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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A PROTEÇÃO CONTRATUAL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR FRANCINE GREIN NASS Itajaí, maio de 2007

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

A PROTEÇÃO CONTRATUAL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

FRANCINE GREIN NASS

Itajaí, maio de 2007

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

A PROTEÇÃO CONTRATUAL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

FRANCINE GREIN NASS

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor Mestre Clovis Demarchi

Itajaí, maio de 2007

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AGRADECIMENTO

A Deus, por ter me dado a oportunidade de chegar até aqui;

A minha família, principalmente a minha mãe Rosani Grein e ao meu segundo pai Hélio

Hayashi. Muito obrigada, minha mãe, pelo seu exemplo de dedicação e de amor. Muito obrigada,

meu segundo pai, pelo seu exemplo de honestidade e de justiça.

Aos meus amigo(a)s que por diversas vezes estiveram ao meu quando eu precisei de uma

palavra de conforto;

Ao meu Professor Orientador Mestre Clovis Demarchi por toda sua dedicação e paciência.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha família, em especial a mãe Rosani Grein e ao meu segundo pai Helio

Hayashi pelos seus ensinamentos e por todo amor que me deram que certamente moldaram a

pessoa que hoje sou e que construíram minha formação ética e moral.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, 28 de maio de 2007.

Francine Grein Nass Graduando

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Francine Grein Nass sob o título A

Proteção Contratual no Código de Defesa do Consumidor, foi submetida em

[Data] à banca examinadora composta pelos seguintes professores: [Nome dos

Professores ] ([Função]), e aprovada com a nota [Nota] ([nota Extenso]).

Itajaí, 28 de maio de 2007.

Professor Mestre Clovis Demarchi Orientador e Presidente da Banca

Professor Mestre Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CC Código Civil

CDC Código de defesa do Consumidor

LICC Lei de Introdução ao Código Civil

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SUMÁRIO

SUMÁRIO......................................................................................... VII

RESUMO........................................................................................... IX

INTRODUÇÃO ................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 4

DOS CONTRATOS ............................................................................ 4

1.1 HISTÓRICO ......................................................................................................4

1.2 FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS............................................................7

1.2.1 PRINCÍPIO DA PROBIDADE E DA BOA-FÉ .............................................................9

1.2.2 PRINCÍPIO DA FORÇA OBRIGATÓRIA.................................................................13

1.3 INTERPRETAÇÃO DOS CONTRATOS.........................................................15

1.4 CLASSIFICAÇÃO...........................................................................................19

1.4.1 DOS CONTRATOS QUANTO SUA NATUREZA. .......................................................20

1.4.2 DOS CONTRATOS QUANTO SUA FORMA .............................................................23

1.4.3 DOS CONTRATOS QUANTO SUA DESIGNAÇÃO ....................................................24

1.4.4 DOS CONTRATOS QUANTO SUA RECIPROCIDADE................................................25

1.4.5 DOS CONTRATOS QUANTO SEU TEMPO DA EXECUÇÃO........................................25

1.4.6 DOS CONTRATOS QUANTO SEU OBJETO ............................................................26

1.4.7 DOS CONTRATOS QUANTO SEU MODO DE FORMAÇÃO.........................................27

1.5 EFEITOS DOS CONTRATOS ........................................................................28

1.5.1 ESTIPULAÇÃO EM FAVOR DE TERCEIRO.............................................................29

1.5.2 O CONTRATO POR TERCEIRO A DECLARAR ........................................................32

1.6 EXTINÇÃO DO CONTRATO ..........................................................................33

1.6.1 DISTRATO ......................................................................................................33

1.6.2 CLÁUSULA RESOLUTIVA ..................................................................................34

CAPÍTULO 2 .................................................................................... 36

DIREITO DO CONSUMIDOR ........................................................... 36

2.1 HISTÓRICO ....................................................................................................36

2.2 CONCEITOS...................................................................................................40

2.2.1 CONCEITO DE CONSUMIDOR.............................................................................40

2.2.2 CONCEITO DE FORNECEDOR ............................................................................41

2.3 RELAÇÕES DE CONSUMO...........................................................................42

2.4 PRINCÍPIOS NORTEADORES DAS RELAÇÕES DE CONSUMO................43

2.4.1 PRINCIPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA.......................................................................44

2.4.2 PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA ........................................................................46

2.4.3 PRINCÍPIO DA EQUIDADE..................................................................................47

2.4.4 PRINCÍPIO DA CONFIANÇA................................................................................48

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2.4.5 PRINCÍPIO DA VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR............................................49

2.4.6 INTERPRETAÇÃO FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR .................................................49

2.5 VÍCIOS NA RELAÇÃO DE CONSUMO..........................................................50

2.5.1 VICIO PELO FATO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO.................................................51

2.5.2 VICIO DO SERVIÇO OU DO PRODUTO..................................................................52

2.5.3 CAUSAS DE EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE.................................................55

2.5.3.1 Não colocação do produto no mercado................................................55

2.5.3.2 Inexistência de defeito............................................................................56

2.5.3.3 Culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro....................................56

CAPÍTULO 3 .................................................................................... 58

A PROTEÇÃO CONTRATUAL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR................................................................................. 58

3.1 DEVER DE INFORMAR (ART. 46, CDC) .......................................................58

3.2 INTERPRETAÇÃO PRÓ-CONSUMIDOR (ART. 47, CDC) ............................60

3.3 EXECUÇÃO ESPECÍFICA (ART. 48, CDC) ...................................................62

3.4 DIREITO DE ARREPENDIMENTO (ART. 49, CDC) ......................................65

3.5 GARANTIA CONTRATUAL COMPLEMENTAR (ART. 50, CDC) .................69

CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 74

REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS........................................ 79

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RESUMO

A presente monografia tem como objeto a Proteção

contratual no Código de Defesa do Consumidor. O seu objetivo é o de analisar os

elementos característicos da proteção contratual presentes no Código de defesa

do Consumidor. A monografia foi dividida em três capítulos. No Capítulo 1,

tratando dos contratos em geral. No capítulo 2 trata-se do Direito do Consumidor.

No capítulo 3 trata-se da proteção contratual no Código de defesa do

Consumidor, analisando especificamente os artigos 46, 47, 48, 49 e 50 do Código

de defesa do Consumidor. Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na

Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo e, o Relatório dos Resultados

expresso na presente Monografia também é composto na base lógica Indutiva.

Foram acionadas as Técnicas do Referente, da Categoria, do Conceito

Operacional e da Pesquisa Bibliográfica.

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INTRODUÇÃO

A presente monografia tem como objeto a Proteção

contratual no Código de Defesa do Consumidor.

O seu objetivo é o de analisar os elementos característicos

da proteção contratual presentes no Código de defesa do Consumidor.

Para realizar o objetivo da pesquisa, a monografia foi

dividida em três capítulos. No Capítulo 1, tratando dos contratos em geral,

fazendo uma incursão sobre a história, a função social dos contratos, sua

classificação, seus efeitos e os elementos para a sua extinção.

No capítulo 2 trata-se do Direito do Consumidor, observando

o seu histórico, conceito, as idéias referentes a relação de consumo bem como os

princípios norteadores da relação de consumo, encerra-se o capítulo analisando

os vícios decorrentes da relação de consumo.

No capítulo 3 trata-se da proteção contratual no Código de

defesa do Consumidor, analisando especificamente os artigos 46, 47, 48, 49 e 50

do Código de defesa do Consumidor.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões

sobre a proteção contratual.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

a) Os contratantes devem agir de forma leal para a

consecução dos objetivos delineados no instrumento negocial respectivo. Deve

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existir entre os negociantes uma relação de confiança mútua e fidelidade ao

pactuado.

b) Para que seja amparada pelo Código de Defesa do

Consumidor, a relação de consumo tem que possuir uma relação de negócios que

visa à transação de produtos ou serviços e que esta seja feita entre um

fornecedor e um consumidor.

c) O dever de informação por parte do fornecedor constitui-

se condição primordial para assegurar ao consumidor a efetividade no elemento

teleológico negocial, qual seja, a finalidade pretendida pelo consumidor na relação

de consumo a que se obriga.

d) Em harmonia com o princípio da transparência, a

interpretação de cláusula contratual em favor do consumidor é mais um dos

alicerces que dão sustentação ao princípio maior da boa-fé objetiva nos contratos.

e) A norma consumerista, atendendo sua função

constitucional, implementa para o consumidor a existência da garantia legal e

contratual.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase

de Investigação1 foi utilizado o Método Indutivo2, na Fase de Tratamento de

Dados o Método Cartesiano3, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente

Monografia é composto na base lógica Indutiva.

1 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente

estabelecido[...]. PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. 10 ed. Florianópolis: OAB-SC editora, 2007. p. 101.

2 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 104.

3 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

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Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Técnicas do Referente4, da Categoria5, do Conceito Operacional6 e da Pesquisa

Bibliográfica7.

4 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o

alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 62.

5 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 31.

6 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 45.

7 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 239.

17 LOPES, Miguel Maria de Serpa. LOPES, Serpa. Curso de direito civil. 3. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1.991.v. 3. p. 32.

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CAPÍTULO 1

DOS CONTRATOS

1.1 HISTÓRICO

O contrato é o instrumento jurídico por excelência da vida

econômica. Surge como uma categoria que serve a todos os tipos de relações

entre sujeitos de direito e a qualquer pessoa independentemente de sua posição

ou condição social.

Contudo, foi o direito Romano que veio a reger o método

pelo qual, haveria de ser conduzido os atos solenes indispensáveis e aplicáveis

às formas de manifestação de vontades, através da stipulatio e da promissio que

consistiam numa promessa solene feita em público, e que vinculava de forma

absoluta a pessoa que a proferisse.

Por sua vez, não cumprida a promessa, resultaria na actio

ex stipulatio, criando o direito assim, uma sanção ao descumprimento de tal

formalidade, de modo que contribuía para dar maior garantia jurídica a essas

relações. Outros atos solenes também compunham o sistema romano, com o

nexum a sponcio, que uma vez respeitados davam origem a obligatio.

A palavra contrato, [...], no mais antigo Direito romano significava apenas o ato por meio do qual o credor atraía a si o devedor, submetendo-o ao seu jugo, como refém, garantia do inadimplemento do débito assumido. Tal era o resultado da idéia originária de obrigação, nascida com um caráter eminentemente penal: a pessoa, não o patrimônio, é que constituía o objeto da responsabilidade pelo débito assumido. O contrato era o ato constitutivo da obligatio; o nexum, no seu aspecto de fonte da obrigação, ou aquele estado físico de prisão, em que o devedor passava a garantir com a sua pessoa a própria dívida. Só depois da responsabilidade transformar-se de pessoal em patrimonial, [...], é que se começou por distinguir os contratos dos pacta e da

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conventio, sob o ponto de vista de que só os contratos pertencentes a uma daquelas categorias previstas no direito romano, eram protegidos pelas ações17.

A igreja, por meio de auxílio dos canonistas, possibilitou uma

idéia no sentido de que as pessoas poderiam celebrar contratos sem a

necessidade de tanto rigorismo. Apenas através da palavra de honra, baseada no

princípio da pacta sunt servanda e respaldada por instrumento que assegurasse o

seu cumprimento. Gomes18 aduz:

A contribuição dos canonistas consistiu basicamente na relevância que atribuíram, de um lado, ao consenso, e, do outro, à fé jurada. Em valorizando o consentimento, preconizaram que a vontade é a fonte da obrigação, abrindo caminha para a formulação dos princípios da autonomia da vontade e do consensualismo. [...] O respeito à palavra dada e o dever da veracidade justificam, de outra parte, a necessidade de cumprir as obrigações pactuadas, fosse qual fosse a forma do pacto, tornando necessária à adoção de regras jurídicas que assegurassem a força dos contratos, mesmo os nascidos do simples consentimento dos contraentes.

No tocante aos aspectos modernos e atuais tem-se que o

instituto do contrato sofreu diversas alterações, face ao desequilíbrio que ocorria

entre os contratantes e à necessidade de oferecer uma forma de segurança para

aqueles que celebravam um contrato. Daí alguns motivos que levaram à

modernização do instituto. Ainda citam-se os entendimentos de Gomes19:

A suposição de que a igualdade formal dos indivíduos asseguraria o equilíbrio entre os contratantes, fosse qual fosse a sua condição social, foi desacreditada na vida real. [...] A interferência do Estado na vida econômica implicou, por sua vez, a limitação legal da liberdade de contratar e o encolhimento da esfera de autonomia privada, passando a sofrer crescentes cortes, sobre todas, a liberdade de determinar o conteúdo da relação contratual. A crescente complexidade da vida social exigiu, para ambos setores, nova técnica de contratação, simplificando-se o processo

18 GOMES, Orlando. Contratos. 24 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004., p. 5. 19 GOMES, Orlando. Contratos. p. 7.

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de formação, como sucedeu visivelmente nos contratos em massa, e se acentuando o fenômeno da despersonalização.

Assim, o contrato moderno assume um papel de extrema

relevância social, tanto nas searas atinentes às pessoas físicas quanto nas

jurídicas, desenfreando um crescente progresso no mundo dos negócios jurídicos.

Uma das características do contrato é o acordo de vontades

entre as partes. Em excessão, a manifestação da vontade poderá ser interpretada

pelo silêncio: “Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou

os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa.”

Rodrigues20 assim dispõe:

A manifestação da vontade é ‘expressa’ quando se revela através do propósito deliberado, de uma das partes, de externar o seu pensamento em determinado sentido. Pode-se revelar por meio da palavra, escrita ou oral, como ainda por gestos. A última hipótese encontra exemplo ilustrativo nos leilões, em que, com um sinal, o licitante revela a intenção de oferecer ao leiloeiro lance mais elevado.

A formação dos contratos tem início conforme o estabelecido

no artigo 427 do Código Civil: “A proposta de contrato obriga o proponente, se o

contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das

circunstâncias do caso.”

Como quase toda regra tem exceção, existem hipóteses nas

quais a proposta deixa de ser obrigatória.

Será comum a efetivação pela outra parte de uma

contraproposta, aplicando a regra do artigo 431 “A aceitação fora do prazo, com

adições, restrições, ou modificações, importará nova proposta.”

Existem duas teorias quanto ao momento em que se forma o

contrato, a teoria da cognição e a teoria da agnição .

20 SILVIO, Rodrigues. Direito Civil. 29 ed. São Paulo: Saraiva, v. 3. 2005. p. 66.

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O Código Civil recepcionou a teoria da agnição, levando em

consideração o momento da expedição da aceitação “art. 434. Os contratos entre

ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida, exceto: – no

caso do artigo antecedente; II – se o proponente se houver se comprometido a

esperar resposta; III – se ela não chegar no prazo convencionado.”

1.2 FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS

A função social do contrato prevista no art. 421 do novo

Código Civil constitui cláusulas gerais, que reforça o princípio de conservação do

contrato, assegurando trocas úteis e justas.

O enunciado 23 do Centro de Estudos Judiciários assim

dispôs:

A função social do contrato prevista no art. 421. do novo Código Civil não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio, quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana21.

O artigo 421 determina que a liberdade de contratar será

exercida em razão e nos limites da função social do contrato, enquanto que o

artigo 422 dispõe que os contratantes são obrigados a guardar, assim na

conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-

fé.

Com advento da 2ª Guerra Mundial e suas conseqüências

para a humanidade, passou-se a exigir do Estado uma postura mais voltada ao

social.

21 NEGRÃO, Teotônio; GOUVÊA;, José Roberto Ferreira. Código Civil e Legislação em Vigor ,

22. ed., São Paulo :Saraiva, 2004, p. 214.

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No campo do direito privado encontra-se o reflexo desse

modo de pensar e do interesse com os contratos não se limita ao individual, mas

é ampliado em prol do social.

Essa alteração de postura não se dá de forma abrupta, mas

paulatinamente; são transplantadas para o direito contratual as mesmas idéias

que norteiam o direto administrativo na proteção do administrado em face da

poderosa administração pública.

A Igreja Católica reunida com o Vaticano II decide a sua

opção pelos pobres, enriquecendo a luta em favor do social.

Nos campos do chamado Direito Social, tais como

educação, saúde, trabalho, lazer, consumo, segurança, previdência social,

economia e outros, verificam que o interesse preponderante está na coletividade,

para a formação de uma vida digna em sociedade.

Desse modo, evolui a teoria contratual para acompanhar a

formação do Estado Social, assim sentida por LÔBO22:

o Estado Liberal assegurou os direitos do homem de primeira geração, especialmente a liberdade, a vida e a propriedade individual. O Estado Social foi impulsionado pelos movimentos populares que postulam muito mais que a liberdade e a igualdade formais, passando a assegurar os direitos do homem de segunda geração, ou seja, os direitos sociais.

Esse momento de transformação é sentido pelo legislador

pátrio que consigna expressamente no novo Código Civil, quando trata dos

contratos, o respeito à Função Social e ao Princípio da Boa-fé, como normas de

ordem pública.

Assim, passa a se fazer uma análise do Princípio da

Probidade e da Boa-fé como limites da Função Social do Contrato.

22 LÔBO, Luiz Neto. Contrato e mudança social. Revista Forense, Rio de Janeiro, n. 722, p. 42.

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1.2.1 Princípio da Probidade e da Boa-fé

A questão da boa-fé atine mais propriamente à interpretação

dos contratos. Os princípios da probidade e da boa-fé devem existir não apenas

na ocasião do contrato, mas, durante toda a sua duração, assim esse princípio se

estampa pelo dever das partes de agir de forma correta antes, durante e depois

do contrato. Isso porque, mesmo após o cumprimento de um contrato, podem

sobrar-lhes efeitos residuais.

A expressão boa-fé tem sua origem etimológica a partir da

expressão latina bona fides.

MARTINS23 nos ensina que:

Fides’ significa o hábito de firmeza e de coerência de quem sabe honrar os compromissos assumidos, significa, mais além do compromisso expresso, a fidelidade e coerência no cumprimento da expectativa alheia independentemente da palavra que haja sido dada, ou do acordo que tenha sido concluído, acordo entre homens honrados – compromisso expresso ou implícito de fidelidade e cooperação nas relações contratuais(confiança).

Analisando a boa-fé, PASQUALOTTO24 apresenta o

seguinte entendimento:

A boa-fé permite que o contrato converta-se numa ‘ordem de cooperação’, em que credor e devedor não ocupam mais posições antagônicas, dialéticas e polêmicas. A contraposição de interesses é superada pela convenção, que concerta e harmoniza os objetivos comuns das partes em torno do objeto do negócio. A partir do acordo de vontades, o cumprimento da obrigação de um representará a satisfação do crédito do outro. Por isso o vínculo jurídico que une os contraentes apresenta uma exigência inerente

23 MARTINS, Plínio Lacerda.O Abuso nas Relações de Consumo e o Princípio da Boa-Fé. Rio

de Janeiro: Forense, 2002. p. 145. 24 PASQUALOTTO, Adalberto. Cláusulas Abusivas em Contratos Habitacionais. In: Revista de

Direito do Consumidor [do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor]. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 40, out.-dez. 2001, p. 22.

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de ética e lealdade, para que não ocorra a frustração das expectativas.

Sob um aspecto genérico, a boa-fé pode ser considerada

como algo que deve estar presente em todas as relações jurídicas e sociais

existentes.

Consoante os ensinamento de SILVA25:

A boa-fé pode ser abordada em diferentes aspectos da vida social. Sob o aspecto psicológico, boa-fé é o estado de espírito de quem acredita estar agindo de acordo com as normas de boa conduta. Sob o ponto de vista ético, boa-fé significa lealdade, franqueza, honestidade, conformidade entre o que se pensa, o que se diz, o que se faz.

A Lei não contém palavras supérfluas, razão pela qual não

se podem entender como sinônimos os princípios da probidade e da boa-fé.

Já a probidade está diretamente legada ao conceito de

honestidade, integridade moral e dignidade, enquanto que a boa-fé é a qualidade

daquele que tem pureza nas suas intenções, ou seja, quer praticar coisa lícita.

É o aspecto moral da contratação, desde sua formação até a

sua extinção. Implica lealdade da palavra, fidelidade no tratamento e cumprimento

adequado das obrigações tempo, lugar e modo convencionados.

Os contratantes devem agir de forma leal para a consecução

dos objetivos delineados no instrumento negocial respectivo. Deve existir entre os

negociantes uma relação de confiança mútua e fidelidade ao pactuado26.

Na análise do princípio da boa-fé dos contratantes, devem

ser examinadas as condições em que o contrato foi firmado, o nível sociocultural

25 SILVA, Agathe E. Schmidt da. Cláusula Geral de Boa-fé nos Contratos de Consumo. In: Revista

de Direito do Consumidor [do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor]. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 17, janeiro/março, 1996, p. 154.

26 LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade Civil nas Relações de Consumo. São Paulo:Revista do Tribunais, 2001. p. 87.

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dos contratantes, seu momento histórico e econômico. É ponto da interpretação

da vontade contratual.

Nesse campo, o artigo 420 e especificamente o artigo 421

que faz referência ao princípio basilar da boa-fé objetiva: "Os contraentes são

obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os

princípios de probidade e boa-fé".

Ensina ALMEIDA COSTA27 que:

Entende-se que, durante as fases anteriores à celebração do contrato – quer dizer, na fase negociatória e na fase decisória - , o comportamento dos contratantes terá de pautar-se pelos cânones da lealdade e da probidade. De modo mais concreto: apontam-se aos negociadores certos deveres recíprocos, como, por exemplo, o de comunicar à outra parte a causa da invalidade do negócio, o de não adotar uma posição de reticência perante o erro em que esta lavre, o de evitar a divergência entre a vontade e a declaração, o de abster de propostas de contratos nulos por impossibilidade do objecto; e, ao lado de tais deveres, ainda em determinados casos, o de contratar ou prosseguir as negociações iniciadas com vista à celebração de um acto jurídico. O reconhecimento da responsabilidade pré-contratual reflecte a preocupação do direito de proteger a confiança depositada por cada um dos contratantes nas expectativas legítimas que o outro lhe crie durante as negociações, não só quanto à validade e eficácia do negócio, mas também quanto à sua futura celebração.

A idéia primordial é no sentido de que, em princípio,

contratante algum ingressa em um conteúdo contratual sem a necessária boa-fé.

A má-fé inicial ou interlocutória em um contrato pertence à patologia do negócio

jurídico e como tal deve ser examinada e punida.

AZEVEDO leciona que o princípio da boa-fé “assegura o que

acolhimento do que é lícito e a repulsa ao ilícito”. 28

27 COSTA, Almeida. Direito das Obrigações. Coimbra: Almedina, 1979. p. 224. 28 AZEVEDO, Alvaro Villaça de. Teoria Geral dos Contratos Típicos e Atípicos. São Paulo:

Editora Atlas, 2002, p. 26.

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O dispositivo do artigo 421 se reporta ao que se denomina

boa-fé objetiva contudo é importante que se distinga da boa-fé subjetiva.

Leciona NORONHA29 que:

Mais do que duas concepções da boa-fé, existem duas boas-fés, ambas jurídicas, uma subjetiva e outra objetiva. A primeira, diz respeito a dados internos, fundamentalmente psicológicos, atinentes diretamente ao sujeito, a segunda a elementos externos, a normas de conduta, que determinam como ele deve agir. Num caso, está de boa-fé quem ignora a real situação jurídica; no outro, está de boa-fé quem tem motivos para confiar na contraparte. Uma é boa-fé estado, a outra boa-fé princípio.

Na boa-fé subjetiva o manifestante de vontade crê que

sua conduta é correta, tendo em vista o grau de conhecimento que possui de um

negócio. Para ele há um estado de consciência ou aspecto psicológico que deve

ser considerado.

Por outro lado, a boa-fé objetiva tem compreensão diversa,

parte de um padrão de conduta comum, do homem no caso concreto levando em

consideração os aspectos sociais envolvidos.

Assim, a boa-fé objetiva se traduz de forma mais perceptível

como uma regra de conduta, um dever de agir de acordo com determinados

padrões sociais estabelecidos e reconhecidos.

Foi Orlando Gomes um dos doutrinadores que melhor soube

expor, a amplitude do conceito da boa-fé objetiva.

Em sua obra “Contratos”, o autor demonstra que a boa-fé

contratual está relacionada com o interesse social de segurança nas relações

jurídicas, expressando as palavras “lealdade, confiança e colaboração” que na

sua visão, traduzem muito bem o sentido do princípio da boa-fé.30

29 NORONHA, Fernando. O Direito dos Contratos e Seus Princípios. São Paulo: Editora

Saraiva, 1994, p. 132

30GOMES, Orlando. Contratos. p 42.

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Vale trazer na íntegra do trecho em que Orlando Gomes

utiliza as três expressões:

Ao princípio da boa-fé empresta-se ainda um outro significado. Para traduzir o interesse social de segurança das relações jurídicas, diz-se, como está expresso no Código Civil alemão, que as partes devem agir com lealdade e confiança recíprocos. Numa palavra, devem proceder com boa-fé. Indo mais adiante, aventa-se a idéias de que entre o credor e o devedor é necessária a colaboração, um ajudando o outro na execução do contrato. A tanto, evidentemente, não se pode chegar, dada a contraposição de interesses, mas é certo que a conduta tanto de um como de outro, subordina-se a regras que visam a impedir dificulte uma parte à ação de outra31.

Existem outros dispositivos que se reportam à boa-fé de

índole objetiva como o artigo 112 que versa que "Os negócios jurídicos devem ser

interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração". Também

o abuso de direito do artigo 186 que estabelece: "Também comete ato ilícito o

titular de um direito que, ao exercê-lo. Excede manifestamente os limites impostos

pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes".

1.2.2 Princípio da Força Obrigatória

O princípio da força obrigatória gera um comprometimento

entre as partes contratantes onde vez celebrado o contrato, este se torna lei entre

os contratantes, por força do referido princípio. GOMES32 ao tratar do assunto

assim dispôs:

O princípio da força obrigatória consubstancia-se na regra de que o contrato é lei entre as partes. Celebrado que seja, com observância de todos pressupostos e requisitos necessários à sua validade, deve ser executado pelas partes como se suas cláusulas fossem preceitos legais imperativos. O contrato obriga os contratantes, sejam quais forem às circunstâncias em que tenha de ser cumprido. Estipulado validamente seu conteúdo, vale dizer,

31 GOMES, Orlando. Contratos. p 42. 32 GOMES, Orlando. Contratos. p. 36.

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definidos os direitos e obrigações de cada parte, as respectivas cláusulas têm, para os contratantes, força obrigatória.

VENOSA33 acerca da matéria leciona:

[...] O acordo de vontades faz lei entre as partes, dicção que não pode ser tomada de forma peremptória, aliás como tudo em Direito. Essa obrigatoriedade forma a base do direito contratual. O ordenamento deve conferir à parte instrumentos judiciários para obrigar o contratante a cumprir o contrato ou a indenizar pelas perdas e danos. Não tivesse o contrato força obrigatória estaria estabelecido o caos. Ainda que se busque o interesse social, tal não deve contrariar tanto quanto possível à vontade contratual, a intenção das partes.

O denominado princípio menciona da impossibilidade de

retratação, alteração ou revogação do contrato, fazendo menção ao princípio da

intangibilidade.

No que diz respeito à intangibilidade Lisboa34 pondera:

Uma vez celebrado o contrato, o seu conteúdo é imutável, a fim de que sejam preservados os interesses que motivaram a sua formulação. Trata-se, desse modo, de negócio jurídico irretratável, diante da idéia de segurança jurídica. Tão-somente em situações excepcionais se terá por rompido o vínculo jurídico [...].

É o sábio entendimento de Gomes35:

[...] Diz-se que é intangível, para significar-se a irretratabilidade do acordo de vontades. Nenhuma consideração de equidade justificaria a revogação unilateral do contrato ou a alteração de suas cláusulas, que somente se permitem mediante novo concurso de vontades.

33 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos

Contratos. v. 2. p. 406-407. 34 LISBOA, Roberto Senise. Contratos difusos e coletivos, p. 86-87. 35 GOMES, Orlando. Contratos. p. 36.

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Desta forma, ao ser celebrado o contrato e aceito entre as

partes, deve este ser fielmente cumprido, a fim de assegurar o negócio jurídico.

1.3 INTERPRETAÇÃO DOS CONTRATOS

A interpretação dos contratos é um dos mais importantes

problemas do direito contemporâneo uma vez que toda manifestação de vontade

necessita de interpretação para que se saiba o seu significado e o seu alcance, as

situações que previu e os efeitos que pretende ter 36.

Apesar disso, são poucas as obras que versam,

especificamente, sobre o assunto.

GOMES leciona que37:

[...] Diz-se que, se o objeto da vontade contratual (negocia) são os efeitos do contrato, deve-se admitir, por dedução lógica, que o fim último da interpretação é a determinação de tais efeitos. Afinal, o que importa é definir a vontade contratual objetivamente expressa nas cláusulas, mesmo que não corresponda exatamente à intenção do declarante. É, de resto, comportamento obrigatório dos contratantes que demanda do intérprete clara definição e, se é juiz, a escolha do preceito aplicável em caso de controvérsia (lide).

Se, por um lado, toda manifestação de vontade carece de

interpretação, por outro, o problema avulta de importância quando se constata o

desusado crescimento de litígios oriundos de divergências quanto à interpretação

dos contratos, quase sempre originados da falta de técnicas com que estes são

formulados, ensejando obscuridades, contradições e lacunas. DINIZ38 traz:

[...] Assim, o intérprete do sentido negocial não deverá ater-se, unicamente, à exegese do contrato, isto é, ao exame gramatical de seus termos, mas sim à fixação da vontade dos contraentes,

36 WALD, Arnold. Obrigações e Contratos. 10 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p.

202. 37 GOMES, Orlando. Contratos. p. 199. 38 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Teoria das obrigações contratuais e

extracontratuais, p. 65.

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procurando seus efeitos jurídicos, indagando sua intenção, sem se vincular, estritamente, ao teor lingüístico do ato negocial. Por outras palavras, o intérprete deverá, prendendo-se ao tipo contratual, reconstituir o ato volitivo dos contratantes, pesquisando qual teria sido a sua real intenção e os fins econômicos visados por eles, corrigindo sua manifestação, escrita ou verbal, erroneamente expressa.

Atualmente a interpretação dos contratos é assoberbada

por dificuldades que a interpretação da lei desconhece.

No Código Civil vigente é possível vislumbrar quatro normas

interpretativas esplicitas nos artigos 112, 113, 114, 819:

Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.

Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.

Art. 114. Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente.

Art. 819. A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação extensiva.

O artigo 112 do Código Civil, como anteriormente relatado,

aduz que o intérprete do sentido negocial não deverá ater-se, unicamente, à

exegese do contrato.

Por sua vez, o artigo 113 expressa que os negócios

jurídicos devem ser interpretados utilizando-se o princípio, estudado

anteriormente, da boa-fé.

Por fim, os artigos 114 e 819 estipulam que o juiz não

poderá dar aos contratos interpretação ampliativa, devendo limitar-se,

unicamente, aos contornos traçados pelos contraentes, vedada a interpretação

com dados alheios ao seu texto.

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Na interpretação contratual serão observados dois

princípios, o da boa-fé, já devidamente espanado anteriormente e o princípio da

conservação do contrato.

Se uma cláusula contratual permitir duas interpretações

diferentes, prevalecerá a que possa produzir algum efeito.

Ocorrendo alguma interpretação que resulte na

impossibilidade ou na incoerência do cumprimento do contrato, este deve ter sua

interpretação modificada, a fim de poder ser executado. Ainda, se o juiz verificar

que há ausência de cláusulas necessárias ao bom entendimento do sentido do

contrato, este pode complementá-lo, com observância da prática realizada no

comércio. WALD dispõe que39:

Quando determinada interpretação leva ao absurdo, isto é, impossibilita a execução do contrato, o mesmo deve ser interpretado de tal modo que possa prevalecer e ser exeqüível. [...] Faltando cláusulas necessárias para a complementação do sentido do contrato, o juiz poderá suprir as falhas existentes recorrendo à prática existente no comércio. [...] Esta interpretação complementar do contrato é denominada por alguns autores interpretação integrativa, pois integra novos elementos no contrato. Na sua função de completar o contrato, o juiz atenderá aos princípios de equidade, aplicando normas supletivas ou, na falta das mesmas, a norma que estabeleceria se fosse legislador [...], desde que compatível com o espírito e as demais cláusulas do contrato. A interpretação integrativa só pode ocorrer em relação aos elementos secundários (não essenciais) do contrato.

O eminente jurisconsulto Pothier40 já fixava, ao tempo do

Código Civil de Napoleão, as seguintes regras de hermenêutica dos contratos:

1) O intérprete deve indagar a intenção comum das partes, de preferência ao sentido gramatical das palavras - Potentior est quam vox mens dicentis. 2)Quando uma cláusula for suscetível de dois entendimentos, deve ter aquele em que possa produzir algum

39 WALD, Arnoldo. Obrigações e contratos. p. 205-206. 40 www.uniao.edu.br/conteudos_2006/silvia/Teoria%20Geral%20dos%20Contratos/aula5.doc

acesso em 02 de maio de 2007.

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efeito, e não no em que nenhum possa gerar - Quoties in stipulationibus ambigua oratio est, comodissimum est id accipi quo res de qua agitur in tuto sit. 3) Quando um contrato encerrar expressões de duplo sentido, deve entender-se no sentido condizente com a natureza do negócio mesmo. 4) A expressão ambígua interpreta-se segundo o que é de uso no país. 5) Devem-se considerar implícitas em todo contrato as cláusulas de uso - In contractibus tacite veniunt ea quae sunt moris et consuetudini. 6) As cláusulas contratuais interpretam-se umas em relação às outras, sejam antecedentes, sejam conseqüentes. 7) Em caso de dúvida, a cláusula interpreta-se contra o estipulante e em favor do promitente. 8) As cláusulas contratuais, ainda quando genéricas, compreendem apenas aquilo que foi objeto do contrato, e não as coisas de que os contratantes não cogitam - Iniquum est perimi pacto, id de quo cogitatum non est. 9) Compreendem-se na universalidade todas as coisas particulares que a compõem, mesmo quando as partes ao contratar não tenham tido conhecimento destas. 10) O caso concreto para explicação da obrigação não deve considerar-se com o efeito de restringir o vínculo, e sim que este abrange os casos não expressos. 11) Uma cláusula expressa no plural decompõe-se muitas vezes em cláusulas singulares. 12) O que está no fim da frase se relaciona com toda ela e não apenas com o que imediatamente a precede, uma vez que guarde concordância em gênero e número com a frase inteira. 13) Interpreta-se a cláusula contra aquele contratante, em razão de cuja má-fé ou culpa a obscuridade, ambigüidade ou outro vício se origina. 14) As expressões que se apresentam sem sentido nenhum devem ser rejeitadas como se não constassem do texto do contrato.

TELLES41 aconselha as seguintes regras para a

interpretação dos contratos:

§ 382. Em todo o contrato ou obrigação deve-se atender à intenção, que as partes tiveram, com preferência ao sentido literal das palavras, em que ele está concebido.

§ 383. As palavras suscetíveis de diversos sentidos devem ser entendidas naquele que mais convém à matéria de que se trata. §

41 TELLES, J. H. Corrêa Telles. Digesto Português. Rio de Janeiro: Ateneu, 1909, p. 51-2

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384. Qualquer palavra ambígua deve ser entendida segundo o uso do país onde o contrato for feito.

§ 385. Uma cláusula suscetível de diversos entenderes, entende-se em aquele, em que possa ter efeito, e não no outro, em que não teria efeito algum.

§ 386. As cláusulas, que são do costume, subentendem-se estipuladas, se são precisas para a validade do contrato, ou quando sejam da natureza dele.

§ 387. As cláusulas de um contrato servem de interpretação umas às outras, quer sejam antecedentes, quer conseqüentes. § 388. Na dúvida, um ato ou contrato interpreta-se a favor da parte obrigada, e não a favor do credor.

§ 389. Por muito gerais que sejam os termos em que foi concebido o contrato, este só compreende as coisas sobre as quais as partes se propuseram tratar, e não as coisas de que elas não cogitaram.

§ 390. Se no contrato se expressou um caso, para explicar a obrigação, não se deve julgar que as partes a quiseram restringir àquele único caso; quando ela for direito é extensiva a outros casos.

§ 391. Estas regras servem igualmente para a interpretação das últimas vontades, em tudo o que podem ser-lhes aplicáveis..

Destarte, a interpretação dos contratos é de suma

importância e pode ser vista como uma forma de esclarecer o conteúdo do

negócio jurídico, evitando que não se possa entender a declaração de vontade

dos contraentes.

1.4 CLASSIFICAÇÃO

A classificação é um procedimento lógico, por meio do qual,

estabelecido um ângulo de observação, o analista encara um fenômeno

determinado, grupando suas várias espécies conforme se aproximem ou se

afastem umas das outras. Sua finalidade é acentuar as semelhanças e

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dessemelhanças entre as múltiplas espécies, de maneira a facilitar a inteligência

do problema em estudo42.

Tal classificação busca um agrupamento feito de acordo

com os elementos comuns, sendo estruturais e técnico-jurídicos, que apresentam

entre si, bem como a sua tipologia isolada.

Para tanto, tem-se varias classificações de contratos.

RODRIGUÊS43 em sua obra classificam-nos da seguinte forma:

Se encararmos os contratos tendo em consideração a sua natureza, podemos classificá-los em contratos unilaterais e bilaterais, onerosos e gratuitos, comutativos e aleatórios e causais e abstratos. Se tivermos em vista a maneira como se aperfeiçoam, podemos distinguir os contratos em consensuais e reais e solenes e não solenes. Se nos ativemos à tradicional divisão, tendo em vista o fato de a lei lhes atribuir, ou não, um nome e lhes sistematizar as regras, podemos separar os contratos em nominados e inominados. Considerando uns em relação aos outros, os contratos se classificam em principais e acessórios. Tendo em vista o tempo em que devem ser executados, separam-se em contratos de execução instantânea e contratos de execução diferida no futuro. Quanto ao seu objeto, pode-se ainda distinguir o contrato definitivo do contrato preliminar. Finalmente, quando se tem em vista a maneira como são formados, cumpre separar os contratos paritários dos contratos de adesão.

Assim passa a se expor uma breve análise acerca da

classificação dos contratos utilizando-se dos ensinamentos deste doutrinador.

1.4.1 Dos contratos quanto sua natureza.

Os contratos quanto a sua natureza são classificados em

unilaterais e bilaterais, onerosos e gratuitos, comutativos e aleatórios e causais e

abstratos.

42 RODRIGUES, Silvio. Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 25. 43 RODRIGUES, Silvio. Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 25.

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A classificação dos contratos em unilaterais e bilaterais tem

como foco as obrigações assumidas pelos contratantes.

São bilaterais os contratos que estabelecem direitos e

deveres para ambas as partes, em que cada um dos contraentes é simultânea e

reciprocamente credor e devedor do outro, pois produz direitos e obrigações para

ambos, tendo por característica principal o sinalagma, ou seja, a dependência

recíproca de obrigações; daí também serem denominados contratos

sinalagmáticos44.

São unilaterais os contratos que estipulam obrigações

apenas para um dos lados, se um só dos contratantes assumir obrigações em

face do outro, de tal sorte que os efeitos são ativos de um lado e passivos do

outro, pois uma das partes não se obrigará, não havendo, portanto, qualquer

contraprestação. “Os contratos unilaterais, apesar de requererem duas ou mais

declarações volitivas, colocam um só dos contraentes na posição de devedor,

ficando o outro como credor”45.

RODRIGUES46 ensina que:

A distinção entre estas duas espécies de contrato é de enorme relevância, porque variam os efeitos do ato conforme o ajuste seja unilateral ou bilateral. Assim, a ‘expectio non adimpleti contratus’, ou seja, a “exceção do contrato não-cumprido”, é peculiar às convenções sinalagmáticas; também, a cláusula resolutiva tácita é inerente ao contrato bilateral e estranha ao unilateral, pois, como naquele, as prestações são recíprocas.

Diz-se contrato oneroso, o que a atribuição patrimonial

efetuada por cada um dos contraentes tem por compensação ou equivalente a

atribuição da mesma natureza proveniente do outro, para alcançar ou manter as

atribuições patrimoniais da contraparte, cada contraente tem de realizar uma

44 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Teoria das obrigações contratuais e

extracontratuais, p.72. 45 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Teoria das obrigações contratuais e

extracontratuais, p. 71-72. 46 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. p. 28.

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contraprestação. Para que o contrato seja oneroso é preciso que cada uma das

partes tenha simultaneamente uma vantagem de natureza patrimonial e um

sacrifício do mesmo tipo.

Contratos gratuitos são aqueles em que somente uma das

partes cumpre a prestação, e a outra não se obriga, limitando-se a aceitar a

prestação. “Os contratos benéficos ou a título gratuito são aqueles que oneram

somente uma das partes, proporcionando à outra uma vantagem, sem qualquer

contraprestação. Logo, apenas um dos contratantes obtém proveito, que

corresponde a um sacrifício do outro, [...]47”

PEREIRA48 ensina que:

É preciso não confundir a classificação dos contratos em bilaterais e unilaterais com a dos onerosos e gratuitos, embora haja coincidência de algumas espécies. Os contratos onerosos comumente são bilaterais, e os gratuitos da mesma forma unilaterais. Mas é apenas coincidência. O fundamento das classificações difere: uma tem em vista o conteúdo das obrigações, e outra, o objetivo colimado. Não há uma correspectividade necessária, pois que existem contratos unilaterais que não são gratuitos (e. g., o mútuo), e outros que são bilaterais e podem ser gratuitos (o mandato, por exemplo).

Assim a ótica da classificação dos contratos em onerosos ou

gratuitos está ligada ao objetivo do contrato, ou seja, aquilo que as partes querem

Contratos comutativos são aqueles em que a prestação e a

contraprestação são equivalentes entre si e suscetíveis de imediata apreciação

quanto à sua equivalência.

São comutativos os contratos em que as prestações de ambas as partes são de antemão conhecidas, e guardam entre si uma relativa equivalência de valores. Não se exige a igualdade rigorosa destes, porque os bens que são objeto dos contratos não têm valoração precisa. Podendo ser, portanto, estimadas desde a

47 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Teoria das obrigações contratuais e

extracontratuais, p.74. 48 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil , p. 67.

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origem, os contratantes estipulam a avença, e fixam prestações que aproximadamente se correspondem49.

Contratos aleatórios são aqueles cujas prestações somente

serão cumpridas pela ocorrência de evento futuro e é imprevisível, sendo,

portanto, incertas quanto à quantidade ou extensão, e podendo culminar em

perda, em lugar de lucro.

São os contratos em que a prestação de uma das partes não é precisamente conhecida e suscetível de estimativa prévia, inexistindo equivalência com a da outra parte. Além disso, ficam dependentes de um acontecimento incerto50.

De acordo com o RODRIGUES51 “Na idéia de

comutatividade se insere, de um certo modo, a de equivalência das prestações.

Porque é normal que, nas convenções de intuito lucrativo, cada parte, só consinta

num sacrifício, se aquilo que obtém em troca lhe for equivalente.”

Contrato abstrato é aquele que tira sua força da própria

forma externa, independente da causa que o gerou. O exemplo típico do contrato

formal e abstrato era a stipulatio, do Direito Romano, onde a mera circunstância

de alguém proferir as palavras solenes da fórmula o vinculava de maneira

absoluta.

1.4.2 Dos contratos quanto sua forma

Se tivermos consideração à maneira como se aperfeiçoam,

os contratos se classificam em consensuais e reais e solenes e não solenes.

Contratos consensuais, também denominados contratos não

solenes, são aqueles que independem de forma especial, para cujo

aperfeiçoamento basta o consentimento das partes.

49 PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil, p. 39-40. 50 PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil, p.40. 51 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. p. 31

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Contratos reais são aqueles que, para se aperfeiçoaram,

necessitam não apenas do consentimento mútuo dos contratantes, mas também

da entrega da coisa. O termo real está relacionado aos bens móveis ou imóveis,

portanto contrato real é aquele que exige na sua constituição o consentimento dos

contratantes e a transferência da posse de algum bem.

A classificação dos contratos em solenes e não solenes está

relacionada à forma de elaboração do contrato. Solenes são os contratos que

dependem de forma prescrita em lei; não solene, ou informal, é o contrato que

independe de qualquer formalidade para que tenha validade, essa é a regra geral

dos contratos e declarações de vontades.

Os contratos solenes ou formais consistem naqueles para os quais a lei prescreve, para a sua celebração, forma especial que lhes dará existência, de tal sorte que, se o negócio for levado a efeito sema observância da forma legal, não terá validade52.

1.4.3 Dos contratos quanto sua designação

Quantas suas designações podem classificar os contratos

em nominados e inominados.

Contratos típicos ou nominados são aqueles que além de

possuírem um nome próprio ainda constituem objeto de uma regulamentação

legal específica. Tais correspondem às espécies negociais mais importantes no

comércio jurídico.

PEREIRA53 assim dispõe:

A celebração de um contrato atípico exige-lhes o cuidado de descerem a minúcias extremas, porque na sua disciplina legal falta a sua regulamentação específica. Na solução das controvérsias que surgirem, o julgador ou interprete terá de invocar em suprimento do conteúdo das cláusulas próprias os princípios legais relativos ao contrato típico mais próximo, e isto nem sempre é fácil, porque a ocupação de zona grísea, entre

52 RODRIGUES, Silvio. Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 34. 53 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. p. 61.

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mais de um, sugere às vezes aproximações várias, nenhuma das quais dotada de pura nitidez.

Inominados são aqueles que não se enquadram em nenhum

diploma legal e não têm denominação legal própria; surgem, geralmente, na vida

cotidiana, pela fusão de dois ou mais tipos contratuais.

Contratos formais, denominados solenes, são os que

somente se perfazem se for obedecida forma especial.

1.4.4 Dos contratos quanto sua reciprocidade.

Considerando uns em relação aos outros, os contratos se

classificam em principais e acessórios.

Os Contratos principais são aqueles que podem existir

independentemente de quaisquer outros já os acessórios são aqueles que têm

por finalidade assegurar o cumprimento de outro contrato, denominado principal.

RODRIGUES assim os conceitua54:

Contrato principal é aquele cuja existência independe da existência de qualquer outro. E contrato acessório é aquele que existe em função do principal e surge para lhe garantir a execução. [...] Dessa maneira, o contrato acessório depende da sina do principal. Exemplos típicos do contrato acessório são a da fiança e as arras.

1.4.5 Dos contratos quanto seu tempo da execução

Tendo em vista o tempo em que devem ser executados,

separa-se em contratos de execução instantânea e contratos de execução

diferida no futuro.

Execução instantânea é aquela onde as partes cumprem

seus deveres e auferem seus direitos em um único momento. Nota-se

PEREIRA55:

54 RODRIGUES, Silvio. Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 35.

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[...] de execução imediata ou instantânea é o contrato em que a solução se efetua de uma só vez e por prestação única, tendo por efeito a extinção cabal da obrigação. E de execução diferida ou retardada é aquele em que a prestação de uma das partes não se dá de um só jato, porém a termo, não ocorrendo à extinção da obrigação enquanto não se completar a solutio.

Ainda ensina PEREIRA56:

De execução sucessiva ou de trato sucessivo, ou execução continuada, como denominado no art. 478, é o contrato que sobrevive, com a persistência da obrigação, muito embora ocorram soluções periódicas, até que, pelo implemento de uma condição, ou decurso de um prazo, cessa o próprio contrato. O que caracteriza é o fato de que os pagamentos não geram a extinção da obrigação, que renasce. A duração ou continuidade da obrigação não é simplesmente suportada pelo credor, mas é querida pelas partes contratantes. Caso típico é a locação, em que a prestação do aluguel não tem efeito liberatório, senão do débito correspondente a período determinado, decorrido ou por decorrer, porque o contrato continua até a ocorrência de uma causa extintiva.

Assim, contratos de execução diferida no futuro são os que

se protraem no tempo, caracterizando-se pela prática ou abstenção de atos

reiterados, solvendo-se num espaço mais ou menos longo de tempo; ocorrem

quando a prestação de um ou ambos os contraentes se dá a termo; ex: compra e

venda a prazo.

1.4.6 Dos contratos quanto seu objeto

Quanto ao seu objeto, pode-se ainda distinguir o contrato

definitivo do contrato preliminar.

O contrato preliminar, consiste naquele por via do qual as

partes contratantes têm o compromisso de celebrar mais tarde outro contrato, que

será o contrato principal. “O contrato preliminar mostra-se portador de uma

55 PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil, p. 41. 56 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. p. 70.

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característica constante, isto é, a de ter por escopo, sempre, a realização de um

contrato definitivo57”.

O contrato definitivo tem por objeto, criar vários tipos de

obrigações para os contraentes. Assim, a compra e venda impõem ao vendedor o

mister de entregar a coisa e, ao comprador, o de entregar o preço. Portanto, cada

qual destes ajustes tem um objeto peculiar e as partes que a eles recorrem visam

obter esse fim típico em questão.

1.4.7 Dos contratos quanto seu modo de formação

Por fim, quando se tem em vista a maneira como são

formados, os contratos paritários dos contratos de adesão.

Contratos paritários são aqueles em que as partes

interessadas, colocadas em pé de igualdade, discutem os termos do ato negocial,

eliminando os pontos divergentes mediante transigência mútua.

Os contratos de adesão excluem a possibilidade de qualquer

debate e transigência entre as partes, uma vez que um dos contratantes se limita

a aceitar as cláusulas e condições previamente redigidas e impressas pelo outro,

aderindo a uma situação contratual já definida em todos os seus termos.

RODRIGUES58:

Contrato de adesão é aquele em que todas as cláusulas são previamente estipuladas por uma das partes, de modo que a outra, no geral mais fraca e na necessidade de contratar, não tem poderes para debater as condições, nem introduzir modificações, no esquema proposto. Este último contraente aceita tudo em bloco ou recusa tudo por inteiro.

O Código do Consumidor (Lei 8078/90) em seu artigo 54

estabeleceu que:

57 RODRIGUES, Silvio. Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 37. 58 RODRIGUES, Silvio. Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 42.

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Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente o seu conteúdo.

Não se pode deixar de esclarecer, que ainda existem outras

disposições acerca da classificação dos contratos que não foram aqui

apresentadas.

1.5 EFEITOS DOS CONTRATOS

O principal efeito do contrato consiste em criar obrigações,

estabelecendo um vínculo jurídico entre as partes contratantes. Trata-se de uma

verdadeira fonte de obrigações; por isso, todos os seus efeitos são meramente

obrigacionais, mesmo quando o contrato serve de título à transferência de direitos

reais. Tais efeitos se manifestam não só na força obrigatória, mas também na

relatividade do contrato59.

O contrato somente produz efeitos entre os contratantes.

O ato negocial deriva de acordo de vontade das partes, sendo lógico que apenas

as vincule, não tendo eficácia em relação a terceiros.

Assim, ninguém se submeterá a uma relação contratual, a

não ser que a lei o imponha ou a própria pessoa o queira.

No mesmo sentido, escreve RODRIGUES60:

O segundo princípio - o da relatividade das convenções - contém a idéia de que os efeitos do contrato só se manifestam entre as partes, não aproveitando nem prejudicando terceiros. O que, aliás, é lógico. Como o vínculo contratual emana da vontade das partes, é natural que terceiros não possam ficar atados a uma relação jurídica que lhes não foi imposta pela lei nem derivou do seu querer.

59 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Teoria das obrigações contratuais e

extracontratuais, p. 94. 60 RODRIGUES, Silvio. Dos contratos e das declarações unilaterais de vontade., p. 17

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Por conseguinte, tal princípio representa um elemento de segurança, a garantir que ninguém ficará preso a uma convenção, a menos que a lei o determine, ou própria pessoa delibere.

Nessa esteira, ainda, colaciona-se a lição de WALD61:

Os contratos alcançam as partes interessadas que são os sujeitos ativos e passivos da relação jurídica, assim como seus sucessores (herdeiros, cessionários), não podendo todavia prejudicar ou beneficiar terceiros sem declaração de vontade por parte destes de que aceitam os efeitos contratuais sobre o seu patrimônio.

Para o não contratante que não sucede o contratante, o contrato é res inter alios acta, relação jurídica entre as partes contratantes, sem nenhum efeito sobre o patrimônio do terceiro.

Podemos distinguir três situações distintas no campo das obrigações: as obrigações personalíssimas (escrever um livro, operar um doente), que só vinculam as partes, não se transmitindo aos seus sucessores (art. 928 do CC); as obrigações não personalíssimas, que obrigam as partes e seus sucessores (pagar um débito em dinheiro, entregar um bem móvel ou imóvel), e finalmente certos contratos que criam deveres ou direitos para terceiros, dependendo todavia a sua eficácia em relação ao terceiro da aceitação deste e, na hipótese de falta da mesma, resolvendo-se no plano patrimonial, em perdas e danos devidas pelos contratantes.

Isso posto, o contrato é uma fonte de obrigações entre as

partes, devendo, portanto, ser cumprido de maneira que os contratantes venham

a honrar o que foi estipulado.

1.5.1 Estipulação em favor de terceiro

A estipulação em favor de terceiro consiste numa das

poucas exceções ao princípio da relatividade dos contratos. Por meio deste

negócio jurídico, um terceiro, determinado ou determinável62 pode exigir o

61 WALD, Arnoldo. Obrigações e contratos, p. 197 62BESSONE, Darcy. Do contrato: teoria geral. 4 ed.. São Paulo: Saraiva,1997.p. 165.

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cumprimento de estipulação em seu favor, mesmo não sendo parte do contrato, a

não ser que haja convenção em sentido contrário63.

No direito brasileiro, a estipulação em favor de terceiro foi

abrangido com o advento do Código Civil atual64 que, contrariando a orientação

romana, permitiu que terceiro pudesse exigir o cumprimento de contrato do qual

não participou, evoluindo a partir do art. 1.121 do Código Civil francês65.

Para GOMES66

A estipulação em favor de terceiro é, realmente, o contrato por via do qual uma das partes se obriga a atribuir vantagem patrimonial gratuita a pessoa estranha à formação do vínculo contratual. (...). Para haver estipulação em favor de terceiro é necessário que do contrato resulte, para este, uma atribuição patrimonial gratuita. O benefício há de ser recebido sem contraprestação e representar vantagem suscetível de apreciação pecuniária. A gratuidade do proveito é essencial, não valendo a estipulação que imponha contraprestação. A estipulação não pode ser feita contra o terceiro. Há de ser em seu favor.

A estipulação em favor de terceiro, por ser um contrato

gratuito e uma exceção ao princípio da relatividade dos contratos, deve ser

interpretada restritivamente, conforme elementar regra de hermenêutica constante

do art. 6º da primeira Lei de Introdução ao Código Civil atual.

LOPES67 assim dispõe:

O princípio fundamental da estipulação em favor de terceiro é de ordem psicológica: a intenção do estipulante de contratar, não no

63 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado. 3 ed.. São Paulo:

Revista dos tribunais, 1.984. t. 26. p. 217-218; Santos, Carvalho. Código civil brasileiro interpretado. 7 ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1.964. v. 15.

64 BEVILAQUA, Clóvis. Código civil dos Estados Unidos do Brasil. 5 ed.. São Paulo: Francisco Alves, 1.938.v. 4. p. 270.

65 A despeito de conferir eficácia a um contrato celebrado em favor de terceiro, o Código Civil francês ainda é marcado pela influência romana que, como regra, vedava tais contratos. A maior admissibilidade destes contratos somente ocorreu por força do trabalho dos operadores do direito (Miranda, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado..., t. XXVI, pp. 214/217).

66 GOMES, Orlando. Contratos, p. 165/166 67“LOPES, Serpa. Curso de direito civil. p. 112/113.

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seu próprio interesse, senão no de terceiro. Essa intenção necessita vir manifestada de um modo expresso e inequívoco. Não basta uma cláusula suscetível de proporcionar, ocasionalmente, ou por repercussão, vantagens a terceiros. Cumpre que tudo decorra, sem nenhuma dúvida possível, do resultado da própria operação, ou de circunstâncias indicativas da intenção do estipulante de conferir um direito a um terceiro. Trata-se de uma questão de interpretação de vontade

A regra hermenêutica vem ainda referendada pelo art. 114

do novo CC que manda interpretar restritivamente os negócios jurídicos

benéficos, como é o caso, reproduzindo o art. 1.090 do CC atual, com a vantagem

de fazê-lo no lugar próprio, ou seja, na parte atinente aos atos jurídicos e não

somente aos contratos.

As partes são livres para distratar o negócio enquanto o

terceiro beneficiário não tiver a pretensão, ou seja, ainda não tenha ocorrido a

condição ou termo que torne exigível o direito de terceiro, as partes têm inteira

liberdade para alterar o negócio.

Ensina MIRANDA:

Em princípio, segundo o Código Civil: (a) O terceiro, a favor de quem se estipulou, adquire o direito desde a conclusão do contrato. Para que isso não se dê, é preciso que se haja preestabelecido a não aquisição desde logo ou a) pela inexão de condição ou termo ao próprio direito, de modo que se não irradie o próprio direito (o que não se presume) (...). Se foi reservada a resolução negocial, têm-se por permitidos, também, o distrato, a remissão de dívida, a compensação entre o promissário e o promitente. Se não foi reservada a resolução, não há pensar-se em desconstituição dos efeitos por vontade do promissário, salvo se não nasceu o direito ao terceiro. Enquanto não tem direito o terceiro, a liberdade dos figurantes é completa, e pode o promissário, por si só, afastar o efeito futuro da promessa do outro figurante, desde que a isso não se oponham os termos do contrato entre eles68.

68 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado..., t. XXVI, p. 242/255

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Assim, pode-se afirmar que a possibilidade de terceiro exigir

o cumprimento de contrato está condicionada à existência de pretensão que lhe

seja exclusivamente favorável, sem que haja, portanto, qualquer prestação que

lhe caiba.

1.5.2 O contrato por terceiro a declarar

É negócio jurídico celebrado pelas partes, por meio do qual

se prevê que uma delas poderá indicar outrem para assumir a sua posição

jurídica, o que liberaria o declarante, conseqüentemente, do vínculo originário.

O nomeado tem a faculdade de aceitar ou não a indicação,

porém, no caso de resposta afirmativa, o nomeado passará a aquisição de todos

os direitos e obrigações concernentes ao contrato principiado, desde que tenha se

verificado a cientificação do promitente acerca da nomeação realizada. A

aceitação tem efeito “ex tunc”.

Um exemplo é o compromisso de venda e compra, onde

seja estabelecido que o compromissário comprador possa indicar terceiro, o qual

assumirá sua posição contratual.

O artigo 468 do Código Civil determina que:

Art. 468. Essa indicação deve ser comunicada à outra parte no prazo de cinco dias da conclusão do contrato, se outro não tiver sido estipulado.

Parágrafo único. A aceitação da pessoa nomeada não será eficaz se não se revestir da mesma forma que as partes usaram para o contrato.

Permanecerá válido somente entre os contratantes iniciais;

quando não ocorrer a indicação da pessoa; quando o nomeado não aceitar a

indicação; se o nomeado era insolvente e o outro contratante desconhecesse tal

fato na época da indicação; se o indicado era civilmente incapaz no momento da

nomeação.

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1.6 EXTINÇÃO DO CONTRATO

1.6.1 Distrato

O distrato nada mais é do que o acordo de vontade entre as

partes contratantes, a fim de extinguir vínculo contratual anteriormente

estabelecido.

O Código Civil, em seu artigo 472 estabeleceu que “o

distrato faz-se pela mesma forma exigida para o contrato”.

O rompimento do vínculo contratual pela vontade de apenas

uma das partes é possível, porém como exceção, sendo assim o artigo 473 do

nosso Código Civil ampara a resilição unilateral somente “nos casos em que a lei

expressa ou implicitamente o permita”, e ainda, o rompimento unilateral do

contrato exige a denúncia notificada da outra parte.

Uma hipótese de resilição unilateral do contrato é a prevista

no artigo 46 da Lei 8245/90, que trata da locação residencial, o qual é a seguir

transcrito:

Art. 46. Nas locações ajustadas por escrito e por prazo igual ou superior a trinta meses, a resolução contrato ocorrerá findo o prazo estipulado, independentemente de notificação ou aviso.

Parágrafo 1º. Findo o prazo ajustado, se o locatário continuar na posse do imóvel alugado por mais de trinta dias sem oposição do locador, presumir-se-á prorrogada a locação por prazo indeterminado, mantidas as demais cláusulas e condições do contrato.

Parágrafo 2º. Ocorrendo a prorrogação, o locador poderá denunciar o contrato a qualquer tempo, concedido o prazo de trinta dias para a desocupação.

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Convém observar que qualquer que seja o efeito do distrato,

ele não atinge os terceiros que adquiriram direitos em virtude da existência do

contrato extinto69.

Ademais, o contrato que já foi executado, e portanto, extinto

pela quitação torna logicamente incabível o distrato. Daí que para DARCY

BESSONE não seja cabível o distrato nos contratos de execução imediata70, pois

neste caso a obrigação é cumprida instantaneamente no momento da celebra;áo

do contrato.

1.6.2 Cláusula resolutiva

A expressão resolutiva tem a acepção de resolver, colocar

fim, assim sendo, a cláusula resolutiva prevê hipótese onde poderá ocorrer o

término da relação contratual.

A cláusula resolutiva pode ser tácita ou expressa. A cláusula

resolutiva tácita tem seu fundamento na lei e alcança todos os contratos, ela é

prevista no Código Civil.

“Art. 475. À parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a

resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em

qualquer dos casos, indenização por perdas e danos”.

Cláusula resolutiva expressa é a que foi inserida pelas

partes no contrato. A cláusula resolutiva expressa, todavia, deve se referir ao

descumprimento específico de um dever contratual determinado, sob pena de se

reputar tácita a cláusula inserida em termo geral71.

69 TJRS – Ap. Cível 70007970239 – 16ª Câm. Cív. – Rel. Dês. Helena Ruppenthal Cunha – j.

17/3/2004. 70 BESSONE, Darcy. Do contrato: teoria geral p. 251. 71 BESSONE, Darcy. Do contrato: teoria geral, p. 252.

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A cláusula resolutiva expressa dispensa a intervenção

judicial, pois ela opera de pleno direito72, inibindo, segundo GOMES, que o credor

opte pela execução do contrato, ação de cumprimento73.

Todavia, há autores que, embora admitam a resolução de

pleno direito, neste caso, apontam à necessidade de sentença declaratória para,

assim, verificar-se, por exemplo, a validade da cláusula, a forma como o direito

dela resultante foi exercida, se de boa ou má-fé, aquilatar o tipo de

inadimplemento e se dá ensejo, de fato, à resolução do contrato.

72 ASSIS, Araken de. Resolução do contrato por inadimplemento, 3 ed. rev. e atual. São Paulo:

RT, 1999. p. 118. 73 GOMES, Orlando, Contratos. p. 175.

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CAPÍTULO 2

DIREITO DO CONSUMIDOR

2.1 HISTÓRICO

Ao se fazer um histórico acerca do Direito do Consumidor,

destaca-se a Revolução Industrial como de grande importância para o

desenvolvimento do Direito do Consumidor.

Ensina SOUZA74.

Antes da era industrial, o produtor-fabricante era simplesmente uma ou algumas pessoas que se juntavam para confeccionar peças e depois trocar os objetos (bartering). Com o crescimento da população e o movimento do campo para as cidades, formam-se grupos maiores, a produção aumentou e a responsabilidade se concentrou no fabricante, que passou a responder por todo o grupo.

Assim a Revolução Industrial foi responsável pelo

crescimento da chamada produção em massa perdendo a produção seu toque

"pessoal" e o intercâmbio do comércio ganhando proporções ainda mais

despersonalizadas.

Em conseqüência disto, descreve SOUZA75

O produtor precisava dar escoamento à produção, praticando, às vezes, atos fraudulentos, enganosos, por isso mesmo, abusivos. A justiça social, então, entendeu ser necessária a promulgação de leis para controlar o produtor-fabricante e proteger o consumidor-comprador.

74 Souza, Miriam de Almeida. A Política legislativa do Consumidor no Direito Comparado, p.40 75 Souza, Miriam de Almeida. A Política legislativa do Consumidor no Direito Comparado, p.48

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O produtor, via de regra, sempre se interessou mais pela

parte monetária do que com o produto, ou mesmo em satisfazer o consumidor76.

O crescimento e contínuos avanços das tecnologias

induziram o consumidor às idéias de que ele estava precisando de mais objetos

que até o momento nunca sentira necessidade de adquirir em sua vida cotidiana.

Com a Segunda Guerra Mundial foi surgindo a idéia de

mídia e tecnologia dando ressurgimento ao direito do consumidor.

Leciona SOUZA77.

A guerra intensificou a produção industrial em massa, e contribuiu para as grandes invenções e o aprofundamento da produção em série. Todo o esforço da guerra resultou, inevitavelmente, em aumento substancial de produção no posterior tempo de paz. O know-how gerado para a guerra provocou, então um crescimento em vários segmentos industriais, gerando um arsenal de produtos surpérfulos e diversificados, em um mercado antes restrito somente ao essencial. Com o advento da televisão, resultou da propaganda informativa o marketing (desenvolvido em forma de propaganda de guerra), com o objetivo de escoar a produção no mercado. Com isso, aumentaram os problemas relacionados à produção e ao consumo, em face de uma competitividade altamente sofisticada por causa das novas mídias e das próprias complexidades dos mercados surgidos no pós-guerra, e do advento do marketing científico. Passou-se então a praticar uma concorrência desleal, fortalecendo a tendência da formação dos cartéis, trustes e oligopólios, o que sem dúvida, colaborou, dentre outros motivos, para o agravamento dos problemas sociais e conflitivos urbanos em decorrência da concentração de renda

Seguindo do período pós-guerra surge à cláusula rebus sic

stantibus, enfraquecendo o princípio da força obrigatória dos contratos. Esta foi

denominada de "teoria da imprevisão" e visava à quebra do princípio do pacta

sunt servanda possibilitando o surgimento do Direito do Consumidor, que se

76 Souza, Miriam de Almeida. A Política legislativa do Consumidor no Direito Comparado, p.48 77 Souza, Miriam de Almeida. A Política legislativa do Consumidor no Direito Comparado, p.

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fundamentava a partir da responsabilidade civil objetiva e do reconhecimento dos

interesses e direitos difusos.

Ensina GOMES78.

O princípio da força obrigatória das convenções, pelo qual o juiz estava obrigado a fazer cumprir os efeitos do contrato, quaisquer que fossem as circunstâncias ou as conseqüências, está abalado. O legislador intervém, a cada instante, na economia dos contratos, ditando medidas que, tendo aplicação imediata, alteram os efeitos dos contratos anteriormente praticados, e vai se admitindo o poder do juiz de adaptar seus efeitos às novas circunstâncias (cláusula

rebus sic stantibus), ou de exonerar o devedor do seu cumprimento, se ocorrer imprevisão. Por fim, desde que os contratos são fonte de obrigações e estas importam limitação da liberdade individual, entendia-se que os seus efeitos não deveriam atingir a terceiros. O contrato era res inter alios acta. Mas as necessidades sociais impuseram a quebra, ainda que excepcional, desse princípio da relatividade dos efeitos do contrato, para a satisfação de certos interesses coletivos privados.

Com as iniciativas de John Fitzgerald Kennedy, na década

de 60, se consolidou o Direito do Consumidor nos Estados Unidos.

Segundo SOUZA79, Kennedy observou os pontos mais

relevantes como sendo:

(1) os bens e serviços colocados no mercado devem ser sadios e seguros para os uso, promovidos e apresentados de uma maneira que permita ao consumidor fazer uma escolha satisfatória; (2) que a voz do consumidor seja ouvida no processo de tomada de decisão governamental que detenha o tipo, a qualidade e o preço de bens e serviços colocados no mercado; (3) tenha o consumidor o direito de ser informado sobre as condições e serviços; (4) e ainda o direito a preços justos

Na 29ª Sessão em 1973, em Genebra, a Comissão de

Direitos Humanos das nações Unidas reconheceu os princípios e chamou-os de 78 GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil, p.105/106. 79 Souza, Miriam de Almeida. A Política legislativa do Consumidor no Direito Comparado, p.

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Direitos Fundamentais do Consumidor dividindo em proteção da saúde e da

segurança; proteção dos interesses econômicos; reparação dos prejuízos;

informação e educação; representação (ou direito de ser ouvido)80 .

As Nações Unidas, por meio da Resolução n.º 39/248,

estabelece objetivos, princípios e normas para que os governos membros

desenvolvam ou reforcem políticas firmes de proteção ao consumidor.

Segundo SOUZA81, o Anexo 3 da Resolução mostra os

seguintes princípios gerais:

a) proteger o consumidor quanto a prejuízos à sua saúde e segurança; (b) fomentar e proteger os interesses econômicos dos consumidores; (c) fornecer aos consumidores informações adequadas para capacitá-los a fazer escolhas acertadas, de acordo com as necessidades e desejos individuais; (d) educar o consumidor; (e) criar possibilidade de real ressarcimento ao consumidor; (f) garantir a liberdade para formar grupos de consumidores e outros grupos e organizações de relevância e oportunidade para que estas organizações possam apresentar seus enfoques nos processos decisórios a elas referentes

Somente com o artigo 48 do Ato das Disposições

Constitucionais Transitórias que foi determinado que o Congresso Nacional

elaborasse o Código de Defesa do Consumidor.

FILOMENO82 relata que a sensibilização dos constituintes de

1887/88, foi obtida por unanimidade na oportunidade do encerramento do VII

Encontro Nacional das Entidades de Defesa do Consumidor, desta feita realizada

em Brasília, por razões óbvias, no calor das discussões da Assembléia Nacional

Constituinte, e que acabou sendo devidamente protocolada e registrada sob n.º

2.875, em 8-5-87, trazendo sugestões de redação, inclusive aos então artigos 36

e 74 da Comissão "Afonso Arinos", com especial destaque para a contemplação

80 SOUZA, Miriam de Almeida. A Política legislativa do Consumidor no Direito Comparado, p.

56 81 SOUZA, Miriam de Almeida. A Política legislativa do Consumidor no Direito Comparado, p.

57 82 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de Direitos do Consumidor, p.21/22

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dos direitos fundamentais do consumidor (ao próprio consumo, à segurança, à

escolha, à informação, a ser ouvido, à indenização, à educação para o consumo e

a um meio ambiental saudável).

2.2 CONCEITOS

O consumidor é definido pelo art. 2º do CDC como sendo

aquele que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, e

fornecedor, pelo art. 3º, como aquele que desenvolve atividade de oferecimento

de bens ou serviços ao mercado.

Contudo, pode-se afirmar que nem todo destinatário final de

uma aquisição será consumidor, assim como nem todo exercente de atividade de

oferecimento de bens ou serviços ao mercado será fornecedor83.

Assim passa a se expor à conceituação detalhada de cada

instituto.

2.2.1 Conceito de consumidor

Conforme preceitua o artigo 1º da Lei 8.078/90, é o

consumidor o sujeito ativo da relação jurídica de consumo, já que a ele se

destinam os meios de proteção e defesa instituídos.

A Lei 8.078/90 em seu artigo 2.º o conceitua como sendo:

Art. 2º. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

ALMEIDA84 conceitua o consumidor partindo de três critérios

distintos: elementos subjetivos, objetivos e teleológicos.

Do ponto de vista do elemento subjetivo, entende que deve

ser o consumidor uma pessoa, enquanto sujeito de direitos; fecha a questão,

83 COELHO, Fábio Ulhoa. O empresário e os direitos do consumidor: o cálculo empresarial

na interpretação do Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 1994. 84 ALMEIDA, Carlos Ferreira. Os direitos dos consumidores. Coimbra: Almedina, 1982. p.28

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ademais, no que pertinente à possibilidade de as pessoas jurídicas também se

incluírem no rol de consumidores, limitando o conceito àquelas que não tenham

fins lucrativos.

Sob o aspecto objetivo, entende o autor esteja o consumidor

ligado a bens (coisas) ou serviços.

Por fim, do ponto de vista teleológico, aduz o Professor da

Faculdade de Direito de Lisboa que, para a correta noção de consumidor, devem

os tais bens ou serviços ter como destino uma utilização final, que seja diversa de

qualquer atividade profissional ou intermediária, ainda que pessoal ou privada.

BENJAMIN85 restringe o conceito de consumidor, o qual

seria "todo aquele que, para seu uso pessoal, de sua família, ou dos que se

subordinam por vinculação doméstica ou protetiva a ele, adquire ou utiliza

produtos, serviços ou quaisquer outros bens ou informação".

Para DINIZ86, o consumidor é tanto a pessoa física ou

jurídica que utiliza o produto como destinatário final, como a coletividade de

pessoas, mesmo que indeterminável que intervém nas relações de consumo.

O conceito legal de consumidor, instituído pelo Código de

Defesa do Consumidor, facilita, pois a sua visualização e proteção nas relações

de consumo.

2.2.2 Conceito de fornecedor

O fornecedor apresenta a característica do fornecimento,

tanto de produtos para o consumo, como para a prestação de serviços.

Art. 3º - Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação,

85BENJAMIN, Antonio Hermen Vasconcelos. O Conceito Jurídico de Consumidor. Revista dos

Tribunais, São Paulo, v. 628, p. 69 ss. 86 DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro, p. 10.

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exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Segundo MARINS87, “fornecedor é todo ente que provisione

o mercado de produtos ou serviços.” Assim, não há como deixar de conceituar

também produtos e serviços.

O § 2º do art. 3º do nosso Código dispõe que serviço é

qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração,

inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as

decorrentes de relações de caráter trabalhista.

SAAD88 conceitua serviço dizendo "é, enfim, uma atividade

humana que, na ótica do CDC, exerce-se sem vínculo empregatício e, de

conseguinte, com autonomia, mas sempre remunerada, pois o serviço gratuito

escapa à regulamentação legal".

Já o produto, segundo o § 1º do art. 3º, é qualquer bem

móvel ou imóvel, material ou imaterial, imperioso salientar que o Código na

verdade se reporta aos bens que possuem natureza patrimonial e são objeto de

direito subjetivo.

2.3 RELAÇÕES DE CONSUMO

Relação de consumo é a relação existente entre o

consumidor e o fornecedor na compra e venda de um produto ou na prestação de

um serviço.

No Código de Defesa do Consumidor esta tutelada as

relações de consumo e sua abrangência estão adstritas às relações negociais,

das quais participam, necessariamente, o consumidor e o fornecedor,

transacionando produtos e serviços.

87 MARINS, James. Responsabilidade de empresa pelo fato do produto. Revista dos Tribunais,

1993, p. 75. 88 SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. Lei 8.078 de

11.09.90. 7 ed. São Paulo: editora RT,2004. p. 83-84

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Para que seja amparada pelo Código de Defesa do

Consumidor, a relação de consumo tem que possuir uma relação de negócios que

visa à transação de produtos ou serviços e que esta seja feita entre um

fornecedor e um consumidor.

As relações de consumo têm sua origem estritamente ligada às transações de natureza comercial e ao comércio propriamente dito, surgindo naturalmente à luz deste. Com o implemento e a difusão do comércio, as relações de consumo experimentaram naturalmente ao longo dos tempos, um processo de aprimoramento e de desenvolvimento "pari passu" com o desenvolvimento das práticas comerciais, ganhando posteriormente importância, até atingir a forma contemporânea conhecida por nós, sendo devidamente regulamentada com o advento da lei 8078/90 (Código de Defesa do Consumidor), que passou a tutelar essa relação, revestindo-a de caráter público, a fim de resguardar os interesses da coletividade. Geralmente as relações de consumo surgem através de um negócio jurídico compreendido entre duas ou mais pessoas, geradas através de princípios contratuais básicos89.

Isso posto, não basta apenas à existência de um consumidor

para que ela seja caracterizada como relação de consumo, é necessária à

existência de um fornecedor que exerça as atividades descritas no artigo 3º do

Código de Defesa do Consumidor.

2.4 PRINCÍPIOS NORTEADORES DAS RELAÇÕES DE CONSUMO

Com base no art. 4.º, do CDC, extrai-se os princípios

básicos do sistema contratual das relações de consumo, os quais possuem,

ainda, reflexo no combatem às cláusulas abusivas, quais sejam: o princípio da

vulnerabilidade do consumidor, princípio da boa-fé, princípio do equilíbrio ou

eqüidade contratual, princípio da transparência, princípio da equidade, e o

princípio da confiança.

89 MANUCCI, Daniel Diniz. Como identificar uma relação de consumo . Jus Navigandi, Teresina, a.

4, n. 42, jun. 2000. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=688>. Acesso em: 11 de maio de 2007

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Nas palavras de MARQUES90

O primeiro tem reflexo direto no campo de aplicação do CDC, isto é, determina quais relações contratuais estarão sob a égide desta lei tutelar e de seu sistema de combate ao abuso. O segundo princípio é basilar de toda a conduta contratual, mas aqui deve ser destacada sua função limitadora da liberdade contratual. O terceiro princípio tem maiores reflexos no combate à lesão ou à quebra da base do negócio, mas pode ser aqui destacada sua função de manutenção da relação no tempo.

Nota-se por necessário fazer uma análise detalhada de cada

instituto.

2.4.1 Principio da boa-fé objetiva

O Código do Consumidor foi à primeira lei brasileira a tratar

da boa-fé objetiva e que tipificou várias hipóteses legais de deveres que

normalmente se incluiriam no âmbito da boa-fé.

O Código do Consumidor, ao estabelecer o princípio da boa-

fé objetiva, oxigenou o sistema negocial proporcionando o equilíbrio nas relações

de consumo, outrora em desvantagem em razão da adoção do princípio da boa-fé

subjetiva, princípio este voltado para o interesse do contrato e não das partes

contratantes.

Boa-Fé Objetiva é um ‘standard’ um parâmetro genérico de

conduta. Boa-fé objetiva significa, portanto, uma atuação ‘refletida’, pensando no

outro, no parceiro atual, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas

razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem

causar lesão ou desvantagem excessiva, gerando para atingir o bom fim.

90 MARQUES, Cláudia Lima. Notas sobre o Sistema de Proibição de Cláusulas Abusivas no

Código Brasileiro de Defesa do Consumidor (entre a tradicional permeabilidade da ordem jurídica e o futuro pós-moderno do direito comparado). Revista Jurídica, Porto Alegre, n. 268, p. 45,

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Nas relações de consumo, muitos dos deveres que no

Direito dos Contratos, têm sua fonte na boa-fé, já encontram previsão legal

específica, a remeter a fundamentação da sentença diretamente à lei.

Vale ainda mencionar que o princípio atinge todos

“envolvidos em um negócio jurídico” de modo que os contratantes devem

realizados levando em consideração os sentimentos da boa-fé.

A boa – fé objetiva traduz a necessidade de que as condutas sociais estejam adequadas a padrões aceitáveis de procedimento que não induzam a qualquer resultado danoso para o indivíduo, não sendo perquirido da existência de culpa ou de dolo, pois o relevante na abordagem do tema é a absoluta ausência de artifícios, atitudes comissivas ou omissivas, que possam alterar a justa e perfeita manifestação de vontade dos envolvidos em um negócio jurídico ou dos que sofram reflexos advindos de uma relação de consumo91:

Assim sendo, para Marques92 e Nunes93 o CDC adota o

princípio da boa – fé objetiva, que de um modo singelo, significa dizer que para se

estabelecer uma relação equilibrada, os contratantes deverão agir de forma

honesta e leal.

São os ensinamentos de AGUIAR JUNIOR94:

A inter-relação humana deve pautar-se por um padrão ético de confiança e lealdade, indispensável para o próprio desenvolvimento normal da convivência social. A expectativa de um comportamento adequado por parte do outro é um componente indissociável da vida de relação, sem o qual ela mesma seria inviável. Isso significa que as pessoas devem adotar um comportamento leal em toda a fase prévia à constituição de

91 BONATTO, Cláudio; MORAES, Paulo Valério Dal Pai. Questões Controvertidas no Código

de Defesa do Consumidor: principiologia, conceitos, contratos. 3 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2000. p. 37 e 38.

92 MARQUES, Cláudia Lima. Contrato no Código de Defesa do Consumidor. 4. ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2002. p. 671.

93 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 107.

94 AGUIAR JUNIOR, Ruy Rosado de. Extinção dos contratos por incumprimento do devedor, 1991, p. 239.

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tais relações (diligência in contrahendo); e que devem também comportar-se lealmente no desenvolvimento das relações jurídicas já constituídas entre eles. Este dever de comportar-se segundo a boa-fé se projeta a sua vez nas direções em que se diversificam todas as relações jurídicas: direitos e deveres. Os direitos devem exercitar-se de boa-fé; as obrigações têm de cumprir-se de boa-fé.

No que diz respeito ao aspecto contratual das relações de

consumo, verifica-se que a boa-fé na conclusão do contrato é requisito que se

exige do fornecedor e do consumidor, de modo a fazer com que haja

“transparência” nas relações de consumo, e seja mantido o equilíbrio entre as

partes.

2.4.2 Princípio da transparência

As relações de consumo devem pautar-se na mais absoluta

transparência, ou seja, o consumidor deve ter prévio e total conhecimento da

exata extensão das obrigações assumidas por ele e pelo empresário, decorrentes

do contrato.

É de suma importância, o princípio da transparência no

direito de consumo, haja vista que sem ele não seria garantida a exigência de

uma postura límpida das partes contraentes.

O princípio da transparência denota ser uma importante

inovação ao sistema jurídico, pois não se pode conceber um ato negocial que

demonstre falta de clareza em seu caráter expressivo. Já o princípio da boa-fé

caracteriza-se pela harmonia entre a transparência e a boa-fé, que se

complementam mutuamente. No principio de eqüidade existe a função básica a

promoção do equilíbrio na relação contratual, promovendo a prática abusiva.

Conclui-se com o princípio da confiança que se caracteriza com a satisfação para

as partes, havendo uma afinidade negocial alcançando com êxito os objetivos

motivadores da operação.

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MATTOS95 dispõe:

[...] É, muito embora o próprio caput do art. 4º do CDC consagre a autonomia do "princípio de transparência", não há como se negar que este nada mais é do que uma das mil faces da boa-fé, que, de tão abrangente, deixa escapar seu sentido para uma conceituação aberta, induzindo o cidadão a uma nova postura no ambiente contratual.

Assim, na formação dos contratos, deve ser observada a

necessária transparência visando possibilitar a instauração de uma relação

contratual sincera e não danosa entre os contratantes.

A transparência significa dar informação clara e correta

sobre o contrato a ser firmado tal como agir com lealdade e respeito nas relações

jurídicas, mesmo na fase pré-contratual. Significa ainda a possibilidade de o

consumidor ter acesso às informações referentes às condições e termos do

negócio que está realizando ou pretende realizar.

Assim, o empresário não poderá valer-se de nenhum

expediente para impedir que o consumidor celebre contrato ignorando

parcialmente as obrigações ou direitos assumidos.

Tal princípio afeta a essência do negócio e importa na

observância dos deveres de boa-fé, de cuidado, de cooperação, de informação,

de respeito à confiança mútua imputados a ambos os contratantes.

2.4.3 Princípio da equidade

A eqüidade, definida por Aristóteles como uma espécie de

justiça que permite ao juiz decidir o litígio de acordo com as peculiaridades do

caso, exerce papel de fonte integradora do ordenamento jurídico (de nada vale a

omissão do legislador do art. 4º da LICC) e de critério permanente para a

interpretação do direito. Visto o direito como um sistema autocorrigível, a

95 MATTOS, Francisco José Soller de. O Princípio da Boa-Fé no Código de Defesa do

Consumidor. In: Juris Revista do Departamento de Ciências Jurídicas. 1997., p. 80.

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eqüidade é o seu limite transcendental, inerente à própria estrutura, além do qual

está a injúria.

2.4.4 Princípio da confiança

Intimamente ligado ao princípio da transparência tem-se o

princípio da confiança, que consiste na credibilidade depositada pelo consumidor

no produto ou contrato a fim de que sejam alcançados os fins esperados.

Prestigia, dessa forma, as legítimas expectativas do consumidor.

Segundo SOUZA98

A situação costumeira de o comerciante propor uma oferta ao consumidor e este por ela ter-se interessado, faz-nos supor que o consumidor acreditou na boa-fé do ofertante, emitindo, por exemplo, um cheque pós-datado. Há desse modo, um contrato verbal cujo conteúdo é uma obrigação de não-fazer, ou seja, de não apresentar o título ao Banco antes da data previamente acertada entre os contratantes. As garantias são, então, dadas de ambos os lados da relação de consumo. O cliente prometeu que o cheque terá fundos quanto for sacado e o vendedor que só o apresentará na data que foi acertada. Trata-se de um acordo bilateral de vontades, com obrigações recíprocas, em que as partes estipulam, livremente, o modo de aquisição e o pagamento daquilo que foi acertado.

O princípio da confiança baseia-se no indivíduo e sua primazia, o qual recebe a declaração de vontade, em sua boa-fé ou má-fé, mas tem como fim proteger os efeitos do contrato e assegurar, através da ação do direito, a proteção aos legítimos interesses e a segurança das relações. O Código do Consumidor instituiu no Brasil o princípio da confiança do consumidor, que consta de dois aspectos deveras relevantes: a proteção da confiança no vínculo

98 SOUZA, Mariana Almeida de. O princípio da confiança do Direito Constitucional e sua aplicação

nos municípios. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 5, nº 194. Disponível em:<http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1531> Acesso em: 11 mai. 2007.

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contratual – tem o intuito de assegurar o equilíbrio das obrigações e os deveres de cada uma das partes, através da proibição de cláusulas abusivas (em especial nos contratos de adesão) e de uma interpretação sempre pró-consumidor; a proteção da confiança na prestação contratual – procura garantir ao consumidor a adequação ao produto ou serviço adquirido, assim como evitar riscos e prejuízos oriundos destes mesmos produtos e serviços. Assim, se ocorrer, no caso supracitado, a apresentação do cheque antes da data acordada entre as partes contratantes, configurar-se-á a quebra da confiança existente nesta relação de consumo.

Consoante os aspectos observados, o mundo atual é um espaço para novos desafios no ramo do Direito Contratual e este só pode ser atendido de forma conveniente, com a aplicação dos princípios da confiança e da boa-fé. Assim, o ideal almejado é que o mercado seja um local seguro, onde haja harmonia e lealdade nas relações entre fornecedores e consumidores.

A mútua de confiança é, pois imprescindível na formação e

execução do contrato, facultando ao consumidor que se sentir lesado por quebra

de confiança argüir a nulidade do negócio.

2.4.5 Princípio da Vulnerabilidade do consumidor

Este princípio atua como elemento informador da Política

Nacional das Relações de Consumo é tido como o núcleo base de onde se irradia

todo o outro princípio informador do sistema consubstanciado no Código de

Defesa do Consumidor.

2.4.6 Interpretação favorável ao consumidor

A interpretação contratual deve sempre favorecer o

consumidor, de modo que eventual tentativa de redação ambígua ou obscura do

contrato resulte ineficaz, diz o art. 47:

Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.

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Segundo esse princípio, se a disposição do contrato

comportar mais de uma interpretação, a que trouxer maiores vantagens ao

consumidor deve ter preferência sobre as demais.

Os contratos de consumo comportam execução especifica,

ou seja, pode o juiz adotar toda e qualquer medida que viabilize atingir o efeito

concreto pretendido pelas partes.

Em regra, as obrigações de fazer se resolvem em perdas e

danos, mas, em se tratando de relações de consumo, esta disciplina é admitida

somente por opção do autor da demanda ou por impossibilidade material da tutela

específica ou de resultado prático correspondentes.

Tanto o empresário como os consumidores estão sujeitos a

regra do artigo 84, de sorte que o primeiro pode obter ordem judicial que o

autorize a realizar, por conta do consumidor, as revisões no bem vendido, se este

ultimo assumiu a obrigação de as fazer.

2.5 VÍCIOS NA RELAÇÃO DE CONSUMO

Ante a necessidade de uma proteção mais ampla do

consumidor na relação de consumo, a noção de vício no é bem mais eficiente do

que a estabelecida pelo direito tradicional.

Para o Código de Defesa do Consumidor "defeito" é vício

mais dano à saúde ou segurança, estando associado, portanto aos fatos do

produto ou serviço e "vício" está associado à deficiência de qualidade ou

quantidade do produto ou serviço.

A responsabilidade pelos vícios na relação de consumo é

subjetiva com presunção de culpa do fornecedor, além da inversão do ônus da

prova em favor do consumidor sendo que, o consumidor poderá acionar

quaisquer dos componentes da cadeia de produção e comercialização seja o

comerciante, o fabricante, o distribuidor, ou todos eles conjuntamente.

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Não haverá a necessidade de haver relação contratual entre

o consumidor e o sujeito passivo demandado pelo vício do produto ou serviço

haja vista á solidariedade entre os componentes da cadeia de fornecedores.

2.5.1 Vicio pelo fato do produto ou do serviço

O vício pelo fato do produto ou do serviço decorre de danos

materiais ou pessoais provocados pelo produto ou serviço, sendo denominados

acidentes de consumo.

Assim, entende-se que o fato do produto é todo e qualquer

acidente provocado por defeito de produto ou de serviço que causar dano ao

consumidor ou a terceiros, que são a ele equiparados para esse efeito99. Neste

sentido nota-se:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

§ 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, [...].

Assim o vício pelo fato do produto é aquele inteiramente

ligado ao produto e o serviço que são considerados defeituosos, ou seja, quando

não oferecem a segurança que deles legitimamente se espera.

Nesta esteira preceitua o art 14, §1º:

§ 1°. O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes [...].

99SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho, Código de Defesa do Consumidor anotado e

legislação complementar, 2005, p.67 a 71

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Portanto quando os produtos ou serviços não oferecerem a

segurança que eles legitimamente se esperada, são considerados defeituosos.

2.5.2 Vicio do serviço ou do produto

O Código de Defesa do Consumidor, na seção III em seu

art. 20 trata da responsabilidade pelo "vício do serviço", mais especificamente,

"vícios de qualidade" por "inadequação" e "disparidade" com as indicações

constantes da oferta publicitária, ainda aqueles que "não atendam as normas

regulamentares de prestabilidade":

O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

(...)

§ 2.o São impróprios serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles de esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade."

Assim, tem-se, pois, que os vícios do produto ou serviços

são aqueles que tendem a inquinar a qualidade ou a quantidade dos produtos ou

serviços, decorrem de vícios inerentes, intrínsecos, aos bens ou serviços, os

quais provocam o dano na própria coisa. Recebem tal denominação, porque não

se exteriorizam a ponto de causar dano à saúde ou a segurança do consumidor, a

desconformidade que ocorre compromete apenas a prestabilidade ou

servibilidade, do próprio produto ou serviço100.

100 SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho, Código de Defesa do Consumidor anotado e

legislação complementar, 2005, p.87.

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Ensina MARQUES101 que "a prestação de serviço adequado

passa a ser a regra, não bastando que o fornecedor tenha prestado o serviço com

diligência".

SANSEVERINO102, sobre conceito ensina que:

"Consideram-se defeituosos os produtos ou serviços que não apresentam a

segurança que deles legitimamente se espera na sociedade de consumo."

Neste sentido, MARQUES103 ainda lembra que

Enquanto o direito tradicional se concentra na ação do fornecedor do serviço, no seu ‘fazer’, exigindo somente as diligências e cuidados ordinários, o sistema do CDC, baseado na teoria da função social do contrato, concentra-se no ‘efeito do contrato’.

O Código de Defesa do Consumidor prescreve no "caput" do

art. 14 e art. 22, que o fornecedor de serviços submete-se à responsabilidade

objetiva:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência da culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequados sobre sua fruição e riscos.

A causa resolve-se à luz do art. 6o inc. VI do Código de

Defesa do Consumidor, que ao prever seus direitos básicos, garante a

indenização por danos patrimoniais e morais decorrentes das relações de

consumo sendo que o inc. II do art. 20 do Código de Defesa do Consumidor

determina "a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada"

pelos vícios de qualidade do serviço. “

101 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime

das relações contratuais. 4 ed. São Paulo: RT, p. 308 102 SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Responsabilidade civil no código do consumidor e

a defesa do fornecedor. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 114. 103 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime

das relações contratuais. p. 308.

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Ainda, preceituando o artigo 26 do Código de Defesa do

Consumidor:

Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviços e de produtos não-duráveis;

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviços e de produtos duráveis.

Assim para reparação o fornecedor terá um prazo de 30 dias

para substituir a parte viciada104.

O direito à reparação em face de vícios do produto ou

serviço se sujeita aos seguintes prazos decadenciais: 30 (trinta) dias, tratando-se

de produto ou serviço não-durável, e 90 (noventa) dias, tratando-se de produto ou

serviço durável105.

Neste sentido cita-se o art 27:

Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.

Por fim, oportuno destacar que os prazos no caso de vícios

aparentes ou de fácil constatação contam a partir da entrega efetiva do produto

ou do término da execução do serviço. Já em se tratando de vícios ocultos, o

prazo começa a contar no momento em que for evidenciado o defeito.

104 SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho, Código de Defesa do Consumidor anotado e

legislação complementar, 2005, p.87. 105 GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil.

Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 3., p. 29.

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2.5.3 Causas de exclusão da responsabilidade

O seu art. 12, § 3° traz as hipóteses que eximem o

fornecedor da obrigação de indenizar:

[...]

§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

I - que não colocou o produto no mercado;

II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Assim, quando não houver relação de causa e efeito, não há

que se falar em responsabilidade estando exonerado o fornecedor sendo que

para todas as hipóteses previstas acima o fundamento da exoneração da

responsabilidade é a inexistência de nexo causal.

2.5.3.1 Não colocação do produto no mercado

Se o produto for defeituoso, mas não foi colocado no

mercado, não há responsabilidade.

NORRIS106 assim define:

Deve-se entender como colocado em circulação um produto sempre que o seu produtor, entendendo encontrar-se a mercadoria em perfeitas condições, faz a sua entrega ao mercado de consumo, introduzindo-o, de forma consciente, no circuito de distribuição, mesmo que seja para exame ou prova.

106 NORRIS, Roberto. Responsabilidade Civil do Fabricante pelo Fato do Produto. Rio de

Janeiro: editora Forense, 1996 p. 86

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Importante ressaltar que a colocação do produto no mercado

não se refere apenas ao momento em que o fornecedor o entrega para que seja

comercializado, mas também quando o entrega para exame ou prova.

2.5.3.2 Inexistência de defeito

Sendo o defeito um elemento indispensável para que haja o

fato do produto e conseqüentemente a responsabilidade do fornecedo rnão

havendo o defeito não há que se falar em responsabilidade, pois não há que se

falar em relação de causa e efeito.

2.5.3.3 Culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro

A culpa exclusiva tanto do consumidor quanto de terceiro

exclui a responsabilidade do fornecedor.

Considera-se é possível falar-se em participação da vítima

no resultado mesmo em se tratando de responsabilidade objetiva, o que ocorrerá

somente em situações excepcionais, em que não haja defeito no produto.

Entretanto, adverte o autor que se, embora culposo, o fato da vítima é inócuo para

a produção do resultado, não pode atuar como minorante da responsabilidade do

fornecedor107.

Tratando-se de culpa do fornecedor, a admissão apenas da

culpa exclusiva do consumidor como causa de exclusão da responsabilidade do

fornecedor constitui afronta à idéia de que a concausalidade culposa da vítima é

uma expressão particular do princípio da boa-fé, que pretende estimular cada um

a velar pela sua própria segurança e evitar que quem causa culposamente um

dano a si mesmo venha a exigir de outrem a sua indenização, num claro venire

contra factum proprium108.

107 CAVALIERI FILHO, Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. p. 433 108 ROCHA, Silvio Luís Ferreira da. Responsabilidade Civil do Fornecedor pelo Fato do

Produto no Direito Brasileiro. p.108

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Quanto à culpa exclusiva de terceiro, Cavalieri Filho110

entende que devem ser aplicados os mesmos princípios contidos no fato

exclusivo do consumidor, ao dizer o seguinte:

Tal como se põe para o fato exclusivo do consumidor, só haverá a exclusão da responsabilidade do fornecedor se o acidente de consumo tiver por causa o fato exclusivo, não concorrendo qualquer defeito do produto. A culpa de terceiro, repita-se, perde toda e qualquer relevância desde que evidenciado que sem o defeito do produto ou serviço o dano não teria ocorrido.

Para Rocha111:

Com efeito, tratando-se de terceiro, não teria sentido a culpa concorrente dele excluir a responsabilidade do fornecedor, porque isso redundaria em irreparável prejuízo para o consumidor. Assim, a concausalidade culposa de terceiro não constitui causa de redução nem de exclusão da responsabilidade do fornecedor perante a vítima.

Assim, não há que se falar em culpa concorrente de terceiro.

110 CAVALIERI FILHO, Sergio . Programa de Responsabilidade Civil, p.434 111 ROCHA, Silvio Luís Ferreira da. Responsabilidade Civil do Fornecedor pelo Fato do

Produto no Direito Brasileiro. 2 ed. São Paulo: editora RT, 2000. p.107.

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CAPÍTULO 3

A PROTEÇÃO CONTRATUAL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

3.1 DEVER DE INFORMAR (ART. 46, CDC)

O art. 46 conta com a seguinte redação112:

Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.

A interpretação do art. 46 do CDC passa, perfunctoriamente,

pela obrigação do fornecedor em atender ao princípio da transparência – ínsito no

corolário maior que é o princípio da boa-fé objetiva -. Então, subsumidas duas

situações em que o consumidor não está obrigado pelo contrato, quais sejam,

quando não lhe for oportunizado o conhecimento prévio do conteúdo contratual e

quando o instrumento contratual estiver redigido a modo a dificultar não só a

exata compressão de seu conteúdo, mas também seu alcance.

Na primeira situação torna-se evidente que não poderá ser o

consumidor obrigado por contrato ao qual não teve acesso quanto ao que nele

consta. Não atendida esta obrigação por parte do fornecedor, as conseqüências

são que, segundo Marques113

112 Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990. 113 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor..p. 662.

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[...] o contrato não tem seu efeito mínimo, seu efeito principal e nuclear que é obrigar, vincular as partes. Se não vincula, não há contrato, o contrato de consumo como que não existe, é mais que ineficaz, é como que inexistente, [...].

No segundo caso, o Código de Defesa do Consumidor está

a exigir que as cláusulas que obriguem os consumidores estejam redigidas de

forma a facilitar a compreensão por aquele que, nos termos da doutrina

dominante, pode-se considerar o homo médium. Nas palavras de Nelson Nery

JÚNIOR114

Não basta o emprego de termos comuns, a não-utilização de termos técnicos e palavras estrangeiras para que seja alcançado o objetivo da norma sob comentário. É preciso que também o sentido das cláusulas seja claro e de fácil compreensão. Do contrário, não haverá exigibilidade do comando emergente dessa cláusula, desonerando-se da obrigação o consumidor.

Sem grandes dificuldades, a jurisprudência pátria tem

aplicado a norma consumerista de forma clara:

DIREITO ECONÔMICO E DIREITO DO CONSUMIDOR – CLÁUSULA DE VARIAÇÃO CAMBIAL – INVALIDADE – MÁCULA AO PRINCÍPIO DO DEVER DE INFORMAR – INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 46 E 52 DA LEI Nº 8.078/90 – COBRANÇA ANTECIPADA DO VALOR RESIDUAL GARANTIDO – DESCARACTERIZAÇÃO DO CONTRATO DE LEASING – VEDAÇÃO LEGAL DE CLÁUSULA DE VARIAÇÃO CAMBIAL – INTELIGÊNCIA DO ART. 6º, DA LEI Nº 8.880/94. Por força do princípio do dever de informar, a apelante tinha o dever de esclarecer, à época da contratação, sobre quais seriam os riscos e as conseqüências da adoção da cláusula de variação cambial. E isso não foi feito, pois basta uma simples leitura da cláusula que prevê a variação cambial para se confirmar a flagrante violação ao princípio do dever de informar. Destarte, como a conduta do apelante maculou o princípio do dever de informar e o art. 46 do Codecon, não é válida a cláusula contratual que prevê o reajuste das prestações do contrato pela variação cambial. A opção de

114 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código brasileiro de defesa do consumidor comentado

pelos autores do anteprojeto: 7. ed. Rio de Janeiro:Forense Universitária. 2001. p. 487.

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compra, com pagamento do valor residual ao final do contrato é uma das características essenciais do leasing. A cobrança antecipada dessa parcela, embutida na prestação mensal, desfigura o contrato, que passa a ser uma compra e venda a prazo ( art. 5º, c, combinado com o art. 11, § 1º, da Lei nº 6.099, de 12.9.74, alterada pela Lei nº 7.132, de 26.10.83). Diante dessa consideração, é de convir-se que é nula, por força do art. 6º da Lei nº 8.880/94, a contratação de reajuste vinculado à variação cambial. A exceção que o referido artigo prevê não se aplica ao caso em tela, porquanto não se trata de contrato de arrendamento mercantil, mas sim de contrato de compra e venda a prazo. (TAMG – AC 0321625-3 – 4ª C.Cív. – Relª Juíza Maria Elza – J. 14.02.2001)

Assim, afirmado que o dever de informação por parte do

fornecedor constitui-se condição primordial para assegurar ao consumidor a

efetividade no elemento teleológico negocial, qual seja, a finalidade pretendida

pelo consumidor na relação de consumo a que se obriga.

3.2 INTERPRETAÇÃO PRÓ-CONSUMIDOR (ART. 47, CDC)

O art. 47 conta com a seguinte redação115:

As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.

O artigo em comento deve ser interpretado de forma ampla e

genérica, já que, ‘cláusulas contratuais’ é termo empregado para qualquer avença

negocial firmada entre consumidor e fornecedor, seja ela escrita ou verbal.

A Lei Consumerista pretende, antes de tudo, impor

instrumentos de reequilíbrio contratual, quer seja, propor para partes desiguais –

seja na vulnerabilidade, seja na hipossuficiência -, tratamento desigual na medida

115 Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990.

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de suas desigualdades, objetivando assim atingir um razoável patamar de

equilíbrio. Esta desigualdade existente entre o consumidor e a portentosa massa

fornecedora está reconhecida no art. 4o, I do Código de Defesa do Consumidor

atendendo à súplica da sociedade de tratamento diferenciado do consumidor.

Ademais, já estabelecia o art. 85 do antigo Código Civil que

nas declarações de vontade, atender-se-á mais a intenção do agente que o

sentido literal do documento confeccionado. É que a doutrina e a jurisprudência

sedimentaram a procura da ‘intenção real’, mormente quando se trata de

contratos de adesão fixados prioritariamente pelo fornecedor em que as cláusulas

contratuais apresentem interpretação dúbia ou contraditória.

Do escólio jurisprudencial catarinense colhe-se:

Apelação Cível n. 97.001400-7, de Criciúma.

Relator: Des. Pedro Manoel Abreu.

Seguro. Acidente de trânsito. Danos morais. Ação de cobrança por sub-rogação. Alegação de falta de cobertura da apólice. Contrato de adesão. Dúvida. Resolução a favor do segurado.

O dano moral é espécie do gênero dano pessoal, sendo responsável regressivamente a seguradora, mormente quando não comprovada expressamente a exclusão dessa responsabilidade no contrato (TARGS, Ap. Cív. n. 195000799, rel. Arno Werlang, j. 08.08.95).

Sendo notório o caráter adesivo de que se reveste o contrato securitário, quaisquer percalços em sua interpretação, decorrentes da obscuridade ou ambigüidade de suas cláusulas, bem como de imprecisões terminológicas, hão de ser destrinçados em prejuízo do estipulante, isto é, do segurador.

A interpretação da cláusula em favor do consumidor não

implica, necessariamente, na anulação do contrato firmado entre as partes, visto

que objetiva a Lei Consumerista apenas retirar do contexto contratual cláusulas

que imponham excessiva onerosidade em desfavor da parte mais débil da relação

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contratual.

Em harmonia com o princípio da transparência – entre

outros -, a interpretação de cláusula contratual em favor do consumidor é mais um

dos alicerces que dão sustentação ao princípio maior da boa-fé objetiva nos

contratos, normatizada e exigida na Lei n° 8.078/90.

3.3 EXECUÇÃO ESPECÍFICA (ART. 48, CDC)

O art. 48 conta com a seguinte redação117:

As declarações de vontade constantes de escritos particulares, recibos e pré-contratos relativos às relações de consumo vinculam o fornecedor, ensejando inclusive execução específica, nos termos do artigo 84 e parágrafos.

O art. 48 do Código de Defesa do Consumidor haverá de ser

interpretado sistematicamente, ou seja, dentro da codificação imposta pela Lei

Consumerista. O artigo em comento é complementado pelos art. 30 e 35 na sua

função e pelo art. 84 e parágrafos nas suas conseqüências.

Inicialmente, o art. 30 da Lei n° 8.078/90119, estabelece a

obrigação do fornecedor de prestar toda informação ou publicidade

suficientemente precisa. Como alerta Luiz Antonio Rizzatto NUNES120,

isto porque, se a informação ou publicidade não for suficientemente precisa, já estará havendo uma infração. E mais

117 Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990. 119 Redação: Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por

qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.

120 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor... . p. 366.

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adiante conclui que Se não for, das duas uma: a) ou nada comunica e aí não se pode falar em oferta por impossibilidade material da mensagem; b) ou comunica mal, caso em que se deverá fazer uma interpretação da mensagem contra o fornecedor que a emitiu ou veiculou.

Independentemente do erro ocorrido na propaganda

veiculada, ocorre o fenômeno da vinculação do fornecedor (salvo se a

mensagem/propaganda/oferta, ‘ela própria’, deixar patente o erro121). Assim,

inobstante muitas vezes não constar do contrato, a oferta estará a ele (contrato)

vinculada por força do art. 30, in fine, do Código do Consumidor, não podendo

sua ausência ser alegada pelo fornecedor como argumento para seu não

cumprimento.

Em relação à execução específica, para um entendimento

sistematizado necessário atender conjuntamente ao disposto no art. 35 da Lei n°

8.078/90122. Pelo final do artigo, verifica-se que o consumidor terá alternativas

para exercer sua proteção contratual, escolhendo livremente uma das três opções

dos incisos.

Um dos aspectos práticos da opção pela execução do inciso

I do art. 35, complementado pelo art. 84, CDC, conforme anota Luiz Antonio

Rizzatto NUNES123, é que:

[...]. Quando a norma fala que o consumidor poder exigir, essa é efetivamente sua intenção. A lei dá ao consumidor o direito de exigir o cumprimento da oferta. Acontece que nada garante – tanto mais na nossa cultura, infelizmente, de desrespeito ao

121 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor... . p.

367-368. 122 Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação

ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha:

I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade;

II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;

III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.

123 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor... . p. 394.

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consumidor – que o fornecedor cumprirá a exigência. De modo que a norma garantidora do direito material ora em comento, que oferece a prerrogativa ao consumidor, fatalmente o levará ao processo judicial.

Anotado que o legislador, já prevendo o processo judicial

como forma garantidora do cumprimento da execução específica de obrigação de

fazer (ou resolução por perdas e danos, conforme a opção do consumidor

lesado), inteligência dos parágrafos no art. 84 do Código de Defesa do

Consumidor, conferiu ao magistrado diversas formas de coerção judicial a fim de

tornar real a efetividade na prestação jurisdicional reclamada pelo consumidor.

A conferência ao juiz de amplos poderes para tornar efetiva

a tutela do consumidor, cuja ordem dos parágrafos do art. 84 são meramente

exemplificativas, pressupõe a necessidade do consumidor de exercer seu direito

constitucional de direito a ação. Por resultado, como ensina Nelson Nery

JÚNIOR124, [...] O juiz poderá determinar qualquer providência que o caso mereça,

a fim de que seja assegurado o resultado prático equivalente ao inadimplemento

da obrigação de fazer.

A jurisprudência tem aplicado a norma legal, inclusive

reiterando os poderes conferidos ao Poder Judiciário para garantir a efetividade:

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PEDIDO ALTERNATIVO DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL COM DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS – COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL PARA ENTREGA FUTURA – INADIMPLEMENTO DA VENDEDORA – TUTELA ANTECIPADA – INDEFERIMENTO PELO JUÍZO – AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO – 1. Se a vendedora se comprometeu a construir o imóvel para entrega futura (cláusula 6ª, alínea a, do contrato), sua obrigação caracteriza-se como de fazer, comportando a tutela específica prevista no art. 84 do Código de Defesa do Consumidor. 2. Revelando-se impossível o cumprimento específico da obrigação de entrega da sala comercial, em face da paralisação da obra, no

124 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do ... p. 491.

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estágio embrionário, é facultado ao adquirente rescindir o contrato com o direito à devolução da quantia paga, monetariamente atualizada, além de perdas e danos (art. 35, III, CDC). 3. Demonstrados os pressupostos da relevância do fundamento da demanda e do justificado receio de ineficácia do provimento final, concede-se liminarmente a tutela pleiteada. (TJPR – AI 0098072-5 – (6002) – 6ª C.Cív. – Rel. Des. Conv. Domingos Ramina – DJPR 19.02.2001)

Em suma, a existência de mensagem/propaganda/oferta

vincula o fornecedor a uma obrigação de fazer perante o consumidor que, uma

vez lesado, poderá optar pelos procedimentos previstos nos incisos do art. 35 do

Código de Defesa do Consumidor, sendo que tal opção é protegida na sua

efetividade pelos poderes conferidos ao juiz através dos parágrafos do art. 84 do

Código de Defesa do Consumidor.

3.4 DIREITO DE ARREPENDIMENTO (ART. 49, CDC)

O art. 49 conta com a seguinte redação125:

O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 (sete) dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.

Diante da massificação das relações de consumo, onde os

fornecedores, objetivando alcançar o maior número possível de consumidores em

menor tempo, utilizam meios extremamente agressivos de propaganda, a

125 Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990.

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legislação consumerista estabeleceu meios de defesa para o consumidor incauto

que muitas vezes se vê engolfado por estas práticas comerciais de marketing,

não tendo chance de raciocinar calmamente a fim de ponderar sobre a

necessidade e oportunidade daquela relação de consumo, sendo absolutamente

normal que haja, posteriormente, um arrependimento sobre o negócio feito sob o

calor da impressão propagandista. Para Luiz Antonio Rizzatto NUNES126,

Nesse tipo de aquisição o pressuposto é que o consumidor está ainda mais desprevenido e despreparado para comprar do que quando decide pela compra e, ao tomar a iniciativa de faze-la , vai até o estabelecimento.

O ensinamento de Nelson Nery JÚNIOR127 justifica a

possibilidade de posterior arrependimento

[...] Isso porque, na maior parte das vezes, as compras por catálogo ou por telefone são realizadas sem que o consumidor esteja preparado para tanto, e, ainda, sem que tenha podido ter acesso físico ao produto. Quando recebe o produto encomendado, verifica que está aquém das suas expectativas, pois, se o tivesse visto e examinado, não o teria comprado.

O art. 49 do Código de Defesa do Consumidor admite o

arrependimento e desistência do negócio por parte do consumidor sempre que a

relação de consumo tenha se materializado fora do estabelecimento comercial.

Note-se que a alteração da vontade de contratar não precisa ser justificada pelo

consumidor, pois, segundo Nelson Nery JÚNIOR128,

[...] Basta que o contrato de consumo tenha sido concluído fora do estabelecimento comercial para que incida, plenamente, o direito de o consumidor arrepender-se.

Ao contrário do consumidor que se dirige a um

estabelecimento comercial pretendendo uma relação de consumo, presumindo-se

que saiba aproximadamente o que deseja e se sente preparado para enfrentar a

126 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor... . p.

555. 127 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: ... p. 493. 128 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor:... p. 492.

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possibilidade de um negócio, o consumidor que tem sua intimidade invadida por

técnicas comerciais agressivas acaba ainda mais numa situação de defensiva e,

de forma muitas vezes constrangedora, se vê quase em uma obrigação de

contratar diante do poder de persuasão de certas campanhas de oferta,

justificando, portanto, não só a possibilidade de posterior arrependimento como

também a plena dispensabilidade de justificativa deste arrependimento.

Outro fator importante é a contagem do prazo de sete dias

para a devolução, este tendo por premissa duas situações distintas: a) o prazo

somente poderá se iniciar a partir da conclusão do contrato de consumo ou do ato

de recebimento do produto ou serviço, ou seja, a partir da conclusão do último

destes atos; e, b) aplica-se nesta contagem de prazo o contido no art. 132 do

Código Civil (Lei n° 10.406/2002).

No caso do art. 49 da Lei Consumerista, o prazo de sete

dias apenas faz referência ao mínimo que a legislação específica estipulou como

período em que o consumidor poderá exercer seu direito de arrependimento.

Assim, caso o fornecedor, em sua mensagem/propaganda/oferta estabelecer

prazo maior, estará neste prazo vinculado, mormente pelo estabelecido no art. 30

da Lei n° 8.078/90 – o que não poderá fazer, obviamente, é estabelecer prazo

menor que sete dias para o exercício do direito de arrependimento do

consumidor.

Inobstante o consumidor não necessitar justificar sua

desistência, existem algumas condições que o obrigam, quer sejam, que a

manifestação ocorra dentro do prazo legal e que seja objetivamente manifestada.

Por outro lado, a norma do Código de Defesa do Consumidor não exige nenhum

procedimento especifico de notificação do fornecedor do exercício do direito de

arrependimento por parte do consumidor, bastando que o consumidor utilize os

meios existentes (telefone, Internet, correios – cartas, telegramas, etc. -, ou

Cartório de Títulos e Documentos e, principalmente, reclamação protocolada em

Procon, entre outros).

O fato de ter a lei (art. 49, in fine, CDC) prescrito

‘especialmente por telefone ou a domicílio’ não quer dizer que este rol é taxativo,

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podendo este rol ser estendido de acordo com as práticas comerciais que vierem

a ser adotadas para vendas fora do estabelecimento comercial. Para Nelson Nery

JÚNIOR129, O caráter de numerus apertus desse elenco é dado pelo advérbio

“especialmente”, constante da norma. Essa expressão indica claramente o

propósito da lei de enumerar exemplos e não hipóteses taxativas.

Exercido pelo consumidor, dentro do prazo legal, seu direito

de arrependimento, estará o fornecedor obrigado à devolução das quantias

eventualmente pagas devidamente corrigidas monetariamente pelos índices

oficiais, bem deverá arcar com as despesas de envio, frete e outros encargos.

Isso porque, sendo as vendas fora do estabelecimento comercial uma verdadeira

invasão na intimidade e paz do consumidor, é bastante razoável que o

responsável por esta prática agressiva responda não só pela devolução

atualizada de quantias pagas, como também pelas despesas de envio, frete e

outros encargos. Nelson Nery JÚNIOR130

adverte que [...] A cláusula contratual que

lhe retire o direito ao reembolso das quantias pagas é abusiva e, portanto, nula,

de acordo com a prescrição do art. 51, n° II, do Código.

Ensina Luiz Antonio Rizzatto NUNES131 que:

A condição estabelecida no art. 49 é do tipo que, uma vez exercida, faz com que o efeito retroaja ao início do negócio, para caraterizá-lo como nunca tendo existido.

Desta forma, operada a desistência, os efeitos da revogação do ato são ex tunc, ou seja, retroagem ao início para repor as partes ao status quo ante, como se nunca tivessem efetuado a venda e compra.

Concluído então, que o estabelecido no art. 49 do Código de

Defesa do Consumidor confere ao consumidor o direito de arrepender-se do

129 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: ...p. 495. 130 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor...: p. 495. 131 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor... . p.

560.

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negócio realizado fora do estabelecimento comercial (telefone, à domicílio ou

qualquer outra iniciativa deste quilate, principalmente, com reclamação

protocolada em Procon). Este direito deverá ser exercido no prazo legal ou prazo

maior estabelecido pelo fornecedor e objetivamente manifestado por qualquer

meio, sendo que eventuais quantias pagas deverão ser devolvidas devidamente

atualizadas por índices oficiais arcando ainda o fornecedor com as despesas de

frete e demais encargos.

3.5 GARANTIA CONTRATUAL COMPLEMENTAR (ART. 50, CDC)

O art. 50 conta com a seguinte redação132:

A garantia contratual é complementar à legal e será conferida mediante termo escrito.

Parágrafo único. O termo de garantia ou equivalente deve ser padronizado e esclarecer, de maneira adequada, em que consiste a mesma garantia, bem como a forma, o prazo e o lugar em que pode ser exercitada e os ônus a cargo do consumidor, devendo ser-lhe entregue, devidamente preenchido pelo fornecedor, no ato do fornecimento, acompanhado de manual de instrução, de instalação e uso de produto em linguagem didática, com ilustrações.

A norma consumerista, atendendo sua função constitucional,

implementa para o consumidor a existência da garantia legal e contratual.

Necessário, outrossim, assinalar o caráter complementar da garantia contratual,

ou seja, o Código de Defesa do Consumidor é enfático em impossibilitar a

substituição da garantia legal por uma eventual garantia contratual. Para Nelson

Nery JÚNIOR133 [...]. Aquela é obrigatória e inderrogável; esta é complementar àquela,

constituindo-se num plus em favor do consumidor.

A garantia legal está prevista no art. 24 da Lei Consumerista

132 Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990. 133 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor.. p. 497.

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e não pode ser condicionada a qualquer fator externo que não seja a adequação

do produto ao destino normal que dele se espera. Luiz Antonio Rizzatto NUNES134

esclarece que

o art. 24 estabelece expressamente a garantia legal de adequação dos produtos e serviços, e o faz absolutamente, porquanto independe de qualquer manifestação do fornecedor, sendo que ele está proibido de buscar desonerar-se de sua responsabilidade por essa garantia legal.

Se a garantia contratual é facultativa para o fornecedor, a

garantia legal é obrigatória não só por que o consumidor pode ser (e

freqüentemente é) vulnerável ou hipossuficiente, mas por que a qualidade,

segurança, durabilidade e desempenho do produto e/ou serviço são uma

exigência do mercado de consumo e é condição sine qua non de ordem pública

(art. 4o, II, letra ‘d’ da Lei n° 8.078/90) baseado no princípio da confiança. Daí a

conclusão de que a garantia legal não nasce a partir do contrato mas sim torna-se

obrigatória desde a produção com a legítima confiança do mercado de consumo

que o produto e/ou serviço se prestará a seu destino.

Do escólio jurisprudencial colhe-se:

RESPONSABILIDADE CIVIL DE FABRICANTE – VÍCIO REDIBITÓRIO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – CLÁUSULA POTESTATIVA – GARANTIA CONTRATUAL – CANCELAMENTO UNILATERAL – NULIDADE ACOLHIDA – Responsabilidade do fabricante. Relação de consumo. Fato do produto. Obrigação de substituir peças viciadas. Garantia complementar. Na relação de consumo, a responsabilidade do fabricante é objetiva, decorrendo do simples fato da fabricação do produto, ou seja, do risco empresarial, e em se tratando de vício de qualidade do mesmo, que afeta a eficiência do seu desempenho e durabilidade, conforme a destinação prevista, poderá o consumidor exigir a substituição das partes viciadas (CDC, arts. 12 e 18). Compreendida na oferta, a garantia, como declaração de vontade, vincula o fornecedor (CDC, arts. 30, 31, e 48), não se tratando de mera liberalidade. A cláusula de cancelamento unilateral, contida

134 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor... . p.

563.

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no certificado de garantia, é nula, não só por sua potestatividade (CC, art. 115, 2. parte), mas por atentar contra a própria garantia legal de adequação e boa qualidade do produto, cuja exoneração contratual é vedada (CDC, arts. 24 e 51, XIII). Procedência da tutela específica com a declaração da nulidade. Multa devida após a citação para o cumprimento da obrigação. Valor da multa e prazo adequadamente fixados. Confirmação da sentença. 135

Enquanto a garantia legal é indeclinável para o fornecedor, a

garantia contratual a uma mera faculdade da cadeia produtiva, sendo que seus

termos e condições são estabelecidos unilateralmente pelo fornecedor. Certo é

que a garantia contratual, por tratar-se de uma liberalidade do fornecedor,

funciona com um estímulo, uma propaganda, um reforço para atrair o consumidor.

Todavia, inobstante estar na esfera de opção do fornecedor de ofertar ou não,

uma vez estabelecida, ao produto estará vinculada (art. 30 do Código de Defesa

do Consumidor).

Estabelece o Código de Defesa do Consumidor que o termo

de garantia seja apresentado de forma escrita, permitindo assim uma correta

interpretação do consumidor da sua medida e extensão, sendo que, no caso de

dúvidas ou interpretações dúbias ou antagônicas, a exegese de fará pró-

consumidor (art. 47, CDC), mormente porque a linguagem do termo de garantia

contratual complementar deverá ser clara e perfeitamente compreensível (art. 31

e 46, CDC).

Quanto à contagem do início de prazo de garantia contratual

complementar estabelece Luiz Antonio Rizzatto NUNES136 que complementar

significa que se soma o prazo de garantia ao prazo contratual. Chegando-se a

seguinte conclusão:

Se o fornecedor dá prazo de garantia contratual [...], dentro do

135 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. AC 2071/95 – Reg. 300797 – Cód. 95.001.02071 – Rio

de Janeiro – 3ª C.Cív. – Rel. Des. Elmo Arueira – J. 03.09.1996)

136 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. . p. 564-

565.

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tempo garantido até o fim (inclusive último dia) o produto não pode apresentar vício. Se apresentar, o consumidor tem o direito de reclamar, que se estende até 30 ou 90 dias após o término da garantia.

Se o fornecedor não dá prazo, então os 30 ou 90 dias correm do dia da aquisição ou término do serviço.

Não termos dúvida, por isso, em afirmar que o sentido de complementar utilizado na redação do caput do art. 50 é [...], a garantia contratual vai até onde prever, e ao seu término tem início o prazo para o consumidor apresentar reclamação.

Inclusive tal posição é a oficial adotada pelo IDEC (Instituto

de Defesa do Consumidor)137. Os julgados têm recepcionado esta posição:

DECADÊNCIA – C. DE DEFESA DO CONSUMIDOR – CONTAGEM DO PRAZO – MEDIDA CAUTELAR – PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVA – INTERRUPÇÃO DO PRAZO – INOCORRÊNCIA – Decadência. Código de Defesa do Consumidor. O prazo de noventa dias é contado do termo final da garantia dada pelo fabricante do produto. Havendo reclamação formulada pelo consumidor fica obstada a decadência até a inequívoca resposta negativa do fornecedor. Medida cautelar de antecipação de prova não produz os efeitos do artigo 219, do CPC, salvo quando, nos termos da lei, a admissibilidade da ação principal está condicionada ao seu ajuizamento. (TJRJ – AI 2335/95 – Reg. 030496 – Cód. 95.002.02335 – 5ª C.Cív. – Rel. Des. Marden Gomes – J. 15.02.1996)

Finalmente, o Código de Defesa do Consumidor obriga o

fornecedor a fazer acompanhar de seu produto o manual de instalação e

instrução, já que decorre o dever de informar (art. 6o, III do CDC138). Este manual

137 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor.. p. 564. 138 Art. 6º. São direitos básicos do consumidor: [...]

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

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de instalação e instrução, por força do art. 31 da Lei Consumerista139, deverá

estar redigido na língua portuguesa, de forma clara e didática, justamente para

facilitar seu manuseio e compreensão por parte do consumidor.

139 Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações

corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente monografia tem como objeto a Proteção

contratual no Código de Defesa do Consumidor.

O objetivo é o de analisar os elementos característicos da

proteção contratual presentes no Código de defesa do Consumidor.

Para realizar o objetivo da pesquisa, a monografia foi

dividida em três capítulos. No Capítulo 1, tratou dos contratos em geral, fazendo

uma incursão sobre a história, a função social dos contratos, sua classificação,

seus efeitos e os elementos para a sua extinção. Destaca-se:

• O contrato é o instrumento jurídico por excelência da vida econômica.

surge como uma categoria que serve a todos os tipos de relações entre

sujeitos de direito e a qualquer pessoa independentemente de sua posição

ou condição social.

• Assim, o contrato moderno assume um papel de extrema relevância social,

tanto nas searas atinentes às pessoas físicas quanto nas jurídicas,

desenfreando um crescente progresso no mundo dos negócios jurídicos.

• A função social do contrato prevista no art. 421 do novo Código Civil

constitui cláusulas gerais, que reforça o princípio de conservação do

contrato, assegurando trocas úteis e justas.

• Na boa-fé subjetiva o manifestante de vontade crê que

sua conduta é correta, tendo em vista o grau de conhecimento que possui

de um negócio. Para ele há um estado de consciência ou aspecto

psicológico que deve ser considerado.

• Por outro lado, a boa-fé objetiva tem compreensão diversa, parte de um

padrão de conduta comum, do homem no caso concreto levando em

consideração os aspectos sociais envolvidos.

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• Os contratos quanto a sua natureza são classificados em unilaterais e

bilaterais, onerosos e gratuitos, comutativos e aleatórios e causais e

abstratos.

No capítulo 2 trata-se do Direito do Consumidor, observando

o seu histórico, conceito, as idéias referentes a relação de consumo bem como os

princípios norteadores da relação de consumo, encerra-se o capítulo analisando

os vícios decorrentes da relação de consumo. Destaca-se:

• A Revolução Industrial foi responsável pelo crescimento da chamada

produção em massa perdendo a produção seu toque "pessoal" e o

intercâmbio do comércio ganhando proporções ainda mais

despersonalizadas.

• No Código de Defesa do Consumidor esta tutelada as relações de

consumo e sua abrangência está adstrita às relações negociais, das quais

participam, necessariamente, o consumidor e o fornecedor, transacionando

produtos e serviços.

• Na formação dos contratos, deve ser observada a necessária

transparência visando possibilitar a instauração de uma relação contratual

sincera e não danosa entre os contratantes.

• A interpretação contratual deve sempre favorecer o consumidor, de modo

que eventual tentativa de redação ambígua ou obscura do contrato resulte

ineficaz.

• A responsabilidade pelos vícios na relação de consumo é subjetiva com

presunção de culpa do fornecedor, além da inversão do ônus da prova em

favor do consumidor sendo que, o consumidor poderá acionar quaisquer

dos componentes da cadeia de produção e comercialização seja o

comerciante, o fabricante, o distribuidor, ou todos eles conjuntamente.

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No capítulo 3 trata-se da proteção contratual no Código de

defesa do Consumidor, analisando especificamente os artigos 46, 47, 48, 49 e 50

do Código de defesa do Consumidor. Destaca-se:

• O dever de informação por parte do fornecedor constitui-se condição

primordial para assegurar ao consumidor a efetividade no elemento

teleológico negocial, qual seja, a finalidade pretendida pelo consumidor na

relação de consumo a que se obriga.

• A Lei Consumerista pretende, impor instrumentos de reequilíbrio contratual,

quer seja, propor para partes desiguais – seja na vulnerabilidade, seja na

hipossuficiência -, tratamento desigual na medida de suas desigualdades,

objetivando assim atingir um razoável patamar de equilíbrio.

• A interpretação da cláusula em favor do consumidor não implica,

necessariamente, na anulação do contrato firmado entre as partes, visto

que objetiva a Lei Consumerista apenas retirar do contexto contratual

cláusulas que imponham excessiva onerosidade em desfavor da parte

mais débil da relação contratual.

• Em harmonia com o princípio da transparência a interpretação de cláusula

contratual em favor do consumidor é mais um dos alicerces que dão

sustentação ao princípio maior da boa-fé objetiva nos contratos.

• A existência de mensagem/propaganda/oferta vincula o fornecedor a uma

obrigação de fazer perante o consumidor que, uma vez lesado, poderá

optar pelos procedimentos,sendo que tal opção é protegida na sua

efetividade pelos poderes conferidos ao juiz através dos parágrafos do art.

84 do Código de Defesa do Consumidor.

• Diante da massificação das relações de consumo, onde os fornecedores,

objetivando alcançar o maior número possível de consumidores em menor

tempo, utilizam meios extremamente agressivos de propaganda, a

legislação consumerista estabeleceu meios de defesa para o consumidor

incauto que muitas vezes se vê engolfado por estas práticas comerciais de

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marketing, não tendo chance de raciocinar calmamente a fim de ponderar

sobre a necessidade e oportunidade daquela relação de consumo.

• A garantia contratual é facultativa para o fornecedor, a garantia legal é

obrigatória não só por que o consumidor pode ser (e freqüentemente é)

vulnerável ou hipossuficiente, mas por que a qualidade, segurança,

durabilidade e desempenho do produto e/ou serviço são uma exigência do

mercado de consumo e é condição sine qua non de ordem pública

baseado no princípio da confiança.

• A garantia legal não nasce a partir do contrato mas sim torna-se obrigatória

desde a produção com a legítima confiança do mercado de consumo que o

produto e/ou serviço se prestará a seu destino.

Quanto as hipóteses, observa-se:

a) Os contratantes devem agir de forma leal para a

consecução dos objetivos delineados no instrumento negocial respectivo. Deve

existir entre os negociantes uma relação de confiança mútua e fidelidade ao

pactuado. A mesma foi confirmada.

b) Para que seja amparada pelo Código de Defesa do

Consumidor, a relação de consumo tem que possuir uma relação de negócios que

visa à transação de produtos ou serviços e que esta seja feita entre um

fornecedor e um consumidor. Esta hipótese foi confirmada.

c) O dever de informação por parte do fornecedor constitui-

se condição primordial para assegurar ao consumidor a efetividade no elemento

teleológico negocial, qual seja, a finalidade pretendida pelo consumidor na relação

de consumo a que se obriga. A hipótese foi confirmada.

d) Em harmonia com o princípio da transparência, a

interpretação de cláusula contratual em favor do consumidor é mais um dos

alicerces que dão sustentação ao princípio maior da boa-fé objetiva nos contratos.

A hipótese foi confirmada.

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e) A norma consumerista, atendendo sua função

constitucional, implementa para o consumidor a existência da garantia legal e

contratual. A presente hipótese foi confirmada.

Alerta-se que a presente monografia não teve a intenção de

esgotar o assunto, mas ser um elemento para aumentar a discussão sobre a

Proteção contratual nos Contratos com base no Código de defesa do

Consumidor.

Quanto à Metodologia empregada, observa-se que o

Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia foram compostos na

base lógica Indutiva.

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