em que os pais tm direito a fica em casa aps o nascimento do(a) seu/sua filho/a para cuidar destes. um dos direitos dos pais trabalhadores em Portugal.

10 | A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal

Portugal tem uma das polticas de licena de paternidade mais progressistas ao nvel europeu, tanto em termos de durao do tempo de licena - 25 dias - como do montante de subsdio que lhe atribudo. Ocupando o quinto lugar no ranking das licenas de paternidade em termos de dias de licena, Portugal apenas antecedido pela Noruega (112 dias), Islndia e Eslovnia (90 dias) e Sucia (70 dias).

Em Portugal, desde 1 de Setembro de 2015 (lei 120/2015, 1 de Setembro), obrigatrio o gozo pelo pai de uma licena parental de 15 dias teis, seguidos ou interpolados, nos 30 dias seguintes ao nascimento do filho, cinco dos quais de modo consecutivo logo aps o parto, e tendo como subsdio 100% do sal-rio mais recente. O facto de uma parte da licena ser obrigatria importante, particularmente em contextos de transformao de regimes de gnero e de crise financeira. Cada casal pode ainda desfrutar de 120 ou 150 dias consecutivos de licena partilhada recebendo cada membro do casal 83% do seu salrio. De acordo com esta legislao, pais com filhos at trs anos podem pedir para tra-balhar de casa e pais de crianas com idades at aos 12 anos (ou em qualquer idade se forem portadores de deficincia ou de doena crnica). Esto ainda autorizados a trabalhar em horrios flexveis ou em regime parcial sem serem penalizados, tanto na avaliao como na progresso da carreira, o que refora a possibilidade da ideia e da prtica dos pais homens enquanto cuidadores ativos.

Ilustrao 4 - Licena de Paternidade em dias na Europa4

4 Fontes: Dirio da Repblica (1a srie, no 170) de 1 de setembro, a Lei no120/2015; OCDE (2016), Parental leave: where are the fathers? Mens uptake of parental leave is rising but still low, Policy Brief, Maro 2016. Disponvel aqui; Addati, L.; Cassirer, N.; Gilchrist, K. (2014), Maternity and paternity at work: law and practice across the world, Interna-tional Labour Office Genebra: ILO. Disponvel aqui.

http://www.oecd.org/policy-briefs/parental-leave-where-are-the-fathers.pdfhttp://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---dgreports/---dcomm/---publ/documents/publication/wcms_242615.pdf

A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 11

Ilustrao 5 - A que tenho Direito?

Evoluo da Legislao sobre Licena de Paternidade em Portugal

Desde 1985 que, de acordo com a legislao portuguesa, o pai tem o direito, na eventualidade de morte ou incapacidade da me, a 30 dias por ano no re-munerados para tomar conta dos seus filhos e/ou filhas, desde que as crianas sejam menores de 11 anos, e pode mesmo tirar uma licena no remunerada de 6 meses a 2 anos (lei 4/84, de 5 de Abril). Em 1999, a licena de paternidade remunerada foi introduzida na legislao portuguesa: o pai passou a poder usu-fruir de 5 dias teis pagos na totalidade a serem usados no primeiro ms de vida da criana (lei 142/99, 30 Agosto). Em 2009, os pais portugueses passaram a ter direito a 20 dias teis de licena de paternidade remunerada, sendo 10 desses 20 dias obrigatrios (o que torna mais fcil o gozo da licena socialmente e no local de trabalho) e tendo como subsdio 100% do salrio mais recente. Cada casal pode ainda desfrutar de um ms adicional de licena partilhada recebendo cada membro do casal 83% do seu salrio (lei 7/2009, 12 Fevereiro). Os pais de crianas com idades at aos 12 anos esto ainda autorizados a trabalhar em horrios flexveis, o que refora a possibilidade da ideia e da prtica dos pais homens enquanto cuidadores ativos. Finalmente, desde 1 de Setembro de 2015 (lei 120/2015, 1 de Setembro), a durao do perodo de licena obrigatria foi alargado de 5 para 10 dias; pai e me passam a poder gozar em simultneo a

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Evoluo do gozo da Licena de Paternidade em Portugal

O usufruto da licena de paternidade na Europa depende das caractersticas dos regimes de licena disponvel em cada pas, tais como durao, montante do subsdio parental, condies para partilhar a licena entre os dois pais, fle-xibilidade e o contexto. Uma investigao do Eurofound (2004) mostra que as taxas de uso da licena de parentalidade por parte dos pais dependem da articulao entre de diferentes fatores, nomeadamente: informao disponvel sobre a licena; valor remuneratrio da licena e disparidades de pagamen-to; disponibilidade e flexibilidade das instituies/equipamentos de cuidado e educao infantil, modelos dominantes de organizao da famlia; e o nvel em que os trabalhadores temem deixar de ter salrio completo, nos casos em que o subsdio parental est ausente ou inferior ao salrio; disponibilidade e flexibilidade das instalaes de acolhimento de crianas; modelos de orga-nizao de famlia vigente; e nvel do receio por parte dos pais que gozam da licena de isolamento face ao mercado de trabalho (Ibidem).

Em Portugal, a evoluo do gozo da licena de paternidade tem sido positiva, como podero ser vistos no grfico em baixo.

Ilustrao 6Evoluo no uso das licenas de parentalidade 2005-2013 (CITE, s/d).

licena parental inicial de 120 ou 150 dias consecutivos (a lei prev contudo excees: o gozo da licena parental inicial em simultneo, de me e pai que trabalhem na mesma empresa, sendo esta uma microempresa, depende do acor-do do empregador); e quem tem crianas at trs anos passa a poder exercer a atividade em regime de teletrabalho - sendo que o empregador no pode opor-se ao pedido do trabalhador, mas a opo de teletrabalho ter de ser compa-tvel com a atividade desempenhada pelo trabalhador e a entidade patronal disponha de recursos e meios para o efeito.

A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 13

O nmero de pais que solicitam licena de paternidade no obrigatria, em Por-tugal, tem vindo a aumentar desde 2005, sofrendo apenas uma pequena descida em 2013. Nesse ano, em cada 100 mes que usufruram da licena de materni-dade, 43 pais pediram licena de paternidade facultativa. Em 2011, por cada 100 mes que usufruram da licena de maternidade, 60 pais pediram a licena de paternidade facultativa, tendo em 2013 o nmero atingido 63, depois de ter tido 64 em 2012 (CITE, 2014).

Porm, apesar do decrscimo registado entre 2012 e 2013 no nmero de pais que requerem licena de paternidade facultativa (7%), uma anlise temporal mais alargada permite observar um aumento de 37% nesta matria entre 2005-2013. Alm disso, o decrscimo entre 2012 e 2013 acompanhado tambm por um decrscimo do nmero total de nascimentos de 14% no mesmo pero-do. Isto : entre 2012 e 2013, o decrscimo de nascimentos caiu mais do que o nmero de pais que requereram licena de paternidade facultativa.

Os nmeros sugerem um balano positivo no que toca a reivindicao e uso do direito licena de paternidade por parte dos pais, mas do-nos tambm sinais de alerta para o futuro prximo.

Em muitos casos, no sem dificuldades que o homem assume um novo lu-gar na vida familiar (Aboim, 2010). A partir de uma perspetiva masculina, embora a paternidade possa ser uma experincia (re)constitutiva da prpria masculinidade (Wall et al., 2010), ser um cuidador conta ainda uma histria incompleta do que significa ser homem. Os pais ainda sentem muitas vezes a necessidade de serem reconhecidos ou de sentirem em si mesmos algumas das caractersticas tradicionalmente atribudas ao ser homem. Ou seja, o facto de um homem se assumir como cuidador, no significa necessariamente que essa funo se sobreponha de ser uma autoridade ou um provedor. Na maioria das vezes, estas caractersticas complementam-se umas s outras. Na verdade, a conceo de ser um pai mais envolvido ainda convive com os pa-pis tradicionais atribudos aos homens (Aboim, 2010).

14 | A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal

Paternidade e Cuidado em ao em Portugal

Vrias instituies, tanto governamentais, como no-governamentais, acadmi-cas e de interveno, tm trabalhado as questes da paternidade e do cuidado em Portugal com contributos especficos em diferentes reas.

Seleo de atores no terreno

A Associao para a Igualdade Parental e Direitos dos Filhos uma asso-ciao portuguesa que promove a tomada de conscincia social e legal quan-to igualdade de direitos e deveres dos pais e mes, nomeadamente quanto responsabilidade parental, bem como as questes da Igualdade Parental e Pa-rentalidade Positiva junto da sociedade civil. F-lo, entre outras formas, atra-vs da promoo de legislao adequada realidade atual inerente ao divrcio, bem como a novas formas de conjugalidade, designadamente por uma maior celeridade processual e medidas coercivas ao incumprimento das decises re-ferentes Regulao das Responsabilidades Parentais; do desenvolvimento de iniciativas tendo em vista o igual tratamento no direito informao de ambos os progenitores em ambiente escolar, bem como a promoo de boas prticas escolares quanto ao direito de informao dos progenitores no residentes. Sai-ba mais sobre o trabalho da Associao para a Igualdade Parental e Direitos dos Filhos aqui.

A Associao Portuguesa de Apoio Vtima (APAV) uma organizao par-ticular sem fins lucrativos de solidariedade social e de voluntariado de mbito nacional, fundada em 25 de Junho de 1990. A APAV tem como objetivo pro-mover e contribuir para a informao, proteo e apoio aos cidados vtimas de infraes penais atravs da prestao de servios gratuitos e confidenciais. Na sua ao, a APAV promove a proteo e o apoio a vtimas de infraes penais, em particular s mais carenciadas. A APAV uma das associaes parceiras da Campanha MenCare em Portugal - Eu sou Pai. Saiba mais sobre o trabalho da APAV na luta pela igualdade de gnero aqui.

A Associao para o Planeamento da Famlia (APF) constituda em 1967, tem como objetivo ajudar as pessoas a fazerem escolhas livres e conscientes no mbito da sua vida sexual e reprodutiva; e contribuir para a promoo da igualdade de direitos e oportunidades entre homens e mulheres; ajudar a mulher a manter o controlo consciente e livre da sua fecundidade, contribuindo para a sua emancipao; promover a educao e o aconselhamento sobre sexualidade, o acesso contraceo e a orientao de problemas de infertilidade; promover a formao e o treino de profissionais de sade, bem como a educao e interven-o comunitria para a abordagem de questes ligadas ao Planeamento Familiar

http://igualdadeparental.org/http://www.apav.pt/apav_v3/index.php/pt/

A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 15

e Educao Sexual; contribuir para a promoo de legislao e polticas que garantam o exerccio dos direitos humanos nos campos da reproduo e da se-xualidade; cooperar com os organismos oficiais relacionados com os objetivos da APF e com organizaes nacionais e internacionais e similares; contribuir para o avano na promoo do conhecimento cientfico nas reas acima referi-das. Saiba mais sobre o trabalho da APF na luta pela igualdade de gnero aqui.

A Comisso para a Igualdade de Gnero (CIG) o organismo nacional res-ponsvel pela promoo e defesa da igualdade entre mulheres e homens, um princpio fundamental da Constituio da Repblica Portuguesa, procurando responder s profundas alteraes sociais e polticas da sociedade em matria de cidadania e igualdade de gnero. Garante a execuo das polticas pblicas no domnio da cidadania, da promoo e defesa da igualdade de gnero e do combate violncia domstica e de gnero e ao trfico de seres humanos, ca-bendo-lhe a coordenao dos Planos Nacionais nessas reas. Saiba mais sobre o seu trabalho na luta pela igualdade de gnero aqui.

A Comisso para a Igualdade no Emprego e Trabalho (CITE) funciona na dependncia do membro do Governo responsvel pela rea da Solidariedade, Emprego e Segurana Social, em articulao com o membro do Governo res-ponsvel pela rea dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade. A sua composi-o tripartida compreende quatro representantes do Estado (1 do Ministrio das Finanas, 1 da Secretaria de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade e 2 do Ministrio da Solidariedade, Emprego e Segurana social), quatro repre-sentantes sindicais e quatro representantes patronais. Conta entre os seus prin-cipais objetivos prosseguir a igualdade e a no discriminao entre mulheres e homens no mundo laboral; a proteo na parentalidade; e a conciliao da vida profissional, familiar e pessoal. A CITE, em 2013, criou o Frum Empresas para a Igualdade de Gnero o nosso compromisso, com o objetivo de juntar empresas que, face aos desafios da competitividade, querem assumir uma cul-tura coletiva de responsabilidade social, incorporando nas suas estratgias de gesto os princpios de igualdade entre mulheres e homens num compromisso claro com a promoo da igualdade profissional e com o combate a todas as formas de discriminao de gnero no trabalho e no emprego. Saiba mais sobre o seu trabalho na proteco da parentalidade aqui.

A Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnf) uma instituio pblica de referncia nacional e internacional, pela sua qualidade e inovao, com interveno reconhecida no sistema de sade e na sociedade. A ESEnfC uma das associaes parceiras e promotoras da Campanha MenCare em Portu-gal Eu sou pai e colaborou na adaptao do Manual P ao contexto Portugus. tambm na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra que o projeto (O)

http://www.apf.pt/https://www.cig.gov.pt/http://www.cite.gov.pt/

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Usar & ser Lao Branco se desenvolve-se desde 2007. (O)Usar & ser Lao Branco um projeto de preveno primria que procura informar, sensibilizar e educar jovens atravs dos seus pares, para prevenirem e combaterem a violn-cia sobre as mulheres, especialmente no contexto das relaes de intimidade, a comear no namoro. Este projeto prope-se implementar um modelo integrado na preveno da violncia, desenvolvendo intervenes formais e informais - especialmente em escolas de ensino bsico, secundrio e superior - sustentadas na metodologia de Paulo Freire. Saiba mais sobre o trabalho da ESEnf na luta pela igualdade de gnero e proteco da parentalidade aqui.

O GRAAL um movimento internacional de mulheres de diversas geraes e culturas, e empenhadas na transformao do mundo numa comunidade global de justia e paz, conforme o sentido simblico da lenda que deu origem ao nome do movimento. Tendo comeado na Holanda, em 1921, com um grupo de estudantes crists que acreditaram ser necessrio tornar visvel e operacional a presena das mulheres na sociedade, espalhou-se pelos cinco continentes e est atualmente ativo em 17 pases. Em Portugal, o GRAAL foi o promotor do projeto Pap d licena?. Este projeto, j terminado, parte do entendimento de que a redistribuio equilibrada das atividades de cuidado dos/as filhos/as estratgica na conciliao da vida profissional com a pessoal, e que conduz a uma maior interveno das mulheres na esfera pblica, corrigindo assim as-simetrias no acesso ao poder, aos recursos e sua realizao profissional. O projeto assumiu como objetivo promover a participao dos homens no cuidado dos filhos/as e contribuir para que utilizem as licenas parentais, prtica que, apesar dos incentivos legais, afirmam ter sido pouco frequente em Portugal. O GRAAL uma das associaes parceiras da Campanha MenCare em Portugal - Eu sou Pai. Saiba mais sobre o trabalho do GRAAL na luta pela igualdade de gnero aqui.

O Promundo uma organizao no-governamental que atua em diversos pa-ses do mundo promovendo a igualdade de gnero e a preveno da violncia com foco no envolvimento de homens e mulheres na transformao de mascu-linidades. Fundado originalmente no Brasil em 1997, o Promundo tem desde 2011 escritrios em Washington, EUA (Promundo-US), e desde 2015 em Goma, na Repblica Democrtica do Congo (Promundo-LPI). Em 2014 foi fundado o Promundo-Europa em Coimbra, Portugal, como um centro de pesquisa europeu do Promundo, em parceria com o Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. O Promundo-Europa desenvolve investigao aplicada e interveno sobre masculinidades e relaes de gnero no actual contexto de crise econ-mica e financeira na Europa, e suas conexes com masculinidades e relaes de gnero. O questionrio IMAGES, criado pelo Promundo, um dos question-rios domiciliares mais abrangentes realizados sobre as atitudes e prticas de

https://www.esenfc.pt/enhttp://www.graal.org.pt/

A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 17

homens com opinies e relatos de mulheres incluindo uma grande varieda-de de tpicos relacionados com a igualdade de gnero. Os dados e concluses gerados a partir da pesquisa IMAGES serviram de base para o desenvolvimento das principais iniciativas do Promundo, sendo utilizados na criao e planeja-mento de diversas intervenes que visam engajar homens na promoo da equidade de gnero e preveno de violncia contra mulheres. O Promundo tambm co-oordenador da Campanha Global de Paternidade MenCare e tem publicado, desde 2015, vrios relatrios que sintetizam a situao da paternida-de e do cuidado por todo o mundo. Saiba mais aqui.

A Sade em Portugus uma organizao no-governamental e uma institui-o particular de solidariedade social, com sede em Coimbra, mas com trabalho tambm ao nvel internacional. Fundada em 1993, conduz a sua aco para pro-mover a integrao social e comunitria com vista ao desenvolvimento integral da pessoa humana, respeitando e assegurando os seus direitos e liberdades fun-damentais. Tem trabalhado sobre questes de trfico humano, sade e gnero. A Sade em Portugus uma das associaes parceiras da Campanha MenCare em Portugal - Eu sou Pai. Saiba mais sobre o trabalho de luta pela igualdade de gnero da Sade em Portugus aqui.

A Segurana Social um sistema que pretende assegurar direitos bsicos dos cidados e a igualdade de oportunidades, bem como promover o bem-estar e a coeso social para todos os cidados portugueses ou estrangeiros que exer-am atividade profissional ou residam no territrio. So objetivos prioritrios do sistema de Segurana Social: garantir a concretizao do direito Segurana Social; promover a melhoria sustentada das condies e dos nveis de proteo social e o reforo da respetiva equidade; promover a eficcia do sistema e a efi-cincia da sua gesto. A informao sobre os direitos e deveres no processo de pedido e atribuio de licena e subsdio de parentalidade deve ser consultada na pgina da Segurana Social, aqui.

http://promundoglobal.org/http://www.saudeportugues.org/http://www.seg-social.pt/inicio

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Seleo de Estudos e Publicaes sobre Portugal

Mens Roles in a Gender Equality Perspective (2014- 2016)5 Projeto de inves-tigao coordenado por Karin Wall do Instituto de Cincias Sociais da Univer-sidade Nova de Lisboa, com equipa de investigao composta por Sofia Aboim, Vanessa Cunha, Susana Atalaia, Leonor Bettencourt Rodrigues, Berit Brandth, Elin Kvande, Gerardo Meil Landwerlin. O projeto tem como finalidade pro-mover o conhecimento e sensibilizar sobre os papis dos homens e sobre a igualdade de gnero em Portugal, num contexto de mudana de prticas e po-lticas, densificando a discusso pblica e reorientando as perspetivas da ao futura. Especificamente, o estudo pretende: produzir um Livro Branco sobre os homens, os papis masculinos e a igualdade de gnero em Portugal, que sirva de base ao debate pblico e sensibilizao sobre esta matria; analisar as ten-dncias recentes relativas aos papis dos homens e s polticas de igualdade de gnero direcionadas para os homens e masculinidades; estabelecer um dilogo com stakeholders relevantes e decisores polticos, incorporando as suas perspe-tivas e comprometendo-os com as linhas de orientao do Livro Branco. Saiba mais sobre este estudo aqui.

Wall, Karin; Aboim, Sofia; Cunha, Vanessa (2010) A Vida Familiar no Mas-culino: Negociando Velhas e Novas Masculinidades, Estudos CITE, Lisboa: CITE6, este livro constitui o resultado de vrios anos de investigao sobre a vida familiar no masculino e cujos principais objetivos eram o de observar a diversidade social nas formas de ser homem na famlia, bem como o de identificar as principais tendncias de mudana nas relaes sociais de gnero na sociedade portuguesa contempornea. Procurou-se dar voz aos homens, protagonistas ainda pouco conhecidos da vida familiar e, de uma forma mais geral, compreender as transformaes operadas nas prticas, nos valores e nas identidades masculinas. Temas to atuais e controversos como a diviso se-xual do trabalho e a evoluo das polticas de famlia; as relaes conjugais e as novas formas de paternidade; a desigualdade de poderes e a expresso dos afetos, as dinmicas de recomposio e as novas trajetrias masculinas na fa-mlia (como ser pai em contextos monoparentais ou ser padrasto); as tenses sentidas pelos homens entre a famlia e o trabalho ou entre referncias mlti-plas de masculinidade; fazem parte deste livro, sendo abordados ao longo dos vrios captulos que o compem. Este livro reflete a vontade de romper com ideias pr-concebidas sobre o papel dos homens na vida familiar, mostrando, antes, o retrato complexo e diversificado que emergiu da observao intensiva das prticas e das trajetrias, ou dos valores e das identidades dos homensen-trevistados entre 2004 e 2005. Atravs das narrativas de homens, todos eles pais ou padrastos, a viver em casal e em situaes de monoparentalidade, este

5 Projeto aprovado pelo Mecanismo Financeiro do Espao Econmico Europeu, EEA Grants, rea de Programa PT07 - Integrao da Igualdade de Gnero e Promoo do Equilbrio entre o Trabalho e a Vida Privada.6 Disponvel aqui.

http://www.ics.ul.pt/instituto/%3Fln%3Dp%26mm%3D2%26ctmid%3D4%26mnid%3D1%26doc%3D31809901190%26sec%3D3%26idpro%3D332%26pid%3D105%20e%20em%20http://www.cite.gov.pt/pt/acite/projetos_eea_grants_002.htmlhttp://cite.gov.pt/asstscite/downloads/publics/A_vida_masculino.pdf

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livro identifica e analisa formas plurais de ser cnjuge e pai, no entrecruza-mento de velhas e novas masculinidades.

Aboim. S. e Vasconcelos, P. (2012) REPORT: Study on the Role of Men in Gender Equality in Portugal, European Union Programme for Employment and Social Solidarity - PROGRESS (2007-2013), Lisboa: ICS7, este Relatrio identifica e analisa o envolvimento dos homens em questes de igualdade de gnero, em Portugal, tanto na esfera pblica como na esfera privada. F-lo atravs da anlise das prticas sociais dos homens, bem como das polticas pblicas em diferentes esferas da vida social, recorrendo a dados qualitativos e quantitativos. A situao das mulheres e a realidade global de gnero no pas tambm objeto de anlise.

Seleo de Projetos e Campanhas em Portugal

Tm sido desenvolvidos vrios projetos e campanhas em Portugal com o obje-tivo de sensibilizar e consciencializar pais, sociedade civil, entidades emprega-doras e grupos profissionais especficos sobre a importncia de uma paternidade envolvida, cuidadora e positiva na vida de todos e de todas.

Pap d licena? Por uma Parentalidade Partilhada

O projeto Pap d licena? Por uma Parentalidade Partilhada foi lanado pelo GRAAL Movimento Internacional de Mulheres - e visou promover a participao dos homens no cuidado dos filhos/as, bem como incentiv-los a gozar as suas licenas parentais. O projeto tinha por base o entendimento de que a redistribuio equilibrada das atividades de cuidado dos/as descenden-tes estratgica na conciliao da vida profissional com a pessoal, conduzindo a uma maior interveno das mulheres na esfera pblica e corrigindo assim assimetrias no acesso ao poder, aos recursos e realizao profissional. 8

7 Disponvel aqui.8 Fonte: GRAAL, Pap d Licena?, disponvel aqui.

http://www.%20ics.ul.pt/publicacoes/workingpapers/wp2012/er2012_3.pdfhttp://graal.org.pt/projecto.php%3Fid%3D9

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Especificamente, foram objetivos do projeto:

Promover a utilizao das licenas parentais por parte dos homens;

Valorizar a paternidade e o favorecimento de ruturas com modelos tradicio-nais de masculinidade e paternidade;

Reduzir a presso social, laboral e econmica exercida sobre os homens para que estes no utilizem as licenas parentais;

Reduzir as assimetrias na participao de mulheres e homens na esfera pri-vada, criando condies favorveis participao e realizao das mulheres na esfera pblica; e, finalmente, aprofundamento a capacidade de interveno do Graal junto de pblicos masculinos.

O projeto desenvolveu diferentes atividades, nomeadamente: o levantamento e sistematizao de perspetivas e experincias de diferentes atores sobre a uti-lizao da licena parental por parte dos homens; a conceo de instrumentos de sensibilizao (brochura, filme e folhetos) para a promoo da participao masculina nos cuidados das crianas e para a utilizao das licenas parentais por parte dos homens; encontros de sensibilizao com pblicos estratgicos, tais como homens e mulheres que tenham ou planeiem ter bebs, profissionais de sade que com eles contactem e empregadores; e a divulgao dos instru-mentos de sensibilizao junto de pblicos estratgicos, de organizaes-cha-ve e da populao em geral.

Desenvolvido entre Junho de 2011 e Abril de 2013, com o apoio do QREN/POPH/CIG, Medida 7.3, o projecto conta com diversos materiais publicados entre os quais: Manual Quantos Passos?9; Folheto para pais10; Folheto para entidades empregadoras11; Folheto para profissionais de sade12.

Ilustrao 7 - Pap d licena

9 Manual Quantos Passos, disponvel aqui. 10 Folheto para pais, disponvel aqui.11 Folheto para entidades empregadoras, disponvel aqui.12 Folheto para profissionais de sade, disponvel aqui.

dhttp://www.cm-vagos.pt/files/3/documentos/20130808142859312722.pdf%20http://www.graal.org.pt//files/1_pais.pdfhttp://www.graal.org.pt//files/2_empregadores.pdfhttp://www.graal.org.pt//files/3_profiss_saude.pdf

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Campanha MenCare em Portugal: EU SOU PAI

Eu sou pai faz parte da campanha global MenCare, destinada a promover relaes equitativas e no violentas entre homens, mulheres e crianas. Ba-seia-se no pressuposto de que a participao dos homens no trabalho doms-tico, na sade materna e no cuidado das crianas um aspeto no apenas necessrio como tambm indispensvel, ainda que largamente ignorado pela luta em prol da igualdade de gnero.

A campanha utiliza mensagens mediticas que captam o valor emocional da transformao de gnero de homens de simplesmente provedores a homens comprometidos com atitudes equitativas de gnero, pais e cuidadores no vio-lentos. Procura ainda contribuir para mudar a forma como o setor de sade envolve os homens na sade materno-infantil.

Dados do estudo IMAGES demonstram que 78 a 92% dos homens relataram que tinham estado presentes em pelo menos uma consulta pr-natal antes do nascimento do seu filho mais novo. Esta constitui uma oportunidade enorme porm ainda negligenciada para aumentar a participao dos homens na sade materna e infantil e prevenir a violncia contra as mulheres e crianas.

Especificamente, a Campanha Eu Sou Pai pretende:

Envolver os homens desde o perodo pr-natal e no parto;

Aumentar a participao dos homens nas tarefas de cuidado;

Ilustrao 8 - Postal da Cam-panha MenCare em Portugal Eu sou Pai

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Promover ativamente os benefcios da paternidade envolvida;

Envolver os homens na sade da criana, incluindo a preveno da trans-misso do VIH das mes para os seus filhos;

Incentivar os homens a brincar com os seus filhos;

Envolver os homens como aliados da educao dos seus filhos;

Incentivar os homens a mostrar afeto pelos seus filhos;

Envolver os homens na preveno da violncia contra mulheres e crianas;

Percecionar os pais como aliados e modelos de desempenho de papis para a igualdade de gnero;

Incentivar pais a envolverem-se quando no vivem junto com o seu filho.

Em Portugal, a campanha Eu sou Pai arrancou dia 19 de Maro de 2015, Dia do Pai, liderada pelo Promundo-Europa e contando com vrios parceiros. O objetivo sensibilizar a populao em geral, assim como sectores-chave da sociedade portuguesa, para a importncia do envolvimento igualitrio e no-violento dos pais, ou outros homens com crianas a seu cargo, nas tarefas de cuidado, procurando ajudar a contribuir para um maior bem-estar familiar e uma crescente igualdade de gnero.

O Promundo-Europa est agora a desenvolver investigao para compreender a evoluo e o estado do envolvimento dos homens nas tarefas de cuidado em Portugal, procurando explorar as diferentes formas como a licena de paterni-dade e o papel dos pais homens enquanto cuidadores so afetados pelo atual contexto de stress econmico e financeiro causado pelas recentes medidas de austeridade implementadas pelo governo no pas. Para alm disso, coordena e implementa aes dirigidas a trs sectores e audincias especficas:

1. Comunidades: Procurando consciencializar o pblico sobre a importncia do envolvimento dos homens nas tarefas de cuidado atravs de uma cam-panha de media;

2. Sector da sade: Dando formao a profissionais do sector de sade sobre os benefcios da paternidade ativa e o cuidado (Programa P), em parceria com a Escola Superior de Enfermagem de Coimbra.

A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 23

3. Entidades empregadoras: Dirigindo-se a empregadores do sector pblico e privado com mensagens sobre os benefcios da licena de paternida-de para os seus trabalhadores e trabalhadoras, bem como para as suas empresas e instituies.

Entre os materiais da Campanha j disponveis em www.eusoupai.pt, conta-se uma coleo de postais onde cada postal (que pode tambm funcionar como marcador de livro) inclui uma ilustrao que desafia o senso comum sobre pa-ternidade e uma infografia com informaes teis sobre o tema.

www.eusoupai.pt

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ENVOLVIMENTO DOS PAIS NA SADE REPRODUTIVA E NA SADE MATERNO-INFANTIL

O envolvimento dos homens na sade sexual e reprodutiva e na sade ma-terno-infantil crucial para assegurar a sade e o bem-estar do homem, da mulher e da criana, bem como para garantir a igualdade de gnero. Porm, os homens so muitas vezes deixados de fora das intervenes, dos servios e das discusses polticas sobre o planeamento familiar e a contraceo. No entanto, e apesar disso, os homens continuam a ter um papel dominante na tomada de deciso em relao sade sexual e reprodutiva, incluindo vida sexual, tamanho da famlia, contraceo e acesso a servios de sade (Levtov et al., 2015; van der Berg, 2015).

2

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As gravidezes no desejadas como resultado da indisponibilidade de contra-cetivos acarretam um risco para a vida e o bem-estar de famlias em todo o mundo. As necessidades no satisfeitas em termos de contraceo so mais graves entre os setores mais vulnerveis da populao: adolescentes, pessoas de baixos rendimentos, pessoas que vivem em reas rurais e bairros marginais urbanos, pessoas com VIH e deslocados internos (OMS, 2014). A Assembleia Mundial de Sade em 2004 recomendou OMS e aos seus estados membros que estes devem garantir o acesso a informao e servios de contraceo, ao mesmo tempo que se fomentam e protegem os direitos reprodutivos (OMS, 2014). Menciona tambm que o aumento da disponibilidade de mtodos contracetivos modernos e seguros ofereceu maiores oportunidades de escolha para a tomada de deciso individual e responsvel relacionadas com a reproduo.

Os contracetivos so essenciais para ajudar as pessoas a gerirem a sua fertili-dade e permitir-lhes decidir se, quando e quantos filhos tero. Globalmente, o uso de contracetivos por parte de mulheres representa cerca de trs quartos do uso total de contracetivos, uma proporo que no se tem alterado muito nos ltimos vinte anos (UNDESA, 2013). Em 2011, e apesar do aumento de acesso a mtodos contracetivos modernos, aproximadamente 12% de mulhe-res entre os 15 e os 49 anos de idade - casadas ou numa unio de facto - e que queriam evitar uma gravidez no tiveram acesso ou no utlizavam um mtodo eficaz de contraceo (GHO, 2011).

A comunicao entre os casais e a tomada de deciso conjunta fundamental para uma contraceo efetiva e para o planeamento familiar. Os homens, no raras vezes e em muitos pases, controlam ou desempenham um papel domi-nante nos processos de deciso sobre sexo, tamanho da famlia, contraceo e acesso a servios de sade (Levtov et al, 2015). Muitas mulheres no podem tomar decises de planeamento familiar ou aceder a servios sem a permisso do seu companheiro masculino ou do apoio financeiro deste. Se os homens e os parceiros no sabem o suficiente sobre gravidez, se consideram que esse um assunto da responsabilidade das mulheres e/ou se dominam os processos de deciso sobre a vida sexual e o processo da gravidez, podero recusar que as suas esposas, parceiras, filhas ou irms usem mtodos contracetivos, vo a consultas mdicas, paguem servios de sade, paguem ou facilitem servios de transporte para o hospital, o que pode potencialmente conduzir a complica-es na gravidez ou mesmo morte da mulher (Ibidem).

Contracetivos

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Apesar dos homens estarem obviamente envolvidos na conceo, so muitas vezes deixados de fora em termos de interveno, polticas pblicas relativas ao planeamento familiar e contraceo.

Em Portugal, o homem quem tradicionalmente controla a tomada de deci-so nesta matria. Na verdade, at dcada de 1950 o controlo da conceo nos pases da Europa Ocidental (e at mais tarde em Portugal) era efetuado fundamentalmente pelos homens atravs do coito interrompido e do uso do preservativo. Esta prtica evidenciava no s a as relaes de poder na famlia e no casal que favoreciam a dominao masculina na vida reprodutiva, mas tambm a incipiente oferta contracetiva da poca. O preservativo era utili-zado mais como mtodo masculino profiltico para as infees sexualmente transmissveis, enquanto os mtodos femininos estavam reduzidos a mtodos abortivos (Mclaren, 1990 apud Almeida & Vilar, 2008). A partir dos anos 1960 e 1970 houve uma grande mudana nesta realidade: o uso dos con-tracetivos comeou a ser despenalizado e os servios de sade nacionais e as agncias internacionais reforaram as prticas dirigidas s mulheres enquanto utilizadoras da contraceo (Almeida & Vilar, 2008).

Em Portugal, esta rea foi designada data como Planeamento Familiar, man-tendo-se ainda hoje especialmente orientado para as mulheres em idade frtil. Neste contexto discursivo centrado nas mulheres, o envolvimento dos homens foi sendo entendido de uma forma reportada sade e s necessidades das mulheres, sobretudo no sentido de estes no criarem obstculos ao uso de contraceptivos femininos e, assim, colaborarem no planeamento familiar e na sade das suas parceiras (Almeida & Vilar, 2008).

A pouca existncia de documentos nacionais orientadores para as prticas dos profissionais de sade direcionados para a Sade dos Homens ou Sade Masculina evidenciam a falta de orientaes estratgicas ao nvel das pol-ticas de sade nesta rea. Na verdade, como refere Almeida & Vilar (2008), no tm sido implementadas campanhas para o envolvimento dos homens na contraceo por parte das entidades oficiais. Por vrios motivos, verificou-se assim, um desenvolvimento da contraceo feminina em detrimento da con-traceo masculina. As normas e as polticas de gnero continuam implcita ou explicitamente a colocar a responsabilidade da reproduo e da fertilidade na mulher. Vrios estudos comprovam uma maior utilizao dos contracetivos femininos; um ligeiro aumento no uso do preservativo; uma prtica de vasec-tomia quase inexistente; ao passo que o coito interrompido ocupa o ltimo lu-gar da escala de utilizao de mtodos contracetivos (Almeida & Vilar, 2008).

A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 27

Dados mais recentes sobre Portugal mostram uma distribuio da responsabili-dade da contracepo tendencialmente mais equitativa (Gomes & Nunes, 2011).

Do mesmo modo, um estudo internacional (Currie et al., 2012) que inclui da-dos de Portugal com jovens de 15 anos encontrou maiores taxas de prevaln-cia de uso do preservativo na ltima relao sexual com valores prximos nos rapazes (84%) relativamente s raparigas (80%).Tambm houve estudos de variao internacional verificando-se que Portugal apresentava uma das taxas mais altas de utilizao do preservativo, ainda assim com maior percentual para as raparigas relativamente aos rapazes. Estes valores diminuem quando questionados sobre a utilizao da plula na ltima relao, com 33% e 18%, respectivamente, para raparigas e rapazes.

Ainda que as normas de gnero continuem a colocar a tnica da responsabili-dade da contraceo na mulher, as polticas pblicas tm tentado tambm de- safiar os homens a envolverem-se no planeamento familiar. Em Portugal, os contracetivos so disponibilizados gratuitamente nos centros de sade13 e nos hospitais pblicos. Ainda que de uma forma meramente emprica, devido carncia de estudos que permitam compreender qual a utilizao destes servi-os pelos homens, estima-se que a utilizao deste servio seja feita em maior percentagem pelas mulheres. Os homens recorrem em situaes pontuais com propsitos especficos. Fazem-nos tambm habitualmente como intermedi-rios da companheira e, por regra, solicitam contracetivos femininos (plula) em nome da parceira. tambm importante notar que os homens com no-es tradicionais do que significa ser homem so mais propensos a ter sexo no protegido e contrair doenas sexualmente transmissveis (Johnson, 2009; Noar & Morokoff, 2002), evidenciando, tambm nesta matria, a necessidade do trabalho de fundo no desafio masculinidade hegemnica.

13 No caso dos centros de sade em Portugal, a disponibilizao gratuita de preservativos depende do comparecimento a uma consulta de vigilncia anual e a anlises de rotina anuais.

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Os homens tm tradicionalmente uma influncia forte (directa ou indirecta) nas decises e na capacidade das mulheres em decidir abortar ou no abortar. Em al-guns pases, as mulheres precisam da autorizao dos seus maridos, companhei-ros ou pais (e no raras vezes do apoio financeiro destes) para tomarem decises relacionadas com a sua sade reprodutiva e sexual, inclundo a de abortar ou no abortar, e para terem acesso realizao de um aborto em segurana.

Desde 1994, aquando da Conferncia Internacional sobre Populao e Desen-volvimento no Cairo, o aborto14 tem sido reconhecido mundialmente como um problema de sade pblica. Esse reconhecimento est associado s consequn-cias fsicas e emocionais que o aborto acarreta, podendo levar a sequelas irrever-sveis e at mesmo morte das mulheres que realizam um aborto (NU, 1995).

Segundo a Organizao Mundial de Sade, as gravidezes indesejadas e os abor-tos induzidos ocorrem em todas as sociedades por diferentes motivos. Entre os quais, destaca: falha de mtodos contraceptivos; uso incorrecto ou de forma inconsistente dos diferentes mtodos contraceptivos; oposio ou limitao por parte dos homens face ao uso de contraceptivos pelas companheiras; resultado de sexo forado / violaes; razes de sade; a prpria gravidez planeada quan-do se torna indesejada pela mudana de circunstncias. Uma educao sexual abrangente, adequada a cada idade, fundamentada e de carter no preconcei-tuoso, associada a servios de planeamento familiar de qualidade e o acesso contraceo, contribuem para evitar a gravidez no planeada e indesejada, reduzindo consequentemente a necessidade de um aborto (OMS, 2012). pois necessrio prestar ateno no s interrupo da gravidez indesejada, mas tambm, e especialmente, sua preveno, devendo as mulheres e os homens partilhar equitativamente as responsabilidades nesta matria. Do mesmo modo, muito importante que todas as mulheres tenham condies para poder realizar um aborto seguro (Ibidem).

De forma a apoiar as escolhas reprodutivas das mulheres, necessrio envolver mais os homens no uso de contracetivos e nos processos de deciso no sentido de que cada vez mais homens apoiem as decises das suas esposas ou parceiras de interromper uma gravidez e as ajudem a aceder a servios de aborto e de ps-aborto. O envolvimento dos homens importante porque a sua presena envolvida, solidria e no-violenta contribui para melhores resultados de sade para a mulher (Levtov et al, 2015).

14 O aborto consiste na interrupo de uma gravidez (IG) com menos de 20-22 semanas de gestao. O aborto pode ser espontneo - devido a uma ocorrncia acidental ou natural ou induzido - procedimento voluntrio usado para interromper uma gravidez, devido a causas mdicas (maternas e/ou fetais) ou por vontade da mulher, denominada interrupo volun-tria da gravidez (IVG).

Aborto

A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 29

Quase metade das gravidezes indesejadas terminam em aborto, de acordo com uma estimativa recente, embora haja variaes regionais substanciais, de me-nos de um quarto da frica Austral a trs quartos no Leste da sia e Europa de Leste (Sedgh, 2014). O objectivo global deveria ser que todas as gestaes sejam previstas e que homens e mulheres estejam igualmente envolvidos na deciso de engravidar e ter um filho. (Levtov et al, 2015). No surpreendente-mente, os pais tendem a ser mais envolvidos na vida dos filhos que planearam ter, com benefcios subsequentes duradouros para as crianas (Bronte-Tinkew et al., 2007; Cabrera et al., 2009).

Os abortos inseguros so uma importante causa de morbidez e mortalidade materna conduzindo morte cerca de 47 mil mulheres a cada ano (Holmes et al, 2012). O acesso a servios de aborto e ps-aborto seguro devem ser uma parte integrante e contnua de cuidados de sade em que se incluem a sade reprodutiva, materna, neonatal e infantil. No entanto, em 66 pases o aborto proibido ou permitido apenas para salvar a vida de uma mulher, e noutros pa-ses onde o aborto legal h muitas restries em torno do seu acesso (CRR, 2014). Estas restries, juntamente com o estigma, a falta de competncias por parte dos profissionais de sade, e outras barreiras, fazem com que o abor-to seja inacessvel para muitas mulheres - especialmente as mulheres margi-nalizadas, incluindo as que vivem na pobreza, que vivem em reas rurais, e as mulheres jovens.

Em Portugal, os direitos sexuais e reprodutivos, reconhecidos pelo estado Por-tugus, incluem o direito ao aborto seguro. No estando desligado do acesso ao planeamento familiar direito reconhecido a todos os cidados e cidads portuguesas desde 1976 - a interrupo voluntria da gravidez (IVG) at s 10 semanas de gestao a pedido da mulher foi criminalizada at 1984. Desde essa data, a lei portuguesa tem incorporado critrios que excluem a ilicitude do aborto. A lei n 6/84 veio permitir a interrupo voluntria da gravidez em casos de perigo de vida da mulher, perigo de leso grave e duradoura para a sade fsica e psquica da mulher, em casos de malformao fetal ou quando a gravidez resultasse de uma violao. Com a lei n. 90/97 houve um alargamento do prazo para interrupo em casos de malformao fetal e em situaes de crime contra a liberdade e autodeterminao sexual da mu-lher. Apenas em 2007 e aps um referendo nacional, foi excluda a ilicitude de casos de interrupo voluntria da gravidez (lei n 16/2007, 17 de abril), passando a ser possvel a realizao de interrupes de gravidez a pedido das mulheres at s 10 semanas, em estabelecimentos de sade oficiais ou oficial-mente reconhecidos.

30 | A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal

De acordo com a legislao atual (artigo 142 do Cdigo Penal) podem ser realizadas interrupes de gravidez por cinco motivos de excluso de ilici-tude de aborto: caso constitua o nico meio de remover perigo de morte ou de grave e irreversvel leso para o corpo ou para a sade fsica ou psquica da mulher grvida; caso se mostre indicado para evitar perigo de morte ou de grave e duradoura leso para o corpo ou para a sade fsica ou psquica da mulher grvida, e seja realizada nas primeiras 12 semanas de gravidez; caso haja motivos seguros para prever que o nascituro venha a sofrer, de forma incurvel, de grave doena ou malformao congnita, e for reali-zada nas primeiras 24 semanas de gravidez, excecionando-se as situaes de fetos inviveis, caso em que a interrupo poder ser praticada a todo o tempo; caso a gravidez tenha resultado de crime contra a liberdade e auto-determinao sexual e a interrupo for realizada nas primeiras 16 semanas de gravidez; ou por opo da mulher, nas primeiras 10 semanas de gravidez.

De acordo com os ltimos dados divulgados pela DGS, em 2014 foram rea-lizadas 16589 interrupes de gravidez ao abrigo do artigo 142 do Cdigo Penal. Tal como j tinha acontecido em anos anteriores, as IG por opo da mulher nas primeiras 10 semanas constituem cerca de 97% do total das in-terrupes realizadas. O segundo motivo mais frequente de IG foi a grave doena ou malformao congnita do nascituro, com 432 registos (2,6%). Verifica-se que 70,7% das IG foram realizadas no Servio Nacional de Sa-de, o que correspondeu a um aumento de 1% relativamente a 2013. Cerca de 63,8% de todos os motivos de IG ocorrem em mulheres com idades compreendidas entre os 20 e os 34 anos, continuando a ser o grupo etrio dos 20-24 aquele em que foram realizadas mais interrupes da gravidez por todos os motivos (22,44%). Dos 15-19 anos verificaram-se 10,56% do total de IG, o que continua a revelar uma tendncia decrescente. No que se refere situao profissional, a categoria das mulheres desempregadas foi a dominante (21,6%), continuando-se a verificar uma diminuio das estudantes (17,1%), relativamente ao ano de 2013. Quanto ao grau de instruo, 37,9% das mulheres tinham o ensino secundrio, 27,5% o 3 ciclo do ensino bsico, 21,4% o ensino superior e 9,8% o 2 ciclo do ensi-no bsico. Da totalidade de mulheres que realizaram IG nas primeiras 10 semanas, 52,1% no vivia em regime de coabitao com o pai da criana. A situao laboral do companheiro era desconhecida em 34,9% dos casos. No que se refere atividade profissional do companheiro, a classe laboral mais representada a dos agricultores, operrios, artfices e outros trabalhado-res qualificados (18,2% em 2014 e 17,3% em 2013). O grupo Desempre-gado diminuiu relativamente ao ano anterior (12,1% em 2013 e 10,6% em 2013) (DGS, 2015a).

A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 31

No que se refere histria de IVG, das mulheres que efetuaram uma IG em 2014, 71,1% nunca tinham realizado anteriormente uma interrupo, 21,9 % tinham realizado uma, 5,1 % tinham realizado duas e 1,9% j tinham reali-zado trs ou mais no decorrer da sua idade frtil (independentemente da data de realizao). Relativamente ao nmero de filhos, 51,2% das mulheres que efetuaram uma IG nas primeiras 10 semanas de gestao, por opo, referiram ter 1 a 2 filhos e 41,1% no tinham filhos. Estes dados so muito semelhantes aos verificados em anos anteriores (DGS, 2015b).

Nas IG realizadas em instituies do sistema nacional de sade, 54,5% decor-reu de acesso direto das mulheres consulta hospitalar (iniciativa prpria), 34,65% tiveram uma referenciao prvia dos cuidados de sade primrios (encaminhamento do centro de sade) e 4,3% decorreu de encaminhamento de outras unidades hospitalares pblicas. Em relao a 2013, mantem-se a ten-dncia de aumento do nmero de mulheres que recorreram consulta de IG por iniciativa prpria. Aps a realizao da IG por opo, 38,2% dessas mulheres escolheu um mtodo contracetivo de longa durao (dispositivo intrauterino; implante contracetivo ou laqueao de trompas). A percentagem de utilizao de contraceo ps IG por opo da mulher varia entre 94-97% (DGS, 2015c).

Desde 2012 regista-se uma diminuio quer em nmeros absolutos de IVG, quer no nmero por 1000 nados-vivos em Portugal. Estes dados permitem verificar que Portugal est abaixo da mdia verificada na Unio Europeia. A despenaliza-o da IVG permitiu tambm reduzir o nmero de mortes maternas relacionadas com o aborto: de 2001 a 2007 esto registadas 14 mortes maternas e de 2008 a 2012 apenas referida 1 morte materna (DGS, 2008; 2010a; 2010b; 2012).

Segundo Bombas (2014), no existem dados nacionais sobre o uso de contra-ceo das mulheres que solicitam IVG. Segundo a mesma autora, os vrios es-tudos realizados em diferentes unidades de cuidados referem que as gravidezes no desejadas esto relacionadas com o no uso de contraceo, a no adeso ao mtodo de contraceo e a m informao sobre a sua eficcia.

A rede de referncia materno-infantil pr-existente lei de 2007 serviu de base concretizao e articulao dos cuidados a prestar. Portugal soube tambm aproveitar a experincia cientfica acumulada com o protocolo de atuao me-dicamentosa para a prtica de aborto e est entre os pases que mais utiliza o mtodo medicamentoso na prtica da interrupo da gravidez.

A excluso da ilicitude da IVG reforou a importncia da contraceo e um maior empenhamento dos profissionais de sade no aconselhamento contrace-tivo. De acordo com a legislao e com as normas da DGS, a realizao de um

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aborto uma oportunidade para aconselhar e promover o planeamento familiar e os servios autorizados para a prtica do aborto devem ter disponveis todos os mtodos de contraceo (DGS, 2008).

Como j se referiu, e de acordo com a Lei n 16/2007, a IVG a pedido da mu-lher pode ser realizada nos Hospitais Pblicos, em alguns (poucos) Centros de Sade e ainda em Clnicas Privadas devidamente reconhecidas pelas entidades competentes. A mulher pode aceder diretamente instituio ou ser encaminha-da por outros servios de sade, solicitando uma consulta de IVG. O processo desenvolve-se em trs etapas: A - inicia-se com a chamada consulta prvia. O perodo entre a marcao e a realizao da consulta prvia no pode exceder 5 dias e a mulher pode estar sozinha ou escolher algum para a acompanhar na consulta. uma consulta de carcter obrigatrio, onde o profissional de sade deve esclarecer todas as dvidas da mulher e fornecer a informao necessria tendo em vista uma tomada de deciso livre, informada e responsvel. entre-gue mulher o impresso do consentimento livre e esclarecido que dever ser lido, assinado e entregue na consulta at data de realizao da IVG. No caso das mulheres menores de 16 anos ou mulheres psiquicamente incapazes, o con-sentimento livre e esclarecido dever ser assinado pelo seu representante legal (pai, me ou tutor). No final da consulta prvia marcada a segunda consulta, para a realizao da IVG. A consulta tambm utilizada para o esclarecimento sobre os mtodos contracetivos; B realizao da IVG, sendo obrigatrio um perodo de reflexo mnimo de 3 dias, entre a consulta prvia durante o qual a mulher pode solicitar apoio psicolgico/aconselhamento ou apoio social. Este perodo poder ser mais longo se a mulher assim o desejar. A IVG realizada, no dia marcado, por um dos mtodos previstos: cirrgico ou medicamentoso. Na grande maioria das vezes o aborto, quer cirrgico quer medicamentoso, realizado em ambulatrio, sem necessidade de internamento; C consulta de controlo ou de follow-up, que dever ser realizada entre 2 a 3 semanas que fundamental para se poder confirmar se a IVG foi bem sucedida. As consultas

de interrupo de gravidez so, por imposio legal, realiza-das apenas por profissionais no objetores de conscincia (APF 2016a; 2016b).

No encontramos dados disponveis sobre a participao dos ho-mens em todo o processo de IVG, em Portugal. Por isso, no po-demos apresentar resultados de como vivem e que participao tm em todo este processo. Por conversas informais com os pro-fissionais que participam em algumas instituies e unidades de cuidados em que se realizam IVG referido que muito pouco comum a presena dos homens. O nmero de interrupes vo-luntrias de gravidez legalmente efetuadas nos hospitais cresceu

Por conversas informais com os profissionais

que participam em algumas instituies e unidades de cuidados

em que se realizam IVG referido que muito

pouco comum a presena dos homens.

A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 33

entre 2002 e 2009, registando-se contudo, em 2010, um decrscimo de 3,7% relati-vamente ao ano anterior. A introduo da Lei 16/2007 de 17 de Abril provocou um aumento significativo no nmero de interrupes voluntrias de gravidez registadas. Assim, o nmero destes registos passou de 4 325 em 2007, para 17 277 em 2010 (INE, 2012).

Globalmente, aproximadamente 1 em cada 3 mulheres sofrem experincias de violncia durante a sua vida infligidas pelo seu parceiro masculino. Para alm disso, das crianas entre os 2 e os 14 anos em pases de baixo e mdio rendimento experienciam formas de castigo violento nas suas casas. A maior parte da violncia na casa cometida pelos homens, enquanto a violncia especificamente exercida contra as crianas perpetrada pelas mes, pelos pais e/ou por outros cuidadores. Apesar de a violncia contra a mulher e de a violncia contra a criana serem habitualmente abordadas como realidades distintas, elas partilham os mesmos fatores de risco e causas profundas (siste-mas de preveno e de resposta insuficientes; normas sobre gnero; ideia da violncia domstica ser um assunto de matria privada, relaes conflituosas, abuso de lcool, questes de sade mental) assim como os mesmos resultados danosos, ocorrendo tambm no raras vezes nos mesmos agregados familiares (Eckenrode et al, 2000; Archer, 2006; Hassan, 2012; Heise, 2011; Bott, 2012; Levtov et al, 2015).

Assim, Ribeiro (2012) afirma que na actualidade em Portugal, se o homem no tem o direito de rejeitar a paternidade, os princpios de igualdade e liberdade pessoal dos homens face procriao no esto assegurados. O autor critica a imposio de uma parentalidade no desejada, de imposio da paternidade a partir da verdade biolgica, o que poder no servir as pessoas envolvidas in-cluindo a prpria criana. Sem querer alterar o direito da mulher a abortar, mas mantendo igual direito ao homem, o autor defende que face a uma gravidez no planeada deve ser reconhecida ao homem o direito a decidir se quer ou no ser pai, ou seja a poder rejeitar os efeitos jurdicos da paternidade e da parentalida-de, com vista a diminuir a desigualdade existente. Esta investigao tem criado um acesso debate nos media e nas redes sociais.

34 | A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal

PATERNIDADE E VIOLNCIA CONTRA A MULHER

E AS CRIANAS

Globalmente, aproximadamente 1 em cada 3 mulheres sofrem experincias de violncia durante a sua vida infligidas pelo seu parceiro masculino. Para alm disso, das crianas entre 2 a 14 anos em pases de baixo e mdio rendimen-to experienciam formas de castigo violento nas suas casas. A maior parte da violncia na casa cometida pelos homens, enquanto a violncia contra as crianas essencialmente perpetrada pelas mes, pais e outros cuidadores. Apesar de a violncia contra a mulher e de a violncia contra a criana serem habitualmente abordadas como realidades distintas, elas partilham os mesmos fatores de risco e causas profundas (sistemas de preveno e de resposta insu-ficientes; normas sobre gnero; ideia da violncia domstica ser um assunto de matria privada, relaes conflituosas, abuso de lcool, questes de sade mental) e resultados danosos, ocorrendo tambm no raras vezes nos mesmos agregados (Eckenrode et al., 2000; Archer, 2006; Hassan, 2012; Heise, 2011; Bott, 2012; Levtov et al., 2015).

De entre os casos registados pela Associao Portuguesa de Apoio Vtima, em 2014 contaram-se 6774 mulheres e 992 casos de crianas e jovens vtimas de violncia. Entre estes casos, 11,6% das vtimas de violncia so filho ou filha do/a perpetrador/a (APAV, 2014); 12,1% das vtimas so o/a companheiro/a e 28,4% so o cnjuge. O perfil tpico da vtima registada pela APAV feminina (82,3%), idade entre os 25 e os 54 (37,1%), casada (39,4%), com filhos (39,4%), com ensino superior (7,6%), empregada (29,6%) e numa relao de conjuga-lidade (28,4%). Por seu lado, o perpetrador tipicamente do sexo masculino (81,9%), idade entre os 25 e os 54 anos (29,9%), casado (35,6%), empregado (31.7%).

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A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 35

Ilustrao 9- Principais situaes de perigo registadas na CNPCJR, comparao de 2009 a 2014.

A pesquisa IMAGES mostra que, quando comparados com homens que no presenciaram violncia durante a sua infncia, os homens que durante a sua infncia foram testemunhas de violncia dirigida contra as suas mes pelos respectivos parceiros masculinos tm maior probabilidade de cometer violn-cia fsica contra as suas parceiras em algum momento das suas vidas (Barker & Aguayo 2012). Por outro lado, o envolvimento solidrio e no-violento dos homens na prestao das tarefas de cuidados pode desafiar e reverter essas normas de gnero e romper com a reproduo intergeracional da violncia baseada no gnero.

Os homens constroem vnculos afetivos mais fortes com quem se preocupam, e ao cuidar de crianas esse vnculo potenciado. O envolvimento activo dos homens no cuidado tem um efeito positivo na socializao do gnero de me-ninas e meninos e faz com que as prprias crianas sejam mais abertas ao questionamento dos papis tradicionais de gnero. Por sua vez, as mulheres que tm os seus parceiros envolvidos nas tarefas de cuidado sentem-se mais apoiadas emocionalmente e menos stressadas do que as mulheres com parcei-ros ausentes ou no envolvidos. As crianas que tm pais afetuosos e solid-rios so mais propensas a estarem mais seguras e melhor protegidas contra a violncia, serem mais bem-sucedidas, e lidarem com as tenses da vida com mais facilidade do que aquelas que tm um pai ausente. O envolvimento de homens no cuidado tambm beneficia os prprios homens: aqueles que parti-cipam de forma mais equitativa no cuidado relatam uma melhor sade mental e fsica (REDMAS, Promundo e EME, 2013).

36 | A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal

15 Atravs de uma anlise da poltica de apoio e promoo da parentalidade da Xerox, bem como de entrevistas com a diretora de Recursos Humanos da Xerox Portugal Maria Alexandra Pires, e com a Assistente do Diretor Geral, da Diretora de RH e do Diretor Financeiro, Isabel Rijo Diogo. 16 A XEROX foi eleita uma das melhores empresas para trabalhar em Portugal pela Revista EXAME, em 2012, pelas suas medidas de apoio e promoo da Parentalidade no seio da empresa atravs de polticas como um ms extra de licena de parentalidade a juntar aos previstos por lei, um salrio adicional ao pai ou me, um subsdio de estudos de 630 por filho at aos 24 anos, aulas de ginstica ou natao gratuitas.17 Atravs de uma anlise da poltica de apoio e promoo da parentalidade da Xerox, bem como de entrevistas com a diretora de Recursos Humanos da Xerox Portugal Maria Alexandra Pires, e com a Assistente do Diretor Geral, da Diretora de RH e do Diretor Financeiro, Isabel Rijo Diogo.

Entre as principais razes pelas quais os homens no dividem equitativamente o trabalho domstico e de cuidado com as suas companheiras esto (Levtov et al., 2015):

As normas sociais e a socializao de gnero que refora a ideia de que o trabalho de cuidado um trabalho fundamentalmente feminino e que as de-cises em contexto familiar devem ser tomadas preferencialmente pelo homem em detrimento da mulher;

Polticas pblicas que reforam (implcita ou explicitamente; por declarao ou por omisso) a distribuio desigual do trabalho de cuidado entre homens e mulheres,

Repercusses no local de trabalho e na gesto dos papis de gnero na sociedade em geral de todas estas normas supramencionadas.

O local de trabalho desempenha, na realidade, um ponto fulcral no reconhe-cimento da necessidade de uma diviso igualitria das tarefas do cuidado e, fundamentalmente, da criao de oportunidades para se pr essa distribuio em prtica.

A XEROX15 Portugal considerada uma empresa de vanguarda no reconhe-cimento da importncia da parentalidade nas polticas e procedimentos inter-nos16. Com base num estudo sobre as polticas da XEROX Portugal17, apre-sentamos uma sntese, bem como a fundamentao do ponto de vista da gesto dos recursos humanos, das medidas implementadas.

BOAS PRTICAS DEENTIDADES PATRONAIS

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H algumas reas de negcio que mostram maior relutncia ao incentivo e apoio parentalidade, mas em todas as reas a tecnologia ajuda a flexibilizar os mtodos e os contextos de trabalho.

Maria Alexandra Pires, Diretora de Recursos Humanos da XEROX

Ilustrao 10- Nmero de homens

que foram pais en-quanto trabalhadores da Xerox/ nmero de pais trabalhadores da

Xerox que pediram licena de paterni-

dade no obrigatria.

A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 37

Exemplo de Boas Prticas: XEROX Portugal

A poltica de apoio parentalidade da XEROX assenta em dois pilares essenciais. Por um lado, em polticas internas de promoo da diversidade, da igualdade de gnero e do equilbrio entre tempo de trabalho e vida pessoal; por outro lado, na participao no frum da CITE, um espao de partilha comparativa e aprendizagem mtua entre empresas sobre igualdade de gnero no trabalho.

Tem duas grandes polticas:

Equilbrio entre tempo de trabalho e vida pessoal O principal objetivo proporcionar aos tra-balhadores e trabalhadoras uma experincia equilibrada de trabalho, vida pessoal e vida familiar para que estes e estas sintam que so respeitados e respeitadas em todas as suas dimenses, isto , na sua dimenso profissional, pessoal e familiar. Parte-se do pressuposto cientificamente compro-vado de que trabalhadores e trabalhadoras felizes vo trabalhar mais e criar um ambiente mais positivo em toda a empresa assim como nas diferentes dimenses da sua vida.

Diversidade - A diversidade de uma empresa vai muito alm da luta pela igualdade de gnero, ainda que esta seja uma componente crucial. A poltica da diversidade visa promover a diferena, qualquer que ela seja. Deste modo, a parentalidade dos pais de todas as raas, religies, orienta-es sexuais e com deficincias tambm promovida. Neste sentido, a Xerox tem uma poltica de tica de negcio, onde todos e todas tm de fazer uma formao obrigatria e assinar uma declara-o certificando que esto de acordo com a tica de negcio e que esto de acordo em manter essa tica no seu trabalho.

Faz parte do Frum da CITE

A Xerox faz benchmarking (em portugus, partilha comparativa e aprendizagem mtua) com as outras empresas que tambm integram este frum. Especificamente, a XEROX tenta no contexto deste frum e semelhana de outras empresas influenciar de uma forma pr-ativa outras empresas, tentando mostrar com base em rcios e nmeros que, efectivamente, ter este tipo de preocupaes com os trabalhadores e trabalhadoras s traz benefcios para as empresas. H tambm um trabalho de influenciar grupos parlamentares nesse sentido. Todos os anos, a XEROX e as restantes empresas que integram este frum, assumem um compromisso e a rea em que se quer fazer esse compromisso. Em 2015, o compromisso da XEROX era a rea da Parentalidade (fizeram workshops e criaram um pacote de benefcios dedicado ao apoio e promoo da parentalidade). No final de cada ano, o compromisso bem como as actividades, iniciativas e resultados subsequentes so avaliados e feito um relatrio. Este frum muito importante porque exige no s o estabelecimento de compromissos autopropostos, como relatrios onde as empresas prestam contas desses compromissos assumidos. A presena no frum com esta dinmica de avaliao comparativa, de aprendizagem mtua e de socializao e discusso de resultados contribui tambm as diferentes empresas estarem constantemente a pensar em formas de inovar e dinamizar polticas da empresa na rea da igualdade de gnero e da parentalidade.

38 | A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal

Exemplo de Boas Prticas: XEROX Portugal

Pacote de Apoio Parentalidade 2016

Complemento da licena parental at 90% do vencimento base bruto.

No ms de nascimento do beb a Xerox Portugal pagar mais 1 ms de salrio base mensal bruto.

Possibilidade de tirar o perodo de frias imediatamente a seguir Licena Parental - desde que o trabalhador ainda no o tenha gozado.

Apoio e incentivo aos pais para tirarem a licena faculta-tiva a seguir licena de paternidade obrigatria. Em 2016, os pais que tirarem a licena parental facultativa tero tam-bm um banco de 6 horas que podero utilizar no primeiro ano de vida do beb.

Pacote de boas vindas do beb Welcome Baby oferta de uma Box de Parentalidade que inclui informao sobre direitos da parentalidade e os benefcios especficos pelo nascimento do(a) beb e uma prenda especial.

O Departamento de Recursos Humanos disponibiliza in-formao especializada sobre infantrios, creches, escolas e outras informaes que sejam do interesse dos(as) trabalha-dores(as) e sobre as quais necessitem de esclarecimentos e/ou apoio especifico.

A Xerox disponibiliza tambm um subsdio de estudos anual, cabaz escolar e estgio no total de 630,00 para filhos/as, subindo para 1.950,00 no caso de filhos/as com necessidades especiais. Em alternativa ao pagamento do subsdio de estudos, os trabalhadores e trabalhadoras podem optar pelo respectivo subsdio em Cheque infncia ou Cheque ensino: Cheque Infncia, para pagamento de lactrios, berrios e jardim-de-infncia para filhos at aos 7 anos de idade; isento em sede de Segurana Social e IRS.

O Cheque Ensino engloba a definio de vale social para pagamento de despesas em escolas, instituies de ensino e manuais escolares, para filhos at aos 25 anos de idade (desde que ainda estudem e estejam a cargo dos pais), estando tambm isento em sede de Segurana Social e IRS. Este vale s pode ser reportado na declarao de rendimen-tos de apenas 1 dos pais (e no nos 2 no caso de optarem por declaraes de rendimentos em separado).

Um cabaz de material escolar aos melhores alunos do ano nos respetivos ciclos escolares - 1, 2 e 3 ciclo.

Para os alunos do ensino universitrio h tambm a pos-sibilidade de realizar um estgio de 3 meses na Xerox, para o filho ou filha que tiver a melhor nota de final de curso e dependente da aprovao da empresa.

Apoio aos filhos e/ou familiares diretos: o trabalhador ou a trabalhadora pode ausentar-se do seu local de trabalho para atender uma situao familiar urgente, sem necessidade de justificao formal com antecedncia e at 3 dias, tendo sem-pre o dever e a responsabilidade de informar a sua chefia dire-ta. Esta situao no tem impacto no seu vencimento base.

O trabalhador ou trabalhadora gerir o seu horrio de traba-lho (de acordo com a poltica de flexibilidade em vigor) para fazer face a alguma necessidade especial da sua vida privada (por exemplo, uma doena de um filho, filha e/ou familiar ou uma reunio na escola).

Liberta de trabalho a manh do 1 dia de escola para que os pais de crianas at aos 10 anos de idade (at ao 5 ano de escolaridade) possam acompanhar os seus filhos e filhas neste dia especial.

Usufruto de um protocolo especial com uma empresa com programas de preparao para o parto e de ginstica ps-parto.

Eu no posso obrigar ningum a tirar a licena de parentalidade, mas posso promov-la.

Maria Alexandra Pires, Diretora de Recursos Humanos da XEROX

A poltica de apoio e promoo da natalidade e da parentalidade visam proteger os trabalhadores e trabalhadoras como famlia. Todos os programas implementados so avaliados numa base anual atravs de medies e inquritos de satisfao.

A Situao da Paternidade Envolvida e No-Violenta em Portugal | 39

RECOMENDAES

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Recomendaes dirigidas a decisores e decisoras polticas, che-fias e prestadores e prestadoras de servios privados e pblicos.

1. Criar planos de ao nacionais e internacionais que promovam a pater-nidade envolvida e no-violenta e que faam homens e meninos parti-lhar com mulheres e meninas de forma igualitria as tarefas de cuidado e as tarefas domsticas. Estes planos nacionais e internacionais devem :

i. Ser transversais a diferentes reas temticas, nomeadamente igualda-de de gnero, direitos das crianas, sade, educ