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Minerva, 5(2): 197-205 A QUESTÃO DAS GRANDES ÁREAS METROPOLITANAS PREVISTAS NA LEI N O 10/2003 – O CASO DA GRANDE ÁREA METROPOLITANA DE COIMBRA Lusitano dos Santos Urbanista, Doutor em Ordenamento do Território e Transportes pela Universidade de Coimbra, Instituto de Estudos Regionais e Urbanos da Universidade de Coimbra, Portugal, e-mail: [email protected]. Ricardo Grade Geógrafo, Mestre em Ordenamento do Território e Desenvolvimento pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Câmara Municipal da Lousã, Portugal, e-mail: [email protected] Resumo No âmbito da criação das áreas metropolitanas, previstas na Lei n o 10/2003 de 13 de Maio, colocou-se em dúvida os critérios que serviram de base à escolha dos municípios que as integraram. A hipótese ensaiada procurou perceber se os conceitos inerentes à sua constituição foram, sobre o ponto de vista científico, os mais correctos. O resultado final revelou duas realidades distintas: por um lado, o simples ajuntamento de municípios de natureza administrativa e, por outro, a homogeneidade dos fenómenos urbanos evidenciados pela aplicação da metodologia. Palavras-chave: administração do território, delimitação de grandes cidades, metrópoles, áreas metropolitanas. Introdução Uma das questões principais na Geografia é a delimitação das estruturas territoriais. Com efeito, considerando que cada estrutura tem os seus limites, nas questões de definição urbana, o problema coloca-se exactamente em determinar as características envolvidas no processo urbano e em que escala se estabelecem as suas inter-relações. Outro problema central da Geografia passa pela determinação desses mesmos limites, uma vez que os processos e os elementos dos sistemas urbanos apenas se encontram activos dentro de certos limites. Contudo, num contexto de globalização, os processos de metropolização enfrentam problemas de delimitação das cidades. Actualmente, os sistemas urbanos carecem muito mais do que de uma simples fronteira espacial, sob a clássica definição de limite de cidade. Os fenómenos de periurbanização espalharam-se por praticamente todas as partes possíveis do planeta, e as rápidas transformações espaciais, a que assistimos sobretudo nas áreas mais densamente urbanizadas, colocaram novos desafios aos estudos de carácter urbano. Por outro lado, o facto de os limites metropolitanos não se encontrarem definidos leva a que ocorram situações em que, muitas vezes, não existe coincidência entre o que são os limites administrativos e a realidade territorial para gerir. Por conseguinte, tem sido desenvolvidos novos e melhores esforços no sentido de definir os limites das cidades, em todas as suas particularidades. Desse modo, a investigação sobre um simples método de delimitação que possa vir a ser aplicado em todos os países, permitindo estudos comparativos entre diferentes regiões, é um dos maiores desafios para os estudos dedicados ao urbanismo em pleno século XXI. Modelo de Análise As diferentes formas de delimitação das áreas urbanas Em menos de um século assistiu-se a uma transformação radical na maioria das cidades européias, onde, a partir das cidades concentradas, se registou um crescimento urbano que se disseminou, criando nós urbanos que se constituíram por todo o território. Em cada país existe uma definição própria de cidade, baseada em critérios geográficos, históricos ou administrativos. A aproximação estatística ao fenómeno urbano é necessariamente baseada, por um lado, naquilo que são as representações do que constitui a cidade, indiferente- mente da sua definição ser de natureza politica, adminis- trativa ou cientifica, e, por outro, a quantificação do objecto urbano, definido como tal. Não obstante esta abordagem, as cidades são demasiado vastas e diversas, onde se torna inviável a aplicação de uma simples definição ou conceito. Com efeito, a definição ou critério de dimensionamento varia com a abordagem que se pretende efectuar, seja ela de natureza morfológica, funções e actividades urbanas, natureza política ou somente sobre

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Minerva, 5(2): 197-205

A QUESTÃO DAS GRANDES ÁREAS METROPOLITANAS PREVISTAS... 197

A QUESTÃO DAS GRANDES ÁREASMETROPOLITANAS PREVISTASNA LEI NO 10/2003 – O CASO DA

GRANDE ÁREA METROPOLITANADE COIMBRA

Lusitano dos SantosUrbanista, Doutor em Ordenamento do Território e Transportes pela Universidade de Coimbra,

Instituto de Estudos Regionais e Urbanos da Universidade de Coimbra, Portugal, e-mail: [email protected].

Ricardo GradeGeógrafo, Mestre em Ordenamento do Território e Desenvolvimento pela Faculdade de Letras da

Universidade de Coimbra, Câmara Municipal da Lousã, Portugal, e-mail: [email protected]

ResumoNo âmbito da criação das áreas metropolitanas, previstas na Lei no 10/2003 de 13 de Maio, colocou-se em dúvida oscritérios que serviram de base à escolha dos municípios que as integraram. A hipótese ensaiada procurou perceber seos conceitos inerentes à sua constituição foram, sobre o ponto de vista científico, os mais correctos. O resultadofinal revelou duas realidades distintas: por um lado, o simples ajuntamento de municípios de natureza administrativae, por outro, a homogeneidade dos fenómenos urbanos evidenciados pela aplicação da metodologia.

Palavras-chave: administração do território, delimitação de grandes cidades, metrópoles, áreas metropolitanas.

IntroduçãoUma das questões principais na Geografia é a

delimitação das estruturas territoriais. Com efeito,considerando que cada estrutura tem os seus limites, nasquestões de definição urbana, o problema coloca-seexactamente em determinar as características envolvidasno processo urbano e em que escala se estabelecem assuas inter-relações. Outro problema central da Geografia passapela determinação desses mesmos limites, uma vez que osprocessos e os elementos dos sistemas urbanos apenasse encontram activos dentro de certos limites. Contudo, numcontexto de globalização, os processos de metropolizaçãoenfrentam problemas de delimitação das cidades.

Actualmente, os sistemas urbanos carecem muitomais do que de uma simples fronteira espacial, sob a clássicadefinição de limite de cidade. Os fenómenos deperiurbanização espalharam-se por praticamente todas aspartes possíveis do planeta, e as rápidas transformaçõesespaciais, a que assistimos sobretudo nas áreas maisdensamente urbanizadas, colocaram novos desafios aosestudos de carácter urbano. Por outro lado, o facto deos limites metropolitanos não se encontrarem definidosleva a que ocorram situações em que, muitas vezes, nãoexiste coincidência entre o que são os limites administrativose a realidade territorial para gerir. Por conseguinte, temsido desenvolvidos novos e melhores esforços no sentidode definir os limites das cidades, em todas as suas

particularidades. Desse modo, a investigação sobre umsimples método de delimitação que possa vir a ser aplicadoem todos os países, permitindo estudos comparativosentre diferentes regiões, é um dos maiores desafios paraos estudos dedicados ao urbanismo em pleno século XXI.

Modelo de AnáliseAs diferentes formas de delimitação das áreas urbanas

Em menos de um século assistiu-se a umatransformação radical na maioria das cidades européias,onde, a partir das cidades concentradas, se registou umcrescimento urbano que se disseminou, criando nósurbanos que se constituíram por todo o território. Emcada país existe uma definição própria de cidade, baseadaem critérios geográficos, históricos ou administrativos.A aproximação estatística ao fenómeno urbano énecessariamente baseada, por um lado, naquilo que sãoas representações do que constitui a cidade, indiferente-mente da sua definição ser de natureza politica, adminis-trativa ou cientifica, e, por outro, a quantificação do objectourbano, definido como tal. Não obstante esta abordagem,as cidades são demasiado vastas e diversas, onde setorna inviável a aplicação de uma simples definição ouconceito. Com efeito, a definição ou critério dedimensionamento varia com a abordagem que se pretendeefectuar, seja ela de natureza morfológica, funções eactividades urbanas, natureza política ou somente sobre

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os modos de vida urbana. Assim, a delimitação de umaárea metropolitana mostrará diferentes resultados emfunção do critério utilizado. Classificando as diferentesformas de delimitação, estas podem agrupar-se segundodiversos métodos:

Métodos Morfológicos: o factor determinante é acontinuidade urbana construída; os critérios decontiguidade e de vizinhança das características físicasda cidade são a base deste grupo de métodos.Métodos Funcionais: o factor chave é a dinâmica, osfluxos e a mobilidade dos indivíduos dentro da áreametropolitana.Métodos baseados na estrutura sectorial da economia,hierarquia das unidades de população e na estruturasocial: a cidade é olhada como uma unidade deprodução de bens e serviços.Métodos Administrativos: as divisões administrativasdo território são as bases deste tipo de delimitação.Métodos Demográficos: este grupo é usualmenteclassificado de método clássico, uma vez que o seufactor chave corresponde à densidade de população.

Cada grupo de métodos de delimitação mostra umadiferente dimensão do fenómeno urbano. Todavia, a suacomplexidade é elevada devido aos múltiplos propósitosna delimitação das cidades e às diferenças observadasem diferentes cidades.

Bases do modelo de análiseFundado em 1989, o Network on Urban Research

in the European Community (NUREC) foi constituído emPisa e, desde então, a discussão acerca da diferença deconceitos de cidade na Europa e planos concretos sobrecomo alcançar o progresso na busca apropriada de basescomuns eram tópicos dominantes nas suas reuniões.Consensual era a idéia de que os investigadores urbanos,os planeadores regionais e urbanos e os políticosnecessitavam de mapas e informação credíveis sobre oespaço urbano. Defenderam-se novos modelos de análiseda realidade urbana, especialmente os que se encontravammais adequados ao crescimento das cidades, tendo emconta que, em especial as grandes e médias, se expandiampor extensões tão vastas do território que os seus limitesindividuais deixavam, muitas vezes, de ser visíveis. Essedesenvolvimento não era, contudo, contabilizado nem pelasestatísticas, nem, muito menos, em termos administrativos.Para além disso, advogava-se que, quanto mais a delimitaçãodo espaço urbano na União Européia (UE) estivesserelacionada com uma variedade de critérios, nos diferentespaíses, mais difícil se tornava a sua comparação entre todos.Assim, o desafio seria leitura precisa, apoiada num sistemade observação credível e que pudesse ser efectivamenteactualizado, no sentido de retratar as sucessivas mudançasna geografia das cidades.

Por conseguinte, foi decidido compilar uma basede dados, no sentido de reunir o maior número de

conceitos, diferentes entre si, usados na descrição dascidades, com vista a poderem ser aplicados em todas ascidades da UE com uma população acima dos 100.000habitantes. Assim, foram reunidos os seguintes conceitos:

A cidade num sentido administrativo e/ou legal.A aglomeração morfológica.A cidade num sentido funcional, definida pelasdensidades dos locais de trabalho ou por padrões dosmovimentos pendulares.

Definidos os conceitos a integrar no estudo, houvetambém lugar à definição das aglomerações, estabelecendoum conjunto de critérios que permitiram estabelecer oconceito chave. Com efeito, a definição de aglomeraçõescompreende três etapas:

A definição do termo edifício (distinção entre edifíciosresidenciais e não residenciais e a combinação dosdois).A definição da “área de construção contínua”, capita-lizando o critério das Nações Unidas da distância, emque um edifício só pode fazer parte de uma área deconstrução contínua se a distância que o separa doedifício que lhe fica mais próximo não distar mais de200 metros.A definição do conceito de aglomeração. Os resultadosque foram definidos de acordo com os pontos 1 e 2são delineados através da rede das unidades adminis-trativas de base. Estas unidades administrativas debase são, por exemplo, as Gemeinden alemãs, os districtsingleses, as communes francesas e, em Portugal, asfreguesias.

Assim, para o NUREC, uma aglomeração é a superfíciena qual o mais pequeno conjunto de áreas de construçãocontínua e a rede de unidades administrativas básicasse sobrepõem uma à outra. Por conseguinte, o resultadodo procedimento de sobreposição que dá origem aoaglomerado não é mais do que os limites das unidadesadministrativas básicas que cobrem as áreas de construçãocontínua.

A realidade administrativa portuguesa afasta-se, namaior parte dos casos, da dos demais países europeus,continuando a basear a delimitação das suas áreas urbanasem critérios de ordem demográfica e sócio-económica. Poresse motivo, a Direcção Geral do Ordenamento do Territórioe Desenvolvimento Urbano (DGOTDU) publicou um estudodenominado “As Regiões Metropolitanas Portuguesas nocontexto ibérico”, no qual procurou aplicar à realidademetropolitana portuguesa um dos critérios vulgarmenteutilizados, em nível internacional, na delimitação espacialde unidades urbanas: o da continuidade de espaçoconstruído. Nesse sentido, foi aplicado às aglomeraçõesde Lisboa e Porto a metodologia de delimitação propostapela rede européia NUREC, introduzindo algumas alteraçõespontuais de aperfeiçoamento e adequação às realidadesem estudo e analisando os resultados obtidos. Assim, os

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procedimentos aplicados distanciaram-se nos seguintesaspectos:

As aglomerações urbanas foram delimitadas à escalamais fina possível, a partir de espaços sem qualquersignificado administrativo.Os critérios de delimitação restringiram-se aos de índoleespacial, não tendo sido considerados limiares dequalquer tipo.Os critérios complementares de exclusão/inclusão dedeterminados espaços em função do uso do solo nãoforam aplicados.

Caso de EstudoCom a publicação da Lei no 10/2003 de 13 de Maio,

é estabelecido o novo regime de criação das áreasmetropolitanas e o quadro de atribuições, competênciase funcionamentos dos seus órgãos. Para além da GrandeÁrea Metropolitana de Coimbra (GAMC), no restante doterritório nacional constituíram-se mais seis grandes áreasmetropolitanas. Com efeito, às já existentes áreasmetropolitanas de Lisboa e Porto vieram juntar-se as áreasmetropolitanas do Minho, Aveiro, Viseu e Algarve. Essasáreas representam cerca de 5.819.243 habitantes,correspondentes a mais de metade da população nacionalque vive em áreas urbanas.

No que concerne à GAMC, foi fundada no dia 30de setembro de 2003, manifestada por cada um dosmunicípios fundadores numa declaração de compromisso.Nesse documento são realçados a prossecução dos finspúblicos de articulações dos investimentos municipaisde interesse supramunicipal, a coordenação de actuaçõesentre os municípios e os serviços da administração central,o planeamento e a gestão estratégica, económica e social

e a gestão territorial. Consideram, pois, que a constituiçãoda Área Metropolitana de Coimbra “é uma acçãoindispensável ao desenvolvimento equilibrado do todoque a constitui” (Declaração e Compromisso – núcleofundador de 30 de Setembro de 2003).

Do núcleo fundador fazem parte os municípios deCoimbra, Figueira da Foz, Miranda do Corvo, Cantanhede,Penacova, Mira, Montemor-o-Velho, Mealhada, Penela,Lousã, Góis, Condeixa-a-Nova, Soure e Vila Nova de Poiares.Posteriormente, aderiram à GAMC os municípios de Tábuae Mortágua, constituindo um total de 16 municípios,conforme se pode verificar na Figura 1. Em termos deobjectivos da GAMC, os estudos de fundamentaçãopreconizam a intervenção supramunicipal em quatro grandesáreas funcionais. São elas:

mobilidade, transportes e urbanismo;ambiente e recursos naturais;planeamento estratégico e dinamização económica;actividades sociais e culturais.

O total dos municípios constitui um universo de431.379 habitantes, distribuídos por uma área de 3.372,2km2, com continuidade territorial entre eles, segundo oestipulado na citada Lei no 10/2003 de 13 de maio de 2003.Nesse universo, o destaque vai para Coimbra, capital dedistrito e cidade fortemente polarizadora de toda a regiãoenvolvente, com cerca de 35% do total de populaçãoresidente da área metropolitana, o que corresponde aaproximadamente 150.000 habitantes no município e 100.000no interior dos limites da cidade. A partir da observaçãoda Tabela 1, constata-se, sem dúvida, que é o municípiomais forte em termos de concentração de população, emboranão seja o que apresenta maior área em km2.

Rede viária (PRN 2000)

Itinerários principais

Itinerários complementares

Estradas nacionais

Grande áreametropolitana de Coimbra

Municípios

N

Figura 1 Enquadramento geográfico e administrativo.

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As opções metodológicasA aproximação ao trabalho da DGOTDU teve por

objectivo a validação dos resultados, procurando reduzirhesitações e possíveis erros de análise que colocassemem causa o resultado encontrado. Desse modo, optou-se pelo recurso às subsecções estatísticas como unidadebásica de referência, ignorando as delimitações de naturezaadministrativa. Por outro lado, dada a natureza dainformação geográfica recolhida, restringiram-se, também,os critérios de delimitação aos de índole espacial, umavez que a aplicação de critérios de exclusão/inclusão deespaços com usos específicos exigiria esforço muitocomplexo no tipo de informação geográfica a utilizar. Nessecaso, a identificação das aglomerações contempla duasnomenclaturas. Numa primeira identificação, o nome do(s)município(s) e, numa segunda identificação, o nome dassubsecções estatísticas que apresentam maior populaçãona aglomeração urbana.

A informação de base e os meios técnicosRelativamente aos meios técnicos utilizados neste

trabalho, para além do software de CAD no tratamento

da informação de base, foram efectuadas operações apartir de um sistema de informação geográfica, neste casoo ArcView GIS 3.2, que permitiu efectuar as análises deíndole espacial de todo o trabalho, recorrendo a ferramentascomo a criação de buffers, a selecção por temas, assimcomo o cálculo e tratamento de todas as áreas resultantesdos dados apurados. As operações realizadas passarampelas seguintes fases:

Tratamento e georeferenciação da informação, em quese procedeu à selecção do tipo de elementos a utilizarno modelo de análise e à sua georeferenciação, de modoa assegurar continuidade gráfica entre todos os ficheiros.Análise de buffers, em que foi estabelecida a distânciade 100 metros para cada elemento gráfico presente notema seleccionado. Com essa operação, deu-se inícioao processo de bufferização da informação digitalrelativa às construções, de modo que fosse criada umaárea com cerca de 100 metros em torno de cada elemento.Apuramento dos contínuos urbanos, em que foramindividualizadas as áreas que compreendem cada umdos contínuos urbanos, de forma a estabelecer-se umahierarquia pela sua dimensão. Dessa análise resultaram,

População

totalSuperfície Freguesias

Densidade

populacionalMunicípios

Habitantes (%) km2 (%) No Hab/km2

Mealhada 20751 4,8 110,7 3,3 8 187,5

Cantanhede 37910 8,8 391,1 11,6 19 96,9

Coimbra 148443 34,4 319,4 9,5 31 464,8

Condeixa-a-Nova 15340 3,6 138,7 4,1 10 110,6

Figueira da Foz 62601 14,5 379,1 11,2 18 165,1

Mira 12872 3,0 124,1 3,7 4 103,7

Montemor-o-Velho 25478 5,9 229,0 6,8 14 111,2

Penacova 16725 3,9 216,7 6,4 11 77,2

Soure 20940 4,9 265,0 7,9 12 79,0

Góis 4861 1,1 263,3 7,8 5 18,5

Lousã 15753 3,7 138,4 4,1 5 113,8

Miranda do Corvo 13069 3,0 126,4 3,7 5 103,5

Penela 6594 1,5 134,8 4,0 6 48,9

Tábua 12602 2,9 199,8 5,9 15 63,1

Vila Nova de

Poiares7061 1,6 84,5 2,5 4 83,6

Mortágua 10379 2,4 251,2 7,4 10 41,3

Total da GAMC 431 379 100,0 3 372,2 100,0 177 127,9

Tabela 1 Identificação das 25 maiores aglomerações urbanas.

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numa primeira análise, 36 contínuos urbanos e, numafase posterior, os 25 contínuos urbanos finais.Selecção por temas, em que foi efectuada a operaçãode transposição dos dados de população por subsecçãoestatística, contidos na informação da Base Georeferen-ciada de Informação (BGRI2001) do INE, cruzando-acom os contínuos urbanos apurados no processoanterior.Obtenção das aglomerações urbanas, em que foramapuradas as aglomerações urbanas da área metropolitanade Coimbra. Esta operação decorreu da sobreposiçãoda informação anterior, hierarquizando e identificandoas suas principais características, obtendo-se, noconjunto de operações realizadas, o resultado final daÁrea Metropolitana de Coimbra.

Área final de estudoCruzando o conjunto de dados disponíveis,

encontramos, na Figura 2, a delimitação da área de estudo.Essa área corresponde a 14 dos 16 municípios da GrandeÁrea Metropolitana de Coimbra, dada a impossibilidadede reunir informação digital sobre a totalidade dosmunicípios constituintes. A área de estudo foi determinadapelos limites administrativos da área metropolitana,enquanto a área de análise dos edifícios foi determinadapela quadrícula das folhas da cartografia digital.

Delimitação dos contínuos urbanosPara a delimitação dos contínuos urbanos foi definido

um zonamento, em torno de cada edifício, com uma distânciade 100 metros, integrando-se nos contínuos os edifícioscom sobreposição do zonamento. A partir do resultadoobtido com o processo de delimitação dos contínuos,estabeleceu-se um ranking, ou seja, uma hierarquizaçãodos contínuos construídos em função da respectiva área.O resultado reflecte a existência de fortes descontinuidadesurbanas no interior dos limites administrativos da GAMC.

O processo seguinte procurou determinar e hierarquizaros maiores contínuos urbanos no interior da áreaadministrativa metropolitana. Desse modo, optou-se porum número que permitisse a representação de, pelo menos,um contínuo urbano por cada município da GAMC. Nãoobstante a existência de municípios com mais de um contínuourbano, procurou alargar-se o número de molde a que todosestivessem representados. Essa tentativa procuroucorresponder ao objectivo de analisar a hierarquia ecomposição da estrutura urbana no interior de áreametropolitana, conforme representado na Figura 3.

Transposição dos contínuos urbanos para a base degeoreferenciação do INE

Apurados que estavam os 25 maiores contínuosurbanos, a fase seguinte passou pela transposição paraa Base Georeferenciada de Informação (BGRI 2001) doINE. Nesse processo de transposição, o objectivo principalfoi o de assegurar, tanto quanto possível, a morfologiados contínuos urbanos originais. No entanto, essatransposição foi sujeita a alguns acertos que visaramadequar a informação aos dados provenientes do INE.No que respeita à BGRI 2001, esta desagrega o territórioda área de estudo em 9.097 subsecções, que, em áreasurbanas, correspondem ao quarteirão. Apesar deste elevadograu de desagregação, a dimensão das subsecções ébastante variável, o que dificulta o processo de trans-posição. Encontramos, assim, uma superfície média de0,37 km2, valor que se pode considerar algo elevado, tendoem conta as características do território que se pretendeestudar.

O método ensaiado utilizou como referência detransposição o centróide da subsecção, incluindo noscontínuos urbanos todas as subsecções cujo centróidese localizava no seu interior, isto é, tendo em conta queo ponto central de uma área se encontre totalmente dentroda outra área à qual se sobrepõe.

Área de estudoÁrea de análise dos edifíciosMunicípios excluídosGAMC (administrativa)Municípios

N

Figura 2 Delimitação da área de estudo.

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Todavia, importa referir que a determinação desteponto central, ou centróide, ocorre especificamente nocentro da área da subsecção, em virtude do tipo de softwareutilizado. Contudo, a transposição introduziu algumasalterações em termos de área, morfologia e topologia,tornando descontínuos alguns contínuos urbanos.

Nessa fase do trabalho colocava-se a questão relativaàs alterações provocadas pela introdução do processode transposição. Sabendo que houve lugar à alteraçãodas dimensões das áreas dos contínuos urbanos, poder-se-ia proceder a uma reavaliação de cada um deles,estabelecendo, assim, um novo ranking. Todavia, esseprocedimento significaria a perda de capacidade de avaliaros contínuos urbanos, enquanto áreas de edificação, cujasdescontinuidades são inferiores a 200 metros.

Havia ainda um aspecto importante a considerarnesse processo, uma vez que, para a delimitação doscontínuos urbanos, estes apresentavam uma separaçãogeográfica entre si, sendo que, no processo de transposição,se pôde observar que em algumas situações as subsecçõespertencentes a diferentes contínuos urbanos passavamagora a estar ligadas entre si. Este facto revela bem aheterogeneidade das subsecções estatísticas que“distorcem”, nalgumas situações, a realidade morfológicados contínuos urbanos.

Apresentação e Análise dos ResultadosConcluído o processo de transposição das

subsecções para os contínuos urbanos e avaliadas queforam todas as opções tomadas na aferição dessametodologia, apresentam-se, na Figura 5, as 25 maioresaglomerações urbanas. E considerámo-las aglomeraçõesurbanas adaptando a metodologia NUREC, em que aaglomeração representa a superfície na qual o mais pequenoconjunto de áreas de construção contínua e a rede deunidades administrativas básicas se sobrepõem.

Neste caso, as subsecções estatísticas substituemas unidades administrativas básicas. Já a faixa de unidadesadministrativas de base que não pertencem à aglomeração,uma vez que não existe sobreposição com as áreas deconstrução contínua, forma os conjuntos complementaresa estas zonas, optando-se por não os representar nestetrabalho.

A Tabela 3 faz a correspondência entre a numeraçãodas aglomerações urbanas da Figura 5 e a sua identificaçãoem termos de freguesia. A designação das aglomeraçõesidentifica, em primeiro lugar, o nome dos municípios poronde se prolonga e, entre parêntesis, a correspondênciaàs subsecções estatísticas, em cada município, cujapopulação é maior.

A observação da Figura 4, complementada pela leiturada Tabela 2, permite salientar um conjunto de factoresimportantes. Há a destacar os seguintes aspectos:

O primeiro indica-nos um claro desenvolvimento dasaglomerações urbanas ao longo das principais viasde comunicação que atravessam o território metropoli-tano. Com efeito, as principais aglomerações urbanas,como a de Coimbra/Condeixa-a-Nova ou o conjuntode aglomerações dos municípios de Cantanhede,Montemor-o-Velho e Figueira da Foz, dispõem-se aolongo do traçado das vias estruturantes (Auto-estradaA1 e A14, Estrada Nacional EN109 e EN110),evidenciando uma disposição linear.O segundo denuncia a evidente polarização daaglomeração urbana de Coimbra/Condeixa-a-Nova e,na sua periferia, a formação de uma coroa urbana, ondese dispõem diversas aglomerações urbanas, corres-pondentes aos municípios limítrofes de Coimbra.Municípios como Cantanhede, Mealhada, Lousã eMiranda do Corvo são paradigmáticos dessa estrutura,chegando, inclusivamente, a tomar parte da aglomeraçãoprincipal, como é o caso de Condeixa-a-Nova.

Figura 3 Os 25 maiores contínuos construídos na área administrativa da GAMC.

N

Contínuos construídos (1)

Área de análise dos edifíciosMunicípios excluídosGAMC (administrativa)Municípios

Contínuos construídos excluídos

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O terceiro aspecto traduz clara distinção entre osector Oeste e o sector Este da área metropolitana.Se o primeiro evidencia maior dispersão, fruto deuma rede viária extensa e de maiores facilidades naocupação de um solo menos acidentado, já o segundosector evidencia maior concentração das suasaglomerações urbanas. Nessas áreas prevalece aocupação nas zonas mais baixas, a maior parte dasvezes em bacias que se podem estender até meia

encosta. Essas áreas apresentam contornos bemdefinidos e estrutura a sua expansão ao longo dasvias que lhe dão acesso.

Uma delimitação alternativa à Área Metropolitana deCoimbra

Todavia, nesta abordagem complementar aosresultados alcançados, propomo-nos a ir mais longe eavançar com uma hipótese alternativa para o formato actual

N

Aglomerações urbanas (1)Municípios excluídosGAMC (administrativa)Municípios

Itinerários principais

Itinerários complementares

Estradas nacionais

Rede viária

1Coimbra – Condeixa-a-Nova (Coimbra,Condeixa-a-Nova)

14Coimbra – Condeixa-a-Nova (Ameal,Arzila)

2 Cantanhede – Figueira da Foz (Tocha, Santana) 15 Figueira da Foz (Alhadas, Carvalhal)

3Lousã – Miranda do Corvo (Lousã, Miranda doCorvo)

16 Penela (Espinhal, Casais do Cabra)

4 Mealhada (Mealhada, Pampilhosa) 17 Tábua (Tábua, Fundo de Vila)

5 Montemor-o-Velho (Casal do Mato, Vale Canosa) 18 Mealhada (Luso, Lameira de São Pedro)

6 Figueira da Foz (Figueira da Foz, Tavarede) 19 Coimbra (Ceira, Vendas)

7Vila Nova de Poiares (Vila Nova de Poiares, SãoMiguel de Poiares)

20 Cantanhede (Arazede, Vila Franca)

8 Mortágua (Mortágua, Vale de Açores) 21 Cantanhede (Ançã, Gândara)

9 Tábua (Póvoa de Midões, Vila do Mato) 22 Cantanhede (Lemede, Cadima)

10 Tábua (Espariz, Vila Seca) 23Figueira da Foz (Marinha das Ondas,Sampaio)

11 Cantanhede (Cantanhede, Arrôtas) 24 Figueira da Foz (Regalheiras, Santa Luzia)

12Coimbra – Montemor-o-Velho (São Silvestre, SãoMartinho de Árvore)

25 Penacova (Cheira, Penacova)

13Coimbra – Miranda do Corvo (São Frutuoso, ValeColmeias)

Figura 4 As aglomerações urbanas da Área Metropolitana de Coimbra.

Tabela 2 Identificação das 25 maiores aglomerações urbanas.

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da GAMC. Por conseguinte, ensaiamos um formato deárea metropolitana que apenas incluísse as aglomeraçõesurbanas que mantivessem um contínuo construído emmais de dois municípios. A essas aglomerações agregaram-se as restantes incluídas nos municípios seleccionados.Apresentamos na Figura 5 e na Tabela 3 as aglomeraçõesurbanas consideradas. Da sua análise ressalta em primeirolugar o facto de ter diminuído o número de municípios,bem como o número de aglomerações, que agora passama ser apenas 20.

Da análise da Figura 5 podemos retirar algumasconclusões interessantes, nomeadamente:

Em termos de critérios exigidos, continua a preencheros requisitos da Lei no 10/2003, que trata da constituiçãodas áreas metropolitanas, relativamente à contiguidadeterritorial dos municípios e ao número mínimo depopulação.

Elimina os municípios mais afastados do Urban Coreda área metropolitana, que é a cidade de Coimbra,tornando-a mais homogénea e mais compacta, abrindonovas perspectivas em termos de políticas supramuni-cipais e evitando dispersões.Elimina os municípios que evidenciam estruturasurbanas mais fragmentadas e mais débeis, afastandograndes áreas de natureza rural e atribuindo a esteterritório um reforço das características urbanas.Aumenta o valor da densidade populacional, devido àpopulação agrupada numa área menor, mas, ainda assim,longe de um valor de características marcadamente urbanas.Permite uma gestão mais racional do território urbano,no que respeita à questão da mobilidade e transportes,urba-nismo, ambiente e recursos naturais, planeamentoestratégico e dinamização económica da área metropo-litana.

N

Aglomerações urbanas (1)GAMC (hipótese alternativa)Municípios

Itinerários principais

Itinerários complementares

Estradas nacionais

Rede viária

Municípios 10

Aglomerações urbanas 92Freguesias

Municípios 126

Aglomerações urbanas 5060Subsecções estatísticas

Municípios 7201

Aglomerações urbanas 248 265População residente

Municípios 369 034

Aglomerações urbanas 353,0Superfície (km2)

Municípios 2392,8

Aglomerações urbanas 703,300Densidade populacional

(hab/km2) Municípios 154,227

Tabela 3 Identificação das 25 maiores aglomerações urbanas (hipótese alternativa).

Figura 5 Aglomerações urbanas da GAMC (hipótese alternativa).

Minerva, 5(2): 197-205

A QUESTÃO DAS GRANDES ÁREAS METROPOLITANAS PREVISTAS... 205

Considerações FinaisPerante os resultados encontrados na delimitação

da Grande Área Metropolitana de Coimbra, constatou-se um conjunto de conclusões interessantes e, de certaforma, reveladoras da realidade urbana na área de influênciade Coimbra. Deste modo, destacamos os seguintesaspectos:

Em comparação com os resultados referentes às áreasmetropolitanas de Lisboa e Porto, a densidade médiado território metropolitano de Coimbra evidencia valoresmais baixos, em muitos casos de carácter marcadamenterural, e que não traduzem uma realidade urbanaconsolidada. Embora aproximando-se mais dos valoresalcançados na região metropolitana do Porto, em funçãode maior dispersão urbana, a verdade é que os valoresestão longe de corresponder a uma área urbanacontínua e consolidada.Em termos de continuidade morfológica, apenas omunicípio de Condeixa-a-Nova estabelece uma continui-dade do urbano construído com a cidade de Coimbra.Já nas restantes aglomerações, por diversos motivos,essa é continuidade interrompida. De realçar que omunicípio de Coimbra funciona quase na sua totalidadecomo uma única aglomeração urbana, factor que lheatribui claramente o papel primordial na organizaçãodesse território.Na área envolvente, nomeadamente nos municípiosque formam uma coroa suburbana em torno da aglome-ração de Coimbra, a sua disposição funciona comoum conjunto de sistemas ou eixos urbanos de médiae pequena dimensão, servindo como suporte habita-cional da cidade de Coimbra e, consequentemente,dependentes funcionalmente da polarização de serviçosevidenciados pela cidade principal da área metropolitana.

A realidade metropolitana da GAMC, tal como propostoneste trabalho, partindo de uma hipótese alternativa,não justifica extensões a municípios como Mira,Mortágua, Tábua, Penela, Góis e Soure, pelo menosem termos morfológicos. Admitem-se relações funcionaisde dependência em relação a Coimbra, mas que,contudo, não pareceram suficientes para sustentar suapresença no território metropolitano da GAMC.

Referências BibliográficasDIRECÇÃO GERAL DO ORDENAMENTO DOTERRITÓRIO E DESENVOLVIMENTO URBANO EAUTORES. As regiões metropolitanas portuguesas nocontexto Ibérico. Lisboa: Direcção Geral do Ordenamentodo Território e Desenvolvimento Urbano, 2002.DOMINGUES, A. (2006). As áreas metropolitanas. In:Geografia de Portugal. Lisboa: Sociedade, Paisagens eCidades. Volume 2: Círculo de Leitores.FERRÃO, J.; VALA, F. Delimitação das aglomeraçõesmetropolitanas de Lisboa e Porto com base no critériode continuidade de espaço construído. Lisboa: INE,Delegação Regional de Lisboa e Vale do Tejo, 2001.GRADE, R. A questão das grandes áreas metropolitanasprevistas na Lei n. 10/2003: o caso da grande áreametropolitana de Coimbra. Coimbra: Faculdade de Letrasda Universidade de Coimbra, 2008.NUREC. Atlas of agglomerations in the European Union.Duisburg: Network on Urban Research in the EuropeCommunity, 1994.PACIONE, M. Urban geography: a global perspective.New York: Routledge, 2002.