a relação do homem com a terra

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Robert Harding/Latinstock Stonehenge, conjunto monumental de blocos de pedra erguido entre os anos 3000 a.C. e 1600 a.C. no sul da Inglaterra. Ainda que sua exata finalidade não tenha sido identificada, a organização do conjunto indica uma sofisticada capacidade de projetar e construir espaços complexos. Neste capítulo você vai estudar: O desenvolvimento da agricultura e a domesticação de animais O surgimento das primeiras cidades O desenvolvimento da metalurgia A África entre 10000 a.C. e 4000 a.C. A América dos sambaquis DOCUMENTO Exploração inicial

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Page 1: A Relação Do Homem Com a Terra

Robert Harding/Latinstock

Stonehenge, conjunto monumental de blocos de pedra erguido entre os anos 3000 a.C. e 1600 a.C. no sul da Inglaterra. Ainda que sua exata finalidade não tenha sido identificada, a organização do conjunto indica uma

sofisticada capacidade de projetar e construir espaços complexos.

Neste capítulo você vai estudar:• O desenvolvimento da agricultura e a domesticação de animais

• O surgimento das primeiras cidades

• O desenvolvimento da metalurgia

• A África entre 10000 a.C. e 4000 a.C.

• A América dos sambaquis

  DOCUMENTO    Exploração inicial   

Observe os objetos retratados abaixo.

Page 2: A Relação Do Homem Com a Terra

Museu Britânico, Londres, Inglaterra/Photo12/AFP

Museu Haaretz Israel, Telaviv, Israel/Erich Lening/Album/Latinstock

Achados arqueológicos do período Neolítico.

 1   Descreva a forma dos objetos.

 2   De que materiais eles devem ter sido feitos?

 3   Para que eles deviam servir? Como seriam utilizados?

 4   Quem fabricou esses objetos?

 5   Que diferenças de forma e função existem entre esses objetos e os que você analisou no capítulo anterior?

 6   Esses objetos seriam úteis para um grupo nômade? Por quê?

No capítulo anterior, estudamos a evolução da espécie humana. Agora, veremos como homens e mulheres organizaram-se em sociedades.

A descoberta da agricultura e a domesticação de animais foram etapas muito importantes no processo de organização das sociedades, pois a garantia de oferta de alimentos em um único lugar permitiu a certos grupos humanos fixar moradia, abandonando o nomadismo.

A REVOLUÇÃO AGRÍCOLA

Page 3: A Relação Do Homem Com a Terra

Os fatos que vamos estudar não ocorreram em todos os lugares ao mesmo tempo. Muitos deles são comprovados por achados arqueológicos, como vestígios de objetos de cerâmica e de construções. Outros são suposições dos estudiosos, que ainda buscam comprovação material. Afinal, muitos vestígios das primeiras sociedades desapareceram e nossos conhecimentos sobre os povos que viveram há milênios são limitados e incompletos.

Sabemos que nossos antepassados, durante o período Paleolítico, viviam em pequenos grupos, como estudamos no capítulo 1. Eles eram nômades e usavam instrumentos feitos de pedra lascada. Seu modo de vida começaria a sofrer grandes transformações por volta de 10000 a.C., data usada como marco do fim do período Paleolítico e início do Neolítico.

Da coleta ao cultivoO que ocorreu por volta de 10000 a.C.? Nessa época, a era glacial chegava ao fim. A temperatura da

Terra elevou-se, os solos ficaram mais férteis e a oferta de alimentos aumentou. Por ter acesso a mais alimentos, as pessoas passaram a viver mais tempo e as crianças tinham mais chances de chegar à vida adulta.

Durante milhares de anos, as mães permaneciam junto aos filhos e com eles circulavam nos arredores dos acampamentos colhendo frutos, enquanto os homens saíam para caçar. As mulheres devem ter percebido, com o tempo, que as plantas brotavam das sementes que eram lançadas ao solo pelo vento ou pelos pássaros. Passaram, então, a plantar sementes. Essa prática garantiu aos grupos humanos uma oferta regular de alimentos, tornando-os menos dependentes da caça e da coleta.

Assim, o permanente deslocamento em busca dos alimentos foi dando lugar à sedentarização, isto é, à fixação das famílias e grupos em áreas férteis, onde a agricultura desenvolvia-se com facilidade. Surgiram as primeiras aldeias.

Observe os mapas. No mapa ao lado é representada uma parte do Oriente Médio conhecida como Crescente Fértil. Como você pode verificar, o Crescente Fértil se estende, como um arco imaginário, do sudeste do mar Mediterrâneo até o golfo Pérsico. Nessa região, o clima quente, a abundância de chuvas e os rios sempre cheios garantiam boas condições para a prática da agricultura. No mapa maior (abaixo) estão representados os prováveis caminhos de expansão das primeiras áreas cultivadas pelos humanos.

Sérgio Fiori

Fontes: A aurora da humanidade. Rio de Janeiro: Time Life/Abril Livros, 1993. p. 94. (Col. História em revista); Hermann Kinder, Werner Hilgemann. Atlas histórico mundial: de los orígenes a la Revolución Francesa. 11. ed. Madrid: Istmo, 1982. v. 1, p. 16. (Col. Fundamentos, 1).

Page 4: A Relação Do Homem Com a Terra

Sérgio Fiori

Fonte: A aurora da humanidade. Rio de Janeiro: Time Life/Abril Livros, 1993. p. 94. (Col. História em revista).

A área necessária para alimentar um agrupamento humano diminuiu muito com a prática da agricultura. Calcula-se que, na base da caça e da coleta, eram necessários 650 quilômetros quadrados para sustentar 25 pessoas, ao passo que 15 quilômetros quadrados de área cultivada bastavam para alimentar 150 pessoas. É muita diferença! Com isso, a agricultura permitiu um acelerado crescimento populacional e a concentração de pessoas em uma mesma região.

As técnicas agrícolasÀ medida que as pessoas aprendiam a lidar com o solo e com as plantas, desenvolviam novas técnicas

de cultivo, como a utilização do arado, a irrigação do solo e a adubagem. Essas técnicas permitiam aproveitar melhor as terras disponíveis para a plantação e aumentar a produtividade. A domesticação e a criação de animais também favoreceram a obtenção de alimento. Com o tempo, as comunidades agrícolas e pastoris passaram a produzir mais do que precisavam para sobreviver. O que a comunidade não consumia era, então, trocado por outros produtos de que o grupo necessitasse.

Museu de Salisburg, South Wiltshire, Inglaterra/ Richard T. Nowitz/Corbis/Latinstock

Ferramentas de pedra polida produzidas no período Neolítico. O machado provavelmente era utilizado na abertura de áreas para o cultivo agrícola.

Page 5: A Relação Do Homem Com a Terra

Essas grandes transformações costumam ser caracterizadas como Revolução Agrícola ou Revolução do Neolítico (neo significa “novo” e lítico, “pedra”), já que o domínio da agricultura coincidiu com outro destacado avanço técnico: os seres humanos aprenderam a polir as pedras e passaram a fabricar machados e pilões, fundamentais para o desenvolvimento da agricultura e para o aproveitamento da colheita.

A criação de animaisA sedentarização contribuiu para a domesticação dos animais, prática que já vinha se desenvolvendo

desde os últimos milênios do período Paleolítico, quando os restos de alimentos deixados pelos humanos atraíam lobos e porcos. Em certos casos, caçadores criavam filhotes formando pequenos rebanhos. Isso assegurava às aldeias fornecimento mais regular de carne e leite.

A criação de animais garantia também o abastecimento de peles para confeccionar vestimentas, coberturas e sacos; de ossos para fabricar ferramentas e utensílios como pentes e botões; de tripas para servir como cordas; de estrume para adubação. Depois de alguns milênios, a força dos animais passou a ser utilizada para puxar arados e mover moinhos, facilitando o trabalho humano.

Album/Hervé Champollion/akg-Images/Latinstock

Kazuyoshi Nomachi/Corbis/Latinstock

As cenas representadas nas pinturas rupestres do Parque Nacional Tassili-n-Ajjer, na Argélia, indicam a convivência das práticas da caça e do pastoreio na região entre 8 mil e 4 mil anos atrás.

A agricultura, por sua vez, beneficiou-se da criação de animais: levado para pastar em área onde a colheita já tivesse ocorrido, o rebanho comia os talos que restavam, limpando o terreno. Ao mesmo tempo, adubava o solo com estrume e pisoteava as sementes, o que ajudava a enterrá-las.

A produção de cerâmicaAchados arqueológicos mostram que no período Paleolítico certos grupos nômades já sabiam que a

argila cozida endurecia, mas a utilizavam apenas na confecção de estatuetas. Afinal, quem iria carregar potes pesados durante longas andanças? Bem mais adequadas para a vida nômade eram as cestas de fibras vegetais trançadas.

Page 6: A Relação Do Homem Com a Terra

Com a prática da agricultura e a sedentarização, os seres humanos puderam desenvolver plenamente as técnicas cerâmicas. Fizeram grandes jarros para armazenar grãos, farinha e água, panelas, pratos, copos, travessas e recipientes para bebidas. Fabricaram ainda tijolos, que seriam usados na construção das cidades. Vestígios de utensílios de cerâmica foram encontrados pelos arqueólogos em diferentes partes do mundo, alguns produzidos entre 7000 a.C. e 6000 a.C.

Instituto Oriental da Universidade de Chicago, Illinois, EUA

O torno de oleiro, inventado por volta de 4500 a.C., tornou mais fácil e rápida a produção de cerâmica. Na imagem, representação de um oleiro encontrada no atual Egito e datada de 2500 a.C. a 2200 a.C.

DA ALDEIA À CIDADEO que diferenciava uma cidade de uma aldeia na Pré-História? Segundo os estudiosos, as primeiras

cidades caracterizavam-se por abrigar alguns milhares de pessoas, possuir um governo exercido por reis e sacerdotes e dispor de um muro de proteção. Nas escavações em sítios arqueológicos datados entre 4000 a.C. e 3000 a.C., os vestígios de muros são bastante evidentes.

As cidades caracterizavam-se ainda pela divisão do trabalho - isto é, a separação das atividades desempenhadas por camponeses, artesãos, comerciantes, militares e sacerdotes - e pelas trocas comerciais.

O poder dos reis e dos sacerdotesPara explicar o surgimento das diferenças sociais, alguns pesquisadores sugerem que as primeiras

aldeias agrícolas teriam sido atacadas por grupos - provavelmente de caçadores - interessados em apossar-se de alimentos. Em seguida, esses grupos teriam obrigado os camponeses, mais pacíficos, a lhes entregar regularmente parte dos alimentos cultivados em troca de paz e proteção contra outros saqueadores. Essa seria a origem das primeiras distinções sociais na comunidade: uma elite guerreira, ou seja, uma minoria que se destacava pela força, passou a dominar a maioria, explorando seu trabalho.

Outros estudiosos afirmam que a separação entre a elite e o povo resultou de um lento processo no qual o rei era, a princípio, um líder escolhido pela comunidade para chefiar situações como guerras ou cerimônias religiosas. Já os sacerdotes eram preparados para dominar o conhecimento. Com base na observação e no estudo da natureza, eles sabiam dizer qual era a melhor época para o plantio, previam fenômenos como eclipses ou a estação das chuvas e conheciam as técnicas de construção. De posse desses saberes, passaram a ser vistos como os intermediários entre os deuses e as pessoas. Cabia aos sacerdotes descobrir as vontades dos deuses e fazer-lhes oferendas.

Em troca dessa liderança, reis e sacerdotes recebiam impostos na forma de alimentos e outros bens. Para armazená-los, mandavam erguer salões fortificados com largas paredes de barro cozido e pedras ou outros materiais disponíveis na região. Esses salões eram ao mesmo tempo celeiro, palácio e templo. Distinguiam-se das demais construções pelas grandes dimensões.

Page 7: A Relação Do Homem Com a Terra

John Garrett/Corbis/Latinstock

Ruínas de cerca de 3000 a.C., localizadas no atual território da Escócia, revelam uma ocupação organizada do espaço de habitação.

Com o tempo, os reis passaram a ser vistos como representantes máximos dos deuses entre os humanos, enquanto os sacerdotes afirmavam-se como as pessoas mais próximas dos deuses. Esse era um forte argumento para convencer os trabalhadores a pagar impostos e prestar qualquer serviço que lhes fosse pedido pelos reis e sacerdotes.

Escavações em JericóUma das cidades mais antigas das quais foram encontrados vestígios é Jericó, na Palestina

(veja a localização de Jericó no mapa do Crescente Fértil, na página 56). Os trabalhos arqueológicos já realizados revelam que as camadas mais profundas do solo escavado datam de aproximadamente 9000 a.C. Nessa época, caçadores e coletores deviam frequentar o local, um oásis próximo ao mar Morto.

Em um nível acima, os arqueólogos encontraram sinais de alimentação mais abundante, mas nada que comprovasse o domínio da agricultura.

O terceiro nível revela a existência de um povoado, em uma área de cinco hectares. Era cercado por uma muralha defensiva e dispunha de uma torre de 8,5 metros de altura. Os cálculos indicam que ali viviam cerca de 2 mil pessoas. Por volta de 7000 a.C., alguma tragédia destruiu Jericó.

Page 8: A Relação Do Homem Com a Terra

Ullstein Bild/Winter

Cidade de Jericó: ruínas de torre datada aproximadamente de 10000 a.C. a 8000 a.C. Fotografia de 1998.

Em um nível acima nas escavações os pesquisadores observaram o ressurgimento daquela ocupação, mas já bastante diferente das anteriores: as casas eram quadradas, com pisos de gesso muito bem-acabados. Os arqueólogos imaginam que essas mudanças deveram-se ao domínio de algum grupo invasor que conquistou a cidade.

Por volta do ano 6000 a.C., iniciou-se na cidade a fabricação da cerâmica.

As escavações apontam sucessivas destruições e reconstruções de Jericó e de suas muralhas até o início da era cristã.

A especialização do trabalhoNa origem das cidades, numerosas atividades eram desenvolvidas nos templos e fiscalizadas pelos

sacerdotes: os rituais religiosos, o planejamento das obras, o controle do trabalho agrícola, a administração de empréstimos e pagamentos, a aplicação da justiça e a produção artesanal.

Com o crescimento das cidades, muitas dessas atividades passaram a ser realizadas também fora do templo. Isso refletia a crescente divisão do trabalho, o que significa que um número cada vez maior de pessoas deixava de se preocupar apenas com a produção imediata de alimentos para se especializar em atividades como a carpintaria, a olaria, a padaria e a agricultura.

Page 9: A Relação Do Homem Com a Terra

The Granger Collection, Nova York, Estados Unidos/Other Images

Preparo do pão representado em escultura egípcia de cerca de 2100 a.C.

Crescimento das trocas comerciaisCom a especialização, os profissionais puderam concentrar toda a atenção e capacidade em uma única

atividade e fazê-la com melhor qualidade e mais depressa. Consequentemente, produziram mais do que o necessário para a população, e a troca de alimentos e objetos tornou-se a base de uma intensa atividade comercial.

A princípio não havia moedas. As trocas eram feitas em espécie, isto é, as pessoas trocavam uma mercadoria por outra (por exemplo, trocavam um pote de farinha por um calçado). Muitas vezes, os sacerdotes organizavam o comércio anotando trocas de valor desigual para indicar quem ficava com crédito e quem ficava devendo.

Page 10: A Relação Do Homem Com a Terra

Portal de Mapas

Fonte: A aurora da humanidade. Rio de Janeiro: Time Life/Abril Livros, 1993. p. 140-141. (Col. História em revista).

Além do mercado local, havia o comércio de longa distância, isto é, de produtos que vinham de muito longe e eram raros, como o sílex e a obsidiana, as rochas mais apropriadas para fazer instrumentos cortantes e disponíveis apenas em alguns locais. O comércio desses materiais era importante porque as armas confeccionadas com eles poderiam tornar a caça mais eficiente e garantir a vitória sobre os inimigos nos campos de batalha.

Ric Ergenbright/Corbis/Latinstock

Obsidiana, rocha vulcânica, em estado bruto. Ao lado, a obsidiana lapidada encontrada no sítio arqueológico de Susa, no atual Irã.

Page 11: A Relação Do Homem Com a Terra

Museu do Louvre, Paris, França/RMN/Franck Raux/Other Images

Martyn F. Chillmaid/SPL DC/Latinstock

Sílex, rocha geralmente calcária, em estado bruto. Ao lado, ponta de lança de sílex, produzida entre 9000 e 6000 anos atrás, encontrada no norte do Níger.

Coleção particular/Science Photo Library/Latinstock

Parte significativa do comércio de longa distância era feita por grupos seminômades. Os integrantes desses grupos viviam em habitações temporárias e geralmente praticavam atividades pastoris, mas também realizavam alguma atividade sedentária, como a agricultura. Como circulavam por diferentes regiões, funcionavam como transmissores de novidades (como o uso do cavalo) e mercadores de produtos raros.

A IDADE DOS METAIS E DA GUERRAEntre 7000 a.C. e 3000 a.C., grupos humanos aperfeiçoa-ram sua capacidade de controlar o fogo e,

entre outras coisas, descobriram a técnica da metalurgia, ou seja, aprenderam a transformar minérios e metais em ligas metálicas. As técnicas de metalurgia foram aprimoradas e difundidas entre cerca de 3500 a.C. e 1000 a.C. Esse período foi denominado Idade dos Metais.

Page 12: A Relação Do Homem Com a Terra

Inicialmente, por volta de 6500 a.C., as pessoas utilizaram cobre para fazer pequenos objetos martelados a frio. Depois, descobriram que esse metal, quando aquecido, tornava-se mais flexível e resistente, possibilitando a fabricação de objetos mais bem trabalhados e cuidadosamente decorados. Entre 3000 a.C. e 2000 a.C., as pessoas passaram a misturar o cobre ao estanho, dando origem ao bronze, mais resistente. Nesse mesmo período, surgiu a metalurgia do ferro, que só se difundiu de fato por volta de 1200 a.C.

Museu Nacional de Arqueologia, Saint-Germain-en-Laye, França/RMN/Jean-Gilles Berizzi/Other Images

Ferramentas produzidas a partir do domínio da metalurgia. Datadas entre 3750 a.C. e 2200 a.C., elas foram encontradas na região de Kersoufflet, França.

A técnica da metalurgia possibilitou a fabricação de armas mais poderosas. Entre 3000 a.C. e 2000 a.C., outra “arma” poderosíssima passou a ser usada nas guerras: os cavalos, cujas velocidade e altura faziam toda a diferença em um campo de batalha. Os cavalos domesticados foram levados ao Oriente Médio por nômades da Ásia Central.

Ao dominar as armas de ferro e domesticar cavalos, os seres humanos inauguraram uma verdadeira “era de guerras”. Nessas guerras, disputavam-se as melhores pastagens, as terras férteis e o domínio de cidades. Vestígios arqueológicos comprovam o aumento dos conflitos entre as populações das diferentes cidades nesse período. Por causa dessas disputas, foram construídas muralhas em torno de várias cidades. Além disso, surgiram os exércitos e uma nova profissão: a militar.

A ÁFRICA ENTRE 10000 A.C. E 4000 A.C.No decorrer da era do gelo, que, como vimos no capítulo 1, teve início por volta de 100000 a.C.,

grupos de Homo sapiens sapiens espalharam-se por toda a África, povoando-a, enquanto outros deixaram as terras africanas ao avançar para o Oriente Médio.

No final da era do gelo, por volta de 12 mil anos atrás, o contrário também começou a ocorrer. Grupos humanos entraram na África pelo deserto do Sinai (veja no mapa abaixo), espalhando-se pela borda do Mediterrâneo e pelo Saara - que ainda não era um deserto, mas uma área ocupada por savanas, grandes lagos e pântanos.

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Portal de Mapas

Fonte: Joseph Ki-Zerbo. Historia del Africa negra. Madrid: Alianza Editorial, 1980. v. 1, p. 77.

Esses deslocamentos foram muito importantes na história humana porque por meio deles difundiram-se hábitos e técnicas de povos distintos. Eles explicam, por exemplo, a presença de fósseis de animais domésticos nos sítios africanos. Como não há indícios de que esses animais tenham sido domesticados na África antes de 6000 a.C. ou 5000 a.C., eles devem ter sido levados por grupos que partiram do Oriente Médio.

Atividade agrícolaNa região do Saara, a grande quantidade de recursos naturais contribuiu para o surgimento de aldeias,

cujos habitantes dedicavam-se a atividades como a pesca, a caça e a coleta. Pesquisadores encontraram na região vestígios de atividade agrícola em períodos muito antigos, provavelmente anteriores ao estabelecimento das grandes sociedades agrícolas do Egito e da Mesopotâmia.

No quarto milênio antes de Cristo, porém, iniciou-se o lento processo de desertificação do Saara, que prosseguiu até o segundo milênio antes de Cristo. Os estudiosos ainda não sabem por que ocorreu a desertificação, mas sabem que as comunidades que habitavam a região tiveram de partir por causa da falta de água. Em geral, migraram para o sul, onde se alternavam a savana e a floresta tropical, e para o leste, onde estava o rio Nilo.

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Nic Bothma/epa/Corbis/Latinstock

Planície semiárida no Mali, em fotografia de 2007. O território desse país situa-se no Sahel, a faixa que separa o sul do deserto das áreas de savanas e de florestas.

O deserto se estendeu por uma área tão vasta que se tornou uma barreira separando as populações que viviam ao sul do Saara daquelas que viviam perto do mar Mediterrâneo. As trocas entre grupos ficaram assim mais difíceis.

As práticas agrícolas propagaram-se lentamente. Descrições de migrações em busca de melhores condições de caça e coleta são muito frequentes na história das sociedades africanas. Os deslocamentos em geral ocorriam em áreas que não ofereciam grandes obstáculos naturais, como cadeias de montanhas ou grandes desertos. Aos poucos, nos locais onde o aumento da população gerou mais disputa pelo espaço, a agricultura e o pastoreio começaram a prosperar. Muitas culturas africanas de pastores mantiveram-se ligadas a um modo de vida seminômade.

A AMÉRICA DOS SAMBAQUISO continente americano foi lentamente ocupado pelo Homo sapiens sapiens do norte para o sul, como

vimos no capítulo 1. Na costa atlântica da América do Sul, há indícios da presença de comunidades humanas entre 4500 a.C. e 500 d.C. Os arqueólogos encontraram em vários pontos do litoral brasileiro grandes elevações, algumas com até 30 metros de altura, formadas por camadas e mais camadas de conchas de moluscos, restos de animais e areia.

Essas formações receberam por parte dos arqueólogos o nome de sambaquis, termo derivado de duas palavras da língua tupi: tamba (“conchas”) e ki (“amontoado”). Ao escavar os sambaquis, os arqueólogos descobriram ossadas humanas e de animais, vestígios de fogueiras, enfeites, pontas de lança, etc.

O estudo dos sambaquis teve início no Brasil na segunda metade do século XIX. Por volta de 1970, as pesquisas ganharam impulso graças aos avanços tecnológicos que permitiram datar com mais precisão os fósseis encontrados. Esses fósseis não existem em grande quantidade, pois os sambaquis foram destruídos ao longo do século XX: o material neles contido, por ser rico em calcário, foi usado na construção civil. Apesar das dificuldades, o estudo dos sambaquis avançou bastante após 1990, revelando novos e importantes aspectos das comunidades litorâneas.

 LIVRO 

Page 15: A Relação Do Homem Com a Terra

Atual Editora

Norberto L. Guarinello. Os primeiros habitantes do Brasil. São Paulo: Atual.Nesse livro, o arqueólogo Norberto Guarinello explica como é o trabalho em arqueologia e o

que as pesquisas revelam sobre os primeiros habitantes do Brasil.

Fabio Colombini

Sambaqui nas proximidades da cidade litorânea de Paraty, no estado do Rio de Janeiro, em fotografia de 2007.

Os integrantes dessas comunidades, comumente identificadas como comunidades de sambaquieiros, alimentavam-se de moluscos e peixes, além de outros pequenos animais, frutos e possivelmente mandioca. Foi possível descobrir isso por causa das conchas acumuladas em grande quantidade, dos arpões e dos anzóis encontrados. Em alguns sítios arqueológicos foram encontrados ossos de peixes grandes, como o tubarão, o que confirma que os habitantes desses locais eram pescadores experientes.

Além de instrumentos de pesca, foram achados nos sambaquis pequenas esculturas representando peixes e outros animais e objetos de pedra que teriam servido para triturar sementes e folhas. Não há

Page 16: A Relação Do Homem Com a Terra

vestígios de artefatos de guerra, o que pode indicar que esses povos não se envolviam em conflitos violentos.

Ao examinar sepulturas dos sambaquis, os pesquisadores observaram que os sambaquieiros tinham o hábito de enterrar, com os mortos, objetos feitos de pedra e osso, colares de conchas de moluscos e lâminas de machados.

De acordo com as pesquisas, existiram comunidades de sambaquieiros ao longo de todo o litoral do Sul e do Sudeste - onde se localizam os atuais estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. No Nordeste e no Norte, foram encontrados vestígios no litoral da Bahia, em Alagoas, no Piauí, no Maranhão, no Pará e também no baixo Amazonas e no Xingu.

Museu Universitário Professor Oswaldo Rodrigues Cabral, Florianópolis, Santa Catarina/Tarcísio Mattos/Tempo Editorial

Artefato de pedra produzido entre 5 mil e 3 mil anos atrás encontrado em sambaqui na ilha de Florianópolis, Santa Catarina.

A maior concentração desses sítios arqueológicos está localizada em uma extensão de 250 quilômetros entre Paranaguá, no Paraná, e Garopaba, em Santa Catarina.

  DOCUMENTO    Exploração final   

Agora que você já conhece a importância da agricultura para a sedentarização, observe novamente os objetos reproduzidos no início deste capítulo e responda:

 1   Por que esses objetos ganharam importância durante o período Neolítico?

 2   Como esses objetos ajudam a entender o surgimento da divisão social do trabalho?

 

    ATIVIDADES         Retomada     

1. Escreva um parágrafo relacionando três fatos: o desenvolvimento da agricultura, o sedentarismo e a domesticação de animais.

2. Observe a imagem a seguir. Que atividades são representadas?

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Museu Britânico, Londres, Inglaterra/Gianni Dagli Orti/Corbis/Latinstock

Servidores trabalham para o rei assírio Assurbanipal (século IX a.C.). Relevo do palácio da cidade de Nimrud, localizada no território atual do Iraque.

3. Que tipo de organização social havia antes do surgimento das cidades?

4. Quais foram as principais mudanças no modo de vida dos seres humanos ao se sedentarizar?

5. Como eram feitas as trocas nas primeiras cidades?

6. Qual foi a vantagem da especialização do trabalho ocorrida nas cidades?

7. No caderno, faça uma linha do tempo das conquistas técnicas que marcaram a vida humana no período Neolítico. Use as datas e os fatos que aparecem nos quadros abaixo.

8. Responda às questões abaixo.a) O desenvolvimento da metalurgia é posterior ao domínio de que outra técnica para a fabricação de

ferramentas e armas?

b) Qual foi a importância da metalurgia para os seres humanos do Neolítico?

9. O processo de desertificação do Saara alterou o modo de vida das populações africanas. Explique as alterações que ocorreram.

10. Como era o modo de vida dos povos dos sambaquis? Que instrumentos eles utilizavam para obter alimentos? 

    Ampliação     

1. Leia com atenção o texto a seguir. Ele foi extraído de uma narrativa ficcional ambientada no período Neolítico e trata de conflitos entre dois grupos, um liderado por Rei e outro por Lalo.

[…] Rei anda ainda com armas antigas, a velha lança de ponta de chifre afiado, o velho arco pesado, com flechas finas de matar passarinho, enquanto os outros já têm arcos de madeiras muito mais leves e firmes, que lançam muito longe flechas que matam até bichos grandes. E têm

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também as espadas, feitas duma pedra que derrete num pote no fogo e, quando volta a esfriar, toma a forma do pote. Bronze, chamam, podem fazer de bronze facas e espadas que cortam fácil tanto um cabelo como um pescoço.

[…] Num lado do rio, o povoado cresce com gente de paz vinda de todos os vales, como no outro lado do rio cresce o bando de Lalo […]. No tempo seco, quando o rio baixa, atravessam o rio para saquear plantações, atacar aqui ou ali — mas o povoado sempre se defende. A cada vez, no entanto, a luta custa mais e mais homens até conseguirem jogar os bandidos novamente de volta para o rio. […]

Domingos Pellegrini. No começo de tudo. São Paulo: Nova Alexandria, 2002. p. 112-113.

a) De acordo com essa narrativa, o bando de Lalo tinha vantagem em relação aos habitantes do povoado vizinho. O que permitiu essa vantagem?

b) Que consequências essa vantagem traria para o bando de Lalo? E para o povoado liderado por Rei?

2. Junte-se a alguns colegas para fazer uma pesquisa sobre a cultura material das primeiras sociedades. Sigam os passos:a) Procurem, na internet, em enciclopédias, em jornais ou em revistas, imagens que ilustrem um dos

temas listados a seguir.

• Primeiras espécies agrícolas cultivadas e sua importância• Primeiras espécies de animais domesticados e sua importância• Ferramentas de pedra lascada e sua importância• Ferramentas de pedra polida e sua importância• Objetos cerâmicos e sua importância• Objetos de metal e sua importância 

b) Selecionem as melhores imagens e façam legendas para cada uma delas.

c) Montem um cartaz para ser apresentado em classe. Não se esqueçam de acrescentar ao cartaz um título.

d) Com os cartazes produzidos por todos os grupos, formem um painel para ser afixado em um mural na escola.

http://obras.acompanha.editorasaraiva.com.br/reader/books/historia/OEBPS/cha02.xhtml