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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO A PROBLEMÁTICA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS E SEU IMPACTO NA ARGENTINA, BRASIL E CHILE DURANTE A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL (1938-43) Jorge Luiz Pereira Ferrer Rio de Janeiro 2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

A PROBLEMÁTICA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS E

SEU IMPACTO NA ARGENTINA, BRASIL E CHILE

DURANTE A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL (1938-43)

Jorge Luiz Pereira Ferrer

Rio de Janeiro 2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO Instituto de Filosofia e Ciências Sociais. Departamento de História.

A PROBLEMÁTICA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS E

SEU IMPACTO NA ARGENTINA, BRASIL E CHILE

DURANTE A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL (1938-43)

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação de História Comparada visando a obtenção do grau de Mestre

Orientação: Francisco Carlos Teixeira da Silva

Maio de 2007

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FICHA CATALOGRÁFICA

Ferrer, Jorge Luiz Pereira A Problemática das Relações Internacionais e seu Impacto na Argentina, Brasil e Chile durante a Segunda Guerra Mundial (1938-1943) Rio de Janeiro, PPGHC/UFRJ, 2007. Páginas Dissertação: Mestrado em História Comparada

1- Relações Internacionais 2- Pan-americanismo 3- Fascismo 4- Continente Americano 5- Guerra I. PPGHC – Dissertação de Mestrado II. Título

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“Por tanto tempo quanto os homens viverem sem um poder comum que a todos mantenha em respeito, estarão nessa condição chamada guerra, e essa guerra é guerra de todos contra todos”.

Thomas Hobbes

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por esta maravilhosa experiência, evento tão raro, em um país de milhões de excluídos. Ao Dr. Francisco Carlos Teixeira da Silva pela confiança depositada neste trabalho, realizado por um estudante oriundo de outra área de atuação (Arquitetura) e, principalmente, pela orientação necessária para o desenvolvimento dessa dissertação. Ao Dr. Alexander Zhebit pelo apoio a esse trabalho, propondo idéias e subsídios para a construção de uma dissertação mais clara e objetiva. Ao Dr. Sidnei Munhoz pelo incentivo e análise acurada na definição do Projeto que redundou na dissertação desse trabalho. A Dra. Maria da Conceição de Góes pelo incentivo e carinho nos momentos de ansiedade e incertezas na preparação desse trabalho. Aos Funcionários do Arquivo Histórico do Itamaraty (Rio de Janeiro) sempre prestativos e empenhados em auxiliar-me, na procura de documentos importantes para a realização deste estudo. Sem eles, não poderia realizar essa Tese de Mestrado. Minha gratidão com eles será eterna (José Luiz Miranda, Roseana Rigas Martins e Sebastião Machado). Aos amigos do Laboratório do Tempo Presente que me acolheram como um “companheiro de longa jornada”, transformando nossos encontros semanais em momentos agradáveis e inesquecíveis (Ana Beatriz, Artur, Bárbara, Bruno, Carlos Neto, César, Daniel, Élson, Jéssica, Josélia, Maria Fernanda, Rafael, Ricardo Bull, Roberto Loyola, Tatiana, Verônica e Wander). Aos colegas do PPGHC pelo carinho, amizade e companheirismo durante os dois anos de convívio nesse Programa de Mestrado (Adan, Jéferson, Jorge José, Luiz Henrique, Paula e Wálter Marcelo). As secretárias do PPGHC (Márcia e Lenisa), presentes em todos os momentos em que precisei de qualquer auxílio do Programa, sempre com um sorriso nos lábios. A Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) pelo financiamento, através de uma Bolsa de Mestrado, deste Projeto. A minha amada esposa pelo seu incentivo, apoio e companheirismo, proporcionando-me uma força hercúlea para a realização deste trabalho.

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LISTA DE ABREVIATURAS

AIB Ação Integralista Brasileira

ASKI Auslander Soderkonto fur Inlandszahlungen (Conta Especial do Estrangeiro para Pagamentos Internos)

CIAA Comisión de Investigación de las Actividades Antiargentinas (Comissão de Investigação das Atividades Anti-argentinas)

DAF Deutsche Arbeits-Front (Frente de Trabalho Alemã)

FAB Força Aérea Brasileira

GESTAPO Geheimestaatspolizei (Polícia Secreta Federal)

GOU Grupo de Oficiais Unidos ou Grupo de Ordem e Unidade

ITAMARATY Ministério de Relações Exteriores do Brasil

MAGIC Grupo de criptógrafos norte-americanos que decifravam mensagens secretas do inimigo

MNS Movimento Nacional Socialista Chileno

NSDAP Nationalsozialistische Deutsche Arbeiterpartei (Partido Nacional Socialista Alemão)

ONU Organização das Nações Unidas

PBV Política da Boa Vizinhança

PURPLE Nome do Código Naval Japonês (NJ-25)

SS Schutzstaffeln (Tropas de Choque)

TOM Teatro de Operações do Mediterrâneo

ULTRA Grupo de criptógrafos britânicos que decifravam mensagens secretas do inimigo

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RESUMO

Este estudo analisa a interdependência das políticas externas entre os países do sul da

América Latina (Argentina, Brasil e Chile), os países do Eixo (Alemanha e Itália) e os

Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial. Inicialmente procura mostrar o

caráter imperialista estadunidense na região e estuda como a grave crise financeira

mundial afetou essas relações, principalmente no Brasil e no Chile, cujas economias eram

muito dependentes do mercado norte-americano. A recessão também afetaria a Argentina

que tinha no mercado europeu (Alemanha e Inglaterra) sua principal fonte de divisas.

Com o crescimento da economia alemã, após o surgimento do nazismo, os alemães

procuram expandir o seu comércio exterior com os países sul-americanos, aumentando a

sua influência política na região, utilizando-se de um elaborado sistema de trocas

comerciais (marcos compensados) que permutava produtos industrializados por matérias-

primas. Os italianos passam a aplicar a mesma política comercial com esses países sul-

americanos. Essa influência preocupava e apavorava o governo norte-americano, que

através de uma nova política de boa vizinhança procura cooptar os países latino-

americanos para o seu lado, através da Política de Solidariedade Americana (Pan-

americanismo). Com o andamento da guerra, na III Conferência dos Chanceleres

Americanos (Rio de Janeiro), praticamente todos os países latino-americanos rompem

relações diplomáticas com os países do Eixo, com exceção da Argentina e do Chile. O

Brasil entraria em guerra com a Alemanha e a Itália depois que alguns de seus navios de

cabotagem foram afundados por submarinos alemães, e o Chile também apoiaria a causa

aliada sob a influência norte-americana. Só a Argentina se oporia a apoiar os EUA na

região, apostando na vitória das forças do Eixo. Por fim, esta pesquisa apresenta os fatos

políticos, comerciais e ideológicos que fizeram com que Brasil e Chile ficassem ao lado

dos aliados durante a guerra, e a Argentina mantivesse uma neutralidade, ainda que

falsa, até quase o final do conflito.

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ABSTRACT

This study analyzes the impact of foreign relations between Argentina, Brazil, and Chile

and the Axis Powers (Italy and Germany),on the one hand, and the United States, on the

other, up to the middle of World War II. It attempts to describe the imperialistic nature of

American intervention in the region and demonstrates how the worldwide financial crisis

affected these relationships. Special attention is given to Brazil and Chile, whose

economies were highly dependent on the American market. As the German economy

grew after the rise Hitler, the Germans actively sought to expand their trade relations with

South American countries, aiming to increase their political influence on the continent.

When the war broke out in Europe, this growing influence became a cause of grave

concern to the United States. As a result, the US launched a new foreign policy initiative

emphasizing Pan-American solidarity in an effort to coopt these nations to its side. And,

lastly, the study presents the political, commercial, and ideological that were crucial in

persuading Brazil and Chile to adhere to the Allied cause as opposed to the Argentinian

decision to remain at least officially neutral almost until the end of the conflict.

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SUMÁRIO

Conteúdo AGRADECIMENTOS LISTA DE ABREVIATURAS RESUMO ABSTRACT SUMÁRIO INTRODUÇÃO PRIMEIRO CAPÍTULO: APRESENTAÇÃO DOS AGENTES EXTERNOS

1.1-As Relações Políticas e Econômicas com a Europa (Alemanha/Itália) 1.2-A Hegemonia Continental Norte-americana

SEGUNDO CAPÍTULO: INTERFERÊNCIA DO FASCISMO NA ESTABILIDADE POLÍTICA, MILITAR E ECONÔMICA DOS PAÍSES DO SUL DA AMÉRICA LATINA

2.1-Na Política Regional 2.2-Na Política Internacional 2.3-No Setor Militar 2.4-No Setor Econômico

TERCEIRO CAPÍTULO: A POLÍTICA DE SEGURANÇA CONTINENTAL PROPOSTA PELOS EUA E SUAS CONSEQÜÊNCIAS NOS PAÍSES DO SUL DA AMÉRICA LATINA

3.1-Os Resultados da Política de Boa Vizinhança Norte-americana 3.2- Colocação em Prática da Política Hegemônica dos EUA, no Sul da América Latina 3.3-O Apoio Financeiro para o Rearmamento das Forças Armadas da América Latina 3.4-O Comércio Norte-americano com as Repúblicas Americanas do Sul da América Latina

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CONCLUSÃO C.1- A EXCEPCIONALIDADE DA POLÍTICA EXTERNA ARGENTINA

1-Rivalidade com os EUA pela Hegemonia do Continente 2-Atrito com o Brasil que Apoiou o Pan-americanismo Norte-americano

3-Comércio Exterior Dependente do Mercado Europeu

C.2- A FALTA DE OPÇÃO DA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA

1-Rivalidade com a Argentina pela Hegemonia na Região Sul do Continente 2-Apoio ao Pan-americanismo em Busca de uma Política Desenvolvimentista 3-Comércio Exterior Dependente do Mercado Norte-americano

C.3- A DIVISÃO BIPOLAR DA POLÍTICA EXTERNA CHILENA

1-Divisão Interna Determina uma Política Externa Dividida (Comunismo x Capitalismo)

2-Manutenção da Política de Neutralidade na Tentativa de Manter a Segurança do País 3-Comércio Exterior Dependente do Mercado Norte-americano

FONTES REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS REFERÊNCIAS DE MEIOS ELETRÔNICOS ANEXOS GLOSSÁRIO

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INTRODUÇÃO:

O principal objetivo deste trabalho foi comparar os interesses nacionais das potências do

Eixo (Alemanha/Itália), dos EUA e dos países do sul da América Latina (Argentina, Brasil

e Chile), para determinar que tipo de política externa, essas nações aplicaram, no

Continente americano, durante a Segunda Guerra Mundial. Procurei analisar,

simultaneamente, as relações comerciais e a influência militar que, principalmente,

Alemanha e EUA exerceram na região, na tentativa de cooptar esses países sul-

americanos para as suas respectivas esferas de influência. A preponderância dos países

do Eixo, na região, surgiu, em parte, com a criação de um forte e promissor comércio

(1934) com os países sul-americanos, logo após o fim da Grande Depressão Mundial.

Essas relações comerciais se baseavam em um sistema de trocas de mercadorias, em

que cada valor conseguido na venda de um produto poderia ser utilizado para a compra

de outro produto, sem a utilização de qualquer tipo de moeda internacional (divisas),

facilitando as economias latino-americanas que não dispunham dessas divisas,

ocasionando uma atitude “pró-Eixo” na região sul da América Latina1 (Capítulos 1.1 e 2.4).

Outro fator considerável era a presença de grandes colônias de imigrantes germânico-

italianas nesses países sul-americanos, onde os fascistas procuravam propagar sua

ideologia política, através de clubes sociais e associações culturais, cuja finalidade, inicial,

era a manutenção das tradições de seus descendentes (Capítulos 1.1 e 2.1). Empresas

alemãs, italianas ou sul-americanas com capital fascista patrocinavam políticos latinos,

que defendiam seus interesses, difundindo as benesses que um regime forte e

centralizador seria capaz de produzir para solucionar os graves problemas sociais e

econômicos que essas Repúblicas sul-americanas enfrentavam naquele momento de

1McCann, Frank D. Jr. “Aliança Brasil Estados Unidos (1937/1945)”. Rio de Janeiro, Biblioteca do Exército, 1995. pp. 105-123.

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grandes transformações mundiais2 (Capítulo 2.2). Um grande número de empresários

nacionalistas e algumas oligarquias rurais apoiavam essas idéias, pois, viam nas

democracias ocidentais sinais de decadência política e moral, que só se preocupavam em

explorar o comércio sul-americano de matérias-primas para abastecer suas indústrias.

Analisei a influência que o aparato militar alemão exercia nas Forças Armadas,

especialmente, nos exércitos dos países do sul da América do Sul. Os governos latino-

americanos da época, devido à sua fraqueza institucional, sempre dependiam de um bom

relacionamento com as Forças Armadas de seus respectivos países.3 Na grande maioria

das Repúblicas sul-americanas, seus representantes precisavam manter uma política

bem estreita e cordial com o corpo de oficiais para manterem a estabilidade política de

seus governos. O espetáculo militar mostrado pela Alemanha e Itália, desde a guerra civil

espanhola, forjou uma grande admiração no seio desses oficiais latinos, que viam,

principalmente, na Alemanha um exemplo de ordem e eficiência que gostariam de

implantar em seus países4 (Capítulos 2.3). É importante frisar que os oficiais latino-

americanos apoiavam a eficiência tática e técnica dos exércitos dos países do Eixo,

porém, sendo totalmente contrários, em sua grande maioria, as idéias fascistas de

superioridade racial. Esses oficiais eram, geralmente, nacionalistas, conservadores e

católicos.

Mostrarei como os EUA, na tentativa de combater o fascismo na região, procuraram

cooptar as repúblicas latino-americanas para a sua esfera de influência, através de uma

2McCann, Frank D. Jr. ob.cit. pp. 69-90. 3Idem, pp.69-90. 4Sondern, Frederic Jr. “Segunda Guerra Mundial”. Rio de Janeiro, Seleções do Reader´s Digest, 1965. pp. 149-154.

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política de solidariedade pan-americana, que realçava a sua hegemonia continental5

(Capítulos 1.2 e 3.1). Os norte-americanos iriam cooperar com todos os regimes,

democráticos ou não, que se opunham aos países do Eixo, apoiando-os com novos

financiamentos, créditos para importações, taxas favoráveis de câmbios para exportações

e a extensão de um programa de assistência militar de empréstimos e arrendamentos

(“Lend-Lease Act”)6 para que os sul-americanos pudessem equipar suas Forças Armadas7

(Capítulos 1.2, 3.3 e 3.4).

Apresentarei uma breve explanação, de como a política de união pan-americana,

coordenada pelos EUA, à medida que o conflito mundial se prolongava, foi tornando-se

cada vez mais agressiva em torno dos países do sul do continente americano, que se

negavam a apoiar as determinações aprovadas na III Conferência dos Chanceleres

Americanos, no Rio de Janeiro, em 28 de janeiro de 1942.8 A partir de então, os norte-

americanos começaram a realizar retaliações comerciais com todos aqueles que

continuaram com a política de neutralidade (Capítulo 3.2). Meu objetivo foi comparar os

caminhos escolhidos ou possíveis de Argentina, Brasil e Chile com suas políticas externas

durante a Segunda Guerra Mundial.

Como a política de auto-exclusão pan-americana adotada pela Argentina, em função da

sua total dependência do mercado europeu para o escoamento de seus principais

produtos (carnes e cereais), era a sua única saída para a manutenção de seus dois

5Castello Branco, Manoel Thomaz. “O Brasil na II Grande Guerra”. Rio de Janeiro, Biblioteca do Exército, 1960. pp. 33-39. 6“Lend-Lease Act” – Lei que permitia ao governo norte-americano fornecer ajuda econômica e material, para qualquer nação que rompesse relações diplomáticas ou estivesse em guerra com os países do Eixo. Ela foi aprovada pelo Congresso norte-americano em 11/03/1941, para ajudar a Grã-Bretanha que, até então, só podia adquirir armas pagando à vista (“Cash and Carry”). O Brasil seria o maior beneficiário na América Latina, recebendo cerca de 70% do capital disponível para os sul-americanos. 7McCann, Frank D. Jr. ob.cit. 105-123. 8Bandeira, Luiz Alberto Moniz. “Brasil, Argentina e Estados Unidos – Da Tríplice Aliança ao Mercosul (1870-2003)”. Rio de Janeiro, Revan, 2003. pp. 197-217.

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principais parceiros comerciais, respectivamente, Inglaterra e Alemanha. Essa política iria

se acentuar, notoriamente, após o golpe militar perpetrado por oficiais nacionalistas

(1943), que resolveram apostar na vitória germânica, mesmo quando todos os indícios

começavam a indicar que os fascistas estavam perdendo a guerra. Iriam criar, junto com

membros importantes do Partido Nazista, uma organização (Operação “Verdadeira

Odessa”)9 que no futuro salvaria um grande número de fascistas das mãos dos aliados10

(Conclusões A.1, A.2 e A.3).

Quanto ao Brasil, a sua escolha seria aceitar a política hegemônica norte-americana no

Continente. Vargas sabia que os norte-americanos não aceitariam a neutralidade

brasileira, principalmente, por causa da sua posição estratégica (costa nordestina), e iriam

até as últimas conseqüências para adquirirem as bases militares fundamentais para o seu

esforço de guerra na região. Outro fator era a total dependência da economia brasileira do

mercado norte-americano para seus principais produtos de exportação (café, borracha,

couros). Por fim, Vargas sabia que apoiando a política dos EUA e, principalmente, se

afastando do apoio financeiro oferecido pelos alemães, conseguiria adquirir o capital

necessário para a construção de uma siderúrgica, iniciando o desenvolvimento da

indústria nacional11 (Conclusões B.1, B.2 e B.3).

9Operação “Verdadeira Odessa”- O livro de ficção escrito pelo inglês Frederick Forsyth apresentava uma organização secreta das SS chamada “Odessa” (Organisation der ehemaligen SS-Angehõrigen), que ajudava a retirar, da Europa, depois da guerra, antigos camaradas de armas. Na verdade, o livro foi baseado nas pesquisas que Forsyth realizou, quando era correspondente da Reuters no início dos anos de 1960. Trinta anos depois, o escritor e pesquisador argentino Uki Goñi descobriu em antigos arquivos do Governo argentino que essa operação de resgate realmente existiu com o apoio dos militares nacionalistas do GOU (Grupo de Oficiais Unidos), logo após o final da Segunda Guerra Mundial. 10Goñi, Uki. “A Verdadeira Odessa – O Contrabando de nazistas para a Argentina de Perón”. Rio de Janeiro, Record, 2004. pp.33-45. 11Bandeira, Moniz. “Presença dos Estados Unidos no Brasil (Dois Séculos de História)”. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1978. pp. 264-274.

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A política interna do Chile, um governo radical de esquerda, estava dividida entre apoiar

os nazistas, quando estes eram aliados dos russos (Pacto Germano-soviético) e os norte-

americanos que haviam comprado, praticamente, toda a produção dos seus principais

produtos minerais (salitre e cobre), logo após o início do conflito na Europa (01/09/1939).

Sua escolha ficou facilitada com a invasão alemã à União Soviética (22/06/1941), quando

políticos, sindicalistas, trabalhadores e opinião pública exigiram que o governo apoiasse

os EUA e a sua política de solidariedade pan-americana12 (Conclusões C.2 e C.3).

12Bethell, Leslie. “História de América Latina -El Cono Sur desde 1930”. Barcelona – Espanha, Crítica, 2002. pp.219-254.

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PRIMEIRO CAPÍTULO:

APRESENTAÇÃO DOS AGENTES EXTERNOS

1.1-As Relações Políticas e Econômicas com a Europa (Alemanha/Itália):

A Alemanha e a Itália tinham grandes comunidades nos países latino-americanos,

principalmente, na Argentina, Brasil, Uruguai, Peru, Colômbia, Cuba e Chile. A

predominância alemã em certas regiões era tão grande que muitos dos nativos falavam a

sua língua de origem. Eles diferiam de seus conterrâneos que emigraram para os Estados

Unidos, conservando sua língua e costumes.13 Essa penetração teve um grande

incremento no final do século XIX, como conseqüência da mão de obra excedente oriunda

da competição capitalista na Europa. Sendo assim, sua “exportação” foi promovida,

ajudando a povoar além da América Latina, regiões do Canadá, Austrália e Estados

Unidos. Na América Latina, essa migração européia (ver Tabela 1) foi muito acentuada na

Argentina e no Brasil. Ambos receberiam quase quatro milhões de imigrantes, sendo que

no Chile o número ficaria em torno de duzentos mil, durante um período de 50 anos

(1880-1930).14

A Argentina seria um dos países latino-americanos que mais receberia imigrantes

europeus (1870-1930), principalmente italianos15, em virtude da possibilidade destes

terem acesso fácil na aquisição de pequenas propriedades, na possibilidade de

13Sondern, Frederic Jr. ob.cit. pp.149-154. 14Bethell, Leslie. “História da América Latina, Volume IV: de 1870 a 1930”. São Paulo, Edusp - Editora da Universidade de São Paulo, 2002. pp. 183-185. 15Fausto, Boris; Devoto, Fernando J. “Brasil e Argentina – Um Ensaio de História Comparada (1850-2002)”. São Paulo. Editora 34, 2004. pp.173-177. Muitos italianos se tornaram pequenos agricultores na região de Santa Fé e Rosário, porém, a grande maioria se estabeleceria na região urbana de Buenos Aires.

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arrendarem terras agrícolas a preços módicos e de suprirem a grande necessidade de

mão-de-obra especializada para a pequena indústria que surgia no país.16 Os alemães se

fixariam na capital Buenos Aires ou na região da Patagônia. Na capital, muitos iriam

trabalhar no comércio e no setor industrial e os que se fixariam na Patagônia seriam

pecuaristas, agricultores ou profissionais da área de petróleo, quando este foi descoberto

na região (1907).17

* Imigração Líquida – Chegadas menos Saídas

Fontes: Argentina- de Lattes, Zulma Recchini; Lattes, Alfredo E. (eds.), “La Población de Argentina (1881-1930)”.

Buenos Aires, Instituto Nacional de Estadística y Cencus, 1975, p. 200; Brasil- Levi, Maria Stella Ferreira. “O papel da

Migração Internacional na Evolução da População Brasileira (1872-1972)”. São Paulo. Revista de Saúde Pública, 8

(supl.), 1974, pp. 49-90, esp. 71-72; Chile- Young, George F. W. “The Germans in Chile: Immigration and Colonization

(1882-1907)”. New York. Center for Migration Studies, 1974, p. 6; Mamalakis, Markos. “Historical Statistics of Chile”.

London. Westport, 1980, vol. II, p. 109.18

No Brasil, o governo, durante um longo período, subsidiou a imigração (1880-1927) para

suprir o setor agrícola em substituição da mão-de-obra escrava. Os italianos seriam os

principais trabalhadores, principalmente no setor cafeeiro. O padrão de assentamento

16Fausto, Boris; Devoto, Fernando J. ob. cit. pp.180-181. 17De Nápoli, Carlos. “Nazis em el Sur – La Expansión Alemana sobre el Cono Sur y la Antártida”. Buenos Aires. Grupo Editorial Norma, 2005. pp.61-83. 18 Bethell, Leslie. “História da América Latina, Volume IV: de 1870 a 1930” ob. cit. pp. 184-185.

Tabela 1-Imigração Líquida* [1880-1930]: Argentina, Brasil e Chile (em Milhares). ANOS ARGENTINA BRASIL CHILE TOTAL ANO

1881-1885 191,0 133,4 4,3 328,7 1886-1890 489,4 391,6 23,9 904,9 1891-1895 156,1 659,7 2,8 818,6 1896-1900 303,9 470,3 4,1 778,3 1901-1905 329,3 279,7 3,6 612,6 1906-1910 859,3 391,6 35,6 1.286,5 1911-1915 490,4 611,4 53,3 1.155,1 1916-1920 2,4 186,4 14,8 203,6 1921-1925 510,2 386,6 34,3 931,1 1926-1930 481,6 453,6 6,3 941,5 TOTAL PAÍS 3.813,6 3.964,3 183,0 7.960,9

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agrícola era o “colonato”19 que deixaria os primeiros imigrantes numa situação de grande

penúria, devido ao excesso de imigrantes contratados e, por conseqüência, dos baixos

salários.20 Muitos achavam que eram tratados como escravos, acontecendo vários

protestos, inclusive com a intervenção do governo italiano tentando minimizar os

problemas decorrentes dessas condições precárias de trabalho. Um grande número deles

foi para os centros urbanos e muitos foram absorvidos pelo pequeno parque industrial

brasileiro que surgia com o capital excedente da produção do café e da necessidade de

criar indústrias de substituição de produtos manufaturados europeus que, com a primeira

guerra, não podiam ser adquiridos pelos comerciantes brasileiros. Após o término do

conflito, haveria um crescimento acentuado de imigrantes alemães, sendo que um grande

número deles se estabeleceu no sul do país como pequenos agricultores, comerciantes e

pequenos industriais.21

O governo chileno também estimularia a imigração estrangeira (1886-1890), em grande

parte de origem alemã (suíços e alemães), que seria absorvida como artesãos nas

grandes cidades ou como fazendeiros nas florestas de Araucânia, no sul do país.22 Outros

iriam trabalhar na indústria mineradora que teria como principais investidores, até o início

da primeira guerra, britânicos e alemães.

É importante destacar que, em função de sua grande coesão, conquistaram um lugar

desproporcional aos seus efetivos na economia desses países. A grande maioria

trabalhava em pequenas fazendas e, por estarem localizadas em áreas isoladas, 19 Colonato – É uma forma de organização econômica e social rural na qual o trabalhador arrenda uma porção de terra de outrem sob condição de destinar parte de sua produção ao seu proprietário. Outra forma de colonato é reservar um ou mais dias da semana para dedicar-se ao cultivo da terra do proprietário. 20 Fausto, Boris; Devoto, Fernando J. ob. cit. p.175; pp. 180-181. 21 Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. “O Brasil de Getúlio Vargas e a formação dos Blocos (1930-1942)”. São Paulo. Companhia Editora Nacional, 1985. pp.68-70. 22 Bethell, Leslie. “História da América Latina, Volume V: de 1870 a 1930”. São Paulo, Edusp - Editora da Universidade de São Paulo, 2002. p. 428.

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19

preservavam as tradições e a língua dos seus países de origem.23 Em função deste

isolamento, tinham uma vida totalmente independente da que existia no resto da região.

Construíam suas próprias igrejas e fundavam escolas contratando professores vindos da

Alemanha. Após 1933, quase todos esses profissionais pertenciam ou tinham alguma

ligação com o partido nazista e, mesmo assim, eram controlados por agentes da Gestapo

infiltrados nessas comunidades.24 Criavam clubes esportivos e sociais, para que seus

adeptos mantivessem viva a cultura de seus antepassados.25 Tinham atuação destacada

no setor aeronáutico, onde a maioria das empresas que operava na América Latina, no

início do século XX, era de capital alemão (Deutsche Lufthansa - Alemanha; LAC - Lloyd

Aéreo Córdoba – Argentina; Sindicato Condor, VARIG - Viação Aérea Rio-grandense e

VASP - Viação Aérea São Paulo – Brasil; LAB - Lloyd Aéreo Boliviano – Bolívia e

SCADTA – Sociedad Colombo-Alemana de Transportes Aéreos - Colômbia)26 ou italiano

(Lati – Línea Aeree Transcontinentali Italiane).27 Também tinham atuação destacada no

comércio e na indústria, principalmente, nos setores de bebidas (vinhos e cervejas),

têxteis e de mineração.

No início dos anos 30, com a falta da participação norte-americana na política européia, a

Alemanha começou a recuperar a sua influência política, principalmente, devido à

fraqueza da Inglaterra e da França. Após a subida dos nazistas (1933), iniciou-se um

grande crescimento buscando outros mercados no mundo e exigindo uma hegemonia no

continente europeu.28 A Alemanha encontrou na América Latina, com destaque para os

países do sul, um mercado extremamente promissor para o reaquecimento da sua

23 McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 70. 24 Sondern, Frederic Jr. ob. cit. pp.149-154. 25 McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 70. 26 De Nápoli, Carlos. ob. cit. 39-57. 27 McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 175-179. 28 McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 69-90.

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20

economia após a recessão mundial (“Plano Schacht”).29 Os alemães criariam um

engenhoso comércio de trocas de mercadorias (1934) utilizando um sistema único de

compensações e subsídios para as importações/exportações, os chamados marcos

compensados ou marcos askis (“Auslander Soderkonto fur Inlandszahlungen” – conta

especial do estrangeiro para pagamentos internos).30 Esse processo econômico de trocas

com a Alemanha determinava que, a cada valor ganho na venda de um produto por um

dos países envolvidos, tivesse um valor correspondente na compra de outro produto pelo

mesmo país, evitando sobras de moedas askis que só poderiam ser reutilizadas,

novamente, em outra negociação com a Alemanha. Caso um país sul-americano tivesse

em excesso esses marcos compensados, poderia vender sua carteira a outro país latino

que desejasse comprar produtos alemães e que tivesse o mesmo acordo de moeda

compensada.31 Esse comércio era muito atraente para ambos os lados, pois oferecia uma

grande oportunidade de expandir suas exportações sem o gasto de divisas, eliminando o

uso das escassas disponibilidades de moedas de aceitação internacional (libras/dólares)

que tanto alemães e sul-americanos dispunham. Os comerciantes italianos passaram a

agir em parceria com os germânicos e a permutar mercadorias industrializadas com

carne, algodão, café, mate, açúcar e minerais.32 Com o início das hostilidades (1939), os

britânicos destruíram este comércio através do bloqueio marítimo, porém não impediram

que as firmas alemãs continuassem a aceitar encomendas para entregas posteriores ao

29 Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. p. 77. Hjalmar Schacht, Presidente do Reichsbank de 1933 a 1939, ao mesmo tempo Ministro da Economia de 1934 a 1937. Ministro sem pasta de 1939 a 1941. Personalidade todo-poderosa dentro do III Reich, cabendo a ele, na verdade, a concepção da nova política econômica e comercial alemã. Schacht foi acusado de ter participado da tentativa de assassinar Hitler em 20 de julho de 1944. Foi condenado pelos nazistas, sendo enviado para o campo de concentração de Dachau . Foi libertado em abril de 1945. Em Nuremberg, foi levado a julgamento pelos aliados, sendo inocentado de todas as acusações em 1946. Posteriormente, foi preso desta vez pelos alemães, sofrendo um processo de “desnazificação” e condenado a oito anos de prisão em um campo de trabalho (1946). Porém, seria libertado dois anos depois (1948). Morreria aos 93 anos em 1970. Sobre a vida e a obra de Schacht consultar Peterson, E. N. “Hjalmar Schacht for and against Hitler: a political-economic study of Germany, 1923-1945”. Boston. Christopher Publishing House, 1954, p. 416. 30McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 125-145. 31Seitenfus, Ricardo Antônio Silva.ob. cit. p. 78. 32Sondern, Frederic Jr. ob. cit. pp.149-154.

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21

fim do conflito, acordos que não seriam cumpridos por causa do prolongamento da

guerra. Esse era o mercado europeu que os negociantes latinos tanto precisavam para

salvar a economia de seus países. Enquanto não conquistassem sua independência

técnica, poderiam comprar, pelo sistema de trocas, produtos manufaturados por matérias-

primas.33 O sucesso desse programa e a conseqüente ampliação do comércio alemão

contribuíram para o fortalecimento de uma atitude “pró-germânica” nesses países latinos

(ver Tabelas 2, 3, 4, 5, 6 e 7).

É importante frisar que esta política protecionista alemã causaria muita contestação nos

EUA, que viam neste sistema de compensações um grave entrave na sua política

comercial “liberal” (Programa Hull)34 com os países do sul da América Latina. A pressão

norte-americana iria se intensificar para impedir que suas exportações sofressem uma

queda acentuada tentando, inclusive, fazer novos acordos comerciais com os sul-

americanos. A maior preocupação seria com a sua exportação de algodão para a

Alemanha, que vinha sofrendo uma grande queda em função da aquisição, pelos

alemães, do algodão brasileiro, através do sistema aski e não utilizando moeda corrente

como faziam com os norte-americanos. Desta forma, os norte-americanos acabariam

influenciando na não renovação do acordo comercial entre Brasil e Alemanha em 1937

(09/1937), como veremos no segundo capítulo dessa dissertação.

33Tota, Antonio Pedro. “O Imperialismo Sedutor – A Americanização do Brasil na Época da Segunda Guerra Mundial”. São Paulo. Companhia das Letras, 2000. pp. 22-28. 34Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. 70-80. Programa Hull – Era um Programa Econômico que repudiava todo o tipo de protecionismo, acreditando na utilização do liberalismo no comércio internacional para a instauração de tratados comerciais bilaterais, com base na cláusula incondicional da nação mais favorecida e das vantagens eqüitativas e recíprocas. Sobre o Programa Hull e a política dos acordos comerciais dos Estados Unidos com a América Latina ver Hull, C. Memories, pp. 366-377; Trueblood, H.J. “Trade Rivalries in Latin America”, Foreign Policy Reports, pp. 154-164 e “Latin América, Germany and the Hull Program”, Foreign Policy Reports, janeiro de 1939, v.17, no 2, pp. 374-390. Em 1933, Cordell Hull, foi

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22

R M

5,7

1,6

17,1

1,6

-----

-----

25,6

-----

17,6

-----

116,4

24,7

1,4

-----

62,8

1937

Ton,

5.870

25.400

34.940

13.260

-----

-----

169.140

-----

9.900

-----

1.554.900

23.290

130

-----

535.180

R M

8,7

-----

10,2

-----

-----

-----

26,2

-----

24,3

-----

9,1

14,2

2,0

-----

2,3

1936

Ton,

9.640

-----

22.400

-----

-----

-----

193.890

-----

16.620

-----

164.380

15.540

230

-----

24.270

R M

4,2

2,3

-----

1,0

4,4

-----

27,9

2,0

31,7

3,8

10,1

22,0

1,9

18,8

1,8

1935

Ton,

4.188

34.593

-----

16.140

63.776

-----

234.828

6.457

28.129

9.223

160.791

32.066

300

30.186

18.564

R M

4,2

0,4

-----

0,1

3,8

-----

37,7

2,9

29,5

5,0

12,7

27,0

2,8

23,0

3,5

1934

Ton,

5.673

5.636

-----

1.217

74.590

-----

306.258

10.493

21.375

12.024

222.248

37.706

267

36.836

46.391

R M

4,0

-----

-----

4,98

4,6

-----

41,6

5,2

19,5

3,0

8,4

24,6

2,5

20,9

6,1

1933

Ton,

5.280

-----

-----

72.099

73.298

-----

338.451

16.497

20.786

10.383

141.358

35.252

267

34.480

74424

R M

3,2

0,05

-----

3,7

12,8

0,7

51,6

4,6

18,1

2,0

19,6

26,3

2,9

23,3

20,0

1932

Ton,

4.793

601

-----

44.238

138.021

7.563

426.188

12.442

18.564

10.010

292.351

38.982

175

38.741

207.054

R M

2,2

2,8

0,1

0,1

3,0

1,4

54,4

4,1

30,8

2,7

23,3

36,6

4,6

31,0

14,4

1931

Ton,

2.312

36.499

142

395

31.991

15.135

313.985

9.069

23.821

8.172

264.803

32.162

175

30.949

130.592

R M

5,2

1,1

34,5

0,9

8,6

5,8

62,4

7,7

62,4

4,6

44,5

56,1

3,3

50,5

66,5

ANO

1930

Ton,

3.415

8.519

37.348

5.229

60.399

55.349

193.617

10.298

30.960

5.233

315.133

39.137

156

37.114

335.419

Tabela 2-Importação - Estatísticas do Comércio Exterior entre Alemanha e Argentina [1930-1937]:

ARGENTINA

IMPORTAÇÕES

PRODUTOS

Algodão

Aveias

Carnes/Embutidos

Centeio

Cevada

Farelo de Trigo

Frutas Oleaginosas

Gordura Animal

Lã/Fios Animais

Mat.-primas Químicas

Milho

Pele Animais

Peles Cruas Animais

Pele Vitela/Vaca

Trigo

Fonte: Schmidt Paul. “Statistisches Jahrbuch – Herausgegeben, Siebenundfzigster Jahrgang”. Berlim,. Verlag für Sozialpolitik, Wirtschaft und Statiwstik,1938.

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23

R M

65,0

8,6

-----

48,9

-----

-----

3,1

1,2

2,7

2,2

9,4

24,2

-----

-----

1937

Ton,

70.090

6.310

-----

63.060

-----

-----

33.710

1.670

13.670

8.660

3.820

21.250

-----

-----

R M

38,4

6,1

4,0

33,7

-----

-----

-----

-----

1,5

1,1

13,1

15,8

-----

-----

1936

Ton,

38.120

5.440

9.900

53.550

-----

-----

-----

-----

8.860

2.640

6.940

16.550

-----

-----

R M

92,1

2,6

2,8

46,1

-----

-----

-----

1,7

-----

-----

7,7

-----

10,5

-----

1935

Ton,

82.788

4.054

7.442

67.993

-----

-----

-----

3.659

-----

-----

5.250

-----

15.807

-----

R M

7,2

1.1

1,1

43,3

-----

-----

-----

1,3

-----

0,8

2,4

9,3

8,3

-----

1934

Ton,

8.299

1.840

3.204

66.743

-----

-----

-----

2.940

-----

4.630

1.679

13.551

13.388

-----

R M

0,02

1,1

1,0

42,1

-----

-----

-----

1,1

0,32

1,1

1,5

9,7

7,8

-----

1933

Ton,

56

1.848

2.240

48.922

-----

-----

-----

2.833

2.555

5.364

1.726

12.497

12.295

-----

R M

0,1

0,90

1,9

53,2

-----

-----

-----

0,9

1,3

0,7

1,2

9,2

6,8

-----

1932

Ton,

237

1.662

4.158

57.736

-----

-----

-----

1.786

6.137

2.953

1.075

10.573

10.262

-----

R M

2,5

1,6

2,6

74,5

0,00

-----

-----

1,6

2,5

1,3

3,2

15,7

13,9

-----

1931

Ton,

2.524

2.135

3.939

68.891

1

-----

-----

2.437

9.730

3.803

2.511

14.318

14.163

-----

R M

4,9

3,7

4,1

81,2

4,8

3,7

4,8

1,3

2,3

-----

4,9

16,2

15,2

0,05

ANO

1930

Ton,

3.888

2.661

4.301

51.042

5.139

181.360

48.358

1.292

5.856

-----

2.659

11.739

11.660

274

Tabela 3-Importação - Estatísticas do Comércio Exterior entre Alemanha e Brasil [1930-1937]:

BRASIL

IMPORTAÇÕES

PRODUTOS

Algodão

Borracha

Cacau

Café

Carnes/Embutidos

Carvão (Hulha)

Farelo de Trigo

Frutas

Frutas Oleaginosas

Frutas Tropicais

Lã/Fios Animais

Pele Animais

Pele Vitela/Vaca

Trigo

Fonte: Schmidt Paul. “Statistisches Jahrbuch – Herausgegeben, Siebenundfzigster Jahrgang”. Berlim,. Verlag für Sozialpolitik, Wirtschaft und Statiwstik,1938.

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24

R M

2,7

14,3

1,3

9,9

1,5

24,6

-----

-----

2,0

6,3

1,2

1,1

1937

Ton,

26.980

19.980

14.530

105.150

5.170

9.450

-----

-----

22.730

3.290

290

6.490

R M

-----

8,8

-----

10,6

2,3

15,7

-----

-----

-----

5,1

1,6

-----

1936

Ton,

-----

19.070

-----

92.050

5.800

7.260

-----

-----

-----

3.650

290

-----

R M

2,3

13,5

-----

-----

-----

12,0

5,03

10,2

0,7

-----

1,7

-----

1935

Ton,

31.901

35.309

-----

-----

-----

7.869

22.798

85.897

6.871

-----

296

-----

R M

0,3

10,8

-----

-----

-----

5,4

0,9

13,1

1,2

-----

0,6

-----

1934

Ton,

4.216

23.323

-----

-----

-----

3.300

5.087

107.099

9.381

-----

121

-----

R M

-----

13,3

-----

-----

-----

1,3

-----

0,03

1,26

-----

-----

-----

1933

Ton,

-----

27.423

-----

-----

-----

1.098

-----

372

4.842

-----

-----

-----

R M

-----

9,9

-----

-----

-----

1,3

-----

8,5

-----

-----

0,01

-----

1932

Ton,

-----

17.666

-----

-----

-----

1.240

-----

56.480

-----

-----

9

-----

R M

-----

16,8

0,2

-----

-----

2,0

-----

13,3

-----

-----

3,4

-----

1931

Ton,

-----

20.315

1.854

-----

-----

1.389

-----

71.874

-----

-----

179

-----

R M

-----

29,4

2,3

-----

-----

0,8

0,5

14,9

1,2

-----

2,8

-----

ANO

1930

Ton,

-----

23.739

20.606

-----

-----

441

1.354

79.647

4.321

-----

86

-----

Tabela 4-Importação - Estatísticas do Comércio Exterior entre Alemanha e Chile [1930-1937]:

CHILE

IMPORTAÇÕES

PRODUTOS

Algodão

Cobre

Farelo de Trigo

Fertilizantes

Frutas

Lã/Fios Animais

Leguminosas

Mat.-primas Químicas

Minérios

Pele/Pelos Animais

Químicos/Farmacêuticos

Vinho

Fonte: Schmidt Paul. “Statistisches Jahrbuch – Herausgegeben, Siebenundfzigster Jahrgang”. Berlim,. Verlag für Sozialpolitik, Wirtschaft und Statiwstik,1938.

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25

Tabela 5-Exportação – Estatísticas do Comércio Exterior entre Alemanha e Argentina [1930-1937]: ARGENTINA

EXPORTAÇÕES ANO

1930 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937 PRODUTOS

Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M

Arames 40205 7,8 35524 6,1 24084 4,1 33888 5,6 20887 3,2 30248 5,2 24010 4,0 27680 5,9

Artigos - Borracha 774 5,4 347 2,3 207 1,1 258 2,1 132 0,6 ----- ----- ----- ----- ----- ----

Artigos - Cobre 3002 9,5 1823 4,7 912 2,2 1198 2,4 890 1,9 1399 2,4 440 2,1 510 2,5

Artigos – Ferro 205480 69,2 118970 39,5 57189 21,3 77266 23,2 75269 20,1 81882 26,3 17860 11,9 26190 17,5

Artigos - Porcelana 26505 6,7 18362 5,1 11150 2,9 11736 2,8 9538 2,3 10876 3,0 1950 1,1 18060 3,5

Artigos - Têxteis 3052 31,8 1830 17,6 1020 8,8 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Automóveis/Bicicletas 241 0,9 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- 1460 3,0 3350 7,4

Barcos 50 0,7 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- 5 3,0 6 1,2 ----- -----

Brinquedos 1429 4,0 819 2,1 653 1,3 789 1,8 370 0,9 596 1,4 750 1,8 880 2,2

Carvão (Hulha) 172420 3,5 131563 2,3 221286 2,4 222999 2,0 275915 2,4 164877 1,5 229980 2,3 369730 3,9

Celulóide 178 1,6 172 1,2 129 0,8 109 0,8 165 1,0 232 0,9 ----- ----- ----- -----

Cimento 65642 1,9 25315 0,6 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Corantes/Vernizes 2263 5,6 2208 4,2 2248 3,3 2312 4,6 2483 4,3 2853 5,1 1590 1,0 2750 1,5

Couro 123 4,8 45 1,6 41 0,8 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- 200 3,1

Ferramentas 1859 3,2 770 1,5 405 0,9 874 1,5 802 1,2 1715 2,2 1180 1,4 1670 2,1

Ferro – Construção 12172 1,8 2044 0,2 ----- ----- 25 0,01 13671 1,3 1719 0,1 ----- ----- ----- -----

Instr. Musicais 1179 6,0 435 2,2 136 0,6 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Lã/Fios Animais 29 1,1 37 0,5 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Locomotivas 245 0,3 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- 1990 1,6

Madeira 11383 3,0 6728 1,8 9059 1,1 6704 0,8 10414 1,2 3687 0,4 ----- ----- ----- -----

Madeira - Construção 14236 1,8 4364 0,4 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Máquinas Elétricas 2157 5,3 1666 4,1 555 1,2 425 1,0 566 1,2 1075 1,6 ----- ----- ----- -----

Máquinas Manuais 16032 30,7 8065 15,0 3648 7,0 4562 7,8 5832 8,4 7192 10,8 11070 16,8 16840 23,2

Máquinas Têxteis 1786 5,5 833 2,4 620 1,2 1341 2,4 1921 2,8 1797 3,2 ----- ----- ----- -----

Mat.Eletrotécnicos 8386 19,9 10174 16,8 3250 6,6 5199 8,5 4893 7,5 3091 5,8 6130 8,7 7550 12,1

Mat.-primas Químicas ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Mecânica Fina 707 6,0 348 2,2 230 1,2 264 2,0 219 1,3 304 2,4 ----- ----- ----- -----

Móveis 2307 3,00 790 1,1 509 0,4 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Papel 45391 19,8 55498 16,6 30963 7,8 23312 6,0 12264 4,2 18955 5,3 13310 4,3 12430 2,9

Química/Farmácia 11819 16,2 11608 14,5 11408 10,5 12341 13,4 11942 12,3 11566 14,1 ----- ----- ----- -----

Relógios 389 2,1 231 1,1 143 0,6 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- 350 1,3

Sapatos/Art. Couro 53 1,7 30 1,4 12 0,5 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Tubos 25800 9,2 17566 6,5 10606 3,7 8248 2,3 5370 1,6 11823 2,5 13870 2,5 34810 7,0

Vidro 6032 6,4 3003 3,2 3069 1,9 3939 2,5 1880 1,7 3569 2,2 640 1,2 900 1,5

Ton. – Tonelada; R M – Reich Marks (Milhões) Fonte: Statistisches Jahrbuch fur das Deutsche Reich – Herausgegeben vom Statistischen Reichsamt – Siebenundfunfzigster Jahrgang (1938).

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Ton. – Tonelada; R M – Reich Marks (Milhões) Fonte: Statistisches Jahrbuch fur das Deutsche Reich – Herausgegeben vom Statistischen Reichsamt – Siebenundfunfzigster Jahrgang (1938).

Tabela 6-Exportação – Estatísticas do Comércio Exterior entre Alemanha e Brasil [1930-1937]: BRASIL

EXPORTAÇÕES ANO

1930 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937 PRODUTOS

Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M

Arames 17016 3,5 16590 3,2 15733 3,1 23197 4,4 27671 4,7 56509 9,4 68960 3,8 49810 11,7

Artigos - Borracha 171 1,3 129 0,8 207 1,1 258 1,2 ----- ----- ----- ----- ----- ----- 710 1,7

Artigos - Cobre 1610 4,0 794 1,6 983 1,3 1656 2,3 1640 2,3 3517 3,9 390 2,0 420 2,3

Artigos – Ferro 56725 26,7 37292 13,3 38931 12,0 60755 18,5 74394 18,8 154662 33,2 26840 12,7 27150 16,6

Artigos - Porcelana 4329 2,7 2186 1,3 2188 1,0 1931 1,1 2358 1,0 ----- ----- 910 1,1 940 1,3

Artigos - Têxteis 849 7,5 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Automóveis/Bicicletas ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- 341 0,6 942 1,6 ----- ----- ----- -----

Barcos ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Brinquedos 287 1,1 83 0,3 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Carvão (Hulha) 181360 3,7 234211 4,6 258253 2,6 335600 3,0 322481 2,7 539799 4,3 514960 4,8 802350 9,5

Celulóide 83 0,8 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Cimento 95489 3,4 25708 0,9 ----- ----- ----- ----- 33398 0,5 82146 1,1 ----- ----- ----- -----

Corantes/Vernizes 2060 5,14 1818 3,7 1285 2,6 1755 5,0 1741 4,8 3729 4,9 2990 1,6 3350 2,0

Couro 95 2,5 76 1,7 62 1,0 128 1,8 110 1,5 145 1,8 140 1,9 200 3,1

Ferramentas 2080 3,5 649 1,2 645 1,0 1509 2,2 1619 2,0 2940 3,2 3590 3,3 4250 4,3

Ferro – Construção 2807 0,5 ----- ----- ----- ----- ----- ----- 5217 0,5 15629 1,3 12720 1,2 11270 1,5

Instr. Musicais 249 1,6 45 0,3 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Lã/Fios Animais 21 0,6 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Locomotivas 326 0,5 767 1,4 ----- ----- ----- ----- ----- ----- 1944 1,9 2520 2,5 ----- -----

Madeira 6962 1,9 5332 1,2 9890 1,3 9738 1,1 9757 1,1 20940 2,1 ----- ----- ----- -----

Madeira - Construção ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Máquinas Elétricas 520 1,3 114 0,3 ----- ----- ----- ----- 336 0,7 909 1,4 ----- ----- ----- -----

Máquinas Manuais 7309 16,6 3416 7,3 1578 3,8 3664 7,4 3762 7,9 10340 14,6 13490 21,7 17970 29,3

Máquinas Têxteis 1718 5,2 678 2,0 603 1,9 1079 2,7 1360 3,1 2108 4,2 ----- ----- ----- -----

Mat.Eletrotécnicos 1246 4,6 634 2,0 350 1,1 552 1,6 640 2,2 1052 3,8 ----- ----- 3670 8,7

Mat.-primas Químicas 4355 1,0 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Mecânica Fina 206 2,2 70 0,8 61 0,6 135 1,6 167 1,5 304 2,4 ----- ----- ----- -----

Móveis 495 0,6 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Papel 9045 5,0 9076 3,2 3191 1,4 4464 2,1 3511 1,8 8305 2,8 7720 1,6 10090 2,1

Química/Farmácia 9861 12,9 11688 11,4 10654 10,4 14149 16,7 15137 15,4 25316 22,1 ----- ----- ----- -----

Relógios 87 0,5 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- 180 1,2 220 1,7

Sapatos/Art. Couro ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Tubos 4518 1,9 2827 1,2 3168 1,1 3302 1,0 4002 1,2 10360 2,4 13750 2,6 20310 5,0

Vidro 1627 3,9 1155 2,0 1132 1,5 1841 2,8 2779 2,7 3826 3,5 670 1,6 860 2,0

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Ton. – Tonelada; R M – Reich Marks (Milhões) Fonte: Statistisches Jahrbuch fur das Deutsche Reich – Herausgegeben vom Statistischen Reichsamt – Siebenundfunfzigster Jahrgang (1938).

Tabela 7-Exportação – Estatísticas do Comércio Exterior entre Alemanha e Chile [1930-1937]: CHILE

EXPORTAÇÕES ANO

1930 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937 PRODUTOS

Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M Ton. R M

Arames 8195 1,5 4335 0,7 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- 18730 2,8 ----- -----

Artigos - Borracha 311 1,7 79 0,4 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Artigos - Cobre 663 2,3 277 0,9 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Artigos – Ferro 61864 23,4 18783 7,5 6547 2,1 8161 1,7 16538 3,1 66904 10,9 9080 5,1 8780 5,7

Artigos - Porcelana 1085 1,1 325 0,4 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Artigos - Têxteis 1020 10,6 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Automóveis/Bicicletas ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Barcos 29 1,47 11 0,03 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Brinquedos ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Carvão (Hulha) ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Celulóide ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Cimento 57807 1,8 18349 0,5 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Corantes/Vernizes 1235 2,1 652 1,0 363 1,0 379 1,5 410 1,1 1408 2,1 ----- ----- ----- -----

Couro ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Ferramentas 688 1,3 157 0,3 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Ferro – Construção 5840 0,9 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Instr. Musicais ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Lã/Fios Animais ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Locomotivas ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- 2178 2,1 ----- ----- ----- -----

Madeira ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Madeira - Construção ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Máquinas Elétricas 1055 2,4 591 1,3 49 0,1 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Máquinas Manuais 8427 16,9 3692 7,7 322 0,6 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Máquinas Têxteis 432 1,1 131 0,4 ----- ----- ----- ----- 522 0,7 783 1,3 ----- ----- ----- -----

Mat.Eletrotécnicos 1467 4,9 994 3,3 149 0,3 ----- ----- 155 0,5 529 1,3 1710 2,9 1980 4,4

Mat.-primas Químicas ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Mecânica Fina 191 2,1 128 1,3 8 0,1 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Móveis 601 0,8 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Papel 3670 2,9 1942 1,3 342 0,3 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Química/Farmácia 5283 7,31 4901 4,1 1138 2,2 1096 2,9 1773 3,6 5812 5,5 ----- ----- ----- -----

Relógios 1235 2,1 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Sapatos/Art. Couro ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

Tubos 8746 2,4 1009 0,3 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- 8420 1,3 6710 1,4

Vidro 890 2,6 546 1,0 ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- ----- -----

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As atividades nazistas na Argentina começaram em meados de 1930, quando membros

do partido de Hamburgo vieram a Buenos Aires obter fundos para o movimento nazista

com alemães e simpatizantes que viviam na região.35 Em sete de abril de 1931, o partido

nazista era fundado com 59 membros, chamando-se “Departamento de Ultramar de la

Direccíon Nacional del Partido Nazi” (Auslandsabteilung der Reichsleitung der NSDAP),

tornando-se em 1937, o quarto partido nazista no continente americano, ficando atrás do

Paraguai (1929), EUA (1930) e Brasil (1931)*.36 Utilizavam as escolas alemãs para

divulgação da ideologia nazista, contratando professores filiados ao partido, direto da

Alemanha, como descrito acima. Criaram duas importantes organizações para cooptar

jovens descendentes de alemães, que eram a Juventud Hitlerista e La Liga de Doncellas

Alemanas (Bund Deutscher Madl). Os rapazes mais capazes eram estimulados a estudar

em escolas na Alemanha e alguns deles seriam convidados para ingressarem em escolas

especiais das SS.37

Os alemães utilizavam jornais de pouca expressão para a divulgação de sua ideologia

(Clarinada, La Fronda, Afirmación de una Nueva Argentina, Reconquista, La Tribuna de

Fresco, Cabildo, El Federal, La Voz Nacionalista e El Pampeiro), apesar dos altos custos

despendidos nesta tarefa. Também subsidiavam jornais em língua alemã (Deutsche La

Plata Zeitung, der Trommler, Der Ruslandsdeutsche e Der Deutsche in Argentinien),

direcionados, principalmente, para as suas colônias no sul (Patagônia). A agência de

nomeado Secretário de Estado, e uma de suas principais políticas foi à ampliação do comércio exterior dos Estados Unidos, principalmente, com os países Latino-americanos estimulando a redução das tarifas alfandegárias. Renunciaria em novembro de 1944 por motivos de saúde. Foi um dos grandes idealizadores das Nações Unidas e como prêmio receberia em 1945, o Prêmio Nobel da Paz. Hull morreria em 23 de julho de 1955. 35Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina – Las Actividades del Nazismo en la Argentina. p. 1. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-027.htm 36Salinas, Juan; De Nápoli, Carlos. “Ultramar Sur – La Última Operación Secreta del Tercer Reich”. Buenos Aires. Grupo Editorial Norma, 2002. pp. 74-79. * Segundo Ricardo Seitenfus o ano do surgimento do Partido Nazista no Brasil, seria em 1929. 37Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. pp. 2-3. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-027.htm

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propaganda Transozean fazia um trabalho de divulgação favorável ao Reich alemão,

criticando as atividades britânicas e norte-americanas na região.38

O Nacional-Socialismo também se infiltrou para o interior, para regiões como o Chaco,

Misiones e na Província de Entre Ríos. No Chaco, existia uma colônia alemã bastante

próspera que, com a estiagem prolongada e a seca de 1937, perdeu toda a colheita,

sendo auxiliados financeiramente pelo Governo alemão, conseguindo dessa maneira um

grande número de simpatizantes.39 Em Entre Ríos a forma de cooptar foi através das

Igrejas, com muitos padres vindos da Alemanha e também das cooperativas agrícolas. Na

região de Missiones, o movimento era intenso, principalmente, porque do outro lado da

fronteira, no Brasil, também havia grande atividade nazista. Outra forma utilizada pelos

alemães para difundir sua política nacional-socialista foi conquistar a opinião de políticos,

militares, profissionais liberais e industriais argentinos. Esse trabalho de relações públicas

era realizado pelo Embaixador alemão, Edmund von Thermann, que buscava apoio em

políticos e funcionários públicos argentinos. O grande problema era que a ideologia

nacional-socialista era anti-clerical e racial, atitudes que a maioria da direita argentina

desaprovava.40

Na região da Patagônia, existiam outros grupos de simpatizantes que seriam utilizados

(ver no Capítulo 2.1) para a instalação de bases de reabastecimento de suprimentos

(combustível e víveres) para submarinos e navios de guerra alemães (Etappendienst).41

38Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. pp. 6-7. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-027.htm 39 Idem pp. 2-3. 40 Idem pp. 3-4. 41 De Nápoli, Carlos. ob. cit. pp. 83-108. Etappendienst – Organização cuja missão principal era preparar instalações de apoio para o reabastecimento de submarinos, navios de guerra e corsários alemães. Foi criada na Primeira Guerra Mundial e posteriormente, relançada, em 1927, pelo Almirante Wilhelm Canaris (Chefe da Abwehr – Serviço Secreto do Exército). Também, realizava serviços secretos para obter informações das atividades do inimigo em portos neutros (quantidade de navios mercantes, tipo de mercadoria transportada,

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Utilizavam, como fachada, empresas de capital alemão que pescavam baleia na região.

Os ativistas alemães atuavam nos portos de Bahia Blanca, Rawson, Comodoro

Rivadávia, Deseado e Santa Cruz, tecendo suas teias nas administrações locais para

montar um grande centro de abastecimento para a marinha alemã.42

No Brasil, os primeiros núcleos de simpatizantes nazistas surgem em 1929, criados por

imigrantes austríacos e alemães. Com a chegada de Hitler ao poder (1933), foram

organizados sob a jurisdição da Organização do Exterior (AO- Auslandorganisation) do

Partido Nacional Socialista Alemão (NSDAP). Em 1934, chegou ao Brasil Hans von

Cossel, disfarçado de adido cultural da Embaixada Alemã para assumir a direção geral do

NSDAP. Cossel começaria um sistema intenso de propaganda pró-nazista, utilizando

jornais (Deutsche Zeitung, Deutsche Morgenm, Neue Deutsche Zeitung), agências

internacionais de imprensa (DNB e Transozean), clubes e associações alemães43 e,

inclusive, um jornal brasileiro: o Meio-dia, com sede no Rio de Janeiro.44 Também utilizava

quatro organizações, de âmbito nacional, a saber, a Organização da Juventude Germano-

Brasileira (HJBDM), a Organização das Mulheres Nacional-Socialistas (NSF), a

Associação dos Professores Nacional-Socialistas (NSLB) e Frente Alemã de Trabalho

(DAF). Os núcleos mais importantes do NSDAP ficavam nos estados do sul do Brasil,

devido à grande colônia alemã existente na região. Os núcleos com maior atividade

destino, etc.) e até mesmo em portos do próprio inimigo. No Chile, durante a Primeira Guerra, seus membros reabasteceram o único navio alemão (“Dresden”) sobrevivente da batalha das Falklands contra os britânicos. Na ocasião, o Tenente Canaris, após o ataque do encouraçado britânico “Glasgow” (09/03/1915) ao “Dresden”, ancorado em águas chilenas, que obrigou o Capitão Lüdeche a afundar seu navio, empreendeu uma fantástica viagem de retorno a Alemanha, passando pela Argentina, embarcando em um navio holandês (“Frísia”), chegando a Berlim são e salvo”. Ver também, Brissand, André. “Almirante Canaris – O Príncipe da espionagem Alemã”. Rio de Janeiro, Biblioteca do Exército, 1978. 42Idem pp. 83-103. 43Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. pp. 93-95. 44Silveira, Joel; Moraes Neto, Geneton. “Hitler/Stalin – O Pacto Maldito”. Rio de Janeiro, Record, 1989. pp. 351-378.

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estavam em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, onde o NSDAP era dirigido,

respectivamente, por Otto Schinke e Ernst Dorsch.45

A imigração italiana, no Brasil, seria muito maior que a alemã (558.405 – segundo o

Censo de 1920 - ver Tabela 8), tendo uma grande diferença da germânica, pois se

espalhou para outros estados do Brasil, sendo a sua principal concentração no Estado de

São Paulo.46 A colônia italiana também era muito organizada e, como os alemães,

utilizou-se de escolas, clubes, associações e periódicos para divulgar suas ideologias. Em

oposição aos alemães, os italianos, principalmente aqueles que viviam nos centros

urbanos, absorveram de forma pacífica e com muita rapidez a cultura e os costumes da

sociedade brasileira. É importante relembrar que os italianos, também, fizeram um

acordo comercial baseado no princípio compensatório, mantendo um comércio regular

que ocuparia a décima posição entre os países mais importantes para a economia

brasileira (ver Tabela 9).

Tabela 8-Localização de Cidadãos Italianos no Brasil [1920]:

ESTADOS 1920 ESTADOS 1920 Acre 56 Paraíba 207 Alagoas 134 Paraná 9.046 Amazonas 726 Pernambuco 756 Bahia 1.448 Piauí 37 Ceará 105 Rio de Janeiro 31.929 Espírito Santo 12.553 Rio Grande do Norte 91 Goiás 268 Rio Grande do Sul 49.136 Maranhão 108 Santa Catarina 8.062 Mato Grosso 810 São Paulo 398.798 Minas Gerais 42.943 Sergipe 79 Pará 1.114 Total: 558.405

Fonte: IBGE, Recenseamento , 1920.47

45Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. p. 97. 46Idem. pp.102-105. 47Idem. p. 104.

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Tabela 9-Valor das Importações Brasileiras [1934-1938]: Valor em Libras-Ouro.

PAÍS 1934 1935 1936 1937 1938 Alemanha 3.569.309 5.608.220 7.065.065 9.697.139 8.975.651 EUA 6.027.001 6.406.277 6.651.129 9.336.999 8.694.768 Itália 884.091 684.401 531.210 603.585 645.932

Total: 10.480.401 12.698.898 14.247.404 18.637.723 18.316.351 Fonte: Ministério das Relações Exteriores, Boletim, nº 23, junho de 1939, p. 19.48

A Itália passaria a se interessar pela política interna brasileira, quando o Conde Galeazzo

Ciano49 assumiu o Ministério das Relações Exteriores (Palácio Chigi), em 1936 (09/06).

Ele seria informado pelo Embaixador italiano no Rio de Janeiro, Roberto Cantalupo, que

um partido político brasileiro, a Ação Integralista Brasileira (AIB)50, uma organização

política bem organizada, com objetivos bem definidos, deveria receber apoio político e

financeiro do governo italiano para representar seus interesses no Brasil. A AIB, apesar

de ter todas as características fascistas, do seu forte nacionalismo e de ser anticomunista,

era considerada um subproduto fascista pelos alemães. A causa desta desconfiança era a

idéia integralista de prestigiar a miscigenação de todas as raças, a sua sustentação

religiosa no catolicismo e a abolição de qualquer atividade das “colônias estrangeiras” no

Brasil. Ciano aceitaria ajudar a ABI com uma subvenção mensal de 50.000 liras.51 O

48Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. p. 109. 49“Os Hierarcas de Mussolini”. Coleção Os Grandes Homens da nossa Época. São Paulo. Editora Três. Conde Galeazzo Ciano – Foi Ministro da Imprensa e Propaganda da Itália em 1935, era membro do Grande Conselho do Fascismo, sendo promovido a Ministro das Relações Exteriores em 1936 (09/06). Era casado com a filha mais velha de Mussolini, Edda, com quem teve três filhos. Fez de tudo para Mussolini não entrar na guerra ao lado dos alemães, pois era germanófobo e sabia que a Itália não estava preparada para o conflito. Extremamente ambicioso, procurou aproximar-se do Rei Vittorio Emanuele (antifascista) e conspirou contra os fascistas, a medida que as derrotas começaram a surgir. Mussolini, ao saber de suas intenções, nomeou-o Embaixador italiano no Vaticano. Demitiu-se do governo fascista e, após o golpe que tirou Mussolini do poder, esperou que o rei o chamasse para algum cargo importante. Mas aconteceu o pior, foi preso pelos alemães e entregue ao novo regime fascista republicano italiano, um regime fantoche que os alemães obrigaram à Mussolini exercer no norte da Itália, sendo julgado e condenado à morte (Tribunal de Verona), com a aquiescência do próprio sogro. Foi fuzilado em 11 de janeiro de 1944. Deixou relatos muitos críticos sobre o fascismo italiano em seus “diários” que foram publicados após o fim da guerra. 50AIB – Ação Integralista Brasileira – Foi um partido fundado em 1932, por Plínio Salgado. Seus principais lemas eram: não aceitava o capitalismo; defendia a propriedade privada; queria resgatar a cultura nacional e o moralismo; valorizava o nacionalismo e a prática cristã; combatia o comunismo e o liberalismo econômico. Tinha semelhanças com o fascismo internacional, inclusive o nazismo, mas não era racista nem anti-semita. A Doutrina Integralista baseava-se na tríade “Deus, Pátria e Família”. 51Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. pp. 115-120.

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crescimento político da AIB foi bastante significativo, inclusive, com ramificações nas

Forças Armadas, principalmente na Marinha (ver Capítulo 2.1). Vargas, assustado com o

seu crescimento, inicialmente, flertou com seus simpatizantes e foi apoiado por eles na

instalação do Estado Novo (1937).52

Após a instauração do Estado Novo, Vargas destruiu as duas organizações que

começavam a ameaçar o seu governo, o Partido Nacional Socialista Alemão (NSDAP) e a

Ação Integralista Brasileira (AIB). O NSDAP foi fechado, muitos dos seus membros foram

presos, fato que criou um sério atrito diplomático com o Embaixador alemão, no Brasil,

Karl Ritter53 (ver Capítulo 2). Ritter protestou violentamente com o Ministro Brasileiro das

Relações Exteriores, Mário de Pimentel Brandão e, inclusive, com o próprio Presidente

Vargas. Esse atrito diplomático gerou uma crise entre o Brasil e Alemanha, que resultou

com a substituição dos respectivos embaixadores. A Ação Integralista Brasileira também

seria fechada, seus partidários presos, muitos indo para a clandestinidade. No ano

seguinte, em 1938, a ABI tentaria um golpe contra o governo que seria facilmente

dominado e derrotado por ele, assunto que será mais bem explicado no Capítulo 2.1.

No Chile, como nos outros países latino-americanos, foi nas comunidades alemãs que

surgiram os primeiros simpatizantes do nacional-socialismo alemão. Porém, devemos

destacar uma grande admiração que a classe média chilena tinha pela idéias nazistas de

ordem pública e de respeito pelas tradições nacionalistas. A filial chilena do Partido

52Costa, Sérgio Corrêa. “Crônica de uma Guerra Secreta – Nazismo na América: a Conexão Argentina”. Rio de Janeiro, Record, 2004. pp. 26-28. Estado Novo (1937) - Para não realizar as eleições presidenciais de janeiro de 1938 e se manter no poder, Vargas daria um Golpe de Estado (10/11/1937) que seria chamado de Estado Novo, nome emprestado da ditadura de Antônio de Oliveira Salazar (Portugal). 53Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. p. 76. Karl Ritter era um diplomata que foi o responsável pelas questões econômicas e comerciais da Wilhemstrasse, de 1924 a 1937. Seria nomeado embaixador no Rio de Janeiro, em julho de 1937. Apesar de não ser membro do partido nazista, seria um defensor fiel das idéias de Hitler. Sua atitude agressiva nas questões diplomáticas iria desencadear um sério entrave diplomático que resultou na sua substituição pelo governo germânico. Após o fim da guerra (1945) seria condenado a quatro anos de prisão. Morreria em 31 de julho de 1968.

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Nacional Socialista Alemão (NSDAP) foi fundada em 1931, por Willi Köhn, Richard

Zeissig, em Santiago, e pelo General von Knauer, que tinha como base de ação a região

sul do país.54 Na classe média chilena surgiu o Movimento Nacional Socialista (MNS)55,

que procurava cooptar seus admiradores através de posições extremamente

nacionalistas, de idéias anti-semitas e grande admiração pela Alemanha. Essa atitude

anti-semita não seria muito exacerbada, devido à pequena comunidade judaica existente

no país e, sim, para impedir a entrada de imigrantes judeus que tentavam fugir do

nazismo na Europa.56

O MNS foi criado em cinco de abril de 1932, no período de anarquia política e social que

surgiu com a queda do governo ditatorial de Carlos Ibáñez (1927-1931). Entre seus

principais fundadores estava o general reformado do Exército Díaz Valderrama, o escritor

Carlos Keller e o advogado Jorge González Von Marées. Utilizavam o mesmo padrão do

partido nazista e seu líder González Von Marées se intitulava o “Führer Chileno”.

Entravam em choques violentos com suas tropas de assalto contra as milícias de

esquerda, ocorrendo mortes e um grande número de feridos.57

Eram definidos como uma organização nacionalista, antiliberal, anti-parlamentar e anti-

marxista. Tinham uma imprensa financiada com publicidade de firmas alemãs e de

descendentes germânicos, que divulgava as grandes realizações do nacional-socialismo

na Alemanha e defendia a política racista e anti-semita de Hitler. Procurava cooptar os

jovens da classe média chilena e a numerosa colônia alemã de fazendeiros do sul do

54Militares y Militarismo – Nazis em Chile. pp. 1-3. www.geocities.com/CapitolHill/7109/nazis.html 55Idem pp. 1-2. Os adeptos do MSN se consideravam “nacista”, um eufemismo para a palavra alemã “nazista”. 56Idem. pp. 1-3. 57Idem pp. 2-6.

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país. Em 1935, apoiaria a realização de um congresso em Concepción, onde

participariam cerca de 9.000 simpatizantes, entre tropas de assalto e partidários.58

O MNS tentou, em 1937, se aliar com a Frente Popular (socialistas, comunistas e

radicais) numa tentativa de participar de uma união partidária para vencer as futuras

eleições de 1938. Porém, não foram aceitos pela esquerda, seus grandes inimigos

ideológicos, apesar de aceitarem lutar pelas mesmas reivindicações contra o imperialismo

norte-americano e as oligarquias chilenas. Dessa forma, resolveu apoiar, como seu

candidato presidencial, o nacionalista General Ibáñez.59 Dias antes das eleições (1938),

com o apoio de alguns setores do Exército, tentou um golpe de Estado, porém, foram

derrotados pelas tropas fiéis ao governo e todos os seus líderes foram presos e

condenados.

No setor militar, tanto Argentina, Brasil e Chile, tiveram uma grande influência da

Alemanha e inclusive, muitos de seus oficiais eram treinados por especialistas militares

prussianos desde o final do século XIX. A Argentina manteria esse convênio nos anos

seguintes, que só seria interrompido pela Primeira Guerra, sendo reativado em 1920. Em

1936, uma Missão Militar da Wehrmacht (Forças Armadas da Alemanha)60 seria enviada

para trabalhar como oficiais do Exército argentino. Seus contratos seriam rescindidos com

a iminência de eclosão da Segunda Guerra Mundial (1939).

58Militares y Militarismo – Nazis em Chile. pp. 2-6. www.geocities.com/CapitolHill/7109/nazis.html 59Idem. pp. 3-6. 60Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. ob. Cit. p. 4. Os oficiais alemães eram: Artilharia – General Günther Niedenführ, Coronel Friedrich Wolf; Cavalaria – Major Rudolf Berghammer; Aviação – Major Otto Kriesche e Intendência – Major Joachim Hans Moehring. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-027.htm

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Após o final da Primeira Guerra Mundial, o Brasil mudaria de política e passaria a gravitar

na esfera de influência francesa, uma das grandes vencedoras do conflito, com a vinda de

uma Missão Militar Francesa (1920-1940) sob o comando do General Maurice-Gustave

Gamelin, que transformaria e profissionalizaria o Exército Brasileiro, aperfeiçoando oficiais

e criando um curso de Estado-Maior.61 Infelizmente, toda essa teoria estaria totalmente

superada vinte anos depois quando a França seria subjugada pela “Blitzkrieg” alemã

(“Guerra Relâmpago”).

Não seria diferente no Chile, onde muitos instrutores alemães seriam contratados para

trabalhar em suas Forças Armadas. A maioria era ex-combatente da Primeira Guerra, que

acabaria criando a Liga de Clubes Militares Alemães (Deutscer Reichskriegerbund),

instituição freqüentada por um número bastante significativo de oficias chilenos. Esses

oficiais tinham grande admiração pela máquina de guerra alemã e viam a possibilidade de

aplicar essa ordem e eficiência em suas unidades militares.62 Este assunto será melhor

estudado no Capítulo 2.3 do nosso trabalho.

61Carvalho, José Murilo de. “Forças Armadas e Política no Brasil”. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Editora, 2005. pp.28-29. 62Militares y Militarismo – Nazis em Chile. pp. 4-6. www.geocities.com/CapitolHill/7109/nazis.html

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1.2-A hegemonia Continental Norte-americana:

No início do século XX, as relações políticas entre a América Latina e os EUA eram

baseadas na “diplomacia do grande porrete” (Big-stick- 1904)63, um corolário da Doutrina

Monroe64 que expressava a posição imperialista e expansionista norte-americana no

continente americano. Essa política foi implantada, principalmente, no Caribe e nos

países do norte da América do Sul (ver Tabela 10). No sul, em virtude, ainda, da

preponderância do capital inglês, o poder norte-americano era menos persuasivo,

situação que iria se modificar logo após o fim da Primeira Guerra e, principalmente, em

meados dos anos trinta, com uma nova política de aproximação feita pelos EUA.65 Essa

aproximação surgiria em função de dois fatores cruciais que preocupavam o governo

63 Santos, Luís Cláudio Villafañe G. “A Diplomacia do Porrete”. São Paulo, Revista “Desvendado a História”, Ano 2, Número 7. Escala Educacional, 2005. pp.30-35. “Big-stick” (Grande Porrete) ou “Corolário Roosevelt” (Theodore) - Foi uma ratificação da política unilateral norte-americana, oriunda da “Doutrina Monroe”, que determinava aos EUA o direito exclusivo de praticar qualquer intervenção na América Latina. Era um recado aos países europeus que os EUA não iriam tolerar qualquer interferência na região. Essa reafirmação da hegemonia norte-americana na região foi causada pela crise entre a Venezuela, Alemanha, Inglaterra e Itália (1902-1903). Os europeus bloquearam os portos da Venezuela, inclusive, atacando seus navios, para exigirem dos sul-americanos o pagamento dos seus empréstimos. Os europeus terminaram com o bloqueio e resolveram suas pendências econômicas na Corte de Haia (1904), com a ameaça dos EUA de enviar uma frota as costas venezuelanas. Os EUA, também, arbitraram as divergências de fronteiras existentes entre a Venezuela e a Inglaterra (Guiana Inglesa- 1903). Na verdade, essa política norte-americana pretendia defender seus interesses na América Central, Caribe e, principalmente, sobre o Canal do Panamá. Theodore Roosevelt disse: “A má conduta crônica, ou uma inoperância que resulte no afrouxamento dos laços da sociedade civilizada, no continente americano como em qualquer outra parte, acaba fazendo exigir a intervenção de alguma nação civilizada. No hemisfério ocidental, a adesão dos Estados Unidos à Doutrina Monroe, ainda que de modo relutante, nos casos de flagrante má conduta ou impotência, a exercer o poder internacional de polícia”. Ver também, Bandeira, Luiz Alberto Moniz. “Formação do Império Americano – Da Guerra Contra a Espanha à Guerra no Iraque” Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2006. pp. 53-55. 64Bandeira, Luiz Alberto Moniz. “Formação do Império Americano – da Guerra Contra a Espanha à Guerra no Iraque” ob. cit. p. 57-58. “Doutrina Monroe” (1823) – Doutrina inspirada no isolacionismo de George Washington (“a Europa tinha um conjunto de interesses elementares sem relação com os nossos ou senão muito remotamente”) e no pensamento de Thomas Jefferson (“a América tem um Hemisfério para si mesma”), que dava direito, somente, aos EUA de intervir em qualquer parte do Continente Americano. Era um recado à Santa Aliança para não tentar recolonizar suas colônias na América. O lema era “A América para os americanos”. 65 Bethell, Leslie. “História da América Latina, Volume IV: de 1870 a 1930”. ob. cit. pp.581-601 e 641-649.

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norte-americano, a necessidade de criação de um novo mercado externo para os seus

produtos manufaturados e o crescimento do fascismo nos países sul-americanos.66

Tabela 10-Os Estados Unidos no Caribe [1898-1934]:

Intervenções dos Estados Unidos no Caribe Países Anos Tipo de Intervenção

02/1898 02/1898 Explosão do U.S.S. Maine (encouraçado)

1898 1902 Ocupação da região

Cuba

1903 1934 Emenda Platt

Haiti 1915 1934 Ocupação da região

1907 1907 Intervenções Militares

1911 1911 Intervenções Militares

Honduras

1924 1924 Intervenções Militares

Ilhas Corn 1916 ----- Arrendamento

Ilhas Virgens 1916 ----- Comprada da Dinamarca

04/1914 01/1914 Ocupação do porto e cidade de Veracruz México

03/1916 01/1917 Expedição punitiva de Pershing

Nicarágua 1912 1933 Ocupação da região

1903 ----- Arrendamento da Zona do canal Panamá

1914 ----- Abertura do Canal do Panamá

1898 1898 Ocupação da região e cedido pela Espanha

1898 1901 Ocupação Militar

Porto Rico

1901 1917 Leis Foraker e Jones

1906 1940 Acordo Alfandegário República Dominicana

1916 1924 Ocupação da região

Fonte: Bethell, Leslie. “História da América Latina, Volume IV: de 1870 a 1930”. ob. cit. p. 622

A economia norte-americana começava a crescer, após um longo período de estagnação

econômica (1929-1932), precisando reconquistar novos mercados para substituir aqueles

perdidos durante a grande depressão. A América Latina seria uma região lógica para essa

expansão econômica, pois, praticamente, todos os países sul-americanos eram carentes

de produtos industrializados, apesar dos esforços realizados, principalmente, por

Argentina, Brasil e Chile, durante a depressão mundial, em desenvolver suas indústrias

de substituição de bens e consumo com os parcos capitais gerados por seus principais 66 McCann, Frank D. Jr. ob. cit. pp. 91-94.

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produtos de exportação (carne congelada, café e cobre). O problema principal era a

disparidade existente entre as economias dos países latino-americanos e a dos norte-

americanos. Estes exigiam que todas as negociações fossem realizadas com moeda-

corrente, lastro que a maioria dos países sul-americanos não tinha.67

O outro fator que preocupava os norte-americanos era o crescimento da influência

fascista na América Latina, quando a partir de 1934, a Alemanha, na procura de novos

mercados, recuperada da grande depressão, iniciou um complexo e elaborado sistema

comercial com os países latino-americanos (Marcos Aski). Trocavam-se produtos

manufaturados e máquinas por matérias-primas, criando um mercado de venda única,

bastante prejudicial ao comércio internacional, notadamente, o dos EUA.68 A política

comercial norte-americana era baseada no liberalismo econômico, utilizando o princípio

da nação mais favorecida69, em que as vantagens concedidas eram eqüitativas e

recíprocas entre os Estados participantes da negociação (Programa Hull – “Reciprocal

Trade Agreement Act”). Desta forma, se sentiam prejudicados com o comércio

protecionista alemão e italiano de trocas de mercadorias. Temiam que os alemães

conseguissem ultrapassar o volume de suas vendas para os países sul-americanos. Em

1929, os norte-americanos já eram os principais parceiros comerciais da América Latina,

mercado que foi abandonado para que o país pudesse se proteger do grande flagelo que

foi os anos de recessão econômica mundial. Naquela época, suas importações

correspondiam a 70% do mercado mexicano, 50% na América Central, 80% no Caribe,

40% na Venezuela, 45% na Colômbia e no Peru, 30% no Brasil, Chile e Uruguai e 20% na

67Tota, Antonio Pedro. ob. cit. pp. 22-28. 68Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. pp. 78-80. 69Idem. ob. cit. p. 80. Princípios da Nação mais Favorecida – significa um caráter bilateral nas negociações comerciais, isto é, uma política livre sem qualquer tipo de protecionismo.

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Argentina. Com o fim da depressão, os norte-americanos queriam retomar esses

mercados e tinham como principal rival os alemães.70

Quando os alemães ofereceram aos latinos o plano comercial de compensação (1934), as

luzes vermelhas se acenderam no Departamento de Estado norte-americano que,

rapidamente, procurou criar acordos comerciais com os sul-americanos para evitar a

penetração fascista em sua área de influência. Com exceção da Argentina, os norte-

americanos fariam acordos comerciais importantes com o Chile, tornando-se o principal

investidor no setor de mineração, comprando cerca de 80% de toda a produção de cobre

e nitratos do país, principalmente a partir de 1936.71 No Brasil, o Departamento de Estado

conseguiu assinar um acordo comercial de reciprocidade em fevereiro de 1935, tentando

impedir que o governo brasileiro aceitasse a proposta de compensação oferecida pela

Alemanha. A principal causa era que os alemães estavam substituindo o algodão norte-

americano pelo brasileiro, que se tornava mais accessível com esse sistema Aski

(“Clearing”),72 prejudicando os fazendeiros norte-americanos que vendiam o seu produto

em moeda corrente (ver Tabela 11).73

70Bethell, Leslie. “História da América Latina, Volume IV: de 1870 a 1930” ob. cit. p. 604. 71Bethell, Leslie. “História de América Latina – 11- Economía y Sociedad Desde 1930”. Barcelona. Crítica, 1997. p.41. 72Sistema Clearing – Sistema Comercial de Compensação. 73McCann, Frank D. Jr. ob. cit. pp. 125-145.

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Tabela 11-Importações de algodão pela Alemanha do Brasil e dos Estados Unidos: [1930-1938]

Fonte:Heraugsgegeben Vom Statistichen Reichsamt, Monatliche Nachweige Über der aüswartigen Handel Deutschlands,

Berlim 1930-1938.74

Apesar da pressão norte-americana, o Brasil acabaria assinando um acordo com o

governo alemão, em junho de 1935, utilizando-se do famoso “jeitinho brasileiro”, isto é,

para não desagradar os EUA, o acordo foi acertado informalmente, deixando o problema

para mais tarde, quando o contrato deveria ser ratificado. Quando o momento chegou

(1937), novo protesto norte-americano fez com que o Presidente Vargas prorrogasse o

contrato, por mais três meses, com a Alemanha. Foram tempos difíceis para o governo

brasileiro que precisava encontrar uma solução para manter seus dois principais

mercados exportadores (EUA e Alemanha). O seu principal produto de exportação, o

café, era vendido para os EUA e o seu segundo, o algodão, para a Alemanha. Os

alemães também protestaram e ameaçaram acabar com o seu comércio exterior com o

Brasil, caso o contrato de compensação não fosse assinado formalmente. Mais uma vez o

governo brasileiro postergou uma decisão formal e foi levando o problema até 1938,

74Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. p. 83.

Importações de Algodão Alemãs Brasil EUA Total Ano

Toneladas % Toneladas % Toneladas % 1930 3.888 0,9 296.131 68,4 433.128 69 1931 2.524 0,7 256.594 67,6 379.809 69 1932 237 --- 317.371 74,7 424.724 75 1933 56 --- 341.232 72,1 473.333 72 1934 8.299 2,1 220.172 55,1 399.455 57 1935 82.788 20,8 106.226 26,7 397.439 47 1936 38.116 11,7 116.854 36,0 325.025 48 1937 70.093 20,0 118.850 34,0 349.648 54 1938 103.386 29,3 84.981 24,1 352.780 53

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quando afirmou que voltaria a trabalhar com os marcos compensados alemães (ver

Capítulo 2.4).75

Preocupados com a expansão do fascismo na América Latina, os EUA implementariam,

em 1936, a “Política da Boa Vizinhança” (PBV), um projeto de segurança continental

baseado em um pacto interamericano de apoio mútuo de todas as nações americanas,

contra intervenções externas (européias), sendo, na verdade, uma forma mais branda da

aplicação de hegemonia econômica e política, até então utilizada pelos norte-americanos

no continente.76 Os norte-americanos retirariam as tropas norte-americanas que ainda

estavam em alguns países do continente (América Central e Caribe), abandonariam

qualquer tentativa de intervenção militar e procurariam instalar um processo de consulta e

cooperação que respeitasse a autodeterminação dos povos. Assim, os EUA reconheciam

a soberania dos países da América Latina e promoveriam uma política de não

intervenção.77

Roosevelt propôs uma Conferência “Interamericana de Consolidação da Paz”78, em

Buenos Aires (12/1936), para apresentar suas idéias sobre segurança continental,

utilizando os novos padrões da PBV, implantados pelo Departamento de Estado norte-

americano. Onze Ministros das Relações Exteriores compareceram à conferência,

presidida por Roosevelt, gerando duas propostas importantes, a “Convenção para

75Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. pp. 125-145. 76Pecequilo, Cristina Soreanu. “A Política Externa dos Estados Unidos – Continuidade ou Mudança?”. Rio Grande do Sul. Editora UFRGS, 2003. pp. 102-111. 77Pecequilo, Cristina Soreanu. ob. cit. pp. 102-111. 78Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. Rio de Janeiro. Imprensa Nacional, 1944. pp.14-16. Anexo 1.

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Manutenção, Salvaguarda e Restabelecimento da Paz” e a “Declaração de Princípios

sobre Solidariedade e Cooperação Americana”. 79

A primeira proposta determinava que as nações americanas devessem defender o

Continente de qualquer tendência expansionista de um país externo (europeu) que

ameaçasse a integridade territorial ou a independência política de qualquer país

americano, utilizando um sistema de consulta entre elas para que medidas necessárias

fossem adotadas na solução do problema. A segunda, declarava a existência de apoio

solidário para a defesa incondicional da soberania das nações do Continente americano.

Qualquer ato que atingisse a paz na América deflagrava o início das consultas, conforme

previsto na Conferência, para garantir e restabelecer a paz no país atingido. Também

ficou estabelecido que qualquer controvérsia existente entre nações americanas seria

resolvida pela via conciliatória de arbitramento entre os países do Continente.80 Os EUA

propunham uma união continental para barrar a influência dos países do Eixo na região,

principalmente nos países onde os governos tinham forte tendência fascista. Para muitos

historiadores, esse momento, foi o ápice das relações interamericanas, onde a

cooperação e solidariedade geraram uma forte integração dos países do continente

americano. Para outros, era a aplicação da Doutrina Monroe com outra roupagem que as

relações internacionais exigiam na época. Na verdade, seria simplesmente uma mudança

tática da política externa norte-americana, sem nenhuma alteração nas suas prioridades

estratégicas continentais.81

Antes de participar da Conferência Interamericana, em Buenos Aires (12/1936), Roosevelt

79Castelo Branco, Manoel Thomaz. ob. cit. pp. 33-39. 80Idem. pp. 33-39. 81Pecequilo, Cristina Soreanu. ob. cit. pp. 111-118.

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conferenciou com Vargas82, no Rio de Janeiro, na tentativa de cooptá-lo para participar do

seu novo sistema de cooperação de defesa continental (PBV).83 Ele temia que, sem essa

união entre os países americanos, a região ficasse ameaçada pela ideologia fascista.

Vargas não se opôs a PBV, porém advertiu Roosevelt que necessitava de armamentos

para fortalecer suas Forças Armadas e precisava construir um pólo siderúrgico para iniciar

o desenvolvimento econômico, tão imprescindível à nação, que vivia sempre dependente

do mercado instável do seu principal produto, o café (70% das exportações brasileiras).84

O governo argentino era contra a liderança norte-americana no continente, pois não

confiava nas boas intenções do governo Roosevelt, principalmente, por não depender,

economicamente, do mercado americano na exportação do seu principal produto, a carne

bovina. Assim, faria ferrenha oposição às propostas norte-americanas na Conferência de

Paz em Buenos Aires. O Departamento de Estado norte-americano, junto com Roosevelt,

a partir desse momento, começaria a estreitar suas relações com Brasil, tentando

arrefecer a oposição argentina à sua PBV.85

No início de 1937, essa política de aproximação com o Brasil sofreria um rude golpe,

quando os norte-americanos, instados pelos argentinos, cancelaram o contrato de

82Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. Rio de Janeiro. ob. cit. pp. 13-14. Trechos do Discurso do Presidente Vargas ao Presidente Roosevelt, durante o banquete oferecido pelo Itamaraty, em 27 de novembro de 1936: “A Conferência da Paz, feliz iniciativa de V. Ex., constitui, por si só, uma prova dos superiores desígnios que lhe animam a ação no campo da política internacional; mas o que empresta à convocação da Conferência caráter absolutamente excepcional é o fato de ela significar, acima de tudo, a consagração de uma política realizada e processada com a maior firmeza, pelo esforço próprio e individual do Governo de V. Ex”. “Da Solidariedade do povo e do Governo do Brasil a essa obra eu posso dar, neste momento, sincera e absoluta segurança, ao erguer a minha taça pela felicidade dos cidadãos da maior democracia do mundo, pela ventura de V.Ex. e pelo êxito dos seus nobres esforços em prol do grande ideal da paz, que irmana indefectivelmente, aos estados Unidos do Brasil, os Estados Unidos da América”. 83McCann, Frank D. Jr. ob. cit. pp. 16-18 e 36-37; Bandeira, Moniz. “Presença dos Estados Unidos no Brasil (Dois Séculos de História)”. ob. cit. p. 254. 84McCann, Frank D. Jr. ob. cit. pp. 16-18. 85Bandeira, Moniz. “Presença dos Estados Unidos no Brasil (Dois Séculos de História)”. ob. cit. p. 254.

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arrendamento de seis velhos destróieres fechado com o governo brasileiro.86 Era uma

tentativa dos EUA de cooptar, novamente, o governo argentino para a sua política de

união contra o fascismo entre as nações americanas. Os militares brasileiros ficaram

muitos desconfiados dos norte-americanos e da sua PBV, gerando uma grave crise no

seio das Forças Armadas, que originou no golpe de Estado em 10 de novembro de 1937,

sob o comando de Vargas (Estado Novo), assunto que será mais bem explicado no

Capítulo 3.3.

O Estado Novo não era o tipo de governo que os norte-americanos gostariam que

existisse no continente sul-americano. O Brasil era um país muito importante do ponto de

vista estratégico, caso os EUA entrassem em guerra, principalmente a região costeira do

nordeste brasileiro. Os norte-americanos temiam que a ditadura Vargas pudesse se aliar

com as potências do Eixo e que os outros países vizinhos se alinhassem com ele. Caso o

Brasil se associasse aos países do Eixo, o continente americano ficaria desprotegido, o

Atlântico Sul ficaria vulnerável, possibilitando aos alemães e italianos a utilização dos

portos brasileiros como base de apoio para seus ataques contra a navegação comercial

existente na região. O governo norte-americano ficou ainda mais assustado quando

Vargas proclamou uma nova Constituição (1937) de inspiração fascista, porém, o que

deixou os políticos norte-americanos mais alarmados foi a suspensão, pelo governo

brasileiro, da sua dívida externa.87 Os banqueiros e industriais norte-americanos

protestaram com o Departamento de Estado exigindo alguma política que garantisse a

continuidade do pagamento da dívida brasileira.

86McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 96; Bandeira, Luiz Alberto Moniz. “Brasil, Argentina e Estados Unidos – Conflito e Integração na América do Sul – Da tríplice Aliança ao Mercosul (1870-2003)”. ob. cit. p. 197-198. 87McCann, Frank D. Jr. ob. cit. pp. 49-68.

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Analisando a gravidade da situação, o Subsecretário de Estado, Sumner Welles, pediu

para que o Embaixador norte-americano no Brasil, Jeferson Caffery, tivesse uma

entrevista com Vargas para verificar a existência de alguma influência dos países do Eixo

na nova política do Estado Novo. Na entrevista, Vargas afirmou que o Estado Novo era

genuinamente brasileiro, sem nenhum apoio de alemães, italianos ou japoneses. Disse,

também, que os integralistas não haviam participado do golpe e que foi obrigado a

permanecer no poder, criando uma nova Constituição, para evitar uma guerra civil.

Assegurou que sua política externa com os EUA não sofreria qualquer alteração,

desejando, inclusive, estreitar ainda mais a política do pan-americanismo no Continente.88

Diante dessas respostas, Welles e Roosevelt ficaram mais tranqüilos, inclusive,

garantiram ao governo brasileiro que os EUA não aplicariam nenhuma retaliação, caso o

Brasil prejudicasse alguns interesses comerciais e financeiros norte-americanos para

favorecer o desenvolvimento da sua economia. A habilidade de Roosevelt evitou que as

relações entre os dois países se deteriorassem, o que poderia levar o Brasil para os

braços dos países do Eixo.

Em dezembro de 1937, Vargas começou a destruir as duas principais organizações que

ameaçavam o seu governo, o Partido Nacional Socialista Alemão (NSDAP) e a Ação

Integralista Brasileira (AIB), gerando um grave incidente com o Embaixador alemão, Karl

Ritter, no Brasil. Esse atrito diplomático desencadeou uma crise entre o Brasil e Alemanha

que resultou com a substituição dos respectivos embaixadores (1938).89 A AIB também

seria fechada e tentaria derrubar Vargas em um golpe desastrado, em 10 de maio de

1938, debelado pelo Exército com relativa facilidade (ver Capítulo 2.1).

88McCann, Frank D. Jr. ob. cit. pp. 52-54. 89McCann, Frank D. Jr. ob. cit. pp. 79-90.

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Na Argentina, o Presidente General Justo (1932-1938) procurava manter seu governo

longe da disputa acirrada que existia na sociedade argentina. O país estava polarizado

(políticos, imprensa, militares e opinião pública), de um lado os que eram favoráveis ao

um regime liberal e democrático, apesar do autoritarismo vigente e do outro, os

nacionalistas, simpatizantes do fascismo (alemão, espanhol ou italiano) que gostariam de

ter um governo mais autoritário e controlador, principalmente, na sociedade civil e na

economia. Um grande número desses nacionalistas pertencia às Forças Armadas e,

como veremos no Capítulo 3.3, exercia muita pressão demonstrando, com freqüência,

sua insatisfação, enfraquecendo e dividindo o governo, inclusive com ameaças de golpe

(revoltas de 1931 e 1933).90 Apesar desses entreveros, Justo conseguiu levar o seu

governo até o fim do mandato em 1938.

No Chile, o governo do Presidente Arturo Alessandri (1932-1938) começou a superar

suas mazelas econômicas provenientes da depressão econômica, obtendo uma relativa

tranqüilidade política, que foi quebrada com uma tentativa de golpe militar em 1933.91 Seu

governo foi beneficiado com a recuperação da economia mundial que gerou um grande

crescimento das exportações chilenas, principalmente de cobre e nitratos (analisado

acima). Porém sua política por demais conservadora, gerou muito descontentamento na

classe operária e nos partidos de esquerda. Ambos começaram a criticar seu programa

político que beneficiava cada vez mais uma oligarquia de industriais e grandes

latifundiários. Os partidos de esquerda, principalmente os comunistas e socialistas,

lançam a Frente Popular para combater os partidos de direita, vencendo as eleições em

1938.92

90Fausto, Boris; Devoto, Fernando J. ob. cit. pp. 235-251. 91Bethell, Leslie. “Historia de América Latina – 15- El Cono Sur desde 1930”. ob. cit. pp. 224-228. 92Bethell, Leslie. “Historia de América Latina – 15- El Cono Sur desde 1930”. ob. cit. pp. 224-228.

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Com a crise internacional aumentando na Europa e na Ásia, os países americanos

resolveram reafirmar a política de solidariedade pan-americana estipulada em Buenos

Aires (12/1936). Na Conferência de Lima (1938), como será explicado no Capítulo 3.1, o

Itamaraty, junto com o Departamento de Estado, trabalhou para se obter apoio

incondicional para a defesa do Continente, utilizando-se de reuniões “extraordinárias” e

“urgentes”, propostas por qualquer integrante para procurar soluções capazes de impedir

algum tipo de agressão externa ao Continente. Como veremos, os países saíram

divididos desta reunião, pois a Argentina não aceitaria qualquer tipo de imposição norte-

americana, que segundo eles, além de colocar todos os membros sob a esfera de

dominação norte-americana, também colocaria o Brasil como o principal parceiro norte-

americano na região. Assim, ficou decidido que seriam feitas apenas “consultas”, sem

nenhum caráter impositivo, para resolver qualquer agressão externa a um ou mais países

do Continente.93

93McCann, Frank D. Jr. ob. cit. pp. 101-103; Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. pp. 124-127; Castelo Branco, Manoel Thomaz.. ob. cit. p. 35.

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SEGUNDO CAPÍTULO:

INTERFERÊNCIA DO FASCISMO (ALEMANHA/ITÁLIA) NA ESTABILIDADE

POLÍTICA, MILITAR E ECONÔMICA DOS PAÍSES DO SUL DA AMÉRICA

LATINA:

2.1-Na Política Regional:

Os fascistas e seus simpatizantes iniciariam o ano de 1938 com grandes preocupações

na região sul do Continente sul-americano. Na Argentina, o anglófilo Roberto Ortiz94

venceria as eleições, sendo empossado (20/02/1938)95 com os mesmos métodos

fraudulentos dos seus antecessores.96 Para dar validade ao seu governo, Ortiz procurou

criar mecanismos para a implantação da normalidade democrática no país, com o retorno,

sem fraudes, do sufrágio universal nas próximas eleições. Infelizmente, a reação dos

partidos de direita, contrários a essa abertura política, abriria uma crise sem precedentes

no cenário político argentino. Na época, muitos políticos viam no Fascismo italiano e,

principalmente, no Nazismo um exemplo modelar de administração, achando que os

regimes democráticos eram fracos, corruptos e que o sufrágio universal era totalmente

absurdo em um mundo onde o poder político e militar dos regimes totalitários se

apresentava como a única solução possível para o desenvolvimento da nação. Um

94Roberto Ortiz, da União Cívica Radical (UCR), venceria as eleições presidenciais em 1937. Nasceu em Buenos Aires (24/09/1886), era formado em Direito (1909) e sofria de diabetes. Com o falecimento de sua esposa, em abril de 1940, sua doença se agravou, tornando-se praticamente cego. Renunciaria definitivamente ao cargo em 03 de julho de 1941, sendo substituído pelo seu vice Ramón Castillo. Faleceria, aos 52 anos, de uma infecção cardíaca em 15 de julho de 1942. 95Luiz Guimarães (Buenos Aires) ao MRE (Ministério das Relações Exteriores), 19 fevereiro 1938, AHI (Arquivo Histórico do Itamaraty). “O novo Presidente da República da Argentina, o Sr. Roberto Ortiz, será empossado no próximo domingo (20/02/1938) às 16:00 hs”. 96Donghi, Tulio Halperin. “La República Imposible (1930-1945)”. Buenos Aires, Ariel, 2004. pp. 236-239.

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senador chegou a declarar que a Argentina era “el único país em la tierra que hoy se

ocupa del voto”.97

Desta forma, Ortiz procurou o apoio das Forças Armadas para consolidar seu poder,

escolhendo para seu Ministro da Guerra, o General Carlos O. Márquez, um ferrenho

inimigo dos oficiais germanófilos e fiel defensor dos anseios da nova gestão

governamental, colocando o exército como mantenedor desta política. O ministro teria

outras preocupações, principalmente, com os oficiais nacionalistas simpatizantes do

fascismo, como reuniões explícitas de simpatia98 e o recebimento de comissões na

aquisição de materiais militares alemães por oficiais que mantinham estreito vínculo com

o Embaixador alemão von Thermann.99

Ortiz também iria diminuir as atividades sociais e políticas de várias associações

estrangeiras, principalmente, alemãs e italianas, impedindo-as de divulgarem suas

doutrinas fascistas aos descendentes desses países e à juventude argentina. Até a sua

posse, os governos anteriores pouco se preocuparam com o tipo de propaganda

disseminada por esses grupos, porém, com o aumento de intensidade dessas ações, o

governo argentino foi obrigado a criar mecanismos para impedir que essa situação

continuasse.100 Ortiz criaria o Decreto Nº 31.321 (15/05/1939) oficializando as atividades

97Donghi, Tulio Halperin. ob. cit. pp. 236-239. 98Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. ob. cit. p. 4. Os Generais Rodolfo Martínez Pita, Carlos von der Becke, Armando Verdaguer e Francisco Reynolds foram fotografados, em uma reunião nazista, fazendo saudações com o braço erguido ao lado de uma bandeira Kyffhäuser Bund em 2 de outubro de 1937, sem qualquer preocupação com a opinião pública argentina. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-027.htm 99Idem. p.4. “O Embaixador alemão, após o fim da guerra, disse que oficiais argentinos utilizaram-se dessas negociações para conseguirem comissões das firmas de armamentos alemães. Esses valores eram pagos pela Embaixada alemã em Buenos Aires”. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-027.htm 100Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina – La Actitud del Gobierno Argentino ante la Actividad de los Grupos Nacionalsocialistas.p. 1. Dois Projetos de Lei seriam apresentados (05/1938) nesse período. Um do deputado socialista Enrique Dickmann e outro dos deputados radicais Raúl Damonte Taborda, Eduardo Araujo, Manuel Pinto e Leônidas Anastasi”. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-028.htm

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das associações estrangeiras no país,101 principalmente após o incidente causado pela

denúncia de Heindrich Jürges102 a uma comissão de inquérito103, sobre um plano de

utilizar a região da Patagônia para atividades nazistas.104 Jürges acusava o presidente do

partido nacional-socialista ( Auslandsabteilung der Reichsleitung der NSDAP –

“Departamento de Ultramar de la Direccíon Nacional del Partido Nazi”), Alfred Muller105,

como o mentor das atividades separatistas no sul da Argentina.106 Com esse decreto, o

NSDAP e o DAF (Deutsche Arbeits-Front - “Frente de Trabajo Alemán”), as duas maiores

organizações nazistas na Argentina, seriam obrigados a trocar suas razões sociais.107 Na

verdade, foi com a visita do couraçado alemão “Schlesien” à Patagônia (Comodoro

Rivadavia), em janeiro de 1938, que as atividades nazistas na região tiveram um grande

101Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. ob. cit. pp. 1-2. Anexo 2. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-028.htm 102Salinas, Juan; De Nápoli Carlos. ob. cit. p. 92. Segundo informações da época, Heindrich ou Enrique Jürgues era alemão, anarquista, gráfico, exímio falsificador, estava desempregado e vivendo com o auxílio de grupos “anti-nazistas”. Tinha antecedentes criminais na Alemanha, sendo exilado pelo regime nazista. Posteriormente, descobriu-se que essas informações foram fornecidas pela Gestapo na Alemanha, a pedido do Embaixador alemão em Buenos Aires (von Thermann). 103Salinas, Juan; De Nápoli Carlos. ob. cit. pp. 91-93; Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. ob. cit.. p. 2. Em junho de 1939, a Comisión de Asuntos Constitucionales de la Cámara de Diputados del Congresso apesar de várias evidências indicando a participação da embaixada alemã nessa e em outras atividades contra a soberania argentina, nada fez e as organizações alemães continuariam com sua política de propaganda a favor do nazismo. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-028.htm 104De Nápoli, Carlos. ob. cit. pp 133-140. Segundo De Napoli o incidente conhecido como o “Complô Patagônico” foi uma fraude criada pelo Serviço de Inteligência Britânico para diminuir a influência alemã na região sul da Argentina e impedir, que um grande acordo comercial, a compra de material ferroviário alemão se realizasse, pois a opinião pública argentina ficaria muito abalada com a tentativa de anexação da Patagônia pelos alemães”; Costa, Sérgio Corrêa. ob. cit. p. 240. Segundo Sérgio Castro esse acordo comercial, através do sistema aski (marcos compensados) seria: 64 locomotivas, 900 vagões de cargas e outros equipamentos ferroviários, trocados por 100 mil toneladas de trigo e 8.000 toneladas de lã. 105Salinas, Juan; De Nápoli Carlos. ob. cit. pp. 91-93; Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. ob. ct. pp. 4-5. Alfred Muller era o fundador do NSDAP na Argentina. Seria obrigado a sair do país, apesar de ser inocentado das acusações feitas na comissão parlamentar, pois o depoimento do acusador seria totalmente descaracterizado pela defesa, acusando-o de criminoso, mentiroso e de receber benefícios de grupos anti-nazistas. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-028.htm 106MRE (Rio de Janeiro) a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 12/04/1939, AHI. “Informo que recebi uma carta do Encarregado de Negócios alemão informando tratar-se de uma verdadeira falsificação, os documentos apreendidos na Argentina. Declarou que as pessoas mencionadas no relatório, jamais deram entrada em nenhuma repartição alemã. Adiantou que o assunto nunca foi tratado por qualquer autoridade ou organização do partido nazista, não existindo, para o Governo alemão, nenhuma questão sobre a Patagônia”. 107Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. ob. cit. p. 1. “O NSDAP passaria a se chamar “Federación de Círculos Alemanes de Beneficencia y Cultura” e o DAF “Unión Alemana de Grêmios”. Continuariam com sua política de disseminar idéias totalitárias e anti-semitas.” www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-027.htm

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incremento.108 O navio permaneceu durante uma semana e um intercâmbio social se

realizou na região. Marinheiros e moradores criaram um grande vínculo que seria utilizado

pela Etappendienst,109 no futuro, para ajudar navios e submarinos fascistas na região.

Transmissões de rádio110 foram enviadas para a Alemanha e para os outros países latino-

americanos falando da confraternização decorrente dessa visita com os habitantes locais.

Mesmo após sua partida, as atividades continuaram com a divulgação de propaganda

nazista deixada pela embarcação.111 Como veremos adiante, a Etappendienst foi de

fundamental ajuda na fuga dos marinheiros do couraçado de bolso “Graff Spee”. As

atividades de reabastecimento de submarinos alemães, praticadas pelo Etappendienst,

seriam descobertas quando um avião da Força Aérea brasileira (FAB), patrulhando a

região sul do Brasil, avistou um navio argentino abastecendo, em pleno mar, um

submarino alemão que imediatamente submergiu112. O Governo brasileiro protestou

violentamente contra esse ato, alegando que, quando a Argentina comprou os navios dos

países do Eixo que estavam parados em seus portos, em função da guerra, manteve as

tripulações dos mesmos. Muitos desses marinheiros agiam em conjunto com o

108De Nápoli, Carlos. ob. cit. pp. 79-80. Os marinheiros desfilavam cantando o hino “Deutschland uber Alles” (Alemanha sobre Todos) pelas ruas e para retribuir a acolhida das autoridades e população local, várias pessoas foram convidadas a conhecer o navio e passear em suas lanchas. 109Idem. ob. cit. pp. 85-90. “Etappendienst” era uma organização que procurava auxiliar as belonaves alemãs, nos países neutros, fornecendo combustível e equipamentos indispensáveis para o melhor funcionamento de seus navios e submarinos. Também, coletava informações sobre os navios inimigos que chegavam na sua esfera de atuação. Podiam agir sorrateiramente e danificar ou destruir qualquer carga existente em navios inimigos. 110MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 20/11/1940, AHI. “Estão sendo capitadas, no Brasil, transmissões de uma estação de rádio usando o prefixo da “Transocean” que parece estar localizada neste país, transmitindo notícias alarmantes sobre ações alemães na Argentina, Bolívia, Paraguai e Uruguai. Favor averiguar com a máxima urgência esse assunto”; Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. ob. cit. p. 7. Durante a guerra, algumas rádios argentinas (Prieto de Buenos Aires, Splendid, Cuyo, Callao, Cultura, Stendor, del Pueblo e Municipal) transmitiam notícias da “Transocean” e de propaganda fascista produzida na própria Argentina. A Embaixada alemã em Buenos Aires, fornecia o equipamento necessário para que esta rede funcionasse sem problemas. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-028.htm 111 De Nápoli, Carlos. ob. cit. p. 80. 112MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 26/08/1942, AHI. “O Encarregado de Negócios da Argentina procurou-me esta manhã, a propósito do assunto dos dois vapores retidos neste porto, em conseqüência de uma medida provisória de ordem geral. Chamei a atenção para o caráter amistoso de nossa atitude decorrente da confiança inspirada, pelos propósitos manifestados por esse governo, de solidariedade e de suas disposições de nos prestar, nas presentes circunstâncias, o máximo de auxílio possível”.

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“Etappendienst”, com a benevolência de certas autoridades argentinas. Em 1943, o

repórter norte-americano, Walter Winchell, declararia que o Governo argentino era

cúmplice dos alemães no afundamento de navios aliados, especificamente, no caso do

navio brasileiro “Parnaíba”, causando protestos em Buenos Aires. Também o

Departamento de Estado informaria que 50 tripulantes alemães do encouraçado “Graf

Spee”, que estavam reclusos na Argentina, haviam fugido e que dois deles seriam

recapturados, novamente, em um submarino alemão.113

Com o aumento da intensidade dessas ações contra a soberania argentina e da

inoperância de muitos políticos em investigarem com rigor essas atividades, seria criada a

“Comisión de Investigación de las Actividades Antiargentinas” (CIAA)114, composta em sua

maioria por parlamentares radicais e socialistas aliadófilos, em junho de 1941. Reafirmou-

se que as principais associações alemãs (NSDAP e DAF) continuavam a descumprir a lei

(Decreto Nº 31.321) divulgando propaganda fascista e, inclusive, apresentava um estudo

mostrando a participação da embaixada alemã na disseminação de propaganda nazista

em jornais, agências de notícias e na divulgação de artigos anti-semitas no país. Como

resultado das investigações, muitas escolas italianas e alemães seriam fechadas, e no

final de 1941 (dezembro), o Governo argentino, através do seu Ministro de Relações

Exteriores Ruiz Guiñazú, recomendaria a substituição do Embaixador von Thermann.

Von Thermann protestaria ao próprio Presidente Castillo115, alegando que a CIAA era

manipulada pelo governo norte-americano. Sem conseguir dissuadir o governo argentino,

113Fernando Lobo (Washington) ao MRE, 11/11/1943, AHI. 114Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. ob. cit. p. 2. A “CIAA” era composta, principalmente, pelos deputados Raúl Damonte Taborda (Presidente), Juan A. Solari (substituiria Taborda na presidência), Adolfo Lanús, Fernando Prat, Silvano Santander, José Aguirre Câmara e Guillermo O´Reilly. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-028.htm 115Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. ob. cit. p. 3. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-028.htm

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von Thermann partiria para a Alemanha, deixando o encarregado de negócios da

embaixada, Erich Otto Meynem, como seu sucessor. Um aliado importante para a CIAA,

no combate ao fascismo, seria um grupo de alemães anti-nazistas (“La Outra

Alemania”)116 formado por indivíduos que fugiram do regime nazista da Alemanha, sendo

um grande número de judeus e católicos.

As atividades nazistas na Argentina iriam crescer, principalmente durante a guerra,

quando seria montada uma grande rede de espionagem financiada pela Embaixada

alemã e alguns empresários germânicos, e se espalhariam pelos países vizinhos. Essa

rede chamada “Bolívar”117 era administrada pelo empresário Walter Koennecke118 (Banco

Germânico) cujo sogro era o magnata da construção civil na Argentina, Ludwig Freude.119

A principal atividade da rede era instalar radio-transmissores120 para informar a

movimentação dos principais portos dos países do sul do Continente. Também, recebiam

notícias oriundas dos EUA e as repassavam para a Europa. É importante salientar que

devido a problemas de recepção, era quase impossível transmitir diretamente dos EUA

para a Alemanha. Os agentes, que atuavam na América do Norte, precisavam contatar

116Historia General de las Relaciones Exteriores Argentina. ob. cit. p. 4. “La Outra Alemania” (Das Andere Deutschland) - Entidade contrária ao nacional-socialismo alemão, criada em 1937, por dissidentes alemães. Um documento seria enviado para a “CIAA” com as seguintes palavras: “...existe uma Alemania distinta de la nazista; existen también aquí, em la Argentina, muchos alemanes que nada tienen que ver com los nazis, que siempre han combatido encarnizadamente procedimientos hitleristas, desleales com la Argentina; que siempre han respetado, respetan y respetarán las leyes y los intereses de la Argentina. Apelamos al pueblo argentino para que no trate de iguales a nacionalsocialistas y alemanes, para que no se nos haga responsables de crimines cometidos por los nazis, a los que condenamos com el mismo fevor que los argentinos y cuyo castigo deseamos seguiremos nuestra lucha, motivada tanto por respeto a la Argentina, como por el profundo amor que sentimos por la outra Alemania. www.cema.edu.ar/ceieg/arg-rree/9/9-028.htm 117Salinas, Juan; De Nápoli Carlos. ob. cit. p.158. Para demonstrar a importância da rede, Himmler concedeu a Becker, a “Cruz de Ferro” por seus serviços de radio-transmissão, em 11 de junho de 1943. 118Goñi, Uki. ob. cit. p. 131. Koennecke seria preso em 08/08/1944, devido a pressões norte-americanas, porém seria libertado em 1945, sob as ordens de Perón. 119Idem. p.14. Ludwig Freude era um milionário alemão, tendo como uma das suas principais atividades o setor imobiliário. Estava ligado a inteligência alemã (Abwher) e era amigo íntimo de Perón. 120Salinas, Juan; De Nápoli Carlos. ob. cit. pp. 139-141. A parte técnica da operação de instalação dos rádio-transmissores era efetuada pela organização chamada “Orga-T” de Hans Franckzok (Utzinger) um especialista em comunicações que tinha a missão de enviar mensagens cifradas diretamente para Himmler. Após a guerra (1947) seria deportado pelo Governo argentino (Perón) para a Alemanha. Na prisão, contou com detalhes toda a relação existente entre a rede “Bolívar” e Perón.

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seus colegas sul-americanos, para que estes enviassem os seus relatórios sobre as

atividades aliadas no Canadá e EUA, para o serviço de inteligência alemão, em Berlim.

Os principais agentes de Koennecke eram Hans Harnisch121 e o Capitão SS Johannes

Sigfrid Becker (“Pepe”)122. Essa rede seria estourada pela “Coordinación Federal”,123 em

agosto de 1944, após pressão do governo norte-americano que enviou um relatório ao

Presidente Farrell sobre as atividades nazistas no país, inclusive uma lista com nomes de

diplomatas alemães, funcionários do governo e militares argentinos.

A Argentina iria enviar, em abril de 1942, um representante para conversar com as

principais autoridades alemãs sobre o futuro do país, caso permanecesse neutro e

contrário à política pan-americana da maioria dos países americanos. Esse representante

seria Juan Carlos Goyeneche124, um enviado especial dos oficiais nacionalistas do GOU,

para conseguir apoio alemão para as próximas eleições presidenciais na Argentina, ou

em última hipótese, ajudando na venda de material bélico para um golpe militar125.

Durante pouco mais de um ano, Goyeneche conferenciou com os principais líderes

121Salinas, Juan; De Nápoli Carlos. ob. cit. pp.139 e 179. O espião Harnisch tinha como fachada o posto de gerente da Compañia Siderúrgica Böcker. Perón o deportaria para a Alemanha em 1947 (Decreto n˚ 18.480), onde, na prisão, confessou todas as ligações existentes entre os espiões alemães (SD) e militares argentinos (GOU) durante a guerra. Ver também: Costa, Sérgio Corrêa da. ob. cit. pp. 386-390. 122Costa, Sérgio Corrêa da. ob. cit. p. 389; Goñi, Uki. ob. cit. pp.130-138; De Nápoli, Carlos. ob. cit. pp.177-184. Preso no final da guerra pela polícia argentina, seria absolvido de todas as acusações sobre espionagem, sendo, posteriormente, protegido por Perón (1946), desaparecendo da vida política argentina. 123De Nápoli, Carlos. ob. cit. p. 177. Polícia Federal argentina que desbaratou os locais de radio-transmissão da rede “Bolívar”. Na verdade, foi um trabalho muito fácil, pois os federais já conheciam todo o esquema da organização. Foram apreendidos 55 radio-transmissores e três máquinas de criptografia “Enigma” (máquina decodificadora do código secreto alemão) da “Orga-T”. 124Goñi, Uki. ob. cit. pp.33-45. Goyeneche era um nacionalista católico, cujo avô fora Presidente do Uruguai e cujo pai havia sido prefeito de Buenos Aires. Tinha estreita ligação com os agentes da inteligência alemã na Argentina. Sua missão na Alemanha era a seguinte: 1)-Saber se após a guerra a Alemanha continuaria comprando produtos argentinos; 2)-Se os alemães reconheceriam o direito argentino pelas ilhas Malvinas; e 3)-Se Hitler concordaria que a Espanha fosse a ponte entre a Argentina e a Europa, após o término do conflito. As respostas foram: 1)-Se a Argentina mantivesse sua posição de neutralidade, seria beneficiada por esta atitude no final da guerra. A Alemanha compraria tudo o que a Argentina pudesse produzir; 2)-A Inglaterra era o inimigo comum, que tinha se apropriado de pontos estratégicos em todas as partes do mundo, como Gibraltar na Espanha. As Malvinas estavam mais próximas da Argentina do que da Inglaterra. Desta forma, iriam apoiar o direito argentino sobre as ilhas; 3)-A relação da Alemanha com a Espanha era cristalina. O importante era a Argentina manter-se neutra e contrária aos interesses norte-americanos na região. 125Goñi, Uki. ob. cit pp. 33-45.

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totalitários europeus, Franco, Salazar, Mussolini e inclusive Hitler, também entrevistando-

se com Ribbentrop e Himmler. Esteve com o Papa Pio XII, onde conversações sobre a

possibilidade de a Argentina mediar a paz mundial foram realizadas126. Isto é, a Argentina

seria a mediadora da paz mundial, depois da vitória alemã na Rússia e, em contrapartida,

o Governo argentino abrandaria a sua política de imigração para que europeus católicos

pudessem buscar uma vida melhor no país sul-americano com o fim da guerra127.

Posteriormente, esses contatos no Vaticano iriam possibilitar a fuga de muitos criminosos

fascistas europeus, através de uma operação clandestina que, além de possibilitar a fuga

de muitos criminosos de guerra, retirou da Europa uma grande quantidade de dinheiro e

ouro roubados pelos nazistas durante o conflito mundial128.

No Brasil, a polícia de Vargas perseguia, prendia e fechava as associações simpatizantes

do fascismo, desde o final do ano de 1937, logo após a instauração do Estado Novo

(10/11/1937). No Rio Grande do Sul, onde a colônia alemã era bastante numerosa, as

atividades nazistas foram combatidas, com vigor, pelas autoridades militares da região

que fecharam o partido NSDAP alemão, obrigaram as escolas a utilizarem a língua oficial,

o português e impediram qualquer tipo de propaganda nacional-socialista em jornais e

revistas. O chefe do NSDAP regional, Ernest Dorsch, seria preso e teria sido pedida a sua

deportação pelas autoridades gaúchas. Em virtude disso, o Embaixador alemão, Karl

Ritter, apresentou um protesto ao Ministério das Relações Exteriores do Brasil

(Itamaraty)129, indignado com o fechamento do partido nacional-socialista (NSDAP), não

126Goñi, Uki. ob. cit. p. 38. 127Idem p.38. 128MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 14/03/1942, AHI. “Estamos informados de que estão sendo feitas, pela Alemanha, Itália e Japão, importantes transferências de fundos da Suíça para a Argentina, principalmente, para custear a campanha da Quinta Coluna na América do Sul”. 129McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 73 e Ministério das Relações Exteriores, Arquivo das Relações Exteriores. O Ministro das Relações Exteriores da época era o Sr. Mário Pimentel Brandão, que exerceu o cargo de novembro de 1936 a março de 1938. Após deixar o Ministério, ocupou a embaixada brasileira em Washington. Após breve permanência nos Estados Unidos retornou à Bélgica (1939) como Embaixador,

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conseguindo demover a posição das autoridades brasileiras. Em uma atitude impensada,

foi falar pessoalmente com Vargas sobre o assunto. Com muita arrogância, disse a

Vargas que as prisões eram ilegais por ser o NSDAP um partido alemão e não brasileiro,

exigindo autorização para o partido funcionar no Brasil. Vargas pediu para que suas

reclamações fossem feitas pelos trâmites legais, isto é, por escrito ao Itamaraty.130 A

única concessão concedida foi que o processo contra Dorsch fosse arquivado,

constituindo-se para o Embaixador alemão, uma vitória de Pirro.131 Começava assim, uma

grave crise diplomática entre o Brasil e Alemanha.

Em março de 1938, o governo alemão publicou um documento criticando duramente o

fechamento de organizações alemãs e a prisão de muitos de seus súditos,

principalmente, nos estados do sul do Brasil.132 Essa intromissão nos assuntos internos

da nação gerou muitos protestos na imprensa brasileira e, inclusive, nas da Argentina,

Chile e Uruguai, acirrando ainda mais os ânimos entre as autoridades brasileiras e o

Embaixador alemão. O Brasil iria lançar, como a Argentina, o Decreto Lei Nº 383

(18/04/1938) que regulamentava as atividades políticas exercidas pelos estrangeiros

deixando aquele país no ano seguinte, devido à invasão das tropas alemãs. Seria designado para representar o Brasil na Comissão Consultiva para a Defesa Política do Continente, em Montevidéu, ali permaneceu durante dois anos. 130MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 18/02/1938, AHI. “O Ministro Aranha informou que o Embaixador alemão, Ritter, foi interpelá-lo sobre o fechamento das organizações nazistas em alguns Estados, principalmente, no sul do país. Informou, caso esta medida fosse mantida, as relações entre os dois países seriam seriamente comprometidas. Aranha salientou que sabia dos riscos que o Brasil estava tomando, afirmando que não abriria mão das resoluções tomadas. Inclusive, salientou que a Alemanha agiria da mesma maneira caso se tratasse de organizações brasileiras no território alemão”. 131Vitória de Pirro - É uma expressão utilizada para expressar uma vitória obtida a alto preço, potencialmente acarretadora de prejuízos irreparáveis. Esta expressão tem origem em Pirro, general grego que, tendo vencido a Batalha de Ásculo contra os Romanos com um número considerável de baixas, ao receber os parabéns pela vitória, teria dito, preocupado: "Mais uma vitória como esta, e estou perdido”. 132MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 13/04/1938, AHI. “O Itamaraty informa que o Cônsul alemão, Karl Steiner, em Florianópolis, tornara-se indesejável, para as autoridades locais, devido as suas atitudes políticas inconvenientes. Antes de ter cassado seu “exequatur”, gostaríamos que fosse retirado ou que, pelo menos, fosse chamado à ordem”.

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residentes no Brasil.133 Imediatamente, os governos dos estados do sul (Paraná, Santa

Catarina e Rio Grande do Sul) começaram a aplicar este decreto, prendendo muitos

simpatizantes nazistas na região e recolhendo farto material de propaganda nacional-

socialista. Escolas alemãs e italianas sofreriam intervenções nos seus programas de

ensino, fazendo com que as principais manifestações cívicas devessem ser as do Estado

brasileiro. O Embaixador Ritter, novamente, protestou com muita veemência sobre esse

decreto, aumentando ainda mais o hiato existente entre as autoridades brasileiras e

alemãs,134 inclusive com o pedido do governo brasileiro de mudança dos respectivos

embaixadores. Quanto ao governo italiano, este acatou as novas normas vigentes com

bastante naturalidade e seu embaixador definiu a situação da seguinte maneira, “a

América do Sul é latina e vai continuar a ser latina.135 Era a atitude mais sensata para

manter estável a relação entre italianos e brasileiros que sempre tinha sido muito

amistosa, diferentemente da dos alemães.

Ritter continuou irredutível, protestando contra o fechamento do NSDAP e a prisão de

vários súditos alemães, quando foi surpreendido com a tentativa de golpe impetrada pelos

133Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. pp.177-180. Anexo 3.; Guerra Duval (Roma) ao MRE, 19/05/1938, AHI. “O Ministro das Relações Exteriores italiano convocou o Embaixador brasileiro para falar sobre as novas disposições legais que fixariam a admissão das atividades de estrangeiros no Brasil. Estava preocupado com as atividades dos italianos, que poderiam sofrer sérias perturbações sob a nova legislação brasileira. Falou sobre a amizade ítalo-brasileira, afirmando que o Brasil era o verdadeiro representante da latinidade na América. No final, argumentou que as associações italianas sempre colaboraram e respeitaram a soberania brasileira. Gostaria que o Ministro Oswaldo Aranha lhe enviasse informações mais detalhadas e tranqüilizadores sobre o assunto”. 134MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 21/05/1938, AHI. “A atitude do Embaixador alemão torna-se cada dia mais irritante, podendo conduzir a incidentes muito desagradáveis entre os dois Governos. Tendo recebido convite para a festa em homenagem ao Chanceler chileno, no Itamaraty, declarou que não poderia participar a nenhum ato oficial enquanto houvesse algum cidadão alemão preso. Foi informado que o nosso Embaixador em Berlim, também, seria recomendado a proceder da mesma maneira. Ele retrucou que se continuar em vigor, o nosso decreto sobre associações estrangeiras, dificilmente o representante diplomático brasileiro na Alemanha, seria convidado para qualquer tipo de cerimônia oficial. Diante deste fato, o Ministério recomenda aos integrantes da missão brasileira em Berlim, de abster-se de qualquer cerimônia desta natureza, realizada pelo Governo alemão.” 135McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 79.

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integralistas.136 Após esse acontecimento e com a prisão de alemães acusados de

participarem da tentativa do golpe, suas críticas ficaram cada vez mais intoleráveis para o

governo brasileiro, principalmente, quando, em Berlim, a Wilhemstrasse (Ministério das

Relações Exteriores alemão), através do Ministro Ernst Weizsäcker, informou ao

Embaixador brasileiro, José Joaquim de Lima e Silva Moniz de Aragão, que o seu

governo estava muito apreensivo pelo o que vinha acontecendo no Brasil contra cidadãos

alemães. Pediu, em nome do bom relacionamento que sempre existiu entre os dois

países, que o governo brasileiro reconsiderasse e retirasse as medidas anti-germânicas,

inclusive com a libertação daqueles que não tinham culpa comprovada no golpe

integralista. Aragão informou que iria levar as suas reivindicações ao Itamaraty, porém,

pediu para que a imprensa alemã deixasse de atacar o governo de Vargas, alegando que

a imprensa brasileira, em momento algum, fez críticas violentas a Hitler. Weizsäcker, em

contrapartida, iria tentar solucionar este problema. Quando informações vindas do Rio de

Janeiro disseram não existir nenhum indício contra a participação de firmas e cidadãos

alemães no golpe137, houve uma melhora no relacionamento com Berlim, inclusive a

imprensa germânica voltou a fazer rasgados elogios ao Governo Vargas.

Porém, em junho de 1938, a polícia encontrou documentos muito comprometedores

contra cidadãos alemães, ligados intimamente à von Cossel (adido cultural da embaixada

alemã), ocasionando várias prisões de membros do partido nazista no sul do Brasil.138

Dessa forma, o Itamaraty pediu que a Wilhemstrasse substituísse seu embaixador (Ritter)

136McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 83. Segundo o autor, não existe nenhuma informação, na correspondência da Embaixada alemã, no Rio de Janeiro, comprovando o envolvimento de Ritter no golpe. 137Moniz de Aragão (Berlim) ao MRE, 25/05/1938, AHI. “A correspondência diplomática comentou a publicação oficial do Governo brasileiro, afirmando que empresas e cidadãos alemães não participaram do movimento integralista, informando que esta declaração iria ajudar na volta das relações cordiais, que sempre nortearam os dois países. Entretanto, informava que os dois países deveriam examinar, com detalhes, as medidas tomadas pelo Brasil no terreno cultural e da educação. Insinuou a necessidade de chegar-se a um acordo sobre as eventuais indenizações sobre os prejuízos causados aos presos alemães”. 138McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 86.

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e retirasse o seu adido cultural (von Cossel) do Brasil. Oswaldo Aranha informou que

Ritter era considerada “persona non grata” (21/09/1938)139, determinando, em novembro,

a substituição do embaixador brasileiro (Moniz de Aragão) em Berlim, na expectativa que

o governo alemão tomasse semelhante providência para o seu representante diplomático.

Essa crise diplomática foi causada pela arrogância e prepotência do Embaixador Ritter

em lidar com as autoridades brasileiras, criando uma profunda revolta, inclusive, entre os

germanófilos brasileiros. Seria nomeado para o seu cargo o Embaixador Kurt Pruefer140

(01/06/1939), acabando com a crise, pelo menos de embaixadores, entre o Brasil e a

Alemanha.

A outra preocupação de Vargas, a Ação Integralista Brasileira (AIB), também seria posta

na ilegalidade, após o fechamento de suas sedes e a prisão dos seus principais membros.

A AIB apoiara Vargas na instauração do “Estado Novo” e, quando percebeu que não seria

chamada para integrar o novo governo, começou a exigir uma maior participação na

política brasileira. Podemos dizer que a AIB era um partido organizado, com uma doutrina

bastante definida, composta, principalmente, de elementos da classe média urbana e

tendo muitos simpatizantes nas Forças Armadas, com maior número de adeptos na

139MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 20/09/1938, AHI. “... o Embaixador Ritter não é “persona grata” ao Brasil”; Idem, 21/09/1938. “Após nossa conversa pelo telefone rogo-lhe que: 1)- V.Ex. deve procurar a autoridade competente e manifestar que, no desejo de aumentar as nossas relações econômicas e estreitar as relações políticas com este país, o Governo brasileiro pede que o Embaixador Ritter não reassuma o seu posto no Rio de Janeiro; 2)- V. Ex. deverá informar, imediatamente, o que foi determinado pela autoridade responsável pelo assunto; 3)- Realizada a sua informação, instruções definitivas serão enviadas para V.Ex. agir conforme os desígnios do Governo brasileiro”. 140Themistocles da Graça Aranha (Berlim) ao MRE, 15/05/1939, AHI. “O Embaixador Prüefer foi ex-Ministro na Albânia e, nos últimos anos, Diretor Geral no Ministério das Relações Exteriores. Goza de excelente reputação em todos os meios e parece ser pessoa de tato”; Idem, 08/06/1939. “O Governo brasileiro solicitou ao Governo alemão a concessão de agrément para o novo Embaixador, Sr. Freitas Valle, a ser enviado pelo Brasil. Esse agrément foi concedido em 10/06/1939. Por parte da Alemanha será enviado, para o Rio de Janeiro, o Sr. Kurt Prüefer como novo Embaixador, para quem o Governo brasileiro concedeu, no mesmo dia, o agrément”.

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Marinha.141 Seu lema era “Deus, Pátria e Família”,142 sendo ferrenhos inimigos do

comunismo e do capitalismo (Liberalismo econômico). Apesar de conseguirem a simpatia

de alguns alemães, os integralistas eram vistos como uma aberração pelos nazistas, pois

suas idéias de assimilação das “colônias estrangeiras” eram completamente contrárias à

doutrina do nacional-socialismo, além da divergência racial e anti-clerical do nazismo.

Como vimos no capítulo anterior, eram subvencionados pelo governo italiano, porém, com

a instauração do Estado Novo, essa política italiana iria mudar totalmente. Roma,

verificando que a AIB fora excluída de participar do novo governo, concluiu que a mesma

havia perdido a força política necessária para conquistar o poder. O Governo italiano

percebeu que o novo regime brasileiro era favorável à política externa italiana e o

integralismo não tinha força suficiente para derrubar a popularidade de Vargas que, como

foi demonstrado na imprensa brasileira, havia crescido assustadoramente, apesar da

alienação geral das massas. Dessa forma, resolveu terminar com o jogo duplo que fazia,

apoiando Vargas e a AIB e decidiu ficar com o Estado Novo, retirando a subvenção

mensal, paga aos integralistas, no início de 1938.

Os integralistas resolveram radicalizar e decidiram que a única solução seria derrubar o

Governo Vargas. Acuados, tentaram uma cartada arriscada e inútil para conquistar o

poder. Na noite de 10 de maio de 1938, vários grupos de integralistas saíram para

eliminar ou prender os principais membros do governo, inclusive, o próprio Presidente da

141MacCann, Frank Jr. ob. cit. p 75. Um exemplo disso foi o incidente que aconteceu no porto de Recife, quando um grupo de integralistas celebrou com a saudação do partido a chegada dos três submarinos comprados à Itália. Praticamente todos os tripulantes responderam à saudação. Vargas revoltado declarou que não iria promover as promoções programadas dos oficiais submarinistas. Dias depois, no Rio de Janeiro, em pleno carnaval, diversos navios ancorados na base naval puseram seus motores em funcionamento. Inquirido pelas autoridades policiais, o comandante da frota respondeu que não devia satisfação a ninguém. Vargas voltou atrás e aprovou as promoções. 142O lema “Deus, Pátria e Família” foram as últimas palavras ditas pelo Presidente Afonso Pena, antes de morrer, vítima do surto de gripe espanhola que então assolava o país. Deus – aquele que dirige o destino dos povos; Pátria - o nosso lar e Família – o início e o fim de tudo. www.integralismo.org.br

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República. O curioso dessas ações foi que, praticamente, todos os grupos falharam em

suas missões, com a exceção do Ministério da Marinha, onde os integralistas,

posteriormente, foram retirados à bala. Na tentativa de eliminar Vargas, o ataque,

comandado pelo ex-capitão Severo Fournier143, foi de uma incapacidade tal que os

poucos guardas existentes no local, juntos com Vargas e sua família, resistiram a forças

muito mais numerosas e melhores equipadas, enquanto esperavam os reforços

prometidos pelo chefe da Polícia, Felinto Muller. Outro ponto importante foi que as tropas

fiéis ao governo demoraram tanto em atacar os sublevados que procuravam invadir o

Palácio Guanabara, na tentativa de eliminar Vargas. Parece que muitos elementos que

participavam do governo esperaram os resultados dos acontecimentos para agir, contra

ou pró, de acordo com as suas conveniências (ver Capítulo 3). Após a derrota dos

integralistas, Vargas receberia o apoio da opinião pública e conseguiria consolidar o

Estado Novo.

Em março de 1938, seis meses antes das eleições presidenciais no Chile (25/10/1938), o

principal fundador do Movimento Nacional Socialista (MNS), González von Marées, em

uma atitude surpreendente, se distanciou do fascismo internacional144 atacando a política

do Terceiro Reich, os alemães que viviam no Chile e os chilenos de origem germânica.

143Guerra Duval (Roma) ao MRE, 27/06/1938, AHI. “O Ministro dos Negócios Estrangeiros italiano recebeu um telegrama da sua Embaixada, no Rio de Janeiro, dizendo que o Capitão Fornier tinha sido levado a mesma, por dois oficiais brasileiros fardados, sendo um deles irmão do Ministro das Relações Exteriores (Oswaldo Aranha), para pedir asilo político. Assegurou que o Governo italiano suspenderá, temporariamente, o pedido em consideração as relações amistosas entre os dois países. Tomaria uma solução rápida após uma conversa com o seu Embaixador”; Idem, 05/07/1938; MRE ao Embaixador brasileiro em Roma, 08/07/1938, AHI. “Atendendo aos desejos desse governo e de membros proeminentes de sua colônia no Brasil, o Tenente Fornier foi retirado da Embaixada italiana, por dois coronéis do Exército e recolhido em uma fortaleza. O fato não despertou nenhuma comoção, e em nada afetou o melindre da representação italiana, resolvendo-se assim, a contento o problema da tentativa de asilo político do tenente sublevado. Queira V. Ex. expressar os agradecimentos do Governo brasileiro pelo o espírito de colaboração amistosa manifestado pelo Governo italiano na solução deste caso”. 144Nazis y Movimiento Nazi em Chile. ob. cit. pp.2-3 Marées atacou com veemência seu antigo aliado, o Partido Nacional-Socialista alemão no Chile, afirmando que sua presença era uma “penetración de pensamientos hitleristas em las colonias alemanas em Sudamérica”, criticando também sua política racista e anti-semita. www.geocities.com/CapitolHill/7109/nazis.html

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Afirmou ainda que, o partido nazista, no Chile, era o principal responsável pela

penetração dos pensamentos hitleristas nas colônias alemães na América do Sul. Sua

intenção era captar a simpatia do eleitorado e os líderes dos partidos de centro e de

esquerda. Porém, sabendo que suas chances de vencer as eleições eram escassas, o

MNS, com apoio de alguns setores do Exército, tentou realizar um golpe em 1938, poucos

dias antes das eleições presidenciais. Cerca de cinqüenta jovens nazistas foram mortos

nesta tentativa pelos Carabineiros145. O governo agiu com rapidez e violência eliminando

o golpe e prendendo os líderes. Devido a esta ação enérgica, o MNS não conseguiu

recuperar-se, mesmo mudando seu nome para Vanguarda Popular Socialista. González

Von Marées continuou sendo seu líder carismático, defendendo o seu partido como

“antifascista, antiimperialista e a favor da luta de classes.” As relações entre Chile e

Alemanha iriam se deteriorar a partir de 1940, quando terminaria as relações comerciais

entre as duas nações devido à guerra.

É importante assinalar que o comércio chileno sofreria muito nos primeiros anos da

Segunda Guerra Mundial, em virtude do perigo que causavam os ataques dos submarinos

alemães e italianos146, enquanto os EUA não entrassem efetivamente na guerra. No

mesmo ano, na cidade de Valdivia, foram criadas leis de “Segurança Nacional” que

impediam e regulamentavam as atividades de estrangeiros no país. Muitos alemães

seriam presos acusados de atividades de sedição (perturbação da ordem pública), fato

que ocasionou represálias na Alemanha, onde a Gestapo prendeu vários cidadãos

chilenos. O NSDAP chileno iria para a clandestinidade em 1942, depois que uma

145Maurício Nabuco (Santiago) ao MRE, 10/09/1938, AHI. “O Comandante da guarnição de Santiago declarou que o Exército nada teve com o sacrifício dos estudantes nazistas, sacrifício que, infelizmente, estaria reabilitando o partido (MSN) perante a opinião pública”. 146MRE a Embaixada brasileira em Santiago, 26/03/1942, AHI. “O Governo brasileiro informa que existem bases de abastecimentos de submarinos inimigos nos portos de Mauá e Saint-Laurent, na Guiana Francesa. Há suspeitas de existiram outras bases na Martinica. O Chile deve tomar precauções no movimento dos seus navios”.

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comissão parlamentar (05/1942) foi constituída para verificar as atividades das

organizações estrangeiras no país. Nesta mesma época, foi descoberta uma rede de

espionagem alemã na cidade de Valparaíso que resultou com a prisão de várias pessoas.

Por causa desses acontecimentos, os Estados Unidos fizeram uma grande pressão que

acabou fazendo com que o governo chileno aceitasse, com alguma relutância, devido à

grande simpatia pela Alemanha que tinham alguns círculos políticos chilenos, as

recomendações da Conferência do Rio de Janeiro (15-28/01/42)147. Em 1943, após o

Chile romper relações diplomáticas com a Alemanha e as potências dos países do Eixo,

as organizações nazistas (MNS e NSDAP) perderiam toda a sua sustentação, força e

popularidade.

A 8ª Conferência Interamericana, em Lima (09-24/12/1938), seria o início da consolidação

da política de solidariedade e cooperação americana (pan-americanismo), mesmo com a

relutância da Argentina em participar dessa união, conforme estipulada pelos Estados

Unidos e Brasil. Brasileiros e norte-americanos estavam muito preocupados com o

crescimento das atividades fascistas na região e concordavam que chegara a hora de se

tomar medidas continentais para frear essa invasão de ideologias, contrárias ao “status

147 MRE a Embaixada brasileira em Santiago, 11/09/1942, AHI. “O Governo brasileiro, através do seu Embaixador pede para que o Chile execute a resolução nº 40 da III Conferência de Chanceleres, que recomenda a supressão de telecomunicações entre os países americanos e os Estados do Eixo. Os EUA também, estão muito interessados que este país tome as medidas necessárias para impedir essas transmissões”; Idem, 14/09/1942. “O Governo brasileiro volta a pedir, ao Governo chileno que impeça as comunicações radiotelegráficas com os países do Eixo. O Ministro Aranha informa que, em cooperação com os norte-americanos, pode controlar, no Rio de Janeiro, as rádios-transmissões executadas no Chile. Afirma que entre os dias 9 e 12 de setembro, vinte e três comunicações foram realizadas pelo Adido Naval alemão em Santiago. Essas comunicações são muito graves para a nossa segurança, principalmente, possibilitando o afundamento de navios nas nossas costas. É preciso eliminar essa situação em benefício da segurança Continental”; Samuel de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 14/09/1942, AHI. “O Ministro das Relações Exteriores chileno informou que a resolução nº 40 está em execução desde agosto último, e que o seu Governo estabeleceu enérgica censura para o seu rigoroso cumprimento. Acrescentou que está estudando, com empenho, a extensão da sua aplicação às Missões Diplomáticas dos países do Eixo, o que a Embaixada norte-americana pediu, por nota, e de acordo com os desejos do Brasil, para ajudar na segurança continental. Referiu-se, porém, a uma recomendação da Comissão Interamericana de Neutralidade que favorece as representações diplomáticas e também que aquela aplicação afastaria um motivo a alegar, no caso do Governo chileno, ter que justificar o rompimento das relações”.

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quo” da região (idéias raciais e anti-clericais). Isso não significava que a Argentina era

contrária a uma política de defesa do continente, porém relutava em permanecer sob a

influência dos EUA e, principalmente, temia que, devido a sua localização estratégica, o

Brasil passasse a ser o grande beneficiário da política de solidariedade continental

proposta pelos norte-americanos. Por fim, como veremos mais adiante, ficou estabelecido

que os países americanos se ajudassem mutuamente para a manutenção da paz,

segurança e soberania dos seus membros, utilizando-se de consultas prévias, se

necessário fosse, para resolverem o problema em conjunto. Iniciava-se uma política para

obstruir as atividades fascistas em todo o continente americano.

Em 1939, com a invasão da Polônia pelos alemães (01/09/1939), Inglaterra e França

declarariam guerra à Alemanha (03/09/1939), iniciando um conflito que duraria quase seis

anos e ceifariam em torno de 65 milhões de pessoas (cerca de 37 milhões de civis e 25

milhões de militares). A Polônia seria dominada rapidamente pela “guerra relâmpago”

(“blitzkrieg”) alemã e o Ocidente seria o próximo alvo das hostes nazistas. Preocupados

com todos esses acontecimentos, os países americanos resolveram marcar uma

conferência para analisarem quais medidas deveriam tomar para não serem envolvidos

no conflito. Assim, foi criada a Primeira Reunião de Consulta dos Ministros das Relações

Exteriores das Repúblicas Americanas, no Panamá (23-03/09-10/1939), que ratificou os

acordos anteriores148 e foi elaborada a “Declaração Geral de Neutralidade das Repúblicas

Americanas”, com exceção do Canadá, que consolidava o pensamento continental de

apoio mútuo (ver Capítulo 3.1). Por fim, instituiu-se uma zona neutra no mar em torno do

148Os acordos ratificados foram os assinados nas Conferências de Buenos Aires (1936) e Lima (1938).

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continente, de 300 milhas149, livres de qualquer ato hostil perpetrado por algum

beligerante.

Um segundo encontro dos Ministros Exteriores das Américas, em Havana (21-30/07/40),

seria realizado, logo após a queda da França, Bélgica, Holanda e Luxemburgo150 e tinha

como objetivo salvaguardar as colônias européias do continente, impedindo que os

alemães instalassem bases militares nas Guianas francesa e holandesa, nas ilhas de

Curaçau ou Martinica. Dessa forma, ficou estabelecido que só a solidariedade continental

poderia salvaguardar a liberdade das Repúblicas americanas (ver Capítulo 3.2).

Uma Terceira Conferência dos Chanceleres (15-28/01/1942) seria realizada no Rio de

Janeiro, logo após a entrada dos EUA na guerra, em função do ataque japonês à base

norte-americana de Pearl Harbour (07/12/1941)151, no Havaí. Quatro dias depois

(11/12/1941), Hitler e Mussolini declarariam guerra aos EUA152, ratificando o conflito que

149O limite internacional para águas territoriais era de três milhas e, seria ampliado para 300 milhas, como “Zona de Segurança” do Continente americano. Um Almirante norte-americano fez a seguinte declaração, após a resolução da ampliação dessa zona de neutralidade. "É uma bela idéia, mas o que faremos se alguém meter o nariz nessa zona”. Na verdade os países americanos, inclusive os EUA, não estavam preparados para defender essa área marítima tão vasta. 150C. de Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 17/05/1940, AHI. “...A batalha continua sem definição. O estado de espírito reinante em Berlim é tal, que a solene reprovação pelos vinte e um Estados americanos à violação da Noruega, dos Países Baixos e da Bélgica, não impressionou a opinião pública”. 151C. Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 7/12/1941, AHI. “O Presidente Roosevelt, em comunicado da Secretaria da Casa Branca, anunciou: “Os japoneses atacaram Pearl Harbour, base naval norte-americana nas ilhas do Havaí, por forças aéreas e navais”. Atacaram igualmente as bases militares de Manila nas Filipinas. O Presidente ordenou imediatamente que as forças armadas executassem todas as ordens previamente preparadas. Adianta a declaração da Casa Branca que esses ataques se realizaram quando ambas as nações estavam em paz, e uma hora depois do Embaixador japonês e o Enviado Especial Saburo Kurusu terem entregue ao Secretário de Estado, o Sr. Cordell Hull, a resposta japonesa ao memorandum de 26/11/1941”. 152MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 11/12/1941, AHI. “A Embaixada da Alemanha comunicou-nos que seu país declarou guerra aos EUA. Dissemos-lhe que estamos solidários com os norte-americanos”; Idem a Embaixada brasileira em Washington, 11/12/1941. “O Embaixador da Alemanha comunicou-me, hoje, que o seu governo declarou guerra aos EUA, responsabilizando disso, o Presidente Roosevelt. Disse que o Governo brasileiro não deveria se deixar impressionar pelos americanos do norte, cujo único objetivo é servir os seus próprios interesses. Acrescentou ser inteiramente falso, tudo quanto se tem dito sobre ambições alemãs na América do Sul e, esperava que o Governo brasileiro não visse razão para mudar sua atitude de completa neutralidade com relação à Alemanha. Respondi ao Embaixador alemão o nosso pesar pela

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vinha ocorrendo no Atlântico Norte, onde unidades navais norte-americanas,

descumprindo todas as leis de neutralidade vigentes, patrulhavam fora da zona

estabelecida de neutralidade e davam proteção a comboios carregados de material bélico

para a Inglaterra. Atacavam submarinos alemães e, quando encontravam navios

mercantes germânicos, enviavam suas coordenadas para belonaves aliadas que, diante

dessas informações, as destruíam ou interceptavam-nas. Ficou decidido que os países

latino-americanos, com exceção da Argentina e do Chile, romperiam as relações

diplomáticas com os países do Eixo. O Brasil romperia as relações diplomáticas e

comerciais com a Alemanha, Itália e o Japão, em 28 de fevereiro de 1942.

Argentina e Chile, apesar do desejo de se manterem solidários à política de apoio mútuo

dos países latino-americanos, buscavam uma saída mais favorável às suas necessidades

do momento. A Argentina necessitava do mercado europeu, tendo pouca necessidade de

permanecer sob a influência norte-americana, resolveu, então, adotar uma política de

neutralidade que não implicasse numa atitude de apoio irrestrito aos desejos belicistas

norte-americanos, nem que resultasse em um atrito político e econômico com a Alemanha

e Itália. Com a morte do Presidente Ortiz, o seu sucessor, Castillo, quase romperia com

os norte-americanos na tentativa de permanecer no poder, pois estava cada vez mais

pressionado pela ala nacionalista das Forças Armadas argentina que era totalmente

favorável aos países do Eixo.

Com o passar do tempo, a pressão norte-americana ficaria cada vez mais intensa,

inclusive, com sanções econômicas e financeiras contra o governo argentino, a fim de

impedir quebras no pan-americanismo, exterminando o último reduto sob influência da

declaração de guerra, na qual daríamos inteira solidariedade aos EUA. Aguardamos comunicação da declaração de guerra da Itália, a esse país, para que o Senhor Presidente delibere a respeito de nossa atitude”.

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Europa no Continente americano. Porém, a pressão exercida pelos EUA só conseguiria

aglutinar as forças nacionalistas na tentativa de derrubar o governo. Coagido,

externamente pelos EUA e internamente pelos nacionalistas, Castillo seria derrubado pela

ala direitista das Forças Armadas argentinas (GOU), em 4 de junho de 1943153. O General

Arturo Rawson assumiria o poder154, procurando criar uma política favorável aos norte-

americanos, porém só permaneceria quatro dias no poder (4-7/06/1943), pois o seu

gabinete não havia agradado aos militares do GOU155.

O GOU, um grupo de militares nacionalistas, germanófilos e favoráveis à neutralidade

argentina, empossaria o General Pedro Ramirez como o novo Presidente da República

(07/06/1943). Ramirez, que foi Ministro da Guerra no governo Castillo, por ter sido

demitido por este, apoiaria o golpe militar nacionalista. Sua administração também seria

relativamente breve. Resolveu romper relações diplomáticas com os países do Eixo

(26/01/1944), alegando fortes pressões dos EUA e do Brasil, após o fracasso de

conseguir armamentos na Alemanha. O anti-americanismo explodiu no país e a Argentina

mobilizou suas tropas para a fronteira com o Brasil, alegando que poderia ser atacado por

Vargas sob a pressão do Departamento de Estado norte-americano. O General Ramirez

seria forçado a renunciar, em 24 de fevereiro de 1944, quando o GOU empossou outro

153MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 04/06/1943, AHI. “Temos informações que o Presidente Castillo desembarcou no porto uruguaio de Colônia”. 154J. de Paula Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 04/04/1943, AHI. “Confirmo que o General Rawson é o cabeça do movimento. O Doutor Ramon Castillo embarcou e se refugiou a bordo de uma canhoneira. A família do Sr. Enrique Ruiz Guiñazú solicitou asilo à Embaixada chilena. Espera-se uma proclamação que explicará o móvel do movimento, o qual parece favorável aos aliados”. 155Idem, 07/06/1943. “O General Rawson, ao renunciar, dirigiu a seguinte proclamação às Forças Armadas: “Havendo cumprido o propósito de depor o Governo diante da impossibilidade de chegar a um acordo sobre a constituição do Gabinete, ponho nas mãos do General Ramirez a renúncia indeclinável ao cargo de Presidente do Governo Provisório, para o qual devia prestar juramento”. O General Ramirez, ao assumir o Governo também, dirigiu uma proclamação às mesmas Forças Armadas e ao povo argentino, na qual disse: “Nesta data assumo o Governo Provisório e o comando das Forças Armadas da Nação”. Evidentemente, há confusão no seio dos militares, dizendo-se mesmo que a crise foi provocada por desinteligências sobre a orientação da política internacional. Parece que alguns militares são de tendência a avançar para a ruptura e outros para manter rigorosa neutralidade. Dentre os primeiros estariam Rawson que, em reunião de ontem, teria solicitado ao Sr. José Maria Rosa e ao General Martinez que renunciassem às partes oferecidas”.

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militar, o general Farrell, na verdade, um testa de ferro do Coronel Juan Domingos Perón.

Farrell continuaria com a política favorável aos alemães e, só em 27 de março de 1945,

declararia guerra à Alemanha, quando este país já estava agonizando.

No caso chileno, a necessidade de manter seu comércio externo, longe dos problemas

causados pela guerra, gerou uma necessidade de manter a neutralidade sem um maior

envolvimento com os EUA. O país não estava preparado para enfrentar uma retaliação,

alemã ou japonesa, contra seus navios mercantes e sabia que os EUA não tinham

condições de ajudar no patrulhamento das suas costas, pelo menos no início de 1942.

Submarinos japoneses poderiam facilmente atacar seus portos, enquanto a esquadra

norte-americana não se recuperasse do golpe de Pearl Harbour. Com o apoio norte-

americano, estes anseios foram sendo dissipados e, apesar de certa relutância de alguns

políticos, o Chile iria participar da política pan-americana proposta pelos EUA. O Chile

romperia as relações com os países do Eixo, em 20 de janeiro de 1943, e declararia

guerra em 12 de abril de 1945.

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2.2-Na Política Internacional:

A situação da política européia, após a anexação da Áustria pela Alemanha

(13/03/1938)156, deixaria as Chancelarias americanas muito apreensivas com a

possibilidade de um conflito mundial.157 Elas procuraram impedir qualquer tipo de

vantagem que permitisse ao governo alemão conseguir mais votos no plebiscito

austríaco, principalmente com a ida de cidadãos austríacos e alemães, residentes na

região, para votarem na Europa.158 O Anshluss (anexação)159 foi referendado (10/04/1938)

com quase 100% de concordância, tanto por alemães como por austríacos. O mundo

acataria a união sem qualquer protesto contundente. A Áustria voltaria a tornar-se uma

nação soberana só após o fim da Segunda Guerra Mundial.

156Moniz de Araguão (Berlim) ao MRE, 14/03/1938, AHI. “Foi publicado oficialmente, em Berlim, a anexação da Áustria pelo Reich alemão, necessitando de um plebiscito para a confirmação da mesma. Enquanto se espera, existe uma grande preocupação nos meios políticos europeus”. 157Fernando Lobo (Washington) ao MRE, 18/02/1938, AHI. “O “New York Times” publicou sensacional correspondência de John White, procedente de Buenos Aires, relativa a uma proposta, que será ou foi apresentada ao Departamento de Estado norte-americano, por várias Chancelarias latino-americanas, no sentido de uma aliança militar e naval interamericana, de proteção mútua às nações americanas contra uma possível agressão européia ou asiática. Os círculos diplomáticos, de Buenos Aires, consideram este projeto o mais importante da história das relações interamericanas e o único meio das nações americanas de se defenderem contra invasões”; Fernando Lobo (Washington) ao MRE, 22/02/1938, AHI. “O Secretário de Estado Sumner Welles, em conversa comigo, informou não ter recebido qualquer proposta para uma aliança militar pan-americana. Pensa tratar-se de uma manobra, de certa corrente sul-americana, a fim de preparar, o terreno favorável às propostas a serem apresentadas na 8ª Conferência Interamericana (Lima – 12/1938). O “New York Times” publicou, ontem, telegrama do correspondente no Brasil, com declarações que teriam sido feitas pelo Itamaraty que “o Brasil não teria participado de tal movimento, nem tenciona participar, futuramente”. Afirma que mesmo se recusando a participar da aliança militar americana, o Brasil acredita nos benefícios da Liga política e econômica dos países americanos”. 158MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 05/04/1938, AHI. “O Ministro quer saber, com urgência, se o governo argentino está concedendo facilidades de saída a navios alemães para operações de plebiscito referente à anexação da Áustria”; Luiz Guimarães Filho (Buenos Aires) ao MRE, 06/04/1938, AHI. “O Subsecretário do Ministério das Relações Exteriores argentino informou que não concedeu nenhuma facilidade a navios alemães ancorados em portos argentinos”. 159Moniz de Araguão (Berlim) ao MRE, 11/04/1938, AHI. “Sem incidentes realizou-se o plebiscito que aprovou a anexação da Áustria à Alemanha. A maioria da população (99,5%) votou a favor, no conjunto dos dois países”.

Formatado: Fonte: (Padrão)Arial, 12 pt, Negrito

Excluído: ¶

Excluído: ítica Mundial

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No final de 1938 (23/12/1938)160, a Argentina reconheceria o novo governo nacionalista do

General Franco, tomando uma posição isolada do acordo realizado no Rio de Janeiro161,

pelo seu Chanceler José Maria Cantillo, onde argentinos, brasileiros e norte-americanos

deveriam tomar uma decisão em conjunto. Após, a decisão da Inglaterra e da França em

aceitar o novo Governo espanhol (27/02/1939), EUA e Brasil acabariam concordando e

reconhecendo o governo fascista de Madri, no mês seguinte, considerando que o assunto

era exclusivamente da seara dos países europeus. O Chile seria um dos únicos países

latino-americanos, junto com o México162, que romperia relações diplomáticas com a

Espanha. A crise foi causada pela proibição do governo espanhol em deixar que centenas

de exilados, que se encontravam na Embaixada chilena em Madri, pudessem sair do país.

O governo chileno manteve-se firme e não permitiu que essas pessoas fossem entregues

ao governo fascista espanhol para serem presas ou assassinadas. Inclusive, o governo

alemão tentaria, sem êxito, conseguir a liberação dessas pessoas junto ao General

Franco163. O Brasil teria um papel importante neste conflito entre chilenos e espanhóis,

pois foi graças a sua intervenção diplomática junto ao governo de Franco, que um acordo

pôde ser fechado entre os dois países164. Por fim, após meses de conflito diplomático,

160Alencastro Guimarães (Buenos Aires) ao MRE, 23/02/1939, AHI. “O governo argentino resolveu entrar, imediatamente, em contato com o General Franco, para formalizar o reconhecimento de seu governo”; MRE a Embaixada brasileira em Washington, 28/02/1939, AHI. “O Brasil irá amanhã (29/02) reconhecer o governo nacionalista do General Franco. Peço que o Departamento de Estado norte-americano seja informado”; Carlos Martins P. Souza (Washington) ao MRE, 31/03/1939, AHI. “O Departamento de Estado informa, confidencialmente, haver decidido o reconhecimento do Governo do General franco amanhã”. 161MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 08/02/1939, AHI. “Foi estabelecido um acordo de princípios entre Argentina, Brasil e EUA, no sentido de se conectarem antes de tomar qualquer deliberação sobre o reconhecimento do Governo nacionalista espanhol”. 162O México não reconheceria o governo nacionalista de Franco e só voltaria a ter relações diplomáticas normais com a Espanha, em 1977. 163Themistocles da Graça Aranha (Berlim) ao MRE, 22/08/1939, AHI. “O Ministério dos Negócios Estrangeiros alemão informou que foram infrutíferas as diligências efetuadas pela Alemanha, na tentativa de resolver o problema dos asilados políticos, na Embaixada chilena, em Madri, junto ao governo nacionalista de Franco”. 164MRE a Embaixada brasileira em Santiago, 09/07/1939, AHI. “Brasil e Chile deram a conhecer ao Governo espanhol, seu ponto de vista favorável ao princípio de asilo defendido pelo Governo chileno. Até agora nenhum resultado foi obtido. Segundo Argeu Guimarães (Encarregado de Negócios do Brasil em Madri), teve conhecimento que o próprio Franco está pessoalmente empenhado na entrega dos asilados e disposto ao rompimento das relações com o Chile”; Idem a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 10/08/1939. “O

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Espanha e Chile chegaram a um acordo, reatando seu relacionamento diplomático165,

com os exilados conseguindo partir sem qualquer tipo de represália166.

O ano de 1939 chegou e acabou com toda a esperança de paz na Europa. Após a

anexação da Áustria, Hitler agora se volta para a região dos Sudetos (Tchecoslováquia),

onde existia uma grande comunidade de alemães e descendentes que queriam

autonomia para, posteriormente, se incorporarem ao Reich alemão. Hitler se mostra

irredutível e ameaça entrar em guerra se não conseguir a região, alegando que precisava

defender os interesses e a vida dos cidadãos alemães contra as represálias do Governo

tcheco. Era uma pantomima bem planejada para agredir o governo da Tchecoslováquia,

que estava, com razão, tentando defender seu território e uma das principais regiões

industriais do país. Vale lembrar que, a principal linha de defesa da região estava calcada Governo brasileiro recebeu um pedido do Governo chileno, no sentido de obter da Espanha, a liberação dos cidadãos espanhóis que se encontram asilados na Embaixada chilena em Madri. Em junho último, atendendo a esse pedido chileno, a Embaixada do Brasil em Madri recebeu instruções para cooperar, no sentido de obter essa liberação, porém, esses esforços não deram resultados. A Embaixada do Brasil, em Madri, tem agora instruções para procurar com as outras missões americanas, uma fórmula de manifestação coletiva para obter os resultados pretendidos pelo Governo chileno”; Idem a Embaixada brasileira em Santiago, 17/07/1940. A Embaixada brasileira em Madri recebeu do Governo espanhol a seguinte nota: “As gestões iniciadas por V.Ex. perante o Chefe de Estado espanhol, referente ao assunto dos refugiados na embaixada chilena, acham-se detidas ante um incidente inesperado, apesar dos bons desejos deste Governo. O motivo são os graves incidentes em atos públicos celebrados em Santiago (Chile), nos quais se insultou a Espanha, assim como seu Chefe de Estado. Este governo viu-se na dura necessidade de romper as relações diplomáticas com o Chile para defender a honra e a dignidade nacionais. O tato e a discrição habituais de V.Ex., das quais deu prova uma vez mais no desagradável assunto dos asilados, não deram o fruto esperado devido à atitude incompreensível e absurda do Governo chileno, o qual durante o período que encarregou o Brasil de servir de intermediário não se abstinha de continuar sua campanha hostil contra a Espanha, sem nada fazer para impedir os atos públicos e as manifestações da imprensa e do rádio, contra o regime espanhol e suas altas autoridades. Em consideração a esse governo e a alta personalidade de V.Ex., o Governo espanhol não tomará medida alguma contra os asilados na Embaixada chilena”. 165MRE a Embaixada brasileira no Chile, 12/10/1940, AHI. “O Governo espanhol informa que todos os asilados já foram libertados e que ficou assentado o restabelecimento das relações diplomáticas. O Brasil assume, perante o Governo espanhol, o compromisso de que o Embaixador da Espanha não será recebido com hostilidades no Chile. Recomendo, pois, a V. Ex. frisar particularmente este aspecto da questão perante as autoridades chilenas e exorta-las a não descurar medidas tendentes a tornar a chegada do Embaixador espanhol a mais agradável possível. V. Ex. deverá tornar isso, também, preocupação sua nos primeiros tempos”. 166MRE a Embaixada brasileira no Chile, 21/09/1940, AHI. “A Embaixada brasileira em Madri comunicou, hoje, que a viagem dos asilados decorreu sem incidentes até Lisboa. Foi providenciada a entrada deles na fronteira portuguesa, onde foram recebidos pelo Encarregado de Negócios do Chile, em Portugal. Para satisfazer as exigências do Governo português, a Embaixada brasileira garantirá a partida dos asilados na primeira oportunidade”.

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nas fronteiras e, com a perda deste território, a Tchecoslováquia estaria aberta a qualquer

ataque alemão. Hitler daria um ultimato (26/09/1938) para anexar a região, colocando as

Chancelarias européias em posição de xeque, no que resultou na Conferência de

Munique (29-30/09/1938). Nessa conferência, os principais líderes mundiais resolveram

que os tchecoslovacos deveriam ceder os Sudetos à Alemanha. Em março de 1939, seis

meses depois, a Alemanha invadiria a desprotegida Tchecoslováquia, transformando-a

nos Protetorados da Boêmia e Morávia. A próxima vítima seria a Polônia, que seria

invadida no dia 1 de setembro de 1939, dando início à Segunda Guerra Mundial

(03/09/1939).

Com a eclosão da guerra, como vimos anteriormente, na Conferência do Panamá

(10/1939) ficou estipulado que uma área, no mar de 300 milhas, ao redor do Continente,

não poderia sofrer qualquer ameaça vinda dos beligerantes, medida necessária na

manutenção da neutralidade dos países americanos. Esta área deveria ser patrulhada

pelas Marinhas dos respectivos países com o apoio norte-americano. Essa zona neutra

seria desrespeitada, pela primeira vez, em setembro de (30/09/1939), quando o

encouraçado de bolso alemão “Admiral Graf Spee” afundou o cargueiro inglês “Clement”,

a 70 milhas da costa de Pernambuco. A segunda vez seria em outubro (03/10/1939), no

último dia da Conferência do Panamá, quando o cruzador inglês “Ájax” pôs a pique o

mercante alemão “Olinda”167, 40 milhas ao largo do Rio Grande do Sul. Outro incidente

aconteceria na costa chilena (16/12/1939), quando o mercante alemão “Dusseldorff” foi

167C. de Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 06/09/1939, AHI. “Foi anunciado, em Berlim, que um cruzador inglês pôs a pique o navio mercante alemão “Olinda”, em águas territoriais do Rio Grande do Sul, desrespeitando a neutralidade brasileira”.

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atacado por dois cruzadores ingleses, dentro da zona de segurança do Continente, e foi

obrigado a pedir abrigo ao governo chileno, devido aos danos sofridos pelo confronto.168

O principal incidente aconteceu em dezembro (13/12/1939), quando uma batalha naval

entre o encouraçado ‘Admiral Graf Spee’ e três cruzadores britânicos, “Achilles”, “Ájax” e

“Exeter”169, foi travada no litoral nordeste do Uruguai170. Após curta e feroz batalha, o

navio alemão avariado e, principalmente sem combustível, entrou pelo rio da Prata e

aportou em Montevidéu. Seu comandante, Hans Langsdorff, pediu autorização para

permanecer no porto durante duas semanas para consertar os danos causados pela

batalha, porém, as autoridades uruguaias só concederiam 72 horas, aplicando a lei

internacional de neutralidade171. Sem opção, Langsdorff resolveu afundar o seu navio no

rio da Prata, internando sua tripulação em Buenos Aires172 onde, dias depois, se suicidaria

(20/12/1939).

168Djalma Ribeiro Lessa (Santiago) ao MRE, 19/12/1939, AHI. “O navio mercante alemão “Dusseldorff” foi autorizado a entrar no porto de Antofagasta, em caráter de presa de guerra, em conformidade com as resoluções da Conferência do Panamá”; Idem, MRE a Embaixada brasileira no Chile, 16/12/1939. 169O “HMNZS Achilles (nº 70)” era um cruzador leve e, durante a guerra estava comissionado na Marinha da Nova Zelândia. Após a batalha do Atlântico, voltou para o seu país e foi empregado no Pacífico, comboiando navios mercantes e de tropas, na luta contra o Japão. Seria retirado do serviço em setembro de 1946 e, vendido ao Governo indiano em 1948, que o manteve ativo até 1978. O “HMS Ajax (n٥ 22)”, também era um cruzador leve, que seria empregado durante a guerra, praticamente, no Mediterrâneo, fazendo escolta de comboios e tropas, sofrendo diversas avarias durante esse período. Participaria do Dia D (06/06//1944) e em fevereiro de 1948 seria aposentado definitivamente. Entretanto, o “HMS Exeter (nº 68)”, um cruzador pesado, seria afundado pelos japoneses no Mar de Java em março de 1942. 170Cyro de Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 20/12/1939, AHI. “O Embaixador uruguaio afirmou que o embate foi realizado em águas territoriais uruguaias, dentro do Rio da Prata, retorquindo o Secretário de Estado norte-americano e o Governo inglês, que afirmam ter acontecido fora das três milhas da costa. Outra preocupação do Uruguai é sobre os protestos do Governo alemão, contra a pouca permanência do “von Spee” no porto, que pode levar a um rompimento de relações”. 171MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 17/12/1939, AHI. “O MRE informa que o Comandante Langsdorff recusa-se a sair ou ser internado. Sugere que a Argentina auxilie o Uruguai política, material e militarmente se o “von Spee” desrespeitar a soberania do Uruguai e com isso a do Continente. O Brasil apóia uma declaração conjunta das Repúblicas americanas contra a violação das águas continentais”. 172Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 20/12/1939, AHI. “O Governo argentino publicou um decreto dispondo a internação dos oficiais e marinheiros do “von Spee”. Os primeiros permanecerão livres, em Buenos Aires, sob palavra de honra, não podendo ausentar-se dela e os segundos serão, provavelmente, distribuídos pelas províncias e território nacional. O suicídio do comandante do couraçado causou sensação, apesar de não surpreender ninguém. A Embaixada alemã disse que esse oficial, desde o começo, havia

Excluído: ia

Excluído: a

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Outro caso de desrespeito à zona neutra, ocorreu quando o cruzador “Hawkins”

interceptou o cargueiro alemão “Wakama” (12/02/40)173, a quinze milhas do litoral

brasileiro, perto de Cabo Frio, que foi afundado pela própria tripulação para que não

caísse em mãos dos britânicos. Dez oficiais e trinta e seis marinheiros foram recolhidos

pelos ingleses e levados como prisioneiros para a Inglaterra. Diante desses fatos, o

Presidente do Panamá, Augusto Boyd (depositário da Declaração do Panamá), protestou

com os países beligerantes sobre o desrespeito praticado em águas neutras americanas,

de acordo com o estipulado na Conferência do Panamá.

Os exércitos alemães invadiriam a Dinamarca e a Noruega (09/04/1940), conquistando as

bases necessárias, para que sua Marinha pudesse proteger seus navios mercantes que

transportavam o minério de ferro, de vital importância na capacidade de guerra alemã,

vindo da Suécia. As próximas vítimas seriam a França, Bélgica, Holanda e

Luxemburgo174, quando sete divisões blindadas alemães, através das Ardenas, atacariam

os exércitos aliados pela retaguarda, derrotando-os em poucos dias e obrigando o

Governo francês a assinar um armistício (21/06/1940), o que colocaria a Inglaterra

sozinha no conflito. Hitler tentaria invadir a Inglaterra, porém a sua Força Aérea

resolvido compartilhar a sorte do seu navio e que só para cumprir o seu dever até o fim, havia adiado a sua eliminação voluntária, o que fez durante a noite, depois de assegurada a sorte de seus comandados”. 173MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 26/02/1940, AHI. “O MRE enviou um telegrama dirigido ao Ministro das Relações do Panamá, sobre o seguinte assunto: “Tenho a honra de levar ao conhecimento de V. Ex. que, no dia 12 do corrente, o cargueiro alemão “Wakama” foi afundado pela própria tripulação, a cerca de 20 milhas do litoral, quando chamado à fala por um navio de guerra inglês, obviamente para fins de visita e captura. Decorrendo do procedimento do vaso de guerra inglês ato de hostilidade, classificado como tal pela XIII Convenção de Haia, e praticado nas águas adjacentes ao Continente americano, que as Repúblicas americanas têm direito de conservar livres de todo ato hostil, por parte de qualquer nação “beligerante”. Desejo pedir a V. Ex. que se sirva para consultar os demais países americanos, na forma de precedente já estabelecido, sobre a conveniência de um protesto coletivo contra essa violação da zona marítima, que nos comprometemos preservar dos malefícios da guerra”; Idem, 25/03/1940. “MRE agradece o apoio recebido pelo Governo norte-americano sobre o protesto coletivo no caso do cargueiro alemão”; Idem, Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 01/04/1940, AHI. 174MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 20/05/1940, AHI. “O Governo do Panamá formulou um protesto conjunto das 21 Repúblicas americanas contra a violação da soberania e da neutralidade de Bélgica, Holanda e Luxemburgo. O protesto se funda aos itens quatro e cinco da declaração do Panamá”.

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(“Luftwaffe”) não conseguiria dobrar os pilotos de caças britânicos e o radar que

possibilitava aos ingleses obterem maior número de aeronaves nos momentos críticos

das batalhas.

A Itália entraria na guerra (10/06/1940)175 atacando o já moribundo exército francês nos

Alpes, com a ambição de participar do butim, que seria conquistado após a derrota

francesa. A campanha seria pífia e seu exército só conseguiria dobrar o inimigo, muito

inferior em número e ânimo, quando tropas alemãs ameaçaram a retaguarda francesa.

Iniciaria, também, a campanha africana atacando o Egito, porém, seu exército mal

armado e com poucos veículos foi presa fácil para o pequeno exército britânico na região.

Em setembro, Alemanha e Itália receberiam o apoio do Japão e formariam o “Pacto da

Tríplice Aliança”176, uma tentativa de impressionar os EUA, cujo governo pretendia entrar

na guerra a favor dos aliados, apesar da opinião pública ainda optar pela neutralidade177.

O Brasil seria o representante dos interesses italianos perante à França e à Grã-

Bretanha178, até a declaração de guerra aos países do Eixo, em agosto de 1942.

175P. Leão Velloso (Roma) ao MRE, 04/06/1940, AHI. “A decisão da Itália de entrar na guerra foi comunicada verbalmente ao próprio Embaixador francês pelo Ministro de Negócios Estrangeiros. Evidentemente, o Embaixador perguntou quando, ao que o Ministro respondeu que no momento não estava ainda resolvido. Parece que a entrada na guerra terá lugar entre 12 e 15 de junho. Não se sabe ao certo, mas não é improvável que o Conselho de Ministros se pronuncie hoje sobre a cessação do estado de não beligerância deste país, sem que isso contudo signifique sua intervenção imediata”. 176C.de Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 27/09/1940, AHI. “A assinatura da “Tríplice Aliança” surpreendeu todas as esferas. Parece-me claro que ela foi firmada, unicamente, a fim de evitar a entrada na guerra dos EUA, pois, a partir de agora, em tal eventualidade, terão de bater-se também contra o Japão”. 177Idem, 28/09/1940. “Como inovação ocasionada no cenário mundial pela “Tríplice Aliança” só parece existir um maior risco de azedamento nas relações do Japão com os EUA, porquanto que Tóquio tudo permitia, na Europa, a Berlim e esta, na Ásia Oriental, ao Império Nipônico. Os meios alemães declaram, com fingida ingenuidade, que o tratado não pode ser incriminado por estar dirigido contra Washington, constituindo, ao contrário, definição da política pan-européia de índole igual à pan-americana, que assumiu, sem consultar os proprietários, a proteção das colônias européias na América e só permitirá sua cessão a um estado americano. Este exemplo parece buscado, muito deliberadamente, para justificar a apropriação pelo Japão das Índias Neerlandesas”. 178 Idem, 12/06/1940. “Ecoou como uma prova de crescente prestígio internacional do Brasil, na Europa, o fato de lhe serem confiados, na França e Grã-Bretanha, a proteção dos interesses italianos”.

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Com a queda da França, os países do Continente americano voltariam a ser reunir para

deliberarem sobre quais medidas seriam necessárias para impedir que as colônias

européias pudessem ser utilizadas pelos países do Eixo, como bases militares,

comprometendo o comércio da região através de um bloqueio realizado por submarinos

dos países do Eixo ou “navios corsários”179 alemães. Na Conferência de Havana

(07/1940), decidiu-se utilizar a política de solidariedade pan-americana (ver Capítulo 3.2).

Assim, as colônias européias seriam ocupadas por tropas norte-americanas e suas bases

militares seriam utilizadas por todos os países participantes do pan-americanismo.

Hitler cometeria um dos maiores erros da história militar ao invadir a Rússia, em 22 de

junho de 1941, menosprezando a qualidade do equipamento e a capacidade de luta do

soldado soviético. Apesar do início promissor, suas tropas foram rechaçadas nos

subúrbios de Moscou (12/1941), sofrendo uma grave derrota, agravada com a

inclemência do frio reinante na região. Como não conseguiria vencer rapidamente o

Exército soviético e com a Inglaterra lutando desesperadamente para manter seu Império,

lutaria em duas frentes (ocidente e oriente) dividindo suas forças e diminuindo a sua

possibilidade na vitória final, principalmente, quando os EUA entraram na guerra. Na

América Latina, os países ficariam perplexos com a derrota alemã e políticos chilenos de

esquerda que apoiavam, mesmo a contragosto, a Alemanha, em função do Pacto

Germano-Soviético (23/08/1939), passaram a pressionar o Governo chileno a tomar uma

ação mais rigorosa contra o fascismo no Continente americano.

179Duarte, Paulo de Q. “Dias de Guerra no Atlântico Sul”. Rio de Janeiro, Biblioteca do Exército, 1968. pp. 25-31. Navios “corsários” eram cruzadores auxiliares (navios mercantes artilhados) que usavam uma série de disfarces para se aproximar de cargueiros aliados isolados, afundando-os com o seu armamento pesado. O principal “corsário alemão” foi o “Atlantis” que afundaria um total de 145.697 toneladas de navios aliados. Seria afundado, perto da costa de Pernambuco, pelo cruzador britânico “Devonshire” quando tentava abastecer o submarino U-126. Ao todo a Marinha alemã utilizaria cerca de 9 navios corsários que aterrorizaram os mares durante o início da guerra”.

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Após os japoneses atacarem a base norte-americana de Pearl Harbour (07/12/1941) e a

declaração de guerra de Hitler e Mussolini (11/122/1941), colocando os EUA no conflito

mundial, uma nova reunião, entre os países do Continente, seria pedida pelo Governo

norte-americano. A Conferência do Rio de Janeiro (15-28/02/1942), como já foi dito

anteriormente, determinaria o rompimento das relações políticas e comerciais dos

membros do pan-americanismo com os países do Eixo, com exceção da Argentina e do

Chile.

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2.3-No Setor Militar:

As Forças Armadas alemãs tinham forte influência entre os militares latino-americanos,

como foi dito no primeiro capítulo. Argentina e Chile tiveram muitos instrutores alemães

trabalhando em seus exércitos, entretanto, o Brasil, após a Primeira Guerra Mundial,

ficaria sob a influência francesa com a vinda de uma Missão Militar que acabaria

profissionalizando o seu exército, criando a escola de Estado-Maior e outras para cada

especialidade militar.180 Quando a guerra começou e as vitórias relâmpagos alemãs

(“blitzkrieg”) começaram a surgir, a admiração cresceu, ainda mais, no seio de todos os

militares sul-americanos.181 Eles achavam que, só aplicando um regime forte e

centralizador, seus países conseguiriam sair do atraso político, econômico e militar em

que viviam. As armas alemãs, também, eram muito requisitadas, principalmente canhões,

canhões antiaéreos, fuzis, metralhadoras e aviões.

A Argentina vinha adquirindo, desde 1936, armamentos na Alemanha e Tchecoslováquia

para aparelhamento do seu exército. Em 1938, o Exército argentino comprou canhões

antiaéreos de 88 mm (“Krupp”) sobre chassis, projetores (“Siemens”) com carros para

transporte, aparelhos de escuta (“Electroacustic”), munições e acessórios diversos182.

Posteriormente, com a eclosão da guerra (1939), ficaria muito difícil adquirir material

bélico na Europa, obrigando ao Governo argentino tentar conseguir armas junto aos

norte-americanos, na política pan-americana de defesa do Continente americano. Porém,

180Carvalho, José Murilo de. ob. cit. pp. 28-29. 181C. de Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 19/08/1941, AHI. “Na visita dos Adidos militares à frente russa, o brasileiro e o argentino foram os únicos americanos convidados”. 182Moniz Aragão (Berlim) ao MRE, 07/07/1938, AHI. “Informo, muito confidencialmente, que o Governo argentino pediu propostas, na Alemanha e Inglaterra, para construção de um couraçado de 35.000 toneladas e três cruzadores de 10 mil. Consta que grande parte do empréstimo externo vem da Suíça, Inglaterra e Holanda, sendo destinado para compra de armamentos, cujas compras na Suécia, Alemanha e Tchecoslováquia têm sido extremamente importantes nos últimos tempos, principalmente, de artilharia e aviação”.

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com a atitude argentina de se recusar a romper relações diplomáticas com os países do

Eixo (1942), os EUA se recusaram a vender armas para os argentinos. Como foi explicado

anteriormente, a Argentina tentou adquirir mais armas do governo alemão (24/08/1942)

utilizando a Espanha como parceira na empreitada. Os espanhóis venderiam as armas

disponíveis em seus depósitos, sendo, posteriormente, abastecidos pelos alemães e a

forma de pagamento seria através do sistema de compensação de mercadorias.

Entretanto, o Governo alemão declinou da venda, alegando necessitar de todas as armas

disponíveis para o seu esforço de guerra. Isso não impediu que algumas armas fossem

enviadas para a Argentina, vindas de fábricas suíças, no início de 1943.183 Essas armas

seriam destinadas para os oficiais do GOU que estavam preparando um golpe contra o

indeciso Presidente Castillo.184

O golpe foi realizado com sucesso, com o GOU empossando o General Arturo Rawson

(04/07/1943) que seria deposto três dias depois, devido à sua tentativa de aproximação

com os EUA, desagradando aos militares nacionalistas. O General Pedro Ramírez seria

colocado em seu lugar. Entre suas primeiras medidas destacaram-se: realizar um expurgo

nas Forças Armadas e organizar um gabinete exclusivamente militar.185 Com a recusa

183De Nápoli, Carlos. ob. cit. pp.104-105. 184J. de Paula Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 05/06/1943, AHI. “A canhoneira “Drumond” ancorou, esta noite, nas proximidades de Colônia, tendo desembarcado o médico de bordo, a fim de procurar medicamentos e três Ministros argentinos, com o compromisso de regressarem para bordo, pela manhã, devido naturalmente, à pequena capacidade de alojamento. O Dr. Ramon Castillo declarou que não desembarcará em território uruguaio, mas aquele Governo receoso de que o Presidente mude de parecer, estuda cuidadosamente, a maneira de proceder para evitar complicações com a revolução triunfante”; Idem, 05/06/1943. “Os Ministros das Relações Exteriores, da Agricultura, da Justiça e da Instrução Pública regressaram de Montevidéu no avião de carreira. Permanecem, no Uruguai, os Ministros da Fazenda e das Obras Públicas. Os Ministros do Interior, da Agricultura e da Indústria e Comércio foram detidos ao desembarcar, dizendo-se que será instaurado processo contra eles. Os Ministros das Relações Exteriores e da Instrução Pública estão em liberdade, em seus domicílios, sendo que o primeiro alojou-se no Plaza Hotel. O Presidente Castillo, que chegou a La Plata, desembarcando em companhia dos Ministros da Marinha e do Interior, dirigiu-se, imediatamente para a Capital Federal, em automóvel, acompanhado pelo General argentino Masson. Apresentou sua renúncia, encontrando-se na residência presidencial de onde, provavelmente, se mudará hoje. Contra sua pessoa nada há”. 185Salinas, Juan; De Napoli, Carlos. ob. cit. pp. 162-173. Eram os seguintes Coronéis: Enrique González, Emilio Ramírez, Elvio Anaya e Juan Perón. Todos eram anglófobos.

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norte-americana de fornecer material bélico para as Forças Armadas argentinas, Ramírez

tentaria adquirir essas armas através dos alemães. A principal razão para a aquisição

desses armamentos era o temor de que os EUA pudessem atacar a Argentina através da

fronteira com o Brasil186. Assim, enviou um antigo agente da rede de espionagem “Bolívar”

para conseguir o armamento necessário junto aos alemães. Esse agente seria preso

(30/10/1942), por agentes britânicos, na ilha de Trinidad, quando o navio espanhol, em

que viajava, parou para se reabastecer. Tanto argentinos e alemães não sabiam que o

código secreto germânico (“Enigma”)187 tinha sido decifrado pelos criptográfos ingleses do

“Ultra”188 e norte-americanos do “Magic”.189

A Inglaterra aceitava a neutralidade argentina para manter o fluxo dos produtos deste país

(carnes e cereais), tão necessários para a sua sobrevivência, acabaria cedendo às

pressões dos norte-americanos e, juntos, congelariam todos os depósitos argentinos em

seus respectivos países. Os EUA cancelariam todas as importações vindas da Argentina

e colocariam sua esquadra em Montevidéu para pressionar os oficiais nacionalistas do

GOU a romperem com a Alemanha. Ramírez, pressionado, procurou reaproximar-se dos

aliados e, por este motivo, foi deposto por Perón e seus asseclas. O GOU colocaria no

poder o General Farrell, irritando ainda mais os norte-americanos. O Departamento de

Estado norte-americano sugeriu que o Brasil transferisse as tropas que seriam enviadas

para a África ou Europa, para o Rio Grande do Sul, na fronteira com a Argentina. Os EUA

186MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 17/05/1943, AHI. “O MRE informa que não houve movimento de tropas no Paraná, ou em qualquer região do sul”. 187Enigma – Era o nome da máquina electro-mecânica de encriptação com rotores, utilizada tanto para a encriptação como para a decriptação de mensagens secretas, utilizada pelos alemães durante a guerra. O código foi decifrado, pelos britânicos através do projeto Ultra, que utilizava o primeiro grande computador da história (“Colossus”). 188Ultra – Eram as informações adquiridas com a decifração das mensagens secretas alemãs (enigma). Era utilizado um computador “Colossus”, projetado na cidade de Bletchley Park, Inglaterra, durante a Segunda Guerra Mundial. Sobre o Projeto Ultra, ver Winterbotham, F. W. “Enigma – O Segredo de Hitler”. Rio de Janeiro, Biblioteca do Exército, 1978. 189Magic – Era o correspondente norte-americano do projeto britânico Ultra.

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obrigaram todos os países sul-americanos a não reconhecerem o novo governo

argentino. Vargas montou uma política de apaziguamento, pedindo a Roosevelt que

repensasse mais calmamente sobre o assunto e este acabou cedendo, diminuindo a

pressão sobre o novo governo argentino do General Farrell.190 Porém, seriam necessários

nove meses para que os EUA reconhecessem o novo governo.

O Brasil, devido à sua posição estratégica, mais cedo ou mais tarde, estaria envolvido no

conflito. Suas Forças Armadas estavam necessitando de armamento e não tinham

elementos suficientes para a proteção de sua vasta linha costeira. Precisavam de todo o

tipo de material bélico, desde carros de transportes, veículos blindados, canhões de

artilharia, armamentos individuais (fuzis e metralhadores) e, principalmente, artilharia de

costa. Vargas procurou o apoio norte-americano, antes mesmo dos EUA entrarem na

guerra, inclusive, bases foram cedidas para que o Governo norte-americano pudesse

salvaguardar a região costeira do nordeste brasileiro (1937)191, ponto estratégico

fundamental na defesa do Continente. Porém, os EUA não estavam preparados para

fornecer o material desejado pelo Brasil e as condições de pagamento eram muito menos

vantajosas das oferecidas pelos alemães.

Quando os EUA se recusaram a vender ao Brasil, três velhos destróieres, após um

protesto argentino (1937), o Governo brasileiro resolveu adquirir, na Europa, todo o

material bélico que precisava para defender o país de algum entrevero futuro. Negociaria

armas de infantaria com a Tchecoslováquia, belonaves e submarinos com a Itália

190MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 05/06/1943, AHI. “Apenas tenha V. Ex. notícia do desembarque do Presidente Castillo, no Uruguai, fica autorizado a fazer saber, ao novo governo argentino que desejamos manter com ele, as mesmas relações amistosas que mantivemos com o Governo passado e, que o reconheceremos assim que esteja definitivamente constituído”. 191McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 94.

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(1938)192. Na Alemanha (1938), compraria canhões de 105 mm e de 88 mm, viaturas de

reboque (“Krupp”)193, telêmetros (“Zeiss”)194 e aparelhos de escuta (“Electroacustic”)195.

Esse material chegaria ao Brasil após o início da guerra e geraria um grave conflito

diplomático com a Inglaterra (1940), como será analisado no próximo capítulo. Em março

de 1941, o governo dos EUA promulgaria o “Lend-Lease Act”, vendendo armamentos

para a Grã-Bretanha e, posteriormente, para todos os países latino-americanos, com

exceção da Argentina, durante todo o conflito. Com a entrada dos EUA na guerra e, após

a resolução da Conferência do Rio de Janeiro (02/1942), grande quantidade de

armamentos seria enviada para rearmar o Exército brasileiro. Antes mesmo dos EUA

entrarem em guerra, bases foram cedidas pelo governo brasileiro, no intuito de ajudar na

defesa do Continente, aplicando a política de solidariedade americana (ver Capítulo

3.3)196.

Dessa forma, os nazistas começaram a se preocupar com a presença norte-americana no

nordeste197, fazendo uma última tentativa de cooptar o Governo brasileiro através de

192MRE a Embaixada brasileira em Roma, 09/11/1939, AHI. “Ministro legaliza documentos para o embarque de munição italiana destinada para a Marinha de Guerra brasileira”; Leão Velloso (Roma) ao MRE, 30/12/1939, AHI. “Informa que está disponível, na “Ansaldo”, o material para a conservação de 23 carros de assalto CV 35”. 193Cyro de Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 02/09/1939, AHI. “Informa que a entrega de material bélico pela empresa alemã “Krupp” continuará normalmente, apesar da guerra”; Idem, 15/09/1939. 194Idem, 09/10/1939. 195Idem, 09/10/1939. 196MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 07/01/1942, AHI. “A resposta já foi dada à Embaixada alemã e publicada em todo o mundo, quando declaramos a nossa solidariedade aos EUA, o que significa auxílio sem reservas a este país. Existem no Brasil, atualmente, em vários aeroportos, desarmados, aproximadamente, 100 mecânicos e auxiliares norte-americanos. Nunca veio 40 aviões como foi dito em seu telegrama. É verdade que passam pelo território brasileiro, rumo à África, contínuos grupos de aviões norte-americanos de diversas categorias, que permanecem no nosso território para reabastecimento ou reparos”. 197C. de Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 18/06/1941, AHI. “Ouviu, ontem à noite, que o Brasil estava negociando com os EUA a cessão de bases navais, negando, categoricamente, o fato para as autoridades alemãs. Entretanto, hoje, foi publicado que as negociações estão tão adiantadas que, a respeito do caso, já forneceram esclarecimentos à imprensa, as Embaixadas do Brasil em Washington e em Buenos Aires”; MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 17/06/1941, AHI. “O Brasil, de fato, está negociando e construindo bases. Essas bases serão brasileiras, mas o material, de que não dispomos, tem forçosamente de ser adquirido no exterior, não deixando por isso de serem propriedades nossas. No caso de se tornarem necessárias a defesa continental, serão franqueadas as nações americanas nos termos das decisões continentais”; Idem, a

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Salazar, Ditador português, que pediu a Vargas para não se aliar aos EUA. A idéia de

Ribbentrop, Ministro das Relações Exteriores alemão, era que o Brasil pudesse ter a

mesma atitude da Espanha, que não rompeu relações diplomáticas com a Inglaterra e os

EUA, mesmo sendo solidária com os países do Eixo. Dessas bases começaram a partir

aviões e navios para o patrulhamento do Atlântico Sul e, após a declaração de guerra

entre EUA e os países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão), essas patrulhas começaram a

atacar, “legalmente”, os submarinos das potências do Eixo, causando baixas ao inimigo.

Quando aviões norte-americanos, com alguns militares brasileiros, começaram atacar

submarinos alemães, fora das nossas águas territoriais, essas operações tiveram grande

repercussão na imprensa, na palavra do Ministro da Aeronáutica, Salgado Filho. Quando

a Marinha alemã soube desses atos, resolveu retaliar a costa brasileira com ataques de

submarinos.

É importante ressaltar que, Hitler proibiu qualquer ato de agressão ao Brasil, após

consultar Ribbentrop sobre as conseqüências políticas advindas desse ato, obrigando ao

Almirante Doenitz (Comandante da Frota de Submarinos Alemã) a cancelar o ataque

punitivo. Em julho de 1942, Donitz voltou a insistir em um ataque ao largo da costa sul-

americana e, como primeira opção, planejou operações ao largo do estuário da Prata

contra navios-frigoríficos repletos de carne argentina com destino à Inglaterra. Ribbentrop

negou qualquer ataque que pudesse levar a Argentina para o lado aliado, entretanto, não

fez nenhuma objeção para ataques feitos ao largo da costa brasileira, fora das águas

territoriais brasileiras (3 milhas).198

Embaixada brasileira em Berlim, 20/07/1941, AHI. “Trata-se de bases aéreas nossas que temos o direito de construir, não estando em jogo a soberania brasileira sobre as mesmas”. 198www.grandesguerras.com.br/artigos/text01.php

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Donitz tomou a decisão de retaliar os ataques desferidos por aviões norte-americanos,

baseados em território brasileiro, contra os seus submarinos. O submarino U-507199

(Tenente-Comandante Harro Schacht)200 recebeu ordens para manobrar livremente ao

longo da costa brasileira. Isto significava procurar navios inimigos em qualquer lugar,

mesmo em águas territoriais. Cumpriu sua missão com tamanho zelo que afundou cinco

navios de cabotagem e um veleiro, bem próximos da costa brasileira (15-17/08/42)201. É

assustador verificar que a técnica de dois torpedos, um após o outro, utilizada pelo

comandante do U-507, foi de extrema violência contra navios indefesos. A intenção era

realmente causar o maior número de vítimas possíveis, pois essa tática agressiva,

geralmente, é utilizada para atacar grandes navios mercantes ou belonaves bélicas do

inimigo. Os passageiros e tripulantes tiveram muito pouca possibilidade de sobreviver,

mesmo perto da costa, pois os navios afundaram rapidamente sem a mínima chance de

serem utilizados os barcos salva-vidas. Foi o grande número de vítimas (607 mortos) que

causou tanta consternação na sociedade brasileira, principalmente a morte de muitas

crianças e mulheres. Em 13 de janeiro de 1943, um avião Catalina (PBY-5) norte-

americano avistou o U-507, bem ao largo da costa de Natal e o destruiu utilizando cargas

de profundidade e todos os seus tripulantes morreram (54). A população brasileira, que já

estava indignada com os ataques sofridos por navios brasileiros em mares longínquos,

exigiu que o governo declarasse guerra à Alemanha e Itália. Vargas viu que a política de

neutralidade não garantia nenhuma segurança para o país, principalmente, com a

presença de tropas norte-americanas no país. O Brasil entraria em guerra com a

Alemanha e Itália, em 31 de agosto de 1942.

199www.sentandoapua.com.br/navios/sub/u507.htm 200www.sentandoapua.com.br/navios/com/schacht.htm 201José de Paula Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 18/08/1942, AHI. “Condolências do Governo argentino ao torpedeamento de navios brasileiros nas costas do nordeste brasileiro”; Samuel de Souza Leão (Santiago) ao MRE, 19/08/1942, AHI. “O governo chileno protesta contra o afundamento de cinco navios brasileiros”.

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As Forças Armadas chilenas eram grandes compradores de material bélico alemão. Em

1937, adquiriria bombardeiros alemães (“Focke Wulf”) para completar suas esquadrilhas

que já possuíam bombardeiros trimotores (“Junkers”) e caças italianas (“Breda”)202,

comprando, também, canhões alemães de 88 mm, dois anos depois (1939). É importante

frisar que, com a recusa do Governo chileno em participar da política de apoio mútuo

continental, ficou alijado do fornecimento norte-americano de armamentos. Dessa forma,

as Forças Armadas chilenas procuraram adquirir armamento alemão (armas de infantaria,

carros blindados e canhões), através do sistema de compensação, utilizando a Espanha

como intermediária na transação comercial. O Chile forneceria salitre à Espanha, que

pagaria com outros produtos aos alemães. A operação não teve sucesso, em virtude da

necessidade alemã de manter toda a sua produção bélica para uso exclusivo do seu

exército e, porque com a pressão norte-americana de manter os países americanos

unidos, foi fechado um acordo militar (“Lend-Lease”) para o Chile obter armamentos

norte-americanos.

Para terminar, gostaria de falar sobre as perdas humanas e materiais que os países do

sul da América Latina tiveram com o bloqueio naval, perpetrado pelos países do Eixo,

contra as rotas de navegação da Grã-Bretanha. A Argentina e Chile sofreriam menos que

o Brasil, por causa da postura de neutralidade que ambas as nações tomaram durante

uma boa parte da guerra. Foi, justamente, neste período (1940-1943), que a campanha

dos submarinos dos países do Eixo obteve grande êxito (“tempo feliz”)203, enquanto os

aliados procuravam mecanismos para inibir e, se possível, eliminar esta ameaça às rotas

202Prieto, Carlos Maldonado. “La Prusia de América del Sur". Santiago, Estúdios Sociales, Corporación de Promoción Universitária (CPU), 1992. pp. 75-102. “Foram comprados 24 unidades de “Junkers” (Ju-86) e 20 unidades de “Breda” (BA-64)”.Ver também, “Guias de Armas de Guerra – Bombardeiros da II Guerra”, Volume II, Nova Cultural, São Paulo, 1986. p. 10. 203“Tempo Feliz” – Foi um termo utilizado para mostrar o momento de grande atividade dos submarinos alemães no Atlântico, contra a navegação aliada.

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marítimas do mundo. Após 1943, com o patrulhamento contínuo dos mares, com o

sistema de comboios, com o aumento de aviões e belonaves e, principalmente, com o

aperfeiçoamento tecnológico de aparelhos de detecção (radar/sonar), a balança pendeu

para o lado aliado. Foi a entrada dos EUA que mudou o cenário da guerra no mar. A

capacidade do parque industrial norte-americano, a cessão de bases militares pelos

países aliados e o estrangulamento do poder combativo e produtivo da Alemanha foram

os principais fatores que determinaram o fim das atividades dos submarinos e corsários

fascistas.

O Brasil sofreria retaliação, da Alemanha, ao permitir que bases militares norte-

americanas fossem instaladas em seu território, culminando com o ataque do U-507

contra sua navegação de cabotagem, conforme descrito acima. A Marinha Mercante

brasileira teria vários navios afundados, antes e depois da proclamação de guerra contra

os países do Eixo. O primeiro ataque a um navio brasileiro, por parte dos alemães, foi

realizado no Mediterrâneo, quando o mercante “Taubaté” (23/03/1941)204, viajando de

Chipre para Alexandria, foi atacado por bombas e metralhadoras por um avião alemão,

apesar de ter içado lençóis brancos, ter a bandeira brasileira pintada em seus costados e

de ter parado as máquinas para demonstrar uma atitude inofensiva. Treze tripulantes

ficaram feridos e um faleceu, sendo preciso que dois rebocadores o levassem para o

porto de Alexandria. O Governo brasileiro formulou um protesto à Embaixada alemã, no

Rio de Janeiro. O Governo alemão acusou o recebimento do protesto, porém se esquivou

de dar maiores explicações205.

204MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 02/04/1941, AHI. “O MRE protesta contra o ataque desferido por avião alemão ao navio brasileiro”; Idem, 04/04/1941. 205C. de Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 29/08/1941, AHI. “Fiz entregar o “memorandum” e, foi respondido que o Embaixador alemão, no Brasil, tem instruções de responder o inquérito que está em curso. A impressão é de que a Alemanha reconhece a culpa, argumentando, para atenuá-la, com circunstâncias fortuitas, como a de não haver sido a bandeira branca içada no primeiro momento”.

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Outro incidente aconteceria com o mercante “Siqueira Campos” (13/06/1941), quando um

submarino alemão abordou-o para verificar os passageiros e a carga transportada. Após

fotografarem os passaportes, o navio foi liberado para seguir viagem. Após o rompimento

das relações diplomáticas com os países do Eixo, os navios mercantes brasileiros

passariam a ser alvo dos ataques de submarinos desses países. Uma série de navios

seria afundada, antes da investida do U-507 nas costas do nordeste brasileiro, fato que

originou a declaração de guerra brasileira. Outros seriam afundados posteriormente e, só

no início de 1944, quando as medidas de proteção aos navios mercantes aliados se

tornaram muito eficientes, os afundamentos deixariam de ocorrer. Argentina e Chile

também teriam perdas, bem menores, é claro, provando que a neutralidade não era uma

política capaz de resguardar a segurança que eles almejavam (ver Tabela 12).

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Tabela 12-Navios de Argentina, Brasil e Chile Afundados pelos Países do Eixo.206

206Navios brasileiros: Cansancão, Elza. “E Foi Assim que a Cobra Fumou”. Rio de Janeiro, Sindicato Nacional Editores de Livros, 1987. pp.19-38; Castello Branco, Manoel Thomaz. ob. cit. pp. 50-64; Duarte, Paulo de Q. ob. cit. pp. 48-51, 85-103 e 107-127. Navios argentinos: Historia General de las Relaciones Exteriores de la República Argentina. ob. cit. pp.3-4. Navio chileno: S. de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 17/03/1942, AHI; Idem, 19/03/1942; MRE a Embaixada brasileira no Chile, 17/03/1942, AHI. 207Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 20/02/1942, AHI. 208Idem, 21/02/1942. 209Idem, 03/03/1942. 210Idem, 10/03/1942. 211Idem, 19/02/1943.

Argentina: Nº NAVIOS DATA 01 Uruguay 27/05/1940 02 Rio Tercero 22/06/1942

Brasil: Nº NAVIOS DATA 01 Cabedelo 14/02/1942 02 Buarque207 16/02/1942 03 Olinda208 18/02/1942 04 Arabutã209 07/03/1942 05 Cairu210 09/03/1942 06 Parnaíba 01/05/1942 07 Comandante Lira 18/05/1942 08 Gonçalves Dias 24/05/1942 09 Alegrete 07/06/1942 10 Pedrinhas 26/06/1942 11 Tamandaré 26/07/1942 12 Piave 28/07/1942 13 Barbacena 28/07/1942 14 Baependi 15/08/1942 15 Araraquara 15/08/1942 16 Aníbal Benévolo 16/08/1942 17 Itagiba 17/08/1942 18 Arará 17/08/1942 19 Jacira 19/08/1942 20 Osório 27/09/1942 21 Lajes 27/09/1942 22 Antonico 28/09/1942 23 Porto Alegre 03/11/1942 24 Apalóide 22/11/1942 25 Brasilóide211 18/02/1943 26 Afonso Pena 02/03/1943 27 Tutóia 30/06/1943 28 Pelotaslóide 04/07/1943 29 Bagé 31/07/1943 30 Itapagé 26/09/1943 31 Cisne Branco 28/09/1943 32 Campos 23/10/1943

Chile: Nº NAVIOS DATA 01 Tolten 13/03/1942

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2.4-No Setor Econômico:

Como explicamos no primeiro capítulo, a importância comercial da Alemanha no mercado

sul-americano era baseado no sistema de compensações (Aski), que proporcionava aos

participantes, trocar mercadorias necessárias para o desenvolvimento dos seus

respectivos países, sem utilizar divisas, moeda corrente. Os países interessados em

comercializar com os alemães, precisavam abrir contas especiais em algum banco

germânico para que os valores de suas vendas à Alemanha fossem depositados pelos

importadores para, mais tarde, serem reutilizados pelos comerciantes sul-americanos que

precisavam comprar produtos alemães.212 Isto é, para cada valor de venda haveria um

valor de compra, se caso houvesse um excesso de marcos compensados em uma dessas

contas, o favorecido poderia comprar mais e, conseqüentemente, vender menos para

equiparar a balança comercial. Isso, muitas vezes, ajudava a reduzir o preço dos

produtos, pois o importante era gerar sempre o mecanismo de trocas. Reafirmamos, mais

uma vez, que esse programa, além de aumentar o comércio alemão na região, contribuiu

para uma atitude “pró-germânica” em todos os países do sul da América Latina.213 Os

italianos, seguindo os mesmos passos da Alemanha, também iriam utilizar o sistema de

trocas como base comercial com os países latino-americanos. Dessa forma, argentinos

vendiam trigo, lã, milho, couros e carnes e recebia produtos manufaturados e maquinaria

para o desenvolvimento do seu parque industrial.214

Com o início da guerra, o Governo Argentino ficou preocupado com a diminuição do

comércio com a Europa, temendo o bloqueio naval britânico, bem como os ataques dos

submarinos dos países do Eixo à navegação mundial. Foi baseado na política de

212McCann, Frank D. Jr. ob. cit. 126-127. 213Idem. p. 127. 214Leão Velloso (Roma) ao MRE, 24/05/1939, AHI.

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manutenção desse comércio, que manteve sua neutralidade perante o conflito, se

distanciando da política de solidariedade pan-americana, proposta pelos EUA. A

Alemanha procurava respeitar a neutralidade argentina evitando atacar seus navios e,

dentro do possível, continuar o seu comércio de compensação para obter matérias-

primas, cada vez mais necessárias para o seu esforço de guerra. Ė importante frisar que,

a Inglaterra era a grande beneficiária dessa atitude alemã, em relação aos navios

mercantes argentinos, pois estes chegavam sem problemas a seus portos, principalmente

carregados de carnes congeladas e cereais. Como contrapartida, fechava os olhos para a

política de neutralidade e só tomaria uma posição mais incisiva, quando foi pressionado

pelo seu principal parceiro comercial e militar, os EUA.

Devido a esse comércio, as exportações argentinas, em 1942, aumentariam quatro vezes

em relação ao ano de 1939, quando se iniciou a Segunda Guerra Mundial.215 A economia

interna também obteria grandes resultados com a criação da indústria de substituição de

produtos que, até pouco tempo, o país importava. Para melhor escoar a sua produção de

cereais, carnes e produtos têxteis, Castillo criaria a Frota Mercante Estatal.216 Essa atitude

iria solucionar um grave problema, principalmente na área do comércio exterior, onde o

país tinha uma grande dependência de outros países para transportar suas mercadorias.

A guerra facilitou essa medida, pois vários navios do Eixo, na sua maioria italianos,

estavam atracados no porto de Buenos Aires por causa do bloqueio naval britânico que

controlava o Atlântico Sul.217 Castillo negociou com o governo italiano, adquirindo esses

215Historia de la Economia Argentina: 18)-Gobierno de Ramón S. Castillo (1940-1943) – “Record de Exportaciones Industriales”. www.monografias.com/trabajos16/economia-argentina/economia-argentina.shtml#CASTILLO 216Idem, “Creación de la Flota Mercante del Estado”. www.monografias.com/trabajos16/economia-argentina/economia-argentina.shtml#CASTILLO 217Idem.

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navios por preços muito abaixo do mercado e, em poucos meses, a Frota Mercante

Estatal teria cinqüenta navios mercantes, prontos para operar no comércio ultramarino.218

Quanto ao Brasil, sua economia era dependente do mercado norte-americano e, seu

principal produto, o café, vinha sofrendo forte concorrência de outros produtores que

almejavam o mercado norte-americano.219 A política econômica liberal norte-americana

exigia que as negociações fossem feitas com moeda de aceitação internacional, da qual o

Governo brasileiro não dispunha. Logo, a proposta de compensação era extremamente

favorável e, foi pensando assim, que o Governo brasileiro fechou um acordo comercial

(1935) com os alemães e, posteriormente, com os italianos, para que pudesse vender

suas matérias-primas e recebesse produtos manufaturados e maquinarias para o seu

pequeno parque industrial. Esse acordo seria renovado, secretamente, por mais um ano

(1936), para não criar desentendimentos com o seu principal parceiro econômico, os

EUA220.

A grande preocupação dos norte-americanos era que a Alemanha passasse a comprar o

algodão brasileiro221, mais barato do que o norte-americano, em função do sistema

Aski.222 Para o Brasil, o mercado alemão era excelente para os produtos que não tinham

mercado nos EUA, como: algodão, borracha, lã, minério de ferro, madeira, frutas e

couros.223 Podia comprar carvão, máquinas, motores e diversos produtos inexistentes no

218Historia de la Economia Argentina. ob. cit. - “Creación de la Flota Mercante del Estado”. www.monografias.com/trabajos16/economia-argentina/economia-argentina.shtml#CASTILLO 219McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 135. 220Idem. pp. 128-131. 221Muniz Aragão (Berlim) ao MRE, 09/06/1938, AHI. “Alemanha compra algodão brasileiro em moeda corrente (divisas)”. 222Idem. p. 129; 223Muniz de Aragão (Berlim) ao MRE, 04/02/1938, AHI. “A Alemanha reduziu o comércio com o Brasil por causa da indefinição sobre a renovação do acordo de compensação entre os dois países”; Idem, 13/07/1938. “Jornais divulgam que a Alemanha deixou de comprar café, fumo, borracha, madeira, carnes, laranjas, bananas, algodão por causa da suspensão das operações comerciais em marcos compensados”.

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país, sem despender moeda corrente e, quanto mais vendesse, mais acumulava marcos

compensados para comprar mais produtos industrializados. A Alemanha passaria a ser o

segundo parceiro brasileiro, com a utilização do sistema Aski e o Brasil se transformaria

no principal consumidor não-europeu de produtos alemães (1938)224.

Quando chegou o momento de renovar, novamente, o acordo comercial com a Alemanha,

os norte-americanos protestaram, afirmando que o Governo brasileiro estaria

descumprindo o acordo comercial, feito anteriormente com eles (1935), se assinasse um

novo acordo de compensação com os alemães. Depois de muitas discussões, inclusive,

com a proposta norte-americana de vender ouro para o Brasil adquirir divisas, o acordo

com a Alemanha seria prorrogado por mais três meses (1937). Os alemães protestaram,

exigindo um contrato anual e prometendo melhores condições para o Brasil comercializar

os seus produtos.225 Em vez de prorrogar o acordo comercial com a Alemanha, o Brasil,

para não melindrar os EUA226, deixou que as negociações fluíssem normalmente, sem a

assinatura de um acordo formal, porém em 1938 (20/07), decidiria continuar a utilizar o

sistema Aski nas transações comerciais com a Alemanha.227 Esse comércio só seria

finalizado com o início da guerra, apesar das promessas germânicas de comprar e

estocar toda produção de algodão e outros produtos brasileiros, no Brasil, até o final da

guerra228. Inclusive, prometeria um acordo vantajoso, para as duas partes, dos saldos

224McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 137. 225Muniz Aragão (Berlim) ao MRE, 21/07/1938, AHI. “O Governo alemão deseja renovar o novo acordo comercial por mais dois anos, no sistema aski e, propõe negociações bem favoráveis que evitará o desequilíbrio da balança comercial”. 226Idem, 10/01/1939. “Houve uma redução do café brasileiro no mercado alemão, em virtude do Brasil não mais vendê-lo no sistema de compensação. O Governo alemão acusa os EUA de obrigar, o Brasil, a tomar tal atitude, obrigando que o pagamento seja feito em moeda corrente”. 227McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 139. 228C. Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 14/09/1939, AHI. “A Alemanha, apesar da guerra, pretende continuar comercializando com o Brasil. Ainda existem saldos em marcos compensados que deverão ser liquidados, através de um acordo vantajoso para ambos os países. Os alemães acreditam que a guerra será breve e que o comércio, com o Brasil, será reativado, principalmente, para a compra de algodão”.

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Askis não utilizados por causa do conflito. Infelizmente, isso não ocorreu e, após o

rompimento das relações, o comércio cessaria totalmente.

A Itália seria outra parceira, de menor envergadura, que utilizou o sistema de trocas229

para trocar matérias-primas, principalmente, por material bélico para a Marinha

brasileira.230 Precisava, também, de produtos agrícolas para manter o seu mercado

interno que deveria sofrer com a entrada do país na guerra, pois este não estava

preparado para uma guerra de longa duração. Por exemplo, o estoque de café chegou a

um nível tão baixo que se tornou uma mercadoria de luxo, só disponível para as forças

armadas, depois que o governo brasileiro deixou de utilizar o sistema Aski (1939).231

O Chile tinha um comércio regular com a Alemanha, utilizando-se do mesmo sistema de

compensação, porém, seu principal parceiro eram os EUA que lhe fornecia os produtos

industrializados, alimentícios e equipamentos para o seu mercado interno, comprando, em

troca, quase a totalidade da produção mineral chilena (80%). A atitude do Governo

chileno de manter-se neutro, era a preocupação de ter seu comércio com EUA bloqueado

por submarinos japoneses ou alemães. Pressionado pelos norte-americanos, acabaria

rompendo com os países do Eixo (1943), pois, o comércio entre eles, já havia cessado

desde 1940.

229Guerra Durval (Roma) ao MRE, 24/02/1938, AHI. “A Itália deseja comprar carne brasileira, porém o Brasil precisa adquirir algum produto italiano em troca”. 230Idem, 20/01/1939. “O Governo italiano pretende trocar café, algodão, carne e outras mercadorias por submarinos, navios mercantes, aviões e armas diversas”. 231MRE a Embaixada brasileira em Roma, 06/05/1939, AHI. “Os Jornais, no Brasil, anunciam que a Itália está restringindo o consumo do café, por não conseguir comprá-lo através do sistema de compensação. Peço informações sobre a veracidade das notícias”; Leão Velloso (Roma) ao MRE, 31/08/1939, AHI. “Itália proíbe consumo de café, o estoque existente só poderá ser usado pelas Forças Armadas”.

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TERCEIRO CAPÍTULO:

A POLÍTICA DE SEGURANÇA CONTINENTAL PROPOSTA PELOS EUA E

SUAS CONSEQÜÊNCIAS NOS PAÍSES DO SUL DA AMÉRICA LATINA:

3.1-Os resultados da Política de Boa Vizinhança norte-americana:

A 8a Conferência de Lima seria o grande teste da política de boa vizinhança norte-

americana, proposta por Roosevelt, em Buenos Aires (1936)232, no estabelecimento dos

princípios de solidariedade e cooperação americana. Havia chegado o momento

apropriado para a criação de acordos e mecanismos capazes de impedir que os

acontecimentos surgidos na Europa e Ásia233 pudessem interferir na soberania do

Continente americano. Só uma ação mútua entre os países americanos poderia impedir

qualquer interferência de uma nação extracontinental. Sem unanimidade, a proteção do

Continente estaria ameaçada pela república(s) dissidente(s), pois através dela(s) uma

potência externa poderia desestabilizar todo o trabalho de solidariedade e cooperação

americana.

A Argentina era a república dissidente, pois se negava a aceitar qualquer compromisso

que a obrigasse a participar de um pacto de aliança militar, que pudesse acarretar uma

corrida armamentista na região, gerando blocos de países coordenados por interesses

hegemônicos que poderiam desintegrar a estrutura atual existente no Continente.234 O

232Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. pp.14-15. 233Na Europa a Alemanha anexara à Áustria e pretendia absorver a região dos Sudetos, na Tchecoslováquia, ao Reich alemão. Na Ásia, o Japão continuava com a sua política expansionista na China. 234Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 28/11/1938, AHI. “Cantilo explica as razões de a Argentina discordar de um tratado de caráter militar para a proteção do Continente”.

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Ministro Cantilo se recusou a apresentar qualquer proposta de tratado sobre segurança

continental, afirmando que qualquer tipo de compromisso teria o inconveniente de perder

sua função, no futuro, se os EUA mudassem sua política em relação à Europa.235 A

Argentina não aceitaria assinar o pacto, propondo apenas uma declaração dos princípios

americanos, expressando a soberania Continental e alertando sobre qualquer

interferência externa, através de idéias e propósitos, no intuito de interferir na política de

defesa dos interesses do Continente.

É importante salientar que o Brasil compartilhava, em parte, dessa decisão argentina de

não participar de uma organização de segurança coletiva, no Continente, dependendo de

contingências européias ou de mutações na política externa norte-americana.236 Porém,

mecanismos precisavam ser criados para preservar a integridade e a soberania das

nações americanas contra a cobiça de alguns países europeus, pelo Continente

americano. O Brasil agiria para impedir qualquer tipo de intromissão de potências

extracontinentais na região e proporia uma política de consulta mútua, se qualquer país

americano se sentisse ameaçado por forças externas na sua segurança, integridade ou

independência.237 O Governo brasileiro salientava que o perigo externo era real e exigia

medidas práticas e funcionais para a solução do problema, não acreditando na

suscetibilidade da política externa norte-americana, porque o pacto só funcionaria com a

participação integral dos EUA prestando assistência militar e econômica às Repúblicas

235Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 29/11/1938, AHI. “Disse que poderia fazer uma declaração solene de princípios, afirmando enfaticamente que não seriam permitidas influências de homens, idéias e propósitos que afetem a integridade moral e material da América Latina. Enfatizou: a América, que não teve necessidade de pacto para fazer a independência, não precisará de alianças preestabelecidas para fazer respeitar a sua soberania e manter-se longe de todo e qualquer fanatismo de origem política e religiosa. Afirmou que a tradição americana nos ensinou a não rompermos as amarras contra a Europa, tomando a situação presente, que se instalou no Velho Mundo, como permanente, já que modificações podem ocorrer e qualquer compromisso firmado perder a sua razão de ser”. 236MRE a Embaixada brasileira em Roma, 05/12/1938, AHI. 237MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 30/11/1938, AHI. “O MRE não aceitaria qualquer declaração que não incluísse medidas contra a intromissão de países extracontinentais na região e de um mecanismo de consulta entre as repúblicas americanas”.

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americanas. O perigo referido acima ficou confirmado com a descoberta de documentos,

interceptados no sul do Brasil (10/1938), sobre uma conspiração nazista nas fronteiras de

Argentina, Brasil e Uruguai.238 Os EUA concordavam com a proposta brasileira, porém era

fundamental que as Repúblicas americanas tomassem uma atitude em conjunto, evitando

qualquer tipo de discórdia. Os norte-americanos temiam que sem a Argentina, o flanco sul

do Continente ficasse vulnerável e exposto à intervenção das potências do Eixo.

Como já haviam acordado anteriormente, os Ministros da Argentina e do Brasil239 não

participariam da conferência, sendo representados, respectivamente, por Luiz

Castineiras240 e Afrânio de Mello Franco241, enquanto os EUA eram representados pelo

Secretário de Estado Cordell Hull e o Chile, pelo ex-Ministro de Relações Exteriores,

Jorge Matte.242 O Ministro argentino iria participar da abertura da Conferência, retornando,

em seguida, para uma viagem de descanso na região dos lagos chilenos.243

Posteriormente, Cordell Hull iria reclamar da ausência dos dois principais Ministros sul-

americanos da reunião, protesto sem fundamento, pois já havia sido informado que

ambos não compareceriam.244

Na Conferência Interamericana de Lima (09-24/12/1938), a atitude argentina iria irritar o

Departamento de Estado norte-americano e o Itamaraty, com a sua determinação de criar

um bloco de países contrários ao pacto de aliança militar pan-americano, na tentativa de

238McCann, Frank D. Jr. ob. cit. pp. 98-99. “O plano estava baseado em três possibilidades: 1)-uma rebelião ampla que justificaria uma intervenção semelhante à da Espanha; 2)-assumir o controle de áreas de população germânica, através de um “Anchluss” do outro lado do Atlântico; 3)-conseguir concessões políticas para que organizações nazistas pudessem agir livremente, até tomarem o poder”. 239MRE a Embaixada brasileira em Washington, 22/08/1938. “Oswaldo Aranha informa que não comparecerá à Conferência”. 240Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 23/09/1939, AHI. 241MRE a Embaixada brasileira em Santiago, 14/11/1938, AHI. 242Maurício Nabuco (Santiago) ao MRE, 09/11/1938, AHI. 243Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. p.237; McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 99. 244McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 99.

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eliminar a possibilidade de se obter a unanimidade, tão necessária à defesa do

Continente.245 Após a relutância inicial da Argentina em participar do pacto e de muitas

conversas entre argentinos, brasileiros e norte-americanos246, foi aprovada a “Declaração

de Lima”247 (24/12/1938), que reafirmava a determinação das Repúblicas americanas de

participar de um pacto de ajuda mútua e de se consultarem, caso acontecesse alguma

intervenção externa ameaçando a paz e a segurança do Continente.248

Após os acontecimentos de Lima, com a atitude argentina de se afastar da política pan-

americana, os EUA iriam se aproximar inexoravelmente do Brasil249 e, como

conseqüência disso, Oswaldo Aranha iria ser convidado, por Roosevelt, a viajar para

Washington e participar de negociações que iniciariam uma parceria política, econômica e

militar, que duraria até o fim da Segunda Guerra Mundial.250 O Brasil, por ser um país de

grande importância estratégica, passaria a fazer parte da estratégia norte-americana de

245Seitenfus, Ricardo Antônio Silva. ob. cit. p.236. 246MRE a Embaixada brasileira em Washington, 02/12/1938, AHI. “O MRE informa que, após conversações entre os representantes argentinos e brasileiros, em Lima, a Argentina acabou aceitando a fórmula de segurança coletiva. Os EUA devem somar esforços para obtermos a unanimidade em favor de uma declaração conjunta, fortalecendo a solidariedade americana”. 247Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. pp.16-17. Anexo 4. 248Protásio Gonçalves (Buenos Aires) ao MRE, 27/12/1938, AHI. “Envia o comunicado enviado à Embaixada, pelo Ministério das Relações Exteriores argentino, informando a posição do Governo Argentino no acordo realizado em Lima”. Anexo 5. 249Pimental Brandão (Washington) ao MRE, 29/12/1938, AHI. “No “Washington Herald”, o Sr. Pierson refere-se à oposição da Argentina ao plano de defesa continental, em Lima, dizendo que tal oposição revelou, pela primeira vez, a luta secreta e diplomática, nesta capital, que vem perdurando há seis anos, consistindo: na corte feita à Argentina pelos EUA à custa da amizade do Brasil; contra tal política, teria o Ministro Aranha protestado vigorosamente, afirmando a Argentina nada mais ser do que uma amizade oportunista dos EUA. O jornalista citou as palavras do Sr. Aranha ao Sub-Secretário de Estado americano: “ O Brasil tem sido secularmente fiel e, entretanto, vocês tomaram uma amante nova e frívola”. O articulista afirma que o Sr. Aranha por 5 vezes protestou sobre a decisão do Departamento de Estado em favor da Argentina. No primeiro caso, sobre os instrutores da aviação militar; no segundo caso, sobre os técnicos navais; no terceiro, sobre a escolha de Buenos Aires para a sede da Conferência de 1936; no quarto, sobre o caso dos destróieres; e, por último, a mais importante, a recusa de Hull em concordar com a venda ao Brasil de trigo subsidiado. Hull curvou-se a correr o risco de ofender os agricultores norte-americanos, tudo ficando bem com a Argentina. Conclui que será interessante observar se a oposição da Argentina, em Lima, vai levar à política da boa vizinhança de Hull, agora inclinado pelo Brasil, a deixar mais isolada, a já solitária Argentina”. 250MRE a Embaixada brasileira em Washington, 28/01/1939, AHI. “O Ministro Oswaldo Aranha irá partir no dia 29/01/1939, com destino a Washington”; Mário da Costa Guimarães (Washington) ao MRE, 30/01/1939, AHI. “Apresenta o protocolo que o Ministro Oswaldo Aranha deverá seguir”.

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defesa do Continente, com os norte-americanos procurando criar mecanismos de

aproximação com o Governo brasileiro.251 Os EUA temiam que os nazistas pudessem

utilizar o Brasil, como base, para ataques à costa norte-americana e também se utilizarem

da grande quantidade de matérias-primas existentes em solo brasileiro. Outro fator

primordial eram as bases do nordeste que seriam imprescindíveis para a manutenção do

comércio marítimo entre as Américas e na proteção contra ataques de submarinos dos

países do Eixo. Dessa forma, Roosevelt procurou junto com o Departamento de Estado

atrair o Brasil para a sua esfera de influência, sem se preocupar com o tipo de governo

instalado por Vargas.

Quando no final de 1937, os militares brasileiros resolveram apoiar o golpe de Vargas,

com a esperança de conseguirem recursos para a compra de armamentos, aumento de

efetivos e investimento na profissionalização das Forças Armadas, a luz vermelha foi

acesa, em Washington, em virtude do teor ditatorial do Estado Novo. Vargas, com muita

astúcia, vinha tentando encontrar uma maneira de permanecer no governo, porém a

Constituição de 1934 o impedia de se reeleger presidente. Aceitou apoiar, com relutância,

como candidato oficial, o paraibano José Américo de Almeida, político ligado à Revolução

de 1930. Insatisfeito com a campanha eleitoral do seu candidato, promoveria junto com as

Forças Armadas e a Ação Integralista Brasileira (AIB) um golpe de Estado. Para justificá-

lo seria criado um plano falso (Plano Cohen)252, onde documentos afirmavam que os

251Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 08/03/1939, AHI. “Na recepção dada, em homenagem, ao Ministro Oswaldo Aranha, o Presidente Roosevelt fez o seguinte discurso: “De conformidade com a recomendação de Vosso Ilustre Presidente, Dr. Getúlio Vargas, meu amigo pessoal, é, também, satisfação genuína, para mim, reiterar o firme desejo do Governo americano de preservar o ideal e a aspiração dos nossos dois governos, através dos quais o povo brasileiro e o dos EUA procuram assegurar o respeito do direito internacional, da ordem e da paz”. Roosevelt salientou, como expressão prática e desejo mútuo de cooperação, a viagem do Ministro Oswaldo Aranha, do qual disse ter sabido conquistar a amizade e a estima de quantos tiveram a ventura de conhecê-lo”. 252Plano “Cohen” – O Capitão Olympio Mourão Filho forjou documentos que acusavam os comunistas de tentarem um golpe contra o Governo. Diante de tal ameaça, Vargas concretizaria o seu projeto de se perpetuar no poder, criando a ditadura do Estado Novo (1937).

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comunistas estavam preparando, com ajuda do Komintern253, tomar o poder em outubro

de 1937. Estava criada a ditadura do Estado Novo que teria a duração de oito anos.

O Estado Novo não era o paradigma político que os norte-americanos gostariam que

existisse no continente sul-americano. O Brasil era um país muito importante do ponto de

vista estratégico e, se o Brasil se associasse às potências do Eixo, o continente

americano ficaria desprotegido, o Atlântico Sul ficaria vulnerável e os fascistas poderiam

utilizar os portos brasileiros como bases de apoio para seus ataques contra a navegação

comercial existente na região. O governo norte-americano ficou ainda mais assustado

quando Vargas proclamou uma nova Constituição (1937) de inspiração fascista, porém, o

que deixou os políticos norte-americanos mais alarmados foi a suspensão, pelo governo

brasileiro, da sua dívida externa. Os banqueiros e industriais norte-americanos

protestaram com o Departamento de Estado exigindo alguma política que garantisse a

continuidade do pagamento da dívida brasileira.

Analisando a gravidade da situação, o Subsecretário de Estado, Sumner Welles, pediu

para que o Embaixador norte-americano no Brasil, Jeferson Caffery, tivesse uma

entrevista com Vargas para verificar a existência de alguma influência dos países do Eixo

na nova política do Estado Novo. Na entrevista, Vargas afirmou que o Estado Novo era

genuinamente brasileiro, sem nenhum apoio de alemães, italianos ou japoneses.254 Disse,

253Ribeiro, Vanderlei Vaselesk (Verbete). Enciclopédia de Guerras e Revoluções do Século XX – Francisco Carlos Teixeira da Silva (Coordenador). Rio de Janeiro, Elsevier, 2004. pp. 511-512. Komintern [Internacional Comunista ou Terceira Internacional (1919-1943)] - Era uma organização, criada sob convocação do Partido Bolchevique Russo, que planejava implantar no mundo a ideologia do comunismo, derrubando a burguesia internacional e estabelecendo uma República Soviética internacional como um passo transitório à completa abolição do Estado. 254Fernando Lobo (Washington) ao MRE, 15/01/1938, AHI. “O “New York Times” sob o título “O Brasil nega a tendência fascista e procura amizades no Continente” publicou a primeira correspondência telegráfica do Jornalista Catledge, contendo o resumo da declaração que lhe foi feita pelo Ministro da Justiça e estampada em sua primeira página. O teor da nota foi o seguinte: “O propósito do Governo brasileiro consiste em envidar todos os esforços, no sentido de provar ao mundo e, particularmente, aos EUA, que o estado

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também, que os integralistas não haviam participado do golpe e que foi obrigado a

permanecer no poder, criando uma nova Constituição255, para evitar uma guerra civil.256

Assegurou que sua política externa com os EUA não sofreria qualquer alteração,

desejando, inclusive, estreitar ainda mais a política do pan-americanismo no Continente.

Diante dessas respostas, Welles e Roosevelt ficaram mais tranqüilos, inclusive,

garantiram ao governo brasileiro que os EUA não aplicariam nenhuma retaliação, caso o

Brasil prejudicasse alguns interesses comerciais e financeiros norte-americanos para

favorecer o desenvolvimento da sua economia.257 A habilidade de Roosevelt evitou que

corporativo estabelecido no país, não é motivado por nenhum espírito fascista e, que não apoiará ideologias que se expressem em opressão racial ou religioso””. 255Fernando Lobo (Washington) ao MRE, 20/01/1938, AHI. “O Jornalista Catledge publicou, no “New York Times”, sua segunda reportagem telegráfica sobre a situação política no Brasil, intitulada “O Brasil livre da influência européia”. Segundo ele, os brasileiros querem demonstrar ao mundo, e especialmente aos EUA, que os atuais acontecimentos não foram influenciados pela ditadura do Presidente Getúlio Vargas, que arrogou poderes jamais exercidos por qualquer outro brasileiro, desde D. Pedro I. Falou numa nova Constituição “feita sob medida para a ocasião”. Afirmou que, com a suspensão ou destruição da velha forma democrática, possivelmente inadequada, inexeqüível e hipócrita, Vargas apresentou-se, ao mundo, como a forma mais audaz de ditador latino-americano. Verificando os acontecimentos anteriores ao golpe de 10/11/1937 e, o que vem se passando no Brasil, torna-se fácil para qualquer observador verificar “que não existe ligação direta entre o novo Estado corporativo e as ditaduras européias”. Apesar de o país estar tecnicamente, em estado de sítio, os cidadãos têm liberdade de ação plena para comentar livremente, em conversas, a atitude de Vargas e do Ministério. Concluiu afirmando, que os brasileiros parecem contentes, depositando a situação, nas mãos “do Homem que afetuosamente chamam Getúlio””. 256Idem. 21/01/1938. “O “New York Times” publicou nova reportagem, de Catledge, sobre o Brasil. O jornalista afirma que a maioria do povo brasileiro está convencida de que, depois de 10/11/1938, tudo melhorou e que ainda há de melhorar. Disse que a decisão de Vargas, dando o golpe de Estado, é aprovada por grande maioria da alta e baixa camada do povo. A campanha eleitoral levou o povo a desgostar-se da política e a desiludir-se do mérito do governo popular, circunstância peculiar ao Brasil. Afirma que o golpe não causou surpresa nem desprazer ao Brasil. O país entrou numa era de tranqüilidade pública, que não conhecia há dez anos. O povo se sente aliviado por saber que o país tem comando, faz pilhéria a respeito do Congresso e conta histórias da incompetência e corrupção dos políticos e, da agudeza de Vargas. O “New York Times” enumera as providências postas em prática por Vargas, em benefício dos interesses do Brasil e a manutenção da paz interna. Diz que ninguém toma a sério a Constituição, considerado documento de conveniência. A correspondência de Catledge é francamente simpática. O “Evening Post”, de ontem, comentou também com simpatia, a situação do Brasil, num tópico intitulado “O Brasil ainda é americano”, elogiando Catledge e considerando-o o mais astuto dos observadores políticos da imprensa de Washington”. 257Idem, 27/01/1938. “A quarta reportagem de Catledge, publicada hoje, refere-se exclusivamente à situação do comércio exterior do Brasil e aos esforços da Alemanha no sentido de conquistar a simpatia e o mercado brasileiros, contrastando com a inércia do governo dos EUA, que permitiu à Alemanha suplanta-lo como o maior exportador para o Brasil. Diz que o representante dos exportadores norte-americanos considera o tratado de comércio entre o Brasil e EUA como “um simples farrapo de papel”. Refere-se à possibilidade de um acordo de compensações, com a Itália e o Japão, e à aquisição de submarinos e aviões italianos, ligando a viagem de Bruno Mussolini ao desejo de fazer propaganda de produtos militares italianos. Menciona a próxima colheita do algodão brasileiro, de dois milhões de fardos, e a sua inevitável influência no comércio com a Itália, Alemanha e Japão”.

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as relações entre os dois países se deteriorassem, levando Vargas258 para os braços do

Eixo.

O ano de 1938 também mudaria o cenário político da Argentina e do Chile. Como falamos

no capítulo anterior, a Argentina elegeu um novo presidente (20/02/1938) que, apesar de

ter sido eleito através de um processo fraudulento, procuraria implementar o liberalismo

na política interna do país, combatendo as fraudes eleitorais nas províncias. Na política

externa implementou uma aproximação com as nações democráticas, sendo ele um

fervoroso anglófilo. Essa mudança na política externa argentina teve boa aceitação no

Departamento de Estado norte-americano, que enviou uma missão aeronáutica para

felicitar o acontecimento.259 É importante frisar que a Argentina era o único país da

América do Sul em dia com as parcelas da dívida externa, contraídas ao Governo norte-

americano. No Chile, a eleição (25/10/1938) seria vencida pela Frente Popular, um pacto

político entre os partidos de esquerda, cujo candidato Pedro Aguirre Cerda260 venceria por

uma margem muito pequena (50,46%) seu adversário. Com a Frente Popular no poder, o

Chile empossaria o primeiro governo composto de partidos marxistas da América Latina

que, logicamente, se aliaria à política externa soviética, apoiando a Alemanha, em função

do Pacto de Não-agressão germano-soviético (23/08/1939), apesar da sua economia

258Idem, 31/01/1938. “Catledge enviou outra reportagem sobre a entrevista com o Presidente Vargas. Diz que Vargas é um homem sagaz, astuto e com grande senso de humor, e sem nenhuma característica exterior dos ditadores. Quanto ao caráter nacionalista do novo movimento, insiste que Vargas, enfaticamente, declara que tal tendência não deve ser entendida como perigosa para os capitais estrangeiros, e que o Brasil, ao contrário, procura a imigração de tais capitais. Diz que a nova Constituição, que Vargas deixa perceber, não deve ser considerada como definitiva. Tem sobre a anterior, a vantagem de não ser cópia do sistema inglês ou do norte-americano: é puramente brasileira e referente às nossas necessidades. Após a publicação destas reportagens de Catledge, a atitude da imprensa norte-americana tem se modificado, sensivelmente, e é, hoje, favorável ao Brasil”. 259Fernando Lobo (Washington) ao MRE, 21/02/1938, AHI. “A imprensa norte-americana se refere, com simpatia geral, a posse do Presidente Ortiz, especialmente, o “New York Times”, que dedica longo telegrama altamente elogioso à Argentina. Afirma que mais de cem aviões de fabricação norte-americana, pertencentes ao Exército argentino, comboiaram os seis aviões, que o Governo norte-americano enviou para saldar o novo governo”. 260Maurício Nabuco (Santiago) ao MRE, 26/10/1938. “O resultado das eleições indica a vitória do Sr. Pedro Aguirre, da Frente Popular”.

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depender, praticamente, do mercado norte-americano. Essa posição seria invertida,

quando o Exército alemão invadiu a Rússia (22/06/1941) e, principalmente, após a

declaração de guerra da Alemanha (11/12/1941) aos EUA.

Quando a guerra foi deflagrada, com a invasão alemã da Polônia (01/09/1939), os países

do Continente americano ficaram apreensivos sobre as conseqüências que poderiam

advir desses acontecimentos e resolveram marcar uma consulta para examinarem a

situação261, em defesa da solidariedade pan-americana.262 O Panamá foi escolhido para a

sede da Primeira Conferência dos Ministros das Relações Exteriores (23-03/09-10/1939),

onde os temas principais seriam: 1)-Criar normas comuns de neutralidade; 2)-Estudar os

meios de manter o Continente em paz; 3)-Melhorar as relações comerciais e defender a

livre navegação do Continente.263

Os trabalhos duraram uma semana e ficaram estabelecidos três pontos fundamentais (ver

Tabela 13) na manutenção da neutralidade do Continente americano, baseando-se na

política de solidariedade americana acordada na Declaração de Lima (1938), além da

instituição de um Comitê Interamericano de Neutralidade264, composta de sete peritos em

Direito Internacional (Argentina, Brasil, Chile, Costa Rica, Estados Unidos, México e

261Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 03/09/1939, AHI. “O Embaixador norte-americano disse-me, confidencialmente, haver feito entrega ao Ministro das Relações Exteriores argentino, de uma comunicação do Governo norte-americano, convidando a República Argentina para, conjuntamente, com Brasil, Chile, Peru, Colômbia, Panamá, México e Cuba, fazerem aos demais países americanos uma consulta, contra o estabelecido na convenção pan-americana para examinar a situação, diante da guerra européia. A consulta indicará, o Panamá, como o ponto de reunião dos Ministros ou dos seus representantes”. 262MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 22/09/1939, AHI. “O MRE apresentou uma proposta, aprovada pelos norte-americanos, ao Governo argentino sobre a proteção das águas territoriais do Continente”. 263MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 18/09/1939, AHI; Idem, 10/10/1939. “MRE informa sobre a posição brasileira sobre o mar continental”. 264Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. p.24. Criação da Comissão Interamericana de Neutralidade, antes de 01/11/1939.

Formatado: Justificado

Excluído: ,

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Excluído: ou

Excluído: .

Excluído: p.27-28

Inserido: p.27-28.

Excluído: Resolução que c

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Venezuela), com base no Rio de Janeiro.265 Um fator discutido na reunião ficou sem uma

solução comunitária266, era o caso de como deveriam tratar os submarinos dos países

beligerantes. Na listagem das normas necessárias para a manutenção da neutralidade

Continental, ficaria a carga de cada país (item 3, letra k), individualmente, como proceder

sobre o problema dos submarinos, uns proibindo a sua entrada nos portos e, outros,

permitindo sob a condição de agirem como uma belonave de superfície267. No final de

1939, o Governo do Panamá encaminhou à Rússia um texto de protesto, assinado por

todas as Repúblicas americanas, com exceção do Chile, pela invasão da Finlândia

(30/11/1939). Sendo o único país americano, cujo governo tem representantes dos

principais partidos de esquerda, não cederia seu ponto de vista, apesar do pedido das

outras repúblicas americanas e, principalmente, do Brasil.268 Por fim, quando os alemães

violaram a soberania e a neutralidade da Bélgica, Holanda e Luxemburgo, o Governo do

Panamá, mais uma vez, em nome das 21 Repúblicas americanas, fez um protesto

conjunto, deplorando o ato agressivo.269

Tabela 13-Principais Declarações da Conferência do Panamá:

265Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 21’10’1939, AHI. “Implementação do Comitê Permanente de Neutralidade”. 266Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 21/10/1939, AHI. “O Governo norte-americano informa que esse conceito deverá ser definido por cada república, individualmente, variando segundo a espécie de embarcação e as circunstâncias”. 267Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 20/09/1939, AHI. “O Governo argentino não faz distinção entre navios de guerra e submarinos, desde que estes naveguem na superfície”. 268MRE a Embaixada brasileira em Santiago, 21/12/1939, AHI. 269Idem a Embaixada brasileira em Berlim, 25/05/1940, AHI.

DECLARAÇÃO DO PANAMÁ 1-DECLARAÇÃO GERAL DE NEUTRALIDADE270 2-DECLARAÇÃO DE NEUTRALIDADE, INSTITUINDO UMA ZONA SEGURANÇA CONTINENTAL271 3-DECLARAÇÃO CONJUNTA DE SOLIDARIEDADE CONTINENTAL272

Formatado: Centralizado,Espaçamento entre linhas: simples

Formatado: Fonte: Negrito,Todas em maiúsculas

Formatado: Fonte: 10 pt,Negrito, Todas em maiúsculas

Formatado: Esquerda,Posição: Horizontal: Centro, Emrelação a: Coluna, Vertical: 0cm, Em relação a: Parágrafo,Horizontal: 0,32 cm, Ao redor

Formatado: Fonte: 10 pt,Todas em maiúsculas

Formatado: Esquerda,Posição: Horizontal: Centro, Emrelação a: Coluna, Vertical: 0cm, Em relação a: Parágrafo,Horizontal: 0,32 cm, Ao redor

Formatado: Fonte: 10 pt,Todas em maiúsculas

Formatado: Esquerda,Posição: Horizontal: Centro, Emrelação a: Coluna, Vertical: 0cm, Em relação a: Parágrafo,Horizontal: 0,32 cm, Ao redor

Formatado: Fonte: 10 pt,Todas em maiúsculas

Tabela formatada

... [1]

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Enquanto isso, os EUA se preparavam para tomar partido na guerra que se iniciava,

apesar da política isolacionista determinada pelo Congresso norte-americano e desejada

pela maioria da opinião pública. Roosevelt sabia que a guerra era a única saída para

retirar, dos EUA, os últimos resquícios da grande depressão mundial. Só com a inversão

de capitais na indústria bélica, seria capaz de ativar todo o potencial que a economia

norte-americana precisava para o seu desenvolvimento pleno. Porém, as leis norte-

americanas impediam que os EUA pudessem vender qualquer tipo de material bélico para

as nações beligerantes, enquanto permanecessem neutros (“Neutrality Act”).273 O Senado

norte-americano mudaria essa lei, aprovando (63 votos contra 30) a venda de

armamentos para que pudesse pagar à vista e carregar (“Cash and Carry”), beneficiando

a Inglaterra e a França contra a Alemanha, mantendo uma aparente imparcialidade norte-

americana.274 A lei, entretanto, proibia que navios mercantes norte-americanos levassem

o material bélico para algum porto beligerante, exceto para os situados nas colônias

européias em águas afastadas da Europa (Atlântico, Pacífico e Oceano Índico).

Com o acirramento da guerra, o grande dilema dos países neutros foi manter-se fora de

qualquer tipo de incidente, causado pelo bloqueio marítimo exercido pelos beligerantes.

Após o término do encontro entre os Chanceleres americanos, ficou estabelecido que o

Governo panamenho enviaria um telegrama para cada país beligerante, informando sobre

as “Zonas de Segurança” determinadas na Conferência.275 A idéia era impedir que fatos

alheios aos interesses continentais pudessem interferir na zona de neutralidade imposta

pela Conferência do Panamá, como os casos: 1)-do cargueiro alemão “Dusseldorff” 270Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. pp.21-25. Anexo 6. 271Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. pp.33-34. Anexo 7. 272Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. pp.17-18. Anexo 8. 273Mário da Costa Guimarães (Washington) ao MRE, 27/09/1940, AHI. 274Idem, 28/10/1939. 275Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. pp.37-38. Os Telegramas foram enviados para Alemanha, França e Grã-Bretanha, e todas responderam terem sido notificadas.

Formatado: Justificado

Excluído: t¶

Excluído: ¶

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atacado pelo cruzador britânico “Despatch” a menos de 20 milhas da costa chilena276; 2)-

do cargueiro alemão “Wakama” interceptado pelo cruzador britânico “Ajax”, perto da

costa brasileira (Cabo Frio)277; 3)-da batalha naval entre o encouraçado de bolso “Graff

Spee” e os cruzadores britânicos “Achiles”, “Ajax" e “Exeter”, perto de Montevidéu, na

entrada do Rio da Prata278, já relatados no capítulo anterior.

O caso mais importante, sem dúvida, foi o combate naval entre o encouraçado de bolso

alemão “Graff Spee” e os três cruzadores britânicos, muito próximos da embocadura do

Rio da Prata. Após um breve, porém intenso, ataque dos navios britânicos, o encouraçado

alemão foi obrigado a entrar no Rio da Prata, bastante danificado279 e com pouquíssimo

combustível, o que levou o seu comandante (Langsdorff) a procurar abrigo no porto de

Montevidéu. Pediu duas semanas para conseguir terminar todos os reparos e, recebeu

um prazo de apenas 72 horas.280 Desta forma, resolveu afundar o navio e levar todos os

seus tripulantes para serem internados na Argentina, com a ajuda do Etappendienst

argentino. Após terminar essa missão, escreveu cartas para familiares e suicidou-se em

um quarto de hotel, em Buenos Aires (20/12/1939).281 O incidente gerou uma série de

correspondências entre as repúblicas americanas, no sentido de tentarem uma atitude

276Djalma Pinto Ribeiro de Lessa (Santiago) ao MRE, 16/12/1939, AHI. “O Governo chileno pede apoio para uma representação coletiva contra os países beligerantes que não respeitam a “Zona de Neutralidade” determinada pela Conferência do Panamá”. 277MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 16/02/1940, AHI. “O MRE enviou um telegrama pedindo uma representação em conjunto, contra a violação praticada pela Marinha Real britânica”. 278Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 14/12/1939, AHI. “Informa a disposição dos Governos americanos em enviar um protesto formal aos beligerantes, protestando contra os três casos relatados”. 279De Nápoli, Carlos. ob. cit. pp 116-127. De Nápoli afirma que os danos existentes no navio alemão eram muito pequenos e que o problema foi a falta de combustível. Diz que o encouraçado estava perto da costa argentina, tentando entrar em contato com os agentes do Etappendienst para obter combustível, pois os navios que tinham sido escalados para lhes fornecer o produto foram afundados pelos britânicos ou estavam sem combustível”. “Outro fato, que corrobora esta hipótese, foi a declaração do Oficial de Artilharia do navio, F. Rasenack, ao documentário do History Channel, “A Batalha do Rio da Prata”, que o sol o impediu de reconhecer as belonaves britânicas, indicando que a embarcação navegava da terra para o mar. 280Carlos Martins pereira e Souza (Washington) ao MRE, 16/12/1939, AHI. “Summer Welles informa que o Uruguai deve tomar a iniciativa para que as Repúblicas americanas tomem uma atitude em conjunto”. 281Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 18/12/1939, AHI.

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conjunta para protestar contra a violação da zona de neutralidade, imposta na

Conferência do Panamá.282 Por fim, o Governo panamenho enviaria um Telegrama de

protesto aos países beligerantes, com a aprovação de todas as Repúblicas americanas.283

Todos responderiam aos telegramas enviados, porém, à medida que a guerra tomava

maiores dimensões, surgiriam as primeiras agressões dentro e fora da zona de

neutralidade americana. Os fatos ocorridos dentro da zona neutra já foram descritos

acima.

Tanto Inglaterra, França e Alemanha tratariam de criar obstáculos para seus inimigos,

imputando um rígido controle contra qualquer tipo de ajuda comercial ou militar que seus

adversários pudessem conseguir de outras nações. Esse bloqueio era legal, estando

dentro das convenções internacionais sobre conflitos bélicos, porém, de difícil aplicação,

por mais que os beligerantes moderassem na sua maneira de agir, em virtude de

imprevistos que poderiam surgir, transformando alguns desses atos em situações de

difícil controle.

O Direito Internacional garantia, aos contendores, o direito de fiscalizar todos os navios,

com destino ao território inimigo ou a portos neutros, podendo apreender qualquer artigo

considerado como contrabando de guerra (armas, munições, combustíveis, máquinas em

geral, gêneros alimentícios, etc.). O material retido poderia ser recuperado ou não, após

julgamento em um “Tribunal de Presas”, subordinado ao Ministério de Economia de

Guerra (“Economic Warface”) de cada país beligerante. França e Inglaterra criaram portos

específicos para a fiscalização de todos os navios mercantes, tentando bloquear qualquer

282MRE a Embaixada brasileira em Washington, 18/12/1939, AHI; Idem, 19/12/1939; Idem a Embaixada brasileira em Berlim, 02/01/1940, AHI. 283Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. pp.39-40. (23/12/1939); MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 28/12/1939, AHI.

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tentativa de apoio aos alemães. Os franceses e britânicos determinaram os seguintes

portos: Brest, Sète (França), Oran (Argélia), Weymouth, Ramsgate, Kirkwall (Inglaterra),

Gibraltar (Espanha) e Haifa (Egito). Após a queda da França (07/1940), os britânicos

resolveram inspecionar todos os navios que se aproximavam da Europa, Mar do Norte e

Mediterrâneo, inclusive utilizando um sistema de controle chamado “navicert”284, um

passe que facilitava aos navios exportadores a passagem, de suas mercadorias, pelo

controle britânico.

A Inglaterra ainda tinha a maior frota naval do mundo e precisava manter as suas rotas de

abastecimentos livres dos ataques perpetrados pelos submarinos (“U-boats”) e navios

corsários alemães. Quando as hostilidades começaram, a Marinha Real tinha no Atlântico

Sul uma Força Naval comandada pelo Comodoro Frank Pegram, que patrulhava a região

utilizando-se de três bases importantes: de Freetown (Serra Leoa), Cidade do Cabo

(África do Sul) e Port Stanley (Ilhas Falkland). A posição geográfica desses portos criou

uma área de patrulhamento, com um formato triangular, onde as belonaves britânicas, em

número bastante reduzido, procuravam eliminar todo o tipo de movimentação inimiga. É

importante frisar que nessa época não existiam bases aéreas capazes de auxiliar a

Marinha Real na vigilância dessa área tão vasta.

Os acontecimentos ocorridos em águas internacionais tiveram como protagonistas a

Inglaterra e o Brasil e esses incidentes quase provocaram o rompimento diplomático entre

eles. Os britânicos começaram a controlar e inspecionar todos os navios que

encontravam dentro de sua zona de patrulhamento. O primeiro incidente ocorreu em

284Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 20/11/1939, AHI. “A Embaixada brasileira foi informada, confidencialmente, pelo Departamento de Estado norte-americano, de que o Governo britânico irá aplicar o sistema “navicert”, com o fim de facilitar o comércio legítimo com as nações neutras, principalmente, com os exportadores norte-americanos”.

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junho de 1940, quando o navio “Almirante Alexandrino”, voltando de Gênova (Itália)285,

carregado com material bélico comprado aos alemães, foi interceptado pelos ingleses e

obrigado a se dirigir a Lisboa. Depois de muita conversa, em virtude de sua carga bélica,

o navio foi liberado, voltando ao Brasil com sua carga intacta. A segunda ocorrência

aconteceu (10/1940) com o navio “Siqueira Campos” que retornava da Europa com cerca

de 400 passageiros e com outra parte do material bélico comprado aos alemães. Este foi

obrigado a aportar em Gibraltar, sob a alegação de transportar material de procedência

alemã, sem o certificado do “navicert” (passe). Verificou-se que a documentação estava

coberta pelo passe, a mercadoria já tinha sido quitada e estava de acordo com o contrato

de importação, de março de 1938, isto é, antes do início da guerra. O navio só seria

liberado depois de muitos contatos diplomáticos entre o Itamaraty, o Governo inglês e

inclusive com a ajuda do Departamento de Estado norte-americano (18/12/1940).286

Mais um incidente aconteceu, quando o navio “Buarque” (27/11/1940), que se achava em

Porto of Spain (Trinidad e Tobago), indo para os EUA, teve parte de sua carga retirada

(38 caixas e 32 fardos) pelas autoridades britânicas. O Itamaraty protestou imediatamente

e o governo inglês, reconhecendo o erro, devolveu a carga retirada com pedidos de

desculpas. O caso seguinte aconteceu quando o cruzador inglês, “Carnavon Caston”,

abordou o mercante “Itapé” (01/12/1940), próximo do litoral brasileiro, retirando de bordo

vinte e dois cidadãos alemães que se dirigiam para o norte do Brasil. O “Itapé” era um

mercante de cabotagem e estava dentro de sua rota normal. Os ingleses alegaram, na

época, que o seu serviço de inteligência havia descoberto que esses elementos eram ex-

marinheiros do encouraçado de bolso “Graf Von Spee”, afundado pelo seu próprio

comandante no Rio da Prata. O Itamaraty pediu explicações formais, pois o Direito

285MRE a Embaixada brasileira em Roma, 05/07/1940, AHI. 286 MRE a Embaixada brasileira em Washington, 16/12/1940, AHI; Idem, 19/12/1940.

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Internacional vedava qualquer beligerante de retirar cidadãos inimigos a bordo de navios

neutros, em alto mar. O Brasil recebeu, mais uma vez, desculpas protocolares do governo

de “Sua Majestade”.

No início do ano seguinte (1941), aconteceria mais outro incidente entre o Brasil e a

Inglaterra, quando esta, deteve o navio “Bagé”, em Lisboa, impedindo que este

transportasse a última carga de armamento importada da Alemanha. Os britânicos não

pretendiam ceder de forma alguma, porém com a forte pressão do governo norte-

americano, acabaram liberando, mais uma vez, o mercante brasileiro. Com a entrada dos

EUA no conflito e, conseqüentemente, o Brasil, após o afundamento de navios brasileiros

pelos alemães, na costa do nordeste, as relações entre o Itamaraty e o Foreign Office

Britânico tornaram-se bem mais amistosas. Inclusive, o Almirante Pegram, da Divisão

Naval Britânica do Atlântico Sul, recebeu relevante ajuda da 4ª Esquadra dos EUA

(Almirante Jonas Howard Ingram), cujo comando incluía as Forças Navais brasileiras,

para o patrulhamento de sua área de atuação no Atlântico Sul.

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3.2-Colocação em Prática da Política Hegemônica dos EUA, no Sul da

América Latina:

Depois da batalha naval no Rio da Prata, o Governo argentino percebeu que seria

necessária uma política mais contundente para manter a neutralidade continental.

Declarações, protestos e telegramas não iriam resolver os problemas causados por uma

guerra, onde os beligerantes não respeitavam nenhum tipo de direito internacional,

principalmente os países do Eixo. Essa posição seria solidificada, logo após os alemães

invadirem a Dinamarca e a Noruega (09/04/1940), sem qualquer aviso prévio. O Ministro

Cantilo estava decidido a deixar a “ficção da neutralidade” e entrar no estado de “não-

beligerante”287, significando que a Argentina manteria a sua neutralidade, tomando as

medidas necessárias para garantir o interesse nacional. Isto é, apoiaria os aliados (França

e Inglaterra), mas manteria o intercâmbio comercial com a Alemanha e Itália. Resolveu

consultar os EUA, ficando profundamente decepcionado, pois os EUA, ainda achavam

que deveriam manter-se neutros288, enquanto se preparavam para a guerra289 e, não

apoiariam a proposta argentina. O Presidente Roosevelt reafirmaria o pan-americanismo

e a política da “paz pela cooperação”, baseada na vontade recíproca da solidariedade em

todo o Continente.290 Não satisfeito, Cantillo procurou o apoio brasileiro para a sua

proposta, porém, mais uma vez, teve a sua solicitação negada.

287Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 13/05/1940, AHI; MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 14/05/1940. 288Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 13/05/1940. 289Idem, 16/05/1940. “Roosevelt solicitou ao Congresso 896 milhões de dólares para a defesa nacional, principalmente, para a produção de aviões, a defesa aérea e o treinamento de pessoal”. 290Idem, 15/04/1940. “Discurso de Roosevelt na comemoração de 50 anos da União Pan-americana: “que um ataque contra uma nação americana equivale a um ataque contra todos, que no caso dos EUA entrarem em guerra, desejaria contar com a colaboração de todos os países americanos””.

Formatado: Justificado

Excluído: s

Excluído: , sobre esta proposta

Excluído: recebendo outra negativa a sua proposta.

Inserido: recebendo outra negativa a sua proposta.

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Após a invasão da Bélgica, Holanda e Luxemburgo (10/05/1940), o Uruguai iria propor um

protesto coletivo contra a Alemanha, reafirmando a posição de neutralidade acordada no

Panamá. Entretanto, a Argentina insistia que o teor da mensagem fosse bastante

agressivo e pediu para mudar o último parágrafo do texto, que dizia: “As Repúblicas

Americanas resolveram, por conseguinte protestar contra os ataques militares dirigidos à

Bélgica, Holanda e ao Luxemburgo, ao mesmo tempo fazendo um apelo para o

restabelecimento da lei, da justiça nas relações entre as nações” para: “As Repúblicas

Americanas, em face destes fatos, reservam plena liberdade de ação para proceder como

parecer melhor em defesa de seus interesses externos e internos”. 291 O Uruguai, apoiado

pelos EUA, insistiu na manutenção original do texto, apesar do protesto argentino que,

nesse momento, tinha o apoio do Brasil.292 O Chile seria o único país sul-americano que

se oporia ao protesto, acreditando que se houvesse uma modificação na sua política de

neutralidade pudesse receber alguma represália dos países do Eixo, aceitando participar

do mesmo, após pressão norte-americana.293 Depois de muitos debates, o Memorando foi

enviado, na íntegra, pelo Governo do Panamá294, que era o representante americano

após a primeira Conferência dos Chanceleres. Os alemães ignoraram o protesto, dando

como resposta: “Como os países europeus, em virtude da Doutrina Monroe, não se

intrometem em pendências interamericanas, não podem, em conseqüência, tornar os

países americanos partido em pendências européias”295, mostrando a ineficácia desse

tipo de procedimento.

291Hilton, Stanley E. “O Brasil e a Crise Internacional (1930-1945)”. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 1977. p.193. 292MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 15/05/1940; Idem, 17/05/1940. 293S. de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 19/06/1940, AHI. “O Governo chileno assinou o decreto de neutralidade na guerra entre Itália, França e Inglaterra”; Hilton, Stanley E. ob. cit. p.194. 294MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 20/05/1940, AHI. 295C. de Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 27/05/1940, AHI; Idem, 07/06/1940.

Formatado: Português (Brasil)

Formatado: Português (Brasil)

Formatado: Português (Brasil)

Excluído: , com o apoio integral dos EUA

Excluído: O

Inserido: O Memorando foi enviado

Excluído: e ignorado pelos

Inserido: e ignorado pelos alemães

Excluído:

Inserido:

Excluído: mostrando a ineficácia desse tipo de procedimento.

Inserido: mostrando a ineficácia desse tipo de procedimento.

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Com a derrota da França e do quase aniquilamento da Força Expedicionária Britânica

(BEF - British Expeditionary Force - 05/1940), em Dunquerque, os países americanos

resolveram, mais uma vez, se consultarem para determinar quais medidas deveriam ser

tomadas em face, principalmente, da possibilidade das colônias européias no Continente,

poderem ser ocupadas por tropas fascistas.296 O local escolhido foi Havana297 e a

Conferência (21-30/07/1940) procurou encontrar um mecanismo capaz de aglutinar todas

as propostas das repúblicas americanas, tomando, sempre por base, a neutralidade e a

solidariedade americana, principalmente, na defesa das colônias européias existentes no

Continente e na tentativa de evitar atividades ou propaganda de elementos externos ao

ideal democrático do Continente298 (ver Tabela 14).

Tabela 14-Principais Pontos da Conferência de Havana:299 PONTOS DA CONFERÊNCIA DE HAVANA

1-DECLARAÇÃO GERAL DE NEUTRALIDADE: a)-exame dos trabalhos realizados pela Comissão Interamericana de Neutralidade (Rio de Janeiro). b)-uniformidade das medidas aplicadas pelas diferentes Repúblicas Americanas para a manutenção da neutralidade no Continente. 2-PROTEÇÃO DA PAZ NO HEMISFÉRIO OCIDENTAL: a)-medidas julgadas necessárias para garantir o “status-quo” das colônias européias no Continente Americano. 3-COOPERAÇÃO ECONÔMICA ENTRE AS REPÚBLICAS AMERICANAS: a)-exame dos trabalhos realizados pelo Comitê Econômico de Washington. b)-atuação do Banco Interamericano (13/05/1940)300 no desenvolvimento das economias das Repúblicas Americanas. 4-DEFESA DAS REPÚBLICAS AMERICANAS CONTRA AGENTES EXTERNOS: a)-medidas para impedir que agentes externos possam atuar dentro do território das repúblicas americanas, criando situações capazes de interferir na estabilidade da região. b)-aprovação de leis, em conjunto, para punir os atos subversivos.

296Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 28/06/1940, AHI. 297MRE a Embaixada brasileira em Washington, 21/06/1940, AHI. 298Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. pp.30-32. Anexo 9. 299Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 27/06/1940, AHI; Idem, 28/06/1940. 300Idem, 13/05/1940; Idem, 01/06/1940.

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Esses pontos seriam muito debatidos, pois apresentavam divergências entre os EUA e a

Argentina que discordava da política de neutralidade e não concordava em se intrometer

na política das nações européias, decidindo se elas eram ou não perigosas ao Continente

americano. Cantilo afirmaria que as Repúblicas americanas só deveriam se reunir,

quando algum acontecimento grave surgisse e prejudicasse a soberania americana.

Também, qualquer intervenção militar, realizada nas colônias européias, deveria ser uma

ação conjunta em benefício dos atuais possuidores dessas colônias, sendo a intervenção,

unicamente, de forma temporária.301 O Chile não concordaria com as propostas

argentinas, reafirmando a política de solidariedade continental contra a auto-determinação

das repúblicas americanas, apoiando a sugestão norte-americana sobre o mandato de

restrição ao direito das possessões européias, em defesa do Continente.302 O Brasil

continuaria com a sua política de solidariedade pan-americana303, com apenas uma

ressalva, em relação às colônias européias. A tutela deveria ser exercida por uma única

República, inclusive, sendo ela responsável pelos ônus de tal intervenção.304 Depois de

algumas discussões, a Conferência de Havana teria um desfecho rápido, com a

aprovação unânime de seus representantes.305

Os EUA mantinham-se neutros através da política de solidariedade pan-americana, mas

se preparavam para a guerra, convocando os reservistas (09/1940), aumentando a

produção bélica306 e, principalmente, apoiando irrestritamente a Grã-Bretanha307, que

estava sozinha lutando com os países do Eixo, após a queda da França. Cada vez mais,

301José de Paula Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 2/07/1940, AHI; MRE a Embaixada brasileira em Washington, 20/07/1940, AHI. 302S. de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 26/07/1940, AHI. 303MRE a Embaixada brasileira em Washington, 28/06/1940, AHI. 304MRE a Embaixada brasileira em Washington, 18/07/1940, AHI. 305Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. pp.27-30. 306Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 01/06/1940, AHI. “O Presidente Roosevelt solicitou, ao Congresso, mais de um bilhão de dólares de crédito adicional para a produção de material bélico”. 307Idem, 12/06/1940.

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cometia atos contrários à sua neutralidade, patrulhando o Atlântico Norte fora da zona de

neutralidade, protegendo comboios de navios mercantes britânicos levando produtos

norte-americanos, cedendo velhos destróieres308 (50) para a Inglaterra, em troca do

arrendamento, por 99 anos, de bases britânicas no Caribe e Terra Nova.309 Forças

militares norte-americanas ocuparam a Groenlândia, a Islândia310 e, por fim, assinando

um acordo de defesa mútua com o Canadá.311

Em 1941 (03/1941), o Congresso norte-americano iria aprovar (60 votos contra 31) a Lei

de Empréstimo e Arrendamento (“Lend and Lease”)312 que iria ajudar militarmente a Grã-

Bretanha que, naquele momento, estava completamente falida, com o envio de uma

grande quantidade de material bélico. Em troca, os britânicos iriam dissolver o sistema de

“Preferência do Império” (“Imperial Preference”) em suas colônias, para permitir que os

EUA pudessem entrar nesse mercado promissor (“Open Door”).313 O sistema “Lend and

Lease” seria estendido ao mundo inteiro (China, Rússia) e, inclusive, na América Latina.

Brasil e Chile seriam favorecidos pelo ato, enquanto o Brasil receberia mais de 70% dos

investimentos destinados para a América do Sul, o Chile receberia uma quantidade muito

pequena, causando um profundo mal estar entre os políticos chilenos e os EUA. A

Argentina, devido a sua atitude em não apoiar a política pan-americana, ficaria privada

desses empréstimos.

Com a disposição de Roosevelt de participar da guerra, mesmo contra a política

isolacionista da maioria do povo norte-americano, os conflitos com os países do Eixo

308C. de Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 05/09/1940, AHI. “O Governo alemão protesta contra o arrendamento dos 50 destróieres norte-americanos à Grã-Bretanha”. 309Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 17/08/1940, AHI. 310Idem, 03/09/1940. 311Idem, 19/08/1940; Idem, 23/08/1940. 312Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 08/03/1941, AHI. 313Bandeira, Luiz Alberto Moniz. “Formação do Império Americano – da Guerra Contra a Espanha à Guerra no Iraque”. ob. cit. p. 115.

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começaram a se multiplicar. Os norte-americanos iriam bloquear os créditos alemães e

italianos nos EUA e fechariam todos os Consulados, agências de propaganda,

publicidade e de viagem alemães, em território norte-americano (06/1941), alegando que

essas instituições estavam exercendo atividades não compatíveis com as suas

atividades.314 Também, iriam protestar ao afundamento do cargueiro norte-americano

“Robin Merr”, atacado por um submarino alemão no Atlântico Sul, alegando que o ataque

era um ato de pirataria contra todas as leis internacionais.315

É preciso salientar que, desde o início da guerra, a posição de neutralidade norte-

americana era uma fachada para ocultar uma guerra que estava sendo travada,

principalmente com a Alemanha, em surdina, longe dos holofotes da mídia e do

conhecimento da maioria das nações. A Marinha norte-americana, quando encontrava

navios mercantes alemães, repassavam suas coordenadas aos navios aliados e estes,

freqüentemente, os afundavam. O patrulhamento do Atlântico Norte seria ampliado

(06/1941) com o encouraçado “Texas” e suas belonaves de apoio chegando muito

próximos das ilhas britânicas, impedindo que submarinos alemães atacassem os

comboios aliados na região. O “Texas” seria atacado (20/06/1941) por um submarino

alemão (U-203), mas para a sua sorte, o torpedo errou o alvo.316 Quando da ocupação da

Islândia por tropas norte-americanas (07/1941)317, Hitler ordenou aos seus submarinos

que se certificasse que suas presas navais eram realmente de navios aliados, evitando

qualquer conflito com belonaves norte-americanas.318

314Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 16/06/1941, AHI. 315Idem, 16/06/1941; Idem, 21/06/1941, AHI. 316Mason, David. “História Ilustrada da Segunda Guerra Mundial - Submarinos Alemães (A Arma Oculta)”. Rio de Janeiro. Editora Renes, 1975. pp.63-66. 317Idem, pp.63-66; C. de Freitas Valle (Berlim) ao MRE, 09/07/1941, AHI. “Protesto do Governo alemão a ocupação norte-americana da Islândia, colocando tropas na zona de guerra”. 318Mason, David. ob. cit. pp.63-66.

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Em setembro (04/09/1941), o destróier “Greer”, em conjunto com um avião da RAF (Royal

Air Force) atacaria um submarino alemão (U-652), que contra-atacaria, também errando o

alvo.319 Após esse incidente, a Marinha norte-americana recebeu ordens de capturar ou

destruir qualquer submarino dos países do Eixo, considerados a partir de então, como

“piratas”, criando uma “guerra não declarada”320 entre os EUA e os países do Eixo.321 A

situação iria piorar, quando os comboios com destino à Islândia e à Terra Nova

começaram a ser escoltados pelos navios norte-americanos, que argumentavam estarem

defendendo suas rotas de apoio a suas bases na região.322 Finalmente, em outubro,

aconteceu o esperado, quando submarinos alemães atacaram dois destróieres norte-

americanos que comboiavam navios mercantes aliados com destino à Inglaterra. No

primeiro ataque (10/10/1941), o destróier “Kearney” ficaria danificado, sendo obrigado a

retornar à sua base de apoio323 e, no segundo, o destróier “Reuben James” seria

afundado, após errar o seu ataque ao submarino inimigo (U-552).324 Roosevelt

protestaria, declarando “que a conduta do submarino alemão foi um ato de pirataria,

contrária a todas as leis internacionais que exigem respeito aos navios neutros”.325

Entretanto, omitiu a verdade ao não afirmar que o destróier estava protegendo um

comboio de navios mercantes aliados, em posição de combate, descumprindo a lei de

neutralidade internacional. Começavam os atritos entre norte-americanos e germânicos

que redundaria na declaração de guerra da Alemanha aos EUA, em 11 de dezembro de

1941. Por fim, Roosevelt e Churchill iriam discutir a “Carta do Atlântico” (09-12/08/1941),

319Mason, David. ob. cit. pp.63-66; Bandeira, Luiz Alberto Moniz. “Formação do Império Americano – da Guerra Contra a Espanha à Guerra no Iraque”. ob. cit. p. 125. 320P. Leão Velloso (Roma) ao MRE, 31/12/1940. 321Mason, David. ob. cit. pp.63-66; Bandeira, Luiz Alberto Moniz. “Formação do Império Americano – da Guerra Contra a Espanha à Guerra no Iraque”. ob. cit. p. 126. 322Idem, pp.63-66; Idem, p.141. 323Idem, pp.63-66; Idem, p.126. 324Mason, David. ob. cit. pp.63-66; Idem, p.126. uboat.net 325Mason, David. ob. cit. pp.63-66.

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na conferência realizada no encouraçado britânico “Prince of Wales”, na costa da Terra

Nova, Canadá. Os EUA e a Grã-Bretanha começariam a estudar uma nova ordem

mundial, baseada em oito pontos fundamentais (ver Tabela 15), com a divulgação da

Carta em 14 de agosto de 1941. Quase um mês depois (24/09/1941), vários países

aderiram aos princípios da Carta (ver Tabela 16). O Brasil e Chile iriam aprovar os

princípios, respectivamente, em 08/02/1943 e 12/02/1945.326 Seria o início da instauração

da Organização das Nações Unidas (ONU).

326Bandeira, Luiz Alberto Moniz. “Formação do Império Americano – da Guerra Contra a Espanha à Guerra no Iraque”. ob. cit. p. 115-116; Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob.cit. pp.223. www.direitoshumanos.usp.br/counter/Doc_Histo/texto/Declaracao_nacoes.html. 327 www.direitoshumanos.usp.br/counter/Doc_Histo/texto/Declaracao_nacoes.html.

Tabela 15-Principais Pontos da Carta do Atlântico:327 PONTOS CARTA DO ATLÂNTICO

1 Nenhum ganho territorial seria buscado pelos EUA ou pela Grã-Bretanha; 2 Modificações territoriais devem estar de acordo com os desejos livremente expostos

pelos povos atingidos; 3 Respeitam o direito de todos os povos de escolherem a forma de governo sob a qual

querem viver e desejam que se restituam os direitos soberanos e a independência aos povos que deles foram despojados pela força;

4 Se empenharão para que todos os estados, grandes ou pequenos, vitoriosos ou vencidos, tenham acesso em igualdade de condições ao comércio e às matérias primas do mundo de que precisem para a sua prosperidade econômica;

5 Desejam promover, no campo da economia, a mais ampla colaboração entre todas as nações, com o fim de conseguir, para todos, melhores condições de trabalho, prosperidade econômica e segurança social;

6 Depois da destruição completa da tirania nazista, esperam que se estabeleça uma paz que permita a todas as nações os meios de viver em segurança dentro de suas próprias fronteiras e, aos homens, em todas as terras, a garantia de existências livres de temor e de privações;

7 Essa paz deverá permitir a todos os homens cruzar livremente os mares e oceanos; 8 Acreditam que todas as nações do mundo, por motivos realistas assim como espirituais,

deverão abandonar todo o emprego da força, estabelecendo um sistema mais amplo e duradouro de segurança geral.

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A pressão norte-americana, com o apoio da Grã-Bretanha e Holanda, contra o Japão,

vinha tornando-se cada vez mais intensa, principalmente após o embargo econômico

(25/07/1941), que culminou com o congelamento de todo os bens japoneses nesses

países, além do fechamento de todo tipo de comércio com o Japão. Com o embargo

comercial do petróleo norte-americano, fundamental para a continuação da sua política

expansionista na China, colocou a máquina de guerra japonesa em cheque mate. Como

manter as regiões conquistadas e continuar lutando sem o petróleo norte-americano? O

Japão ficaria sem opção, devendo decidir entre a renúncia de tudo que havia conquistado,

com muito custo material e humano, na China e Manchúria, ou atacar as Índias Orientais

328Declaração das Nações Unidas – Biblioteca Virtual de Direitos Humanos www.direitoshumanos.usp.br/counter/Doc_Histo/texto/Declaracao_nacoes.html.

Tabela 16-Países que Aderiram a Carta do Atlântico:328 Número País Data Número País Data

1 Arábia Saudita 01/03/1945 23 Honduras 24/09/1941 2 Austrália 14/09/1941 24 Índia 24/09/1941 3 Bélgica 24/09/1941 25 Irã 10/09/1943 4 Bolívia 27/04/1943 26 Iraque 16/02/1942 5 Brasil 08/03/1943 27 Iugoslávia 24/09/1941 6 Canadá 14/09/1941 28 Libéria 26/04/1944 7 Chile 12/02/1945 29 Luxemburgo 24/09/1941 8 China 24/09/1941 30 México 05/06/1942 9 Costa Rica 24/09/1941 31 Nicarágua 24/09/1941 10 Cuba 24/09/1941 32 Noruega 24/09/1941 11 Egito 27/02/1945 33 Nova Zelândia 14/09/1941 12 Equador 07/02/1945 34 Panamá 24/09/1941 13 Estados Unidos 14/09/1941 35 Paraguai 12/02/1945 14 Etiópia 28/07/1942 36 Peru 11/02/1945 15 Filipinas 10/06/1942 37 Polônia 24/09/1941 16 França 26/12/1944 38 República Dominicana 24/09/1941 17 França Livre* 24/09/1941 39 Rússia 24/09/1941 18 Grã-Bretanha 14/09/1941 40 São Salvador 24/09/1941 19 Grécia 24/09/1941 41 Tchecoslováquia 24/09/1941 20 Guatemala 24/09/1941 42 União Sul Africana 14/09/1941 21 Haiti 24/09/1941 43 Uruguai 23/02/1945 22 Holanda 24/09/1941 44 Venezuela 16/02/1945

*Observação: A França Livre sob a liderança de Charles de Gaulle aderiu a Carta (09/1941), ainda durante a ocupação alemã, posteriormente, com a libertação de Paris e de quase todo território francês, o governo provisória iria aderir a Carta do Atlântico (12/1944).

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Holandesas, uma fonte excepcional de petróleo na região, porém, para isso, seria

necessário atacar os EUA e a Grã-Bretanha. Os ingleses estavam muito ocupados com

os alemães e italianos, na Europa e no Mediterrâneo, dessa forma, muito enfraquecidos

para oporem qualquer resistência significativa. O Governo holandês era um agregado dos

ingleses, após a sua derrota para os alemães, restando apenas os EUA.

O gigante americano era um adversário de peso e, seria necessário uma operação capaz

de colocá-lo em desvantagem estratégica, por um longo período, enquanto se realizasse

a conquista do petróleo das Índias Orientais Holandesas. Decidiram, então, atacar a base

naval norte-americana de Pearl Harbour, na tentativa de eliminar a maior esquadra

adversária na região. Enquanto os preparativos militares eram realizados, na frente

diplomática, os japoneses continuariam conversando com os EUA para resolverem os

problemas do embargo econômico e comercial, procurando uma solução pacífica para o

problema. O que eles não sabiam era que o Código Naval japonês (NJ-25 ou “Purple”)

havia sido quebrado pelos criptógrafos norte-americanos, através da operação “Magic”. A

“Magic” captaria diversas mensagens enviadas pelo Governo japonês (3-5/12/1941) às

suas delegações diplomáticas nos EUA e Havaí, indicando que os japoneses estavam

preparando um ataque iminente. Com o endurecimento dos norte-americanos no setor

diplomático, estendendo as negociações, os japoneses aceleraram o projeto bélico

(“Tora, Tora, Tora”)329. Com essas informações, Roosevelt e seus conselheiros sabiam

que um ataque aconteceria e não tomaram as medidas necessárias para impedi-lo. O

ataque aconteceu na manhã de 7 de dezembro de 1941, antes do Embaixador japonês

entregar a declaração de Guerra ao Departamento de Estado norte-americano. EUA e

Japão estavam em guerra a partir deste momento. Com o ataque japonês a Pearl

Harbour, os norte-americanos tiveram que sair da inércia do isolacionismo e se

329Tora, Tora, Tora – Palavra código para o ataque japonês à base norte-americana de Pearl Harbour no Havaí.

Excluído: O Ministro Aranha informa que enviou um telegrama à Delegação brasileira, recomendando-lhe coordenar esforços no sentido de fazer vingar o projeto do mar continental. A objeção argentina quanto à dificuldade do patrulhamento parece secundária, pois em plano de tão vasto alcance, o importante seria:¶1-Obter unanimidade das nações americanas em relação ao projeto. ¶2-O seu reconhecimento pelos beligerantes.¶Quanto a efetividade do patrulhamento, ele é impossível não só para as nações latino-americanas mas para qualquer potência naval, por mais poderosa que seja. O efeito que se deseja obter é, sobretudo, moral, demonstrando a unidade do pensamento continental. ¶¶Aranha gostaria de saber, discretamente, se a Argentina, de acordo com os compromissos assumidos na Conferência do Panamá, já iniciou ao patrulhamento da sua costa ou se limita a exercer vigilância na zona usual de três milhas.¶¶¶¶

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prepararem para a guerra, inclusive contra os alemães e italianos, após Hitler e Mussolini

declararem guerra aos EUA.

Após o ataque, os norte-americanos pediriam uma nova reunião dos países americanos

para deliberarem sobre a entrada dos EUA na guerra e, sobre uma política de

solidariedade pan-americana mais enérgica contra os países do Eixo. A III Conferência

dos Chanceleres Americanos330 seria realizada no Rio de Janeiro (15-28/01/1942)331,

diferindo completamente das anteriores, onde os norte-americanos propuseram, de

imediato, o rompimento integral de todas as Repúblicas americanas com as potências do

Eixo (ver Tabela 17). Até o início da conferência, onze países americanos (Canadá, Costa

Rica, Cuba, El Salvador, EUA, Guatemala, Haiti, Honduras, Nicarágua, Panamá e

República Dominicana) haviam declarado guerra e três, rompido relações diplomáticas

(Colômbia, México e Venezuela) com a Alemanha, Itália e Japão332, com os demais

países americanos ficando solidários aos EUA.

330Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. pp.12-13. Anexo 10. 331MRE a embaixada brasileira em Berlim, 20/12/1941, AHI. “A inauguração da III Conferência será no dia 15/02/1942”. 332Idem, 10/01/1942, AHI.

Tabela 17-Principais Recomendações da Conferência do Rio de Janeiro:333 RECOMENDAÇÕES DA CONFERÊNCIA DO RIO DE JANEIRO

1-As Repúblicas Americanas consideram qualquer ato de agressão de um Estado extracontinental contra uma delas, como agressão contra todas, constituindo ameaça imediata à liberdade e independência da América; 2- As Repúblicas Americanas reafirmam completa solidariedade e sua determinação de cooperarem, todas juntas, para sua proteção recíproca, até que os efeitos da presente agressão, contra o Continente, tenham desaparecido; 3- As Repúblicas Americanas, seguindo processos estabelecidos em suas próprias leis e dentro da posição e circunstância de cada país no atual conflito continental, recomendam ruptura nas suas relações diplomáticas com Japão, Alemanha e Itália, tendo o primeiro desses Estados agredido e, os outros dois declarado guerra a um país americano; 4- As Repúblicas Americanas declaram que só acontecerá o restabelecimento das relações, descritas no parágrafo anterior, se houver uma consulta entre si, mantendo o caráter solidário da resolução.

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O Governo argentino afirmaria que manteria a sua neutralidade e consideraria os EUA

como um país não beligerante, marcando uma reunião com os Ministros das Relações

Exteriores de Chile, Paraguai e Peru para apoiarem a sua posição de alterarem o mínimo

possível os princípios gerais de neutralidade benevolente para com os EUA. O Peru, a

princípio, aceitaria a proposta argentina e o Paraguai ficaria em “cima do muro”, não

querendo declarar guerra às potências do Eixo, nem manter-se dentro da neutralidade

argentina. Por fim, o Chile preferia aguardar os acontecimentos do encontro, no Rio de

Janeiro, para tomar uma definição definitiva.334 É importante frisar que, a Argentina estava

em litígio diplomático com a Alemanha, em função das investigações realizadas pela

Comisión de Investigación de las Actividades Antiargentinas (CIAA) sobre a participação

do Embaixador alemão, Von Thermann, em atividades contra a soberania argentina (ver

Capítulo 2.1), que originou a troca dos respectivos embaixadores.335 Para evitar ações

violentas contra essa atitude e qualquer manifestação contrária aos EUA336, foi instituído o

“Estado de Sítio”337 (16/12/1941) no país.338

Apesar do estado de emergência, uma grande parte da opinião pública argentina preferia

que o governo concordasse com a política norte-americana, rompendo relações com os

países do Eixo, porém, havia um grupo considerável contrário a essa política e que cada

vez mais se imiscuía dentro da política governamental.339 À medida que, o Presidente

Ortiz ficava impossibilitado de governar devido a sua saúde delicada (diabetes), esse

333MRE a embaixada brasileira em Berlim, 24/01/1942, AHI; Idem a Embaixada brasileira em Roma, 24/01/1941, AHI; Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. Rio de Janeiro. Ob. cit. p.11. 334Heitor Lyra (Buenos Aires) ao MRE, 08/01/1942, AHI. 335Heitor Lyra (Buenos Aires) ao MRE, 30/12/1941, AHI. 336José de Paula Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 16/12/1941, AHI. 337“Estado de Sítio é uma abordagem de governo decretada pelas autoridades competentes em situações de emergência nacional em oposição ao Estado de Direito”. 338José de Paula Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 16/12/1941, AHI. “Foi decretado o “Estado de Sítio” em toda a Argentina”. 339Heitor Lyra (Buenos Aires) ao MRE, 20/01/1942, AHI.

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grupo, formado, principalmente por militares nacionalistas (GOU), começaria a manobrar

a política argentina para o lado da Alemanha. Ortiz iria renunciar ao seu mandato, devido

ao agravamento da sua doença340 e seria substituído pelo Vice-Presidente Ramón

Castillo.341

O Brasil era favorável à proposta norte-americana, mas sabia que, com a relutância da

Argentina em aceitá-la, colocaria as fronteiras no sul do país vulneráveis a algum tipo de

intervenção, financiada por elementos fascistas. Vargas afirmaria que só assinaria a

resolução norte-americana se os argentinos também o fizessem. Depois de muita pressão

e discussões, os argentinos aceitaram assinar a resolução, que recomendava e não

obrigava as Repúblicas americanas a romperem relações diplomáticas com os países do

Eixo. Apesar desse problema ter sido solucionado, os militares brasileiros continuavam

indecisos, pois temiam represálias alemãs se o país rompesse as relações diplomáticas e

comerciais com a Alemanha. Vargas acabaria aceitando a proposta norte-americana e o

Brasil romperia as relações diplomáticas com a Alemanha, Itália e Japão em 28 de janeiro

de 1942.342 Portugal iria representar os interesses brasileiros nesses países343 e a

Espanha ficaria encarregada dos interesses alemães e japoneses no Brasil.344 Por fim, a

Suíça seria a protetora dos interesses italianos em terras brasileiras.345

O Governo chileno iria para a conferência, muito preocupado, com a atitude que deveria

tomar no Rio de Janeiro. Não queria romper relações diplomáticas, nem declarar guerra

340Cansado e enfermo, em virtude de uma diabete crônica, Ortiz perderia a batalha contra as forças fascistas e reacionárias que existiam na política argentina, vindo a falecer em julho de 1942. 341J. P. Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 24/04/1942, AHI. 342MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 28/01/1942, AHI; Idem a Embaixada brasileira em Roma, 08/01/1942, AHI; 342Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob.cit. pp. 22-23, 28-30. 343MRE a Embaixada brasileira emberlim, 21/01/1942, AHI; Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. p.36. 344Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. p.36. 345Ministério das Relações Exteriores. “O Brasil e a Segunda Guerra Mundial”. ob. cit. 38.

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aos países do Eixo.346 Suas Forças Armadas estavam desarmadas e despreparadas para

defender o país de um ataque japonês ou alemão, temendo, principalmente, retaliações à

sua marinha mercante. Era favorável à manutenção da unanimidade nas resoluções da

solidariedade continental, mas, devido à sua debilidade militar agiria contra essa

política347, apoiando a proposta argentina de neutralidade. O Chile só mudaria de posição

quando o Governo norte-americano enviou ajuda financeira para aquisição de material

bélico, através do sistema “Lend and Lease”, para o rearmamento das suas Forças

Armadas e, principalmente após a visita do Chanceler chileno a várias Repúblicas

americanas para analisar a posição de cada governo348, em relação ao rompimento com

as potências do Eixo. Só os argentinos iriam tentar dissuadi-lo a não romper relações

diplomáticas com a Alemanha, Itália e Japão.349 O Governo iria romper suas relações

diplomáticas com esses países em 20 de janeiro de 1943350, deixando a Suíça como

encarregada de seus interesses, nos respectivos países.351

As Repúblicas americanas iriam aproveitar a Conferência do Rio de Janeiro para

resolverem o litígio secular de fronteiras entre o Peru e o Equador. A solução foi decidida

com o recuo das forças militares peruanas para a posição anterior, mantendo o “status-

quo” da região.352 A ratificação do protocolo de paz, amizade e limites entre os dois

países foi celebrado no dia 01 de abril de 1942.353

346S. de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 05/01/1942. 347Idem, ao MRE, 20/01/1942, AHI; J. de Paula Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 21/02/1942, AHI. 348MRE a Embaixada brasileira em Santiago, 01/10/1942, AHI. 349S. de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 12/01/1942, AHI. 350Idem, 20/01/1943. 351Idem, 20/01/1943. 352MRE a Embaixada brasileira em Washington, 13/12/1941; Carlos Martins Pereira e Souza (Berlim) ao MRE, 29/01/1942, AHI. 353Idem, 01/04/1942.

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3.3-O Apoio Financeiro para o Rearmamento das Forças Armadas da

América Latina:

Quando os EUA perceberam que a Alemanha e Itália estavam cooptando os militares

latino-americanos (1938), convidando-os para participarem de cursos de aperfeiçoamento

em suas instituições militares e oferecendo material bélico através do sistema aski de

compensação, resolveram agir para fortalecer sua posição na região.354 Criariam uma

política de assistência militar (10/01/1938), com o oferecimento de um intercâmbio de

missões militares e abrindo as portas de suas escolas para que os oficiais latino-

americanos pudessem estudar. A Argentina seria uma das primeiras beneficiadas dessa

política de boa vizinhança norte-americana, que buscava impedir que as Forças Armadas

argentinas fossem arregimentadas pelo fascismo, desestabilizando a política pacifista do

Continente americano.355 O Brasil seria o maior prejudicado, na ocasião, pois, para se

aproximar dos argentinos, o Governo norte-americano vetou a venda de navios de guerra

(destróieres) para o Brasil, após a alegação argentina de que essa transferência

desestabilizaria a paridade existente entre as duas marinhas sul-americanas (ver Capítulo

2.3).

Assim, os militares brasileiros começaram a desconfiar da política norte-americana para a

região e resolveram comercializar com os fascistas o armamento de que tanto

necessitavam para aparelhar suas Forças Armadas. Além disso, os preços dos

armamentos norte-americanos eram muito superiores aos dos alemães e italianos e só

poderiam ser adquiridos através de moeda corrente. O Brasil resolveu comprar o material

354Pimentel Brandão (Washington) ao MRE, 23/05/1938, AHI. “Sumner Welles alegou que a Alemanha e Itália faziam os mais sedutores oferecimentos à Argentina, quanto a instrutores e material de aviação, chegando à Itália propor, gratuitamente, a cessão de instrutores”. 355Idem, 23/05/1938.

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bélico de que tanto necessitava, na Europa: navios, na Inglaterra; submarinos, na Itália;

artilharia, na Alemanha e armas leves (infantaria), na Tchecoslováquia (ver Capítulo 2.3).

A compra de maior vulto seria com a fábrica alemã “Krupp”, fornecedora de canhões (88 e

105 mm) e de suas plataformas motorizadas (03/1938). Foi por causa desse material,

comprado na Alemanha e com o início das hostilidades, o Brasil teria uma série de

entreveros com a Inglaterra e só conseguiria recebê-lo com a ajuda da diplomacia norte-

americana (ver capítulo 3.1).

Em maio de 1939 (25/05/1939), George Marshall, Chefe do Estado-Maior do Exército

norte-americano, viria ao Brasil para avaliar as Forças Armadas brasileiras e traçar um

plano de defesa continental, levando o General Góes Monteiro como convidado, na volta

para os EUA. Após várias reuniões em Washington, ficou claro para os militares norte-

americanos que o maior problema das Forças Armadas brasileiras era equipamento

militar. Uma minuta de contrato de cooperação militar foi assinada, porém nada foi feito

nos anos seguintes, pois os EUA estavam sob a Lei de Neutralidade (“Neutrality Act”) e

não podiam fornecer armas a países estrangeiros.

Com o início das hostilidades na Europa, os norte-americanos mudariam a sua política de

ajuda militar ao Continente. À medida que as tropas nazistas não encontravam

adversários na Europa, destruindo todos os exércitos que lhe faziam frente, com exceção

da Inglaterra, as Repúblicas americanas buscariam o caminho da neutralidade, utilizando-

se da política de solidariedade pan-americana para se afastarem do conflito europeu.

Porém, como vimos anteriormente, a neutralidade não significava que estariam livres de

qualquer adversidade ocasionada pela guerra, como os acontecimentos futuros

demonstrariam. Navios de diversos países americanos seriam afundados e havia a

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ameaça de que os fascistas pudessem ocupar as colônias européias no Continente

americano.

O Governo norte-americano, enquanto neutro, ajudaria a Grã-Bretanha contra os países

do Eixo, fornecendo armamentos e suprimentos diversos, recebendo em troca o

arrendamento de bases navais no Caribe e Terra Nova. Em 1941 (08/03/1941), o

Congresso norte-americano aprovaria a lei de “Empréstimo e Arrendamento” (“Lend and

Lease”) para auxiliar os ingleses que se encontravam completamente combalidos

economicamente, estendendo essa política de empréstimo para os países latino-

americanos, no ano seguinte (1942).

Após a Conferência do Rio de Janeiro, os EUA iriam aumentar a sua participação militar

no Continente, com Roosevelt pedindo a Vargas, permissão para o envio de militares

norte-americanos para as bases do Norte/Nordeste (Belém, Natal e Recife), que estavam

sendo construídas pela “Pan-American Airways” (PAA), alegando que os EUA não

poderiam utilizar a rota do Mediterrâneo para ajudar os britânicos, e que era

imprescindível aos vôos, com destino à África, uma escala em Natal. Com a aquiescência

do governo brasileiro, militares norte-americanos começaram a desembarcar no nordeste

brasileiro, concretizando o acordo aprovado, no ano anterior (05/1941), para a instalação

de bases militares norte-americanas na região. O Brasil queria limitar o número de

militares norte-americanos nas bases cedidas no Nordeste356, preferindo que

especialistas e técnicos ajudassem os brasileiros na construção das mesmas e que elas

fossem operadas, em sua maioria, por militares brasileiros.357 Porém, com a guerra se

aproximando do continente, com os ataques de submarinos alemães no Atlântico Sul e

356MRE a Embaixada brasileira em Washington, 24/12/1941, AHI. 357MRE a Embaixada brasileira em Washington, 06/05/1941, AHI.

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em função da importância estratégica do saliente nordestino, o número de militares norte-

americano aumentou consideravelmente, sendo autorizado pelo Governo brasileiro, que

três companhias de fuzileiros navais fizessem o patrulhamento das bases militares em

Belém, Natal e Recife, além de pilotos e elementos da Marinha norte-americana.

Roosevelt proporia a Vargas um acordo militar para o patrulhamento da Guiana

Holandesa (Suriname) com o Brasil, enviando tropas, em conjunto com os EUA, para a

proteção das minas de bauxita da região.358 Como a participação brasileira no Suriname,

ficaria mais fácil convencer o Governo brasileiro da necessidade de aumentar os efetivos

militares norte-americanos em solo brasileiro, principalmente agora que o Governo de

Vichy havia feito um acordo com os alemães para que estes utilizassem Dakar como base

para seus submarinos, acordo que não vingaria, em função dos esforços realizados pelos

norte-americanos com os militares franceses ligados a De Gaulle. O Estado-Maior

brasileiro declinou do convite, informando não estar preparado para auxiliar as forças

norte-americanas no Suriname. É importante afirmar que, após o rompimento das

relações diplomáticas com a Alemanha e Itália, o Brasil perderia 13 navios mercantes (ver

Tabela 12), até o ataque perpetrado por submarinos alemães na costa brasileira, em

agosto de 1942.

Em 1942 (07/08), o Almirante Karl Doenitz, comandante da Força de Submarinos alemã

(U-boats), ordenou uma ofensiva contra navios brasileiros, como represália a ataques

realizados por aviões da FAB aos submarinos alemães no Atlântico Sul. Enviou o U-507

para atacar navios mercantes ao largo da costa brasileira. O ato de represália do U-507

afundaria, em poucos dias (15-19/08/42), cinco mercantes e um veleiro, matando 607

pessoas. Essa provocação alemã gerou uma grande repercussão de repúdio e ódio na

358MRE a Embaixada brasileira em Roma, 26/11/1941, AHI.

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opinião pública brasileira, que o governo de Getúlio Vargas foi instado a declarar guerra

ao Eixo, em 31 de agosto de 1942.

Brasil e EUA iriam formalizar um acordo sobre a convocação de reservistas residentes em

seus respectivos países, permitindo que eles pudessem optar em qual país gostariam de

servir, diferindo da política alemã que filhos de pais alemães, mesmo que morem fora da

Alemanha devem servir à pátria dos seus pais, independente de já terem cumprido o

serviço militar no país de seu nascimento. Os termos do acordo são: 1)-O Governo norte-

americano inicia o processo que permite ao estrangeiro registrado, em virtude da lei do

serviço militar e que seja cidadão de país co-beligerante e não manifeste intenção de

naturalizar-se norte-americano, optar para servir como norte-americano; 2)-O Governo

norte-americano está disposto a conceder a cidadão de país co-beligerante, que não

tenha manifestado intenção de naturalizar-se norte-americano e, já servindo no Exército

norte-americano, o ensejo de optar, sendo transferido para as forças do seu país

respectivo; 3)-Os detalhes do Acordo seriam confiados ao Departamento de Guerra e ao

Conselho do Serviço Militar por parte deste Governo e às autoridades competentes por

parte dos países signatários; 4)-Fica estabelecido que as pessoas que optarem, sejam

efetivamente aceitas pelas autoridades militares de seu país antes de partirem dos EUA;

5)-Para a efetividade do Acordo, deverão os representantes diplomáticos dos países

signatários, em Washington, passar nota declarando que seu governo deseja usufruir das

facilidades do Acordo concordando no seguinte: a)-nenhuma ameaça ou pressão será

exercida pelo seu Governo a fim de induzir qualquer pessoa nos EUA a alistar-se nas

forças de seu país ou de país estrangeiro; b)-o tratamento recíproco quanto ao direito de

opção será proporcionado, por motivos imperiosos, aos residentes nos países signatários;

c)-nenhum alistamento feito, nos países signatários, de norte-americanos ou de

estrangeiros de qualquer nacionalidade que declararam a intenção de se naturalizarem

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norte-americanos, será aceito nos EUA.359 O Governo brasileiro aprovaria o projeto de

reciprocidade de reservistas.360

Em 1943, em outro encontro entre Roosevelt e Vargas, o primeiro foi no Rio de Janeiro

em 1936, o Presidente brasileiro informou ao seu aliado norte-americano que não

aceitava um simples papel de coadjuvante na guerra. O Brasil não ficaria limitado apenas

em franquear o seu território às tropas de nações estrangeiras. Queria participar mais

intensamente, inclusive enviando tropas para os campos de batalhas, fortalecendo a sua

posição na América Latina e também nas conferências de paz que surgiriam após o

término da guerra. O governo de Vargas decidia levar às últimas conseqüências a

participação brasileira no conflito. Apesar da falta de interesse do Departamento de

Guerra norte-americano, ficou decidido que o Brasil deveria preparar um Corpo de

Exército (Três Divisões de Infantaria), equipado pelos norte-americanos, para ser enviado

para o norte da África, no ano seguinte. Com a rendição das tropas ítalo-alemãs na África

do Norte (12/05/1943), tornou-se desnecessária a presença de tropas brasileiras na

região. Porém, quando os aliados começaram a retirar tropas do Teatro de Operações do

Mediterrâneo (TOM) para a invasão da Normandia (Operação “Overlord”) e,

posteriormente, para o sul da França (Operação “Anvil/Dragon”), surgiu a necessidade de

cobrir esses claros de contingentes na Itália. O Brasil só conseguiria criar, por uma série

de fatores, uma Divisão de Infantaria que seria incorporada ao IV Corpo (General

Crittenberger) do V Exército norte-americano (General Mark Clark).

O Chile receberia uma comissão de técnicos militares norte-americanos que avaliariam as

necessidades bélicas do país, para que este pudesse participar da defesa continental

359Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 14/11/1942, AHI. 360MRE a Embaixada brasileira em Washington, 27/04/1943, AHI.

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(10/1940). Seria oferecida ajuda material e de efetivos militares norte-americanos que

seria rejeitado, inicialmente, pelo governo chileno que preferia recorrer aos EUA quando

julgasse necessário.361 Quando os japoneses atacaram os norte-americanos

(07/12/1941), as Forças Armadas chilenas estavam completamente despreparadas para

se defenderem de qualquer ataque externo. Necessitavam de armamentos e que os EUA

ajudassem no patrulhamento de suas águas continentais. Sua relutância em romper

relações diplomáticas com os países do Eixo era baseada na sua falta de estrutura militar

para manter-se e, conseqüentemente, para impedir que seus navios pudessem ser

atacados por submarinos japoneses ou alemães.

O Governo norte-americano pediria autorização (10/1941) para que seus navios de guerra

utilizassem os portos chilenos de Antofogasta e Valparaiso, como base de apoio para o

patrulhamento do Pacífico, com o Governo chileno aquiescendo, pois esse patrulhamento

ajudava na proteção de seus navios mercantes.362 Após aderir à política hegemônica

norte-americana (02/1943), receberia, através do sistema de “Empréstimos e

Arrendamentos”, material bélico para se proteger de algum ataque externo.363 Procuraria,

junto com a Argentina, fortificar o Estreito de Magalhães364 na tentativa de impedir que

corsários alemães pudessem passar do Atlântico para o Pacífico, pelo sul do Continente.

361S. de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 20/08/1940, AHI. 362Idem, 28/10/1941. 363MRE a Embaixada brasileira em Santiago, 04/01/1943, AHI; S. de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 05/05/1942, AHI. “O Governo chileno recebeu 15 aviões “North American” cedidos pelos EUA, através do sistema de “Empréstimo e Arrendamentos””. 364S. de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 02/12/1941, AHI; Idem, 02/12/1941. “O Governo argentino concordaria com as seguintes condições: 1)-Ser informado do plano de fortificações, número de fortins e características dos armamentos; 2)-Número total de guarnições; 3)-Duração das fortificações; 4)-Assinatura de um Protocolo declarado suspensa, temporariamente, a Cláusula V, do Tratado de 1881. O Ministro das Relações chileno aceitou as condições argentinas”; J. de Paula Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 10/12/1941, AHI; MRE a Embaixada brasileira em Santiago, 17/12/1941, AHI. “O Governo brasileiro concorda com os itens da proposta chilena, mas pede para ser conservada a Cláusula V do Tratado de Limites argentino-chileno de 1881, no sentido de se manter, inteiramente, livre para os navios de países americanos à navegação no estreito”.

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Dias após a capitulação da Bélgica, Holanda e Luxemburgo, a Argentina (24/05/1940)

seria procurada pelos EUA para envidar esforços na defesa da política de neutralidade

pan-americana. O Governo norte-americano estava preocupado com as conseqüências

que poderiam acontecer, caso a Inglaterra fosse derrotada pela Alemanha. A França já

estava, praticamente, eliminada e os EUA temiam que os fascistas pudessem agir no

Continente americano, utilizando-se das colônias européias dos países derrotados. Os

EUA queriam criar um projeto de defesa mútua e precisavam saber quais as

necessidades prementes dos argentinos, e como se portariam perante uma ameaça vinda

de fora da região. Um oficial norte-americano veio a Buenos Aires entrevistar-se com

representantes da Marinha argentina para analisar medidas conjuntas de defesa do

Continente. Recebeu como resposta que a Argentina agradecia a oferta, mas, no

momento, não havia necessidade de uma colaboração mais estreita entre os dois países,

pois, caso fosse necessário, utilizaria o sistema de consultas entre as Repúblicas

americanas acordadas no Panamá. Posteriormente, os norte-americanos (17/06/1940)

iriam oferecer, novamente, um mecanismo de ajuda mútua entre os dois países, inclusive

averiguando se seria possível que portos, bases aéreas e aeroportos pudessem ser

utilizados por militares norte-americanos em defesa do Continente. Mais uma vez, essas

propostas foram rejeitadas pelo Governo argentino, que reafirmou procurar os demais

governos americanos, caso se sentisse ameaçado. Na Conferência de Havana (21-

30/07/1940), o Chanceler Cantillo pretendia mostrar para os países do Eixo uma política

mais agressiva, pois acreditava que a neutralidade não trazia segurança alguma,

enquanto os beligerantes não respeitassem a vontade de viver em paz dos neutros. A

maioria das Repúblicas americanas rejeitaria essa proposta e a Argentina, a partir daí, iria

se distanciar do pan-americanismo, voltando-se para o lado do fascismo, principalmente

com a subida no poder dos oficiais nacionalistas do GOU.

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Apesar de manter sua política de neutralidade, diferindo das demais nações americanas,

a Argentina acreditava que poderia conseguir o apoio norte-americano na compra de

armas para fortalecer suas forças armadas, mas seus planos foram rejeitados pelos EUA,

principalmente após a Conferência do Rio de Janeiro. Os EUA iniciariam uma pressão

muito forte, através de sanções econômicas e comerciais, para obrigar ao Governo

argentino a participar da política pan-americana, que recomendava na época o

rompimento das relações com os países do Eixo. Pressionou tanto o Presidente Castillo,

que este seria deposto pelos oficiais do GOU, capitaneados por Perón (ver Capítulo 2.1).

A pressão continuaria aumentando, porém os militares nacionalistas permaneceram

irredutíveis e, aquele que tentou se opor ao movimento, General Rawson, ficaria apenas

três dias no poder.

Outro oficial assumiria o poder, General Ramirez, que seria deposto menos de oito meses

depois, após apoiar a política de solidariedade pan-americana, imposta pelos EUA. A

partir desse momento, os oficiais do GOU estavam completamente envolvidos com os

fascistas (ver Capítulo 2.1), empossando outro militar, General Farrell, para prosseguir

com a política de neutralidade simpática aos países do Eixo. Irritados, os norte-

americanos ameaçaram atacar Buenos Aires com a esquadra anglo-brasileira (4ª

Esquadra Norte-americana), mas foram demovidos por Vargas, que seria o primeiro a

reconhecer o novo Governo argentino. Com muita relutância, os EUA concordariam em

aprovar o novo governo, mas continuariam com as pressões até que, em 27 de março de

1945, a Argentina declararia guerra à Alemanha.

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3.4-O Comércio Norte-americano com as Repúblicas Americanas do Sul da

América Latina:

A Alemanha encontraria no mercado latino-americano uma excelente oportunidade para o

reaquecimento da sua economia (1934), logo após a grande depressão mundial, iniciada

em 1929. Utilizando-se de um engenhoso sistema de trocas de mercadorias (ver

Capítulos 1.1 e 2.4), transformar-se-ia no principal adversário comercial dos EUA, na

região. Os países do sul da América Latina, por ainda estarem sofrendo as

conseqüências da crise econômica mundial, seriam os principais beneficiários desse

comércio de compensação (sistema aski). Enquanto os norte-americanos procuravam

comercializar seus excedentes agrícolas e industriais, restringindo, em muito, seu

mercado para as matérias-primas dos países latino-americanos, principalmente de Brasil

e Chile, os alemães procuravam criar um sistema econômico que gerava o

desenvolvimento do seu parque industrial, utilizando-se de matérias-primas necessárias

para o desenvolvimento do país e, posteriormente, para a manutenção do seu esforço de

guerra. Com o passar do tempo, à medida que a Alemanha começou a tornar-se um

parceiro importante dos países sul-americanos, os EUA procurariam barrar essa ameaça

comercial européia ao Continente.

Em 1939, os EUA iriam modificar sua política comercial na região, tentando expandir seus

negócios na América do Sul, preocupados com o avanço ideológico do fascismo, em face

do sucesso do sistema aski alemão. O novo programa comercial continha os seguintes

pontos: 1)-Discutir as dificuldades cambiais com os representantes dos países latino-

americanos, durante a Conferência dos Ministros das Fazendas do Continente, na

Guatemala (13/11/1939); 2)-Investir capitais norte-americanos no desenvolvimento

industrial da América do Sul, sob a orientação de técnicos norte-americanos na área

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agrícola e industrial; 3)-Estender empréstimos do Tesouro norte-americano para

estabilização das moedas sul-americanas, tomando o ouro como base, e facilitar o

câmbio; 4)-Conceder créditos para exportação e importação, facilitando os negócios entre

as empresas norte-americanas e os mercados sul-americanos; 5)-Estudar,

detalhadamente, esses mercados sul-americanos e tirar o melhor proveito das suas

potencialidades.365

Com esse programa, pretendiam cooptar os sul-americanos a participarem da sua política

de boa vizinhança, através do pan-americanismo. Novos investimentos, na região,

significavam uma dependência econômica que poderia ajudar aos interesses norte-

americanos, quando estes entrassem em guerra com os países do Eixo. O Comitê

Econômico Financeiro Americano366, criado na Conferência do Panamá (23-03/09-

10/1939)367, seria o responsável pela estabilidade cambial e por todas as medidas

necessárias para a formação de uma relação monetária, entre as diversas moedas

americanas, usando o ouro com lastro. Esse Comitê aprovaria a criação do Banco

Interamericano368, com o capital inicial de cem milhões de dólares e que se tornaria o

principal gestor de todos os investimentos feitos na região, principalmente com os países

que participassem da política de solidariedade pan-americana imposta pelos norte-

americanos.

Como vimos nos capítulos anteriores, os argentinos tinham na Inglaterra sua principal

parceira comercial, além de ser sua mais importante financiadora e investidora externa, 365Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 16/10/1939, AHI; Idem, 27/10/1939. 366Idem, 20/10/1939. Idem, 15/09/1939. 367.Idem, 15/09/1939. “O Comitê Econômico Financeiro Americano, com sede em Washington, seria composto por especialistas em finanças das Repúblicas americanas, sendo dirigido por um norte-americano, um argentino e um brasileiro, eleitos na Conferência do Panamá”. 368Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 17/01/1940, AHI; MRE a Embaixada brasileira em Washington, 08/05/1940, AHI; Idem, 10/05/1940; Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 13/05/1940, AHI. “O Embaixador brasileiro assinou a Convenção para a criação do Banco Interamericano”.

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com a Alemanha, ficando em segundo lugar. Os EUA compravam muito pouco369, porém

tinham uma participação razoável na exportação de produtos manufaturados. A Argentina

dependia do mercado europeu para a venda dos seus principais produtos (carnes, trigo, lã

e milho) e com a eclosão da guerra, as suas exportações cresceriam (400%), pois a

Inglaterra era totalmente dependente do seu mercado externo, cerca de 70% de suas

necessidades básicas370, para manter seus exércitos funcionando. Como foi explicado no

capítulo 2.3, os ingleses não estavam preocupados com a política hegemônica norte-

americana na América Latina e aceitavam a política de neutralidade argentina para

continuar recebendo o fluxo de produtos argentinos, sem serem incomodados pelos

submarinos alemães.

Na tentativa de trazer o Governo argentino para a sua política de solidariedade pan-

americana, os EUA iriam enviar uma missão financeira371 a Buenos Aires (01/1941), que

compraria carne congelada372 com isenção de impostos, assinaria um Tratado de

Comércio (10/1941)373 e um acordo relativo à navegação comercial.374 O tratado comercial

seria cumprido até quase o final do ano seguinte (1942), com os EUA comprando erva-

mate375, couro, lãs e óleos vegetais (10/1942)376 e financiando equipamentos para a

369Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 23/08/1939, AHI. “Foram retomadas as negociações comerciais para a venda de carne congelada argentina ao mercado norte-americano”. 370MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 18/10/1939, AHI. “A Argentina concluiu um acordo comercial com a Inglaterra para o fornecimento de 171 mil toneladas de carne de vaca e 35 mil toneladas de carne de carneiro, com o pagamento em libras e preços superiores à média de 1938”. 371MRE a Embaixada brasileira em Washington, 04/01/1941, AHI. 372MRE a Embaixada brasileira em Washington, 15/04/1941, AHI. 373Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 14/10/1941, AHI. 374Idem, 21/10/1942. “Acordo entre EUA e Argentina para o transporte das mercadorias compradas pelos norte-americanos na Argentina”. 375MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 30/09/1942, AHI. “A Argentina vendeu 5 mil toneladas de erva-mate para os EUA”; MRE a Embaixada brasileira em Washington, 30/09/1942, AHI; Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 01/10/1942, AHI. “A Companhia “Van Sant” adquiriu há tempos, na Argentina, 5 toneladas de erva-mate para a extração da cafeína, destinada à “Companhia Coca-Cola”. Os norte-americanos liberaram somente 850 toneladas para serem embarcadas para os seus portos, enquanto não receberem os outros produtos (couro, lãs e óleos vegetais) mais importantes para a suas indústrias”.

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exploração de petróleo em território argentino (09/1942)377, que seria distribuído aos

países latino-americanos carentes desse produto.378 Esse acordo para a exploração de

combustível líquido seria cancelado, com a recusa argentina de romper relações

diplomáticas com a Alemanha. As pressões norte-americanas, que já vinham se

intensificando desde o final de 1942, iriam aumentar, substancialmente, no início de 1943,

com um boicote comercial contra a Argentina, com o confisco dos seus ativos nos EUA e

Inglaterra e com a sua exclusão do plano de reabilitação econômica com o fim da

guerra.379 A Argentina seria o único país sul-americano que não receberia qualquer apoio

financeiro através do sistema de “Empréstimo e Arrendamentos (“Lend and Lease”) para

a compra de material bélico para as suas Forças Armadas.380 Os norte-americanos

congelariam os fundos do “Banco de La Nación Argentina” e do “Banco de la Província de

Buenos Aires” e de três mil empresas argentinas nos EUA381.

O Brasil tinha uma relação de total dependência comercial com os EUA e o seu principal

produto de exportação, o café, estava sofrendo forte concorrência no mercado norte-

americano, de produtores da Colômbia, Venezuela e América Central. Com tanta

concorrência, o preço do café diminuía cada vez mais, impedindo o Brasil de cumprir suas

obrigações com os portadores de títulos brasileiros e impossibilitando a compra de

mercadorias no mercado norte-americano. Outros produtos como: açúcar, algodão,

borracha, couros, óleos vegetais e produtos têxteis não tinham espaço no mercado

interno norte-americano, só encontrando demanda no mercado alemão. Assim, o acordo

de marcos compensados (aski), com a Alemanha, tornou-se muito vantajoso para adquirir 376Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 01/10/1942, AHI. “Existem dificuldades para embarcar os produtos (couro, lãs e óleos vegetais) argentinos para os EUA”. 377MRE a Embaixada brasileira em Washington, 17/09/1942, AHI. 378Idem a embaixada brasileira em Buenos Aires, 01/10/1942, AHI. “Os EUA encetaram negociações com a Argentina para o fornecimento de petróleo às nações vizinhas (Brasil, Chile, Paraguai e Chile)”. 379Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 28/01/1943, AHI. 380Idem, 10/04/1943. 381Fernando Lobo (Washington), 04/11/1943, AHI.

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produtos industrializados e maquinarias para o desenvolvimento da pequena indústria

brasileira, porém impossibilitava a aquisição de divisas como já foi explicado no capítulo

anterior (2.4). Dessa forma, o Governo brasileiro deixaria de cumprir com suas obrigações

com os seus credores (1938) e deixaria de pagar a sua dívida externa, criando uma

grande insatisfação entre os empresários norte-americanos que exigiam que esses

pagamentos fossem feitos dentro do prazo estipulado, com muitos pretendendo liquidar

seus investimentos no Brasil. É importante frisar que os maiores credores eram os

ingleses e não os norte-americanos382 e, enquanto os primeiros preferiram aguardar as

novas propostas brasileiras para a solução do problema, os segundos protestaram

imediatamente, exigindo uma atitude impositiva, como no caso com o México, do Governo

norte-americano contra o Brasil.383 O Governo brasileiro fecharia um acordo final para o

pagamento da sua dívida externa com os EUA em 1943.384

Roosevelt, preocupado com o crescimento do comércio entre o Brasil e a Alemanha e

temendo que os alemães se tornassem os principais parceiros comerciais do Brasil,

ordenou que seu Secretário da Fazenda aguardasse uma sugestão do Ministro da

Fazenda brasileiro, sobre o pagamento da dívida, pedindo, também, calma aos credores

norte-americanos, acreditando em um entendimento breve entre os dois países.385 Com a

intervenção de Aranha, o Governo brasileiro iria, com muito sacrifício, depositar nos EUA

(1939), um milhão de dólares para o início do pagamento da dívida externa com os seus

credores norte-americanos, enquanto discutia um acordo de conciliação entre as partes

para a amortização do restante da dívida.386 Os empresários norte-americanos seriam os

primeiros contemplados com o pagamento da dívida externa brasileira, em dólares,

382MRE a Embaixada brasileira em Washington, 10/10/1938, AHI. 383Pimentel Brandão (Washington) ao MRE, 08/10/1938, AHI. 384Fernando Lobo (Washington) ao MRE, 26/11/1943, AHI. 385Pimentel Brandão (Washington) ao MRE, 29/11/1938, AHI. 386MRE a Embaixada brasileira em Washington, 29/06/1939, AHI.

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enquanto os credores europeus iriam aguardar um pouco mais387, até o Brasil encontrar

uma maneira de pagar os seus débitos sem comprometer, ainda mais, a sua tênue

economia, agravada com a grave crise internacional que se avizinhava. O Brasil fecharia

um acordo com todos os seus credores internacionais e voltaria a pagar a sua dívida, com

uma redução de 50% nos juros, em 8 de março de 1940.388

O Brasil vivia um momento de grande tensão econômica, com seu principal produto

sofrendo uma forte concorrência no mercado norte-americano, como foi explicado acima,

e o seu segundo melhor comprador, estando em guerra contra a Inglaterra e França

(09/1939). A Inglaterra iria instituir o bloqueio naval contra a Alemanha (“Sistema Navicert”

– ver capítulo 3.1), dificultando o comércio que esta tinha com os países sul-americanos,

e, como represália, sofreria ataques praticados por submarinos alemães, tornando os

mares do mundo inseguros para qualquer tipo de comércio internacional. Os brasileiros

estavam cientes desses dilemas e viam, na tentativa de criar um desenvolvimento

sustentado, a única maneira de sair desta interdependência dos países industrializados. O

Governo brasileiro precisava investir em eletrificação para deixar de depender do carvão

alemão389, na criação de uma siderúrgica para acabar com compra de chapas de ferro e

aço, vindas da Alemanha, confeccionadas com o minério brasileiro. Com a guerra se

estendendo acima do desejado, ficou claro que o comércio entre os dois países sofreria

uma grande redução, mesmo com a promessa alemã de continuar comprando produtos

brasileiros para recebê-los após o fim do conflito. Era necessário buscar uma nova política

de desenvolvimento, procurando uma parceria para ajudar no financiamento de uma

indústria siderúrgica no Brasil.

387MRE a Embaixada brasileira em Washington, 30/12/1939, AHI. 388Idem, 08/03/1940. 389O carvão era um dos principais produtos de exportação da Alemanha para o Brasil, que produzia um carvão de baixa qualidade e queima rápida.

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Vargas, diante desse dilema e procurando manter-se neutro, tentou tirar partido da

situação com o objetivo de construir uma siderúrgica no Brasil. Sabia que não conseguiria

ficar longe da influência norte-americana, porém, precisava de financiamento e

equipamentos para a construção da siderúrgica no Brasil. Os norte-americanos, apesar

da melhora no relacionamento, não se mostravam interessados em financiar a

empreitada, mesmo com a pressão de Roosevelt. Um exemplo desse desinteresse foi a

recusa da Companhia norte-americana “United Steel” de patrocinar a construção da

siderúrgica, sem incluir, na transação, o pagamento da dívida externa brasileira

(01/1940).390 A Alemanha, pelo contrário, aceitava financiar a siderúrgica em condições

extremamente vantajosas para o Brasil, financiando a empreitada em troca de matérias-

primas essenciais para o esforço de guerra alemão. A notícia de que a indústria alemã

“Krupp” estava interessada no plano siderúrgico brasileiro, deixou os políticos norte-

americanos muito preocupados. Roosevelt observou que se o Brasil aceitasse a proposta

alemã da “Krupp”, a porta estaria aberta para a penetração do nazismo no continente sul-

americano. Após muitas negociações entre políticos e financistas norte-americanos, os

EUA aceitaram financiar a siderúrgica brasileira. O “Export Bank” financiaria a siderúrgica,

com um empréstimo de 20 milhões de dólares, com esse valor podendo aumentar para 25

milhões, conforme as necessidades do empreendimento.391 A construção, organização e

o gerenciamento do empreendimento seria realizado, inicialmente, por uma empresa

norte-americana, até que profissionais brasileiros fossem treinados e pudessem substituir

os norte-americanos.392

390Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 22/01/1940, AHI. 391Idem, 31/05/1940, AHI. “O empréstimo inicial seria de 10 milhões de dólares”; Idem, 26/09/1940. “O valor do empréstimo seria de 20 milhões de dólares, pelo prazo de 12 anos a juros de 4%”; McCann, Frank D. Jr. ob. cit. p. 163. O Export Bank financiou a empreitada em U$ 20 milhões de dólares, indo até a U$ 25 milhões, com prazo de 10 anos para pagar, com carência de 3 anos e juros de 4%. 392Carlos Martins Ferreira e Souza (Washington) ao MRE, 31/05/1940, AHI.

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A realização desse empreendimento gerou um comprometimento muito grande do

Governo brasileiro com os norte-americanos, esfriando, de vez, o comércio de

compensação existente com os alemães. Outros acordos comerciais seriam realizados

entre o Brasil e os EUA durante os próximos anos, principalmente, para utilização no

esforço de guerra norte-americano. O Brasil venderia borracha393, cobalto, níquel e

tungstênio394, linter de algodão395, couro396, cacau397, amido398, mate399, café400, arroz401,

recebendo, em troca, ferramentas, folhas de flandres, máquinas agrícolas, produtos

cirúrgicos, elétricos, farmacêuticos, fotográficos, óticos, químicos402 e óleos

lubrificantes403. Os EUA também ajudariam na produção brasileira de gêneros

alimentícios, enviando técnicos e equipamentos para os Estados situados no norte e

nordeste, para estudarem e aplicarem métodos para um melhor aproveitamento das

terras.404

Com o acirramento dos combates marítimos entre alemães e aliados, muitos países

neutros sofreriam as conseqüências dessa guerra, que se tornava cada vez mais

irrestrita. As perdas aliadas estavam se tornando cada vez mais proibitivas (1940) e,

quando a Inglaterra ficou sozinha na luta contra o fascismo (1941), os afundamentos de

seus navios mercantes estavam acontecendo em uma proporção tão grande, que em

breve o seu comércio exterior ficaria totalmente paralisado. A ajuda norte-americana viria

393MRE a Embaixada brasileira em Washington, 21/06/1941, AHI. “Toda a produção de borracha brasileira foi vendida para os EUA”. 394Idem, 13/03/1942. “Acordo com extensão até junho de 1943”. 395Idem, 24/05/1942. “Acordo com extensão até julho de 1943”. 396Idem, 02/06/1942 397Idem, 16/06/1942. 398Idem, 07/08/1942, AHI. “O Brasil vendeu 5 mil toneladas de amido para os EUA”. 399Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 04/07/1943. 400MRE a Embaixada brasileira em Washington, 04/10/1943. “Fornecimento de café brasileiro para os EUA e Canadá”. 401Idem, 29/12/1943. “Arroz brasileiro no mercado norte-americano e inglês”. 402Idem, 28/04/1942. 403Idem, 05/08/1942. 404Idem, 03/09/1942.

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em um momento crucial para as pretensões britânicas de continuar na luta e manter seu

comércio externo funcionando. Apesar de neutros (ver Capítulo 3.2), os EUA começariam

a patrulhar os comboios que iam para a Inglaterra e, quando afinal entrou na guerra, sua

produção naval ainda não estava preparada para a demanda necessária para tornar os

mares seguros para o comércio entre os seus aliados. Roosevelt lançaria um projeto

revolucionário de construção naval que, no seu auge, conseguiria produzir um cargueiro a

cada três dias. Eram navios baratos e com um sistema de produção bastante simplificado

e repetitivo para facilitar a produção, porém tamanha rapidez tinha conseqüências graves,

pois eram navios muito frágeis e de duração muito limitada. Seriam conhecidos como os

“Navios da Liberdade” (“Liberty Ships”) e, muitas vezes, só conseguiam fazer uma viagem

com carga total. Assim, os EUA foram obrigados a desviar outros navios da sua frota para

cobrir esses claros nos comboios aliados, criando uma grave falta de navios mercantes

para continuar seu comércio, principalmente para a América Latina.

Uma saída foi utilizar os navios dos países do Eixo parados em portos sul-americanos,

atitude já utilizada pelos norte-americanos com os navios fascistas atracados em seus

portos, gerando, inclusive, um protesto do Governo alemão contra a utilização de seu

patrimônio, sem autorização prévia405. A Argentina iria criar a sua frota mercante (ver

Capítulo 2.4) comprando navios italianos atracados em seus portos devido ao bloqueio

inglês à navegação fascista. O Brasil conseguiria um empréstimo (1939) do “Export and

Import Bank” para a compra de 14 navios para o “Lloyd Brasileiro”, antes da crise naval

comercial na região.406 A solução encontrada foi o financiamento da compra dos navios

405MRE a Embaixada brasileira em Berlim, 23/07/1940, AHI. 406MRE a Embaixada brasileira em Washington, 18/09/1939, AHI. “O empréstimo seria de 50 milhões de dólares, sendo uma parte destinada para a compra dos 14 navios”; Idem, 23/09/1939; Idem, 26/10/1939; Idem, 31/10/1939.

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fascistas pelo Banco Interamericano, com a aprovação do Comitê Econômico

Interamericano, sediado em Washington, pelos países sul-americanos interessados407.

Entretanto, essa medida não seria suficiente para solucionar a falta de navios mercantes

nos EUA para a manutenção do seu comércio com os países sul-americanos. Os EUA

iriam reduzir em 30% o fornecimento de petróleo aos países sul-americanos, em virtude

da falta de navios para o transporte do produto.408 Por falta de navios-tanques, o Brasil

ficaria, praticamente, sem petróleo para manter suas parcas indústrias e seu sistema de

transporte marítimo e rodoviário, durante dois meses409. Outra solução encontrada foi o

arrendamento de 37 navios brasileiros para a marinha mercante norte-americana, para

serem utilizados, unicamente, na linha EUA-Brasil, pedindo o ressarcimento da tonelagem

perdida, após o final do conflito.410 A situação voltaria ao normal, no início de 1944, à

medida que as rotas marítimas eram limpas dos ataques de submarinos alemães.

No caso chileno, sua economia dependia muito do mercado norte-americano (1939) e, à

medida que a guerra se prolongava (1940), a Alemanha, o seu segundo parceiro

comercial, sairia de cena, deixando que os EUA se tornassem, praticamente, o único

comprador dos produtos minerais chilenos (cerca de 80%). Com a guerra, as exportações

chilenas cresceriam substancialmente, gerando uma pequena acumulação de divisas que,

com os empréstimos cedidos pelos norte-americanos411, ajudariam a desenvolver as

indústrias do aço, petróleo, eletricidade e da pesca. Esses investimentos eram

407Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 29/08/1941, AHI; Idem, 08/10/1941. “O Comitê Econômico Interamericano aprovou a compra de navios alemães, dinamarqueses e italianos, fundeados em portos norte-americanos. Os EUA se entenderam com a “Comissão Marítima” da Grã-Bretanha, no sentido de não haver nenhum contratempo na viagem desses navios para o porto do Rio de Janeiro”. 408MRE a Embaixada brasileira em Washington, 18/04/1942, AHI. 409Idem, 16/07/1941. 410Idem, 05/08/1942. 411Bethell, Leslie. “Historia de América Latina – 15- El Cono Sur desde 1930”. Ob. cit. p. 243.

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administrados pela “Corporación de Fomento de la Produción” (CORFO), instituição

criada no governo anterior para desenvolver e ajudar as regiões abaladas pelo terremoto

de 1939412. Os EUA comprariam toda a produção anual de minérios chilena, porém a

preços muito baixos (artificiais), engessando a economia chilena que precisava pagar,

cada vez mais, pelos produtos importados norte-americanos413. A inflação subiria

assustadoramente e, para piorar, os salários estavam muitos baixos, gerando muita

insatisfação e greves nas minas. O governo, por sorte, receberia ajuda dos sindicatos, em

sua maioria controlada pelos comunistas que incentivariam os trabalhadores a se

sacrificarem pela causa comunista contra o fascismo414, política esta que se inverteria,

imediatamente, após o término da guerra (1945), quando greves e manifestações iriam

quebrar esse pacto entre os trabalhadores chilenos415.

412Bethell, Leslie. “Historia de América Latina”. Ob. cit. p. 237. 413Idem. p. 243. 414Idem. p.243. 415Idem. p.244.

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CONCLUSÃO:

Esse trabalho foi baseado, principalmente, na análise textual de documentos

governamentais (telegramas) enviados pelas Embaixadas brasileiras, de cada capital dos

países envolvidos na pesquisa (Alemanha, Argentina, Brasil, Chile, EUA e Itália) ao

Itamaraty (Ministério das Relações Exteriores do Brasil). Também, foram pesquisados os

telegramas expedidos pelo Ministro das Relações Exteriores do Brasil para essas

respectivas Embaixadas, indicando que tipo de política externa o Governo brasileiro

adotou, durante um dos períodos mais difíceis do Século XX. Esses documentos,

produzidos em diferentes regiões do mundo, quando foram comparados, mostraram uma

visão específica de cada comunidade atingida, no contexto global desses acontecimentos

históricos. O período estudado compreendeu os dois anos anteriores à deflagração do

conflito (1938-1939) até a sua metade (1939-1943), quando a balança militar começou a

pender para o lado dos aliados.

Inicialmente, analisamos a geração desses fatos na política do Continente americano,

mostrando como os interesses nacionais determinaram políticas completamente

diferentes para a solução dos problemas existentes em cada nação envolvida. Depois,

estudamos como essas políticas se interagiram no âmbito regional, ocasionando rupturas

de pensamento ideológico, comercial e político e, por fim, as conseqüências dessas

decisões em relação ao mundo em guerra. Ao compararmos essas políticas (nacional,

regional e mundial) dos países sul-americanos, chegamos às seguintes conclusões:

PAÍS POLÍTICA EXTERNA ADOTADA

C1- Argentina A EXCEPCIONALIDADE DA POLÍTICA EXTERNA ARGENTINA C2- Brasil A FALTA DE OPÇÃO DA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA

C3- Chile A DIVISÃO BIPOLAR DA POLÍTICA EXTERNA CHILENA

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C1-A EXCEPCIONALIDADE DA POLÍTICA EXTERNA ARGENTINA:

A Argentina seguiria um caminho completamente diferente das demais Repúblicas

americanas durante a Segunda Guerra Mundial. No início, logo após a invasão da

Noruega e Dinamarca pelos alemães (09/04/1940), durante o governo do Presidente

Ortiz, um aliadófilo convicto, tentou optar por uma política mais agressiva (“de não

beligerância”) contra os países do Eixo, porém os norte-americanos e as demais

Repúblicas americanas se recusaram a aceitar essa política, temendo represálias

advindas, principalmente dos alemães. É importante frisar que os norte-americanos ainda

não estavam preparados para participar do conflito e precisavam de tempo para

movimentar todo o seu potencial industrial e reorganizar as suas Forças Armadas.

Assim, o Governo argentino iria mudar o rumo da sua política externa, optando pela

neutralidade e não aceitando romper com as potências do Eixo, na Conferência do Rio de

Janeiro (15-28/01/1942). Essa atitude iria se acentuar quando Ortiz, devido a seu estado

de saúde, renunciou e foi substituído pelo Vice-Presidente Castillo (1942), favorável à

manutenção da neutralidade. Com a pressão norte-americana aumentando e a indecisão

de Castillo em definir a política externa argentina, um golpe militar seria realizado por

forças nacionalistas (GOU) que empossariam o General Rawson (04/06/1943). Este

duraria três dias no poder, após ter anunciado o rompimento de relações com os países

do Eixo. Seria substituído pelo General Ramirez (07/06/1943), que devido à pressão

norte-americana, acabaria rompendo com os países do Eixo, no início de 1944

(06/01/1944). Insatisfeitas, as forças reacionárias e nacionalistas argentinas iriam

derrubá-lo, praticamente um mês depois (24/02/1944), colocando em seu lugar o General

Farrell, que acabaria declarando guerra à Alemanha, em março de 1945 (27/03/1945),

quando a guerra na Europa já estava terminando e o “Reich de mil anos” de Hitler estava

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totalmente, arruinado. Ao compararmos os telegramas das Embaixadas brasileiras e os

telegramas enviados pelo Itamaraty, encontramos três pontos importantes:

1-Rivalidade com os EUA pela Hegemonia do Continente:

Constatamos, no nosso trabalho, que a Argentina era contrária à política pan-americana

proposta pelos EUA, pois temia que os norte-americanos a utilizassem para dominar a

América Latina. Não queriam nenhuma interferência na região e temiam que esse

predomínio norte-americano colocasse o Brasil, devido à sua posição estratégica, como a

segunda força no Continente. Os argentinos tinham como premissa que os países

vizinhos (Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai) estavam sob sua esfera de influência e não

aceitavam nenhuma interferência norte-americana nesta sua política hegemônica. Para

comprovarmos essa premissa da política externa argentina na região, podemos mostrar

os seguintes telegramas:

1)-Heitor Lyra (Buenos Aires) ao MRE (Ministério Relações Exteriores), 08/01/1942. Sobre

a reunião realizada pela Argentina antes da III Conferência dos Chanceleres Americanos.

“Ele informa que as Delegações da Argentina, Chile, Paraguai e Peru, se

reuniram, em Buenos Aires, procurando levar uma proposta em conjunto

para a III Conferência dos Chanceleres Americanos, no Rio de Janeiro. A

Argentina propôs a manutenção da “neutralidade”, porém, com benevolência

para os EUA, considerando-o um país “não beligerante”. O Peru, a princípio,

concordou com a opinião argentina, o Paraguai permaneceu indeciso entre o

PONTOS PRINCIPAIS NA POLÍTICA EXTERNA ARGENTINA NÚMERO PONTOS PRINCIPAIS

1 Rivalidade com os EUA pela Hegemonia do Continente; 2 Atrito com o Brasil, que apoiou, irrestritamente, o Pan-americanismo norte-americano; 3 Comércio exterior dependente do mercado Europeu (Inglaterra e Alemanha).

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rompimento das relações e a neutralidade argentina e, o Chile preferiu

aguardar os acontecimentos que surgirão na Reunião Consultiva no Rio de

Janeiro. Todos, porém, concordam que os fundamentos da solidariedade

devem ser revistos”.

2)-José de Paula Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 21/02/1942. Tentativa do

Governo argentino em cooptar o novo Presidente chileno (Antonio Ríos) para a sua

política de neutralidade.

“O Ministro das Relações Exteriores argentino, Sr. Ruiz Guiñazu, encontrou-

se com o novo Presidente chileno, Sr. Antônio Ríos, em Bariloche, para

tentar persuadi-lo de participar da política de neutralidade perante as

potências do Eixo. Ortiz declinou da proposta, alegando que preferia não

assumir nenhuma posição antes de assumir o cargo. O Governo argentino

ficou desapontado com essa atitude, pois pretendia manter o Chile, como

seu aliado, para não ficar isolado no Continente Americano”.

3)-Idem, 24/07/1943. O Governo argentino procurou aproximar-se, novamente, do

Paraguai, enviando uma missão especial para a inauguração do novo mandato do

Presidente Morínigo.

“O Embaixador do Paraguai informou-me que a Argentina enviará uma

missão especial para a inauguração do novo mandato do Presidente

Morínigo, no dia 15 de agosto, que poderá ser chefiada pelo Ministro das

Relações argentino Storni. O Embaixador paraguaio vê, nesse gesto e nos

convites recentes feitos aos Presidentes chileno (Ríos), boliviano

(Peñaranda) de visitarem Buenos Aires, o propósito argentino de reforçar

suas relações com os países vizinhos, tentando minimizar a má impressão

pela demora da ruptura das relações diplomáticas com os países do Eixo”.

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Também achavam que os norte-americanos queriam afastá-la do Brasil, inventando

informações falsas sobre suas intenções hegemônicas na região, deixado os brasileiros

apreensivos e, principalmente, fornecendo material bélico, em grande quantidade, para as

Forças Armadas brasileiras, criando um grande desequilíbrio militar entre os dois países.

Por fim, o Governo argentino acreditava, como os alemães, que os EUA estavam

promovendo a guerra e, com a sua arrogância e ganância, arrastariam todas as

Repúblicas americanas para o conflito.

Vimos que, após a entrada dos EUA na guerra e, depois, da III Conferência de

Chanceleres Americanos, no Rio de Janeiro, onde os argentinos, junto com o Chile, se

recusaram a romper relações diplomáticas com os países do Eixo, a pressão do Governo

norte-americano aumentou sensivelmente, provocando a queda do Presidente Castillo,

pelo golpe militar realizado por oficiais nacionalistas do GOU (Grupo de Oficiais Unidos).

Esses oficiais optaram por apoiar os países do Eixo, inclusive, como vimos, enviando um

emissário à Alemanha para conseguirem armamentos para defenderem sua posição

política contra os EUA. Eles fariam uma opção equivocada, pois a Alemanha já estava em

processo de derrocada, não podendo ajudar com equipamentos bélicos seus

companheiros argentinos. Entre os telegramas que indicam essa forte pressão contra o

Governo argentino, podemos ressaltar os seguintes:

4)-Carlos Martins Pereira e Souza (Washington), ao MRE, 24/07/1942. O Discurso do

Secretário de Estado norte-americano Cordell Hull, bastante agressivo, criticando a

política de neutralidade argentina.

“O Sr. Sumner Welles informou que o discurso do Secretário de Estado

Cordell Hull foi, particularmente, severo para com os neutros, visando à

Argentina, que sofrerá uma pressão muito mais forte por parte dos EUA. O

Sr. Hull afirmou que todos devem lutar contra o inimigo de hoje (Eixo), em

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face da sua política de destruição de todos os valores humanos.Salientou a

necessidade da criação de um “Organismo Internacional”, munido de força

para sancionar suas decisões,da Corte de Justiça Internacional, da solução

dos problemas do desarmamento dentro da garantia da paz duradoura, da

vigilância às nações agressoras, da redução das excessivas tarifas

aduaneiras, da estabilidade do livre câmbio monetário e do livre acesso à

distribuição das matérias-primas”.

5)-Idem, 28/01/1943. Mostra os comentários da imprensa norte-americana sobre a

proposta de “boicote” comercial ao Governo argentino.

“O Jornal “Washington Post” comentou as propostas de boicote comercial

contra a Argentina, tentando demovê-la da sua atitude de neutralidade. O

boicote abrange os bens confiscados em todas as Nações Unidas. A

Argentina seria excluída do plano de reabilitação econômica na futura paz.

No editorial do “Times”, a proposta de boicote tem recebido, ultimamente,

acolhimento favorável nos círculos oficiais. Porém, os comentários são

desfavoráveis, em vista dos danos que semelhante política causaria à

política de boa vizinhança e de seus efeitos sobre a maioria da população

argentina, favorável à ruptura com os países do Eixo. Critica-se que a

iniciativa parta dos EUA, com os quais o comércio argentino tem diminuído

cada vez mais, devido às dificuldades de transporte e de prioridade de

fornecimentos e praça nos navios em favor do Brasil”.

Os norte-americanos, para mostrar a sua força comercial e política, resolveram embargar

os bens argentinos nos EUA, negaram qualquer tipo de armamento para as Forças

Armadas argentinas e ameaçaram mostrar documentos que demonstravam a participação

dos nacionalistas argentinos no golpe militar, realizado na Bolívia (1943). Os norte-

americanos venceriam esse embate, porém a um custo político muito caro, afastando,

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definitivamente, a Argentina da política pan-americana, apesar do rompimento das

relações diplomáticas com os países do Eixo (25/02/1944). Quanto ao golpe na Bolívia,

conseguimos achar um grande interesse do Governo argentino em reconhecer, o mais

rápido possível o novo Governo boliviano, sem menção a qualquer apoio político ou

militar:

6)-Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 30/09/1942. O Embaixador paraguaio, em

Buenos Aires, informa que a situação política na Bolívia é delicada e os argentinos

culpam os norte-americanos pela situação atual.

“O Embaixador paraguaio, em conversa com o Chanceler argentino

Guiñazu, soube que a situação interna da Bolívia era bastante delicada,

devido à demasiada ingerência norte-americana nos seus negócios e que,

isto lhe havia sido relatado pelo Ministro das relações exteriores da Bolívia,

que se sente, por isso, incômodo na Pasta”.

7)-MRE (Rio de Janeiro) a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 30/12/1943. Informa

que o Governo argentino gostaria que o Paraguai reconhecesse o novo Governo

boliviano, sem consultar as demais Repúblicas americanas.

“O Governo paraguaio comunicou ao Embaixador Negrão de Lima, em

Asunción, ter sido convidado pela Argentina a reconhecer o Governo

revolucionário da Bolívia. Negrão foi informado que os paraguaios não

tomariam nenhuma decisão antes de consultar as demais nações

americanas. O Paraguai irá acompanhar a posição do Brasil”.

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2-Atrito com o Brasil, que apoiou, irrestritamente, o Pan-americanismo Norte-

americano:

A Argentina, temendo a perda da sua hegemonia na região sul da América Latina, em

função do apoio norte-americano ao Brasil, antes da Conferência do Rio de Janeiro,

procurou cooptar o Chile, Paraguai e Peru para a sua política de neutralidade contra o

rompimento das relações diplomáticas com os países do Eixo. Não sendo bem sucedida,

com a exceção do Chile, utilizou-se de todas as prerrogativas para manter o seu prestígio

na região. Resistiu aos pedidos dos Governos brasileiro e norte-americano, para participar

da política de solidariedade pan-americana e, principalmente, após o golpe militar

praticado pelos os oficiais do GOU, tornou-se uma ameaça da paz no Continente. Como

prova da continuidade da sua política de neutralidade, trazemos os seguintes telegramas:

8)-Idem, 22/07/1942. A esperança de que a Argentina, por fim, rompesse com as

potências do Eixo, ruiu quando o novo governo manteve a mesma orientação política do

governo anterior.

“Desfazendo as versões difundidas, o Departamento Nacional de Imprensa e

Propaganda da Presidência da República Argentina publicou um

comunicado afirmando que a orientação política, interna e externa, mantém-

se na posição anunciada publicamente pelo Presidente da República. Esse

comunicado tem o propósito de desmentir as notícias circulantes de que

este Governo está preparando a ruptura. O Ministério das Relações

Exteriores argentino procurou ser prudente, pois parece haver resistência no

Exército a uma mudança de atitude. O Embaixador norte-americano Norman

Armour ficou bastante decepcionado com essa informação, pois o

Presidente Ramirez havia prometido romper as relações com os países do

Eixo, até o dia 15 de agosto”.

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9)-Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 08/06/1943. O Presidente Ramirez informa

que a política externa argentina permanece inalterada.

“O Presidente argentino fez o seguinte comunicado: “A República Argentina

afirma a sua tradicional política de amizade e de leal cooperação com as

Nações da América, de acordo com os pactos existentes. Com referência ao

resto do mundo, sua política é, no presente, de neutralidade. O Governo

Provisório crê, além disso, expressar que sustenta o princípio da absoluta

autonomia dos estados para darem-se suas normas de governo. Em tal

conceito, não tolerará nenhuma ingerência estranha, pois o povo argentino

mantém e manterá, através de todas as vicissitudes que possam ocorrer, as

formas republicanas representativas, conforme a própria constituição”.

Assinado, Ramirez”.

10)-Idem, 30/10/1943. O Governo argentino reafirma, oficialmente, a política de

neutralidade, contrariando todas as repúblicas americanas.

“Acabo de ser informado que o Governo argentino estendeu as disposições

do decreto de 4 de dezembro de 1939, sobre a neutralidade da Argentina,

ao atual conflito armado ítalo-germânico”.

Com o temor de que os fascistas pudessem usar a Argentina como trampolim para

atividades subversivas na região, os EUA iriam apressar o fornecimento de material bélico

para o Brasil contrabalançar essa ameaça. Boatos, criados por fascistas ou norte-

americanos, informavam que os argentinos estavam aumentando os seus efetivos

militares na fronteira com o Brasil, obrigando os brasileiros a colocar suas parcas forças

militares na região, sob prontidão e, aventando a hipótese da utilização das tropas

designadas para a Força Expedicionária Brasileira (FEB) na fronteira com a Argentina. A

grande preocupação dos militares brasileiros era que os argentinos, apoiados pelos

fascistas, pudessem armar e financiar as colônias germânicas nos Estados do sul contra

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o governo Vargas. Quanto a possibilidade de existir ativistas fascistas na Argentina,

procurando criar uma instabilidade nos países fronteiriços, encontramos os seguintes

telegramas:

11)-MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 17/03/1942. Fundos vindos do exterior

estariam financiando atividades fascistas na Argentina.

“As transferências de fundos disfarçam-se sob o pretexto comercial, sendo

feitas, principalmente, da Alemanha e da Itália”.

12)-Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 22/01/1943. O Governo norte-americano e

portador de um memorando sobre atividades fascistas na Argentina.

“O Embaixador norte-americano, em Buenos Aires, acaba de informar-me,

confidencialmente, que o Delegado norte-americano do Comitê de defesa

Política do Continente, de Montevidéu, apresentou um “memorandum”,

composto de três partes, contendo informações sobre atividades nazistas na

Argentina. Disse-me o Embaixador Armour, que o Sub-Secretário de Estado

das Relações Exteriores argentinos, a quem deu conhecimento, manifestou

estar o Chanceler Enrique Ruiz-Guiñazu contrariado pelo fato, manifestando

o desejo de não se dar publicidade do mesmo. O Embaixador Armour

respondeu tratar-se de estudo entre o Governo norte-americano e o Comitê,

competindo, exclusivamente, a este dar publicidade ou não”.

13)-MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 16/08/1943. Cônsul alemão na

fronteira com o Brasil financia atividades fascistas na região fronteiriça.

“O MRE está informado de que o Cônsul alemão em Posadas, que desfruta

do amparo das autoridades argentinas, costuma enviar agentes nazistas ao

nosso território para praticarem atividades subversivas”.

Na verdade, argentinos e brasileiros procuravam manter uma política de entendimento,

baseado no respeito mútuo de seus dirigentes, inclusive, com o Brasil procurando que os

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EUA reconhecessem o novo Governo argentino, mostrando, aos norte-americanos, que o

não reconhecimento e as sanções econômicas, não trariam os argentinos para o lado dos

aliados. A mudança do Governo argentino, segundo muitos políticos brasileiros, não

representava uma ameaça à estabilidade na região, e sim, era uma tentativa argentina de

manter a sua soberania intacta contra a penetração norte-americana em seus assuntos

internos. Os exemplos da política de amizade existente entre brasileiros e argentinos são:

14)-MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 07/06/1943. O MRE pretende ser o

primeiro país em reconhecer o novo Governo argentino.

“O Ministro das Relações Exteriores brasileiro, Oswaldo Aranha, instruiu o

nosso Embaixador, em Buenos Aires, que é necessário ser o Brasil, o

primeiro país a reconhecer o Governo argentino, dada a nossa vizinhança e

tradições”.

15)-Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 09/06/1943. O Brasil reconhece o novo

Governo argentino, acompanhado por outros países latino-americanos.

“Entreguei, hoje, a nota sobre o reconhecimento do novo Governo, junto

com o Governo paraguaio. A Bolívia e o Chile acabam de conceder o

reconhecimento”.

16)-Idem, 11/06/1943. Por fim, os EUA reconhecem o novo Governo argentino.

“O Governo dos EUA acaba de reconhecer o Governo argentino depois de

uma entrevista entre o Embaixador Norman Armour e o Ministro das

Relações Exteriores argentino”.

É importante salientar, que os militares brasileiros tinham pensamentos opostos, temendo

um ataque dos nacionalistas argentinos ao Brasil. Diante de tanta pressão externa,

concluímos que os argentinos pretendiam manter sua independência na região, sem criar

sérios entreveros com os brasileiros e, estes, pensavam da mesma maneira, pois um

atrito militar ou político seria muito prejudicial para ambos os países. Vários boatos

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indicavam que, tanto argentinos quanto brasileiros estavam movimentando tropas em

suas respectivas fronteiras, como veremos a seguir:

17)-MRE a embaixada brasileira em Buenos Aires, 17/05/1943. O MRE informa ao

Governo argentino que não houve nenhuma movimentação militar em suas fronteiras e

nenhum aumento dos efetivos militares.

“Não houve qualquer movimento de tropas no Paraná ou qualquer região do

sul. O Governo pretende, oportunamente, elevar efetivos militares do sul, a

fim de enviá-los para a zona de guerra, retirando-os dessas guarnições,

apenas aqueles necessários para o embarque da FEB. A fronteira sul será,

praticamente, desguarnecida, pois confiamos, inteiramente, nos propósitos

de nossos vizinhos”.

18)-Idem, 07/06/1943. Agora, o Governo argentino desmente movimentação de tropas na

fronteira com o Brasil.

“Recebemos com viva satisfação às expressões amistosas do General

Ramirez desmentindo os rumores absurdos e tendenciosos aludidos.

Acrescento que, da nossa parte, também só nos animam os propósitos da

tradicional lealdade que sempre orientaram a política do Brasil para com a

Argentina”.

3-Comércio Exterior dependente do Mercado Europeu (Inglaterra e Alemanha):

Outro ponto de destaque nas nossas pesquisas foi a necessidade dos argentinos de

manterem o seu principal mercado exterior intacto durante a guerra. Como já foi

exaustivamente analisado, britânicos e alemães eram seus principais parceiros

comerciais, sendo os norte-americanos um comprador eventual dos produtos argentinos.

A Argentina temia que, com a eclosão da guerra, o país ficasse privado desse comércio,

porém, como os beligerantes necessitavam dos seus produtos, um acordo tácito surgiu e

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os navios mercantes carregados de carnes e cereais argentinos não eram incomodados

por ambos os países.

A Inglaterra, apesar do bloqueio contra a Alemanha, não impedia que navios neutros,

vindos da Argentina, levassem produtos para a Alemanha e os países ocupados por suas

tropas, recebendo, em contrapartida dos alemães, a não intervenção de seus submarinos

aos navios que partiam dos portos argentinos com destino às ilhas britânicas. Os

alemães, além de manter um comércio ativo com os argentinos, procuravam consolidar

sua política de amizade na região, na tentativa de cooptar, através da Argentina, outras

Repúblicas americanas. O comércio com a Grã-Bretanha aumentaria, substancialmente, e

se manteria ativo durante todo o conflito na Europa, enquanto com os alemães iria

diminuir, à medida que os reveses, na guerra, se intensificavam, impedindo aos alemães

de receberem ou enviarem produtos para outras partes do mundo. Enquanto os alemães

diminuíam o seu comércio com os argentinos em função da guerra, os britânicos iriam

intensificá-lo, como veremos abaixo:

19)-MRE a Embaixada brasileira em Buenos Aires, 18/10/1939. A Inglaterra faz um

acordo comercial com a Argentina, comprando carne de vaca e de carneiro.

“Foi concluído com a Inglaterra um acordo comercial para o fornecimento de

171 mil toneladas de carne de vaca e 25 mil toneladas de carne de carneiro,

com o pagamento em libras, com preço, ligeiramente, superior à média de

1938”.

20)-A Inglaterra vende material bélico para a Argentina.

“O MRE quer saber todos os pormenores quanto à qualidade e quantidade

do material exportável, sobre o acordo concluído entre a Inglaterra e esse

país sobre a exportação de munição e petrechos bélicos”.

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C2-A FALTA DE OPÇÃO DA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA:

No caso brasileiro, verificamos que Vargas aceitou, de bom grado, a única possibilidade

de êxito para a sua política externa durante a Segunda Guerra Mundial. A total

dependência econômica do mercado norte-americano, sua fragilidade militar e,

principalmente, a posição estratégica do nordeste brasileiro, fundamental para a defesa

do Continente, induziram o Brasil para a política de solidariedade pan-americana, imposta

pelos EUA. As facilidades comerciais oferecidas pelos alemães e italianos (sistema aski),

que ajudaram muito a economia brasileira, nos anos posteriores à grande depressão

mundial (1935) até o início da guerra (1939), não foram suficientes para deslocar a

influência norte-americana da política interna brasileira. Temos que ressaltar que o Brasil

assinaria um acordo comercial com os EUA (1935), antes de aceitar a proposta de

marcos compensados dos alemães, baseado no princípio da nação mais favorecida

(liberalismo econômico), tendo que disponibilizar suas divisas (moeda internacional) para

continuar mantendo um mercado para o seu principal produto, o café.

No âmbito militar, a resistência aos norte-americanos seria maior, principalmente, com a

recusa dos EUA em fornecer à Marinha brasileira alguns destróieres (1937), após um

protesto argentino. Os oficiais brasileiros ficariam revoltados e muito desconfiados com a

política de boa vizinhança norte-americana, porém com a venda de armamento alemão

para o Exército brasileiro, os norte-americanos, reconhecendo o erro anterior e,

preocupados com a penetração fascista nas forças militares brasileiras, passaram a

cooptar esses oficiais, oferecendo cursos de aperfeiçoamento em escolas militares norte-

americanas e armamentos para o rearmamento das Forças Armadas brasileiras. Um

acordo militar foi realizado, com o Governo brasileiro cedendo bases navais e aéreas,

antes da entrada dos EUA na guerra.

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Na Conferência do Rio de Janeiro (15-28/01/1942), Vargas, orientado pelos militares,

relutou em romper relações diplomáticas com os países do Eixo se a Argentina não

participasse da mesma empreitada, preocupado com a segurança da sua fronteira no sul.

O Brasil acabaria aderindo ao rompimento e sofreria as conseqüências dessa adesão,

navios brasileiros passariam a ser torpedeados pelos submarinos das potências do Eixo

no Atlântico Norte, acabando com ataques bem próximos às suas costas, que ocasionou

a entrada do país no conflito (31/08/1942). Confrontando todos os telegramas, achamos

três posições fundamentais:

1-Rivalidade com a Argentina pela Hegemonia na Região Sul do Continente:

A disputa pela hegemonia regional, entre Brasil e Argentina, vem de longa data, porém,

se acentuaria nos anos críticos da Segunda Guerra Mundial, principalmente quando

grupos conservadores e nacionalistas assumiram o Governo argentino e resolveram

apoiar a Alemanha, acreditando que esta venceria a guerra. Militares brasileiros temiam

que movimentos fascistas surgissem nas colônias germânico-italianas, com apoio do novo

Governo argentino, posição que o Ministro Aranha discordava, apesar de preferir que a

Argentina optasse pela política de solidariedade pan-americana. Na verdade, apesar de

um pequeno antagonismo natural entre os dois países, seus principais políticos se

respeitavam e procuravam acordos mútuos em benefício das suas respectivas nações.

Quando os alemães atacaram os navios de cabotagem brasileiros, naquele fatídico mês

POSIÇÕES FUNDAMENTAIS NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NÚMERO POSIÇÕES FUNDAMENTAIS

1 Rivalidade com a Argentina pela Hegemonia na região sul do Continente; 2 Apoio ao Pan-americanismo em busca de uma Política desenvolvimentista; 3 Comércio exterior dependente do mercado norte-americano.

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de agosto (15-19/08/1942), o apoio dado pelo Governo argentino demonstrou grande

revolta pelo ocorrido e uma profunda consternação com as mortes de cidadãos

brasileiros. Quando o Brasil entrou na guerra, o Presidente Castillo declarou o Brasil como

um país “não beligerante”. Podemos destacar como amostra de solidariedade com o povo

brasileiro, os seguintes telegramas:

1)-José de Paula Rodrigues Alves (Buenos Aires) ao MRE, 19/08/1942. A imprensa

argentina noticia os torpedeamentos dos navios brasileiros, com muita consternação e

revolta, apoiando uma política de unidade Continental para combater o inimigo fascista.

“Os jornais argentinos comentam, em extensos editoriais, o torpedeamento

de navios brasileiros, encarecendo a necessidade da perfeita e completa

unidade continental em face do inimigo comum. Estamos recebendo

demonstrações de simpatia e adesão de toda a gente. Pelo correio aéreo

remeto os recortes dos jornais”.

2)-Idem, 14/09/1942. Comício de solidariedade às vítimas brasileiras do ataque cometido

pelo submarino alemão U-507 no nordeste brasileiro, com a presença de várias

instituições argentinas.

“Patrocinada por 45 instituições de ordem cultural, social e econômica, e

pelos quatro grandes partidos políticos, haverá, na tarde de sábado, 19 do

corrente, no “Luna Parque”, um grande comício em homenagem ao Brasil,

em cuja cerimônia falarão cinco ex-ministros das Relações Exteriores, a

saber: Senhores Tomas A. Lê Breton, Adolfo Rioy, Saavedra Lamas, José

Maria Cantillo e Julio A. Roca, faltando apenas o Sr. Bosch, que pela sua

idade avançada, não poderá falar. A Comissão organizadora sugere que o

Presidente Getúlio Vargas poderia enviar em um disco, por via aérea, uma

saudação ao povo argentino, a qual seria aqui irradiada, naquele dia no

“Luna Parque”. A mesma Comissão desejaria que as cadeias de rádio

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brasileiras se pusessem em contacto com a “Transradio” para providenciar a

transmissão do que será irradiado pela rádio “El Mundo””.

Essa atitude iria mudar quando os oficiais do GOU assumiram o poder na Argentina e

começaram a cooptar, para a sua esfera de influência, os países vizinhos, inclusive,

financiando um golpe militar na Bolívia que derrubaria o Presidente Peñaranda.

Entretanto, o Brasil conseguiria manter boas relações com o Chile e Paraguai, assinando

acordos comerciais, culturais e financeiros importantes para colocar o Brasil em posição

de destaque na região sul. Os documentos pesquisados não apresentam provas

irrefutáveis da interferência argentina no golpe militar da Bolívia, mas os norte-americanos

procuraram incutir nas Repúblicas americanas essa possibilidade. A única posição

argentina que conseguimos identificar foi a rapidez com que o Governo argentino pediu

para seus vizinhos reconhecerem o novo Governo boliviano.

3)-MRE a Embaixada brasileira em Washington, 07/12/1943. O Governo argentino pede

que os países limítrofes da Bolívia reconheçam, o mais breve possível, o novo Governo

desse país.

“Acabamos de receber da Embaixada, em Buenos Aires, o telegrama abaixo.

Gostaríamos de conhecer sua opinião e a do Governo norte-americano: “Recebi hoje a

visita do Consultor Jurídico do Ministério das Relações Exteriores, que veio, em nome

do seu Governo, pedir-me para dizer a Vossa Excelência o seguinte: a)-que a

República Argentina reitera o desejo de reconhecer o Governo boliviano,

simultaneamente, com o Brasil, Chile e Paraguai, países limítrofes com a Argentina e

Bolívia; b)-que considera o tempo decorrido suficiente para a apreciação dos

acontecimentos; c)-uma vez que a Bolívia assegura o cumprimento, exato, dos fatos e

dos compromissos assumidos e que a situação interna se encontra estabilizada,

parece que é o momento de se proceder o reconhecimento, tanto mais quanto sua

atitude, com relação aos adversários, tem sido humana e respeitosa. Sei que uma

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consulta idêntica foi feita aos Embaixadores chileno e paraguaio. O primeiro disse-me

que a resposta de seu país será negativa, preferindo esperar um pouco mais. Quanto

ao Paraguai, sei que o Embaixador transmitiu mais ou menos a mesma impressão”.

José de Paula Rodrigues Alves”.

4)-Fernando Lobo (Washington) ao MRE, 28/12/1943. O Governo norte-americano pede

ao Brasil para não reconhecer o novo Governo boliviano, até ficar provado que os

nazistas e argentinos não interferiram na política interna desse país.

“O Governo norte-americano pede ao MRE que não reconheça o novo

Governo boliviano, até que fique plenamente provado que o movimento

revolucionário não sofreu qualquer influência nazista ou argentina”.

5)-Idem, 29/12/1943. Os norte-americanos pedem uma reunião de Chanceleres

americanos para que medidas sejam tomadas contra a Argentina e, principalmente, que o

Brasil exerça uma pressão direta contra os seus vizinhos do sul.

“Em um artigo do “Washington Post”, o Sr. Sumner Welles advoga a reunião

dos Ministros das Relações Exteriores das Repúblicas Americanas, com o

intuito de consultar a respeito da atitude e medidas a serem tomadas, em

face da situação na Bolívia, caso haja provas concretas de interferência e

cumplicidade da Argentina, nos negócios internos do país vizinho. Considera

importante uma ação direta do Brasil, sobre a Argentina, a fim de modificar

sua política externa, provocando, sem dúvida, uma reação popular contra o

Governo Ramirez. As Nações Unidas devem manter a recusa de qualquer

auxílio material, crédito, empréstimo e arrendamento”.

Sobre as boas relações entre Brasil, Chile e Paraguai, os documentos, abaixo, mostram a

preocupação do Governo brasileiro em procurar cooptar seus amigos sul-americanos,

assinando um tratado comercial vantajoso com o Chile e pedindo apoio aos EUA para

impedir que movimentos fascistas no Paraguai pudessem desestabilizar o Governo local.

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6)-MRE a Embaixada brasileira em Santiago, 18/03/1943. O Brasil assina um tratado

comercial com o Chile com redução de tarifas alfandegárias.

“No Tratado Comercial assinado, recentemente, nessa capital, foram

concedidos ao Chile os mesmos favores tarifários concedidos à Argentina,

quanto aos seguintes produtos: enchovas, polpa de frutas, alpiste, tomates,

cereais, alhos, batatinhas para sementes, batatas alimentícias, cebolas,

vime, palha, livros e publicações”.

7)-MRE a Embaixada brasileira em Washington, 07/05/1942. Brasil pede auxílio aos EUA

para impedir que ativistas fascistas possam desestabilizar o Governo paraguaio.

“Lavra em certos setores do Paraguai, intensa campanha contra os EUA,

movida, especialmente, por simpatizantes do nazismo. Cremos que a

concessão da ajuda, pedida pelo Paraguai a esse Governo, serviria para

neutralizar a ação de propaganda contrária a esse país. Vossa Excelência

poderá dizer isso ao Sr. Sumner Welles, acrescentando que veríamos com

agrado a concessão do auxílio ao Paraguai, país que temos procurado servir

na medida de nossas necessidades”.

2-Apoio ao Pan-americanismo em busca de uma Política Desenvolvimentista:

Como vimos em nossa pesquisa, o Brasil optou pela política de solidariedade pan-

americana, unindo-se aos EUA e as outras Repúblicas americanas, na tentativa de

manterem-se neutras e longe da guerra na Europa (1939-1940). Contudo, a guerra

chegou até ao Continente quando os EUA entraram em guerra (12/1941), obrigando a

maioria das Repúblicas americanas a romperem relações ou declararem guerra ao Eixo

Berlim-Roma-Tóquio. O Brasil participaria, junto com os EUA, da proteção do Continente,

cedendo bases no nordeste brasileiro e, após os ataques a sua navegação costeira,

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entraria em guerra contra a Alemanha e Itália. Sobre a importância das bases aéreas e

navais no Brasil, destacamos dois documentos de contextos diferentes:

8)-Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 07/08/1943. O Secretário de

Estado norte-americano Sumner Welles declarou que o seu país não pretende manter as

bases aéreas e navais construídas na América do Sul, após o fim do conflito.

“Sumner Welles, em sua habitual entrevista à imprensa, referindo-se à

propaganda nazista no Continente, baseada em falsas interpretações de

declarações de personalidades do Governo dos EUA, sobre a utilização,

depois da guerra, de bases aéreas nos países da América do Sul, declarou

que este país não nutre intenção alguma de submeter a estudos, o direito de

conservar essas bases como compensação ao auxílio material norte-

americano durante a guerra. Salientou, com particular encômio, a

declaração feita no Rio de Janeiro, pelo Secretário Geral do Ministério das

Relações Exteriores, mencionando de maneira especial a passagem relativa

ao espírito de amizade e às relações entre o Brasil e este país. Observou os

efeitos benéficos dessas declarações em esclarecer o mal entendido

provocado pela ação do inimigo. Acrescentou mais, que a utilização das

bases na América do Sul decorre de acordo, que permite o seu uso comum

para fins de interesses mútuos, enquanto durar a guerra”.

9)-Idem, 12/10/1943. O Secretário da Marinha norte-americana Frank Knox enaltece a

importância das bases do nordeste brasileiro no esforço de guerra norte-americano.

“O Secretário da Marinha norte-americana Frank Knox fez declarações muito

favoráveis à participação do Brasil na guerra. Os principais pontos foram: a)-

existem participantes adequados à defesa, desde o Recife até o Atlântico

Norte; b)-a contribuição do Brasil é cada vez mais substancial à guerra ante

os submarinos; c)-o Brasil tem um número crescente de navios para uso

contra os submarinos, e os aeroportos brasileiros estão sendo cada vez

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mais importantes nessa luta; d)-o papel do Brasil demonstra seu notável e

valioso progresso”.

Seria o principal beneficiário da política de “Empréstimos e Arrendamentos” (“Lend and

Lease”) norte-americana para o rearmamento da América Latina, como participou,

também, de acordos financeiros que proporcionaram ao país um investimento de U$ 300

milhões de dólares, além de conseguir o apoio dos EUA para a construção de uma

siderúrgica no país. Descobrimos que depois de alguns percalços, o Brasil conseguiria

adquirir um excepcional empréstimo para colocar sua economia nos trilhos, a seguir:

10)-Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 04/06/1943. Brasil e EUA

assinam um acordo financeiro que cede aos brasileiros um crédito de U$ 200 milhões de

dólares.

“O Secretário do Tesouro enviou-me, devidamente assinada, a carta do

aumento de crédito para 200 milhões. A única formalidade a seguir será a

minha assinatura na referida carta, o que farei, logo que receber autorização

de Vossa Excelência”.

11)-Fernando Lobo (Washington) ao MRE, 25/11/1943. O Governo norte-americano

aprovou um novo acordo financeiro, desta vez de U$ 300 milhões de dólares, que irá

substituir o assinado anteriormente.

“O Secretário de Tesouro norte-americano assinou o novo acordo financeiro,

que eleva o crédito para U$ 300 milhões de dólares”.

Verificamos que Vargas, em momento algum, flertou com os alemães (política pendular),

pois sabia que os EUA não permitiriam perder sua hegemonia no Continente. Vargas era

nacionalista e procurava sempre as melhores oportunidades para o desenvolvimento do

Brasil, não tendo ideologia fixa em seus pensamentos, queria apenas melhorar a

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economia brasileira. Quando não recebeu apoio norte-americano para comprar armas,

procurou-as na Alemanha, quando os EUA não quiseram comprar mais café, vendeu-o

para alemães e italianos, quando não tinha divisas para comercializar com os norte-

americanos, fez o acordo dos marcos compensados com os alemães; quando pretendeu

criar um pólo desenvolvimentista no Brasil com a construção de uma siderúrgica,

procurou recursos onde lhe fosse oferecido e acabou conseguindo nos EUA. Sabia que

ficaria sob a esfera de influência norte-americana e mesmo sendo um ditador, foi um

parceiro extremamente fiel a seus camaradas norte-americanos.

Vargas pediria a Roosevelt que o Brasil tivesse uma participação mais ativa no conflito,

deixando de ser, simplesmente, um país fornecedor de matérias-primas e de bases

militares, para conseguir, no futuro, nas negociações de paz, uma cadeira permanente

nas Nações Unidas. Desse acordo seria criada a Força Expedicionária Brasileira (FEB),

que participaria do Teatro de Operações do Mediterrâneo (TOM) subordinada ao V

Exército norte-americano (07/1944 a 19/09/1945). Conseguimos destacar o encontro

entre Vargas e Roosevelt, em Natal, onde ficou acordado o envio de forças militares para

combater o fascismo para fora do Continente. Por fim, analisamos a adesão do Brasil na

Carta do Atlântico e a Declaração das ações Unidas:

12)-Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 30/01/1943. Divulgação pela

imprensa do encontro entre Getúlio Vargas e Franklin Roosevelt, em Natal.

“A imprensa registra com especial realce a conferência de Natal entre os

Presidentes Getúlio Vargas e Franklin Roosevelt, publicando comunicados

oficiais dos dois Governos, assim como a entrevista à imprensa brasileira,

concedida pelo Presidente Getúlio Vargas logo após sua volta ao Rio de

Janeiro. Especula-se que nessa conferência teria sido decidido: 1)-o Brasil

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colocará à disposição dos EUA certo número de navios mercantes; 2)-o

Brasil enviaria forças para a linha de frente”.

13)-Idem, 08/02/1943. O Brasil adere à Carta do Atlântico e à Declaração das

Nações Unidas.

“Na entrevista, às 2 horas, que tive com Sumner Welles dei-lhe,

verbalmente, conhecimento da decisão do Governo brasileiro. Recebido, às

8 horas e meia, pelo Secretário de Estado, entreguei-lhe, pessoalmente, a

nota comunicando a adesão formal do Brasil à Declaração das Nações

Unidas e à Carta do Atlântico”.

14)-Idem, 22/02/1943. O Departamento de Estado norte-americano informa o recebimento

da adesão brasileira à Declaração das Nações Unidas e à Carta do Atlântico.

“O Departamento de Estado acusou o recebimento da nota sobre a adesão

do Brasil à Declaração das Nações Unidas, exprimindo a satisfação deste

Governo de haver o nosso país, se associado, formalmente, aos princípios

da Carta do Atlântico na luta contra as forças brutais que querem subjugar o

mundo.Transmitirá nossa comunicação aos governos das Nações Unidas. O

Sub-secretário de Estado informou-me, em carta, que haverá no dia 4 de

março, na Casa Branca, uma cerimônia de saudação ao Brasil e ao Iraque,

fazendo-se pública, nessa ocasião, a declaração do Governo brasileiro”.

3-Comércio Exterior dependente do Mercado Norte-americano:

Esse ponto é, sem dúvida, um dos mais difundidos em qualquer dissertação sobre o

assunto. O Brasil era um país pobre, produtor de matérias-primas, deficiente em

tecnologia, com um parque industrial sofrível, com destaque para o setor têxtil, totalmente,

dependente do mercado internacional para vender seus produtos primários em troca de

equipamentos e produtos manufaturados. Era um parceiro ideal para qualquer país

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industrializado, que poderia comprar artigos básicos para as suas indústrias, a preços

baixos, vendendo produtos industrializados por preços muito mais caros. Assim, qualquer

tentativa de desenvolvimento criada pelo Brasil, encontraria forte oposição dos países

industrializados. O Brasil necessitava de vender cada vez mais seus produtos para tentar

capitalizar divisas, tão necessárias para custear o seu desenvolvimento industrial e

tecnológico.

Os EUA eram os principais parceiros comerciais do Brasil, porém, este comércio era

realizado com moeda corrente (divisas) através do princípio da “nação mais favorecida”,

criando uma desvantagem muito grande para o país, pois importava mais do que

exportava, criando um déficit comercial cada vez maior. Dessa forma, o país foi obrigado,

por falta de recursos, de suspender o pagamento da sua dívida externa (1938). Mais

tarde, o Governo brasileiro fecharia um acordo com os EUA para a aquisição de ouro para

completar as suas parcas divisas e tentar regularizar o seu pagamento da dívida com os

credores internacionais, principalmente os norte-americanos. Vimos nos telegramas,

abaixo, o esforço do Governo brasileiro para solucionar o pagamento da sua dívida

externa com os Portadores norte-americanos de Títulos brasileiros, com a aquisição de

ouro, adquirido através do Departamento de Tesouro dos EUA.

15)-MRE a Embaixada brasileira em Washington, 29/07/1943. Acordo com o

Departamento de Tesouro norte-americano para a aquisição de ouro para ajudar o Brasil

a aumentar as suas divisas (estabilização do câmbio).

“Queira entrar em entendimento com esse Governo para ampliação e

prorrogação do acordo assinado em Washington, pelo Ministro Souza Costa,

em julho de 1937, sobre aquisição de ouro. O máximo de ouro a ser

adquirido deve ser elevado a U$ 100 milhões de dólares e o prazo,

prorrogado por mais cinco anos, isto é, até 15 de julho de 1947. O texto do

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mencionado acordo foi enviado a esta Secretaria de estado com o ofício

dessa Embaixada nº 294, de 30/07/1937”.

16)-Fernando Lobo (Washington) ao MRE, 26/11/1943. O Governo brasileiro aprova o

Decreto Lei nº que estabelece regras para o pagamento de sua dívida externa.

“Transmiti à imprensa norte-americana, o texto do Decreto Lei nº e os

respectivos anexos 1 e 3, que regula o acordo com os Portadores norte-

americanos de Títulos brasileiros, para o pagamento da nossa dívida

externa”.

O Brasil precisava ampliar mercados e encontrou na Alemanha o seu segundo parceiro,

que, como analisamos durante todo o trabalho, criou um sistema de trocas (marcos

compensados ou aski), extremamente vantajoso para os países carentes de divisas. O

mercado alemão conseguia absorver muitos produtos primários brasileiros (algodão,

borracha, lã, café e cacau) que não tinham mercado ou estavam sofrendo forte

concorrência de outros países, nos EUA. Esse comércio criaria uma série de entreveros

com os norte-americanos que se sentiam ameaçados pelos produtos alemães no

mercado brasileiro, assim como temiam perder o mercado alemão, para o algodão

brasileiro. A pretensão brasileira era manter uma harmonia entre esses dois mercados,

extremamente importante para o desenvolvimento da sua economia e, também, evitar a

dependência de um único parceiro comercial.

Roosevelt procurou, através de uma política amigável (boa vizinhança), conciliar esse

conflito, temendo que o Brasil fosse cooptado para o lado do fascismo. Com o início do

conflito (1939), os EUA com a sua política hegemônica no Continente, intensificaria a sua

política de reaproximação com o Brasil, por uma série de circunstâncias já estudadas

neste trabalho, formulando vários acordos comerciais (algodão, cacau e café) e militares

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170

(“Lend and Lease”), que afastaram, definitivamente, o já combalido comércio alemão da

região, em função do bloqueio imposto pelos britânicos aos navios mercantes alemães,

com exceção do comércio argentino, durante a Segunda Guerra Mundial.

Porém, o acordo comercial mais importante entre norte-americanos e brasileiros foi o

financiamento para construção de uma siderúrgica no Brasil. Depois de muitos debates e

recusas dos empresários norte-americanos em emprestar o capital para esse grande

empreendimento e da ameaça alemã de custeá-lo, o “Export Import Bank” acabaria

emprestando o capital necessário para a criação da Companhia Siderúrgica Nacional.

Apesar dos atrasos causados, principalmente pelas prioridades militares norte-

americanas na produção de equipamentos de guerra, a usina seria iniciada em 1946.

Esse apoio norte-americano iria colocar, definitivamente, o Brasil ao lado dos EUA na

guerra contra os países do Eixo. Ao compararmos os telegramas que falam sobre os

acordos financeiros para a aquisição de uma siderúrgica no Brasil, conseguimos compilar

quatro documentos, em momentos diferentes, muito interessantes, enquanto um mostra a

desistência da “United Steel” em patrocinar a construção da siderúrgica, outros dois

assinalam o acordo realizado. O quarto mostra a preocupação do Governo brasileiro com

a demora na entrega dos materiais para o início da construção da siderúrgica,

considerando-os indispensáveis para a defesa do país:

17)-Carlos Martins Pereira e Souza (Washington) ao MRE, 22/01/1940. A “United Steel”

não aceitou financiar uma siderúrgica no Brasil, apesar do parecer técnico ter sido

favorável ao empréstimo.

“Na presença do Consultor Financeiro do Departamento de Estado,

conferenciei com o Secretário de Estado, ao qual dei conhecimento da

decepção que causou a decisão da “United Steel”, porquanto o relatório

técnico é muito mais decisivo e otimista do que as considerações de ordem

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171

geral que determinaram a companhia a enviar seus representantes ao

Brasil. Se a “United Steel” não se interessava pela colaboração oferecida,

porque, inicialmente, não manifestou tal pensamento. O Secretário de

Estado insinuou a possibilidade de interessar outras empresas de

metalurgia. Respondi-lhe que o Brasil não podia esperar, indefinidamente,

pela problemática de boa vontade dos capitais norte-americanos para tornar

uma realidade, a política de boa vizinhança. Ficou combinada uma reunião,

no Departamento de Estado, onde encontrarei os representantes da

“Reconstruction Finance Corporation”, “Export and Import Bank”, Ministério

do Comércio e interessados na metalurgia, para procurarmos bases para a

cooperação norte-americana. Asseguraram-me, não ter o menor fundamento

a propalada permutação entre a questão siderúrgica e a da dívida.

Provavelmente, alguns interessados buscam, esperançosos, conjugar

esforços no sentido de condicionar uma à outra”.

18)-Idem, 31/05/1940. Empresa norte-americana acaba aceitando a empreitada de

construir a siderúrgica brasileira.

“Tenho a grande satisfação de comunicar que Sumner Welles acaba de me

informar que a “Reconstruction Finance Corporation”, presidida pelo Sr.

Jessé Jones, declara, oficialmente, que assumirá o financiamento da

indústria siderúrgica no Brasil, com a cota inicial de U$ 10 milhões de

dólares, podendo ser, entretanto, essa soma aumentada de acordo com as

necessidades do plano brasileiro. Jones manifestou o desejo de que

confiemos a construção, organização e administração, por prazo de alguns

anos, a uma empresa norte-americana. Fico feliz pelo êxito das negociações

que foram iniciadas, cerca de 6 meses atrás, com diversas organizações

financeiras oficiais norte-americanas para a solução do nosso problema

siderúrgico”.

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19)-Idem, 26/09/1940. Finalmente, o acordo para a construção da siderúrgica no Brasil é

assinado.

“Tenho a honra de comunicar a Vossa Excelência que foram trocadas

cartas, entre o Dr. Guilherme Guinle e o Sr. Jessé Jones, assegurando o

crédito de U$ 20 milhões de dólares, pelo prazo de 15 anos a juros de 4%,

destinado à construção da usina siderúrgica, de acordo com o plano adotado

pela Comissão brasileira”.

20)-MRE a embaixada brasileira em Washington, 04/01/1940. Com a demora da entrega

do material para a construção da siderúrgica no Brasil, o MRE pede prioridade para o

envio desses equipamentos.

“O Ministério das Relações Exteriores brasileiro está preocupado com as

encomendas necessárias para a construção da usina siderúrgica nacional,

em função dos EUA criar prioridades para a execução de encomendas feitas

as suas fábricas, na função de necessidade, para produzir equipamentos

para a defesa nacional norte-americana. O Brasil considera indispensável, à

defesa do país, a construção da Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta

Redonda, pedindo para que seja considerado material e equipamento de

guerra”.

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C3-A DIVISÃO BIPOLAR DA POLÍTICA EXTERNA CHILENA:

Como verificamos neste trabalho, o Chile era o único país latino-americano que tinha um

governo democrático, composto pelos principais partidos de esquerda (comunistas,

radicais e socialistas) que, na política interna, buscava o desenvolvimento industrial, em

conjunto com mecanismos capazes de solucionar os principais problemas sociais e, na

política externa, uma campanha de luta contra o fascismo e o imperialismo internacional.

Essa política externa não impediu o país de se relacionar, comercialmente, com norte-

americanos, britânicos e alemães, porém, seriam os norte-americanos os principais

parceiros chilenos no período da Segunda Guerra Mundial. É importante ressaltar que,

durante a guerra, os norte-americanos comprariam, praticamente, toda a produção

mineral chilena, cerca de 80% (salitre, cobre e nitratos), até o final de 1945.

O Governo chileno entraria em conflito, com quase ruptura de relações diplomáticas,

contra o governo nacionalista espanhol (Franco), por causa de cidadãos espanhóis

exilados na Embaixada chilena, em Madri (1939), logo após o fim da guerra civil

espanhola. O Brasil teria um papel fundamental na solução do problema, conduzindo as

negociações e conseguindo que os asilados fossem liberados e as relações políticas

entre espanhóis e chilenos retornassem à normalidade. Descobri, surpreso, que o

Governo chileno tinha um excelente relacionamento com o Governo brasileiro,

principalmente, nas questões relacionadas com a política regional sul-americana. Antes

de agirem na política regional, os chilenos consultavam os brasileiros e, geralmente,

acatavam as resoluções propostas pelo Governo brasileiro. A única exceção seria na

Conferência do Rio de Janeiro, onde o Chile, devido à sua fragilidade militar, acabou não

concordando com a política de romper com os países do Eixo. Como vimos, a pressão

norte-americana, a opinião pública chilena e os partidos de esquerda que compunham a

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Frente Popular acabaram levando o Chile a romper relações diplomáticas com os países

do Eixo, em 23 de janeiro de 1943. Estudando as informações vindas das embaixadas,

analisamos os principais pontos:

1-Divisão Interna Determina uma Política Externa Dividida (Comunismo x

Capitalismo):

Quando comecei a analisar e a comparar os telegramas vindos da Embaixada brasileira

em Santiago, com os enviados pelo Itamaraty, acreditava que existissem referências

sobre uma disputa bipolar no Governo da Frente Popular chilena. Ao estudar a política

chilena, encontrei várias vezes informações que indicavam essa divisão, com os

comunistas e socialistas apoiando o Governo da União Soviética e os radicais, as

potências Ocidentais. Achei fontes que indicavam que os socialistas chilenos eram contra

o Pacto Germano-soviético e os comunistas, favoráveis, inclusive, passando a defender o

fascismo alemão. Quando os alemães invadiram a Rússia, comunistas e socialistas iriam

se unir contra o fascismo e, com a entrada dos EUA na guerra, passariam a defender a

causa aliada, aceitando a política de solidariedade pan-americana. Infelizmente, tenho

que admitir, esta hipótese não foi possível verificar nas fontes (telegramas) do Ministério

das Relações Exteriores do Brasil.

PRINCIPAIS PONTOS NA POLÍTICA EXTERNA CHILENA NÚMERO PRINCIPAIS PONTOS

1 Divisão interna determina uma Política Externa dividida (Comunismo x Capitalismo); 2 Manutenção da política de neutralidade na tentativa de manter a segurança do país; 3 Comércio exterior dependente do mercado norte-americano.

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2-Manutenção da Política de Neutralidade na Tentativa de Manter a Segurança do

País:

O Governo chileno aceitou participar da política pan-americana, quando esta preconizava

a neutralidade como a forma ideal de manter as Repúblicas americanas longe da guerra

européia (1939-1940). Contudo, quando esta política modificou-se preconizando que o

Continente rompesse as relações diplomáticas com as potências do Eixo, por causa da

entrada dos EUA no conflito, o Governo chileno, preocupado com a sua fragilidade militar,

resolveu manter-se neutro, indo contra a nova resolução acordada na Conferência do Rio

de Janeiro (1942). O Chile temia um ataque japonês à sua vasta costa ou que submarinos

alemães pudessem interromper o seu comércio exterior, principalmente para os EUA.

Precisava de ajuda militar urgente, porém, naquele momento, os norte-americanos

estavam incapacitados de fornecer qualquer tipo de material bélico aos chilenos. Os

documentos, abaixo assinalados, mostram o pânico que as autoridades e a imprensa

chilenas tinham de serem surpreendidas por algum ataque das potências do Eixo:

1)-S. de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 20/01/1942. A Imprensa chilena está

preocupada com as resoluções acordadas na III Conferência dos Chanceleres

Americanos no Rio de Janeiro.

“Os jornais chilenos continuam interessados com os trabalhos da III Reunião

de Consulta, especialmente, quanto ao rompimento das relações com a

Alemanha, Itália e Japão. Em geral, condenam a proposição neste sentido,

salientando o perigo que poderá trazer ao Chile, país completamente

desarmado, e julgando que este Governo não a deva aceitar. O Vice-

Presidente da República, também, falou-me sobre o assunto, manifestando

grande temor e apreensão diante das graves conseqüências que

acarretariam para este país”.

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2)-MRE a embaixada brasileira em Santiago, 22/01/1942. O Ministro Aranha procura

acalmar o Vice-Presidente chileno informando-o de que os EUA e o Brasil irão apoiar o

Chile na defesa da sua soberania.

“Diga ao Vice-Presidente chileno qu,e conversando com o Secretário de

Estado Sumner Welles, fui informado que os EUA darão toda a assistência

necessária e nós, brasileiros, faremos tudo que esteja ao nosso alcance

para não deixar o povo chileno desamparado”.

3)-MRE a Embaixada brasileira em Washington, 04/08/1942. O Governo chileno informa

que em breve irá tomar uma decisão sobre a ruptura contra os países do Eixo.

“O Embaixador do Brasil, em Santiago, teve uma longa entrevista com o

Presidente chileno, onde declarou que o seu Governo tomará,

imediatamente, as decisões, mesmo as extremas, que o Presidente dos

EUA reputa imprescindíveis e necessárias à defesa e solidariedade

continentais. Salientou, porém, que um ataque às fontes de produção

chilenas, todas situadas na costa, ou a paralisação do comércio marítimo

teriam sérias conseqüências na política interna e criariam graves problemas

para a população do norte do país que ficaria sem trabalho. Por causa disso,

pediria ao Governo norte-americano todo o auxílio indispensável e

conveniente. O Presidente do Chile pede, que não se veja nesse pedido,

qualquer propósito de negociar com a posição de seu país no conflito, mas

tão somente, o de colaborar, cada vez mais, estreitamente, com os EUA e

as demais Nações americanas”.

Essa política de neutralidade iria gerar um conflito com os EUA e que se prolongaria

durante todo o ano de 1942. Verificamos que, com a visita do Ministro das relações

Exteriores do Chile a várias Repúblicas americanas, no final de 1942, o Governo,

pressionado pela opinião pública, pelos principais sindicatos dos trabalhadores chilenos e

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pela imprensa, acabaria aceitando romper as relações com os países do Eixo em 20 de

janeiro de 1942.

Descobrimos, também, que os norte-americanos fizeram uma forte pressão política contra

a intenção dos chilenos permanecerem neutros, inclusive, com discursos duros e

ofensivos do Secretário de Estado Sumner Welles à imprensa internacional, fato que

desagradou, em muito, o Governo chileno. O incidente criado, entre o Chile e os norte-

americanos, foi o ponto mais tenso entre os dois países durante a Segunda Guerra

Mundial, como podemos ver nos telegramas escolhidos:

4)-Fernando Lobo (Washington) ao MRE, 10/10/1942. Discurso do Sr. Sumner Welles

criticando a política de neutralidade do Chile e da Argentina.

“Em discurso pronunciado em Boston, o Sr. Sumner Welles, apresentando

um resumo da situação atual da guerra e os objetivos futuros da paz,

realçou a atitude dos países latino-americanos que declararam guerra aos

países do Eixo e, condenou a atitude da Argentina e do Chile, que permitem

que seus territórios sejam utilizados por agentes inimigos, responsáveis pelo

afundamento de navios aliados. Acrescentou que não esperava que esses

países ficassem tanto tempo sem apoiar os seus vizinhos, que estão em luta

de vida ou morte para a preservação da liberdade e da integridade do Novo

Mundo, ameaçados de serem atacados, pelas costas , por emissários do

Eixo infiltrados na Argentina e no Chile. A imprensa norte-americana informa

que a Argentina e o Chile protestaram contra as expressões do discurso e,

que o Embaixador chileno recebeu instruções para protestar, oficialmente,

contra as mesmas expressões”.

5)-S. de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 12/10/1942. O discurso do Sr. Welles

provocou protestos no Chile e adiou a viagem do Presidente chileno aos EUA.

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“O Governo chileno acaba de comunicar ao Embaixador norte-americano o

texto da mensagem telegráfica, nos termos mais cordiais, que o presidente

Ríos dirigiu ao Presidente Roosevelt, dizendo que, em vista do ambiente

desfavorável criado pelos EUA para a sua visita aquele país, resolveu adiar

a viagem. O Governo chileno, também, entregou um comunicado à

imprensa”.

6)-Idem, 13/10/1942. O Governo chileno pede apoio ao Ministro Oswaldo Aranha para

resolver o incidente ocorrido com os EUA, devido ao discurso do Sr. Welles.

“Os Senadores Amanutegin e Videla Lira pediram ao Ministro brasileiro

Oswaldo Aranha que interceda, com o fim de resolver o lamentável

incidente, produzido pelo discurso do Sr. Sumner Welles, que obrigou ao

Presidente Ríos a adiar a sua viagem aos EUA, como satisfação à opinião

pública. Acreditam que Vossa Excelência possa conseguir que o Presidente

Roosevelt responda o telegrama do Governo chileno, reforçando o convite

de visita a Washington, e insinuando que o incidente seria esclarecido. O

Governo chileno está muito desejoso de solucionar este desagradável

incidente, que causa especial satisfação nos partidários do eixo e está

sendo explorado pelos representantes diplomáticos desses países”.

Com o Chile participando, novamente, do pan-americanismo, os norte-americanos

começaram a rearmar as Forças Armadas chilenas, através do sistema de “Empréstimos

e Arrendamentos” (“Lend and Lease”), porém, os militares chilenos não ficariam

satisfeitos com a quantidade e a qualidade do material bélico fornecido. Por fim, o

Governo chileno romperia as relações diplomáticas com os países do Eixo:

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7)-S. de Souza Leão Gracie (Santiago) ao MRE, 20/01/1943. O Chile rompe com as

potências do Eixo.

“O Ministro das Relações Exteriores acaba de me informar, oficialmente, que

foi decretado o rompimento das relações diplomáticas e consulares com os

Governos do Eixo. As notas comunicando a ruptura foram mandadas

entregar, hoje, aos representantes da Alemanha, Itália e Japão. Disse-me

que o Governo suíço se encarregará dos interesses chilenos naqueles

países”.

Um fato bastante interessante descoberto nessa pesquisa, foi que o Governo chileno

sempre procurou consultar o Itamaraty, antes de tomar qualquer atitude referente à

política sul-americana, aceitando, na maioria das vezes o conselho recebido. O Brasil,

também, seria o mediador do conflito diplomático entre o Chile e a Espanha nacionalista

por causa de um grupo de cidadãos espanhóis asilados na Embaixada chilena, em Madri,

no final da guerra civil. A participação do Itamaraty foi fundamental para a solução do

caso, que acabou com a saída do grupo, via Portugal para Santiago, sem qualquer tipo de

represália praticada pelo governo espanhol.

3-Comércio Exterior Dependente do Mercado Norte-americano:

A economia chilena, com vimos, era extremamente dependente dos capitais

internacionais e, após o início da Segunda Guerra Mundial (1939), passou a viver em

função da economia norte-americana. Os EUA investiriam pesado na produção mineral

chilena (salitre, cobre e nitrato), entretanto pagariam pelos produtos um valor muito

pequeno (artificial), prejudicando a economia chilena, que gastava cada vez mais com as

importações dos produtos norte-americanos. Poderíamos afirmar que o Chile foi um

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grande aliado na luta contra o fascismo, pois subvencionou toda a sua produção mineral.

Os trabalhadores, também, cumpriram o seu papel, aceitando salários baixos e fazendo

hora-extra para aumentar a produção nas minas, sendo impedidos pelos sindicatos,

comandados pelos comunistas, de fazerem qualquer tipo de greve, em apoio à Rússia

que lutava junto com os aliados.

Apesar disto, houve um acúmulo de divisas que seriam utilizadas, junto com os

empréstimos cedidos pelos norte-americanos (“Export Import Bank”), para o

desenvolvimento das indústrias do aço, petróleo, eletricidade e da pesca. Esses

investimentos eram administrados pela “Corporación de Fomento de la Produción”

(CORFO), instituição que tinha sido criada para ajudar as regiões abaladas pelo terremoto

de 1939. Enquanto vendia seus produtos por um preço irreal, o Chile era obrigado a

adquirir produtos manufaturados norte-americanos por preços muito elevados. Muitos

desses produtos eram comprados na Alemanha, através, do programa de marcos

compensados (sistema aski), trocados por nitratos e cobre, sem a utilização de divisa. O

custo de vida aumentaria 300%, durante o período da guerra (1942-1945), empobrecendo

cada vez mais os trabalhadores chilenos. Podemos afirmar que a participação chilena na

política hegemônica norte-americana foi bastante prejudicial ao país.

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FONTES:

1-Telegramas recebidos pelo Ministério das Relações Exteriores do Brasil

(Itamaraty) das seguintes Embaixadas brasileiras [1938-1943]:

1.1- BERLIM:

1.2- BUENOS AIRES:

1.3- ROMA:

ANO TELEGRAMAS BOLETINS 1938 123 --- 1939 260 25 1940 486 42 1941 525 183 1942 --- --- 1943 --- --- Total: 1.394 250

ANO TELEGRAMAS BOLETINS 1938 200 --- 1939 172 --- 1940 190 --- 1941 211 2 1942 369 --- 1943 338 12 Total: 1.480 14

ANO TELEGRAMAS BOLETINS 1938 85 --- 1939 181 --- 1940 428 4 1941 151 --- 1942 23 --- 1943 --- --- Total: 868 4

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182

1.4- SANTIAGO:

1.5- WASHINGTON:

2-Telegramas expedidos pelo Ministério das Relações Exteriores do Brasil

(Itamaraty) para as seguintes Embaixadas brasileiras [1938-1943]:

TOTAL FINAL: Telegramas: 14.081 Boletins: 326

ANO TELEGRAMAS BOLETINS 1938 107 --- 1939 202 --- 1940 197 --- 1941 299 --- 1942 344 --- 1943 265 8 Total: 1.414 8

ANO TELEGRAMAS BOLETINS 1938 224 --- 1939 297 --- 1940 342 --- 1941 488 --- 1942 878 50 1943 879 --- Total: 3.108 50

EMBAIXADAS BRASILEIRAS Berlim Buenos Aires Roma Santiago Washington ANO

Telegramas Telegramas Telegramas Telegramas Telegramas

1938 99 145 80 73 173 1939 180 140 119 122 241 1940 345 145 296 113 262 1941 229 194 128 154 457 1942 39 227 25 157 636 1943 --- 230 --- 183 625 Total: 892 1.081 648 802 2.394

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183

3-Ministério das Relações Exteriores – “O Brasil e a Segunda Guerra

Mundial” – Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, Brasil, 1944 (Volumes I, II).

3.1-CONFERÊNCIA INTERAMERICANA DE CONSOLIDAÇÃO DA PAZ: pp. 14-16

Vol. I

Projeto de Pacto Interamericano de Segurança Coletiva (Anexo 1)

[Buenos Aires – 1936]

3.2-OITAVA CONFERÊNCIA INTERAMERICANA: pp. 16-17 Vol. I

Resolução CIX da Oitava Conferência Internacional Americana (Anexo 4)

[Lima – 1938]

3.3-PRIMEIRA CONSULTA DE MINISTROS DAS RELAÇÕES EXTERIORES DAS

REPÚBLICAS AMERICANAS: pp. 21-25 Vol. I

Declaração Geral de Neutralidade (Anexo 6)

[Panamá – 1939]

3.4-PRIMEIRA CONSULTA DE MINISTROS DAS RELAÇÕES EXTERIORES DAS

REPÚBLICAS AMERICANAS: pp. 33-35 Vol. I

Instituindo uma Zona de Segurança Continental (Anexo 7)

[Panamá – 1939]

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184

3.5-PRIMEIRA CONSULTA DE MINISTROS DAS RELAÇÕES EXTERIORES DAS

REPÚBLICAS AMERICANAS: pp. 17-18 Vol. I

Declaração Conjunta de Solidariedade Continental (Anexo 8)

[Panamá – 1939]

3.6-SEGUNDA CONSULTA DE MINISTROS DAS RELAÇÕES EXTERIORES DAS

REPÚBLICAS AMERICANAS: pp. 30-33 Vol. I

Defesa da Política Pan-americana (Anexo 9)

[Havana – 1940]

3.7-TERCEIRA CONSULTA DE MINISTROS DAS RELAÇÕES EXTERIORES DAS

REPÚBLICAS AMERICANAS: pp. 12-13 Vol. II

Rompimento de Relações Diplomáticas com as Potências do Eixo (Anexo 10)

[Rio de Janeiro – 1942]

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Barcelona, Espanha, Editorial Crítica, 2002.

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39. “Sentando a Pua! – A História da Aviação Militar Brasileira na Segunda Guerra

Mundial – Comandantes de U-boats (Harro Schacht)”.

Disponível em: http://www.sentandoapua.com.br/navios/com/schacht.htm.

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40. “Sentando a Pua! – A História da Aviação Militar Brasileira na Segunda Guerra

Mundial – U-boats (U-507)”.

Disponível em: http://www.sentandoapua.com.br/navios/sub/u507.htm.

Acesso: 13/01/2006.

41. “The U-boat War (1939-1945)”.

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Disponível em: http//www.grandesguerras.com.br/artigos/text01.php?art_id=194.

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.

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ANEXOS:

ANEXO 1: CONFERÊNCIA INTERAMERICANA DE CONSOLIDAÇÃO DA PAZ

[BUENOS AIRES – Dezembro de 1936]

Os principais Artigos da Conferência foram:

Artigo 1-As Altas Partes Contratantes, firmemente dispostas a defender o Continente

americano contra a tendência expansionista de outros povos, declaram que não terá

aplicação na América a doutrina segundo a qual a carência de matérias primas, o excesso

de população ou qualquer outro pretexto dá direitos à aquisição de terras alheias.

Artigo 2-As Altas Partes Contratantes consideram como ato inamistoso a intromissão de

qualquer potência extracontinental em país americano com o qual a dita potência não

tenha relações pré-existentes de dependência política, sempre que tal intromissão

ameace a segurança nacional desse país, ou comprometa, direta ou indiretamente, a sua

integridade territorial, ou determine o exercício de qualquer forma de influência

preponderante estranha sobre os seus destinos.

Artigo 3-As Altas Partes Contratantes concordam em se concertar imediatamente umas

com as outras, para a defesa comum e resguardo de todas, se a segurança nacional, a

integridade territorial ou a independência política de um país americano vier a ser

ameaçada ou comprometida por qualquer país extra-continental.

Artigo 4-As Altas Partes Contratantes consideram igualmente como ato inamistoso a

intromissão de qualquer delas, direta ou indireta, seja qual for o pretexto, nos assuntos

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privativos de qualquer dessas partes, ainda que sob a invocação de o fazer para cumprir

as disposições deste Pacto. As Altas Partes Contratantes, no caso de violação das

disposições deste artigo, concordam em se concertar imediatamente, entre si, por

iniciativa de qualquer delas.

Artigo 5-Este Tratado será ratificado pelas Altas Partes Contratantes na forma

estabelecida em suas respectivas Constituições, sem que esta ratificação signifique de

modo algum renúncia de obrigações anteriores, contraídas com outros Estados ou com

organizações internacionais.

O original do tratado e os instrumentos de ratificação serão depositados na União Pan-

americana, que, por via diplomática, comunicará o recebimento de tais instrumentos a

todos os Governos signatários.

(Buenos Aires, 23 de dezembro de 1936).

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ANEXO 2: DECRETO LEI Nº 31.321 QUE OFICIALIZA AS ATIVIDADES DAS

ASSOCIAÇÕES ESTRANGEIRAS NA ARGENTINA

[BUENOS AIRES – MAIO DE 1939]

Os principais Artigos do Decreto Lei foram:

Artículo 1º-Todas las asociaciones, tengan o no personería jurídica, que se constituyan

en la Capital Federal y territorios nacionales, deberán comunicar al Ministerio del Interior a

los Jefes de Policía de los respectivos domicilios, la denominación que adopten, sus

finalidades, sus reglamentos y estatutos, y la nómina de sus componenetes incluyendo

nombre y apellido, edad, estado civil, profesión, nacionalidad y domicilio. Deberán llevar,

obligatoriamente y ponerlo a disposición de la autoridad cuando ésta lo requiera, un libro

de actas en que consten todas sus resoluciones.

Artículo 2º-Las asociaciones no podrán tener ni utilizar otros distintivos de nacionalidad,

que los consagrados por el Estado, ni adoptar enseñas, himnos, uniformes o símbolos

que singularicen partidos o asociaciones extranjeras.

Artículo 3º-Las denominaciones, los estatutos y los reglamentos que usaren, serán y

estarán escritos únicamente en idioma castellano.

Artículo 4º-Ninguna asociación podrá realizar actos que importen inmiscuirse, directa o

indirectamente, en la política de los países extranjeros, ni ejercer acción individual o

colectiva compulsiva para obtener la adhesión a determinados idearios políticos, bajo

promesa de ventajas o amenazas de perjuicios de cualquier naturaleza.

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Artículo 5º-Toda asociación, esté o no esté compuesta por extranjeros, deberá tener

origen, exclusivamente, dentro del territorio argentino; sus autoridades y reglamentos

tendrán idéntico origen nacional. Deberán, asimismo, sujetarse a los principios

democráticos que imponen la determinación de sus actos y la elección de sus autoridades

se hará siempre por medio del voto de sus afiliados.

Artículo 6º-Ninguna asociación podrá depender de gobierno ni entidades extranjeras ni

recibir del exterior subvenciones ni donaciones de ninguna especie, salvo las de índole

benéfica, que podrá aceptar previo conocimiento del Poder Ejecutivo.

Artículo 7º-Las asociaciones extranjeras que tengan fines culturales, artísticos o de

asistencia social, podrán desenvolver libremente sus actividades, sin más obligaciones

que las impuestas en el artigo 1º.

Artículo 8º-El incumplimiento de las disposiciones que preceden, determinará la

inmediata disolución de la asociación infractora, sin perjuicio de las penalidades que a sus

miembros pueda corresponder de acuerdo a las leyes en vigor.

Artículo 9º-Las asociaciones existentes a la fecha de este decreto tendrán un plazo de

noventa días para someterse a sus prescripciones …

(Buenos Aires, 15 de maio de 1939).

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ANEXO 3: DECRETO LEI Nº 383 QUE REGULAMENTA AS ATIVIDADES

POLÍTICAS EXERCIDAS PELOS ESTRANGEIROS RESIDENTES NO BRASIL

[RIO DE JANEIRO – ABRIL DE 1938]

Os principais artigos do Decreto Lei eram:

Artigo 1º-Fica proibido aos estrangeiros exercer qualquer atividade de natureza política

nem imiscuir-se, direta ou indiretamente, nos negócios públicos do país.

Artigo 2º-Fica vedado aos estrangeiros organizar, criar ou manter sociedades, fundações,

companhias, clubes e quaisquer estabelecimentos de caráter político, ainda que tenham

por fim exclusivo a propaganda ou difusão, entre seus compatriotas, das idéias,

programas ou normas de ação de partidos políticos do país de origem. É proibido

organizar desfiles, passeatas, comícios e reuniões de qualquer natureza, e qualquer que

seja o número de participantes. Não podem manter jornais, revistas ou outras

publicações, estampas, artigos e comentários na imprensa, conceder entrevistas, fazer

conferências, discursos, alocuções...

Artigo 3º-Os estrangeiros tem o direito de se reunirem com “fins culturais, beneficentes

ou de assistência”, bem como para comemorar as “datas nacionais ou acontecimento de

significação patriótica”. Mas essas associações não podem de modo algum “receber

subvenções, contribuições ou auxílios de governos estrangeiros”.

Artigo 5º-Fica proibido aos brasileiros “natos ou naturalizados, e ainda que sejam filhos

de estrangeiro”, de fazer parte das organizações criadas em virtude do Artigo 3º.

(Rio de Janeiro, 18 de abril de 1938)

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ANEXO 4: OITAVA CONFERÊNCIA INTERNACIONAL AMERICANA - PACTO

INTERAMERICANO DE SEGURANÇA COLETIVA

[LIMA – DEZEMBRO DE 1938]

Os Governos dos Estados Americanos declaram:

Artigo 1˚-Que reafirmam sua solidariedade continental e seu propósito de colaborar na

manutenção dos princípios em que se baseia a dita solidariedade.

Artigo 2˚-Que, fiéis aos princípios antes enunciados e à sua soberania absoluta,

reafirmam sua decisão de mantê-los e defende-los contra toda intervenção ou atividade

estranha que possa ameaçá-los.

Artigo 3˚-E que, para o caso em que a paz, a segurança ou a integridade territorial de

qualquer das Repúblicas americanas se veja assim ameaçada por atos de qualquer

natureza que possam menoscaba-las, proclamam seu interesse comum e sua

determinação de tornar efetiva sua solidariedade, coordenando suas respectivas vontades

soberanas mediante o procedimento da consulta que estabelecem os convênios vigentes

e as declarações das Conferências Interamericanas, usando dos meios que em cada

caso aconselhem as circunstâncias. Fica entendido que os Governos das Repúblicas

americanas obrarão, independentemente, em sua capacidade individual, reconhecendo-

se amplamente sua igualdade jurídica como Estados soberanos.

Artigo 4˚-Que para facilitar as consultas que estabelecem este e outros instrumentos

americanos de paz, os Ministros das Relações Exteriores das Repúblicas americanas

celebrarão, quando o julguem conveniente, e por iniciativa de qualquer deles, reuniões

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nas diversas capitais das mesmas, por meio da rotação e sem caráter protocolar. Cada

Governo pode, em circunstâncias e por motivos especiais, designar representantes que

substituam seu Ministro das Relações Exteriores.

Artigo 5˚-Esta declaração será conhecida como “Declaração de Lima”.

(Lima, 24 de dezembro de 1938).

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ANEXO 5: POSIÇÃO DO GOVERNO ARGENTINO EM LIMA

[LIMA – DEZEMBRO DE 1938]

A posição do Governo argentino no acordo realizado em Lima foi:

“El concepto argentino de la solidaridad continental, de sus alcances y de las obligaciones

que supone para los paises americanos ha sido claramente fijado por el Señor Ministro de

Relaciones Exteriores en su discurso del 10 de diciembre, pronunciado en la primera

sesión plenaria de la Conferencia de Lima. El discurso del Ministro Cantilo, en efecto,

después de señalar la existencia de una conciencia continental, manifestada, por lo

pronto, en el esfuerzo común con que América lucho por su libertad “en una guerra sin

fronteras” declaro que, por encima de todo pacto o alianza expresamente establecida, la

solidaridad americana es un hecho definitivo y natural, que ningún país del continente

puede desconocer. “Todos y cada uno de nosotros agrego estamos dispuestos a sostener

y a probar esa solidaridad frente a cualquier peligro que, venga de donde viniere,

amenazará la independencia o la soberanía de cualquier Estado de esta parte del mundo.

No necesitamos para ello pactos especiales. Actuaríamos con un solo e idéntico impulso,

borradas las fronteras y con una bandera para todos, la de la libertad y la justicia”. Pero el

Ministro Cantilo señal al mismo tiempo, que esta solidaridad no deber ser entendida como

excluyente de la política propia de cada Estado, ya que al lado de los intereses

continentales existen para cada país los intereses regionales y los intereses, aun mas

vastos, que determinan su posición en el orden universal. Por lo que hace a la República

argentina, el país se siente particularmente solidario con la Europa por el aporte humano,

económico y espiritual, que debe al viejo mundo. El universalismo, dijo el Señor Cantilo,

es tradición el la Patria de aquel que un día en Washington expuso como lema de la

política internacional argentina “La América para la humanidad”, en obediencia a estos

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principios generales que corresponden a la tradición de la política internacional del país,

celosamente mantenida en el curso de todas las conferencias y acuerdos anteriores, la

Delegación argentina ante la Conferencia de Lima, entrando en el estudio de un tema que

preocupo desde un principio como motivo principal de aquella reunión, proyectó y

comunicó con fecha de 14 de diciembre una declaración de “expresión de conciencia y

solidaridad americana”, en la que, después de recordarse el espíritu semejante de las

instituciones democráticas de los pueblos de América, su reacción común contra los actos

destinados a alterar su paz o su independencia y la solidaridad natural con que ella,

llegado el caso, habría de producirse, se refirmaba la decisión de poner en practica esa

solidaridad por medio del procedimiento consultivo previsto en los acuerdos vigentes para

oponerse a toda acción atentaría, si perjuicio de a forma autónoma y soberana con que

cada Gobierno obraría a este efecto. Al mismo tiempo, y para señalar claramente la

posición argentina ante otras delegaciones que trabajaban sobre el mismo tema, nuestra

Delegación declaró que la República Argentina, decididamente dispuesta a admitir toda

formula que implicase una manifestación de principios de solidaridad, no podría, sin

embargo, aceptar con ese objeto ningún pacto con compromisos jurídicos de carácter

permanente. Todas las hipótesis de hechos susceptibles de amenazar la paz de América

se explicó en esa oportunidad y están previstas en los acuerdos de la Conferencia de

Consolidación de la Paz de Buenos-Aires, de 1936, por cuya razón un protocolo especial

destinado a contemplar específicamente la acción subversiva de países

extracontinentales tendría el significado de una alianza disfrazada, y seria rechazada. Los

contraproyectos presentados por otras delegaciones, o bien insistieron en prevenir

exclusivamente la intervención de los Estados extracontinentales, o bien pretendieron

establecer as clases de agresión, de gravedad diferente, según fuesen de origen

extracontinental o continental. Una contrapropuesta elaborada como texto conciliatorio por

las Delegaciones de los Estados-Unidos y del Perú, comunicada el día 16, insistía en el

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principio “de resistencia” colectiva, en términos directos, que la Delegación argentina no

pudo admitir, considerándola también como una manifestación de alianza contraria a la

posición netamente asumida por nuestro país en Lima. En esa oportunidad, y en vista de

que las contrapropuestas presentadas suponían de hecho el rechazo de la primera forma

argentina, o, por lo menos, disminuían sus probabilidades como expresión unánime de la

Conferencia de Lima. Simultáneamente con ese nuevo texto, las Delegaciones en Lima

han debido considerar un nuevo anteproyecto, presentado el día 19, como nueva forma

de conciliación, por los Delegados del Perú, el Brasil y los Estados-Unidos. La Delegación

argentina se vio obligada a mantenerse en su posición anterior y a rechazar el nuevo

contraproyecto, de cuyos artículos primero y segundo se dispendia, en sustancia, que el

proceso de consulta establecido por las convenciones vigentes no tiene por objeto la

apreciación previa de los hechos, como lo ha entendido siempre el Gobierno argentino,

sino, directamente, el deber de resistir a los actos de amenazas de cualquier Estado no

americano contra un Estado americano. Aparte de que la formula volvía así nuevamente

al concepto de resistencia directo, y en consecuencia, de la alianza, el texto no podía

satisfacer a la Delegación argentina, en cuanto parecía establecer un régimen de defensa

organizado especialmente o preferentemente contra los países extra continentales.

Algunas otras formulas propuestas después con fines de conciliación han girado en

general, alrededor de estos mismos principios, contrarios a la doctrina argentina.

Obligada, pues, a rechazar también estos nuevos textos de transacción, la Delegación

argentina se atuvo desde entonces a la formula de su ultima contrapropuesta, en la que,

por sugestiones de diversas cancillerías, fueron consentidas ciertas modificaciones de

detalle, inspiradas en un gran espíritu de conciliación y en un vehemente deseo de

alcanzar, al fin, como se ha alcanzado, la unanimidad de la expresión americana. En

cuanto a lo que se ha dado en llamar la “formula de los tres Presidentes”, no ha existido

nunca, ni los Jefes de Estado han tenido sobre este asunto contacto directo alguno. La

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chancillería argentina consultó en ciertos momentos a las chancillerías de algunos países

vecinos sobre las formulas en estudio. Y de esas consultas resultaron, como se ha dicho,

nuevos textos o modificaciones, que fueron oportunamente sugeridos a Lima. Esos textos

y modificaciones han sido contemplados en parte en la formula definitivamente adoptada,

que es así la obra de los veintiún países americanos, sobre la base de la segunda formula

propuesta por la Delegación argentina. Ella realza la posición argentina, que, siendo

propia de nuestra tradición, no implica en absoluto desconfianza contra país alguno, ni

mucho menos aún contra país alguno del continente, que ha encontrado en la formula de

la “buena vecindad” tan feliz expresión de amistad y colaboración”.

(Buenos Aires, 27 de dezembro de 1938)

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ANEXO 6: CONFERÊNCIA ENTRE OS MINISTROS DAS RELAÇÕES

EXTERIORES DAS REPÚBLICAS AMERICANAS – DECLARAÇÃO GERAL DE

NEUTRALIDADE

[PANAMÁ - OUTUBRO DE 1939]

Os Governos americanos resolvem:

1-Afirmar a posição de neutralidade geral das Repúblicas Americanas, incumbindo a cada

uma delas regulamentar, em caráter particular e no exercício de sua soberania própria, a

forma de dar-lhe aplicação correta.

2-Fazer com que seus direitos e posição de neutralidade sejam plenamente respeitados e

observados por todos os beligerantes e por todas as pessoas que ajam em nome, em

representação ou no interesse dos beligerantes.

3-Declarar que, de acordo com a referida posição de neutralidade, existem certas normas

reconhecidas pelas Repúblicas Americanas, aplicáveis nessas circunstâncias e, por

conseguinte:

a)-evitarão que seus respectivos territórios, terrestre, marítimo ou aéreo, sejam utilizados

como base de operações bélicas; b)-evitarão, de acordo com sua legislação interna, que

os habitantes de seus territórios desenvolvam atividades capazes de comprometer a

posição neutral das Repúblicas Americanas; c)-evitarão que, em seus respectivos

territórios, se alistem pessoas para servir nas forças militares, navais ou aéreas dos

beligerantes; se contratem ou induzam pessoas a abandonar seus lares com o objetivo de

tomar parte nas operações bélicas; se empreenda qualquer missão militar, naval ou aérea

em favor dos beligerantes; se aprovisionem, armem, ou aumentem as forças ou o

Formatado: Normal,Justificado, Espaçamento entrelinhas: Duplo

Formatado: Justificado,Espaçamento entre linhas: Duplo

Formatado: Justificado,Espaçamento entre linhas: Duplo

Formatado: Justificado,Espaçamento entre linhas: Duplo

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armamento de qualquer vapor ou navio para ser empregado no serviço de um dos

beligerantes, para fazer cruzeiros ou cometer atos de hostilidade contra outro beligerante,

seus nacionais ou bens; e que os beligerantes ou seus agentes estabeleçam, no território

terrestre ou marítimo das Repúblicas Americanas, estações rádio-elétricas ou se sirvam

de tais estações para se comunicarem com os Governos ou forças armadas daqueles; d)-

poderão determinar, quanto aos navios de guerra beligerantes, que não sejam admitidos,

em portos ou águas próprias, em número superior a três, de cada vez; e que de qualquer

maneira, sua permanência não exceda de 24 horas. Poderão excetuar-se desta

disposição os navios dedicados exclusivamente a missões científicas, religiosas ou

filantrópicas, assim como aqueles que arribarem por motivo de avaria; e)-exigirão que

todos os navios e aviões beligerantes, que procurem hospitalidade em zonas sob sua

jurisdição e governo, respeitem plenamente sua condição de neutros e observem suas

respectivas leis e regulamentos, bem como as regras do Direito Internacional sobre os

direitos e deveres de neutros e beligerantes e, na hipótese de haver dificuldade de serem

respeitados e observados seus direitos, o caso poderá ser objeto de consulta entre eles,

se assim for solicitado; f)-considerarão como infração à sua neutralidade todo o vôo de

aeronaves militares dos Estados beligerantes sobre o próprio território. E com relação às

aeronaves não militares adotarão as seguintes medidas: só poderão voar com licença de

autoridade competente, sem distinção de nacionalidade, e deverão seguir itinerários

estabelecidos pelas mesmas autoridades; seus comandantes ou pilotos deverão declarar

o lugar da partida, as escalas e o destino; só poderão usar radiotelegrafia para assegurar

a rota e as condições de navegabilidade, utilizando linguagem clara em idioma nacional,

sendo admitidas unicamente as abreviaturas regulamentares; as autoridades

competentes poderão exigir que as aeronaves levem um co-piloto ou radiotelegrafista

para fins de controle. As aeronaves militares dos beligerantes, transportadas a bordo de

navios de guerra, não poderão deixar esses navios em águas das repúblicas Americanas;

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as aeronaves militares dos beligerantes, que descerem em território de uma República

Americana, serão internadas por esta, até o fim das hostilidades, assim como sua

tripulação, salvo no caso de pouso por avaria comprovada. Excetuam-se da aplicação

dessas regras os casos em que existam convenções que determinem o contrário; g)-

poderão submeter os navios mercantes de bandeira beligerante, assim como seus

passageiros, documentos e carga, a inspeção nos próprios portos; o agente consular

respectivo deverá certificar os portos de escala e de destino, comprovando também que

se trata de viagem de fins exclusivamente comerciais. Poderão, também, fornecer

combustível aos ditos navios na medida necessária para chegarem até o porto de

abastecimento, ou de escala em outra República Americana, salvo no caso de viagem

direta a outro continente, circunstância em que poderão fornecer-lhes a quantidade

necessária de combustível. Se ficar comprovado que forneceram combustível a navios de

guerra beligerantes, serão considerados como transporte auxiliares; h)-poderão

concentrar, estabelecendo guarda a bordo, os navios mercantes, de bandeira beligerante,

que permaneçam asilados em suas águas, ou internar os que tenham feito falsas

declarações sobre o seu destino, assim como os que demorem tempo excessivo e não

justificado na viagem, ou tenham adotado sinais distintivos próprios aos navios de guerra;

i)-considerarão lícita a transferência de bandeira de um navio mercante a uma das

Repúblicas americanas, desde que essa mudança se tenha realizado com absoluta boa

fé, sem cláusula de retro-venda e em águas de uma República Americana; j)-não

equipararão aos navios de guerra os navios mercantes armados, de bandeira beligerante,

desde que não levem mais de quatro canhões de seis polegadas, colocados na popa, e

não tenham reforçados os conveses laterais, ou quando, a juízo das autoridades locais,

não existam outros elementos que revelem que o navio mercante poderá ser empregado

para fins ofensivos. Poderão exigir que aqueles navios, para entrar nos portos, depositem

os explosivos e as munições nos lugares em que a autoridade local determinar; k)-

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poderão excluir os submarinos beligerantes das águas adjacentes a seu território, ou

então admiti-los sob condição de que se submetam à regulamentação que prescrevam.

4-dentro do espírito enunciado nesta Declaração, os Governos das Repúblicas

Americanas manterão estreito contacto a fim de uniformizar, na medida do possível, a

aplicação de sua neutralidade e para torna-la efetiva em defesa de seus direitos

fundamentais.

5-Com o fim de estudar e formular recomendações relativas aos problemas de

neutralidade, de acordo com o que aconselharem a experiência e o desenrolar dos

acontecimentos, será constituída, enquanto durar a guerra européia, uma Comissão

Interamericana de Neutralidade, composta de sete peritos em Direito Internacional, que

serão designados pelo Conselho Diretor da União Pan-americana antes de 1˚ de

novembro de 1939. As recomendações da Comissão serão comunicadas aos Governos

das Repúblicas Americanas, por intermédio da União Pan-americana.

(Panamá, 03 de outubro de 1939)

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ANEXO 7: CONFERÊNCIA ENTRE OS MINISTROS DAS RELAÇÕES

EXTERIORES DAS REPÚBLICAS AMERICANAS – INSTITUINDO UMA ZONA

DE SEGURANÇA CONTINENTAL

[PANAMÁ – OUTUBRO DE 1939]

Os Governos americanos declaram:

Artigo 1˚-Como medida de proteção continental as repúblicas Americanas, enquanto

mantiverem sua neutralidade, têm o direito indiscutível de conservar livres de todo ato

hostil, por parte de qualquer nação beligerante não americana, as águas adjacentes ao

Continente americano, que consideram como de interesse primordial e de direita utilidade

para as suas relações, quer o referido ato hostil seja praticado de terra, do mar ou do ar.

Artigo 2˚-Os Governos das Repúblicas Americanas concordam em que se esforçarão por

obter dos beligerantes a observância das disposições contidas nesta Declaração, por

meio de representações conjuntas aos Governos que atualmente ou no futuro venham a

tomar parte nas hostilidades, sem prejuízo do exercício dos direitos individuais de cada

Estado, inerentes à sua soberania.

Artigo 3˚-Os Governos das Repúblicas Americanas declaram, além disso, que, sempre

que considerarem necessário, se consultarão, entre si, para determinar as medidas a

serem tomadas, individual ou coletivamente, afim de conseguir o cumprimento das

disposições desta Declaração.

Artigo 4˚-As Repúblicas Americanas, enquanto existir um estado de guerra do qual elas

próprias não participem, e quando for julgado necessário, poderão realizar

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patrulhamentos individuais ou coletivos, conforme resolverem, por mútuo consentimento e

até onde os elementos e recursos de cada uma o permitam, nas águas adjacentes às

suas costas, dentro da zona já definida.

(Panamá, 03 de outubro de 1939).

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ANEXO 8: CONFERÊNCIA ENTRE OS MINISTROS DAS RELAÇÕES

EXTERIORES DAS REPÚBLICAS AMERICANAS – DECLARAÇÃO CONJUNTA

DE SOLIDARIEDADE CONTINENTAL

[PANAMÁ – OUTUBRO DE 1939]

Os Governos americanos declaram:

Artigo 1˚-Que reafirmam a declaração de solidariedade entre os povos deste continente,

proclamada na 8˚ Conferência Interamericana de Lima, em 1938.

Artigo 2˚-Que se esforçarão usando de todos os recursos espirituais adequados de que

disponham, para conservar e fortalecer a paz e a harmonia entre as Repúblicas da

América, como requisito indispensável para que se possa cumprir com eficácia o dever

que lhes corresponde na evolução histórica universal da civilização e da cultura.

Artigo 3˚-Que estes postulados não obedecem a qualquer propósito egoísta de

isolamento e antes se inspiram no elevado intuito de cooperação universal, que leva estas

nações a formular fervorosos votos para que cesse o deplorável estado de guerra

atualmente existente entre alguns países da Europa, com grave perigo para os mais altos

interesses espirituais, morais e econômicos da humanidade, e para que volte a reinar no

mundo a paz, não ditada pela violência, mas baseada na justiça e no direito”.

(Panamá, 03 de outubro de 1939).

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ANEXO 9: CONFERÊNCIA ENTRE OS MINISTROS DAS RELAÇÕES

EXTERIORES DAS REPÚBLICAS AMERICANAS – DEFESA DA POLÍTICA

PAN-AMERICANA

[HAVANA – JULHO DE 1940]

As Repúblicas Americanas, na defesa e proteção da política pan-americana, resolvem:

Artigo 1º-Reiterar a recomendação feita pela Primeira Reunião de Consulta do Panamá,

de que os Governos das Repúblicas Americanas adotem as disposições necessárias para

extirpar das Américas a propaganda de doutrinas que tendam a pôr em perigo o comum

ideal democrático interamericano, assim como as que sejam convenientes para evitar

quaisquer atividades capazes de comprometer a neutralidade americana;

Artigo 2º-Recomendar aos Governos das Repúblicas Americanas as seguintes regras a

respeito de lutas civis, distúrbios internos ou propagação de ideologias subversivas: a)-

empregar os meios necessários para evitar que os habitantes de seu território, nacionais

ou estrangeiros, tomem parte, reúnam elementos, passem a fronteira ou embarquem no

seu território para introduzir ou fomentar guerra civil, ou distúrbio interno, ou propagar

ideologias subversivas em outro país americano; b)-desarmar ou internar toda força

rebelde que traspasse as suas fronteiras. Desde que sejam aplicáveis observar-se-ão as

regras de internação formuladas pela Comissão Interamericana de Neutralidade do Rio de

Janeiro; c)-proibir o tráfego de armas e material de guerra, salvo quando forem destinados

ao governo, enquanto não esteja reconhecida a beligerância dos rebeldes, caso no qual

se aplicarão as regras de neutralidade; d)-evitar que em sua jurisdição se equipe, se arme

ou se adapte para uso bélico, qualquer embarcação destinada a operar no interesse da

rebelião;

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Artigo 3º-Reiterar a Recomendação da Primeira Reunião de Consulta do Panamá para

que se promova, com a maior brevidade possível, a coordenação das regras e

procedimentos que julguem úteis, para facilitar a ação das autoridades policiais e

judiciárias dos respectivos países, em repressão das atividades ilícitas que tentam

realizar, em qualquer momento, indivíduos nacionais ou estrangeiros, em favor de um

Estado estrangeiro;

Artigo 4º-Recomendar aos Governos dos estados americanos, sem prejuízo do respeito

devido ao seu direito individual e soberano para regular a condição jurídica dos

estrangeiros, a consagração das seguintes normas legislativas ou administrativas: a)-

tornar efetiva a proibição de toda atividade política de indivíduos, associações, grupos ou

partidos políticos estrangeiros, qualquer que seja a forma com que a dissimulem ou

encubram; b)-fiscalização rigorosa da entrada de estrangeiros no território nacional,

particularmente no caso em que estes sejam nacionais de Estados não americanos; c)-

supervigilância policial eficaz das atividades das coletividades estrangeiras não

americanas, estabelecidas nos diversos Estados americanos; e d)-criação de um sistema

penal destinado a prevenir e impedir as infrações determinadas neste artigo;

Artigo 5º-Encarecer a necessidade de comunicação recíproca, em forma direta, ou

mediante o órgão da União Pan-americana, de informações e dados acerca da entrada,

não admissão e expulsão de estrangeiros e da adoção das medidas preventivas e

repressivas previstas no artigo anterior;

Artigo 6º-Qualquer das repúblicas americanas, atingidas diretamente pelas atividades a

que se refere esta Resolução, poderá iniciar o procedimento de consulta”.

(Havana, 30 de julho de 1940)

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ANEXO 10: CONFERÊNCIA ENTRE OS MINISTROS DAS RELAÇÕES

EXTERIORES DAS REPÚBLICAS AMERICANAS – ROMPIMENTO DE

RELAÇÕES DIPLOMÁTICAS

[RIO DE JANEIRO – JANEIRO DE 1942]

As Repúblicas Americanas, na defesa e proteção da política pan-americana, adotem,

imediatamente, de conformidade com as práticas usuais e a legislação de cada país:

a)-as medidas adicionais que sejam necessárias para interromper-se, durante a atual

emergência continental. Todo o intercâmbio comercial e financeiro, direto ou indireto,

entre o Hemisfério Ocidental e as nações signatárias do Pacto Tripartido e os territórios

dominados pelas mesmas;

b)-as medidas para se suspenderem as demais atividades comerciais e financeiras

prejudiciais ao bem estar e à segurança das Repúblicas Americanas, medidas essas que

terão, entre outros objetivos, os seguintes:

I)-Impedir, dentro das Repúblicas Americanas, as operações comerciais e financeiras

contrárias à segurança do Hemisfério Ocidental, realizadas diretamente pelos Estados

membros do Pacto Tripartido, pelos territórios por eles dominados, ou por seus nacionais,

sejam pessoas naturais ou jurídicas, e evitar também outras, realizadas indiretamente

pelos ditos Estados ou seus cidadãos, e as que redundarem em benefício dos ditos

Estados ou territórios e de seus cidadãos, ficando entendido que as pessoas naturais

poderão ser excetuadas de tais medidas quando forem residentes de uma República

Americana, e com a condição de ficarem controladas conforme prevê o inciso seguinte;

II)-Vigiar e controlar todas as operações comerciais e financeiras que realizem, dentro das

Repúblicas Americanas, os nacionais dos Estados signatários do Pacto tripartido ou dos

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territórios dominados por eles, que residam em uma das ditas Repúblicas e proibir todas

as operações de qualquer natureza que forem contrárias à segurança do Hemisfério

Ocidental.

(Rio de Janeiro, 28 de janeiro de 1942)

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GLOSSÁRIO:

GLOSSÁRIO Personalidade Função Data

01 Adolf Hitler Ditador Alemão 1933 - 1945 02 Agustín P. Justo Presidente Argentino 1932 - 1938 03 Antônio de Oliveira Salazar Ditador Português 1932 - 1968 04 Arturo Rawson Presidente Argentino 04-07/06/1943 05 Arturo Alessandri Palma Presidente Chileno 1932 - 1938 06 Benito Mussolini Ditador Italiano 1922 - 1945 07 Carlos Ibañez del Campo Presidente Chileno 1927 - 1931 08 Carlos Saavedra Lamas Ministro Relações Exteriores Argentino 1936 - 1938 09 Cordell Hull Secretário Estado Norte-americano 1933 - 1944 10 Edmund von Thermann Embaixador Alemão na Argentina 1938 - 1943 11 Enrique Ruiz Guiñazú Ministro Relações Exteriores Argentino 1941 - 1943 12 Franklin Delano Roosevelt Presidente Norte-americano 1941 - 1945 13 Francisco Paulino Franco Ditador Espanhol 1939 - 1975 14 Galeazzo Ciano Ministro Relações Exteriores Italiano 1938 - 1943 15 Getúlio Dornelles Vargas Ditador Brasileiro do Estado Novo 1937 - 1945 16 Jéferson Caffery Embaixador Norte-americano no Brasil 1937 - 1944 17 Joachim Ribbentrop Ministro Relações Exteriores Alemão 1938 - 1945 18 José Maria Cantilo Ministro Relações Exteriores Argentino 1938 - 1940 19 Juan Antonio Ríos Presidente Chileno 1942 - 1946 20 Juan D. Perón Ministro do Trabalho/Oficial do GOU 1943 - 1944 21 Júlio Argentino Roca Ministro Relações Exteriores Argentino 1940 - 1941 22 Karl Ritter Embaixador Alemão no Brasil 1937 - 1938 23 Mário de Pimentel Brandão Ministro Relações Exteriores Brasileiro 1937 - 1938 24 Oswaldo E. de Sousa Aranha Ministro Relações Exteriores Brasileiro 1938 - 1944 25 Pedro Aguirre Cerda Presidente Chileno 1938 - 1941 26 Pedro Paulo Ramirez Presidente Argentino 1943 - 1944 27 Ramón S. Castillo Presidente Argentino 1940 - 1943 28 Roberto M. Ortiz Presidente Argentino 1938 - 1940 29 Segundo Storni Ministro Relações Exteriores Argentino 07-09/1943 30 Sumner Welles Secretário Estado Norte-americano 1937 - 1943

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Página 104: [1] Excluído Jorge Ferrer 22/2/2007 11:54

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