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FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE LISBOA

A propósito de um caso de ascite

TRABALHO FINAL DO MESTRADO INTEGRADO EM MEDICINA

Gabriela Sofia Cancela da Fonseca Ferreira Santos

Orientadora:

Clínica Universitária de Gastrenterologia

FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE LISBOA

A propósito de um caso de ascite

refractária

TRABALHO FINAL DO MESTRADO INTEGRADO EM MEDICINA

Gabriela Sofia Cancela da Fonseca Ferreira Santos

Orientadora: Professora Cilénia Baldaia Enes da Costa

Clínica Universitária de Gastrenterologia

Ano lectivo 2015/2016

FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE LISBOA

A propósito de um caso de ascite

TRABALHO FINAL DO MESTRADO INTEGRADO EM MEDICINA

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ÍNDICE

RESUMO ...................................................................................................................................... 3

ABSTRACT .................................................................................................................................. 3

ABREVIATURAS ........................................................................................................................ 4

INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 5

CASO-CLÍNICO ........................................................................................................................... 8

DISCUSSÃO ............................................................................................................................... 11

CONCLUSÕES ........................................................................................................................... 20

AGRADECIMENTOS ................................................................................................................ 21

BIBLIOGRAFIA ......................................................................................................................... 22

ANEXOS..................................................................................................................................... 26

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RESUMO

A cirrose hepática é a principal causa de hipertensão portal no mundo. Uma das

hipóteses terapêuticas é através da colocação de um TIPS, que minimiza as

consequências da hipertensão portal, através da sua descompressão, o que se reflecte

numa melhoria da qualidade de vida do doente. A endotipsite é uma complicação grave,

mas rara, que ocorre após a inserção do TIPS, que se caracteriza pela presença de uma

infecção endovascular com ponto de partida no interior do stent. A abordagem deste

tipo de doentes ainda é bastante controversa, nomeadamente no que toca ao seu

diagnóstico, terapêutica e seguimento. Apresentamos um caso clínico de uma doente

com uma cirrose hepática que, após a inserção de um TIPS, vem a desenvolver uma

endotipsite. Ainda, após a sua inserção, a suspeita de uma cardiomiopatia cirrótica foi

colocada, dado surgimento de uma insuficiência cardíaca. Neste trabalho, pretendemos

demonstrar as dificuldades diagnósticas e descrever as consequências desta rara

complicação do TIPS – a Endotipsite.

ABSTRACT

Liver cirrhosis is the major cause of portal hypertension in the world. TIPS is a

therapeutical technique, which allows a portal decompression and thus limits the

consequences of portal hypertension leading to a better patient's quality of life.

Endotipsitis is a serious complication, although rare, occurring after the insertion of

TIPS, characterized by an endovascular infection that develops from the inside of the

stent. Dealing with this type of patients is still quite controversial, particularly with

regard to their diagnosis, therapy and follow-up. Here we present a case of a patient

with liver cirrhosis to whom TIPS was inserted and came to develop an endotipsitis. A

cirrhotic cardiomyopathy, first presented as a heart failure after the placement of TIPS,

was also suspected. We also describe and analyse some of the difficulties in managing

and diagnosing in patients developing this rare complication of TIPS – Endotipsitis.

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ABREVIATURAS

AASLD: American Association for the Study of Liver Diseases

BNP: Brain Natriuretic Peptide

ECG: Electrocardiograma

EASLD: European Association for the Study of the Liver

ETE: Ecocardiograma transesofágico

ETT: Ecocardiograma transtorácico

E/A <1.0: razão de velocidades de preenchimento precoce (E) e tardia (A)

GAVE: Ectasia vascular no antro gástrico

HDFVVC: Hemodialfiltração veno-venosa contínua

HT: Hipertensão

MDR: Multirresistência

MELD: Model for End-stage Liver Disease

NT-proBNP: N-terminal da pro-hormona do péptido natriurético cerebral

PSAP: Pressão sistólica da artéria pulmonar

RMN: Ressonância magnética nuclear

TA: Tensão arterial

TIPS: Transjugular Intrahepatic Portosystemic Shunt

UCE: Unidades de concentrado eritrocitário

UCIGEH: Unidade Cuidados Intensivos Gastroenterologia e Hepatologia

VHB: Vírus da hepatite B

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INTRODUÇÃO

O TIPS (Transjugular Intrahepatic Portosystemic Shunt) é um bypass de inserção

percutânea, de baixa resistência, criado artificialmente num fígado cirrótico que liga a

porção intra-hepática da veia porta com um segmento intra-hepático da veia supra-

hepática, através de um stent. Assim obtém-se uma descompressão portal (<12 mmHg)

(1) o que contribui para a minimização das complicações derivadas da hipertensão

portal, permitindo uma melhoria na qualidade de vida do doente.

Foi descrito inicialmente como uma técnica de investigação, em 1969, e ganhou

relevância clínica na década de 90 (2). Continua a ser amplamente usada e tanto a

AASLD como a EASLD defendem que as principais indicações para a sua inserção com

eficácia comprovada por ensaios clínicos controlados, são: a hemorragia aguda

secundária à rotura de varizes gastroesofágicas, após insucesso da terapêutica médica e

endoscópica, sabendo-se que a taxa de hemorragia secundária a 1 ano é

aproximadamente 60% (1); e o tratamento da ascite refractária, que ocorre em 5 a 10%

dos casos (1). Aplica-se também a outras condições, apesar de a sua eficácia não estar

demonstrada por ensaios clínicos controlados, tais como a gastropatia portal

hipertensiva, a hemorragia de varizes gástricas, a ectasia vascular gástrica antral

(GAVE), o hidrotórax hepático refractário, a síndrome hepato-renal (tipo 1 e tipo 2), a

síndrome de Budd-Chiari, a doença veno-oclusiva e a síndrome hepato-pulmonar (3).

De acordo com as normas padrão da EASL, o tratamento da ascite não complicada

dever-se-á iniciar, para volumes pequenos (ascite de grau 2), por uma restrição de sódio

e diuréticos, tais como espironolactona e furosemida. Para volumes maiores (ascite de

grau 3) recorre-se ao uso de paracenteses sucessivas associadas à infusão de albumina

(4). Define-se ascite refratária como aquela que não pode ser totalmente drenada ou que

recorre precocemente, não podendo ser prevenida através de terapêutica médica, tanto

por falha na resposta à restrição de sódio e tratamento com diuréticos, ou por se ter

tornado intratável pelo desenvolvimento de complicações relacionadas com o uso de

diuréticos na dose efectiva (4).

Após a colocação do TIPS observa-se uma rápida e significativa melhoria clínica com

uma redução espontânea da ascite e de outros edemas periféricos; ocorre também, a

curto prazo, um aumento do débito cardíaco, da pressão auricular direita e da pressão

arterial pulmonar, o que origina uma redução secundária na resistência vascular

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periférica e uma normalização do débito sanguíneo. Com o passar do tempo o débito

cardíaco tende a diminuir e a retomar os valores pré-inserção. A nível renal há uma

subida da taxa de filtração glomerular, com melhoria da diurese, e um aumento da

excreção de sódio, o que conduz a uma diminuição da pressão arterial (4).

No entanto podem surgir complicações derivadas da colocação do TIPS. As que estão

relacionadas com o local de punção envolvem a hemorragia intraperitoneal, a

perfuração da veia porta e/ou da artéria hepática, ou danos ao nível do ducto biliar, que

podem resultar na formação de uma fístula. No entanto, a incidência deste tipo de

complicações é baixa, cerca de 0.5% a 4.3% dos casos (1). Algumas mais graves são

associadas a maior instabilidade do doente e morte. Destas destaca-se a falência

hepática, a encefalopatia, que ocorre em aproximadamente 30 a 50% dos casos (1), e a

sépsis; uma outra complicação grave, apesar de pouco comum, é a endotipsitis, que se

verifica meses, ou mesmo anos, após a colocação do TIPS. De entre todas as

complicações, a mais relevante clinicamente é a encefalopatia hepática (1).

A endotipsite resulta de uma infecção endovascular que se desenvolve a partir de um

trombo ou do desenvolvimento de vegetações no interior do stent. Foi pela primeira vez

descrita por Sanyal e Reddy (5) para designar uma condição caracterizada por uma

bacteriémia clinicamente persistente, que implica a presença de um foco infeccioso em

contínuo com a circulação venosa e sem que tenha sido possível comprovar a existência

de um foco infeccioso alternativo apesar de uma busca exaustiva (endocardite, infecção

de um acesso central, abcesso abdominal ou hepático, empiema, colangite ou

osteomielite, (6)) (Anexo 1).

Vários outros autores usam critérios mais estritos para definir uma bacteriémia

persistente, para o mesmo microrganismo (Anexo 2).

Para o diagnóstico definitivo de endotipsite o TIPS deve ser identificado como a única

fonte de infecção. O procedimento de excelência para atingir este diagnóstico passa pela

remoção do TIPS e posterior realização de uma análise cultural das vegetações ou do

material trombótico existente no stent ou, em alternativa, pode ser realizada uma biópsia

endotelial do interior do TIPS (6). Contudo a remoção do TIPS apenas é possível em

duas situações, na autópsia após o falecimento do doente ou durante um transplante

hepático, o que torna este diagnóstico difícil de ser confirmado.

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Desta forma, a endotipsite acaba por ser considerada como um diagnóstico de exclusão,

baseando-se nos critérios propostos por Sanyal e Reddy (5).

É de salientar que a mortalidade após a colocação de um TIPS aproxima-se dos 100%

em doentes classificados na escala Child-Pugh, com um valor superior a 13 pontos,

nível C (7).

Com este trabalho pretende-se descrever as dificuldades diagnósticas e de

manuseamento de uma rara complicação do TIPS – a endotipsite. Assim revemos um

dos casos identificados nos últimos cinco anos que ocorreu no serviço de

Gastroenterologia/Hepatologia do Hospital de Santa Maria em Lisboa.

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CASO-CLÍNICO

Doente do sexo feminino, 73 anos, caucasiana, reformada, com cirrose hepática, de

provável etiologia alcoólica, conhecida desde há vinte e um anos, com episódios prévios

de rotura de varizes esofágicas há dezanove anos, trombose parcial ao nível do

segmento extra-hepático esquerdo da veia porta desde há nove anos e Child-Pugh B no

último ano.

Apresentava uma ascite, que oscilava entre ligeira a moderada, controlada com

espironolactona desde há vários anos mas com agravamento no último ano, com o

surgimento de hipercaliémia, mesmo em doses baixas. Também não respondia a doses

progressivamente mais elevadas de espironolactona e furosemida, nem a uma restrição

salina com BonSal. As paracenteses evacuadoras tinham periodicidade bi-mensal e mais

tarde bi-semanal (com drenagens que variavam entre os 3000cc a 7000cc), e mesmo

assim com dificuldade de cedência da ascite e internamentos frequentes. Como doenças

associadas apresentava anemia ferropénica multifactorial, ectasia vascular antral

gástrica (GAVE), gastropatia portal hipertensiva e pólipos gástricos com erosões,

diabetes mellitus tipo 2, doença hemorroidária, complicada com prolapso e antecedentes

cirúrgicos de colecistectomia. Mantinha abstinência alcoólica há mais de vinte anos e

não tinha antecedentes familiares de hepatopatia.

Estabeleceu-se o diagnóstico de ascite refractária. Foi então estudada a indicação para

shunt intra-hepático porto-sistémico transjugular. O estudo prévio excluía infeções e

alterações do ecocardiograma transtorácico.

À data da inserção do TIPS o score de MELD era de 9 pontos e pertencia à classe B de

Child-Pugh. O procedimento decorre sem problemas técnicos ou intercorrências

imediatas. A ascite desapareceu imediatamente e não apresentava icterícia nem sinais de

edemas periféricos.

Dois dias depois da sua realização surge um pico febril de 38.7 ºC. Apenas associado a

dor no local de punção da veia jugular interna direita, subida dos parâmetros

inflamatórios, mas hemoculturas e uroculturas negativas. Faz antibioterapia empírica

com meropenem e linezolide (durante cerca de dez dias).

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Assiste-se então a uma descompensação progressiva: agudização de anemia por

hemólise (descidas significativas da hemoglobina e da haptoglobina, e com subida da

bilirrubina) com necessidade de quatro UCE’s; um aumento da colestase; e uma

retenção hidro-salina acompanhada de uma ascite, que se torna gradualmente mais

volumosa, e com difícil controlo com diuréticos, em doses máximas, e com múltiplas

paracenteses evacuadoras (cerca de 2-3 por semana). Nesta altura o quadro de ascite

associava-se a edemas peri-maleolares e a ortopneia. Novamente os exames culturais

foram negativos. O eco-doppler excluía a hipótese de disfunção do TIPS, mas sugeria a

existência de uma trombose parcial da veia porta com trombose parcial do ramo

esquerdo. É repetida a avaliação cardiológica. O NT-proBNP era de 633 pg/mL e o

ecocardiograma transtorácico e transesofágico demonstravam manutenção da função

ventricular esquerda. Admitiu-se a presença de insuficiência cardíaca global por

sobrecarga de volume. A terapêutica com carvedilol, losartan, espironolactona,

furosemida em perfusão permitiu franca melhoria da retenção hidro-salina mas foi

suspensa por hipotensão.

Durante a semana seguinte persistem os picos febris, acima dos 38.5ºC e edemas

periféricos. A antibioterapia é alterada empiricamente para piperacilina-tazobactam,

apesar das múltiplas culturas negativas.

Cerca de um mês depois da inserção do TIPS é internada na UCIGEH por insuficiência

respiratória e encefalopatia porto-sistémica de novo de grau II. À admissão encontrava-

se taquipneica e taquicardica, com uma TA 130/60mmHg, com icterícia marcada, da

pele e das escleróticas, mucosas pálidas, diminuição do murmúrio vesicular no terço

inferior do hemotórax direito com discretos fervores basais, e uma ascite moderada.

Exibia uma hérnia umbilical e uma hérnia da linha branca, ambas redutíveis.

Apresentava novamente edemas periféricos peri-maleolares mas sem sinais de trombose

venosa profunda. Perante este quadro são realizados novos exames culturais e pela

primeira vez, obteve-se o isolamento de Enteroccocus faecium sensível à vancomicina.

Realizou terapêutica com meropenem, vancomicina e fluconazol. Nesta altura, dada a

existência de uma sépsis agravada a Enteroccocus faecium, com provável foco no stent

do TIPS, admite-se o diagnóstico de endotipsite, por exclusão extensiva de outros focos.

É realizado um novo ecocardiograma que revelou uma aurícula esquerda e ambas as

cavidades direitas dilatadas, uma regurgitação ligeira a moderada das válvulas, mitral e

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tricúspide, e uma função sistólica global conservada. Verificou-se também a existência

de uma hipertensão pulmonar grave, com PSAP de 99mmHg, comparativamente aos

33mmHg medidos antes da colocação do TIPS. Como intercorrência, a doente

apresentou hematémeses. Ficou medicada com somatostatina, durante cinco dias, e

realizou suporte transfusional, tendo tido alta posteriormente.

Mais tarde, é novamente re-internada na UCIGEH por febre, encefalopatia de grau I,

reaparecimento dos edemas periféricos e da ascite, confirmado em ecografia abdominal,

e degradação progressiva da função hepática. Nas hemoculturas, à entrada, foram

isoladas as seguintes bactérias: Enterococcus faecium (sensível à vancomicina e

resistente à ampicilina) e Escherichia coli (resistente à ciprofloxacina e ampicilina mas

sensível à amoxicilina/ácido clavulâmico, gentamicina, amicacina e cefuroxima) e

Klebsiella pneumoniae produtora de carbapemenases (sensível à ciprofloxacina,

gentamicina e amicacina mas resistente ao carbapenemo). Num isolamento, que se

realizou posteriormente, verificou-se que esta também era sensível a colistina e

tigeciclina. Fez antibioterapia de acordo com os testes de sensibilidade disponíveis.

Apesar da terapêutica antibiótica dirigida persistiam em todas as hemoculturas, os

isolamentos de Escherichia coli e da Klebsiella pneumoniae produtora de

carbapenemases.

A doente entra em choque séptico, ocorre lesão renal aguda com necessidade de suporte

órgão com HDVVC e aminas. Neste contexto a doente realiza suporte transfusional (na

totalidade com nove UCE’s e uma pool de plaquetas) e realizou terapêutica com

daptomicina, ceftriaxone e amicacina. Teve alta e tentou-se prolongamento do

tratamento para o domicílio, com linezolide, cefuroxime e ciprofloxacina, nas seis

semanas seguintes, no entanto, por complicações semelhantes, a doente é novamente

internada.

Seis meses depois da inserção do TIPS, a doente faleceu. Não foi realizada autópsia

apesar de proposta pelos clínicos.

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DISCUSSÃO

Cerca de 29 milhões de pessoas, na Europa, sofrem de doença hepática crónica (8). A

cirrose é a principal causa de hipertensão portal no mundo ocorrendo em

aproximadamente 90% dos casos (9). As consequências da hipertensão portal são

inúmeras e, quando não são devidamente tratadas, têm um elevado risco de morte.

As infecções bacterianas são a principal causa de descompensação da doença hepática

crónica, presente em cerca de 25 a 30% dos doentes em admissão hospitalar (8), e

aumentam o risco de morte, com uma taxa de mortalidade de aproximadamente 38% ao

fim de um mês (8).

A doente do caso clínico apresentava uma cirrose hepática de possível etiologia

alcoólica associada a múltiplas complicações, consequentes da hipertensão portal, das

quais se destacam antecedentes de ruptura de varizes esofágicas e a existência de uma

ascite refractária, dado o aparecimento de hipercaliémia devido à terapêutica instituída.

Assim, não tendo critérios para integrar a lista de espera para um transplante hepático

(discutido mais adiante), e dado o objectivo terapêutico do TIPS, tal como é

mencionado na Introdução, a doente foi considerada uma boa candidata para a

colocação do mesmo. É de salientar que a doente não apresentava contraindicações

relevantes para a colocação de um TIPS, quer relativas quer absolutas (Anexo 3), tendo-

se procedido à colocação do mesmo.

Imediatamente a seguir, o seu quadro clínico melhorou com o desaparecimento da ascite

e sem indícios de icterícia ou edemas periféricos. No entanto, dois dias depois da

colocação do TIPS surge febre, com valores superiores aos 38ºC, subida dos parâmetros

inflamatórios e dor no local de punção da veia jugular interna direita.

É importante ressalvar que à colocação do TIPS estão associadas diversas complicações,

que se podem classificar em três categorias, descriminadas na tabela 4 (Anexo 4). Note-

se que uma das complicações mais frequentes derivadas do procedimento é a perfuração

capsular, que atinge cerca de 33% dos casos (10), enquanto a hemorragia intraperitoneal

é a principal complicação intraoperatória imediata (11), apesar da sua baixa incidência

(1% a 2% (10)). Perante o quadro clinico descrito anteriormente a exclusão destas

complicações é importante, dada a prevalência de uma e a precocidade da outra,

respectivamente, com que surgem.

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Pela persistência da febre surge a suspeita da existência de uma infecção, tendo a doente

iniciado antibioterapia empírica com meropenem e linezolide, tendo havido cedência da

febre. Inicialmente começou-se por excluir as infecções que não estariam relacionadas

com a colocação do TIPS, visto que são de maior incidência (5). Contudo, as buscas

exaustivas feitas com recurso a ecocardiograma, electrocardiograma, eco-doppler e

paracenteses diagnósticas, não revelaram resultados significativos. As uroculturas foram

negativas assim como as hemoculturas (até aos 28 dias de internamento, altura em que

foi isolada a Enterococcus faecium). As avaliações analíticas apenas demonstravam,

constantemente, um aumento dos parâmetros inflamatórios.

Assim, sem foco infeccioso aparente e com a evidência de que a doente não apresentava

febre anteriormente à colocação do TIPS, a suspeita de que a infecção pudesse estar

relacionada com o TIPS era cada vez maior, tendo-se colocado esta hipótese desde a

segunda/terceira semana de internamento da doente.

Neste contexto surge a suspeita da existência de uma endotipsite, visto ser um uma

hipótese de diagnóstico apenas passível de ser colocada após a exclusão de todas as

outras patologias - diagnóstico de exclusão. De acordo com os critérios propostos por

Sanyal e Reddy e de De Simone et al, (5, 12) podemos afirmar que existia uma forte

possibilidade de a doente ter desenvolvido uma endotipsite: presença de uma

bacteriémia mantida juntamente com febre persistente com exclusão das restantes

etiologias possíveis e um TIPS aparentemente normal - Infecção provável. Dada a

impossibilidade de remoção do TIPS não é possível obter-se um diagnóstico definitivo.

A endotipsite é uma complicação de tal forma rara que o valor de incidência global não

é conhecido, sabendo-se que existe em aproximadamente 1% dos doentes com TIPS

(10). Os factores de risco não se encontram, até à data, rigorosamente estabelecidos

embora em 2011 Meir et al tenham identificado quatro factores de risco, independentes,

para a existência de uma bacteriémia pós-TIPS: (i) a ausência de profilaxia antibiótica,

(ii) um procedimento prolongado, (iii) uma infecção pré-existente por VHC e (iv) a

presença de um hipotiroidismo. Nenhum destes factores estava presente na doente do

caso clínico, o que não nos permite corroborar os estudos referidos.

A associação entre a existência de focos infecciosos e uma bacteriémia, num doente

com TIPS, é elevada. Sabe-se mesmo que o tempo médio de aparecimento de uma

bacteriémia, após a colocação do TIPS, é de aproximadamente 38 dias (6), embora

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possa ocorrer em qualquer momento. A literatura menciona que pode surgir entre os seis

dias e os dez anos (12).

Assume-se que o agente patogénico associado à endotipsite seja uma bactéria, dada a

maior prevalência destas nesta condição. Relativamente ao tipo de bactérias,

frequentemente estas pertencem à classe das gram-positivas (10), destacando-se uma

maior prevalência para as espécies de estafilococos e enterococos (6) (Anexo 5). Além

disso, há uma correlação entre o tempo que demora uma bacteriémia a surgir e o tipo

das bactérias que ela envolve, existindo uma associação entre infecções precoces (< 120

dias) e a presença bactérias gram-positivas ((13) (10)), tal como se verificou no nosso

caso clinico, com o isolamento da Enterococcus faecium aos 28º dia após a colocação

do TIPS. Contudo, tanto a Klebsiella pneumoniae produtora de carbapemenases como a

Escherichia coli, ambas pertencentes à classe das gram-negativas, foram também

isoladas mais tarde (ao 40º dia) e não fazem parte das espécies mais frequentemente

isoladas em endotipsites.

A presença de uma Klebsiella pneumoniae produtora de carbapemenases foi uma

surpresa, visto não ser uma bactéria que esteja normalmente associada a endotipsites. É

uma bactéria que nos preocupa por ser multirresistente e possuir um elevado potencial

de disseminação, o que lhe confere um maior grau de patogenicidade e por isso um pior

prognóstico. A Klebsiella pneumoniae é a espécie bacteriana mais prevalente que

incorpora a enzima que confere resistência ao carbapenem (15).

Na maioria das vezes, estas bactérias produtoras de carbapemenase, não são detectadas

inicialmente num antibiograma (14), sendo identificadas, erradamente, como sensíveis

ao imipenem ou meropenem (16) (17). Isto deve-se, provavelmente, à grande

variabilidade na concentração mínima inibitória ao carbapenem, o que poderá estar

relacionado com uma heterogeneidade fenotípica existente entre as bactérias,

isoladamente. Os resultados dos antibiogramas demonstram a existência de uma falsa

susceptibilidade, in vitro, ao carbapenem. Há assim uma dificuldade tanto na

identificação da bactéria como da sua susceptibilidade antibiótica, o que provoca um

atraso na antibioterapia adequada e conduz a um pior prognóstico. Comparando com o

nosso caso clínico, existe a possibilidade de ter existido uma detecção tardia ou

incorrecta da Klebsiella pneumoniae produtora de carbapemenases. O atraso da sua

identificação poderá ter levado a uma antibioterapia inicialmente inadequada.

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A existência de antibióticos com um maior poder de erradicação de bactérias MDR,

como as polimixinas e a tigeciclina, têm sido utilizados para escalar na terapêutica

destas estirpes multirresistentes, principalmente em meio hospitalar, visto que, por

exemplo, a susceptibilidade in vitro para as polimixinas ronda os 90% a 100% (18, 19).

Contudo no nosso caso não chegaram a ser instituídas como terapêutica.

É importante salientar ainda que os doentes com cirrose encontram-se mais susceptíveis

a desenvolver infecções relacionadas com bactérias multirresistentes (8) o que lhes

confere um risco de morte duas vezes superior face a infecções com bactérias que não

são MDR (20), daí uma maior necessidade de alerta e vigilância neste grupo de doentes.

Analisando outros casos de endotipsite, já descritos na literatura (10), pudemos verificar

que independentemente da etiologia de cirrose hepática, a bacteriémia é variável, no que

respeita ao nível de duração, à evolução, ao agente etiológico e ao tipo de terapêutica

efectuada. De entre estes casos (10) destacamos na tabela 8 (Anexo 8) apenas aqueles de

doentes com uma etiologia cirrótica alcoólica. De acordo com a referida tabela, no caso

nº 24 (isolamento da bactéria Klebsiella MDR) verificou-se que a bacteriémia só se

manifestou 1095 dias após a colocação do TIPS, com uma duração de 9 dias e resolução

com tigeciclina, o que é bastante díspar do que foi observado na nossa doente

(bacteriémia ao fim de 28 dias com isolamento de Klebsiella pneumoniae produtora de

carbapemenases ao fim de 41 dias). Como não sabemos o perfil de resistências da

Klebsiella MDR referida na tabela, e com a ressalva que a tigeciclina é a última linha de

tratamento, não podemos compará-la com a que foi encontrada na nossa doente salvo

nas respectivas respostas ao antibiótico administrado, excelente no caso nº24 e mau no

caso da nossa doente.

Relativamente aos casos em que se isolou a Enterococcus faecium (nº10 e nº11), o

tempo de surgimento de endotipsite é variável (10 e 375 dias após a inserção do TIPS).

Comparando com o nosso caso clínico o perfil de sensibilidade parece igualar à do caso

nº10, com boas respostas terapêuticas à vancomicina, apesar da diferença no tempo de

instalação da bacteriémia (28 dias no nosso caso).

Quanto à Escherichia coli (nº17 até ao nº22) verificou-se que o seu surgimento é mais

tardio comparativamente às restantes bactérias, mas ainda assim variável (entre os 183 e

1092 dias). Cerca de 50% destes casos resultaram em morte, apesar da antibioterapia

realizada, independentemente do tempo. No nosso caso não foi possível estabelecer uma

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correlação entre o seu falecimento e a presença desta bactéria dado a existência

concomitante com uma Klebsiella pneumoniae produtora de carbapemenases.

Várias classificações têm sido propostas para prever o prognóstico dos doentes com

TIPS mas nenhuma delas inclui complicações infecciosas. Destacam-se assim duas

escalas, a escala de MELD e a de Child-Pugh. A escala de Child-Pugh foi inicialmente

desenvolvida para estimar o risco de mortalidade pós-operatória de TIPS/shunt

cirúrgico, em doentes com varizes esofágicas, sendo utilizada para prever a

sobrevivência a curto e a longo prazo (1). Contudo, esta classificação tem limitações

pois por um lado não diferencia os tipos de doentes que apresentam uma disfunção

hepática grave e, por outro lado, dois dos cinco critérios que a constituem, a

encefalopatia hepática e a presença de ascite, apresentam um elevado grau de

subjectividade e, portanto, torna o prognóstico mais questionável.

A escala de MELD tem ultimamente substituído a de Child-Pugh como modelo de

prognóstico. Apesar de ter sido criada para avaliar o prognóstico a curto prazo em

doentes que foram submetidos à colocação de TIPS após uma hemorragia

gastrointestinal (22), foi mais tarde proposta para prever a mortalidade a 3 meses em

doentes com doença hepática terminal (21, 23). Todos os critérios que constituem esta

escala são parâmetros laboratoriais analíticos e por isso não carecem de interpretação

subjectiva.

No caso descrito, à data da colocação do TIPS, a doente apresentava-se com 9 pontos na

escala de MELD e pertencia à classe B de Child-Pugh, o que lhe conferia um

prognóstico aceitável. No entanto, dada a evolução do seu quadro clinico, cerca de 5

meses depois a doente apresentava-se com 32 pontos na escala de MELD e pertencia à

classe C de Child-Pugh, o que a classificava como tendo um mau prognóstico. Este

ainda viria a ser agravado pela persistência de uma infecção por uma bactéria MDR,

vindo a doente a falecer pouco tempo depois. Sabe-se que apesar da colocação do TIPS

ter uma taxa de sucesso em mais de 90% dos doentes (24), a mortalidade também é

elevada (aproximadamente 100%), principalmente em doentes com Child-Pugh classe C

(7).

A realização de um transplante hepático seria a opção que permitiria estabelecer o

diagnóstico definitivo de endotipsite, pela remoção do TIPS infectado, e acima de tudo

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permitiria solucionar o problema da cirrose hepática. Contudo a decisão clínica para

obtenção de um transplante hepático deve ter em conta diversos parâmetros (Anexo 6).

Apesar das diversas complicações que a doente apresentava, consequentes da falência

hepática cirrótica e da hipertensão portal, tais como a ascite refractária, a ruptura de

varizes esofágicas, sinais de encefalopatia hepática e de gastropatia (observação de

GAVE no relatório da endoscopia digestiva alta realizada), e ainda de um impacto

negativo sobre a sua qualidade de vida, a doente nunca se esteve elegível para ser

referenciada para transplante hepático.

A referenciação de um doente com uma idade superior aos 65 anos deve ser discutida

numa equipa multidisciplinar visto que com o aumento da idade se associa um maior

risco de co-morbilidades, sabendo-se mesmo que, acima dos 70 anos, há um maior risco

de complicações cardiovasculares no pós-transplante (26). A doente do caso clínico

tinha 73 anos de idade tendo esta sido a principal contra-indicação na referenciação da

nossa doente. A presença de outras contra-indicações, tais como a existência de uma

trombose parcial ao nível do segmento extra-hepático esquerdo da veia porta, um

MELD inferior a 15 pontos (antes da colocação do TIPS) e mais tarde de 32 pontos

(depois da colocação do TIPS), uma sépsis não controlada (agravada pela existência de

uma bactéria MDR) e uma hipertensão pulmonar severa (PSAP ~ 99mmHg), contribuiu

para a não referenciação do transplante hepático.

Uma das peculiaridades deste caso é o desenvolvimento de insuficiência cardíaca pós-

TIPS com HT pulmonar grave sendo possível que o diagnóstico de cardiomiopatia

cirrótica não tivesse sido correctamente ponderado na fase pré-TIPS.

Desde os finais dos anos 80 que têm sido citados casos de mortes inexplicáveis por

falência cardíaca, em doentes com shunts porto-cava cirúrgicos ou com TIPS, ou ainda

submetidos a transplante hepático, o que levou à suspeita da existência de uma

disfunção cardíaca relacionada com a cirrose (27).

Assim tem-se vindo a verificar a existência de uma associação entre a cirrose hepática e

a presença de alterações cardiovasculares significativas, das quais se destacam: um

aumento do débito cardíaco em repouso, uma diminuição das resistências vasculares

periféricas, uma diminuição da contractilidade do miocárdio ou da competência sistólica

(principalmente em situações de stress fisiológico, farmacológico ou físico), um

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aumento da espessura do ventrículo esquerdo associado a uma disfunção diastólica e a

existência de alterações significativas electrofisiológicas. O conjunto destas alterações

foi designado por cardiomiopatia cirrótica (27).

A cardiomiopatia cirrótica é uma disfunção cardíaca reversível consequente da cirrose

hepática crónica. Os critérios propostos para o seu diagnóstico baseiam-se em alterações

do ECG, do ecocardiograma 2D e em marcadores serológicos (28), permitindo dividi-la

em dois tipos de disfunção, sistólica ou diastólica (Anexo 7).

A componente diastólica é aquela que mais frequentemente se encontra afectada, nestes

doentes, caracterizando-se por um relaxamento anormal do ventrículo esquerdo, que

provoca um aumento da pressão ventricular diastólica final à custa de um enchimento

auricular tardio (30), além de uma contractilidade cardíaca ineficaz acompanhada de

anomalias electrofisiológicas, na ausência de outra doença cardíaca conhecida (27) (28)

(30).

Assim, a maioria dos doentes cirróticos classificados com um Child-Pugh B ou C

apresentam pelo menos um critério de cardiomiopatia cirrótica, nomeadamente um

prolongamento QT e, frequentemente, manifestam uma disfunção diastólica (29). Tais

características foram observadas na doente apresentada no nosso caso clínico.

De entre os doentes com cardiomiopatia cirrótica com disfunção diastólica, a maioria

são assintomáticos, de tal forma que a prevalência é também desconhecida (30). Assim

a suspeita da sua existência apenas ocorre com o aparecimento súbito de sinais e

sintomas de insuficiência cardíaca após a exposição a algum tipo de evento de stress

(31). Note-se, contudo, que não está quantificado o intervalo de tempo que é necessário

decorrer para que surjam as manifestações de insuficiência cardíaca.

No nosso caso clínico a doente não evidenciava a existência de uma doença cardíaca

conhecida, o que era sustentado pelo ecocardiograma transtorácico realizado antes da

colocação do TIPS, “Sem alterações significativas nas válvulas cardíacas e cavidades

direitas não dilatadas, aurícula esquerda não dilatada e ventrículo esquerdo com

função sistólica global conservada com apenas um fluxo com onda E<A sugestivo de

alteração do relaxamento ventricular esquerdo. Sem hipertensão pulmonar (PSAP

aproximadamente 33 mmHg)”. Não tinha também elevações dos biomarcadores

cardíacos. No exame electrocardiográfico, realizado antes da colocação do TIPS, não se

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evidenciavam alterações significativas. No entanto nenhum destes exames foi realizado

na presença de qualquer evento de stress que pudesse despoletar a evidência de uma

cardiomiopatia cirrótica.

A suspeita de cardiomiopatia cirrótica com uma disfunção diastólica só se veio a

colocar com o aparecimento de uma série de alterações hemodinâmicas que começaram

a surgir, nomeadamente manifestações de insuficiência cardíaca, após a doente ter sido

exposta a dois tipos de eventos de stress: a presença do TIPS e a existência de uma

endotipsite.

Dado o contexto a doente foi continuamente submetida a uma avaliação cardiológica.

De acordo com o ECG obtido verificou-se a presença de uma taquicardia sinusal

acompanhada de um prolongamento do intervalo QT, ambos critérios de suporte (Anexo

7), que corroboram a presença de uma disfunção diastólica cardíaca. Além disso,

através do ETT verificou-se que apesar de uma função sistólica global conservada,

havia uma dilatação tanto da aurícula esquerda como das cavidades direitas do coração

e ainda uma hipertensão pulmonar grave (PSAP aproximadamente de 99 mmHg),

características descritas como evidências de que esta disfunção é exacerbada após a

colocação de um TIPS (32). Registou-se também um aumento da razão entre as fases

precoce e tardia do enchimento ventricular ou E/A <1.0 (correlacionado com a idade) e

um aumento da massa do miocárdio, através do ETT, acompanhado de um aumento

BNP e NT pro-BNP.

O tratamento da insuficiência cardíaca num doente cirrótico é realizado da mesma

forma que num doente não cirrótico, com restrição hidrossalina e uso de diuréticos,

permitindo obter uma redução da pós-carga. Contudo, este é o ponto mais difícil de ser

atingido nos cirróticos pois estes apresentam uma hipotensão arterial basal (30) tal

como se verificava na nossa doente. O benefício do uso de beta-bloqueantes a longo

prazo em doentes cirróticos com insuficiência cardíaca parece não ser suficientemente

conclusivo quando comparado com doentes sem cirrose. No entanto, os beta-

bloqueantes não selectivos permitem uma diminuição no prolongamento do intervalo

QT (33) e uma diminuição do débito cardíaco, principalmente com o propanolol (34),

daí que seja incentivada a sua utilização neste tipo de doentes.

Apesar das consequências da cardiomiopatia cirrótica esta é reversível com o

transplante hepático, sendo possível obter uma normalização da fracção de ejecção (35),

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uma diminuição da disfunção diastólica, uma reversibilidade da pressão sistólica e ainda

um aumento da capacidade de exercício em condições sob stress, seis a doze meses

após o transplante. Estruturalmente ainda se consegue observar uma regressão completa

da espessura da parede ventricular (36). Dadas as vantagens e melhorias obtidas com o

transplante hepático este deve ser sempre considerado.

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CONCLUSÕES

A discussão do caso clínico apresentado leva-nos a constatar que o controlo e o

tratamento das complicações da hipertensão portal são limitados.

No caso em análise, a presença de uma sépsis com base numa endotipsite dificultou

ainda mais o controlo da hipertensão portal, dado que a existência de uma bacteriémia

acentuou a descompensação hepática e agravou a progressão clínica e o respectivo

prognóstico. Apesar dos vários ciclos de antibioterapia poderem resolver as

endotipsites, eles tornam-se menos eficazes na presença de bactérias MDR havendo

necessidade de uma terapêutica mais eficiente, com o risco de aparecerem novas

resistências. É de salientar que não encontrámos na literatura nenhum caso de

endotipsite com infecção por Klebsiella pneumoniae produtora de carbapemenase,

isoladamente ou em simultâneo com Enterococcus faecium.

Este é apenas um dos múltiplos casos que demonstra como a partir de determinado

momento a irreversibilidade do processo impede o retorno ao nível da estabilidade,

impossibilitando mesmo a realização do transplante hepático, dado que as opções

terapêuticas dependem do prognóstico da doença hepática.

Embora reversível, a cardiomiopatia cirrótica é uma consequência do processo

degenerativo hepático – cirrose – que na maioria das vezes passa despercebida,

principalmente quando a componente cardíaca disfuncional é a diastólica. No nosso

caso clínico, esta suspeita coloca-se devido ao aparecimento súbito de manifestações de

insuficiência cardíaca após a colocação do TIPS e na presença conjunta da endotipsite.

Dada a dificuldade diagnóstica, o aumento da vigilância é importante assim como a

definição da melhor estratégia para a detecção da disfunção diastólica devendo-se

recorrer ao ecocardiograma e à RMN cardíaca dinâmica, assim como a exames

cardiológicos sob stress (ECG, ETT, RMN) e ECGs seriados, de forma a identificar

alterações que permitam antecipar o diagnóstico.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à Dra. Cilénia Baldaia, minha orientadora, ter-me sugerido este tema para a

realização desta tese e todo o esforço, dedicação e acompanhamento que me deu durante

o desenvolvimento deste trabalho. Aos membros do júri os meus agradecimentos pela

disponibilidade manifestada. Também agradeço aos meus pais e mais chegados amigos

todo o apoio que me deram durante a realização deste trabalho.

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ANEXOS

Anexo 1.

Tabela 1. Critérios de definição Endotipsite(5)

Bacteriémia

Achados clínicos e laboratoriais

TIPS

Infecção definitiva Clinicamente significativa

Febre e múltiplas hemoculturas positivas

Vegetações ou trombos no interior do stent

Infecção provável Mantida

Febre persistente (ausência de outros focos infecciosos)

Aparentemente normal

Anexo 2.

Tabela 2. Critérios de bacteriémia adicionais

Definição

DeSimone et al. (12)

2 hemoculturas positivas (intervalo > 12h);

ou ≥ 4 hemoculturas positivas ( intervalo ≥ a

1h entre a 1ª e última hemocultura). Armstrong and MacLeod (37)

≥ 2 hemoculturas positivas (intervalo ≥ a 7 dias entre a primeira e última hemocultura).

Bouza et al. (13) Nº de colónias bacterianas no sangue portal superior ao nº de colónias bacterianas no sangue venoso periférico.

Anexo 3.

Tabela 3. Contraindicações da inserção do TIPS (3)

Contraindicações Absolutas Contraindicações Relativas

Insuficiência cardíaca congestiva Obstrução de todas as veias hepáticas

Múltiplos quistos hepáticos Trombose da veia porta

Sépsis Coagulopatia severa (INR> 5)

Obstrução biliar não identificada Trombocitopenia <2000/cm3

Hipertensão pulmonar severa Hipertensão pulmonar moderada

Hepatoma (especialmente se fosse central)

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Anexo 4.

Tabela 4. Complicações da inserção do TIPS (11)

(1) Técnica (2) Shunt (3) Complicações especiais

Relacionadas com acesso: Encefalopatia hepática Hemólise intravascular Perfuração capsular Consequências hemodinâmicas Endotipsite

Hemorragia intraperitoneal Sépsis Enfarte hepático

Fistula Hemobilia

Relacionadas com Stent: Trombose Oclusão

Deslocação do stent Sépsis

Anexo 5.

Tabela 5. Microganismos isolados em Endotipsites (6)

Microrganismo Frequência (%) Staphylococcus aureus 41

Staphylococcus coagulase negativa 26 Enterococci spp 15

Candida spp 15 Outros 3

Anexo 6.

Tabela 6. Critérios de decisão para integrar na lista de espera para transplante

hepático (25)

1 O impacto que o transplante hepático terá na sobrevivência do doente no espaço de 1 ano, visto que os doentes serão selecionados para integrar a lista de espera se a sua sobrevivência, na ausência do transplante, for menor ou igual a um ano;

2 A melhoria significativa da qualidade de vida, visto que os doentes também serão selecionados para integrar a lista de espera dependendo do grau de limitação da vida diária devido à doença;

3 Idade do doente, pois apesar das vantagens do transplante há sempre um risco de mortalidade e morbilidade associado à cirurgia e à imunossupressão que o doente terá que efectuar para o resto da sua vida.

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Anexo 7.

Tabela 7. Critérios propostos de diagnóstico da cardiomiopatia cirrótica (28)

Disfunção sistólica Disfunção diastólica Critérios de suporte

Aumento do débito cardíaco com o exercício

Aumento da razão entre a fase precoce e tardia do enchimento

ventricular ou E/A <1.0 (correlacionado com a idade)

Alterações eletrofisiológicas

Resposta cronotrópica anormal

Prolongamento do intervalo QT

Alterações de volume ou estímulo farmacológico

Tempo de desaceleração prolongado (>200 ms)

Desacopelagem eletromecânica/dissincronia

Fracção de ejecção em repouso <55%

Prolongamento do tempo de relaxamento iso-volumétrico

(>80 ms)

Aumento do volume da aurícula esquerda

Aumento da massa do miocárdio

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Anexo 8.

Tabela 8. Casos de Endotipsites descritos na literatura (10)

Caso Referência

Bibliog.

Etiologia cirrose

/Motivo de TIPS

Endotipsite após

TIPS (dias)

Isolamentos Evolução Duração

bacteriémia (dias)

Tratamento Duração tratamento

(semanas)

1 3 D. Alcoólica 110 Staphylococcus aureus Resolução 6 Vancomicina/ Rifampicina 6

2 2 D. Alcoólica 663 Staphylococcus aureus Morte - Flucloxacilina 2

3 18 D. Alcoólica /VHB 100 Staphylococcus aureus Morte 5 Vancomicina 1

4 19 D. Alcoólica 7 Staphylococcus epidermidis Resolução 25 Daptomicina 6

5 5 D. Alcoólica 120 Staphylococcus epidermidis Resolução 30 Vancomicina 6

6 20 D. Alcoólica /VHC 10 Enterococcus spp Resolução 10 Vancomicina/Gentamicina 28

7 18 D. Alcoólica 60 Enterococcus spp Resolução 3 2

8 20 D. Alcoólica 60 Enterococcus spp Morte - Vancomicina -

9 21 D. Alcoólica 420 Enterococcus faecalis Resolução 90 Gentamicina/ Anfotericina 6

10 20 D. Alcoólica 10 Enterococcus faecium Resolução 10 Vancomicina 28

11 2 D. Alcoólica 375 Enterococcus faecium - - Vancomicina 1

12 3 D. Alcoólica 416 Streptococcus sanguis Resolução 6 Penicilina 4

13 24 D. Alcoólica 56 Gemella morbillorum Resolução 60 Ampicilina 44

14 2 D. Alcoólica 730 Latobacillus rhamnosus Resolução - Netilmicina, Claritromicina 12

15 18 D. Alcoólica 732 Latobacillus rhamnosus Morte 4 Ampicilina 4

16 18 D. Alcoólica 146 Lactobacillus acidophillus Morte 3 Ampicilina 6

17 3 D. Alcoólica 183 Escherichia coli Resolução 6 Ceftriaxone 4

18 3 D. Alcoólica 532 Escherichia coli Resolução 6 Ceftriaxone 4

19 6 D. Alcoólica 1065 Escherichia coli Resolução 31 Ciprofloxacina 16

20 2 D. Alcoólica 282 Escherichia coli Morte - Ceftriaxone/Gentamicina 12

21 2 D. Alcoólica 1092 Escherichia coli Morte - Ceftriaxone/Vancomicina/

Piperacilina-

tazobactam/Amoxicilina

12

22 2 D. Alcoólica 765 Escherichia coli Morte - Meropenem/ Amicacina 3

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30

23 3 D. Alcoólica /VHC 329 Klebsiella pneumonia Resolução 6 Ceftriaxone 4

24 25 D. Alcoólica 1095 Klebsiella MDR Resolução 9 Tigeciclina -

25 26 D. Alcoólica 21 Serratia marcescens Resolução 49 Imipenem 98

26 2 D. Alcoólica 1065 Enterobacter cloacae Resolução - Ceftriaxone/Gentamicina/

Vancomicina/ Piperacilina-

tazobactam/

Meropenem/Ciprofloxacina

12

27 30 D. Alcoólica 150 Candida glabrata Morte - Fluconazol -

28 31 D. Alcoólica - Morte 60 Posaconazol 6

29 6 D. Alcoólica/VHB 35 S.aureus/ Pseudomonas

aeruginosa

Morte 14 Ticarcilina-ácido

clavulâmico/Gentamicina/

Amicacina/ Ciprofloxacina

-

30 3 D. Alcoólica 235 E.coli/ Klebsiella oxytoca Resolução 6 Ceftriaxone 4

31 3 D. Alcoólica 285 E.coli/ Acinetobacter Resolução 6 Ceftriaxone 6

Referências bibliográficas da Tabela 8:

(2) Kochar N, Tripathi D, Arestis NJ, Ireland H, Redhead DN, Hayes PC. Tipsitis: incidence and outcome-a single centre experience. Eur J Gastroenterol Hepatol 2010 (3) Sanyal AJ, Reddy KR. Vegetative infection of transjugular intrahepatic portosystemic shunts. Gastroenterology 1998; (5) Bouza E, Muñoz P, Rodríguez C, Grill F, Rodríguez-Créixems M, Bañares R, Fernández J, García-Pagán JC. Endotipsitis: an emerging prosthetic-related infection in patients with portal hypertension. Diagn Microbiol Infect Dis 2004; (6) Armstrong PK, MacLeod C. Infection of transjugular intrahepatic portosystemic shunt devices: three cases and a review of the literature. Clin Infect Dis 2003; (18 )DeSimone JA, Beavis KG, Eschelman DJ, Henning KJ. Sustained bacteremia associated with transjugular intrahepatic portosystemic shunt (TIPS). Clin Infect Dis 2000; (19) Colston JM, Scarborough M, Collier J, Bowler IC. High-dose daptomycin monotherapy cures Staphylococcus epidermidis‘endotipsitis’ after failure of conventional therapy. BMJ Case

Rep 2013; 2013 (20) Brown RS, Brumage L, Yee HF, Lake JR, Roberts JP, Somberg KA. Enterococcal bacteremia after transjugular intrahepatic portosystemic shunts (TIPS). Am J Gastroenterol 1998;

(21) Passeron A, Mihaïla-Amrouche L, Perreira Rocha E, Wyplosz B, Capron L. [Recurrent enterococcal bacteremia associated with a transjugular intrahepatic protosystemic shunt]. GastroenterolClin Biol 2004; (24) Medina-Gens L, López J, Manzanedo B, Pintado V. [Endotipsitis due to Gemella morbillorum]. Enferm Infecc Microbiol Clin 2007; (25) Aggarwal S, Park J. Endotipsitis: a diagnostic challenge. J Postgrad Med 2011; (26) Marques N, Sá R, Coelho F, da Cunha S, Meliço-Silvestre A. Spondylodiscitis associated with recurrent Serratia bacteremia due to a transjugular intrahepatic portosystemic shunt (TIPS): a case report. Braz J Infect Dis 2007; (30) Schiano TD, Atillasoy E, Fiel MI, Wolf DC, Jaffe D, Cooper JM, Jonas ME, Bodenheimer HC, Min AD. Fatal fungemia resulting from an infected transjugular intrahepatic portosystemic shunt stent. Am J Gastroenterol 1997; (31) Anstead GM, Martinez M, Graybill JR. Control of a Candida glabrata prosthetic endovascular infection with posaconazole. Med Mycol 2006;