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A PRODUÇÃO DE TEXTO COM BASE NA REPRESENTAÇÃO DO SUJEITO
NA LITERATURA: A ANÁLISE DO DISCURSO DA ALIENAÇÃO
Aline de Oliveira ADELINO
([email protected] Crítica Integrativa: estudos de literatura e sociedade, Universidade
Federal do Rio Grande do Norte)
Andrey Pereira de OLIVEIRA
([email protected] Crítica Integrativa: estudos de literatura e sociedade,
Universidade Federal do Rio Grande do Norte)
RESUMO
Parte considerável dos alunos de nível médio demonstra dificuldades nas produções
textuais a partir de temas e textos-base pré-definidos. Em vista desse tipo de problema,
e, com uma reflexão sobre a prática educacional, pretende-se promover um estudo
interdisciplinar para maximizar o aprendizado do aluno do ensino básico. É, portanto,
necessário que se compreenda como a Literatura e a Música podem facilitar a produção
desse aluno em Língua Portuguesa. Para esta pesquisa, utilizam-se conceitos e estudos
prévios de autores como Antunes (2010) e Charaudeau (2008). Objetiva-se propor,
como procedimento de aula, levar o poema de Vinícius de Moraes, “O operário em
construção” e a canção de Zé Ramalho, “Cidadão”, como suporte para discutir e
escrever sobre o tema “Desigualdade social: a alienação do trabalhador”, buscando
encaixar a discussão nas competências e habilidades que requerem os concursos para
ingresso de estudantes em Universidades Públicas. As seções e os procedimentos
usados nesta pesquisa são caracterizados para resultar em um roteiro de auxílio à ação
de o aluno conseguir escrever a redação com normas pré-definidas.
Palavras-chave: Ensino. Discurso. Literatura. Produção textual.
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1 Introdução
As produções de texto direcionadas às bancas de concurso no Brasil devem
obedecer a algumas regras impostas previamente, inclusive, a mais conhecida delas: a
do Exame Nacional do Ensino Médio, o famoso ENEM, que possui uma cartilha
própria, organizada pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
O ENEM é uma das provas mais conhecidas e, consequentemente, mais
importantes do país no que diz respeito ao ingresso às principais Universidades Públicas
como também aos principais programas do Governo Federal, como foi o caso do
Ciências sem Fronteiras e do Programa Universidade para Todos.
A redação desse concurso é uma das protagonistas no período da prova. O valor
avaliativo dela é mil e o peso é decisivo para a nota final do candidato. Para que o aluno
consiga a nota máxima, ele deve seguir algumas recomendações que são explanadas na
cartilha, como por exemplo, a de respeitar os direitos humanos e escrever mais do que
sete linhas, como veremos a seguir.
A cartilha é como uma carta de recomendação sobre o que deve ou não ser feito
na prova. Ela apresenta direcionamentos, tais como: quem irá avaliar as redações, como
serão avaliadas, como serão atribuídas as notas – competências, como são chamadas as
categorias de conjunto de notas – e o que faria com que o aluno tirasse nota zero, por
exemplo.
Além de apresentar recomendações para cada uma das cinco competências, o
manual mostra caminhos que os estudantes terão acesso também na hora de realizar a
redação, como é o caso da lista do que fazer ou evitar para fugir da nota zero. Um dos
passos é “cópia integral de texto(s) motivador(es) da proposta de redação e/ou de textos
motivadores apresentados no caderno de questões” (Inep 2017) e, por isso,
trabalharemos neste artigo a melhor maneira de aliar o conhecimento prévio e uso dos
textos motivadores na dissertação.
Tendo em vista que grande parte dos alunos possui dificuldade na produção de
texto quando ele já possui um tema e textos-base pré-definidos, este artigo pretende
estimular o uso multidisciplinar de Literatura e Música de modo a facilitar a sincronia
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das artes com a Língua Portuguesa bem como equilibrar o uso dos textos de apoio com
o repertório cultural do aluno.
Em um primeiro momento, abordaremos o que são exigências nos concursos
para saber o que os alunos devem saber antes da prova, ou seja, o que é regra e o que
deverá ser obedecido para garantir que seja feito um bom texto. E também qual a
ligação entre essas regras pré-estabelecidas com a mostra dos textos-base.
Depois, a intenção é desvendar como Literatura e Música podem auxiliar a
escritura desse aluno de forma que ele consiga levar consigo uma bagagem cultural com
um pensamento crítico formado e isso facilite seu julgamento sobre o tema proposto.
Para tanto, foi pedido que alunos escrevessem com os seguintes textos já definidos: “O
operário em construção” de Vinícius de Moraes e “Cidadão” de Zé Ramalho para tratar
o tema “Desigualdade Social: a alienação do trabalhador” e perceber como os alunos
utilizam essas e outras leituras para desenhar sua argumentação.Além disso, serão
apresentados os resultados dessas produções que foram previamente pedidas aos alunos.
Por fim, apresentaremos uma espécie de roteiro de auxílio à ação do aluno.
Como procedimento de aula, esse roteiro funcionará da seguinte forma: o professor terá
acesso ao que se pede pelo principal concurso de ingresso à Universidade Pública do
Brasil, saberá como o seu aluno vai ser avaliado, terá noção do histórico de textos-bases
utilizado para que, então, auxilie o seu aluno a carregar as aulas para a hora de dissertar
de forma prática.
2 Desenvolvimento
2.1 Exigências nos concursos
Aos candidatos que participam de concursos pelo Brasil são pedidos alguns
encaminhamentos gerais que se repetem todos os anos, pois compõem a estrutura da
redação: o texto precisa ser uma dissertação-argumentativa, portanto, escrito em prosa,
necessariamente sobre o tema que eles informarão na hora da escrita, porém com a
margem de discussão entre ordem social, científico, cultural e político.
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É indispensável que o estudante formule uma tese, a qual defenda o seu ponto de
vista sobre o assunto, já que o texto além de ser informativo precisa de argumentação, é
fundamental também que se argumente de forma coerente e coesa, utilizando
habilidades que foram aprendidas ao longo dos anos no ensino regular. Depois, pede-se
que seja elaborada uma proposta de intervenção ou uma solução para o problema
desenvolvido.
Os critérios de avaliação também são conhecidos previamente pelos alunos, são
as chamadas competências e elas são numeradas de um a cinco, cada uma sendo
responsável por avaliar parte do texto escrito pelo candidato. Entre esses critérios está,
por exemplo, o de o aluno demonstrar domínio na modalidade formal da língua
portuguesa.
Na ordem que a cartilha apresenta, resumiremos os critérios de avaliação:
1. A competência um diz respeito, como já foi citado anteriormente, ao aluno
respeitar a norma padrão da língua portuguesa. Ele deverá, portanto, fazer as
concordâncias devidamente adequadas, respeitar a pontuação, garantir que a
ortografia está correta conforma a gramática normativa;
2. A competência número dois pede que o aluno respeite o tipo do texto, então,
que ele escreva um texto dissertativo-argumentativo em prosa, usando outras
áreas do conhecimento para discutir o tema: sociologia, história, geografia,
biologia, a que mais se aproxime da discussão. É pedido também que se
compreenda o tema, pois se houver fuga deste, o aluno receberá uma nota
zero;
3. Na três, é necessário que o candidato organize seus argumentos em defesa de
um ponto de vista;
4. Na quarta competência, a cobrança diz respeito ao conhecimento que o
aluno precisa ter dos elementos linguísticos para construir a argumentação.
Fazer coerência adequada com o texto e com o mundo, utilizando elementos
coesivos para melhor interligar as ideias no texto;
5. Por último, a competência cinco, pede uma proposta de intervenção que
solucione o problema discutido. O estudante precisa solucionar o problema
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respondendo o que será a solução, como ela poderá ser realizada e quem
poderá fazer isso acontecer.
A prova de redação é composta por textos-base que conduzem o aluno ao recorte
do tema. Normalmente, são fragmentos de notícias, artigos de opinião, charges, músicas
que fazem alusão ao tema pedido. No ano de 2016, por exemplo, o MEC colocou o
tema “Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil” e a proposta
acompanhava quatro textos motivadores, os quais apresentavam, de maneira geral, que
intolerância religiosa é crime no Brasil e estatísticas provando que, apesar disso, ainda
existem muitos casos.
O primeiro texto motivador era do Ministério Público do Rio de Janeiro,
apontando que, de acordo com a Constituição do país, é crime ser preconceituoso e
cometer atos contra a religião de outrem. O segundo texto, fragmento retirado do Jornal
do Senado, informa existir o direito a liberdade de expressão desde que exista
concomitantemente o respeito às diferenças. O código civil compôs o terceiro texto-
base, apresentando o artigo 208, o qual explana, entre outros aspectos, qual a pena para
quem comete esse crime. O quarto e último texto é da Secretaria de Direitos Humanos
da Presidência da República e demonstra, em dados estatísticos, as denúncias realizadas
pelas religiões, entre elas as de descendência afro-brasileira, evangélica e espírita.
Com efeito, é a partir da leitura desses textos que o aluno poderá unir seu
conhecimento sobre o assunto com a sua bagagem cultural (suas leituras de notícias e
literárias, seus conhecimentos sobre filmes, músicas e séries que relembrem o tema).
Como será atribuída nota zero ao aluno que copiar integralmente qualquer um desses
textos, é importante que ele tenha conhecimento extra sobre o assunto. Para isso, o
professor tem papel fundamental na construção desse acervo intelectual.
Muitas são as formas de o aluno ter acesso à cultura e, com isso, desenvolver seu
senso crítico e desenvolver sua opinião sobre diversos assuntos. Poder participar de
momentos extra sala de aula pode auxiliar nisso: assistir a peças de teatro, filmes, séries,
ouvir músicas, ler romances, contos, poemas abre as possibilidades de enxergar o
mundo. Nesse sentido, o próximo tópico demonstrará como dois desses campos podem
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amparar o professor a trabalhar a produção textual em sala de aula: a Literatura e a
Música.
2.2 Literatura e Música como auxílio em sala de aula
Nenhum texto é absolutamente original, nem pertence por inteiro à autoria de
quem o disse ou escreveu. Nossa voz carrega necessariamente as vozes de
todos que nos antecederam, tenhamos consciência disso ou não.
[...]
Assim a intertextualidade está intrinsecamente presente em cada evento de
linguagem. (ANTUNES, pág. 76)
A intertextualidade é a maneira de tratar um mesmo tema usando referência de
outros textos que também já falaram sobre. Direta ou indiretamente, a pessoa que
escreve coloca outras vozes no texto por já terem se apropriado dos discursos antes
lidos ou ouvidos. Isso pode acontecer de maneira natural ou ainda planejada e é dessa
segunda maneira que trataremos neste tópico.
Planejar uma intertextualidade requer um vasto conhecimento sobre textos que
possam interagir com o tema que se escreve seja para concordar seja pra discordar, já
que nenhuma ocorrência desse mecanismo linguístico acontece por acaso. Sempre que
utilizamos o discurso de outro dentro do nosso texto significa que, necessariamente,
tínhamos um propósito para tal, foi uma estratégia para que nosso discurso ganhasse
mais efeito.
Quando nos utilizamos da palavra do outro, podemos fazer isso com a intenção
de fortalecer nosso argumento, maximizar as possibilidades de exposição do nosso
ponto de vista, para aumentar o número de adeptos a mesma concepção ou mesmo para
refutar um raciocínio diferente do nosso. Em qualquer uma dessas possibilidades, é
imprescindível que o escritor tenha total conhecimento sobre o tema, sobre o seu
próprio pensamento e sobre as ideias defendidas pelo outro.
Irandé Antunes, já citada anteriormente, trata em: Análise de textos:
fundamentos e práticas, um tópico específico sobre a relação de um texto com os outros
textos. A seguir, veremos uma passagem que nos faz refletir sobre essa ligação do que
escrevemos com o que já existe, vejamos:
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Não há saída: nossos textos estão ancorados em outros textos prévios, textos
científicos, literários ou do saber comum. As conexões que se vão
estabelecendo entre esses saberes é que geram concepções mais integradas e
favorecem um entendimento mais global do mundo. (pág. 78)
Conforme a linguista, nossos textos ao se interligarem com outros textos pré-
existentes “geram concepções integradas”, portanto, as ideias se convergem com o
objetivo de entender melhor o mundo. A intertextualidade, então, não tem a intenção de
complicar as discussões, mas sim propor outra maneira de interligar, discutir e
argumentar.
Nessa perspectiva, a Literatura e a Música, por estarem presente na rotina do
aluno, seja para o lazer seja nas aulas de língua portuguesa para trabalhar, muitas vezes,
a gramática, podem facilitar a produção de texto do aluno, já que os temas das redações
dos concursos são temas universais e, portanto, certamente já discutidos em outros
textos.
O uso de textos que se aproximam do educando faz com que abra espaço para
ele se expressar, para se comunicar melhor e para promover troca de experiências entre
os estudantes sobre cultura e história individuais. E a música, aqui, é tratada como texto,
pois entendemos a música como um texto tanto oral quanto escrito que pode ser
interpretado, usado para refletir, criticar e reproduzir pensamentos.
Simões et al. (2006) propõem que se utilize letras de música como atividades de
leitura, isso porque acredita-se que o trabalho com esse gênero textual na sala de aula
apresenta algumas vantagens, como: a) possibilidade de lidar com um universo textual
conhecido; b) o uso de uma abordagem interdisciplinar que abranja tópicos transversais;
c) oportunidade para a discussão de diferentes contextos socioculturais a partir das
ideologias expostas nas letras de música.
A literatura como mediadora de produção de textos também apresenta
benefícios. O leitor não é um elemento passivo, ele reflete sobre os significados
apreendidos e essa reflexão é capaz de provocar a imaginação e a criação dos alunos. Na
teoria, para que isso acontecesse o ensino médio precisou passar por modificações e a
nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei 9394/96 oferece uma nova
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maneira de aprendizagem, na qual os conteúdos tradicionais ficam em segundo plano,
priorizando a leitura.
Na prática, ainda não vemos professores de outras disciplinas, muitas vezes nem
os de Língua Portuguesa, colocando a leitura como protagonista em sala de aula, o que
ainda há é a busca por regras, conceitos, nomenclaturas gramaticais e histórias da
literatura.
Nesse sentido, defendemos a importância do auxílio dessas duas áreas e
colocamos em prática como apresentar textos diretamente ligados a temas específicos
ajudam os alunos a escreverem melhor, a pensar criticamente e a fazer ligações de
intertextualidade. O próximo tópico apresentará como foi desenvolvida a atividade.
2.3 Resultados de “Desigualdade Social: a alienação do trabalhador”
Foi proposto a candidatos ao ENEM, a maioria alunos de cursinho ou
terminando o ensino médio, em uma oficina de redação, que eles escrevessem sobre o
tema “Desigualdade Social: a alienação do trabalhador” baseando seus discursos nos
textos entregues anteriormente: o poema “O operário em construção” de Vinícius de
Moraes e a canção de Zé Ramalho, “Cidadão”.
O poema, com traços da segunda e da terceira fases do Modernismo brasileiro, é
uma alegoria da construção da consciência do trabalhador que, até então, é alienado e
não tem noção da sua importância social. Por meio de metáforas, apresentam-se
discussões sobre desigualdade social, direitos do trabalhador e, principalmente,
alienação.
A alienação é apresentada já na primeira estrofe da poesia de Vinícius de
Moraes, o eu-lírico é quem constrói as casas onde antes não havia outras construções,
compara o trabalhador a um pássaro que, sem asas, subia essas casas e desconhecia sua
incumbência, vejamos:
Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
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Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão
A canção narra a história do eu-lírico que trabalha como pedreiro e constrói
todos os prédios ao redor, dos quais não pode usufruir em razão de sua condição social.
É uma música que aborda o preconceito, a discriminação e também, como no poema, a
alienação pela qual o trabalhador passa por não ter total noção da sua relevância na
sociedade.
Meu domingo tá perdido, vou pra casa entristecido
Dá vontade de beber
E pra aumentar meu tédio
Eu nem posso olhar pro prédio que eu ajudei a fazer
A alienação, como a diminuição da capacidade dos indivíduos em pensar ou agir
por si próprios, aparece em ambos os textos e a intenção deste trabalho era que os
alunos, com base neles, escrevessem uma dissertação-argumentativa tratando de como o
trabalhador é importante para a construção da cidade e se esquece da sua própria
construção.
Os alunos receberam essa proposta para, em duas horas, dissertarem sobre o
tema. Não foi a primeira vez que eles receberam os textos previamente, toda oficina eles
trabalhavam com temas diferentes e com textos referentes a eles, fosse música fosse
poema fosse imagem (pintura, fotografia).
Foram entregues os textos e as normas as quais os alunos deveriam obedecer,
respeitando as principais regras que eles também obedecem ao se submeterem ao
ENEM. No entanto, os textos-motivadores nesta atividade poderiam ser usados na
dissertação final deles, pois a intenção era que aumentasse a bagagem cultural desses
estudantes.
A atividade consistia em fazer a leitura dos textos e realizar a escrita antes
mesmo que houvesse alguma discussão sobre o tema para que um discurso não
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influenciasse no outro, pois a realização era individual como é em qualquer concurso. O
enunciado era o seguinte:
“A prova de redação exigirá de você a produção de um texto em prosa, do tipo
dissertativo-argumentativo, sobre um tema de ordem social, científica, cultural ou
política. Os aspectos a serem avaliados relacionam-se as competências que devem ter
sido desenvolvidas durante os anos de escolaridade. Nessa redação você deverá
defender uma tese- uma opinião a respeito do tema proposto-, apoiada em argumentos
consistentes, estruturados com coerência e coesão, formando uma unidade textual. Seu
texto deverá ser redigido de acordo com a modalidade formal da Língua Portuguesa.
Por fim, você deverá elaborar uma proposta de intervenção social para o problema
apresentado no desenvolvimento do texto que respeite os direitos humanos.
REDAÇÃO: Muitas vezes o trabalho braçal é esquecido e/ou desvalorizado em nossa
sociedade, tendo em vista que os operários – os quais participam de todo processo de
construção – não usufruem dos seus próprios trabalhos, discutida em, no máximo, 30
linhas, o tema: “Desigualdade social: a alienação do trabalhador”.
Todas as oficinas funcionavam da seguinte forma: os alunos recebiam os textos
que também eram projetados em sala para fazer uma leitura em conjunto, sem
discussão, a princípio, para que cada um pudesse fazer sua interpretação individual.
Depois, recebiam o tema da dissertação-argumentativa que precisariam escrever e eram
informados que precisariam usar algum dos textos lidos anteriormente. Isso era feito
para que eles tivessem o costume de pesquisar, ao treinarem sozinhos, textos para
compor sua bagagem cultural.
Na oficina que resultou este artigo, especificamente, os alunos leram o poema de
Vinícius de Moraes e a canção de Zé Ramalho, como já foi dito, e, mais uma vez, foram
informados de que precisariam ou usar ambos os textos ou escolher algum deles para
compor sua argumentação sobre o tema “Desigualdade Social: a alienação do
trabalhador”.
Como exemplo, a aluno 1 escolheu a canção “Cidadão” para integrar o seu
primeiro parágrafo de desenvolvimento, vejamos:
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“Em primeiro plano, essa falta de direitos inicia a partir do momento em que
um construtor trabalha para fazer uma escola na qual seu filho nunca vai poder
estudar por sua falta de renda. Essa situação é a que conta a música “Cidadão” de Zé
Ramalho, “eu nem posso olhar o prédio que ajudei a fazer”, passagem da obra que
mostra ao ouvinte/leitor passar por um criminoso que, muitas vezes, ocorre aos
empregados de baixa renda.”
Esse mesmo aluno continuou a argumentação utilizando outros exemplos
anteriormente usados para trabalhar outro tema, provando, assim, que os textos não se
perdem e compõem o crescimento intelectual, podemos observar:
“Em segundo plano, forte crítica a esse fato se dá no filme “Tempos Modernos”
com Charles Chaplin. A obra mostra a rotina forçada e difícil de um empregado da
indústria, a ponto de ficar viciado no movimento costumeiro e só conseguir fazer isso.
Com isso, apesar de todo o esforço feito pelo trabalhador, ele é demitido sem
remuneração ou conhecimento.”
Já o aluno 2 preferiu utilizar o poema “O operário em construção” na sua
argumentação, como vemos a seguir:
[...] “Tendo isso exposto, é necessário, ainda, relembrar que a alienação
acontece em consequência de uma sociedade extremamente desigual e injusta. Nesse
mesmo sentido, Vinícius de Moraes discutiu em seu poema “O operário em
construção” como esse trabalhador se deu conta de que quase tudo a sua volta
dependia dele para ser construído, “certo dia à mesa, ao cortar o pão o operário foi
tomado de uma súbita emoção ao constatar assombrado que tudo naquela mesa –
garrafa, prato, facão – era ele quem os fazia”. Desse modo, constata-se que esse
problema precisa ser sanado ou, ao menos, diminuído.”
No próximo tópico, apresentar-se-á o roteiro de aula como auxílio ao professor e
ao aluno.
2.4 Procedimento de aula: Roteiro de apoio à ação do aluno
Para melhor desenvolver essa atividade, foi pensado um roteiro para auxiliar o
aluno. Esse roteiro vai servir tanto para o professor nortear sua aula como para que o
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aluno utilize-o para todas as produções de texto que precisar fazer. Ela consiste em
seguir os seguintes passos:
1. Apresentação do texto a ser trabalhado (de preferência, poema e/ou canção)
concernente com o tema
2. Leitura do texto
3. Comentários gerais sobre o texto
4. Interpretação individual do texto
5. Estudo do vocabulário
6. Produção de texto com base nos textos estudados
Com esse caminho, ficará mais fácil tanto para o aluno escrever quanto para o
professor direcionar a aula. A seguir, mostraremos como essa facilidade virá passo a
passo.
No passo um, será interessante para o aluno ter variedades de textos para
conhecer o tema proposto, pois, muitas vezes, ele acaba não conhecendo muito
sobre esse tema. Para o professor, ajudará à medida que ele poderá fazer um recorte
como preferir sobre a discussão, articulando o que será mais importante para a
formação do estudante.
No passo dois, os estudantes poderão treinar a leitura dos textos, identificando a
melhor forma de fazê-la para cada gênero. O professor, por sua vez, diagnosticará
quais dificuldades determinados alunos passam. No três, o grupo terá espaço para
comentar, de maneira geral, o texto. Elementos linguísticos, semânticos, temáticos
ou mesmo ligados ao sentimento individual. Para o professor, esse espaço pode
ajudar a reconhecer o nível de bagagem cultural que cada um traz consigo.
No passo quatro, os estudantes poderão exercitar a interpretação de maneira
individual, dessa forma, o discurso se amplia e eles conseguem chegar à essência
dos textos. Essa é uma competência imprescindível para Língua Portuguesa, mas
também para outras disciplinas. O professor vai poder, mais uma vez, reconhecer as
habilidades de discurso dos alunos.
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No cinco, quando forem feitos os estudos sobre o vocabulário, todos os aspectos
linguísticos serão observados pelos alunos e, dessa maneira, ajudará a compreender
conceitos aplicados ao texto. O professor poderá avaliar, de forma contínua, qual a
relação do aluno com a Língua Portuguesa e com a produção textual.
No último passo, o de número seis, serão feitas, de fato, as dissertações com
base nos textos estudados em sala de aula. Os alunos colocarão em prática as teorias
sobre produção de texto bem como seus conhecimentos sobre o tema, inserindo os
resultados das discussões feitas com o professor e os colegas. Já o professor, irá
receber o feedback do seu trabalho, reconhecendo, no outro, a sua complexidade e
levando em consideração, também, suas esferas culturais, afetivas e linguísticas.
3 Considerações finais
Para auxiliar os alunos que demonstram dificuldades em produção textual,
escrevemos este artigo. Foi possível notar, na oficina, que existem ainda muitas
barreiras a serem enfrentadas quanto ao modo de colocar o aluno também como
protagonista. A nossa reflexão teve o objetivo de promover um estudo interdisciplinar
entre Literatura, Música e Produção Textual para facilitar a intertextualidade individual
do aluno, partindo de uma coletiva. Utilizamos autores conhecidos, Vinícius de Moraes
e Zé Ramalho para que os estudantes se sentissem familiarizados e escolhemos um tema
bastante atual e relevante, “Desigualdade social: a alienação do trabalhador” para
despertar o interesse da discussão.
Com a análise dos textos dos alunos, pudemos identificar que eles conseguiram
usar os textos dentro das suas dissertações, atingindo um resultado positivo para o nosso
objetivo principal. Desejamos, agora, que o início do nosso trabalho consiga se
perpetuar e que outros alunos tenham contato com esse método de auxílio, repetição e
resultados.
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REFERÊNCIAS
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Editorial, 2010.
BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais. Ministério da Educação. Temas
transversais. Brasília: MEC/SEF, 1998.
BRÉSCIA, Vera Lúcia Pessagno. Educação Musical: bases psicológicas e ação
preventiva. São Paulo: Átomo, 2003.
CHARAUDEAU, Patrick. Linguagem e discurso: modos de organização. São Paulo:
Ed, Contexto, 2012.
CITELLI, Beatriz; GERALDI, J. Wanderley. Aprender e ensinar com textos de
alunos. São Paulo: Cortez, 2011.
SIMÕES, D. et al. A música e o ensino da língua portuguesa. Cadernos do CNLF, v.
X, n. 7, 2006. Disponível em: < http://www.filologia.org.br/xcnlf/7/04.htm>. Acesso
em: 07 de Nov de 2017.
ZILBERMAN, R. E. Silva, SILVA, E. T. da Silva. Leitura: perspectiva
interdisciplinares. São Paulo: Ática, 1995.