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Aspectos clínicos da genética canina A revista internacional para o Médico Veterinário de animais de companhia VETERINARY • Como abordar... A síndrome gastrintestinal e das vias respiratórias superiores em cães braquicefálicos • Predisposição genética para reações adversas a medicamentos no cão • Rastreamento genético em cães • Interações entre nutrientes e genes: aplicação à nutrição e saúde dos animais de companhia • Aspectos genéticos da doença renal canina • Do lobo ao cão: diversidade fenotípica observável nas raças caninas

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Aspectosclínicos da

genéticacanina

A revista internacional para o Médico Veterinário de animais de companhia

VETERINARY

V

• Como abordar... A síndrome gastrintestinal e das vias respiratórias superiores em cães braquicefálicos • Predisposição genética para reações adversas a medicamentos no cão • Rastreamento genético em cães• Interações entre nutrientes e genes: aplicação à nutrição e saúde dos animais de companhia • Aspectosgenéticos da doença renal canina • Do lobo ao cão: diversidade fenotípica observável nas raças caninas

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A maior biblioteca «on-line» ao serviço do Médico Veterinário, com uma ampla ofertade livros científicos, resumos, manuais, calendário, anúncios classificados, entre outros.Acesso grátis e ilimitado a veterinários, estudantes e técnicos de Medicina Veterinária.

C O N H E C I M E N T O E R E S P E I T O

Temos o prazer de anunciar que a Veterinary Focus, revista publicada por Royal Canin,que reúne informação «State-of-the-Art» sobre medicina canina e felina, está disponí-vel em formato eletrônico no website IVIS.

Livros de Medicina de Animais de Companhia: Resumos de Medicina de Animais de Companhia:

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SUMÁRIO

Veterinary Focus, Vol 17 n° 2 - 2007

A Veterinary Focus é publicada em inglês, francês, alemão, chinês, holandês, italiano, polonês, português, espanhol,japonês, grego e russo.

Ilustração da capa: Bulldog Inglês

A revista internacional para o Médico Veterinário de animais de companhia

VETERINARY #17.22007 - 1 0 $ / 1 0€

Conhecimento e Respeito... As raças caninas no mundo p. 02Frank Haymann

Como abordar... A síndromegastrintestinale das vias respiratóriassuperioresem cães braquicefálicos p. 04Valérie Freiche e Cyrill Poncet

Predisposição genética para reações adversas a medicamentos no cão p. 11Margo Karriker

Rastreamento genético em cães p. 18Matthew Binns

Interações entre nutrientes e genes: aplicação à nutrição e saúde dos animais de companhia p. 25Brittany Vester e Kelly Swanson

Aspectos genéticos da doença renal canina p. 33Catherine Layssol, Yann Queau e Hervé Lefebvre

Ponto de vista Royal Canin... Raça: um parâmetro fundamental em nutrição canina p. 40Pascale Pibot

Do lobo ao cão: diversidade fenotípica observável nas raças caninas p. 45Bernard Denis

ALEMANHA ARGENTINA AUSTRÁLIA ÁUSTRIA BAHREIN BÉLGICA BRASIL CANADÁ CHINA CHIPRE COREIA CROÁCIA DINAMARCA EMIRADOS ÁRABES UNIDOS ESLOVÉNIA ESPANHA ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA ESTÓNIA FILIPINAS FINLÂNDIAFRANÇA GRÉCIA HOLANDA HONG-KONG HUNGRIA IRLANDA ISLÂNDIA ISRAEL ITÁLIA JAPÃO LETÓNIA LITUÂNIA MALTA MÉXICO NORUEGA NOVA ZELÂNDIA POLÓNIA PORTO RICO PORTUGAL REINO UNIDO REPÚBLICA CHECA REPÚBLICA DAÁFRICA DO SUL REPÚBLICA ESLOVACA ROMÉNIA RÚSSIA SINGAPURA SUÉCIA SUIÇA TAILÂNDIA TAIWAN TURQUIA

CONHECIMENTO E RESPEITO

Visite a biblioteca científica para uma selecção de artigosda Veterinary Focus

Consultores Editoriais• Drª Denise A. Elliott, BVSc(Hons), PhD, Dipl.ACVIM, Dipl. ACVN Comunicações Científicas,Royal Canin, EUA

• Drª Pascale Pibot, DVM, Diretora dePublicações Científicas, Royal Canin, França

• Drª Pauline Devlin, BSc, PhD, Diretora-Assistente Veterinária, Royal Canin, RU

• Drª Karyl Hurley, BSc, DVM, Dipl. ACVIM, Dipl.ECVIM-CA Assuntos Acadêmicos Globais,WALTHAM

Editor• Dr. Richard Harvey, PhD, BVSc, DVD, FIBiol, MRCVS

Secretário Editorial• Laurent [email protected]

• Ellinor GunnarssonIlustração• Youri Xerri

Tradução (Português)• Paula Cortes

Revisão editorial para outras línguas :• Drª Imke Engelke, DVM (Alemão)• Drª María Elena Fernández, DVM (Espanhol)• Drª Eva Ramalho, DVM (Português)• Drª Paola Oppia, DVM (Italiano)• Drª Margriet Bos, DVM (Holandês)• Prof. Dr. R. Moraillon, DVM (Francês)• Drª Wandréa de S. Mendes, DVM, MSc, DSc (Brasil)• Drª Luciana D. de Oliveira, DVM, MSc, DSc (Brasil)• Drª Ana Gabriela Valério, DVM (Brasil)

Publicado por: Buena Media Plus

PCA:Bernardo Gallitelli

Endereço:85, avenue Pierre Grenier92100 Boulogne – França

Telefone:+33 (0) 1 72 44 62 00

Impresso na União EuropeiaISSN 0965-4577Circulação: 100,000 cópiasDepósito legal: Junho 2007

Publicado por Aniwa S. A. S.

Impresso no Brasil por: Intergraf

©Eric Isselée

As autorizações de comercialização dos agentes terapêuticos para uso em animais de companhia variam muito mundialmente. Na ausência de uma licença específica, deve ser consideradaa publicação de um aviso de prevenção adequado, antes da administração de tais fármacos.

AGRADECIMENTOS: A ROYAL CANIN DO BRASIL AGRADECE O PROF. DR. FERNANDO BRETAS VIANA PELA PRECIOSA CONTRIBUIÇÃO NAREVISÃO DESTA EDIÇÃO DA REVISTA VETERINARY FOCUS.

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As raças caninas no mundopor Frank Haymann

Australian Stumpy Tail Cattle Dog

©iStockph

oto

Pastor Romeno Mioritic

©iStockph

oto

CONHECIMENTO E RESPEITO

Aseleção genealógicacanina remonta ao finaldo século XIX e representa,

na atualidade, mais de 30 geraçõesde reprodução seletiva. Em cadaano nascem e são registados maisde 3.5 milhões de cães de raça.

Os cães de raça nouniverso da populaçãocanina globalHoje em dia, os cães de raçaregistrados representam apenas5 a 6% da população caninamundial (Tabela 1).Atualmente cerca de 100 países sededicam à criação de cães de

raça, mas só 90% dos animaisnascidos são registrados, emapenas 25 países.

A Federação Cinológica Inter-national (FCI) coordena 83associações nacionais querepresentam mais de 2.500.000cães registrados anualmente. OJapanese Kennel Club constitui aorganização nacional maissignificativa, com mais de530.000 cães registrados. OAmerican Kennel Club (AKC) é afederação canina mais prolífica nomundo, com um registro anualsuperior a 900.000 cães.

Diversidade O número de raças reconhecidasnão é idêntico entre Federações.O Kennel Club do Reino Unidoreconhece 200 raças caninas,mas o pr imeiro lugar emtermos de diversidade é ocupadopela FCI, que reconhece 354 raçasdistintas, a última provenienteda Polônia, denominadaGonzcy Polski. O Pastor BrancoSuíço, o Australian Stumpy TailCattle Dog e Pastor RomenoMioritic também pertencem àsnovas raças reconhecidas.Apesar desta diversidade mais de50% dos nascimentos resultamde uma única classificação deraças. A Tabela 2 apresenta umdestaque dos países maisativos em reprodução canina.

NB O número de cães de raçatem crescido na populaçãocanina, que é relativamenteestável. As raças pequenas temevidenciado um aumento signifi-cativo de popularidade ao longoda última década. O fenômenocomeçou na Ásia e difundiu-se

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Pastor Branco Suíço

©iStockph

oto

País População canina (milhões) Cães de raça pura (% população total)Em todo o mundo 600 5,8

Alemanha 5,5 18,2Austrália 4 20Espanha 5,5 15,5Finlândia 0,5 80França 8,5 17,6

Grã Bretanha 6,9 36,2Índia 50 0,3

Tailândia 10 2EUA 58 22,4

por outros continentes, e deforma menos acentuada naEuropa. Provavelmente estatendência relaciona-se com acrescente urbanização da socie-dade e irá manter-se.

Tabela 2.As três raças mais populares em cada país

Tabela 1.População canina e cães de raça no mundo

PaísAustráliaÁustriaBélgicaBrasil

DinamarcaFinlândiaFrança

AlemanhaGrã Bretanha

HungriaItáliaJapãoNoruega

Nova ZelândiaHolandaPortugalEspanhaSuéciaTailândiaEUA

Raça n° 1Pastor AlemãoPastor AlemãoPastor AlemãoYorkshire Terrier

Retriever do LabradorPastor FinlandêsPastor AlemãoPastor Alemão

Retriever do LabradorRetriever do Labrador

Pastor AlemãoTeckel

Pastor AlemãoRetriever do LabradorRetriever do LabradorRetriever do Labrador

Yorkshire TerrierPastor AlemãoGolden Retriever

Retriever do Labrador

Raça n° 2Retriever do Labrador

Golden RetrieverPastor Belga

Retriever do LabradorPastor AlemãoElkhound

Golden RetrieverTeckel

Pastor AlemãoWest Highland Terrier

Setter InglêsChihuahuaElkhound

Pastor AlemãoPastor AlemãoRottweiler

Pastor AlemãoGolden Retriever

Shih TzuGolden Retriever

Raça n° 3Staffordshire Bull TerrierRetriever do Labrador

Golden RetrieverRottweiler

Golden RetrieverPastor Alemão

Retriever do LabradorBraco Alemão de Pelo Duro

Cocker Spaniel InglêsPastor AlemãoSpaniel Bretão

Shih TzuSetter Inglês

Golden RetrieverGolden RetrieverPastor AlemãoGolden Retriever

Retriever do LabradorRottweiler

Pastor Alemão

O prêmio “maturidade cinotécnica”, os países em que os cães de raça se encontram em maioria em termos da população canina, vai para ospaíses Escandinavos.

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COMO ABORDAR...

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IntroduçãoEm resultado da seleção genética realizada aolongo dos últimos 15 anos, a morfologia dos cãesbraquicefálicos (principalmente o BuldogueFrancês, o Buldogue Inglês, o Pug ou o BostonTerrier) evoluiu para faces achatadas, amplas ecurtas (1) (Figura 1). Além das má-formaçõesvertebrais e da dermatite das pregas cutâneas,esta evolução acentuou um determinado número dedesordens funcionais que, muitas vezes, osproprietários desses animais encaram como“normais”.

Podem ser de dois tipos:

De tipo respiratório• Sons respiratórios acentuados• Tolerância reduzida ao esforço ou ao calor• Cianose • Síncope

ou De tipo gastrintestinal• Regurgitação de saliva em situações de stress• Vômito frequente

Valérie Freiche, DVMClínica Alliance, Bordéus, FrançaValérie Freiche graduou-se na Escola Nacional de MedicinaVeterinária de Alfort - França, em 1988, onde foi interna eassistente no Departamento de Medicina até 1992. A Drª Freiche empreendeu a sua própria clínica na região deParis, e optou por se dedicar à gastrenterologia. Desde 1992,é responsável pelas consultas de gastrenterologia efibroscopia digestiva na Escola Nacional de MedicinaVeterinária de Alfort. Desempenha a mesma função clínicareferência, a clínica Frégis, em Arcueil. Em 2006, mudou-separa o sudoeste de França para trabalhar nessa mesma áreana clínica Alliance, outra referência. A Drª Valérie Freicheparticipa regularmente de conferências e cursos de pós-graduação em gastrenterologia.

Cyrill Poncet, DVM, Dipl. ECVS Clínica Frégis, Arcueil, FrançaO Dr. Poncet graduou-se na Escola Nacional de MedicinaVeterinária de Toulouse, em 1998, onde tambémespecializou-se em cirurgia (2001). Posteriormente, realizouinternato em cirurgia, na clínica Frégis, e obteve o diplomaeuropeu de cirurgia (ECVS - European College of Veterinary

A síndrome gastrintestinal edas vias respiratóriassuperiores em cãesbraquicefálicos

Surgeons). Atualmente, o Dr. Poncet é um dos sócios daclínica Frégis e especialista em cirurgia de tecidos moles.

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Embora os distúrbios respiratórios tenham sido objetode inúmeros estudos (2-5), a descrição e a análisedos distúrbios gastrintestinais (GI) crônicosassociadas a anomalias respiratórias é mais recente(6,7). Em estudo prospectivo, os autores destacaram aelevada incidência de distúrbios GI em animaisapresentados em consulta com obstrução do tratorespiratório superior, 97,2% nos 73 animais (nasequência de exame clínico e endoscópico). Foramfrequentemente observadas lesões inflamatórias noesôfago distal, no estômago ou no duodeno,podendo estar associadas a anomalias anatômicasou funcionais (ex.: atonia do cárdia, refluxogastroesofágico, retenção gástrica, hiperplasia damucosa pilórica ou estenose pilórica) (8). O examehistológico conduzido em 51 destes animaisrevelou 98% de casos de gastrite crônica. Foiestabelecida correlação estatística entre agravidade dos sintomas clínicos gastrintestinais erespiratórios, evidenciando abordagempatofisiológica comum validada do ponto de vistaestatístico.

Realizou-se, posteriormente, estudo retrospectivodestes animais (7): através de exame e tratamentomédico sistemático das lesões esofágicas, gástricase duodenais, paralelamente a cirurgia corretiva dotrato respiratório superior.

Objetivos do estudo:• Avaliar, a médio prazo, as melhorias respiratóriasnos cães.

• Avaliar a evolução dos distúrbios gastrintes-tinais após intervenção cirúrgica para osproblemas respiratórios.

• Avaliar a utilidade de monitorização precoce dosdistúrbios GI e se o tratamento dos sintomasclínicos proporcionava melhores prognósticosem cães braquicefálicos.

Este artigo apresenta uma síntese de recentes estudossobre o diagnóstico e o tratamento médico dosdistúrbios do trato digestivo superior em cãesbraquicefálicos.

Avaliação clínica Quando o motivo da consulta for dificuldaderespiratória, intolerância ao esforço (ou calor) ousíncope, o histórico pode revelar a existência dedistúrbios GI digestivos associados.

Geralmente a consulta inicial é realizada aoprimeiro episódio de dispnéia, desencadeado poruma situação de estresse ou calor. Normalmente, osrelatos dos proprietários descrevem intolerância aoesforço por várias semanas ou meses anteriores àconsulta. Estes distúrbios respiratórios são denatureza inspiratória ou mista. Além disso, ossintomas GI estão frequentemente associados eincluem refluxo, ingestão frequente de grama,emese em caso de excitação ou brincadeiras,regurgitação de saliva ou vômito de alimentoparcialmente digerido após prolongadointervalo de tempo seguinte às refeições. Silmultaneamente, quando distúrbios GI são o

Figura 1.a. Buldogue Inglês macho com 18 meses de idade, com problemas respiratórios e regurgitação. b.Buldogue Francês macho com 14 meses de idade, com problemas digestivos crônicos. Note a estenose nasal bilateral.

a. b.

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motivo da consulta, é possível identificar desordensrespiratórias associadas. Cinco sinais fundamentais para avaliar a gravidadedos distúrbios respiratórios são:• Ronco• Esforço inspiratório• Dispnéia• Intolerância ao esforço ou ao estresse• Síncope

Três sintomas clínicos GI:• Ptialismo• Regurgitação• Vômito

A intensidade dos sinais clínicos pode ser classi-ficada como segue:1. mínimos, 2. moderados e 3. acentuados.

No estudo prospectivo realizado (6), apenas 6,6%dos 73 animais não evidenciaram sintomas dedistúrbios GI independentemente da razão daconsulta (desordens digestivas ou respiratóriasconstatadas pelos proprietários). 82% dos indivíduosforam classificados nos níveis 2 ou 3. Os primeirossinais digestivos ou respiratórios manifestaram-seantes dos seis meses em 67,2% dos casos.

Na prática, uma vez confirmada síndrome obstrutivado trato respiratório no decurso do exame clínico éaconselhável efetuar exame endoscópico (sobanestesia geral) do trato respiratório superior egastrintestinal, para avaliar as lesões em ambos ossistemas. A cirurgia corretiva do trato respiratóriosuperior (se indicada), é realizada sob a mesmaanestesia.

A radiografia do tórax está preconizada sempreque o exame pulmonar revelar anomalia ouquando a anamnese descrever tosse intensa ou

episódios de dispnéia severa. No BuldogueInglês é frequentemente constatada a presençade hipoplasia traqueal, o que agrava osdistúrbios respiratórios crônicos nestes cães(9,10).

Achados endoscópicos A anestesia de cães braquicefálicos requeratenção minuciosa e elevado nível de cuidadosdurante o tratamento. • Dieta líquida nas 24 horas anteriores à anestesiageral

• Pré-medicação com acepromazina (0,5mg/kg IM),dexametasona (0,2mg/kg IM) e metoclopramida(0,5mg/kg IM)

• Indução rápida da anestesia geral (tiopental 5-10mg/kg)

• Entubação do animal e manutenção da anestesiacom isoflurano misturado com 100% de oxigênio(11).

A primeira fase do exame é realizada com o animalem posição ventral, para facilitar o diagnóstico dasdesordens respiratórias:• Aspecto das narinas• Alongamento e hiperplasia do palato mole• Aspecto das amígdalas• Eversão dos ventrículos da laringe• Flacidez da cartilagem aritenóideia da laringe• Macroglossia (obstrução parcial ou total da faringenasal pela base da língua)

• Redução de movimentos temporomandibulares

Na segunda fase, em decúbito lateral esquerdo,podem ser diagnosticadas as principais lesões GI,distinguindo-se três tipos de anomalias em cadasegmento digestivo (esôfago, estômago, duodenosuperior): • Anomalias anatômicas: má-formações congê-nitas ou lesões adquiridas no trato GI superior(desvio esofágico, estenose pilórica, hérnia dehiato, etc.) (12)

• Anomalias funcionais decorrentes de alterações notrânsito GI (atonia do cárdia, refluxo duodeno-gástrico, etc.)

• Anomalias lesionais: lesões inflamatórias geral-mente secundárias às duas anomalias acimadescritas (esofagite, gastrite, etc.) (13)

O exame deverá incidir particularmente sobre osseguintes segmentos do trato digestivo superior e

COMO ABORDAR...

Figura 2.Endoscopia esofágica: o esôfago possui umcomprimento excessivo e não linear.

© Freiche

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sob seguintes aspectos: • Comprimento do esôfago (Figura 2)• Aspecto do esôfago distal e avaliação do cárdia• Aspecto da mucosa gástrica• Aspecto do antro pilórico e das pregas peripilóricas• Facilidade da passagem de endoscópio• Aspecto da mucosa duodenal

Biópsias do estômago e do duodeno devem serrealizadas para determinar a intensidade doinfiltrado inflamatório, ao final do examehistológico.

Intervenção cirúrgica e recuperaçãopós-operatória As anomalias respiratórias identificadas sãocorrigidas por cirurgia após endoscopia. Estasanomalias podem incluir:• Palatoplastia (14)• Ventriculectomia • Rinoplastia por excisão em cunha de uma seçãodo epitélio e da prega medial da cartilagem nasalinferior (15)

Em cães braquicefálicos, a recuperação pós opera-tória é bastante delicada e comporta riscos potenciais.Portanto, deverá decorrer com o mínimo deestímulos sonoros e luminosos. O tubo endotra-queal deve ser removido o mais tarde possível,preferencialmente quando o animal estiverprestes a conseguir erguer-se. A ocorrência dedificuldades respiratórias acentuadas durante afase pós-operatória podem requerer umatraqueostomia temporária (4,9% dos casos noestudo prospectivo) (16).

O animal deve ser mantido sob vigilância constante,no mínimo durante as 18 horas seguintes àintervenção cirúrgica. A monitorização durantea recuperação pode incluir: oxigenoterapiaatravés de entubação nasotraqueal, fisioterapiaadequada para favorecer a mobilização do mucorespiratório espessado (massagens repetidas emovimentos de percussão na caixa torácica) easpiração de algum flegmão.

O tratamento médico inclui dexametasona(0,2mg/kg IM) e metoclopramida (0,3mg/kgIM) 4 horas após a pré medicação. Se a fase pósoperatória for satisfatória, administra-se pro-gressivamente ao paciente pequenas porções de

alimento semi líquido. Não se verificandoquaisquer complicações, o animal recebe alta 24horas após a admissão.O tratamento cirúrgico, quando necessário, das anomalias

digestivas detectadas durante a gastroscopia (hérnia do

hiato ou estenose pilórica) nunca é efetuado simultanea-

mente a correção das anomalias respiratórias. Deverá ser

adiado por várias semanas, estabelecendo-se entretanto uma

terapia provisória com medicamentos.

Patologia macroscópica do trato GI eresultados histopatológicos A endoscopia do trato GI pode revelar uma ou muitasdas diversas anomalias identificadas durante o estudoprospectivo conduzido em 73 cães braquicefálicos(6):

Esôfago1. Desvio esofágico: anomalia relatada emestudo efetuado em Bulldogs Ingleses (17).Este desvio provoca a retenção de saliva eresíduos de alimentos, e pode explicar asalivação em animais em situações deexcitação.

2. Lesões inflamatórias e erosão distal podem serassociadas a um comprimento excessivo doesôfago (esôfago redundante) e/ou à inconti-nência do cárdia (abertura do cárdia durante ainalação, fenômeno que nunca observadoem outras raças durante a endoscopia) (Figura3).

A SÍNDROME GASTRINTESTINAL E DAS VIAS RESPIRATÓRIAS SUPERIORES EM CÃES BRAQUICEFÁLICOS

Figura 3.Endoscopia esofágica:a atonia do cárdia éuma característica doscães braquicefálicos.São observáveis sinaisde esofagite distalsecundária e presençade refluxo ácidocrônico.

© Freiche

Figura 4.Gastroscopia:espessamento dasdobras gástricas epresença de pontoseritematosos indicandodesenvolvimento deum tipo de gastritefolicular, comum emcães braquicefálicos.

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Estômago1. Presença de gastrite, frequentemente folicular:observa-se macroscopicamente pontilhadoeritematoso múltiplo, visível no corpogástrico mas também na zona antral deforma mais acentuada (Figura 4).

2. O piloro apresenta-se rodeado por pregasexcessivas da mucosa, o que pode dificultar apassagem do endoscópio até o duodenoproximal. Em alguns casos, embora o animaltenha sido submetido a jejum pré operatório, oestômago encontra-se repleto de suco gástricoou alimentos não digeridos, absorvidos até 18horas. Previamente estas últimas observaçõesindicam a presença de síndrome de retençãogástrica, provavelmente decorrente de razõesfuncionais ou anatômicas (Figura 5).

3. Em 7 animais do estudo anterior, não foi possívelproceder à exploração do duodeno durante oprocedimento endoscópico, devido a estenosepilórica ser tão grave que impediu a passagem doinstrumento. A obstrução era provocadausualmente por pregas hiperplásicas da mucosa,em contraste com o que se verifica em situaçõesde estenose pilórica real, em que a hipertrofiamuscular constitui a principal causa da redução

da abertura do piloro.

DuodenoFoi observada a presença de duodenite em 44%dos animais examinados no estudo prospectivo(39,5% dos animais examinados no estudoretrospectivo).

Macroscopicamente, observa-se uma coloraçãoheterogênea, aumento da granulação da mucosa easpecto eritematoso no duodeno proximal, complacas de Payer bastante visíveis e, por vezes,descoloridas (Figura 6).

Em estudo prospectivo, realizado em 51 animais, oexame histopatológico do estômago revelou gastritescrônicas difusas em 50 amostras (98%), com lesões debaixa intensidade em 13 casos (25,5%), lesõesmoderadas em 25 casos (49%) e graves em 12 casos(23,5%).

Realizaram-se biópsias duodenais em 43 animais.A principal lesão observada foi a linfoplasmocitose,que afetou 42 animais (97,7%). As lesões foram debaixa itensidade em 13 casos (30,9%), modera-das em 23 casos (54,8%) e graves em 6 casos(14,3%).

Tratamento e acompanhamento clínicoAdotou-se terapêutica padrão inicial diante dadetecção de lesões inflamatórias gastrintestinaisdurante a endoscopia, basicamente:• anti-ácido: normalmente inibidor da bomba deprótons, omeprazol (0,7mg/kg/dia, em doseúnica diária).

• agente procinético : cisaprida (0,2mg/kg, 3 vezesao dia) ou metoclopramida (0,5mg/kg, 2 vezesao dia, com monitorização da tolerância aofármaco)

Após obtenção dos resultados histológicos, o trata-mento pode ser adaptado individualmente. Otratamento pode ser estendido por maior período,com redução gradual. Outra possibilidade é asubstituição por outro tratamento mais específico,como nos casos:

Gastrite severa e/ou duodenite com fibrose parietal:tratamento para 3 meses

COMO ABORDAR...

Figura 6.Duodenoscopia quedestaca a presença deuma duodenite nãoespecífica ativa. Amucosa apresentaaspecto espessado.

Figura 5.Gastroscopia de umBulldog Francês de 2anos, apresentado àconsulta devido avômito frequente. A região em redor dopiloro evidencia umespessamentoanômalo e umdiâmetro muitoreduzido.

© Freiche

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Page 11: A revista internacional para o Médico Veterinário de ...conteudo.royalcanin.com.br/upload/FOCUS 17.2.pdf · superior a 900.000 cães. Diversidade O número de raças reconhecidas

Vol 17 No 2 / / 2007 / / Veterinary Focus / / 9

• inibidor da bomba de prótons (omeprazol:0,7mg/kg/dia, 1 vez por dia)

• procinético • tratamento tópico local com solução à base defosfato de aluminio

• prednisolona (0,5mg/kg/dia, 2 vezes por dia,com redução gradual das quantidades)

Gastrite moderada a severa, sem fibrose e/ou duo-denite acentuada: tratamento para 3 meses• Idêntico ao tratamento para gastrite severa, massem corticosteróides

Esofagite distal: terapia para 15 dias, seguida pelotratamento da gastrite associada • procinético • inibidor da bomba de prótons• sucralfato (1g por dia, por via oral 2 vezes pordia, em jejum)

• sais de magnésio (1mL/kg, 3 vezes por dia, apósas refeições)

• fosfato de alumínio: 1mL/kg, 3 vezes por dia,por via oral, fora do período das refeições)

É aconselhável realizar uma endoscopia de rotinaapós 6 meses ou menos, caso não se observemelhoria.

Também se preconizam algumas medidas dietéticas:controle da quantidade, alimentoshiperdigeríveis ou hipoalergênicos para casosespecíficos.

Acompanhamento clínico e avaliaçãoa curto prazoFoi possível realizar o acompanhamento dos animaisem 51 dos 61 casos (83,6%).

Em relação aos distúrbios respiratórios: éesperada melhoria dos sinais clínicos em 90%dos animais nas semanas posteriores à cirurgia.Melhorias imediatas foram observadas em 60%dos cães.

Em relação aos distúrbios digestivos: melhoriasem cerca de 80% são esperadas como resultadoà medicação, Foram observadas aproximada-mente de 60% dos cães com melhorias noperíodo de 15 dias.

Acompanhamento clínico e avaliaçãoa longo prazoApós um período mínimo de acompanhamento de6 meses, as melhorias dos distúrbios respiratóriosabordados no estudo foram consideradasexcelentes em 34 casos (66,7%), boas em 11(21,6%) e inexistentes em 2 (3,9%). Deterio-rações foram evidenciadas em 4 casos (7,8%).

Em relação aos sintomas GI, dos 47 casos comsinais clínicos de distúrbios digestivos na fase deadmissão, as melhorias foram classificadas excelentesem 34 (72,3%), boas em 9 (19,1%) e inexistentes em2 casos (4,3%). Deteriorações foram evidenciadasem 2 casos (4,3%). Os 4 casos sem sinais dedistúrbios gástricos antes da intervenção,também não evidenciaram desordens durante operíodo de acompanhamento.

Nos estudos retrospectivos realizados, foi observadamelhoria significativa dos distúrbios digestivos com oprotocolo terapêutico e cirúrgico estabelecido,graças ao qual mais de 80% dos animaisapresentaram poucas ou nenhuma desordem GIapós o período de acompanhamento. As melhoriasforam rápidas e duradouras. Os resultadosconfirmam as hipóteses estabelecidas durante oestudo prospectivo (6), segundo as quais existeminterações estreitas entre a sintomatologia dosdistúrbios respiratórios e dos distúrbios digestivos; eque o tratamento cirúrgico do trato respiratóriosuperior contribui de forma considerável para amelhoria digestiva em cães braquicefálicos. Estahipótese é reforçada pelo fato de também seobservarem melhorias digestivas em animais nãosubmetidos a qualquer tratamento terapêuticodurante o período pós operatório. Adicionalmente,em geral, não foram observadas recorrências dosdistúrbios digestivos com a interrupção do tratamento.

Melhoria macroscópica emicroscópica das lesões digestivasFoi observada melhora das lesões inflamatórias dotrato digestivo superior macroscópico, emicroscopicomente. Dos 10 casos em que foipossível a realização de endoscopia GI, todosdemonstraram melhorias ou desaparecimentomacroscópico das lesões inflamatórias do tratodigestivo, mesmo nos animais em que a princípio

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observou-se recorrência ou persistência dos distúrbiosdigestivos. Apesar de serem ainda visíveis máformações, a correção cirúrgica do trato respiratóriosuperior e a aplicação de tratamento durante asprimeiras semanas do período pós operatóriopermitiram reduzir ou eliminar as desordensfuncionais do trato digestivo.

Complicações pós-operatórias As principais complicações descritas foram vômitoe pneumonia por aspiração (4,5,15). Outro estudo(5) relatou 10/118 casos de pneumonia poraspiração (8,5%) diagnosticados no período pós-operatório, com 6 (5%) óbitos, no intervalo de36 horas após a cirurgia.

Um período mínimo de 24 horas de jejum antes dacirurgia, uma pré medicação adequada, bemcomo a vigilância de quaisquer desordensdigestivas concorrentes, limitam as complicaçõespós operatórias. Tratam-se de recomendaçõescitadas na literatura em diversas ocasiões. Nopresente estudo não foram observados casos de

pneumonia por aspiração durante o período pós-operatório. Ao nosso ver, o tratamento sistemáticodas desordens digestivas pode ajudar a reduzir estascomplicações, frequentemente fatais, durante operíodo pós operatório.

ConclusãoEstes dados demonstram que a anamnese clínica doscães braquicefálicos deve incluir abordagem globaldos distúrbios respiratórios, bem como dosdistúrbios do trato digestivo superior (movimentosde mastigação, ptialismo, vômitos ou regurgitação),ainda que não se constituam reclamações doproprietário. Atualmente, já é um fato comprovadoque a correção cirúrgica precoce dos distúrbiosrespiratórios produz melhorias rápidas nosdistúrbios digestivos. O tratamento de suporte dasanomalias digestivas também melhora a sintomato-logia respiratória dos animais em fase pós operatória.

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IntroduçãoA farmacoterapia tem como objetivo a maximizaçãodo efeito terapêutico e, por outro lado, minimizar asreações adversas e interações medicamentosas, o quenão é simples. Pacientes complexos, processospatológicos variáveis e medicações elaboradascomplicam a maioria dos cenários clínicos. Muitasvezes, nem todo o cuidado do mundo é suficiente paraconseguir prever, evitar e gerir reações adversasaos medicamentos.

Há muito tempo se observam relações de reaçõesmedicamentosas, com a raça, a idade, a influência

ambiental e outros fatores. Entretamto nunca foipossível mapear geneticamente esses eventos ouassociá-las, de forma inequívoca, a ponto dogenoma.

Nos últimos anos, os estudos têm-se focadosobretudo na base genética das interações farma-cocinéticas (absorção, distribuição, metabolismo,excreção) e farmacodinâmicas (interações medi-camentosas com alvos, tais como os receptores e ostransmissores) dos fármacos no organismo. Estaárea de investigação foi denominada farmaco-

Predisposição genéticapara reações adversas amedicamentos no cão

Margo Karriker, PharmDPrograma de Nutrição Clínica WALTHAM UCVMC-SD, Centrode Medicina Veterinária da Universidade da Califórnia,San Diego, USAA Dra Karriker doutorou-se na Faculdade de Farmácia daUniversidade da Carolina do Norte, Chapel Hill, em 2003. Em2005 concluiu residência em Farmácia Clínica Veterinária, noHospital Universitário da Faculdade de Medicina Veterinária daUniversidade da Califórnia, Davis, ano em que também passou aexercer o cargo de Especialista WALTHAM, em Farmácia Clínica,no Programa de Nutrição Clínica WALTHAM UCVMC-SD, em SanDiego. A DraKarriker faz parte do corpo clínico da Faculdade deFarmácia da UC Skaggs San Diego e é farmacêutica de umaequipe federal de Assistência Médica Veterinária.

PONTOS-CHAVE➧ Crescem as evidências de existência de umaligação genética entre as característicasfenotípicas dos cães e as reações adversas amedicamentos.

➧ As áreas da farmacogenética e dafarmacogenômica expandem rapidamente aperspectiva de aplicação clínica dos dadosgenéticos para favorecer a prevenção de reaçõesadversas, prever o comportamento dos fármacos eidentificar novos objetivos farmacológicos para ainvestigação.

➧ A mutação de deleção de genes multirresistentes afármacos (MDR), que induz a alteração daexpressão da glicoproteína-p e do comportamentodos medicamentos em Collies e raças aparentadas,constitui uma das variações genéticas maisamplamente estudadas, observadas em cães.

➧ Os avanços da farmacogenética e suaaplicabilidade clínica terão um impactoconsiderável nas decisões clínicas do futuro.

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genética, elaborada para facilitar a compreensãoda variação genética nas populações, para assimprever a reação de um indivíduo à farmacoterapia.Também pressupõe a capacidade de prever, efetivae eficientemente, resultados seguros em quasetodos os pacientes, pois aborda alvos específicosda terapia medicamentosa. Considerando que oprojeto do genoma humano já está concluído e ointeresse constante no mapeamento do perfilgenético de outras espécies, os dados farmaco-genéticos e, por consequência, os indicadoresclínicos da resposta medicamentosa, passarãoprovavelmente a desempenhar um papel maishabitual na prática veterinária. À medida em que ocenário clínico evolui para um tratamento contínuode doenças complexas, manejo de doenças crônicase diagnóstico menos comuns, a capacidade deprever a interação do paciente com a medicaçãoprescrita (e talvez a probabilidade de sucessoclínico) poderá revelar-se componente valioso daabordagem terapêutica.

Atualmente, os dados clínicos e circunstanciais,que permitam relacionar as características dasraças ou populações passíveis de predispor osanimais para reações adversas aos fármacos, sãoainda bastante escassos. Há relativamente poucotempo, os conhecimentos baseavam-se emelementos fenotípicos, ou seja, na sua expressãovisível, como a pelagem e a cor dos olhos. Aabordagem farmacogenética às reações medica-mentosas adversas proporcionará uma farmaco-terapia única para cada paciente e a elaboraçãode terapêutica individualizada (1).

Sabe-se atualmente que uma população de animaisaparentemente similares pode evidenciardiversidade de reações clínicas a uma terapiaidêntica. Esta resposta clínica variável, pode serdevido a componentes genéticos, mas graças aosconhecimentos farmacogenéticos teremos aoportunidade de alterar a abordagem em temporeal. Através de (screening tests) especificamente

Enzima Variações fenotípicas Fármaco afetado Alteração de respostaPseudocolinesterase plasmática Hidrólise éster, lenta Succinilcolina Apnéia prolongadaTiopurina metiltransferase Fracos metiladores de TPMT 6-Mercaptopurina Toxicidade da medula óssea(TPMT) 6-Tioguanina Lesões hepáticas

Azatioprina Aldeído desidrogenase Metabolizadores rápidos, Etanol Lenta: ruborização facial

lentos Rápida: proteção contra a cirrose hepática

Catecol-O-metiltransferase Metiladores elevados, Levodopa Resposta aumentada reduzidos Metildopa ou reduzida

CYP 2D6 Ultra rápida Debrisoquina Ultra rápida: resistência ao Extensiva Nortriptilina fármacoMetabolizadores fracos Dextrometorfano Extensiva: câncer de pulmão

Fraca: toxicidade aumentadaCYP 2C9 Metabolizadores fracos Tolbutamida, S-varfarina, Resposta aumentada

fenitoína, agentes anti- ou toxicidadeinflamatórios não esteróides

CYP 2C19 Hidroxiladores fracos, Omeprazol Fraca: toxicidade aumentada,extensivos eficácia reduzida

TransportadoresTransportador multirresistente Sobreexpressão Muitos - Ver Tabela 2 Resistência ao fármacoa fármacos (MDR-1)ReceptoresB2 Adrenoreceptor Regulação descendente Albuterol Baixo controle da asma

do receptor5-HT2A receptor serotonérgico Polimorfismos múltiplos Clozapina Eficácia variável do fármacoHER2 Sobre expressão Trastuzumabe Eficácia variável do fármaco

(câncer de mama)

Tabela 1.Exemplos de variações hereditárias ou adquiridas em enzimas, receptores e transportadores de fármacosconsiderados clinicamente relevantes em Medicina Humana (2)

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direcionados, será possível pré-identificar animaiscom expressão alterada da proteína ou asequência genética responsável por reaçõesadversas, associadas a um medicamento específicoou a uma categoria de fármacos. Munidos dasferramentas proporcionadas pela farmacogenética,torna-se possível evitar ou alterar essas reaçõesmodificando nossas escolhas de fármacos.

Evolução atual da farmacogenéticaNo passado, julgava-se que o fato de os organismospossuírem a capacidade de se adaptarem às influên-cias exercidas por fatores ambientais ou terapêu-ticos baseava-se na hereditariedade. No início doséculo XX, os estudos conduzidos por diversosinvestigadores provaram a existência da ligaçãoentre os processos bioquímicos que controlam ometabolismo dos fármacos e a genética (2). Snyderpublicou, em 1932, um dos primeiros trabalhossobre uma resposta a um produto químico estranho.Com base em trabalhos anteriores de Fox, Blakeslee eSalmon, a insensibilidade gustativa à feniltio-carbamida (PTC) foi descrita e associada acaracterísticas autossômicas no ser humano (3).Posteriormente, durante a Segunda Guerra Mundial,Archibald Garrod detectou uma relação entre odesenvolvimento de uma reação de hemólise àprimiquina e os soldados afro-americanos. A investi-gação demonstrou que a hemólise resultava de umadeficiência genética em glicose-6-fosfato-desidro-genase (G-6-PD) (4).

Com o passar do tempo, as observações de succinil-colina, isonizida e debrisoquina ajudaram a associaras reações individuais dos pacientes a um padrãogenético. Os primeiros trabalhos e estudos de casoslançaram as bases para a farmacogenética moderna.

Desde esses avanços iniciais, a tecnologia contempo-rânea favoreceu uma progressão acentuada doestudo da farmacogenética. Atualmente, a atençãocentra-se tanto na farmacogenética (a colaboraçãoentre a bioquímica e a farmacologia, paracorrelacionar marcadores fenotípicos a ligaçõesgenéticas específicas) como na farmacogenômica. Afarmaco-genômica difere da farmacogenética quantoà abran-gência do seu âmbito. Recorrendo àtecnologia avançada, como a sequenciação do DNAem larga escala, o mapeamento dos genes e abioinformática, as pesquisas podem centrar-se emvariáveis interpaciente, de modo a prever

diferenças no comportamento e resposta asdrogas. A abordagem genômica permitirá estudar abase da resposta aos medicamentosa, preverrespostas, identificar novos objetivosfarmacológicos e individualizar a terapia, de formaa reduzir o custo dos fármacos e, evitar efeitosindesejáveis. Várias descobertas farmacogenéticasrecentes tiveram sua relevância clínica comprovadaem pacientes veterinários. A população canina,caracterizada por uma variabilidade racial rastreável,intensivos programas de reprodução consanguíneas eintervalos entre gerações reduzidos constitui modeloideal para exploração da genética populacional ebastante realista para investigações sobre a ligaçãogenética a repostas farmacológicas específicas.Diversos trabalhos em farmacogenética têm sidorealizados na medicina humana e veterinária (2,5).Este artigo resume os mais relevantes indicadoresgenéticos das reações adversas aos medicamentos jádescritos no cão.

Mutação multirresistente a fármacos(MDR-1) e glicoproteína-pVários trabalhos e relatórios de casos clínicos descre-vem relação entre algumas raças de cães pastores eocorrência de reações adversas a anti-parasitários eoutros fármacos. As avermectinas constituem umaclasse de medicamentos amplamente utilizada emMedicina Veterinária para o tratamento de parasitasinternos e externos. Um composto específico dessaclasse, a ivermectina, paralisa os organismosinvertebrados através da ativação do GABA (ácidogama-aminobutírico) ou do bloqueio dos canais decloro controlados por glutamato, existentes nosistema nervoso periférico.

Geralmente, os mamíferos evidenciam umaexpressão GABA no sistema nervoso central, prote-gida pela barreira hematoencefálica, que pode serafetada pelo uso de ivermectina. Do ponto de vistaclínico, observa-se maior sensibilidade em Collies(Figura 1) e raças próximas aos efeitos dasivermectinas no sistema nervoso central (SNC) , queapresentam como sinais clínicos de intoxicaçãotremores, hipersalivação, coma, depressão e ataxia.Descreveu-se primeiramente nos anos 80, que dosesbastante reduzidas (1/100-1/200 da dosagempadrão) provocavam esse tipo de reações adversasgraves e profundas em alguns, mas não todos, Colliese raças próximas. Explorando diversas possibi-lidades, como alterações nas ligações com proteínas,

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verificou-se que Collies com reações adversasapresentavam concentrações de ivermectina nocérebro mais elevadas que Collies não sensíveis.

Foi demonstrado que a base desta observação estáassociada a uma mutação de deleção na sequênciagenética MDR-1 (Multi Drug Resistance 1), que dáorigem a uma série de codóns de terminação prema-turas, cuja expressão impede a formação de cerca de90% da sequência de aminoácidos da glicoproteína-presultante (6). Originalmente identificada emmeados dos anos 70, a glicoproteína-p é umaproteína de membrana glicosilada, com 170 kDa, queconfere uma resistência intrínseca a uma amplavariedade de fármacos, exportando estas substânciapara fora do organismo. A expressão da glicoproteína-p é observável em diversos tecidos, incluindo nocérebro, onde ajuda a preservar a integridade dabarreira hematoencefálica. No intestino, esta proteínalocaliza-se na zona apical das microvilosidades dosenterócitos, onde limita a absorção ebiodisponibilidade de substratos. Na superfície dascélulas tumorais, induz multirresis-tência a fármacos;e a sua presença nos túbulos renais proximaisacelera a secreção de substratos na urina (7).

O papel da glicoproteína-p na barreira hemato-encefálica foi originalmente demonstrado no geneMDR-1 de ratos knockout. Estudos efetuados comivermectina revelaram que, comparativamente àsestirpes selvagens, a população knockout era 50 a100 vezes mais sensível a efeitos neurológicos. Ofato de se demonstrar que a ivermectina constituium substrato para a glicoproteína-p tornou evidentea relação entre a ausência desta proteína e as reaçõesadversas documentadas (8). A consequência das

alterações na expressão desta proteína tem granderelevância clínica, uma vez que se caracteriza porampla expressão tecidular e relativa falta deespecificidade do substrato.

A distribuição da mutação MDR-1 já foi descrita napopulação canina. Relatou-se que cerca de 75% dosCollie existentes nos EUA, França e Austráliapossuem um alelo mutante para a expressão daglicoproteína-p alterada. Suspeita-se que as raçasafetadas possuam linhagens semelhantes queincluam outras raças de cães pastores, como o OldEnglish Sheepdog, o Pastor Australiano, o Pastorde Sheltland, o Pastor Inglês, o Border Collie, oPastor Alemão, o Whippet de pêlo comprido e oSilken Windhound. Até o presente momento, relatosde casos em outras raças não relacionadas sãomenos comuns.

Diversos fármacos relevantes em medicina veteri-nária demonstraram ser substratos daglicoproteína-p (Tabela 2). Durante a absorçãodo fármaco, a glicoproteína-p pode reduzirsignificativamente a biodisponibilidade oral dosseus substratos. Tal como observado no MDR-1 deratos knockout, a biodisponibilidade do substratoda glicoproteína-p é consideravelmente superiorque nas estirpes selvagens. As investigaçõesrealizadas com base neste processo demonstraramque a biodisponibilidade oral do docetaxel, umsubstrato, aumentava quase 20 vezes quandoassociado a um inibidor de glicoproteína-p. Durantea distribuição dos fármacos pelo organismo, o papelda glicoproteína-p volta a ter influência. No caso desubstratos passíveis de desencadear reaçõesadversas mediante o acesso ao sistema nervosocentral, aos testículos ou à placenta, as raças queapresentem uma mutação de deleção MDR-1 terãomaior probabilidade de se intoxicar, mesmo embaixas doses. Geralmente, os animais heterozi-góticos para a deleção não evidenciam reaçõescom uma única dose. No entanto, com doseselevadas ou crônicas poderá produzir-se toxici-dade.

Durante a excreção do fármaco, a expressão daglicoproteína-p nos túbulos renais altera a depuraçãode alguns substratos, particularmente de drogasquimioterapêuticas. Em ratos, a administraçãosimultânea de um inibidor da glicoproteína-p

Figura 1. Collie AmericanoPadrão

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diminui a depuração biliar e renal da doxorubicina. À medida que aumentarem o número de pesquisase as informações sobre a alteração da expressão emanimais, é indiscutível que as implicações damutação de deleção MDR-1, bem como a subse-quente expressão da glicoproteína-p, adquirirãomaior relevância clínica. Atualmente, pelo menosum laboratório comercial realiza análises emamostras caninas para fornecer informações sobreo genótipo (Universidade Estatal de Washington:www.vetmed.wsu.edu/vcpl).

Enzimas do citocromo P450O metabolismo dos fármacos é mediado por diversossistemas complexos. Uma vez elucidado no serhumano, o sistema enzimático CYP450 (citocromoP450) será melhor compreendido na espéciecanina. Esta classe de enzimas é responsável pelometabolismo de uma ampla variedade defármacos, com expressão em diversos pontos doorganismo. Já demonstrou-se que é possível induzirou inibir estas enzimas através de medicamentosespecíficos, que estas enzimas, podem evidenciarsub ou super expressão em algumas populações, evariar sua expressão em determinados indivíduos damesma população.

Demonstrou-se uma deficiência em CYP1A2 em10% de uma pequena população de Beagles (9).Apesar de poucos fármacos utilizados na MedicinaVeterinária terem sido identificados como substratosdesta enzima, investigações futuras poderãoapontar maior revelância clínica.

O CYP2B11 revela cerca de 14 tipos de variaçõesem sua atividade em cães mestiços. Nos Galgos, foidemonstrada uma atividade particularmentebaixa, em relação à população canina geral.Diversos fármacos, incluindo o propofol, sãosubstratos da enzima CYP2B11, que pode seexpressar de forma distinta em machos e fêmeas(10).

Existem também evidências que a CYP2D15 poderevelar polimorfismo no cão. Em Beagles, porexemplo, aproximadamente metade da populaçãoevidencia uma boa metabolização do celecoxibe(um substrato da CYP2D15), enquanto que nosoutros 50% a metabolização é baixa. Foi demons-trado que este efeito pode aumentar até 5 vezes a

meia-vida de eliminação deste fármaco (11). Apesarda extrapolação deste achado não ter sido aindaaplicada a outros fármacos não-esteróides comestrutura semelhante, como o deracoxibe, arealização de estudos aprofundados e a análise deevidências clínicas poderão aportar maisinformação. Existem outros medicamentos cujopapel como substrato da CYP2D15 foi já determi-nado no homem, mas são substâncias utilizadascom menor frequência em Medicina Veterinária.

À medida que a investigação do processometabólico do metabolismo dos fármacos no cãoaumentar, poderemos obter dados que demons-

PREDISPOSIÇÃO GENÉTICA PARA REAÇÕES ADVERSAS A MEDICAMENTOS NO CÃO

Fármacos citotóxicos Doxorubicina VincristinaVimblastina

Fármacos cardíacos Digoxina

ImunossupressoresCiclosporina

Fármacos antieméticos Ondansetrona

Agentes antidiarréicos Loperamida

Antibióticos Eritromicina

EsteróidesDexametasonaHidrocortisona

Bloqueadores dos receptores H2CimetidinaRanitidina

Outroslvermectina SelamectinaMoxidectinaMilbemicinaMorfinaFenitoína RifampinaAmitriptilina

Tabela 2. Substratos da p-glicoproteína (7)

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trem a existência de outras variações das enzimasmetabólicas. Graças a um maior conhecimentosobre a origem destas mutações, provavelmentedescobriremos outras raças afetadas, e outrasclasses de fármacos envolvidas. A disponibilizaçãode novas evidências poderá ajudar-nos a evitarinterações perigosas do tipo fármaco/fármaco,fármaco/alimento ou fármaco/raça.

Tiopurina metiltransferase (TPMT)A tiopurina S metiltransferase foi estudada emhumanos, tendo sido demonstrado que esta enzimacataliza a metilação de fármacos como a 6-mercaptopurina e a azatioprina. Investigaçõesrecentes identificaram polimorfismo genético emcães que provoca acentuada variação na expressãodesta enzima. Salavaggione et al. (12) detectaramníveis de TPMT, na contagem média de eritrócitoscaninos (CHM), similares aos observados nosestudos conduzidos em seres humanos. Além disso,foram igualmente observados níveis muito variáveisdesta enzima metabolizadora de fármacos, mesmoem populações de raças semelhantes, situação quetambém se verifica no ser humano. O estudo incluiu56 raças de cães distintas e alguns indivíduos deraças cruzadas. Primeiramente, o estudo analisou osníveis de TPMT em 145 amostras, determinando queo nível de atividade apresentava variações de 9escalas. Utilizando a informação sobre a sequência eestrutura do gene TPMT, os investigadoresresequenciaram todos os éxons desse gene canino,utilizando o DNA de 39 cães selecionados com basenos diferentes níveis de atividade do TPMT no CHM.Subsequentemente foram observados nove polimor-fismos, dos quais seis associados a 67% da variaçãodos níveis de atividade do TPMT nos eritrócitos em39 amostras. Quando se procedeu à análise dos 6polimorfismos de nucleotídeo único, utilizando oDNA dos 145 cães, verificou-se que os mesmosexplicavam 40% da variação fenotípica.

Ainda não é possível elucidar totalmente a aplicaçãoclínica das variações observadas. Sabe-se que empacientes com baixa atividade TPMT existe um riscomais elevado de toxicidade potencialmente letal,com a administração de fármacos de tiopurina emdoses padrão. Do mesmo modo, em pacientes comatividade enzimática elevada poderá produzir-se uminsucesso clínico, devido a subdosagens. Foiconstatada uma baixa actividade TMPT emSchnauzers Gigantes, enquanto os Malamutes do

Alasca revelam níveis elevados (13). Apesar daaplicação clínica deste conhecimento não poder serdisponibilizada até terem sido estabelecidosmétodos de análise padronizados, é importanteconsiderar que as variações que ocorrem podempredispor certas raças a risco elevado a reaçõesadversas a medicamentos, como a supressão damedula óssea, que deverão ser contempladas emestudos clínicos.

Os Galgos e a anestesiaOs Galgos constituem, desde tempos remotos, umacategoria de cães altamente domesticada erigorosamente reproduzida. No entanto, a seleçãofísica destes cães os predispôs a muitas anomaliasanatômicas e fisiológicas, como reaçõesidiossincráticas a determinadas classes de farmácos.Tal como descrito, sensibilidades a agentesanestésicos, como o propofol, poderão estarrelacionadas com uma variação do citocromo P450relativa a outras raças não próximas. Também sãoobserváveis outras reações, provavelmente emconsequência dos padrões de criação, reprodução, dapressão do exercício e das exigências de desempenhoque o homem estabelece para estes animais.

Tipicamente, a categoria dos Galgos inclui oGreyhound, Whippet, Borzoi, Irish Wolfhound,Basenji, Saluki, além do Basenji e do RhodesianRidgeback, que são animais criados para caçar combase na visão ao invés do olfato. Estes cães foramselecionados para características similares emtermos de massa corporal, musculaturaproeminente, membros compridos e tóraxprofundo. Em geral, possuem comportamentobastante nervoso e, em ambiente clínico,apresentam maior probabilidade de desenvolvercomplicações relacionadas ao estresse. Os galgos têmmuito menos massa gorda do que as outras raças, oque os predispõe a um risco mais elevado de reaçõesadversas a fármacos com ação lipofílica, como osbarbitúricos, que são depurados do cérebro para osmúsculos e reservas adiposas, e subsequentementeeliminados pelo fígado. Embora as evidênciasindiquem que nem todos os Galgos reagem damesma forma aos barbitúricos e ao propofol, essasreações resultam de um conjunto de fatores queinclui a expressão genética polimórfica, a expressãogenética variável e as influências ambientais.

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Toxicidade idiossincrática àssulfonamidas Um número crescente de dados sustentam as teoriasque defendem que as diferenças farmacogenéticastambém podem potencializar reações adversas aosmedicamentos, não relacionadas com a concentraçãodo fármaco e não previsíveis. Estas reaçõesidiossincráticas foram caracterizadas no serhumano já há algum tempo. Foi demonstrado nocão que as sulfonamidas (sulfametoxazol,sulfadiazina, sulfadimetoxina) provocam inúmerasreações dose-dependentes, como hematúria, anemiaarregenerativa, interferência na síntese da hormôniostireoideanos. Observaram-se outras reaçõesadversas em doses terapêuticas, que tendem a sermais generalizadas e mais típicas de reaçõesimunológicas tardias, podendo ocorrer apóstratamento de curta duração (10 dias ou menos).Normalmente, essas reações incluem sinais dehepatotoxicidade, erupções cutâneas, febre, anemiahemolítica, uveíte, poliartrite, proteinúria e inchaçofacial. Atualmente está em desenvolvimento nos nosEstados Unidos, uma investigação com o intuito decaracterizar cães com estas reações, através da técnicaELISA para anticorpos antifármacos, por meio deensaios de citotoxicidade in vitro e outrasmetodologias (14).

ConclusõesPossuímos dados concretos que nos permitem verifi-car no âmbito genético, algumas reações adversas amedicamentos, observadas em certas raças caninas.As abordagens prévias à identificação da predispo-sição genética para este tipo de ocorrências baseadasno fenótipo e na pesquisa da ligação genética embreve darão lugar à identificação dos fatoresgenéticos predisponentes e à alteração das terapias,com o objetivo de agir antecipadamente. Já foramdescritos diversos fatores genéticos com implicaçõesclínicas na farmacoterapia. Graças à farmaco-genética, disporemos de mecanismos que nospermitam aplicar uma farmacoterapia mais eficiente.Será possível realizar triagem de animais potencial-mente em risco, efetuar testes para verificar as suascaracterísticas genotípicas e adequar a terapêutica aoindivíduo e não à população. Baseados nos avançosproporcionados por respostas genéticas claras,poderemos identificar novos objetivos farmaco-lógicos específicos, que se traduzam em terapia comcapacidade de minimizar as reações adversas aosmedicamentos e maximizar os benefícios terapêu-ticos. O suporte das investigações acadêmicas eclínicas nas áreas da farmacogenética e dafarmacogenômica, aportará benefícios a todos ossetores da Medicina Veterinária no futuro.

PREDISPOSIÇÃO GENÉTICA PARA REAÇÕES ADVERSAS A MEDICAMENTOS NO CÃO

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Introdução Provavelmente, o cão foi a primeira espécie domesti-cada pelo homem e, desde essa época, ocupa umlugar especial em seu coração. A grande diversi-dade fenotípica evidenciada pelas diferentes raçascaninas levou Darwin a concluir que não poderiamter todos origem em um único antepassado recente.De fato, dados moleculares recentes demonstramque todas as espécies caninas derivam do lobo cinza(1). Muito embora a seleção inicial realizada pelo

homem se concentrasse no desenvolvimento dascaracterísticas funcionais para o seu própriobenefício, como a caça, pastoreio e guarda derebanhos, o desenvolvimento de exposiçõescaninas, clubes de raças e livros de origens,durante a era vitoriana, foi responsável pelaemergência de novas raças baseadas sobretudo, naaparência. Essas novas raças eram resultantes,geralmente, de cruzamentos consanguíneos e da

Triagem genéticaem cães

Matthew Binns, BSc (Hons), PhDColégio Real de Medicina Veterinária, Londres, Reino Unido

O Dr. Matthew Binns é Professor de Genética no ColégioReal de Medicina Veterinária de Londres em 2004, apósquatorze anos a serviço do Animal Health Trust (AHT).Sua área de investigação centra-se nas doençasgenéticas equinas e caninas, com o objetivo demelhorar a saúde e bem-estar destas espécies, atravésde testes de triagem desenvolvidos com base no DNA. ODr. Binns presidiu os comitês de mapeamento genéticoequino e canino da International Society for AnimalGenetics (Sociedade Internacional de Genética Animal) ejá publicou mais de 150 trabalhos científicos.

PONTOS-CHAVE➧ O recente sequenciamento do genoma canino acelerou oritmo de identificação das mutações causadores de doençasgenéticas caninas.

➧ O número crescente, testes de triagem genética disponíveiscomercialmente que permitem seleção das raças caninas,reduzindo e eliminando as mutações prejudiciais, de forma aobter animais mais saudáveis.

➧ Atualmente encontram-se já disponíveis ferramentasgenéticas, que podem ser utilizadas para identificar as“impressões digitais” específicas de cada raça, para a maioriadas raças puras. Graças a essas ferramentas, também épossível determinar a composição racial de indivíduoscruzados, o que se traduz na oportunidade de definir, emtermos genéticos, uma grande diversidade de característicaspatológicas, morfológicas e comportamentais.

➧ Os avanços científicos alcançados na caracterizaçãomolecular das doenças caninas despertou o interesse pelasua potencial utilização como modelo biomédico, emcondições equivalentes no ser humano. Portanto os futurosresultados do mapeamento de doenças genéticas caninasapresentarão relevância clínica tanto no âmbito da MedicinaVeterinária como humana.

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seleção de indivíduos com característicasestruturais ou comportamentais particularmentedesejáveis.

A interessante história dos cães de raça pura estáevidente nas assinaturas genéticas dos res-pectivos cromossomos, revelados pelos sequen-ciamento do genoma canino, que tambémdemonstra a ocorrência de dois episódios degargalo genético. Provavelmente o primeiroestado associado aos primórdios dadomesticação, em que se obteve uma variaçãogenética limitada a partir da população doslobos. Isto ocorreu provavelmente há mais de10. 000 anos, e a estrutura dos cromossomosancestrais envolvidos se dividiu em pequenosfragmentos devido ao processo de recombinação.O segundo gargalo é comparativamente recente ereflete a formação das raças puras: em que avariação genética da população canina domésticafoi distribuída por diversas raças.

A maioria das raças tem a sua origem em umnúmero reduzido de cães fundadores. A elaboraçãode livros de origens fechados, que impedia aincorporação de novas variantes genéticas na raça,fixou as opções genéticas para cada raça. Perdeu-se assim a variação genética, inicialmente atravésde desvios genéticos, fenômeno observável empequenas populações, em que os cromossomos dealguns fundadores passam a ser comuns, enquantoque outros desapareceram involuntariamente. Oscriadores também se empenharam na produção deindivíduos homogêneos, que correspondessem coma maior exatidão possível aos padrões da raça. Paratal, recorreram frequentemente ao cruzamentoconsanguíneo de animais com as característicasdesejadas e à utilização de machos reprodutorespopulares, muitas vezes campeões de exposiçõescaninas. A associação de desvios genéticos eendogamias provocou uma redução do nível devariabilidade do DNA na maioria das raças. Defato, para os genes que controlam as característicasque definem o padrão da raça é provável que poucaou nenhuma variação genética seja permitida. Ascaracterísticas únicas da população canina sãobastante úteis para o estudo de doenças heredi-tárias complexas , sendo o cão reconhecidocadavez mais como espécie modelo, através da qual serápossível descobrir os genes responsáveis pelasdoenças caninas e humanas mais comuns (2).

A genética molecular do cão percorreu um longocaminho num período de tempo relativamentecurto. Sua composição cromossômica é complexapara a investigação genética, por possuir umelevado número de cromossomos (2n=78)dificilmente diferenciáveis entre si. Foisurpreendente e fortuito o fato da técnica dacitometria de fluxo (flow-sorting) ter conseguidoseparar a maioria dos cromossomos, o quepermitiu criar ferramentas para identificar cadacromossomo canino individualmente (3). Osprimeiros marcadores genéticos de DNA foramdesenvolvidos no início dos anos 90, seguidos deperto pela elaboração de alguns esboços de mapasgenéticos (4). Estes mapas foram um elementoessencial para a identificação das mutaçõesgenéticas causadores de doenas hereditárias,assim como de características morfológicas ecomportamentais relevantes. O subsequentemapeamento da linhagem genética, associado auma abordagem genética específica (ver Tabela1), possibilitou a identificação de diversasmutações responsáveis por doenças e o desenvol-vimento dos primeiros testes de triagem genéticapara cães de raça pura. A seguir, estão descritosos testes disponíveis para o diagnóstico de doenças,bem como a forma como podem ser utilizados peloscriadores para a prática de uma reprodução seletivade cães saudáveis.

O ponto mais importante do progresso dainvestigação das doenças hereditárias foi aobtenção do financiamento para o total dosequenciamento do genoma canino, realizadopelos cientistas do Broad Institute de Boston emTasha, uma cadela Boxer. Silmultaneamente foirealizado o sequenciamento parcial do genoma deoutros nove cães de raça, quatro lobos e um coiote,no intuito de identificar marcadores depolimorfismos de nucleotídeo único emquantidades elevadas, que podem ser utilizadospara triagem rápida de doenças hereditárias noscães (5).

Doenças hereditárias Já foram identificadas cerca de 500 doenças genéticasem cães de raça. O site Inherited Diseases in Dogs, ouIDID (www.vet.cam.ac.uk/idid) apresenta umacompilação da informação existente sobre doençashereditárias, mais de metade dessas doenças sãoherdadas através de um distúrbio Mendeliano

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Autossômico Recessivo. Isto explica em parte adificuldade dos criadores em conseguir eliminaras mutações das raças, uma vez que são incapazesde distinguir os indivíduos geneticamente normaisdos portadores. Em contrapartida, nos distúrbiosMendelianos Autossômico Dominantes, em que amutação em um alelo é o suficiente paradesencadear a doença, torna-se relativamentesimples excluir os animais afetados da reprodução. Amaioria das doenças dominantes que ainda severificam na população canina são caracterizadas pelamanifestação tardia dos sintomas , quando, os cãesafetados podem já ter sido cruzados antes da doençatornar-se aparente.

As mutações podem ocorrer em qualquer gene e,por isso, qualquer órgão ou tecido pode ser afetadopor uma doença hereditária. Este fato reflete nagrande quantidade de doenças documentadas nabase de dados IDID.

A mesma mutação pode ocorrer em várias raçasevidenciando uma provável antiga mutação existentena espécie canina antes das raças terem sidoestabelecidas. Um exemplo, é a mutação responsávelpela Doença de von Willebrand de Tipo I,identificada inicialmente no Doberman. O mesmosítio de mutação foi subsequentemente identificadoem pelo menos outras oito raças, incluindo Bernese,Drentsche Patrijshond , Pinscher Alemão, Kerry BlueTerrier, Manchester Terrier, Papillon, Welsh Corgi ePoodle. Por outro lado existem mutações diferentesresponsáveis pela Doença de von Willebrand de Tipo Iem outras raças, incluindo o Setter Irlândesvermelho ou branco.

Pode ser difícil calcular com precisão a frequência dasmutações nas raças, mesmo com o recurso de umteste genético talvez por problemas no método dedeterminação das frequências relatadas peloslaboratórios responsáveis pela condução dostestes, uma vez que é mais comum a procura porcriadores que tenham tido um problema clínicocom alguma das suas linhagens, do que poroutros que não tenham experimentado esse tipode situação. A frequência da mesma mutação emraças distintas também pode variar bastante,provavelmente devido a origem da raça e aohistórico da população. Por exemplo, foi relatadafrequência da Doença de von Willebrand de Tipo I de28% no Doberman comparativamente a apenas 1%

no Bernese e no Poodle.

Em relação às doenças Mendelianas, o futuro épromissor para os criadores de cães de raça que estãocapacitando-se cada vez mais para diagnosticar amutação responsável pela doença e implementarplanos de reprodução seletivos, de modo a minimizaro impacto no seu plantel. Contudo, a situação já não épositiva para a maioria das doenças amplamentedisseminadas, como a displasia coxo-femoral, aepilepsia, os distúrbios cardíacos e imunológicos,uma vez que o componente genético ligado àdoença é mais complexo e pressupõe um númerosuperior de genes envolvidos. A identificação dasmutações que aumentam o risco de doenças e aimplementação de programas de reprodução seletivospode ser complicado. No entanto, à medida que foremdisponibilizadas novas ferramentas de genotipificaçãode alta densidade, é provável que sejam caracterizadasas mutações que contribuem para essas doenças, o queserá muito útil para a redução da gravidade nas raçasafetadas.

Testes de triagem genéticaOs testes de triagem genética com base no DNAapresentam diversas vantagens em comparação àsrestantes técnicas de diagnóstico clínico. Uma vezidentificada a mutação responsável por uma doença,torna-se, é relativamente simples elaborar testesrápidos, precisos, pouco dispendiosos e definitivos.Na maioria dos casos, os testes de DNA utilizamamostras sanguíneas ou bucais, amplificação decópias de DNA, através da técnica denominadaReação de Polimerização em Cadeia (PCR) e aanálise do DNA produzido pela PCR através dediversos métodos.

O número de testes genéticos para deteção dedoenças hereditárias em cães tem aumentado deforma consistente e é provável que acelere aindamais com a disponibilização da sequência dogenoma canino. A Tabela 1, apresenta uma lista detestes genéticos existentes no mercado para este tipode doenças hereditárias em cães de raça, bem comoos endereços eletrônicos das empresas que oscomercializam. Em muitas espécies animais, incluindoo cão, a análise genética das doenças hereditáriassão geralmente patenteadas o que limita o númerode organizações autorizadas a diagnosticar algu-mas doenças.

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TRIAGEM GENÉTICA EM CÃES

Doença Raça EmpresaDeficiência de adesão leucocitária canina Setter Irlandês AHT, Healthgene, Optigen

Setter Irlandês vermelho ou branco AHT, OptigenLipofuscinose ceróide Border Collie AHT, Optigen

Buldogue GTAnomalia do olho do Collie/Hipoplasia Pastor Australiano Opitigencoroidal Border Collie Optigen

Lancashire Heeler Optigen Nova Scotia Duck Tolling Retriever OptigenCollie de Pelo Longo OptigenPastor de Shetland OptigenCollie de Pelo Curto OptigenWhippet Optigen

Degeneração dos cones Braco Alemão de Pelo Curto OptigenHipotiroidismo congênito com bócio Fox Terrier Miniatura HealthgeneCegueira noturna congênita estacionária Pastor de Brie AHT, Healthgene, OptigenToxicose por cobre Bedlington Terrier AHT, VetgenNeutropenia cíclica Collie de Pelo Longo Healthgene

Collie de Pelo Curto HealthgeneCinistúria Retriever do Labrador PennGen

Terranova DDC, Healthgene, Optigen, PennGen, VetgenDeficiência de Fator VII Alaskan Klee Kai PennGen

Beagle PennGenDeerhound Escocês PennGen

Deficiência de Fator IX (Hemofilia B) Bull Terrier HealthgeneLhasa Apso HealthgeneRetriever do Labrador Healthgene

Deficiência de Fator XI Kerry Blue Terrier PennGenNefropatia familiar Cocker Spaniel Inglês OptigenDisplasia folicular Munsterlander HealthgeneFucosidose Springer Spaniel Inglês AHT, Finnzymes, PennGenLeucodistrofia das células globóides Cairn Terrier Healthgene

West Highland White Terrier HealthgeneGangliosidose GM1 Cão D’Água Português HealthgeneCatarata hereditária Boston Terrier AHT

Staffordshire Bull Terrier AHTToxicidade da ivermectina (MDR1) Pastor Australiano WSUCVM

Collie WSUCVMPastor Alemão WSUCVMOld English Sheepdog WSUCVMSilken Windhound WSUCVMWhippet WSUCVM

Acidúria L-2-hidroxiglutárica Staffordshire Bull Terrier AHTMucopolissacaridose IIIB Schipperke PennGenMucopolissacaridose VI Pinscher Miniatura PennGenMucopolissacaridose VII Pastor Alemão PennGenDistrofia muscular Golden Retriever HealthgeneMiotonia congênita Schnauzer Miniatura Healthgene, PennGenNarcolepsia Teckel Optigen

Doberman Pinscher Healthgene, OptigenRetriever do Labrador Healthgene, Optigen

Deficiência em fosfofrutoquinase Cocker Spaniel Americano DDC, Healthgene, Optigen, PennGen, VetgenSpringer Spaniel Inglês AHT, DDC, Healthgene, Optigen, PennGen, Vetgen

Atrofia progressiva da retina Cão Esquimó Americano OptigenPastor Australiano OptigenAustralian Stumpy Tail Cattle Dog OptigenBullmastiff OptigenWelsh Corgi Cardigan CUVS, Healthgene, OptigenChesapeake Bay Retriever OptigenChinese Crested Dog Optigen >

Tabela 1. Testes de triagem genética para doenças hereditárias em cães de raça pura

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A maioria das doenças referidas na Tabela 1 étransmitida por condições autossômicas recessivas,sendo que a principal vantagem dos testes de DNAreside na capacidade de identificar os portadores,uma vez que geralmente não é possível distinguiros portadores dos não portadores através doexame clínico. Os primeiros funcionam como“depósitos” da doença para as gerações futuras. Namaioria dos casos os cães afetados resultam do cruza-mento entre dois progenitores portadores e, em média,cerca de 25% da ninhada apresentará a doença.

Graças aos testes de detecção de doenças recessivascom base no DNA, os criadores dispõem de diversasopções para melhorar a saúde e bem-estar dos seuscães, tal como se indica na Figura 1.

O principal objetivo consiste em evitar o cruzamentode dois indivíduos portadores, uma vez irá originarcães afetados (Figura 1A). Se um criador possuir umanimal portador do qual esteja interessado em obterdescendência, deverá selecionar um indivíduodeclarado geneticamente isento pelos testes, para

Atrofia progressiva da retina (cont.) Cocker Spaniel Inglês OptigenBoiadeiro de Entlebuch OptigenLapphund Finlandês OptigenSetter Irlandês AHT, Healthgene, Optigen, VetgenSetter Irlândes Vermelho ou Branco OptigenKuvasz OptigenRetriever do Labrador OptigenLancashire Heeler OptigenPastor da Lapônia OptigenMastifes OptigenTeckel Miniatura de Pelo Longo AHTPoodle Miniatura OptigenSchnauzer Miniatura OptigenNova Scotia Duck Tolling Retriever OptigenCão D’Água Português OptigenSamoieda OptigenHusky Siberiano OptigenSloughi AHT, OptigenLapphund Sueco OptigenPoodle Toy Optigen

Deficiência da fosfatase desidrogenase do piruvato Clumber Spaniel GTSussex Spaniel GT

Deficiência da piruvatoquinase Basenji Healthgene, Optigen, PennGen, VetgenBeagle PennGenCairn Terrier PennGenChihuahua PennGenEsquimó PennGenTeckel PennGenWest Highland White Terrier AHT, DDC, Healthgene, PennGen

Imunodeficiência combinada severa Basset Hound PennGenWelsh Corgi PennGen

Doença de von Willebrand Bernese Finnzymes, VetgenDrentsche Patrijshond VetgenDoberman Finnzymes, Vetgen Pinscher Alemão VetgenSetter Irlândes Vermelho ou Branco AHTKerry Blue Terrier Finnzymes, VetgenManchester Terrier Finnzymes, VetgenWelsh Corgi Pembroke Finnzymes, Vetgen Papillon Finnzymes, Vetgen Poodle(todas as variedades) Finnzymes, VetgenPastor de Shetland VetgenScottish Terrier Vetgen

AHT: http://www.aht.org.uk/DDC: http://www.vetdnacenter.com/canine-disease-test.htmlFinnzymes: http://diagnostics.finnzymes.fi/index.php?lang=_en&page=canine_inherited_diseaseGT: http://www.gtg.com.au/AnimalDNATesting/index.asp?menuid=080.150.010Healthgene: http://www.healthgene.com/canine/genetic_dna_testing.asp

Optigen: http://www.optigen.com/PennGen: http://w3.vet.upenn.edu/research/centers/penngen/services/alldiseases.htmlVetgen: http://www.vetgen.com/canine-services.htmlWSUCVM: http://www.vetmed.wsu.edu/depts-VCPL/

Para maiores informações sobre os testes, consulte os seguintes sites da Internet.

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TRIAGEM GENÉTICA EM CÃES

efetuar o acasalamento. Desta forma, obterá emmédia 50% de cães portadores e 50% isentos(Figura 1B). Mas o mais importante é que atravésdeste método não são produzidos cães afetados e, pormeio de testes conduzidos na ninhada, o criador podeescolher os animais que melhor correspondam aosseus critérios de seleção e sem a presença da doença.Se a ninhada não apresentar indivíduos com estascaracterísticas, poderá realizar-se novo cruzamentoentre um animal portador e outro isento. No casoespecífico de algumas doenças, é possível utilizar umcão afetado para a reprodução com um parceirodeclarado isento, situação em que todos os cães daninhada serão portadores (Figura 1C).Posteriormente, poderá ser aplicada a mesmametodologia utilizada nos portadores a estes cães.

Uma opção é remover todos os portadores dapopulação reprodutiva. Se a frequência de portadores

da raça for reduzida (inferior a 5%) poderá constituira melhor solução. Efetivamente, essa medida permiteerradicar a doença testada mas simultâneamente,aumenta a proporção de portadores de outrasmutações prejudiciais. Assim, se a frequência inicialde portadores for elevada, a opção da remoção damutação genética ao longo de diversas geraçõesevita prejuízos sobre a diversidade genética daraça. No Reino Unido, um exemplo bem sucedido é oprograma de diagnóstico genético da deficiência deadesão leucocitária canina (CLAD), doençaautossômica recessiva em Setter Irlandês. A CLADprovoca a falência do sistema imune do animal, queno espaço de meses se revela fatal. Na sequência dadescoberta da mutação responsável por estadoença (6) (ver Figura 2 para exemplificação dosresultados de um teste), o UK Kennel Club e a IrishSetter Breed Association estabeleceram umprotocolo segundo o qual os animais portadorespoderiam ser reproduzidos e registrados, duranteum período de 5 anos. Esse período terminou emJulho de 2005, e determinou que apenas podem serregistrados animais declarados isentos pelo testepara CLAD, ou serem filhos de reprodutores isentosde CLAD. Desta forma, os criadores de Setter

Figura 1.Reprodução seletiva, com base nos resultados dos testes genéticos para umadoença recessiva. O exemplo A ilustra o caso do cruzamento de dois portadores(círculos semi-preenchidos). Em média, 50% dos filhotes desta ninhada serãoportadores, 25% isentos (círculo não preenchido) e os 25% restantes estarãoafetados (círculo preenchido). No exemplo B, foi cruzado um portador com um indivíduo declarado geneticamente são pelos testes. Nesta situação não se produzem cães afetados: metade dos filhotes da ninhada serão portadores e a outra metade isentos. A análise conduzida na ninhada permitirá identificar osfilhotes geneticamente sãos que constituem assim, um potencial estoque dereprodutores. O exemplo C, exemplifica o caso do cruzamento de um cão afetadocom um indivíduo declarado isento. De novo, não se obterão filhotes afetados,uma vez que toda a ninhada será portadora da mutação da doença. Posteriormente, estes portadores poderão ser cruzados com indivíduosgeneticamente sãos, tal como se ilustra no exemplo B.

Figura 2.Teste para a deficiência de adesão leucocitária canina (CLAD) do SetterIrlandês, com base na sequência de DNA. As setas destacam a alteraçãodo nucleótido único, responsável por esta doença letal. Em indivíduosnormais, ambas as cópias do gene CD18 contêm um nucleótido G (picopreto), enquanto que em indivíduos portadores, estão presentes ambosos nucleótidos C (azul) e G (preto). Este exame permite identificação clarados portadores.

A)

Normal (G/G)

Portador (C/G)

B)

C)

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Irlandês conseguiram eliminar esta doençahereditária letal do seu plantel, preservando adiversidade genética da raça. Um pré-requisito paraum programa deste tipo é a abertura edisponibilização do registro de resultados aoscriadores. Neste caso, além de uma base de dadosdos resultados dos testes CLAD online, o UK KennelClub adicionou os resultados de testes CLAD aoregistro do animal, publicando-os também nosuplemento do livro de origens. Os resultados passamtambém a ser indicados nos certificados de registroda respectiva progenia, para atestar que estãogenetica-mente isentos de CLAD. Diversos programas como este serão aplicados nofuturo, o que se traduzirá em considerá-veis melhoriaspara a saúde e bem-estar dos cães de raça e mestiços,graças à eliminação de doenças genéticas perigosasatravés da reprodução seletiva.

Identificação das raças na origem decães mestiçosA formação de raças puras a partir de um númeroreduzido de reprodutores, seguida pela reproduçãointensiva consanguínea, deu origem a uma enormediversidade fenotípica entre raças, porém com níveisinternos elevados de similaridade genética.Recorrendo aos SNPs inicialmente identificadosdurante o sequenciamento do genoma canino, os cien-tistas do Centro de Nutrição de Animais de Companhia- WALTHAM selecionaram cerca de 1.500 SNPs queabrangem os 38 autossomos, com o objetivo deidentificar assinaturas genéticas específicas da raça,nas 120 raças caninas mais populares (Paul Jones -comunicação particular). Procedeu-se à colheita de

amostras tanto no Reino Unido como nos EUA e,curiosamente, os resultados demonstraram quealgumas raças, como o Terrier Irlandês e SetterGordon, eram distintas geneticamente de acordo como seu país de origem. Em contrapartida, em outrasraças como o Pastor Alemão e o Bearded Collieverificaram-se poucas diferenças entre as amostras doReino Unido e dos EUA. Os resultados destacaram aexistência de padrões de SNPs específicos emdiferentes raças, que permitem associar amostrasdesconhecidas a uma raça determinada com umelevado grau de segurança. Em seguida, os cientistasanalisaram um grupo de cães mestiços para tentaridentificar as raças de que estes derivavam. Na maioriados casos foi possível, e o teste comercial sofisticado,Wisdom Mx Panel, (que utiliza uma gama de SNPs maisespecífica) que pode fazer isso está disponível pela MarsVeterinária (http://www.marsveterinary.com). Graçasao teste Wisdom NX os proprietários de cães mestiçospoderão conhecer a origem dos seus animais. Nesteteste, as raças que contribuem com mais de 12,5%para a composição genética do cão são indicadasnos resultados, o que esclarecerá ao proprietárioquanto aos atributos físicos do animal, proporcio-nando em simultâneamente uma perspectiva sobre asnecessidades dietéticas, de adestramento e exercício.Mais importante, a análise conduzida em cãesmestiços constitui também estratégia de pesquisamuito importante para o mapeamento decaracterísticas e doenças, através da identificaçãodos SNPs comuns a indivíduos mestiços comdoenças ou atributos físicos similares.

TRIAGEM GENÉTICA EM CÃES

1. Wayne RK. Molecular evolution of the dog family. Trends in Genetics 1993; 9: 218-224.

2. Neff MW, Rine J. A fetching model organism. Cell 2006; 124: 229-231.

3. Langford CF, Fischer PE, Binns MM, et al. Chromosome-specific paints from ahigh-resolution flow karyotype of the dog. Chromosome Research 1996; 4:115-123.

4. Neff MW,Broman KW, Mellersh CS, et al. A second-generation genetic linkagemap of the domestic dog, Canis familiaris. Genetics 1999; 151: 803-820.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Interações entre nutrientes egenes: aplicação à nutrição esaúde dos animais decompanhia

Brittany M. Vester, MSDepartamento de Ciências Animais, CiênciasNutricionais e Medicina Veterinária Clínica daUniversidade de Illinois, Urbana, EUAA DrªBrittany M. Vester graduou-se em Ciências AnimaisnaUniversidade de Purdue em 2004. Obteve mestradoem CiênciasAnimais, na Universidade de Illinois em nutriçãode animais decompanhia. A área de concentração de suas pesquisas éconsequência da administração de dietas com teores proteicoselevados a felinos domésticos e exóticos.

Kelly Swanson, PhDDepartamento de Ciências Animais, CiênciasNutricionais e Medicina Veterinária Clínica daUniversidade de Illinois, Urbana, EUAO Dr. Swanson graduou-se em Ciências Nutricionais naUniversidade de Illinois em 2002, e é doutor pelamesmaUniversidade na área da genômica funcional. Em 2004,ingressou no corpo docente da Universidade de Illinois como Professor Assistente do Departamento de Ciências Animais. O Dr. Swansoné tambémmembro da Divisão de Ciências Nutricionais e do Departamento de Medicina Veterinária Clínica. Suas principais áreas depesquisa incluem a saúde e as doenças intestinais, a regulação do apetite e a obesidade e os efeitos nutricionais nos perfis de expressãogenética de cães e gatos. Além de pesquisador, o Dr. Swanson é professor de Introdução à Nutrição, disciplina ministrada aos alunos doprimeiro ano de Medicina Veterinária, e de um curso de Superalimentação de Animais de Companhia, elaborado para alunos de licenciaturae de pós-graduação.

PONTOS-CHAVE➧ O sequenciamento do genoma canino já foi realiza-do e o projeto o genoma felino encontra-se em curso.

➧ A descoberta de polimorfismos de nucleotídeoúnico (SNPs) passíveis de afetar a resposta anutrientes ou fármacos permitirá aospesquisadores e veterinários formular dietas combase no genótipo, identificar populaçõessusceptíveis a doença e tratar com eficácia osanimais doentes.

➧ A hereditariedade epigenética persiste ao longo degerações e pode contribuir para a capacidade deresposta de um animal a nutrientes específicos.

➧ Já foi determinado que os nutrientes podeminfluenciar a expressão do gene, incluindo aprodução de mRNA (transcrição), a organização domRNA, a produção de proteínas (tradução), asalterações pós-tradução e, consequentemente,influenciar o estado metabólico do animal.

➧ A pesquisa futura tornará possível a formulação dedietas em função dos genótipos, a utilização debiomarcadores para a detecção precoce de doenças, eaparecimento de novas terapias para as doençasdos animais de companhia.

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IntroduçãoOs animais de companhia, mais especificamente os cãese os gatos, comportam desafios únicos para MedicinaVeterinária e da ciência nutricional. Além das idiossin-crasias metabólicas, o específico cuidado e nutriçãobaseiam-se na promoção da saúde ao longo de toda avida e não em parâmetros de produção (por ex.: ganhode peso médio diário, índice de conversão alimentar)como é frequente nas espécies destinadas a produção.Adicionalmente os proprietários de animais de companhiatendem a antropomorfizar cães e gatos e estão dispostosa despender grandes quantias em tudo o que consideramnecessário para a saúde e bem-estar dos seus animais, o quecontribui para que a nutrição e a medicina dos animais decompanhia se assemelhe frequentemente à humana. Porexemplo, diversos programas de pesquisa atuais incluem oteste de ingredientes “funcionais”, para identificar os efeitosda nutrição materna, preservar a saúde em animaisgeriátricos ou analisar o papel da nutrição na prevenção etratamento de doenças. Hoje em plena era "ômica", o desafioconsiste em identificar as necessidades nutricionais não sócom base no estágio fisiológico, mas também de acordocom o genótipo.

Dada à sua importância como modelo bio-médico para o homem, o cão foi o primeiromamífero não roedor em que foi possívelcompletar o sequenciamento do genoma.Impulsionado pelo National Institutes ofHealth (NIH), o primeiro projeto do genomacanino foi finalizado em julho de 2004. Desdeentão foi apresentado um projeto de altaqualidade para o sequenciamento dogenoma e um mapa de polimorfismos denucleotídeos interacial único (1). Embora

menos adiantado do que a pesquisa em cães, já foramalcançados grandes progressos no Projeto do GenomaFelino, atualmente em curso. Ambas as sequências dogenoma constituem valiosas ferramentas para a pesquisa emanimais de companhia e da Medicina Veterinária. Além dosdados fornecidos pelo sequencia-mento do genoma, asnovas tecnologias desenvolvidas nas áreas da biologiamolecular, ciência computacional, bio-informática enanotecnologia, proporcionaram aos pesquisadores amplagama de métodos complementares às técnicas jáexistentes. Estas novas ferramentas permitirão avançosconsideráveis no estudo da nutrição e saúde dos animais decompanhia em um futuro próximo.

A dieta é, provavelmente, o fator ambiental maisimportante entre os que afetam o fenótipo (característicasfísicas) de um animal. Não só a genética (DNA) do animalinfluencia o modo como o seu organismo reage à dieta. Adieta também influi na expressão genética, incluindo atranscrição (síntese de mRNA), a organização e transportedo mRNA, a tradução (síntese de proteínas) e as alteraçõespós-tradução (Figura 1). Adicionalmente, descober-tas recentes no campo da epigenética demonstraram que

o estado nutricional in uteroe/ou durante a primeira fasedo período pós-parto pode tergrandes repercussões no me-tabolismo ao longo da vidae no risco de contração dedoenças. Embora os estudosem nutrigenômica estejamainda em fase inicial, suaimportância já ficou bemdemonstrada. Serão anali-sados os principais meiosque favorecem a interaçãoentre nutrientes e genes,através de alguns exem-plos, bem como sua aplicação

Termo DefiniçãoNutrigenética O efeito do genótipo na absorção, metabolismo,

transporte ou excreção dos nutrientesNutrigenômica Ação do(s) nutriente(s)

na expressão genética SNP (polimorfismo de Alteração de um único nucleótido nucleotídeo único) na sequência do DNA de um gene Epigenética Alteração estável e hereditária da expressão do gene,

independente das alterações na sequência do DNA

Definição dos termos

Figura 1. Interações Dieta – Genes.

Adaptado de Milner, 2003 (18)

Pós-tradução

Proteína

TraduçãomRNA

DNA

Nutrigenômica

Transcrição

Epigênese

Nutrigenética

D I E TA

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futura na área da saúde e doenças dos animais decompanhia.

NutrigenéticaMuito embora a absorção, metabolismo, excreção, etc. damaioria dos nutrientes tenha sido bem descrita, os fatoresque contribuem para a grande variação inter-animal queocorre nestes processos, tanto na população canina comofelina, carecem de melhor definição. O perfil genético dapopulação analisada talvez constitua um dos principaisfatores responsáveis por estas diferenças. O termo“nutrigenética” pode ser utilizado para descrever o efeitodo genótipo (perfil genético) na absorção de nutrientes,no metabolismo, no transporte e na excreção. A reaçãode um animal a um nutriente específico, por exemplo,depende da sequência do DNA e da consequente sequênciade aminoácidos e estrutura das proteínas dos genesenvolvidos na sua absorção e metabolismo.

Apesar da variação na sequência do DNA poder sermodificada de diversas formas, a alteração mais simples éconhecida como um polimorfismo de nucleotídeo único(SNP), no qual um nucleotídeo é substituído por outro. Ospolimorfismos de nucleotídeo único podem ser comparadosàs “variações de uma receita” (2). Cada gene individualconstitui a receita para um grupo específico de proteínas quedesempenha uma determinada função biológica. De acordocom a localização e tipo de SNP, os efeitos fenotípicos podemser graves, moderados ou indetectáveis. Apesar dosinúmeros SNPs não exercerem qualquer efeito biológico,outros são passíveis de alterar a receita, com a consequenteprodução de um tipo ou quantidade de proteína diferente.Mesmo que a ação dos SNPs não seja detectadaisoladamente, estes podem ter efeitos aditivos e alterarde forma significativa a funcionalidade protéica econtribuir potencialmente para a resposta do animal à dietaou para a susceptibilidade a certas doenças. Embora o

conhecimento nesta área se encontre ainda em fase inicial, aimportância dos perfis de SNP já foi reconhecida, e constituium campo de pesquisa intensas nos seres humanos, animaisde companhia e espécies pecuárias.

A investigação do genoma humano permitiu a identificaçãode numerosos SNPs que se consideram associados ao riscode doenças, muitos dos quais aplicáveis também aos animaisde companhia. Um exemplo é a relação entre a interleucina-1 (IL-1) e a incidência das doenças inflamatórias. No serhumano, os indivíduos com uma variação específica do geneda IL-1 demonstraram maior predisposição para diversasdoenças, incluindo a doença de Alzheimer, doençaperiodontal e um risco mais elevado de ataques cardíacos. Ainflamação é conhecida como um componente importantede diversas doenças crônicas, incluindo as predominantes napopulação de animais de companhia, como a obesidade, odiabetes, a artrite, a doença periodontal e os distúrbiosinflamatórios intestinais. O estudo das variações dogenótipo, incluindo os perfis de SNPs, constitui um objetivoprimordial para o desenvolvimento da prevenção dedoenças e estratégias de tratamento, tanto no ser humanocomo em animais de companhia. Embora o tempo efinanciamentos indispensáveis para a condução destaspesquisas, sejam impactantes, as recompensasultrapassam largamente os custos envolvidos. Assim, estesestudos devem ser ampliados aos animais de companhia.

Ainda que atualmente a identificação e/ou significado damaioria dos SNPs seja ainda desconhecido ou escassamentedescrita, existem diversos exemplos que demonstram aspotenciais implicações da sua utilização futura, entre osquais o da toxicose por cobre observável na raçaBedlington Terrier (Figura 2). Embora esta doença sejaalvo de estudo há décadas, só recentemente descobriu-seque é causada por uma mutação no gene de MURR1, comdiversas variantes genéticas (SNPs) associadas à doençaidentificada (3). Uma mutação MURR1 traduz-se nummetabolismo deficiente do cobre, favorecendo seu acúmulono tecido hepático, o que por sua vez produz a toxicidade.Antes de ter sido identificada a mutação genética quecaracteriza esta doença, o melhor método de diagnósticoconsistia na mensuração das concentrações hepáticas decobre com 1 ano de vida. Contudo, os níveis podemapresentar-se já perigosamente elevados nessa idade. Umavez que os animais portadores de um único alelo modificadonão evidenciam teores elevados de cobre no fígado, estaanálise não permite identificar os portadores da doença. Com base no conhecimento atual, um teste genético parauma doença deste tipo permitirá o diagnóstico das mutaçõesMURR1 e a identificação dos animais afetados e portadores

INTERAÇÕES ENTRE NUTRIENTES E GENES: APLICAÇÃO À NUTRIÇÃO E SAÚDE DOS ANIMAIS DE COMPANHIA

Figura 2.Bedlington Terrier.

(© Hermeline / Aniwa)

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da mutação. A análise genética poderá ser realizada logoapós o nascimento, permitindo que o proprietário e oMédico Veterinário procedam à alteração da dieta emconformidade. Este constitui apenas um exemplo de umainteração nutriente – gene e respectivo impacto na saúde elonge-vidade do animal. À medida que vão sendoidentificadas mais interações, poderão ser elaboradas dietascom maior grau de complexidade em função do genótipodo animal.

Existem diversos SNPs caninos ou felinos, não necessa-riamente associados à nutrição, mas com influência na saúde,nas doenças ou nos critérios de seleção. Citam-se a seguiralguns exemplos. O gato Siamês possui um fenótipo singular:corpo de cor clara e uma máscara escura na face, patas ecauda. Este padrão de cor, habitualmente denominadofenótipo pointed, constitui uma forma de albinismo. Umestudo recente analisou as mutações da tirosinase associadas àscores da pelagem dos gatos Siameses e Burmeses (Figura 3),tendo sido constatada maior produção de pigmentos da últimaraça (4). A avaliação do fenótipo pointed determinou que amutação existente na raça siamesa é muito sensível àtemperatura, o que se traduz na presença de pigmentosapenas das extremidades menos quentes do corpo. Aocontrário, as mutações constatadas nos gatos Burmesesrevelaram menor sensibilidade à temperatura, o que explicaa pigmentação observável em todo o corpo desta raça.

Vários estudos conduzidos em cães focaram as alteraçõesda função imunológica devido a variações no genoma.Através desses estudos é possível identificar indivíduosou grupos com maior susceptibilidade a doenças ou comuma capacidade limitada de combater infecções. Osgenes do Complexo Principal de Histocompatibilidade

Canina (DLA) são considerados altamente polimórficosno cão. A avaliação das variantes de classe II dos DLA revelouuma acentuada variabilidade entre as diferentes raçascaninas (5). Considerando-se as semelhanças entre cães elobos, crê-se que estes genes foram selecionados devido àsua capacidade evolutiva. Além disso, a intervenção humanana reprodução desta espécie animal produziu gravesestrangulamentos, eventualmente responsáveis pelas altera-ções induzidas nas áreas em questão, e pelo aumento dasusceptibilidade de algumas raças a doenças específicas(5).

Encontra-se também em curso uma pesquisa extensiva naárea da farmacogenética, com o objetivo de avaliar aresposta do paciente a um fármaco específico. Já foiestabelecido que a variação genética afeta o mecanismo demetabolização dos fármacos. No ser humano, os indivíduospodem ser classificados em vários grupos (por ex.:metablizadores lentos, intermediários, rápidos e ultra-rápidos) em função do respectivo perfil genético (6). Nocaso de alguns fármacos já comercializados, aestipulação da dosagem e da forma mais eficaz domedicamento pode ser facilitada pela identificaçãoprévia da genética do paciente. Esta abordagem damedicina será ainda mais abrangente no futuro, nãosó para o homem como também para animais decompanhia e de produção.

Foram analisados diversos genes associados ao meta-bolismo dos fármacos (ex.: enzimas do citocromo P450)no cão. Também realizou-se o estudo da função de um geneespecífico (CYP1A2) em cães, que demonstrou possuirum SNP variante na região codificadora do gene (7). Estegene manifesta-se no fígado e é importante para a

determinação da capacidade meta-bólica no cão e no ser humano. Asvariações específicas identificadasaté agora tornam um gene nãofuncional (7). Existem provavelmen-te muitas outras variações noCYP1A2 canino e em outros genesCYP, com implicações consideráveisna farmacogenética canina.

Já está disponível no mercado umchip de SNP canino, embora aindanão tenham sido publicadostrabalhos relativos à sua utilização. Àmedida que a pesquisa que utilizaeste chip e outras estratégias demapeamento vai identificandoFigura 3. gato Siamês gato Burmês

(©Hermeline/Aniwa)

(©Lanceau)

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outros SNP’s relevantes, as técnicas de determinação dogenoma adquirirão cada vez maior importância em termosda recomendação de dietas e/ou prescrição de fármacos.Apesar de eventuais complicações éticas, a utilização emanimais de companhia poderá constituir uma importanteferramenta tanto para os Médicos Veterinários como paraos proprietários. A análise genética, através da qual podemser tomadas decisões na reprodução poderá permitir, nofuturo, a prevenção de defeitos genéticos graves, diminuir afrequência de genes de doenças e, simultaneamente,preservar populações de raça pura geneticamentedistintas. Também poderão ser utilizados métodossemelhantes para prevenir ou tratar com eficácia animaiscom maior predisposição para certas doenças, recorrendo auma intervenção nutricional ou farmacológica. Assim,cada nova descoberta nos aproxima um pouco mais dasdietas e terapias personalizadas já praticadas em medicinahumana.

Hereditariedade epigenética eprogramação metabólica As interações entre nutrientes e genes também podem semanifestar através de mecanismos epigenéticos. Aepigenética constitui um dos dois principais mecanismosque regulam a expressão genética. A regulação epigenéticadiz respeito ao controle da expressão do gene, que érelativamente estável e hereditária através de gerações.Embora estas alterações possam persistir após a replicação,as modificações na sequência e regulação genética sãoindependentes das variações na sequência do DNA. Ahereditariedade epigenética é influenciada por diversosfatores, incluindo a dieta e as concentrações hormonaisdurante a primeira fase de desenvolvimento ao longo davida. A mutação epigenética investigada com maiorfrequência envolve padrões de metilação do DNA. Em geral,a metilação na proximidade de regiões promotoras de genesestá associada ao silenciamento dos genes (i.e. repressão datranscrição). Os padrões de acetilação histônica tambémpodem influenciar a transcrição (Figura 4).

Estudos recentes estabeleceram uma ligação entre heredi-tariedade epigenética e o status metabólico para toda a vida,processo que se denomina "programação metabólica". Porestar associada a ocorrência de doenças crônicas comoobesidade, diabetes, doenças cardíacas e distúrbioscomportamentais, os efeitos nutricionais na hereditariedadeepigenética são exaustivamente pesquisados. Apesar dasprimeiras pesquisas se terem focado apenas a condiçãonutricional in utero, demonstrando assim a importância danutrição materna, sabe-se que tanto a nutrição pré-natalcomo a pós-natal contribuem para a programação

metabólica. Um estudo bastante convincente, conduzido nos sobre-viventes à fome que assolou a Holanda durante a SegundaGuerra Mundial, demonstrou não só a importância danutrição pré-natal e pós-natal, como revelou que esses efeitospodiam ser transmitidos durante várias gerações (9). Os bebêscom baixo peso ao nascimento, gerados por mulheres comacesso reduzido a alimentos durante a gestação, evidenciarammaior incidência de obesidade, intolerância à glicose ehipertensão em adultos (10,11). O achado mais significativoproporcionado por este trabalho foi a detecção do aumento derisco doenças na terceira geração (i.e. os netos das mulheresque sobreviveram à fome), o que demonstra que a dietamaterna pode afetar não só a sua progênie como também asgerações futuras. Inúmeros ensaios realizados com roedoresrevelaram resultados semelhantes, permitindo que seiniciasse a identificaçãodos mecanismos envolvidos nestesprocessos.

Embora a boa qualidade da alimentação materna de cães egatos seja uma realidade há várias décadas, os dadoscontinuam a ser escassos. Esta ausência de conhecimentostraduziu-se em recomendações alimentares pouco definidase na ausência de produtos comercializados para fêmeasgestantes e lactantes. Não existe uma quantificação precisadas necessidades nutricionais de filhotes e animais jovensem fase de crescimento, nem o impacto que o statusnutricional durante este período poderá ter a longo prazo.Considerando os recentes avanços no campo da epigenética,que inclui a capacidade de avaliar o nível de metilação doDNA, esperar-se grandes avanços na programação

INTERAÇÕES ENTRE NUTRIENTES E GENES: APLICAÇÃO À NUTRIÇÃO E SAÚDE DOS ANIMAIS DE COMPANHIA

Tradução

Proteína

mRNA

Transcrição

RNA-polimerase

Deacetilação histônicaDNA

Acetilação histônica

Figura 4.Mecanismos epigenéticos da expressão genética.

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metabólica no futuro.

Regulação nutricional da expressãogenética - Nutrigenômica Ao contrário da modificação epigenética, a expressãogenética também pode ser regulada através de processosinstáveis controlados por ativadores e repressores datranscrição do DNA. Os genes associados ao metabolismolipídico, por exemplo, são muitas vezes regulados destaforma e são afetados por fatores como a fonte de energia(gordura vs carboidratos) e o status metabólico (jejum vsalimentado) (12). Assim, o estado nutricional pode afetar onúmero de enzimas presentes ao promover grandesalterações na taxa de transcrição genética.

Até há relativamente pouco tempo, pensava-se que asalterações na expressão genética atribuídas à dieta erammediadas sobretudo pela ação hormonal do sistemanervoso. Contudo, investigações recentes demonstraramque os macronutrientes (por ex.: glicose, ácidos graxos eaminoácidos) e os micronutrientes (por ex.: ferro, zinco evitaminas) também podem regular a expressão genética.Existem também diversos componentes alimentares bio-ativos com capacidade de atuar como fatores de transcriçãoe que influenciam diretamente a expressão genética, onde seincluem os carotenóides, flavonóides, monoterpenos e osácidos fenólicos (13).

Os nutrientes afetam a expressão genética através demecanismos diretos ou indiretos. A maioria dos exemplosreferidos ocorre através de regulação direta. Contudo,nutrientes como a fibra dietética, submetida a um processo defermentação pelas bactérias intestinais, dão origem à produçãode compostos como os ácidos graxos de cadeia curta. Assim,estes subprodutos vão atuar como mensageiros secundáriospara influenciar a expressão genética. Embora a investigaçãonesta área seja ainda limitada, há muito interesse no que dizrespeito às fibras fermentáveis e aos seus efeitos noorganismo. Os relatórios preliminares destes trabalhoschamam a atenção de investigadores e veterinários para o fatoque deverão ser considerados não só os efeitos diretos que adieta poderá ter no animal, como também os efeitos sobre asbactérias intestinais e os efeitos indiretos decorrentesdessas alterações.

Em contraste com os testes de hereditariedade epigenética,que podem requerer ensaios de longa duração e envolvervárias gerações, a identificação de alterações relacionadascom nutrientes na transcrição ou na tradução pode serefetuada em um período de tempo bastante curto. Poderãoser observadas algumas diferenças após o consumo de uma

única refeição ou após alguns dias ou semanas deadministração de uma determinada dieta. No passado, osestudos desta natureza efetuados em cães e gatos erambastante restritos, devido ao número limitado de dados dosequenciamento genético destes animais. A maioria dostrabalhos centrava-se na resposta de um único gene ou deum pequeno grupo de genes relevantes para a doença oupara a via metabólica estudada.

A descoberta recente da sequência do genoma caninopermitiu aos investigadores desenvolverem chips demicroarray comerciais com capacidade de avaliar simul-taneamente milhares de transcrições genéticas, o queproporciona uma perspectiva global da expressão genética.Graças aos microarrays é possível identificar a “assinaturametabólica” ou a “assinatura da doença” do animal com baseno perfil de expressão genética. Dada a recente disponi-bilização dos testes arrays comercialmente, foramconduzidos um número limitado de ensaios na espéciecanina, particularmente relacionados com a nutrição oudoenças. Entre os trabalhos já publicados, muitos realizarama comparação de perfis de expressão genética de cãessaudáveis versus cães doentes, incluindo estudos sobreosteoartrite (OA) (14), câncer (15) e cardiomiopatiadilatada (CMD) (16).

A OA canina provoca a degeneração das cartilagens eevidencia problemas similares à displasia coxofemoral.Através de análises microarray realizadas à cartilagemarticular, o MIG-6 (gene responsivo ao impacto mecânico)foi associado à OA (14). Os pesquisadores aprofundaram aavaliação das concentrações de MIG-6 na expressão gené-tica, recorrendo à técnica de reação em cadeia pela poli-merase (PCR) em tempo real, de modo a validar os dadosdo array. Este estudo utilizou cães de raça Retriever doLabrador e cruzamentos de Retriever do Labrador eGreyhound, com maior ou menor predisposição para a OAem função dos resultados da subluxação dorsolateral. Foiconstatada uma elevada presença do gene MIG-6 nos cãesdo grupo de alto risco de OA, levantando também ahipótese que este gene possa regular a degradação eprodução de cartilagem nesta espécie (14).

O câncer é uma doença muito complexa que envolveinúmeras vias patológicas, pelo que constitui uma excelenteaplicação da tecnologia microarray. Os testes arrays sãoatualmente utilizados para investigar neoplasias em cães,após estudos preliminares para comparar o tecido dotumor com o tecido saudável (15). A CMD, outra doençacomplexa, foi também recentemente estudada através demicroarrays caninos. Uma investigação preliminar concluiu

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que as expressões genéticas envolvidas na produção deenergia celular, na sinalização, comunicação e estruturacelular, em geral, são inferiores em cães com CMD,comparativamente aos animais saudáveis (16). Emcontrapartida, os genes associados à defesa celular e àresposta ao estresse apresentavam uma regulação crescentena população doente. Estes estudos iniciais identificaramdiversos genes e vias envolvidos no desenvolvimento decâncer, OA e CMD e espera-se que possam ser utilizados emfuturos trabalhos para aumentar os conhecimentos sobre osprocessos patológicos e evidenciar objetivos terapêuticos.

Poucos estudos utilizaram microarrayspara avaliar os efeitosda dieta em populações saudáveis. No entanto, paracompreender totalmente os efeitos da nutrição sobre a saúdee sobre as doenças, é necessário recorrer aos efeitos globaisdas alterações no estado nutricional dos indivíduossaudáveis. Assim, o nosso laboratório conduz atualmenteuma investigação sobre os efeitos da idade e da dieta nosperfis de expressão genética de inúmeros tecidos relevantesdo ponto de vista do metabolismo e/ou no processo deenvelhecimento, incluindo o fígado, o cólon, o músculoesquelético, o córtex cerebral e tecido adiposo. Os resulta-dos preliminares deste trabalho encontram-se em fase depublicação e são fundamentais para originar novaspesquisas nutrigenômicas caninas e felinas. Devido a vastainformação e ferramentas sobre o sequenciamento dogenoma canino já disponível, são previsíveis grandesavanços na área da nutrigenômica durante a próximadécada. Apesar dos chips de microarray canino já seremcomercializados, o mercado ainda não dispõe de ummicroarray felino. À medida em que forem obtidos mais

dados sobre o sequenciamento do genoma felino eaumentar a procura destas ferramentas de pesquisa,certamente surgirão no mercado arrays felinos e produtossemelhantes.

O futuro da nutrigenética e danutrigenômica em Clínicas VeterináriasÉ difícil de prever o impacto da nutrigenômica no futuro dotratamento e nutrição dos animais de companhia, uma vezque depende diretamente dos avanços tecnológicos nessaárea. Questões de ordem econômica, ética e regulamentartambém irão arbitrar o ritmo da realização destes progressosbem como as tecnologias e estratégias adoptadas.Considerando-se que a saúde e a longevidade são primordiaispara cães e gatos, é provável que a prevenção controle outratamento de doenças. Assim, o futuro poderá passarpela inclusão de: 1) testes do genoma, para evitar ou limitar aprevalência de doenças genéticas, identificar populaçõessusceptíveis, determinar dietas ideais em função de umgenótipo específico e estabelecer o formato e dosagemfarmacêutica mais eficaz de acordo com o genótipo; 2)biomarcadores, para a detecção precoce de doenças eterapêuticas especialmente direcionadas; 3) nanoferra-mentas, para a análise rápida de biópsias tecidulares ouamostras sanguíneas.

Ainda que a análise genética ao nível do genomaconduzida em clínicas veterinárias possa estar ainda aanos de distância, sua utilização terá grande influênciana saúde nos próximos anos. Já foram identificadas maisde 400 doenças genéticas caninas e 250 felinas, muitasdas quais poderão ser consideravelmente influenciadas

INTERAÇÕES ENTRE NUTRIENTES E GENES: APLICAÇÃO À NUTRIÇÃO E SAÚDE DOS ANIMAIS DE COMPANHIA

Figura 5. Descoberta dos biomarcadores da doença.

Progressão da doença Biomarcador 1

Biomarcador 2 Biomarcador 3

Tempo

Amostra # 1 Amostra # 2 Amostra # 3

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INTERAÇÕES ENTRE NUTRIENTES E GENES: APLICAÇÃO À NUTRIÇÃO E SAÚDE DOS ANIMAIS DE COMPANHIA

pelas experiências de investigação do genoma (17;http://omia.angis.org.au/). O sequenciamento dosgenomas e o cruzamento de indivíduos, em função daausência de mutações genéticas responsáveis poderáajudar a erradicar muitas doenças.

Contudo, devido aos estrangulamentos genéticos ocorridosem diversas raças, este método de evitar potenciais doençaspoderá não ser possível nem desejável. Nesses casos, serápossível recorrer a intervenção precoce com programasnutricionais específicos (como é o caso da toxicose de cobre),para controlar ou minimizar o risco de doença. Odiagnóstico genético proporciona também informaçõesfundamentais sobre as formas e dosagens farmacêuticasmais adequadas.

Se por um lado as doenças genéticas constituemproblema considerável para diversas raças caninas e felinas,a grande maioria das doenças que afetam a saúde e alongevidade dos animais possuem natureza complexa.Apesar destas doenças se caracterizarem muitas vezes porum componente genético, a idade, o sexo e fatoresambientais como a dieta também desempenham um papelfundamental no seu desenvolvimento. No caso de doençasdificilmente identificáveis com base apenas em testesgenéticos, a utilização de biomarcadores para a sua detecçãoe caracterização precoce será de grande importância. Osbiomarcadores genômicos poderão ser observáveis antes doaparecimento dos sintomas clínicos, permitindo assim adetecção precoce e a identificação objetivos biológicosespecíficos. Encontra-se em realização no nosso laboratóriouma investigação sobre biomarcadores de doenças, queaumentam ou diminuem em função da progressão destas

(Figura 5) com o objetivo de desenvolver esse tipo deferramentas de diagnóstico.

Os avanços alcançados no campo da nanotecnologia tambémserão utilizados para complementar a prevenção de doençasou as estratégias terapêuticas referidas. Hoje é possívelrecorrer a pequenas biópsias de tecidos ou amostrassanguíneas para determinar o DNA, ou analisar a expressãogenética. A capacidade de utilizar as pequenas amostrasbiológicas para a análise genética ou de diagnósticocertamente irá aumentar no futuro. A natureza poucoinvasiva destes procedimentos abrirá novas vias para apesquisa, promovendo a utilização clínica destasferramentas.

Em uma época em que os cães e os gatos são cada vez maistratados como um membro da família ao invés de umsimples animal de companhia, não é de surpreender que asua alimentação e cuidados médicos sejam semelhantes àsdo ser humano. A identificação de perfis de PNU, de padrõesde metilação do DNA, de padrões ou assinaturas deexpressões genéticas que afetam ou respondem ao statusnutricional e/ou a doenças implicará muito tempo e recursosfinanceiros consideráveis, porém, os resultados serão muitocompensadores. À medida que novas tecnologias inovadorassão desenvolvidas e os respectivos custos diminuem,aumentará a utilização da biologia genômica nainvestigação e no cenário clínico.

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Entre os animais domesticados, o cão é a espécie commaior diversidade genética (mais de 350 raçasidentificadas). As raças diferem entre si em termos

morfológicos, como o tamanho e características comporta-mentais, em função dos padrões definidos pelos criadores.Também podem evidenciar atributos fisiológicos distintos.Contudo, não foram ainda elucidados os principais meca-nismos dos efeitos genéticos. Este artigo resume o conhe-cimento atual sobre a influência dos genes na função renal eas principais doenças genéticas renais caninas.

Efeito dos genes na função renalOs rins possuem diversas funções: função tubular (filtração,reabsorção e secreção), endócrina (síntese da eritropoietinae do calcitriol) e metabólica. O conhecimento sobre a açãodos genes nestas funções, assim como os potenciais efeitosdiagnósticos e clínicos (Figura 1) é ainda limitado.

Filtração glomerular Estudos conduzidos recentemente indicam que a taxa defiltração glomerular (TFG) no cão depende do porte e da raça(1). Foram medidos os níveis de depuração de creatininaexógena plasmática (recentemente validado como umindicador da TFG) em 386 cães saudáveis de diferentes raças.O valor médio da TFG situou-se em 3 ± 0,7 mL/min/kg, obser-vando-se uma considerável influência do tamanho do animal.Quanto maior era o cão, mais baixa era a TGF (Figura 2).Também foram constatadas algumas diferenças inter raciais.Assim, as conclusões preliminares parecem indicar que osgenes, direta ou indiretamente, afetam a função renal nos cãesde acordo com o porte. O valor limite de 1,8 a 2 mL/min/kgpara a TFG (abaixo do qual se considera a anormalmentebaixa) tem de ser reduzido para as raças gigantes (>45 kg) eaumentado para as raças pequenas (<10 kg) (1).

Adicionalmente, a creatinina é essencialmente eliminadapela filtração glomerular no cão, e em animais saudáveis, os

Aspectos genéticosda doença renal canina

Catherine Layssol, Yann Queau, Hervé LefebvreDepartamento de Ciências Clínicas, Escola Nacional deMedicina Veterinária de ToulouseCatherine Layssol é licenciada pela Escola Nacional de MedicinaVeterinária de Toulouse (França). Exerceu as funções deassistente no Departamento de Medicina Interna de CarnívorosDomésticos durante um ano e nos últimos seis é responsávelpela ultra-sonografia das clínicas da Escola Nacional de MedicinaVeterinária de Toulouse. A Dra Laysoll tem em curso um projetode pesquisa sobre a validação da ultra-sonografia renal e suapotencial utilização para detecção precoce de doenças renaissubclínicas (particularmente, doenças genéticas).

Yann Queau é licenciado pela Escola Nacional de MedicinaVeterinária de Toulouse. Atualmente desenvolve um projeto depesquisa interracial sobre a variabilidade da função renal de cãessaudáveis em canis de reprodução, efeitos da idade sobre afunção renal e validação dos métodos de ultra-sonografia renal.

O Dr. Lefebvre é Médico Veterinário e Professor de Fisiologiana Escola Nacional de Medicina Veterinária de Toulouse.Doutorou-se em 1994 e é diplomado pelo Colégio Europeu deFarmacologia e Toxicologia Veterinária. Hervé Lefebvre é autor demais de 60 artigos, de capítulos de livros e desenvolve trabalhoshá 15 anos sobre aspectos da função renal. O Dr. Lefebvreconduz atualmente um estudo sobre a biologia da creatinina e osignificado clínico da sua concentração plasmática como meioauxiliar para o diagnóstico precoce da insuficiência renal crônicaem diversas raças caninas.

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níveis referência das concentrações plasmáticas variam emfunção do tamanho e da raça (2). Assim, os valores dacreatinina plasmática são mais baixos nas raças miniatura(<10kg) que nas raças grandes (30 a 45kg) ou nas raçasgigantes (>45kg). É importante considerar estasdiferenças durante a elaboração de um diagnóstico, umavez que os valores referência deverão contemplar todas asraças. Por exemplo, em um cão de pequeno porte100µmol/L constitui um valor anormalmente elevado,enquanto que 140µmol/L pode ser um nível normal parauma raça gigante (>45kg) (Figura 3).

Outras funções renaisA informação disponível sobre o efeito dos genes em outrasfunções renais é bastante escassa. No Dálmata, por exemplo,o ácido úrico (um produto do catabolismo do nucleotídeopurina) é moderadamente reabsorvido pelo túbulo renal

proximal, ao contrário das outras raças em que a reabsorçãoé quase total. Um estudo demonstrou a variabilidade em termos defrequência da micção, volume diário e compo-sição da urinaentre um Schnauzer Miniatura e um Labrador Retriever,com administração do mesmo alimento (3) (Figura 4).

Doenças renais hereditárias Foram publicados vários ensaios sobre doenças renaiscaninas de origem genética (4,5).

Definições Seguem alguns termos utilizados para caracterizardoenças renais com possível origem genética.

Doença hereditária ou genética – doença transmitidaatravés do espermatozóide ou do óvulo. Em geral, asdoenças autossômicas dominantes distinguem-se dasdoenças autossômicas recessivas. O termo “autossômico”refere-se à mutação que provoca a distúrbio em um

Figura 1.Possíveis efeitos dos fatores genéticos na fisiologia renal.

FUNÇÃO RENAL

PARTICULARIDADES ESPECÍFICAS DA RAÇA

FisiológicaTaxa de filtração glomerular Funções tubularesFunções endócrinasProdução de urinaComposição da urina

DiagnósticoValores referência(ex.: creatinina)Exames funcionais(TFG)

FisiopatológicaDoenças renaisgenéticas

Predisposição para a DRC

Sensibilidade renal nodecurso de doença não renal

Figura 2.Efeito do porte na taxa de filtração glomerular no cão adulto.

Figura 3.Efeito do porte sobre o valor referência da creatinina plasmática emmg/L em cães adultos. (Valores expressos em µmol/L).

Taxa de filtração glomerular (mL/min/kg)1.5 2 2.5 3 3.5 4 4.5

Raças pequenas:1-10 kg

Raças médias:10-25 kg

Raças grandes:25-45 kg

Raças gigantes:>45 kg

5 (44) 9 (80)

5 (44) 12 (106)

7 (62) 18 (159)

7 (62) 17 (150)

Figura 4.Análise comparativa da produção de urina, número de micções pordia, pH urinário e concentração de cálcio urinário de 8 Retrevier doLabrador (azul claro) e 8 Schnauzers Miniatura (azul escuro), machose fêmeas saudáveis, com idades médias compreendidas entre 3 e 4anos e administração do mesmo alimento.

Segundo Lefebvre et al., 2006 (1).

Segundo Stevenson & Markwell 2001 (3)

Segundo Craig et al., 2006 (2).

Raças pequenas:1-10 kg

Raças médias:10-25 kg

Raças grandes:25-45 kg

Raças gigantes:>45 kg

25

20

15

10

5

0

1

0.8

0.6

0.4

0.2

0

32.52

1.51

0.50

6.66.56.46.36.26.16

5.9Volume de urina (mL/kg/dia)

Cálcio urinário (mmol/L) Micções (número/dia)

pH (unidades)

© (Hermeline / Aniwa)

© (Hermeline / Aniwa) © (Hermeline / Aniwa)

© (Hermeline / Aniwa)

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cromossomo não sexual. Nas doenças autossômicasdominantes (raras no cão), a progenitora afetada resultahabitualmente do cruzamento de animais saudáveis comheterozigotos portadores da doença. A doença poderá nãoter sido identificada durante a fase de reprodução e, porconsequência, o animal é denominado “portador saudável”.Estas doenças são transmitidas sequencialmente degeração em geração, ou seja, sem saltar nenhumageração. No caso das doenças autossômicas recessivas, oanimal afetado é homozigótico para o gene. Em contrastecom as autossômicas dominantes, as doenças autossômi-cas recessivas afetam, em geral, um ou mais membros damesma ninhada, mas não necessariamente da geraçãoanterior; progenitores saudáveis podem gerar criasafetadas. A maioria das doenças genéticas caninasdocumentadas são autossômicas recessivas. Os cãestambém apresentam doenças renais genéticas induzidaspor mutações, localizadas não nos autossomos, mas simno cromossomo X (ex.: a nefropatia hereditária dosSamoiedas provocada por um gene dominante).

Doença familiar – doença que afeta diversos indivíduosrelacionados entre si (i.e. da mesma família), com umafrequência superior à observada na população geral. Adoença familiar não possui necessariamente origemgenética (por ex.: a leptospirose em uma matilha decães).

Doença congênita – doença presente desde o nascimento,mas não necessariamente hereditária, (por ex. infecções,substâncias nefrotóxicas, etc.). Embora as causas da doençarenal genética possam divergir, na maioria dos casos oresultados clínico é a Doença Renal Crônica (DRC). Operíodo de manifestação dos sinais biológicos ou clínicosvaria de alguns meses (Samoieda) até alguns anos (BullTerrier).

Fatores extra-renais e doenças genéticasconcomitantes que afetam a prevalência dainsuficiência renalA função renal pode ser afetada por inúmeros fatoresgenéticos renais e extra-renais. A DRC manifesta-se commaior frequência em cães idosos do que em jovens adultos.A expectativa de vida depende da raça e do porte: émenor (média 7 anos) nas raças gigantes (>45kg) doque nas raças miniatura (<10kg) (média 11,2 anos) (6).A frequência da DRC clínica é mais elevada nas raças depequeno porte. A predisposição de determinadas raçaspara o desenvolvimento de doenças em outros sistemas,com efeitos renais, pode explicar a frequência maiselevada de DRC nessas raças. Por exemplo, os Poodles

evidenciam maior predisposição para a doençadegenerativa valvular e para a Síndrome de Cushing,duas doenças que reduzem indiretamente a funçãorenal. O Retriever do Labrador e o Golden Retrieverpossuem um risco mais elevado de desenvolver lesõesrenais devido a infecção por Borrelia burgdorferi, comuma incidência 6,4 e 4,9 vezes superior, respectivamente,que as outras 15 raças estudadas (7).

Doenças genéticas renais variadas As principais doenças renais de origem genética sãoapresentadas na Tabela 1, podendo ser agrupadas deacordo com a natureza e o local da lesão.

Amiloidose renalA amiloidose abrange um grupo de doenças caracte-rizadas pela deposição extra-celular de material fibrilar,originado em proteínas beta, e com estrutura de folha pre-gueada, que se tornam insolúveis. Esta doença é detectadaatravés de análises histológicas utiizando a coloraçãoVermelho Congo. As raças caninas que revelam maiorpredisposição são Beagle e Shar Pei. Manifesta-segeralmente na idade adulta, sobretudo em cães idosos, ecaracteriza-se por uma proteinúria acentuada, hiperco-lesterolemia, hipo-albuminemia e TFG reduzida. Na raçaShar Pei, já foram relatados episódios discretos deedema articular e hipertermia.

Lesão da membrana basal glomerular Diversas raças apresentam esta lesão, que se caracterizapelo espessamento da membrana basal glomerular. NoBull Terrier e no Dálmata, a transmissão é autossômicadominante, enquanto no Cocker Spaniel é autossômicarecessiva. No Samoieda a transmissão está associada aocromossomo X. O primeiro sinal biológico desta doençaé a proteinúria, que surge antes de qualquer sintomaclínico. A idade de aparecimento dos sintomas biológicose clínicos é muito variável. No Bull Terrier, por exemplo,a doença é observada principalmente em animais adultos,algumas vezes em cães idosos. No entanto, na raçaSamoieda, os cães afetados raramente ultrapassam os7 ou 8 meses de vida. Foi desenvolvido, recentemente,um teste molecular para o diagnóstico da mutação noCocker Spaniel.

Glomerulonefrite membrano-proliferativaA definição de glomerulonefrite membrano-prolife-rativa é histológica. As lesões incluem proliferaçãocelular mesangial, com células polimorfonucleares emacrófagos, e acúmulo de material e depósitos deorigem membrano-mesangial. Os sinais clínicos e

ASPECTOS GENÉTICOS DA DOENÇA RENAL CANINA

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biológicos são idênticos à DRC. A origem genética destedistúrbio já foi demonstrada em diversas raças.

Doença renal policísticaA doença renal policística caracteriza-se pela presençade cistos, em número e tamanhos variáveis, no tecidorenal e já está documentada em Bull Terriers, CairnTerriers e West Highland White Terriers. Trata-se de umadoença autossômica dominante no Bull Terrier eautossômica recessiva nas outras duas raças. Noprimeiro caso, geralmente é associada a anomalias nasválvulas mitral e aórtica, e também a displasia mitral,mas sem presença de cistos hepáticos. No Cairn Terrier

são observáveis cistos tanto nos rins como no fígado.Enquanto no Bull Terrier os sinais clínicos podemmanifestar-se em adultos jovens, no Cairn Terrier e noWest Highland White Terrier os sintomas surgem entre oprimeiro e o segundo mês de vida, podendo verificar-se apresença de cistos sem qualquer sinal clínico ou biológico.

Displasia renalO termo displasia renal refere-se a qualquer lesão resultantede um desenvolvimento anômalo dos rins. Em geral, oexame histológico revela glomérulos imaturos, prolife-ração adenomatosa do epitélio dos ductos, assim comolesões renais secundárias (glomeruloesclerose, fibroseintersticial, pielonefrite). A displasia renal já está descritaem numerosas espécies, e apresenta sinais clínicos ebiológicos idênticos aos da DRC. Esta doença afetafilhotes e adultos jovens.

Cistadenocarcinoma renal multifocal Foi descrita no Pastor Alemão uma síndrome cancerígenaque associa o cistadenocarcinoma renal multifocal com adermatofibrose nodular e se caracteriza por tumores renaisbilaterais multifocais, inúmeros tumores cutâneos e sub-cutâneos, e nódulos com leiomioma uterino. Esta doençaé autossômica dominante e já foi identificado um genemutante.

Lesão tubularA síndrome de Fanconi constitui a lesão tubular melhordocumentada em medicina canina. Foi descrita sobre-tudo na raça Basenji, mas também no Elkhound Norueguêse, com menor frequência, no Shetland e no Schnauzer. Estadoença caracteriza-se por múltiplas deficiências dereabsorção nos túbulos proximais, que dão origem apoliúria/polidipsia, glicosúria sem hiperglicemia, amino-acidúria, isostenúria e acidose metabólica hiperclorêmica.A DRC manifesta-se habitualmente nas fases mais avançadasda doença. Geralmente, o diagnóstico é realizado entreos 4 e os 7 anos de vida, embora os sinais clínicos possamsurgir mais cedo. Os estudos conduzidos apresentam taxasde sobrevivência variáveis, porém, graças à introduçãoimediata de terapêutica nutricional na fase de detecção, aesperança de vida pode chegar a 5 anos após o diagnóstico(8). As alterações dietéticas têm como objetivo corres-ponder as necessidades nutricionais e energéticas dopaciente, aliviar os sintomas clínicos e as consequências dauremia, minimizar os distúrbios de fluídos, preservar oequilíbrio eletrolítico, vitamínico, mineral e ácido-básico, eevitar a progressão da insuficiência renal.

Doenças Raças afetadasAmiloidose Beagle

Shar PeiLesão da Bull Terriermembrana basal Cocker Spaniel Inglêsglomerular Dálmata

Doberman PinscherSamoieda

Glomerulonefrite BerneseBulmastifeSpaniel BretãoRottweilerSoft-coated Wheaten Terrier

Doença policística Bull Terrierrenal Cairn Terrier

West Highland White TerrierDisplasia renal Malamute do Alasca

BoxerElkhound NorueguêsChow ChowGolden RetrieverLhasa ApsoSchnauzer Miniatura Shih TzuSoft-coated Wheaten TerrierPoodle Standard

Cistadenocarcinoma Pastor AlemãomultifocalLesão tubular Basenji(síndrome de Fanconi) Elkhound NorueguêsCistinúria Terranova

Retriever do Labrador BuldogueMastife

Tabela 1.Principais doenças renais caninas de origem genética

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Cistinúria A cistinúria consiste numa excreção urinária anormal deum aminoácido: a cistina. Em condições fisiológicasnormais, os aminoácidos filtrados pelos glomérulos sãototalmente reabsorvidos pelos túbulos renais. Embora aexcreção excessiva possa dar origem à formação decálculos, especialmente em machos, o seu efeito podepermanecer subclínico e nunca evoluir para uma doençadeclarada. Esta afecção foi estudada sobretudo noTerranova, com transmissão autossômica recessiva, e foitambém observada em outras raças, como o Labrador, oBuldogue e o Mastife. A presença de cistina na urina édetectável através do teste de nitroprussiato de sódio. Jáfoi desenvolvido um teste molecular para os Terranova eRetriever do Labrador, para identificação de animaisdoentes e portadores.

Doença renal hereditária: diagnósticoe tratamentoDiagnósticoO diagnóstico das doenças renais genéticas processa-seem duas fases: 1) confirmação da doença renal;2) identificação do envolvimento genético.

Diagnóstico da insuficiência renal O diagnóstico da doença renal é elaborado com base naanamnese e exame clínico, em análises indiretas noplasma e urina, no diagnóstico por imagem, em examesfuncionais e biópsias. Neste artigo, abordaremos apenasos métodos de diagnóstico utilizados para determinar adoença renal genética.

AnamneseDeve suspeitar-se de doença renal genética em qualquercaso de DRC observado em filhotes ou jovens adultos. Porconseguinte, é necessário checar se a DRC foi adquiridaem consequência de infecção ou de nefrotoxicidade.Embora seja importante considerar o fator racial(predisposição), outras raças, incluindo cães mestiços,podem apresentar doenças renais genéticas, algumasdas quais podem afetar animais idosos (amiloidoserenal). Os sintomas clínicos são idênticos aos da DRC:poliúria/polidipsia, anorexia, perda de peso, debilidademuscular, desidratação, vômito, entre outros. Os filhotesevidenciam atrasos de crescimento. A evolução clínica évariável, a doença pode manter-se estável ou evoluirrapidamente, sobretudo em cães jovens.

Parâmetros plasmáticos e urináriosA urina é frequentemente isostenúrica, mas pode ocorrer

um decréscimo da densidade urinária em uma fase tardiada progressão da doença renal genética. É possíveldetectar a proteinúria nas fases iniciais. Foram recente-mente publicadas algumas recomendações relativas àmensuração e interpretação da proteinúria (9). Aglicosúria e aminoacidúria são igualmente observáveis nasíndrome de Fanconi.

A avaliação dos valores referência para as concentrações deplasma ou de creatinina sérica é considerada o melhorparâmetro sanguíneo indireto da função renal. A fase daDRC também pode ser determinada através dos valores dacreatinina, de acordo com os critérios propostos pelaInternational Renal Interest Society (10). Os níveis referênciada creatinina sérica devem ser interpretados em função doporte do animal. Caso se suspeite de doença genética, deverámensurar-se regularmente os níveis de creatininaplasmática (i.e. com intervalos de 3 a 6 meses, emanimais adultos), para detectar qualquer aumentogradual, incluindo no intervalo referência para a creatinina.Os outros indicadores sanguíneos são os utilizados para aDRC.

É mais difícil interpretar os resultados das análises deurina e plasma de filhotes uma vez que é necessáriocontemplar suas especificidades fisiológicas. Emcondições fisiológicas normais, a densidade urinária dosfilhotes é mais elevada do que a dos animais adultos(11). Por exemplo, uma densidade urinária de 1,025revela maior alteração na capacidade de concentrar a urinaem filhotes do que em adultos. Durante a fase decrescimento, o nível de creatinina plasmática dos filhotessaudáveis aumenta gradualmente, dificultando a inter-pretação de mensurações sucessivas.

Diagnóstico por Imagem O diagnóstico por imagem também pode revelar-se bastanteútil. A radiografia renal e a ultra-sonografia (Figura5) são os exames utilizados com maior frequência e autilização destas técnicas foi já analisada em diversosartigos (12,13). A radiografia permite observar a forma etamanho dos rins. A ultra-sonografia é recomendadaem caso de suspeita de doença renal hereditária,principalmente displasia renal e doença policística. Oscritérios para a avaliação de uma ultra-sonografia são: apresença de lesões difusas ou localizadas, ecogenicidade,estrutura, tamanho e forma. No caso da displasia renal, aestrutura do rim apresenta-se desorganizada e, geralmente,é observável um aumento da ecogenicidade e da espessurado córtex. Os cistos renais apresentam a forma decavidades anecogênicas e são frequentemente observados

ASPECTOS GENÉTICOS DA DOENÇA RENAL CANINA

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no córtex. O tamanho dos rins depende da idade e da raça doanimal, o que dificulta a interpretação dos resultados. Noentanto, é importante considerar que as lesões renais nemsempre são acompanhadas de insuficiência funcional. Algunsanimais com lesões renais, detectadas por ultra-sonografia,podem permanecer em uma fase subclínica durante muitotempo.

Exames funcionaisA avaliação proporcionada pelos indicadores indiretosda função renal raramente possui a sensibilidadenecessária para detectar a insuficiência renal precoce.Em caso de suspeita de DRC, em que essa hipótese nãopossa ser confirmada ou excluída através de análises derotina do plasma e urina, preconiza-se a determinaçãoda TFG. Em termos nefrológicos, a TFG constitui omelhor indicador da função renal, cuja determinaçãopoderá ser realizada na clínica, através da mensuraçãodos níveis de depuração da creatinina ou do iohexol noplasma. Este procedimento consiste na administraçãoendovenosa de um marcador e na colheita sucessiva deamostras sanguíneas durante algumas horas. Adepuração (que representa a TFG) é então calculadadividindo-se a dose injetada pela área abaixo da curvadas concentrações plasmáticas (14). Os valores obtidospara a TFG devem ser interpretados em função do portedo animal . Em filhotes a interpretação é mais complexa,uma vez que a TFG é mais elevada (11). O exame funcionalmais adequado para confirmar o diagnóstico dedeficiência tubular consiste na determinação das fraçõesde excreção de eletrólitos e aminoácidos, que apresentam

valores muito altos. Entretanto, as frações de excreção são dedifícil interpretação e requerem condições padronizadas.

Biópsia renalPara caracterizar a natureza e a gravidade das lesõesrenais é necessário realizar a um exame histológico. Esteprocedimento não é realizado na prática clínica,sobretudo devido ao risco de complicações associadas àbiópsia, que ocorrem em cerca de 13% dos casos (15). Ométodo utilizado com maior frequência é a biópsia poragulha, orientada por ultra-sons, sob anestesia geral. Emfilhotes, a biópsia pode ser repetida de dois em dois mesescom um risco mínimo de induzir artefatos na interpretaçãodas lesões ou alterar a função renal (16). A análise idealda biópsia renal requer a observação da amostra através deum microscópio óptico (exame básico), por imuno- histo-química e microscópio eletrônico (avaliação ultra-estrutural). Alguns laboratórios fornecem kits especiaispara preparação de amostras. Recentemente forampublicadas algumas recomendações relativas à colheita epreparação de amostras (17).

Identificação do caráter genético da doença renalA estratégia para o diagnóstico da doença renal hereditáriavaria caso se trate de um proprietário ou de um criador. Naprática clínica, é difícil identificar o caráter genético de umadoença, portanto deve recorrer-se aos serviços de umespecialista em genética. Recomendamos, também, a leiturados artigos recentemente publicados sobre este tema(18,19).

No caso de um cão que pertença a um proprietário, éaconselhável tentar contatar o criador ou os proprietáriosdos progenitores ou dos irmãos da ninhada. Este proce-dimento é necessário para determinar um eventual carátergenético da doença, na ausência de testes genéticos. Noentanto, é difícil convencer os proprietários, bem como osveterinários assistentes, a cooperar, uma vez que aidentificação dos aspectos genéticos da doença é umprocesso trabalhoso e sem qualquer implicação terapêutica.Deverão ser analisados os dados familiares de vários animais(genealogia e se possível uma amostra de DNA).

Para os criadores, trata-se obviamente de uma questãoimportante, uma vez que o diagnóstico é fundamental para oestabelecimento de recomendações que evitem a trans-missão da doença à progenitora. As medidas a seremadotados pelo criador irão depender de diversos fatores,incluindo o modo de transmissão, se conhecido, apossibilidade de efetuar testes genéticos de diagnóstico, adimensão e diversidade do capital genético, e a

Figura 5. Ultrassonografia renal.

A. Cisto renal

B. Displasia renal

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prevalência da doença em canis.

Se apenas estiver implicado um único gene dominante,todos os portadores estarão afetados e, por consequência, osanimais não devem ser utilizados para reproduçao. A idadede aparecimento dos sinais clínicos constitui um fatorfundamental: se surgirem antes da maturidadesexual, o animal não deve ser selecionado para repro-dução. Em contrapartida, se os sinais clínicos se manifesta-rem no adulto, o animal poderá ter tido inúmeras crias oumorrer de outra doença antes de surgirem quaisquer sinaisindicativos de uma doença genética.

Se o gene não for dominante, a seleção é maisproblemática. O animal pode ser um portador são, ou seja,uma espécie de reservatório do alelo recessivo. Através deum teste genético para portadores saudáveis, é possívelexcluir da reprodução os animais afetados, uma vez que ocruzamento de um portador saudável com um portadornão saudável irá aumentar o número de animais portadoressaudáveis, propagando assim a anomalia. Contudo, estasrecomendações simples nem sempre são observadas, devidoao valor intrínseco dos cães reprodutores e de outroscritérios de seleção valorizados pelos criadores, bemcomo à eventual presença de outras doenças genéticasna raça em questão.

A análise genética pode ser utilizada como forma deidentificar os animais afetados e os portadores antes doaparecimento de sinais clínicos e laboratoriais. É importanteutilizar o teste especificamente desenvolvido para cada raça,uma vez que a mutação responsável pode ser diferente deoutra raça. Se a doença for de caráter poligênico, dificultaa seleção de cães para a reprodução. Fatoresambientais (i.e. consumo de água, exercício) podemtambém afetar a expressão clínica.

ConclusãoNão se conhece ainda em profundidade a relação existenteentre os genes e a função renal, mas sabe-se que poderá terum grande impacto na fisiologia renal. A identificação dadoença renal genética em algumas raças evidencia anecessidade de se considerar as pesquisas recentesconduzidas na área da nefrologia. Tem-se observado umaprocura crescente de laudos genéticos em relação a doençasrenais, principalmente por parte de associações de raçascaninas.

Os autores agradecem a valiosa contribuição do ProfessorAlain Ducos, geneticista da Escola Nacional de MedicinaVeterinária de Toulouse.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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PONTO DE VISTA ROYAL CANIN

IntroduçãoInicialmente, os alimentos comerciais para cãesprocuravam suprir as necessidades nutricionaismínimas combase em ensaios conduzidos em Beaglesem condições laboratoriais. Entretanto, a oferta deprodutos tem sofrido uma rápida e consideráveldiversificação e, atualmente, são contemplados inú-meros fatores passíveis de influenciar as necessidadesnutricionais: idade, crescimento, condição física(influenciada pelo status sexual), atividade e estilo devida, estado de saúde, sem esquecer o porte do cão emais, recentemente, a raça.

A extrema heterogeneidade desta espécie animalincentivou o estudo das diferenças anatômicas efisiológicas das raças caninas. De fato, as necessi-dades nutricionais de um Yorkshire, que em 8meses, multiplica o seu peso ao nascimento 20vezes, não são idênticas às de um Mastife, que leva18 a 24 meses até atingir o tamanho adulto, duranteos quais multiplica por 100 vezes o peso com quenasceu.

Para diferenciar os alimentos de acordo com otamanho do animal, princípio óbvio durante a fasede crescimento, foram analisadas as diferençasentre os cães adultos de distintas raças:

• As necessidades energéticas são calculadas semprecom base na mesma equação padrão?

• As capacidades digestivas são idênticas em cadaraça?

• As necessidades nutricionais são influenciadaspelo tipo de pele e pelagem?

• Os riscos de doenças e a expectativa de vida, quevariam em função do porte e da raça, deverão serconsiderados antes de se desenvolverem sinaisclínicos?

A pesquisa conduzida com o objetivo de responderestas questões permitiu desenvolver a abordagemda nutrição canina. A perspectiva nutricionalcoletiva tem sofrido transformações progressivas,tendo passado a contemplar o porte do animal emuma primeira fase, e posteriormente o fator raça. Opresente artigo pretende demonstrar como a

Raça: um parâmetrofundamental em nutrição canina

Pascale Pibot, DVM Grupo Royal Canin, Aimargues, FrançaPascale Pibot é graduada pela Escola Nacional de MedicinaVeterinária de Nantes (França) e ingressou na Royal Caninem 1987. Dentre os diversos cargos desempenhados,destacam-se: monitorização técnica de reprodução canina,formação interna e comunicação científica para médicosveterinários e criadores de cães. Atualmente, exerce asfunções de responsável pelas publicações científicas paracriadores e veterinários do departamento de Comunicaçãoda Royal Canin.

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compreensão dos riscos relacionados com umadeterminada raça pode conduzir a uma melhorutilização dos aspectos preventivos da nutrição.

Observar a cinética da ingestão decada cão e adaptar o croquete emconformidadeO tamanho, a forma e a textura dos croquetesconstituem os primeiros parâmetros que devem seradaptados à raça do animal, com três objetivosprincipais: facilitar a preensão do alimento, controlara velocidade de ingestão e prevenir a ocorrência dedoença periodontal.

Facilitar a preensão do alimentoOs cães dolicocéfalos possuem arcadas dentáriassobrepostas, semelhantes a lâminas de umatesoura, e evidenciam sempre uma retração dealguns milímetros na arcada inferior. No entanto, aface dos cães braquicéfalos é mais curta, fato queleva a um prognatismo da mandíbula eposicionamento alternativo dos dentes na maxila(Figura 1).

Se não houver contato entre os incisivos, o cão teráde utilizar a língua ou os dentes laterais paraprender o alimento. Consequentemente, terá ten-dência a ingerir rapidamente os croquetes o quepressupõe um maior risco para torção-dilatação

gástrica em cães de caixas torácicas profundas,com maior predisposição natural para desenvolveressa síndrome (1).

Assim, as características físicas do croquete devemser adaptadas ao tamanho e à forma das mandíbulasdo cão, para permitir a fácil preensão do alimentoe, simultaneamente, evitar a sua desagregação, bemcomo movimentos de deglutição desnecessários.

Controlar a velocidade de ingestãoAlgumas raças caninas evidenciam um comporta-mento alimentar particularmente voraz. Emboraseja uma característica canina natural, pode serbenéfico reduzir a velocidade de ingestão. Aadministração de croquetes ao Dogue Alemão comum tamanho mínimo de 3 cm, constitui uma formade forçar o animal a mastigar antes de os ingerir, oque limita o risco de aerofagia, fator predispo-nente a dilatação gástrica (2).

Outra vantagem adicional do controle da velocidadede ingestão reside no estímulo da saciedade, devidoao prolongamento do tempo necessário à refeição.Em cães com predisposição para o aumento de peso,os croquetes de grandes dimensões e baixadensidade proporcionam um maior volume dedosagem e, portanto, uma ingestão calóricaadequada.

Prevenção da doença periodontalA doença periodontal afeta todos os cães ao longoda vida, com diferentes graus de gravidade deacordo com o porte e a raça do animal. Estaafecção manifesta-se de forma mais precoce emais grave em cães com peso inferior a 10kg(3). Uma das razões que explicam o maior risco éuma atividade de mastigação reduzida: frequente-mente as refeições destes animais são compostaspor alimentos com uma consistência pastosa(alimentos caseiros ou industrializados úmidos)que não produzem a ação de escovação necessáriapara combater a placa dentária. Além disso, amaioria dos cães que vivem em ambientesfechados têm poucas oportunidades de morder outransportar objetos.

Figura 1. Implantação dentária na mandíbula superior do PastorAlemão e do Buldogue Inglês, respectivamente.

Maxila do Pastor Alemão Maxila do Buldogue Inglês

O prognatismo que caracteriza o Buldogue deu origemao reposicionamento e rotação gradual do 3º e 4º

pré-molares o que dificulta a oclusão e a mastigação.

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PONTO DE VISTA ROYAL CANIN

Entre os cães de pequeno porte, algumas raçasespecíficas evidenciam maior incidência destadoença. Por exemplo, os problemas dentários são aprincipal razão das consultas veterinárias da raçaYorkshire Terrier, de qualquer idade (4). Nestaraça, os dentes decíduos permanecem na gengivadurante um período de tempo excepcionalmentelongo, provocando um alinhamento e uma orien-tação dentária imperfeita, uma vez que as duasarcadas não se unem corretamente.

A forma e a textura de um croquete especifi-camente elaborado para um determinado tipo decão pode favorecer o efeito de escovação passivo, eregular. É importante garantir a penetração sufi-cientemente profunda do dente no croquete sem

que se produza uma fragmentação rápida (Figura2). Esta ação de escovação ajuda a reduzir aformação da placa bacteriana.

Aperfeiçoar o cálculo dasnecessidades energéticas para otimizar a manutenção do pesoMesmo em cães com pesos corporais similares sãoobserváveis amplas variações das necessidadesenergéticas de manutenção entre raças distintas.Por exemplo, é o caso do Dogue Alemão que requerum aporte adicional de cerca de 50% das caloriascontabilizadas apenas com base no peso vivo (5,8).O pêlo curto e a massa muscular características destaraça explicam suas elevadas necessidadesenergéticas. (Figura 3). Os músculos consomemmuito mais energia do que a massa gorda, mesmose a atividade física do cão for moderada.

Para preservar uma condição corporal ótima, oDogue Alemão requer uma dieta rica em energia.Uma concentração energética elevada em umalimento significa que permite reduzir o volume dadosagem para evitar a ingestão de quantidadesexcessivas, fator de risco da torção-dilatação doestômago, e para a função digestiva em geral. Emcontrapartida, o Labrador possui uma composiçãocorporal rica em massa gorda e um risco elevado deobesidade. Algumas medidas podem ajudar a evitara sobrecarga ponderal desta raça: uma razãoproteico-calórica elevada, utilização de cereaiscom um índice glicêmico moderado e aincorporação de L-carnitina, por exemplo.

Figura 2. Força necessária para fragmentar o croquete: análisecomparativa de dois produtos distintos (Royal Canin 2003).

O segundo croquete (específico) é bem mais macio que oprimeiro. Contudo, oferece maior resistência à pressão antes dese fragmentar, o que permite uma penetração mais profunda

do dente.

n°1: Produto standard para cães de raças pequenasn°2: Croquete especificamente elaborado para promover

a mastigação de cães de pequeno porte

Força N

50

40

30

20

10

0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0Profundidade da penetração

O Dogue Alemão possui mais massa magra que os outros cães de raças grandes e gigantes. Os dados relativos aoDogue Alemão são bastante similares às medidas de Lauten, et al. (10), que quantificou a massa magra desta raça em

79.7 ± 3.9%, através de Absorciometria por Raio X de Dupla Energia (DEXA).

100

80

60

40

20

10

0Dogue Alemão Pastor Alemão Beauceron São Bernardo Golden Retriever Labrador Terranova

(6) (12) (6) (3) (3) (8) (2)

Mas

sa m

agra m

édia (%

) 81.578.1 78.1

73.1 72.3 65.860.7

Figura 3.Comparação entre a proporção de massa magra da composição corporal de cães de raças grandes e gigantes (Dados não publicados - Centro de Investigação Royal Canin).

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Identificar a sensibilidade digestiva De um modo geral, os cães de raças grandesapresentam fezes com um teor de umidade maiselevado e menos bem formadas do que os cães demenor porte (6). Dois fatores explicam claramentea sua reduzida tolerância digestiva:

• Grande permeabilidade do intestino delgado, quefavorece o retorno do sódio ao intestino após aabsorção durante o processo digestivo (7). A pre-sença de concentrações elevadas de sódio nesteórgão estimula o fluxo osmótico da água para ointestino grosso e consequentemente aumenta oteor de umidade das fezes.

• Trânsito prolongado no cólon, que favorece afermentação bacteriana de resíduos não digeridos.O trânsito no cólon representa 80 a 90% dotempo de trânsito total: cerca de 40 horas no casodo Dogue Alemão, comparativamente a 24 horasem Poodle Toy (9) (Figura 4).

No que diz respeito às raças sensíveis é importanteprocurar facilitar a digestão no intestino delgado deforma a reduzir o processo de fermentação no cólon.Os resultados em termos da qualidade das fezes sãorapidamente observáveis com um limiar máximo de10% de proteínas indigeríveis no alimento, o queimplica em seleção muito rigorosa da fonte proteica.

A quantidade e variedade das fibras a incluir nadieta também variam em função do tipo de cão. Acarência em imunoglobulina A (IgA), anticorpoespecífico para defesa da mucosa contra infecções, é

frequentemente observada no PastorAlemão. Nesta situação, aincorporação simultânea de fruto-oligossacarídeos (FOS) e manano-oligossacarídeos (MOS) constitui umasolução interessante, uma vez que osMOS estimulam a produção de IgA(11).

Em cães com uma atividade fermen-tativa naturalmente elevada (p.ex. oBoxer, o Buldogue, etc.), uma ingestãoexcessiva de fibras fermentáveis(FOS) pode provocar a produção defezes amolecidas. Deste modo e nocaso destas raças, é preferível utilizar

fibras como a polpa de beterraba, que secaracterizam por uma degradação mais lenta.

Otimizar a qualidade da pelagemespecífica de cada raçaA pelagem é formada por 95% de proteínas parti-cularmente ricas em tio-aminoácidos que entramna composição da queratina. A renovação da pele edo pêlo representa cerca de 35% das necessidadesdiárias em proteínas de um cão adulto (12). Qual-quer carência pode dar origem a uma pelagemopaca, quebradiça e despigmentada e quanto maiselevado for o nível de produção de pêlos maior seráo risco de potenciais carências. As raças caninascom pelagem de crescimento rápido, como oYorkshire Terrier, o Maltês, o Shih Tzu ou o LhasaApso evidenciam maior predisposição para estetipo de problemas.

Os lípideos que entram na composição da oleosidadesão específicos da espécie e raça em questão: oLabrador possui uma pelagem particularmenteimpermeável porque produz 5 vezes mais oleosidadeque um Poodle (13). A produção e a qualidade daoleosidade são influenciadas pela nutrição, sobretudono que diz respeito à quantidade e tipo de ácidosgraxos essenciais contidos no alimento.

A beleza da pelagem está diretamente relacionadacom a saúde da pele, e neste ponto, a raça constituitambém um fator. Se a pelagem for regularmentetosada, a velocidade da renovação das células daepiderme aumenta, passando, em média, de 22para 15 dias (14). Algumas raças possuem umpH cutâneo elevado, que favorece a proliferação

RAÇA: UM PARÂMETRO FUNDAMENTAL EM NUTRIÇÃO CANINA

Figura 4.Comparação entre a duração total do trânsito gastrintestinal de um Dogue Alemão e outroscães de distintas raças e tamanhos (Extraído de Hernot, et al., 2005).

As letras (a,b,c,d) assinalam diferenças significativas entre os grupos (p<0.05). O tempo total do trânsito digestivo de um Dogue Alemão representa o dobro

do trânsito digestivo de um Poodle Toy.

60

50

40

30

20

10

0Poodle Schnauzer Schnauzer DogueToy Standard Gigante Alemão

Horas

22.9

32.8

55.1

43.2

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14. Baker BB, Maibach HI, Park RD. Epidermal cell renewal in dogs after clippingthe hair. Am J Vet Res 1974; 35(3): 445-446.

15. Matousek JL, Campbell KL. A comparative review of cutaneous pH. VetDermatol 2002; 13: 293-300.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

bacteriana. Esta característica pode explicar aacentuada frequência de piodermite no PastorAlemão (15).

É possível adaptar a resposta nutricional a cadasituação de forma a proporcionar uma soluçãoespecífica para um risco potencial, por exemplo:• um alimento enriquecido com ácido linoléico(precursor de ácidos graxos essenciais da sérieÔmega 6) ajuda a reequilibrar a película lipídicasuperficial em caso de exposição cutânea elevada(ausência de sub-pêlo, por exemplo)

• o teor acrescido em ácido gama-linolênico (GLA)permite reduzir a irritação cutânea, tal como nocaso da atopia. A eficácia do GLA aumenta se estefor associado a ácidos graxos Ômega 3 de cadeialonga que reduzem a inflamação.

• otimização dos níveis de vitamina A paracombater a seborréia.

Ajudar a prevenir algumas doençasO conceito de nutrição preventiva adquire cada vezmais sentido quando se considera riscos ospatológicos relacionados com a raça do cão. Aliteratura veterinária atual é rica em dados sobre asensibilidade de certas raças a algumas doençasespecíficas (4). A melhor compreensão dos riscospermite aplicar respostas nutricionais que ajudam aretardar ou a evitar o desenvolvimento de certasdoenças. Não se enquadra no âmbito do presenteartigo revisar exaustivamente as afecções relacio-

nadas com uma raça específica. Contudo, poderemoscitar como exemplos, as doenças cardíacas no Boxer,os distúrbios da motilidade intestinal do Teckel, osriscos de urolitíase do Schnauzer Miniatura e umagrande variedade de doenças degenerativas(catarata, insuficiência renal, doença crônica dasválvulas cardíacas, etc.) que se manifestamsobretudo em cães de pequeno porte, os quaisapresentam expectativa de vida maior. É possívelresponder a todos estes exemplos através deadaptações nutricionais específicas.

ConclusãoA nutrição clínica é uma área em franco desenvol-vimento, tal como se pode comprovar pelo númerode artigos científicos sobre o tema: 2748 publicaçõessobre nutrição e saúde em 2005, comparativamentea apenas 1331 em 1995, o que representa o dobrodos trabalhos científicos no espaço de 10 anos.Atualmente, a nutrição canina é ambiciosa. Ela nãose limita a suprir as necessidades nutricionais docão, mas procura também melhorar o estado geralde saúde do animal antecipando potenciais riscospassíveis de afetar o seu bem-estar e longevidade. Oalimento adaptado à raça representa um novoavanço, que leva em consideração as necessidadesespecíficas de cada animal.

RAÇA: UM PARÂMETRO FUNDAMENTAL EM NUTRIÇÃO CANINA

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Até o desenvolvimento da ciência genômicaas raças caninas podem ser classificadasem três grupos de características, i.e. tipo

morfológico, pelagem e aptidões. Os primeirosdois são facilmente perceptíveis e constituem osprincipais elementos do fenótipo observado. Esteartigo objetiva analisar a forma como, de umantepassado selvagem com uma aparênciarelativamente homogênea, foi possível chegar àextraordinária diversidade atual das raças caninas.Optamos por uma perspectiva generalista, às vezesapoiando-nos na probabilidade e na lógica aoinvés de simples fatos cientificamente estabele-cidos. No futuro, a genética molecular trará maisinformações sobre outros pontos mas, atualmente,encontra-se na fase de coleta de dados muito cedopara seu desenvolvimento. Neste trabalho,abordaremos os fatores relacionados com apelagem, uma vez que o determinismo genéticodesses grupos não é idêntico.

Tipo morfológico Baron é a mais importante referência da tradiçãocanina francesa. Suas teorias chegaram até aosnossos dias através do seu discípulo Dechambre (1).Na sua opinião, para caracterizar a morfologiaexterna dos animais é necessário considerarsucessivamente o perfil (contorno do indivíduoobservado de lado), as proporções (relação entreas diferentes partes do corpo e como um todo,observado de lado e de frente), e a forma (altura epeso). Nenhuma outra espécie apresenta tantasvariações relacionadas a todos estes parâmetroscomo o cão, fato que pode ser explicado por diversosfatores.

Do lobo ao cão:Diversidade fenotípicaobservável nas raças caninas

Bernard Denis, DVMO Professor Bernard Denis graduou-se na Escola Nacional deMedicina Veterinária de Alfort em 1967. Iniciou na cadeira deZootecnia e Economia Rural em 1969. A partir de 1979desempenhou as funções de Diretor de Departamento na Escola de Medicina Veterinária de Nantes. Embora aposentado da carreira docente em 2002, o Professor Bernard Denisdesempenha ainda diversas atividades: é Presidente da sociedadeEtnozootécnica, membro da Academia Agrícola daFrança e membro das comissões científicas da Sociedade CentralCanina e da Federação Cinológica Internacional. Zootecnista,veterinário e autor de cerca de 150 publicações sobre diversostemas, incluindo o manual «Genética e seleção canina»publicado em 1997, cuja segunda edição em breve estarádisponível.

PONTOS-CHAVE➧ O tipo morfológico e a pelagem são as características

mais visíveis do fenótipo de diversas raças caninas.

➧ O seu desenvolvimento processou-se durante um longoperíodo de tempo através da evolução progressivadavariação contínua e também em consequência da exploração de mutações.

➧ As alterações mutacionais desempenharam um papel mais importante em termos da pelagem que da morfologia externa.

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Em primeiro lugar, é um dado geralmente aceito quea espécie canina é bastante propensa a variações. Épossível, que no futuro, a genética molecular nosforneça a explicação.

Em segundo lugar, o tempo de domesticação do cão(cerca de 15.000 anos a.C. ou mais cedo), o curtointervalo entre gerações e a sua natureza prolíferatornam a história do cão particularmente longa ecomplexa, pontuada por diversos acontecimentossignificativos.

É possível que os principais conjuntos decaracterísticas raciais tenham origens diferentes.Tradicionalmente, considera-se que o cão descendede 4 subespécies geográficas de lobos. As hipótesesvariam de acordo com os autores (2,3) mas o conceitobásico é idêntico e, em geral, parece estarcorrelacionado com a classificação de Mégnin (1889)(4) que divide as raças em 4 grupos principais comcaracterísticos morfológicas bem definidas, quesupostamente também correspondem a 4 origenscom localizações geográficas distintas: lupóide (tipolobo) do noroeste da Eurásia, bracóide (tipo mastim)da Europa meridional, molossóide (estrutura ósseaforte) das cadeias montanhosas da Eurásia e graióide(tipo galgo) das vastas estepes e regiões desérticas.

As primeiras sub-espécies de lobos domesticadospodem ter apresentado apenas discretas diferençasmorfológicas, mas é provável que possuíssem varia-ções genéticas específicas entre si. É difícil acreditarque tivesse sido possível obter a ampla gama defenótipos observada hoje nas raças caninas com baseem cada grupo local. Existe alguma controvérsiaquanto a isto, mas é um dado geralmente aceito.Neste caso também, a genética molecular poderáajudar-nos a esclarecer melhor o princípio, mas ébastante improvável que seja negado. Também não éprovável que seja validada a hipótese apresentada porSavolainen, et al. em 2002 (5) que propõe um únicocentro de domesticação.

Ao longo da história, os cães foram submetidostanto aos efeitos da seleção natural, que otimi-zava sua adaptação ao meio natural e seleçãoartificial, desenvolvida pelo ser humano cominúmeras variações e correspondente a utilizaçõesbastante diversificadas. A adaptação ao ambientenatural poderia pressupor a necessidade de umamorfologia específica (não foi por acaso que os

galgos se desenvolveram nas estepes e nas regiõesdo deserto) e os seres humanos também acentuaramo elemento natural ou procuraram modelos quecorrespondessem melhor às utilizações preten-didas pela seleção.

Através da seleção das populações caninas, os sereshumanos exploraram três mecanismos genéticos:- ao contrário do que se possa pensar, as mutaçõesmais visíveis desempenharam um papel menor naevolução morfológica. Contudo, podem explicaralgumas formas de raças de membros curtos, bemcomo as modificações nas orelhas e cauda. Emtermos gerais, o nanismo provavelmente nãopossui origem fatorial; - variação contínua, que de modo geral, resulta daação dos poligenes e constitui a principal influênciaem termos da seleção. A sua exploração durante umlongo período foi o principal impulsionador daevolução das raças: obtiveram-se formatos anõesatravés da redução progressiva e cruzamentogradual de cães com menor peso, enquanto os cãesgigantes resultaram da seleção progressiva dotamanho e peso. As modificações do tipo morfológicogeral (alargamento ou redução do torso, ênfase naconcavidade ou convexidade do perfil cefálico, etc.)também resultam da acção dos poligenescorrespondentes; - para acelerar a evolução pretendida, os sereshumanos recorreram com relativa frequência acruzamentos com cães de outras raças para obter orespectivo apuramento. De fato, os cruzamentosinter-raças foram fundamentais para a evolução dareprodução canina, afetando indiscutivelmentetodas as raças, mas a sua importância não deveser sobrevalorizada.

Em termos gerais, a diversidade da morfologiaexterna observada em todas as raças caninas éexplicada sobretudo pela genética quantitativa.Contudo, o mesmo não pode ser afirmado no quediz respeito à pelagem, tópico sobre o qualabordaremos.

PelagemDo ponto de vista genético, as características dapelagem resultam inicialmente da ação dosprincipais genes que produzem a cor preta, castanha,fulvo, etc., e o pêlo liso, ondulado, curto oucomprido. Os poligenes «modificadores» exercemsua influência graduando algumas cores, que em

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consequência adquirem uma tonalidade mais oumenos escura, ou então modificando o grau deexpressão das características da pelagem que passaa ser mais ou menos comprido, mais ou menosduro etc. No entanto, a principal fonte de variaçãoda pelagem é produzida pelas mutações.

As espécies animais selvagens apresentam apenasum tipo de pelagem, característico do indivíduo,uma vez que quaisquer alterações na cor dapelagem são eliminadas pela seleção natural, quese processa de diversas formas:- não reconhecimento do animal mutante pela mãe damatilha, resultando em sua morte ou abandono,

- aqueles que conseguem escapar à eliminação eatingem a idade da reprodução não são reconhecidospor potenciais parceiros e, consequentemente sãoimpedidos de acasalar e transmitir o gene mutante,- a nova pelagem poderá não ser compatível com a«camuflagem» natural proporcionada pela pelagemnormal em relação ao ambiente.

Nos primórdios da domesticação, o homemconservava os animais menos agressivos e protegiaaté certo ponto as cores mutantes, preferindomesmo reproduzi-las, o que aumentou a frequênciade novas pelagens. Estas tornaram-se maisdiversificadas nos animais domésticos, permane-cendo a pelagem selvagem como um padrão entremuitos outros. Com excessão do gato e do burro, apelagem selvagem é hoje rara ou mesmo um casoexcepcional (6). De fato, este fator enquadra-se nanoção que a domesticação modifica o animal sobdiversos ângulos.

Procuramos demonstrar que a realidade é maiscomplexa. Se a pelagem selvagem parece ser rara éporque a expressão fenotípica foi alterada pelaseleção após a incorporação de elementos modifi-cadores (7). O cão ilustra de forma excepcional estahipótese. Nesta espécie, a pelagem selvagem,considerada muito rara é tradicionalmente designada«cinza-lobo». De fato, de acordo com a nomenclaturacientífica das cores habitualmente utilizadas na França(8) e que também propomos, na realidade é «areiaenegrecida». Contudo, a simples observação doslobos em Jardins Zoológicos demonstra, por um lado,que a cor areia enegrecida, algumas vezes dá origem afulva enegrecida e por outro lado, a extensão de áreasnegras no manto é variável. Estas variações espontâneasforam exacerbadas no cão devido ao fato da seleção

operar em duas direções opostas, quer suprimindo aomáximo a pelagem preta do manto ou, pelocontrário, intensificando-a.Obviamente, o resultado é bastante variado, com umapelagem de tonalidade quase fulva no primeiro caso epelo contrário, quase preta no segundo. De fato, o geneda pelagem selvagem continua a dominar mas devidoà ação dos modificadores, sua expressão variaconsideravelmente. Este tipo de pelagem

DO LOBO AO CÃO: DIVERSIDADE FENOTÍPICA OBSERVÁVEL NAS RAÇAS CANINAS

Tipos morfológicos da espécie canina (segundo Mégnin, (4))

Tipo Bracóide (i.e. Pointer alemão)

(© Lenfant)

Tipo Graióde (i.e. Whippet)

(© Lenfant)

Tipo Molossóide (i.e. Terranova)

(© Lenfant)

Tipo Lupóide (i.e. Pastor Belga Malinois)

(© Hermeline - Doxicat)

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DO LOBO AO CÃO: DIVERSIDADE FENOTÍPICA OBSERVÁVEL NAS RAÇAS CANINAS

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2. Fiennes R, Fiennes A. The Natural History of the Dog, London: Weidenfeld &Nicolson, 1968.

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4. Mégnin P. Le chien et ses races, Vincennes: L’Eleveur, 1889.

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6. Gautier A. La domestication. Et l’homme créa l’animal, Paris: Errance, 1990.

7. Denis B. Nature et fréquence de la robe sauvage chez les mammifèresdomestiques. Anthropozoologica 1994; 19: 9-16.

8. Denis B. Les couleurs de robes chez le chien, Paris: Société Centrale Canine,1982.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

continua a ser bastante frequente no cão, apesar denão identificada como tal. O homem também temreproduzido algumas variações de cores oucaracterísticas da pelagem ad infinitum através daseleção (por exemplo desenvolvendo inúmerasmanchas em pelagens de fundo branco), aumentandoa diversidade das pelagens caninas. Quandorealizou-se a primeira padronização, comcompilação dos livros de origens, as seleçõesrealizadas pelos criadores eram bastante diferentes,de acordo com as raças. Alguns clubes considera-ram apenas uma pelagem como característica e outrosreconheceram várias, enquanto outros aceitaram prati-camente todas. É claro que não é só a cor da pelagemque caracteriza a raça, mas constitui um «elementodecorativo» bastante procurado.

ConclusãoApesar da raças caninas terem surgidooficialmente no século XIX, são o resultado de umahistória muito longa, que combina a diferenciaçãogeográfica, a seleção e o cruzamento de raças. Aherança genética da espécie continua a ser redistri-buída e estimulada pelas mutações, através das quais ohomem procura explorar a variabilidade genética paradesenvolver populações animais de acordo com aslinhas pretendidas, resultando na atual extraor-dinária diversidade fenotípica das raças caninas, massimultaneamente, muitas outras característicassofreram um processo cumulativo. Embora apredisposição racial para doenças seja muitas vezesassociada ao tipo morfológico da pelagem selecionadapelo ser humano, é mais frequente o resultado da«carga genética», que constitui aspecto invisível, dadiversidade genética das raças caninas.

Exemplo da evolução das cores da pelagem do lobo

Pelagem areia enegrecida ou cinza-lobo (Husky Siberiano)

(© Lenfant)

Pelagem enegrecida (Schnauzer miniatura)

(© Hermeline - Doxicat)

Pelagem fulvo enegrecida (Pastor Belga Tervueren)

(© Hermeline - Doxicat)

Pelagem fulvo enegrecida (Teckel de pêlo comprido)

(© Lanceau)

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