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1 A PRODUÇÃO DA CIDADE UNIVERSITÁRIA NO NORTE DE MATO GROSSO: SINOP DE GLEBA A PÓLO ESTUDANTIL DE NÍVEL SUPERIOR Edenilson Dutra de Moura Bacharel em Geografia Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia UFMT [email protected] As políticas de colonização privada de terras na Amazônia mato-grossense na década de 1970 permitiram a formação de vários núcleos urbanos, Sinop é uma das cidades que há quase quatro décadas após o processo de colonização, vem conquistando seu espaço entre as cidades de Mato Grosso, se destacando em alguns aspectos regionais, como em números de população absoluta e na prestação de serviços a outros municípios de Mato Grosso e também para outros estados, como o sul do Pará. Sinop apresenta diversos equipamentos públicos e privados e se caracteriza como um pólo de educação de nível superior no estado de Mato Grosso, sendo o único município mato- grossense que possui duas universidades públicas: a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e a Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), sendo que nem a capital Cuiabá, mesmo com reivindicações populares, ainda não possui um campus universitário estadual (UNEMAT), considerando este um fato a se refletir sobre a atual distribuição do ensino superior em Mato Grosso. Este trabalho faz parte das reflexões iniciais da dissertação de mestrado em fase de construção, orientada pela Professora Doutora Sônia Regina Romancini, pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Mato Grosso, dissertação esta que de maneira mais aprofundada irá tratar da relação universidade e cidade em Sinop - MT. Acerca dos procedimentos metodológicos adotados para execução desta pesquisa destaca-se o construto teórico e metodológico pautado nas discussões pertinentes à produção do espaço e como técnicas adotadas ressalta-se a execução de pesquisa em campo realizada no mês de março e abril do corrente ano, com aplicação de roteiros de entrevistas semi-estruturado com questões abertas e fechadas à estudantes das diferentes instituições da cidade e registro fotográfico. Desta forma, o objetivo do presente trabalho é trazer uma reflexão sobre a influência de instituições de

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A PRODUÇÃO DA CIDADE UNIVERSITÁRIA NO NORTE DE MATO GROSSO: SINOP DE GLEBA A PÓLO ESTUDANTIL DE NÍVEL SUPERIOR

Edenilson Dutra de Moura

Bacharel em Geografia

Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia UFMT [email protected]

As políticas de colonização privada de terras na Amazônia mato-grossense na

década de 1970 permitiram a formação de vários núcleos urbanos, Sinop é uma das

cidades que há quase quatro décadas após o processo de colonização, vem conquistando

seu espaço entre as cidades de Mato Grosso, se destacando em alguns aspectos

regionais, como em números de população absoluta e na prestação de serviços a outros

municípios de Mato Grosso e também para outros estados, como o sul do Pará. Sinop

apresenta diversos equipamentos públicos e privados e se caracteriza como um pólo de

educação de nível superior no estado de Mato Grosso, sendo o único município mato-

grossense que possui duas universidades públicas: a Universidade Federal de Mato

Grosso (UFMT) e a Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), sendo que

nem a capital Cuiabá, mesmo com reivindicações populares, ainda não possui um

campus universitário estadual (UNEMAT), considerando este um fato a se refletir sobre

a atual distribuição do ensino superior em Mato Grosso.

Este trabalho faz parte das reflexões iniciais da dissertação de mestrado em fase

de construção, orientada pela Professora Doutora Sônia Regina Romancini, pelo

Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Mato Grosso,

dissertação esta que de maneira mais aprofundada irá tratar da relação universidade e

cidade em Sinop - MT. Acerca dos procedimentos metodológicos adotados para

execução desta pesquisa destaca-se o construto teórico e metodológico pautado nas

discussões pertinentes à produção do espaço e como técnicas adotadas ressalta-se a

execução de pesquisa em campo realizada no mês de março e abril do corrente ano, com

aplicação de roteiros de entrevistas semi-estruturado com questões abertas e fechadas à

estudantes das diferentes instituições da cidade e registro fotográfico. Desta forma, o

objetivo do presente trabalho é trazer uma reflexão sobre a influência de instituições de

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ensino superior (instituições públicas e privadas de ensino de terceiro grau), sobre a

produção do espaço urbano local.

SINOP – MT: ENTENDENDO SUA FORMAÇÃO

Para a introdução da discussão do artigo, faz-se necessário uma reflexão sobre a

área de estudo, Sinop um município localizado na Região Norte de Mato Grosso,

segundo classificação do IBGE, para as regiões do estado. Localizado aproximadamente

a 520 km de distância da Capital mato-grossense Cuiabá. Fundada em 14 se setembro

de 1974, em 1976 o então governador de Mato Grosso José Garcia Neto, eleva Sinop à

categoria de distrito do município de Chapada dos Guimarães. Teve sua emancipação

somente em 17 de dezembro de 1979. É pólo da Microrregião “Sinop”, composta por

nove municípios, sendo eles: Claudia, Feliz Natal, Itaúba, Marcelândia, Nova Santa

Helena, Santa Carmem, Sinop, União do Sul e Vera, estes que fazem parte da

Mesorregião Norte Mato-Grossense e limita-se com os municípios de Vera, Santa

Carmem, Sorriso, Tapurah, Itaúba e Cláudia.

Sinop é a cidade da região Norte de Mato Grosso que conta com a maior

população desta região, no censo do IBGE de 2010, a contagem da população foi de

113.099 habitantes, uma característica marcante da cidade é seu constante crescimento

da população, para a estimativa do ano de 2013 a população sinopense era de 123.634

habitantes. Seu processo de formação está diretamente ligado com as políticas de

colonização privada de terras em Mato Grosso na década de 1970, onde vários projetos

e programas estratégicos de ocupação da Amazônia foram criados, com a intenção de

promover a integração do território considerado por alguns discursos como

demograficamente “vazio” e promover uma produção capitalista do espaço.

O governo federal priorizou as regiões Centro Oeste e Norte, com a intenção

de abri-las ao capital nacional e estrangeiro, ocupar e explorar os recursos na terra e

desestimular a migração para as regiões Sul e Sudeste já saturadas. No período do

governo militar foram difundidos os discursos de preocupação acerca da segurança

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nacional da Amazônia, que deram origem a um modelo capitalista da produção do

espaço.

Um desses planos destaca-se o Programa de Integração Nacional (PIN), criado

pelo Presidente Médice, pelo decreto Lei nº 1.106 de 16/06 de 1970, foi um dos

importantes meios para a integração e ocupação da Amazônia, foi neste programa que o

slogan “integrar para não entregar” foi difundido por todo território nacional. Tinha

como objetivos financiar obras de infraestrutura de aberturas de rodovias federais e

fazer reforma agrária ao longo das rodovias construídas. Implantar as seguintes

rodovias: BR 163, Cuiabá – Santarém, BR 364, Cuiabá – Porto Velho, BR 070, Rio

Araguaia – Cuiabá, BR 080 Rio Araguaia – Cachimbo, BR 168, Barra do Garças – São

Félix do Araguaia e a BR 174, Cáceres até Rondônia. Sobre o PIN, os autores Browder

e Godfrey (2006), consideraram:

O PIN serviu vários propósitos estratégicos: ao justificar a construção de nova infra-estrutura de comunicação e transporte na região, deslocar grupos nativos locais e proporcionar uma reserva de trabalho migrante, o programa preparou o caminho para a fronteira corporativista do final da década de 1970. (BROWDER E GODFREY, 2006, p.200).

O Programa de Integração Nacional dinamizou a produção do espaço, em áreas

que o projeto contemplou, levando principalmente obras de infraestrutura, como o

asfaltamento de rodovias, que foram importantes para a fixação de cidades próximas às

estradas.

POLÍTICAS DE COLONIZAÇÃO PRIVADA EM MATO GROSSO

Além de programas federais como o PIN, algumas políticas estaduais como a

política de colonização serviram como instrumento estratégico do governo para a

integração e ocupação da Amazônia mato-grossense, este que constitui um estado rico

em biodiversidade e dono de uma considerável extensão territorial de 903. 366. 192

km², IBGE (2013), portanto, o terceiro maior estado brasileiro. Segundo dados da

SEPLAN-MT (2000), 53,6% do território pertencente à Floresta Amazônica que foi

palco de ações políticas de integração do território ainda pouco habitado na época de

tais intervenções. Em meados da década de 1970 até o final da década de 1980, as

colonizações particulares viram em Mato Grosso, impulsionados por parcerias com o

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governo, que oferecia vantagens financeiras, facilidades no acesso à terra, graças aos

programas de desenvolvimento regional, um espaço de oportunidade, vindo muitos

empresários das regiões Sul e Sudeste, para desbravarem as terras mato-grossenses.

Neste período, em Mato Grosso, 33 colonizadoras particulares que implantaram 88

projetos, que totalizaram uma área de 3,25 milhões de hectares, onde cerca de 19.550

famílias de colonos ocuparam as terras mato-grossenses. A tabela abaixo trata sobre os

diferentes tipos de projetos de colonização de terras em Mato Grosso e suas respectivas

abrangências em dimensões territoriais.

Colonização em Mato Grosso – 1970/1992

Projeto de Colonização

Projetos Área (Km²) % do Estado Beneficiários (Famílias)

Oficial 14 10.634 1.18 10.185

Particular 87 32.463 3.60 19.558 Total 101 43.097 4.78 29.743

Fonte: MORENO, Gislaene. (São Paulo, p.314. 1993). Organizado por MOURA, 2014.

Contudo, frente aos incentivos para as políticas de colonização particular, muitas empresas compram as terras para iniciarem o processo de ocupação e colonização das mesmas, o que futuramente gerou diversos núcleos urbanos, como Sinop.

Gislaene Moreno (1993) contribuiu com estudos e pesquisas sobre o processo fundiário no estado de Mato Grosso e também acerca das políticas de colonização particular em Mato Grosso, um meio capitalista de apropriação de terras, a referida autora considerou:

Está claro que o controle do território para a expansão capitalista é o móvel das iniciativas privadas no processo de colonização. Assim, o acesso à terra, permitido a colonos ou trabalhadores do campo em geral, e a formação de verdadeiras cidades no meio da selva devem ser entendidos dentro da lógica contraditória do capital, como partes integrantes e necessárias de um único processo: o de construção capitalista do território. Como fruto desse processo, foram criados a

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partir da década de 70, 83 novos municípios, todos emancipados, sendo que quase a metade resultante da colonização privada. Isto significa que até o inicio de 1970 o estado contava apenas com 34 municípios. Termina a década de 1980 com 95 e inicia a década de 1990 com um total de 117 municípios. (MORENO, 1993, p. 310).

O alto poder aquisitivo dos empreendedores colonizadores facilitou a

permanência e prosperidade das colonizações, que proporcionaram a origem de muitas

cidades, pela apropriação capitalista da estrutura do campo e pela mecanização da

agricultura, que acelerou a reestruturação sócio-espacial do território mato-grossense. É

neste palco que a colonizadora de terras SINOP (Sociedade Imobiliária do Noroeste do

Paraná), adquire terras em Mato Grosso, sobre este assunto os autores Ferreira e Moura

(2008), escreveram, que inicialmente havia o núcleo de Colonização Celeste (Gleba

Celeste), que contava com uma área inicial de 198 mil hectares de terras destinadas à

colonização. Em 1971, Ênio Pipino, que representava a empresa colonizadora cujo

nome é: Sociedade Imobiliária do Noroeste do Paraná – SINOP adquiriu as terras do

núcleo de colonização. O fundador de Sinop foi o comendador Ênio Pipino, que

liderava este projeto de colonização. Pipino trazia consigo a experiência de haver

fundado inúmeras cidades no estado do estado do Paraná. Ao tempo desta colonização,

sua empresa, a Sinop Terras, tinha sede em Maringá. Mais tarde a própria denominação

desta empresa colonizadora, daria seu nome ao futuro município mato-grossense.

Contudo, Sinop mostra um rápido crescimento urbano e demográfico, e em

poucos anos teve sua economia alterada por diferentes ciclos, mantendo uma

característica de uma centralidade urbana regional. Inicialmente uma aposta para a sua

economia seria a produção de álcool utilizando-se da mandioca, não logrando êxito,

passou-se então para um ciclo das madeireiras e serrarias, onde muitos relatos de

moradores contam que o município chegou a possuir mais de mil madeireiras, nesta

época a cidade era destaque em rankings de desmatamento florestal em todo o Brasil,

felizmente essa atividade foi aos poucos sendo ceifada. Dentro da perspectiva de

centralidade, percebe-se em Sinop a relação de uma centralidade urbana, pautada na

relação do espaço e de uma organização espacial e hierarquizada vinculada ao

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capitalismo. Sobre uma concepção de centralidade, trago à baila as palavras de Corrêa

(2011), para explicitar a ideia de localidades centrais:

A recuperação da teoria das localidades centrais é importante porque ela trata de um tema relevante que é de organização espacial da distribuição de bens e serviços, portanto, de um aspecto da produção e de sua projeção espacial, sendo assim, uma faceta da totalidade social. Recuperá-la porque se torna necessário enriquecer a visão geográfica da sociedade, isto é, enriquecer nossa compreensão sobre as diferentes formas de espacialização da sociedade. (CORRÊA, 2011, p. 17).

Ressalta-se que a localização de Sinop é uma área de expansão e concentração

de atividades agrícolas, mantenedoras do agronegócio em Mato Grosso, o que ajuda a

justificar sua atual sustentação econômica, a múltipla prestação de serviços e um

comércio varejista e atacadista estruturado, além de muitas empresas especializadas no

setor (venda de insumos e maquinários agrícolas), servindo também para centralizar

outras prestações de serviços públicos e privados, como: saúde, a logística de

transportes de cargas, concentração de órgãos públicos para atender a outros municípios

da região, possuir o aeroporto mais ativo da região norte do estado, e em especial relevo

neste trabalho a prestação de ensino de nível superior e suas interfaces na espacialidade.

A PRODUÇÃO DO ESPAÇO:

AS INTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR PRODUZINDO A CIDADE

Após uma reflexão sobre o processo de formação do município de Sinop,

ressaltando sua historicidade pautada em programas e políticas de ocupação privada de

terras na Amazônia mato-grossense, introduzimos então sobre a inserção da instalação

de instituições de ensino superior em um município então recém-criado, sendo a

Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e Universidade do Estado de Mato

Grosso (UNEMAT) as primeiras instituições a serem instaladas em Sinop, em 1990

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cria-se o Núcleo de Ensino Superior de Sinop, o que mais tarde tornaria o campus da

UNEMAT, e em 1992 a instalação do campus da UFMT (inicialmente foi criado o

Núcleo Pedagógico Norte Mato-Grossense em 1991).

Na contemporaneidade percebe-se que as instituições de ensino agregam muito

além da principal função social de uma universidade, que em linhas gerais destaco seu

papel na contribuição cientifica, filosófica e cultural pensada em atividades pautadas no

ensino, pesquisa e extensão. Através destes espaços públicos acontece uma

supervalorização de espaços privados em detrimento dos primeiros, sendo

principalmente o mercado imobiliário o principal meio que mais se dinamiza em função

das universidades na cidade estudada, além de casas de festas e shows e franquias de

redes internacionais de fast food que aproveitam entre outros fatores, mas, sobretudo, o

grande potencial principalmente de estudantes universitários, para instalarem suas filiais

na cidade.

Essa dinamização do espaço intra-urbano e a produção deste, são pautadas em

uma produção espacial que concordando com as idéias, por mim considerada clássica de

Roberto Lobato Corrêa, onde o autor classifica como os principais proprietários de meio

de produção, sendo os proprietários fundiários, os promotores imobiliários, o Estado e

também, os grupos sociais, na ideia de Corrêa os ‘grupos sociais excluídos’, mas,

considero que mesmo os “excluídos”, na verdade estão sim inseridos no sistema

capitalizado de produção espacial, entretanto, são aqueles que mais sofrem com tal

perversidade deste sistema, o capitalismo. Ainda sobre os agentes sociais da produção

do espaço, é dada à partir de cada relação estabelecida em um dado momento da história

impressa no espaço, perfazendo a relação espaço e tempo, como expressa as palavras de

Corrêa (2013):

Os agentes sociais da produção do espaço estão inseridos na temporalidade e espacialidade de cada formação socioespacial capitalista. Refletem, assim, necessidades e possibilidades sociais, criadas por processos e mecanismos que muito deles criaram. E são os agentes que materializam os processos sociais na forma de um ambiente construído, seja a rede urbana, seja o espaço intraurbano. (CORRÊA, 2013, p.43- 44).

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Ainda sobre algumas das contribuições teóricas sobre a produção do espaço e

suas múltiplas lentes teóricas e de abordagens, trago à baila concepções de Marcelo

Lopes de Souza (baseando-se teoricamente em pensadores como Marx e Lefebvre),

onde o referido autor salienta sobre a necessidade de incorporarmos nesta discussão,

além da materialidade do espaço e as idealizações de produção espacial em favor de

cada vez mais valores estritamente econômicos, mas, discutir também novas formas e

práticas espaciais, como abordagens que tratam também das produções simbólicas do

espaço, além de diferentes relações de poder estabelecidas espacialmente, tal idéia pode

ser verificada com a citação que segue:

De toda sorte, não existe apenas uma única maneira de interpretar e focalizar a “produção do espaço”. Do predomínio de uma visão estreitamente “materialista” (redutora do espaço à sua materialidade), e mesmo economicista a uma visão mais abrangente e radical, que desafie o próprio pano de fundo filosófico da reflexão lefebvriana (o pensamento de Marx), várias são as possibilidades. [...] Com efeito, já por aí se descortina a possibilidade de ver a “produção” como sendo não apenas a produção de bens materiais (móveis e imóveis), mas também a produção simbólica e de relações de poder. O termo “produção” é suficientemente amplo e plástico para comportar essa multiplicidade de dimensões. (SOUZA, 2013, p.40-41).

É sobre a ótica da produção do espaço especialmente o urbano, enriquecido com

respostas de diferentes estudantes universitários, obtidas por meio de roteiros de

entrevistas, através de pesquisa de campo melhor detalhada nos procedimentos

metodológicos no inicio deste artigo, que permeia a discussão e reflexão da produção do

espaço de uma cidade universitária, e suas principais implicações não somente do

espaço concreto, mas também dos modos de representação deste espaço.

Por meio de análise de alguns roteiros selecionados para a apresentação neste

trabalho apenas duas questões para observação serão destacadas, ressalto a dificuldade

de sintetizar uma discussão profícua em poucas páginas para atender as normas de envio

e posteriormente publicação deste texto, intercalo algumas inserções/análises de

algumas entrevistas sobre a temática investigada.

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o 1 - Qual ou quais elementos na cidade você relaciona com a presença

das Instituições de Ensino Superior (IES)?

Sobre este questionamento 15 estudantes de diferentes instituições de ensino e

cursos de graduação e faixa etária, responderam sobre quais elementos visíveis e

também simbólicos presentes em Sinop eles relacionam com a presença das IES, por

mais que a questão era de caráter qualitativo, foi possível quantificar os elementos que

foram citados por eles, onde, muitos elementos foram repetidos por diferentes

entrevistados, como ilustra a tabela:

Principais elementos citados Números de entrevistados que mencionaram

Residenciais/Kitinetes/Repúblicas 10

Barzinhos/Boates/Casas de Shows 11

Praças nos fins de semana com muitos jovens 3

Restaurantes novos nas proximidades das IES 3

Novo bairro na frente da UFMT 4

Principais elementos que um grupo de 15 estudantes mencionou sobre aspectos na cidade que eles relacionam com a presença das IES. Fonte: Moura, Edenilson. 2014.

Com esta amostragem verifica-se que principalmente o setor imobiliário e o

setor de bares e casas de festas foram os mais citados pelos estudantes entrevistados, em

Sinop, é uma tarefa fácil andar pelas ruas da cidade e perceber muitas kitinetes,

repúblicas, principalmente nas proximidades das IES, bem como, a presença de vários

estabelecimentos comerciais como bares e boates, como nas proximidades da

UNEMAT, mostrando uma supervalorização de espaços privados em detrimento dos

espaços públicos.

o 2- Você considera Sinop uma cidade universitária?

Perguntou-se também para o mesmo grupo de 15 estudantes sobre a

representação de Sinop como “Cidade Universitária”, esta também foi uma questão

aberta onde poderia se acrescentar as justificativas para as respostas, como mostra a

tabela de síntese dessa questão:

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Você considera Sinop uma cidade

universitária?

Quantidade de respostas Algumas Justificativas

Sim 10 “Sim, porque tem muitas instituições...”

“É a única cidade de Mato Grosso que

tem duas universidades públicas...”

“Tem cursos de diferentes áreas...”

“Sim, porque a cidade era muito parada

antes de ter os campus das

universidades, principalmente o da

UFMT, veio muita gente de fora, e isso

fez a cidade crescer...”

“Sim, quase todo lugar que você vai em

Sinop, vê gente com camiseta de

cursos...”

Não 1 “Não, acho que tem que melhorar muito

a qualidade das instituições...”

“Mais ou menos”, “Caminhando

para isso”, “Quase”

4 “Mais ou menos, tem muita gente na

cidade que vem para trabalhar e não

necessariamente veio pelas

universidades...”

“Caminhando para isso, mas, precisa

melhorar, tem que ter mais cursos de

pós-graduação, quase não tem, e isso é

importante para uma cidade

universitária...”

“Quase, falta estrutura para isso, como

mais laboratórios de qualidade...”

Que a cidade de Sinop realmente apresenta características de uma cidade

universitária é inquestionável, instituições públicas e privadas de ensino, apresenta

diferentes áreas de cursos de graduação e uma população de estudantes de ensino

superior considerável, mas, é interessante ver pelas respostas dos estudantes acerca

dessa representação de cidade universitária, sobre a necessidade de melhoria

principalmente no que diz respeito a qualidade do ensino prestado nas instituições,

sendo a qualidade um atributo fundamental para esse “título”, e não somente a

quantidade de instituições, cursos e vagas.

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Elementos concretos na espacialidade: influências das universidades na cidade

Fotografias 1 e 2: ¹Residenciais em frente à UNEMAT e no fundo um edifício sendo construído.²Casa de shows ‘boate’ onde prioriza-se o estilo musical intitulado “Sertanejo Universitário” em frente à UNEMAT. Fotografia: Edenilson Moura, Abril/2014.

Fotografias 3 e 4: Novos residenciais em bairro recém criado em frente ao campus da UFMT. Ressalta-se que é um bairro criado para atender principalmente a demanda de estudantes e professores desta instituição de ensino. Fotografias: Edenilson Moura, Abril/2014.

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Fotografias 5 e 6: 5Lote em bairro universitário (Na frente da UFMT) como área de especulação imobiliária. 6Anúncio de um edifício residencial em outdoor fazendo menção à localização de uma instituição privada de ensino superior: “Próximo a FASIPE” – ilustrando a relação de instituições de ensino superior, inclusive privada, dinamizando a localização de empreendimentos imobiliários. Fotografias: Edenilson Moura, Abril/2014.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observa-se que no contexto regional, que Sinop um município criado por meio

de políticas de ocupação da Amazônia mato-grossense na década de 1970, sob a ótica

da expansão de uma produção capitalista do espaço, hoje contribui para a estruturação

da rede urbana do estado de Mato Grosso, onde a prestação de serviços, especificamente

a presença de Instituições de Ensino Superior como Universidades públicas e também

privadas, dão subsídios para tal consolidação da rede intra-urbana e interurbana, e

também influenciam na produção do espaço urbano local, que modifica as formas

vigentes dessa produção, como exemplo, a apropriação privada do mercado imobiliário,

onde espaços privados supervalorizam-se em detrimento da presença de espaços

públicos. Este estudo, contudo poderá ser uma ferramenta para a construção de políticas

na gestão pública local, além de contribuir aos estudos de centralidade urbana e

produção do espaço regional e também das relações entre universidade e cidade.

REFERÊNCIAS

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BROWDER, John. GODFREY, Brian. Cidades da floresta: urbanização, desenvolvimento e globalização na Amazônia brasileira. Manaus: Editora da Universidade Federal do Amazonas, 2006.

CORRÊA, Roberto Lobato. Sobre agentes sociais, escala e produção do espaço: um texto para discussão. In: CARLOS, Ana Fani Alessandi. SOUZA, Marcelo Lopes de. SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO. São Paulo. 2013

CORRÊA, Roberto Lobato. Trajetórias Geográficas. 6ªed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011.

FERREIRA, João Carlos Vicente. SILVA, José de Moura e. Cidades de Mato Grosso: origem e significados de seus nomes. Cuiabá: Ed. Memória brasileira, 2008.

MOURA, Edenilson Dutra de. Reflexões urbanas e culturais da cidade de Sinop. Monografia (Bacharelado em Geografia) – Instituto de Ciências Humanas e Sociais, Departamento de Geografia, Universidade Federal de Mato Grosso. Cuiabá, Mato Grosso. 2013.

MORENO, Gislaene. Os (des)caminhos da apropriação capitalista da terra em Mato Grosso. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de Geografia, Universidade de São Paulo. São Paulo. 1993.

SOUZA, Marcelo Lopes de. Os conceitos fundamentais da pesquisa sócio-espacial. 1ªed. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2013.